Re Vista Ju Ridic 2013
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DIREITO PBLICO: REVISTA JURDICA DA ADVOCACIA-GERAL DO ESTADO DE MINAS GERAIS n.1, jan./dez. 2013
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DIREITO PBLICO: REVISTA JURDICA DA ADVOCACIA-GERAL DO ESTADO DE MINAS GERAIS n.1, jan./dez. 2013
ESTADO DE MINAS GERAIS
ADVOCACIA-GERAL DO ESTADO
DIREITO PBLICO:
Revista Jurdica da Advocacia-Geral do Estado de Minas Gerais
Direito Pblico: Rev. Jurdica da Advocacia-Geral do Estado MG Belo Horizonte v.10 n.1 p. 1- 349 jan./dez. 2013
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ISSN 1517-0748 DIREITO PBLICO:
REVISTA JURDICA DA ADVOCACIA-GERAL DO ESTADO DE MINAS GERAIS Rua Esprito Santo, n 495 Centro 30.160.030
Belo Horizonte MG Brasil Fone: (31) 3218-0700 - Fax: (31) 3218-0742
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GOVERNADOR DO ESTADO Antnio Augusto Junho Anastasia
PRESIDENTE DO CONSELHO EDITORIAL Marco Antnio Rebello Romanelli
CONSELHO EDITORIAL Dr. Alberto Guimares Andrade (MG Advocacia-Geral do Estado) Prf. Dr. Amanda Flvia de Oliveira (MG Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais) Prof. Dr. Antnio Agostinho Cardoso da Conceio Guedes (PORTUGAL - Faculdade de Direito da Universidade Catlica Portuguesa) Prof. Dr. Antnio Carlos Diniz Murta (MG Advocacia-Geral do Estado e Faculdade de Direito da FUMEC) Dr. Crmen Lcia Antunes Rocha (DF Supremo Tribunal Federal) Dr. Carla Amado Gomes (Portugal Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa) Prof. Dr. Carlos Vctor Muzzi Filho (MG Advocacia-Geral do Estado e Faculdade de Direito da FUMEC) Prof. David Sanchez Rubio (ESPANHA - Universidad de Sevilla) Prof. Dr. Emerson Gabardo (PR Faculdade de Direito da Universidade Federal do Paran) Prof. Dr. rico Andrade (MG Advocacia-Geral do Estado e Faculdade de Direito da FUMEC) Dr. Jaime Npoles Vilela (MG Advocacia-Geral do Estado) Prof. Dr. Jason Soares Albergaria Neto (MG Advocacia-Geral do Estado e Faculdade de Direito Milton Campos) Prof. Dr. Jorge Miranda (Portugal Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa) Dr. Jos Jairo Gomes (DF Procuradoria-Geral da Repblica) Dr. Lusa Cristina Pinto e Netto (MG Advocacia-Geral do Estado) Prof. Dr. Mrcia Carla Ribeiro (PR - Procuradoria-Geral do Estado e Faculdade de Direito da UFPR e PUC-PR)
Prof. Dr. Misabel Abreu Machado Derzi (MG Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais) Prof. Dr. Onofre Alves Batista Jnior (MG Advocacia-Geral do Estado e Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais) Prof. Dr. Raquel Melo Urbano de Carvalho (MG Advocacia-Geral do Estado) Dr. Roney Luiz Torres Alves da Silva (MG Advocacia-Geral do Estado) Dr. Srgio Pessoa de Paula Castro (MG Advocacia-Geral do Estado) Prof. Dr. William Byrnes (EUA - Thomas Jefferson School of Law) Prof. Dr. Wilson Nerys Fernndez (URUGUAI - Facultad de Derecho - Universidad de la Repblica - Udelar)
DIRETOR Alberto Guimares Andrade
COORDENADORES Onofre Alves Batista Jnior Antnio Carlos Diniz Murta Lusa Cristina Pinto e Netto
COMISSO TCNICA Lcia Ferraz Venturi Julieta Dias Nascimento Bernardo Guimares Loureiro Fernanda Christina Teixeira Maia Geraldo Cocolo Jr.
Prof. Dr. Maria Clara da Cunha Calheiros de Carvalho (PORTUGAL Escola de Direito - Universidade do Minho)
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Direito Pblico: Revista Jurdica da Advocacia-Geral do Estado de Minas Gerais / Advocacia-Geral do Estado de Minas Gerais. Vol. 1, n. 1, (Jul./Dez. 2004). Belo Horizonte: Imprensa Oficial de Minas Gerais, 2004 - .
Anual
Formada pela fuso de: Direito Pblico: Revista da Procuradoria-Geral do Estado de Minas Gerais e Revista Jurdica da Procuradoria-Geral da Fazenda Estadual.
ISSN 1517-0748 1. Direito pblico - Peridico 2. Direito tributrio - Peridico I. Minas Gerais - Advocacia-Geral do Estado II. Ttulo.
Bibliotecria: Lcia Ferraz Venturi CRB/6-1913
2013 Centro de Estudos - ADVOCACIA-GERAL DO ESTADO DE MINAS GERAIS. O contedo dos artigos doutrinrios publicados nesta Revista e os conceitos emitidos so de nica e exclusiva responsabilidade de seus autores. Qualquer parte desta publicao pode ser reproduzida, desde que citada a fonte. Tiragem: 1.800 exemplares Impresso no Brasil - Printed in Brazil
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SUMRIO
APRESENTAO
SAUDAO AOS NOVOS PROCURADORES DO ESTADO.................................................................7
1 DOUTRINA O PROCESSO COLETIVO E O ACESSO JUSTIA SOB O PARADIGMA DO ESTADO DEMOCRTICO DE DIREITO - Antnio Gomes de Vasconcelos, Tereza Cristina Sorice Baracho Thibau e Alana Lcio de Oliveira ................................................................................................................................................................................11 O PRINCPIO DA ISONOMIA, O PROJETO DE NOVO CPC E UMA SINGELA CONSTATAO - Leonardo Oliveira Soares ....................................................................................................................................21 O PROJETO DO NOVO CPC E A TUTELA DE EVIDNCIA - Luiz Fernando Vallado Nogueira........................................................................................................................29 O DIREITO TRIBUTRIO COMO INSTRUMENTO DE COMBATE POBREZA: A ELIMINAO DA REGRESSIVIDADE FISCAL PELA APLICAO EFETIVA DO PRINCPIO DA CAPACIDADE CONTRIBUTIVA COM RELAO AOS IMPOSTOS QUE ONERAM O CONSUMO - Luiza Oliveira Guedes .........................................................................................................................................39 A SUSPENSO COMPULSRIA DE AES INDIVIDUAIS NA PENDNCIA DE AES COLETIVAS DE MESMA TEMTICA: INSTRUMENTO DE RACIONALIZAO E EFETIVIDADE DA TUTELA JURISDICIONAL - Tereza Cristina Sorice Baracho Thibau e Alana Lcio de Oliveira.......................................................................67 A ADMINISTRAO CONTRATADA E A UTILIZAO DE TAXA DE ADMINISTRAO PELA ADMINISTRAO PBLICA - Thasa Ferreira Amaral Gomes Espnola.............................................................................................................81 DA IMPOSSIBILIDADE DE PRORROGAO DE VIGNCIA DAS ATAS DE REGISTRO DE PREOS NO MBITO DO ESTADO DE MINAS GERAIS: COMPARATIVO EVOLUO LEGISLATIVA FEDERAL -Thiago de Oliveira Soares ....................................................................................................................................99
2 RELATRIOS DE GRUPOS DE ESTUDO DE TESES JUDICIAIS.....................................................105 3 PARECERES, NOTAS JURDICAS E PEAS PROCESSUAIS.......................................................177
4 JURISPRUDNCIA ............................................................................................................................239
5 SMULAS ADMINISTRATIVAS ........................................................................................................299
6 LEGISLAO DA ADVOCACIA-GERAL DO ESTADO....................................................................303 ORIENTAO EDITORIAL...................................................................................................................319
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APRESENTAO
Neste ano a Revista Jurdica da Advocacia-Geral do Estado de Minas Gerais
completa dez anos, fato este de jbilo e imensa satisfao para os seus editores.
A Revista da Advocacia-Geral do Estado de Minas Gerais uma publicao anual
e contm informaes de direito pblico, especialmente, nas questes que tm pertinncia
com os estados federados. composta de artigos, pareceres, notas jurdicas e peas
processuais, desenvolvidos por Procuradores do Estado e por outros colaboradores, bem como
de jurisprudncia referente administrao pblica estadual.
Sua primeira edio se deu aps a promulgao da Emenda Constituio
Mineira n 56, de 17 de julho de 2003, a qual extinguiu as Procuradoria-Geral do Estado e
Procuradoria-Geral da Fazenda Pblica Estadual, criando a Advocacia-Geral do Estado de
Minas Gerais.
Em 1958, a primeira edio da Revista da Procuradoria-Geral do Estado recebeu o
ttulo Direito Pblico. Em 1991 passou a ser denominada Revista da Procuradoria-Geral do
Estado e, em 1999 voltou a receber o ttulo Direito Pblico. Desde a dcada de 60, de igual
modo, a antiga Procuradoria-Geral da Fazenda Estadual, tambm editou anualmente a sua
revista, de contedo exclusivamente tributrio.
Em 2004, diante da alterao legislativa e a transformao das extintas
procuradorias, prosseguindo o mesmo ideal de ampla divulgao dos trabalhos jurdicos
desenvolvidos por qualificado corpo de profissionais, a Advocacia-Geral do Estado passou a
publicar a sua revista denominada Direito Pblico: Revista Jurdica da Advocacia-Geral do
Estado de Minas Gerais.
Por fim, completando uma dcada, renova-se o mesmo propsito do primeiro
fascculo da Revista da AGE, ou seja, relevante fonte de consulta a estudos e discusses
jurdicas que guardem pertinncia com a atuao da administrao pblica dos Estados da
Federao, renovada anualmente pelo esforo de seus muitos colaboradores.
Alberto Guimares Andrade
Diretor da Revista Jurdica da AGE-MG.
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SAUDAO AOS NOVOS PROCURADORES DO ESTADO
DISCURSO POR OCASIO DA CERIMNIA DE POSSE DOS PROCURADORES
DO ESTADO, APROVADOS EM CONCURSO PBLICO, NA ADVOCACIA-GERAL
DO ESTADO, EM BELO HORIZONTE, AOS 21 DE FEVEREIRO DE 2013,
PROFERIDO PELO PROCURADOR DANIEL CABALEIRO SALDANHA.
EXCELENTSSIMO SENHOR GOVERNADOR DO ESTADO, PROFESSOR ANTNIO
ANASTASIA,
EXCELENTSSIMO SENHOR ADVOGADO-GERAL DO ESTADO, DR. MARCO
ANTNIO REBELO ROMANELLI,
EXCELENTSSIMO SENHOR PRESIDENTE DO TRIBUNAL DE JUSTIA DO ESTADO
DE MINAS GERAIS, DESEMBARGADOR JOAQUIM HERCULANO RODRIGUES,
EXCELENTSSIMO SENHOR PRESIDENTE DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO
BRASIL, SEO DE MINAS GERAIS, DR. LUS CLUDIO CHAVES,
SENHORES PROCURADORES, AGORA MEUS PARES,
SENHORES:
Com alegria e jbilo nos inauguramos na carreira da Advocacia Geral do Estado.
Cuida-se, em verdade, de nossa admisso a uma das mais nobres e fidalgas carreiras de Estado,
encarregada constitucionalmente de defender a Administrao, a Fazenda e, conseguintemente,
a Sociedade. Quis a Astcia da Histria que a Repblica viesse a se instalar entre ns. No fosse
a Repblica e, qui, a esmagadora maioria de ns, seno todos, no estaria a participar conosco
desta cerimnia. Explico: elemento basilar do Governo republicano o princpio do mrito, cuja
expresso mais concreta no outra seno o concurso pblico. Esse inefvel priplo que viemos
palmilhando j h mais de um ano. O enfrentar e arrostar os exames no d mostras apenas do
preparo humano e intelectual daqueles que lograram sua aprovao, mas, ao fim e ao cabo,
acaba por provar a higidez espiritual de cada um.
Enfrentar o certame do concurso permitiu a cada um de ns responder a inmeras
perguntas, mas, creio, tambm franqueou-nos a oportunidade de refletirmos sobre o vaticnio
do dintel de Delfos: Conhece-te a ti mesmo. J agora, quando vo se amainando a insegurana
do candidato e o furor do aprovado, podemos nos reconhecer como servidores, como
procuradores do Estado. Tomemos da a dimenso da estatura de nossos cargos. Encarregados
constitucionalmente de representar o Estado, assumimos, com efeito, sua prpria
personalidade. Acaso algum, em s conscincia, outorgaria um mandato a quem no merece
sua mais ntima confiana? Pois bem, senhores. O Estado outorgou-nos um mandato.
Deposita, pois, em ns, a mais cndida e imaculada confiana.
chegado o momento de tomar posse do cargo. Saibam que aqueles que hoje
assumem este compromisso no desertaro da justia, no tergiversaro com valores, no se
apequenaro diante das objees inopinadas. Defender o Estado , qui, a mais elevada das
dignidades. Estejam seguros de que aqueles que, por opo, hoje, recebem esse encargo sero
aguerridos defensores da Ordem e do Estado, sem, contudo, permitir que se lhes vergue o
sentimento de justia. Bem por isso, atentos advertncia de Rui Barbosa, havero de
repudiar o epteto de Fazendeiros, fazendo, antes, por merecer, o simples, conquanto sbrio e altaneiro, ttulo de Advogados do Estado.
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Como sabemos, muitos procuram enxergar jaas e ndoas, onde apenas h o bem-
servir, a idoneidade e a correo. Combater o bom combate, porm, a predileo, a
verdadeira profisso de f do Procurador do Estado. No haveremos de esmorecer. No
haveremos de desertar. No haveremos de retroceder. Muitos esto em nossas fileiras.
Estamos seguros, bem assim, que militaro em nosso auxlio os ditames da Justia - que no
se intimida e que sabe aquilatar e discernir, com ponderao e prudncia, onde h o bem, o
reto e o justo. Ao passo em que outros pretendem ser resolutivos, ns, antes, devemos ser
combativos, porquanto nos seja interdito regatear com a Lei ou com o Direito.
A advocacia pblica, senhores, no cenrio de hipertrofia de determinadas
instituies, o ltimo bastio de defesa da legitimidade democrtica e da Verdade Eleitoral,
porque encarregada de defender a independncia da Administrao eleita. Bem por isso,
merecedora, no mais das vezes, de antipatias e prevenes. Mal no far. Cortejar a
popularidade no nossa vocao.
A carreira da Advocacia Geral do Estado avanou bastante, merc, sobretudo, da
determinao do ento Governador Acio Neves, na gesto do outrora Advogado-Geral do
Estado, Dr. Bonifcio Andrada. Determinao essa que vem sendo renovada, ampliada e
engrandecida por Vossa Excelncia, senhor Governador, na gesto do Advogado-Geral do
Estado, Dr. Marco Antnio Romanelli. No creiamos, contudo, que esse avano seja fruto de
qualquer predileo ou deferncia especial em relao a ns, enquanto classe. , antes,
produto do reconhecimento da elevada posio estratgica de nossa funo constitucional,
aliada percepo da evidente eficincia de seus quadros na tutela do Direito e na
salvaguarda da Fazenda, cujos interesses no so outros, seno os interesses da Sociedade. J
no posso crer, senhor Governador, que haver defeces, em favor de outras carreiras, no
apenas pela valorizao contnua que lhe devota a Administrao, mas, sobretudo, pelo estima
que lhe empresta a Sociedade.
Estimados Colegas! Somos chamados a meter as mos causa do Estado,
defesa da ordem jurdica e ao trabalho. Muito se tem dito que a advocacia pblica deve
defender o Estado, no o Governo. Verdade, mas verdade parcial. Defender a independncia
do Governo eleito, defender a prpria constituio. No h se acanhar ou ter pruridos.
Onde houver ameaa ordem democrtica, vontade eleitoral, independncia dos
poderes, a nos bateremos.
J caando as velas ao discurso, meu dever, em nome de todos, render nossas
profundas homenagens a todos os que nos ampararam nesse percurso. Senhores pais, sintam-
se, na pessoa de minha me, Josilene, reconhecidos e aplaudidos. Aos esposos, companheiros,
noivos e namorados, desejo se sintam to amados por vossos entes queridos, quanto espero se
sinta Aimara. Aos amigos, que nos apoiaram e impulsionaram, nossa alegria ser eternamente
hipotecada causa da amizade.
Sejamos intrpidos, sem deixar que nos pique o orgulho. Preservemos nossas
almas juvenis, sem antepor o draconianismo equidade. Envergonhemo-nos menos de errar,
do que de no nos emendarmos. Trabalhemos por essa que agora nossa Casa! Trabalhemos
pelo Estado! Trabalhemos por todos os Mineiros! Oxal tenhamos foras! Que nos guiem
nossos Manes! Que nos proteja Deus!
Muito Obrigado!
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DOUTRINA
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O PROCESSO COLETIVO E O ACESSO JUSTIA SOB O
PARADIGMA DO ESTADO DEMOCRTICO DE DIREITO
H um tempo em que preciso abandonar as roupas usadas, que j tem a
forma do nosso corpo, e esquecer os nossos caminhos, que nos levam
sempre aos mesmos lugares. o tempo da travessia: e, se no ousarmos
faz-la, teremos ficado, para sempre, margem de ns mesmos.
(Tempo de Travessia de Fernando Pessoa)
ANTNIO GOMES DE VASCONCELOS
TEREZA CRISTINA SORICE BARACHO THIBAU
ALANA LCIO DE OLIVEIRA
________________________ SUMRIO ________________________
1 Introduo. 2 O paradigma do Estado Democrtico de Direito. 3
Processo coletivo de interesse pblico e o acesso justia no
paradigma do Estado Democrtico de Direito. 4 Concluses
1 INTRODUO
A sociedade contempornea vivencia as consequncias das profundas
transformaes que a marcaram desde reestruturao do modelo capitalista resultante na
desregulamentao dos mercados financeiros que possibilitou a criao de novos produtos
financeiros e multiplicaram as possibilidades de lucros puramente especulativos e,
consequentemente, sem a necessidade de investimento e atividades produtivas (BOLTANSKI
E CHIAPELLO, 2009, p. 21). Tal reestruturao foi favorecida ainda pela elevao, ao
paroxismo, da internacionalizao das aes polticas e macroeconmicas globais inspiradas
no pensamento neoliberal hegemnico que, por sua vez, foi potencializada pela extraordinria
evoluo das novas tecnologias da comunicao. Tais transformaes decorrentes de uma
complexa interao de elementos multifacetrios proporcionaram uma expanso sem
precedentes do capitalismo coexistente com a da situao econmica e social de um nmero
cada vez mais crescente de pessoas. A esse revigoramento do sistema capitalista no
correspondeu, portanto, um progresso na rea social.
Ao contrrio, um tal estado da arte fez emergir uma relao paradoxal entre as
promessas da ordem jurdico-constitucional do estado democrtico de direito e a realidade
Doutor em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais. Mestre em Direito pela Universidade Federal
de Minas Gerais, Especialista em Direito Pblico pela FDMM. Professor adjunto da UFMG. Juiz Titular da 5
vara do Tribunal Regional do Trabalho 3 Regio. Doutora em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais. Mestre em Direito pela Universidade Federal
de Minas Gerais. Professora associada da Universidade Federal de Minas Gerais. Vice-Diretora da Diviso de
Assistncia Judiciria da Faculdade de Direito da Universidade Federal de Minas Gerais. Procuradora do Estado de Minas Gerais. Mestranda em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais.
Especialista em Direito Material e Processual do Trabalho.
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decorrente das transformaes ditadas por foras hegemnicas neutralizadoras da funo
transformadora destas novas ordens jurdicas. concomitante ampliao normativa dos
direitos sociais corresponde emergncia dos conflitos de massa oriundos e da leso massiva
e sistmica dos direitos sociais e da incapacidade do sistema judicirio de responder s
demandas oriundas deste cenrio. A isto se soma a persistncia de cultura jurisdicional
individualista calcado no paradigma do estado liberal, apesar de, uma vez mais, no plano
normativo a ao coletiva detenha lugar privilegiado na nova ordem jurdica brasileira.
Sem perder de vista o amplo espectro dos elementos implicados na configurao
deste contexto de ausncia de efetividade dos direitos sociais e de crise da justia, o alvo do
presente artigo analisar o processo coletivo, enquanto instrumento promotor do acesso
justia (CAPPELLETTI, 1991) e de realizao de direitos fundamentais, sob o paradigma do
Estado Democrtico de Direito. Restringe-se, portanto, por questo metodolgica,
perspectiva tecno-processual, reservando para estudos posteriores as indispensveis
abordagens inter e transdisciplinares para a apreenso da questo numa perspectiva mais
abrangente e complexa.
A perspectiva adotada a da tutela processual coletiva, como processo de
interesse pblico1, luz da teoria da instrumentalidade do processo (DINAMARCO, 1996).
A tnica do acesso justia envolve a compreenso dos institutos processuais
sob um espectro de democracia, de participao e de afirmao de direitos fundamentais.
Como tal, contrape-se a uma viso engessada, eminentemente privatista, isoladora e
tcnica da ordem processual. 2
A relevncia do movimento de acesso justia est na busca pela conformao do
processo s atuais demandas sociais de celeridade e efetividade, em prol da edificao do
carter instrumental e social do processo.
Nesse contexto, em face das mltiplas formas de litigiosidade, a tcnica
processual preocupa-se em erguer mecanismos aptos proteo e afirmao de interesses
mltiplos, despontando a tutela processual coletiva.
O manto sobre o qual se realiza o processo coletivo tecido sobre um ideal de
sensibilidade social (DINAMARCO, 1996), uma vez que as decises proferidas em sede de
ao coletiva possuem a qualidade de imprimir reflexos a um maior nmero de pessoas e,
assim, o potencial de solues mais equnimes e democrticas, dirigidas s demandas de
interesse pblico.
1 Refere-se ao entendimento segundo o qual o processo coletivo se presta s demandas judiciais que envolvam
interesses referentes preservao da harmonia e realizao dos objetivos constitucionais da sociedade, ou
seja, defesa de interesses pblicos primrios (DIDIER JNIOR, 2010), bem como o fomento aos direitos
fundamentais.
Vale afirmar que o termo interesse pblico equvoco e passvel de divergncias conceituais. No obstante,
assenta-se que o nico interesse pblico legtimo aquele que coincide com os interesses da coletividade
delimitados pelo paradigma normativo da ordem jurdica. Nesse sentido, o interesse pblico a que se refere o
interesse pblico primrio e nunca o interesse pblico secundrio, enquanto vontade egostica da administrao
pblica momentaneamente instalada. Desta feita, a primazia do interesse pblico atualmente, a despeito de
imperiosa, demanda a ponderao de valores e aplicao da proporcionalidade, a fim de fixar o interesse social
prevalente. (CARVALHO, 2008). 2 Dinamarco no afasta a essncia tcnica do processo, mas defende a instrumentalidade do processo afeta
tambm realidade social e poltica (1996). No se descuida do entendimento contrrio ao carter
instrumentalista do processo, no qual se defende o processo como um direito e como criador e regente do prprio
direito, mas nunca como instrumento de realizao de direitos (SILVA, 2012).
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Emerge a temtica do carter de interesse pblico do processo coletivo, sob as
premissas erigidas no Estado Democrtico de Direito.
2 O PARADIGMA DO ESTADO DEMOCRTICO DE DIREITO
A maioria dos autores constitucionais, conforme revelam os estudos de direito
comparado est de acordo em que o do estado democrtico de direito corresponde a uma
profunda alterao no paradigma do estado constitucional, de tal ordem a autorizar a
referncia a um estado (neo)constitucional ou mais precisamente a vrios (neo)
constitucionalismos (CARBONELL, 2005, p. 9).
Trata-se da superao do estado de direito legislativo, no sendo mais adequada a separao entre lei e justia. Devemos, portanto, admitir que o direito contemporneo
compe-se de regras e de princpios, ambos eivados de idntica natureza normativa
(ZAGREBELSKY, 2005, p. 109). Esta perspectiva transcende a uma concepo positivista e
individualista da jurisdio, uma que esta alcana um sentido atrelado normatividade dos
princpios constitucionais de justia e efetividade dos direitos. Nesse sentido o processo
coletivo assume posio privilegiada na ordem jurdico-processual, compreendia em conexo
com o direito constitucional. Jos Afonso da Silva (2005) esclarece que o Estado de Direito
a forma de Estado em que so fixadas diretrizes normativas para organizar e limitar o
exerccio do poder. A noo de democracia, ento, surge como um qualificativo de contedo
material, a diretriz fundamental da atuao do poder, na medida em que abre espao para a
participao popular com nfase nos direitos fundamentais3.
A ps-modernidade transcende a lio da democracia formal representativa,
manifestada primordialmente no exerccio do direito poltico constitucional do voto, volvendo
vistas a uma noo de democracia considerada sob um vis substancial. Esse qualificativo
democrtico elemento legitimador do poder, ento constitudo juridicamente, no qual o
cidado se insere nos centros de deciso poltica e participa ativamente dos destinos coletivos
(democracia substancial). Trata-se da chamada legitimao democrtica do poder (SILVA,
2005) o que se coaduna com a doutrina que considera a democracia como uma dimenso
indissocivel do Estado de Direito, cuja eventual ciso torna o Estado de Direito um
esqueleto de princpios e regras formais (CANOTILHO, 1999)4.
A democracia substancial pauta-se na afirmao dos direitos humanos, reconhecidos
pela observncia de valores inerentes pessoa, indutivos das aes e das escolhas polticas e
exigveis de toda a sociedade e do prprio Estado (SOUZA NETO, 2012). O cidado sai da
posio inerte de espectador e de mero reivindicador de direitos e concretizaes substanciais da
democracia representativa, assumindo postura decisiva nas escolhas e na gesto pblicas.
Nesse paradigma, a democracia assume um carter ligado efetivao de direitos e
garantias fundamentais individuais e coletivos, vinculando Estado e sociedade em prol da
transformao da realidade social, compartilhando responsabilidades e esforos para o bem comum.
3 Para os fins desta proposta, os direitos fundamentais variam conforme a modalidade de Estado, a ideologia e os
princpios consagrados na Constituio, sendo, pois, reflexos dos direitos humanos em cada Estado. Neste sentido,
a fundamentalidade a expresso da indispensabilidade daqueles direitos para a organizao social, poltica e
econmica de uma dada sociedade, a base a ser observada nas relaes intersociais (BONAVIDES, 2009). 4 A despeito da ciznia entre doutrinadores e operadores do direito que vislumbram reticncias entre a integrao
do Estado de direito e a Democracia, comunga-se da doutrina que conjuga as duas expresses enquanto
dimenses qualificadoras do Estado, por todos, cita-se Canotilho, J. J. Gomes (1999).
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A noo de democracia substancial coincide com a denominada democracia deliberativa5 qual se refere Vicente de Paulo Barreto (2006), na qual a cidadania no se restringe ao exerccio do direito poltico, mas clama por uma participao social ativa em todo
processo democrtico de elaborao de leis, de gesto pblica e de resoluo de conflitos
sociais (cidadania social e participativa).
O Estado Democrtico de Direito , portanto, um Estado no qual o poder -
constitudo democraticamente como resultado da soberania popular- exercido dentro de
limites juridicamente estabelecidos e que se pauta nos ditames dos direitos fundamentais,
tornando o cidado corresponsvel pelos destinos da sociedade. o mote onde as relaes
entre Estado e sociedade so redesenhadas na busca pela complementaridade entre a
realizao pessoal do indivduo e a harmonia das relaes sociais.
Entremeio as premissas de participao e de cidadania ativa, de incluso nos
centros de poder, elevando o contedo emancipador da democracia, incorpora-se a
essencialidade da tutela processual coletiva como instrumento de transformao da realidade
social e de consumao de direitos fundamentais.
3 O PROCESSO COLETIVO DE INTERESSE PBLICO E O ACESSO JUSTIA
NO PARADIGMA DO ESTADO DEMOCRTICO DE DIREITO
Sob as vestes do referencial terico elementar acaudilhado por Cappelletti (1991), o
acesso justia um movimento em prol da afirmao do carter instrumental6 e socializante do
processo, bem como de anlise crtica dos instrumentos oferecidos aos indivduos para tornar
efetiva a prestao jurisdicional. A partir da constatao de problemas concretos, o movimento de
acesso justia permite erigir solues favorveis adequao da resposta jurisdicional ofertada.
da essncia desse movimento a concepo do processo como um
instrumento de realizao efetiva dos direitos violados ou ameaados de violao, um
processo a servio de metas, no apenas legais e jurisdicionais, mas tambm sociais e
polticas (THEODORO JNIOR, 1999).
A temtica do acesso justia deve ser observada tendo como esteio os
paradigmas do Estado Democrtico de Direito e a valorizao do processo, que se mostra um
imperativo da prpria estrutura democrtica, porquanto, inefetivo o reconhecimento dos
direitos fundamentais se desacompanhados de instrumentos que os imponham. Boaventura
Santos (2008) assevera que uma vez destitudos de mecanismos que fizessem impor o seu
respeito, os direitos passariam a meras declaraes de contedo e funo mistificadores7.
5 Vicente de Paulo Barreto trata da democracia deliberativa em que se busca a integrao entre a democracia
representativa (poltica), caracterizada pelo Estado representativo; a democracia liberal, afeta ao exerccio do
poder sob o vis do liberalismo; e a demanda pela realizao de direitos humanos e pela participao social ativa
e responsvel em que a sociedade se insere nos planos decisrios da gesto pblica como um sujeito capaz de
alterar a prpria realidade (2006). 6 A instrumentalidade do processo repousa suas razes na tese de que o processo no um fim em si mesmo, mas
antes um instrumento de realizao efetiva de direitos, no possui valor absoluto e no pode se distanciar das
normas substanciais e das exigncias sociais de pacificao de conflitos (DINAMARCO, 1996, p. 379). 7 Nesse sentido, Antnio Gomes de Vasconcelos reconhece o esgotamento da concepo formal do princpio de
democracia, no diz respeito aos mecanismos de positivao e de reconhecimento dos diretos: Esse modelo encontra-se exaurido. Defronta-se com a crise de insuficincia do modelo de racionalidade da filosofia
(epistemologia da conscincia) e da cincia moderna (mtodo cientifico) transposto para o direito moderno que tende a acreditar que a mera existncia dos direitos no plano normativo e de instituies encarregadas de sua
operacionalizao realiza a justia, independentemente da sua efetividade.
ANTONIO GOMES VASCONCELOS et al. O processo coletivo e o acesso justia sob o paradigma do estado democrtico ..._____
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O direito ao acesso efetivo justia tem sido progressivamente reconhecido
como sendo de importncia capital entre os direitos individuais e sociais. A titularidade
de direitos destituda de sentido, na ausncia de mecanismos para sua efetiva
reivindicao (CAPPELLETTI, 1996).
Esse arcabouo permite destacar a perspectiva da teoria da complexidade8, pela
qual todo tema deve ser considerado a partir de uma anlise complexa, no
particularizada. Ora, se assim, no se pode enfrentar a crise da jurisdio9 partindo-se de
uma viso minimalista e individualizada, relativizando a tcnica processual. A elevao de
mecanismos alternativos de soluo de conflitos10, com carter desjudicializador, no
pode ser considerada como a panaceia de todos os males, uma vez que, o processo
essencial afirmao da democracia no Estado de Direito e, consequentemente,
implementao de direitos fundamentais.
Defende-se a noo do processo focado no compromisso estatal,
constitucionalmente formulado, de exercer a atividade jurisdicional (ou poder de jurisdio)
com vistas sustentao de direitos e garantias fundamentais.
O Processo deve ser acolhido como um instrumento para a realizao dos fins
sociais do Estado, uma ferramenta fundamental de alcance dos objetivos essenciais da
sociedade, possuindo, pois, funo social e construtiva. Dessa feita, seu estudo parte da
premissa de que a cincia jurdica humana, normativa, aplicada e contextualizada,
associando-o aos diversos aspectos histricos, culturais, polticos e econmicos existentes no
mbito de sua aplicao, a fim de que se justifique.
Tem-se que a funo social do processo, nas palavras de Jos Carlos Barbosa
Moreira (2001), est no estmulo eliminao das diferenas (maior igualdade) e na primazia
dos interesses coletivos sobre os individuais.
Essa a conjuntura que exalta o processo coletivo como meio de acesso
justia, por se prestar participao social, na medida em que tutela direitos que espraiam
seus nortes para alm do acervo jurdico do indivduo singularmente considerado. A ideia
fundante do processo coletivo possibilitar a cognio judicial dos interesses
metaindividuais por iniciativa de um nico ente intermedirio, legalmente legitimado para
a tutela de direitos da coletividade, a fim de incrementar o acesso justia, o que remete
essncia de interesse pblico do processo coletivo, e, consequentemente, de instrumento
realizador de direitos fundamentais.
8 A teoria mencionada propugna que os pressupostos da razo dialgica e da complexidade, norteadores do
conhecimento e da ao (ao pblica jurisdio e administrao), para os quais avanou a filosofia da linguagem e a cincia contemporneas (que aceitou o papel do sujeito, da incerteza e da desordem na busca do
conhecimento cientfico), so coerentes com os fundamentos e os princpios democrticos do Estado
Democrtico de Direito (CF/88) e com a dinmica da sociedade contempornea (VASCONCELOS, Antnio
Gomes de. Pressupostos filosficos e poltico-constitucionais para a aplicao do princpio da democracia
integral e da tica de responsabilidade na organizao do trabalho e na administrao da justia: o sistema
ncleos intersindicais de conciliao trabalhista: estudo de caso a questo trabalhista regional e os resultados da instituio matricial de Patrocnio-MG (19942006).907 f. Tese de Doutorado Universidade Federal de Minas Gerais, Faculdade de Direito, defendida em dezembro/ 2007.) 9 Refere-se s mesas de debate acerca das carncias da jurisdio, da cultura de damandismo e da litigiosidade
em repetio, bem como da morosidade da justia e da necessria celeridade do processo. 10Refere-se s formas alternativas de soluo de conflitos e fortalecimento de mecanismos de preveno de
litgios, ao que se d louvor.
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Ricardo de Barros Leonel (2002) esclarece que o processo coletivo tem intensa
dimenso poltica, pois o equacionamento dos conflitos a ele relativos implica em escolhas
polticas, trazendo sociedade a possibilidade de influir em decises fundamentais do Estado
atravs do exerccio da jurisdio coletiva.
A par do exposto, a funo social do processo coletivo deve ser ainda reconhecida
na sua formulao enquanto meio de soluo de conflitos que oportuna a realizao e a defesa
de direitos sociais, na medida em que a teorizao dos direitos metaindividuais e sua definio
legal11 serve como facilitador do reconhecimento de direitos fundamentais sociais, ampliando
os meios de sua deduo em juzo12 (LEITE, 2001).
Esse o entendimento que imprime carter de interesse pblico ao processo coletivo,
como um instrumento a favor do interesse pblico primrio erigido pelos grupos sociais e
almejado pela sociedade, cujo escopo a manuteno do Estado Democrtico de Direito.
Nesse sentido, o processo coletivo, alm de se consubstanciar em instrumento de
tutela de direitos coletivos em sentido amplo, deve conter em seu conceito o elemento de
litigao de interesse pblico, seno pela natureza transcendente dos direitos que visa proteger, pela potencialidade de servir preservao da harmonia e a realizao dos objetivos
constitucionais da sociedade (DIDIER JNIOR, 2010).
Assim que a tutela metaindividual sobrepe-se em importncia e efetividade,
despontando o privilgio s decises coletivas, visto que capazes de influir nos destinos polticos
da sociedade e de se projetarem para alm da relao processual definida pelas partes.
A sistematizao e edificao de um processo coletivo efetivo esta absolutamente
ligada noo de democracia em uma sociedade pluricntrica, vez que somente a
manifestao de interesses coletivos capaz de influir na perspectiva poltica do Estado.
Nas lies de Boaventura Santos (2008), a mobilizao poltica e cidad s faz
sentido se houver interesse coletivo e mecanismos erigidos para sua tutela efetiva e eficiente,
cuja manifestao adequada aos nortes da ao coletiva.
4 CONCLUSES
A noo de um Estado Democrtico de Direito a noo de interao entre as
dimenses de participao social no processo de elaborao do direito e na definio e
execuo dos fins do Estado, sempre e absolutamente volvidos edificao e concretizao
de direitos fundamentais das diversas geraes. Trata-se, pois, de paradigma construdo sob
a premissa da participao ativa e responsvel dos cidados na realizao do projeto social
que se forjou Constitucionalmente.
Sob tal paradigma, o processo dirige suas atenes afirmao de seu carter
instrumental e sua adequao s novas realidades sociais constatadas. Edifica-se como um
sistema arquitetado sob as estruturas da socializao, do acesso justia e da realizao de
direitos fundamentais. O processo concorre para a consagrao da cidadania e para a interao
11 Artigo 81 do Cdigo de Defesa do Consumidor. 12 Neste sentido , bem de ver, o artigo 83, III, da LOMPU, encampa a tese defendida ao prescrever a ao civil
pblica trabalhista como instrumento hbil a defesa dos direitos coletivos dos trabalhadores em face do
desrespeito aos direitos sociais trabalhistas constitucionalmente garantidos.
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entre a realidade social e o direito material. O que impe a formulao, reformulao,
reinterpretao e revisitao de prticas, institutos, regras e princpios jurdicos em prol do
alcance dessa finalidade.
O Estado Democrtico de Direito eminentemente um Estado de justia material
social, e um Estado de justia um Estado no qual a jurisdio se faz presente (CANOTILHO,
1999). Sendo assim, o Estado Democrtico de Direito indissocivel do processo, enquanto, um
mecanismo disponibilizado pelo ordenamento jurdico para a concretizao de direitos. De que
vale a positivao de direitos pela seara legislativa ou jurisprudencial, quando apartados
mecanismos democrticos com mpeto de impor sua efetivao.
No se concebe uma ordem processual isolada e absorta em regras tcnicas
distanciada da realizao da ordem constitucional que projeta a sociedade e eleva os direitos
fundamentais dos membros que a compe, condio de direito pblico primrio, primeiro,
acima do interesse pblico secundrio.
O grande servio prestado pela moderna doutrina processualista, com lastro em
uma noo social e instrumental do processo, foi a afirmao do comprometimento da
ordem jurdica processual com valores constitucionalmente estabelecidos enquanto um
patamar mnimo de cidadania e dignidade. Assim que o processo coletivo se mostra
absolutamente absorto pelo carter instrumentalista do processo por ser conformado pela
participao democrtica da sociedade na jurisdio. O devido processo legal coletivo
redefine os institutos processuais clssicos em favor da efetividade do processo coletivo
para afirmao de seu sentido.
O processo coletivo distingue-se do processo individual, em importncia, pela
marca que ostenta de interesse pblico, uma vez que possui o potencial de estender suas
decises para um grande nmero de pessoas e de influir nos planos polticos da sociedade.
a tutela coletiva processual que possui o potencial de descortinar as demandas
da sociedade, dadas as conformaes do devido processo legal coletivo e de transformar a
realidade factual atravs da extenso subjetiva da coisa julgada coletiva.
Alm disso, a tutela processual coletiva possui o condo de prevenir conflitos por
intermdio da ao jurisdicional, j que capaz de determinar a conduta pblica em vistas de
ameaa de leso a direitos. Esse o mais relevante sentido do processo coletivo e, em sntese,
o que o configura como um processo de interesse pblico por essncia a possibilidade de
influir nas diretrizes polticas pautadas pelos bens jurdicos tutelados por meio das aes
coletivas preventivas e reparatrias.
Os males causados pela persistncia do modelo liberal-individualista como
paradigma ainda hegemnica que orienta a prtica judiciria e o dfice de efetividade da
jurisdio remetem o processo coletivo a um plano secundrio, destituindo-o de sua funo
estratgica na realizao de direitos fundamentais substanciais, na pacificao social e na
realizao da justia. Ao se reconhecer sua funo estratgica na realizao do projeto de
sociedade coerente com o estado democrtico de direito inscrito na constituio federal,
confere-se-lhe o status de instrumento processual de elevado interesse pblico, pondo em
relevo seu potencial transformador da sociedade e sua aptido para influir e inibir escolhas
polticas contrrias o princpio de justia fundante da sociedade brasileira.
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O PRINCPIO DA ISONOMIA, O PROJETO DE NOVO CPC E UMA
SINGELA CONSTATAO
LEONARDO OLIVEIRA SOARES
________________________ SUMRIO ________________________
1 Introduo. 2 Disciplina do tema no CPC vigente. 3 Disciplina da
matria no PLS 166/2010 e no PLC 8.046/2010. 4 Projeto de CPC e a
sociedade civil: uma constatao. 5 Uma ltima justificativa para o
exame (atual e futuro) da matria. 6 Concluso.
1 INTRODUO
No escrito1 analisa-se a diferena de regramento dispensada Fazenda Pblica no
Projeto de CPC (PLS 166/2010), atualmente PLC 8.046/2010 em tramitao na Cmara dos
Deputados2. Mais especificamente, a compatibilidade da distino de prazos prevista no
Projeto em tela com o princpio constitucional da isonomia e, ao fim das contas, com o devido
processo legal do Estado Democrtico de Direito brasileiro. A rigor, o tema, em si mesmo
considerado, nada traz de singular. Com efeito, eis que a diversidade de tratamento no se
constitui em exclusividade do mundo do direito, pois, tambm nas relaes interpessoais,
ocioso dizer, casos similares, vez por outra, recebem ateno particularizada. Basta pensar,
por exemplo, no que ocorre nas relaes entre professores e alunos, ou entre pais e filhos.
Certo , contudo, que, no direito, como, de resto, na vida, as distines somente
podero ser admitidas caso estejam fundadas em critrios racionais e no discriminatrios.
No menos certo, de outro lado, que nem sempre essa particularidade considerada para
levar a cabo as diferenciaes.
Em sntese, e a ttulo de desfecho da introduo, somente a partir das muitas
situaes da vida que se poder refutar ou no determinado modo particular de, por assim
dizer, ver as coisas. Insista-se, no mundo jurdico no menos que no plano das relaes
interpessoais. Sim, pois o conjunto de regras e princpios que recebe a denominao de
Direito trar sempre, em seu interior, as mesmas limitaes, contradies e possibilidades
de efetivao que o ser humano, ai de ns!, experimenta, diuturnamente, na busca de seu
afirmar-se enquanto tal.
* Procurador do Estado de Minas Gerais. Advogado Regional Adjunto em Ipatinga. Mestre em Direito
Processual pela PUC-MG. Membro da Academia Brasileira de Direito Processual Civil. Professor de Teoria
Geral do Processo e Processo Civil na Faculdade de Direito de Ipatinga. 1As prerrogativas processuais do Poder Pblico previstas no PLS 166/2010 e no PLC 8046/210 foram objeto de
exame noutro estudo, para o qual se remete o leitor interessado no assunto. A atuao da Fazenda Pblica em
juzo no Projeto de CPC em tramitao legislativa: consagrao de prerrogativas ou de privilgios ao Poder
Pblico no Estado Democrtico de Direito brasileiro? In: SILVA, Jos Anchieta da (Org.). O novo processo
civil. So Paulo: Lex Magister, 2012. 2Resumo da tramitao em aludida Casa Legislativa pode ser lida em:
. Acesso em: 10 abr. 2013.
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Para que a abordagem se faa de modo mais abrangente, ser apresentado o modo
como o CPC em vigor e aludidos Projetos Legislativos cuidam do tema. Em contrapartida ao
entendimento defendido no texto, dar-se- notcia de judicioso Projeto Substitutivo
recentemente apresentado Cmara dos Deputados, no qual o assunto recebeu disciplina
diversa. A partir da, finaliza-se o trabalho com destaque para o carter plural das discusses
atuais por que passa a aprovao do futuro CPC ptrio.
2 DISCIPLINA DO TEMA NO CPC VIGENTE3
Segundo o art. 188 do CPC vigente, goza o Poder Pblico de prazo em qudruplo
para contestar (rectius: responder) e em dobro para recorrer. Previso, diga-se, que alcana o
Ministrio Pblico. Ao propsito, confira-se a lio de NERY JR.4:
Poderia parecer primeira vista que as prerrogativas processuais concedidas,
por exemplo, Fazenda Pblica e ao Ministrio Pblico (prazo em dobro para
recorrer e em qudruplo para responder CPC 188) infringiriam o princpio constitucional da igualdade.
Entretanto, o que princpio constitucional quer significar a proteo da igualdade
substancial, e no a isonomia meramente formal.
Nada obstante a judiciosa ponderao ora citada, vale a pena ainda insistir na
seguinte pergunta: estar a norma ora gizada de acordo com o princpio constitucional da
isonomia (art. 5, caput da CF/88)? Por outras palavras, ter sido recepcionada, haja vista o
Estado que se buscou, e se busca, enfatize-se, implantar com a Carta Democrtica de 1988? A
reposta ser desdobrada em duas indagaes. Ou melhor, resultar do modo como se prope
equacion-las. Eis ento os questionamentos: a distino de prazos necessariamente
incompatvel com o devido processo legal? Ainda que no o seja, haver justificativa racional
para sustentar-se a diferenciao?
Quanto primeira pergunta, no preciso muito esforo para encontrar situaes
similares que recebem disciplina distinta em nosso dia a dia. Aqui, o pai oferece a um dos
filhos algo que no ser dado ao outro. Ali, o professor, no meio de exposio terica, permite
a aluno dedicado interromp-lo para formular perguntas que jamais seriam respondidas, caso
viessem de aluno pouco frequente.
Ora, se assim no mundo da vida, sendo irrelevante cogitar, neste momento, da
valorao que comportem tais distines, no se pode, seno ingenuamente, supor que o
conjunto de regras que disciplina a atividade estatal de dizer o direito haveria de permanecer
imune marca registrada de seu criador. Afinal, v a obviedade, o direito criao humana!
Talvez a mais eloquente manifestao da isonomia resida na constatao de que
somos nicos, singulares. Sim, o que nos iguala , precisamente, o fato de sermos diferentes!
Do que se acaba de dizer no se extrai que o dispositivo em foco do CPC se
apresenta, necessariamente, compatvel com a Constituio ptria. De fato, para tanto, deve
encontrar-se critrio racional e no discriminatrio, justificador da diferenciao em exame.
3 O tpico corresponde, em pequena parte, ao quanto exposto sobre o ponto (diferenciao de prazos) no trabalho
citado em nota n. 01, tendo sido, entretanto, objeto de reviso e acrscimo, inclusive de notas de rodap. 4 Princpios do processo na Constituio Federal. 9.ed. rev., ampl. e atual. So Paulo: Revista dos Tribunais,
2009. p. 100.
LEONARDO OLIVEIRA SOARES. O princpio da isonomia, o projeto de novo CPC e uma singela constatao________________
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DIREITO PBLICO: REVISTA JURDICA DA ADVOCACIA-GERAL DO ESTADO DE MINAS GERAIS n.1, jan./dez. 2013___
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Passa-se, pois, a responder ao segundo questionamento.
Ora, no difcil (ser?) sustentar que a fazenda pblica zela (deve zelar) pelos
interesses jurdicos da coletividade que, ao fim e ao cabo, ser a destinatria das decises
proferidas no processo (rectius: suportar a imutabilidade do dispositivo da deciso
declaratria, constitutiva ou condenatria proferida contra o Poder Pblico).
Com efeito, pois, no final das contas, o patrimnio pblico que ser alcanado,
v.g., pelas condenaes em decorrncia de atos5 ou omisses de agentes pblicos em
desacordo com a legalidade democrtica.
Ainda na rbita patrimonial, e nada obstante tratar-se de pretenses executivas
cujo exerccio no ser, por isso, regido pela primeira parte do disposto no art. 188 do CPC,
no se pode negar que interessa coletividade o recebimento de crditos exigidos em sede de
execuo fiscal. Aos menos em tese, eis que destinados a viabilizar a pronta realizao das
muitas obrigaes constitucionais impostas ao Estado ptrio. Ou ser que a m aplicao dos
recursos pode ser admitida como fundamento legtimo para deixar-se de recolher aos cofres
pblicos tributos institudos segundo as determinaes legais e constitucionais vigentes? Ou
servir para considerar que toda e qualquer disciplina especfica voltada satisfao de
cogitados crditos seja necessariamente inconstitucional?
Feita essa pequena observao, mostra-se oportuno citar a lio doutrinria de
Luiz Fux6, hoje, Ministro do STF, e que presidiu a comisso encarregada de elaborar o PLS
166/2010, segundo a qual:
A finalidade da norma excepcional a proteo do interesse pblico; por isso a
Fazenda diferentemente do particular, vela em juzo por objetos litigiosos difusos,
tornando evidente que a prerrogativa no ofende o princpio isonmico encartado na Constituio Federal (aspas no original).
Se assim , vislumbra-se critrio racional e no discriminatrio que justifica a
diferenciao de prazos. Por outras palavras, o art. 188 do CPC compatvel com o
devido processo legal.
3 DISCIPLINA DA MATRIA NO PLS 166/2010 E NO PLC 8.046/2010
O Projeto de CPC em trmite legislativo estatui que a Fazenda Pblica gozar de
prazo em dobro para todas as suas manifestaes no processo. Eis o modo como o tema foi
disciplinado no PLS 166/2010, in verbis:
Art. 95. A Unio, os Estados, o Distrito Federal, os Municpios e suas respectivas
autarquias e fundaes de direito pblico gozaro de prazo em dobro para todas as
suas manifestaes processuais, cuja contagem ter incio a partir da vista pessoal
dos autos, mediante carga ou remessa.
5 Por certo, a ilicitude da conduta do agente estatal ou de quem lhe faa s vezes no se constitui em requisito
necessrio para ensejar a responsabilizao objetiva do Estado. 6 FUX, Luiz. Curso de direito processual civil. 4.ed. Rio de Janeiro: Forense, 2008. v. 1, p. 337. Vide tambm
NERY JR., Nelson. Princpios do processo na Constituio Federal. Op. cit., p. 96-105. Em sentido contrrio,
DINAMARCO, Cndido Rangel. Instituies de direito processual civil. 6.ed. So Paulo: Malheiros, 2009. v. 2,
p. 216-217. SCARPINELLA BUENO, Cssio. Curso sistematizado de direito processual civil. So Paulo:
Saraiva, 2007. v. 1, p. 124.
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No PLC 8.046/2010, atualmente sob apreciao da Cmara dos Deputados, o
assunto recebeu tratamento similar, com a ressalva do termo a quo para fluncia do prazo.
Segue o dispositivo, in verbis:
Art. 106. A Unio, os Estados, o Distrito Federal, os Municpios e suas respectivas
autarquias e fundaes de direito pblico gozaro de prazo em dobro para todas as
suas manifestaes processuais, cuja contagem ter incio a partir da vista pessoal
dos autos (sem destaque no original).
Nada obstante a justificativa apresentada no item anterior (titularidade difusa dos
direitos controvertidos, ao menos se considerada a posio ocupada pela Fazenda Pblica no
processo) seja o principal fundamento para justificar, salvo melhor juzo, a distino de
tratamento em exame, apontaram-se, noutro trabalho7, fatores secundrios, mas que, nem por
isso, devem ser desconsiderados na disciplina da matria. So eles: a) as dificuldades
inerentes obteno de informaes, perante o rgo da administrao envolvido, para
subsidiar a elaborao da defesa e b) o nmero de demandas em que o Poder Pblico figura
como parte. Ainda naquele estudo8, e sobre este ltimo ponto, enfatizou-se que:
O fato de ter havido efetiva alterao nos quadros das Procuradorias encarregadas da
representao judicial das pessoas jurdicas de direito pblico no afasta o ponto
salientado no texto. Com efeito, pois as garantias constitucionais de acesso justia
(art. 5 XXXV) e de obteno de gratuidade para demandar em juzo (art. 5,
LXXIV), fizeram e fazem eclodir aes das mais diversas a fim de que a sociedade
(rectius: seus membros), legitimamente saliente-se, exija do Poder Pblico gama de
prestaes a que cada cidado brasileiro faz jus e que no se encontravam
contempladas em textos constitucionais anteriores.
Por outro lado, no se pode deixar de gizar que, em recente estudo, ao analisar as
tenses existentes entre garantias constitucionais, ilustre jurista denominou de segunda onda
de relativizao de cogitadas garantias a que se efetiva mediante a edio de leis contrrias ao
devido processo legal.
E dentre tais atos normativos, inseriu o que prev prazos processuais diferentes
para a Fazenda Pblica e o Ministrio Pblico. Eis a passagem9:
A ideia da possibilidade jurdica de relativizao de garantias constitucional-
processual ou de que inexistem garantias constitucionais absolutas e que, portanto,
so todas mitigveis, no Brasil, goza de largo prestgio e obtm trnsito fcil,
inclusive ensejando consciente ou inconscientemente a possibilidade de que leis infraconstitucionais arranhem, sem pejo, as garantias de assento constitucional, fazendo nascer uma verdadeira segunda onda de relativizao (aspas no original).
7 SOARES, Leonardo Oliveira. O prazo prescricional das aes (pretenses) indenizatrias propostas contra o
Poder Pblico no Estado Democrtico de Direito brasileiro. Revista de Processo, n. 195, p. 154. 8 Idem, p. 154, nota de rodap n. 41. 9 PORTO, Srgio Gilberto. A regncia constitucional do processo civil brasileiro e a posio do Projeto de um
novo Cdigo de Processo Civil. Revista Sntese Direito Civil e Processual Civil, So Paulo, n. 72, p. 72-73,
jul./ago. 2011. Em dois recentes trabalhos, o tema relativizao, no caso, da garantia constitucional da coisa
julgada, foi objeto de nossa anlise. Toma-se, pois, a liberdade de remeter o leitor interessado aos estudos: A
denominada coisa julgada inconstitucional e o processo civil de resultados no Estado Democrtico de Direito
brasileiro. Primeiros escritos de direito processual: faz escuro mas eu canto. Belo Horizonte: Del Rey, 2013 e
Novas consideraes sobre a proposta extrassistmica de flexibilizao da coisa julgada no Estado Democrtico
de Direito brasileiro. Revista Forense, Rio de Janeiro, n. 415, jan./jun. 2012.
LEONARDO OLIVEIRA SOARES. O princpio da isonomia, o projeto de novo CPC e uma singela constatao________________
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Decerto no se vai aqui examinar um a um os dispositivos relacionados atuao
da Fazenda Pblica e do Ministrio Pblico no processo. Sem embargo autoridade do autor
cuja judiciosa lio acaba de ser apresentada, com apoio nas razes elencadas nos tpicos 2 e
3 do presente trabalho, chega-se, contudo, concluso de que o Projeto de CPC em exame
no viola, no particular10, o mandamento constitucional da isonomia.
4 PROJETO DE CPC E SOCIEDADE CIVIL: UMA CONSTATAO
Em notcia publicada no stio eletrnico do renomado Instituto Brasileiro de
Direito Processual11, colhe-se informao de que terceiro Projeto de CPC foi recentemente
apresentado Cmara dos Deputados.
O primeiro ponto que merece destaque e aplausos consiste na iniciativa, pois as
muitas teorias desenvolvidas pelos eminentes juristas12 elaboradores do Substitutivo ora
citado decerto melhor aproveitaro ao homem comum a partir da aplicao concreta nos casos
levados apreciao do Poder Judicirio.
Sob essa perspectiva, nada mais salutar de que o oferecimento sociedade de
Texto de Lei cuja base axiolgica corresponde, sem sombra de dvidas, ao instituto
devido processo legal, clusula ptrea do Estado Democrtico de Direito brasileiro.
Estado, vale salientar, que apresenta como fundamento primeiro o princpio constitucional
da dignidade da pessoa humana, a reclamar tempestiva e adequada proteo na via
jurisdicional (art. 5 LXXVIII da CF/88).
Fica, assim, o sincero reconhecimento. E para que no se tenham dvidas do
propsito do presente escrito, transcreve-se o trmino da exposio de motivos do Projeto em
tela, no qual h expresso convite ao debate, assim formulado:
Com essas breves consideraes, aguardamos de todos, inclusive e em especial dos
demais membros do Instituto Brasileiro de Direito Processual, as inafastveis
crticas e comentrios iniciativa ora apresentada. dela e deles, somando o que o
devido processo legislativo j forneceu, desde a iniciativa da Comisso de Juristas
encarregada de elaborar o Anteprojeto, e fornecer perante a Cmara dos Deputados,
que teremos, todos, um melhor Cdigo de Processo Civil.
Pois bem. Quanto ao tema, para o que interessa ao artigo, destaca-se que o Projeto
em questo elimina a disciplina diversa para o atuar da Fazenda Pblica em juzo, ao
fundamento de que a diferenciao se mostra incompatvel com a efetividade do direito material
e com a desejada eficincia administrativa. Seguem as razes apresentadas para tanto:
Propomos a eliminao de todas as prerrogativas da Fazenda Pblica, inclusive a
diferenciao de prazos e do reexame necessrio. Parece-nos, sempre com o
10 Para anlise crtica do Projeto, vide judicioso estudo de BRTAS, Ronaldo de Carvalho Dias. Comentrios ao
Projeto de novo Cdigo de Processo Civil aprovado no Senado Federal. Revista do Instituto dos Advogados de
Minas Gerais, Belo Horizonte, n. 17, p. 23-47, 2011. 11 Disponvel em: . Acesso em: 27 maio 2012. 12 A saber, Ada Pellegrini Grinover (Presidente de Honra do Instituto Brasileiro de Direito Processual); Carlos
Alberto Carmona (Secretrio-Geral do Instituto Brasileiro de Direito Processual); Cassio Scarpinella Bueno
(Diretor de Relaes Institucionais do Instituto Brasileiro de Direito Processual) e Paulo Henrique dos Santos
Lucon (Vice-Presidente do Instituto Brasileiro de Direito Processual).
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respeito ao entendimento contrrio13, que aquelas normas diferenciadas no se
sustentam mais, inclusive quando analisada a questo na perspectiva do direito
material e do princpio da eficincia, que deve reger toda a atividade administrativa (aspas no original)14.
No se espere, porm, uma crtica, por pequena que seja, ao respeitvel
posicionamento aqui apresentado. At porque as linhas redigidas anteriormente serviram para
que o ora subscritor abordasse, sob outra tica, verdade, o assunto.
Bem, no ser apresentada nenhuma sorte de objeo em vista de motivo singelo,
a saber: o trabalho, j em seu encerramento, visa a tornar explcita uma constatao, qual seja,
o Estado ptrio atual no mais e to somente o vilo autoritrio responsvel pelas mazelas
que (infelizmente) ainda afligem sociedade to desigual como a brasileira.
De fato, pois, do contrrio, discusses como a que fora proposta pelos destacados
juristas, autores do Projeto em comento - as quais, salientem-se, permanecem em aberto15 -
seriam, para usar de expresso mais ao gosto popular, pura e simplesmente remetidas para debaixo do tapete. Vem a calhar a passagem lanada na epgrafe16, eis que, de fato, no Estado Democrtico de Direito, nem de longe a comunidade jurdica se caracteriza pela e na
uniformidade de pensamento. Bem ao contrrio, a livre circulao de teses diversas a
medida certa do grau de desenvolvimento dessa comunidade.
Com esse registro, busca-se tambm retificar, quando nada amenizar, objeo que
se apresentou, em obra especializada,17 legitimidade mesma da mudana que se pretende
empreender no ordenamento ptrio. Na oportunidade, afirmou-se, linhas gerais, que a brevidade
com que o PLS 166/2010 fora votado no Senado, aliada ao fato de as audincias pblicas que
antecederam a apresentao do Texto de Lei ao Congresso haverem sido realizadas sem que a
comunidade jurdica tivesse conhecimento do contedo do Projeto Legislativo poderia acarretar
um, por assim dizer, dficit de legitimidade democrtica iniciativa.
Salvo melhor juzo, as inmeras audincias realizadas pela Cmara dos
Deputados18 para debater o Projeto, enfim de conhecimento pblico, somadas entrega,
naquela Casa Legislativa, de Substitutivo de autoria de renomados membros de Instituio
13 Salienta-se que um dos ilustres autores do Substitutivo j deixara registrado, em obra doutrinria, que o tema, contudo, dos mais polmicos. BUENO, Cssio Scarpinella. Curso sistematizado de direito processual civil, p. 124. 14 Nenhuma dvida, apressa-se em dizer, quanto obrigatoriedade de a Administrao Pblica encontrar-se
adstrita ao princpio constitucional da eficincia. De igual modo, o servio pblico de prestao de justia. A
rigor, independentemente da insero de aludido princpio no Texto Constitucional, pode mesmo ser dito que,
desde quando franqueado o acesso ilimitado aos Tribunais (art. 5, XXXV da CF/88) e proibida a autotulela,
obrigou-se o Estado ptrio a resolver de modo til - eficiente - os conflitos na esfera jurisdicional. 15 Confirma isso, recentssima publicao, na qual se l que os prazos diferenciados atentam contra o princpio
constitucional de durao razovel do processo. MEIRELES, Edilton. Durao razovel do processo e os prazos
processuais no Projeto de Cdigo de Processo Civil. Revista de Processo, n. 207, p. 200-205, maio 2012. 16 SOARES, Leonardo Oliveira. O requerimento de suspenso de eficcia de liminar como desdobramento do
direito fundamental do ru tutela jurisdicional adequada. Revista Dialtica de Direito Processual. So Paulo, n.
86, p. 65-73, maio. 2010. 17 A atuao da Fazenda Pblica em juzo no Projeto de CPC em tramitao legislativa: consagrao de
prerrogativas ou de privilgios ao Poder Pblico no Estado Democrtico de Direito brasileiro? In: SILVA, Jos
Anchieta da (Org.). O novo processo civil. So Paulo: Lex Magister, 2012. 18 As atividades de divulgao e debates sobre o Projeto, empreendidas naquela casa Legislativa encontram-se
listadas no stio eletrnico disponvel em:
. Acesso em: 27 maio 2012). De igual
modo, merece a louvvel iniciativa o reconhecimento da comunidade acadmica no menos que da sociedade
civil como um todo.
LEONARDO OLIVEIRA SOARES. O princpio da isonomia, o projeto de novo CPC e uma singela constatao________________
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representativa da sociedade civil, fazem com que a crtica supracitada seja recebida,
quando nada, com reservas.
No de desprezar-se, pois, o momento histrico ora vivenciado e que, oxal,
haver de persistir e robustecer-se.
5 UMA LTIMA JUSTIFICATIVA PARA O EXAME (ATUAL E FUTURO) DA
MATRIA
O PLC 8.046/2010 encontra-se em fase adiantada de votao na Cmara dos
Deputados19. Da poder-se-ia supor que sua eventual aprovao em referida Casa Legislativa,
seja nos moldes em que redigido o Projeto de Lei em foco, seja nos termos do judicioso
Substitutivo destacado no item anterior, acabar por tornar de pouca ou de nenhuma utilidade
o escrito j em seu trmino.
Digo-lhe, ento, exigente leitor, que independentemente da aprovao e do modo
como o tema ora objeto de anlise venha ser disciplinado no futuro CPC, nunca ser demais
discutir os limites e as mltiplas possibilidades de concretizao do princpio da isonomia em
pas ainda to repleto de distores. Debate, quase desnecessrio dizer, atinente esfera
processual, tanto quanto do direito material. E que, por certo, no se esgota nas duas
possibilidades acima consideradas. Vai j a concluso.
6 CONCLUSO
A diferena de tratamento dispensada a determinadas situaes similares no se
constitui em exclusividade do mundo do direito. Muito menos, d ensejo, por si s, a
discriminaes infundadas.
Assim, diante da titularidade difusa dos direitos discutidos no processo, afigura-se
justificada a diferena de prazos relacionados atuao da Fazenda Pblica em juzo.
Decididamente, caro leitor, o conjunto de regras e princpios a que se d o nome de
Direito - criao do gnio humano - levar sempre consigo a marca registrada de seu criador.
Carecer, contudo, de legitimidade democrtica e, pois, configurar manifesto
desrespeito ao mandamento constitucional da igualdade toda e qualquer disciplina jurdica
particularizada, fundada em critrio discriminatrio no justificvel racionalmente. Pouco
importando, neste caso, a quem aproveitar a transgresso em tela.
REFERNCIAS
BRTAS, Ronaldo de Carvalho Dias. Comentrios ao Projeto de novo Cdigo de Processo
Civil aprovado no Senado Federal. Revista do Instituto dos Advogados de Minas Gerais, Belo
Horizonte, n. 17, p. 23-47, 2011.
19 Da consolidao legislativa disponibilizada ao tempo em que se finaliza o escrito extrai-se que a diferena de
prazos foi mantida no Projeto de CPC (art. 184), aps os debates na Cmara dos Deputados Disponvel em:
Acesso em: 28 maio 2013.
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BUENO, Cssio Scarpinella. Curso sistematizado de direito processual civil. So Paulo:
Saraiva, 2007. v.1.
DINAMARCO, Cndido Rangel. Instituies de direito processual civil. 6. ed. So Paulo:
Malheiros, 2009. v. 2.
EXPOSIO DE MOTIVOS. Disponvel em:
. Acesso em: 27 maio 2012.
FUX, Luiz. Curso de direito processual civil. 4.ed. Rio de Janeiro: Forense, 2008. v. 1, p. 337.
MEIRELES, Edilton. Durao razovel do processo e os prazos processuais no Projeto de
Cdigo de Processo Civil. Revista de Processo, n. 207, p. 200-205, maio 2012.
NERY JR., Nelson. Princpios do processo na Constituio Federal. 9.ed. rev., ampl. e atual.
So Paulo: Revista dos Tribunais, 2009.
PORTO, Srgio Gilberto. A regncia constitucional do processo civil brasileiro e a posio do
Projeto de um novo Cdigo de Processo Civil. Revista Sntese Direito Civil e Processual
Civil, So Paulo, n. 72, jul./ago. 2011.
SOARES, Leonardo Oliveira. A atuao da Fazenda Pblica em juzo no projeto de CPC em
tramitao legislativa: consagrao de prerrogativas ou de privilgios ao Poder Pblico no
Estado Democrtico de Direito brasileiro? In: SILVA, Jos Anchieta da (Org.). O novo
processo civil. So Paulo: Lex Magister, 2012.
SOARES, Leonardo Oliveira. A denominada coisa julgada inconstitucional e o processo civil
de resultados no Estado Democrtico de Direito brasileiro. In: Primeiros escritos de direito
processual: faz escuro mas eu canto. Belo Horizonte: Del Rey, 2013.
SOARES, Leonardo Oliveira. Novas consideraes sobre a proposta extrassistmica de
flexibilizao da coisa julgada no Estado Democrtico de Direito brasileiro. Revista Forense,
Rio de Janeiro, n. 415, jan./jun. 2012.
SOARES, Leonardo Oliveira. O prazo prescricional das aes (pretenses) indenizatrias
propostas contra o Poder Pblico no Estado Democrtico de Direito brasileiro. Revista de
Processo, So Paulo, n. 195, maio 2011.
SOARES, Leonardo Oliveira. O requerimento de suspenso de eficcia de liminar como
desdobramento do direito fundamental do ru tutela jurisdicional adequada. Revista
Dialtica de Direito Processual, So Paulo, n. 86, maio 2010.
LEONARDO OLIVEIRA SOARES. O princpio da isonomia, o projeto de novo CPC e uma singela constatao_______________
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PROJETO DO NOVO CPC E A TUTELA DE EVIDNCIA
LUIZ FERNANDO VALLADO NOGUEIRA
________________________ SUMRIO ________________________
1 O sistema atual Cautelares e tutelas antecipadas A caminhada rumo efetividade. 2 A proposta do Projeto do CPC Nova diviso Medidas de urgncia: tutela de urgncia e tutela de evidncia. 3 Ainda
a proposta e as hipteses especficas para a concesso da tutela de
evidncia. 4 Concluso.
1 O SISTEMA ATUAL CAUTELARES E TUTELAS ANTECIPADAS A CAMINHADA RUMO EFETIVIDADE
A efetividade das decises judiciais sempre foi uma preocupao a
atormentar aqueles que estudam o Direito. E, quando se fala em efetividade, vm
tona as medidas de urgncia!
Com efeito, o Cdigo de Processo Civil, antes mesmo das vrias reformas que lhe
foram impostas e da prpria Constituio Federal de 1988, j estabelecia a possibilidade de
obteno imediata e satisfativa do bem de vida perseguido, em sede de liminar, em alguns
procedimentos especiais. Assim que, por exemplo, o Cdigo admitia a proteo possessria,
com evidente carter satisfativo, j no incio do trmite do processo respectivo (art. 928,
CPC). De igual forma, a lei que regulava o processo de mandado de segurana (Lei n
1.533/51), em seu artigo 7, previa a hiptese da concesso da ordem, j em carter liminar.
As medidas cautelares, cujo objetivo apenas o de assegurar o resultado prtico do
processo, tambm j estavam previstas nos arts. 796 e seguintes do Cdigo de Processo Civil.
Portanto, pode-se afirmar que, antes da Carta Constitucional de 1988, j
existiam dispositivos que objetivavam a maior efetividade do processo. Em outras
palavras, a busca do processo justo.
Alis, j se percebia a ntida distino entre as tutelas cautelares e as tutelas
antecipadas. As primeiras, previstas nos aludidos arts. 796 e seguintes do Cdigo Processual
objetivavam garantir o resultado prtico do processo e no eram satisfativas (o bem de vida
perseguido no era alcanado, de imediato). J as tutelas antecipadas, embora ainda no
previstas expressamente no Cdigo quela poca, aconteciam, na prtica, por intermdio das
liminares em procedimentos especiais, sendo que, nestes casos, havia a plena satisfao com a
obteno do bem de vida.
Procurador do Municpio de Belo Horizonte. Professor da Ps Graduao de Direito de Famlia da Faculdade
Arnaldo. Professor na Ps-graduao da Faculdade de Direito do Sul de Minas. Professor de Processo Civil do
Instituto de Educao Continuada (IEC) da PUC MINAS. Professor de Processo Civil e Direito Civil do Curso
de Direito da FEAD.
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Eis que, com a Constituio de 1988, houve a previso de que seriam assegurados
a razovel durao do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitao (art. 5, inc. LXXVIII). Mais ainda, houve a previso de garantia de apreciao pelo Poder
Judicirio de leso, inclusive quando ocorrer ameaa a direito (art. 5, XXXV, CF).
No plano infraconstitucional, notadamente no que toca s tutelas de urgncia,
houve avanos que se mostravam atentos aos ditames constitucionais.
De fato, com a Lei n 8.952/94 houve a instituio da tutela antecipada, pela qual
se generalizou quanto possibilidade de a medida de urgncia ser satisfativa. Vale dizer que,
desde que houvesse, alm do perigo de dano ou abuso no direito de defesa, prova inequvoca e verossimilhana da alegao (art. 273, CPC), j poderia o magistrado antecipar, total ou parcialmente, os efeitos da tutela pretendida no pedido inicial.
Na linha do que j admitia o chamado Cdigo de Defesa do Consumidor (Lei n
8.078/90 art. 84, 3), a referida Lei n 8952/94 inseriu no Cdigo de Processo Civil a antecipao da tutela para os casos de obrigaes de fazer ou no fazer (art. 461, 3). Em
seguida, e por intermdio da Lei n 10.444/02, estendeu-se a mesma medida para as aes que
tivessem por objeto a entrega de coisa (art. 461-A e 3, CPC).
Disto tudo sobressai que ainda subsiste, na atualidade, uma diviso nas medidas
de urgncia: tutela antecipada e cautelar, sendo que a primeira tem carter satisfativo e a
segunda visa garantir o resultado prtico do processo.
Acontece que os requisitos concesso das referidas medidas so diferentes, at
mesmo porque o alcance da tutela antecipada mais amplo e eficaz do que o da cautelar.
Sim, para a tutela antecipada de rigor que haja prova inequvoca e verossimilhana da alegao (art. 273, CPC), requisitos estes que exigem uma quase certeza de que o pretendente tem razo em seu pleito e ser vitorioso ao final. J
para a cautelar, h um rigor menor, na medida em que basta sua concesso a relevncia da
fundamentao e o perigo de dano.
De maneira objetiva, lembra Antnio Carlos Marcato1, ao se referir tutela
antecipada, que predomina o entendimento de que no se trata de cautelar, pois no se limita a conservar situaes para assegurar a efetividade do resultado final, mas implica
antecipao do prprio resultado.
Fredie Didier, Paula Sarno, Rafael Oliveira2 evidenciam a distino entre a
cautelar e a tutela antecipada:
Sob essa perspectiva, somente a tutela antecipada pode ser satisfativa e atributiva, quando antecipa provisoriamente a satisfao de uma pretenso
cognitiva e/ou executiva, atribuindo bem da vida. J a tutela cautelar sempre
no-satisfativa e conservativa, pois se limita a assegurar a futura satisfao de uma
pretenso cognitiva ou executiva, conservando bem da vida, embora possa ser
tutelada antecipadamente.
Conforme entendimento de Jos Roberto dos Santos Bedaque3,
1 MARCATO, Antnio Carlos. Cdigo de Processo Civil interpretado. 3.ed. So Paulo: Atlas, 2008. 2 DIDIER JR., Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael. Curso de direito processual civil. 4.ed. rev.,
ampl. e atual Salvador: JusPodivm, 2009. v.2.
LUIS FERNANDO VALLADO NOGUEIRA. Projeto do CPC e a tutela de evidncia. ______________________________________
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() Distinguem-se, todavia, pelo carter satisfativo de uma, inexistente na outra. As medidas cautelares exerceriam em nosso sistema apenas a funo de assegurar a
utilidade do pronunciamento futuro, mas no antecipar seus efeitos materiais, ou seja,
aqueles pretendidos pela parte no plano substancial. A diferena fundamental entre
ambas residiria, pois, nesse aspecto provisoriamente satisfativo do prprio direito
material cuja tutela pleiteada de forma definitiva, ausente na cautelar e inerente na
antecipao.
O que acontece que essa dualidade de medidas de urgncia, com requisitos e
procedimentos distintos, estava a causar embaraos na prestao jurisdicional. que
os requerimentos feitos erroneamente ocasionavam o indeferimento das pretenses,
em vista de inadequao formal.
A fim de superar tal obstculo formal, a Lei 10.444/02 cuidou de trazer o 7 ao
art. 273 CPC, o qual consubstanciou a chamada fungibilidade das medidas de
urgncia. Em outras palavras, o requerimento que desconsiderasse a dicotomia
entre cautelar e tutela de urgncia poderia, ainda assim, ser aproveitado, em
homenagem efetividade do processo.
Com efeito, se o autor, a ttulo de antecipao de tutela, requerer providncia de natureza cautelar, poder o juiz, quando presentes os respectivos pressupostos, deferir
a medida cautelar em carter incidental ao processo ajuizada (7 art. 273 CPC).
Trata-se, a, de um grande avano na efetividade, pois, ao permitir que a cautelar seja
deferida, incidentalmente, no prprio processo principal, o legislador acenou com a possibilidade
de haver uma desburocratizao com a eliminao do processo cautelar autnomo.
Para Luiz Rodrigues Wambier4,
[] Assim, em casos urgentes, o juiz no pode deixar de conceder a medida simplesmente por reputar que ela no foi requerida pela via que considera cabvel.
Nessa hiptese, se presentes os requisitos, o juiz tem o dever de conceder a tutela
urgente pretendida e, se for o caso, mandar a parte posteriormente adaptar ou
corrigir a medida proposta. O te