Psicologia da Educacao
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Psicologia da Educação
PSICOLOGIA DAEDUCAÇÃO
CURITIBA
2012
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁSETOR DE EDUCAÇÃO
COORDENAÇÃO DE INTEGRAÇÃO DE POLÍTICASDE EDUCAÇÃO A DISTÂNCIA
CURSO DE PEDAGOGIAMAGISTÉRIO DA EDUCAÇÃO INFANTIL E
ANOS INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL
PROFª CLARA BRENER MINDAL
PROFª TAMARA DA SILVEIRA VALENTE
PROFª TANIA STOLZ
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Curso de Pedagogia - Magistério da Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental UFPR
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Psicologia da Educação
PRESIDÊNCIA DA REPÚBLCA
Dilma Roussef
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO
Aloízio Mercadante
UNIVERSIDADE ABERTA DO BRASIL
Diretor
João Carlos Teatini de Souza Lima
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ
ReitorZaki Akel Sobrinho
Vice-ReitorRogério Andrade Mulinari
Pró-Reitora de Graduação - PROGRADMaria Amélia Sabbag Zainko
Pró-Reitor de Pesquisa e Pós-Graduação -PRPPG
Sérgio Scheer
Pró-Reitora de Extensão e Cultura - PROECElenice Mara Matos Novak
Pró-Reitora de Gestão de Pessoas - PROGEPELaryssa Martins Born
Pró-Reitor de Administração - PRAPaulo Roberto Rocha Krüger
Pró-Reitora de Planejamento, Orçamento eFinanças - PROPLAN
Lucia Regina Assumpção Montanhini
Pró-Reitora de Assuntos Estudantis - PRAE
Rita de Cássia Lopes
SETOR DE EDUCAÇÃO
Diretora
Andrea do Rocio Caldas
Vice-Diretora
Deise Cristina de Lima Picanço
Coordenador do Curso de Pedagogia - Magistério da
Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino
Fundamental
Américo Agostinho Rodrigues Walger
Coordenador de Tutoria
Lezyane Silviera Daniel
Revisão Textual
Altair Pivovar
Coordenadora EaD - UFPR e UAB
Marineli Joaquim Meier
Coordenadora Adjunta UAB
Gláucia Brito
Coordenadora de Recursos Tecnológicos
Sandramara Scandelari Kusano de Paula Soares
Produção de Material Didático
CIPEAD
Coordenação de Integração de Políticas de
Educação a Distância - CIPEAD
Foto da capa - http://www.sxc.hu/photo/
1191196
CIPEADFone: (41) 3310-2657
Coordenação do Curso de PedagogiaFone:(41) 3360 5139
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Contatos
CIPEADPraça Santos Andrade, 50 Térreo
80020-300 Curitiba PR
Fone: (41) 3310-2657
e-mail: [email protected]
www.cipead.ufpr.br
Setor de EducaçãoRua General Carneiro, 460 2º andar
80060-150 Curitiba PR
Fone:(41) 3360 5141 3360 5139
e-mail:[email protected]
www.educacao.ufpr.br
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Psicologia da Educação
APRESENTAÇÃO DA DISCIPLINA
Prezado Aluno,
A Psicologia da Educação pode ser considerada como o campo científico que
toma como objetivos a compreensão, a explicação, a previsão e a modificação dos
fenômenos educativos. A Psicologia da Educação ganha identidade própria por volta
do fim do século XIX e início do século XX em diversos países. Os conteúdos que a
compõem surgem, por um lado, da aplicação dos conhecimentos e das explicações
das diferentes correntes teóricas da Psicologia ao âmbito educacional, e, por outro
lado, dos estudos específicos das diferentes situações educativas.
Até meados da década de 50 do século XX, predominou a aplicação dos
conhecimentos gerados pela Psicologia em consultórios terapêuticos e laboratórios
universitários. Destacam-se, por exemplo, as tentativas de estender à escola os
princípios e leis da aprendizagem elaborados com os resultados de estudos realizados
em sua maioria com animais em laboratórios.
Por volta da década de cinquenta, e principalmente em anos posteriores, essa visão
da Psicologia da Educação como aplicação direta da Psicologia geral se modificou em
função da compreensão das especificidades do espaço escolar. O ambiente escolar, os
professores, os alunos e suas características e funcionamento passaram a ser objeto de
estudos.
Neste volume sobre Psicologia da Educação, você encontrará um pouco de
Psicologia aplicada à educação e um pouco de pesquisa específica realizada na escola.
Na Unidade 1 discutem-se alguns dos principais conceitos da teoria piagetiana
do desenvolvimento cognitivo e suas implicações para a educação. Empreende-se
nesta discussão um movimento que parte da ação pedagógica para a reflexão teórica.
A Unidade 2 enfoca a teoria histórico-cultural de Vygotsky e sua importância na
compreensão do papel da escola e do professor para o desenvolvimento psicológico
humano. A Unidade 3 aborda as contribuições da teoria behaviorista para a educação.
Após uma apresentação geral do que é o behaviorismo, são trabalhadas as principais
ideias de dois dos maiores expoentes dessa corrente psicológica. Skinner e Bandura
desenvolveram estudos sobre aprendizagem e formação de hábitos que apresentaram
resultados extremamente úteis para os professores na sociedade atual. As diferenças
entre aprendizagem por meio de reforços e por meio de punições, a formação de
hábitos de estudo e a influência dos meios de comunicação sobre o comportamento
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agressivo são temas discutidos nesta unidade.
A Unidade 4 trata da contribuição de alguns conceitos básicos da psicanálise
para o campo educacional. Optou-se por discutir o conceito de pulsão e a sua
vinculação à sexualidade humana. Também abordam-se a relação entre a pulsão e os
modos de defesa na latência e na adolescência, por entender-se que essa discussão
auxilia os professores a conhecer o impacto da sexualidade, de acordo com os
pressupostos freudianos, nos seus alunos.
Profª Clara Brener Mindal
Profª Tamara da Silveira Valente
Profª Tania Stoltz
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Psicologia da Educação
PLANO DE ENSINO
1 DISCIPLINA
PSICOLOGIA DA EDUCAÇÃO
2 CÓDIGO
EDP- 036
3 CARGA HORÁRIA TOTAL
120 HORAS
3.1 CARGA HORÁRIA PRESENCIAL
3.1.1 Com Professor formador: 12 horas
3.1.2 Com o tutor presencial no Polo: 12 horas
3.2 CARGA HORÁRIA À DISTÂNCIA
Noventa e seis (96) horas de estudos com orientação presencial e a distância dos tutores do polo
presencial e/ou tutores da UFPR. Estes estudos incluem a participação em fóruns, chats e outros
espaços virtuais.
4 EMENTA
Histórico, conceito e objeto. Teoria do desenvolvimento psicológico do ser humano e suas implicações
educacionais: perspectivas psicanalíticas e cognitivistas. Concepções teóricas contemporâneas sobre o
processo de aprendizagem e suas implicações para a atividade docente: enfoques behaviorista, humanista
e cognitivista.
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5 OBJETIVOS
5.1 OBJETIVO GERAL
Promover a compreensão dos processos psicológicos envolvidos no processo de ensino-aprendizagem
e sua relação com o desenvolvimento humano, e das principais abordagens teóricas da Psicologia da
Educação.
5.2 OBJETIVOS ESPECÍFICOS
Reconhecer a importância do conhecimento científico sobre o processo de ensino e aprendizagem.
Conhecer os postulados básicos das principais teorias contemporâneas acerca do processo de ensino
e aprendizagem.
Compreender as principais contribuições de teorias sobre o desenvolvimento psicológico para a
aprendizagem escolar.
Refletir sobre as possibilidades de aplicação à prática pedagógica dos postulados teóricos estudados
sobre o papel do educador no processo de ensino e aprendizagem.
6 PROGRAMA
UNIDADE 1
1 O CONSTRUTIVISMO PIAGETIANO
1.1 COMO AS PESSOAS APRENDEM, PARA PIAGET.
1.2 FATORES RESPONSÁVEIS PELO DESENVOLVIMENTO COGNITIVO.
1.3 A CONSTRUÇÃO DAS ESTRUTURAS DO CONHECIMENTO.
UNIDADE 2
2 A PSICOLOGIA HISTÓRICO-CULTURAL DE VYGOTSKY
2.1 O HOMEM COMO SER HISTÓRICO.
2.2 COMO AS PESSOAS APRENDEM?
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Psicologia da Educação
UNIDADE 3
3 CONTRIBUIÇÕES DO BEHAVIORISMO PARA A EDUCAÇÃO
3.1 O QUE É O BEHAVIORISMO?
3.2 PRIMEIRA GERAÇÃO DE BEHAVIORISTAS: COMPORTAMENTO REFLEXO EAPRENDIZAGEM INSTRUMENTAL.
3.3 SEGUNDA GERAÇÃO DE BEHAVIORISTAS: CONDICIONAMENTO OPERANTE.
3.4 TERCEIRA GER AÇÃO DE BEHAVIORISTAS: APRENDIZAGEM SOCIAL DO
COMPORTAMENTO.
UNIDADE 4
4 CONTRIBUIÇÕES DE ALGUNS CONCEITOS BÁSICOS DA PSICANÁLISE PARAO CAMPO EDUCACIONAL.
7 ORIENTAÇÃO DIDÁTICO-PEDAGÓGICA
7.1 PROCEDIMENTOS PARA LEITURA E ANÁLISE DOS TEXTOS
Para que você aproveite ao máximo o material teórico, indicamos os seguintes passos para sistematizaçãoe estudo. Na medida do possível, utilize-o habitualmente.
Faça uma primeira leitura, buscando uma visão do conteúdo como um todo.
Releia o texto, anotando palavras ou expressões desconhecidas, e sublinhe as ideias centrais.
Leia novamente e procure entender a ideia principal, que pode estar explícita ou implícita no texto.
Localize e compare as ideias entre si, procurando semelhanças ou diferenças.
Interprete as ideias, tentando descobrir conclusões a que o autor chegou.
Elabore uma síntese/resumo/apreciação crítica.
8 AVALIAÇÃO
8.1 Atividades presenciais com 75% de frequência (aula na UFPR e tutoria no polo).
8.2 Atividades e exercícios sobre os textos e materiais de apoio.
8.3 Atividades como fóruns, pesquisa, produção de textos e outras que o professor considerar.
8.4 Leituras complementares indicadas, com registro de análise crítica.
8.5 Exercícios de autoavaliação com produção de conhecimento.
8.6 Prova presencial ao término de pelo menos 75% das atividades realizadas.
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Psicologia da Educação
SUMÁRIO
1 O CONSTRUTIVISMO PIAGETIANO ...........................................................................
1.1 COMO AS PESSOAS APRENDEM, PARA PIAGET? ...........................................................
1.2 FATORES RESPONSÁVEIS PELO DESENVOLVIMENTO COGNITIVO ..........................
1.3 A CONSTRUÇÃO DAS ESTRUTURAS DO CONHECIMENTO.........................................
REFERÊNCIAS ............................................................................................................................
2 A PSICOLOGIA HISTÓRICO-CULTURAL DE VYGOTSKY ................................
2.1 O HOMEM COMO SER HISTÓRICO ..................................................................................
2.2 COMO AS PESSOAS APRENDEM? .....................................................................................
REFERÊNCIAS ............................................................................................................................
3 CONTRIBUIÇÕES DO BEHAVIORISMO PARA A EDUCAÇÃO ..........................3.1 O QUE É BEHAVIORISMO? .................................................................................................
3.2 PRIMEIRA GERAÇÃO DE BAHAVIORISTAS: COMPORTAMENTO REFLEXO OU
RESPONDENTE E APRENDIZAGEM INSTRUMENTAL ...........................................................
3.2.1 Comportamento reflexo ou respondente: Pavlov .................................................................
3.2.2 Aprendizagem instrumental: Thorndike ...............................................................................
3.3 SEGUNDA GERAÇÃO DE BEHAVIORISTAS: CONDICIONAMENTO OPERANTE .......
3.3.1 O condicionamento operante: Skinner .................................................................................
3.3.2 Aumentar ou manter um comportamento: reforços ............................................................
3.3.3 Diminuir um comportamento: punição e extinção operante ................................................
3.3.4 Modelagem e esquemas de reforçamento ............................................................................
3.3.5 Implicações educacionais dos estudos de Skinner ...............................................................
3.4 TERCEIRA GERAÇÃO DE BEHAVIORISTAS: APRENDIZAGEM SOCIAL DO
COMPORTAMENTO ..................................................................................................................
3.4.1 A Teoria da Aprendizagem Social de Bandura .....................................................................
3.4.2 A Teoria Cognitivo-Social da Aprendizagem de Bandura ......................................................
REFERÊNCIAS ............................................................................................................................
4 CONTRIBUIÇÕES DE ALGUNS CONCEITOS BÁSICOS DA PSICANÁLISEPARA O CAMPO EDUCACIONAL ....................................................................................
REFERÊNCIAS ............................................................................................................................
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Psicologia da Educação
O CONSTRUTIVISMOPIAGETIANO
UNIDADE 1
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Psicologia da Educação
1 O CONSTRUTIVISMO PIAGETIANO
Um dos teóricos mais importantes do desenvolvimento psicológico é
o biólogo e psicólogo suíço Jean Piaget (1886 - 1980). Sua teoria merece
destaque por seu rigor científico, vasta produção científica e por suas
implicações no campo da educação. Piaget desenvolveu inúmeras pesquisas
em diferentes lugares do mundo, contando com o uso do método clínico
(DELVAL, 2002). O construtivismo piagetiano entende o desenvolvimento
psicológico humano a partir de construções que se estabelecem de um
nível inferior a um nível superior e são desencadeadas pela interação do
sujeito com o meio físico e social. A teoria de Piaget é construtivista porque
ele e studa essas construções ou mudanças que ocor rem no
desenvolvimento cognitivo ao longo da vida e os mecanismos que explicam
essas transformações. A partir da década de 1960, com os estudos sobre
a causalidade, a característica construtivista da teoria de Piaget começa a
ficar mais marcante, porque ele passa a precisar melhor o papel do objeto
no processo de construção do sujeito.
FIGURA 1 - JEAN PIAGET
FONTE: http://commons.wikimedia.org/wiki/File:Jean_Piaget.jpg
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1.1 Como as pessoas aprendem, para Piaget?
Segunda-feira, 7h30 da manhã, aula de história na 8ª série A. O professor
saúda os alunos. Pede para pegarem o caderno e copiarem o que está
escrevendo no quadro. Os alunos reclamam. O professor diz que depois
irá explicar tudo o que está no quadro. O professor começa a escrever
compulsivamente no quadro, enchendo-o com tópicos referentes à
Revolução Russa. Os alunos estão inquietos, mas o professor continua
virado para a lousa. Depois de aproximadamente 20 minutos de cópia, o
professor pára, senta-se à sua mesa, olha para a turma e espera cerca de
10 minutos até que os alunos terminem de copiar o texto. Os alunos estão
agora em silêncio. O professor começa a explicar o que está no quadro.
Repete as frases que já foram escritas, dando-lhes outra ordem. Por exemplo,
quando está escrito 1905 Revolução popular contra o czar, acentua-se a
crise social na Rússia, o professor fala: “Tinha uma crise social na Rússia
em 1905, então ocorreu uma revolução popular contra o czar”. Um aluno
levanta a mão. O professor ignora. O aluno chama o professor. O professor,
impaciente, diz: “O que é Carlos? Já começa cedo... Não posso nem começar
a explicar?”. O garoto se retrai, mas faz a pergunta. “Por que a Rússia
estava em crise, professor?”. O professor responde com má vontade: “Tinha
uma revolução popular contra o czar e a crise na Rússia aumentou,
entendeu?”. O aluno responde: “Não”. O professor: “Ai, Carlos! Tá difícil,
heim?”. Fala olhando para a turma. A turma reage à provocação do
professor: “É, Carlos, fica quieto, cala a boca. Deixa o professor explicar...”.
O professor continua com a “explicação”... Depois de ter lido e repetido o
que leu do quadro, pergunta: “Entenderam?”. Silêncio. “Ótimo”, diz o
professor. Podem abrir o livro na página 17 e começar a responder a
atividade 1 até a 3. O professor senta à sua mesa e espera, a qualquer
momento, o barulho do sinal...
O trecho citado demonstra uma típica rotina de escola. Mas será que
essa rotina está contribuindo para que o aluno aprenda? O que Piaget nos
fala sobre como as pessoas aprendem?
Para Piaget (1958; 1964; 1974; 2003), tudo o que o aluno vai
aprender depende de seu nível de desenvolvimento cognitivo. Esses níveis,
estágios ou formas vão caracterizando as possibilidades de relação com o
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Psicologia da Educação
meio ambiente. A cada momento de seu desenvolvimento, o homem
interpreta e resolve os problemas de sua realidade de maneira diferente.
O desenvolvimento cognitivo começa quando nascemos; não está
dado antes do nascimento. Isso significa que a nossa inteligência vai sendo
construída lentamente a partir de nossa interação com o meio físico e social.
É por isso que Piaget é INTERACIONISTA. A ação do aluno é aqui
fundamental! Não a ação de cópia, mas a ação física ou mental sobre o
conteúdo apresentado pelo professor. O aluno precisa fazer algo com o
conteúdo que o professor apresenta.
A perspectiva interacionista entende o processo de desenvolvimento humano a partir da
interação com o meio físico e social. Nessa perspectiva, todas as funções humanas desenvolvem-
se pela interação. O raciocínio, por exemplo, não se desenvolve sem a interação com um meio
ambiente.
Você sabia que a cognição, para Piaget, representa as diferentes
atividades da mente humana? É isso mesmo! Memória, atenção, raciocínio,
representação... são atividades da mente.
O que o aluno vai fazer com o conteúdo apresentado pelo professor
precisa ser primeiro assimilado e depois acomodado pelo aluno.
ASSIMILAÇÃO e ACOMODAÇÃO são dois mecanismos complementares
e indissociáveis que estão envolvidos no desenvolvimento e na aprendizagem
do aluno (PIAGET, 1936; 1983). O desenvolvimento intelectual é o
resultado de um equilíbrio progressivo entre assimilação e acomodação.
Como isso se expressa na sala de aula?
Primeiro, é necessário que o aluno integre a informação nova à
estrutura de conhecimentos que possui. Os alunos sempre trazem uma
série de conhecimentos fruto de sua interação com o meio físico e social.
Ao mesmo tempo, têm também uma determinada capacidade de pensar
sobre esses conhecimentos. Como fica isto então na atividade do aluno?
Quando o aluno se esforça por entender o conteúdo apresentado
pelo professor, vai primeiro interpretar o conteúdo novo tomando como
referência a sua compreensão de mundo, os conhecimentos que já tem.
Para interpretar o mundo, usamos o que já está disponível, e o que está
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disponível já foi construído a partir de interações anteriores. A esse
movimento denominamos de ASSIMILAÇÃO. A assimilação refere-se à
incorporação de um dado novo à estrutura de conhecimento do sujeito.
Ela sempre vem antes quando pensamos em um avanço. É por essa razão
que nos surpreendemos muitas vezes com as colocações de nossos alunos
que estão muito distantes daquilo que apresentamos a ele. Ele está tentando
assimilar e, para isso, tenta entender o novo a partir do velho conhecimento
que possui.
Piaget (1964) expressa que o desenvolvimento vem sempre antes da
aprendizagem porque, para aprender, o sujeito precisa antes de tudo
assimilar. Isso pela simples razão de que o desenvolvimento se dá em um
processo e não é simplesmente um percurso de novos inícios e nem uma
soma de informações. Ao assimilar, o sujeito começa a tornar um
conhecimento significativo para ele, começa a incorporá-lo. No caso do
aluno, ele interpreta e entende o conteúdo a partir das possibilidades
cognitivas que tem.
O fato de assimilar não garante ainda uma nova compreensão ou um
avanço no desenvolvimento de sua inteligência. É preciso também acomodar.
Aliás, a assimilação é sempre balanceada pela ACOMODAÇÃO no
referencial piagetiano. A acomodação representa o ajuste ou mudança do
sujeito às provocações do meio. No caso do aluno, por exemplo, ele modifica
a sua maneira de pensar a partir de sua ação. Não é a cópia que caracteriza
essa mudança, mas a transformação do sujeito a partir da provocação do
meio.
Assim, o meio provoca o sujeito, mas é o sujeito que age em resultado
da provocação e integra a nova informação ao conjunto de conhecimentos
que possui. Pode-se dizer, então, que, por melhor que seja o professor, é o
aluno que aprende, porque precisa assimilar e acomodar.
O equilíbrio entre assimilação e acomodação constitui o que Piaget
chama de ADAPTAÇÃO. A adaptação é um processo ativo, dinâmico e
contínuo, no qual a estrutura hereditária do organismo interage com o meio
externo com vistas a reconstituir-se no sentido de um todo novo e significativo
para o sujeito. Não tem nada a ver com passividade. No caso do exemplo
apresentado no início, há a necessidade de interagir com os alunos durante
a aula para solicitar deles a forma como entendem o que está sendo
apresentado como conteúdo e provocá-los para ir mais adiante nessa
construção.
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Psicologia da Educação
Se o aluno não tenta entender primeiro o novo conteúdo a partir dos
conhecimentos que tem, estará simplesmente tentando decorar algo que
não tem sentido para ele. Como resultado, logo esquecerá o que foi
simplesmente memorizado sem compreensão. A situação de sala de aula
descrita anteriormente não é a mais adequada para levar os alunos a interagir
com conhecimentos, porque se apresenta como aula tão somente expositiva,
exigindo muito pouco a atividade reflexiva do aluno. No exemplo, quando
um dos alunos começa a integrar as informações trazidas pelo professor,
sua curiosidade é impedida pelo professor e pelos colegas. Infelizmente,
essa é uma situação que verificamos muito em sala de aula. Falta trazer o
aluno para a discussão. Perguntar-lhe como está entendendo o conteúdo
ou como o explica a partir de sua realidade. É preciso que o aluno confronte
suas concepções com as apresentadas pelo professor. Perceba a diferença
entre a forma como entende e a forma apresentada pelo professor para
poder rever as suas concepções. Isso é solicitar a atividade do aluno.
Uma noção piagetiana importante para o trabalho em sala de aula é a
de CONFLITO COGNITIVO.
O conflito cognitivo (PIAGET; GRÉCO, 1974) é interno ao aluno e
significa a contradição entre a forma como o ele entende a realidade e o que
está sendo apresentado pelo meio a que ele pertence. Não adianta o
professor dizer que o que o aluno diz é o contrário do que está ensinando.
É o aluno que precisa chegar a essa conclusão para poder avançar.
O conflito cognitivo é condição para a mudança consciente, por isso
a aula precisa ser dialogada. O aluno precisa ter voz na sala de aula. Despejar
uma quantidade excessiva de informações sobre os alunos não leva a lugar
nenhum, porque é preciso tempo para assimilar e acomodar. Uma vez
acomodado, o material estará disponível para novas assimilações. É por
isso que o processo de construção de conhecimentos no sujeito não tem
fim e depende das assimilações e das acomodações que vai conseguindo
realizar.
Por que o aluno não pode só acomodar? Porque a acomodação
depende da incorporação prévia do conhecimento aos esquemas que o
sujeito possui. Sem a assimilação anterior, tem-se sempre um novo começo,
não um enriquecimento e ampliação do conhecimento anterior. Para Piaget,
não há grandes saltos no desenvolvimento cognitivo. Ele se processa a partir
de uma sequência que ocorre a partir de um nível imediatamente inferior.
Esquema é a menor unidade do conhecimento. É aquilo que se generaliza
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da ação e pode ser utilizado em outras construções. Um conjunto de
esquemas dá origem a estruturas. O avanço no processo de construção
tanto das estruturas do conhecimento como da realidade sempre vai do
estágio sensório-motor e do pré-operatório ao operatório concreto e
operatório formal. Essa sequência será descrita adiante.
Na visão piagetiana, a adaptação e a organização constituem os
invariantes funcionais do desenvolvimento cognitivo. São elas que permitem
esse desenvolvimento. Por meio da organização, há a integração do que é
adaptado a um sistema coerente. A adaptação e a organização se referem
ao plano estrutural e ao plano funcional do desenvolvimento cognitivo.
Para Piaget (1974a; 1974b; 1983a), o desenvolvimento cognitivo
ocorre por meio da construção de estruturas do conhecimento que, por
sua vez, compõem-se de esquemas práticos e conceptuais. As estruturas
permitem entender a realidade e resolver problemas nessa realidade.
Estruturas são sistemas de transformação, porque, no modelo piagetiano, é
só pela atividade transformadora do sujeito que ele constrói sua inteligência
e a sua realidade.
Até agora, vimos que Piaget tem muito a dizer sobre como as pessoas
se desenvolvem e aprendem. Vimos que a aprendizagem depende sempre
do desenvolvimento. Piaget (1964; 1983a) se interessou pelo estudo do
processo de desenvolvimento das estruturas do conhecimento. O
desenvolvimento dessas estruturas está ligado à embriogênese, ao
desenvolvimento do corpo e de todas as suas funções, que só se completa
na adolescência. O desenvolvimento, assim como a aprendizagem, depende
de dois processos: a assimilação e a acomodação. Ambos levarão a uma
nova adaptação. Adaptação e organização são invariantes funcionais e estão
presentes tanto na construção das estruturas do conhecimento como da
realidade. Em sala de aula, é preciso estimular o pensamento dos alunos,
dando-lhes voz para exteriorizá-lo e para apresentar outras perguntas que
possam contribuir para a necessidade de rever conhecimentos e construir
conhecimento novo. No exemplo apresentado no início desta unidade,
observa-se que Carlos se interessa pelo conteúdo e quer ir além do
apresentado pelo professor, ao que o professor responde com censura,
exatamente o oposto do que faria o professor que se fundamenta nas ideias
de Piaget.
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Psicologia da Educação
Na sala de aula, o conteúdo é o objeto do conhecimento. Ao ser
instigado a pensar sobre esse conteúdo e, principalmente, ao atuar sobre
ele, o sujeito está ativando a construção de sua inteligência que, para Piaget,
pode ser entendida como construção das estruturas do conhecimento.
Portanto, forma e conteúdo se relacionam nesse processo. A forma diz
respeito às estruturas e o conteúdo ao funcionamento do sujeito em relação
a um objeto específico e contando com suas estruturas. Mas as estruturas
não são inatas, dependem, para a sua construção, da construção da
realidade, a qual está impregnada de conteúdos.
O que acabamos de dizer refere-se a uma das mais importantes
contribuições de Piaget (1936; 1937): a de que a inteligência constrói-se
paralelamente à construção da realidade. Ao conhecer o real por meio de
suas ações, o sujeito está construindo ao mesmo tempo a sua inteligência.
Agora se pode entender por que Piaget considera o processo de
desenvolvimento da inteligência ou da cognição paralelamente ao processo
de construção da realidade. O que isso significa? Significa que
compreendemos a realidade na medida em que construímos a nossa
inteligência. Assim entendemos por que a criança pequena entende a
realidade de forma diferente da criança de oito anos e do adolescente. As
estruturas estão em construção e permitem interpretar e resolver problemas
da realidade. Dependendo das estruturas que são ativadas, a realidade é
entendida de maneira ingênua e simples ou, ao contrário, em sua
complexidade.
Segundo Piaget, ao construir o objeto, o sujeito constrói a si mesmo. O que você entende por
essa afirmativa?
Segundo Piaget, a inteligência não nasce com a gente, ela se constrói lentamente a partir da interação
com o meio.
Como o professor pode contribuir nesse processo?
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1.2 FATORES RESPONSÁVEIS PELO DESENVOLVIMENTO
COGNITIVO
Como aquilo que conseguimos aprender tem a ver com o nível de
desenvolvimento cognitivo, é importante que o professor conheça o que
Piaget (1958; 1964; 1965) indica como fatores responsáveis pelo
desenvolvimento da inteligência.
Piaget enumera quatro fatores fundamentais para essa construção: a
maturação, a experiência física, a interação e transmissão social e o processo
de equilibração. Todos são igualmente importantes, mas um integra os
demais: o processo de equilibração.
A maturação orgânica é uma condição de possibilidade do organismo
de se desenvolver. Envolve o desenvolvimento neurofisiológico. Não pode
ser entendida como único fator responsável pela inteligência, porque sem a
experiência, a interação social e o processo de equilibração não há
desenvolvimento cognitivo. No entanto, a maturação é indispensável, porque
mesmo com a presença dos outros fatores, o não-desenvolvimento da
maturação vai ser determinante é o que explica, por exemplo, o fato de um
bebê não conseguir compreender álgebra linear.
A experiência com objetos (ou experiência física) é outro fator
fundamental na visão piagetiana. Para o desenvolvimento da inteligência, é
indispensável a atuação sobre os objetos. Piaget distingue aqui dois tipos
diferentes de experiência: a experiência física e a experiência lógico-
matemática. A experiência física diz respeito à atuação sobre os objetos e o
conhecimento de suas propriedades por meio da abstração física. Por
exemplo, ao tocar em um objeto, podemos perceber que ele é gelado ou
quente. Já a experiência lógico-matemática leva a um conhecimento a partir
das coordenações de minhas ações e necessita de uma abstração
reflexionante. A abstração reflexionante (PIAGET, 1977a; 1977b) é o
resultado de um conhecimento advindo da coordenação das ações exercidas
pelo sujeito sobre o objeto. Esse conhecimento não está no objeto, mas no
sujeito que pensa. Por exemplo, o conhecimento de que há objetos mais
quentes e objetos mais gelados do que outros não está no objeto, mas na
mente do sujeito que pensa, e depende do estabelecimento de relações. A
abstração reflexionante envolve o reflexionamento e a reflexão. O
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Psicologia da Educação
reflexionamento constrói em um plano superior o que foi construído no
plano da ação. Já a reflexão refere-se a um reflexionamento de segundo
grau ou a uma tematização em um plano superior do que foi construído por
meio da coordenação das ações. A experiência, por si só, não explica o
desenvolvimento, porque requer, para a sua compreensão, a maturação,
além dos outros fatores. Mas a experiência é indispensável, porque sem ela
não há o conhecimento de objetos. Por exemplo, a criança pequena pode
fazer inúmeras experiências com diferentes objetos, mas o conhecimento
que retira delas corresponde ao nível de seu desenvolvimento intelectual,
que envolve também a maturação, a interação e transmissão social e,
sobretudo, o processo de equilibração.
A interação e transmissão social dizem respeito à importância das
interações com as outras pessoas e do conhecimento a que temos acesso a
partir delas para o desenvolvimento da inteligência (PIAGET, 1958; 1965).
Não é o único fator, porque mesmo interagindo com inúmeras pessoas e
tendo acesso a toda sorte de conhecimentos, sem a maturação, por exemplo,
o sujeito não irá entender o que está sendo dito e apresentado. Por outro
lado, esse é um fator indispensável, porque mesmo tendo maturação,
experiência e o processo de equilibração, o nível de desenvolvimento
dependerá sempre do acesso a conhecimentos em um determinado meio
social e cultural. Esse fator está relacionado a atrasos e acelerações no
desenvolvimento.
Contando apenas com a maturação, a experiência e a interação social,
ainda não é possível explicar o desenvolvimento cognitivo para Piaget. Há a
necessidade de um fator integrador, e este é o processo de equilibração. As
construções que o sujeito vai fazendo ao longo de sua vida só são possíveis
pelo processo de equilibração. Esse processo autorregulador do organismo
permite a busca de um novo equilíbrio a partir de uma situação de
desequilíbrio cognitivo. Ao longo de sua existência, o sujeito vai realizando
inúmeras adaptações, que podem ser entendidas como estágios temporários
de equilíbrio. Eles logo são contrabalançados por situações que representam
desequilíbrios cognitivos, que podem ser entendidos como incompreensões,
situações com as quais não sabemos lidar. O processo de equilibração
representa esse percurso de equilíbrios e desequilíbrios em vários níveis.
Ele integra os fatores de maturação, experiência e interação social e possibilita
uma resposta do sujeito às diferentes situações da vida. Não é possível
visualizar esse fator, de modo que, para entendê-lo, pode-se pensar no
quanto, às vezes, lemos uma mesma obra e só muito tempo depois
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entendemos seu real significado, por vezes em um contexto bem adverso
ao da leitura de um livro. Outro exemplo é o da criança que tem significativo
acesso à cultura e a um método adequado para a alfabetização, mas só
depois das férias apresenta um surpreendente avanço em seu domínio da
linguagem escrita. Conhecer os quatro fatores descritos nos permite entender
a dinâmica entre desenvolvimento e aprendizagem na teoria piagetiana.
Como é a evolução dessa dinâmica?
É o que se discute na sequência.
1.3 A CONSTRUÇÃO DAS ESTRUTURAS DO CONHECIMENTO
A partir da interação do sujeito com o meio físico e social, ocorre a
construção das estruturas do conhecimento ou da inteligência. Piaget
distingue quatro conjuntos de estruturas que se desenvolvem em movimento
como o de uma espiral evolutiva (equilibração majorante): as sensório-
motoras, as pré-operatórias, as operatórias concretas e as operatórias formais.
Para Piaget (1994), inteligência e afetividade constroem-se paralelamente,
assim como a moralidade. A equilibração majorante, ou o processo de
desenvolvimento de uma nova forma de equilíbrio mais ampliada, explica a
passagem de um conjunto de estruturas ao outro. Nessa ultrapassagem, o
novo integra o que foi construído em um patamar inferior e o ultrapassa.
No entanto, coexistem, também, formas próprias de estruturas mais
elementares, podendo estas ser ativadas dependendo da situação. É o caso,
por exemplo, do adulto que em determinada situação responde com
características do operatório concreto ou do pré-operatório, quando já
apresenta raciocínio operatório formal.
As primeiras estruturas, as sensório-motoras, desenvolvem-se desde
o nascimento. A assimilação ocorre a partir dos reflexos inatos, que o bebê
utiliza para interagir com o meio. Os reflexos se prolongam, formando os
primeiros esquemas, como o de sugar e o de agarrar. Estes se combinam
por meio da ação interativa com o meio. Por exemplo, quando o bebê
25
Psicologia da Educação
nasce, apresenta o reflexo de sugar que se adapta ao mamilo da mãe. Ao
passar para a mamadeira, o bebê necessita fazer outra adaptação. Primeiro
assimila o bico da mamadeira como se fosse o bico do seio e lentamente vai se
acomodando ou se ajustando ao novo objeto por conhecer: o bico da
mamadeira. Uma vez adaptado, o bebê utilizará esse conhecimento para novas
adaptações, como quando inicia com a comida de colher. Primeiro assimila a
colher como se fosse o bico da mamadeira e só lentamente vai se ajustando ou
se acomodando ao seu formato.
Assimilação e acomodação explicam desde o início os avanços do sujeito.
A partir das ações do bebê, é construída a primeira noção de objeto
permanente, de tempo, de espaço e de causalidade. Na construção dessa
primeira forma de inteligência, a criança pequena se utiliza dos sentidos e de
seus movimentos. No início não distingue o que diz respeito ao corpo dela e o
que pertence ao meio, estando presa em uma espécie de egocentrismo físico.
A inteligência sensório-motora, não-socializada, caracteriza-se por
reflexos, instintos, primeiros hábitos, percepções diferenciadas e estruturas
sensório-motoras. Já no domínio afetivo, encontramos a construção de
sentimentos intraindividuais que acompanham todas as ações (tendências
instintivas, emoções, prazeres e dores relacionados às percepções, sentimentos
de agrado e desagrado), assim como regulações elementares, marcadas por
sentimentos de êxito ou fracasso. Quanto ao desenvolvimento da moralidade,
não há ainda noção de limites. A criança está em uma fase denominada de
anomia: ausência de regras conscientes. As estruturas sensório-motoras são
construídas do nascimento até aproximadamente dois anos e se caracterizam
por uma inteligência prática, que se define pelo uso (PIAGET, 1936).
Seguindo os fatores responsáveis pelo desenvolvimento cognitivo, na
fase sensório-motora o bebê necessita interagir com diferentes objetos de cores,
texturas, sons, gostos e formatos diferenciados. É preciso instigá-lo para
experimentar novos movimentos e reconhecer os objetos a partir dos sentidos,
porque é por esse canal que as primeiras construções cognitivas se
estabelecem. Por outro lado, requer-se a interação significativa com um ou
dois adultos que interajam mais próximos à criança e a iniciem no conhecimento
dos objetos do mundo. A segurança do bebê depende desse contato mais
próximo com algumas pessoas que se dediquem a ele de forma responsável e
da existência de certas regularidades, como hora de comer, de dormir e de
passear, entre outras. Essas regularidades do meio vão ser o precursor das
futuras regras e normas. No plano estrutural, a inteligência prática, que pode
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ser entendida como uma adaptação, se define por uma indiferenciação entre
a assimilação e a acomodação. O que é assimilado o é no momento em que
é acomodado e vice-versa.
A lenta construção do segundo grupo de estruturas, as estruturas
pré-operatórias, inicia-se em torno dos dois anos, com o aparecimento da
capacidade de representação simbólica. Mas o que isso significa? Significa
que as ações do sensório-motor podem ser agora interiorizadas. É por isso
que podemos dizer que o estágio pré-operatório pode ser entendido como
o de uma inteligência prática interiorizada e não-reversível. É o início do
pensamento na criança e da inteligência verbal.
A capacidade de representação se expressa na linguagem, no jogo
simbólico, na imitação, no sonho, no desenho, na imagem mental. A criança
é agora capaz de retomar o que foi feito em outra ocasião. Um fato importante
é o aparecimento da linguagem. Com a linguagem, amplia-se a capacidade
de interação e comunicação, levando à possibilidade de exteriorização da
vida interior e, assim, de corrigir ações futuras. A criança já antecipa o que
vai fazer.
Muitas características correspondem a esse período de 2 a 7 anos,
aproximadamente (PIAGET, 1937; 1978). Uma das principais características
é o egocentrismo psíquico ou tendência a relacionar tudo ao seu próprio
ponto de vista, como se fosse o centro do universo, juntamente com os
outros homens. Tudo o que foi criado, foi criado para o homem, expressão
de um antropocentrismo. É por essa razão que a criança se imagina até
dominando os fenômenos da natureza. Por exemplo, se desejar que chova,
vai chover. Essa característica leva a uma incapacidade de se colocar no
lugar do outro e de entendê-lo como tendo desejos e necessidades diferentes
dos seus. A criança quer a proximidade de outra, mas tem dificuldade em
desenvolver um trabalho conjunto ou integrar a ideia do outro à sua própria
construção. É o que se observa nas crianças menores: estão juntas, brincam
juntas, mas cada uma da sua maneira. Esse egocentrismo vai apresentar
diferentes manifestações, como o artificialismo, quando a criança crê que
os homens criaram os fenômenos naturais. Pensa, por exemplo, que as
montanhas e as árvores foram criadas pelos homens.
Outra manifestação do egocentrismo infantil é o animismo. Com ele,
a criança dá vida humana a animais, a objetos e a outros seres. Por isso se
encanta com estórias em que plantas têm sentimentos humanos, animais
falam e objetos podem sentir dor, prazer, como ela própria.
27
Psicologia da Educação
O realismo é mais uma característica do egocentrismo infantil. A
criança tem dificuldade em entender que retratos, palavras, sonhos e
sentimentos indicam apenas um ponto de vista; ela acredita que existam
objetivamente. Acredita, por exemplo, que os nomes são parte da coisa
nomeada e quanto maior for a palavra, maior será o objeto que nomeia.
O raciocínio da criança pré-operatória não se baseia na lógica, mas
na proximidade dos fatos. A criança imagina uma relação causal entre fatos
que ocorram juntos. Por exemplo, o carro anda porque tem estrada ou
porque foi tocada a buzina. A essa característica Piaget denomina raciocínio
sincrético.
Uma das mais importantes características do pré-operatório é o jogo
simbólico, onde se observa um predomínio da assimilação sobre a
acomodação. No jogo simbólico ou no jogo do faz-de-conta, a criança se
utiliza de um significante para dar-lhe outro significado. Por exemplo, um
objeto pode representar outra coisa, para além de seu significado coletivo:
uma pedra pode ser um carro, a criança pode ser um super-herói ou uma
fada e assim por diante. O jogo simbólico é uma das principais características
do desenvolvimento infantil, porque, por meio da imaginação e da
criatividade, a criança cria um mundo novo ainda não experimentado por
ela, mas movido por seus desejos. Para brincar de faz-de-conta, é necessária
uma inteligência representativa que antecede a racionalidade e que permite
a relação entre significantes e significados. É por isso que dizemos que há
um predomínio da assimilação, porque mais ênfase é dada à incorporação
do dado novo aos esquemas e estruturas do sujeito e menos à acomodação
ou ajuste do sujeito à realidade.
Outra característica importante do pré-operatório é a imitação. A
capacidade de imitação implica uma retomada do que foi feito pela ação,
mas ainda não há a incorporação do que é imitado ao repertório do sujeito,
possibilitando generalizações. A criança imita por imitar. Por isso, Piaget
entende a imitação como um predomínio da acomodação ou ajuste do
sujeito ao objeto sobre a assimilação.
A imitação também é uma manifestação da capacidade humana de
representação que antecede a operação (ação mental reversível), essência
do conhecimento para Piaget. Assim, na inteligência pré-operatória já há a
necessária diferenciação entre a assimilação e a acomodação, mas ainda
não há o seu equilíbrio. Ora há o predomínio da assimilação, como no jogo
simbólico, ora há o predomínio da acomodação, como na imitação. Ambos
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preparam o aparecimento da operação.
Tanto o jogo simbólico como a imitação devem ser estimulados no
período pré-operatório. E isso de diferentes maneiras: trabalho com
linguagens, desenho, teatro, brincadeira de faz-de-conta, jogos, música, dança
e brincadeira livre. É importante que a criança crie seu enredo a partir de
suas necessidades. Essas atividades estarão relacionadas ao desenvolvimento
de outro conjunto de estruturas: as estruturas operatórias concretas.
O jogo simbólico e a imitação são as principaisatividades do pré-operatório, e devem ser estimuladas. Acriança está se apropriando lentamente de sua realidadebasicamente a partir dessas atividades nesse período. Nelas,retoma mentalmente tudo o que foi praticado na ação prática,consistindo em uma inteligência representativa. Devemos,enquanto educadores, solicitar de inúmeras formas essacapacidade de representação: contar estórias, representá-las, imaginar outros personagens, outros desfechos daestória, dançar, fazer teatro, desenho, música, pintura,escultura, brincar com a linguagem, com trava-línguas emuitas outras atividades podem estar contribuindo para odesenvolvimento da inteligência da criança nesse período(STOLTZ, 2008, p. 33)
No aspecto afetivo, a criança pré-operatória manifesta sentimentos
interindividuais construídos a partir do intercâmbio afetivo entre as pessoas
e para além dos sentimentos ligados ao próprio sujeito (STOLTZ, 2007).
Esses se manifestam por afetos intuitivos que se expressam por sentimentos
sociais elementares, com expressão dos primeiros sentimentos morais. A
moral que se estabelece durante o período pré-operatório é uma moral
heterônoma, onde o certo e errado são dados por uma autoridade externa
ao sujeito. A moral heterônoma antecede a moral autônoma, que possibilita
ao sujeito determinar os caminhos de sua formação por si mesmo (PIAGET,
1977; STOLTZ, 2006).
Na moral heterônoma, os sentimentos morais da criança refletem a
vontade do adulto significativo. A moral heterônoma (ou moral da obediência)
estabelece como critério de bem e mal a vontade dos adultos (PIAGET, 1977).
Há, portanto, a necessidade de o educador não abusar de sua autoridade. A
relação entre o adulto e a criança deve sempre considerar o diálogo e o respeito
para que contribua na superação da moral heterônoma e para a construção
da moral autônoma. A educação deve fomentar as relações entre as crianças,
promovendo o conhecimento e o intercâmbio entre elas. A estimulação da
cooperação entre iguais, por meio do trabalho em pequenos grupos, auxilia
na diminuição da coação externa e no aumento da autonomia.
29
Psicologia da Educação
No perríodo pré-operatório, a criança é capaz de pré-conceitos (por
exemplo, um representante da classe é tomado como a classe inteira).
Próximo dos 2 anos, a criança tende a acreditar, por exemplo, que o
cachorro que vê é o mesmo que viu em outro local bem distante. Após os
4 anos iniciam-se conceitos intuitivos, que reconhecem classes pela
semelhança, mas não contando, ainda, com argumentos lógicos. As
classificações das crianças pré-operatórias de mais idade são baseadas,
geralmente, em um só critério. Há a dificuldade de considerar mais de um
critério, como, por exemplo, ao separar triângulos vermelhos e de três lados
iguais (equiláteros). É preciso estimular o pensamento da criança para a
organização de diferentes classificações e relações, preparando-a para o
advento das operações.
O que falta à criança pré-operatória? Falta a capacidade de estabelecer
relações a partir de uma lógica racional. Essa criança apresenta-se, na
linguagem piagetiana, como não-conservante e marcada por um pensamento
não-reversível. A conservação é a necessidade lógica de consideração de
certos atributos nas diferentes transformações de um objeto. Por exemplo,
se tomamos duas quantidades iguais de massa de modelar e modelamos
uma em formato de bola e a outra em formato de salsicha, pode até parecer
que na salsicha tem mais massa, mas na realidade a sua quantidade não se
altera pela mudança na forma. A criança pré-operatória tem muita dificuldade
em atividades como essa, porque o seu raciocínio está preso à sua percepção
imediata, ao imediatamente visível e perceptível. Por isso ela é não-
conservante. Outro exemplo que poderíamos citar aqui é o do copo de
leite. Se despejarmos uma mesma quantidade em dois copos iguais e depois
mantivermos um copo com a mesma quantidade e despejarmos o conteúdo
do outro em um copo de formato diferente, a criança acredita que muda a
quantidade de líquido para beber, só porque o nível de leite no copo de
formato diferente é outro.
FIGURA 2
FONTE: http://www.sxc.hu/photo/1194108
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O pensamento não-reversível da criança pré-operatória é fácil de ser
reconhecido. Ela não consegue retornar mentalmente ao ponto de partida
de uma transformação de um objeto.
Por exemplo, na transformação da massa de modelar, a criança não
consegue apresentar mentalmente como argumento da conservação de
quantidade de massa a reflexão de que era uma bola antes de se tornar
salsicha e, por isso, a quantidade só poderia ser a mesma. Reversibilidade
e conservação são as características do pensamento racional, que só se
apresentam no operatório concreto. Aqui, no pré-operatório, ocorre a
preparação para o aparecimento da operação, que é justamente a
capacidade de retornar mentalmente ao ponto de partida e de se apropriar
do processo de transformação. Operar é transformar. Como educadores,
podemos contribuir para o desenvolvimento da capacidade de operar ao
solicitar a atividade do aluno voltada à reflexão sobre o processo de
transformação que levou a dado conhecimento.
As estruturas operatórias concretas desenvolvem-se a partir das pré-
operatórias e acrescentam a reversibilidade à inteligência interiorizada pré-
operatória (PIAGET; SZEMINSKA, 1941).
Aproximadamente dos 7 anos até em torno dos 12 anos, a criança é
capaz de operar em sua realidade concreta a partir da lógica das classes e
das relações. Conservação e reversibilidade são as suas principais
características. Por exemplo, quando descobre que errou ao realizar uma
operação, é capaz de rever todo o processo realizado para identificar o
erro e refazer o percurso, seguindo dos resultados aos meios. A conservação
permite à criança entender conceitos como, por exemplo, o de fruta, cuja
essência envolve várias frutas de formatos bem diversos, como a jaca e a
pitanga. A primeira conservação é a de substância, depois surge a
conservação de peso e, por fim, a conservação de volume.
A capacidade da criança de estabelecer relações lógicas permite-lhe
a coordenação de pontos de vista diferentes, diferentemente do
egocentrismo intelectual e social ou da centração em si mesma do período
pré-operatório.
No período operatório concreto, a criança consegue coordenar
diferentes pontos de vista e integrá-los de modo lógico e coerente (PIAGET,
2003). Mas a capacidade de reflexão se manifesta a partir de situações
concretas. Essa capacidade de pensar antes de agir, considerar vários pontos
31
Psicologia da Educação
de vista, lembrar o passado e antecipar o futuro aparece considerando a
história de interações vividas pela criança, não ainda no plano hipotético-
dedutivo. Como educadores, podemos também estimulá-la a pensar baseada
em hipóteses.
Tudo aquilo que a criança não conseguia fazer no período pré-
operatório passa a ser agora possível, como formar o conhecimento de
número, estabelecer sequências de ideias e eventos, estabelecer relações
de causa e efeito.
No que diz respeito ao domínio afetivo, observa-se no operatório
concreto o aumento de uma autonomia na ação em relação ao adulto, levando
a criança a organizar os seus próprios valores morais. Surgem, assim,
sentimentos morais autônomos, com intervenção da vontade nos dilemas
entre o dever e o prazer, por exemplo. As crianças são capazes de elaborar
as suas próprias regras. Com a descentração, o grupo vai crescendo em
importância para a criança, e satisfaz, cada vez mais, suas necessidades de
afeto. No final do período operatório concreto, a criança pode vir a se
contrapor frontalmente ao adulto.
A capacidade de cooperar, a partir da diminuição do egocentrismo,
possibilita a integração e coordenação de novas ideias às ideias próprias.
Surgem sentimentos morais, como o respeito mútuo, a honestidade e a
justiça, que consideram a intenção da ação e não o seu resultado. Por
exemplo, ao manchar uma toalha de mesa sem querer, a criança não acha
que deva ser punida (PIAGET, 1977).
A construção das estruturas operatório-formais amplia a capacidade
das operações concretas. As operatório-formais começam a aparecer no
início da adolescência, com o término da construção das estruturas
concretas, em torno de 11 e 12 anos. Aqui o adolescente é capaz de exercer
as operações mentalmente, sem necessitar do concreto, subordinando o
real ao mundo dos possíveis. As construções podem agora partir do
pensamento hipotético-dedutivo e basear-se em proposições. Esse é o
pensamento que guia o cientista na elaboração de uma nova teoria. As
estruturas operatório-formais permitem inúmeras construções e são as
últimas que se desenvolvem no sujeito a partir da interação com o meio.
Há, portanto, fechamento no plano estrutural e ilimitadas possibilidades de
construção no plano funcional. Essas estruturas indicam o mais elevado
nível de desenvolvimento cognitivo do adolescente e do adulto. Por exemplo,
ao abordar um problema, o sujeito varia cada vez uma das variáveis implicadas
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FIGURA 3
FONTE: http://www.sxc.hu/photo/1200271
na sua causa, mantendo outras variáveis constantes, no sentido de verificar
a influência da variável manipulada na produção de um resultado (PIAGET,
1970).
O grupo matemático INRC, representando identidade, negação,
reciprocidade e correlação, é o que caracteriza melhor as possibilidades de
combinação que o pensamento operatório formal é capaz de realizar.
Por que muitos adolescentes e adultos não apresentam características
do pensamento operatório formal? Trabalhando com adultos e adolescentes,
verificamos que nem sempre seu raciocínio indica características do
pensamento do cientista. Na verdade, ao lado de raciocínios operatório-
formais coexistem raciocínios mais simples, baseados em características de
estruturas inferiores, como concretas, pré-operatórias ou até sensório-
motoras. Como se explica isso?
Piaget elaborou uma epistemologia e a denominou de epistemologia
genética, que significa estudo do conhecimento a partir de sua gênese. Ele
estava preocupado em saber como se dá o desenvolvimento da inteligência
no sujeito. Chegou à conclusão de que o mais alto nível de desenvolvimento
das estruturas do conhecimento é o formal, que pode ser generalizado aos
mais diferentes domínios. Em tese, a possibilidade de manifestação em um
campo abre a possibilidade de manifestação em todos os outros. Mas, no
plano do funcionamento psicológico, da resolução de problemas da realidade,
vemos que isso não se dá de imediato, automaticamente. A exteriorização
do pensamento formal depende das interações do sujeito com os diferentes
domínios e do tipo de interação nesses domínios.
33
Psicologia da Educação
Piaget diz (1970) que é possível que o pensamento formal se manifeste
apenas nos domínios em que o sujeito interaja mais e exerça a sua profissão
ou especialidade. Em tese, dadas as condições do meio para o
desenvolvimento dessas estruturas, elas iniciariam seu desenvolvimento no
início da adolescência. O mais importante a ser observado, como professor,
é a sequência do desenvolvimento dessas estruturas, mais do que a idade
de seu aparecimento. Essa sequência inicia pela ação, passa pela
representação e chega à operação concreta e formal. Nesse sentido,
acreditamos ser importante obedecer a essa sequência no trabalho com
um novo domínio de conteúdos em sala de aula, porque o pensamento
operatório-formal exige construções anteriores para o seu aparecimento.
Por exemplo, temos que partir verificando indícios do conteúdo novo no
contexto social e cultural vivido pelo sujeito, para que ele possa ser percebido
como significativo no plano sensível. Na sequência, levarmos o sujeito a
representar o que entende por aquele conteúdo e depois a estabelecer
relações com outros objetos de conhecimento vinculados, primeiro, ao seu
mundo concreto e, depois, ao plano das ideias. Essa sequência aponta para
a reconstrução das estruturas em um domínio específico.
Como fica o desenvolvimento da afetividade desse adolescente? A
partir das operações formais, sentimentos interindividuais se combinam com
sentimentos envolvendo ideais coletivos. O adolescente é capaz de lidar
com conceitos como liberdade, justiça, solidariedade etc.
No início da adolescência observa-se a retomada de uma espécie de
egocentrismo, que coloca o adolescente como centro de atenções. O
adolescente vive conflitos. Deseja tornar-se independente em relação ao
adulto, mas ainda depende dele. Próximo à idade adulta, começa a eleger
um conjunto de regras e de valores pelos quais vive e se mantém leal. Ocorre
a afirmação da vontade. A capacidade de realizar abstrações e generalizações
o leva a fazer deduções de simples hipóteses e a lutar por elas. A autonomia
moral e intelectual só é possível a partir do operatório formal. Segundo
Piaget, esse é o objetivo da educação. No plano estrutural, essa autonomia
A evolução da inteligência e da afetividade está na descentração do
indivíduo, que se inicia no operatório concreto. No que se refere à afetividade,
é a partir do contato com o outro que o sujeito constrói os primeiros
sentimentos interindividuais, para além dos sentimentos restritos ao próprio
sujeito. Para Piaget (1977), quanto maior o autoritarismo do meio, maior a
vigência de egocentrismo e impedimento do desenvolvimento da autonomia,
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característica do indivíduo descentrado. Quanto mais autônomo o sujeito,
maior é a sua capacidade de articular o pensamento próprio ao pensamento
do outro, sem se submeter a ele. Por isso a capacidade de socialização do
adolescente e do adulto saudável é, em tese, maior.
Piaget delega aos pedagogos a tarefa de verificação da cooperação
como processo educativo. Stoltz (2007), Guimarães e Parrat-Dayan (2007)
e Stoltz (2008) propõem a interação social cooperativa que estimule o
processo de tomada de consciência de noções específicas. “A interação
deve estimular a reflexão sobre a reversibilidade física e mental envolvendo
atividades relativas a pessoas e atividades relativas a outros objetos”
(STOLTZ, 2007, p. 34). Esse movimento implica um processo dinâmico
do fazer ao compreender e vice-versa.
Uma distinção importante relativa à aprendizagem é entre
aprendizagem em sentido lato e aprendizagem em sentido estrito (PIAGET;
GRÉCO, 1974).
A aprendizagem em sentido estrito está relacionada a umasituação específica, a uma experiência, a um treino e leva aum conhecimento limitado, restrito àquele conteúdo. Essetipo de aprendizagem tende a enfatizar os aspectosfigurativos do pensamento imitação, percepção, memória,imagem mental e permite o conhecimento de estados,não de transformações.Já a aprendizagem em sentido lato confunde-se com opróprio desenvolvimento, vai estar relacionada aos aspectosoperativos do conhecimento, ligados às transformações.Os aspectos operat ivos explicam o processo detransformação que levou a dado conhecimento.Piaget expressa que o que deve ser enfatizado na educaçãosão os aspectos operativos ou o pensar sobre astransformações e não sobre os estados. O conhecimentofigurativo leva apenas a uma memorização semcompreensão que logo é esquecida.Como podemos contribuir para o favorecimento daaprendizagem lato sensu? Solicitando sempre relações entreconhecimentos e a atividade do aluno. Por outro lado,podemos apresentar problemas que necessitem doconhecimento científico e ativem a capacidade do aluno depensar nas relações de sua realidade com o conhecimento,que o levem a pensar de forma ativa e crítica sobre aqueleconhecimento científico (STOLTZ, 2008, p. 278).
A aprendizagem está, assim, subordinada ao processo geral de
equilibração e ao nível de desenvolvimento cognitivo (PIAGET, 1983a). O
que ensinar e como ensinar depende do conhecimento do aluno, das suas
características e de suas possibilidades de assimilar e acomodar. O trabalho
do educador deve ser o de estimular a capacidade do aluno por meio de
35
Psicologia da Educação
situações desafiadoras, contando com diferentes materiais e conhecimentos.
A curiosidade deve ser o motor de novas construções. Situações-problema
desenvolvidas em pequenos grupos e relacionadas ao contexto social e
cultural do aluno podem contribuir para o desencadeamento de novas
construções cognitivas e afetivas. Mais importante do que pedir ao aluno
respostas, a tarefa do educador, baseado em Piaget, consiste em levá-lo a
desenvolver novas perguntas. Por isso o ensino pode ser caracterizado como
envolvendo uma experimentação ativa.
Como você avalia a situação de sala de aula apresetnada no início deste capítulo?
Discuta-a tomando como referência o objetivo da educação para Piaget e sua teoria sobre
desenvolvimento e aprendizagem.
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Curitiba: UFPR, 2007.
STOLTZ, T.; PARRAT-DAYAN, S. Educação e inclusão social: uma leitura possível a partir de Piaget.
In: GUÉRIOS, E.; STOLTZ, T. (Orgs.). Educação, inclusão e exclusão social: contribuições para o
debate. Curitiba: Aos Quatro Ventos, 2007.
38
Curso de Pedagogia - Magistério da Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental UFPR
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Psicologia da Educação
A PSICOLOGIAHISTÓRICO-CULTURAL
DE VYGOTSKY
UNIDADE 2
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41
Psicologia da Educação
2 A PSICOLOGIA HISTÓRICO-CULTURAL DE VYGOTSKY
Entre os teóricos que são referência hoje na questão da aprendizagem,
está Lev S. Vygotsky (18961934). Vygotsky nasceu na Rússia e, em sua
breve existência, deixou uma teoria em construção que pretende a superação
dos reducionismos mecanicistas e idealistas. A base dessa orientação teórica
está no marxismo e no ideário da Revolução Russa de 1917. Vygotsky,
assim como Luria e Leontiev, via o homem como ser ativo, resultado de
suas interações no contexto social e cultural. Por essa razão é um teórico
interacionista. Suas obras foram proibidas na própria Rússia entre 1936 e
1956, por motivos políticos. No Brasil, a influência do pensamento de
Vygotsky começa a crescer a partir da década de 1980, principalmente
nas áreas da Educação, Psicologia do Desenvolvimento e Psicologia Social.
Sua abordagem teórica é também conhecida na Educação e na Psicologia
como sociointeracionista ou sócio-histórica.
FIGURA 4:: LEV SEMENOVICH VYGOTSKY
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2.1 O HOMEM COMO SER HISTÓRICO
Lúcia voltou para casa desanimada. Havia dado quatro aulas seguidas,
estava exausta. Na verdade, o que a incomodava era o desrespeito e a falta
de consideração dos alunos daquela escola. Tinha aplicado avaliação em
uma das turmas. Ficou horrorizada com o resultado. Era como se não tivesse
dado dois meses de aula sobre aquele assunto. E ainda teve que escutar de
uma adolescente: “Não sei por que perder o meu tempo vindo para esta
escola. Não está me ensinando nada...”. O pior era que Lúcia estava vendo
que não ensinava nada...
Mas, afinal, a escola é importante? Ninguém melhor do que Vygotsky
para responder a essa questão. Vygotsky (RATNER, 1995; VAN DER VEER;
VALSINER, 1999) entende o homem como se constituindo em um processo
histórico, síntese de múltiplas determinações. O que significa isso? Significa
que o que o homem vai aprender e desenvolver depende do que for
possibilitado a ele conhecer. O humano não está anteriormente dado. É o
resultado das interações que o homem vai estabelecendo em um contexto
social e cultural bem específico. E mais, essa humanidade do homem está
em evolução, o que significa que os instrumentos e a rede de relações sociais
que possibilitam o acesso ao conhecimento hoje certamente será outra
amanhã e levará a diferente desenvolvimento humano. Vygotsky responderia
com muita clareza à situação da professora Lúcia. Se a escola não funciona,
não é por culpa dos alunos. É a escola que precisa rever urgentemente o seu
papel e a sua forma de atuação.
Na perspectiva de Vygotsky (1991; 1994) e Vygotsky e Luria (1996),
aprendizagem gera desenvolvimento. Se os alunos não aprendem, estão
perdendo em termos de desenvolvimento. Para muitos, a escola é o único
espaço de acesso ao saber elaborado, aquele que foi socialmente construído
e historicamente acumulado para ser apropriado pelas gerações mais novas.
Para que ter acesso ao saber elaborado ou científico? Para desenvolver uma
visão crítica da realidade, para não ser explorado. Para ter consciência de
direitos e deveres e conseguir viver a sua cidadania. Vygotsky vai mais longe.
Para ele, o desenvolvimento das funções psicológicas superiores, aquelas
que nos distinguem como seres humanos, só se realizam pelo acesso ao
saber elaborado ou o conhecimento científico. Essas funções psicológicas
superiores que distinguem o homem de outros animais são o pensamento
abstrato, o comportamento intencional, a memorização ativa, a atenção
voluntária, a linguagem e a afetividade propriamente humana, entre outras.
43
Psicologia da Educação
Essas funções estão em evidente oposição com a de outro grupo de funções,
as funções psicológicas inferiores, que partilhamos com os outros animais:
sensações, atenção involuntária, memória involuntária e reações emocionais
básicas, entre outras.
Segundo Vygotsky:
o aprendizado geralmente precede o desenvolvimento. Acriança adquire certos hábitos e habilidades numa áreaespecífica, antes de aprender a aplicá-los consciente edeliberadamente. Nunca há um paralelismo completo entreo curso do aprendizado e o desenvolvimento das funçõescorrespondentes (VYGOTSKY, 1998, p. 126).
Seguindo a ideia de que aprendizagem gera desenvolvimento, o fato
de uma pessoa ter seu desenvolvimento restrito explica-se pelo tipo de
aprendizagem que desencadeou em seu contexto social e cultural. Isso
significa que somos muito mais responsáveis uns pelos outros do que
pensamos. O que o outro vai desenvolver tem íntima relação com o que o
contexto lhe possibilitou aprender. As funções psicológicas superiores
precisam estar antes no contexto, externas ao sujeito, para que este possa
se apropriar delas mediante aprendizado. Tudo se passa, para Vygotsky
(1994), do externo para o interno, das relações entre as pessoas para as
relações com o próprio sujeito, dos processos interpsíquicos ou intermentais
para os processos intrapsíquicos ou intramentais. “Chamamos de
internalização a reconstrução interna de uma operação externa”
(VYGOTSKY, 1994, p. 74).
E o que permite essa passagem do externo para o interno ao próprio
sujeito? O processo de internalização ou a passagem do interpsíquico para
o intrapsíquico. Mas o sujeito é ativo nesse processo. Esse processo envolve
uma transformação do sujeito a partir de sua negociação com a cultura.
Isso significa que o sujeito também influencia o contexto, mas essa capacidade
foi desenvolvida nele por um contexto social e cultural.
Essa origem social e cultural do homem encontra seus fundamentos
na visão do materialismo histórico dialético (MOLL, 1996; OLIVEIRA,
1997; VAN DER VEER; VALSINER, 1999). O conceito principal aqui é o
conceito marxista de trabalho. O trabalho é entendido como atividade
especificamente humana que transforma a natureza e, ao transformá-la,
modifica o sujeito. Nessa transformação da natureza, o homem se vale de
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instrumentos e das relações com outros homens. Atividade e linguagem,
entendidas dentro de um contexto histórico e cultural, são as categorias
vygotskyanas que explicam o processo de aprendizagem e desenvolvimento.
Sendo assim, é a própria vida que determina a consciência e não o inverso.
Dentro dessa concepção, tem-se ainda uma visão essencialmente dinâmica
do desenvolvimento. Tudo está em permanente movimento e transformação.
No desenvolvimento do homem, a relação que era imediata para a
satisfação de necessidades tornou-se mediada, isto é, passou a ser ampliada
pela intervenção de um elemento na relação homemmundo. Pela
necessidade de atuar sobre a natureza para garantir a sua sobrevivência, o
homem foi desenvolvendo instrumentos para aprimorar essa relação. Por
exemplo, o machado permite que o homem derrube árvores e possa
construir casas com elas. Da mesma forma, a linguagem permitiu incrementar
as relações entre os homens e a própria evolução humana.
A possibilidade da linguagem racional e a possibilidade de
desenvolvimento da atividade propriamente humana de trabalho, contando
com seu planejamento e execução, determinaram a melhor satisfação das
necessidades básicas e a criação de novas necessidades que, por sua vez,
exigiram novos instrumentos e novos conhecimentos em um movimento de
desenvolvimento da humanização do homem. Os homens são os únicos
animais que fazem uso racional de instrumentos enquanto mediadores de
sua relação com o mundo. Esta é uma das principais ideias de Vygotsky
(2000): a de que a relação homem-mundo é mediada.
Essa mediação conta com instrumentos físicos (por exemplo, caneta,
serrote, papel, computador, etc.) e instrumentos psicológicos (linguagem
como sistema de signos) que vão possibilitar a transformação do contexto e
do próprio homem. Por isso a educação é fundamental. A educação vai
iniciar a criança nos conhecimentos que a humanidade já construiu, para
que ela parta destes para ir mais além e crie outros conhecimentos. A escola
também vai permitir o conhecimento e apropriação de diferentes
instrumentos, fundamentais para o viver em sociedade. Entre a criança e o
mundo há uma cultura que fala deste mundo para ela. Ter acesso ou não a
este conhecimento implica em ser incluído ou excluído da sociedade.
A mediação vai significar o mundo para a criança. Essa significação é
o ponto de partida para a criação de sentidos. Os sentidos envolvem a
nossa relação com os significados, que são coletivos. Os significados são o
resultado da atividade de um determinado grupo cultural. Por exemplo, o
45
Psicologia da Educação
significado de ser rico ou pobre em nossa sociedade capitalista. Os sentidos
representam a nossa relação com esse significado: o que é ser rico ou pobre
para mim. O sentido depende do contexto e de vivências afetivas.
A mediação da cultura vai determinar que o desenvolvimento do
homem, de biológico, passe a ser sócio-histórico, ou seja, de acordo com as
interações realizadas em um contexto social e cultural específico. No homem,
a relação homemmundo é mediada por sistemas simbólicos. E é essa
mediação que faz com que o homem esteja em um processo de
transformação. Para Vygotsky (1996), há uma base biológica para absorver
e tornar próprias essas transformações: o cérebro. Esse órgão do corpo
humano é suficientemente plástico para adaptar-se a mudanças.
Segundo Vygotsky, o processo de internalização envolve uma série
de transformações. O fundamento do que somos está no processo de
internalização. Vygotsky (1994, p. 75) entende essas transformações a partir
do uso de sistemas de signos e da mudança de atividade:
a) Uma operação que inicialmente representa uma atividade externa
é reconstruída e começa a ocorrer internamente. É de particular
importância para o desenvolvimento dos processos mentais superiores
a transformação da atividade que utiliza signos, cuja história e
características são ilustradas pelo desenvolvimento da inteligência
prática, da atenção voluntária e da memória.
b) Um processo interpessoal é transformado num processo
intrapessoal. Todas as funções no desenvolvimento da criança
aparecem duas vezes: primeiro, no nível social, e, depois, no nível
individual; primeiro, entre pessoas (interpsicológico), e, depois, no
interior da criança (intrapsicológico). Isso se aplica igualmente para a
atenção voluntária, para a memória lógica e para a formação de
conceitos. Todas as funções superiores originam-se das relações reais
entre indivíduos humanos.
c) A transformação de um processo interpessoal num processo
intrapessoal é o resultado de uma longa série de eventos ocorridos
ao longo do desenvolvimento. O processo, sendo transformado,
continua a existir e a mudar como uma forma externa de atividade
por um longo período de tempo, antes de internalizar-se
definitivamente. Para muitas funções, o estágio de signos externos
dura para sempre, ou seja, é o estágio final do desenvolvimento. Outras
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funções vão além no seu desenvolvimento, tornando-se gradualmente
funções interiores. Entretanto, elas somente adquirem o caráter de
processos internos como resultado de um desenvolvimento
prolongado. Sua transferência para dentro está ligada a mudanças
nas leis que governam sua atividade; elas são incorporadas em um
novo sistema com suas próprias leis.
Linguagem e atividade possibilitaram e possibilitam, assim, o
desenvolvimento propriamente humano. Os animais também têm uma
linguagem, mas não uma linguagem racional que possibilite acesso e
transmissão de cultura. É uma linguagem usada basicamente para alívio de
tensão e contato psicológico com outros membros do grupo. Os animais
fazem um uso pré-intelectual da linguagem, porque ela não tem nesse caso
a função de signo. Os animais irracionais também apresentam uma atividade,
mas ela não é planejada como no trabalho humano. É uma atividade que
também se vale de instrumentos como mediadores, revelando uma espécie
de inteligência prática. Na inteligência prática, que se manifesta na criança
pequena e nos animais superiores, há a capacidade de solução de problemas
e de alteração do ambiente para conseguir determinados fins. Mas esse
modo de funcionamento intelectual é independente da linguagem, indicando
uma fase pré-verbal de desenvolvimento do pensamento.
Em um determinado momento do desenvolvimento da espécie (ou
filogenético), o pensamento se torna verbal e a linguagem se torna racional.
Esse é o momento em que o biológico se transforma em sócio-histórico. A
história de cada um (ontogênese) retoma a história da espécie. Tornamo-
nos humanos ao interagir com seres humanos e pela apropriação dos modos
culturalmente instituídos de intercâmbio e produção. As trocas que
estabelecemos com o outro vão desencadear processos nesse outro. Dito
de outro modo: se considerarmos uma criança criada em um sítio afastado
e cujos pais são analfabetos e trabalhadores do campo, o aprendizado e
desenvolvimento dessa criança terá as marcas desse contexto. Uma criança
que nunca teve a oportunidade de pegar em um lápis para rabiscar ou
desenhar vai apresentar um desenvolvimento diferenciado em relação à
criança que desde bebê rabisca e tem acesso múltiplo aos bens da cultura.
Por isso a escola é fundamental. Não para excluir a criança que no 1º ano
não sabe nem segurar um lápis. Mas para possibilitar a ela o aprendizado
dessa habilidade e muito mais. “A internalização das atividades socialmente
enraizadas e historicamente desenvolvidas constitui o aspecto característico
da psicologia humana; é a base do salto qualitativo da psicologia animal
47
Psicologia da Educação
Até agora, ficou claro que Vygotsky (1994) enfoca a importância da
instrução para o desenvolvimento humano. É principalmente a educação
formal que vai desencadear as funções psicológicas superiores. No entanto,
se a escola não cumpre seu papel, como é o caso do exemplo apresentado
no início deste capítulo, como atuar? O que Vygotsky nos fala sobre como
as pessoas aprendem?
Como a linguagem, inicialmente exterior ao sujeito, se internaliza e se
torna instrumento do próprio pensamento? A primeira manifestação da
linguagem no sujeito é a linguagem externa (ou fala social), cuja função é de
comunicação social. Depois surge a fala egocêntrica, que acompanha a
atividade do sujeito. A fala egocêntrica representa a transição da fala social
para a fala interior. A fala passa então a anteceder a atividade, orientando-a.
Somente depois a fala é internalizada e o discurso passa a ser interno. O
sujeito utiliza o discurso para organizar e expressar o seu pensamento.
Vygotsky (2000) observa que o pensar em voz alta não se limita a
acompanhar a atividade da criança: auxilia na orientação mental, na
compreensão consciente também de adultos; ajuda a superar dificuldades.
Observa-se, assim, tanto um aspecto exterior, fonético, como um aspecto
interior, semântico e significativo, na linguagem.
Muitas vezes, ainda que as crianças conheçam as palavras, não conseguem
entender o que lhes é dito. Falta-lhes o conceito generalizado que lhes garante
o entendimento. As formas mais complexas da comunicação humana só
são possíveis porque o pensamento do homem reflete uma realidade sob a
forma de conceitos. O trabalho com conceitos científicos é aqui de
fundamental importância.
para a psicologia humana” (VYGOTSKY, 1994, p. 76).
Faça uma busca na internet de pesquisas que envolveram a aprendizagem de crianças em um
ambiente não-humano. Como é o desenvolvimento dessas “crianças selvagens”?
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2.2 COMO AS PESSOAS APRENDEM?
Para Vygotsky (1994; 2000), o aprendizado começa no momento
em que nascemos. A partir da interação, sobretudo com o outro mais
experiente e significativo, iniciamos o nosso conhecimento do mundo por
meio dos significados partilhados pelo grupo. Essa interação social exerce
um olhar sobre as nossas ações e as significa. Internalizamos essas
significações. Se o outro nos enxerga regularmente como inferior, inteligente
ou atrapalhado, internalizamos esse significado. Os diferentes contextos
interativos nos iniciam em nossa cultura, na maioria das vezes, de forma
não intencional.
Na escola, no entanto, a interação é planejada, sistemática e
intencional. Nesse caso, a sua responsabilidade no processo de apropriação
da cultura pela criança é muito maior. Muitas vezes, a escola representa o
único lugar de acesso a um saber mais elaborado pela criança. Não dá para
desconsiderar ou negligenciar esse espaço. Vygotsky (1991; 1994) enfatiza
a importância não só da escola, mas também do professor. Ao professor
cabe organizar o conteúdo de forma que o aluno aprenda. Em outras palavras,
ensinar e ensinar bem. Como fazer isso, se há tantos alunos em classe?
Intervindo na ZDP (ou zona de desenvolvimento proximal ou potencial de
seus alunos). Intervir na ZDP significa atuar no futuro desse aluno. Para
tanto, é necessário conhecer o que ele já sabe e o que ele só poderá saber
com a ajuda de uma pessoa mais capaz ou um expert. Se o professor intervém
naquilo que o aluno já sabe ou conhece, o aluno não vai aprender nada
nem se motivar para o aprendizado. Se o professor intervém muito além da
capacidade do aluno, de modo que nem com a ajuda do professor pode
conseguir entender, também não vai aprender nada. A ideia de Vygotsky do
trabalho do professor consiste em ir sempre além daquilo que o aluno já
sabe. É investir no espaço compreendido entre o nível real (o que ele já
sabe) e o nível potencial desse aluno (o que ele só poderá saber com a ajuda
de outro); investir no potencial para que este se torne real no futuro. Para
Vygotsky (1994, p. 112), a zona de desenvolvimento proximal:
“é a distância entre o nível de desenvolvimento real, que se costuma determinar através da
solução independente de problemas, e o nível de desenvolvimento potencial, determinado através
da solução de problemas sob a orientação de um adulto ou em colaboração com companheiros
mais capazes”.
49
Psicologia da Educação
O problema está em saber como atuar em ZDPs tão diversas como
as que encontramos em sala de aula (MOLL, 1996). Nesse sentido, é preciso
considerar também o trabalho entre crianças de níveis desiguais de
desenvolvimento, mas não excessivamente distantes. Um companheiro mais
capaz pode auxiliar um menos capaz a se apropriar de um conteúdo. Por
outro lado, ao “ensinar” o colega, levando-o a pensar no procedimento
mais adequado para a resolução de um problema, o expert passa a entender
melhor aquilo que já pensava entender.
Para intervir na ZDP, portanto, é preciso conhecer o aluno com o
qual se vai trabalhar. Saber o que ele já conhece e, como professor, dominar
o campo de conhecimentos que justifica a sua docência. Dominar porque,
para Vygotsky (1994) e Moll (1996), o papel principal é do professor. Dele
se espera a organização do real para o aluno de modo que este aprenda. E
isso não é fácil. É preciso trabalhar do geral para o particular, integrando
conhecimentos a partir de suas relações, sem apresentar o conteúdo de
forma fragmentada. O professor é responsável pelo que o aluno vai aprender
e se ele vai aprender. Se ele não está aprendendo, é preciso considerar que
provavelmente é necessário mudar a forma de ensinar. Considerar também
a possibilidade de o aluno não dominar ainda conteúdos mais básicos e a
possibilidade de falta de significado do conteúdo para o aluno. No primeiro
caso, é necessário apresentar o conteúdo de maneira articulada e não
fracionada, dando-lhe uma sequência. Também é preciso rever os
instrumentos necessários para o domínio desse conteúdo, no sentido de
levar o aluno a se apropriar dele. No segundo caso, é preciso levá-lo a
aprender, primeiro, conteúdos mais básicos, para então seguir com o ensino
de outros mais complexos. No terceiro caso, é indispensável verificar tanto
a validade do conteúdo como formas de torná-lo significativo no contexto
social e cultural do aluno.
O trabalho com desafios e problemas que dependem doconhecimento científico para a sua resolução e que estejamalém da capacidade da criança resolver por si só representaminteressantes oportunidades de atuar na ZDP. “O trabalhocom pequenos grupos, considerando níveis diferenciadosde desenvolvimento de seus integrantes, também pode serprodutivo no sentido de intervir nas ZDPs (STOLTZ, 2008,p. 70).
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O investimento no conhecimento científico significativo e próprio da
escola é importante porque a partir dele ocorre uma inversão da ação, e o
pensamento passa a ser guiado por conceitos, possibilitando o
desenvolvimento do pensamento generalizante. Os conceitos científicos
seguem o caminho inverso da construção dos conceitos espontâneos.
O processo de interiorização de conceitos começa com o
desenvolvimento da criança e a partir de sua interação com o mundo social.
A relação entre a construção de conceitos espontâneos e de conceitos
científicos é de grande importância para a educação. A esse respeito,
Vygotsky (2000) indica dois percursos diferenciados, de caminhos opostos,
mas que mantêm relação dialética entre si.
O desenvolvimento dos conceitos espontâneos da criança é
ascendente, enquanto o desenvolvimento dos seus conceitos científicos é
descendente, para um nível mais elementar e concreto. Isso decorre das
diferentes formas pelas quais os dois tipos de conceitos surgem. Pode-se
remontar a origem de um conceito espontâneo a um confronto com uma
situação concreta, ao passo que um conceito científico envolve, desde o
início, uma atitude ‘mediada’ em relação a seu objeto (VYGOTSKY, 1998,
p. 135).
O trabalho na escola deve considerar não só o conhecimento científico,
como também o trabalho com a imaginação e a arte. Para Vygotsky (1999;
2008) e Colaço (2004), entre as tarefas de maior importância para a
psicologia infantil e a pedagogia está o fomento à capacidade criadora, dada
a sua importância para o desenvolvimento geral e maturidade da criança.
As atividades criadoras, os jogos e as brincadeiras criam ZDPs. Na criação,
observa-se a combinação do antigo com o novo. Vygotsky nos fala aqui da
necessidade do pensamento por imagens, base da imaginação e da fantasia.
O que a arte tem a oferecer de diferente que o conhecimento científico? A
arte fala da mesma realidade, só que com outra linguagem. A imaginação
permite a antecipação do desenvolvimento. Por lidar com a abstração, a
imaginação está na origem do pensamento generalizante. A imaginação
amplia a experiência do homem. Há uma vinculação recíproca entre
imaginação e emoção.
Vygotsky (1994) expressa que o jogo e a brincadeira da criança são
importantes desencadeadores de ZDPs. No jogo, a criança assume papéis
que estão adiante de seu desenvolvimento. É o caso do jogo simbólico em
que a criança representa a mãe, o pai, a professora, o dentista, papéis que
51
Psicologia da Educação
não são os dela, mas que aprendeu no meio social e cultural.
Resumindo, podemos entender o trabalho na escola como envolvendo
uma negociação designificados. A consciência individual e os aspectos
subjetivos são essenciais ao desenvolvimento. Na teoria de Vygotsky (VAN
DER VEER; VALSINER, 1994), eles surgem em função da reconstrução,
da reelaboração dos significados pelo indivíduo, os quais foram transmitidos
pelo grupo cultural. O processo de desenvolvimento é entendido como a
apropriação ativa do conhecimento disponível na sociedade em que a criança
nasceu. A apropriação que a criança faz do real depende de como ele é
apresentado a ela, como os outros com os quais ela interage ajudam a
organizar a sua percepção, como chamam a atenção ou desconsideram
certos aspectos. O desenvolvimento humano depende da apropriação que
o sujeito faz da experiência social, das regulações realizadas por outros para
a autorregulação.
Acesse o site www.scielo.org e busque um artigo recente envolvendo a discussão da teoria de
Vygotsky para a educação. Faça uma síntese dos principais aspectos do artigo escolhido (considere:
objetivo, referencial teórico, método, resultados, discussão e conclusão). Relacione o artigo aos
conteúdos abordados neste capítulo
52
Curso de Pedagogia - Magistério da Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental UFPR
REFERÊNCIAS
COLAÇO, V. F. R. Processos interacionais e construção de conhecimentos e subjetividade de crianças.
Psicologia: Reflexão e Crítica, v. 17, n. 3, p. 333340, 2004.
LURIA, A. R.; LEONTIEV, A.; VYGOTSKY, L. S. Psicologia e pedagogia: bases psicológicas da
aprendizagem e do desenvolvimento. São Paulo: Moraes, 1991.
MOLL, L. C. Vygotsky e a educação: implicações pedagógicas da psicologia sócio-histórica. Porto
Alegre: Artes Médicas, 1996.
OLIVEIRA, M. K. Vygotsky: aprendizado e desenvolvimento. Um processo sócio-histórico. São Paulo:
Scipione, 1997.
RATNER, C. A psicologia sócio-histórica de Vygotsky: aplicações contemporâneas. Porto Alegre: Artes
Médicas, 1995.
STOLTZ, T. As perspectivas construtivista e histórico-cultural na educação escolar. Curitiba: IBPEX,
2008.
VAN DER VEER, R.; VALSINER, J. The Vygotsky reader. Oxford: Blackwell, 1994.
_____. Vygotsky: uma síntese. 3. ed. São Paulo: Loyola, 1999.
VYGOTSKY, L. S. A formação social da mente. São Paulo: Martins Fontes, 1994.
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_____. Pensamento e linguagem. São Paulo: Martins Fontes, 1998.
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_____.The problem of the environment. In: VAN DER VEER, R.; VALSINER, J. The Vygotsky reader.
Oxford: Blackwell, 1994a.
_____. Thinking and speech. In: VYGOTSKY, L. S. Collected works. New York: Plenum, 1987.
VYGOTSKY, L. S.; LURIA, A. R. Estudos sobre a história do comportamento: o macaco, o primitivo
e a criança. Porto Alegre: Artes Médicas, 1996.
53
Psicologia da Educação
CONTRIBUIÇÕES DOBEHAVIORISMO PARA
A EDUCAÇÃO
UNIDADE 3
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Psicologia da Educação
3 CONTRIBUIÇÕES DO BEHAVIORISMO PARA A EDUCAÇÃO
3.1 O QUE É O BEHAVIORISMO?
A palavra inglesa “behavior” significa comportamento. Behaviorismo
é termo bastante utilizado para referir-se ao conjunto de definições e estudos
que compõem a teoria comportamental. O behaviorismo como teoria
psicológica tem por objetivo o estudo do comportamento humano seja para
descrever, predizer ou modificar os comportamentos.
Os behavioristas dão ênfase ao comportamento observável e
manifesto, isto é, ao que as pessoas efetivamente fazem ou dizem e ao que
ocorre como resultado de sua ação. Eles não gastam muito tempo
especulando e discutindo sobre o que poderiam estar sentindo ou pensando,
ou sobre o que ocorre em seu cérebro, a menos que isto possa ser manifesto,
registrado ou tornado observável. Alem de enfatizar o que as pessoas fazem
e os resultados dessa ação, os behavioristas também estudam a influência
que o meio exerce sobre o comportamento das pessoas.
Para os behavioristas, existem características e comportamentos das
pessoas determinados pela herança genética e pelo funcionamento orgânico,
fisiológico, biológico. Mas eles consideram que essas características, assim
como a maioria dos comportamentos são, em boa medida, resultado da
experiência e da influência do meio no qual a pessoa está inserida. Os
behavioristas chamam de aprendizagem às mudanças comportamentais que
resultam de influência externa e da experiência.
Ao longo do desenvolvimento do behaviorismo como teoria
psicológica, manteve-se sempre a convicção de que comportamentos,
hábitos, condicionamentos, tudo o que pode ser considerado resultado de
aprendizagem pode ser modificado. No entanto, os temas estudados pelo
behaviorismo foram se modificando ao longo do século XX.
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A teoria comportamental é também conhecida como teoria da
aprendizagem. Nos países onde a teoria foi mais desenvolvida (Estados
Unidos e Inglaterra), impressiona o volume de pesquisa desenvolvida sobre
aprendizagem por condicionamento e sobre os diversos fatores que
influenciam a aprendizagem.
Neste capítulo, abordamos os principais tipos de condicionamento e
alguns dos fatores que influenciam a aprendizagem das pessoas. Optamos
por fazer uma abordagem temporal, já que os estudos sobre condicionamento
respondente antecedem os de condicionamento operante e por sua vez,
esses dão subsídios para os estudos sobre aprendizagem social.
Assim, partimos da história do behaviorismo sugerida por Staats
(Ardila, 1993), na qual, identifica três gerações de pesquisadores
behavioristas que contribuíram para o desenvolvimento da teoria ao longo
do século XX. Cada geração estabeleceu princípios e conceitos que hoje
compõem a teoria.
A seguir, apresentamos a contribuição geral de cada grupo e
destacamos o autor que mais se sobressai, pela contribuição ao
behaviorismo e à educação.
3.2 PRIMEIRA GERAÇÃO DE BEHAVIORISTAS:
COMPORTAMENTO REFLEXO OU RESPONDENTE E
APRENDIZAGEM INSTRUMENTAL
A primeira geração inclui pesquisadores de áreas e países diferentes
que por volta do fim do século XIX e início do século XX - contribuíram
para descobrir os princípios básicos do condicionamento e da aprendizagem.
Eles estudaram reações fisiológicas, reflexos neurológicos, leis da
aprendizagem, comportamento animal, entre outros. Hoje em dia, os
resultados de seus estudos formam a base inicial do que depois veio a ser
chamado de behaviorismo ou de teoria da aprendizagem.
3.2.1 Comportamento reflexo ou respondente: Pavlov
Podemos mencionar como uma grande contribuição pioneira a do
57
Psicologia da Educação
Esse processo de aprendizagem acabou sendo conhecido por diversos
nomes: condicionamento simples, condicionamento respondente,
condicionamento reflexo ou condicionamento pavloviano e se resume ao
processo pelo qual um estímulo não natural provoca uma resposta fisiológica
ou emocional.
O cão de Pavlov salivava ao contato da carne com a boca; salivava
ao som de uma campainha que tocava antes de ser fornecido o alimento ou
salivava ao ser acessa a luz do local em que se encontrava. Carne, campainha
e luz provocavam salivação, mas só a carne era estímulo natural, ou seja,
alimento. O conhecimento derivado desses experimentos foi o de que
reações fisiológicas podem ser provocadas por eventos completamente
artificiais do ambiente alem do estímulo natural. Essa noção se estendeu ao
comportamento reflexo: batimentos cardíacos, por exemplo, e ao
comportamento emocional. Muitos dos medos, hábitos alimentares, entre
outros, que aprendemos desde a infância seguem esse modelo de
aprendizagem. É comum, por exemplo, bebês chorarem ao avistar a
mamadeira pouco antes do horário de mamar e pessoas sentirem enjôos
FIGURA 5 - PAVLOV
FONTE: http://commons.wikimedia.
org/wiki/Ivan_Pavlov
fisiologista Russo Ivan Petrovich Pavlov (1849 -1936) que, ao pesquisar a
fisiologia da salivação utilizando cães, descobriu que não é apenas o alimento
como estímulo natural que provoca a emissão de saliva. Ao contrário, outros
estímulos artificiais, como, por exemplo, o som de uma campainha, se
relacionados à alimentação provocam também essa reação fisiológica. Ele
concluiu que algumas reações fisiológicas podiam ser condicionadas por
eventos que ocorrem no ambiente e passou a estudar os princípios desse
tipo de aprendizagem
58
Curso de Pedagogia - Magistério da Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental UFPR
3.2.2 Aprendizagem instrumental: Thorndike
Os estudos do norte americano Edward Lee Thorndike (1874 -1949)
sobre aprendizagem resultaram na formulação da “lei do efeito” e na
definição da aprendizagem instrumental: neste caso não existe uma resposta
provocada por um estímulo identificado ou natural e sim um comportamento
que objetiva uma meta e que será construído progressivamente por tentativas
e erros. A probabilidade de repetir uma resposta depende de quanto ela
nos aproxima da meta desejada e do prazer que isso nos proporciona.
Aprendizagem por tentativa e erro é facilmente observável em crianças
quando constroem com blocos de madeira, quando experimentam encaixar
peças em brinquedos e quebra-cabeças: cair uma torre ou não encaixar
uma peça dá a dica de que outra forma deve ser experimentada. As
brincadeiras que as crianças fazem com letras e palavras podem seguir este
modelo de aprendizagem e erro, o prazer da descoberta de acertos e erros
auxilia no domínio da linguagem falada e escrita.
ao ver certos alimentos, mesmo sem comê-los.
Os princípios do condicionamento respondente são muito utilizados pelos
profissionais de propaganda que os utilizam para promover o consumo de
certos produtos pela ativação de necessidades fisiológicas e afetivas. Marcas
de alimentos são relacionadas a necessidades afetivas, sexuais, convívio
familiar ou com amigos, o que não tem relação nenhuma com seu valor
alimentício.
Pense o que significa a expressão “dar água na boca”, quando a usamos?
Você já sentiu fome ao sentir cheiro de carne assada? E ao ver uma propaganda de comida?
Observe em sua casa, se as pessoas se levantam para comer ou beber quando passam na televisão
propagandas de comida, refrigerante ou cerveja.
Preste atenção em propagandas: identifique apelos afetivos, amedrontadores, sexuais ou outros utilizados
para promover o produto que se anuncia.
Observe seus alunos: consegue identificar alguma reação de ansiedade, medo, alegria ou qualquer
outra, provocada por eventos do ambiente? Como reagem a propagandas?
59
Psicologia da Educação
O pequeno Albert tinha menos de um ano quando foi colocado nesse
estudo. Foi verificado inicialmente que Albert não apresentava sinais de
medo quando via um ratinho branco, desses de laboratório, circulando
pelo local da experiência. Também foi verificado que, como muitos bebês,
Albert assustava-se e chorava ao ouvir um som repentino e estridente.
Seguindo os princípios do condicionamento operante, Watson
apresentou o ratinho branco junto com o som (pareamento) e não
demorou muito tempo para o pequeno Albert começar a chorar e
manifestar medo quando apenas via o ratinho. O medo provocado por
algo que antes não o provocava estava instalado. O mais interessante
dessa experiência é que esse medo foi generalizado a bichos de pelúcia
brancos, a pele de casaco branca, e até, ao uniforme branco das
enfermeiras. Em termos psicológicos, Albert havia desenvolvido uma
fobia. Para retirar a fobia, Watson teve que fazer o caminho inverso, ou
seja, retirar a associação do som desagradável com os objetos brancos.
Aparentemente Albert curou-se da fobia, mas esse experimento, pelo
sofrimento que causou foi muito criticado.
Muitos dos estudos de Pavlov e Thorndike sobre condicionamento
reflexo e aprendizagem instrumental foram realizados com animais. No
entanto, nos Estados Unidos, John Broadus Watson (1878 - 1958) fez
estudos em laboratório sobre reações emocionais tais como medo e fobia
em crianças, utilizando o modelo de condicionamento respondente.
Watson é conhecido como o fundador do behaviorismo como teoria
científica. Foi muito criticado pelos seus estudos com bebês. Porem, esses
estudos mostraram que medos podem ser instalados por condicionamento
respondente e que podem ser removidos por extinção operante. O estudo
mais conhecido é o caso do “pequeno Albert” que relatamos a seguir.
60
Curso de Pedagogia - Magistério da Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental UFPR
À época, por volta de 1920, os métodos de e studo do
comportamento propostos por Watson foram uma verdadeira revolução:
ele rechaçou o corpo tradicional da psicologia e seus métodos e os substituiu
pelos métodos experimentais de estudos controlados realizados em
laboratório e centrados no comportamento observável.
Em suma, a primeira geração de psicólogos behavioristas tinha
acumulado um corpo grande de conhecimentos experimentais sobre
aprendizagem animal e tinha formulado os princípios básicos de dois tipos
de aprendizagem: a obtida por condicionamento respondente e a obtida
por aprendizagem instrumental tentativa e erro. Faltava a fundamentação
teórica de base. A partir da abria-se o espaço para a segunda geração de
behavioristas.
3.3 SEGUNDA GERAÇÃO DE BEHAVIORISTAS:
CONDICIONAMENTO OPERANTE
As tarefas da 2ª geração de psicólogos behavioristas foram ampliar
os conhecimentos científicos sobre aprendizagem e construir estruturas
teóricas formais que pudessem incorporar as descobertas experimentais.
Isto é, era necessário oferecer um contexto filosófico para o behaviorismo,
que servisse de estrutura teórica para as descobertas em laboratório.
Os que seguiam o fervor revolucionário de Watson mantiveram a
separação entre behaviorismo e a chamada psicologia tradicional. Isto quer
dizer que os temas estudados pelos behavioristas diziam respeito à
aprendizagem respondente, ao comportamento manifesto; outros temas,
tais como o estudo do inconsciente, da personalidade, da inteligência, da
cognição, da consciência, das atitudes, dos valores, entre outros estudados
pela psicanálise e outras teorias da psicologia eram considerados tabus ou
eram reduzidos a resultados de aprendizagens por condicionamento. Os
psicólogos behavioristas que no período entre 1920 e 1950 tentaram
abordar esses temas tabus não foram, muitas vezes, bem sucedidos. Uma
mudança significativa surgiu com a proposta de condicionamento operante
de Skinner (Figura 2).
61
Psicologia da Educação
3.3.1 O condicionamento operante: Skinner
Na década de 50, se alguém t ivesse interesse na teoria
comportamental - ou teoria da aprendizagem como também é conhecida -
teria que seguir os grandes expoentes da segunda geração: os
norteamericanos Hull, Tolman ou Skinner. Staats (Ardila, 1993) afirma que
o fervor e o legado revolucionários daquelas primeiras gerações foram muito
fortes. Podemos afirmar que para muitos psicólogos behavioristas ainda o
são até hoje, início do século XXI.
Vamos descrever, agora, os elementos básicos da teoria de Burrhus
Frederic Skinner (1904 -1990) e sua contribuição para a educação.
Skinner pode ser considerado como o principal representante da
corrente behaviorista que dominou incontestavelmente a Psicologia norte-
americana entre, pelo menos, as décadas de trinta a setenta do século XX.
Skinner viveu nos Estados Unidos dos ideais positivistas e democráticos de
forte influência luterana. Ali, paradoxalmente, no país que se destacava
como o mais rico do mundo na primeira metade do século XX, a depressão
econômica, a 2ª Guerra Mundial e a constatação da situação de
marginalização e de pobreza de parte da população colocavam questões
prementes para os cientistas que iniciavam suas atividades acadêmicas por
volta da década de trinta. Nesse contexto, segundo Goulart (1994), Skinner
aspirava ao ideal de buscar a melhoria da vida das pessoas. Sua contribuição
FIGURA 6 - SKINNER
FONTE: http://commons.wikimedia.org/wiki/
B._F._Skinner
62
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está dentro dos princípios e da filosofia da análise experimental do
comportamento.
Como expoente da segunda geração, Skinner formula uma filosofia
para o behaviorismo e postula uma terceira forma de condicionamento e de
aprendizagem. Skinner reconhece como formas de aprendizagem o
condicionamento respondente ou clássico, que age sobre os reflexos,
comportamentos involuntários e, em parte, sobre os componentes
emocionais e a aprendizagem por tentativa e erro. No entanto, sugere que
somente uma parte da aprendizagem obedece aos dois esquemas anteriores.
Para Skinner, a maioria das aprendizagens e dos comportamentos obedece
a outro processo que ele chamou de condicionamento operante. Nesse
processo, o comportamento se modifica pelo efeito que provoca no
ambiente, isto é, pelas suas consequências.
Em outras palavras, o condicionamento operante é o processo pelo
qual se modifica a possibilidade futura de aparecimento de um
comportamento. Isto quer dizer, que a frequência de emissão de um
comportamento pode variar em função das consequências que esse
comportamento provoca no ambiente. O comportamento operante é uma
ação voluntária, faz parte do repertório comportamental dos sujeitos,
depende da musculatura estriada do organismo e ocorre sem que, muitas
vezes, seja possível detectar algum estímulo específico. Para Skinner, muito
do que denominamos hábitos passa por condicionamento operante e a maior
parte do comportamento humano é aprendida por este meio.
Assim, ao longo da vida, as pessoas acumulam uma história de hábitos
e aprendizagens específicas, que é sua história de condicionamentos
respondentes, operantes e outras experiências. Para Skinner, se o
comportamento pode ser modificado pelas consequências, estas podem
em qualquer momento, modificar a história de vida do indivíduo. Isto é,
comportamentos novos podem ser aprendidos e comportamentos antigos
podem ser modificados.
Nessa concepção reside uma das principais contribuições de Skinner
à Educação, pois ele se opõe à ideia do inatismo da inteligência por um
lado, e por outro, à idéia da personalidade estática. Nessa teoria, tanto
comportamentos inteligentes quanto aspectos da personalidade são
aprendidos. Muito daquilo que se considerava como características imutáveis
da inteligência e da personalidade, Skinner considera como comportamentos
operantes passíveis de modificação. Somos o resultado, em parte, de nossa
63
Psicologia da Educação
história de condicionamentos ou de aprendizagens.
Em experimentos de laboratório, foram estabelecidos os princípios
gerais de aprendizagem da teoria skinneriana. Posteriormente, foram feitas
observações em ambientes naturais como a família, escola, etc.
É importante prestar atenção às definições e conceitos da teoria
behaviorista para não criar confusão.
Na teoria skinneriana, as consequências que mudam um
comportamento operante podem ser de dois tipos: reforços ou punições.
Um comportamento pode ser aumentado ou ser mantido por meio de
reforços ou, pode ser diminuído por meio de punições ou de extinção
operante.
3.3.2 Aumentar ou manter um comportamento: reforços
As consequências que mantém ou aumentam a probabilidade de
ocorrência de um comportamento são chamadas de reforços.
A possibilidade de alguma coisa ou evento servir para reforçar vai
depender de cada pessoa. Nem tudo é reforçador para todas as pessoas.
Assim, Skinner propõe uma investigação daquilo que reforça ou pune cada
indivíduo. Por exemplo, para crianças pequenas, pegar no colo, dar atenção,
fornecer alimento, doces, brinquedos podem servir de reforçadores. Porém,
para uma criança com fome, o alimento é reforçador e para uma criança
com dor de barriga não.
Em geral, lembramos de recompensas materiais quando pensamos
em reforçadores. No entanto, o prazer ou satisfação que podemos ter ao
realizar tarefas e aprendizagens podem ser auto-reforços importantes. Por
exemplo, uma criança pode aprender a escovar seus dentes pela sensação
agradável de limpeza e pela saúde bucal que isso traz e não apenas porque
assim agrada pais ou professores ou porque ganhará um brinquedo se o
fizer. O mesmo vale para as lições de casa e aprendizagens escolares ou
quaisquer outros comportamentos.
É importante saber que não somente uma criança pode ser levada a
certas preferências e gostos pelo meio de condicionamento respondente e
operante, mas que a auto-satisfação também pode ser condicionada. Para
tanto, a criança pode ser incentivada a expressar seus sentimentos em relação
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às tarefas que executa, alem de receber os merecidos elogios ou
recriminações. A percepção pela criança de como se sente faz parte da
aprendizagem do seu autocontrole.
Para Skinner os reforços podem ser de dois tipos: quando implicam
acréscimo de algo benéfico ou agradável para o sujeito são chamados de
reforços positivos. É o caso de elogios, prêmios ou até a satisfação que
sentimos depois de ter estudado e tirado uma boa nota.
Reforços podem ser negativos quando o comportamento reforçado
retira algo que está presente no ambiente e isso é desagradável ou prejudicial
para a pessoa. É o caso quando diminuímos o som da TV que está muito
alto e nos incomoda ou quando tiramos o sapato para retirar uma pedra
que entrou quando andávamos ou quando uma criança foge da mãe ou
diretora que vai dar uma bronca. Tanto o comportamento de diminuir o
som quanto o de tirar o sapato pode ser repetido no futuro. De igual modo,
se a criança na fuga se livrou da bronca, tenderá a repetir esse
comportamento no futuro.
3.3.3 Diminuir um comportamento: punição e extinção operante
Ao contrário do que acontece quando se usam reforços, algumas
consequências podem diminuir, em lugar de aumentar, a probabilidade de
ocorrência futura de um comportamento. As consequências que diminuem
comportamentos chamam-se punições. Assim como os reforços, as punições
também podem ser de dois tipos: positivas quando acrescentam algo
prejudicial ou desagradável para a pessoa e negativas quando retiram algo
agradável ou benéfico. Observe que é o oposto do que acontece no reforço.
Um exemplo de punição positiva é quando somos multados por estacionar
em lugar proibido, quando uma criança “apanha” por algo que fez de errado
ou quando fica de castigo por mentir. Exemplo de punição negativa é quando
a criança perde o recreio que adora por não ter feito a lição de casa, fica
sem ver televisão por ter feito algo errado ou perde as férias porque reprovou
Reforços de qualquer tipo aumentam ou mantém a probabilidade de um comportamento
aparecer no futuro.
65
Psicologia da Educação
várias disciplinas.
Além da punição, Skinner descreve outra forma de eliminar
comportamentos que é chamada de extinção operante. A extinção operante
consiste em não fornecer consequência alguma para o comportamento que
se deseja eliminar.
No entanto, seria equivocado acreditar que Skinner é a favor das
punições. Ao contrário, quando Skinner discute a modificação de
comportamentos, ele faz ênfase na utilização de reforços para os
comportamentos ou hábitos que se deseja estabelecer, ou seja, reforçar
aquilo que se quer que a pessoa aprenda. Ao mesmo tempo, os
comportamentos que se deseja eliminar devem ficar sem reforços para que
diminuam. Ele desaconselha utilizar apenas punições, pois considera que
elas provocam suspensão apenas momentânea do comportamento
indesejado, provocam frustração e reações emocionais adversas na pessoa
punida e não evitam o aparecimento posterior do mesmo comportamento,
principalmente, quando a pessoa não sabe o que deve fazer ou não aprendeu
o comportamento exigido.
No uso de punições e reforços na educação encontramos alguns
equívocos:
Na educação infantil, pode acontecer que muitas vezes esquecemos
que os comportamentos desejados devem ser “ensinados” para as crianças.
Isto quer dizer que temos que estabelecer um processo de aprendizagem
ou de condicionamento daquilo que queremos e não apenas punir ou castigar
quando a criança “fez errado”.
Outra crença comum na educação de crianças, e que a compreensão
do funcionamento de reforços e punições nos ajuda a superar, é achar que
se a criança fez o que esperávamos, ela não deve ser elogiada, pois fez
apenas o que devia fazer; mas, se ela fizer o que achamos errado e queremos
que modifique deve ser punida. Estas atitudes contradizem os princípios do
reforçamento operante que mostram que reforçar o comportamento
Na Teoria Behaviorista para diminuir comportamentos indesejados utiliza-se punição
ou ignora-se o comportamento.
66
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adequado e ignorar o inadequado é melhor do que simplesmente punir o
inadequado.
3.3.4 Modelagem e esquemas de reforçamento
O processo utilizado para ensinar um comportamento na teoria
skinneriana é chamado de modelagem. Consiste basicamente em:
1) Observar, em primeiro lugar, se o comportamento que se deseja
estabelecer, ou que seja aprendido, já faz parte do repertório
comportamental da pessoa e em que medida aparece. Se não, busca-
se algum comportamento aproximado àquilo que se deseja.
2) Em segundo lugar, passa-se a reforçar aproximações do
comportamento todas as vezes que aparece: isto é reforço é contínuo.
3) Uma vez estabelecido o comportamento desejado (aprendido)
podemos melhorar sua qualidade. Para tanto passamos a reforçar
seletivamente aqueles desempenhos qualitativamente melhores.
4) Também é possível definir quando e como se deseja o
comportamento, variando o número de respostas exigidas e o tempo
de resposta, como veremos a seguir.
Outras modificações na emissão de comportamentos podem ser
realizadas pela variação do número de respostas exigidas e pela variação do
espaço de tempo em que se fornecem os reforços.
Skinner considera que na vida diária o esquema que prevalece não é
o de reforço contínuo, ou melhor: nem sempre somos punidos ou reforçados
pelo que fazemos de bom ou de ruim. Assim, nem os pais elogiam
constantemente seus filhos nem os professores podem elogiar todos seus
alunos ao mesmo tempo e todas as vezes que seria necessário. Na realidade
esquemas de reforço contínuo são mais utilizados quando queremos
estabelecer uma aprendizagem nova ou modificar uma antiga. O mais comum
é que um comportamento seja reforçado algumas vezes sim e outras não,
aleatoriamente, ou que siga algum outro esquema.
Assim, Skinner estudou as variações que ocorrem no comportamento
67
Psicologia da Educação
em função do espaçamento do tempo em que surgem os reforços e o que
ocorrem depois de emitidas uma ou várias respostas. Se o esquema
condiciona que o reforço aparecerá num período de tempo espaçado e
fixo, por exemplo, um reforço a cada meia hora, há uma concentração de
comportamentos próximo do fim da meia hora. Algo similar ocorre quando
os alunos estudam loucamente apenas antes das provas quando estas
ocorrem semestralmente.
A outra variação no esquema de emissão de comportamentos está
relacionada à exigência de um número qualquer de comportamentos antes
do aparecimento da consequência. Por exemplo, Skinner treinou pombos
famintos a bicar um alvo e verificou que era possível exigir cada vez mais
bicadas antes de fornecer o reforço alimentar. Isto poderia levar a bicar ou
“trabalhar” até a exaustão. Na agricultura, na indústria e em atividades de
serviço, é comum encontrar este esquema: pessoas recebem pagamentos
e premiações pela quantidade de sacas colhidas, pela quantidade de
produtos fabricados ou vendidos.
Como na vida diária os reforços e punições não são sempre contínuos,
Skinner verificou que reforços aleatórios são os mais comuns e que uma
vez criado o hábito ou aprendido o comportamento, os reforços aleatórios
o mantém, tornando muito difícil modificá-lo. Por isso é necessária a análise
do comportamento.
Outra situação que deve ser considerada é que, na escola e em outros
ambientes onde interagem muitas pessoas, o professor pode não ser a
principal fonte de reforçamento para algumas crianças. Assim, quando os
reforços e tentativas do professor para modificar o comportamento de um
aluno falham, deve ser observado se o comportamento que se quer modificar
não está sendo reforçado pelos colegas ou outras pessoas da instituição ou
fora dela. Isto, às vezes requer auxílio de especialistas para realizar a análise
e a proposta de modificação.
Recapitulando: vimos até agora três tipos de aprendizagem:
- aprendizagem por condicionamento respondente
- aprendizagem por tentativa e erro
- aprendizagem por condicionamento operante
68
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3.3.5 Implicações educacionais dos estudos de Skinner
A ideia de que o comportamento pode ser modificado pelas
consequências trouxe implicações para a educação no sentido de que
chamou a atenção para a influência que os educadores sejam eles pais ou
professores exercem sobre o comportamento dos educandos. A ideia de
motivos intrínsecos como única explicação para os comportamentos passou
a ser questionada.
As técnicas derivadas da análise experimental do comportamento e
as técnicas de modificação do comportamento são amplamente utilizadas
ainda hoje nas escolas.
Algumas noções comportamentais, como a da necessidade de
observação minuciosa das situações de aprendizagem para poder discriminar
adequadamente como são reforçados os comportamentos (contingências
de reforçamento); a do valor dos reforços na aprendizagem e manutenção
de comportamentos adequados e, principalmente, a das noções referentes
aos malefícios e não efetividade da punição são conhecimentos úteis para o
professor.
A área educacional para a qual a utilização dos princípios de
modificação do comportamento contribui significativamente é a da educação
especial, principalmente na formação de hábitos de convívio social e de
higiene.
A teoria skinneriana valoriza o papel do professor no processo de
aprendizagem: é ele que deve planejar e organizar conteúdos e atividades,
dirigir e reforçar a aprendizagem dos alunos e ensiná-los a formar hábitos de
estudo e também de auto-reforço e motivação. A resposta dos alunos, sua
aprendizagem, depende então, em boa parte, do professor e do controle
que ele exerce.
Faça um quadro sobre as característ icas do condicionamento respondente e do
condicionamento operante. Procure exemplos, em sua experiência, que ilustrem os
diversos tipos de condicionamento mencionados acima. Discuta com seus colegas e
tutor os exemplos que vocês escreveram.
69
Psicologia da Educação
Assista o filme “Trocando as bolas”, com os atores Dan Aykroyd e Eddie Murphy e
direção de John Landis. Esse filme mostra como seria possível mudar a vida das pessoas
com controle do comportamento e como as pessoas poderiam modificar esse processo
quando percebem que estão sendo controladas. Aproveite e dê boas risadas com essa
comédia de ficção. Depois pense, seria possível mudar totalmente a vida das pessoas,
como o filme propõe?
Assista ao programa de televisão chamado “Super Nanny”. Você consegue identificar os
princípios de aprendizagem e condicionamento aplicados nas propostas de modificação
de comportamento? Veja o que seus colegas identificaram e discutam: vocês fariam a
mesma coisa, como fariam?
Além de hábitos de higiene, de organização e cuidados com seu
ambiente, outro ótimo exemplo de comportamentos que são aprendidos e
precisam ser reforçados, na escola e em casa, são os chamados “hábitos de
estudo” como sublinhar ideias importantes, palavras desconhecidas, buscar
significados no dicionário, fazer resumos, quadros, para citar apenas alguns
relacionados à leitura. Estes e outros hábitos podem ser ensinados na escola
desde as primeiras séries já que não surgem espontaneamente nas crianças.
Outra contribuição dos estudos de Skinner para a educação encontra-
se na chamada tecnologia educacional que propõe técnicas como o estudo
dirigido (no qual pequenas unidades de conteúdo são aprendidas
progressivamente passo a passo) e as máquinas de aprender que hoje
encontram equivalente em muitos programas educativos que utilizam
computador.
É um erro acreditar que a teoria de Skinner apenas propõe a
manipulação do comportamento. Em seus escritos Skinner frisou sempre a
necessidade de levar as pessoas ao auto-controle, isto é, à percepção do
que as influencia ou controla de modo que elas possam ter auto-controle de
suas vidas. Apenas como informação, a expressão utilizada por Skinner
para definir o que chamamos neste texto de autocontrole foi contracontrole.
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3.4 TERCEIRA GERAÇÃO DE BEHAVIORISTAS: aprendizagem social
do comportamento
A terceira geração de pesquisadores behavioristas se fortalece na
segunda metade do século XX. Ela se caracteriza pelo interesse em criar
enfoques mais integrados com outras correntes da psicologia. Isto quer
dizer que se procuravam formas de estudar temas, antes não abordados,
com os métodos e os conceitos behavioristas. No entanto, nem a primeira
nem a segunda geração de behavioristas tinha criado marco de referência
produtivo para essa unificação.
Surgiram, então, propostas teóricas que buscavam aproximação e
síntese com outras teorias psicológicas e estudos sobre temas como
personalidade, cognição, emoções que utilizavam conceitos e métodos
behavioristas. Na área educacional investigaram-se características de
professores e alunos que podem influenciar nas situações de ensino e de
aprendizagem. Estudos sobre criatividade, motivação, auto-estima, lócus
de controle, auto-eficácia, crenças auto-dirigidas, entre outros trouxeram
contribuições para a educação.
A seguir, apresentamos os resultados de estudos e os conceitos
teóricos desenvolvidos por Albert Bandura (1924 -), principal representante
da terceira geração.
3.4.1 A Teoria da Aprendizagem Social de Bandura
Estudos sobre imitação e agressividade
Professor e pesquisador ainda na ativa na Universidade de Stanford,
Estados Unidos, Albert Bandura (1924 - ) procura demonstrar, desde o
início de sua carreira por volta de 1960, que a aprendizagem ocorre por
outros meios e não apenas pelo reforço direto do comportamento principal
ideia defendida por Skinner e a segunda geração de behavioristas.
Em outras palavras, encontramos aqui uma diferença que deve ser
bem entendida: nas teorias de condicionamento respondente e operante
quem recebe reforços ou punições é o próprio sujeito da ação; na teoria da
aprendizagem por observação, o observador vê outra pessoa ser reforçada
ou punida pelo seu comportamento. Este sujeito que observa aprende pelo
71
Psicologia da Educação
que viu: pela imitação de modelos.
Bandura acredita, conforme relata Pajares (2004), que as diversas
culturas humanas transmitem costumes sociais, conhecimentos e
competências complexas, principalmente pela experiência vicariante, isto é,
pela aprendizagem com base na imitação de pessoas que servem como
modelos.
Sendo assim, Bandura (1961) propõe que enquanto boa parte da
socialização infantil ocorre pelo treino direto, é possível que muito do
repertório comportamental da criança seja adquirido, também, pela imitação
de modelos. Bandura chamou esse processo de identificação com adultos
importantes de vida da criança. É importante lembrar que a identificação
não se restringe à imitação de modelos adultos, mas também, outras crianças
podem servir como modelos.
Podemos assim dizer que, o processo de identificação, como foi
mencionado acima, é chamado de aprendizagem vicariante e parece ser o
resultado da imitação pela criança de atitudes e padrões de comportamento
que os pais e outros adultos não tentaram ensinar diretamente. De fato, a
modelação parental do comportamento pode, algumas vezes, contrariar o
efeito daquilo que é ensinado diretamente.
É o que acontece, como pode ser observado em diversos estudos,
quando um pai castiga fisicamente uma criança porque ela agrediu um
companheiro. Espera-se que o resultado desse castigo seja que a criança
diminua sua agressividade com os colegas e pare de bater neles. Mas
Bandura observou que não é isso o que ocorre na realidade. Geralmente,
junto com o aprendizado intencional, certa quantia de aprendizagem não
prevista é aprendida ocasionalmente pela imitação do modelo do conjunto
do comportamento dos pais.
Ou seja, ao bater na criança para castigá-la, os pais dão um exemplo
de como agredir os outros e é este aprendizado que realmente irá mais
tarde guiar a criança em suas interações sociais. Isto quer dizer que, frente
a seus colegas, a criança imitará o comportamento paterno e não fará o que
lhe foi dito fazer.
Bandura e Walters (Pajares, 2004) realizaram investigações sobre
comportamento agressivo com adolescentes de boa condição sócio-
econômica e de famílias bem constituídas. Constataram que adolescentes
hiper-agressivos podem ter pais que servem de modelo para atitudes hostis.
72
Curso de Pedagogia - Magistério da Educação Infantil e Anos Iniciais do Ensino Fundamental UFPR
Esses pais não toleram agressividade em casa, no entanto incentivam a
agressividade do filho fora dela. Têm atitude complacente quando o filho
relata o seu envolvimento em situações agressivas contra colegas e na escola.
Na escola encontramos alunos que são incentivados a serem agressivos da maneira relatada
acima? O que a escola faz? Comente com seus colegas de curso.
Experimentos realizados com crianças em situação pré-escolar
mostraram que enquanto aprendem conteúdos das situações educativas,
as crianças também aprendem a imitar certos comportamentos do professor
que são totalmente irrelevantes para a tarefa orientada.
Uma explicação para isso é que respostas afetivas aumentam as
propriedades reforçadoras secundárias do modelo e predispõem o imitador
a reproduzir o comportamento observado, pela satisfação que isso produz.
Uma vez que as características dos pais e de outras pessoas
significativas adquirem propriedades reforçadoras para a criança, mesmo
que ela não seja reforçada diretamente, a satisfação de agir como alguém
que ela gosta pode gerar autorreforço.
Em geral, crianças aprendem a imitar o comportamento exibido por
modelos quando eles interagem de maneira responsiva e de modo a cuidar
da criança. O valor das propriedades secundárias do modelo aumenta em
função da atitude e isso facilita a aprendizagem. Isso vale para todos os
tipos de comportamentos menos para o agressivo que, independente da
qualidade do modelo, as crianças imitam rapidamente.
Por meio da associação repetida entre o comportamento parental e
atributos como aconchego, reforço, atividade afetuosa de cuidado, assume-
se que as características do comportamento dos pais gradualmente tomam
valor positivo para a criança. Consequentemente, a criança está motivada
para reproduzir em seu comportamento os atributos valorizados
positivamente.
Para ilustrar o mecanismo da imitação, Bandura (1963) costumava
contar para seus alunos uma história contada por um de seus professores:
73
Psicologia da Educação
Um fazendeiro solitário decidiu ter um papagaio comocompanhia. Depois de comprar o pássaro, o fazendeiropassava um bom tempo à noite ensinando ao papagaio afrase: diga tio! Diga tio! A despeito da devota atenção doprofessor, o papagaio não mostrava nenhuma resposta.Finalmente, o frustrado fazendeiro pegou uma vara demarmelo e, depois de cada recusa em produzir a fraseesperada, batia na cabeça do papagaio. Esse método visceralprovou ser tão ineficaz quanto o outro mais cerebral. Entãoo fazendeiro agarrou seu amigo emplumado e o jogou nogalinheiro. Tempos depois, o fazendeiro ouviu uma baitaconfusão no galinheiro e foi investigar. Encontrou que opapagaio cutucava na cabeça com uma vara de marmelo asassustadas galinhas e ao mesmo tempo gritava: diga tio!Diga tio! (BANDURA, 1963). [tradução livre da autora]
Bandura realizou diversos estudos para determinar em que medida a
agressão pode ser transmitida, para as crianças, pela exposição a modelos
de adultos agressivos. Um deles ficou conhecido como experiência do
boneco João bobo.
Nessa experiência, as crianças que assistiram a um vídeo que mostrava
um adulto do sexo feminino ou masculino batendo em um boneco Jõao
bobo, imitaram esse comportamento em situação de jogo posterior.
Para entender melhor:
Diversos sites na Internet veiculam filmes sobre o experimento com o boneco João
bobo. Esses filmes podem ser acessados com as palavras de busca: “Bobo doll”, “João
bobo” e “Albert Bandura”. Assista os filmes e leia o texto da disciplina.
Além da agressividade dos adultos, também a atitude que os adultos
têm em relação a sua própria agressividade, pode ser imitada pelas crianças.
Os adultos diferem na maneira como conduzem seus impulsos agressivos.
Alguns atacam verbalmente e outros podem atacar fisicamente. Alguns
adultos fogem de ataques agressivos porém sentem-se magoados por essa
reação, outros encaminham sua agressividade para atividades políticas ou
esportivas. Seja aberta ou oculta, a atitude dos adultos pode ser percebida
e imitada pela criança.
74
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Os avanços da tecnologia da comunicação fizeram dos modelos
simbólicos ou modelos virtuais - um veículo chave na difusão de ideias,
valores e estilos de comportamento.
As investigações com o boneco João bobo se estenderam para outros
estudos, nos quais, foi avaliado o efeito sobre as crianças de modelos
agressivos na vida real e na mediação por filmes ou modelos veiculados
pela televisão. Depois da exposição a cada tipo de modelo as crianças
passavam por uma situação frustrante e verificava-se a quantidade de imitação
do comportamento agressivo anteriormente observado.
Os resultados deixaram pouca dívida de que a exposição a modelos
agressivos praticamente duplica a agressividade das crianças após a
frustração subsequente. Observou-se tendência, principalmente nos meninos,
a imitar mais os modelos agressivos masculinos do que os femininos. Alguns
meninos chegaram a dizer espontaneamente que o comportamento da
mulher agressiva estava fora do tipo (não era a maneira de mulheres se
comportarem). O modelo masculino agressivo era visto como apropriado
por meninos e meninas.
Foi verificado também que, quando as crianças assistiram modelos
não agressivos, elas imitavam esse comportamento.
Modelos não só reduzem a inibição da agressividade das crianças
como também modelam a forma do comportamento. Outro resultado
verificado nesses estudos foi que as crianças estiveram menos inclinadas a
imitar modelos dos desenhos animados - apesar de que eles também
provocaram aumento da agressividade - do que modelos da vida real. No
entanto, os filmes são tão efetivos quanto as situações da vida real para
eliciar e transmitir agressividade.
Por outro lado, também foi demonstrado que expor crianças agressivas
a modelos alternativos, que possuam maneiras não agressivas, para que
elas possam copiar pode ser altamente eficaz na modificação dos padrões
de personalidade agressivo-dominantes.
Em diversos estudos as crianças foram expostas a um modelo único.
No entanto, no curso do desenvolvimento social as crianças têm amplo
contato com modelos múltiplos, particularmente os membros da família, da
escola e outros ambientes e esses modelos podem diferir amplamente em
seu comportamento e em sua influência relativa sobre a criança.
75
Psicologia da Educação
Apesar de as crianças adotarem muitas características dos modelos
mais fortes, elas também reproduzem alguns dos padrões de respostas do
modelo que ocupa papel subordinado. Seu comportamento é uma síntese
dos elementos selecionados dos vários modelos. Então, numa família até os
membros do mesmo sexo podem exibir diferentes características de
personalidade, conforme tenham selecionado diferentes elementos a imitar
nas atitudes e comportamentos de seus pais. Embora pareça paradoxal, é
possível encontrar considerável inovação pela imitação seletiva.
Pode-se concluir, então, que as crianças não reproduzem
mecanicamente as características da personalidade de cada modelo com o
qual se deparam e nem imitam cada elemento do comportamento exibido
pelos modelos mesmo quando constituem suas fontes primárias de
comportamento social. Na realidade realizam seleção e síntese de diversos
modelos e comportamentos.
Diversas variáveis psicológicas determinam a seleção dos modelos e
o grau em que serão imitados. A maneira como o comportamento do modelo
é reforçado ou punido (consequências) influencia a imitação. Vários estudos
foram realizados para verificar essa ideia.
Um estudo apresentou, para grupos distintos de crianças, versões
do mesmo filme, porém com diferentes consequências finais: em um filme,
o modelo é reforçado; no outro, é punido. No primeiro filme, no qual a
agressão do modelo é reforçada, as crianças imitaram rapidamente o
comportamento agressivo físico e verbal. Ao mesmo tempo, esse modelo,
cuja agressividade foi reforçada, foi escolhido pela maioria das crianças como
o preferido para imitar, embora fosse criticado por elas, por não se controlar
e por jogar sujo. Pelo contrário, as crianças que viram o filme onde o
comportamento agressivo foi punido, não o imitavam e não escolhiam aquele
modelo como preferido.
Em suma, esses estudos sobre imitação do comportamento agressivo
claramente demonstram que consequências reforçadoras para o modelo
do comportamento podem levar a superar o sistema de valores do
observador. As crianças rapidamente imitam os modelos “que se dão bem”
mesmo que possa ser rotulado como moralmente repreensível e discutível
e o modelo seja criticado publicamente por envolver-se nesse tipo de
comportamento.
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Em muitas apresentações de TV e de outros meios de comunicação
de massa, modelos anti-sociais acumulam fontes de reforços consideráveis
utilizando meios tortuosos e são apenas punidos após o último comercial,
na suposição de que o final punitivo apagará ou irá contra a aprendizagem
do modelo de comportamento anti-social. As pesquisas de Bandura (1963)
revelaram que apesar da punição final administrada, esse final não impede
a imitação do comportamento anti-social inicialmente reforçado.
Estudos sobre autorregulação
Outro tema pesquisado por Bandura (PAJARES, 2004; BANDURA,
2005) nos anos 1960 foi o do desenvolvimento infantil das capacidades
de autorregulação. Para tanto, realiza estudos sobre a aquisição de padrões
de atuação por autorreforço a partir da perspectiva de que as pessoas são
organismos proativos, auto-organizados, autorregulatórios, autorreflexivos
e não apenas organismos que reagem e são moldados por estímulos do
meio.
Em 1977, Bandura publicou o livro Teoria da aprendizagem social,
no qual sintetiza a teoria da aprendizagem por modelação psicológica
(imitação). Esse livro teve ampla repercussão no crescente interesse de
muitos pesquisadores pelo aspecto social da aprendizagem.
3.4.2 A Teoria Cognitivo-Social da Aprendizagem de Bandura
Bandura trabalhava com pesquisadores de vários campos de
conhecimento, seu leque de interesses era bastante amplo. Por exemplo,
ao estudar formas de melhorar distúrbios fóbicos, interessou-se pelas
mudanças que estavam relacionadas à percepção de eficácia pelos pacientes.
Ele continuava com o interesse teórico pela aprendizagem por observação,
a autorregulação, a agressividade e as mudanças psicológicas, mas a partir
dos anos 1980, Bandura (2006) se dedica mais a elucidar o papel mediador
do pensamento autorreferenciado na atividade humana.
Em meados de 1980, Bandura desenvolveu a teoria cognitivo-social
da aprendizagem que ele considerava mais ampla e integradora do que a
teoria da aprendizagem social. A teoria cognitiva social explica as causas do
funcionamento social pela interação entre fatores cognitivos, fatores da
personalidade e eventos do meio que influenciam cada um ao outro
77
Psicologia da Educação
reciprocamente. Na adaptação e mudança dos seres humanos desempenham
papel central a cognição, a aprendizagem vicariante (modelos), os processos
de autorregulação e de autorreflexão.
Competências de aprendizagem e desempenho
Sugestões educacionais podem ser adaptadas das pesquisas de Bandura
(1988). Para desenvolver competências que levem a obter melhor
desempenho pode ser realizado um programa de aprendizagem que inclui:
a) modelação qualificada;
b) fortalecimento das concepções pessoais sobre as próprias
capacidades e
c) aumento da auto-motivação através de sistemas de metas.
a) Modelação qualificada para o desenvolvimento de competências.
Para lembrar e não confundir:
O que é modelação?
Modelação é o processo pelo qual pessoas aprendem imitando
modelos. O aprendiz aqui não recebe diretamente nem reforços nem
punições. Ele observa alguém que os recebe. Da observação, o
aprendiz retira elementos para imitar e esta imitação é sua
aprendizagem. Esse processo é objeto dos estudos de Bandura e
ponto central de sua teoria.
O que é modelagem?
Modelagem é o processo pelo qual pessoas aprendem novos
comportamentos pelo reforço direto de respostas relacionadas ao
comportamento desejado. O aprendiz aqui é quem recebe os reforços
ou punições. Esse processo é objeto dos estudos de Skinner e ponto
central de sua teoria.
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O método de modelação que produz melhores resultados inclui três
elementos:
1) as pessoas observam o modelo que possui as habilidades
apropriadas;
2) as pessoas realizam atividade prática guiada em condições
simuladas, nas quais podem aperfeiçoar as habilidades;
3) as pessoas são auxiliadas para aplicar inicialmente suas novas
habilidades em situações de trabalho ou estudo que possam ser bem
sucedidas. Habilidades complexas podem ser divididas em sub-
habilidades, isto é, pequenos passos que podem auxiliar o domínio
da habilidade.
As competências humanas requerem não só habilidades, mas
também, crença na capacidade própria de utilizar bem aquelas habilidades.
De maneira recíproca, na medida em que se incrementam as habilidades,
aumenta a crença na própria competência. O impacto da modelação sobre
a crença nas capacidades é grandemente incrementado pela similaridade
percebida com os modelos. Ao aperfeiçoar as habilidades, as pessoas
necessitam retorno informativo de como estão fazendo. Isto é, chamar a
atenção para o que foi bem feito enquanto se corrigem as deficiências.
Práticas simuladas continuam até que os alunos possam desempenhar
as habilidades com perícia e espontaneidade. O passo seguinte é ganhar
bom desempenho e autoconfiança em situações reais. As pessoas devem
ter a experiência de ser bem sucedidas utilizando o que aprenderam para
poder acreditar nelas mesmas e no valor dos novos meios.
FIGURA 7
FONTE: http://www.sxc.hu
79
Psicologia da Educação
A situação de aprendizagem deve prover tempo de prática suficiente
para obter proficiência nas habilidades modeladas. Em outras palavras, as
pessoas necessitam de tempo suficiente para se convencer de sua nova
efetividade. Outro detalhe importante é que novas habilidades não serão
amplamente utilizadas se não se provam úteis quando postas em prática
em situações de trabalho.
b) Autoeficácia percebida
Sobre o senso de autoeficacia, Bandura costumava dizer que as
práticas educacionais deveriam ser avaliadas não só pelas habilidades e
conhecimento que produzem para o uso presente. Também deveria ser
considerado o que fazem com as crenças infantis sobre suas capacidades,
crenças que influenciam a maneira como as crianças abordarão o futuro.
Diversos estudos de Bandura mostraram que estudantes que desenvolvem
um forte senso de autoeficácia estão bem equipados para educar a si
mesmos quando têm que confiar em sua própria iniciativa.
Há enorme diferença entre ter uma habilidade e ser capaz de utilizá-
la bem e consistentemente em circunstâncias difíceis. O sucesso requer
habilidades e forte crença na própria capacidade de exercer controle sobre
os eventos que levam a alcançar uma meta. As crenças de uma pessoa
sobre suas capacidades podem afetar sua vida de muitas maneiras.
O que a pessoa acredita interfere nos tipos de escolhas que uma
pessoa faz, no empenho que coloca naquilo que realiza, em quanto ela
persevera frente a dificuldades e impedimentos e na sua capacidade de
encontrar apoios e meios de enfrentar falhas e impedimentos. As crenças
da pessoa determinam se os seus padrões de pensamento são
autoimpeditivos ou de autoajuda.
Crenças sobre autoeficácia
Uma pessoa com alto senso de eficácia focaliza sua atenção em como
administrar as tarefas. Uma pessoa com baixo senso de eficácia e cheia de
autodúvidas se centra nas coisas que podem sair mal e nas suas
incapacidades.
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Observe o que você pensa quando enfrenta dificuldades. Você é do tipo de pessoa que
acha que o mundo vai acabar, que você não vai dar conta, que vai dar tudo errado ou, você
procura soluções e se esforça para resolver os problemas?
Observe crianças. Você percebe diferenças no pensamento de autoeficácia, entre aqueles
que estão bem em seus estudos e os que estão com notas baixas?
Uma pessoa com alto senso de eficácia focaliza sua atenção em como administrar as tarefas.
Uma pessoa com baixo senso de eficácia e cheia de autodúvidas se centra nas coisas que
podem sair mal e nas suas incapacidades.
As crenças das pessoas em sua capacidade afetam sua criatividade
produtiva. Num experimento, pessoas que passaram por um treino de como
incrementar o pensamento criativo mostraram que, quanto maior era a crença
em suas capacidades, mais altas eram as metas que colocavam a si mesmas,
elas permaneciam mais fortemente comprometidas em alcançar essas metas
e eram mais produtivas em trazer ideias criativas.
As pessoas frequentemente restringem suas opções de carreira porque
acreditam que lhes faltam as capacidades necessárias, mesmo se elas têm
realmente as habilidades. Se considerarmos os avanços tecnológicos, antigas
barreiras permanecem: meninos tendem mais a ter bom desempenho ao
lidar com computadores do que as meninas, porque eles vêem como
necessário para seu futuro.
Autoeficácia e motivação
Crenças de autoeficácia também afetam a motivação. As crenças
que as pessoas têm sobre sua eficácia determinam quanto esforço será
gasto em seu empenho e quanto tempo irão perseverar face aos obstáculos.
Quando enfrentam dificuldades, pessoas com dúvidas reduzem seus esforços
e optam por soluções medíocres ou desistem.
As pessoas que acreditam que podem lidar com tarefas e situações
difíceis, não caem fora e não se afetam por elas. Aqueles que não acreditam
se estressam. Eles pensam em suas deficiências, vêem as situações como
cheias de obstáculos, se preocupam com possíveis problemas que dificilmente
podem acontecer, se estressam e diminuem seus desempenhos.
81
Psicologia da Educação
Na tensão e na depressão a auto-eficácia percebida tem a ver com
habilidade de lidar com os problemas e com a própria habilidade para
controlar hábitos de pensamento angustiantes. Não é a mera ocorrência de
pensamentos apreensivos senão a inabilidade de retirá-los que provoca a
ansiedade. A habilidade para lidar com pensamentos negativos e de mudar
o pensamento para ideias que auxiliem a pessoa a se organizar para enfrentar
problemas pode ser ensinada desde a infância.
Como promover crenças de autoeficácia
As crenças de autoeficácia das pessoas podem ser instaladas e
fortalecidas de quatro maneiras.
1) Experiências bem sucedidas. Se as pessoas obtêm somente
sucesso fácil e rápido podem esperar resultados rápidos e sentir-se
sem coragem quando falham. Quando as pessoas se tornam seguras
de suas capacidades de sucesso, elas podem lidar com falhas e
insucesso sem ser adversamente afetadas por isso.
2) Experiência vicária. O segundo modo de fortalecer autocrenças
é pela modelação. Fácil acesso a modelos proficientes constrói
competências para lidar com situações interpessoais, de estudo e de
trabalho. Ver pessoas semelhantes a si mesmo serem bem sucedidas
por esforço contínuo levanta as crenças do observador sobre suas
próprias capacidades. Observar similares falhando, a despeito de seu
alto esforço, diminui o julgamento do observador em suas próprias
capacidades e mina seus esforços.
3) Persuasão social. O terceiro modo de aumentar as crenças.
Encorajamento realista pode ser mais bem sucedido se a pessoa está
preocupada e cheia de dúvidas sobre si mesma. Além de incentivos,
motivadores e outros, designar tarefas que levem a sucesso e evitar
colocar a pessoa prematuramente em situações em que poderiam
errar ou ser mal sucedidas. Para assegurar progresso no
desenvolvimento pessoal, o sucesso é medido em termos de
autocrescimento antes que de triunfo sobre os outros.
4) Condições fisiológicas. As pessoas também confiam
parcialmente em seu nível de tensão corporal ao julgar suas
capacidades. Elas medem seu estado emocional e tensão como sinais
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de vulnerabilidade para desempenho pobre. Em atividades que
envolvem força e desempenho corporal para vencer obstáculos, as
pessoas julgam sua fadiga, dores e doenças, como sinais de
incapacidade física. Uma maneira de modificar as crenças de auto-
eficácia é reduzir a tensão corporal e a maneira de interpretar os estados
corporais.
Crenças sobre habilidade
Outro sistema de crenças que influencia a atitude das pessoas frente
ao ensino e a aprendizagem é o de como as pessoas vêem o que é habilidade.
As concepções das pessoas sobre habilidade intelectual podem ter forte
impacto sobre seu próprio funcionamento. Foram identificadas duas
concepções principais: na primeira perspectiva a habilidade é vista como
tarefa a ser adquirida e que pode ser aprimorada continuamente pelo ganho
de conhecimento e pelo aperfeiçoamento das competências pessoais.
Quanto mais esforço e trabalho, mais a pessoa se torna capaz.
As pessoas com esta concepção adotam uma atitude de aprendizagem
curiosa e inquiridora; buscam tarefas desafiadoras que dêem oportunidades
para expandir seu conhecimento e competências; vêem os erros como
naturais e como parte instrutiva do manejo de novas atividades; consideram
que as pessoas aprendem com os erros; consideram o empenho e o esforço
como parte da obtenção de habilidades e julgam suas capacidades em termos
de seu progresso pessoal e não pela comparação com outras pessoas.
Quando enfrentadas com tarefas difíceis, as pessoas que pensam em
termos de habilidades aprendidas analisam a tarefa para focalizar aquilo que
causa problemas e buscam as melhores formas de resolver os desafios.
Em contraste, na segunda perspectiva, as pessoas vêem as habilidades
como capacidades fixas com as quais vieram equipadas ao nascer. Para
elas, situações nas quais podem falhar são altamente ameaçadoras; elas
vêem qualquer equívoco como erro fatal e como prova de que não são
inteligentes; se comparam com os outros e se sentem ameaçados e sem
coragem quando os outros os ultrapassam; preferem tarefas nas quais
possam errar menos e que lhes permitam demonstrar proficiência, à custa
da aprendizagem de novas habilidades; paradoxalmente, elas também vêem
o empenho e o alto esforço como indicativo de pouca habilidade.
83
Psicologia da Educação
Quando enfrentadas com tarefas difíceis, aqueles que olham sob o
ponto de vista de habilidades fixas fazem um autodiagnóstico negativo,
focalizam suas deficiências pessoais e os possíveis resultados adversos.
Crenças sobre a capacidade de controle
Outro tipo de crença importante é o quanto a pessoa se acredita
capaz de controlar os eventos que acontecem em sua vida diária. Podem se
salientados dois aspectos no exercício do controle: o nível de auto-eficácia
para provocar mudanças pelo uso produtivo das suas capacidades e esforço;
a possibilidade de mudança (ou controlabilidade) do entorno.
Aquilo que a pessoa acredita poder ou não controlar e mudar em si
mesma e em seu entorno, afeta a extensão com que ela tira vantagem das
situações em que se encontra. Melhor desempenho escolar, por exemplo,
é obtido por crianças que acreditam que de seu estudo e esforço depende
o resultado que alcançam. Quando as crianças acreditam que o resultado
depende do professor, ou de uma inteligência que não possuem e que a
situação não vai mudar mesmo com esforço, desistem e colocam pouco
empenho nos estudos.
c) Autorregulação e motivação pelo sistema de metas
A teoria social cognitiva enfatiza também as capacidades humanas
para autodirecionamento e automotivação. Essas capacidades contribuem
para a auto-regulação da at iv idade humana. Ao exercer seu
autodirecionamento, as pessoas adotam padrões internos, pegam pistas
sobre seu comportamento e seguem incentivos para eles mesmos
sustentarem seus esforços até conseguir o que queriam.
Muitas das atividades que as pessoas fazem estão dirigidas a resultados
que se encontram longe no futuro. Portanto, eles têm que criar, para eles
mesmos, guias e motivadores no presente para atividades que conduzam à
satisfação daqueles desejos futuros, o que nem sempre é muito fácil,
especialmente para crianças e pessoas que apresentem quaisquer
dificuldades.
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Metas motivadoras
Características de metas motivadoras que auxiliam no desempenho:
ter definição explícita; ser desafiadoras e interessantes; fazer a pessoa acreditar
que vai progredir; ter proximidade temporal.
Metas bem definidas e acessíveis aumentam o bem estar psicológico
e têm efeito altamente motivador; proporcionam senso de propósito e
direção; elevam e mantêm níveis de esforço necessários para alcançá-las.
Metas confusas, mal definidas e que não deixam claro o que a pessoa
deve alcançar, diminuem o esforço e a motivação.
As metas não somente guiam e motivam o desempenho; elas também
auxiliam na formação de crenças sobre as habilidades pessoais. Submetas
divisão de tarefas em pequenos passos - servem ao propósito de ajudar a
pessoa a avaliar seu desempenho.
Um estudo analisou o que têm os jogos de computador que capturam
o interesse dos jogadores por horas sem fim. Foi verificado que os jogos de
computador interessantes têm metas desafiadoras e aqueles que não são
interessantes não.
Participação na elaboração de metas
Para aumentar os efeitos motivadores as pessoas devem concordar e
participar da definição das metas. Metas não têm muito efeito motivacional
se há pouca concordância pessoal em relação a elas.
Quando as metas estão muito distantes podem levar a desmotivação
e sofrer interferências de outras influências do dia a dia. O melhor é estabelecer
em conjunto, uma divisão em tarefas com uma série de metas alcançáveis,
em curto prazo; as metas em curto prazo guiam e mantêm a meta final em
longo prazo.
O benefício de submetas foi testado com estudantes que tinham séria
dificuldade em operações matemáticas. Um grupo de estudantes fez um
curso com os conteúdos a aprender divididos em objetivos diários a alcançar,
isto é, metas próximas. Outro grupo fez o mesmo curso, porém só havia a
meta final de aprendizagem de todos os conteúdos. Um terceiro grupo não
fez o curso.
85
Psicologia da Educação
Os resultados da pesquisa mostraram que os estudantes que se
motivaram com metas próximas aprenderam melhor as habilidades
esperadas, se tornaram mais confiantes em suas capacidades matemáticas
e desenvolveram grande interesse pela matemática. Ao contrário, os
estudantes que tinham em mente, apenas, objetivos em longo prazo, não
apresentaram melhora no seu desempenho matemático. Ao comparar o
desempenho do grupo com metas em longo prazo e do grupo que não fez
o curso, não foram encontradas diferenças.
Faça uma lista das diversas crenças aqui descritas que influenciam o desempenho. Identifique
crianças que tenham dificuldade em alguma disciplina e verifique que tipo de crenças eles
têm. Compare seu trabalho com o de seus colegas: há semelhanças? Há diferenças?
Quais? O que poderia ser feito para ajudar essas crianças?
Conheça um pouco mais sobre os autores:
Skinner - alguns livros do próprio autor fazem uma boa síntese de sua teoria:
SKINNER, B. F. Sobre o behaviorismo. São Paulo: Cultrix, 1999.
_____________. Questões recentes na análise comportamental. Campinas: Papirus, 1991.
_____________. Ciência e comportamento humano. 9. ed. São Paulo: Martins Fontes,
1994.
No livro: FADIMAN, J.; FRAGER, R. Teorias da personalidade. São Paulo: Harper &
Row do Brasil, publicado em 1979, há uma boa síntese da teoria skinneriana e exercícios
interessantes para experimentar a modificação do comportamento.
Uma síntese da teoria comportamental pode ser encontrada em:
PLACCO, V. M. N. S. (Org.). Psicologia & Educação: revendo contribuições. São Paulo:
EDUC, 2000.
Bandura - o único livro disponível atualmente em língua portuguesa é BANDURA, A.;
AZZI, R. G.; POLYDORO, S. A. J. Teoria sóciocognitiva.
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O site sobre Bandura, em língua inglesa, traz biografia e resumo de sua obra, além
de links para os textos mais importantes do autor. Pode ser acessado em: http://
www.des.emory.edu/mfp/bandurabio.html
Um bom resumo de estudos sobre auto-eficácia, crenças auto-dirigidas, motivação e
outras características da personalidade que influenciam no desempenho, pode ser
encontrado no livro:
COLL, C; PALACIOS, J.; MARCHESI, A. (Orgs.). Desenvolvimento Psicológico e
Educação: Psicologia da Educação. Porto Alegre: Artes Médicas, 1995. Volume 2.
(É bom saber que a edição de 2005 não traz essas informações já que tem outra
estrutura e conteúdos diferente).
De modo geral, os diversos sites de busca disponíveis na Internet permitem acesso a
inúmeros artigos e informações em língua portuguesa sobre Skinner, Bandura e
suas teorias. É interessante consultar e verificar o que há neles.
87
Psicologia da Educação
REFERÊNCIAS
ARDILA, R. Síntesis Experimental del Comportamiento. Bogotá: Planeta, 1993.
Bandura, A.; Huston, A. C. Identification as a process of incidental learning. Journal of Abnormal and
Social Psychology, v. 63, n. 2, p. 311-318, 1961.
Bandura, A. The role of imitation in personality, The Journal of Nursery Education, v. 18, n. 3, 1963.
__________. Organizational applications of social cognitive theory. Australian Journal of Management,
v. 13, p. 275-302, 1988.
__________. Evolution of social cognitive theory. In: SMITH, K. G.; HITT, M. A. (Eds.). Great minds in
management. Oxford: Oxford University, p. 9-35, 2005.
__________. Toward a psychology of human agency. Perspectives on Psychological Science, v. 1,
p.164-180, 2006.
GUOLART, I. B. Psicologia da Educação: fundamentos teóricos e aplicações à prática pedagógica. 4.
ed., Petrópolis: Vozes, 1994.
STAATS, A. W. Prólogo. In: ARDILA R. Síntesis experimental del comportamiento. Bogotá: Planeta,
1993.
PAJARES, F. Albert Bandura: Biographical sketch. 2004. Disponível em: <http://des.emory.edu/
mfp/bandurabio.html>. Acesso em: 29/05/2008.
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Psicologia da Educação
CONTRIBUIÇÕES DEALGUNS CONCEITOS
BÁSICOS DAPSICANÁLISE PARA O
CAMPOEDUCACIONAL
UNIDADE 4
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Psicologia da Educação
4 CONTRIBUIÇÕES DE ALGUNS CONCEITOS BÁSICOS DAPSICANÁLISE PARA CAMPO EDUCACIONAL
Muitas vezes, ao nos depararmos com alguns comportamentos das
crianças na escola, não compreendemos muito bem o que motiva esses
comportamentos. Quando a criança é ainda um bebê, ficamos curiosos
com o modo pelo qual ela incessantemente leva as mãos à boca. Um pouco
mais crescidinha, quando estamos lhe ensinando a fazer o seu asseio pessoal
de modo que ela fique um pouco mais autônoma, ficamos intrigados quando,
depois de deixá-la por diversos minutos em cima do peniquinho, ela faz xixi
em nossas mãos. Tampouco compreendemos quando determinado aluno
não desgruda da sua professora. Bem, o que será que está por trás de
comportamentos tão distintos? Para a Psicanálise, o que motiva cada um
deles é uma força constante que pressiona a partir do interior do organismo
da criança, que não tem meios de contê-la, mas pode canalizá-la. Essa força
constante é denominada por Freud de pulsão.
FIGURA 8
FONTE: http://www.sxc.hu/photo/950512
A pulsão é um processo dinâmico que acontece no psiquismo de
todos nós e consiste numa pressão que nasce a partir de uma excitação que
acontece dentro do nosso corpo. Essa excitação produz em nós um estado
de tensão, e este estado produz no nosso organismo uma urgência em
suprimir essa tensão. Para realizar essa tarefa, o organismo busca um
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objeto sobre o qual descarregar essa tensão (LAPLANCHE; PONTALIS,
1938, p. 506). Essa descarga de tensão é sentida pela criança como
prazerosa, e a essa sensação de prazer Freud vinculou o termo sexual.
Dependendo da fase do desenvolvimento do psiquismo da criança,
ela descarrega essa tensão no próprio corpo, sendo o seu corpo o seu
objeto para a obtenção de prazer. É o caso, por exemplo, do bebê que
busca obter prazer ao sugar incessantemente ora a sua chupeta, ora o seu
polegar. Em ambos os casos, o bebê está obtendo prazer ao excitar a região
oral, constituída pelos lábios, boca e garganta.
Assim temos que muitos dos comportamentos que as crianças
apresentam na escola são manifestações da pulsão. A pulsão é uma força
que nasce de excitações vindas do interior do organismo e vão produzindo
um estado de tensão. Quando esse estado de tensão é suprimido, a criança
sente prazer; quando esse prazer é obtido, diz-se que houve uma satisfação
sexual.
Além de vincular o termo sexual à redução de um estado de tensão,
Freud (O. C. v.XX, 1925, 1975, p. 51) também amplia o conceito de
sexualidade. Para ele, o termo sexualidade designa uma satisfação que
ultrapassa a obtida nas relações sexuais genitais, ou seja, naquelas relações
em que, para fins de obtenção de prazer, há a junção dos órgãos sexuais do
homem e da mulher, e que nós costumamos chamar de ‘relações sexuais,
acasalamento ou cópula’ (FERREIRA, s/d, p. 343). Para ele, as pulsões
sexuais incluem as manifestações afetuosas e amistosas, ou seja, para esse
FIGURA 9 - FREUD
http://commons.wikimedia.org/wiki/
File:Sigmund_Freud_1926.jpg
93
Psicologia da Educação
autor, as relações afetivas entre as pessoas são fonte de satisfação.
Freud utilizou o termo Eros para se referir a essas manifestações, e
ligou as manifestações eróticas às pulsões de vida, contrapondo-as às
pulsões de morte. Para ele, todo o exercício da sexualidade no homem/
mulher comporta simultânea e dialeticamente manifestações que levam à
construção e à destruição. A destruição é demonstrada, por exemplo, nas
atitudes de agressão que uma criança dirige a si mesma ou ao seu coleguinha
na sala de aula. Muitas vezes, a criança que morde a outra no parquinho da
escola está querendo dizer que, na impossibilidade de falar, com palavras,
do afeto que dirige ao coleguinha, só lhe resta o uso do corpo, o próprio e
o do coleguinha, para comunicar esse afeto. A experiência na escola nos
mostra que uma criança morde aquele coleguinha de quem se sente mais
próxima. Vejamos o que Dolto (1999, p. 141) tem a dizer sobre isso.
Uma criança é agredida por um menininho de quinze meses,tão grande quanto ela, que tem dois anos e meio. Derrubadapor ele, a menina faz uma careta de sofrimento. Depois selevanta sem dizer uma palavra. Digo, então, ao jovemagressor: “Se ela tem uma cara engraçada, é porque ela éportadora da síndrome de Down [...] você não precisavaderrubá-la! Mas ela não está chateada com você e poderiaser uma amiga para você”. Ele a rodeia, depois vem trazer-lhe um objeto. Então ela o pega pelo pescoço, levando-o(até) ao pai que está lá, vindo buscá-la. Contentamentoquase sem palavras! No fundo, o menino só queria entrarem comunicação com ela, o que poderia ter malogrado...(DOLTO, 1999, p. 141).
A pulsão de morte manifestada por atos agressivos na criança pequena
é muito comum, pois a ela falta a linguagem verbal com a qual expressar
sentimentos de prazer e desprazer frente às suas experiências cotidianas na
escola e fora dela. Na falta de uma linguagem verbal comum às duas crianças,
elas vão utilizar a linguagem corporal. Essa é facilmente entendida por ambas.
Mas, aos poucos, essas crianças deverão receber do seu meio social os
instrumentos simbólicos com os quais possam compartilhar esses
sentimentos. E, na escola, as pessoas privilegiadas para exercerem esse
papel de introduzi-las no campo simbólico são os professores.
A eles compete colocar em palavras a experiência de agressão vivida
tanto por quem agrediu como por quem foi agredido, lembrando que o ato
agressivo não comporta, quando se fala em criança pequena, uma intenção
de produzir um dano. Isso quer dizer que o ato agressivo dirigido a um
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coleguinha é um ato inconsciente. Aos poucos, na medida em que as crianças
vão conhecendo melhor as palavras e seus sentidos, elas vão conseguindo
expressar melhor seus sentimentos, e o corpo deixa de ser tão diretamente
atingido. Falando, elas conseguem comunicar o que lhes agrada e desagrada,
ou seja, o que lhes dá prazer e o que lhes causa desprazer.
As pulsões de vida englobam todos aqueles comportamentos que
levam a algo construtivo. É o caso, no exemplo acima, do menino que traz
um objeto para iniciar uma conversa com uma pessoa que desperta nele
algum afeto, algum interesse, e que minutos antes ele havia agredido. Num
convívio entre seres sociais que somos, é preciso que aprendamos a controlar
nossas pulsões, não só as pulsões de morte, mas também as pulsões de
vida, pois o pacto civilizatório exige de nós que respeitemos uns aos outros.
Por exemplo, no caso daquele menininho que, impelido pela pulsão de vida
revestida de interesse, começou a se aproximar da menininha depois de tê-
la agredido, se ela não tivesse aceitado o ‘presente’ que ele lhe trouxe, ele
teria que aceitar a decisão dela. Em respeito a ela, ele teria que manifestar
uma atitude de compreensão. Nesse caso, ela estaria demonstrando que
ainda não estava pronta para aceitar o seu pedido de desculpas. Novamente,
aqui, o papel do professor como tradutor dos sentimentos de ambos é
imprescindível.
Ao colocar em palavras todos os aspectos envolvidos no
acontecimento, o professor estaria, por um lado, nomeando os sentimentos
de cada um e as circunstâncias em que tudo ocorreu, e, por outro, e como
consequência, estaria mostrando que existe outra forma de nos colocarmos
diante de situações que não compreendemos muito bem, ou seja, estaria
mostrando aos seus alunos que a fala, as palavras, podem ocupar o lugar
de comunicação que antes estava reservado ao corpo. Aos poucos, a
comunicação simbólica substitui a comunicação corporal, fruto de muitos
dissabores nas escolas de Educação Infantil, uma vez que crianças pequenas
têm muita dificuldade em controlar as suas ações motoras, aumentando a
possibilidade de elas machucarem umas às outras.
Nem as pulsões dirigidas aos laços afetivos nem as pulsões destrutivas
são conscientes, e exigem de nós que imponhamos um obstáculo a elas
para preservarmos a nossa estabilidade emocional. É necessário que os
professores de crianças na Educação Infantil saibam que muitas vezes elas
são ‘tomadas’ por suas pulsões, das quais não têm consciência, fazendo
coisas das quais se arrependem logo depois de terem feito. Igualmente, é
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Psicologia da Educação
necessário que esses professores saibam que a criança precisa aprender a
controlar-se, mas elas não sabem fazer isso por conta própria, principalmente
porque não contam ainda com os recursos simbólicos de linguagem com
os quais possam realizar reflexões complexas.
Cabe ao professor estar atento aos seus alunos e sempre nomear os
seus sentimentos, explicitar as circunstâncias dos acontecimentos, tanto os
agradáveis como os desagradáveis, incentivando-os sempre a procurar o
sentido das suas ações, utilizando-se de todos os recursos que a linguagem
coloca a seu serviço. Seus alunos vão aprendendo, aos poucos, a controlar
os ímpetos que prejudicam tanto a sua estabilidade emocional como o pacto
civilizatório.
Para Freud (1938, 1975), a nossa vida mental é função de um
aparelho constituído de diversas partes: o id, o ego o superego. Em seus
estudos do desenvolvimento individual dos seres humanos, ele descobriu
uma área muito antiga, que influencia o funcionamento psíquico, e nomeou-
a com o termo id. O id “constitui o polo pulsional da personalidade; os seus
conteúdos, expressão psíquica das pulsões, são inconscientes, em parte
hereditários e inatos e em parte recalcados e adquiridos” (LAPLANCHE;
PONTALIS, 1983, p. 285). O ego deriva do id e “está numa relação de
dependência quanto às reivindicações do id, bem como aos imperativos do
superego e às exigências da realidade. Embora se situe como mediador
encarregado dos interesses da totalidade da pessoa, a sua autonomia é
inteiramente relativa” (LAPLANCHE; PONTALIS, 1983, p. 171). A terceira
parte do aparelho psíquico é o superego, e “o seu papel é assimilável ao de
um juiz ou de um censor relativamente ao ego. Freud vê na consciência
moral, na auto-observação, na formação de ideais, funções do superego”
(LAPLANCHE; PONTALIS, 1983, p. 643).
A Psicanálise considera que é de uma organização somática que
partem as pulsões que gerarão o psiquismo dos seres humanos. Mas, como
isso acontece? As pulsões buscam sempre satisfação, e nessa busca não
consideram restrições. Por força das exigências do mundo real, uma porção
do id se transforma numa organização que atua no sentido de colocar regras
às pulsões do id. A essa parte, transformada sob a influência do mundo
externo, Freud deu o nome de ego.
O ego tem a tarefa de autopreservação e vai agir no sentido de manter
o organismo preservado tanto com relação aos acontecimentos externos
como com as sensações e impressões internas.
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Com referência aos acontecimentos externos, desempenhaessa missão dando-se conta dos estímulos, armazenandoexperiência sobre eles (na memória), evitando estímulosexcessivamente intensos (mediante a fuga), lidando comos e stímulos moderados (através da adaptação) e,f inalmente, aprendendo a produzir modificaçõesconvenientes no mundo externo, em seu próprio benefício(através da atividade). Com referência aos acontecimentosinternos, em relação ao id, ele desempenha essa missãoobtendo controle sobre as exigências dos instintos [pulsões],decidindo se elas devem ou não ser satisfeitas, adiandoessa satisfação para ocasiões e circunstâncias favoráveisno mundo externo ou suprimindo inteiramente as suasexcitações (FREUD, v. XXIII, 1975, p. 170).
Essa citação de Freud nos permite apreender que o ego põe em ação
as funções intelectuais do nosso psiquismo. Com relação aos acontecimentos
externos, que acontecem corriqueiramente nas escolas, para manter o
psiquismo estável, o ego utiliza as funções de percepção, de memória, de
classificação, de comparação, de decisão e de escolha da ação mais
adequada para o momento. Com relação às sensações, às impressões e às
excitações internas, o ego cria alguns mecanismos para controlar as pulsões.
A esses mecanismos Freud deu o nome de mecanismos de defesa.
Em cada um de nós habita um ego que tem por função manter a
nossa estabilidade psíquica, mesmo que não tenhamos consciência de que
tudo isso está acontecendo dentro de nós. É muito importante que um
professor saiba que existe um ego em formação em cada um de seus alunos,
e que quanto mais nova é a criança menos eficiente é esse agente mediador
e tanto mais ela está submetida as suas pulsões.
Na sua tarefa de autopreservação, na busca de adaptação do psiquismo
às exigências do meio social, o ego gera um agente especial que se constitui
num prolongamento das influências das regras sociais, sejam elas advindas
dos pais, dos educadores ou das leis. Elas são introjetadas no psiquismo
infantil durante o longo período da infância, e seus efeitos se estendem ao
psiquismo do adulto. A esse agente especial Freud deu o nome de superego.
Mas isso só vai acontecer depois que a criança passar pelo Complexo de
Édipo e entrar numa fase em que as pulsões estarão em um estado de
relativa calmaria, como veremos logo adiante.
Ao diferenciar-se do ego que, por sua vez, diferenciou-se doid, o superego constitui-se numa terceira força, cabendo aoego conciliar as exigências tanto de uma quanto da outra.O superego, ao ser constituído numa criança, conta nãosomente com o impacto da personalidade dos pais dessa
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Psicologia da Educação
criança, mas, também, com as tradições, crenças e valoresdas famílias de origem dos pais, e com as exigências domeio social no qual todos se inserem. Além disso, “osuperego, ao longo do desenvolvimento de um indivíduo,recebe contribuições de sucessores e substitutos posterioresaos pais, tais como professores e modelos, na vida pública,de ideais sociais admirados (FREUD, v. XXIII, 1975, p. 171).
Isso nos faz pensar em quanta responsabilidade temos quando nos
propomos a trabalhar com crianças pequenas. À falta de uma linguagem
verbal, essas crianças vão prestar muita atenção ao que fazemos, pois quanto
menor é a criança mais ela depende, no seu processo de desenvolvimento
psíquico, de sua habilidade para imitar. Precisamos nos lembrar de que a
criança é um ser em formação que faz um esforço enorme para inserir-se
no seu meio social. Antes do domínio da linguagem verbal e falada, mas
tendo como um dos objetivos desenvolver essas habilidades simbólicas, o
ego em formação nessa criança percebe as situações e as pessoas do seu
meio social, memoriza atitudes que ela viu nos pais e nos professores, analisa
os aspectos envolvidos e decide por uma ou outra ação. É importante ter-se
em conta que tudo isso acontece sem que ela tenha consciência de que
todo esse processo está em curso dentro do seu psiquismo. Do mesmo
modo, o uso dos mecanismos de defesa não é consciente. Tudo isso
acontece num espaço virtual que tangencia o consciente, o subconsciente
e o inconsciente.
Ainda, a respeito da relação entre o id e o superego, Freud (1938,
1975) observa que embora exista uma diferença fundamental entre eles o
id sendo o substrato biológico do psiquismo e o superego a parte relativa às
influências da sociedade , há algo em comum entre eles: ambos representam
as influências do passado. O id representa a influência da hereditariedade,
que é a continuidade biológica da pessoa que vem ao mundo, e o superego
deriva da introjeção das leis morais consideradas válidas pelo psiquismo das
pessoas que fazem parte do entorno social da criança que, ao terem contato
com ela ao longo do seu desenvolvimento, influenciam-na. O id, constituindo
aquela força que impõe uma satisfação imediata das suas pulsões, e o
superego, cuja finalidade é a limitação dessas satisfações, produzem excessos
de tensão, provocando um aumento de desprazer. Esse aumento de
desprazer gera um sinal de ansiedade, sinal este próprio da função do ego.
Nesse embate de forças, as incontáveis relações entre o ego, o id e o superego
resultam em sínteses subjetivas (ou subjetividade).
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Vimos anteriormente que Freud refere-se às pulsões de vida usando
o termo Eros. Em 1938, ele relaciona ao termo Eros o termo libido e localiza
no ego a cota disponível de libido, que é a energia que movimenta o
psiquismo, embora a sua fonte seja somática, partindo dos diversos órgãos
e partes do corpo. O ego é o responsável pela distribuição dessa energia,
que vai em direção aos diferentes objetos que são investidos dessa libido e
retornam ao ego, num movimento constante (Freud, 1938, 1975).
Apesar de considerar o corpo inteiro como fonte de excitações
geradora de libido, Freud (1938, 1975) destaca algumas delas, ligando-as
a órgãos ou partes específicas do corpo humano, as zonas erógenas. Como
vimos no início deste trabalho, a primeira zona erógena se localiza na região
da boca, e o predomínio de excitação nessa região do corpo engendra a
fase denominada de fase oral.
Sabemos que a primeira atividade do bebê é mamar. Essa atividade
está a serviço da preservação do corpo da criança, mas, se bastasse a
nutrição para satisfazê-la, uma vez saciada, a criança não sugaria tudo o
que está ao alcance de sua boca. A atividade psíquica, mediante a ação do
ego, está atenta a esse modo de proceder e se concentra na satisfação
obtida pela excitação da boca e órgãos adjacentes (lábios e garganta), gerando
uma distinção entre aquilo que é fruto da satisfação biológica e aquilo que
é fruto da satisfação propriamente psicológica.
A obstinada persistência do bebê em sugar dá prova, em estágio
precoce, de uma necessidade de satisfação que, embora se origine da
ingestão da nutrição e seja por ela instigada, esforça-se, todavia, por obter
prazer independente da nutrição e, por essa razão, pode e deve ser
denominada de sexual (FREUD, 1975, p. 179).
A criança que está nessa fase é extremamente dependente das pessoas
que cuidam dela. Uma criança que acabou de nascer é muito frágil tanto do
ponto de vista biológico como do psicológico. Nesse momento do
desenvolvimento da criança, é difícil distinguir as necessidades biológicas
das demandas psicológicas, e, embora, aos poucos, essas necessidades e
demandas se diferenciem, elas se manterão relativamente inter-relacionadas
num movimento dialético constante entre os aspectos biológicos e os
psicológicos, influenciando o desenvolvimento da criança.
Mesmo estando saciado pela alimentação, o bebê vai buscar satisfazer
suas demandas pela excitação dos lábios, da boca e da garganta. Isso quer
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Psicologia da Educação
dizer que ele vai levar à boca tudo o que ele puder, objetivando produzir
uma satisfação à sua pulsão oral. É importante que as pessoas que cuidam
e educam as crianças que frequentam as escolas de Educação Infantil fiquem
atentas a essa atitude, nunca considerando que a repetição incessante desse
levar objetos à boca constitua uma provocação.
As pessoas que se ocupam dos bebês e das crianças bem pequenas,
aproximadamente com um ano de vida, precisam sempre lembrar que a
pulsão exige uma satisfação e, para isso, busca um alvo. Precisam lembrar
também que essa pulsão é uma força que nasce de excitações constantes
vindas do interior do organismo da criança, que vão produzindo um estado
de tensão. Para controlá-las, o ego precisa decidir o que fazer para acalmar
essa tensão. No caso do bebê e das crianças bem pequenas, o ego leva a
criança a realizar ações motoras de sucção, suprimindo a tensão, e quando
esse estado de tensão é suprimido, a criança sente prazer.
A segunda fase é denominada de fase anal, porque a região que passa
a exigir satisfação é a região vinculada à função excretória ou relativa ao
controle dos esfíncteres. Essa fase acontece com as crianças com
aproximadamente dois anos. Nessa fase fica um pouco mais claro algo que
já se anunciava na fase anterior, muito embora de modo quase imperceptível,
e que se constitui na satisfação obtida por meio de manifestações agressivas.
Freud (1938, 1975, p. 179) liga essas manifestações ao caráter sádico das
pulsões. Para ele, o sadismo configura-se numa fusão das pulsões de vida e
das pulsões de morte que persiste durante toda a vida psíquica da pessoa.
Segundo Laplanche e Pontalis (1983, p. 605), do ponto de vista
terminológico, Freud reserva o termo ‘sadismo’ ou ‘sadismo propriamente
dito’ para a associação da sexualidade e da violência exercida sobre outrem,
mas, de forma menos rigorosa, também usa esses termos para referir-se ao
exercício da violência, sem que haja, advinda desse exercício, qualquer
satisfação sexual. Isso explica a atitude da criança pequena que mencionamos
no início deste texto que, ao invés de fazer xixi no peniquinho, depois de ser
deixada por diversos minutos em cima dele, faz xixi nas mãos de quem a
estava ajudando. Mesmo não querendo agredir, causou-lhe um desagrado.
Uma situação muito difícil de lidar nessa fase é o auxílio à criança que
inicia o controle dos esfíncteres e da bexiga. Não é um controle fácil de
fazer e depende da prontidão do aparato esquelético e muscular da criança.
Dolto (2001, p. 48) nos ajuda a identificar o melhor período para se iniciar
o controle da defecação e micção.
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É por volta de dois anos, a partir do momento em que acriança é capaz de subir e descer uma escada sozinha, umaescada de cozinha até o último degrau, que agarra com asmãos; bem, é nesse momento que seu sistema nervosoestá pronto e que ela consegue largar as fraldas se prestaratenção. Antes, não consegue (DOLTO, 2001, p. 48).
Outro dado a ser levado em consideração no aprendizado desse
controle relaciona-se ao fato de que ele exige muita paciência das pessoas
que cuidam das crianças pequenas. Como vimos, esse aprendizado não
depende só do desejo da criança, pois não tem nada mais importante para
ela nessa fase do que agradar a sua mãe ou quem cuida dela. Ela vê a mãe
ou quem cuida dela como a fonte de todas as suas satisfações e não tem
nenhuma intenção de perder essa fonte inesgotável de cuidados. Se ela não
consegue fazer o cocô e o xixi no peniquinho, é porque talvez essa exigência
seja muito prematura. Usar a força física com essa criança, além de ser uma
violência, constitui-se numa manifestação da pulsão destrutiva de quem
exerce essa agressão. É necessário que a criança aprenda a controlar o seu
organismo, mas não a qualquer custo.
A terceira fase, segundo Freud (1975, p. 179), é uma precursora da
forma final que a vida sexual assumirá após o surgimento da adolescência,
quando então a sexualidade atingirá a sua fase genital. Essa fase, que atinge
a criança mais ou menos aos três anos, foi denominada de fase fálica, sendo
que o interesse sexual recai sobre os órgãos sexuais.
A criança que está na fase fálica já tem uma noçãomelhor, se comparada com as fases anteriores, de que existeuma distinção entre ela própria e o outro, ou seja, entre oseu eu e o objeto. Isso acontece porque o desenvolvimentodo ego da criança lhe permite estabelecer relações comobjetos com um alto grau de continuidade e estabilidade. Eele acrescenta que isso torna possível à criança nutrirsentimentos de ciúme, medo e raiva por um rival, comtodas as características essenciais desses sentimentos navida adulta (BRENNER, 1987, p. 118).
A pulsão nessa fase dirige seu interesse para os pais. São eles os
objetos aos quais a força pulsional se dirige, constituindo o que Freud chamou
de Complexo de Édipo.
101
Psicologia da Educação
Segundo Laplanche e Pontalis (1983), o Complexo de Édipoé um conjunto organizado de desejos amorosos e hostisque a criança experimentarelativamente aos pais. Sob asua forma ‘positiva’, o complexo apresenta-se como nahistória de Édipo-Rei: desejo da morte do rival que é apersonagem do mesmo sexo e desejo sexual da personagemdo sexo oposto. Sob a sua forma ‘negativa’, apresenta-seinversamente: amor pelo progenitor do mesmo sexo e ódiociumento ao progenitor do sexo oposto. Na realidade, estasduas formas encontram-se em graus diversos na chamadaforma ‘completa’ do complexo de Édipo (LAPLANCHE;PONTALIS, 1983, p. 116).
O Complexo de Édipo tem sido foco de muitos estudos e é um tema
controverso, mas quem está atento às crianças nessa faixa etária percebe
que seu interesse desliga-se do seu próprio corpo e volta a sua atenção para
as diferenças sexuais anatômicas das pessoas do seu entorno social. E quem
está lá? Pessoas do sexo feminino e pessoas do sexo masculino. Essa
diferença causa grande curiosidade na criança, que passa a dedicar à libido,
tentando compreender um pouco melhor tudo o que diz respeito a essa
diferença. Mas, subjacente a essa curiosidade geral sobre as diferenças
sexuais, está uma questão primordial para ela. A criança nessa fase se
pergunta, de modo inconsciente: afinal, do ponto de vista da sua sexualidade,
o que ela é? Para responder a essa questão, ela vai colocar-se em muitas
situações de experimentação envolvendo a sua sexualidade.
Na escola, isso acarreta atitudes como as de querer ver epegar os órgão genitais dos coleguinhas, de exibir os própriosórgãos genitais e, principalmente, atitudes relacionadas àmasturbação na sala de aula ou nos banheiros da escola(VALENTE, 2008).
Essas atitudes provocam muitas vezes inquietações nos professores,
mas é preciso ter em mente que essas experimentações fazem parte da
descoberta que as crianças nessa fase estão fazendo relativas ao próprio
corpo e à própria sexualidade. De seres potencialmente bissexuais no inicio
dessa fase, depois da resolução do Complexo de Édipo a menina identifica-
se com a mãe e o menino com o pai. Cada um deles sai dessa fase com
uma marca de feminilidade, no primeiro caso, e de masculinidade, no
segundo.
A partir daí, Freud (1975, p. 180) nos diz que, entre essa fase fálica
e a puberdade, uma porção de libido fica retida, outra é incorporada à
função sexual como atos preparatórios para a sexualidade adulta, gerando
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uma satisfação que ele denomina de pré-prazer, e outra porção é excluída
da organização libidinal. Essa exclusão pode acontecer por supressão
(repressão) dos impulsos ou pelo deslocamento dessa energia, que
redireciona o seu objetivo sexual.
Essa energia, que até então se direcionava para a obtenção de prazer
no próprio corpo da criança e que constituía o prazer característico das
fases oral, anal e fálica, volta-se para a obtenção de prazer fora do corpo da
criança. A esse movimento de deslocamento da pulsão para objetos fora do
corpo da criança, Freud (1975, p. 181) chamou de sublimação.
A sublimação é, segundo Laplanche e Pontalis (1983), um processo
postulado por Freud para explicar atividades humanas sem qualquer relação
aparente com a sexualidade, mas que encontrariam o seu elemento propulsor
na força da pulsão sexual. Freud descreveu como atividades de sublimação
principalmente a atividade artística e a investigação intelectual (LAPLANCHE;
PONTALIS, 1983, p. 638).
Essa fase, que fica entre a fase fálica e a adolescência, recebeu o
nome de fase de latência. Não fica difícil entender a importância do processo
de sublimação na criança na fase de latência em relação ao seu processo de
escolaridade. É nessa etapa do desenvolvimento do seu psiquismo que,
muitas vezes, ela está entrando na escola para ser alfabetizada. Pode-se
dizer que, ao entrar na escola, a criança carrega em si uma força pulsional,
erótica, que a impulsiona para a aprendizagem e, consequentemente, para
a ampliação do seu universo simbólico e conhecimento. Isso nos leva a
pensar que, para além do caráter socializador da escola, ela se constitui em
um locus privilegiado de inserção no simbólico, na linguagem, entendida
aqui na sua acepção mais ampla.
Freud diz que é um processo de defesa do ego, a repressão, o que dá
inicio à latência. Laplanche e Pontalis afirmam que “a repressão num sentido
lato é uma operação psíquica tendente a fazer desaparecer da consciência
um conteúdo desagradável ou inoportuno: ideia, afeto, etc. (LAPLANCHE;
PONTALIS, 1983, p. 638).
No capítulo intitulado “Um estudo autobiográfico”, Freud (1975, p.
5051) diz que um fato notável no desenvolvimento da vida sexual do ser
humano é a ocorrência de duas ondas, com um intervalo entre elas, que ele
chamou de desencadeamento bifásico. A primeira fase desse encadeamento
atinge um primeiro clímax no quarto ou quinto ano da vida de uma criança
103
Psicologia da Educação
(constituída pela fase fálica), e a segunda ocorre na puberdade. O que quebra
a cadeia é o período de latência, no qual as pulsões sexuais da primeira fase
são reprimidas e são estruturadas as formações reativas de moralidade,
vergonha e repulsa. “Na vida sexual da puberdade, verifica-se uma luta
entre os anseios dos primeiros anos e as inibições do período de latência”
(FREUD, 1975, p. 51). As formações reativas constituem-se em hábitos
ou atitudes psicológicas de sentido oposto a um desejo recalcado e como
reação a ele. Elas podem ser apresentadas em comportamentos singulares
e peculiares ou constituírem-se em traços de caráter mais ou menos
integrados no conjunto da personalidade de uma pessoa (LAPLANCHE;
PONTALIS, 1983, p. 258).
Sarnoff (1995, p. 41) discorda um pouco de Freud quanto à
diminuição da intensidade da força pulsional na criança que está na fase de
latência. Para ele, não há a diminuição de intensidade na energia sexual
nessa fase. O que há é um modo de descarregar essa energia que se serve
dos mecanismos de defesa de ego característicos dessa fase. São eles: a
sublimação, a formação reativa, a fantasia, a regressão e a repressão.
Os conceitos de sublimação, formação reativa e repressão já foram
abordados anteriormente; resta serem explicitados os mecanismos de fantasia
e regressão. A fantasia (ou fantasma) constitui-se em uma encenação
imaginária em que a pessoa está presente e que figura a realização de um
desejo que, não raro, é um desejo inconsciente, sendo que essa figuração
aparece de modo mais ou menos deformado, pois deriva de processos
defensivos (LAPLANCHE; PONTALIS, 1983, p. 228). A regressão, por
sua vez, constitui-se num retorno em sentido inverso desde um ponto já
atingido até um ponto que lhe seja antecedente, desde que o processo
psíquico no qual se insere esse retorno contenha um sentido de percurso
ou de desenvolvimento (LAPLANCHE; PONTALIS, 1983, p. 567). Para
o que é próprio do âmbito educacional, convém mencionar que “essas
defesas da latência permitem que a criança dirija as suas energias para um
comportamento e aprendizagem cooperativos” (SARNOFF, 1983, p. 42).
A fase genital corresponde ao exercício da sexualidade própria do
adolescente, que vai se prolongar na fase de adulto e depois na terceira
idade, com as atitudes características de cada uma dessas fases.
Para Blos (1985, p. 6), “o fato biológico da puberdade dá origem a
uma nova organização das pulsões e do ego”. O ego é o mediador entre a
pulsão e as exigências do mundo exterior e, para realizar essa tarefa, ele
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recorre a processos mentais de pensamento e julgamento, visando atingir a
sua principal função, que é proteger o funcionamento mental. Na
adolescência, a finalidade do ego mantém-se a mesma das fases que a
antecederam.
Esse autor considera importante definir as precondições que o ego
precisa ter no início da adolescência, para que as qualidades e funções
especificamente adolescentes possam se desenvolver. Para Blos (1985, p.
1745), a criança na fase de latência precisa essencialmente aumentar os
seus investimento libidinais nas representações que vêm produzindo tanto
no que se refere aos objetos sublimados quanto no seu próprio eu; capacitar
o ego para resistir ao mecanismo de regressão, expandindo a esfera
resistente ao conflito interno; desenvolver um ego crítico que complemente
as funções do superego, de modo que a autoestima melhor regulada atinja
um grau de independência relativa ao ambiente; reduzir o uso da linguagem
corporal, ampliando concomitantemente a capacidade de expressão verbal;
e desenvolver o processo de pensamento secundário (próprio das esferas
conscientes da mente) como meio de reduzir a tensão e exercer um domínio
do ambiente (social) por meio da aprendizagem de habilidades.
Embora suficientes para as exigências do período de latência, essas
condições são insuficientes quando consideradas as exigências do período
da adolescência. “Incapaz de dominar as situações críticas que tem de
enfrentar, o ego recorre a vários mecanismos de estabilização como medidas
temporárias para proteger sua integridade” (BLOS, 1985, p. 178). Os
mecanismos de estabilização do funcionamento mental do adolescente não
são claramente distintos, podendo se fundir uns nos outros, dependendo
da ênfase, até que adquiram um caráter novo e mais duradouro (BLOS,
1985, p. 180).
Isso acontece, por exemplo, no mecanismo estabilizador constituído
pela identificação. A identificação é um processo psicológico pelo qual um
indivíduo assimila um aspecto, uma propriedade, um atributo do outro e se
transforma, total ou parcialmente, segundo o modelo dessa pessoa
(LAPLANCHE; PONTALIS, 1983, p. 295). Esse processo está na base
da constituição de uma personalidade (ou subjetividade).
A identificação na adolescência pode ser de cunho defensivo, primitivo,
transitório e adaptativo. A identificação primitiva anula o esforço que o ego
fez de dist inguir o eu do objeto; a identificação defensiva e a
contraidentificação decorrente podem deixar marcas permanentes no ego;
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Psicologia da Educação
a identificação transitória segue um movimento que vai da fantasia até a
formação do ideal de ego e da sublimação; e a identificação adaptativa é
uma função do ego autônomo. “As transições e combinações dessas várias
formas de identificação são típicas do desenvolvimento adolescente” (BLOS,
1985, p. 181).
Outro mecanismo estabi lizador típico da adolescência é a
intelectualização, processo por meio do qual o indivíduo procura dar uma
formulação discursiva aos seus conflitos e às suas emoções, de modo a
dominá-los (LAPLANCHE; PONTALIS, 1983, p. 315). Para Blos (1985,
p. 181), a intelectualização representa uma tentativa de dominar os perigos
pulsionais pelo deslocamento. Esse autor afirma que nesse contexto dos
mecanismos que têm funções estabilizadoras para os adolescentes cabe
ainda mencionar a criatividade, que serve para o domínio interno dos conflitos
emocionais (BLOS, 1985, p. 182).
Em síntese, supõe-se que a importância e mesmo a necessidade de
um pedagogo ou professor ou educador conhecer toda essa explicação
reside no fato de, muitas vezes, comportamentos expressos pelos alunos
na sala de aula ou nos pátios da escola serem nada mais do que
manifestações da pulsão, cuja característica principal é a de ser uma força
constante em direção de um alvo em busca de satisfação. De como e quanto
os mecanismos de defesa são utilizados pelo aparelho psíquico depende a
estabilização do psiquismo, principalmente quando consideradas as fases
de latência e adolescência.
A RESPEITO DAS FRALDAS
Depoimento:
“Sou mãe de cinco filhos com idades bem próximas, o mais velho tem dez
anos e o menor tem dois anos e um mês. Entre meus dois primeiros filhos,
há apenas um ano de diferença. Como muitas mães, tinha pressa em tirar
as fraldas de meu primeiro menino, principalmente porque sua irmãzinha
era bem pouco menor do que ele. Então insisti em apresentar-lhe o penico
com a maior freqüência possível, à s vezes, a cada hora e ralhava com ele
porque não obtinha resultados e também porque sujava fraldas. Depois de
um ano de esforços, ele abandonou as fraldas aos dois anos exatos, durante
o dia, e aos dois anos e meio, à noite. Portanto, nada glorioso. Isso para
meu primeiro filho; depois inverti o um pouco o sistema. Apresentei o penico
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Resposta de Dolto:
Muito divertido e instrutivo, agradeço a essa mãe pelo testemunho. Acho
que isso vai servir de consolo para muitas mães que se atormentam porque seus
filhos não largaram as fraldas. Devo dizer também que ela teve sorte que o mais
velho não continuasse a fazer pipi na cama: começou a ensiná-lo cedo demais.
É por volta de dois anos, a partir do momento em que a criança é capaz de subir
e descer uma escada sozinha, uma escada de cozinha até o último degrau, que
agarra com as mãos; bem, é nesse momento que seu sistema nervoso está
pronto e que ela consegue largar as fraldas se prestar atenção. Antes, não
consegue. Essa mãe teve um outro filho, um ano depois. Acho que o mais velho
deve ter considerado o interesse de sua mãe pelo seu bumbum algo muito
agradável: graças a isso, ela se dedicava especialmente a ele. Acho bastante
inteligente o que ela fez, sem saber, com o mais velho que, com isso, continuou
a monopolizar o interesse materno após o nascimento do segundo. Os outros
filhos agem por identificação com o mais velho. Todos querem agir tão bem
quanto o mais velho assim que conseguem. É claro que as meninas só conseguem
por volta de um ano e nove meses e os meninos por volta de um ano e onze
meses: os meninos largam as fraldas depois das meninas. Mas faço uma pergunta:
Esse primogênito não seria um pouco perfeccionista, menos livre, menos flexível
em seus movimentos do que os outros? Se ele não for assim, tudo esta perfeito.
Todavia, é de fato uma pena perder tanto tempo com o penico enquanto há
tantas outras coisas a serem feitas para desenvolver as habilidades das mãos, da
boca, da fala, do corpo inteiro... Quando uma criança é hábil com as mãos,
acrobata, isto é, goza com liberdade e relaxamento de uma boa coordenação de
seus movimentos e de um tônus dominado, quando já fala bem, sente prazer
em abandonar as fraldas por conta própria, em fazer como fazem os adultos,
isto é, ir ao banheiro. Aproveito para dizer que as mães jamais deveriam colocar
o penico no banheiro, exceto à noite, e que a menos que faça muito frio e
apenas no inverno a criança vá sempre fazer as necessidades no banheiro e
nunca nos cômodos em que se vive e em que se come.
Adaptado do capítulo 6 do livro: DOLTO, F. Quando surge a criança. 2. ed, tomo I,
p. 47-9.
sem ralhar, ou ralhei sem apresentar o penico etc. Até o último, finalmente,
o quinto, que dispôs de liberdade total: nunca lhe apresentei o penico. A
minha conclusão é a seguinte: todos os meus filhos largaram as fraldas aos
dois anos de dia e aos dois anos e meio à noite. Acho inútil querer que os
filhos abandonem as fraldas a qualquer preço”.
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Psicologia da Educação
A RESPEITO DA MANIFESTAÇÃO DO COMPLEXO DEÉDIPO - FASE FÁLICA
Depoimento:
Minha filha de três anos que é bastante equilibrada há três meses
desperta todas as noites. Fui falar com algumas amigas que têm filhos
pequeno e elas confirmaram que seus filhos também despertam muitas
vezes, três ou quatro vezes por noite. Fui falar com o pediatra e pedi que
ele receitasse calmantes a minha filha, mas ele se recusou.
Resposta de Dolto:
Trata-se de uma criança com já três anos... Ora, três anos é a idade em que
a menininha é presa de um amor incendiário pelo pai. Essa mãe não fala do
marido, mas provavelmente deve dormir na cama junto com o marido. Acho
que a menininha gostaria de ter um companheiro ou uma companheira de
sono, como a mãe. [...] Aos três anos, acontece o despertar: procurar a
mãe, voltar a ser pequena e estar de novo perto dela, porque é a idade em
que se cresce, adquirindo-se a consciência de ser menino ou menina. Uma
coisa boa a se fazer é brincar de cabra-cega de dia com a criança, escurecer
o quarto. Coloca-se uma faixa sobre os olhos e finge-se de ser noite; a gente
levanta-se, faz algo, acende a luz, apaga etc. Mas evita ir acordar o pai ou a
mãe. Acho que depois de algumas explicações, por intermédio da brincadeira,
a criança vai compreender muito bem que deve deixar os pais em paz;
quando crescer, vai ter um marido, mas agora é pequena, embora não seja
um bebê. [...] Acho absolutamente necessário a mãe explicar que os meninos
e as meninas têm sexo diferentes, deve pronunciar a palavra ‘sexo’, que
não é uma questão de pipi; ela é uma menininha bonita e vão tornar-se uma
mocinha e, depois, uma mulher, como a mãe. O médico tem toda a razão:
os calmantes só resolvem o problema da mãe. [...] Porque essa criança está
sozinha e acho que tem ciúmes, com três anos, dos dois pais que estão
juntos na cama.
Adaptado do capítulo 9 do livro: DOLTO, F. Quando surge a criança. 2. ed, tomo I, p.
65-7.
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Leia atentamente o que o texto diz sobre a fase de latência e faça um resumo, articulando
os mecanismos de defesa dessa fase e os processos intelectuais ligados à aprendizagem
na escola.
1. Conceitue pulsão de acordo com a teoria psicanalítica.
2. Cite dois exemplos de manifestação da pulsão de vida.
3. Cite dois exemplos de manifestação da pulsão de morte.
4. Cite as partes constitutivas do aparelho mental segundo Freud.
Elabore um quadro com as características do id, do ego e do superego, explicitando as
relações entre eles, os pontos em que são semelhantes e os pontos em que se
diferenciam.
Cite as características das fases oral, anal e fálica e estabeleça a relação entre cada uma
delas e a pulsão sexual.
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Psicologia da Educação
REFERÊNCIAS
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BRENNER, C. Noções básicas de Psicanálise: introdução à psicologia psicanalítica. Tradução de Ana
Maria Spira. 4. ed. São Paulo: EDUSP, 1987.
DOLTO, F. Quando surge a criança. Tomo I. 2. ed. Tradução de Marina Appenzeller. Campinas: Papirus,
2001.
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Rio de Janeiro: Imago, 1938, 1975.
_________. Edição standard brasileira das obras psicológicas completas de Sigmund Freud. v. XX. Rio
de Janeiro: Imago, 1938, 1975.
JORGE, M. A. C. Fundamentos de Psicanálise de Freud a Lacan: as bases conceituais. 4. ed., v. I. Rio
de Janeiro: Jorge Zahar, 2005.
LAPLANCHE, J.; PONTALIS, J-B. Vocabulário da Psicanálise. 7. ed. Tradução de Pedro Tamen. São
Paulo: Martins Fontes, 1983.
SARNOFF, C. A. Estratégias psicoterápicas nos anos de latência. Tradução de Regina Garcez. Porto
Alegre: Artes Médicas, 1995.
VALENTE, T. S. Do nascimento do ego e da constituição do inconsciente. In: VI Jornada de Cartéis da
Escola da Coisa Freudiana, 2008, Curitiba/Paraná. Anais. Curitiba/Paraná: Escola da Coisa Freudiana
(mimeo). p. 3132.
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