PESQUISA ODONTOLÓGICA NO BRASIL: características da ... · Pesquisa odontológica no Brasil:...
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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE
CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS DA SAÚDE
PESQUISA ODONTOLÓGICA NO BRASIL:
características da produção científica no início do
século XXI
Aldo Angelim Dias
Natal
2008
Aldo Angelim Dias
PESQUISA ODONTOLÓGICA NO BRASIL:
características da produção científica no início do século XXI
Tese apresentada à Universidade Federal do Rio
Grande do Norte - Programa de Pós-Graduação
em Ciências da Saúde, como parte dos
requisitos para obtenção do título de Doutor em
Ciências da Saúde.
Orientadora: Profa. Dra. Delane Maria Rêgo
Natal
2008
Divisão de Serviços Técnicos
Catalogação da Publicação na Fonte UFRN/Biblioteca Setorial de Odontologia
Dias, Aldo Angelim.
Pesquisa odontológica no Brasil: características da produção científica no início do século XXI / Aldo Angelim Dias. – Natal, RN, 2008.
viii, 60f.
Orientador: Delane Maria Rêgo.
Tese (Doutorado) - Universidade Federal do Rio Grande do Norte. Centro de Ciências da Saúde. Programa de Pós-graduação em Ciências da Saúde.
1. Pesquisa em odontologia – Tese. 2. Metodologia – Tese. 3. Educação superior – Tese. I. Rêgo, Delane Maria. II. Título.
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE
CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS DA SAÚDE
Coordenador do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde:
Prof. Dr. Aldo da Cunha Medeiros
iii
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE
CENTRO DE CIÊNCIAS DA SAÚDE
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM CIÊNCIAS DA SAÚDE
PESQUISA ODONTOLÓGICA NO BRASIL:
Características da Produção Científica no Início do Século XXI
Presidente da banca:
Prof. Dra. Delane Maria Rêgo
BANCA EXAMINADORA
Profa. Dra. Delane Maria Rêgo (UFRN)
Profa. Dra. Rejane Andrade de Carvalho (UNP)
Prof. Dr. Danilo Lopes Ferreira Lima (UNIFOR)
Prof. Dra. Lélia Batista de Souza (UFRN)
Prof. Dr. Antônio Ricardo Calazans Duarte (UFRN)
iv
Dedicatória
A Deus, força enigmática que me conduz e que me permite, através da fé, acreditar que
posso ter energia para seguir os caminhos propostos pela vida.
A meus pais, Cândido e Guilhermina, que me deram muito mais que saúde e educação.
Proporcionaram-me a vida, bem maior de todo o amor e alegrias nela contidas e toda a
sorte de viver em plena harmonia.
À minha irmã, Aline, que vem sendo modelo constante para mim; modelo de
responsabilidade, de seriedade, da boa conduta profissional, do amor inigualável e de
felicidade.
Aos amigos, sempre presentes, que ajudaram com informações valiosas para a
composição desse trabalho.
v
AGRADECIMENTOS
Inicialmente, meu agradecimento maior para a orientadora e minha mestre, e agora
também amiga, Profa. Dra. Delane Maria Rêgo, pela orientação segura, pela sempre
disponibilidade, pela atenção e carinho com que me orientou e abriu possibilidades para
novos trabalhos, novas parcerias.
À Universidade Federal do Rio Grande do Norte, na pessoa do Ilmo. Coordenador Prof.
Dr. Aldo da Cunha Medeiros, que me possibilitou participar como discente e aprendiz no
Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde.
Ao Prof. Dr. Paulo Capel Narvai, pela orientação, pelos encaminhamentos necessários,
pelos debates polêmicos gerados por esta pesquisa.
À Universidade de Fortaleza, na pessoa da Diretora do Centro de Ciências da Saúde,
Prof.ª Fátima Maria Fernandes Veras, do ex-coordenador do Curso de Odontologia,
Prof. Luiz Roberto Augusto Noro, e da atual coordenadora, Profa. Karol Silva de Moura,
que possibilitaram as várias dispensas à Faculdade necessárias para a minha
participação no programa de Doutorado e pelo estímulo constante na continuação do
trabalho.
À amiga Maria Cristina Germano Maia, pelas versões dos resumos do artigo e da tese
para o inglês e pelo apoio incondicional na realização desta obra.
vi
Resumo
A Odontologia, como ciência e campo do saber, tem apresentado um desenvolvimento
substancial nas últimas décadas na área da pesquisa e educação. O objetivo deste
estudo foi avaliar a produção científica em Odontologia no Brasil, a partir de seus
delineamentos metodológicos, que caracteriza o início do século XXI. Foram avaliados
5.203 resumos dos estudos apresentados nas reuniões da Sociedade Brasileira de
Pesquisa Odontológica (SBPqO) no período de 2001 a 2006. Os principais resultados
identificam que, quanto à metodologia usada nas pesquisas, houve predomínio dos
estudos de natureza individuada, intervencional e longitudinal; das pesquisas das áreas
de Dentística, Periodontia, Endodontia, Odontopediatria e Saúde Coletiva e dos estudos
laboratoriais sobre as pesquisas clínicas ou com sujeitos coletivos. Tornam-se
evidentes neste estudo a inter e a multidisciplinaridade no delineamento do estudo, por
conta da tríade Educação-Saúde-Pesquisa ser trabalhada a fim de que transcendam
seus campos de ação, rumo à transdisciplinaridade. Conclui-se que, no período
estudado, houve equilibrada produção no campo odontológico brasileiro.
vii
ABSTRACT
Dentistry, as a science and field of knowledge, has presented a substantial
development in the last decades in the areas of research and education. The aim of
this study was to evaluate the Brazilian scientific production in Dentistry, as from their
methodological outlining, which characterizes the XXI Century. Five thousand two
hundred and three study abstracts were evaluated, comprising works presented in the
meetings of the Brazilian Society of Dentistry Research (SBPqO), during the period of
2001 to 2006. The main results identify that, as for the methodology used in the
researches, there was a predominance of the studies of an individuate, interventionist
and longitudinal nature; of the researches in the areas of Dentistry, Periodontology,
Endodontics, Pedodontics and Collective Oral Health and experimental studies about
clinical researches or with collective subjects. The inter and multidisciplinarity are
pointed out in the outlining of this study, as the triad Education-Health-Research is
discussed, so that they transcend in their fields of action, in the direction of the
transdisciplinarity. It is concluded that, in the studied period, there was a reasonable
and balanced production in Brazilian dental field.
Sumário
1 INTRODUÇÃO ..........................................................................................................1
2 REVISÃO DA LITERATURA......................................................................................4
3 INDEXAÇÃO DO ARTIGO........................................................................................11
4 COMENTÁRIOS, CRÍTICAS E SUGESTÕES..........................................................40
3.1 Produtos gerados pela Tese ......................................................................41
4.2 Críticas à Metodologia ................................................................................43
4.3 Mérito, contribuições da publicação e outros aspectos ..............................45
REFERÊNCIAS ...........................................................................................................47
ABSTRACT..................................................................................................................52
viii
1 INTRODUÇÃO
A discussão da relação indissociável entre ensino, pesquisa e extensão
como função da Universidade permanece como o grande desafio, principalmente na
prática do ensino de graduação em todas as áreas e, em especial, na Odontologia(1).
Há a necessidade de reforçar a compreensão de que esse princípio, o da
indissociabilidade, não se faz espontaneamente pela natureza de ações intrínsecas nos
seus processos históricos e epistemológicos, mas sim pela intencionalidade de
compreender o conhecimento, a ciência e o mundo numa relação dialética produzida
por sujeitos históricos – professor e alunos – que interagem construindo o “novo de
novo” e muitas vezes também o “inédito”(2).
A pesquisa na área odontológica já experimentou momentos de grande
importância como o entendimento da Cariologia, a importância da placa dentária na
gênese da cárie e das doenças periodontais, a possibilidade de remineralização da
estrutura dentária, a conseqüente redução da prevalência da cárie em níveis globais e o
impacto sobre as necessidades de tratamentos restauradores(2). Nota-se, porém, que a
Odontologia vive um especial paradoxo, confluindo um excepcional desenvolvimento de
materiais e equipamentos e uma frustrante repercussão social desses avanços
tecnológicos.
Nesse sentido, essa área vem aumentando quantitativa e qualitativamente
sua produção de pesquisas nas últimas décadas, situação semelhante à observada
para a produção científica no Brasil como um todo que, em 2006, ultrapassou a da
Suécia e a da Suíça e alcançou a 15ª. posição mundial, com 16.872 artigos publicados.
Em relação a 2004, o crescimento representou um incremento de 33%, o triplo da
média mundial(3).
Atualmente o setor saúde concentra cerca de 30% dos grupos e linhas de
pesquisa e pesquisadores (doutores ou não) no universo geral da pesquisa no Brasil.
Desse total, cerca de 46% são representados pelas pesquisas clínicas e os 54%
restantes estão divididos em pesquisas biomédicas, tecnológicas e em Saúde Pública;
esta última detentora de 13,2% do total(4).
A partir desse referencial, como hipótese da pesquisa, o objetivo deste
trabalho é avaliar o estágio atual da produção científica brasileira em Odontologia,
visando mapear as novas tendências metodológicas.
As seguintes indagações serviram de pontos de partida:
• Qual o estágio da produção científica em Odontologia no Brasil que
caracteriza o início do século XXI?
• Como o binômio pesquisa-ensino pode contribuir para o desenvolvimento
da Odontologia no país, como uma área inter e multidisciplinar?
Partindo dessas considerações, inicia-se este estudo, cuja exposição
encontra-se distribuída em três capítulos.
No primeiro, a Introdução delimita o objeto de estudo, justificando a escolha
do tema e o direcionamento escolhido pelo autor.
No capítulo seguinte, a Revisão da Literatura traz uma complementação de
citações da literatura específica relevantes para o projeto.
Em seguida, está inserido o artigo aceito para publicação no periódico
“Revista Panamericana de Salud Pública/Pan American Journal of Public Health” (ISSN:
1020-4989).
Por fim, o terceiro capítulo encerra este trabalho com a discussão de
aspectos relevantes, mas não contemplados nos capítulos anteriores, sob a forma de
comentários, críticas e conclusões.
2 REVISÃO DA LITERATURA
A ciência da Odontologia no Brasil tem apresentado um desenvolvimento
substancial nas últimas décadas, o que proporcionou um progresso nunca visto tanto no
ensino quanto na pesquisa.
Tal avanço apresenta um significado importante dada à grande defasagem
da pesquisa no Brasil, em relação aos países líderes mundiais, quando se fala de
políticas de ciência e tecnologia em nível global. Se para esse grupo privilegiado, a
ciência ao final do século XX, apresentava um paradigma de fonte de oportunidade
estratégica, tendo passado por dois outros momentos bem distintos (ciência como
motor do progresso e, em uma segunda etapa, como solucionadora de problemas),
para o Brasil, a ciência ainda experimentava um período com fortes indícios de
funcionar como “motor do progresso”, dentro de um contexto de “prestígio científico” e
longe dos preceitos atuais da globalização econômica e dos sistemas de pesquisa(5,6).
Como observado por Muccioli et al.(7), no entanto, alguns aspectos
importantes, como o número de patentes depositadas no país, ainda deixa a desejar, o
que “indica a necessidade de dar atenção à repercussão prática dos nossos
investimentos na área científica”. Além disso, reiteram que não basta produzir artigos
científicos, sendo fundamental que a pesquisa proporcione benefícios para a sociedade
que os financia através de impostos. A publicação também tem sido um fator crucial na
discussão de uma maior visibilidade das pesquisas produzidas no Brasil e vários
autores(7-10) concordam que é importante que a pesquisa tenha repercussão e que sirva
de base para outros trabalhos na mesma área ou em áreas diversas.
Em especial na área da saúde, os conhecimentos científico e técnico têm nos
periódicos o seu principal meio de publicação, com controles de qualidade exercidos,
entre outros, pela sua indexação em bases de dados bibliográficas que registram o
conhecimento público atualizado e acumulado ao longo dos anos(9).
Além disso, uma forma de analisar a distribuição mundial da pesquisa em
saúde e o grau de importância dado pelos diferentes países (desenvolvidos e em
desenvolvimento) é verificada pela informação de que a maior parte (90,4%) da
produção bibliográfica científico-tecnológica está concentrada em 42 países de renda
alta, estando os cinco mais produtivos (Estados Unidos, Reino Unido, Japão, Alemanha
e França), como detentores de 72,5% da produção total. O Brasil faz parte de um
grupo, que ainda contém China, Federação Russa, Turquia e África do Sul, responsável
por apenas 5,4% dos 27,5% restantes da produção científica global(11).
Coleman(12), analisando o futuro da pesquisa científica, indica que até fatores
aparentemente deixados em segundo plano como a versão dos artigos para o idioma
inglês, são determinantes para a publicação de pesquisas. Isso talvez justifique, como
citado pelo próprio autor, que autores de países como o Brasil não consigam tantas
publicações em revistas de alto impacto como seria de se esperar. Muitas vezes, a
fraca versão para o inglês, que continua sendo a língua predominante no mundo
científico, elimina, inclusive, a própria análise do conteúdo do artigo.
As necessidades, portanto, de uma mudança não só paradigmática e
estrutural, mas concreta a partir da adoção de medidas que estimulem o financiamento,
a produção científica e a construção do saber no vasto campo da Saúde e, em
particular, na Odontologia são emergenciais. Algumas providências têm sido
estabelecidas e já se nota um crescente aumento dos dispêndios financeiros com a
pesquisa e desenvolvimento em saúde no Brasil em anos recentes, chegando a uma
média anual de quase seiscentos milhões de dólares para o período de 2000 a 2003,
com gastos oriundos das diferentes esferas públicas e ainda contemplando entes
privados e organismos internacionais(13).
Apesar de tais avanços importantes e elucidativos do processo saúde-
doença bucal, identifica-se no momento, um certo esgotamento de pesquisas que
busquem o desenvolvimento de materiais e técnicas que sejam, ao mesmo tempo,
eficazes e que tenham uma relação ótima em termos de custo-efetividade. Por outro
lado, intensificam-se aquelas que buscam avaliar a melhoria das condições de saúde
bucal na população de forma coletiva.
As áreas da Dentística e Materiais Dentários, Saúde Coletiva/Odontologia
Preventiva, Endodontia, Patologia, Prótese e Periodontia foram as categorias temáticas
mais pesquisadas nos três periódicos brasileiros mais utilizados pelos cirurgiões-
dentistas no período de 1990 a 2004. Importante destacar a inclusão da Saúde
Coletiva/Odontologia Preventiva como a segunda área mais estudada(14).
O ensino e, por conseguinte, a pesquisa na Odontologia estão adaptados a
um contexto baseado na aplicação técnica, refletindo a marcante presença da indústria
de equipamentos e materiais odontológicos no país(15). Entretanto, com a saturação do
mercado de trabalho odontológico privado (consultórios e clínicas) e a constante
inserção do cirurgião-dentista nos programas de Saúde Coletiva, como o Programa
Saúde da Família, identifica-se uma retomada do interesse por pesquisa em Saúde
Pública nos últimos anos(16) e, com isso, uma necessidade na reformulação dos
currículos adequando-os às novas Diretrizes Curriculares Nacionais dos cursos de
graduação na área da saúde, recomendadas pelo Ministério da Educação-MEC(17), que
direcionam a formação do profissional para um perfil generalista e visando a busca de
ações promotoras de saúde e não apenas curativo-reabilitadoras.
Boa parte dessa nova retomada da pesquisa em Saúde Pública vem ao
encontro de busca de alternativas de alocação de recursos que sejam analisadas no
contexto da universalidade e da integralidade e com a combinação de eficiência e
equidade no provimento do bem público da assistência à saúde(18).
Reflexões epistemológicas colocam a Saúde Coletiva como “campo
científico”(19) ou “espaço disciplinar complexo”(20) e não como disciplina ou como
especialidade da Medicina ou da Odontologia. A abrangência e a complexidade da área
tem sido tema de diversas publicações, reforçando uma crescente produção
científica(21).
Apesar dessa produção científica emergente em Saúde Coletiva, a plena
divulgação científica dos trabalhos realizados fica prejudicada pela reduzida quantidade
de periódicos que aceitam pesquisas nessa área. No Brasil, particularmente, a maioria
dos artigos da área concentram-se em dois grandes periódicos que aceitam pesquisas
nas áreas de Epidemiologia, de Políticas Públicas de Saúde e de Ciências Sociais em
Saúde. Em 2007, Carvalho et al. avaliando a produção bibliográfica publicada nesses
dois importantes veículos (Cadernos de Saúde Pública e Revista de Saúde Pública)
encontraram que a maior parte das pesquisas têm a Epidemiologia como tema
central(10).
É notório que grande parte da produção científica emerge nas Universidades
e reflete o que é estimulado pelo corpo docente de pesquisadores. Naturalmente, um
curso de Odontologia está inserido num determinado tempo e lugar e precisa explicitar
seu compromisso social com sua inserção local, sem desprezar uma articulação com
outros tempos e lugares(1).
A chamada Odontologia de mercado, por sua vez, jamais perdeu a
hegemonia no sistema de saúde brasileiro(22) e isso tem reflexo direto na grande
concentração de pesquisas de natureza eminentemente clínicas ou voltadas para o
estudo de biomateriais(23). Em linhas gerais, a concepção de prática da Odontologia de
mercado está centrada na assistência odontológica ao indivíduo doente, e realizada
com exclusividade por um sujeito individual no restrito ambiente clínico-cirúrgico, não
apenas predominando no setor privado, como segue exercendo poderosa influência
sobre os serviços públicos(24, 25).
Vive-se hoje um processo de esgotamento do modelo tradicional de
educação superior. A necessidade de mudanças dessa formação tem estado na pauta
das discussões há algum tempo, porém pouco se tem avançado. A questão da
formação de profissionais de saúde envolve diretamente as oportunidades advindas do
mercado de trabalho, o perfil profissional e a satisfação das demandas
populacionais(26). E as práticas docentes têm sido objeto constante de avaliação e de
revisão (27-31).
Parte das mudanças que são visíveis no modo de pesquisar e divulgar a
informação científica também se relaciona com as novas tecnologias que proporcionam
uma disseminação maior e mais rápida do que é publicado. Coleman(12) aponta
variadas contribuições das chamadas tecnologias digitais da informática: publicações
on line, redução dos custos da produção de um periódico, maior visibilidade do trabalho
produzido, entre outras. Embora a língua inglesa, hegemônica nas publicações, seja,
para alguns, um entrave a ser ultrapassado, nota-se que, aos poucos, periódicos em
outras línguas também estão ganhando impacto importante no mundo científico.
Em Odontologia, o compromisso social com as necessidades de atenção da
população e com a transferência de conhecimentos na busca da autonomia, a
intersetorialidade, a contextualização da aprendizagem na realidade de inserção social
dos sujeitos, a problematização da realidade e do conhecimento, a negociação para
decisões coletivas e a participação como base da cidadania são temas desafiadores
para uma educação humanizada na área de Saúde Bucal(32).
E para finalizar, ressalta-se a informação de Zanetti de que rupturas
epistêmicas, ampliação teórica, requalificação da recuperação do nosso objeto
complexo, tudo isso implica necessariamente na ampliação das ferramentas
metodológicas; em particular, no alcance dos métodos que trabalham com as
categorias de vida, sejam elas em sua dimensão biológica, sejam elas em sua
dimensão social e filosófica. Nesses últimos casos, encontra-se implícita a aproximação
teórica e metodológica da Odontologia com as Ciências Sociais e a Filosofia. Com isso,
o caminho já trilhado para a afirmação da Saúde Coletiva no Brasil pode colaborar com
todo esse esforço de integração dos alicerces na produção de conhecimentos e
formação, seja para a transformação, seja para a compreensão e convivência(33).
3 Indexação do Artigo
Periódico: Revista Panamericana de Salud Pública/Pan American Journal of Public
Health
• Enviado em 13/10/07
• Aceito para publicação com restrições em 09/01/08
• Reenviado com modificações em 22/01/08
• Aceito incondicionalmente em 15/02/08
Tendências da produção científica em odontologia no Brasil1
[Running title: Produção científica em odontologia]
Aldo Angelim Dias2, Paulo Capel Narvai3 e Delane Maria Rêgo4
RESUMO
Objetivo. Descrever a tendência da produção científica odontológica no Brasil,
destacando-se a área de saúde bucal coletiva, nos primeiros anos do século XXI.
1 Artigo revisado e editorado pela revista; publicação prevista para agosto/2008.
2 Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde-PPGCSA-UFRN.Universidade de
Fortaleza (UNIFOR), Fortaleza (CE), Brasil. Enviar correspondência para este autor no
seguinte endereço: Rua Coronel Jucá 330, apto. 1202, Meireles, CEP 60170-320, Fortaleza,
CE, Brasil. E-mail: [email protected]
3 Universidade de São Paulo (USP), Faculdade de Saúde Pública, São Paulo (SP), Brasil. E-
mail: [email protected]
4 Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN), Programa de Pós-Graduação em
Ciências da Saúde (PPGCSA) e Departamento de Odontologia, Natal (RN), Brasil. E-mail:
Métodos. Os resumos de trabalhos apresentados nas reuniões da Sociedade Brasileira
de Pesquisa Odontológica (SBPqO) de 2001 a 2006 foram avaliados em termos do seu
desenho metodológico (estudo agregado ou individuado; estudo observacional ou de
intervenção; estudo transversal ou longitudinal), natureza geral (revisões bibliográficas,
estudos com seres humanos ou pesquisas laboratoriais) e enquadramento em uma das
19 especialidades reconhecidas pelo Conselho Federal de Odontologia (CFO). Dos 10
406 trabalhos apresentados nesse período, foram lidos 5 203 (50,0% do total).
Resultados. Quanto ao desenho metodológico, 87,5% dos resumos eram do tipo
operativo individuado e 12,5%, do tipo agregado. Na classificação da natureza geral da
pesquisa, 41,7% dos resumos tratavam de estudos com seres humanos. Os resumos
restantes (58,3%) tratavam de pesquisas laboratoriais in vitro (31,1%), pesquisas
laboratoriais in vivo (23,6%) e revisões bibliográficas (3,6%). Com relação às áreas de
conhecimento do CFO, apenas cinco atingiram percentuais de ocorrência superiores a
10,0%: dentística, periodontia, endodontia, odontopediatria e saúde coletiva.
Conclusões. A produção científica odontológica brasileira no período de 2001 a 2006
foi equilibrada, com crescente interesse na área de saúde bucal coletiva.
Palavras-chave Odontologia [odontologia/dentistry], pesquisa/tendências
[investigación/tendencias / research/trends], Brasil
[Brasil/Brazil].
A pesquisa odontológica no Brasil experimentou um aumento quantitativo
significativo nos primeiros anos do século XXI, expresso pela maior divulgação em
revistas especializadas e por apresentações em encontros científicos (1). No entanto,
esse aumento não foi necessariamente acompanhado por uma melhora na qualidade
do que se publica. Além disso, é comum que os resultados de uma determinada
pesquisa, ainda que apresentados em encontros científicos, nunca cheguem aos
periódicos, não se completando, dessa forma, o processo de produção-divulgação-
apropriação de conhecimentos.
Em um ensaio sobre a qualidade dos artigos científicos publicados na área da
saúde, Szklo (2) menciona vários fatores associados à má qualidade desse material,
desde a interpretação errônea de dados e a análise equivocada de associações
estatísticas até a ocorrência de problemas elementares, como resumos extensos
demais e uso excessivo de abreviações. Nesse quesito, o adequado delineamento da
pesquisa é também um fator decisivo e fundamental para o alcance dos objetivos, ainda
que nenhum delineamento impeça erros (3).
A acessibilidade aos periódicos é outro fator a ser considerado. A informação
consultada pelos cirurgiões-dentistas geralmente é definida pela facilidade de acesso,
como apontado em estudo de Amorim et al.(4). As autoras concluíram que as três
revistas mais consultadas são de fácil acesso, tratam de assuntos mais gerais e têm
uma flexibilidade maior na escrita do texto.
O objetivo deste artigo é descrever as tendências das características
quantitativas da produção científica odontológica no Brasil, destacando-se a área de
saúde bucal coletiva, nos primeiros anos do século XXI. Para tanto, os resumos de
trabalhos apresentados nas reuniões da Sociedade Brasileira de Pesquisa
Odontológica (SBPqO) foram avaliados em termos de sua área de conhecimento e do
tipo e delineamento da pesquisa.
MATERIAIS E MÉTODOS
O material investigado constituiu-se dos resumos dos trabalhos apresentados
nas reuniões da SBPqO no período de 2001 a 2006. Dos 10 406 trabalhos
apresentados nesse período, foram lidos 5 203 resumos, correspondendo a 50,0% do
total. Foram lidos todos os resumos de numeração ímpar em cada seção em que se
divide a grade de apresentação dos trabalhos durante o evento (5-10). Como o número
de trabalhos apresentados a cada ano não foi o mesma, exatamente a metade dos
resumos de cada ano foi lida.
A SBPqO é um ramo da International Association for Dentistry Research
(Associação Internacional para Pesquisa Odontológica, IADR) e se reúne anualmente
desde 1983. As pesquisas apresentadas durante esses encontros anuais servem como
referência para o perfil da pesquisa odontológica desenvolvida no país (11). Nesse
evento, são apresentados trabalhos previamente selecionados, oriundos de todas as
regiões do Brasil e abrangendo todas as áreas de conhecimento em odontologia.
Admite-se, portanto, que é possível tomá-los como representativos do conjunto da
produção científica odontológica no Brasil.
Os resumos foram lidos e classificados de acordo com dados coletados a partir
de um formulário específico que incluía as seguintes categorias de classificação:
desenho metodológico, natureza geral e pertinência a uma determinada área de
conhecimento odontológico. Dentro dessas categorias, incluíam-se outras
subcategorias, conforme descrito a seguir.
Para a definição do desenho metodológico, foi utilizada a classificação
epidemiológica de Rouquayrol e Almeida Filho (12), que divide a pesquisa de acordo
com: 1) o tipo operativo ou a natureza do grupo estudado; 2) a posição do investigador;
e 3) a referência temporal. Essa proposta está de acordo com a classificação da
pesquisa sugerida por Lilienfeld (13) e Miettinen (14) e vai ao encontro das
classificações sugeridas por autores clássicos da área de epidemiologia, como
Rothman e Greenland (15), e por autores da área de saúde bucal coletiva, como
Antunes e Peres (16).
Para o tipo operativo foram utilizadas as categorias “agregado” e “individuado”.
A categoria agregado se refere a coletivos humanos necessariamente determinados por
fatores sociais ou coletivos. São exemplos de agregados a população das escolas de
um município ou o conjunto de habitantes de uma localidade. A categoria individuado
se refere a estudos onde os sujeitos são analisados um a um, e não como grupo,
podendo englobar pesquisas clínicas ou laboratoriais.
Quanto à posição do investigador, as pesquisas foram classificadas como
“estudos observacionais” ou “estudos de intervenção”, os quais determinam a
participação passiva ou ativa, respectivamente, do pesquisador. Tal descrição pode ser
utilizada em conjunto com as categorias empregadas para classificar o tipo operativo
(agregado ou individuado). Ainda na classificação do desenho metodológico, os
estudos foram agrupados quanto à referência temporal em “transversais” e
“longitudinais”.
Essas categorias, por permitirem inserção simultânea, possibilitam
cruzamentos, de modo que, por exemplo, os estudos de coorte ou prospectivos podem
ser classificados como pesquisas individuadas, observacionais e longitudinais. A
mesma classificação se aplica aos estudos de caso-controle (sendo estes
retrospectivos). Já os ensaios clínicos podem ser classificados como estudos
individuados, de intervenção e longitudinais.
Quanto à natureza geral, os estudos foram divididos em: 1) revisões
bibliográficas (incluindo as revisões simples e as sistemáticas com ou sem meta-
análise); 2) estudos com seres humanos (pesquisas clínicas ou com sujeito coletivo); e
3) pesquisas laboratoriais (in vivo, quando realizadas em animais, e in vitro).
A classificação das pesquisas segundo as áreas de conhecimento levou em
consideração o seu enquadramento em uma das 19 especialidades reconhecidas pelo
Conselho Federal de Odontologia (CFO) (17). Embora a especialidade “saúde bucal
coletiva” extrapole, por sua natureza, o que se poderia denominar de campo
odontológico, uma vez que se constitui também em uma área de conhecimento
constitutiva do campo mais geral da “saúde coletiva”, neste estudo é considerada como
uma especialidade odontológica para fins analíticos. Os resultados foram expressos
como freqüência de cada categoria.
RESULTADOS
Quanto ao desenho metodológico, 87,5% dos resumos eram do tipo operativo
individuado e 12,5%, o agregado. Com pequenas variações durante o período
analisado, a freqüência dos estudos operativos individuados foi sempre acima de
80,0%, com exceção do ano de 2005 (77,0%). Em 2003, os estudos individuados
alcançaram 97,0% (tabela 1). No quesito “posição do investigador”, 48,8% foram
estudos de observação. Nesses, por definição, o pesquisador não interveio diretamente
no fluxo dos acontecimentos que tomou como objeto de pesquisa (tabela 2). Ainda
quanto ao desenho metodológico, na dimensão “referência temporal” 52,9% foram
estudos longitudinais e 47,1%, transversais (tabela 3).
Com relação à segmentação das pesquisas nas áreas do conhecimento
odontológico definidas pelo CFO (17), apenas cinco atingiram percentuais de ocorrência
superiores a 10,0%: dentística, periodontia, endodontia, odontopediatria e saúde
coletiva, nesta ordem. A saúde coletiva chegou a totalizar 10,5% dos trabalhos
pesquisados. Patologia, prótese dentária, cirurgia e traumatologia bucomaxilofaciais,
ortodontia e estomatologia tiveram freqüências entre 4,7 e 9,8%. As outras nove
especialidades reunidas totalizaram 9,6%. Nesse conjunto encontram-se as cinco
especialidades aprovadas pelo CFO em 2002: odontologia do trabalho, ortopedia
funcional dos maxilares, disfunção temporomandibular e dor orofacial, odontologia para
pacientes com necessidades especiais e odontogeriatria. A essas se somam radiologia
odontológica e imaginologia, implantodontia, odontologia legal e prótese
bucomaxilofacial (tabela 4).
Na classificação da natureza geral da pesquisa, 41,7% dos resumos tratavam
de estudos com seres humanos. O peso maior nesse total, entretanto, foi dos estudos
de natureza clínica quando comparados aos de base populacional. Os resumos
restantes (58,3%) tratavam de pesquisas laboratoriais in vitro (31,1%), pesquisas
laboratoriais in vivo (23,6%) e revisões bibliográficas (3,6%) (tabela 5).
DISCUSSÃO
Desde meados dos anos 1970, um representativo campo intelectual se formou
no Brasil, no qual as ciências sociais e a área do ensino e educação tomaram como
tema a saúde, que, por sua vez, recebeu a influência de conjunturas sociais, políticas e
institucionais. A esse respeito, Nunes (18) pondera que há um campo aberto para
estudos sobre a construção científica na área das ciências sociais em saúde. Isso vem
sendo realizado por meio de estudos que buscam fundamentação na sociologia, história
e filosofia da ciência, permitindo uma análise mais aprofundada da produção científica.
Apesar de esse crescimento contemplar praticamente todas as áreas de conhecimento
do campo mais geral da saúde, nota-se que, na odontologia, ele tem acontecido de
forma mais lenta e gradual.
Ainda são poucos os relatos sobre a quantidade e a qualidade dos trabalhos
científicos realizados na área odontológica no Brasil, embora haja um crescimento
gradativo do interesse por esses estudos nos últimos anos, permitindo traçar um
diagnóstico mais preciso do que se produz em nosso país. Para esta pesquisa,
optamos por utilizar o mesmo campo de ação empregado por Cormack e Silva-Filho
(11). Na análise da produção apresentada na Reunião Anual da SBPqO de 1997, os
autores concluíram que a pesquisa odontológica no Brasil estava voltada para assuntos
que tratavam dos materiais de uso odontológico, aspectos biológicos e técnicas clínico-
cirúrgicas. Tais temáticas corresponderam a 88,3% dos trabalhos daquele ano. Apenas
11,7% das pesquisas versaram sobre assuntos de cunho social. A participação do setor
privado no financiamento dessa produção foi considerada inexpressiva (1,7%); as
instituições públicas, por sua vez, despendiam suas verbas de forma desvinculada da
área social. Os autores enfatizaram o fato de que, apesar de o financiamento ser
essencialmente realizado por instituições públicas, a grande maioria das pesquisas se
orientava ao estudo de materiais odontológicos com fins terapêuticos com pouco ou
quase nenhum alcance para a maior parte da população (11). Já no presente estudo,
observamos um predomínio de pesquisas clínicas ou com sujeitos coletivos (41,7%).
Entretanto, dentro dessa categoria, a maior contribuição foi das pesquisas de natureza
clínica (30,2%) em relação às pesquisas com sujeitos coletivos (11,5%).
O alto percentual de pesquisas laboratoriais (54,7%) deve ser visto com
atenção, já que muitos desses estudos englobam benefícios que podem ser aplicados
diretamente à coletividade. É o caso, por exemplo, das pesquisas que visam a reduzir
os custos na área da prevenção, com o desenvolvimento de novos produtos para
escovação ou de materiais restauradores mais acessíveis. Embora esses estudos
sejam realizados em um ambiente laboratorial, podem ter aplicação na área de saúde
coletiva (19, 20). Antunes e Peres (16) também afirmam que a observação clínica e a
pesquisa laboratorial se integram aos estudos epidemiológicos, formando um tripé que
sustenta os conhecimentos utilizados para os programas de saúde. Para Gadelha (21),
o desenvolvimento da sociedade está intrinsecamente ligado ao conhecimento, à
pesquisa e à expansão do sistema de saúde em sua integralidade, incluindo estudos
que possam trazer benefícios diretos ou indiretos para a saúde bucal coletiva.
Quanto ao desenho metodológico, na dimensão referência temporal, chama a
atenção o fato de que 52,9% dos estudos tenham sido classificados como longitudinais.
Esse índice se justifica pelo alto número de estudos laboratoriais (54,7%) e pesquisas
clínicas com seres humanos (30,2%) (tabela 5), que, geralmente, envolvem seguimento
ao longo de um determinado espaço de tempo.
Os resultados mostram que as áreas que tratam diretamente das doenças
bucais de maior prevalência (cárie e doença periodontal) também foram o foco mais
freqüente da pesquisa. É válido assinalar, porém, que houve uma proximidade dos
valores de freqüência relativa (entre 10,5 e 12,8%) obtidos pelas cinco primeiras áreas,
que ainda incluíam a endodontia, a odontopediatria e a saúde coletiva. Destaca-se a
posição ocupada pela saúde coletiva (10,5%), superando todas as outras
especialidades subseqüentes. Sua posição limítrofe em relação à patologia (9,8%),
especialidade que estuda aspectos histopatológicos das alterações do complexo
bucomaxilofacial mostra, de certa forma, uma tendência de reversão da preocupação
dos grupos científicos em pesquisar apenas o dano ou a lesão para estudar outros
aspectos que envolvem o adoecer humano, a sua prevenção e a promoção da saúde.
Utilizando como categorias as áreas de conhecimento do Conselho Nacional
de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) do Ministério da Ciência e
Tecnologia do Brasil, ao invés das especialidades do CFO, como no presente estudo,
Cavalcanti et al. (22) obtiveram resultados semelhantes, com a odontologia preventiva e
social (equivalente neste estudo à saúde coletiva) em segundo lugar entre as áreas
mais estudadas (8,5%), tendo como grupo de análise os trabalhos apresentados na 20ª
Reunião Anual da SBPqO. No estudo citado, as outras áreas onde mais houve
pesquisa foram materiais dentários, endodontia, odontopediatria e radiologia, nesta
ordem.
No presente estudo, o mesmo raciocínio usado para explicar a posição
ocupada pela saúde coletiva pode também ser utilizado para interpretar o
comportamento das três áreas seguintes: prótese (7,4%), cirurgia (6,1%) e ortodontia
(5,2%). Essas áreas sempre disputaram o interesse de especialidade entre os
cirurgiões-dentistas, mostrando-se, nesta avaliação, ainda com ocorrência importante
nos grupos estudados. Se, durante décadas, a reabilitação, a cirurgia e a ortodontia
interceptora ou corretiva prevaleceram na profissão odontológica, tanto como objeto de
suas práticas quanto como objeto de investigação científica, os resultados desta
pesquisa indicam uma nova tendência.
A estomatologia, uma área ainda pouco explorada da odontologia (apenas 369
cirurgiões-dentistas, ou 0,17% do total de profissionais, são registrados nessa
especialidade no CFO) (23), tem apresentado um aumento significativo no número de
pesquisas nos últimos anos, o que justifica estar entre as 10 áreas mais estudadas.
Todas as cinco especialidades registradas no CFO em 2002 ficaram entre as
áreas menos estudadas. A baixa ocorrência provavelmente se deve a dois fatores: a
ausência de disciplinas correlatas nos cursos de graduação em odontologia e também
aos poucos cursos de pós-graduação lato e stricto sensu com foco nessas áreas.
Amorim (24) obteve resultados semelhantes aos do presente estudo ao analisar
os três periódicos brasileiros mais consultados pelos cirurgiões-dentistas, entre 1990 e
2004. A autora encontrou que 52,73% dos artigos nesses periódicos estão
concentrados em apenas cinco áreas: dentística (13,41%), saúde coletiva (11,25%),
endodontia (11,24%), estomatologia/patologia (8,95%) e prótese (7,89%). Destaca-se
novamente a participação significativa da área de saúde coletiva, a segunda mais
freqüente em periódicos que, por sua vez, concentravam 52,74% do acesso e utilização
pelos cirurgiões-dentistas brasileiros.
Os resultados aqui descritos vão ao encontro da observação de Barros (25) e
Birman (26), que afirmam que o progresso observado na saúde coletiva reflete a
demanda crescente das universidades e principalmente do Sistema Único de Saúde.
Embora incipiente, tal evolução quantitativa acena para uma nova realidade, na qual o
interesse pelo social vem se consolidando como objeto de estudo nas instituições de
ensino e pesquisa.
Narvai e Almeida (27) avaliaram a produção científica brasileira na área de
odontologia social e preventiva no período de 1986 a 1993 e a associação dessa
produção com o sistema de saúde e as políticas de saúde. Foram examinados 386
artigos, publicados em 19 periódicos. Embora o trabalho tenha se restringido à
odontologia social e preventiva, é relevante destacar que os autores concluíram que
cerca de 75% da produção nessa área tiveram origem em universidades públicas.
Em comparação com a pesquisa de Narvai e Almeida, na qual 56,7% dos
artigos eram originais e outros 30,3% traziam revisões de literatura e ensaios, neste
estudo as revisões ficaram em 3,6%, já que algumas categorias das reuniões da
SBPqO foram mais dirigidas aos estudos sobre educação em saúde, com maior
tendência de se apresentarem naquela classificação.
Embora seja importante, em função de sua rapidez e chegada imediata ao
público-alvo, a apresentação de trabalhos em congressos e eventos técnico-científicos,
segundo Población e Duarte (28), ainda se reveste de um tratamento menos formal
quando comparada à divulgação mais criteriosa, representada pela publicação em
revistas científicas (29). Assim, cabe enfatizar que a divulgação em periódicos
possibilita que toda uma comunidade, que lida com a construção e o progresso do
conhecimento, possa se beneficiar dos resultados de cada investigação científica, na
medida em que faz alavancar esse progresso e o submete à apreciação de pares
acadêmicos.
Foratini (30) assinala que, no Brasil, muitos periódicos não preenchem critérios
de qualidade como impacto, competitividade e internacionalidade. Para Cury (31), a
odontologia brasileira ainda está em estado inicial, não tendo incorporado os critérios
internacionais. No entanto, o autor admite que a busca por parâmetros claros e
objetivos de qualidade deve ser a tônica dos periódicos brasileiros.
Para Narvai (32), o aumento do número de publicações em saúde bucal
coletiva, que se expressa também na edição de livros, ainda não é suficiente para
consolidar essa área como uma das mais produtivas, embora essa pareça ser uma
tendência a curto e médio prazo.
Nessa perspectiva, Mashelkar (33) afirma que a força econômica de um país é
confrontada com sua capacidade autóctone de pesquisa. Dados do CNPq (34) indicam
que o setor saúde, no período de 2000 a 2004, foi responsável por 27% das linhas e
33,2% dos grupos de pesquisa. Com relação ao número de pesquisadores, a
participação da área de saúde chegou a 32,9% do total de pesquisadores da base do
CNPq no ano de 2004. Esses números refletem uma participação importante em todas
as linhas de pesquisa, incluindo a saúde pública, responsável por 13,2% dos estudos
realizados naquele ano. O aumento da produção de pesquisa gera mais necessidade
de divulgação no meio científico.
Merece registro o fato de o CNPq ter firmado, em 2004, uma parceria com o Ministério
da Saúde, por meio da qual 1 milhão de reais foram destinados especificamente ao
financiamento de projetos de pesquisa no campo da saúde bucal coletiva (35). O edital
nº 038/2004 do CNPq/Ministério da Saúde/Departamento de Ciência e Tecnologia
(CNPq/MS-DECIT) contemplou 10 linhas de apoio sobre o tema, desde modelos de
atenção e serviços de saúde bucal até impactos epidemiológicos e estudos de risco
ocupacional em profissionais da área. A iniciativa interministerial emergiu num momento
em que a saúde bucal coletiva ganha destaque na discussão das políticas públicas de
saúde.
Silveira (36) pondera que os desafios atuais da pesquisa odontológica
brasileira remetem ao incremento da publicação em periódicos nacionais e estrangeiros
e à “aplicação racional” dos resultados “visando à melhoria de qualidade da saúde das
populações”.
CONCLUSÕES
Conclui-se que, no período de 2001 a 2006, a pesquisa odontológica no Brasil se
caracterizou pelas seguintes tendências:
• predomínio, quanto ao desenho metodológico, dos estudos de natureza
individuada, típicos de pesquisas com enfoque clínico, para o estudo de
materiais e com impacto limitado, mas não excludente, para as coletividades
humanas;
• apesar da pouca diferença percentual, predomínio dos estudos de natureza
intervencionista sobre os observacionais, e dos estudos longitudinais sobre os
transversais;
• freqüência maior, quanto à área do conhecimento, de pesquisas nas áreas da
dentística, da periodontia, da endodontia e da odontopediatria e participação
significativa da área de conhecimento da saúde bucal coletiva, que correspondeu
à quinta área com maior produção dentre 19 especialidades;
• quanto à natureza geral, freqüência maior de estudos laboratoriais com relação
àqueles em humanos. As pesquisas que usaram sujeitos coletivos como unidade
de análise foram bem menos freqüentes do que as pesquisas eminentemente
clínicas.
A análise das reuniões da SBPqO mostrou que, não obstante as reconhecidas
dificuldades encontradas para produzir conhecimento na área da saúde em países em
vias de desenvolvimento, houve uma equilibrada produção no campo odontológico
brasileiro no período de 2001 a 2006, com crescente interesse na área de saúde bucal
coletiva.
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ABSTRACT
Trends of dentistry research in Brazil
Objective. To describe the trends of dentistry research in Brazil (especially population-
based oral health) in the early 21st century.
Methods. The abstracts of works presented at the meetings of the Brazilian Society for
Dental Medicine Research (Sociedade Brasileira de Pesquisa Odontológica, SBPqO)
from 2001 to 2006 were assessed in terms of methodological design (aggregate or
population-based and individual-based studies; observational and intervention studies;
cross-sectional and longitudinal studies), overall nature (literature review, studies with
human beings and laboratory studies) and classification into one of the 19 specialty
categories recognized by the Brazilian Federal Dentistry Council. Of the 10 406
abstracts presented in this period, 5 203 (50.0%) were reviewed.
Results. Concerning methodological design, 87.5% of the abstracts referred to
individual-based studies, vs. 12.5% of aggregate studies. Concerning overall category,
41.7% referred to studies with human beings. The remaining abstracts (58.3%)
described in vitro (31.1%) or in vivo (23.6%) laboratory research and literature reviews
(3.6%). Concerning the Council’s specialty categories, only five had a frequency higher
than 10.0%: esthetic dentistry, periodontics, endodontics, pediatric dentistry and
population-based oral health.
Conclusions. The Brazilian scientific output in the field of dental medicine for the period
between 2001 and 2006 was balanced, with increasing interest in the area of
population-based oral health.
TABELA 1. Freqüência absoluta e relativa dos estudosa apresentados nas
reuniões da Sociedade Brasileira de Pesquisa Odontológica conforme tipo
operativo, Brasil, 2001 a 2006
Estudos agregados Estudos individuados
Ano n % n %
2001 117 17,0 570 83,0
2002 46 11,0 373 89,0
2003 38 3,0 1.214 97,0
2004 98 11,0 797 89,0
2005 170 23,0 572 77,0
2006 181 15,0 1.027 85,0
Total 650 12,5 4 553 87,5
a n = 5 203.
TABELA 2. Freqüência absoluta e relativa dos estudosa apresentados nas
reuniões da Sociedade Brasileira de Pesquisa Odontológica conforme posição
do investigador, Brasil, 2001 a 2006
Estudos observacionais Estudos de intervenção
Ano
n % n %
2001 298 43,5 389 56,5
2002 187 44,6 232 55,4
2003 680 54,3 572 45,7
2004 362 40,4 533 59,6
2005 470 63,3 272 36,7
2006 570 47,2 638 52,8
Total 2 567 48,8 2 636 51,2
a n = 5 203.
TABELA 3. Freqüência absoluta e relativa dos estudosa apresentados nas
reuniões da Sociedade Brasileira de Pesquisa Odontológica conforme
referência temporal, Brasil, 2001 a 2006
Estudos transversais Estudos longitudinais
Ano n % n %
2001 395 57,5 292 42,5
2002 174 41,5 245 58,5
2003 576 46,0 676 54,0
2004 353 39,5 542 60,5
2005 378 51,0 364 49,0
2006 574 47,5 634 52,5
Total 2 450 47,1 2 753 52,9
a n = 5 203.
TABELA 4. Freqüências absoluta e relativa dos estudosa apresentados nas
reuniões da Sociedade Brasileira de Pesquisa Odontológica conforme área de
conhecimento, Brasil, 2001 a 2006
Área n %
Dentística 665 12,8
Periodontia 609 11,7
Endodontia 593 11,4
Odontopediatria 562 10,8
Saúde coletiva 547 10,5
Patologia 510 9,8
Prótese buço-dentária 385 7,4
Cirurgia 317 6,1
Ortodontia 271 5,2
Estomatologia 245 4,7
Outras áreas 499 9,6
Total 5.203 100,0
a n = 5 203.
TABELA 5. Freqüência absoluta e relativa dos estudosa apresentados nas
reuniões da Sociedade Brasileira de Pesquisa Odontológica conforme a
natureza geral da pesquisa, Brasil, 2001 a 2006
Natureza da pesquisa n %
Estudos em humanos 2 170 41,7
Pesquisas clínicas 1 572 30,2
Pesquisas com sujeitos coletivos 598 11,5
Pesquisas laboratoriais 2 846 54,7
In vitro 1 618 31,1
In vivo 1 228 23,6
Revisões bibliográficas 187 3,6
Total 5 203 100,0
a n = 5 203.
4 COMENTÁRIOS, CRÍTICAS E SUGESTÕES
Para qualquer planejamento estratégico, seja qual a área trabalhada, é
necessário e fundamental que um bom diagnóstico da situação seja realizado. Assim,
objetivos e metas e um plano de ação mais eficaz são mais facilmente delineados.
Nas áreas de Saúde, Educação e Pesquisa, os estudos de prevalência revelam um
instantâneo da situação vivida e compartilhada entre os atores sociais.
Nesse estudo, o diagnóstico foi a própria pesquisa que revelou as grandes
áreas de concentração mais estudadas e os desenhos metodológicos mais comuns.
A inter e a multidisciplinaridade esperadas pelo Programa de Pós-
Graduação da Universidade Federal do Rio Grande do Norte se tornam bem
evidentes por envolvermos áreas que se inter-relacionam mutuamente, criando uma
simbiose necessária da Educação, Saúde e Pesquisa a fim de que transcendam seus
campos de ação, rumo à transdisciplinaridade. Ou como relata o próprio programa em
suas bases, quando fala sobre a transdiciplinaridade, que “rompe frontalmente com a
lógica da eficácia pela eficácia, procurando transformar a ciência, muito mais do que
limitá-la, tão-somente, a crescer; é preciso buscar novos paradigmas, os quais
responderão pelo conhecimento científico”.
Adiante, nesta seção, ficarão evidentes outras metas atingidas e futuras
intenções deste trabalho.
4.1 Produtos gerados pela Tese
Relacionados diretamente à pesquisa foram concluídos 2 artigos enviados
para os seguintes periódicos: Revista Panamericana de Salud Pública/Pan American
Journal of Public Health (ISSN: 1020-4989) e Revista da Sociedade Brasileira de
Periodontologia (0103-9393).
Dos artigos enviados, foi aceito para publicação o da Revista
Panamericana de Salud Pública/Pan American Journal of Public Health (ISSN: 1020-
4989) e o outro continuava em análise até a conclusão dessa tese. Pela indexação do
primeiro periódico em bases importantes como do Medline (subconjunto da base
PubMed, que indexa, além de periódicos selecionados para indexação sistemática no
subconjunto MEDLINE, outros títulos que publicam esporadicamente artigos de
interesse em ciências da saúde)(9), esse artigo foi identificado como principal produto
gerado pela tese.
Ademais, vale citar que a pesquisa foi realizada envolvendo pesquisadores
de centros diferentes do país, a saber os dois autores (aluno e professora
orientadora) da Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN) e um terceiro
autor da Universidade de São Paulo (USP) que contribuiu substancialmente por ter
pioneiramente trabalhado nesta linha de pesquisa. Essa inter-relação entre
universidades é de fundamental importância não só pelo diálogo estabelecido entre
centros formadores de regiões diferentes, mas também pela necessária e salutar
integração e parceria constituídas por pesquisadores que lidam com o tripé ensino-
educação-pesquisa em realidades distintas.
Utilizando aspectos metodológicos da pesquisa e durante o curso de
Doutorado, foram gerados vários produtos indiretos dos quais se destaca um livro
organizado pelo autor, intitulado Saúde Bucal Coletiva: Metodologia de Trabalho e
Práticas, objeto direto da prática de ensino do orientando, publicado em 2006 pela
Editora Santos, com circulação nacional, o qual contém 4 capítulos escritos pelo autor
organizador, 2 deles em parceria com a professora orientadora. O livro também
apresenta 3 capítulos assinados por professores do corpo docente e seus respectivos
orientandos do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Saúde/PPGCSA da
UFRN.
Na reedição deste livro, prevista para 2008, 2 novos capítulos foram
incluídos em conjunto com a orientadora e outros membros do PPGCSA e se
encontram em fase final de revisão. Os dois capítulos contemplam os objetivos do
programa por tratar de temas multidisciplinares e com enfoque reflexivo e ao mesmo
tempo resolutivo para problemas que coexistem no cotidiano da saúde (“Periodontia
médica: racionalidade científica e reintegração clínica” e “Aplicação de estratégias
terapêuticas odontológicas em oncologia médica”). Estes novos temas refletem a
área de atuação profissional da orientadora e os novos rumos adotados pela mesma,
como meta para se integrar ao escopo do programa multidisciplinar a que pertence.
Outros produtos gerados foram: 2 capítulos de livro, publicado pela
EDUFRN em 2005 (Saúde Bucal Coletiva: Conhecer para Atuar) e 1 capítulo de livro
intitulado “Periodontites Agressivas: Etiologia, Diagnóstico e Tratamento”, pela Editora
Artes Médicas, no mesmo ano (Periodontia: A Atuação Clínica Baseada em
Evidências Científicas)” publicado pela Sociedade Brasileira de Periodontologia
(SOBRAPE).
4.2 Críticas à Metodologia
Pesquisas de prevalência não costumam animar a comunidade científica
com relação ao interesse suscitado pelas mesmas; e quase sempre são preteridas às
pesquisas de coorte e de caso-controle(34, 35). Entretanto, para qualquer planejamento
é de fundamental importância que o mesmo se baseie em um diagnóstico pleno e
concreto da situação. Para conhecer e interpretar o universo de pesquisas em
Odontologia no Brasil, de acordo com a grande área de concentração e desenho
metodológico, a realização de um estudo de corte transversal identificou as
tendências que se delineiam para os primeiros anos do século XXI.
Observou-se também que nos últimos anos houve um interesse crescente
de se analisar o que é efetivamente produzido, a partir de artigos científicos, em
várias áreas do conhecimento. Uma consulta na base SciELO utilizando as categorias
“produção” e “científica” identificou 371 artigos (entre originais e editoriais), no período
de 1987 a 2007. Só nos últimos dois anos (2006 e 2007) foram 155 artigos ou 41,7%
de toda a produção de trabalhos sobre o assunto nos últimos 20 anos. O assunto
parece estar na agenda das pesquisas atuais tanto que um importante periódico
brasileiro de alto impacto na área de Saúde Coletiva reservou uma edição especial
para artigos que se debruçassem sobre a análise da produção científica brasileira sob
vários aspectos(36).
No ano passado, conseguiu-se identificar pelo menos sete artigos que
analisavam a produção científica em diversas áreas como na Psiquiatria(37, 38), no
Serviço Social(39), em Ciência da Informação(40), em Economia da Saúde(35), em
Enfermagem(41) e em Saúde Reprodutiva(42).Em todos eles, um objetivo comum: o de
detectar o que está sendo produzido efetivamente em cada área e quais
metodologias de trabalho estão sendo priorizadas.
Essa nova vertente da pesquisa em Saúde, o da análise de produções
científicas, entusiasma os presentes autores para que estudos abordando outros
aspectos possam ser conduzidos, tais como: comparativo com produções de autores
brasileiros em eventos internacionais e pesquisa sobre o fluxo de publicações efetivas
dos trabalhos apresentados nesses encontros e estudo para mapeamento quanto ao
financiamento, à origem geográfica e aos temas gerais abordados nas pesquisas em
Odontologia.
No entanto, parece que a necessidade de se estudar produção científica
em determinadas áreas revela a imensa quantidade de pesquisas já realizadas e o
esgotamento/saturação do saber sob alguns aspectos. Em revisões sistemáticas do
COCHRANE observa-se que boa parte das terapias em teste se equivalem e que,
talvez, urge melhorar a articulação para uma maior aplicabilidade das pesquisas
realizadas.
Neste projeto, a intenção inicial era que o corte temporal pudesse englobar
pelo menos uma série de 10 anos; entretanto, optou-se pelo período de 2001 a 2006
por representar o início do novo século. O vasto material utilizado nesse primeiro
estudo (5.203 resumos) foi um dos fatores complicadores para a pesquisa haja vista a
grande quantidade de dados a serem analisados.
Na realização da pesquisa houve a necessidade de um estudo piloto
quando foram analisados 30 resumos para calibração inicial e apropriação do
instrumento metodológico. A análise estatística a partir de freqüências simples foi
apropriada, haja vista não se estudar relações causais ou de associação onde seria
imperativo o uso de testes específicos.
4.3 Mérito, contribuições da publicação e outros aspectos
Um dos principais méritos gerados por essa pesquisa é o de apresentar
um estudo teórico que poderá contribuir para delinear outros trabalhos sobre o
assunto abordando objetivos diferentes. Durante a coleta de dados, ficou explícita a
pouca quantidade de artigos sobre a produção científica na área da Saúde, embora
se evidencie um crescente interesse nos últimos anos como citado anteriormente e
que, na Odontologia, confere originalidade ao nosso trabalho.
Ressalta-se que ao mesmo tempo em que vários trabalhos foram
realizados analisando a produção científica em áreas diversas, houve dificuldade para
se encontrar estudos bibliométricos ou que analisam o status da pesquisa
odontológica no Brasil e no mundo.
É uma das metas dos autores, por conta da vivência docente, o
prosseguimento da pesquisa associando-a a novas metodologias de ensino, em
particular àquelas que buscam modos alternativos no processo de aprendizagem,
como a baseada na problematização de situações. Essas novas tendências devem se
opor ao modelo clássico de exposição teórica, isento de debate e tendo o discente
como apenas um receptáculo de informações, sem nada a acrescentar ou contribuir
no processo ensino-aprendizagem.
Ademais, deve ser reforçado que a formação do aluno deve estar pautada
no tripé ensino-pesquisa/extensão-assistência a fim de que se possa cumprir uma
das diretrizes do MEC qual seja a “formação integral e adequada do estudante” (17),
contemplando o sistema de saúde vigente no país, a atenção integrada da saúde em
um sistema regionalizado e hierarquizado de referência e contra-referência e o
trabalho em equipe.
Acredita-se, finalmente, que a publicação do artigo principal em um
periódico de impacto relevante, e com larga inserção no público alvo a que se
destina, é fundamental para que a pesquisa ganhe ainda mais visibilidade e
relevância quanto ao assunto tratado. A Revista Panamericana de Salud Pública/Pan
American Journal of Public Health é publicada pela Organização PanAmericana de
Saúde Pública que, por sua vez, é um dos braços regionais da Organização Mundial
de Saúde (OMS), possibilitando e garantindo seriedade, transparência e respeito às
pesquisas que divulga.
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