O Papel da Família na Educação Midiática dos Filhos 1 · educação dos filhos frente a ......
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Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação XIX Congresso de Ciências da Comunicação na Região Sudeste – Vila Velha -‐ ES – 22 a 24/05/2014
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O Papel da Família na Educação Midiática dos Filhos 1
Franciani BERNARDES2
Faculdade do Centro Leste - UCL Teresa TORRECILLAS3
Universidad CEU San Pablo Juliana COLUSSI4
Universidad Complutense de Madrid
RESUMO
A exposição descuidada de crianças e adolescentes diante da televisão é um tema de discussão que repercute de forma cada vez mais frequente na nossa sociedade. A instrução parental torna-se necessária no atual contexto das tecnologias da informação e da comunicação. Com o objetivo de informar pais, professores, educadores e apontar novos resultados à comunidade acadêmica, este trabalho aborda uma série de questões sobre as formas de educação familiar diante da TV. Os resultados deste trabalho foram obtidos por meio da técnica metodológica de entrevistas em profundidade. As respostas cruzadas dos adultos e das crianças revelam semelhanças e diferenças sobre os usos e valores observados entre as gerações. PALAVRAS-CHAVE: Infância; televisão; educação midiática; mediação familiar 1. Introdução
Esta comunicação tem o propósito de difundir os resultados de um projeto de pesquisa
financiado pelo Ministerio de Ciencia y Tecnología da Espanha, titulado: “Producción
de contextos de recepción de la audiencia infantil en España: el lugar de la familia”
(SEJ2005-05805). Este estudo situa os pais como os principais agentes socializadores da
criança nas relações que estabelecem com a televisão e como principais responsáveis da
educação dos filhos frente a outras fontes de mediação como a TV. O objetivo principal
da pesquisa foi detectar e analisar os processos de mediação dos pais e a forma como
essas estratégias de educação midiática são utilizadas. Pretendeu-se, além disso,
verificar a hipótese de que a televisão vem conquistando uma força socializadora cada
vez maior.
1 Trabalho apresentado no DT 6 – Interfaces Comunicacionais do XIX Congresso de Ciências da Comunicação na Região Sudeste, realizado de 22 a 24 de maio de 2014. 2 Professora doutora da Faculdade do Centro Leste (UCL), email: [email protected]. 3 Professora doutora da Universidad CEU San Pablo, email: [email protected]. 4 Pesquisadora doutora da Universidad Complutense de Madrid, email: [email protected].
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Os direitos das crianças e dos adolescentes têm sido um tema de grande preocupação
política e cívica. Atualmente, há uma grande sensibilidade sobre a necessidade de velar
pela proteção dos menores com o propósito de assegurar um entorno comunicativo que
garanta o desenvolvimento adequado a eles. O debate sobre a qualidade dos conteúdos
televisivos existe desde quando surgiu o meio. No entanto, foi nos anos 1990 quando
surgiu uma acirrada luta pelas audiências, transformando o meio em um negócio,
dificultando o crescimento de conteúdos cujos valores parecem ser pouco rentáveis à
indústria audiovisual, tais como a difusão da cultura, da educação, da diversidade de
opinião e do pluralismo.
O desenvolvimento tecnológico contribuiu com a mudança de hábito de consumo
televisivo das crianças. Com o aumento do número de aparelhos nas casas, a TV passou
para o quarto dos menores, estimulando formas de visionamento menos gregárias e mais
individuais. Esse comportamento revela que pais e filhos coincidem cada vez menos
diante do meio.
Nesse contexto, pretendeu-se estudar o papel dos pais como os principais responsáveis
pelo uso que as crianças fazem da televisão. Considera-se a família como o primeiro
cenário de apropriação de sentidos e significados, o lugar onde se deve aprender a fazer
o uso adequado dos meios.
2. Marco teórico
Os estudos culturais britânicos dos anos 1990 incidiam na ideia de que são os membros
da audiência os que atribuem sentido aos conteúdos televisivos. No caso da audiência
infantil, a família é o contexto natural e mais próximo da criança, é o lugar onde ela
estabelece suas relações com o meio e onde encontra os recursos necessários para
negociar com seus significados (Torrecillas, 2010). A chave para as crianças
interpretarem as mensagens audiovisuais de forma adequada, sem a necessidade de
estarem diretamente influenciadas por conteúdos nocivos ao seu desenvolvimento, está
no uso adequado e responsável do meio. O grande desafio dos pais é justamente criar
um ambiente de recepção apropriado, capaz de favorecer condições físicas - de modo a
organizar de forma adequada o lugar que ocupa o televisor- e intelectuais – com
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competências para interagir com as mensagens – atributos necessários para equilibrar a
indiscutível força socializadora do meio.
O fundamento teórico desta linha de pesquisa procede não apenas do âmbito da
comunicação, mas também da sociologia e da psicologia social, o que justifica e
esclarece o carácter interdisciplinar deste tipo de estudo. Não se pode estudar o
comportamento da criança ou a adoção de valores e atitudes sem considerar o entorno
no qual a criança se desenvolve como elemento constitutivo que explica o
comportamento humano. No caso da presente pesquisa, a relação entre pais e filhos,
condiciona a forma na qual a criança se relaciona com o meio e o modo no qual se verá
afetado pelo mesmo (Torrecillas, 2011).
Contexto é a unidade básica de análise do entorno, cenário específico, concreto e
particular no qual se observam tipos de conduta regulares (Martí, 2005: 140-141). O
contexto de recepção televisiva infantil é a unidade básica de análise das relações entre
o menor; e a televisão é o cenário específico, concreto e particular onde é possível
observar o comportamento da criança em relação ao meio. O conceito fundamental no
campo da recepção é o da mediação entendida como “instancia cultural desde donde el
público de los medios produce y se apropia del significado y del sentido del proceso
comunicativo” (Martín Barbero, 1987) ou como “proceso estructurante que configura y
reconfigura tanto la interacción de los miembros de la audiencia con la televisión como
la creación por ellos del sentido de esa interacción” (Orozco, 1996: 74). As audiências
infantis, da mesma forma que as audiências em geral, interagem com a televisão a partir
de condicionantes determinadas pela mediação dos diferentes contextos nos quais vivem
imersos.
“Es necesario por tanto comprender el entorno de la televisión como un entorno estimular que vehicula información en formas nuevas, y analizar los diversos mecanismos y modalidades en que la información culturalmente mediada se presenta” (Del Río, 2004: 109).
A família é fundamental no estudo da interação social. É o lugar onde a criança irá
assimilar as dimensões mais significativas da interação. É onde se instaura o processo
de socialização do menor, onde se constituem os esquemas relacionais que irão
influenciar na forma de se relacionar com os outros no futuro. Na realidade, é onde se
produzem as relações afetivas mais profundas (PICARD, 1992). A família “representa
a la vez un modelo y un ejemplo del sistema interactivo que implica una especialización
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de roles y actitudes, una relación de lugar, normas relacionales y un conjunto de
representaciones y valores que orientan las conductas” (PICARD, 1992: 155).
“La familia es – al igual que en los restantes aspectos del desarrollo del niño- uno de
los agentes mediadores más determinantes en la relación que el niño establezca con la
pequeña pantalla, tanto en lo que respecta a los tiempos y dietas de consumo, como en
los modos de visionado de contenidos y los posibles beneficios o perjuicios cognitivos y
morales que deriven de esa relación” (DEL RÍO, 2004: 286).
As pesquisas desenvolvidas na Espanha sobre mediação familiar coincidem ao apontar
os pais como potenciais mediadores na relação da criança e da televisão, “ya sea como
mediador que potencia la resistencia a efectos o como amplificador. (…) Cabe admitir
la relación causal entre medio de comunicación, familia y niño” (García Matilla, 2004:
16). “Visto desde esta perspectiva, la relación del niño con la televisión es más
comprometedora para los propios entornos familiares que para los programadores y
los empresarios” (LADEVÉZE, 2006: 172).
Entende-se por mediação é o processo pelo qual os pais e outros responsáveis pela
educação das crianças as ajudam a decodificar e a compreender a complexidade do
ambiente em que vivem. Nesse processo, os agentes mediadores transformam os
produtos audiovisuais em termos de fácil compreensão para as crianças em suas
diferentes fases de desenvolvimento. O processo de mediação, promovido pelos pais, os
auxilia no processo de criar, reforçar, transformar, contradizer e estruturar as
informações, inclusive as que são transmitidas pela televisão; de forma que lhes permite
confrontar com mais facilidade os temas cotidianos. O próprio trabalho dos meios de
comunicação é, por sua natureza, um trabalho de construção social. A elaboração da
representação de tudo o que acontece no mundo e a escolha de determinados
acontecimentos para torná-los públicos, são mediações próprias dos meios de
comunicação (PEREIRA, 1998). Nas palavras de Orozco (1989, p. 13), entende-se por
mediação “o conjunto de elementos que influenciam no processo de aprendizagem e
conformam seu produto final, tanto provenientes do desenvolvimento cognoscitivo do
sujeito, como de sua cultura”.
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O diálogo que os pais estabelecem com seus filhos sobre seus hábitos de uso e sobre o
tempo de exposição aos meios de comunicação são os fatores mais importantes no
momento de determinar o poder socializador dos meios. Quando não existe esse
diálogo, as crianças estarão mais expostas às influências, com possibilidade de
potencializar comportamentos, atitudes e valores. Neste contexto, os meios se
transformam em um modelador da identidade (PÉREZ, 2005).
3. Metodologia
Este trabalho utiliza o método de análise qualitativo e a técnica metodológica entrevista
em profundidade. A razão de ser da opção metodológica foi por considerar a forma de
interação verbal a mais adequada aos objetivos apresentados. Além disso, entende-se
que a entrevista permite obter informação diretamente dos objetos de análise, assim
como conhecer por meio dos adultos a forma como eles mediam a relação que os filhos
estabelecem com o meio em questão.
A mostra foi composta por 48 famílias da Comunidade de Madri. Os sujeitos
entrevistados que participaram da pesquisa são pais com filhos de idades compreendidas
entre 4 e 12 anos residentes em Madrid capital e metropolitano. Os dois critérios
considerados para a seleção da mostra foram a classe social e o número de filhos.
Quatro grupos foram diferenciados segundo sua segmentação social: classe média alta,
classe média, classe média baixa e classe baixa. Os fatores considerados no estudo que
determinaram as categorias de padrão social foram o nível de escolaridade, a ocupação,
o poder aquisitivo e local de residência. É possível compreender o uso que os sujeitos
fazem da televisão considerando duas categorias principais de análise: a forma de
consumo - como assistem à televisão - e as estratégias ou a projeção de sentido
atribuídos à televisão.
O critério aplicado na pesquisa para a seleção dos perfis analisados foi o da
representatividade substantiva, ou seja, em vez de reproduzir em pequena escala as
características da sociedade analisada, cobriu-se as situações sociais de interesse para a
pesquisa.
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Após a transcrição literal das entrevistas, a informação foi processada em fichas gerais
para cada perfil analisado. A seguir, toda a informação obtida foi novamente distribuída
em fichas de integração local com o propósito de codificar os dados por seções segundo
a categoria de análise. Na etapa final, realizou-se a interpretação dos dados e a
apresentação dos resultados.
4. A mediação familiar
Mediação familiar é o termo usado para definir o modo como os pais intervêm na
relação que seus filhos estabelecem com a televisão. Com base na literatura, considerou-
se, tanto desde a comunicação como desde a sociologia, que tal intervenção representa o
elemento mais importante de todos porque estabelece a relação que as crianças irão
desenvolver com o meio.
Uma das primeiras realidades constatadas por meio das análises é que o exercício de
intervenção familiar apresenta uma mediação padrão ou preferente de conduta.
Mediação preferente é o ideário ou conjunto de ideias que os pais sustentam em suas
predisposições volitivas sobre a televisão, e mais concretamente, sobre como deve ser a
relação entre as crianças e a televisão. A esfera de significação que os pais interiorizam
sobre a televisão teoricamente daria sentido aos comportamentos que normalizam em
suas próprias relações com o meio e que logo transmitem aos seus filhos. No ideário dos
pais se situam os critérios sobre como seus filhos devem fazer uso da televisão.
Para determinar a mediação preferente os indicadores estudados foram os seguintes:
critérios gerais que os pais sustentam sobre o meio; representação do meio; valorização
do meio como fonte de influências e valorização de seu possível uso educativo.
Considerou-se como mediação efetiva o modo em que os pais materializam o ideário
que tem sobre a TV assim como sua atuação em relação a seus filhos e a TV, ou seja, a
mediação efetiva faz referência a forma na qual os pais interagem com seus filhos com
respeito à televisão, a partir do significado ou ideário que eles têm sobre o meio. Para
estudar a mediação efetiva indagou-se os seguintes indicadores: sugestões, conselhos e
alternativas oferecidas aos filhos; proibições ou normas sobre televisão; medidas de
controle e obstáculos que interferiam na mediação.
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4.1. Características da mediação na recepção televisiva infantil
A recepção televisiva infantil é um processo complexo que define a natureza da relação
que o menor estabelece com a televisão. O modo de se relacionar com a mesma, as
características dos produtos consumidos e a mediação de todos os entornos com os
quais o menor se relaciona na sua vida cotidiana: a escola, seu grupo de iguais, a
família, a própria televisão e a cultura na qual está inserido. Essa realidade, constatada
no decorrer da pesquisa põe de manifesto, por um lado, a dificultadade na hora de
afrontar um estudo de recepção porque é impossível abranger o objeto de estudo em sua
totalidade e, por outro lado, porque não existem dois processos de recepção iguais.
Desta forma, só é possível analisar quais são as condições necessárias para frear ou
equilibrar o poder socializador da TV. Esta é a razão pela qual as perspectivas mais
contemporâneas sobre comunicação apontam em suas linhas de pesquisa a educação
midiática como uma das vias mais importantes para criar o ambiente adequado para que
os meios percam importância como provedores de critérios normativos diante de
agentes de tanto peso como a família e a escola. Estas duas instituições podem e devem
ser entidades promotoras de valores, critérios e pautas de conduta.
Após a análise minuciosa de todos os indicadores de mediação familiar, conclui-se que
os contextos são cada vez mais individualizados. No entanto, por meio das
peculiaridades de cada um, foi possível detectar semelhanças em todos eles e
generalizar que a mediação familiar nos lares analisados é deficiente. Os pais não
respondem ao seu compromisso de entidade mediadora. As razões que conduziram a
essa conclusão foram as seguintes:
- Os pais não oferecem um discurso sólido sobre a televisão. Conhecem muito
bem o discurso que está no imaginário social, mas quando tratam de personalizar essas
ideias não se incluem. É como se a televisão existente em sua casa fosse diferente às
demais.
- Apesar da deslegitimação social do meio estar presente no discurso das
famílias analisadas, a televisão continua sendo o aparelho estrela dos lares. Todos os
entrevistados opinam que a programação é de má qualidade, que os conteúdos são
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manipuladores e que sua programação é sensacionalista. Mostraram-se extremamente
incômodos com a presença de conteúdos violentos e eróticos, principalmente em horário
de programação infantil. Ao contrario do que se acreditava, o acelerado crescimento do
uso de tecnologias da informação e da comunicação não teve influência significativa no
tempo que as crianças passam diante da TV. O consumo da temporada 2009-2010
alcançou 239 minutos diários por pessoa, quatro minutos a mais que a temporada
anterior. Nos anos seguintes, o consumo continuou aumentando: o consumo televisivo
registrado pela Barlovento Comunicación5 nos anos 2011, 2012 e 2013 são de 239, 242
e 244 minutos de média diária por indivíduo, respectivamente. Em 2012, se alcançou o
récord histórico de consumo televisivo na Espanha. A cifra de 2013 representa a
segunda cota mais alta da história. Esse número continua em alta. Só nos meses de
janeiro e fevereiro de 2014 foi registrado uma média de consumo por indivíduo de 267
minutos.
- Os adultos acreditam parcialmente na influência do meio. Atribuem à televisão
um importante poder socializador. No entanto, se excluem dessa influência ao atribuir
esse peso às suas crianças. Acreditam que a televisão pode exercer influência
principalmente na linguagem ou no desejo de consumir bens de consumo devido ao
excesso de publicidade. Ainda assim, opinam que essas influências não afetam a sua
família. Portanto, conhecem o discurso presente no imaginário social, mas não o
internalizam.
- Pais e filhos coincidem cada vez menos em frente à televisão. Diante do
tradicional caráter familiar da TV, observa-se a generalização do uso individual. A
mudança foi favorecida pela multiplicação de aparelhos nas casas e pela fragmentação
das emissoras responsáveis por ampliar a oferta. O uso individual do meio favorece a
inibição paterna na mediação, já que resulta mais difícil para os pais controlar o que
seus filhos assistem. Uma outra razão é que quando o televisor está em um espaço
reservado, como o quarto da criança, a força normativa do mandato, quando existe,
perde valor.
- Os pais desconhecem os conteúdos televisivos vistos pelos filhos. Este fator,
favorecido pelo uso individualizado do meio, revela que os pais não estão cientes de
5 Consultora audiovisual espanhola especializada em análises de audiencias de TV.
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certos riscos potenciais, já que ignoran as características das mensagens difundidas nos
programas vistos pelos seus filhos. No caso dos produtos audiovisuais ofertados como
infantis, a situação se repete: os adultos não estão a par do visionado das crianças e
acreditam que todas as transmissões dos canais infantis sejam adequadas ao estágio de
desenvolvimento do menor. Este desconhecimento acontece devido à confiança
depositada na própria indústria, pouco sensibilizada com a proteção da infância.
- Observou-se uma ausência de normas e proibições no que diz respeito à
utilização da TV em casa. Este indicador é o mais significativo para descrever a
mediação familiar. Os pais não impõem critérios sobre televisão através de mandatos. A
reação dos adultos é improvisada. Quando se trata da exposição das crianças diante de
cenas violentas ou eróticas, a atuação dos pais se dá de forma autoritária e pouco
instrutiva: exigem que os menores desligam a TV ou mudem o canal. A supervisão dos
adultos é superficial. Eles mesmos afirmaram que em suas casas não existem normas
nem proibições. Temem uma atitude autoritária diante das crianças.
- Os pais não oferecem estratégias de educação midiática aos filhos. A televisão
não faz parte das pautas educativas. Não foi detectada nenhuma estratégia como forma
de ensinar os filhos a descodificarem mensagens nos meios, tampouco observou-se
propostas educativas que ensinassem às crianças a ter um olhar mais crítico diante dos
produtos audiovisuais.
- Há muitos impedimentos que favorecem a inibição da responsabilidade
mediadora das famílias. Entre eles, destaca-se a impossibilidade de estar em casa no
tempo de entretenimento das crianças. Além da dificuldade de conciliar a vida familiar e
a laboral, foram observados outros dois obstáculos: primeiro, o cansaço após uma longa
jornada de trabalho; e segundo, o receio de isolar a criança de seu grupo de iguais, por
negar acesso aos conteúdos audiovisuais da moda.
5. Considerações finais
A infância encontra-se em um cenário de desproteção diante de seu entorno midiático.
Além da falta de sensibilização da indústria e da ineficácia das políticas de regulação, a
função mediadora das famílias não se estabelece em um rol de pautas educativas, seja
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por falta de uma consciência mais ativa dos adultos ou mesmo devido aos obstáculos
apresentados no trabalho. A família está perdendo espaço no que diz respeito à
educação dos filhos diante da força socializadora da TV. Os conteúdos vistos
diariamente pelas crianças competem, em atrativos e credibilidade, com pais que não
orientam o olhar dos filhos pata que eles compreendam e assimilem as mensagens
televisivas de forma adequada.
A falta de formação dos adultos é uma das principais razões pela ausência de
consciência do problema. Além desse desconhecimento generalizado, a origem da
inibição paterna é muito mais complexa e está relacionada diretamente com a forma em
que os adultos entrevistados concebem a educação dos filhos: entendem que se trata de
um processo autônomo que deve ser supervisado, sem intervenções autoritárias por
meio de normas ou proibições. A maioria das famílias manifestaram sua opinião sobre a
forma ideal de educação: um modelo de atuação que ofereça autonomia aos menores
sem a imposição rígida de normas e critérios.
Diante do cenário apresentado, faz-se necessário implicar as famílias no uso que os
filhos fazem dos meios de comunicação. O ponto de partida indispensável para que esse
processo se concretize é a formação dos pais a partir de uma educação midiática
destinada a adultos. A mediação ativa, ou seja, aquela situação em que os pais se
implicam na instrução, guia e controle do uso que os menores fazem dos meios não vai
acontecer se os mesmos não receberem diretrizes para a formação midiática a partir de
instituições educativas.
Os critérios normativos aplicados em casa são fundamentais para inserir pautas de
conduta nos filhos. Significa recuperar a autoridade paterna que muitos pais, como ficou
patente no estudo, confundem com autoritarismo. Trata-se de normas fundadas no
consenso, de uma autoridade exercida de forma participativa e de uma normativa
estável e fundada em princípios estáveis. O programa de instrução a ser usado pelos
adultos deve estar regido de forma de que os filhos conheçam a natureza da indústria
audiovisual, a linguagem, ferramentas e códigos audiovisuais e que aportem recursos
que os tornem capazes de realizar uma leitura crítica e autónoma ante as mensagens.
Portanto, o seguimento e controle exigem constância e participação ativa.
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