O uso dos dicionários pelos aprendentes chineses de PLEUNIVERSIDADE DE LISBOA FACULDADE DE LETRAS O...
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UNIVERSIDADE DE LISBOA
FACULDADE DE LETRAS
O uso dos dicionários pelos aprendentes chineses
de PLE
Lu Qiuhua
Tese orientada pela Prof.ª Doutora Margarita Maria Correia
Ferreira e Prof.ª Doutora Tanara Zingano Kuhn, especialmente
elaborada para a obtenção do grau de Mestre em Português
Língua Segunda / Língua Estrangeira.
2018
Agradecimentos
Um agradecimento profundo às minhas orientadoras, Professora Doutora
Margarita Maria Correia Ferreira e Professora Doutora Tanara Zingano Kuhn, pela
orientação dedicada, pelas vossas sugestões, pela paciência ao longo deste processo
e pelo encorajamento e palavras carinhosas.
À Professora Doutora Catarina Isabel Sousa Gaspar, pelo seu ensino e cuidado
ao longo do curso. Ao Professor Doutor António Manuel Dos Santos Avelar,
Professora Doutora Teresa Seruya e Professor Doutor Carlos Gouveia, por me
dirigirem à área de Português como LE/L2 e multiculturalismo.
À Xu Shuai, Pu Kejun, Ye Xinlei, Gu Jie, Kong Mengya, Li Yiyi e Yu Chuan,
pela vossa amizade, apoio e companhia em todos os momentos. A todos os amigos
e colegas do Curso de Português como LE/L2 da Faculdade de Letras da
Universidade pela vossa ajuda e companheirismo no percurso de aprendizagem.
Aos meus colegas, amigos e professoras da Universidade de Estudos
Estrangeiros de Tianjin, pela vossa ajuda no presente trabalho, em particular, à Li
Xin, pela sugestão e comentários na elaboração do questionário, e à professora Liu
Quan e Yang Shu, pelo encorajamento e divulgação do questionário do presente
trabalho.
A todos os respondentes do questionário, pela vossa paciência no
preenchimento e contributos para a investigação.
Às minhas amigas mais queridas Xie Wei, Wei Ping, Wu Yi e Gui Jingfan, pela
amizade profunda ao longo dos 12 anos. Sinto-me grata por vos ter conhecido.
Aos meus pais e à minha avó materna, pelo vosso amor, carinho e apoio desde
sempre. Ao meu avô materno falecido, pelo seu cuidado ao longo dos anos. Espero
que seja feliz no outro mundo..
i
Resumo
O dicionário desempenha um papel essencial ao longo do percurso da aprendizagem
de uma língua segunda / língua estrangeira. Embora um número considerável dos estudos
teóricos e empíricos tenham sido realizados de forma a lançar a base teórica para a
elaboração do dicionário, os dicionários da língua portuguesa, sobretudo aqueles a que os
aprendentes chineses têm acesso, não experimentaram tantos avanços como no caso do
inglês, com poucas escolhas disponíveis para os seus consumidores potenciais. A escassez
dos estudos na área também resultou na falta dos conhecimentos a nível académico em
torno do uso do dicionário pelos aprendentes chineses, contribuindo para a elaboração do
presente trabalho.
O presente trabalho objetiva adquirir informações, por meios da pesquisa
quantitativa, sobre o uso do dicionário da língua portuguesa por parte dos estudantes
chineses, com base no enquadramento teórico abordado na primeira componente do
trabalho. Procedeu-se posteriormente a uma análise dos dicionários mais procurados
conforme os resultados do questionário, de forma a resumir as qualidades que deve
possuir um dicionário ideal para os aprendentes chineses.
Palavras-chave: dicionário; lexicografia; metalexicografia; uso de dicionários;
aprendentes chineses
ii
Abstract
The dictionary plays an essential role in the course of learning a second language /
foreign language. Although a considerable number of theoretical and empirical studies
have been carried out so that the theoretical basis can be launched for dictionary
development, the dictionaries in Portuguese, especially those to which the Chinese
learners have access, have not experienced as much progress as English did, remaining
few choices available to their potential consumers. The scarcity of the studies in the area
also resulted in the lack of knowledge in academic aspects about the use of the dictionary
by the Chinese learners, which is one of the main reasons for the elaboration of the current
work.
The present thesis aims to acquire some information, through quantitative research,
on the topic of dictionary use of Portuguese by Chinese students, based on the theoretical
framework addressed in the first component of the work. The most popular dictionaries
were then analyzed according to the results of the questionnaire in order to summarize
the qualities that an ideal dictionary should have for Chinese learners.
Key words: dictionaries; lexicography; metalexicography; dictionary use; Chinese
learners
1
Índice
Resumo ..................................................................................................................... i
Abstract ................................................................................................................... ii
Introdução ............................................................................................................... 6
Capítulo I - Dicionário e aprendizagem de língua estrangeira .......................... 9
1.1 Definição do dicionário ............................................................................ 9
1.1.1 Dicionário ou enciclopédia?.......................................................... 10
1.1.2 Macroestrutura ............................................................................... 11
1.1.2.1. A disposição de entradas .................................................... 12
1.1.2.2. Fontes do dicionário ........................................................... 15
1.1.3 Microestrutura ............................................................................... 17
1.1.3.1. A cabeça do verbete ........................................................... 17
1.1.3.2. Definição ............................................................................ 23
1.1.3.3. Colocações ......................................................................... 27
1.1.3.4. Expressões idiomáticas ...................................................... 30
1.1.3.5. Exemplos ............................................................................ 32
1.1.4 Medioestrutura .............................................................................. 34
1.2 Tipos de dicionários de língua ............................................................... 36
1.2.1 Dicionário monolingue geral ........................................................ 36
1.2.2 Dicionário monolingue para aprendizes ....................................... 38
1.2.3 Dicionário bilingue ....................................................................... 41
1.2.4 Dicionário semibilingue ................................................................ 45
1.3 O uso do dicionário é benéfico à aprendizagem? .................................. 46
Capítulo II – Metodologia .................................................................................... 49
2.1 Questionário ........................................................................................... 49
2.1.1 Questionário-piloto ....................................................................... 50
2
2.1.2 Questionário principal e perfil dos respondentes .......................... 53
2.2 Análise dos dicionários .......................................................................... 54
Capítulo III - Apresentação e discussão dos resultados do inquérito .............. 55
3.1 Resumo dos resultados ............................................................................. 75
Capítulo IV – Análise dos dicionários ................................................................. 77
4.1 Análise da macroestrutura ...................................................................... 77
4.2 Análise da microestrutura ...................................................................... 80
4.3 Uma proposta de um dicionário ideal para os aprendentes chineses ..... 90
Conclusão .............................................................................................................. 92
Referências bibliográficas .................................................................................... 95
Anexo I – Versão Chinesa do Questionário-piloto ........................................... 100
Anexo II - Versão Portuguesa do Questionário-piloto .................................... 106
Anexo III – Versão chinesa do questionário ...................................................... 114
Anexo IV – Versão portuguesa do questionário ............................................... 120
Anexo V – Sistemas de indexação...................................................................... 126
Anexo VI – Digitalização dos verbetes de “cor” no DPC ................................ 128
3
Índice de Figuras
Figura 1 - Excerto do Longman Language Activator (2002, p. 15) ....................... 40
Figura 2 - Excerto do Longman Dictionary of Contemporary English
(English·Chinese) (5ª Edição) (2014) (pp. 472) ............................................. 42
Figura 3 - Resultado de pesquisa ............................................................................ 79
Figura 4 – Verbete de "entender" no DLP .............................................................. 81
Figura 5 – Verbete de "entender" na Infopédia ....................................................... 81
Figura 6 – Verbete de "entender" no DPLP ............................................................ 82
Figura 7 – Verbete de "entender" no DPC (pp. 413) .............................................. 83
Figura 8 – Verbete de "escola" na Infopédia .......................................................... 84
Figura 9 – Verbete de "escola" no DPLP ................................................................ 85
Figura 10 – Verbete de "escola" no DPC (pp. 432) ................................................ 85
Figura 11 – Verbete de "理 lǐ" no DCCP (pp. 377) ............................................... 88
Lista de Tabelas
Tabela 1 - Marcas diassistemáticas num dicionário contemporâneo para fins gerais
........................................................................................................................ 22
Tabela 2 - Problemas e soluções do questionário ................................................... 51
Tabela 3 – Comparação dos dicionários ................................................................. 77
Lista de Gráficos
Gráfico 1 - Nível de Proficiência ............................................................................ 54
Gráfico 2 - Sexo ...................................................................................................... 54
Gráfico 3 – Dicionários consultados com mais frequência .................................... 56
4
Gráfico 4 - Relação entre o nível de proficiência e a escolha pelo dicionário ....... 57
Gráfico 5 – Ordem de frequência de uso ................................................................ 60
Gráfico 6 – Razões de consulta .............................................................................. 61
Gráfico 7 – Grau de satisfação em relação aos dicionários .................................... 62
Gráfico 8 – Frequência de uso dos diferentes formatos de dicionário ................... 64
Gráfico 9 – Contexto de consulta ........................................................................... 65
Gráfico 10 – Vantagens do dicionário em papel ..................................................... 66
Gráfico 11 – Vantagens dos dicionários eletrónicos ............................................... 67
Gráfico 12 – Pontos fracos dos dicionários bilingues ............................................ 69
Gráfico 13 – Pontos fracos dos dicionários monolingues ...................................... 70
Gráfico 14 – Categoria das palavras com informações satisfatórias no dicionário 71
Gráfico 15 – Categorias das palavras carenciadas das informações procuradas .... 71
Gráfico 16 – Elementos procurados no dicionário ................................................. 73
Gráfico 17 – Elementos que procuram mas que não encontram ............................ 74
5
Lista de Abreviaturas
CALD – Cambridge Advanced Learner’s Dictionary
CALD2 – Cambridge Advanced Learner’s Dictionary» em CD-ROM (2ª edição, versão 2.0a)
CCALED – Collins Cobuild Advanced Learner’s English Dictionary
CCALED5 – Collins Cobuild Advanced Learner’s English Dictionary em CD-ROM (5ª
edição)
COBUILD – Collins Birmingham University International Language Database
DCCP – 简明汉葡词典 Dicionário Conciso Chinês-Português
DLP – Dicionário da Língua Portuguesa
DPC – 葡汉词典 Dicionário Português-Chinês
DPLP – Dicionário Priberam da Língua Portuguesa
L1 – Língua primeira
L2 – Língua segunda
LDOCE – Longman Dictionary of Contemporary English
LDOCE4 – Longman Dictionary of Contemporary English em CD-ROM (4ª edição)
LE – Língua estrangeira
MED – Macmillan English Dictionary for Advanced Learners
MED2 – Macmillan English Dictionary for Advanced Learners em CD-ROM (2ª
edição, versão 2.0.0702)
OALD – Oxford Advanced Learner’s Dictionary
OALD7 – Oxford Advanced Learner’s Dictionary em CD-ROM (7ª edição)
PB – Português brasileiro
PE – Português europeu
PLE – Português língua estrangeira
6
Introdução
O dicionário é um instrumento indispensável na aquisição e aprendizagem de
qualquer língua estrangeira ou segunda (LE/L2). À medida do desenvolvimento dos
dicionários a nível mundial, para além dos trabalhos já realizados anteriormente na área
lexicográfica e metalexicográfica, surgem cada vez mais estudiosos que começaram a
prestar atenção às necessidades dos utilizadores dessa obra e que se dedicaram ao estudo
do uso dos dicionários, com a finalidade de contribuir para a construção de um dicionário
adequado aos seus utilizadores.
Os utilizadores chineses dos dicionários portugueses, todavia, não desfrutaram da
florescência dos estudos. Desde a publicação do primeiro dicionário português-chinês na
China Continental em 1994, o Dicionário Conciso Português-Chinês, até os dias de hoje
foram publicados apenas quatro dicionários gerais entre as duas línguas; entre estes, o
Dicionário Português-Chinês, publicado em 2001, é o mais procurado. Num território
que conta 37 universidades que oferecem cursos de língua portuguesa1 (Público, 2017),
tal realidade certamente não conseguiu satisfazer as enormes necessidades dos
aprendentes chineses.
A par do referido, a escassez das pesquisas na área também fracassou no lançamento
da base académica para a futura elaboração, como é visível na obra do Welker (2010), em
que se apresentaram centenas dos estudos empíricos acerca do uso do dicionário em geral,
entre os quais, contudo, nenhum se debruçou sobre o uso dos utilizadores chineses das
ferramentas da língua portuguesa. Assim sendo, consideramos necessário realizar uma
investigação para tomar conhecimento dos recursos lexicográficos que utilizam, bem
como das suas preferências, hábitos, opiniões e necessidades sobre estes, de forma a
disponibilizar os dados referenciais na área, dando contributo, de certo modo, para a
futura elaboração dos dicionários destinados aos aprendentes chineses.
1 De acordo com a notícia do Público, de 30 de julho de 2017, disponível em
https://www.publico.pt/2017/07/30/sociedade/noticia/em-sete-anos-havera-50-universidades-chinesas-comportugues-
1780800
7
Para atingir esse objetivo, o questionário foi construído em torno das seguintes
quatro perguntas de pesquisa:
1) Que dicionários os aprendentes chineses utilizam?
Antes de tudo, o mais importante é saber a quais dicionários os estudantes estão a
recorrer com alta frequência, selecionando os quatro mais utilizados para a análise
posterior. Foi enumerado o maior número possível dos dicionários que existem no
mercado chinês, dividindo aqueles com diferentes formatos em duas opções (em papel ou
em formato digital - online/eletrónico/CD-Rom), para que os dados possam ser analisados
de maneira mais precisa. Como o presente trabalho se foca apenas no dicionário, os
tradutores online, como o Google Tradutor, não foram incluídos nas opções da pergunta
do questionário.
2) Com que frequência e em que contexto eles utilizam o dicionário?
Na era das tecnologias emergentes, num país, neste caso a China, dominado por
smart phones , como será o hábito de uso dos aprendentes chineses? Tendo em mente esta
dúvida, pretendemos recolher dados sobre a frequência com que os aprendentes usam tal
ferramenta em diferentes formatos – em papel, na aplicação, online (no site) ou em CD-
Rom, tentando tornar claro o hábito de uso dos chineses.
Com base em tal realidade, supõe-se que os dicionários em formatos digitais,
especialmente os das aplicações, são mais utilizados pelos respondentes.
Para além de frequência, os contextos em que o dicionário é mais consultado é
também um tema por explorar.
3) Quais são as suas opiniões em relação aos dicionários que conhecem?
Tendo conhecido os dicionários usados e a frequência e contexto de consulta, espera-
se que os respondentes possam expressar, através das várias perguntas, as suas razões para
a consulta de determinado dicionário e a sua satisfação em relação aos diversos formatos,
bem como do que consideram as suas vantagens e pontos fracos, para poder tomar
conhecimento, de forma detalhada, das opiniões dos aprendentes chineses a respeito do
dicionário.
8
4) O que eles procuram na consulta no dicionário?
A última pergunta foca-se nas necessidades dos aprendentes, visando recolher dados
sobre quais elementos microestruturais num verbete procuram e quais precisam mas não
encontram, bem como a taxa de sucesso de consulta em torno dos diversos tipos das
palavras, no intuito de resumir as informações de que um verbete necessita para satisfazer
as demandas dos aprendentes chineses.
O presente trabalho divide-se em quatro capítulos. A fim de disponibilizar uma base
teórica para a elaboração do questionário, no primeiro capítulo foi abordada de forma
detalhada a definição do termo “dicionário” e as estruturas existentes nessa obra,
designadamente, a macroestrutura, microestrutura e medioestrutura, bem como as
componentes que as constituem. Várias pesquisas foram também citadas para justificar a
utilidade do dicionário.
O capítulo II e o III relacionam-se com o estudo quantitativo do presente trabalho;
enquanto o primeiro se foca na metodologia, em que se referiram os aspetos preparativos
da pesquisa, como o formato e língua utilizados no questionário e a realização do
questionário-piloto. O terceiro capítulo dedicou-se à apresentação e análise dos resultados
do questionário, tentando retratar as características do uso dos dicionários pelos
utilizadores chineses.
O último capítulo destina-se a analisar, de acordo com os resultados da investigação,
os quatro dicionários mais populares e ntre os respondentes, tendo por base também o
enquadramento teórico. Por consequência, baseando-se nos capítulos anteriores, foi
apresentada uma proposta do dicionário ideal, sendo enumeradas as suas qualidades
obrigatórias.
9
Capítulo I - Dicionário e aprendizagem de língua estrangeira
1.1 Definição do dicionário
O que é dicionário? Antes de tudo, será pertinente abordar a definição do termo
“dicionário”, para proceder aos capítulos posteriores de forma mais explícita. No
Dicionário Priberam da Língua Portuguesa, define-se como:
a colecção organizada, geralmente de forma alfabética, de palavras ou
outras unidades lexicais de uma língua ou de qualquer ramo do saber
humano, seguidas da sua significação, da sua tradução ou de outras
informações sobre as unidades lexicais.
Tal definição é relativamente completa do ponto de vista lexicográfico, pelo que leva
em conta a estrutura interna e conteúdo do dicionário, abrangendo os dicionários em dois
sentidos, como Correia (2009: 23) explicitou na sua obra: em sentido genérico, o
dicionário é um género de catálogo da palavras ou expressões ordenadas alfabeticamente;
em sentido estrito, trata-se de dicionário de língua, em que foram descritas as “unidades
lexicais” de “uma determinada língua ou sistema linguístico”.
No presente trabalho, restringir-se-á o dicionário ao sentido estrito. Sendo assim,
merece tomar conhecimentos sobre como os estudiosos definiram o dicionário de língua.
Zgusta (1971: 17), o “padrinho” da lexicografia do século XX, citado por van
Sterkenburg (2003: 4), definiu o “dicionário”, ou “dictionary” em inglês, como o seguinte:
A dictionary is a systematically arranged list of socialised linguistic
forms compiled from the speech-habits of a given speech community
and commented on by the author in such a way that the qualified reader
understands the meaning … of each separate form, and is informed of
the relevant facts concerning the function of that form in its community.
Tal definição foi considerada um pouco elitista por van Sterkenburg (2004), porque,
nessa descrição, o dicionário parece ser apenas acessível a e compreensível por
utilizadores com níveis de educação sucessivos.
Svensén (1993), por seu turno, definiu o dicionário como um livro que, em primeiro
lugar, contém informações sobre o significado das palavras e os próprios usos nas
situações comunicativas específicas. A par do referido, para o autor sueco o dicionário
10
também é uma ferramenta prática de referência, em vez de um livro para ler de página
em página. Tais definições, lamentavelmente, por limites da era, concentraram-se apenas
nos dicionários impressos, não levando em conta os de formato digital.
Segundo van Sterkenburg (2003: 3), quando se fala do “dicionário”, trata-se do
dicionário prototípico, o dicionário monolingue alfabético para fins gerais, que se
carateriza pelo uso de uma e mesma língua tanto para o objeto como para as descrições,
pela sua natureza exaustiva da lista das palavras descritas e pelos conhecimentos
apresentados de carateres linguísticos em vez de enciclopédicos. Com base nos critérios
formais e funcionais, o autor (2003: 8) resumiu uma definição relativamente integral
quanto ao dicionário prototípico, a qual serve também para os dicionários em geral, que
é a seguinte:
The prototypical dictionary has the form of a static (book) or dynamic
product (e-dictionary) with an interstructure that establishes links
between the various components (e-dictionary) and is usually still
alphabetically structured (book). It is a reference work and aims to
record the lexicon of a language, in order to provide the user with an
instrument with which he can quickly find the information he needs to
produce and understand … (the) language. (…) With regard to content
it mainly provides information on spelling, form, meaning, usage of
words and fixed collocations.
1.1.1 Dicionário ou enciclopédia?
Olhando para as definições referidas de van Sterkenburg (2003), constata-se que se
aludiu à enciclopédia. Sendo os “primos mais próximos” o dicionário e a enciclopédia,
nas palavras de Jackson (2002: 21), qual é a diferença entre eles?
Correia (2009: 25) abordou, de forma detalhada, as diferenças, salientando que o
dicionário de língua se dedica à “descrição de unidades lexicais ou palavras”, que fazem
parte de um “sistema linguístico” e que estão ligadas às informações relacionadas com o
seu funcionamento, bem como as relações estabelecidas com as outras unidades nesse
sistema. A enciclopédia, por outro lado, é um “compêndio”, onde constam informações
em torno dos aspetos mais diversificados, disponibilizando, através do “texto
11
informativo”, as explicações dos objetos “extralinguísticos”, provavelmente com
ilustrações.
Jackson (2002), citado por Welker (2004), também fez uma distinção explícita entre
ambas as obras. Segundo ele, o dicionário é um livro de consulta em torno das palavras
de uma língua, enquanto a enciclopédia é uma obra debruçando-se sobre coisas, pessoas,
lugares e ideias, sobre o mundo real em vez da língua.
O exemplo levantado por Rey-Debove (1971: 35), citado por Lara (1989: 283) e
Welker (2004: 45), esclareceu claramente a diferença: o dicionário de língua falou do que
significa o leão, enquanto a enciclopédia apresentou e mostrou o que é um leão.
1.1.2 Macroestrutura
Tendo elucidado o que significa o dicionário a nível académico, vamos concentrar-
nos nas estruturas que constituem um dicionário – a macroestrutura, microestrutura e a
medioestrutura. Quanto ao primeiro termo, Svensén (2009: 368) explicitou que é usado
para denotar a relação e ordem entre os lemas incluídos numa lista de lemas, sendo
descrito também como um elemento da estrutura de acesso externo, que objetiva dirigir
os utentes ao lema que procuram. Welker (2004: 81), citando a definição de Rey-Debove
(1971), definiu a macroestrutura como “o conjunto das entradas” e a “forma como o corpo
do dicionário é organizado”. Correia (2009: 24) expressou o termo de forma mais integral,
pormenorizando que a macroestrutura é “o conjunto de todas as partes que constituem o
dicionário”, que, para além da nomenclatura, o equivalente de “word-list” (Béjoint, 2000:
13), abrange também os componentes que foram considerados pertencentes à
megaestrutura2 por alguns autores (Hartmann & James, 2002: 93; Svensén, 2009: 379),
nomeadamente, “o prefácio, a introdução, o guia de utilização, a lista de abreviaturas e
convenções usadas no corpo da obra, a lista de símbolos fonéticos usados e os diversos
apêndices que a obra pode conter”. No presente trabalho empregar-se-á a definição da
2 Hartmann & James (1998:93), citados por Welker (2004), definiram o termo como “o conjunto formado pela
nomenclatura e os textos externos”.
12
Correia (2009), respeitando-se também as outras definições apresentadas. No presente
capítulo abordar-se-á apenas a nomenclatura, enquanto os outros elementos serão
discutidos na análise final dos dicionários no capítulo IV.
1.1.2.1. A disposição de entradas
Svensén (2009) classificou a “macroestrutura”, neste caso se referiu à nomenclatura,
em dois principais tipos: um baseado no aspeto da expressão, como a grafia dos lemas,
cuja ordenação é feita conforme o princípio alfabético, sendo designada “macroestrutura
alfabética”, que é universalmente prevalente nos dicionários para fins gerais; outro é
denominado como a “macroestrutura sistemática”, ocorrida geralmente nos dicionários
técnicos e especializados, a qual se foca no conteúdo, como os significados dos lemas,
organizados com base nos princípios sistemático ou temático.
Em relação à macroestrutura alfabética, o autor (2009) fez uma classificação mais
específica: a macroestrutura estritamente alfabética e a não estritamente alfabética. A
primeira ainda se divide em dois tipos: a sem agrupamento e a com agrupamentos. Por
um lado, na macroestrutura estritamente alfabética sem agrupamentos, ou a
macroestrutura alfabética linear, tal como a denominação indica, observa-se estritamente
a ordem alfabética (Carvalho, 2001: 90), com os lemas no extremo esquerdo da coluna
(Svensén, 2009: 371). Na macroestrutura estritamente alfabética com agrupamentos, por
outro, existem blocos que agrupam os lemas morfologicamente relacionados, incluindo
um lema principal e um ou vários sublemas, o que favorece a economia de espaço.
Contudo, tomando em conta que a morfologia às vezes entra em conflito com a ordem
alfabética, tal organização também não vai ajudar nas atividades pedagógicas, porque a
sequência das palavras relacionadas será interrompida (Svensén, 2009: 374). Welker
(2004: 83), citando Hausmann & Werner (1991: 2747), também afirmou que, com a
ordenação alfabética, é possível que sejam agrupadas num mesmo bloco as palavras não
ligadas semanticamente.
13
Na macroestrutura não estritamente alfabética com agrupamentos3, um bloco contém
todos os sublemas morfologicamente relevantes ao lema principal, que foram ordenados
alfabeticamente (Welker, 2004: 83). Ao contrário do seu homólogo com agrupamentos
que obedece estritamente à ordem alfabética, no caso dos conflitos a ordem alfabética tem
de ceder à morfológica (Svensén, 2009: 375). As estruturas com blocos normalmente
visam, a nível pedagógico, agrupar os lemas morfologicamente relacionados para
promover a compreensão das palavras e aprendizagem dos vocábulos, sendo adequados
primariamente aos dicionários monolingues para aprendizes.
Apesar de ganhar mais popularidade que o seu homólogo, a ordenação alfabética
possui também pontos fracos. Baldinger (1960: 525), citado pelo Welker (2004: 82),
tomou como exemplos as palavras derivadas, que se separam das suas palavras-bases e
radicais, e também os homófonos, como “senso” e “censo” em português, que não se
encontram próximos mutuamente, o que dificulta a consulta para aqueles que conheçam
apenas a pronúncia. Rey (1977: 20), citado por Welker (2004: 82), opinou que o sucesso
da ordem alfabética foi apenas atribuído à sua “eficácia prática”, pelo que “o absurdo
conceitual e linguístico é reconhecido universalmente”.
Merece salientar o facto de que as macroestruturas referidas acima ocorrem na
maioria dos dicionários das línguas ocidentais; no caso dos dicionários de chinês, que
adota um sistema de grafia distinto, a situação é diferente. Como Creamer (1991: 2604)
apresenta, sendo o chinês uma língua baseada nos símbolos, ou o que nos chamamos
“carateres”, que são compostos por uma série dos traços, os sistemas de arranjo dos
dicionários chineses da versão impressa baseiam-se, em princípio, na forma ou pronúncia
dos carateres. O primeiro era o mais popularizado, tendo principalmente por base os
radicais4 e a configuração dos carateres. De acordo com Zhang & Yong (2007: 54), na
macroestrutura ordenada pelos radicais, agrupam-se os carateres ou carater-entrada de
uma palavra com mesmos radicais, todos ordenados conforme o número total dos traços
3 Termo traduzido por Carvalho (2001: 90), citado por Welker (2004: 83).
4 O radical é um elemento que geralmente indica o significado básico de um carater chinês, encontrando-se no esquerdo,
topo ou parte inferior desse símbolo (Creamer, 1991: 2604).
14
da parte restante. Os carateres com número igual de traços são distinguidos ainda mais de
acordo com a forma do próprio carater. Por exemplo, o carater “吃”, que significa
“comer”, tem como radical a parte esquerda “口”, que designa “boca” e possui três traços.
Ao consultar o carater no dicionário, é preciso encontrar primeiro o “口” na categoria dos
radicais com três traços no índice dos carateres. A seguir, remetemos à seção do radical
“boca”, contamos o total de traços da parte direita “乞”, neste caso três, e localizamos o
“comer” na subsecção dos carateres cuja parte restante é composta por três traços. Tal
arranjo era utilizado universalmente nos dicionários modernos da língua chinesa (Zhang
& Yong, 2007) – cf. Anexo 5.
A macroestrutura ordenada pela configuração dos carateres, por seu turno, constitui
a ordenação baseada no número dos traços. Os carateres com a mesma quantidade de
traços são agrupados conforme os radicais ou regra de escrever traços. Como tal arranjo
geralmente se aplica aos dicionários especializados de determinado domínio (Zhang &
Yong, 2007: 55), não se abordará mais no presente subcapítulo.
As macroestruturas tradicionais referidas dos dicionários chineses, efetivamente,
não são acessíveis para aqueles que não estão familiarizados com a estrutura dos carateres
ou que não se habituaram a fragmentar os radicais. Sendo assim, nos dias de hoje, com a
popularização do pinyin, o Alfabeto Fonético Chinês baseado no sistema romanizado
criado em 1958, a maioria dos dicionários de chinês contemporâneo adota a
macroestrutura alfabética adaptada, em que os carateres se ordenam pelo próprio pinyin,
contando com o sistema de indexação dos radicais enquanto auxílio (Zhang & Yong, 2007:
56; Creamer, 1991: 2608). Como em chinês existem quatro tons, como no exemplo da
vogal final “a”, por ordem: ā, á, ǎ, à, os carateres com mesmo pinyin são dispostos
segundo a ordem dos seus tons.
No que diz respeito à macroestrutura sistemática, nesse tipo de dicionário, os
conceitos que fazem parte de uma determinada área são associados aos diferentes grupos
temáticos, dentro dos quais estes são organizados no sistema conceitual que descreve as
suas correlações (Svensén, 2009: 377). Considerando que os dicionários com tal
15
macroestrutura são geralmente técnicos ou especializados, não se apresentará mais
detalhes sobre os mesmos no presente subcapítulo.
1.1.2.2. Fontes do dicionário
O que torna um dicionário confiável? Segundo Atkins & Rundell (2008: 45), num
dicionário confiável, os resumos sobre os comportamentos das palavras aproximam-se
intimamente à maneira como a língua é realmente utilizada num ato comunicativo
autêntico. No aspeto subjetivo, um dicionário pode ser justificado, de certo modo, pela
introspeção, que descreve o processo de que um falante nativo explicita uma palavra e o
seu significado da sua língua materna consultando os conhecimentos linguísticos e
lexicais armazenados na sua mente e recuperando os factos relevantes (Atkins & Rundell,
2008: 46). Contudo, mesmo os falantes mais educados podem ter incertezas em relação
ao uso de uma determinada palavra, já não para falar dos equívocos possíveis sobre, por
exemplo, o uso e registo de certa palavra. Aliás, o que está apresentado numa obra
lexicográfica necessita de ter provas verificadas provenientes das outras fontes. Sendo
assim, não é aceitável a introspeção como única fonte de um dicionário (Svensén, 2009:
40).
As citações, por sua vez, foram o único método confiável na coleção dos materiais
lexicográficos das fontes primárias. Com a computadorização da lexicografia, todavia, as
mesmas foram gradualmente substituídas pelo método de corpus (ibid.: 41). Sinclair
(2005: 16) resumiu a definição de corpus em geral: “A corpus is a collection of pieces of
language text in electronic form, selected according to external criteria to represent, as
far as possible, a language or language variety as a source of data for linguistic research”.
Com base nela, Atkins & Rundell (2008: 54) propuseram uma definição mais específica
para os corpora lexicográficos, como a coleção dos dados da língua estabelecidos
especialmente para a criação dos dicionários.
Segundo Béjoint (2000: 97), na moderna lexicografa baseada em corpora, todos os
lemas na nomenclatura, bem como os seus significados, foram retirados exclusivamente
16
de um corpus. Um exemplar típico nesta área é o Collins COBUILD English Language
Dictionary, em que todos os exemplos se provêm do corpus COBUILD5, com apenas
pequenas adaptações realizadas (Béjoint, 2000: 71).
O que foi referido, de facto, ocorre principalmente aos dicionários monolingues. No
caso dos dicionários bilingues, a situação é diferente. De acordo com Svensén (2009: 55),
em vez de corpora, muitos dicionários bilingues baseiam-se nos seus homólogos
monolingues e bilingues, sendo suplementados pelas citações das outras fontes, dados de
informantes ou introspeção do lexicógrafo. Tais dicionários foram criticados por não
refletir a língua no seu uso real, sendo desvalorizados sobretudo pela escassez das
descrições sintáticas. A criação do corpus paralelo compensou essa deficiência, que
designa um conjunto de corpora6 em que os textos em língua A correspondem de certa
forma àqueles na língua B (e talvez na língua C e D) (Atkins & Rundell, 2008: 70). Apesar
das enormes dificuldades na compilação de um corpus paralelo, como na procura dos
textos equivalentes nas línguas relevantes, e dos defeitos no uso desse material, como a
pouca eficiência e a não equivalência entre os lemas e exemplos, esse tipo de corpus ainda
serve para mostrar a maneira como os tradutores resolvem os problemas relativos às
palavras de alta frequência, relembrando os utilizadores para que o mesmo não ressurja.
No que diz respeito à seleção dos lemas de um corpus, Biderman (2000: 37) apontou
a frequência como o critério principal da seleção, ou seja, através do levantamento
estatístico em corpora diversificados de grande dimensão. Nas opiniões da autora, as
palavras com frequência inferior a cinco não devem ser registadas. O corpus de um
dicionário que inclui, por exemplo, 50 000 lemas, “deve conter, no mínimo, 10 milhões
de ocorrências de todas as modalidades de discurso e/ou texto para garantir a
representatividade do acervo lexical da língua, bem como de seu uso” (Bideman, 1998:
132).
5 Termo abreviado para Collins Birmingham University International Language Database.
6 Se forem dois corpora, será um corpus paralelo bilingue. Se forem mais, será uma versão multilingue.
17
1.1.3 Microestrutura
Terminando a parte da macroestrutura, mudamos o foco para a sua irmã –
microestrutura. Rey-Debove (1971: 21), citada por Welker (2004: 107), definiu o termo
como o “conjunto das informações ordenadas de cada verbete após a entrada”, o qual se
deve organizar de modo padronizado em todos os verbetes. Além de a definição ser
criticada como uma proposta incompleta por Wiegand (1989), a ideia da padronização
universal também sofreu impugnação, opinando que a padronização pode apenas existir
dentro de cada categoria de lemas.
A definição adotada na obra de Svensén (2009: 344) é mais concreta, e inclui não só
o lema, como também a estrutura interna e todas as indicações que aparecem num verbete.
A microestrutura até pode ser classificada em dois tipos: a microestrutura abstrata e a
concreta. Svensén (ibid.) descreve a primeira como um conjunto das regras gerais para a
confeção estrutural dos verbetes num determinado dicionário, em que podem existir
várias microestruturas abstratas conforme as características dos verbetes. O seu homólogo
concreto, por sua vez, é a realização de uma microestrutura abstrata num determinado
verbete de um dicionário. No presente trabalho, aplicar-se-á a definição de Svensén (2009)
para o termo microestrutura, que designa, na maioria das vezes, a microestrutura abstrata.
Para melhor abordar o termo, foi adotada a estrutura da obra de Welker (2004), que
enumerou seis tipos de informações na microestrutura, nomeadamente, a cabeça do
verbete, definição, colocações, exemplos e expressões idiomáticas.
1.1.3.1. A cabeça do verbete
Segundo Welker (2004: 110), a cabeça do verbete abrange “o lema e as informações
anteriores … às definições (ou equivalentes, nos dicionários bilingues)”, designadamente,
“variantes ortográficas, a pronúncia, a categoria gramatical, informações flexionais e/ou
sintáticas, a etimologia, marcas de uso”.
Variantes ortográficas
18
Possuindo a língua portuguesa diversas variedades, a saber, as variantes antes e
depois do Acordo Ortográfico, bem como as grafias estabilizadas europeia e brasileira,
muitos autores ou editoras na área optaram por incluir tais informações nos seus
dicionários. Apesar do facto de que, teoricamente, as variantes ortográficas estão
incluídas na cabeça do verbete, que, supostamente, aparece no início de um verbete, no
caso dos dicionários da língua portuguesa, a situação é um pouco diferente. No Dicionário
Priberam da Língua Portuguesa (DPLP), um dicionário em formato digital, as
informações relevantes encontram-se no final do verbete, como acontece ao lema
“abstracto”, em que se apresenta no final a “Grafia alterada pelo Acordo Ortográfico de
1990: abstrato” e “Grafia do Brasil: abstrato”. O Dicionário da Língua Portuguesa
(adiante designado por DLP), publicado pela Porto Editora, por seu turno, divide as
variantes ortográficas em diferentes verbetes. Entretanto, onde quer que se encontrem,
tais tipos de informações seriam úteis para os aprendentes da língua portuguesa, o que
será confirmado pela investigação nos capítulos posteriores.
Pronúncia
Embora Rey & Rey-Debove, citados por Welker (2009: 112), tenham afirmado que
“a informação sobre a pronúncia é fundamental”, Svensén (2009: 114) tem uma opinião
distinta, afirmando que a demanda de informações de pronúncia nos dicionários varia
entre as línguas. Welker (2003: 72) também reiterou que a pronúncia apenas é necessária
quando não existem regras explícitas, como acontece na língua inglesa. No caso do inglês,
a pronunciação está em pouca consonância com a sua grafia e é, em geral, imprevisível;
por consequência, a transcrição fonética consta na maioria dos dicionários da língua
inglesa (Svensén, 2009: 114). O português, entretanto, possui “regras que permitem
pronunciar adequadamente a grande maioria dos lexemas” dele (Welker, 2004: 113);
assim sendo, em muitos dicionários da língua portuguesa, em vez das transcrições
fonéticas, existem apenas esclarecimentos para os lemas com certa sílaba que provoca
confusão.
Classe gramatical
19
Apesar de a classe gramatical existir nos verbetes da maioria dos dicionários, Welker
(2004: 115) citou o exemplo do dicionário bilingue publicado pela editora alemã
Langenscheidt, onde tais informações foram omitidas quanto aos lemas “em que não há
dúvidas”, pelo que concordou com a ideia de que a classe se esclareceu pelo equivalente
ou definição. O autor brasileiro sugeriu ainda que a omissão dessa informação seja
realizada nos dicionários no futuro para economizar espaço. Importa salientar, contudo,
que a sugestão não tomou em conta os utentes estrangeiros dos dicionários, especialmente
aqueles a níveis elementares de proficiência e os falantes de uma língua com sistema
distinto, como os aprendentes chineses da língua europeia. A questão de haver ou não
dúvidas em relação aos lemas também deve ser decidida pelos utentes, em vez de pelo
lexicógrafo. No caso dos aprendentes chineses da língua portuguesa, os resultados do
questionário realizado no presente trabalho também demonstram se os aprendentes
realmente precisam da indicação da classe gramatical dos lemas.
Informações flexionais e sintáticas
Como Welker (2004: 115) afirmou na sua obra, para além da classe gramatical,
costumam ser incluídas na cabeça do verbete as informações flexionais, dependendo do
idioma. Os dicionários da língua inglesa costumam indicar as formas irregulares dos
verbos e dos plurais. No caso dos seus homólogos da língua portuguesa, o Dicionário da
Língua Portuguesa da Porto Editora não apresentou nenhumas informações flexionais
nos verbetes, enquanto no Dicionário Priberam se indica a forma feminina irregular dos
substantivos.
No que diz respeito às informações sintáticas, segundo Zöfgen (1994: 147), citado
por Hausmann (1977: 70) e Welker (2004: 137), existe nos dicionários “a dimensão
sintagmática a quatro níveis”: as “informações sobre a construção/sintaxe”; colocações;
“combinações lexicais fixas”, geralmente lematizadas; “exemplificações em forma de
frases ou [partes de frases]”. Sendo essa primeira pertencente à cabeça de verbete, o
presente subcapítulo focar-se-á na mesma, deixando as outras três dimensões para os
subcapítulos posteriores. Welker (ibid.) apontou um fenómeno na área lexicográfica de
20
que os dicionários costumavam e continuam a apresentar as informações relativas à
maneira de formar “sintagmas e frases com o lema” exclusivamente a respeito aos verbos,
os quais, via de regra, se limitam à indicação da subclasse do verbo, se é “transitivo direto,
transitivo indireto, intransitivo ou pronominal”, sem esclarecimentos explícitos acerca de,
por exemplo, as preposições requeridas, que apenas se manifestam nos exemplos
apresentados (se existirem).
Tais afirmações ainda podem ser constatadas no DPLP e na versão impressa do DLP
da Porto Editora. No primeiro não existe nenhum esclarecimento em relação aos factos
sintáticos, enquanto o segundo os apresenta nos exemplos. Felizmente, no formato digital
do dicionário da Porto Editora, foi acrescida no final do verbete a nota sobre regências
que se chama “Como usar o verbo”, em que se indicam, de forma explícita, as preposições
requeridas pelo verbo e os respetivos exemplos.
Etimologia
As informações sobre a etimologia, que contam a origem, a maneira de ser formado
e a evolução de um lema, constam normalmente nos dicionários monolingues, “sobretudo
os mais extensos” (Svensén, 2009: 331; Welker, 2004: 116). Tais tipos de informações,
em geral, compreendem a datação do lema, formas dos étimos, ou melhor, as palavras-
fontes, significado dos étimos e palavras contemporâneas relacionadas com o lema
(Svensén, 2009). No caso dos dicionários da língua portuguesa mais procurados de
Portugal, o DPLP e o DLP, contêm a forma do étimo e/ou o significado do étimo, como
no exemplo do lema “definir”, onde são apresentados no primeiro “latim definio7, -ire” e
“Do latim definīre8, «idem»” no último. Na opinião de Svensén (ibid.: 334), por sua vez,
a presença das informações etimológicas nos dicionários de L2 vão expor os utentes
estrangeiros a enormes riscos de conhecer as ideias erradas sobre o significado atual dos
lemas. Welker (2004), tendo revisado as pesquisas anteriores, também revelou que essas
informações foram as menos procuradas, assim sendo, concordamos com a ideia de que
7 Forma de infinitivo presente.
8 Forma infinitiva.
21
as mesmas não são sempre necessárias na grande maioria dos dicionários.
Marcas de uso
Como Svensén (2009: 315) explica, “marking”, ou o termo mais específico,
“disasystematic marking”, refere-se a que um determinado item léxico se desvia num
certo aspeto dos principais itens descritos num dicionário, com o seu uso sujeito a certa
restrição. Num dicionário, a marcação de um item lexical é realizada por meio dos
“rótulos”, ou mais precisamente, as chamadas marcas de uso em português (Strehler,
1998). Segundo Correia (2009: 59), as mesmas podem-se debruçar sobre a variação
geográfica, temporal e social. Tomando a língua portuguesa como exemplo, a primeira
resulta da marcação nos dicionários dos usos específicos em um país lusófonode língua
portuguesa, como “brasileirismos” e “angolanismos”, bem como dos usos próprios de
uma determinada região de um país. Na variação temporal foi realizada a marcação dos
lemas ou aceções obsoletos, arcaicos ou neológicos, enquanto as marcas de variação
social e de registo dizem respeito às “palavras e aceções próprias de registos considerados
desviantes da norma-padrão”, que são, de preferência, evitados nas comunicações formais.
De acordo com Svensén (2009: 315), o sistema de “labelling”, ou marcação, de um
dicionário é composto por várias “microestruturas”, que se relacionam, respetivamente,
com uma determinada categoria das caraterísticas dos itens léxicos. O autor (ibid.), bem
como Welker (2004), organizou também a classificação de marcas sugerida por
Hausmann (1989), que, com base nos termos correntes na linguística, a saber, diacrónico,
diatópico, diastrático e diafásico, criara vários adjetivos específicos para a área
metalexicográfica, como as seguintes:
22
Critério Tipo de marcas Periferia marcada Exemplos de marcas
Tempo diacrónicas Arcaísmo - neologismo antigo, envelhecido,
neologismo
Local diatópicas Regionalismo, dialeto Brasil: Nordeste,
Angola,
Nacionalidade diaintegrativas Estrangeirismos latim, francês
Médio diamediais Linguagem oral e escrita coloquial
Sociocultural diastráticas Socioleto chulo, familiar, calão,
popular
Formalidade diafásicas Formal - Informal informal, formal
Tipologia de
textos
diatextuais Poético, literário,
jornalístico
poético, literário,
jornalístico
Tecnicidade diatécnicas Linguagem técnica Medicina, Biologia,
Militar
Frequência diafrequentes Raro raro, ocasional
Atitude diaevaluativas Conotado pejorativo, eufemismo
Normalidade dianormativas Incorreto non-standard
Tabela 1 - Marcas diassistemáticas num dicionário contemporâneo para fins gerais
Fontes: Hausmann (1989); Welker (2004); Svensén (2009); Dicionário Priberam da
Língua Portuguesa; Dicionário da Língua Portuguesa
Como a tabela apresenta, as marcas diacrónicas destinam-se a assinalar os lemas
obsoletos ou neológicos, enquanto as diatópicas foram aplicadas às aceções utilizadas em
determinada região ou país. As diaintegrativas, evidentemente, dedicam-se aos
estrangeirismos. As diamediais, diastráticas e diafásicas estão relacionadas com os
contextos de uso da linguagem, designadamente oral e escrito, com os socioletos e com
as formal e informal. As diatextuais ou diatécnicas surgem em lemas ou aceções restritas
a um género textual ou a uma linguagem técnica. As marcas diafrequentes, obviamente,
assinalam os lemas raros. As diaevaluativas apresentam a atitude do falante ao utilizar
uma determinada palavra, ao passo que os seus homólogos dianormativos indicam o uso
23
inadequado de uma aceção segundo as normas da língua-padrão (Welker, 2004: 131).
De acordo com Svensén (2009: 317), as marcas objetivam, por um lado, fornecer as
informações sobre um item léxico, por outro, diferenciar, através desse fornecimento, o
item referido dos outros da mesma natureza, de forma a dirigir os utilizadores às
informações que procuram no dicionário. Welker (2004: 134) também destacou a
importância das marcas tanto na produção de textos como na receção, pelo seu contributo
para os aprendentes para “uma compreensão exata do texto”. Tomando em conta os seus
benefícios, o autor também sugeriu a inclusão na introdução de uma explicação mais
detalhada em torno dessas notas, para os utilizadores tirarem melhor partido das mesmas.
1.1.3.2. Definição
De acordo com Imbs (1960: 9), citado por Welker (2004: 117), a “arte suprema, em
lexicografia, é a da definição”. Para o autor francês, a mesma não visa, de qualquer modo,
ser sinónimo de objetividade, com a única intenção de traduzir o que “a palavra sugere à
mente”, acerca de um dado “objeto”, “num dado ambiente histórico” (Imbs, 1960: 10,
apud Welker, 2004: 118).
Welker (2004), tendo resumido os trabalhos anteriores, classificou a mesma na
definição lexicográfica, enciclopédica e, na área de terminografia, a terminológica.
A espécie enciclopédica, como a denominação demonstra, existe nas enciclopédias
ou em verbetes da mesma natureza de alguns dicionários, geralmente dos dicionários
monolingues (ibid; Svensén, 2009). Silva (2003: 38) definiu a mesma como um “resumo
de conhecimentos”, descrevendo que tanto a referida como o seu homólogo terminológico,
são, em princípio, compostos por uma frase, uma perífrase, uma enumeração ou um
sintagma, com base nas “regras sintáticas e gramaticais da língua”. Silva (2003) também
citou as observações de Cabré (1993: 313), em que se constatou frases com longas e
exaustivas descrições a respeito do objeto definido nos artigos enciclopédicos.
No caso da definição terminológica, Couto resumiu (2003: 16) que a mesma tem por
objeto o termo que pertence a uma linguagem especializada de um dado domínio e que
24
tem por função “identificar e classificar o conceito dentro do sistema conceptual do qual
faz parte”. Tal definição existe, em geral, nos glossários e dicionários especializados de
um domínio específico.
A definição lexicográfica, o foco do presente subcapítulo, por sua vez, tem por objeto
“a palavra ou signo linguístico da linguagem geral”, com a finalidade de explicar os
significados para discriminar o sentido de um lema e o seu uso numa língua (ibid.).
Correia (2009: 55) acrescentou que a definição lexicográfica pode ser apresentada por
meio de perífrases, explicitações ou os seus sinónimos. Combinando as classificações de
Welker (2004) e Svensén (2009) a respeito à definição, o presente subcapítulo será
apresentado em torno dos dois tipos principais: a “lógica”, “analítica” ou “aristotélica”, e
a definição por sinónimos.
A primeira, também chamada a definição intensional por Svensén (2009), foi
considerada como o tipo mais prestigioso da definição por Béjoint (2000: 198), a qual se
refere ao conteúdo dos lemas. O processo de tal definição envolve dois termos latinos:
genus proximum (género próximo) e differentia specifica (diferença específica), que
designam, respetivamente, a classe que contém o definiendum 9 como um dos seus
elementos, e as caraterísticas distintivas que diferenciam o definiendum dos outros
elementos na mesma classe. A definição deve abranger tantas caraterísticas distintivas
quantas forem necessárias para delimitar o conceito dos seus homólogos da mesma classe
(Svensén, 2009: 219). Welker (2004: 118) tomou o lema “cadeira” como exemplo para
melhor esclarecer os termos, nesse caso, o seu genus proximum é móvel, enquanto nas
differentiae specificae se apresentam “para sentar-se”, “com encosto”, “para uma pessoa”,
entre outras.
Svensén (2009) salientou ainda o caso dos lemas de um domínio especializado,
como os da biologia, uma vez que as definições nos dicionários, geralmente monolingues,
têm por função descrever a língua em vez de classificar o mundo; para evitar uma
9 Em latim, significa “o que deve ser definido”. Paralelamente existe outro termo, “definiens”, que designa aquilo que
define
25
definição tão exaustiva como na enciclopédia, na mesma estão apresentados apenas o
genus proximum junto com uma ou duas differentiae specificae, como os seguintes
exemplos retirados do Longman Dictionary of Contemporary English (5ª edição):
longhorn (…) noun [countable] a cow with long horns10
canasta (…) noun [uncountable] (…) a card game
Svensén, bem como Béjoint (2000), propuseram ainda um outro tipo de definição, a
chamada definição extensional, que se foca no âmbito dos lemas. Tais definições são
menos comuns nos dicionários da língua para fins gerais e são constituídas normalmente
pela enumeração de todos os conceitos que podem ser incluídos no definiendum, como o
seguinte exemplo levantado por Svensén (2009: 221):
motor vehicle n. car or motorcycle or moped or van or …
Comparando com o mesmo verbete no Longman Dictionary of Contemporary
English: “motor vehicle noun [countable] formal any vehicle which has an engine, such
as a car, bus, or truck”, parece que essa enumeração não é sempre necessária visto que
existe um modo mais simplificado de definição. Béjoint (2000) também salientou que o
tipo extensional ou outros tipos apenas seriam precisos no momento em que a definição
analítica não funcionasse.
Um outro tipo de definição, a “definição por sinónimos”, referida por Svensén
(2009), foca-se no aspeto da expressão dos signos e aplica a forma de uma paráfrase da
designação (ibid.: 214). A sinonímia, segundo o autor, compreende três aspetos: o
significado denotativo, o conotativo e as caraterísticas pragmáticas. O primeiro é
considerado como o significado “real”, ou melhor, de natureza objetiva e cognitiva. Os
significados secundários, designadamente, os subjetivos e emotivos, são conhecidos
como os conotativos. As caraterísticas pragmáticas, por seu turno, estão relacionadas com
o estado de uma palavra como pertencente a uma linguagem geral ou técnica e as suas
ocorrências nos diferentes níveis de estilo. A sinonímia completa vai ser realizada quando
duas palavras se equivalem em todos os três aspetos, a qual, contudo, ocorre usualmente
10 Para simplificar, dos verbetes foram omitidas as transcrições fonéticas e informações etimológicas.
26
apenas na terminologia técnica. Assim sendo, aplica-se, via de regra, os sinónimos em
conjunto com os “near synonyms” (quase sinónimos), que se referem à equivalência a
nível denotativo das duas palavras (ibid.). Tal resolução é mais económica, estando válida
quando as exigências para a precisão semântica não são grandes. No caso dos sinónimos
polissémicos, todavia, estes não podem substituir a definição toda, sendo sujeitos à
desambiguação (ibid., 215). Por tais razões, Imbs (1960: 13), citado por Welker (2004:
118), criticou o modo de definição por sinonímia por ser “o menos científico possível”,
dando com facilidade em pseudodefinições que “estabelecem um círculo vicioso”.
Além dos referidos, em 1987 foi publicado o Collins COBUILD English Language
Dictionary (adiante designado por Dicionário COBUILD), em que se adotou uma
maneira distinta para a disposição das definições. Nessa obra, as definições foram
construídas como uma frase completa, visando apresentar as mesmas por meio da oração
ordinária, no intuito de simplificar e tornar mais compreensíveis as definições para que
os utilizadores possam aplicar os lemas com facilidade (Svensén, 2009: 235). Foram
extraídas partes dos verbetes do Dicionário COBUILD11 e do Longman Dictionary para
melhor demonstrar as diferenças.
defeat 1.verb If you defeat someone, you win a victory over them in a
battle, game, or contest. (…) (COBUILD)
defeat verb [transitive] 1. to win a victory over someone in a war,
competition, game, etc. (…) (Longman Dictionary)
home 1. countable noun Someone's home is the house or flat where they
live. (…) (COBUILD)
home noun 1. PLACE WHERE YOU LIVE [uncountable and countable]
the house, apartment, or place where you live (…) (Longman Dictionary)
Svensén (2009: 236) tomou atitudes positivas em relação ao modo de definir no
Dicionário COBUILD, concluindo que as mesmas servem tanto para a produção como a
receção, considerando a sua inclusão das informações contextualizadas sobre o lema e o
11 Os verbetes do COBUILD foram extraídos da página oficial do dicionário online da Collins.
27
facto de que o lema é definido como no seu uso real. Rundell (1999), em contrapartida,
não considerou a mesma como a melhor solução, defendendo que mais pesquisas sobre
as necessidades dos utilizadores seriam indispensáveis para verificar o valor prático dos
vários estilos de definição. Zöfgen (1994: 139), citado por Welker (2004: 124), criticou o
volume excessivo das definições e a “repetição de palavras desnecessárias”. Apesar das
suas deficiências do ponto de vista lexicográfico, o sucesso do Dicionário COBUILD a
nível internacional evidenciou que tais definições são apreciadas por um número
considerável dos utilizadores do dicionário, sendo benéficas à sua aprendizagem ou uso
da língua.
1.1.3.3. Colocações
O que são colocações? Falando da abordagem orientada por corpora, Jones &
Sinclair (1994: 16), citados por W elker (2004: 140), explicitaram as mesmas como
“coocorrência regular de itens lexicais”. Svensén (2009: 159), resumindo dos trabalhos
de Sinclair (1991: 109-21), considerou as colocações como o fenómeno estatístico que se
baseia nas coocorrências das palavras em texto autêntico. Sinclair (1998: 15) acrescentou
posteriormente que a colocação é a coocorrência de palavras com, no máximo, quatro
palavras intervenientes. Nas definições do autor inglês, as colocações são compostas por
um nó (node), que designa a palavra que está a ser estudada, e um colocado (collocate),
que se trata de qualquer palavra que apareça nas circunstâncias específicas de um nó”
(ibid., 1991: 115). A respeito desse conceito, Svensén (2009: 160) elucidou que as
palavras que formam uma colocação não precisam de ser sempre adjacentes mutuamente.
No caso da colocação inglesa “make a decision”, por exemplo, pode-se dizer como “The
decision to use the atomic bomb was made by President Truman”. Para o autor (ibid.),
cada grupo de palavras que coocorre mais frequentemente do que por acaso é considerado
como uma colocação.
Apesar do referido, Svensén (ibid) apontou também que tal abordagem de definir
colocação é problemática, pelo que a dependência demasiada na frequência resultaria na
28
inclusão das combinações das palavras com alta frequência mas malformadas, como “you
and”. Justificou ainda que, mesmo que as combinações referidas sejam eliminadas por
meio do chamado “filtro gramatical”, sobrariam também as combinações frequentes e
bem-formadas, mas desnecessárias, como o caso de “hotel” enquanto nódulo: “a hotel,
my hotel, left the hotel, went to my hotel” (apud. Hausmann, 2004: 319). Nessa maneira,
segundo Svensén (ibid.), seriam ignoradas, pelas perspetivas do sistema linguístico, um
grande número das combinações de palavras relevantes com baixa frequência da
ocorrência.
Hausmann (1977, 1984, 1989), citado por Welker (2004: 141), propôs uma definição
diferente, resumindo que as colocações são as coocorrências de “palavras com
combinabilidade limitada, de combinações afins, de produtos semi-cristalizados que o
falante não monta de forma criativa, mas encontra na sua memória como um todo e que
o ouvinte percebe como algo conhecido” (Hausmann, 1984: 399), de “combinações
binárias típicas, específicas e caraterísticas”. Nessa conceção, salientou-se que é através
da competência dos falantes nativos que dominam bem a sua língua materna, em vez da
análise de frequência, que se decide se uma combinação é considerada como uma
colocação afinal. Por outras palavras, os colocados são aqueles “parceiros” que surgem
logo à mente dos falantes nativos ao ouvirem ou pensarem numa palavra (Welker, 2004:
141).
Não obstante o mencionado, às vezes, ainda é possível estar confuso com as
combinações livres e as colocações. Svensén (2009: 161) enumerou dois exemplos para
esclarecer a diferença. Por um lado, as combinações livres são como as expressões “buy
a book” e “red car”, cujos componentes podem ser substituídos por inúmeros lemas,
sendo que nenhum elemento se restringe à combinabilidade. Tais combinações ainda se
caraterizam pela previsibilidade dos seus componentes, que são palavras que podem ser
definidas e entendidas independentemente. O conceito das colocações, por outro, pode
ser demonstrado pela expressão “make a decision”, que não é banal do ponto de vista
semântico, pelo que a palavra “decision” está sujeita à combinabilidade quando o falante
29
pretende expressar, com verbos, que se toma uma decisão. Em suma, pelo menos um dos
componentes da colocação tem restrições de combinabilidade e possui a natureza
previsível de certo modo. Ao contrário do que acontece às combinações livres, nas
colocações geralmente existe pelo menos um componente entendível, enquanto a parte
restante seria definida somente através do seu parceiro colocacional.
Acerca da estrutura das colocações, Hausmann (1985), citado por Welker (ibid.: 142),
dividiu a colocação em base e colocado, sendo que “a base é aquela parte que é qualificada
ou detalhada pelo colocado” (Zöfgen: 1994: 164, apud Welker, ibid.). Benson (1985),
citado por Svensén (2009: 164), classificou as colocações em duas categorias: a colocação
lexical e a colocação gramatical. A primeira, como já se abordou anteriormente, é
representada por grupos de palavras que coocorrem com mais frequência, como “make a
decision”, “temperatures fall” e “deep sorrow”. A última, por seu turno, designa aquelas
combinações compostas por uma palavra de conteúdo dominante, nomeadamente, verbos,
substantivos e adjetivos, e uma palavra funcional, geralmente a preposição, como
“interested in” e “capable of”. Embora a última seja considerada mais como instâncias de
valência por Svensén (ibid.), emprega-se a classificação de Benson no presente trabalho
para efeitos de investigação nos capítulos posteriores.
Abordando a questão da inclusão das colocações no dicionário, em vários trabalhos
de Hausmann, citado por Welker (2004: 142), realçou-se que é nos verbetes das bases que
as colocações deviam ser registadas, pelo que aqueles que consultam o dicionário para a
produção de texto, tomando a colocação “chover torrencialmente” como um exemplo,
têm dúvidas em relação a como descrevem a chuva. No caso da receção, contudo, segundo
Hausmann (1985: 121), citado por Welker (ibid.), em princípio é o colocado que provoca
a consulta, como o “torrencialmente” na expressão referida, nesse modo,
preferencialmente deve registar-se a colocação no verbete do colocado. Em resumo, é
aconselhável incluir a colocação nos verbetes de ambas as partes, como Haussman
sugeriu, em particular para os dicionários monolingues, que são benéficos para a receção
e a produção de textos. Nos dicionários impressos, dados os limites de volume e motivos
30
económicos, não seria realizável incluir todas as colocações relevantes em ambos os
verbetes, o que, todavia, pode ser concretizado, de certa forma, nos dicionários eletrónicos,
em que podem registar-se, com base no princípio da frequência, as colocações que
consideram pertinentes para satisfazer as necessidades dos utilizadores.
1.1.3.4. Expressões idiomáticas
As expressões idiomáticas, ou idioms em inglês, segundo Svensén (2009: 188), são
as combinações (relativamente) fixas de palavras, cujos significados não equivalem à
soma simples de todos os seus componentes, ou seja, não é possível inferir o significado
de uma expressão idiomática através das palavras que a formam. Tal caraterística revela
que as expressões possuem um significado metafórico, distinguindo-se, assim, das
colocações e combinações livres (ibid.: 189).
Apesar da sua diferença das outras espécies das expressões, Hundt (1994: 213),
citado por Welker (2004: 167), observou que, em muitos dicionários da língua portuguesa,
não se constatou um critério específico de registo, pelo que as expressões idiomáticas e
os provérbios estão misturados com as combinações fixas, locuções pragmáticas e o
“léxico de línguas de especialidade”. Do ponto de vista lexicográfico, tal disposição não
está nítida nem organizada cientificamente. Ponderando as perspetivas dos aprendentes
de uma língua estrangeira, sobretudo os de proficiência elementar, a mistura talvez não
influencie a consulta pelo que estes possivelmente têm dificuldades em distinguir as
expressões idiomáticas das combinações fixas e locuções pragmáticas. O que torna a
consulta mais eficaz, porventura, é a ordenação alfabética das expressões e combinações,
que prevalece na maioria dos dicionários da língua portuguesa. Schemann (1979), citado
por Welker (ibid.), no seu dicionário de idiomatismos, com base no alfabetismo, agrupou
as expressões idiomáticas da mesma palavra conforme as suas classes gramaticais. Tal
ordenação foi também ajustada e aplicada posteriormente. Contudo, Welker (ibid.: 167)
confessou também que o essencial é que haja uma ordem que atua no dicionário todo de
forma que os utilizadores possam localizar as expressões eficientemente.
31
A fixidez das expressões idiomáticas, aliás, também é relativa, sendo explicado por
vários tipos de variantes nas mesmas. Alvarez (2000: 87), no seu trabalho de
doutoramento, classificou as variantes em três tipos: as morfológicas, que indicam a
mudança da forma através da omissão ou inclusão de elementos gramaticais, como “pedir
a (minha) mão”12; as lexicais, com um lema trocado, sem alterar o sentido e estrutura da
expressão, como “vender/dar gato por lebre13”; e as por extensão, que resultam da adição
ou omissão dos itens lexicais, como em “ter os pés (bem assentes) na terra14 ”. Um
dicionário perfeito, na opinião de Welker (ibid.: 170), deve assinalar as possibilidades de
transformação para informar os consulentes, mas confessou também que isso é quase
inviável.
Não obstante o referido, Welker, citando o próprio trabalho em alemão (2003: 129),
sumarizou quatro regras em relação à apresentação das expressões idiomáticas: i. utiliza-
se o infinitivo apenas no caso de que o verbo pode ser conjugado sem limites; ii. deve-se
indicar caso o verbo de uma expressão exista somente em determinado tempo; iii. não se
pode registar uma expressão com infinitivo se o sujeito da expressão for um lema
específico15; iv. as expressões que existem somente em certa forma verbal apenas podem
ser registadas nessa forma.
A par do exposto, Welker (2004) apontou ainda o facto de que os utilizadores podem
ter dificuldades em identificar por onde começa uma expressão idiomática. Para as
expressões “de olhos fechados16” e “não dar uma para a caixa17”, por exemplo, é possível
que achem que estão corretas como “olhos fechados” e “dar uma para a caixa”. A solução
que o autor brasileiro e Burger (1998) sugeriram é a indicação do sujeito e/ou os
complementos, nomeadamente, os objetos obrigatórios ou opcionais, como as seguintes
12 As três expressões apresentadas foram retiradas do site do Dicionário infopédia da Língua Portuguesa. De acordo
com a fonte, “pedir a mão de” significa “pedir em casamento”.
13 Significa “enganar, dando ou vendendo o mau como se fosse bom”.
14 Significa “ser realista, ser objetivo”.
15 Deve-se indicar as possibilidades de um verbo ser aplicado em vários tempos.
16 Significa “sem necessidade de reflexão”.
17 Significa “dizer ou fazer tudo ao contrário”.
32
formas: ter (algo ou alguém) na mão, dar (algo) a conhecer (a alguém).
Os padrões das definições do Dicionário COBUILD, por sua vez, como Landau
(2001) apresenta, são, de certo modo, adequados para apresentar as expressões
idiomáticas, os quais mostram, ao mesmo tempo, a valência sintática e variantes das
expressões, como os seguintes exemplos:
stand/turn sth. on it's head
If you stand an idea or argument on its head or turn it on its head, you think about
it or treat it in a completely new and different way.
test the water
If you test the water or test the waters, you try to find out what reaction an action
or idea will get before you do it or tell it to people.
1.1.3.5. Exemplos
O termo exemplo, segundo Jacobsen (1991), em sentido amplo, refere-se às
expressões idiomáticas, colocações e outros tipos de sintagmas, visto que todos estes
servem para exemplificar o uso dos lemas. Welker (2004: 150), citando Hausmann (1977)
e Zöfgen (1994), delimitou os exemplos a “frases ou enunciados”, e defendeu que,
considerado o facto de que possuem as próprias designações, as colocações e expressões
idiomáticas, não vale a pena incluir as mesmas no âmbito do termo exemplo, definindo o
mesmo como “frase ou trecho de frase que serve para exemplificar”. Correia (2009: 61)
fez uma explicitação mais detalhada, definindo os exemplos de uso como frases
construídas pelo lexicógrafo ou excertos dos textos das espécies diversas, que
representam os vários “registos linguísticos” que se constituem o corpus que esse
dicionário tem como base. No presente trabalho, no intuito de proceder à investigação de
forma mais precisa para os respondentes chineses, empregar-se-á a definição da Correia.
Welker (2004: 150), na sua obra, enumerou três tipos de exemplos: o autêntico,
adaptado e construído. O primeiro, segundo o autor brasileiro, é sinónimo às abonações,
que se tratam da frase ou excerto extraído dos textos autênticos, como os das obras dos
“bons autores”, jornalísticos e científicos. Em torno de tal espécie, as opiniões variam-se
33
significativamente. Segundo Svensén (2009: 284), os adeptos defenderam que, se um
dicionário se basear num corpus, não faz sentido inventar exemplos com base nele, pelo
que um corpus de volume considerável permite encontrar os bons exemplos para a
maioria dos lemas, mesmo os menos frequentes. Ao parecer de Martin (1989: 600), citado
por Welker (2004: 151), os exemplos autênticos trazem marcas históricas e ideológicas,
levando a que o conteúdo seria apenas acessível àqueles equipados dos conhecimentos
relevantes. Svensén (2009: 284) também apontou o facto de que os exemplos autênticos
são menos úteis para os aprendentes do nível elementar de uma língua, que podem ter
dificuldades em compreender os materiais autênticos.
Fox (1987: 148), todavia, considera que quaisquer alterações para tornar o exemplo
mais compreensível e regular, mesmo as modificações nos tempos e a substituição de uma
palavra pela outra, podem destruir a sua sensação e autenticidade, dando falsa impressão
aos utilizadores. Para a lexicógrafa, os exemplos autênticos são não só corretos
gramaticalmente, como também apropriados conforme a situação, sendo que são
utilizados na situação real. Em contrapartida, os exemplos inventados, talvez, não
consigam ilustrar o uso mais típico de um lema e parecem, às vezes, estranhos, não
pertencendo a um ato comunicativo. Em resposta ao referido, Laufer (1992) argumentou
que qualquer lexicógrafo que seja falante nativo educado possui competências
linguísticas corretas sobre a própria língua materna e a sua gramática, bem como o uso e
contexto típicos de um lema. O teste que Laufer (ibid.) procedeu em relação ao valor
pedagógico do exemplo autêntico e do construído também evidenciou que os construídos
foram mais benéficos tanto à compreensão como à produção das palavras novas para os
alunos.
Os exemplos adaptados, versões modificadas dos exemplos autênticos, foram
preferidos aos inventados por Welker (2004: 156), pelo que os lexicógrafos podem correr
o risco de errar, como apresentar frases contendo a aceção obsoleta de um lema. Para
evitar tal tipo de erros, o autor brasileiro sugeriu que, ao inventar um exemplo, consultasse
o mesmo num corpus para confirmar se tal frase ou enunciado ocorre na vida real de
34
maneira semelhante, com exceção dos lemas e as aceções mais comuns, uma vez que
estes surgem logo à mente do lexicógrafo, como um membro de uma sociedade linguística.
No que diz respeito à necessidade de inclusão dos exemplos nos verbetes, Welker
(2004: 154) opinou que o uso correto deve ser ilustrado através das colocações
gramaticais e lexicais; assim sendo, atribuiu os exemplos a “um terceiro elemento de
auxílio na produção de texto”, considerando indispensáveis as colocações gramaticais e,
de grande importância, as lexicais. Portanto, os exemplos não são sempre necessários no
caso de coexistência desses dois tipos de colocações. Tais afirmações, todavia,
possivelmente não levam em conta os utilizadores não nativos. Como Correia (2009: 62)
abordou, os exemplos, de facto, são indispensáveis nos dicionários de produção, sendo
explicado pela sua inclusão das informações essenciais para os utilizadores para fins
pedagógicos, a saber, “a estrutura argumental da entrada, regências a que está sujeita,
coocorrentes típico e informação de carácter cultural”. No caso dos verbos, por exemplo,
mesmo que exista colocações que indicam a preposição com que se deve combinar, um
exemplo na frase preposicional serve melhor para apresentar o uso correto e contexto de
emprego desse verbo. Welker (2004: 160) também admitiu que, como as marcas apenas
indicam os registos de forma geral, os exemplos ainda são valorizados pela ilustração dos
contextos em que um lema está empregado. No caso dos aprendentes chineses da língua
portuguesa, o resultado da pesquisa nos capítulos posteriores também demonstrará se os
exemplos são procurados numa consulta.
1.1.4 Medioestrutura
Para além de macroestrutura e microestrutura, num dicionário, ainda existe a
chamada medioestrutura, também denominada como remissões (Welker, 2004: 177),
referências cruzadas18 ou estrutura de referências cruzadas19, que se relacionam com os
indicadores, geralmente palavras ou símbolos, que permitem aos utilizadores do
18 Em inglês “cross-reference”.
19 Em inglês “cross-reference structure”.
35
dicionário localizarem os materiais espalhados por diferentes componentes, ou fora do
dicionário, no intuito de facilitar o acesso às informações relevantes (Hartmann & James,
2002: 32).
Welker (2004: 178), citando Sousa (1995: 301), apontou que a principal função das
referências cruzadas é “evitar repetições”. De acordo com Svensén (2009: 389), nos
dicionários impressos, as remissões têm como função economizar espaço, uma vez que,
nos casos dos itens multi-lexicais, colocações e expressões idiomáticas, não é possível
registar os mesmos nos verbetes de todos os componentes intervenientes, assim sendo, a
solução comum é a registação das expressões ou itens no verbete da palavra de base, ou
daquela mais “pesada” semanticamente, adicionando remissões nos outros.
As referências cruzadas também ajudam no reforço da relação semântica dos
dicionários, normalmente aqueles para fins gerais, com a macroestrutura alfabética,
considerando que com essa estrutura se torna oculta a vinculação semântica entre os lemas.
O reforço geralmente é realizado por meios do acesso aos itens semanticamente relativos,
como os sinónimos, antónimos e hiperónimos (ibid.).
As remissões, em princípio, são apresentadas através de uma seta, ou palavras como
“see” em inglês e formas diversas do verbo - “ver”, “veja”- ou simplesmente “v.” e “cf.”.
(Welker, 2004; Svensén, 2009). Debruçando-se sobre as suas posições, segundo Wiegand
(1996: 25), citado por Welker (ibid.: 178), as remissões dentro de um dicionário podem
aparecer no verbete, no índice, “numa inserção dentro da macroestrutura”, como a
remissão dos lemas iniciados da letra “Y” aos outros iniciais no caso de português, nos
textos externos, como as remissões para exemplificações na introdução ou no resumo de
gramática do dicionário, e em ilustrações, em que se indica números para remeter aos
lemas representados por determinada imagem. Para as referências cruzadas nos verbetes,
ocorre geralmente em situações como a remissão de um lema raro ao seu sinónimo ou
variante ortográfica mais frequente, a de um lema flexionado à sua forma canónica e no
caso de que o lema apenas existe enquanto parte de um item lexical complexo.
Na obra de Svensén (2009: 390-92), as referências cruzadas foram classificadas em
36
duas formas: a explícita e a implícita. A primeira inclui o indicador que declara a presença
da remissão, como uma seta e verbo “ver”, e a especificação do “endereço” da remissão,
geralmente salientado através das formas itálico ou negrito. As remissões aos sinónimos
e à forma canónica de um lema flexionado são consideradas como a espécie implícita.
Welker (2004: 180) até opinou que “toda palavra empregada na definição implica uma
remissão para o lema daquela palavra”, sendo que os utilizadores têm de consultar as
palavras desconhecidas nela.
1.2 Tipos de dicionários de língua
No mundo da lexicografia, as classificações dos dicionários são diversificadas. Nos
aspetos do formato, existe dicionário em papel e dicionário eletrónico, com o último ainda
especificado em dicionário online, dicionário na aplicação e dicionário em CD-ROM. Das
perspetivas do número das línguas que contêm, estão à nossa disposição os dicionários
monolingues, dicionários bilingues e dicionários multilingues. Partindo das próprias
funções, disponibiliza-se também os dicionários para fins gerais, dicionários
especializados, dicionários para aprendizes, ou até dicionários para produção, dicionários
para receção, entre outros. Como o presente trabalho tem como foco o uso dos dicionários
por parte dos aprendentes chineses, a seguir será abordado por detalhes os quatro tipos
mais populares entre os utilizadores da China, a saber, o dicionário monolingue geral, o
dicionário para aprendizes, o dicionário bilingue e o dicionário semi-bilingue.
1.2.1 Dicionário monolingue geral
De acordo com Landau (1984: 8), um dicionário monolingue, como a denominação
implica, é uma obra escrita exclusivamente em uma e mesma língua, sendo destinado
principalmente aos falantes nativos dessa língua, às vezes para aqueles que a aprendem
como uma LE/L2 também.
Um dicionário monolingue geral, por sua vez, segundo Geeraerts (1989: 293), citado
por Van Sterkenburg (2003: 3), contém no primeiro lugar os dados semasiológicos, em
37
vez dos onomasiológicos nem não-semânticos, descreve a língua padrão em vez das
variedades restritas e funciona para fins pedagógicos em vez dos críticos nem académicos.
Nas opiniões de Béjoint (2000: 40), os dicionários monolingues gerais também
possuem a natureza prototípica, pelo que:
It is the one that every household has, that everyone thinks of first when
the word dictionary is mentioned, it is the type that is most often bought,
most often consulted, the one that plays the most important role in the
society that produces it. It sells in huge numbers everywhere, and it is
also the one that metalexicographers describe most, sometimes even
exclusive.
Segundo Sterkenberg (2003: 7), apesar da afirmação sobre os dicionários modernos
de que apenas se descreviam a língua produzida de uma determinada comunidade de fala,
sem intenções prescritivas, não se pode negar que tais dicionários ainda desempenham o
papel de um “código de lei” para todos os assuntos linguísticos, como as questões sobre
se aceitam as variantes regionais, históricas ou sociais. De certa forma, os dicionários
monolingues gerais podem ser considerados como o protetor da pureza da própria língua.
O Webster’s Third New International Dictionary, antecessor do dicionário online
bem conhecido Merriam-Webster Unabridged, um dicionário monolingue geral na
lexicografia inglesa, é considerado por Landau (1984: 18) como o verdadeiro trabalho
“unabridged”, o dicionário mais integral na língua inglesa. Contendo mais de 470 000
entradas, no dicionário americano foram omitidos todos os termos que se tornaram
obsoletos até 1755, menos aqueles encontrados nas obras conhecidas dos autores
importantes, contando com citações abundantes para justificar as definições e numerosas
informações relativas ao uso típico dos lemas.
No caso do português europeu, de acordo com Correia (2009: 117), três dicionários
gerais merecem a nossa atenção. O Dicionário da Língua Portuguesa, da Porto Editora,
publicado pela primeira vez em 1952 e atualizado ultimamente em 2017, possuindo
também formatos digitais, abrange um vocabulário geral extenso e um número
considerável dos termos técnicos e especializados, com cerca de 260 000 definições,
expressões fixas e provérbios, bem como as informações etimológicas. O Dicionário da
38
Língua Portuguesa Contemporânea, apenas em versão impressa, foi publicado em 2001;
apesar da sua dimensão relativamente modesta das entradas – 70 000 -, dado ser o fruto
do projeto dicionarístico académico, Correia (ibid.: 119) considerou que foi o dicionário
com maior impacto social e que “mais destaque que mereceu na comunicação social”. E
por fim, o Grande Dicionário da Língua Portuguesa, da Porto Editora, de 2004, que
existe apenas em papel, inclui aproximadamente 130 000 entradas, sendo o maior
dicionário português a apresentar as transcrições fonéticas de todas as entradas, o que,
como se referiu nos subcapítulos anteriores, é muito raro na lexicografia portuguesa (ibid.:
120). Além do referido, cabe mencionar ainda o Dicionário Priberam da Língua
Portuguesa (DPLP), um dicionário de português contemporâneo em formato digital,
tendo com base o Novo Dicionário Lello da Língua Portuguesa, que entrou em
funcionamento ao público desde 2008. Tal como os seus homólogos impressos, o DPLP
regista não só os vocabulários gerais, mas também os termos mais comuns das áreas
científicas e técnicas (Dicionário Priberam da Língua Portuguesa, 2008).
1.2.2 Dicionário monolingue para aprendizes
O dicionário monolingue para aprendizes, em inglês learner’s dictionary, é uma
obra para fins pedagógicos, destinada aos aprendentes de uma língua estrangeira (Svensén,
2009: 29). Segundo Welker (2004: 216), tal tipo de dicionário tem como objetivo auxiliar
o estudante de línguas estrangeiras nas diversas atividades, sobretudo na produção de
textos, em vez de se focar na aprendizagem do vocabulário.
Focando-se nos seus utilizadores, neste caso, os falantes da língua estrangeira, os
dicionários para aprendizes, como o famoso Oxford Advanced Learner’s Dictionary
(OALD), adotam uma linguagem mais simples do que os monolingues tradicionais,
contando, muitas vezes, com um número relativamente reduzido de verbetes e aceções e
mais exemplos (Humblé, 2001: 34). O autor considerou ainda tal tipo dos dicionários
como os dicionários “bilingues” universais, visto que traduzem, no caso do OALD, o
inglês difícil no inglês compreensível, independentemente da L1 dos utilizadores (ibid.).
39
Welker (2004: 219) também reiterou que, com a finalidade de auxiliar nas atividades
produtivas, os autores dos dicionários prestam atenção especial, desde o início, à
apresentação das informações sintáticas para além da regência.
Entre todos os dicionários para aprendizes existentes, os da língua inglesa são os
mais desenvolvidos e avançados, sendo explicado pela existência dos “Grande 5” (adiante
designados G5), designadamente, o Cambridge Advanced Learner’s Dictionary (CALD)
(Procter, 199520 ), o Collins Cobuild Advanced Learner’s English Dictionary (adiante
designado por CCALED) (Sinclair, 1994), o «Longman Dictionary of Contemporary
English» (LDOCE) (Summer, 1995), o Oxford Advanced Learner’s Dictionary (OALD)
(Crowther, 1995) e o Macmillan English Dictionary for Advanced Learners (MED)
(Rundell, 2002), que servem como uma ferramenta lexicográfica multifuncional para
ajudar o melhor possível um grupo-alvo em quaisquer atividades comunicativas e de
aprendizagem da LE/L2 (Swanepoel, 2003: 57; Rizo-Rodríguez, 2008). Rizo-Rodríguez
(2008), no seu trabalho, fez uma comparação detalhada em relação aos G521 em formato
de CD-ROM. Em resumo, todos os B5 baseiam-se em corpora de enorme dimensão; entre
estes, no entanto, destacam-se o MED2, CALD2 e OALD7 pelo seu registo dos
regionalismos representativos. Constatou-se também a indicação pormenorizada das
diferenças dos registos dos lemas nos outros quatro dicionários, com exceção do
CCALED5. Ambos os elementos tornam os próprios dicionários mais adequados para os
fins de decodificação. A inclusão das entradas enciclopédicas no LDOCE4 e das culturais
no OALD7 também não só possibilitou aos aprendentes o acesso ao vocabulário essencial
dessa língua, como também enriqueceu os conhecimentos relativos ao contexto cultural
(ibid.: 27). Rizo-Rodríguez também observou que os verbetes dos outros quatros
dicionários contêm um número considerável de informações extra, tais como as de
20 Os dicionários foram citados conforme as datas da publicação das suas primeiras edições.
21 No trabalho de Rizo-Rodríguez (2008), foram postos em análise os “Big 5” (B5), nomeadamente, o CALD em CD-
ROM (2ª edição, versão 2.0a, 2005) (CALD2), o CCALED em CD-ROM (5ª edição, 2006) (CCALED5), o LDOCE
em CD-ROM (4ª edição, 2005) (LDOCE4), o MED em CD-ROM (2ª edição, versão 2.0.0702, 2007) (MED2) e o
OALD em CD-ROM (7ª edição, 2005) (OALD7).
40
multimédia, os exemplos suplementares, colocações e as notas de uso e de cultura. Apesar
das informações humildes constantes no CCALED5, as definições completamente
oracionais da espécie do COBUILD podem servir como um exemplo para as explicações
dos professores durante as aulas (Herbst, 1996).
Não obstante as informações abundantes que as obras acima referidas contêm, tais
tipos de dicionários ainda têm defeitos; por exemplo, um aprendente deve ter consciência
de qual é o item lexical específico que procura. Se um aprendente pretender encontrar
uma palavra com o significado de “irritar alguém”, sem conhecimentos sobre a grafia,
não conseguirá encontrar o lema nos dicionários como os G5, dicionários organizados
alfabeticamente. Para compensar tal defeito, foi compilado o dicionário para produção
Longman Language Activator, com macroestrutura temática, organizada em torno de
cerca de mil conceitos básicos, como “accept”, “walk” e “alone”, no intuito de dirigir os
utilizadores que buscam um termo fundamental a um vasto leque de vocábulos
sofisticados ou especializados (Swanepoel, 2003: 56; Rundell: 1999: 49).
Figura 1 - Excerto do Longman Language Activator (2002, p. 15)
41
No caso da língua portuguesa, um exemplo é o Dicionário de Português Básico, da
Edições ASA, publicado em 1990, que tem como público-alvo aqueles que têm o
português como língua de comunicação. Foi também um dos poucos dicionários
portugueses que apresentaram não só informações sintáticas, como também exemplos,
mesmo que, dados os limites do volume, apenas os lemas mais comuns estejam equipados
com tais informações. A dimensão humilde – por volta de 3 000 entradas –, contudo,
também o impediu de ser um dicionário de aprendizagem para um vasto público.
1.2.3 Dicionário bilingue
Os dicionários bilingues, como o termo indica, são aqueles que contêm duas línguas-
objeto, uma dos quais, na maioria das vezes, é idêntica à língua materna dos utilizadores
(Svensén, 2009: 12).
De acordo com Hausmann (1994: 12), citado por Welker (2004: 200), os dicionários
deste tipo podem dispor das duas direções, sendo denominados dicionários bidirecionais,
que servem aos falantes de ambas as línguas, como o Dicionário Académico de Chinês-
Português / Português-Chinês (2017), da Porto Editora. Um dicionário com apenas uma
direção, ou um dicionário monodirecional, destina-se aos falantes de apenas um idioma,
como o Dicionário Editora de Português-Espanhol (2010), também da Porto Editora.
Partindo das próprias funções, Wiegand (1996: 529), citado por Welker (2004: 200), ainda
classificou os dicionários em dois tipos: um monofuncional, que desempenha apenas uma
função, e um polifuncional, ou multifuncional, equipado com várias funções. Esse
primeiro ainda pode ser especificado com base nas intenções do dicionário. Se for um
dicionário ativo, ou seja, uma obra referencial para produção, seria um dicionário
monofuncional de L1 a L2. No caso de um dicionário passivo, que se destina à receção,
seria monofuncional de L2 a L1 (Kromann et al, 1991: 2719). Os princípios de ativo-
passivo possibilitam nos dicionários as descrições gramaticais específicas para os
utilizadores, bem como as notas de que estes necessitam escritas na sua própria língua
(ibid.: 2720).
42
Varantola (2002), na sua pesquisa, constatou a preferência pelos dicionários
bilingues por parte dos aprendentes. Lew & Adamska-Salaciak (2015: 50) atribuíram tal
preferência à satisfação, por parte das obras bilingues, das necessidades básicas dos
aprendentes – relacionar as informações novas, neste caso da língua que aprendem, com
aquelas de que já tomaram conhecimentos, ou seja, na L1.
Figura 2 - Excerto do Longman Dictionary of Contemporary English (English·Chinese) (5ª Edição)
(2014) (pp. 472)
Tal conclusão também foi comprovada pelo mercado a nível internacional, sendo
que o sucesso do G5 resultou no nascimento dos seus descendentes bilingues, traduzidos
em várias línguas principais do mundo, ocupando sobretudo o mercado dos dicionários
na China. Os dicionários bilingues para aprendizes como o Oxford Advanced Learner’s
English-Chinese Dictionary (1997), o Collins Advanced Learner’s English-Chinese
Dictionary (2006) e o Longman Dictionary of Contemporary English (English·Chinese)
(1997), cujas edições mais recentes sempre foram publicadas pouco depois da atualização
das versões monolingues (Chen, 2011). Os dicionários bilingues para aprendizes foram
43
valorizados significativamente por Lew & Adamska-Salaciak (2015: 54), que opinam que
nenhuma obra de referência pode competir com o dicionário bilingue confecionado
especialmente para os aprendentes de uma L1 específica quando se trata de destacar
contrastes entre essa L1 e a LE/L2, como os comentários nas diferenças gramaticais,
indicação dos falsos amigos ou resumo dos erros comuns resultantes da intervenção da
L1. Nesse tipo da obra, serão viáveis também mais referências à cultura da L1, seja
através da seleção dos lemas, expressões comuns e exemplos de uso baseados nos corpora,
seja por meios das notas culturais particularmente elaborados.
Tendo como foco os aprendentes chineses da língua portuguesa, no presente trabalho
será pertinente uma apresentação dos dicionários bilingues entre chinês e português
existentes no mercado atual. A referida obra bidirecional da Porto Editora é o único
dicionário bilingue, publicado em Portugal, entre os dois idiomas. Quanto à variedade
brasileira, existe o Dicionário Prático Português-Chinês / Chinês-Português, publicado
em 2007 pela Editora Campus, que é considerado como o “primeiro dicionário brasileiro
de português e chinês”, destinando-se, contudo, aos aprendentes da língua chinesa
(Davies & Whitlam, 2007). No mercado da China, as obras lexicográficas sino-
portuguesas também não se desenvolveram tanto como aconteceu ao inglês, japonês e
francês, sendo que o dicionário bilingue mais procurado e integral no mercado é o 葡汉
词典 Dicionário Português-Chinês (adiante designado por DPC), publicado em 2001,
com apenas uma edição, e editado por Chen Yongyi, um lexicógrafo e tradutor
especializado na língua inglesa. O DPC também pode ser considerado um dicionário para
aprendizes, levando em conta o seu número considerável de entradas – cerca de 70.000 –
e a sua apresentação relativamente enriquecida dos exemplos, colocações e expressões
idiomáticas, acrescido o facto de que a obra é destinada aos aprendentes chineses da
língua portuguesa.
Como o governo chinês tem adotado uma política bastante branda em relação à
questão da propriedade intelectual, em 2010, foi publicado, com acesso gratuito, num
fórum online o formato eletrónico do DPC, que foi compilado exclusivamente por um
44
“voluntário”22 num ficheiro em formato mdx que pode ser incorporado nos softwares ou
aplicações específicos da China, como MDict e Bluedict, todos com acesso gratuito. Dado
o grande volume do DPC impresso (com 1 174 páginas) e a preferência prevalente pelos
dicionários eletrónicos dos chineses, o formato digital foi gradualmente divulgado,
correndo de boca em boca, entre os aprendentes. Apesar da sua ilegalidade,
academicamente não se pode negligenciar a enorme popularidade que o formato digital
ganhou; portanto, decide-se incluir o mesmo na investigação e análise do presente
trabalho, extraindo, contudo, citações apenas da versão impressa quando necessário.
Para além do DPC, os outros dicionários na área incluem o 简明葡汉词典
Dicionário Conciso Português-Chinês, publicado por The Commercial Press em 1994,
com cerca de 50 000 entradas, sendo o primeiro dicionário sino-português na China
Continental. O 简明汉葡词典 Dicionário Conciso Chinês-Português (adiante
designado por DCCP), editado por Wang Suoying e Lu Yanbin em 1997, um casal
dedicado ao ensino da língua portuguesa e chinesa. O DCCP contém por volta de 25 000
entradas, incluindo aproximadamente 500 neologismos que refletiram a realidade na
altura e colocações de uso corrente e exemplos para os lemas mais comuns, tornando-se
ainda hoje a ferramenta principal como auxílio na produção para os aprendentes chineses.
Desde a publicação do DPC, não foi publicado nenhum dicionário bilingue geral ao longo
dos anos23. Em 2016, publicou-se o 精选葡汉汉葡词典 Dicionário Conciso Português-
Chinês Chinês-Português, de The Commercial Press, o qual contém mais de 40 000
entradas no total, destinando-se não só aos aprendentes da língua portuguesa, como
também aos da chinesa.
A par dos referidos, cabe mencionar ainda um dicionário online recém-construído, o
Iao Dicionário Luso-Chinês, um dicionário bidirecional, que toma como referências, pela
primeira vez, a maioria dos dicionários sino-portugueses disponíveis, designadamente, o
DPLP, o DLP, o Michaelis Moderno Dicionário da Língua Portuguesa, o DCCP, o DPC,
22 O fórum referido destina-se a publicar gratuitamente as versões eletrónicas compiladas dos dicionários impressos
de várias línguas.
23 Foram publicados apenas três thesauri de dimensão reduzida ao longo dos anos.
45
o Glossário Jurídico Chinês-Português do Governo de Macau, as páginas da Wikipédia,
etc. O Iao registou cerca de 97 000 entradas em chinês e 145 000 em português,
disponibilizou remissões para os outros dicionários online, até para as páginas de
Wikipédia, com a intenção de possibilitar aos aprendentes e tradutores da língua
portuguesa uma ferramenta grátis, prática e constantemente atualizada, de natureza
abrangente (Iao, 2018). Por ser um dicionário relativamente novo e, de certo modo,
inovador, o Iao ainda não é do conhecimento dos aprendentes chineses de português.
Levando em conta a escassez das obras referenciais na lexicografia sino-portuguesa,
temos a certeza de que o Iao ocupará um espaço de mercado considerável no futuro.
1.2.4 Dicionário semibilingue
Os dicionários semibilingues, também denominados dicionários bilingualizados,
segundo Hartmann & James (2002), são obras baseadas nos dicionários monolingues,
cujas entradas foram traduzidas, completa ou parcialmente, em uma outra língua. As
definições descritas na L1, em conjunto com a tradução, transformam o dicionário num
monolingue ou bilingue da língua estrangeira, que facilita e torna as consultas mais
eficazes, ganhando popularidade entre os aprendentes (Marello, 1996: 50; apud Welker,
2004: 203). As referidas versões bilingues dos G5, dicionários para aprendizes com
enorme sucesso, são exemplares do dicionário semibilingue, como mostra a Figura 2.
Apesar do seu sucesso e popularidade, Lew & Adamska-Salaciak (2015: 49)
analisaram os defeitos do dicionário semibilingue. Por um lado, a nomenclatura é fixada
na cultura da L2, sem considerar o facto de que os utilizadores podem necessitar de falar
e escrever sobre os próprios países e culturas, o que foi evidenciado pela falta do índice
de L1. Por outro, os autores concluíram de muitas pesquisas empíricas sobre o uso dos
dicionários bilingualizados que os aprendentes tendem a ignorar as definições todas na
L2 quando os equivalentes na L1 estão disponíveis, o que levou a que os autores
duvidassem do conceito do dicionário referido.
Não obstante os defeitos, Laufer & Kimmel (1997: 362) ainda consideravam o
46
dicionário híbrido ou o semibilingue como uma melhor escolha, pelo que os aprendentes
se sentem inseguros se não puderem relacionar o significado de um lema estrangeiro ao
homólogo na sua L1, por melhor que sejam as explicitações e as ilustrações em L2. As
explicitações monolingues, no entanto, geralmente apenas são compreendidas
parcialmente ou até mal-entendidas por alguns aprendentes. Assim sendo, um dicionário
bilingualizado com traduções de alta qualidade parece o mais apropriado para os
aprendentes.
1.3 O uso do dicionário é benéfico à aprendizagem?
Os estudos sobre o uso do dicionário já se tornaram a divisão mais recente e
promissora na área de pesquisa sobre os dicionários (Hartmann, 1994); entre estes, muitos
já lançaram o foco à utilidade dessas obras. A utilidade do dicionário, ou “dictionary
usefulness” em inglês, segundo Laufer & Kimmel (1997: 362), pode ser definida como o
âmbito em que um dicionário é benéfico no fornecimento das informações necessárias
para os seus utilizadores. Nesi (2000: 55) apontou o facto de que, ao elaborar o
questionário, muitos estudiosos costumam definir a hipótese de que o dicionário é uma
ferramenta benéfica para os aprendentes, a qual, de facto, fica a ser comprovada. Mais
pesquisas serão precisas para verificar se o uso do dicionário trouxe benefícios efetivos,
ou se é apenas resultado dos hábitos que os professores preferem e das atividades
promocionais das editoras.
Em torno da utilidade do dicionário, as pesquisas anteriores produziram resultados
distintos. Bensoussan et al. (1984) constataram, surpreendentemente, das três pesquisas
realizadas entre 1 501 participantes que o uso de um dicionário não exerceu efeitos
significativos sobre os resultados dos testes da compreensão da leitura. Aizawa (1999)
notou que os sujeitos sem auxílio do dicionário ganharam, em média, notas mais elevadas
na compreensão da leitura do que aqueles que usavam dicionário.
Em contrapartida, muitos estudiosos obtiveram resultados contrários nas suas
pesquisas em torno do mesmo tema. Summers (1988) descobriu que os alunos que
47
utilizaram um dicionário tiveram uma pontuação significativamente melhor nos testes de
compreensão de pós-leitura e de vocabulário. Chen (2011), por sua vez, realizou um teste
sobre o vocabulário inglês, destinado à comparação da eficácia entre a suposição
contextual e o uso do dicionário semibilingue, com mais de 210 participantes chineses. O
resultado indicou que o uso do dicionário contribuiu para uma melhor performance na
compreensão do vocabulário, sendo que tal estratégia garantiu o acesso a informações
lexicais mais enriquecidas e precisas, contando que os alunos adquiram competências
adequadas da consulta no dicionário. Entretanto, tendo analisado as respostas dos alunos,
Chen (ibid.) confessou também que o grupo com dicionário não produziu melhores
resultados que o que não teve esse auxílio em todos os casos, sendo o resultado sujeito às
competências de consulta dos sujeitos e à extensão das informações fornecidas no
dicionário bilingualizado.
Lew (2004: 27) ainda apontou que a eficácia dos dicionários pode depender do nível
de proficiência dos utilizadores, uma vez que os aprendentes avançados possivelmente
não beneficiam tanto do recurso ao dicionário, enquanto os do nível elementar
provavelmente não possuem a competência requerida para localizar e extrair as
informações relevantes. Tal afirmação, contudo, precisa de ser verificada por mais
pesquisas em grande escala.
Em relação à utilidade dos dicionários das diferentes espécies, Laufer & Melamed
(1994) elaboraram um teste para verificar a efetividade dos dicionários monolingue,
bilingues e semi-bilingues quanto à produção e compreensão das palavras desconhecidas
entre os 123 alunos universitários e da escola secundária intervenientes. Constatou-se que
os alunos de todos os níveis que utilizaram o dicionário bilingualizado obtiveram
melhores resultados na maioria das vezes na compreensão, e os do nível intermédio e
avançado na produção. Tal resultado não está em plena consonância com a pesquisa de
Lew (2014), que realizou uma pesquisa em grande escala, dedicada à comparação do
efeito dos dicionários em formato monolingue, bilingue e semibilingue na compreensão
da L2, contando com a participação de 711 alunos polacos. A pesquisa demonstrou que,
48
em vez da versão semibilingue, o seu homólogo bilingue foi o mais eficaz para todos os
níveis de proficiência, o que resultou das definições obscuras dos equivalentes na L1 na
versão semibilingue. As entradas monolingues no teste, por seu turno, foram as menos
efetivas enquanto um meio auxiliar da compreensão da L2.
Como Chen (2011: 218) resumiu, não existe uma resposta simples de “sim ou não”
em relação à questão de se o dicionário é benéfico, visto que existem vários fatores que
podem influenciar o resultado da pesquisa, como o nível de proficiência dos aprendentes.
Contudo, das pesquisas citadas pode-se constatar que, de modo geral, os dicionários, em
particular os bilingues e semibilingues, exercem impactos positivos, em certo grau, na
aprendizagem da língua estrangeira, sobretudo na compreensão da leitura e dos
vocabulários.
49
Capítulo II – Metodologia
O presente capítulo apresenta os dois métodos adotados para responder às perguntas
de pesquisa deste trabalho. Por um lado, visamos recolher informações factuais e opiniões
em torno do uso dos dicionários da língua portuguesa por meio da consulta aos seus
utilizadores; por outro, serão analisadas as obras mais procuradas entre estes, tendo como
suporte os dados recolhidos anteriormente.
2.1 Questionário
No âmbito da investigação académica sobre o uso do dicionário, questionário,
entrevista, observação, protocolos e testes são os principais recursos utilizados (Welker,
2010). Entre estes, segundo Lew (2004: 37), o questionário faz, no seu melhor, na
abrangência do contexto e das situações de consulta do dicionário, e também se encontra
uma importante fonte das informações dos dados cuja coleção pelos outros métodos seria
uma opção inaceitável, seja por motivos económicos ou éticos, seja simplesmente por ser
impossível. Welker (2010: 14) também opinou que, “in countries or situations in which
nothing is known about dictionary use questionnaire surveys are still useful”. Sendo assim,
optou-se por recorrer ao questionário para a recolha dos dados sobre o uso do dicionário
da língua portuguesa por parte dos chineses.
De acordo com Yuan (2014), o ensino do PLE na China atualmente realiza-se, em
princípio, nas instituições de ensino superior, os estudantes universitários, naturalmente,
estão expostos a uma variedade relativamente mais diversificada de dicionários,
tornando-se, assim, o público-alvo da presente pesquisa. Considerando o facto de que os
estudantes se espalham por todo o mundo devido ao intercâmbio, a distribuição do
questionário foi procedida em forma digital de maneira a entrar em contacto com o maior
número de respondentes possível e facilitar também a coleta e análise.
Em relação à língua utilizada no questionário, Lew (2004: 40) apontou, como riscos
da utilização de língua estrangeira num questionário, o mal entendimento das perguntas
50
e a imprecisão do significado que se pretendia expressar aos respondentes, chegando à
conclusão de que é a língua materna dos sujeitos que deve ser aplicada no questionário.
Com base no referido, o questionário foi escrito em chinês para atingir a uma melhor
compreensão (ver Anexo I) enquanto no presente trabalho, apresento também o mesmo
traduzido para a língua portuguesa (ver Anexo II).
2.1.1 Questionário-piloto
Antes de lançar o questionário final em grande escala, o questionário-piloto é
indispensável para detetar eventuais lacunas, aproveitando para se aperfeiçoar. Pelas
razões já referidas anteriormente, a pilotagem foi realizada através do link
https://wj.qq.com/s/1928040/2356, um site grátis e de fácil acesso na China.
O questionário contém 16 perguntas, entre as quais as opções da 2ª e a 4ª se baseiam
nas escolhas dos respondentes na pergunta 1. Além disso, se escolher a opção “Não uso
dicionário de português”, dadas as funções limitadas do site, o respondente terá de saltar,
por si próprio, para a pergunta 15. Para facilitar o preenchimento dos respondentes e poder
obter os resultados de modo mais efetivo possível, a maioria das perguntas são de escolhas
múltiplas, não contendo perguntas abertas.
Tomando em conta que as necessidades diversificadas podem resultar em hábitos e
usos distintos pelos aprendentes de níveis diferentes de proficiência, o questionário-piloto
foi enviado, por mensagens do WeChat24, a seis respondentes de níveis A2 a C2, todas de
sexo feminino, tentando verificar se a composição do questionário é apropriada para
respondentes de níveis diversos.
Antes de responderem ao questionário, as respondentes foram informadas de que
podiam comunicar, por escrito, neste caso, por mensagens do WeChat, com a autora sobre
as dificuldades de compreensão e dúvidas relacionadas com as perguntas do mesmo.
Também foi feito o pedido do feedback ou sugestões sobre o mesmo. As respondentes
levaram, em média, cinco minutos a responderem ao questionário, e levantaram três
24 Uma ferramenta das mensagens instantâneas na China.
51
dúvidas, que serão expressas na seção seguinte.
Um facto interessante é que todas as dúvidas foram levantadas pelas respondentes
de níveis mais avançados, variando de B2 a C2, que confessaram que as perguntas eram
inovadoras e representavam os problemas que costumam encontrar no uso dos dicionários
existentes da língua portuguesa, ao passo que as de níveis mais básicos não tinham
nenhuns problemas de incompreensão nem sugestões.
Os resultados da pilotagem mostram que as perguntas do presente questionário
servem, em princípio, para verificar a hipótese da autora, possuindo, contudo, aspetos por
alterar e melhorar. Para facilitar a análise, os problemas serão apresentados na Tabela 2,
acompanhados com as soluções adotadas. As páginas mencionadas se referem ao
questionário em português (Anexo II).
Tabela 2 - Problemas e soluções do questionário
Problemas Soluções
Duas respondentes confessaram que
tiveram um pouco de dificuldade em
encontrar os dicionários que usam com
mais frequência na pergunta 1 (página 2),
dado que não estão muito familiarizadas
com os títulos de alguns dicionários
Além das traduções do título (quer com
tradução oficial quer traduzido pela
autora), acrescentam-se a algumas
opções o nome pelo qual é conhecido o
dicionário, a cor da capa ou a aplicação
em que se instala, com as seguintes
alterações:
⚫ Dicionário Português-Chinês em
papel, editado pelo Chen Yongyi
(“dicionário de grande tijolo vermelho” /
“dicionário vermelho português-
chinês”)25
25 Dado o grande volume do dicionário em causa e a sua capa vermelha, os estudantes chineses costumam
chamá-lo o “dicionário de grande tijolo vermelho” ou o “dicionário vermelho português-chinês”.
52
⚫ Dicionário Português-Chinês na
aplicação (normalmente instalado na
aplicação Mdict, Bluedict, Eudic, etc.)
⚫ Dicionário da Língua Portuguesa da
Porto Editora (com capa cor-de-laranja)
⚫ Dicionário Escolar Ilustrado da
Editora Texto (com capa verde)
⚫ Dicionário Chinês-Português /
Português-Chinês da Porto Editora (com
capa azul)
Uma respondente afirmou que, ao
responder à pergunta 5 (página 4) ficou
confusa em relação aos formatos de
dicionário, nomeadamente a
“Aplicação de dicionário para
smartphone/tablet”, “Dicionário online”
e “Dicionário em CD-ROM”.
Os últimos dois formatos em questão
foram alterados para os seguintes:
Dicionário online no site;
Dicionário em CD-ROM (pode ser
instalado no computador).
Duas respondentes levantaram dúvidas
em relação às perguntas 11 e 12 (nas
páginas 6 e 7), afirmando que o termo
“taxa de sucesso de consulta” pode ser
mal entendido. Uma delas escolheu a
opção “verbo” em ambas as perguntas,
pois pensava que, ao consultar o
dicionário monolingue, geralmente é
difícil para ela entender o significado
exato de certo verbo, mas tal
incompreensão pode diminuir pela
Elimina-se o termo em questão e as
perguntas 11 e 12 serão alteradas como as
seguintes:
11. Na sua experiência de uso de
dicionários monolingues, em quais tipos
de palavras é que não consegue encontrar
no dicionário as informações que
procura?
12. Na sua experiência de uso de
dicionários bilingues, em quais tipos de
palavras é que consegue encontrar no
53
apresentação dos sinónimos. Sendo
assim, ela escolheu a mesma opção em
ambas as perguntas.
dicionário o máximo de informações que
procura?
Ao responder à pergunta 9 (página 6),
uma respondente escolheu a opção
“Outra ______”, sem preencher a linha.
Acréscimo do termo “(por favor
preencha)” para todas as opções abertas,
como a seguinte:
Outra (por favor preencha) _____
2.1.2 Questionário principal e perfil dos respondentes
Tal como o questionário-piloto, a sua versão final também foi enviada, com o link
https://wj.qq.com/s/1962645/55c7, através das mensagens do WeChat, para vários grupos
de conversas na aplicação, constituídos por centenas de aprendentes universitários da
língua portuguesa, e, através de email, para os alunos do curso de português em Portugal.
A recolha dos dados decorreu entre 26 de março e 2 de abril de 2018, tendo conseguido
137 resultados no total, do quais 132 são efetivos, sendo que esses cinco respondentes
deixaram algumas perguntas em branco.
Antes de mais, será pertinente tomar conhecimento do perfil dos respondentes.
Como o Gráficos 1 e 2 mostram, a maior parte dos respondentes são do sexo feminino
(81%), a maioria dos quais se autoavaliaram nos níveis intermédios, com 36% dos
aprendentes do nível B2, 25% do C1 e 17% do B1. É uma pena que não tenha conseguido
chegar a mais estudantes dos níveis elementares e do superior. As razões por tal escassez,
do ponto de vista da autora, são porque, por um lado, por falta de conhecimento a respeito
dos dicionários, os aprendentes elementares possivelmente não têm tanta vontade em
responder ao questionário; por outro, quanto aos do nível C2, além de serem, efetivamente,
carenciados os aprendentes da proficiência superior, a modéstia enraizada no caráter dos
chineses também decidiu que poucos se autoavaliavam nesse nível.
54
Gráfico 1 - Nível de Proficiência
Gráfico 2 - Sexo
2.2 Análise dos dicionários
Serão analisados os quatro dicionários mais populares, em diferentes formatos, de
acordo com os resultados do inquérito. As categorias de análise serão os elementos
canónicos do dicionário, designadamente, a macroestrutura, microestrutura e
medioestrutura, que foram detalhadamente descritos no Capítulo I.
Também será apresentada, tendo por base os resultados da análise, uma proposta do
dicionário ideal para os aprendentes chineses, que combinará todas as vantagens dos
dicionários em análise, bem como os aspetos de que os respondentes necessitam num
dicionário.
A1
4% A2
11%
B1
17%
B2
36%
C1
25%
C2
7%
Nível de Proficiência
A1 A2 B1 B2 C1 C2
19%
81%
Sexo
Masculino Feminino
55
Capítulo III - Apresentação e discussão dos resultados do inquérito
Tendo analisado o perfil dos respondentes, surgem as seguintes perguntas: quais são
os seus dicionários favoritos? Como são os seus hábitos de uso? O que eles pensam dos
diversos tipos de dicionário? Todas essas perguntas serão respondidas no presente
capítulo.
No que toca aos dicionários consultados com mais frequência, segundo o Gráfico 3,
o Dicionário Português-Chinês (DPC), editado por Chen Yongyi, ganhou a maior
popularidade, com a sua aplicação selecionada por 69,7% dos aprendentes e a edição
impressa por 62,9%. O Dicionário Conciso Chinês-Português (DCCP), editado por Wang
Suoying e Lu Yanbin, bem como o Dicionário Priberam (DPLP) ficam no terceiro lugar,
com 22,7% de votos para cada. Logo a seguir são o Dicionário da Língua Portuguesa
(21,2%) da Editora Porto (DLP) e o seu formato digital (20,5%) - a aplicação que partilha
o mesmo título e o site chamado Infopédia. É de salientar que ninguém selecionou o
famoso Dicionário Aurélio, que lançou a sua primeira edição em 1975 no Brasil
(Biderman, 2000), sendo explicado, possivelmente, pela sua natureza brasileira, enquanto
os respondentes são maioritariamente aprendentes da variedade do português europeu.
Para além dos apresentados nas opções, 5,3% dos respondentes referiram-se a outros
dicionários como o Linguee26, Iao Dicionário Bidirecional Português-Chinês, Dicionário
Informal, Dicionário Online de Português27 e o Dicionário Conciso Português-Chinês
Chinês-Português28. Em relação aos três respondentes (2,3%) que não usavam dicionários
de português, dois ficam no nível A1 e um no B2, o que foi resultado, possivelmente, da
escassez dos conhecimentos linguísticos.
26 O Linguee contém o dicionário bidirecional de português-inglês.
27 Os três dicionários referidos são todos ferramentas online, entre os quais os últimos dois se focam na variedade do
português brasileiro.
28 Foi publicado pelo Commercial Press em 2016, com o título em chinês 精选葡汉汉葡词典.
56
Gráfico 3 – Dicionários consultados com mais frequência
Se combinar o nível de proficiência na língua para a análise, pode-se observar,
através do Gráfico 4, as preferências pelos diversos dicionários dos diferentes níveis dos
respondentes. Não foram incorporados no Gráfico 4 os dados dos respondentes do nível
A1, visto que a quantidade reduzida (com seis respondentes no total) não é suficiente para
proceder a uma análise justificável. Mas cabe mencionar aqui que, entre esse seis
62.9%
69.7%
16.7%
22.7%
1.5%
21.2%
20.5%
5.3%
0.0%
22.7%
3.0%
0.0%
0.0%
2.3%
5.3%
0.0% 20.0% 40.0% 60.0% 80.0% 100.0%
Dicionário Português-Chinês em papel
Dicionário Português-Chinês na aplicação
Dicionário Conciso Português-Chinês
Dicionário Conciso Chinês-Português
Visual Dicionary Português·English·汉语
Dicionário Língua Portuguesa
Infopédia ou na aplicação
Dicionário Chinês-Português / Português-
Chinês
Dicionário Escolar Ilustrado
Dicionário Priberam (online ou na aplicação)
Dicionário de Português licenciado para
Oxford University
Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa em
papel
Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa em
CD-Rom
Não uso dicionário de português.
Outro
1. Indique até três dicionários que usa com mais
frequência.
Dicionários selecionados
57
aprendentes, além dos dois que afirmaram que não utilizaram dicionários, dois votos
foram atribuídos ao DPC na edição impressa e à sua aplicação, três. O DCCP e ao DPLP
ganharam respetivamente um voto. No que diz respeito ao Gráfico 4, de forma geral,
independentemente do formato, o DPC é o mais consultado entre todos os níveis de
respondentes (A2: 60%, B1: 67,3%, B2: 62,5%), embora tal preferência seja menos
relevante para os aprendentes dos níveis avançados (com 57,7% para C1 e 36,8% para
C2). O DCCP também está na lista de popularidade entre os estudantes; contudo, ele é
mais preferido pelos respondentes dos níveis elementar e intermédio – de A2 a B2 – do
que pelos mais avançados (C1 e C2). O DLP, junto com os seus formatos digitais, ocupa
também um mercado considerável entre os utilizadores, especialmente para os dos níveis
avançados, sendo explicado pela percentagem de 24,4% para C1 e 31,6% para C2. O
DPLP ganhou mais popularidade nos respondentes do nível superior que outros, com
votos de 26,3% dos aprendentes do C2 e 5,9%, 10,7% e 11,5% para os do A2, B1 e C1.
Do ponto de vista da natureza dos dicionários, os respondentes avançados consultam os
dicionários monolingues com mais frequência que os elementares.
Gráfico 4 - Relação entre o nível de proficiência e a escolha pelo dicionário
0%
10%
20%
30%
40%
50%
60%
70%
80%
90%
100%
A2 B1 B2 C1 C2
1.1 Relação entre o nível de proficiência e a escolha pelo dicionário
Dicionário Português-Chinês em papel Dicionário Português-Chinês na aplicação
Dicionário Conciso Chinês-Português Dicionário Língua Portuguesa
Infopédia ou na aplicação Dicionário Priberam
58
Tal resultado está em consonância com a conclusão de Lew (2004: 20) de que, apesar
da preferência geral entre os aprendentes pelos dicionários bilingues, a mesma é menos
destacada para os de proficiência avançada. Um número razoável de estudos, citados por
Lew (ibid.) (Al-Ajmi, 1992; Atkins & Varantola, 1998; Baxter, 1980; Jakubowski, 2001;
Tomaszczyk, 1979), também notaram a tendência para que os aprendentes avançados
utilizem os dicionários monolingues relativamente com mais frequência que os bilingues.
Por limites técnicos do site29 e para uma análise mais precisa, as perguntas 2 e 3
foram lançadas para encontrar as razões para uso de certo dicionário, as quais serão
também analisadas em conjunto. De acordo com o Gráfico 5, a aplicação do DLP destaca-
se entre todos os seus homólogos, sendo a primeira escolha para 52,3% dos respondentes.
A sua versão em papel, com 20,8% dos votos, ocupa o segundo lugar. Por seu turno,
conforme o Gráfico 630, dado o conteúdo quase idêntico, naturalmente são semelhantes
as razões para a consulta destes dois formatos – a quantidade satisfatória das entradas
(60,2% para a aplicação e 60,9% para a edição impressa), explicações entendíveis e
completas (50,6% e 55,4%), apresentação dos provérbios ou/e expressões idiomáticas
relativas (44,6% e 42,4%), disponibilização de exemplos (31,3% e 35,9%). As
recomendações do professor também exerceram impacto considerável sobre os
respondentes, com 21,7% que as consideram relevantes na escolha da versão em papel e
15,2% para a aplicação. É de sublinhar que 13,3% e 9,8% dos utilizadores, respetivamente
da edição impressa e da aplicação, afirmaram que a sua escolha pelas ferramentas
referidas resultou da falta de outros dicionários disponíveis. Um utilizador do formato em
papel até acrescentou que, apesar dos erros existentes, a ferramenta em causa ainda é o
recurso lexicográfico mais útil a que os aprendentes têm acesso, o que, juntamente com
o resultado, reflete de certo modo a escassez dos dicionários da língua portuguesa na
China. Para além das opções sugeridas, outras razões para o uso da versão de aplicação
por 14,1% dos utilizadores são a facilidade de transportar e a consulta eficaz no telemóvel.
29 O site em que se distribuiu o questionário não disponibiliza a função em que se cita as respostas dos respondentes
na pergunta anterior como as opções na pergunta seguinte. 30 Dado que as respostas convergem para determinados dicionários, no Gráfico 6 foram apenas apresentados os
resultados dos dicionários que foram mais escolhidos como primeira escolha.
59
O DPLP, que ocupar o terceiro lugar – 8,5% – na lista do dicionário favorito dos
respondentes, foi escolhido por razões parcialmente semelhantes às do 1º e 2º
classificados – para além das explicações entendíveis e completas (70%), quantidade
satisfatória de verbetes (53,3%), apresentação de exemplos (40%) e de provérbios e/ou
expressões idiomáticas (36,7%) e as recomendações do professor (26,7%) e a presença
dos sinónimos em abundância (30%) também contribuíram para a preferência dos seus
utilizadores.
O seu homólogo monolingue, o DLP, é relativamente menos consultado, com 6,9%
dos respondentes que o consideram como a ferramenta favorita. 50% dos utilizadores
escolheram tal ferramenta pelas suas explicações entendíveis e completas, 42,9% pela
apresentação de provérbios ou/e expressões idiomáticas, 35,7% pela quantidade
satisfatória de verbetes, 32,1% pelos seus exemplos das palavras e 17,9% pelas
recomendações dos professores. Um resultado distinto das outras ferramentas é que, 25%
dos utilizadores consultam o DLP, porque indica o uso diferente das variedades de
português europeu e brasileiro (PE e PB).
De forma geral, são elementos mais valorizados pelos aprendentes a quantidade de
verbetes, as explicações das palavras, os provérbios ou/e expressões idiomáticas e
exemplos de uso das palavras. A par disso, os utilizadores dos dicionários monolingues
prestam atenção não só aos sinónimos em português das palavras, como também à
diferença de uso das variedades PE e PB. As razões para tais resultados são as seguintes:
por um lado, o DPC foi publicado em 2001, não indicando, portanto, de forma abrangente,
o uso diferenciado das variedades da língua portuguesa; por outro, a investigação de Fan
(2000) sobre o comportamento de consulta nos dicionários, com mais de 1 000 estudantes
universitários de Hong Kong como sujeitos, constatou que os estudantes chineses não
consideravam que os equivalentes em chinês fossem úteis, tendo explicado a indiferença
pelos mesmos por parte dos utilizadores no caso do DPC, que apresentam, na maioria dos
casos, apenas equivalentes em chinês.
60
Gráfico 5 – Ordem de frequência de uso
20.8%
52.3%
2.3%
3.8%
0.0%
6.9%
3.8%
3.1%
8.5%
0.0%
0.0%
0.8%
0.0%
0.0%
0.0%
31.5%
10.0%
5.4%
9.2%
0.0%
10.0%
10.0%
3.1%
11.5%
0.8%
0.8%
0.0%
0.8%
0.8%
0.8%
11.5%
8.5%
9.2%
10.0%
1.5%
4.6%
6.9%
0.8%
3.8%
2.3%
0.0%
0.0%
0.0%
0.0%
0.0%
0.0% 20.0% 40.0% 60.0% 80.0% 100.0%
Dicionário Português-Chinês em papel
Dicionário Português-Chinês na aplicação
Dicionário Conciso Português-Chinês
Dicionário Conciso Chinês-Português
Visual Dicionary Português·English·汉语
Dicionário Língua Portuguesa
Infopédia ou na aplicação
Dicionário Chinês-Português / Português-
Chinês
Dicionário Priberam (online ou na aplicação)
Dicionário de Português licenciado para
Oxford University
Linguee
Iao Dicionário
Dicionário Informal
Dicionário Conciso Português-Chinês Chinês-
Português
Dicionário Online de Português
2. Indique a frequência de uso dos dicionários escolhidos na pergunta 1.
1º lugar 2º lugar 3º lugar
61
Gráfico 6 – Razões de consulta
60.2%
50.6%
31.3%
44.6%
6.0%
2.4%
14.5%
9.6%
6.0%
21.7%
13.3%
0.0%
60.9%
55.4%
35.9%
42.4%
6.5%
3.3%
10.9%
12.0%
5.4%
15.2%
9.8%
14.1%
35.7%
50.0%
32.1%
42.9%
7.1%
3.6%
25.0%
14.3%
7.1%
17.9%
7.1%
0.0%
53.3%
70.0%
40.0%
36.7%
10.0%
10.0%
13.3%
30.0%
23.3%
26.7%
10.0%
0.0%
A quantidade das entradas que contém
satisfaz as minhas necessidades.
Explicações entendíveis e completas da
palavra.
Apresenta os exemplos para a palavra
consultada.
Apresenta os provérbios ou/e expressões
idiomáticas relativos à palavra consultada.
Esclarece a pronúncia da palavra consultada.
Indica a escrita da palavra antes e depois do
Acordo Ortográfico.
Indica o uso diferente do português europeu
e português brasileiro.
Apresenta sinónimos em abundância.
Sugere bons equivalentes.
Porque é o dicionário que meu professor
recomendou.
Porque não tenho outro dicionário/é o único
disponível.
Outra: É fácil de transportar e a consulta no
telefone é muito eficaz.
0.0% 20.0% 40.0% 60.0% 80.0% 100.0%
3. Porque é que consulta com mais frequência o dicionário
selecionado na pergunta 2?
Dicionário Português-Chinês em papel Dicionário Português-Chinês na aplicação
Dicionário Língua Portuguesa Priberam
62
Tendo conhecido os dicionários utilizados e as razões para a consulta, passaremos a
escutar as opiniões dos utilizadores em relação aos dicionários. Constata-se do Gráfico 7,
onde se pode ler que os aprendentes, em geral, estão satisfeitos com os dicionários
existentes no mercado chinês, com a maioria dos dicionários atingir acima dos 80% de
grau de satisfação. Apenas 1,2%, 3,3% e 3,3% dos utilizadores expressam a sua
insatisfação respetivamente ao DPC em papel, ao DCCP e ao DPLP. Comparando com os
seus homólogos, o Dicionário de Português licenciado pela Oxford University, instalado
Gráfico 7 – Grau de satisfação em relação aos dicionários
37.35%
33.70%
13.6%
6.7%
100.0%
35.7%
29.6%
36.7%
50.0%
100.0%
100.0%
50.60%
54.35%
72.7%
83.3%
50.0%
55.6%
75.0%
43.3%
100.0%
100.0%
100.0%
10.84%
11.96%
13.6%
6.7%
14.3%
14.8%
25.0%
16.7%
50.0%
1.20%
3.3%
3.3%
0.00% 20.00% 40.00% 60.00% 80.00% 100.00%
Dicionário Português-Chinês em papel
Dicionário Português-Chinês na aplicação
Dicionário Conciso Português-Chinês
Dicionário Conciso Chinês-Português
Visual Dicionary Português·English·汉语
Dicionário Língua Portuguesa
Infopédia ou na aplicação
Dicionário Chinês-Português / Português-Chinês
Dicionário Priberam (online ou na aplicação)
Dicionário de Português licenciado para Oxford
University
Linguee
Iao Dicionário
Dicionário Informal
Dicionário Conciso Português-Chinês
Dicionário Online de Português
4. Está satisfeito com o(s) dicionário(s) que usa?
1-Muito satisfeito 2 3 4-Nada satisfeito
63
no sistema IOS, não ganhou tanto apreço, com a metade dos utilizadores afirmando o seu
desgosto, o que pode ser atribuído à quantidade reduzida dos utilizadores – apenas quatro
respondentes escolheram a ferramenta como a sua favorita. Resultados semelhantes
também ocorrem ao Visual Dictionary Português·English·汉语, Linguee, Iao Dicionário,
Dicionário Informal, Dicionário Conciso Português-Chinês e Dicionário Online de
Português, que ganharam 100% de grau de satisfação, com apenas um(a) utilizador(a)
para cada ferramenta.
Em qual formato os aprendentes chineses costumam consultar o dicionário? O
Gráfico 8 consegue dar uma resposta. As aplicações para smartphone ou tablet ganham,
de forma dominante, mais popularidade, contando com 73,5% dos respondentes que
afirmam que recorrem sempre a esse formato e 19,9% que o utilizam frequentemente.
Apenas 2,2% dos utilizadores nunca experimentaram esse fruto das novas tecnologias.
Logo a seguir vem o dicionário online, com o número dos utilizadores leais a atingir 18,7%
e 37,7% dos respondentes, respetivamente. O dicionário impresso já não é tão popular
como antigamente, com 67,7% dos respondentes a expressarem que consultam raramente
a ferramenta em papel e 12,8% que nunca a utilizaram. Os seus “clientes repetitivos”
apenas ocupam 5,3% (usam sempre) e 14,3% (usam frequentemente). O dicionário em
CD-Rom, fica no último lugar, sendo explicado por 85,8% dos respondentes que nunca
recorreram a esse formato. Somente 0,8% e 1,6% dos respondentes aplicam sempre ou
frequentemente esse formato à sua aprendizagem.
Tal resultado está em concordância com a hipótese apresentada anteriormente, de
que os dicionários em formatos digitais, em particular as aplicações, são mais consultados
pelos respondentes. Sendo a China o maior mercado das aplicações no mundo31, não é
nada de estranhar que as aplicações dominem entre todos os formatos, mesmo que, como
as opções da pergunta 1 mostram, os aprendentes chineses não tenham tantas escolhas
quanto aos dicionários eletrónicos. A respeito do formato em CD-Rom, como poucos
31 Segundo os dados estatísticos de App Annie, citados pelo Business Insider, a economia de aplicações da China supera
a maioria dos outros mercados em relação aos gastos do consumidor, o número de aplicações usadas e o tempo total
gasto em aplicações.
64
dicionários relativos à língua portuguesa estão equipados com CD-Rom na China, é
natural que a maior parte dos aprendentes nunca tenha utilizado esse formato.
Gráfico 8 – Frequência de uso dos diferentes formatos de dicionário
Para além da preferência dos aprendentes, também será interessante conhecer a que
tarefas se destina a consulta do dicionário. O Gráfico 9 demonstra que a maioria dos
respondentes recorrem ao dicionário na leitura (92,6%) e na produção escrita (80,7%).
11,1% dos respondentes necessitam da ajuda do dicionário na produção oral e apenas 1,5%
vão utilizar a ferramenta na compreensão do oral. Tal resultado está em plena
concordância com o do questionário de Jiang (2007), que observou que, entre os 60
respondentes universitários do curso de inglês da China, mais de metade consultam o
dicionário para trabalhos de leitura e escrita, não tendo, contudo, esse hábito para
atividades orais e auditivas. Lew (2004: 20) também chegou a essa conclusão a partir da
investigação de Jakubowski (2001) sobre o uso de dicionários bilingues e monolingues
5.3%
73.5%
18.7%
0.8%
14.3%
19.9%
37.7%
1.6%
67.7%
4.4%
33.1%
11.8%
12.8%
2.2%
9.2%
85.8%
0%
20%
40%
60%
80%
100%
Dicionário em papel Aplicação para
smartphone/tablet
Dicionário online Dicionário em CD-
Rom
5. Com que frequência usa dicionários nestes formatos?
Sempre Frequentemente Raramente Nunca
65
por aprendentes polacos, resumindo que o exercício das competências orais
definitivamente não é um contexto importante para o uso do dicionário em geral.
Gráfico 9 – Contexto de consulta
A seguir, serão abordadas de forma detalhada as opiniões em relação aos dicionários
impressos e em formatos digitais, nomeadamente, as respetivas vantagens e pontos fracos
que os aprendentes consideram. Consoante o Gráfico 10, 57,8% dos respondentes
apontam o maior benefício dos dicionários em papel à grande quantidade das informações
que contêm, 45,2% opinam que determinadas informações apenas constam nessa versão
e 40,7% consideram que esta se destaca por não exigir energia elétrica ou ligação à
Internet. A par disso, 25,2% dos respondentes expressaram a sua preferência pela leitura
em papel em vez do ecrã, enquanto 8,1% dos aprendentes, possivelmente adeptos dos
formatos eletrónicos, não encontraram nenhuma vantagem no dicionário físico. 5,2% dos
estudantes também exprimiram outros pareceres sobre o tópico, acrescentando que os
dicionários impressos são mais adequados ao comparar os sinónimos da palavra, que têm
maior precisão e menos erros ou que a consulta em papel é isenta de interrupção. Uma
92.6%
11.1%
80.7%
1.5%
0.0%
20.0%
40.0%
60.0%
80.0%
100.0%
Na leitura Na produção oral Na produção escrita Na compreensão do oral
6. Em que contexto utiliza o dicionário de português com mais
frequência?
66
realidade para outros três respondentes é que o dicionário em papel é o único recurso
lexicográfico que a faculdade permite utilizar nas aulas e no teste.
Em suma, um número considerável dos respondentes escolhem os dicionários em
papel pelas informações abundantes e únicas que contêm. A não exigência de bateria e de
ligação à Internet também o torna mais distinguível. Contudo, à medida que mais versões
digitais são produzidas, os dicionários em papel serão abandonados no final?
Gráfico 10 – Vantagens do dicionário em papel
Por sua vez, como os aprendentes consideram os homólogos eletrónicos? Tal como
apresentado no Gráfico 8, a percentagem dominante de 91,8% confirma a vantagem dos
formatos digitais. Como se vê no Gráfico 11, para o resto das opções sugeridas, as
percentagens variam em torno de 30%. 37,3% dos respondentes que valorizam o
dicionário eletrónico por lhes permitir ter acesso à pronúncia em áudio, enquanto 36,6%
elogiam o mesmo pela facilidade da consulta de conjugação dos verbos. Ao contrário do
25.2%
45.2%
57.8%
7.4%
40.7%
8.1%
5.2%
0.0% 10.0% 20.0% 30.0% 40.0% 50.0% 60.0% 70.0%
Prefiro ler em papel do que no ecrã.
Algumas informações procuradas existem
apenas na versão de papel.
Os dicionários em papel contêm mais
informações.
A consulta é mais fácil no dicionário em
papel.
Não preciso da energia elétrica, Internet ou
dados móveis (3G/4G).
Nenhuma
Outra
7. Quais considera ser as vantagens do dicionário em papel?
67
dicionário em papel, o eletrónico possibilita a consulta dos verbos conjugados, sendo
apreciados por 34,3% dos respondentes. As entradas e/ou exemplos mais recentes (31,3%)
e a atualização constante (30,6%) também contribuem para o uso universal, acrescida a
função de salvar palavra para a aprendizagem posterior (29,9%). Outros benefícios a que
alguns respondentes se referiram incluem a facilidade de transportar e a melhor precisão
no âmbito das terminologias.
De modo geral, a consulta eficaz é a maior razão para a popularidade dos dicionários
eletrónicos. As suas funções em abundância, seja a pronúncia em áudio e “caderneta do
vocabulário”, seja a facilidade da consulta da conjugação e do verbo conjugado, tornam
o próprio mais competitivo. A atualização constante da ferramenta e dos verbetes também
garante a precisão e serventia das informações consultadas. Tendo em conta tantos
benefícios e a preferência dos aprendentes chineses, no parecer da autora, será mais
favorável, tanto aos lexicógrafos como aos utilizadores, disponibilizar a versão eletrónica
dos dicionários no futuro, o que não só expandirá o mercado do dicionário, como também
facilitará significativamente a aprendizagem da língua portuguesa
Gráfico 11 – Vantagens dos dicionários eletrónicos
91.8%
37.3%
30.6%
31.3%
36.6%
34.3%
29.9%
2.2%
3.0%
0.0% 20.0% 40.0% 60.0% 80.0% 100.0%
A consulta é mais eficaz.
Tenho acesso facilitado (por clique) à
pronúncia oral em áudio. (Caso o…
Está constantemente atualizado.
Contém entradas e/ou exemplos mais
recentes.
Facilita a consulta de conjugação dos verbos.
Mesmo que insira, por exemplo, os verbos
conjugados, ainda consigo ter acesso ao…
É possível salvar palavras para estudar depois
Nenhuma
Outra
8. Quais considera ser as vantagens dos dicionários
eletrónicos, seja online, aplicação ou CD-ROM?
68
No que diz respeito aos dicionários bilingues e monolingues, como é que os
aprendentes avaliam os mesmos? O Gráfico 12 apresenta os pontos fracos dos bilingues.
58,8% dos respondentes assinalaram definições obsoletas de algumas palavras, 56,3%
apontaram a quantidade mais pequena de verbetes e 51,9% lamentaram a falta de
provérbios e/ou expressões idiomáticas. E ainda, 40,7% dos respondentes notaram a falta
das marcas de uso nos verbetes, sendo que os equivalentes estão descontextualizados e
que neles não existem pistas que ajudem o utilizador a escolher. Outros pontos fracos
incluem a não indicação do uso diferente das duas variedades de português (37%),
exemplos obsoletos das palavras (34,1%) e a falta de informações relativas à pronúncia
(34,1%). Além dos referidos, tal categoria também está depreciada por 29,6% dos
respondentes, dado que não disponibiliza a escrita antes e depois da aplicação do Acordo
Ortográfico. E um respondente acrescentou que muitas palavras ou exemplos
apresentados no dicionário bilingue não são usados por falantes nativos.
Em suma, os resultados, em geral, não demonstram grande disparidade, contando
com percentagens aproximadas. Importa salientar que muitos pontos fracos dos
dicionários bilingues, como as definições e exemplos obsoletos e a questão do Acordo
Ortográfico, estão associadas às suas eras de publicação. Tomando os mais populares
como exemplo, o DPC foi lançado pela primeira vez em 2001, sem novas edições; o
Dicionário Conciso Português-Chinês publicou-se pela primeira vez em 1994 e DCCP
em 1997, com também uma única edição. Entre estes, somente o primeiro indicou a
escrita relativa ao Acordo Ortográfico. Com efeito, de acordo com as informações
constantes no Portal da Língua Portuguesa, embora o Novo Acordo Ortográfico de 1990
tenha sido assinado nos anos 90, este apenas entrou em vigor em Portugal em 2009. Tal
realidade, por um lado, justificou alguns dos seus pontos fracos, por outro, refletiu
novamente a carência dos recursos lexicográficos no mercado chinês.
69
Gráfico 12 – Pontos fracos dos dicionários bilingues
Os dicionários monolingues, por seu turno, apresentam um resultado distinto, como
se vê no Gráfico 13. Ao contrário das percentagens semelhantes que acontecem aos seus
homólogos bilingues, prevalece entre outros pontos fracos a existência de definição
incompreensível para os estrangeiros, contando com o consenso de 78,4% dos
respondentes. Na opção referida, para uma melhor compreensão, foi citada como exemplo
a consulta da palavra “alimentação”. O DLP, bem como os seus formatos digitais, define
o substantivo como “ato ou efeito de alimentar(-se)”, o que, efetivamente, não levou em
consideração a possibilidade de que um utilizador estrangeiro possa nem conhecer o
verbo “alimentar(-se)”. Eis é a razão pela qual a opção foi mais escolhida. A par disso,
alguns respondentes também lamentaram a falta de marcas de uso (32,8%), falta de
provérbios e/ou expressões idiomáticas (29,9%) e falta de exemplos da palavras (27,6%).
56.3%
58.5%
34.1%
51.9%
34.1%
29.6%
37.0%
40.7%
0.7%
0.0% 20.0% 40.0% 60.0% 80.0% 100.0%
Não contém tantas palavras como os
monolingues.
Algumas definições de palavras são obsoletas.
Alguns exemplos de palavras são obsoletos.
Falta de provérbios e/ou expressões
idiomáticas.
Falta de informações sobre a pronúncia.
Não disponibilizam a escrita antes e depois do
Acordo Ortográfico.
Não indicam o uso diferente do português
europeu e português brasileiro.
Os equivalentes não estão contextualizados e
não têm pistas que ajudem o utilizador a…
Outra
9. Na sua opinião, quais são os pontos fracos dos dicionários
bilingues português-chinês/chinês-português que conhece?
70
Ao contrário do seu homólogo bilingue, apenas 14,2% dos respondentes queixaram-se da
quantidade limitada de verbetes, bem como da ausência de informações da pronúncia
(16,4%) e da não indicação do uso diferente das duas variedades de português (19,4%).
Dos resultados pode-se chegar à conclusão de que os dicionários monolingues
apresentam um melhor desempenho que os seus homólogos bilingues em termos de
quantidade dos verbetes, informações sobre a pronúncia e o uso diferente do PE e do PB.
A falta de exemplos, provérbios e expressões idiomáticas e do contexto em que se
emprega a palavra parece ser um problema comum a ambos tipos de dicionários. No que
diz respeito à definição incompreensível de algumas palavras, o formato digital pode
ajudar a resolver o problema. Tomando o site do DPLP como um exemplo, quando se
pesquisa a palavra “alimentação” no site, disponibiliza-se aos utilizadores as definições
do substantivo, cuja primeira definição é “dar alimento a”, e do seu verbo “alimentar”.
Mesmo que não conheça a palavra “alimento”, o site possibilita a consulta, por um clique,
das quaisquer palavras desconhecidas na definição, resolvendo, de certo modo, este
problema.
Gráfico 13 – Pontos fracos dos dicionários monolingues
14.2%
78.4%
27.6%
29.9%
16.4%
19.4%
32.8%
0.0%
0.0% 20.0% 40.0% 60.0% 80.0% 100.0%
Entradas limitadas das palavras.
Algumas definições não são compreensíveis
para os estrangeiros.
Falta de exemplos da palavra.
Falta de provérbios e/ou expressões
idiomáticas.
Falta de informações sobre a pronúncia.
Não indica o uso diferente do português
europeu e português brasileiro.
Não indicam como se emprega a palavra em
contexto.
Outro
10. Na sua opinião, quais são os pontos fracos dos dicionários
monolingues que conhece?
71
Os resultados das perguntas 11 e 12, os quais se focam nas informações de diferentes
categorias de palavras que constam no dicionário, complementando-se uma com a outra,
podem ser analisados em conjunto. Em resumo, os respondentes têm mais dificuldades
em encontrar informações relativamente aos pronomes (49,6%), preposições (47,3%),
conjunções (40,3%) e advérbios (31%) no dicionário, enquanto conseguem mais
informações que procuram dos substantivos (66,2%), verbos (63,9%) e adjetivos (54,1%).
Gráfico 14 – Categoria das palavras com informações satisfatórias no dicionário
Gráfico 15 – Categorias das palavras carenciadas das informações procuradas
16.3%
15.5%
14.7%
31.0%
47.3%
49.6%
40.3%
0.0% 20.0% 40.0% 60.0% 80.0% 100.0%
Substantivo
Adjetivo
Verbo
Advérbio
Preposição
Pronomes (que, quanto, como, onde, etc.)
Conjunção (e, mas, nem, ou, etc.)
11. Na sua experiência de uso de dicionários monolingues, em quais tipos
de palavras é que não consegue encontrar no dicionário as informações
que procura?
66.2%
54.1%
63.9%
17.3%
18.8%
18.8%
13.5%
0.0% 20.0% 40.0% 60.0% 80.0% 100.0%
Substantivo
Adjetivo
Verbo
Advérbio
Preposição
Pronomes (que, quanto, como, onde, etc.)
Conjunção (e, mas, nem, ou, etc.)
12. Na sua experiência de uso de dicionários bilingues, em quais tipos de
palavras é que consegue encontrar no dicionário o mais possível as
informações que procura?
72
Sendo palavras gramaticais os pronomes, preposições, conjunções e advérbios, que
funcionam de forma distinta do que no sistema gramatical de chinês, é previsível que não
constem no dicionário tantas informações de que os aprendentes precisam, visto que, além
do significado, é indispensável também o domínio na gramática para uma melhor
aprendizagem e aplicação dessas palavras. A importância dos conhecimentos gramaticais
reflete-se, em particular no caso dos advérbios, na medida em que nos atuais dicionários
em papel, possivelmente por limite de espaço, não constam verbetes para advérbios em -
mente, ou seja, quando um aluno se depara com um advérbio desconhecido terminando
em -mente, se não tiver aprendido a regra gramatical relevante, não conseguirá
encontrar o significado nos dicionários em papel. Felizmente, os dicionários em formatos
eletrónicos, como a Infopédia e DPLP32, resolvem este problema, pois contêm também
os verbetes para advérbios, facilitando a aprendizagem da língua portuguesa por
estrangeiros.
Por fim, vamos conhecer quais elementos são procurados e quais os respondentes
procuram mas não encontram quando consultam o dicionário. No âmbito do primeiro
tema (ver Gráfico 16), o significado, sem dúvida, ocupa o primeiro lugar com a escolha
de 79,3% dos respondentes. Seguem-se as colocações (65,9%), os exemplos de uso da
palavra (63,7%), os provérbios e/ou expressões idiomáticas relacionados (56,3%), bem
como as informações sobre o contexto de uso (49,6%), demonstrando as demandas por
parte dos respondentes dos conhecimentos relativos ao uso de um lema. Um número
considerável dos respondentes também presta atenção especial aos elementos gramaticais,
sendo que o género e a classe da palavra foram selecionados respetivamente por 51,9% e
44,4% dos respondentes. A pronúncia (18,5%), por seu turno, é a menos procurada.
32 A aplicação do DPC foi criada com base na sua versão em papel, não contendo também, portanto, verbetes dos
advérbios.
73
Gráfico 16 – Elementos procurados no dicionário
Considerando o Gráfico 17 para a análise, que se debruça sobre os elementos que os
aprendentes procuram mas que não encontram no dicionário, pode-se observar que muitas
das informações mais procuradas não constam dos dicionários. Por exemplo, provérbios
e expressões idiomáticas contam com 67,7% dos votos, a colocação da palavra com 53,4%
e os exemplos de uso com 39,1%, o que está em concordância com os resultados do
Gráfico 16 e do Gráfico 6, onde se referiu as razões para o uso de determinado dicionário,
indicando que um número considerável dos estudantes escolhem um dicionário por
apresentar exemplos e provérbios e/ou expressões idiomáticas relativos à palavra. Dos
resultados referidos pode-se chegar à conclusão de que, embora alguns dos dicionários
mais populares33 contenham certos exemplos (no caso do DPLP e do DPC), provérbios
33 No presente trabalho, com base dos resultados das primeiras duas perguntas, os dicionários mais populares referem-se a
79.3%
18.5%
51.9%
44.4%
33.3%
63.7%
65.9%
56.3%
29.6%
49.6%
0.0% 20.0% 40.0% 60.0% 80.0% 100.0%
Significado
Pronúncia
Género da palavra
Classe da palavra (substantivo, adjetivo,
verbo, etc)
Ortografia (forma plural, forma de Acordo
Ortográfico, etc.)
Exemplos de uso da palavra
Colocação da palavra
Provérbios e/ou expressões idiomáticas
relacionados
Uso diferente em português europeu e
português brasileiro (se existir)
Informações sobre o contexto de uso
(formal/informal)
13. Quais elementos é que normalmente procura na consulta de
uma palavra no dicionário?
74
e/ou expressões idiomáticas e colocação das palavras, as suas quantidades não
satisfizeram as necessidades crescentes dos aprendentes.
Gráfico 17 – Elementos que procuram mas que não encontram
As informações fonéticas, nomeadamente a transcrição fonética e o áudio da
pronúncia, como na pergunta 13, também não são alvo de atenção dos respondentes. Na
aprendizagem da língua portuguesa, é de conhecimento comum que o domínio das regras
fonéticas facilitou significativamente a pronunciação de uma palavra portuguesa. Tal
caraterística determinou que a pronúncia não é sempre informação necessária na
aprendizagem da língua portuguesa.
Por outro lado, os elementos fonéticos também não desapareceram dos dicionários
existentes. A Infopédia, bem como a sua aplicação, apresentam as transcrições fonéticas
todos os formatos do Dicionário Português-Chinês, Dicionário da Língua Portuguesa e do Dicionário Priberam.
6.0%
16.5%
39.1%
53.4%
67.7%
38.3%
3.0%
0.0% 20.0% 40.0% 60.0% 80.0% 100.0%
Transcrição fonética.
Áudio da pronúncia.
Exemplos de uso da palavra.
Colocação da palavra.
Provérbios e/ou expressões idiomáticas
relacionados.
Uso diferente em português europeu e
português brasileiro (se existir)
Outro
14. Quais elementos é que costuma procurar e não encontra nos
dicionários que usa com frequência?
75
completas de cada palavra. No DPLP disponibiliza-se somente as pronúncias especiais de
certas palavras, como os casos de “êxito |êizi|” e “boca |ô|”. O DPC, por sua vez, contém
uma quantidade muito reduzida de informações relativas à pronúncia, como o exemplo
de “poder (ê)”. Quanto aos áudios de pronúncia, não estão disponíveis, infelizmente, nos
dicionários referidos.
Além das opções sugeridas, um respondente mencionou a ausência de conjugação,
provavelmente nos dicionários em papel, porque os utentes têm acesso no DPLP e nos
formatos digitais do DLP. Dois respondentes lamentaram a inexistência de sinónimos e
antónimos nos dicionários que utilizam, que também estão disponíveis no DPLP. Outro
respondente referiu-se à carência das terminologias no(s) dicionário(s) consultado(s).
Sendo dicionários destinados ao público geral ou aos aprendentes da língua, é natural que
não contenham tantas terminologias como os seus homólogos especializados em
determinada área.
3.1 Resumo dos resultados
Resumindo, para os 132 respondentes, maioritariamente do sexo feminino e dos
níveis intermédios, os dicionários mais populares são, por ordem descrescente, o DPC,
DPLP, DLP e DCCP. Os dicionários bilingues são relativamente mais preferidos pelos
aprendentes dos níveis elementares e intermédios, enquanto os monolingues ganham mais
popularidade nos de proficiência avançada. Os respondentes apreciam um dicionário
normalmente pela sua quantidade satisfatória de verbetes, explicações entendíveis e
completas e apresentação de provérbios, expressões idiomáticas e exemplos das palavras,
ao passo que os utilizadores dos dicionários bilingues prestam atenção especial aos
sinónimos, equivalentes e uso diferentes das variedades de português.
Os respondentes estão, em geral, satisfeitos com os dicionários que utilizam. Tal
como suposto pela autora, os formatos eletrónicos, sobretudo as aplicações nos
telemóveis e tablets, são os mais utilizados. A consulta do dicionário, para os aprendentes
chineses, destina-se principalmente aos trabalhos relativos à leitura e produção escrita.
76
Os respondentes escolhem os dicionários em papel por conterem informações completas
e únicas, sem necessidade de energia elétrica ou ligação à Internet. Os dicionários em
formatos eletrónicos, por sua vez, são apreciados pela consulta eficaz, atualização
constante e exemplos recentes e pelas multifunções como o áudio de pronúncia,
conjugação e o “caderno das palavras”. Quanto aos dicionários bilingues existentes, por
limites de espaço e época de publicação, são depreciados pela quantidade reduzida de
verbetes, definições e exemplos obsoletos e equivalentes não contextualizados. Os seus
homólogos monolingues também são criticados pela definição incompreensível para os
estrangeiros, que pode ser resolvida de certo modo pelos dicionários eletrónicos, e pela
falta de exemplos e do contexto em que se aplica a palavra. A par disso, faltam a ambas
as categorias provérbios e/ou expressões idiomáticas.
Para os respondentes, ao consultar as palavras gramaticais, designadamente o
pronome, advérbio, conjunção e preposição, as informações que contêm no dicionário
não conseguem satisfazer as necessidades de aprendizagem, ao passo que, nos verbetes
das categorias substantivo, verbo e adjetivo, se tem acesso às informações procuradas.
Além do significado, os elementos mais procurados dizem respeito ao uso da palavra,
incluindo os seus exemplos de uso, colocações, provérbios e/ou expressões idiomáticas
relacionadas e contexto, que também são os mais ausentes no dicionário.
Em síntese, são monótonos e antigos os dicionários de língua portuguesa existentes
no mercado chinês, que se encontra por desenvolver. Seja monolingues seja bilingues,
não conseguem satisfazer as necessidades dos aprendentes chineses no âmbito de
aplicação de certa palavra. Espera-se que, na futura elaboração de dicionários, os
lexicógrafos possam levar em conta tais demandas e se empenhem em disponibilizar mais
dicionários em formato digital.
77
Capítulo IV – Análise dos dicionários
Baseando-se nos resultados do questionário no capítulo anterior, foram selecionados
para a análise no presente capítulo os quatro dicionários mais utilizados, bem como os
seus formatos disponíveis, a saber, o Dicionário Português-Chinês (DPC), em versão
impressa e eletrónica, o Dicionário da Língua Portuguesa (DLP) em papel, a Infopédia
online e a respetiva aplicação, o Dicionário Priberam da Língua Portuguesa (DPLP),
com a versão online e aplicação disponíveis, e o Dicionário Conciso Chinês-Português
(DCCP).
4.1 Análise da macroestrutura
Antes de tudo, será pertinente tomar conhecimento primeiro, por detalhes, das
informações básicas dos dicionários por analisar. Como a seguinte tabela demonstra, ao
contrário do que aconteceu aos dicionários monolingues, os dois dicionários bilingues
não experimentaram nenhumas atualizações. Simultaneamente, a aplicação do DPLP foi
também ignorada desde 2014; sendo assim, os verbetes na aplicação não serão incluídos
na análise. Com exceção do dicionário chinês-português, os outros três contêm um
número considerável de entradas, sobretudo os monolingues, que contam com mais de
100 000 entradas. No que diz respeito às fontes do dicionário, nenhum deles se baseia em
corpora, enquanto as entradas chinesas no DCCP foram selecionadas de um dicionário
de autoridades de chinês e o DPLP tem por base o Novo Dicionário Lello da Língua
Portuguesa, publicado pela Lello Editores entre 1996 e 1999. Os dicionários restantes,
por sua vez, foram todos frutos da elaboração autónoma dos autores ou editoras.
Tabela 3 – Comparação dos dicionários
Ano de
publicação
Última edição /
atualização
Número de
entradas Fonte
78
DPC 2001 N/A Cerca de 70 000 N/A
DCCP 1997 N/A Por volta de 25 000
Dicionário
Moderno da
Língua Chinesa
DPLP
2008 (versão
online)
2011 (aplicação)
2018 (versão
online)
2014
(aplicação)
115 82134
Novo Dicionário
Lello da Língua
Portuguesa
DLP 1952 2017 Mais de 260 000
definições35 N/A
Formato
digital do
DLP
2003 (Infopédia)
2011 (aplicação) 2018 Mais de 120 000 DLP
Em relação à macroestrutura, todos os dicionários impressos supramencionados
adotam a ordem alfabética; entre estes, o DCCP, sendo um dicionário com chinês
enquanto língua-fonte, disponibiliza dois sistemas de indexação para a consulta, um por
radicais e outro por pinyin, como o Anexo V ilustra. Paralelamente, o DPLP também
possibilita a pesquisa reversa, que permite “encontrar os verbetes que apresentam no seu
interior as palavra(s) digitada(s)”, designadamente, por meio da pesquisa de uma palavra
ou várias palavras, das “sequências de caracteres delimitadas por asterisco (como chav*
e *iscar)” e das abreviaturas aplicadas nos dicionários (como adv. e fam.). Também é
viável na pesquisa a combinação de qualquer uma das opções referidas, como “s. m. fam.
bac*” (Dicionário Priberam, 2018). A Infopédia, por sua vez, não está equipada com
tantas funções no âmbito da pesquisa reversa, a qual sugere apenas no quadro da pesquisa,
por ordem alfabética, alguns lemas cujos exemplos, colocações ou expressões idiomáticas
contêm a palavra digitada, como mostra a Figura 3. A par do referido, tanto o DPLP como
a Infopédia, acrescida a sua aplicação, permitem a pesquisa das formas flexionadas dos
34 Como referido, no site oficial do DPLP não está disponível essa informação, retirou-se o dado da apresentação do
Observatório da Língua Portuguesa publicada em 2016, através do link https://observalinguaportuguesa.org/lingua-
portuguesa-esta-mais-rica-dicionario-priberam-tem-mais-de-840-novas-palavras-desde-o-inicio-do-ano/
35 No dicionário impresso não foi indicado o número das entradas.
79
lemas, designadamente, o verbo conjugado, a forma feminina, plural e até advérbios com
sufixo de “-mente”, derivados dos adjetivos, que não foram registados nos dicionários
impressos, o que favorece significativamente aos aprendentes estrangeiros que não estão
familiares com as regras de flexão em português.
Figura 3 - Resultado de pesquisa
No que diz respeito ao textos externos dos dicionários, a saber, “o prefácio,
introdução, lista de abreviaturas usadas no dicionário, informações sobre a pronúncia,
resumo da gramática, lista de siglas e/ou abreviaturas, lista de verbos irregulares, lista de
nomes próprios, lista de provérbios, bibliografia, fontes, às vezes, certas curiosidades”
(Welker, 2004: 79), todas as obras em análise contêm o guia de utilização e a lista de
abreviaturas aplicadas, que se encontram no início dos dicionários impressos ou na página
principal dos dicionários online, não existindo, contudo, nas respetivas aplicações. Em
relação aos apêndices, o DCCP incorporou a Lista dos Carateres Simplificados Chineses
e as Unidades de Peso e Medida. Sendo um dicionário chinês-português e considerando
a era da publicação – os anos 90 –, em que o governo chinês ainda estava a promover os
carateres simplificados, a incorporação de tal lista não é de estranhar. As últimas
costumam permanecer nos dicionários destinados aos chineses, visto que a China adotava
sistema de medição próprio antigamente.
O DPC, por sua vez, inclui uma série de apêndices que consideraram úteis para a
80
aprendizagem dos alunos, incluindo a Lista de Conjugação dos Verbos, a Lista das
Traduções Chinesas para os Nomes Próprios Comuns em Português, a Lista das Regiões
e Países Importantes no Mundo, a Lista dos Numerais, a Lista dos Elementos Químicos,
a Lista das Unidades de Medida e a Lista de Classificação Militar de Portugal e Brasil. O
DLP, por seu turno, registou no final a lista das palavras e expressões estrangeiras, bem
como a das abreviaturas, siglas e símbolos. Sendo um dicionário que deu destaque ao
Acordo Ortográfico, também foi incorporado o Guia do Acordo Ortográfico, que descreve,
por detalhes, as mudanças instituídas pelo Tratado.
Acerca do DPLP e da Infopédia, na página principal do primeiro estão apresentados
o resumo da gramática portuguesa e uma série das ligações úteis para o uso de português,
como os auxiliares de tradução, conjugador e corretor ortográfico e sintático, a que,
todavia, não se tem tido acesso ao longo do tempo, provavelmente por erros técnicos. A
Infopédia, de facto, é um site que integra todos os dicionários publicados pela Porto
Editora, com o DLP enquanto o seu dicionário default. Assim sendo, no site tem-se um
acesso fácil a um leque vasto de dicionários, tais como o de toponímia, antroponímia e
termos médicos, bem como os que envolvem outras línguas como inglês, espanhol e
chinês. Lamentavelmente, as informações supramencionadas não existem nas respetivas
aplicações, o que pode ser atribuído ao atraso do desenvolvimento do mercado português
das aplicações. No caso dos chineses, que preferem substancialmente a consulta nos
telemóveis, tal falta não é benéfica para a promoção dos dicionários no mercado,
resultando, supostamente, nas cópias-pirata36, como o que acontece ao DPC impresso.
4.2 Análise da microestrutura
Os resultados do questionário realizado demonstraram que os aprendentes
necessitam de informações relativas ao uso dos lemas de consulta; portanto, em seguida
proceder-se-á à comparação dos verbetes dos quatro dicionários em análise.
36 Como se explicou no Capítulo I, tanto o governo como os chineses, em geral, não prestam atenção à propriedade
intelectual, levando a que muitos dicionários impressos tenham sido ilegalmente compilados nos formatos eletrónicos.
81
Figura 5 – Verbete de "entender" na Infopédia
Toma-se o verbo “entender” como exemplo, entre os três formatos do DLP,
nomeadamente, a edição impressa, a versão online (Infopédia) e a aplicação. O verbete
na Infopédia é o mais integral, já que disponibiliza a remissão às conjugações, apresenta
a transcrição fonética, que não existe na edição impressa nem na aplicação, e incorpora a
componente de “Como usar o verbo” que apresenta as colocações preposicionais mais
comuns desse lema. Não obstante o facto de que a aplicação do DLP 37 acrescentou
também a componente referida, foram omitidos nesse formato os significados e exemplos
dessas expressões. Aliás, uma grande parte das aceções são apresentadas por sinónimos
no DLP/Infopédia, não envolvendo muitas palavras em que os estrangeiros podem ter
37 Como o conteúdo na aplicação é quase idêntico ao do Infopédia, não se apresentou a captura na aplicação no presente
capítulo.
Figura 4 – Verbete de "entender" no DLP
82
dificuldades e permitindo a consulta rápida, por um clique, de qualquer palavra nas
aceções. Tal função, infelizmente, não foi concretizada na sua aplicação.
Comparando com DLP, o DPLP adota uma linguagem menos acessível, como a
aplicação das palavras como “apossar-se”, “superintender” e “rixa”, que são ainda mais
difíceis do que o próprio lema “entender” (ver Figura 6). Embora o site também possibilite
a remissão rápida aos verbetes de qualquer palavra na definição, demasiadas palavras
desconhecidas frustrariam a aprendizagem da língua portuguesa por parte dos utilizadores
estrangeiros. A falta de exemplos, colocações ou expressões idiomáticas, que podem
ajudar na compreensão do vocábulo, dificultaria ainda mais a aquisição e aplicação do
lema, considerando que “entender” é um verbo que aparece com alta frequência tanto nas
atividades de produção como nos materiais de receção. Neste caso, a Infopédia manifesta
relativamente um melhor desempenho na disposição do verbete para os utilizadores
estrangeiros.
Figura 6 – Verbete de "entender" no DPLP
83
Figura 7 – Verbete de "entender" no DPC (pp. 413)
O DPC, por sua vez, detalhou muito mais a definição de “entender”. Para além de
incluir as aceções que o DLP e DPLP incorporaram, abrange também as aceções como a
número 6 “ouvir” na classe de verbo transitivo, a 1ª “prestar atenção, cuidar” e a 3ª
“[Direito] conhecer, admitir” no intransitivo, e a 4ª “ser ajuizado” e a 6ª “compreender-
se sem explicar” na classe pronominal. Das aceções pode-se inferir que o DPC pretende
enumerar o maior número de aceções possível para os seus utilizadores, todos equipados
com colocações e/ou exemplos e as respetivas traduções em chinês, no intuito de alcançar
uma melhor compreensão e aplicação do lema consultado. A par do referido, o DPC
também possui a maior quantidade de expressões idiomáticas entre os dicionários em
análise, destacando também o contexto de uso para algumas expressões como “entender
da poda [coloquial]” e “entender do riscado [Brasil].” Todavia, dada a época de
publicação (em 2001), expressões como “entender de lagares de azeite” e “entender tanto
de um assunto como de lagares de azeite” já não pertencem ao uso corrente nos dias de
hoje. Nesse caso, é possível acontecer que os aprendentes utilizem as expressões que nem
todos os falantes nativos percebem, perdendo, assim, a confiança na aprendizagem.
O verbete em causa no formato eletrónico do DPC é quase idêntico à versão impressa,
faltando apenas a aceção “ouvir”, por lapso do “voluntário” que publicou esse formato.
Lapsos semelhantes também ocorrem no registo errado dos termos como “hemolde” por
“hemoide” e na omissão completa de verbetes, como no caso de “cor” (substantivo
84
feminino), como o anexo VI demonstra. Em outras palavras, apesar da eficácia e
conveniência do formato eletrónico do DPC, os seus utilizadores podem perder algumas
informações importantes, que não foram registadas nesse formato.
Paralelamente, como lidam os dicionários com os substantivos? Ao contrário do que
aconteceu com “entender”, no caso de “escola”, o DPLP apresenta as aceções de forma
mais compreensível, enquanto estas, na Infopédia38 possuem um caráter enciclopédico,
com que os aprendentes podem ter dificuldades e até perder paciência de ler. Contudo,
apesar de ter apresentado as aceções com linguagem acessível, a inexistência de exemplos
pode provocar confusão para os aprendentes chineses, por exemplo, na aceção 3 “Os
professores” pode levar a que os utilizadores do nível elementar façam equivaler os
“professores” à “escola” no uso quotidiano.
Figura 8 – Verbete de "escola" na Infopédia
38 Como os verbetes nas três versões do DLP são idênticos, apresenta-se apenas a captura do verbete no Infopédia.
85
No aspeto de definir os substantivos concretos, os dicionários bilingues e
semibilingues, obviamente, desempenham melhor o seu papel, pelo que um equivalente
na L1 é bem mais eficaz na explicitação do que a descrição exaustiva sobre o que é o
objeto consultado. Sendo um dicionário para aprendizes, nos verbetes dos substantivos
do DPC indica-se também os plurais e formas femininas irregulares como no caso de
“leão” (pl. leões; f. leoa) e “cidadão” (pl. cidadãos; f. cidadã), relembrando aos
utilizadores as formas irregulares.
Figura 10 – Verbete de "escola" no DPC (pp. 432)
Figura 9 – Verbete de "escola" no DPLP
86
Na questão da indicação das grafias das variedades europeia e brasileira, o DPC e
DLP optaram por criar novos verbetes para a brasileira, onde existem remissões para a
forma europeia, enquanto no DPLP e Infopédia têm acesso direto a qualquer forma dos
lemas, com a outra variedade indicada nesse verbete.
Além disso, dos resultados do questionário pode-se comprovar que um número
considerável dos respondentes estão preocupados com as aceções derivadas da sua
palavra-base, que pode ser verbo, adjetivo e substantivo, como no caso de “avaliação”,
“suspensão” e “proporcionar”. Em comparação, enumerou-se as primeiras aceções nos
verbetes dos lemas referidos para verificar se a questão é comum nos dicionários mais
procurados.
avaliação
(DLP e Infopédia)
1. ato de avaliar
2. valor determinado pelos avaliadores
(DPLP)
1. Acto de avaliar.
2.Valor determinado por peritos, apreciação.
(DPC)
1. avaliar 的行为 (ato de avaliar39)
2. 定价,估量,计价,标价 (equivalentes que significam valor determinado, estimação,
valor indicado )
suspensão
(DLP e Infopédia)
1. ato ou efeito de suspender(-se)
2. estado do que se acha suspenso ⟨o sistema de suspensão de uma ponte⟩
(DPLP)
1. Acto ou efeito de suspender.
2. Estado de algo que está suspenso.
(DPC)
1. suspender 的结果和行为 (efeito e ato de suspender)
2. 暂停,停止 (equivalentes que significam pausa e cessação)
39 Os enunciados entre parênteses são traduções das aceções no DPC.
87
~ de um jornal 报纸停刊; ~ de um pagamento 停止付款; ~ de um cargo 停职
proporcionar
(DLP e Infopédia)
1. fazer com que haja proporção entre duas ou mais coisas
2. tornar proporcional
(DPLP)
1. Fazer com que duas coisas conservem entre si uma determinada proporção. =
HARMONIZAR, ADAPTAR
2. Tornar ou tornar-se proporcional.
(DPC)
1. 使成比例,使匀称;使均衡;使协调 (tornar proporcional, tornar bem proporcional;
tornar equilibrado; tornar harmonizado)
~ uma estátua ao pedestal 使塑像与底座成比例
Baseando-se nos três exemplos, constatou-se que a questão da aceção
incompreensível para os utilizadores estrangeiros está enraizada em todos os três
dicionários. Por exemplo, nos verbetes de “avaliação”, não conseguirão compreender a
primeira aceção sem conhecer a palavra “avaliar”, mesmo no DPC, um dicionário
destinado aos aprendentes chineses. No caso dos lemas “suspensão” e “proporcionar”, os
utilizadores ainda precisam de tomar conhecimento primeiro dos significados dos lemas
“suspender” e “suspenso”, bem como “proporção” e “proporcional” ao consultar o DLP
e DPLP. O DPC, neste caso, desempenhou as vantagens do dicionário semibilingue, tendo
apresentado equivalentes em chinês para uma melhor compreensão, com as colocações
enquanto auxílio. O DPLP, ao definir “proporcionar”, também disponibilizou os
sinónimos do lema para ajudar na compreensão. Como se referiu no capítulo anterior,
apesar de que os dicionários monolingues online possibilitem o acesso rápido aos verbetes
de qualquer palavra que apareça nos verbetes, as aceções incompreensíveis para os
aprendentes chineses, evidentemente, complicaram a consulta. Mesmo o DPC, um
dicionário bilingue, também não consegue evitar recorrer a tal maneira de definir,
dificultando a consulta dos seus utilizadores.
88
Figura 11 – Verbete de "理 lǐ" no DCCP (pp. 377)
O DCCP, sendo um dicionário com o chinês enquanto língua-fonte, apresenta uma
estrutura diferente das obras supramencionadas. As palavras iniciadas com um mesmo
carater simplificado foram agrupadas juntas. Se o carater principal for importante e
ocorrer com alta frequência em chinês, como o verbete de “理” na Figura 11, enumeram-
se também as palavras ou expressões que o contêm, mas que não se iniciam com esse
carater. Todas as entradas são equipadas com o pinyin, equivalentes ou traduções, e
colocações e/ou exemplos curtos, tentando disponibilizar uma obra simplificada e prática
para ajudar na aprendizagem da língua portuguesa dos chineses. Considerando a época
de publicação do DCCP, em 1997, não se indicou as grafias antes e depois do Acordo
Ortográfico, sendo a maioria das palavras apresentadas pertencentes à variedade europeia.
A época também carregou o dicionário de marcas históricas por ter registado alguns
carateres e palavras chineses que já não pertencem ao uso corrente, como o verbete “妣
89
mãe defunta”, “货郎 vendedor ambulante” e “麇集40 reunir-se; agrupar-se”. Todavia,
algumas palavras de uso corrente, como “暂停41” e “纸巾42
”, não foram registadas na obra.
Certos equivalentes e/ou traduções também não são precisas, como o exemplo de “反馈”,
que atualmente traduzimos por “feedback”, os equivalentes que apresentou são
“realimentação; alimentação de retorno”, que, de facto, já não são utilizados para se
referir a esse conceito hoje em dia. No verbete “computador”, em chinês “电脑”, além do
equivalente, foi apresentada também a tradução literal “cérebro eletrónico”, pelo que esse
primeiro carater designa “eletrónico” e o último, “cérebro”. As marcas históricas também
se refletem no registo de uma série de termos políticos com caraterísticas chinesas, como
“o ideal nobre do comunismo”, “construção socialista” e “membro da Liga da Juventude
Comunista”, considerando as necessidades dos estudantes universitários que se
envolveriam na leitura, tradução e produção dos textos relativos à política.
Em suma, todos os três dicionários com português enquanto língua-fonte têm os seus
defeitos. No caso dos dois dicionários monolingues, as informações que constam nas
versões online são mais integrais do que nos seus outros formatos. Por lapsos do
“voluntário”-pirata, o formato eletrónico do DPC também não contém tantas informações
como a edição impressa. A respeito dos elementos que fazem parte do verbete, o DPC
abrange mais informações relativas ao uso do lema do que quaisquer formatos dos outros
dois homólogos monolingues e demonstra um melhor desempenho em relação à definição
dos substantivos concretos; contudo, tomando em conta que a obra foi publicada há 17
anos, é inevitável que contenham aceções, colocações e expressões idiomáticas obsoletas,
o que diminuiu a sua competitividade. Aliás, constatou-se que a questão da definição
incompreensível é um problema comum em todos os três dicionários referidos, que não
deve ser negligenciado pelos lexicógrafos sino-lusófonos. Apesar de o DCCP ter
desempenhado o seu papel de dicionário para produção, a obra publicada há 21 anos
também possui deficiências resultantes do ano de publicação e de entradas limitadas,
40 As três palavras referidas eram todas utilizadas nos tempos antigos. 41 Significa “suspensão, pausa” ou “suspender, parar” em chinês. 42 Significa “guardanapo”, normalmente de bolso.
90
necessitando de uma edição revisada e atualizada.
4.3 Uma proposta de um dicionário ideal para os aprendentes chineses
Tendo analisado os dicionários mais procurados entre os chineses e baseando-se nos
resultados do questionário, estão resumidas, no presente subcapítulo, as caraterísticas
com que um dicionário ideal se deve equipar para os falantes da língua chinesa. Importa
salientar que a proposta foi realizada completamente do ponto de vista académico e das
necessidades dos utilizadores, não levando em conta os fatores práticos como a sua
viabilidade no mercado e os investimentos estimados.
Com base nas preferências, frequência e hábitos de uso dos chineses, é aconselhável
publicar um dicionário eletrónico bilingue ou semibilingue, de português para chinês,
preferencialmente como aplicação, o qual pode ter por base, por exemplo, o DLP ou DPLP.
Falando de aspetos técnicos, a aplicação deve ser atualizada constantemente a nível
técnico e lexicográfico e disponibilizar as remissões às conjugações dos verbos. Deve
permitir também a consulta rápida de qualquer palavra portuguesa que apareça na
definição, bem como pesquisa reversa e de formas flexionadas dos lemas. Considerando
que um número considerável dos respondentes se preocupa com questões de energia e
dados de Internet, pode possibilitar a função de “dicionário offline” na aplicação, que já
foi realizada em bastantes aplicações na área. A função de “caderno dos vocabulários”
também pode ser incorporada na aplicação para que os utilizadores possam rever e estudar
os vocábulos que consideram importantes.
Em torno dos aspetos lexicográficos, pode tomar-se como referência os dicionários
para aprendizes, que ganharam enorme popularidade no mercado chinês, como o Oxford
Advanced Learner’s English-Chinese Dictionary, que contém uma quantidade
considerável de entradas (neste caso de 70 000 a 100 000, levando em conta os números
de entradas dos dicionários analisados) e registando nos verbetes, conforme o princípio
de frequência, os exemplos, colocações e expressões idiomáticas mais comuns do uso
corrente nos dias de hoje, bem como as respetivas traduções, de forma a satisfazer as
91
necessidades dos aprendentes chineses. A respeito da questão da definição
incompreensível, como “ato ou efeito de X (verbo)” e “estado de algo que é/está Y
(adjetivo)”, acresce-se à definição a tradução ou equivalente em chinês, com a finalidade
de evitar que tal incómodo aconteça novamente. As marcas de uso também serão
necessárias para informar os utilizadores do contexto de uso. A par disso, será também
bem-vinda a indicação da variedade brasileira (supõe-se que seja um dicionário que tem
como foco a variedade portuguesa) e as grafias diferentes antes e depois do Acordo
Ortográfico; o registo da transcrição fonética e pronúncia em áudio seria opcional. Caso
forneça a pronúncia em áudio, idealmente deve ser gravado por falantes nativos.
Evidentemente, tal proposta é idealista visto que exige investimentos em grande
escala tanto nos lexicógrafos especializados como na tecnologia para a concretizar. O seu
público-alvo relativamente mais pequeno, se comparado com o de inglês e japonês,
também poderá dificultar a elaboração de tal aplicação de dicionário da língua portuguesa
na China. Seja como for, espera-se ainda que tal proposta possa servir de referência para
a construção de um dicionário eletrónico à medida do crescimento do grupo dos
aprendentes da língua portuguesa no futuro.
92
Conclusão
Ao longo do presente trabalho, em torno do uso do dicionário, foram abordadas em
detalhes as estruturas de um dicionário, bem como as componentes que as constituem.
Foram apresentados também os tipos mais comuns de dicionários, tomando como
exemplos aqueles mais conhecidos a nível internacional e as obras existentes relevantes
para a lexicografia portuguesa. Tendo por base o enquadramento teórico, foi realizado um
questionário para os aprendentes chineses da língua portuguesa, no intuito de tomar
conhecimento sobre o uso do dicionário por tal grupo. Procedeu-se, por consequência, às
análises dos quatro dicionários mais procurados entre os respondentes, comparando as
suas vantagens e deficiências, de forma a resumir as caraterísticas que deve possuir um
dicionário ideal destinado aos estudantes chineses de português.
Um dicionário é considerado como uma obra de referência que se destina a registar
o léxico de uma língua, a fim de fornecer aos seus utilizadores uma ferramenta que os
ajude a encontrar com rapidez as informações que procuram para os efeitos de produção
e compreensão dessa língua. A respeito da estrutura de um dicionário, pode-se considerar
que é composto por macroestrutura, microestrutura e medioestrutura.
A macroestrutura relaciona-se com o conjunto de entradas e a disposição desse
conjunto, funcionando geralmente por ordem alfabética na maioria dos dicionários
modernos da língua. A microestrutura, por sua vez, é composta principalmente pela
cabeça de verbete, definição, colocações, exemplos e expressões idiomáticas, enquanto
as últimas três nem sempre marcam presença nos dicionários. A medioestrutura refere-se
à estrutura das remissões, que auxiliam os utilizadores a localizar as informações
espalhadas dentro ou fora do dicionário, com a finalidade de evitar repetições e
economizar espaço.
Quanto aos diferentes tipos de dicionário, foram abordados detalhadamente os
quatros tipos mais comuns, a saber, o dicionário monolingue geral, o dicionário para
aprendizes, o dicionário bilingue e o dicionário semibilingue. O primeiro foi considerado
prototípico pelo que é aquele que surge primeiro à nossa mente ao pensar no termo
93
“dicionário” e que é mais procurado e consultado. O dicionário para aprendentes é uma
obra destinada aos alunos estrangeiros de uma língua, para fins pedagógicos, sendo
descrita com uma linguagem mais acessível e contendo mais exemplos e informações
sintáticas. O dicionário bilingue, bem como o dicionário semibilingue, são alvo de
preferência dos aprendentes de língua estrangeira. Apesar de tal preferência, o dicionário
mais popular e integral de português-chinês ainda é o DPC, publicado em 2001, refletindo
a escassez das obras lexicográficas de referência para o português no mercado chinês.
No que diz respeito à utilidade do dicionário, várias pesquisas verificaram que o uso
de dicionário exerce, em certo grau, impactos positivos à aprendizagem da língua
estrangeira, ao passo que as espécies bilingues e semibilingues são consideradas mais
eficazes em promover a aprendizagem.
Como não fora concretizada qualquer pesquisa acerca do uso por aprendentes
chineses da língua portuguesa, foi realizado um questionário online para estudantes
universitários em torno de quatro perguntas: i) Que dicionários os aprendentes chineses
utilizam? ii) Com que frequência e em que contexto eles utilizam? iii) Quais são as suas
opiniões em relação aos dicionários que conhecem? iv) O que eles procuram da consulta
no dicionário?
Os 132 resultados recolhidos responderam às perguntas referidas, retratando para
nós o perfil acerca do uso do dicionário dos estudantes chineses: preferência prevalente
pelo DPC e pelos formatos eletrónicos; consulta ao envolver-se nas atividades de
produção e compreensão escritas; valorização dos verbetes em grande quantidade,
definições e exemplos mais recentes e marcas de uso, bem como os exemplos e
expressões idiomáticas; dificuldades em encontrar as informações que procuram ao
consultar lemas gramaticais como preposições, conjunções e advérbios; demanda de
informações relativas ao uso como exemplos, colocações e expressões idiomáticas.
Quanto às análises dos dicionários mais populares entre os aprendentes chineses,
chegou-se a conclusão de que, apesar de o DPC conter mais informações de uso do que
todas as versões do DPLP e DLP, também foi depreciado pelas suas informações
94
relativamente obsoletas. O mesmo também aconteceu ao DCCP, que se limitou à época
de publicação, sendo carregado de marcas históricas.
Com base no enquadramento teórico, pesquisa realizada e análises feitas, foi
apresentada uma proposta em relação ao dicionário ideal para os utilizadores chineses,
que se carateriza pela sua natureza eletrónica e bilingue ou semibilingue, por ter entradas
completas e informações relativas ao uso enriquecidas e equipadas com traduções e a
melhoria na definição dos lemas derivados de outras formas. Por ser um dicionário
eletrónico, as funções enriquecidas serão também indispensáveis para satisfazer as
necessidades dos aprendentes.
Sendo um trabalho restrito ao uso do dicionário por chineses, ainda existem aspetos
que necessitam de mais discussão a respeito de, por exemplo, corpora, dicionários da
variedade brasileira, como o Aurélio, o Michaelis e o Houaiss, e os dicionários eletrónicos.
Seja como for, espera-se que o presente trabalho já seja capaz de ilustrar a realidade dos
dicionários da língua portuguesa no mercado chinês e o seu uso, além de apresentar uma
proposta preliminar de uma obra ideal para os utilizadores desse território. Apresenta-se
aqui também a esperança de que as observações primitivas do presente trabalho possam
inspirar pessoas competentes a envolverem-se na construção dos dicionários sino-
portugueses necessários, preenchendo as lacunas que permanecem ao longo do tempo.
95
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100
Anexo I – Versão Chinesa do Questionário-piloto
101
102
103
104
105
106
Anexo II43 - Versão Portuguesa do Questionário-piloto
43 No questionário, a palavra chinesa em azul, “多选题”, que fica no final das perguntas de escolha múltipla,
significa “Escolha Múltipla”. Sendo uma plataforma exclusiva para utilizadores chineses, o site apenas possui a
versão chinesa.
107
* As opções da pergunta 2 baseiam-se na escolha na pergunta 1. Será apresentado
abaixo um exemplo para a visualização da pergunta 244.
* Caso tenha escolhido as primeiras três opções na pergunta 1, a pergunta 2 ficará
como a seguinte45:
44 A frase chinesa no final da pergunta 2, “此题选项来源于1题中的选项,请先填写第1题”, significa “As opções da
presente pergunta originam-se das escolhas da pergunta 1; por favor preencha a pergunta 1 primeiro”.
45 A frase chinesa em cima do quadro de ordem, “拖动或点击右侧的选项到左边的次序位置进行排序”, significa
“Arraste ou clique as opções à direita do quadro para a esquerda, para as ordenar”.
108
* Tal como na pergunta 2, as opções da 4 também se baseiam na escolha na pergunta
1. Será apresentado abaixo um exemplo para a visualização da pergunta 4.
109
* Caso tenha escolhido as primeiras três opções na pergunta 1, a pergunta 4 ficará
do seguinte modo:
110
111
112
113
114
Anexo III – Versão chinesa do questionário
115
116
117
118
119
120
Anexo IV – Versão portuguesa do questionário
121
122
123
124
125
126
Anexo V – Sistemas de indexação
Sistema de indexação por radicais
127
Sistema de indexação por yinpin
128
Anexo VI – Digitalização dos verbetes de “cor” no DPC