Relatorio Final da Pesquisa Qualitativa sobre a Produção Audiovisual Independente do DF
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2011
Vídeos na internet feitos por grupos informais do DF: Estudo sobre o processo de construção, motivações e escolhas estéticas – Relatório Qualitativo
Coordenadores da pesquisa:
Gledson Shiva e Eladio A. Oduber P.
Fundo de Apoio à Cultura FAC – Governo do
Distrito Federal - GDF
29/08/2011
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Coordenadores da pesquisa: Gledson Shiva. [email protected]
Dr. Eladio A. Oduber P.
Equipe participante do projeto:
Msc. Solange Miguel Marcondes Armando – Analista / Moderadora Laís Konrad – assistente
Eunice Borges – Layout
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I. SUMÁRIO II. APRESENTAÇÃO ..................................................................................... 7
III. OBJETIVOS DA PESQUISA ........................................................................ 7
III. ASPECTOS METODOLÓGICOS ..................................................................8
CONTEXTUALIZAÇÃO DA TÉCNICA DE FOCUS GROUP NO ÂMBITO DA METODOLOGIA QUALITATIVA ................................................................. 8
Grupo Focal .......................................................................................... 9
Procedimentos e campo............................................................................10
Plano de análise ..................................................................................... 10
IV. PRINCIPAIS RESULTADOS....................................................................... 11
Os entrevistados, O Começo................................................................... 12
Por que Postar?...................................................................................... 15 O Público.............................................................................................. 18 Processo Criativo e Escolhas Estéticas........................................................... 20
A Inspiração......................................................................................... 23 Referência........................................................................................... 25
Padrões.................... .......................................................................... 28
Satisfação........................................................................................... 31
Percepção Ética...................................................................................... 34
Percepção de Grupos Primários e Secundários................................................ 35
Percepções Sobre Tempo X Dinheiro........................................................... 36
Remuneração Pela Postagem...................................................................... 37
Equipe e Equipamentos............................................................................. 41
Produtores de Conteúdo Local e a Lei do Audiovisual......................................... 46
V. CONCLUSÕES........................................................................................... 48
Um Mundo de Diálogos Audiovisuais .............................................................. 48
Recomendação......................................................................................... 49
VI. ANEXOS.................................................................................................. 51
Roteiro de Grupo Focal ............................................................................ 51
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Vídeos na internet feitos por grupos informais do DF: Estudo sobre o processo de construção, motivações e escolhas estéticas – Relatório Qualitativo
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II. APRESENTAÇÃO Encontra-se neste relatório a compilação e organização dos depoimentos, registrados em aproximadamente cinco horas de gravação, de dois grupos focais realizados com realizadores de vídeos do DF, postados na internet.
Os dados qualitativos, que resultaram dos Grupos Focais foram dispostos neste relatório respeitando, dentro do possível, a fidelidade à forma no momento de sua coleta. Assim sendo, deve-se esclarecer que o presente trabalho tem um caráter mais etnográfico que interpretativo e representa um primeiro movimento de aproximação aos grupos informais que realizam e postam vídeos em sites da internet.
A interpretação e divulgação das informações contidas neste relatório visam contribuir para o entendimento da produção audiovisual destinado à internet dos grupos de realizadores informais do DF.
III. OBJETIVOS DA PESQUISA
Objetivo geral
Conhecer - através de indicadores qualitativos – o quadro de estratégias e conteúdos materiais e simbólicos que um grupo de vídeo-makers do DF constroem e utilizam para realizar e divulgar suas produções no ciberespaço.
Objetivos específicos
Este estudo pretendeu identificar as percepções do público de interesse nos seguintes aspectos:
I. IDEOLOGIA DAS PROPOSTAS:
→ Analisar as influências narrativas e conceituais que determinam a configuração ideológica e artística do conteúdo produzido por esses grupos ou/e indivíduos;
II. M O T IV A Ç Õ E S / G R U P O S D E R E F E R Ê N C I A :
→ Conhecer qual o desejo que os move: desejo de se expressar, desejo de pertencer a um grupo, desejo de aperfeiçoar uma técnica artística, desejo de ser famoso, etc.;
I II . RECURSOS / EXPECTATIVAS DE RETORNO:
→ Confrontar com cada um dos entrevistados as questões de dispêndio de recursos, energia e tempo pessoal em algo tão efêmero. Que tipo de retorno eles esperam por este “trabalho”?
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IV. PE RC E P Ç Ã O SO B R E O PROCESSO CRIATIVO :
→ Entender como surge e é desenvolvida a história ou/e tema que será gravado, editado e postado na internet;
V. RELAÇÃO COM O GRUPO PRIMÁRIO/ PATROCÍNIO MATERIAL E SIMBÓLICO:
→ Identificar como eles encaram o entorno pessoal (familiares e amigos próximos): se são hostis ou receptivos àquela atividade; VI. REPRESENTAÇÕES SOBRE A INDUSTRIA CULTURAL / SUSTENTABILIDADE:
→ Verificar o entendimento que eles têm sobre a indústria cultural (economia da cultura) do audiovisual mundial, brasileiro e do Distrito Federal, para entender até que ponto aquele trabalho possa vim a ser auto-sustentável;
VII. COOPERAÇÃO E TRABALHO:
→Compreender até que ponto é realizado uma ação realmente colaborativa, um co-work que possibilita a feitura de seus filmes.
IV. ASPECTOS METODOLÓGICOS
CONTEXTUALIZAÇÃO DA TÉCNICA DO GRUPO FOCAL NO ÂMBITO DA METODOLOGIA QUALITATIVA
A pesquisa qualitativa é um tipo de investigação que oferece técnicas especializadas para a obtenção de respostas sobre o que as pessoas pensam e sobre os seus sentimentos, permitindo uma melhor compreensão das atitudes, crenças e comportamentos de uma população específica sobre um determinado tema.
O enfoque qualitativo proporciona profundidade de compreensão das respostas de consumidores ou usuários de um serviço. Por sua própria natureza, a investigação qualitativa trata dos aspectos emocionais e contextuais da resposta humana, o que a caracteriza uma índole interpretativa, mais que descritiva. A natureza da análise qualitativa está vinculada às ciências sociais e à teoria psicanalítica.
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Para a realização deste trabalho foi utilizada a técnica de pesquisa qualitativa denominada Grupo Focal. Um mesmo roteiro1 orientou os 02 Grupos focais realizados.
G RU PO FO C A L
Os Grupos focais ou Discussões em Grupo são uma das técnicas de investigação qualitativa preponderantes. As discussões em grupo são amplamente utilizadas, sendo as principais razões de sua utilização a existência de uma interação no grupo, a facilidade de observação e a relação positiva entre custo e calendário da pesquisa.
Os grupos de discussão utilizam uma extensa indagação e perguntas abertas aproveitando-se da dinâmica de grupo sob monitoramento de um moderador qualificado de maneira a alcançar níveis crescentes de compreensão e aprofundamento do tema proposto. Além disto, é possível a utilização de técnicas projetivas, como personificação e card sorting, que se propõem trazer à tona percepções e sentimentos não filtrados por racionalizações.
Esta dinâmica reúne indivíduos selecionados em uma disposição de entrevista coletiva, conduzidos por um moderador, estabelecendo-se um fórum onde se obtêm riquíssimos depoimentos sobre o tema abordado. As entrevistas foram realizadas em local apropriado, confortável, numa atmosfera informal, por períodos de duas horas e meia, conduzidas pelo próprio coordenador do projeto e assistido por uma analista e uma assistente.
O roteiro foi aplicado de forma flexível, servindo como orientação para que se abordassem os temas previstos, mas permitindo que os informantes enfatizassem suas experiências e percepções mais significativas. Garantimos assim condições ótimas de espontaneidade e objetividade para abranger todos os pontos do roteiro. A dinâmica projetiva que foi aplicada foi a assistência de uma produção de vídeo nos formatos que o grupo produz sendo os participantes encorajados a opinar sobre o material exposto. Com este recurso obtivemos amostras teóricas das críticas e o pensamento ético e estético dos informantes, trazendo também à tona conteúdos e opiniões não racionalizadas.
O local escolhido para a realização das reuniões foi a sala confortável e silenciosa climatizada e bem iluminada, provida de equipamento de gravação em áudio e vídeo localizada na Asa Sul do Plano Piloto de Brasília.
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PR O C E D I M E N T O S E C A M P O
Para atingir os objetivos deste estudo optou-se pela realização de dois (02) Grupos Focais, com seis a oito participantes em cada um.
Em diversas reuniões da coordenação da pesquisa aprofundamos os objetivos desse estudo de forma a corresponder às expectativas, definindo-se, assim, a concepção e estratégias de seleção a serem adotadas.
Concluída esta fase, a equipe de pesquisa. começou o processo de seleção da amostra que participaria das duas técnicas.
A amostra de este estudo qualitativo foi composta de vinte vídeo-makers. Por motivos de ética e sigilo científico não revelamos outros detalhes sobre os informantes. As atividades que foram cumpridas para a realização da pesquisa seguiram o seguinte roteiro:
No primeiro mês do projeto, o coordenador da pesquisa detectou onde estavam os vídeos narrativos e performáticos destes produtores informais do Distrito Federal. A investigação foi feita nas redes sociais, nos sites de armazenamento de vídeo, blog’s, na internet como um todo; verificando ainda nos nossos contatos on-line e off-line as pessoas ou/e grupos que se enquadravam como objeto desta pesquisa, e que residiam em nossa cidade ou entorno;
No segundo mês o coordenador da pesquisa e o analista sistematizaram os dados e reuniram-se para definir os 10 (dez) grupos ou/e indivíduos que seriam selecionados;
No terceiro mês a equipe de pesquisa deu prosseguimento aos contatos, abordando diretamente as 20 (vinte) pessoas escolhidas para responderem nosso roteiro de perguntas;
No quarto mês iniciamos e executaremos o processo de mobilização para a organização dos grupos focais com estes produtores de conteúdos audiovisuais para a internet;
No quinto mês foram degravadas as reuniões para formato digital;
No sexto, sétimo, oitavo e nono mês foram sistematizados e analisados todos os dados coletados através dos grupos focais, elaborando um relatório com a conclusão da pesquisa.
PL A NO D E A N Á LI SE
A análise qualitativa que neste estudo foi utilizada procurando identificar a presença ou ausência de características, temas, expressões ou símbolos que compõem a “lógica” da percepção do realizador de vídeos informais para a internet.
Para a realização da análise dos depoimentos foi utilizado o método de codificação aberta que consiste na fragmentação dos textos escritos e sua posterior conceitualização e reintegração em uma nova estrutura. (Straus e Corbin, Apud Flick U. p. 189).
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V. PRINCIPAIS RESULTADOS
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OS ENTREVISTADOS, O COMEÇO.
Entre os entrevistados dos dois grupos focais encontramos videomakers que começaram a postar na internet no
intervalo que compreende os anos de 1999 a 2010. A maioria começou a postar a partir de 2005. Houve quem já
tivesse postado mais de 300 vídeos num período que começou em 2006.
“Eu estou entrando nessa área de vídeos para a internet há pouco tempo, menos de 1 ano [...]”
“[...] desde 2003, então já fazem 8 anos.”
“A primeira vez que eu fiz algum vídeo pra postar em algum lugar foi em 2000. Acho que foi entre 1999 ou 2000.”
“Eu comecei ano passado, no começo do ano passado. Aí eu comecei a postar os vídeos mais ou menos no meio do ano.”
Os gêneros postados pelos entrevistados variam entre vídeo clipes, esquetes, talking heads 1
Além de produzir vídeos para internet especificamente, produzem também curtas-metragem de ficção,
documentários, clipes, e vídeo-arte cujo destino final é o público de festivais, festas, e o consumidor de
publicidade. A internet - no caso de alguns, é um meio a mais para divulgação das obras.
, paródias, entrevistas,
ficção, ficção em episódios, ficções interativas, “vídeos de cunho sociológico”, documentários, registros de eventos
e exposições, curtas-metragens, vídeo-arte/experimentais e trash.
“faço vídeos mais de cunho sociológico”
“Os vídeos que eu tenho feito são a maioria videoclipes para a internet”
“O meu programa na internet é um programa meio que de entrevista, ele é isso aqui [...]É um bate papo, eu chamo um
artista da cidade pra conversar, aí a gente senta e começa a dialogar, gravar e depois eu edito e jogo na internet.”
“Eu comecei no trash, e é legal você começar assim de qualquer jeito porque você vai pegando o “feeling” do que
funciona, e do que não funciona.”
“[...] eles são calcados em um estilo policial, mas com humor, e sempre muda o estilo. É como se cada episódio tivesse
efeito com uma pessoa diferente[...]”
1 Vídeo centrado em um único performer/personagem, geralmente dirigido e produzido pelo mesmo.
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No GF1 reconheceram que sua produção é fundamentalmente baseada em texto por contraposição ao que se
chama de vídeo água - vídeos experimentais, de caráter sensorial. Já no GF2 encontramos vários artistas multimídia
do circuito experimental e/ou da vídeo-arte.
-“[...] a maioria das pessoas aqui estão mais ligados ao texto, que escrevem e transpõem isso. Não são vídeos sensoriais,
não são vídeos como até o “Festival do Minuto” nomeia “Vídeos Água”, são vídeos com texto na sua maioria. Em que
você pensou em um texto, viu se aquilo vai funcionar e elaborou os personagens em cima, ou veio junto.”
“[...] normalmente o que eu trabalho mais é em termos de figurinos, cenografia, esse tipo de coisa. 2. eu ajudo a
produzir para os outros meus amigos. [...]. O meu negócio é as coisas com as mãos. Por exemplo figurinos das outras
pessoas, eu faço muito cenografia e tudo mais, e até ajudar os outros amigos como eu estava falando com o pessoal
agora pouco.
“[...] Sou artista multimídia, bacharel em artes plásticas pela UNB.”
As postagens foram feitas em diversos sites e vlogs 2
, mas principalmente no Youtube. A preferência se deve à
facilidade para “subir” e descarregar os vídeos. Além disso o site incorpora e disponibiliza novas tecnologias,
ficando os criadores despreocupados com a compatibilidade. Mesmo assim, muitos artistas alimentam seus
próprios sites paralelamente à postagem no Youtube ou postam em sites que consideram de “melhor qualidade”.
“[...] eu tenho subido todos pro Youtube. Eu resolvi centralizar por questões práticas do Youtube. Antes eu tentava sim
subir para meu próprio site, mas era menos prático. Eu que tinha que tomar conta da infra-estrutura. O Youtube trás
essa coisa boa de novas tecnologias, ele incorpora sozinho. A gente meio que sobe e se despreocupa com essa questão de
compatibilidade. Não tem tanto a questão da obsolescência se a gente tentasse desenvolver sozinhos né.”
“Eu boto curta-metragem, coisas mais de portfólio. Coisa mais que facilita a vida. [...]Eu uso mais o Youtube por uma
questão de praticidade. Pois foi o primeiro, pois o “Vimeo” tem mais qualidade, se você for fazer uma análise de botar
coisas para portfólio o “Vimeo” tem muito mais qualidade.”
2 Ou Videoblogs.
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Além deste foram mencionados os sites “Jacaré Banguela”, o “Porta Curtas”, o “Vimeo” e sites de eventuais
festivais de cinema onde se fazia up-load de vinhetas dos filmes participantes (os chamados teasers), ou se
descarregava o filme em sua totalidade, se o site comportasse. Falou-se também sobre a postagem nas
comunidades de redes sociais (Orkut e Facebook).
“[...] Aí tu vê, essa coisa do Jacaré que eu fiquei de cara, que você vê que são pessoas completamente diferentes, [...]”
“[...] Depois alguns sites se popularizaram como o Porta Curtas, o Youtube mesmo, depois do início dele, popularizou
alguns canais de curtas metragens, ficcionais, etc.
“Eu não comecei pensando em nada, só fazia pros amigos mesmo, tanto que eu não tinha “Orkut”, não tinha nada. Eu
comecei a fazer esses vídeo e “Pra quem eu to colocando?”, era só pra quem tava ali o link e eu mandava o vídeo. Aí eu
entrei nas comunidades do “Orkut” do “Facebook” pra começar a tentar ver e mostrar pra outras pessoas né. Aí começa a
se criar essa possibilidade de viver talvez disso. Eu to começando agora a ter essa expectativa.”
Muitos conheceram o meio de expressão através da convivência com amigos que já produziam cinema, em
película ou vídeo, trabalhando primeiramente na parte técnica, fazendo trabalhos escolares com a câmera, ou
simplesmente o fato de a possuírem foi o suficiente para que alguns desses realizadores despertassem para o ofício.
Os tutoriais encontrados na Rede foram uma fonte de aprendizado técnico importante para esses autodidatas
“[...] Eu era vizinho do André Cunha que era um diretor de Fotografia, eu pedi pro cara e falei “posso carregar caixa
pra você em um set seu?” o cara virou e falou “Larga de ser vagabundo, você tem uma câmera desse tamanhinho, um
computador desse, filma teus negócios!”. Entendeu? Tenta a sorte e vai ver o que é que dá. E eu fui correr atrás e
comecei me lascando. [...]
“[...] aí eu comecei a fazer com câmera digital simples, aí comecei a postar e mostrar pros amigos. As pessoas
começaram a gostar e eu comecei a me interessar mais na parte de cinema mesmo. Comecei a pesquisar na internet como
eu poderia fazer esses vídeos, sobre luz, iluminação esse tipo de coisa. [...] Eu comecei a procurar tutorial. No Youtube
tem muito vídeo de tutoria sobre programas pra desenvolver. Ai eu comecei a estudar essa parte, me interessei, gostei.
Aí eu procurei me especializar na área. Comecei a fazer uma faculdade agora de Produção Audiovisual, no Uni Cesp
no Guará.”
“Olha comigo surgiu um negócio que é o seguinte: eu era escoteiro aí teve uma galera que marcou um esquema de
trabalho. [...] E foi a primeira experiência e eu achei muito interessante. E casou de meses depois eu conseguir um
estágio em uma TV.[...]”
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Outros cursaram jornalismo, publicidade, artes plásticas e faculdades afins; outros ainda freqüentaram oficinas de
audiovisual e cursos de especialização.
Mas é comum o fato de terem experimentado bastante antes de travarem contato com algum tipo de
sistematização teórica. Outro ponto comum é o vínculo com a linguagem cinematográfica, seja por terem se
interessado primeiro pela tela grande, seja por terem se voltado para ela a partir da experiência com produção
para internet.
“Eu entrei nessa questão de audiovisual muito pela técnica também. E foi uma questão de cara de pau total. Porque
apareceu uma pessoa falando assim: “estou com um contato na televisão muito bom, você sabe filmar? É daqui a um
mês que a gente vai gravar” [...]Aí eu tive que aprender, e já entrar nessa parte. Aí eu comecei pela técnica, foi ao
contrário. Eu já fazia artes cênicas na UNB, então tinha essa coisa artística também. Mas na área de audiovisual eu
entrei pela técnica.”
“ [...] normalmente se faz o caminho inverso no Brasil. Porque a pessoa experimenta e depois que vai pensar na
técnica, na linguagem, conservadorismo.” - “Às vezes você descobre coisas que você experimentou lá atrás que você já
tem um estudo formal em cima. Aí você pensa “ah é isso que eu fazia”.” - “Começa a nomear suas loucuras.”
“todo mundo tinha um certo histórico com cinema,[...]
O Festival do Minuto é o mais reconhecido entre os projetos estimuladores para a postagem na internet. Foram
citadas também as oficinas de audiovisual e, mais especificamente o programa comunitário “Picasso não Pichava”.
“[... ]Na época nós tínhamos o Festival do Minuto, e era uma coisa muito cobiçada, eram milhares de pessoas que
mandavam vídeos e parecia ser muito simples, só um minuto e você tinha que fazer com um vídeo.[...]”
[...] projeto chamado Picasso não Pichava . Lá tem uma oficina de audiovisual que tenta incentivar os meninos a
produzirem [...].”
POR QUE POSTAR?
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A audiência massiva e a exibição simplificada do material produzido é o principal motivo para se fazer o
up-load dos vídeos, concorrendo com esse motivo a possibilidade de se conhecer a opinião das pessoas que
assistem, obter reconhecimento ou mesmo notoriedade. A postagem não é apenas uma “vitrine”, ela é também
uma forma de interação entre o criador e seu público.
“O barato no caso como você falou é ter muito mais gente querendo ver o que você faz, muito mais gente interessada em
sei lá, em participar de certa forma, porque é um participar que as pessoas tem sobre a vida que você tem. Então de
uma certa forma você faz uma coisa que vai tocar outra pessoa, isso é interessante.”
“Eu fiz só pra mostrar o resultado pras pessoas, aí vi que tem resultado. As pessoas votam por você, perguntam como
você fez, qual é o processo de criação, se vai ter mais.”
“[...]Pra ser visto, que é o que importa.”
Realmente interessados na quantidade de visualizações atingida pelo vídeo postado, a possibilidade de que sua
produção se torne um “viral” está no horizonte de interesse dos videomakers desse grupo. Pode-se afirmar que para
esses criadores mais vale ter comentários ruins, do que pouca visibilidade.
“Primeiramente eu acho que foi a primeira maneira de conseguir expor o conteúdo que a gente produzia [...] uma
maneira interessante de divulgar e conhecer outros trabalhos também. [...]”
“[...] esse era o jeito da gente compartilhar e fazer com que a produção fosse vista para que ela não ficasse nas nossas
gavetas, em HDs ou CDs. Quando você se propõe a fazer vídeo ou alguma forma de expressão artística você no fundo
por mais ermitão que você seja, você tem esse desejo de que alguém vá ver, ou vá ler, que alguém vá ver o que você fez.
[...]”
“É uma coisa tipo “Estão prestando atenção em mim.”
“Eu gosto muito dessa coisa do feedback. Eu acho que a internet, esse anonimato da internet trás um feedback muito
real. [...] E também concordo com relação à qualidade de vídeos, vai ganhando visitações espontaneamente, e vai
tornando viral, uma hora ou outra aquilo não tem nada, e de repente, não necessariamente isso tem a ver com a
qualidade intelectual [...]”
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No GF1 a exibição pela internet foi contraposta à mostra em vídeos-clube e em festivais, onde considerando-se a
minguada platéia destes últimos e a fama de “circuito intelectual” em oposição ao circuito “de entretenimento” da
WEB.
A função de “portfólio” da produção artística e profissional foi ressaltada pelos criadores no GF2.
“ Eu acho que uma coisa legal da internet [...] é que você sai um pouco daquele circuito intelectual dos festivais. Por
exemplo os filmes dele, que eu fazia e faço também, não é um filme intelectual, é um filme mais de entretenimento. Na
internet você consegue atingir mais esse público do que em festival, e ser reconhecido melhor até, e consegue atingir
mais gente que às vezes um pessoal pega um dinheiro do FAC, vai e gasta cem mil reais fazendo um vídeo curta que vai
ser visto por 50 pessoas, sei lá, por 500 pessoas. Aí você faz um vídeo muito menos do que isso na internet, que se for
bom vai ser visto por muito mais gente.”
“Eu boto curta-metragem, coisas mais de portfólio. Coisa mais que facilita a vida. [...]. Como é que faz 10 mil pessoas
ver um curta-metragem meu? Festival de Cinema? Não pode ser. Quantos festivais de cinema eu vou ter que botar ele
pra 8 mil pessoas, 9 mil assistirem o filme? [...]”
Caracterizada como um ambiente de “liberdade total”, a Internet é percebida como permissiva no sentido estético
e temático, além de permeável a produções de baixo custo. Das ficções do gênero “trash” aos tutoriais, passando
pela vídeo-arte, tudo pode encontrar seu público no espaço cibernético. O anonimato permite que o público
opine livremente sobre o que assiste e isso estreita os laços entre produtor e consumidor.
“[...] a minha é muito semelhante ao que os demais falaram. Eu acho que o Youtube, a internet, os vídeos da internet
são um ambiente de liberdade total em que você tem 20 milhões de expectadores em potencial para cada vídeo que você
posta lá. Daí pra quem faz vídeos pensando no público, pensando na segunda pessoa, é o ambiente ideal pra você
colocar aquela sua forma de expressão, aquele seu vídeo, aquela coisa que de alguma forma você achou que devia ser
compartilhado com as pessoas.”
Encanta-os também a possibilidade da Web funcionar como um canal de TV para produtores que não têm acesso à
TV aberta ou por assinatura.
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“Eu acho que fiquei deslumbrado com o fato de a internet poder ser um outro tipo de televisão para pessoas que não
tem acesso a canais de televisão. Eu posso chegar e filmar uma coisa engraçada sem usar muito dinheiro e ao mesmo
tempo ver os comentários de todo mundo, você vai ver se eu pegar o primeiro vídeo que eu postei, sei lá, teve 200
comentários em 1 dia, eu fiquei “uau” eu li todos. 70% dos comentários são ruins.”
Um dos entrevistados manifestou que não apenas o jornalismo on line, como também o compartilhamento pessoal
de memória não pode prescindir da imagem em movimento divulgada pela internet.
“Às vezes você viaja, filma lá faz uma coisa interessante. Mas a pessoa que você conheceu lá ficou lá, aí quando você
posta esse material na internet você manda esse link por e-mail e fala “Ta aí, você lembra de quando a gente, sei lá,
fez tal coisa”. Pra assistir, né. Tem essa facilidade, o vídeo dá uma vida a coisa. Hoje em dia inclusive até esses jornais
online que a gente vê, os fotógrafos estão fazendo pequenos clipes né, de acidentes e outras coisas, tudo agora tem um
pequenos clipes de 30 segundos. Porque só as fotos não alimenta mais a sensação de informação.”
Já que a produção desses vídeos é geralmente mais simples e rápida, alguns artistas consideram a postagem uma
forma de se manterem em atividade e no exercício da pesquisa entre – ou até mesmo durante – produções de
maior vulto.
.“Comigo eu acho que seria interessante conseguir dinheiro com o viral, mas eu tenho interessem em produções
maiores também. Tenho interesse, por exemplo, em engatar um documentário. Só que o viral é uma forma de
eu continuar produzindo, continuar tendo curiosidade sobre as coisas e chamando atenção mesmo para a
minha produção. É uma forma barata de você produzir conteúdo, Mesmo não recebendo eu faço. Mesmo não
ganhando nada eu continuo fazendo. Mas o meu interesse mesmo é pegar um assunto e escarafunchar um
assunto e ir até o fundo mesmo e raspar o tacho.”
O PÚBLICO.
“Agora pra mim o público de internet é uma coisa, é uma nuvem ainda, eu não consegui definir. Até porque
eu acho que existem muitos nichos simultâneos ali. Tem gente que entra pra ver uma coisa engraçadinha,
outros já querem ver uma repercussão de televisão, um Big Brother, um pedaço de uma coisa. Então assim eu
ainda não consegui definir exatamente um público pra eu poder trabalhar com ele.”
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Como o entrevistado acima, nem todos podem caracterizar com clareza a sua audiência, alguns assumem,
simplesmente, sem preocupação maior, que seu público é “variado”, e reconhecem que existem inúmeros “nichos”
nos quais se agrupa a audiência, em ambiente virtual. A característica de cada grupo pode depender do lugar onde
o vídeo é divulgado. Esse foi o resultado principal no GF1.
“eu conheço muito bem o meu público. Eu comecei justamente fazendo as paródias dos vloggers que estavam fazendo
sucesso em 2006 e isso causou um impacto grande no Youtube também, e as pessoas começaram a prestar atenção em
mim bastante e acho que isso realmente fez com que eu conhecesse o meu público. E também, não sei se vocês sabem,
mas você pode olhar nas estatísticas do Youtube
“O meu público é 85% de homens.” [Consideração estatística auferida pelo Youtube.]
, e tem lá mostrando qual é o seu público, se é mais homens, qual a
porcentagem de homens, qual a faixa etária e tal.”
Já a maioria dos entrevistados no GF2 são de criadores que conhecem seu público e direcionam a produção
baseados no gosto de seu publico alvo. Ajuda o fato de alguns sites disponibilizarem ferramentas de cadastro e
enquetes com as quais os produtores aprendem a contar para ganhar mais reconhecimento e até retorno de mídia.
A ferramenta mais mencionada foi o Google Analytics por permitir identificar, além da quantidade de
visualizações o tempo que a pessoa passa no site, a palavra chave utilizada, o lugar do acesso, entre outras
possibilidades, facultando ao criador saber, por exemplo, se o seu conteúdo está longo ou “enfadonho”.
No GF2 focal os criadores relataram que se empenham num relacionamento de intercâmbio com a audiência,
principalmente no contexto de comunidades das redes sociais.
Sim, um pouco por feedback de contatos que chega. E um pouco pelas estatísticas do Youtube e do Google, que permite
mostrar a faixa etária, sexo, país de origem. Eu sou ate um pouco fascinado por isso. Eu tenho o “Google analytcs”
instalado no meu site e acho fascinante ver as cidades do Brasil que acessaram.
“[...] Outra ferramenta útil que o Youtube disponibiliza para conhecer o público-alvo é que ele permite mostrar as
palavras que foram usadas para encontra o vídeo. As palavras-chave que a pessoa digitou no Google. No meu caso, por
exemplo que a maioria dos meus vídeos, a maioria não, mas metade deles é mostrando o software que eu desenvolvo no
“quase cinema”. Então nas buscas eu conheço o meu público, eu vejo que ele está procurando um “software gratuito de
edição de vídeo” o outro está procurando “software para professores”, aí eu vejo “nossa, tem 100 pessoas procurando
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software para salas de aula” então é um público alvo dos vídeos, dos softwares que eu estou produzindo. Então
analisando isso também ajuda.”
“[...] Por exemplo, comunidade de vídeos caseiros: [...] aí tal eu postei lá, aí acabou que a gente formou um grupo de
pessoas que discutem, a gente posta um vídeo e vai outra lá e comenta, olha devia ser “assim ou assado”, ou como você
poderia melhora nesse quesito. Aí a gente começa a fazer edição em tempo real e com os comentários das pessoas que
estão participando ali daquela comunidade, né. Aí posta o vídeo lá no final, ai depois vai ter um concurso de vídeos,
com as pessoas que participam da comunidade estão fazendo lá agora, são pessoas do Brasil inteiro. [...] Foi realmente
pelas comunidades do Orkut.”
Além das comunidades específicas estabelecidas nas redes sociais e dos consumidores de produtos e serviços
divulgados pelos produtores entrevistados, aos poucos os moderadores foram identificando, nas falas, as categorias
usadas pelos criadores/produtores de vídeo para agrupar a audiência: “molequinho de 14 anos”, “nacionalistas”,
“público de coisas engraçadinhas”, “público de coisa de televisão” (BBB, por exemplo), “público de curtas”,
“emos”, “indies” (independentes), “hippies”, “cineastas”, “meninas” (público feminino), “público de
entretenimento”, e, claro, o “público dos amigos”.
“[...] tava interessado em focar nesse público que focava em festivais de internet, eu queria ter o retorno, queria saber
se o meu conteúdo tinha qualidade para competir com os outros que eu via que faziam sucesso. E era basicamente o
público que procurava curtas metragens [...] depois [...] você vai aprendendo a lidar com isso você quer atingir um
público maior, de entretenimento, criar esquetes, ampliar o foco talvez para ver se isso vai ter um retorno de mídia
interessante. Inicialmente meu foco era o público que acompanhava os festivais pela internet basicamente.”
Não mencionaram terem feito alguma pesquisa específica, atendo-se às ferramentas disponíveis nos sites para
identificação da audiência. No caso do Youtube, a ferramenta torna os menores de idade em “maiores de 18”, e os
não declarantes de gênero são incluídos no grupo dos “homens”.
PROCESSO CRIATIVO E ESCOLHAS ESTÉTICAS
Mas mais ou menos como um artista que pôs um quadro na parede, tem criticas e criticas. Têm críticas construtivas, eu
acho que houve no meu caso muitos artistas não tem essa intenção de agradar todo mundo. Eu acho que é uma utopia
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isso e pouca gente consegue. Nem a Rede Globo consegue agradar todo mundo, né? Então eu acho que agradar mais a
si mesmo, né. Aos conceitos estéticos, e essa mensagem que está querendo ser passada.
A alteridade está sempre no horizonte da criação de cada integrante deste grupo focal, visto que nenhuma obra é
para ser guardada das pessoas. Entretanto, respeitam seu próprio senso estético, em especial porque não há
nenhum vínculo econômico associado à criação.
Mesmo em se tratando de um ambiente muito permissivo, a condição de fruição do espectador na Rede está
implícita nas escolhas “espontâneas” desses criadores. Sabem que o fruidor de sua obra as assiste geralmente a sós,
em uma pequena tela, e não tem paciência para conteúdos maiores que poucos minutos (15 minutos é já
considerado muito tempo).
[...] mas quando eu vou produzir algo pela internet, geralmente eu penso nessa questão do curto. O assunto como
qualquer assunto eu vou ter uma inspiração dependendo do dia, do que aparece na minha frente. Eu acho que o que
delimita a idéia é o tamanho, “será que eu consigo mostrar isso nesse espaço de tempo?” “será que é possível ou será que
eu vou precisar de fazer um curta de 15 minutos?” Porque eu não sei se uma coisa de 15 minutos eu veicularia na
internet, a não ser a titulo de estar lá, como uma espécie de portfólio.”
“Porque aqui [ durante uma dinâmica, na sala de entrevista] é uma experiência coletiva, quase uma experiência de
cinema mesmo, e no Youtube não, você tem lá uma experiência individual com o vídeo, e normalmente você não está
com tempo, e não ta com “saco” pra assistir.”
De maneira geral, se aceita a teoria de que se agradar ao criador, vai agradar a outrem, porque as pessoas não são
tão diferentes umas das outras e que, pelo menos entre os amigos, haverá algum tipo de entendimento.
“[...] Quando você se propõe a fazer vídeo ou alguma forma de expressão artística você, no fundo, por mais ermitão
que você seja, você tem esse desejo de que alguém vá ver, ou vá ler, que alguém vá ver o que você fez. É uma coisa
inerente de qualquer realizador em qualquer área artística.[...]
“Eu acho que quando não tem ninguém te pagando pra fazer, você faz o jeito que você acha que é o melhor, então você
não tá nem aí se beltraninho vai gostar, ou se "ciclaninho" não vai. Você faz do jeito que você acha que vai.”
“Porque se atraiu a minha curiosidade porque não irá atrair a de outra pessoa? Então eu vou por aí, eu não penso
muito no público, eu vou pela curiosidade e naturalmente o público se sente curioso também.
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Ainda menos preocupados em agradar, há produtores que manifestaram serem motivados pelo desejo de provocar
polêmica. Outros disseram que a pesquisa necessária ao vídeo é uma forma de compreender melhor um
determinado assunto, ou satisfazer uma curiosidade. O vídeo seria uma fase desse processo de conhecimento.
“E eu acho que o meu interesse acaba sendo o interesse de várias pessoas. Acaba que você produz sobre um assunto que
você tem uma dúvida, ou que você quer saber mais sobre aquilo e naturalmente as outras pessoas também vão ter aquela
curiosidade. Ou se não tinham vão descobri uma coisa nova, então eu vou atrás da minha curiosidade. Eu não me
preocupo muito se o público vai gostar ou não. [...]”
“Eu acho que eu procuro fazer mais em vez de agradar, é causar polêmica. [...]”
Havendo a possibilidade de algum retorno financeiro pelo conteúdo veiculado as formas escolhidas são os “curtas
leves” e as comédias. Também o “estranho”, o “diferente”, o “polêmico”.
Há um cuidado maior com a opinião da audiência provável e possível também pelo fato de se saber que as
informações dispostas nas redes sociais e sites pessoais são analisadas regularmente para diversos fins cotidianos.
“Ah, eu tenho uma certa preocupação sim. Eu acho que a gente tem que analisar que as redes sociais e a internet em si
hoje em dia definem um pouco do seu perfil, da sua pessoa. [...]eu hoje em dia eu vivo de internet, trabalho muito,
vivo com o computador 24 horas ligado, eu pesquiso as pessoas aonde eu puder pesquisar. [...]Então assim, eu me
preocupo com o que as pessoas vão ver, inclusive que não tem nenhum vídeo meu falando palavrão. Porque eu trabalho,
eu tenho um lado, que eu trabalho com educação. Eu sou voluntário também em um movimento escoteiro.”
“ [...]a partir desse momento que tinha essa disponibilidade de você receber pelo seu conteúdo, agente começou a
tentar a ver o que era sucesso, o que era exibido na televisão, para produzir pra colocar no site, para exibir na TV a
cabo. [...] Então o realizador começou a pensar no público, porque o próprio site divulgava quem era os mais vistos, os
mais comentados e normalmente eram ligados a comédia, como curtas leves, de ficção, etc.”
“[... ]Não existem regras para a internet, se você quer, tá beleza. Acho que você tem que pensar, como é que a sua
audiência vai reagir, e se eles vão mandar esses vídeos para outras pessoas verem porque ele é tão estranho, tão
diferente, tão polêmico.”
A busca pela “novidade” é bastante considerada quando se pensa em mercado. Há quem escolha veicular sua
produção em Inglês para atingir o público internacional.
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[...] eu sei que eu preciso ousar, então é uma coisa assim como uma faca de dois gumes. Ao mesmo tempo eu tenho que
agradar a banda, e ao mesmo tempo eu tenho que ousar porque eu tenho um público ali que tá querendo coisas
diferentes. Tem esse limiar, até onde eu posso ir com a imagem da banda, até onde eu posso ir em cada. É bem tenso,
eu fico nervoso quando eu coloco um vídeo na internet eu falo “será?”, como é que vai ser o feedback, porque pra mim é
importante.”
[...] to sempre procurando buscar idéias novas para fazer vídeos novos. E são sempre em inglês, na maioria das vezes.
[...] Como ele está querendo mesmo mais mercadológico, no Youtube ele fala tudo em inglês, tem isso também. Por
mais que meu filme esteja todo com legenda, e seja divulgado em site estrangeiro e tudo, os gringos chegam lá e ouvem
um pouquinho de Português e já saem fora.”
A INSPIRAÇÃO
Não houve nenhuma referência a uma sistemática específica para os seus trabalhos criativos. De fato fez-se
comentários à dificuldade por se estabelecer, tão precocemente, características dos processos individuais.
“Ah, isso aí eu não sei. [...]6. Acho que do mesmo lugar que brota uma poesia, da idéia para uma fotografia. Acho
que é muito pessoal. E até pra cada pessoa é muito difícil. Acho que fica uma vida inteira pra talvez até tentar
entender o processo criativo, fazer com que ele seja mais frutífero.”
“Eu acho que você falou tudinho, [nome]. É a mesma coisa que procurar saber da onde vem uma idéia. Não da pra
saber de onde vem uma idéia. De repente você está dormindo, acorda e o negócio ta lá.”
Houve, sim, menção espontânea e esporádica aos processos conhecidos da produção de cinema e vídeo
(construção de roteiro, pesquisa, pré-produção, edição, finalização, etc., não necessariamente nessa Ordem).
Paradoxalmente talvez, expressões indicando “planejamento” foram repetidas inúmeras vezes no GF2 em meio a
vários relatos sobre ocorrência súbita das idéias. No GF1 aconteceram semelhantemente.
“Meu filme, que está em pré-produção agora...”
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“[...] no processo de fabricação de um roteiro você estuda, você pesquisa, você lê, você vai atrás[...]”.
“[...] a gente produz o vídeo dependendo do cliente, dependendo do evento que a gente está. – [outro confirma] É,
dependendo dos vídeos de registros. [...]Então o que a gente pode produzir é infinito, e a leitura que eu faço da
internet e do Youtube no caso é... – [o interlocutor] Mas sempre tem o “porque” “pra que” “pra quem” “pra onde” qual é
a justificativa.”
“Eu particularmente as coisas que eu vejo mais elas vão pra roteiros. E às vezes nem meus, discussões de roteiros com
outros diretores amigos, aí você propõe. Pô, eu já ouvi falar que um cara teve uma idéia. Às vezes uma ideiazinha dá
argumento pra um longa-metragem de 90, 120 páginas. Eu também tenho um problema sério com coisas que filmam
na rua. Meu celular “putz”, o único celular que eu estou a mais de 3 meses é esse aqui, porque cara ele não tem nem
jogo, sacou? Se tivesse um celular que filmasse eu tava enrolado. E os poucos que eu tinha que filmei eu basicamente
filmava “beberagem” com meus amigos que eu nunca vou botar na internet assim”.
A inspiração pode acontecer em qualquer lugar, depois de um filme, numa conversa entre amigos.
“Um dia um amigo nosso falou: “Ah, vocês deviam fazer um parte II”, aí eu falei assim: “A gente devia fazer logo uma
série e deixar assim tipo as séries da HBO com 12 capítulos.” Daí que veio o lance dos 12, a gente fixou esses 12. Aí a
gente falou, vamos fazer um curta de cinema depois, com película e tal... a gente viajava.”
Existe um envolvimento subjetivo em tempo integral com a obra do momento em que se decide por executá-la,
mesmo que desenvolvendo atividades paralelas de outra natureza. Como mencionado anteriormente, a duração e
o custo da produção, são fatores que condicionam a criação.
“Eu acho o seguinte, sei lá, eu to andando na rua, na verdade eu começo a pensar em tudo que pode virar um vídeo.
[...] E se eu tinha a máquina fotográfica eu podia pegar uma seqüência de fotos na web e fazer uma animação através
do Photoshop. E aí eu penso muito nisso, nas coisas que estão ao meu redor e como isso pode virar um vídeo. Até pensei
nisso semana passada, meu trabalho tinha um casal de namorados e eles se separaram. Então o que a gente fez? A
gente pegou o depoimento de todo mundo da empresa e gravou um depoimento tipo: “volta, não sei o que”. Simples,
sem nada de mais, sem muita invenção. Sabe? Mas isso dá um vídeo sim. Pronto.”
“Obviamente você tem que ter uma idéia, primeiro, do que você vai fazer, mas pensar em um começo, meio e fim, ou
então não, pois hoje em dia você tem total liberdade para fazer o que quiser. Pode filmar você completamente em
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silêncio olhando para o teto por 20 segundos e colocar na internet, quem sabe isso não vai virar uma coisa viral.
Entendeu?”
“É, é mais ou menos a mesma coisa, você não tem uma inspiração especial. Talvez uma coisa mais barata te motive
mais, mas não é muito diferente assim.”
REFERÊNCIAS
Verificamos que suas escolhas estéticas estão motivadas pela história pessoal de cada criador, suas filiações à
cultura pop, virais, celebridades, fotografia, música, artes plásticas, autores de literatura, cineastas e algumas
influências oriundas da própria internet.
Procuram também modelos momentâneos dependendo do tipo de produção em que estão envolvidos. Por
exemplo, um dos entrevistados, apesar de não gostar especialmente de filmes de terror, foi buscar inspiração no
filme “O Massacre da Serra Elétrica”, e também em filmes considerados “toscos”.
“É, no nosso caso nós somos consumidores de cinema, de filme. E acho que muita coisa veio das conversas de coisas que
a gente assistiu ao mesmo tempo, juntos ou não.”
“[...] Mas eu comecei fazendo pesquisa em fotografia. Eu fazia pesquisas fotográficas pra poder me inspirar para eu
poder escrever. Vamos dizer assim. As cenas, elas vinham através da imagem, não através da palavra. Então, por
exemplo, se estou lendo lá uma música, e o cara está falando que encontrou uma menina, aquela musiquinha de amor
e tal, e aquilo me lembrou uma coisa “vintage”, antiga. Aí eu começo a pesquisar em sites especializados em
fotografias, que tem fotografias que eu considero mais bem trabalhadas. Não são aquela coisa de pesquisar no “Google
Imagens” que aparece um monte de coisa que não tem nada a ver. Sites especializados em fotografia mesmo. Às vezes eu
coloco ali e me inspiro e falo: “Nossa, olha só. Que cena poderia ser essa fotografia?”.
Dentre as várias influências do cinema foram nomeados:
• Afonso Braza
• Quentin Tarantino
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• George Lucas
• Sergei Eisenstein
• Nelson Pereira dos Santos
• e os produtores de vídeo clipes Jonathan Glazer, Michel Gondry e Spike Jonze.
Bill Viola, produtor de vídeo-arte, John Cage e Yoko Ono, artistas multimedia da era pop, assim como as obras
“O Brilho Eterno de Uma Mente Sem Lembranças”3, “Branco”4, “Star Wars” e “Bufallo 66”5
Houve quem disse consumir quase que indiscriminadamente a produção de criadores regulares para o Youtube,
atentos a evolução das suas obras como é o caso do pessoal da Pepa Filmes.
foram
especificamente citados.
O primeiro – “Pepa Filmes. Ele fez os vídeos mais sinistros porque eu conhecia ele, e ele começou “anos luz” antes da internet assim. Você pega os primeiros vídeos do Pepa, cara. Era os vídeos do cara com 7 anos de idade, e você vê nos últimos filmes o cara com 14 anos de idade. Esse cara ele é o cara.”
O outro – “Ele é o cara. Ele foi um dos primeiros que começou com esse negócio de “sabre de luz”.”
O primeiro – “É, você pega um dos primeiros vídeos dele e ele era moleque, um “gurizinho”.”
O outro – “Eu comecei a fazer vídeo por causa dos vídeos dele. Eu quis fazer vídeo pra internet por causa dele.”
No GF1 o número de citações espontâneas de produções oriundas da internet foi relativamente pequeno se
comparado ao número de referências do cinema, da literatura e outras formas artísticas bem estabelecidas
historicamente.
“De internet? Tenho mais de cinema, de literatura...”
“[...] Muita das nossa referências não tinham no Youtube. Nós não tínhamos alguém fazendo uma série de internet na
época. A gente foi só fazendo.”
3 “Eternal Sunshine of the Spotless Mind” (EUA-2004). Drama dirigido por Michel Gondry, com roteiro de Charlie Kaufman. 4 Filme de Yoko Ono e John Cage. DATA 5 Fildme de Vincent Gallo. Data
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Se perguntados especificadamente que pessoas ou produções lhes agradam no cenário local e nacional fazemos a
seguinte lista para o cenário brasiliense:
• Guilherme Zaiden (citado nos dois GF),
• Filipe Frazão (citado nos dois GF)
• “Vai Você Produções”,
• Grupo “É Nóis”, (citado nos dois GF)
• A obra de Santiago Dellape,
• Vídeos da “Cucão Filmes”,
• Vídeos de Gustavo Serrate (citado nos dois GF),
• Vídeos de Thiago Beloti,
• Vídeos de Thiago Moisés,
• Aléx Vidigal (“O Filho do Vizinho” foi a obra sua mencionada com entusiasmo),
Também escutamos elogios à produção dos alunos da UnB a partir dos anos 2000 e a dois grupos de teatro que
postam conteúdos na Web: Os Melhores do Mundo e o G7.
Nacionalmente comentou-se do grupo Anões em Chamas (GF1 e GF2), e quanto aos programas de opinião sobre
cinema “Cabine de Celular” e “Pipoca com Nanquim”.
Então ainda na história da arte tem também a Yoko Ono e do John Cage, que eles tem um filme que eles têm que se
chama “branco” que eles participavam de um grupo de artistas da década de 60 que se chamava “Fluxus” que trabalhou
antes do vídeo-arte que era o cinema experimental.
“Eu trabalho na área de cinema hoje por causa de “Quentin Tarantino”. Sou fã do Tarantino e da forma como ele
começou, fui vendo a história dele e assim fui gostando mais ainda.” [...]
“O meu programa[...] foi inspirado em um programa de televisão hoje que eu gosto é o “Programa do Jô Soares”. Sou
apaixonado naquele programa porque é um bate-papo, é uma conversa com as pessoas, e vai lá muitas pessoas
interessantes que não são nenhum artista. Então eu sempre gostei dessa parte daquele programa.”
“Cinema e literatura. Meu filme que está em pré-produção agora é baseado em um dos textos mais populares do
Nietzsche, que nem é tão popular assim. E os outros são músicas. É muito ocasional assim, depende do filme, depende
do projeto.” [...]
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“E eu uso o vídeo como meio de expressão. Descobri lá no “Bill Viola” que é um artista americano, que foi um dos
primeiros vídeo-arte que eu tive contato e que me emocionou e eu vi que é possível. [...]comecei a fazer vídeo por causa
dos vídeos dele. Eu quis fazer vídeo pra internet por causa dele.”
Há uma forte relação com o cinema de um gênero muito admirado pelo público jovem urbano e conhecido pelo
termo “trash”, e a admiração são tanta por realizadores internacionais como também por nomes nacionais.
“Nosso filme já participou daquele “Amostra Trash” de Goiânia, e eu não pude ir, mas dois do nosso grupo foram. E lá
estava o Zé do Caixão, Ivan Cardoso, e eles estavam lá, bebendo com o Zé do Caixão, com o Ivan Cardoso, e
aprontando. E esses casos do cinema foram inspirações.”
Eu comecei no “trash”, e é legal você começar assim de qualquer jeito porque você vai pegando o “feeling” do que
funciona, e do que não funciona. Era na época só eu e amigos da rua, e aí a gente produzia. Só que era muita coisa.
De registro a gente tem 3 fitas VHS cheias de curtinhas “trashs” que a gente fez lá.
“[...] eu fiz na brincadeira mesmo. Na época eu comprei a câmera e comecei a filmar minhas idéias. Aí fui filmando,
filmando e falei “e agora? Como é que eu vou fazer para poder editar isso aqui?”. Eu nem sabia que o nome era
“editar”. Aí na época eu comecei a pesquisar mesmo na internet, eu lia um fórum de um pessoal que fazia filme “trash”,
e eles davam algumas dicas[...]”
PADRÕES
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Estimulados pelas dinâmicas da entrevista6
No decorrer da entrevista no GF1 foi mencionado um viral denominado informalmente como “A Mulher da
Colheita Feliz”
e algumas vezes espontaneamente, formularam algumas teorias
estéticas sobre que tipo de obra “dá certo”, e como se constitui o modelo para cada um deles. Também
comentaram sobre antípodas do que seriam os bons vídeos ou temas preferidos.
7
Esses fenômenos são observados regularmente na internet e os entrevistados procuram entender o que os faz
atingir tamanha expressividade. É de opinião no GF1 que a espontaneidade é o ingrediente mais importante do
viral.
considerado nesse grupo como exemplo de produção despretensiosa que se popularizou em todo
Brasil. A qualidade mencionada para esse vídeo foi “honestidade”.
Os Vídeos não ficam famosos por sua qualidade “intelectual”, ao contrário, parece-lhes que são os mais
“escrachados” ou “irrelevantes” que vão passar de monitor em monitor até atingir milhares de visualizações. No
GF2 mencionaram o fenômeno do “E.T. Bilú”. As pessoas também compartilham aquilo que consideram
“estranho”, diferente, ou polêmico... e até ruim.
Se esse vídeo tivesse aparecido em algum site, um site de comédia e tal, talvez tivesse milhares de acessos por pessoas
xingando ele.
Eu tenho a impressão de que existe mercado para absolutamente tudo. Assim se a mensagem que você fala é alguma
coisa relevante mais gente vai querer. Se for irrelevante muito mais gente vai querer.
No GF1 o que eles consideraram “ruim” provocou indignação e reações emocionais que se tornaram mais intensas
na medida em que se sentiram à vontade para se manifestar. “Muito biruta”, “essa coisa”, “é uma porcaria”, “uma
bosta”, “discurso xarope” foram algumas das expressões negativas genéricas utilizadas para descrever um
determinado mau resultado.
Os que se preocupavam em expressar uma opinião mais analítica proferiram frases como:
“que o cara não domina a linguagem audiovisual, ele domina só o “blá blá blá”
6 Em uma delas é apresentado um vídeo “qualquer” como mote para observar que tipo de critérios e valores serão convocados para análise da obra. A outra dinâmica consistiu numa pergunta bastante aberta: “O que você prefere, tempo ou dinheiro? “ O entrevistado deveria escolher entre bastante tempo ou bastante dinheiro na ocasião da produção de um trabalho, sendo que uma escolha excluiria a outra. Essas perguntas muito abertas captam resíduos que não aparecem em questões muito direcionadas. 7 As postagens são muitas vezes reconhecidas e citadas com base no conteúdo. Neste caso uma mulher postou, enfurecida, uma reclamação contra o jogo “colheita feliz”, aplicativo do Orkut. Esse vídeo se tornou um fenômeno de visualizações.
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“ele vislumbra de um tipo de audiovisual, com um texto ali por trás de um vídeo performance que não funciona nem
uma coisa e nem outra. E acaba se perdendo talvez pelo discurso sobre...”
“eu achei o discurso muito rebuscado, eu achei que ficou muito texto e a imagem não diz muito. A imagem tenta dizer,
mas não diz. Acho que cria um texto ali, joga uma idéia interessante de início, mas desenvolve mal a idéia”
“ faltou texto, ele se embolou e ficou isso aí.”
Mas, como acontece na Internet, o que muitos acharam ruim, encontrou sua audiência, seja pela identificação
estética, seja pela “generosidade” da atribuição de sentido. A pressão para a conformidade pode, entretanto,
diminuir essa disponibilidade.
O primeiro - “Eu gostei – (Risos.)- Eu gostei mesmo, de verdade. - Ficou bem trash [...] Eu gostei disso, da...
O outro - Da “birutice”? Do inesperado?”
O primeiro - “Não, não da “doidice” assim...”
O outro - “Da performance? Você gostou do texto? - Da atitude?”
O primeiro - “Não, o texto você vê que é uma brincadeira né, que ele dá giros ali e não se conecta. Mas é legal. Eu achei
legal.”
O outro - “É seu, né?”
O primeiro – “Não. (Risos) Eu nunca fiz nada parecido com isso, eu não faço. Não parece comigo, sabe?”
O outro – “De quem é? De quem é? levanta a mão.”
O primeiro - “O problema é que eu acabo viajando demais às vezes...”
No GF2 houve muitas manifestações que relativizavam o gosto próprio da pessoa que proferia a opinião.
Percebemos claramente, neste grupo, alguns critérios que foram levados em conta para as análises: ritmo da
narrativa (texto e imagem), o ritmo de cortes, o local de apresentação do vídeo, a qualidade do som e a direção.
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“Eu acho que esse vídeo é para um publico especifico, e eu acho que eu não me encaixo nesse publico.”
“Eu, pra mim, parece que é um produto feito para alguma instalação artística. Eu acho que teria mais motivo, eu ate
aceitaria ele em uma instalação artística do que ele estar na web. Mas eu acredito que exista um publico que consuma
isso. E eu acredito que todo tipo de vídeo você deve utilizar. [...] Eu achei uma narração cansativa, um corte muito
ruim, o que eu estou falando é que não é o meu gosto, [...]Acho que a narração ficou com um certo agudo que ficou
dando uma certa agonia [...]”
“Eu acho assim, acho que a proposta artística do cara é a proposta artística dele. Em termos de analise narrativa
digamos, é cansativo. Ele não tem ritmo de corte, ele não tem ritmo de fala, ele não tem ritmo de... É um poema com
umas imagens, e as imagens também não te ajudam a assimilar a idéia da qual ele quer. Então chega uma hora que
você se perde assim, você fica só vendo, né.”
“[...] É você começa a prestar atenção em coisas que não é o que o cara quer.”
SATISFAÇÃO
Se perguntados se estão contentes com os resultados estéticos da sua produção, a maioria absoluta responde que
sim - alguns pelo resultado em si, outros pela satisfação geral no processo de realização.
“Normalmente eu gosto muito, porque eu assistiria. (Risos). Eu assistiria o que eu coloco.”
“Eu só o considero finalizado quando eu estou plenamente realizado com ele. Se não pra mim não está pronto. Vamos
dizer assim, eu fico lá mexendo, mexendo, até que “Caramba, agora está bom.”
“Ah, eu gosto! Me “amarro””. - “Eu gosto também, trato como filho.”
Um dos entrevistados afirmou que não finaliza uma obra enquanto o resultado não lhe agradar plenamente. Outro
prefere realizar a idéia da maneira possível para não perder a oportunidade que pode se apresentar
repentinamente.
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Filma isso com um celular, filma isso com uma câmera, se amanhã você tiver a oportunidade de filmar com alguma
coisa mais profissional, você vai fazer profissionalmente. Mas não perde a oportunidade de transformar isso que ta na
sua cabeça porque o recurso não é ideal. Entendeu? Então eu sou muito assim. Hoje em dia eu comprei um celular que
filma pra registrar o momento que talvez eu nunca vou conseguir estar com uma câmera no meu bolso. Então eu acho
que há uma oportunidade sempre, então as idéias pra mim surgem daí, aonde eu estou se é possível fazer um vídeo. O
que aconteceu uma vez: tinha um cara bêbado no ônibus [...]Lógico eu também quero produzir coisas melhores, com
qualidade, [...]Mas eu acho que as oportunidades não devem ser desperdiçadas. Se não tem como fazer com uma
produção, com uma equipe, que faz do jeito que da pra fazer. Amanha se tiver uma idéia melhor, faz de uma forma
melhor.
Uma pessoa alegou nunca estar plenamente satisfeito com a obra, mas arrematou que esse descontentamento o
impulsiona para próximos vídeos.
“No final das contas ao assistir, ou até mesmo quando você está editando, você pensa: “ah, poderia ter feito assim,
poderia ter feito de outro jeito”. Então você nunca fica 100% satisfeito quando você olha assim. E isso que é legal,
porque você acaba tendo idéia pra fazer o próximo filme, o próximo vídeo. E acho que estar insatisfeito gera interesse,
acho que é bom. Mas eu entendi sua pergunta, acho que sim. Acho que se não tivesse rolando o mínimo de satisfação já
era pra eu ter desistido.
Verificamos uma ansiedade maior pela perfeição, um sofrimento na busca pelo “melhor possível”, em alguns
entrevistados.
“[...] agora em relação a nível de qualidade tem que ser sempre o máximo que a gente possa fazer. Porque se não de
que adianta a gente estar fazendo? Sabe, quando eu pego algum trabalho, é sempre fazendo o máximo pra ir até o
final o melhor que eu posso. Obviamente tem horas que não dá, tem horas que eu viro e falo “não, isso eu não vou
conseguir fazer”.
“Eu acho tudo uma droga. [...] achava uma droga não quer dizer que era ruim desde o começo, quer dizer que, por
mais que seja planejado, qualquer coisa que sai errado me incomoda. Cenário é tranqüilo de fazer porque está lá
parado, então não tem com o que se incomodar. Mas atuação... De vez em quando dá vontade de pegar o ator e sair
batendo, principalmente se o ator sou eu. Aí sim.”
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A fala abaixo compara a produção de filmes em vídeo com a produção em película. Observações como essas
podem ser encontradas ao longo de toda entrevista no GF2. Dá-nos a entender que a produção em película, da
concepção à mostra, é mais desgastante e mais cara, logo a produção em vídeo tem uma relação melhor de
custo/benefício em termos de satisfação.
Eu trato como filho mas não gosto não, cara. [...]Não, eu acho que vou gostar mais dos meus filhos do que dos meus
filmes. Eu rodei um em 2009 e até hoje eu não terminei de editar. Eu só olho pra ele assim, e pra mim são só
erros.[...] Não, é porque na verdade eu tenho um perfeccionismo também. Depende, tem até essa questão que é
interessante. Quando você faz um vídeo, uma coisa pequenininha, ali que é mais simples. Os primeiros vídeos que eu
fiz ele tem aquela coisa que você ta no calor da idéia, na emoção ai você faz, filma com teus amigos e já bota no
computador, já edita e é massa. [...]o vídeo tem essa coisa de ser mais rapidinho, né? [...]Curto sim, na verdade eu
vou ser sincero. Eu gosto muito do material que eu faço hoje para os outros como Diretor de Fotografia. A gente vai lá
com os amigos e roda 4 dias de filmagem, o cara que se vire para editar e eu só olho: “pô, esse plano ficou legal, essa
foto agora ficou bonita, ah essa luz foi massa” acabou. Porque não é meu que ta pra jogo. Não sou eu que estou ali no
desespero tipo: “ó eu vou ganhar uns prêmios se não eu não vou ganhar dinheiro para o próximo”.
Esses produtores não estão alheios a questão da responsabilidade e da ética na atividade de produção e veiculação
de imagens. Sabem do poder da câmera de interferir no evento sendo filmado e na disposição anímica de quem
assiste.
“Agora você pegar um roteiro com violência gratuita que não justifica nem esteticamente ou como diversão. Porque o
grande lance é esse, uma violência gratuita que se justifica como diversão. Você acha divertido assim e tal. E agora
você fazer por fazer? Pelo chocar, aquela onda pesada, essas são ruins, são tristes, sabe?”
“Eu já tive que trabalhar com jornalismo e ai “neguinho” já começa a bagunçar, quebrar, cagar e chutar a parada. Ai
eu já corto e não filmo. Pra mim, tipo assim, eu estou contribuindo para aquilo ali, para as pessoas ficarem fazendo
“burburinho”. Então é uma coisa que eu evito, mas não fazer é muito complicado. A gente depende de dinheiro, mas eu
particularmente não faço. Se depender de mim eu não faço.”
“Filmar miséria no Nordeste. Acho que já tem isso diariamente e acho que acaba que não leva a muita coisa. Ou os
“Quilombolas” também. É, ir lá filmar os Quilombolas e fazer um documentário. [...]Aí você vai lá em ganha seus
R$10 mil, não sei quantos e fica ali filmando os Quilombolas como se fosse um bando de bicho do zoológico. E acha
que depois alguém vai se conscientizar e fazer alguma coisa para os Quilombolas por eles terem feito isso. Acho muito
burguês também.”
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“Eu acho que eu não faria depreciação com certos tipos de pessoas. Na internet é muito fácil você ficar falando mal de
“em”, de “macumbeiro” de não sei o quê. Parece que todo mundo é ruim. Eu acho muito elitista, muito ignorante, esse
tipo de coisa de ficar depreciando eu não gosto não.”
Conhecem também a dimensão política do que estão produzindo e não se refugiam na suposta “isenção de
documentaristas”, muito embora varie, entre eles, o limite até onde levam seu próprio voyerismo. Aqui temos um
fragmento emblemático:
“Isso aconteceu no CAJE, cara. Eu fui filmar um garoto que tinha sido atropelado, que tinha cheirado “reducola”, e a
Diretora falou que a gente tinha que filmar e tudo mais, e eu fui lá e beleza “vou filmar um enterro, então ta ok”. E o
problema é que o garoto ia ser enterrado como indigente, apesar de ter uma família. E ai a Diretora do filme
organizou um ônibus dos amigos dele da rodoviária e a família do menino, as pessoas que ele tinha como família foram
pra lá. E ai eu to lá filmando, e aquela galera falando indignada que não iam deixar enterrar o garoto como
indigente, ai uma hora eu fui ver e chega à mãe do menino. A primeira coisa quando o caixão chegou, a primeira coisa
que o irmão dele, que dava pra ver que era totalmente do crime, o cara assim com a camisa escrito “é, mata mesmo” e
tal, a primeira coisa que os caras fizeram foi abrir o caixão. Aí ta o corpo de um garoto que obvio, se ele morreu e
passou pelo IML e vai ser enterrado, não vão lavar o corpo, ta sujo de sangue, ainda está com cheiro de “reducola”,
entendeu? Ta todo detonado do jeito que veio, do jeito que botaram lá e levaram.
Moderadora: Aí você não filmou?
“Não, eu filmei. Até então eu continuei filmando mas eu comecei a me sentir incomodado. Eu tinha um assistente, e aí
eu pedi pro assistente, eu hesitei e virei pro assistente e falei “cara, continua”, e ele “por quê?” e eu “porque por via das
dúvidas eu não sei se eu quero compactuar com isso”, porque eu achei que era sensacionalista demais.”
PE RC E P Ç Ã O ÉTICA
Se perguntados sobre temas ou cenas específicas que são “tabu” para eles, ou que por algum outro motivo jamais
filmariam, as respostas foram as seguintes, (sem hierarquização e sem consenso):
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• Temas tristes ou depressivos,
• Blasfêmia contra Deus,
• Pedofilia e temas envolvendo sofrimento infantil,
• Pornografia,
• Bagunça, caos, baderna,
• Homossexualismo.
“Eu não gosto de fazer nada de um tema muito escuro, muito tenso, tem sempre que ser alguma coisa mais leve. Pelo
menos pra gente ser uma pessoa mais feliz.”
“Eu acho que eu não faria pornografia. Eu já brinquei falando, mas de fato eu nunca fiz não. “[...]Por tabu, vergonha
de mostrar pra família, pros amigos, sei lá. [...]Nem diretor. Eu pego e falo “Pô, eu dirigi um pornô, mãe assiste aí”.
Ou então “pai, assiste aí”. Não.”
“Ah, algo contra religião, contra Deus. [outro] Nossa, eu teria muito problema também.”
“[...] se me chamarem pra rodar um filme pornô beleza, esteticamente eu vou tentar fazer o melhor serviço possível
para um filme pornô. [...]se der pra botar uma estética artística que eu goste, eu vou até tentar. Assim agora um filme
com pedofilia, cara. Tipo assim: vai além da minha capacidade de diretor, de desenhar esteticamente e narrativamente
de maneira Audiovisual um filme, entendeu?”
PRESSÃO DE GRUPOS PRIMÁRIOS E SECUNDÁRIOS
Se perguntados pelo tipo de pressão externa que por ventura incida sobre seu processo criativo, os que já estão
entrando num contexto profissional relataram ter a percepção demandada de clientes no sentido do cumprimento
dos prazos, e os demais participantes reportam a percepção dos amigos e fãs que esperam a postagem regular nos
canais pessoais e vlogs.
A família pode ser aliada, mas pode também cobrar em nome da definição profissional do individuo por uma
atividade melhor remunerada - ou, ao menos, remunerada.
Há solicitação e insistência de parentes e amigos quanto ao conteúdo a ser gravado, e mesmo pela não-gravação de
determinados conteúdos.
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“[pressão] De todo mundo. Eu nunca vi ele na vida e ele acabou de falar que viu o trailer do meu filme e eu tô na
pilha de vê, aí toda aquela confiança que eu tinha criado para editar o vídeo amanha você já pensa: “pô, neguinho ta
na maior expectativa, não vai ficar tão bom quanto o trailer, merda”. É isso.”
“Da família tem [pressão], né. Porque a gente ta ali, e eu sou funcionário publico, ai a família fala: “pra que você ta
fazendo isso?, pra que você esta perdendo seu tempo fazendo vídeo? [...] É, para não filmar [determinado assunto].
Minha mãe, minha mulher. Meu filme é uma coisa mais pesada. Ao contrario de vocês ai. [...]Eu já me matei umas 5
vezes no meu vídeo lá. Eu vivo morrendo. Minha mãe não gosta nem de ver. [...]Ela fala “faz um filme de amor, faz
um filme de comedia”, ai rolam essas pressões só. Esse tipo de pressão mesmo.”.
“Eu tento manter uma periodicidade no blog, e acontece mesmo das pessoas verem meu Facebook e as pessoas
perguntarem qual será a dessa semana, e ai às vezes, no meu último post eu tive que pedir desculpas porque eu tô
trabalhando por uma ONG...”
PE RC E P Ç ÕES SOBRE TEMPO x DINHEIRO
“É uma pergunta capciosa essa.”
“sim.”
Essa pergunta foi mais uma maneira de conhecer sobre o processo de criação, hábitos e valores que permeiam a
atividade dos entrevistados.
Ficou ainda mais claro que, se todo o trabalho de criação e postagem dos vídeos envolve muito planejamento,
envolve também muita improvisação e muita disposição para o inesperado.
A insuficiência, seja de tempo ou seja de recursos, pode ser encarada como um “limite criativo” e muitas vezes um
estímulo simplificador com muitos exemplos na experiência pessoal e na história cinematográfica.
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Pareceu-nos que a escassez de tempo é mais fácil de resolver, ou que os criadores estão mais acostumados e
aparelhados de tecnologias cotidianas de fácil acesso atualmente para solucionar esse problema. Além disso, tanto
o custo do trabalho, quanto o custo do aluguel de equipamentos é proporcional ao tempo gasto. A maioria
escolheu, não sem algumas considerações, o dinheiro.
“[...] se é pra fazer eu quero fazer logo. Pra que ficar demorando? Aproveito enquanto estou apaixonado por ele.
Assim, o [nome] estava falando agora do processo do filme dele, realmente é complicado, se você faz o negócio, faz o
negócio de uma vez. Porque ou você termina logo em tempo de ainda gostar do que está fazendo, ou chega uma hora
que você fala: “quer saber? Vou fazer outra coisa”.”
“É muito complicado porque às vezes quanto menos você tem recurso você tem as melhores idéias. Aquela clássica do
“Spielberg” no “Indiana Jones”,
“Uma vez eu vi um comentário que eu achei muito interessante, que fala assim: o jogo não tem graça se não tiver os
limites. [...]Eu acho que ter tempo, ter todo o tempo não é a favor do filme. Eu acho que quando você está sem tempo é
uma limitação criativa. [...]”
que ele tinha uma cena com 5mil figurantes, era uma luta fenomenal e no dia da
filmagem o...” [...]“ó, o Harioson Ford está doente, esta gripado e não vai filmar”. Os caras ficaram sentados lá,
“trocentos” caras vestidos lá com as espadas, e estava pensando “meu irmão, e ai?” aí o Assistente de Direção falou
“cara, ia ser massa se pegasse uma espada e ele desse um tiro e vai embora”. E ai o cara na hora, o Spielberg ligou para
o Harrison Ford e falou: “cara você poderia filmar quantos minutos?”, aí ele falou de sacanagem: “15”, aí ele falou:
“beleza é o suficiente”.
REMUNERAÇÃO PELA POSTAGEM
Nem todos os entrevistados dedicam-se integralmente à produção audiovisual, entre eles estavam
funcionários públicos e outros profissionais. Mas boa parte dos entrevistados atuam na criação e produção
profissional de vídeos.
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“Eu trabalho no SAMU, né? Trabalho com atendimentos de alta urgência, [...]”
“ [...] normalmente o que eu trabalho mais é em termos de figurinos, cenografia, esse tipo de coisa. 2. eu ajudo a
produzir para os outros meus amigos. [...]. O meu negócio é as coisas com as mãos. [...]”
“eu trabalho com vídeo, eu vivo disso, mas tecnicamente falando eu sou um cinegrafista, acabei de concluir minha
especialização em audiovisual também. [...]7. Mas assim o que eu ganho dinheiro com vídeo é com televisão. Não é
bem o foco que eu quero seguir carreira, né. Eu quero trabalhar com Publicidade e Cinema. Mas os que pagam é a TV.”
“ [...] então assim eu hoje em dia eu vivo de internet, trabalho muito, vivo com o computador 24 horas ligado”
“Eu só trabalho com isso. Eu sou formado em Jornalismo mas eu fiz Mestrado em Direção. Eu trabalho só com Cinema
e Publicidade.”
Muitos afirmaram ter obtido algum tipo de retorno financeiro pelas postagens e um deles disse participar, naquela
atualidade, de um programa de parceria com um site. Foram citados o sistema de parceria do Youtube, o projeto
“Fiz TV” e o Festival do Minuto como fontes da remuneração.
“É, isso já aconteceu muito na época do Festival do Minuto, quando há a necessidade de comprar um conteúdo das
empresas de telefone para celular e etc., elas adquiriram e compram muitos vídeos curtos principalmente ligados a arte
visual, não muito de conteúdo, de vloguers
“Participo do programa de parceria de lucros do Youtube [...]
. E o Festival do Minuto tinha um contrato que você assinava e vendia pro
IG, pra OI, pois estava ligada no festival e isso dava uma grana. E a partir dos downloads que você tinha do seu
conteúdo, justamente te pagariam.”
“Eu já tive na época da “Fiz TV” também. [...]Era mensal. [...] Foi em 2009, né. Era um contrato mesmo. Porque lá
era o seguinte: você mandava e eles tinham o canal de televisão. [...]Então e eles tinham um canal de televisão, então
se o seu vídeo fosse aprovado na internet você passava na televisão e você tinha remuneração por cada minuto de vídeo.
E tinha assim, você começava como usuário e ia subindo, subindo até virar diretor. Então os minutos iam aumentando
o valor no caso. [...]Só no “Fiz TV” mesmo.”
“Eu já tive, mas não assim como ele, eu tive foi 10 dólares eu acho. Uma mixaria.”
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“[...] eu já fiz vários tipos de contratos, coisas diferentes para empresas. Por exemplo, a empresa chamada “Clarie” quer
comprar um vídeo meu por 300 dólares.”
Segundo os entrevistados, seria necessário um grande número de postagens e de visualizações para se obter um
valor monetário significativo. Entretanto falou-se de um retorno comercial indireto, que utiliza o número de
visualizações como moeda para se estabelecer contratos publicitários, sessão de direito das imagens, e promoção
pessoal no mercado de vídeos fora da internet.
“ [...] eu não ganho dinheiro com as visualizações, mas pra mim é importante porque eu to vendendo aquele trabalho
né. A Banda ganha. Então a próxima banda eu posso fazer mais caro porque o outro deu não sei quantos mil
visualizações, já tem não sei quantos inscritos no meu canal, já vende aquela coisa.”
“Eu já tive a experiência de ganhar dinheiro com a internet. Por conta dos vídeos e tal a gente acabou se esbarrando
com o cara que tinha um cliente que tinha pouco dinheiro pra fazer uma campanha para o Dia dos Namorados de uma
Perfumaria. E a gente sugeriu fazer uma coisa pra usar na internet que não teria custo nenhum, um custo básico
lá.[...]”
Para alguns a possibilidade de se ganhar a vida produzindo para a internet não é um “sonho” ou um “ideal”, é algo
tangível ou atual.
Ah, eu não vejo como um sonho. Eu vejo como uma profissão mesmo. É comum hoje em dia. As redes sociais mesmo
estão aí pra isso. Porque uma pessoa que produz vídeo não poderia?
“O maior exemplo assim ó: tem o “Larica Total” que é com o Paulo Tifentaler, eles fizeram o vídeo né, o programa que
é um cara na cozinha com uma câmera parada num ângulo só. E o cara teoricamente ensinava a fazer uma receita com
as sobras da geladeira. E pô, o sucesso do programa veio primeiro na internet, e depois veio no Canal Brasil. Hoje ele
passa no Canal Brasil acho que toda Segunda-Feira meia noite, uma coisa dessa. Mas acho que o programa é internet.
Eles botam dois blocos de 10 minutos e ta lá. E é incrível isso, realmente, os caras arrumaram um emprego.[...]”
“Aí a gente começa a ver que existe essa possibilidade.”
“ Eu não comecei pensando em nada, só fazia pros amigos mesmo, tanto que eu não tinha “Orkut”, não tinha nada. Eu
comecei a fazer esses vídeo e “Pra quem eu to colocando?”, era só pra quem tava ali o link e eu mandava o vídeo. Aí eu
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entrei nas comunidades do “Orkut”, do “Facebook” pra começar a tentar ver e mostrar pra outras pessoas, né. Aí começa
a se criar essa possibilidade de viver talvez disso. Eu to começando agora a ter essa expectativa.”
Entretanto nem todos gostariam de ganhar a vida com postagens na internet, preferindo dedicar-se também a
produções mais demoradas como curtas metragens e documentários. Todavia entre os entrevistados estavam
também criadores altamente motivados nesse sentido, tendo já vivido a experiência de se manter com a produção
para a Web, ou entendendo esse mercado como parte do percurso para a TV e para a produção de DVDs.
“Eu acho que seria interessante conseguir dinheiro com o viral, mas eu tenho interesse em produções maiores também.
Tenho interesse, por exemplo, em engatar um documentário [...]”
Eu tenho vontade de fazer uma série para internet que consiga se sustentar devido ao sucesso, as visualizações e o
interesse do público se mantendo com 1 episódio por semana talvez. Eu tenho essa vontade tem muito tempo, como ele
falou um exemplo dos “Anões em Chamas”, ele faz esse tipo de seriado que ele se sustenta. Mas eu tenho vontade de
fazer algo voltado pro humor e que será um seriado e que depois possa ser compilado tudo e depois ganhar outras
mídias como TV e DVD. “Eu estou começando a elaborar essa idéia.”
“Eu gostaria de que isso fosse a minha vida mesmo. Que foi por um tempo intensamente, a cada dois dias eu fazia um
vídeo.”
Houve um breve comentário no grupo sobre o sucesso financeiro e de visualizações dos vídeos tutoriais. Também
sobre a posse de aparato técnico que envolve produzir com qualidade competitiva.
“E também tem gente que faz muito sucesso na internet que já tem um aparato técnico porque tem uma qualidade de
produção de equipamento diferenciado. E a partir desse momento quando eles postam os vídeos deles, eles já tem uma
qualidade diferenciada e por isso mesmo tem bastante visualização. [...] ” como o “Mister Guitar Man” que está ligado
mesmo a vídeos rápidos e efeitos especiais. [...]ele se sustenta. Acho que são 150 mil dólares por mês.”
“Eu acho que aqui faltou também alguém de tutorial que é uma coisa que bomba na internet. [...]Qualquer dúvida
que você tenha você joga lá que encontra. “Como abrir a garrafa La Priori” por exemplo, aí vai ter um cara lá que te
explica “você pega e roda a tampa”.
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EQUIPE E EQUIPAMENTOS
A arregimentação de amigos para colaborar como técnicos ou intérpretes, sem pro labore, é a forma mais comum
de compor equipes.
“a gente já fez uns trabalhos juntos com a câmera dele, ele me empresta luz. Tipo um empresta pro outro, o que eu
tenho eu empresto para amigos, e amigos me emprestam também. E funciona assim.”
“Camaradagem”.
“Eu já consegui fazer alguns trabalhos com parceria mesmo, com amigos. [...]Então normalmente os trabalhos que
tenho feito, tem sido com a ajuda mesmo. Na camaradagem, os amigos ajudando tanto com equipamento quanto com
mão de obra mesmo. [...] Tem uns que furam, a gente sabe disso. Atrasa a gravação, fica remarcando, remarcando. Às
vezes tem que tirar o cara e chamar outro pra dar uma mão pra gente.”
“Depende do tipo de finalidade do vídeo no caso. Eu só preciso da idéia inicial e da camaradagem das pessoas. E da
câmera.”
Com a perpetuação dos convites, essas equipes se solidificam juntamente coma amizade, podendo variar de quatro
a cinqüenta pessoas.
“No começo eu chamava os amigos, assim éramos 4 e chamávamos algumas pessoas para trabalharem como ator, e
depois acho que nos 2 últimos curtas que a gente fez, a gente já tinha uma equipe de quase 50 pessoas.”
As queixas sobre a “brodagem” se multiplicam: atrasos, ausência sem prévio aviso, desconcentração, e falta de
habilidade técnica dos colegas. Por isso há quem prefira contratar profissionais sempre que haja recursos.
Trabalhar. Comentou-se, inclusive, de habilidades sociais específicas nesse tipo de associação.
“Acho que amigo é tudo furão. Amigo só quer fazer festa, quer beber. Eu estava fazendo uma paródia do “Avatar” uma
vez, e os meus amigos bebendo, enchendo a lata. Aí eu - “Não gente, concentra aí falta pouco” tal, aí saiu.”
A- “Sabe o que eu acho complicado chamar amigos mesmo se eles topam? É porque você chega lá e a pessoa não sabe
posicionar a câmera, não tem nenhum senso de estética, não sabe como iluminar, não sabe como fazer nada. Ela só esta
lá e pronto.” B - “É, mas aí esse amigo que não sabe fazer nada você chama para ser figurante. C – “É, você chama ele
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pra outra coisa”. A – “E quando você só tem amigos que não sabem fazer nada?” B - “Aí é complicado, porque quando
eu chamo pelo menos alguns amigos já gostam de cinema.”
“Então, na “Jedai.com” eu tinha que comandar uma equipe imensa só por conta de “brodagem”. E de vez em quando a
pessoa virava e falava eu não vou fazer esse negócio porque eu tenho mais o que fazer. Se não fosse importante que se
dane! Mas se fosse importante eu virava e fala assim: “olha, eu fico devendo um favor pra você.” Qualquer pessoa que
me conheça sabe que um favor meu é “fogo”. A coisa mais difícil, é bem valioso quando um cara pede um negócio desse.
Então normalmente faz as coisas na “brodagem” mesmo como se diz. Isso faz com que você desenvolva uma habilidade
social muito diferente, você tem que liderar uma equipe que não está sendo paga para fazer o que você quer. E é bem
engraçado.”
Existem os que não têm queixas e só remuneram técnicos que não estiverem disponíveis no grupo. Há ainda quem
escolha trabalhar só e com equipamento próprio, concordando, entretanto, que, na medida em que escolher
equipamentos mais sofisticados, mais dependerá de uma equipe.
“Eu produzo de todos os jeitos. Eu acho que varia desde essa produção de “ego trip”, que é sozinho, desde com um
monte de gente, curta que envolva muitas pessoas. Como é o caso dele ali e do [...]. Mas assim, o problema com pessoas
é que sempre, pelo fato de não ter dinheiro envolvido, não poder remunerar, demitir.”
“Eu sou uma pessoa assim, to meio que desanimado, porque eu estou sozinho. Eu estou com uma câmera profissional
muito boa e não tem como gravar sozinho o vídeo, eu gostaria de me juntar a algum grupo, fazer alguma coisa com
alguém. Porque sozinho eu não estou produzindo nada ultimamente. O último vídeo que eu fiz foi no Natal, falando
sobre Natal. E o público estava até falando “cadê você?”.
No outro lado da moeda, há uma reclamação muito contundente relacionada a diferença entre se trabalhar “por
amor” e trabalhar remunerado. Os diretores compreendem como “injustiça” o fato de as pessoas chaves na criação
e coordenação dos trabalhos muitas vezes perceberem menos que os envolvidos na parte técnica e na logística – ou
ainda tão somente empreenderem gastos, pois há gastos mesmo que tudo seja executado na “camaradagem”
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(gasolina, comida, desgaste de equipamentos, etc.). Este fato é mais perceptível nas ocasiões em que há
financiamento publico.
“Cinema, assim a experiência é engraçada. [...] Eu pelo menos no último filme que eu rodei eu perdi 20 mil reais.
Nossa assistente de Direção ganhou R$1.500,00 o segundo assistente ganhou R$1.000,00. O assistente de Direção é
algo fundamental, um cara que tem um mando no “set”, é o cara que dá as ordens, é o cara que fala “vai câmera”, o
cara que fala “corta”, se ele falar que foi valeu. Quem toca o set é o Assistente de Direção, não é o Diretor. A não ser
que seja um Diretor muito “pilhado”. E cara o Assistente eletricista ganha mais do que ele, porque? Porque os caras são
organizados, sindicalizados, eles tem todo uma coisa, eles trabalham 12 horas por dia, e se atrasar a hora do almoço o
cara fala “não a gente não vai mais fazer o plano”. Aí você tem que lidar com o cara que ta ganhando mais que seus
amigos. Isso porque você ganhou o dinheiro de Fundo de Arte e Cultura pra rodar o filme e os caras simplesmente
param no meio e falam assim “Eu to parando porque deu minhas 12 horas diárias”.
Outro motivo de associar-se a colegas é o compartilhamento de equipamento.
“Mas quando você pede emprestado o dono vem junto...”
“Eu uso equipamento assim, dependendo do trabalho que eu vou fazer. Eu uso uma simples handy cam e também às
vezes equipamento profissional mesmo. Eu trabalho em parceria hoje com o [nome], e o [nome] tem uma boa câmera, a
gente já fez uns trabalhos juntos com a câmera dele, ele me empresta luz. Tipo um empresta pro outro, o que eu tenho
eu empresto para amigos, e amigos me emprestam também. E funciona assim.”
No que tange aos equipamentos, a maioria afirmou usar uma handy cam e, mesmo tendo adquirido equipamento
mais sofisticado, ainda preferem a câmera simples em determinados projetos.
“Eu tenho uma câmera “Mini DV” mesmo, essa da Panasonic comum, um microfone mesmo desses, que nem ele falou,
pega o microfone, coloca o cabo de vassoura e faz o “Boom”. Pega o microfone e faz, sempre se adaptando mesmo”
.
Muitos querem “evoluir” para equipamentos profissionais pela qualidade da imagem e recursos que esses
oferecem, ou simplesmente pela mudança de estilo do artista. Por outro lado os equipamentos profissionais
perdem em portabilidade e flexibilidade na operação. Por essa razão equipamentos sofisticados podem,
paradoxalmente, ser considerados limitantes.
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“Assim, eu vou filmar alguma coisa agora eu penso “pô, com a outra câmera eu filmava qualquer bobagem e colocava
no ar”, agora eu olho e fica tão bonita a imagem, não dá pra botar qualquer coisa.” – “É mais responsabilidade, né?”
“[...] a partir do momento que você vai querer ter um equipamento melhor, etc., você pensa em um outro projeto. Esse
projeto que eu faço pro Youtube eu gravo lá com a webcam e to tranqüilo, o áudio ta bom e etc. Mas quando eu
produzo meus curtas, meu audiovisual eu já vou buscar um equipamento que se adéqüe da melhor forma, que tenha
uma qualidade que se transponha para os atores, não seja qualquer coisa, eu já penso nesse modo de produção para
melhorá-lo com meu projeto. Mas por enquanto eu ainda estou na internet com a minha webcam tranqüilo.”
No GF1 houve, de maneira muito breve e genérica, menção aos equipamentos de som e iluminação. Não se
comentou sobre programas de edição ou softwares relacionados a montagem dos vídeos. As únicas marcas citadas
explicitamente foram a câmera “Cannon 7D”, a TX3 – profissionais, e a SR11, da Sony, portátil.
No GF2 foram citadas inúmeras adaptações que solucionam a iluminação e a sonorização, fruto da experiência de
cada um, e também de pesquisas na Rede (vídeos tutoriais) e em conversa com amigos.
“[...] aí eu vi um vídeo de uma pessoa na internet falando que basta você ter a vontade, não precisa ter o equipamento
certo, a estrutura certa pra você fazer. Ai eu comecei e falei “como é que eu vou fazer os meus?”, ai eu montei os meus
iluminadores, eu acabei que meus refletores eu mesmo fiz, eu acabei fazendo o meu próprio tripé pra ter a câmera mais
estável. Montei meu próprio “tracking” com cano de PVC pra fazer o que eu queria fazer, no vídeo que eu queria fazer.
Então eu pensei “eu vou fazer o vídeo dentro das minhas limitações, mas tentando explorar o máximo que eu puder das
coisas”. Eu não podia comprar por exemplo um iluminador de mil reais, não eu vou fazer o meu mesmo. Eu peguei um
pedestal e um cano de PVC, comprei um refletor de jardim de mil, comprei um de 500, acabei comprando 3. Montei
minhas estruturas pra poder fazer o que eu queria dentro da minha limitação. Realmente eu posso fazer minhas coisas
dentro das minhas limitações com um pouco de qualidade. Aí eu tenho o meu trabalho, a pós-produção do vídeo pra
tentar alavancar e deixar o vídeo um pouco mais com a qualidade que eu quero,né?”
A escolha dos equipamentos depende do projeto em questão.
Eu trabalhava com uma “hand cam” comum e há 6 meses atrás eu comprei uma “Canon 7D” profissional muito boa.
Mas eu estou pagando até agora. E como eu falei é difícil filmar sozinho porque o foco é manual. Mas é excelente a
qualidade, é incrível quando eu filmo e vejo no computador “uau!”. Quando você posta também, você vê que a
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qualidade é absolutamente bonita. E eu não uso equipamento profissional de áudio ainda, mas eu vou comprar desse
gravador de áudio. E é isso.”
Eu usei a maioria desses vídeos que tem lá no Youtube, eu usei uma “hand cam” SR11 que é da Sony, e ela é
pequenininha, ela é full HD e tem entrada para microfone. E ela tem essas vantagens de ser prática e ser muito móvel,
por ser assim desse tamanho, e é uma qualidade excepcional. Isso nesses trabalhos. Mas já usei a TX3 que é lá da FAC,
que é uma câmera bem potente. E como ele falou, depende do projeto. E tem a iluminação e tal, como a gente conhece,
assim, quase todo mundo aqui deve ter amigos que tem luz, que tem lapela, tem equipamentos, dá pra você fazer na
“brodagem”.
“É aquilo que eu falei, depende muito do que você vai fazer. Dependendo do que vai fazer a gente vai atrás de um
equipamento melhor, dependendo da cena. Então assim, se for fazer vídeos mais fácil mesmo, em lugares mais claros
até ta simples, vou pegar essa “camerazinha” mesmo.”
É unanimidade a noção de que o estilo se entrelaça ao tipo de tecnologia utilizada.
“Eu acho que o negócio que você falou, que você parou de produzir depois que comprou um bom equipamento. Eu acho
que, já eu não parei de produzir. Mas eu tive um momento que eu falei “pêra aí”, pois você não quer produzir da
maneira que produzia, até porque quando você muda de tecnologia acho que muda seu trabalho. Por exemplo, eu
tinha uma “handy cam”.
“Aí eu tinha feito umas imagens antes e a gente gravou um vídeo totalmente espontâneo interessantíssimo porque foi
uma situação espontânea. Com a câmera que eu tenho agora eu não consigo mais esse tipo de situação, porque é uma
câmera grande, que não é uma câmera que você tira em qualquer lugar, que liga fácil, pois ela demora. Então é uma
câmera que exige preparo, exige pensamento. Então você vai mudando o seu estilo de produzir. Mas eu produzi muito
tempo com câmera sem bateria, que tinha que fica ligando na tomada.”
“A linguagem que você vai adotar tem a ver com o equipamento que você vai usar.”
“Assim, eu vou filmar alguma coisa agora eu penso: “pô, com a outra câmera eu filmava qualquer bobagem e colocava
no ar”, agora eu olho e fica tão bonita a imagem, não dá pra botar qualquer coisa.” – “É mais responsabilidade, né?”
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PRODUTORES DE CONTEÚDO LOCAL E A LEI DO AUDIOVISUAL
Quando perguntados se tinham conhecimento da tramitação do Projeto de Lei Nº 116 (PLC 116), que,
entre outras coisas institui uma cota de produção nacional independente a ser veiculada pelos canais fechados, os
entrevistados responderam que sim, conheciam a iniciativa.
Também opinam que tal lei, se aprovada, vai abrir oportunidades para muitos produtores de conteúdo. Sabem que
os brasileiros vendem já conteúdo para a HBO, para o Discovery Chanel, e para History Chanel. No Brasil o canal
que compra conteúdo independente é o Canal Brasil, as demais emissoras têm produção própria (Globo, Band,
Record).
Todavia, em meio ao entusiasmo pela possibilidade do aparecimento de novas produtoras e sustentação das que
sobrevivem hoje em dia, alguns questionamentos foram levantados: será que essa nova demanda não será regulada
pelos velho “padrão Globo de produção”? Será que haverá procura pelas estéticas veiculadas pelas minorias? Será
que haverá qualidade e inventividade de forma a não desestimular a audiência quanto ao produto independente
nacional? Exatamente o que estamos chamando de “produção independente”? Seria regionalizado?
“Oportunidade vai ter pra muita gente. O problema é ter competência. Porque muita gente vai querer tentar fazer
alguma coisa, e quando você ver o mercado vai estar inundado de mais do mesmo. Porque o povo vai tentar fazer mais
do mesmo e é muito difícil ter alguém que pense fora da caixa aqui nesse pais. A caixa no caso não vou dizer a Globo.
Mas o padrão Globo de qualidade é uma coisinha que incomoda, porque todo mundo quer fazer um negocio bonitinho,
mas não é todo mundo que é corajoso que vai usar as receitas de comida lá. Ou que nem o Pepa, que no final das
contas a coragem que o Pepa teve, que esse moço teve são assim, eles são os verdadeiros pioneiros. Agora a maioria do
pessoal vai fazer mais do mesmo. Mais novelinhas de adolescentes.”
“Se for uma cota e obrigar a comprar acho que a principio pode cair assim “o que é que tem pra comprar? Só tem lixo?”
vai ter que ser lixo. Mas nós que consumimos também reclamamos e hoje em dia isso é bem mais fácil. Tinha um
programa no “Fiz TV” e as pessoas escreviam para ele, e ele sabia como é que tava indo o conteúdo que ele produzia. E
eu acho que o conteúdo independente vai caminhar por ai. As pessoas vão falar, e quando a emissora ver que isso não
ta dando certo, o cara vai ter uma sacada e ter uma idéia diferente, nem que seja o cara que faça comida com sobra.”
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“Às vezes eu vejo, mesmo a produção independente, como um aprendizado. Vejo um distanciamento muito grande da
sociedade, por exemplo. A gente sai pra ver, à periferia lá tem o seu espaço dentro desse projeto, por exemplo? [...] Às
vezes eles pegam os autores independentes do cara que domina lá.”
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V. CONCLUSÕES
Um Mundo de Diálogos Audiovisuais
Ficou muito fácil produzir e distribuir conteúdos audiovisuais, hoje em dia câmaras estão acopladas em
equipamentos do dia-a-dia como celular, computador de mesa, notebooks, tablets, etc., e com a integração digital
em redes (Telecomunicações e informática) isso eliminou em muito um elemento de entrave (estabelecimento da
escassez para a realização comercial/lucro) considerado essencial na economia clássica: o intermediário da
distribuição. Muito da falência de grandes conglomerados editorias e de mídia impressa, gravadoras e, de certo
modo, até grandes estúdios de cinema (o caso de pedido de concordata da MGM pode se enquadrar neste
espectro) vem da troca de arquivos digitais e a fácil disseminação dos mesmos pela internet, o que vem gerando
diversos embates entre grandes corporações de mídia e entretenimento com governos e sociedade civil. Apesar
das batalhas judiciais que este imbróglio vem provocando em todo o mundo, não será uma lei (no Brasil temos um
Marco Civil da internet a ser debatido no congresso antes de virar a lei que regulamente as relações das pessoas e
conteúdos no ambiente virtual) que impedirá as facilidades de produzir, editar e distribuir um vídeo, pelo
contrário: com o barateamento de equipamento e políticas públicas para o acesso massivo da população à grande
rede (PNBL – Plano Nacional de Banda Larga) será cada vez maior a produção de conteúdos audiovisuais, e eles
estarão na internet, e muitos deles serão narrativos e performáticos.
Está bem próximo o momento histórico em que a maioria da população irá se comunicar/dialogar através
de conteúdos audiovisuais, produzindo, editando e distribuindo conteúdos pela rede mundial de computadores,
abastecendo servidores (como os do Google/Youtube) ou transmitindo as mensagens por vídeos-torpedos de
celular para celular. O fenômeno será algo próximo ao ato de escrever, no qual hoje em dia está disseminado
quase que amplamente em todo o mundo alfabetizado, com pequenas diferenças em países chamados de
desenvolvido com os subdesenvolvidos. Observando o público da amostragem desta pesquisa fica claro que a
diversidade de motivações, os interesses, as perspectivas de futuro e até mesmo a maneira como começaram a
produzirem seus vídeos nos leva a entender que ser um realizador de vídeo não mais significará um status
profissional ligada a uma área artística ou mesmo relacionado com um mundo de celebridades, isso se tornará
banal – se é que já não é hoje, ao ponto de não mais ser considerado uma especialidade, cineastas na sociedade não
serão exceção e sim a regra, regra de comunicação entre pessoas de um mundo conectado e informatizado, onde
equipamentos que captam som e imagens serão tão baratos e fáceis de usar que não mais causarão espanto, do
mesmo modo que em algum momento da historia saber ler e escrever e ter os recursos para isso (papel e lápis)
também passou a ser algo corriqueiro e de fácil acesso a maior parte da população.
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Para consumar esta perspectiva basta considerar o fato que a maioria quando começou com a atividade
não tinha formação na área, se quer uma capacitação, e que muitos aprenderam, aprendem (e certamente ainda
aprenderão) tudo pela internet, através dos chamados vídeos “tutoriais”. Apesar de muitos terem ingressado num
curso formal de graduação, seja na área de Comunicação Social ou Artes, mostram-se indiferente a algum
conhecimento adquirido formalmente, ficando a clara impressão que um certificado/diploma não mudaria – ou
não mudou, em nada suas perspectivas técnica, estética e de aperfeiçoamento de uma linguagem audiovisual que
este praticasse ou desconhecesse, tornando o aprendizado em banco escolar irrelevante para a continuidade do ato
de produzir, no qual está associado intrinsecamente a falta de recursos ou/e tempo, e não por falta de
conhecimento na operação de equipamentos, desenvolvimento de uma linguagem ou condução de atores, o que é
perfeitamente verificável nos vídeos destes realizadores disponível na internet e nas suas manifestações ao longo
dos Grupos Focais.
Recomendação
Mesmo esses dados sendo limitados os mesmos sugerem que não se trata de episódios eventuais, mas de
fluxos estáveis de uma sociedade cada vez mais inserida e dialogando com e por telas, conectadas por redes cada
vez mais acessíveis pelos motivos deste ambiente está se transformando na nova feira, o novo espaço
mercadológico do mundo que paulatinamente deixa de ser analógico em absolutamente tudo e se converte
exponencialmente em digital.
Para alem das relações de troca comercial os dispositivos de acesso (gadget) equipados com captação de
sons e imagens em movimento associada a sua imediata distribuição pelas redes de telecomunicações possibilitam a
expressão do pensamento e dos sentimentos de pessoas com tendências expressivas, no qual a comunicação ganha
tempero e substância (significado). Mesmo os dispositivos sendo fabricados para indivíduos, algumas linguagens
artísticas requerem um grupo de pessoas para sua realização, e esse é o caso daqueles que se dedicam a produzir
conteúdos audiovisuais narrativos, onde é imprescindível a figura do interprete de personagens, o ator. Fica
evidente que para alem da necessidade de equipamentos, para os grupos que se dedicam a produzir conteúdos
narrativos, a necessidade primordial está neste tipo de recurso humano imprescindível para uma plena realização
de sua obra. Por tanto, pensando numa política pública de cultura, seria crucial providenciar algum tipo de
suporte, apoio financeiro ou mesmo alguma forma de garantir para os grupos/coletivos que trabalham com
conteúdos narrativos o acesso a atores – sejam profissionais ou em formação adiantada, que possibilitasse o pleno
desenvolvimento de seus projetos.
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Esta medida está em consonância com os investimentos na manutenção de grupos artísticos que o estado
já vem realizando com determinadas linguagens, e alem disso - e talvez até mais importante, a medida estaria de
acordo com a Convenção Sobre a Proteção e Promoção da Diversidade das Expressões Culturais principalmente
no que concerne a alínea c do Artigo 6º (Direitos das Partes no Âmbito Nacional) no qual se afirma a necessidade
de “medidas destinadas a fornecer às indústrias culturais nacionais independentes e às atividades no setor informal
acesso efetivo aos meios de produção, difusão e distribuição das atividades, bens e serviços culturais”.
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VI. ANEXOS
1. Roteiro de Grupo Focal
I. Introdução (10 Minutos)
O moderador se apresenta
Apresenta os colegas de trabalho & colegas da
Apresenta o grupo focal como técnica para gerar idéias
Foco da discussão:
Está interessada em conhecer a opinião de vocês, sobre o processo de produção e postagem dos seus vídeos na internet
→ Regras do Grupo Focal
→ Encorajar a informalidade e a participação de todos;
→ Razões da gravação (A reunião é gravada para ajudar na redação do relatório e somente será escutada pelos pesquisadores);
→ Promessa de sigilo (os nomes dos participantes não serão associados aos comentários);
→ O sistema de gravação é sensível (se agradece, no possível, evitar conversas paralelas e batidas na mesa);
→ Necessitamos incluir as opiniões de tudo mundo;
→ Necessidade de opiniões sinceras, abertas, honestas;
→ Encorajar as diferenças de opinião (Não é necessário o consenso);
→ È interessante respeitar o tópico que está sendo tratado (Há muito material a ser perguntado);
→ O papel do moderador é parecido ao de um “árbitro de futebol”;
→ Em algum momento posso necessitar da ajuda de vocês no sentido de “soltar a imaginação”;
→ Não é preciso pedir a palavra para falar;
→ Dúvidas?
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→ Introdução (esquentamento)
→ Os participantes se apresentam - nome
→ O que cada um gosta de fazer no tempo livre?
II. (10 Minutos)
Explorar: Causas
→ Qual o objetivo de filmar e colocar na web? → Motivações → Explorar as seguintes hipóteses: desejo de se expressar, desejo de pertencer a um grupo, desejo de aperfeiçoar uma técnica artística, desejo de ser famoso, etc.
III. (10 Minutos)
Explorar: Contexto
→ Como surge e é desenvolvida a história ou/e tema → Como isso se relaciona com a sua atividade atual; → como eles encaram o entorno pessoal (familiares e amigos próximos): se são hostis ou receptivos àquela atividade.
IV. (10 Minutos)
Explorar: Resultado
→ Qual é a avaliação que vcs fazem dos resultados de vcs e dos outros “colegas”? → Como é essa relação com o Google, eles estão abastecendo o site do Google → Que tipo de retorno eles esperam por este “trabalho”? → Verificar o entendimento que eles têm sobre a indústria cultural (economia da cultura) do audiovisual mundial, brasileiro e do Distrito Federal, para entender até que ponto aquele trabalho possa vim a ser auto-sustentável;
V. (15 Minutos)
Explorar: Recursos
→ Como é a relação com os recursos tempo e dinheiro? → Quanto injeta e qual a constância? → Tipo de equipamentos (São próprios ou de terceiros?) → Dispêndio de recursos, energia e tempo pessoal em algo tão efêmero.
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VI. (15 Minutos)
Explorar: Controle Social
→ A idéia de limite , pressão social, controles morais, coerções diretas e indiretas?
VII. (10 Minutos)
Explorar: Recrutamento
→ Como você se associa às pessoas para formar uma equipe, um grupo? Há algum critério? →Alianças estratégicas acionadas, laços sociais, grau de informalidade e formalidade. →Compreender até que ponto é realizado uma ação realmente colaborativa, um co-work que possibilita a feitura de seus filmes. VIII. (10 Minutos)
Explorar: Intensidade → Imagine seu dia com 100% qual a porcentagem que você dedica a esta atividade? → Em que momentos, condições você tem maior ou menor intensidade criativa? → Você tem algum parâmetro para saber o quanto o seu produto... ? IX. (10 Minutos) Explorar: Público → Tem um público alvo? → Você pensa em agradar o público? → Como é o retorno do público que assiste? X. (10 Minutos) Explorar: Estética → Analisar as influências narrativas e conceituais que determinam a configuração ideológica e
artística do conteúdo produzido por esses grupos ou/e indivíduos;
→ Gostos a respeito de filmes e dos vídeos da internet
XI. (10 Minutos) Explorar: Ética → Algum tipo de tema tabu?
→ Avaliações de outros filmes desde o ponto de vista ético concordâncias...
Agora necessito da ajuda de vocês no sentido de “soltar a imaginação”;
XII. Tecnicas projetivas (10 Minutos)
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→ Assistência de vídeo de feito por outro “video-maker
XIII. Síntese (10 Minutos)
Explorar:
Narratividades, similitudes, conflitos, crenças, etc.
X. Fechamento (05 Minutos)
Agradecemos muito a ajuda de vocês. As informações que foram compartilhadas esta noite serão de extrema utilidade para a organização dos próximos eventos.
Muito obrigado.