Notas de Aula de Equa˘c~oes Diferenciais Ordin...
Transcript of Notas de Aula de Equa˘c~oes Diferenciais Ordin...
Notas de Aula deEquacoes Diferenciais Ordinarias
Sandro Marcos Guzzo
23 de fevereiro de 2017
Sumario
1 Terminologia basica das Equacoes Diferenciais 4
2 Equacoes de primeira ordem 8
2.1 Equacoes separaveis . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 8
2.2 Equacoes exatas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 10
2.3 Equacao diferencial linear geral de ordem 1 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13
2.4 Aspectos qualitativos das solucoes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 16
2.5 Aplicacoes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 17
2.5.1 Equacoes de Bernoulli e de Ricati . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 18
2.5.2 Dinamica populacional . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 20
2.5.3 Resfriamento de corpos . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 29
2.5.4 Diluicao de solucoes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 30
2.5.5 Decaimento radioativo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 32
3 Equacoes diferenciais lineares de ordem superior 35
3.1 Teoria preliminar . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 35
3.2 EDs lineares homogeneas a coeficientes constantes . . . . . . . . . . . . . . . 42
3.3 EDs lineares nao homogeneas a coeficientes constantes . . . . . . . . . . . . . 49
3.3.1 Metodo da variacao dos parametros . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 49
3.3.2 Metodo dos coeficientes indeterminados (superposicao) . . . . . . . . . 53
3.3.3 Metodo dos coeficientes indeterminados (anuladores) . . . . . . . . . . 56
3.4 Equacao de Cauchy-Euler . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 63
3.5 Aplicacoes . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 70
2
3.5.1 Sistema massa-mola . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 71
3.5.2 O pendulo simples . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 75
4 A Transformada de Laplace 79
4.1 Transformada de Laplace . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 79
5 Equacoes diferenciais nao lineares 88
5.1 Solucoes por serie de potencia . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 88
5.2 Aplicacao: A catenaria . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 89
6 Sistemas de equacoes diferenciais lineares 95
6.1 Teoria preliminar . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 95
6.2 Metodo de eliminacao algebrica . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 96
6.3 Sistemas de EDs lineares de primeira ordem . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 101
6.4 Sistemas de EDs lineares de primeira ordem a coeficientes constantes . . . . . 104
3
Capıtulo 1
Terminologia basica das Equacoes
Diferenciais
Equacoes diferenciais sao equacoes que aparecem com muita frequencia quando tentamos mo-
delar fenomenos fısicos, quımicos ou biologicos. Por esta razao e de fundamental importancia
o estudo deste tipo de equacao, bem como o comportamento de suas solucoes.
Definicao 1.0.1. Uma equacao que contem uma ou mais variaveis (independentes) e as
derivadas de uma ou mais funcoes destas variaveis e dita uma equacao diferencial (ED).
Definicao 1.0.2. Uma equacao diferencial que contem uma ou mais funcoes de apenas uma
variavel independente e chamada de equacao diferencial ordinaria (EDO).
Exemplo 1: As igualdades abaixo sao equacoes diferenciais ordinarias:
d2u
dt2− d2v
dt2= t,(
dy
dx
)2
+ 2dy
dx− 1 = 0,
y′′′ − 3y′′ + 2y = 0,
du
dtcos t− du
dtsen(2t) = et.
�
Neste curso estamos interessados somente em equacoes diferenciais ordinarias, isto e,
equacoes diferenciais em que as funcoes envolvidas dependem de apenas uma variavel. Entao
deste ponto em diante, sempre que escrevermos equacoes diferenciais, ou ED, estamos nos
referindo a equacoes diferenciais ordinarias, ou EDO.
Definicao 1.0.3. Dentre as derivadas que figuram em uma equacao diferencial, a maior
ordem destas derivadas constitui a ordem da equacao diferencial.
4
Exemplo 2: A equacao diferencial
k2d3u
dt3+ k
d2u
dt2+du
dt= 0
possui ordem 3 (de terceira ordem). �
Exemplo 3: A equacao diferencial
d2y
dx2−(d2y
dx2
)3
+ y = cosx
possui ordem 2 (de segunda ordem). �
O estudo de equacoes diferenciais envolvendo duas ou mais funcoes (de apenas uma
variavel) sera desenvolvido no capıtulo referente a sistemas de equacoes diferenciais. Desta
forma, neste momento temos particular interesse em equacoes diferenciais envolvendo apenas
uma funcao de apenas uma variavel.
Definicao 1.0.4. Uma equacao diferencial e dita linear quando for linear em cada uma das
derivadas das funcoes envolvidas. Em outras palavras, quando puder ser escrita na forma
an(x)dny
dxn+ an−1(x)
dn−1y
dxn−1+ · · ·+ a1(x)
dy
dx+ a0(x)y = g(x)
sendo que ai(x) sao as funcoes coeficientes com an(x) 6= 0 e g(x) e o termo independente.
Observe que, para uma equacao diferencial ser linear, as potencias das derivadas
da funcao que figuram na equacao, devem ser iguais a 1, e as funcoes coeficientes dependem
somente da variavel independente.
Exemplo 4: As equacoes
xdy
dx+ y = 0,
ed2u
dt2− (sen t)u = cos t,
sao lineares enquanto as equacoes
yy′′ + 2xy = ex,
e
u3 − 3du
dt+ u = 0,
nao sao lineares (ou sao nao-lineares). �
Vamos agora estabelecer o que entenderemos por uma solucao de uma equacao
diferencial.
Definicao 1.0.5. Qualquer funcao, definida em algum intervalo I, que satisfaz a equacao
diferencial, e dita uma solucao para a equacao no intervalo I.
5
Exemplo 5: A funcao u = cos(2t) e uma solucao da equacao
d2u
dt2+ 4u = 0
no intervalo I = (−∞,∞), pois temos u′ = −2 sen(2t) e u′′ = −4 cos(2t), e assim,
u′′ + 4u = −4 cos(2t) + 4 cos(2t) = 0,
para todo t ∈ (−∞,∞). �
Exemplo 6: A funcao y = x lnx e uma solucao para a equacao
x2y′′ − xy′ + y = 0
no intervalo I = (0,∞), pois y′ = (lnx+ 1) e y′′ = 1x donde
x2y′′ − xy′ + y = x2 1
x− x(lnx+ 1) + x lnx = x− x lnx− x+ x lnx = 0
para todo x ∈ (0,∞). �
Note que nos casos do exemplo anterior, as funcoes u ≡ 0 e y ≡ 0 sao tambem
solucoes das equacoes propostas. A solucao nula, e chamada de solucao trivial.
Embora a ideia seja bastante simples, encontrar uma solucao para uma equacao
diferencial dada, em geral nao e uma tarefa simples. Os metodos conhecidos nos permitem
determinar solucoes de uma classe muito pequena de equacoes diferenciais.
Alem disso, algumas equacoes nao possuem solucao explıcita, outras ainda podem
possuir infinitas solucoes.
Exemplo 7: A equacao diferencial
yy′ + x = 0
possui solucao implıcita dada por x2 + y2 = 4, no intervalo I = (−2, 2). �
Exemplo 8: A equacao
u′′ + u = 0
possui solucao explıcita dada por u = C1 cos t + C2 sen t, para quaisquer valores reais de C1
e C2. �
Exemplo 9: A equacao diferencial
y′ − y = 0
possui solucao explıcita dada pela funcao y = Cex, para qualquer C ∈ R. �
Nas equacoes dos dois ultimos exemplo, os valores das constantes C, C1 e C2 podem
ser determinados impondo-se restricoes sobre a solucao. Tais restricoes sao denominadas
condicoes iniciais.
6
Definicao 1.0.6. Um problema de valor inicial (PVI), e um conjunto de uma equacao dife-
rencial, de ordem n, juntamente com n condicoes iniciais. Sera, em geral, um problema da
forma an(x)
dny
dxn+ · · ·+ a1(x)
dy
dx+ a0(x)y = g(x)
y(x0) = y0, y′(x0) = y1, . . . , y(n−1)(x0) = yn−1.
Exemplo 10: A solucao do PVI {y′ − y = 0
y(0) = 2
e a funcao y = 2ex. �
Exemplo 11: A solucao do PVI{u′′ + u = 0
u(0) = 1, u′(0) = −1
e a funcao u = cos t− sen t. �
Exercıcios:
7
Capıtulo 2
Equacoes de primeira ordem
Neste capıtulo estamos particularmente interessados em problemas da forma
y′ = F (x, y)
sujeita a alguma condicao inicial y(x0) = y0. A primeira pergunta que fazemos e se este
problema possui solucao, ou melhor, quais as condicoes que garantem que este problema
possui solucao. O teorema que enunciaremos (sem demonstracao) nos da condicoes para isto.
Teorema 2.0.1 (Picard). Seja R uma regiao retangular do plano xOy que contem o ponto
(x0, y0) em seu interior. Se F (x, y) e ∂F∂y sao contınuas em R, entao existe um intervalo I,
centrado em x0 e uma unica funcao y = f(x) definida em I, satisfazendo o PVI{y′ = F (x, y)
y(x0) = y0.
Este e um teorema importante sobre a existencia de solucoes de um PVI porque as
hipoteses sao relativamente faceis de serem verificadas. A demonstracao pode ser vista em
[1].
2.1 Equacoes separaveis
Definicao 2.1.1. Uma equacao diferencial e dita separavel (ou tem variaveis separaveis) se
puder ser escrita na formady
dx=g(x)
h(y). (2.1)
Levando em conta entao que a equacao (2.1) cumpre condicoes para garantir a
existencia de solucao, queremos obter esta solucao. Vamos estabelecer que condicoes devem
ser cumpridas por y = f(x), para que esta funcao seja uma solucao para a equacao (2.1).
8
Para que y = f(x) seja solucao de (2.1), devemos ter
h(y)dy
dx= g(x),
e integrando ambos os membros em x, temos∫h(y)
dy
dxdx =
∫g(x)dx.
Mas, do calculo, temos ∫h(y)
dy
dxdx =
∫h(y)dy,
donde devemos ter ∫h(y)dy =
∫g(x)dx. (2.2)
Assim, se houver uma solucao y = f(x) para a equacao (2.1) esta solucao deve
satisfazer a equacao integral (2.2). Esta equacao integral torna-se portanto um metodo de
busca de solucoes para a equacao (2.1). Um caso particular da equacao (2.1) ocorre quanto
h(y) = 1. Neste caso, a equacao integral a ser resolvida se reduz a
y(x) =
∫g(x)dx.
Exemplo 12: Para resolver a equacao
xe−y senx− yy′ = 0,
notemos que a equacao pode ser posta na forma
y′ =x senx
yey
e a solucao e entao obtida resolvendo a equacao integral∫yeydy =
∫x senxdx,
que resulta na solucao implıcita
yey − ey = senx− x cosx+ C,
para alguma constante C. �
Exemplo 13: [Teorema de Pitagoras] Tomemos um triangulo retangulo de hipotenusa a
e catetos b e c. Fixemos um dos catetos, digamos c, e consideremos que a hipotenusa seja
calculada em termos do outro cateto, isto e, a = a(b) e uma funcao da variavel independente
b. Nestes termos, um acrescimo ∆b da variavel independente provoca um acrescimo ∆a da
variavel dependente.
9
O triangulo de hipotenusa ∆b e cateto x e semelhante ao triangulo original, e por
esta semelhanca, vemx
∆b=b
a.
Observemos que quando ∆b → 0, entao x → ∆a, e tambem ∆a∆b →
dadb = a′(b). Tomando
entao o limite, quando ∆b→ 0, temos
da
db=b
a,
que e uma equacao diferencial separavel, e a sua solucao e encontrada resolvendo-se a equacao
integral ∫ada =
∫bdb.
Nestes termos, a solucao e,
a2
2=b2
2+ cte,
ou ainda,
a2 = b2 + cte,
para alguma constante cte. A constante cte pode ser determinada conhecendo-se uma
condicao inicial, isto e, o valor de a(b) quando b = 0. Sabemos que quando b = 0 a hi-
potenusa a se reduz ao cateto c, e portanto a condicao inicial e a(0) = c. Substituindo na
solucao, obtemos
02 + cte = a2(0) = c2,
donde cte = c2 e portanto a solucao da ED e dada (implicitamente) por a2 = b2 + c2. �
2.2 Equacoes exatas
Lembremos do calculo diferencial e integral, que dada uma funcao f(x, y) contınua com
derivadas parciais de primeira ordem contınuas, a diferencial total df e precisamente
df =∂f
∂xdx+
∂f
∂ydy
10
onde dx e dy sao respectivamente as diferenciais em x e em y. Tambem, se a funcao f for
constante, entao a diferencial df e nula.
Definicao 2.2.1. Uma expressao diferencial
M(x, y)dx+N(x, y)dy
e uma diferencial exata, em uma regiao R do plano xOy, se for igual a diferencial total de
alguma funcao f(x, y), isto e, se existir uma funcao f(x, y), de forma que
∂f
∂xdx+
∂f
∂ydy = df = M(x, y)dx+N(x, y)dy
para todo x, y ∈ R.
Definicao 2.2.2. Uma equacao diferencial da forma
M(x, y)dx+N(x, y)dy = 0
e chamada de equacao diferencial exata, se a expressao do lado esquerdo e uma diferencial
exata.
Observe que em uma equacao diferencial exata, uma solucao implıcita pode ser
obtida pela equacao f(x, y) = c, onde c e uma constante. Isto porque se f(x, y) = c entao
df = 0 e assim,
M(x, y)dx+N(x, y)dy = df = 0.
Teorema 2.2.3. Sejam M(x, y) e N(x, y) funcoes contınuas, que possuem derivadas parciais
contınuas em uma regiao retangular R = {(x, y) ∈ R2; a < x < b, c < y < d}. Entao
M(x, y)dx+N(x, y)dy
e uma diferencial exata se, e somente se,
∂M
∂y=∂N
∂x.
Prova. Suponha primeiro M(x, y) e N(x, y) com derivadas parciais primeiras contınuas em
R, e que M(x, y)dx+N(x, y)dy e uma diferencial exata. Entao existe uma funcao f(x, y) tal
que∂f
∂xdx+
∂f
∂ydy = M(x, y)dx+N(x, y)dy,
isto e,∂f
∂x= M(x, y), e
∂f
∂y= N(x, y),
e assim,∂M
∂y=
∂
∂y
∂f
∂x=
∂2f
∂y∂x=
∂2f
∂x∂y=
∂
∂x
∂f
∂y=∂N
∂x.
11
Para a recıproca, suponha que ∂M∂y = ∂N
∂x . A obtencao de uma funcao f(x, y) satis-
fazendo∂f
∂x= M(x, y), e
∂f
∂y= N(x, y),
e um processo meramente construtivo. Integrando a primeira igualdade em x, temos
f(x, y) =
∫M(x, y)dx+ cte.
Ocorre que neste caso, cte e uma funcao que pode depender no maximo de y, ou seja
f(x, y) =
∫M(x, y)dx+ g(y), (2.3)
e derivando em relacao a y temos
∂f
∂y=
∂
∂y
∫M(x, y)dx+
dg
dy,
e entao
N(x, y) =∂
∂y
∫M(x, y)dx+
dg
dy,
dondedg
dy= N(x, y)− ∂
∂y
∫M(x, y)dx.
Finalmente integrando esta ultima em y obtemos g(y) e substituindo em (2.3) obteremos uma
expressao para a funcao f(x, y) procurada, e a consequente solucao da equacao diferencial
exata que sera dada implicitamente por
f(x, y) = c,
para qualquer constante real c.
Resumindo este processo, para obter entao a solucao de uma equacao diferencial
exata M(x, y)dx+N(x, y)dy = 0 ou M(x, y) +N(x, y) dydx = 0, usamos o seguinte roteiro:
1- Verificar se a equacao dada e exata, isto e, se ∂M∂y = ∂N
∂x ;
2- Determinar ∫M(x, y)dx;
3- Determinar
g′(y) = N(x, y)− ∂
∂y
∫M(x, y)dx,
integrar em y para obter g(y), e escrever f(x, y) que e dada por
f(x, y) =
∫M(x, y)dx+ g(y);
4- A solucao da equacao diferencial exata e dada implicitamente por
f(x, y) = c
para alguma constante c real.
12
Exemplo 14: Determinar a solucao de 2xy + (x2 − 1) dydx = 0. �
Exemplo 15: Determinar uma solucao para o PVI{(cosx senx− xy2)dx+ y(1− x2)dy = 0
y(0) = 2
�
2.3 Equacao diferencial linear geral de ordem 1
Definicao 2.3.1. Uma equacao diferencial linear geral de ordem 1, e uma equacao diferencial
na forma
a1(x)dy
dx+ a0(x)y = g(x)
com a1(x) 6≡ 0. Se g(x) = 0 entao a equacao e dita homogenea.
Em geral uma equacao diferencial linear de primeira ordem se apresenta na forma
y′ + P (x)y = Q(x), (2.4)
e se nao estiver assim, procuramos faze-lo, dividindo toda a equacao por a1(x). Esta ultima
equacao e conhecida como forma padrao da ED linear geral de primeira ordem.
Um procedimento util para determinar a solucao geral de (2.4) e o estudo preliminar
da equacao homogenea associada
y′ + P (x)y = 0.
Isto se deve ao fato de que a solucao yc da equacao homogenea e parte da solucao da equacao
geral (2.4). O proximo teorema garantira isto.
Teorema 2.3.2. Seja yp uma solucao da ED linear geral (2.4) e yc uma solucao (nao iden-
ticamente nula) da equacao homogenea associada. Entao y = Cyc + yp e ainda uma solucao
da equacao (2.4), para qualquer constante C ∈ R.
Prova. Seja y = Cyc + yp. Entao y′ = Cy′c + y′p e
y′ + P (x)y = Cy′c + y′p + P (x)(Cyc + yp)
= Cy′c + y′p + CP (x)yc + P (x)yp
= Cy′c + CP (x)yc + y′p + P (x)yp
= C(y′c + P (x)yc) + (y′p + P (x)yp) = Q(x),
donde y e solucao de (2.4).
13
Para determinar yc, a solucao da equacao homogenea
y′ + P (x)y = 0
notemos que e uma equacao diferencial separavel. De fato, podemos reescreve-la como
y′ =−P (x)
1y
=g(x)
h(y),
cuja solucao e dada pela equacao integral∫g(x)dx =
∫h(y)dy,
isto e, ∫−P (x)dx =
∫1
ydy.
O primeiro membro ainda e desconhecido pois nao sabemos quem e P (x). Mas o segundo
membro pode ser integrado em y, e temos∫−P (x)dx = ln |y|+ C1,
e isolando a funcao y, temos
ln |y| =∫−P (x)dx+ C1 = C1 −
∫P (x)dx
e portanto
y = eC1−∫P (x)dx = eC1e−
∫P (x)dx = Ce−
∫P (x)dx,
para alguma constante C. Desta forma temos yc, a solucao da ED homogenea, dada por
yc = Ce−∫P (x)dx.
Para determinar yp utilizaremos um metodo conhecido como metodo da variacao de
parametros. A ideia e tentar encontrar uma funcao u(x) de tal forma que yp = u(x)yc seja
solucao da equacao nao homogenea (2.4). Considerando entao
yc = e−∫P (x)dx e yp = u(x)yc,
queremos quedypdx
+ P (x)yp = Q(x). (2.5)
Desenvolvendo o lado esquerdo, temos
dypdx
+ P (x)yp =d
dx(u(x)yc) + P (x)(u(x)yc)
=du
dxyc + u(x)
dycdx
+ P (x)u(x)yc
= u(x)
(dycdx
+ P (x)yc
)+ yc
du
dx= yc
du
dx,
14
e substituindo isto em (2.5), obtemos
ycdu
dx= Q(x),
oudu
dx=Q(x)
yc= Q(x)e
∫P (x)dx,
e entao
u(x) =
∫Q(x)e
∫P (x)dxdx.
Assim,
yp = u(x)yc = e−∫P (x)dx
∫Q(x)e
∫P (x)dxdx,
e temos que a solucao geral da equacao (2.4) e dada por
y = Cyc + yp = Ce−∫P (x)dx + e−
∫P (x)dx
∫Q(x)e
∫P (x)dxdx, (2.6)
para alguma constante C.
Observe que para determinar yp, foram feitas varias integrais indefinidas, e nestas
integrais nao foram consideradas as constantes de integracao. Um bom exercıcio e verificar
porque isto nao foi necessario. O termo e∫P (x)dx e conhecido como fator de integracao, ou
fator integrante, da equacao (2.4).
Para a solucao de uma equacao diferencial de primeira ordem procedemos de acordo
com o seguinte roteiro:
1- Escrever a ED na forma padrao, y′ + P (x)y = Q(x).
2- Identificar P (x) e determinar o fator de integracao e∫P (x)dx.
3- Multiplicar a equacao pelo fator de integracao. Com esta multiplicacao o lado esquerdo
da equacao sera automaticamente a derivada de um produto e a equacao se tornara
d
dx
(e∫P (x)dxy
)= Q(x)e
∫P (x)dx.
4- Integrar em x (nao esquecer agora a constante de integracao) e isolar y.
Observe que este procedimento nos fornece exatamente a solucao (2.6). A constante
de integracao podera ser determinada com a imposicao de uma condicao inicial.
Exemplo 16: Determinar a solucao da equacao diferencial y′ + 2y = 6ex. �
Exemplo 17: Determinar a solucao do PVI{y′ + 2xy = x
y(0) = 2
�
15
2.4 Aspectos qualitativos das solucoes
Definicao 2.4.1. Uma equacao diferencial na forma
dy
dx= g(y) (2.7)
onde a funcao g(y) nao depende diretamente da variavel independente x, e chamada de
equacao autonoma.
Definicao 2.4.2. Se y0 e um zero da funcao g(y), isto e, g(y0) = 0, entao y(x) ≡ y0 e uma
solucao de (2.7) e e chamada de solucao de equilıbrio, ou solucao estacionaria, e o numero y0
e chamado de ponto de equilıbrio, ou singularidade.
Definicao 2.4.3. Um ponto de equilıbrio y0 e dito estavel se dado ε > 0, existe um δ > 0
tal que se |y0 − b| < δ a solucao do PVI{y′(x) = g(y)
y(0) = b
satisfaz |y(x)− y0| < ε para todo x ≥ 0. Em outras palavras,
limb→y0
y(x) = y0.
Um ponto de equilıbrio que nao e estavel e dito instavel.
Definicao 2.4.4. Um ponto de equilıbrio y0 e dito assintoticamente estavel se for estavel e
se
limx→∞
y(x) = y0.
O proximo teorema nos da condicoes para determinar quando um ponto de equilıbrio
e estavel ou instavel.
Teorema 2.4.5. Sejam g(y) uma funcao com derivada contınua, e y0 um ponto de equilıbrio
de
y′ = g(y).
Se g′(y0) < 0 entao y0 e um ponto de equilıbrio estavel (assintoticamente estavel), e se
g′(y0) > 0 entao y0 e um ponto de equilıbrio instavel.
Prova. A ideia e analisar a variacao de y(x)− y0, onde y(x) e solucao do PVI{y′(x) = g(y)
y(0) = b
Nestes termos
d
dx(y(x)− y0)2 = 2(y(x)− y0)y′(x)
16
= 2(y(x)− y0)g(y)
= 2(y(x)− y0)(g(y)− g(y0)),
ja que g(y0) = 0. Agora, do teorema do valor medio, sabemos que
g(y)− g(y0) = g′(η(x))(y(x)− y0)
para algum η(x) entre y(x) e y0, e portanto
d
dx(y(x)− y0)2 = 2(y(x)− y0)g′(η(x))(y(x)− y0) = 2(y(x)− y0)2g′(η(x)).
Supondo agora g′(η(x)) < 0, da continuidade de g′, segue que existe δ > 0 e θ > 0, tais que
g′(y) ≤ −θ < 0
para qualquer |y(x)− y0| < δ. Assim, se a solucao y(x) do PVI satisfaz |y0 − b| < δ, entao
d
dx(y(x)− y0)2 ≤ −2θ(y(x)− y0)2
para θ > 0. Resolvendo esta ED em (y(x)− y0), vem
(y(x)− y0)2 ≤ Ce−2θx
para alguma constante C, e como o lado direito vai a zero quanto x→∞, entao
limx→∞
y(x) = y0.
O raciocınio e analogo para g′(y) > 0. Obteremos
g′(y) ≥ θ > 0
para algum θ > 0 e |y(x)− y0| < δ. Assim, se |b− y0| < δ,
d
dx(y(x)− y0)2 ≥ 2θ(y(x)− y0)2
e portanto
(y(x)− y0)2 ≥ Ce2θx
donde e possıvel obter um ε > 0, tal que |y(x) − y0| ≥ ε para |b − y0| < δ, e isto significa a
instabilidade de y0.
2.5 Aplicacoes
Vejamos agora alguns modelos que podem ser representados matematicamente por alguma
equacao diferencial de ordem 1. Primeiramente, vamos a duas equacoes importantes.
17
2.5.1 Equacoes de Bernoulli e de Ricati
A equacao diferencial
y′ + P (x)y = Q(x)yn (2.8)
onde n e um numero real, e conhecida como Equacao de Bernoulli. Note que se n = 0 ou
n = 1 entao a equacao torna-se uma equacao diferencial linear, cuja solucao sabemos ser dada
por
y = Ce−∫P (x)dx + e−
∫P (x)dx
∫Q(x)e
∫P (x)dxdx, se n = 0,
y = Ce−∫
(P (x)−Q(x))dx, se n = 1.
Supondo agora n /∈ {0, 1}, e que estejamos interessados em uma solucao (nao nula) para
(2.8). Entao dividindo a equacao por yn, temos
y−ny′ + P (x)y1−n = Q(x).
Escolhendo agora w(x) = y1−n(x) notemos que
w′ = (y1−n)′ = (1− n)y−ny′,
e substituindo temos1
1− nw′ + P (x)w = Q(x),
ou ainda,
w′ + (1− n)P (x)w = (1− n)Q(x),
que e uma equacao diferencial linear de primeira ordem em w, ja posta na forma padrao.
Resolvendo entao em w, pela tecnica obtida na secao anterior, e substituindo em y = w1
1−n ,
obtemos a solucao y para a equacao (2.8).
Exemplo 18: Para obter uma solucao para xy′ + y = 1y2
, primeiro reescrevemos esta
equacao na forma padrao (2.8),
y′ +1
xy =
1
xy−2,
que e uma equacao de Bernoulli com n = −2 e P (x) = Q(x) = 1x . A mudanca de variaveis
w = y1−n = y3, nos leva a
w′ +3
xw =
3
x.
Resolvendo em w, obtemos (pelas tecnicas da secao anterior)
w = 1 +C
x3,
e entao
y =3
√1 +
C
x3
para qualquer constante C. �
18
A equacao diferencial (nao linear)
y′ + P (x)y = Q(x)y2 +R(x) (2.9)
e chamada Equacao de Ricati. A solucao geral da equacao de Ricati pode ser obtida
conhecendo-se alguma solucao particular yp. Vamos verificar que se yp e uma solucao parti-
cular de (2.9), entao y = yp +u e tambem solucao da equacao (2.9), desde que u seja solucao
de uma equacao de Bernoulli associada
u′ − (2Q(x)yp − P (x))u = Q(x)u2.
De fato, para que yp + u seja solucao de (2.9), devemos ter
(yp + u)′ + P (x)(yp + u) = y′p + u′ + P (x)yp + P (x)u
= y′p + P (x)yp + u′ + P (x)u
= Q(x)y2p +R(x) +Q(x)u2 + (2Q(x)yp − P (x))u+ P (x)u
= Q(x)y2p + 2Q(x)ypu+Q(x)u2 +R(x)
= Q(x)(y2p + 2ypu+ u2) +R(x) = Q(x)(yp + u)2 +R(x) = Q(x)y2 +R(x).
Observe que esta tecnica nao obtem uma solucao da equacao de Ricatti, mas a
partir de uma solucao da equacao de Ricatti podemos obter outra solucao pela adicao de
uma solucao da equacao de Bernoulli associada.
Exemplo 19: Determinar a solucao da equacao de Ricati y′ = 2x2 + 1xy−2y2, sabendo que
yp = x e uma solucao particular. Para isto, colocamos y = yp + u = x+ u e obtemos
(x+ u)′ = −2(x+ u)2 +1
x(x+ u) + 2x2.
Reorganizando esta equacao, vem
u′ +
(4x− 1
x
)u = −2u2,
que e uma equacao de Bernoulli em u com n = 2. Fazendo w = u1−n = u−1, obtemos
w′ +
(1
x− 4x
)w = 2,
que resolvida em w nos traz
w = − 1
2x+Ce2x2
x=
2Ce2x2 − 1
2x.
Portanto a solucao da equacao de Ricati e
y = yp + u = x+1
w= x+
2x
2Ce2x2 − 1.
�
19
2.5.2 Dinamica populacional
Os modelos de crescimento populacionais que iremos analisar agora sao bastante simples.
Nem sempre traduzem uma situacao real, que pode se tornar complexa devido a fatores
biologicos e sociais.
Designemos p(t) a quantidade de indivıduos de uma determinada especie, em um
instante t (t ≥ 0). O modelo Malthusiano, o mais simples possıvel, supoe que a taxa de
crescimento da populacao e proporcional ao numero de indivıduos presentes. Nestes termos,
temos a equacao
p′(t) = rp(t), (2.10)
sendo r a constante de proporcionalidade.
Vamos considerar que r > 0 pois caso contrario, terıamos p′(t) = rp(t) < 0 o que
significa que o numero de indivıduos p(t) e decrescente, e a populacao nestas condicoes tende
a extincao.
Como ja sabemos, a equacao (2.10) e uma equacao separavel e a solucao desta
equacao e dada por
p(t) = Cert,
sendo que C e uma constante que pode ser determinada conhecendo alguma condicao inicial.
Em geral e uma condicao da forma p(0) = p0 indicando que no instante t = 0 a populacao
inicial e de p0 indivıduos. Substituindo entao t = 0 obtemos C = p0, e assim
p(t) = p0ert.
Podemos ainda determinar a constante de proporcionalidade r. Para isto, basta
saber alguma outra informacao sobre a populacao em um determinado tempo t1 > t0.
Note ainda que equacao (2.10) e uma equacao autonoma. O unico ponto de equilıbrio
e y0 = 0, e portanto p(t) ≡ 0 e a unica solucao de equilıbrio, que e instavel, ja que y′(0) =
r > 0.
E evidente que este modelo nao traduz uma situacao real a longo prazo, porque o
crescimento exponencial da populacao nao pode se manter indefinidamente. O modelo de
Verhulst leva em conta que, por algum motivo social ou geografico, exista um controle do
crescimento da populacao. Dentre os modelos estudados por Verhulst, um deles supoe que
a constante de proporcionalidade R seja uma funcao que decai linearmente de acordo com o
numero de indivıduos da populacao. Desta forma, R = R(p) = a − bp com a e b constantes
positivas.
Verhulst pressupos que existe um numero k chamado de limite populacional. Este
limite populacional e em geral entendido como a capacidade maxima de indivıduos suportada
pelo meio ambiente em que a populacao esta inserida. Sendo assim, quando o numero de
20
indivıduos p e bem inferior a capacidade maxima k do meio, a constante de proporcionalidade
e r. Quando p = k, a populacao atingiu o limite suportavel pelo meio, e a constante de
proporcionalidade deve ser 0, isto e, a populacao para de crescer.
Determinando os coeficientes a e b para cumprir estas condicoes, temos que R =
R(p) = r − rkp. Temos assim o modelo de crescimento proposto por Verhulst
p′(t) = (r − r
kp(t))p(t) = rp(t)− r
kp2(t), (2.11)
conhecido tambem como equacao logıstica.
Note que nao e mais uma equacao linear. Trata-se de uma equacao do tipo de
Bernoulli, com n = 2 e assim a substituicao u = p1−n = p−1 trara a equacao
u′(t) =r
k− ru.
A solucao desta ultima e dada por
u = Ce−rt +1
k=
1 + kCe−rt
k,
e portanto
p(t) =1
u=
k
1 + kCe−rt.
A constante C pode ser determinada conhecendo-se a populacao inicial p(0) = p0.
Substituindo t = 0 obtemos C = k−p0kp0
, e assim,
p(t) =k
1 + k k−p0kp0e−rt
=p0k
(k − p0)e−rt + p0.
Observe que quando t→∞ teremos p(t)→ k, o que indica que a populacao tende a
se estabilizar em k indivıduos. Este fato pode ser confirmado pelo estudo da equacao (2.11),
que e uma equacao autonoma, com pontos de equilıbrio 0 e k. A solucao de equilıbrio p(t) ≡ 0
e instavel enquanto a solucao de equilıbrio p(t) ≡ k e estavel, de acordo com o teorema 2.4.5.
Vamos agora apresentar modelos de crescimento populacional dados pela equacao
logıstica (modelo de Verhulst) com extracao. Estes modelos possuem importancia economica.
Suponha um produtor com um campo de cultivo vegetal ou animal. A populacao cresce
segundo o modelo logıstico e entao o produtor esta interessado em saber se pode colher ou
abater sua producao, sem comprometer a sobrevivencia da especie.
Estamos interessados na equacao
dp
dt=(rp− r
kp2)− βp, (2.12)
sendo β uma constante. Isto significa que (de tempos em tempos) estamos fazendo a extracao
de uma parcela, ou uma porcentagem da populacao.
21
Lembremos que na equacao (2.12), r e a taxa de crescimento da populacao p e k
e a capacidade limite do meio ambiente, em numero de indivıduos. Vamos ainda supor que
r > 0, ou equivalentemente que a populacao esta crescendo, e portanto p0 = p(0) < p(t) < k.
Faremos primeiro uma analise da equacao (2.12) sob o ponto de vista das equacoes
autonomas, como visto na secao 2.4. Considerando a equacao
dp
dt= g(p) =
(rp− r
kp2)− βp = (r − β)p− r
kp2,
vamos determinar as raızes da equacao g(p) = 0. Nestes termos, temos as solucoes de
equilıbrio p1 = 0 e p2 = k(1− βr ). Vamos analizar a estabilidade destas solucoes de equilıbrio.
Como dgdp = r − β − 2p rk , entao temos que
dg
dp(p1) = r − β,
e tambemdg
dp(p2) = r − β − 2k(1− β
r )r
k= r − β − 2(r − β) = β − r.
Observemos entao que a decisao da estabilidade ou instabilidade das solucoes de
equilıbrio, isto e, a decisao dgdp > 0 ou dg
dp < 0, fica condicionada ao fato de que β > r ou
β < r.
Se a taxa de extracao β for maior que a taxa de crescimento populacional r, ou seja,
se (β − r) > 0 entao a solucao de equilıbrio p(t) ≡ 0 e estavel. De outra forma,
limt→∞
p(t) = 0,
e por conseguinte a populacao p(t) tende a extincao quando t→∞.
Por outro lado, se a taxa de extracao β for menor que a taxa de crescimento popu-
lacional r, ou seja, (β − r) < 0, entao a solucao de equilıbrio p(t) ≡ k(1− βr ) e estavel. Isto
significa que
limt→∞
p(t) = k(1− βr ),
e assim, a populacao tende ainda a se estabilizar em k(1− βr ) < k indivıduos quando t→∞,
o que garante a sobrevivencia da especie.
O caso β = r tambem pode ser analisado. Neste caso,
dp
dt= − r
kp2 < 0,
o que significa que a funcao de populacao p(t) e estritamente decrescente, ja que sua derivada
e estritamente negativa. Isto indica tambem que a populacao p(t) tende a extincao quando
t→∞.
A teoria a respeito das equacoes autonomas nos permite obter algum conhecimento
da solucao p(t) sem necessariamente obter a solucao p(t) explicitamente. Embora tenhamos
22
este conhecimento, ainda pode ser importante determinar a funcao p(t) pois ela nos permitira
(por exemplo) uma estimativa da populacao p(t) em um determinado tempo t1 de interesse.
Vamos entao resolver a equacao (2.12), obtendo uma expressao explıcita para p(t),
evidentemente em termos de r, k e β. Feito isto, confrontaremos o comportamento da funcao
p(t) com o que foi deduzido nos paragrafos anteriores.
O metodo que utilizaremos para obte a solucao de (2.12) e o metodo das equacoes
separaveis. Podemos reescrever a equacao (2.12) na forma
dp
dt= rp
(1− β
r− p
k
),
obtendo1
p(
1− βr −
pk
) dpdt
= r.
Integrando ambos os membros em t, temos∫1
p(
1− βr −
pk
) dpdtdt =
∫rdt,
ou ainda, ∫1
p(
1− βr −
pk
)dp =
∫rdt. (2.13)
Para integrar o primeiro membro, vamos usar a tecnica das fracoes parciais, isto e,
reescrevemos a fracao do integrando como soma de duas fracoes,
1
p(
1− βr −
pk
) =A
p+
B
1− βr −
pk
,
para A e B constantes, a serem determinadas. Calculando A e B, obtemos que a igualdade
acima se verifica com
A =r
r − βe B =
r
k(r − β),
e assim1
p(
1− βr −
pk
) =r
p(r − β)+
r
k(r − β)(1− βr −
pk ).
Segue que∫1
p(
1− βr −
pk
)dp =
∫r
p(r − β)dp+
∫r
k(r − β)(1− βr −
pk )dp
=r
(r − β)
∫1
pdp+
r
k(r − β)
∫1
1− βr −
pk
dp
=r
(r − β)ln |p|+ −r
(r − β)ln |1− β
r −pk |
=r
(r − β)
(ln |p| − ln |1− β
r −pk |)
23
=r
(r − β)ln
∣∣∣∣∣ p
1− βr −
pk
∣∣∣∣∣ .Voltando com esta integral em (2.13), temos que
r
(r − β)ln
∣∣∣∣∣ p
1− βr −
pk
∣∣∣∣∣ = rt+ C,
sendo C a constante de integracao. Para determinar a constante de integracao C, usamos a
condicao inicial p(0) = p0, e obtemos
C =r
(r − β)ln
∣∣∣∣∣ p0
1− βr −
p0k
∣∣∣∣∣ ,donde temos que
r
(r − β)ln
∣∣∣∣∣ p(1− βr −
p0k )
p0(1− βr −
pk )
∣∣∣∣∣ = rt.
ou ainda
ln
∣∣∣∣∣ p(1− βr −
p0k )
p0(1− βr −
pk )
∣∣∣∣∣ = (r − β)t.
Queremos isolar o termo p(t) na igualdade acima, a fim de obter a solucao explıcita
da equacao diferencial (2.12). Aplicando exponencial em ambos os membros, temos
p(rk − βk − p0r)
p0(rk − βk − pr)= e(r−β)t,
e reorganizando
p(rk − βk − p0r) = p0(rk − βk − pr)e(r−β)t.
Separando a variavel p no primeiro membro, obtemos
p(rk − βk − p0r) + p0pre(r−β)t = p0(rk − βk)e(r−β)t,
ou ainda
p(
(rk − βk − p0r) + p0re(r−β)t
)= p0(rk − βk)e(r−β)t,
donde segue que
p(t) =p0(rk − βk)e(r−β)t
(rk − βk − p0r) + p0re(r−β)t=
p0k(r − β)
(rk − βk − p0r)e(β−r)t + p0r.
De posse agora da solucao explıcita
p = p(t) =p0k(r − β)
(rk − βk − p0r)e(β−r)t + p0r, (2.14)
da equacao (2.12), podemos confirmar as analises feitas pela teoria das equacoes autonomas.
Se β < r, temos
limt→∞
(k(r − β)− p0r)e(β−r)t = 0,
24
e entao
limt→∞
p(t) = limt→∞
p0k(r − β)
(rk − βk − p0r)e(β−r)t + p0r=p0k(r − β)
p0r= k(1− β
r ),
e assim, a populacao tende a se estabilizar em k(1− βr ) < k indivıduos quando t→∞, o que
garante a sobrevivencia da especie.
Se β > r, temos que
limt→∞
(k(r − β)− p0r)e(β−r)t = ±∞,
dependendo do sinal da constante que multiplica a funcao exponencial. Entao
limt→∞
p(t) = limt→∞
p0k(r − β)
(rk − βk − p0r)e(β−r)t + p0r= 0,
e por conseguinte a populacao p(t) tende a extincao quando t→∞.
Se β = r, a solucao (2.14) nao tem sentido pois o numerador e o denominador se
anulam. Ocorre que neste caso, a equacao diferencial (2.12) fica modificada e o processo para
obter a solucao (2.14) deve ser readequado. De fato, se β = r entao a equacao diferencial
(2.12) ficadp
dt=−rkp2,
ou ainda1
p2
dp
dt=−rk,
e integrando ambos os membros em t temos que
−1
p=−rkt+ C,
sendo que C e a constante de integracao. Colocando t = 0, na ultima igualdade obtemos que
C = − 1p0
, e assim,
−1
p=−rkt− 1
p0= −rp0t+ k
kp0,
e segue que
p = p(t) =kp0
rp0t+ k.
Observemos agora que ainda temos
limt→∞
p(t) = limt→∞
kp0
rp0t+ k= 0,
ou seja, a populacao ainda tende a extincao quando t→∞ no caso em que a taxa de extracao
e igual a taxa de crescimento.
Outra alternativa a extracao proporcional, e a extracao constante. Estamos agora
interessados na equacaodp
dt=(rp− r
kp2)− β, (2.15)
25
sendo β uma constante. Isto significa que estamos fazendo uma extracao de uma quantidade
fixa de β indivıduos da populacao.
Intuitivamente a equacao (2.15) deveria ser mais facil de ser resolvida do que a
equacao (2.12), porque a extracao foi simplificada. Entretanto sob o ponto de vista das
equacoes diferenciais o modelo (2.12) e mais simples, porque o termo βp se junta com o
termo rp, e o lado direito da equacao (2.12) possui apenas dois termos. Na equacao (2.15)
nao podem ser agrupados termos e o lado direito da equacao fica com tres termos distintos.
Vamos primeiro fazer uma analise qualitativa da equacao (2.15), usando a teoria das
equacoes diferenciais autonomas. Colocando
dp
dt=(rp− r
kp2)− β = −β + rp− r
kp2,
temos que as solucoes de equilıbrio sao dadas pelas raızes da funcao g(p) = − rkp
2 + rp− β.
Observe que g(p) e uma funcao quadratica cujo grafico (em relacao a p) e uma
parabola voltada para baixo. Se esta funcao nao possuir duas raızes reais, entao g(p) < 0
para qualquer p. Segue que dpdt = g(p) < 0 e isto significa que a funcao de populacao p(t) e
estritamente decrescente, ja que sua derivada e estritamente negativa. Em outras palavras,
temos a extincao da especie.
Comecamos entao supondo que β < rk4 , ou equivalentemente, 4β
rk < 1, para que g(p)
possua duas raızes reais. Neste caso temos duas solucoes de equilıbrio reais, que sao
p =−r ±
√r2 − 4 rkβ
−2 rk=−r ± r
√1− 4β
rk
−2 rk,
ou ainda,
p1 =k
2
(1−
√1− 4β
rk
)e p2 =
k
2
(1 +
√1− 4β
rk
).
Note que as solucoes de equlıbrio sao ambas positivas ja que,√
1− 4βrk < 1. Observe
ainda que p1 <k2 < p2. Para analise da estabilidade das solucoes de equilıbrio, observemos
que dgdp = g′(p) = −2r
k p+ r. Segue que
g′(p1) =−2r
kp1 + r >
−2r
k
k
2+ r = 0,
e tambem
g′(p2) =−2r
kp2 + r <
−2r
k
k
2+ r = 0.
Assim sendo, a solucao de equilıbrio p1 e sempre instavel e a solucao de equilıbrio
p2 e sempre estavel. Isto significa que
limt→∞
p(t) = p2 =k
2
(1 +
√1− 4β
rk
).
26
Mesmo conhecendo um pouco sobre as solucoes p(t) da equacao (2.15), vamos resol-
ver analiticamente a equacao diferencial para comparar estes resultados. Para isto, lembremos
que a equacao (2.15) e uma equacao de Ricati. Conhecendo uma solucao particular podemos
transformar esta equacao em uma equacao de Bernoulli. Vamos usar uma das solucoes de
equilıbrio. Considere que α e uma das raızes da funcao g(p), isto e, α = k2
(1±
√1− 4β
rk
)e
uma solucao de equilıbrio, que possivelmente teremos que fixar adiante como sendo p1 ou p2.
Consideremos a funcao q(t) = p(t)− α, ou p(t) = q(t) + α. Segue que p′(t) = q′(t) e
a equacao (2.15) fica reescrita na forma
dq
dt= q′ = − r
k(q + α)2 + r(q + α)− β
= − rk
(q2 + 2qα+ α2) + rq + rα− β
=(− rkα2 + rα− β
)− r
kq2 +
(r − 2rα
k
)q
= − rkq2 +
(r − 2rα
k
)q,
ja que (− rkα
2 + rα − β) = 0, pois α e raız de g(p) = − rkp
2 + rp − β. Temos portanto uma
nova equacao diferencial em q,
q′ = − rkq2 +
(r − 2rα
k
)q = − r
k
(q2 + (2α− k)q
).
Reescrevemos esta ultima equacao como
1
q(q + 2α− k)q′ = − r
k,
e integramos ambos os lados em relacao a t, obtendo∫1
q(q + 2α− k)q′dt = −
∫r
kdt,
ou ainda ∫1
q(q + 2α− k)dq = − r
kt+ C. (2.16)
A integral do primeiro membro e obtida pela tecnica de fracoes parciais. Colocamos
1
q(q + 2α− k)=A
q+
B
q + 2α− k,
e calculando A e B para que a igualdade seja satisfeita, obtemos A = 12α−k e B = −1
2α−k .
Assim, ∫1
q(q + 2α− k)dq =
∫1
(2α− k)qdq +
∫−1
(2α− k)(q + 2α− k)dq
=1
2α− k
∫1
qdq − 1
2α− k
∫1
q + 2α− kdq
=1
2α− kln |q| − 1
2α− kln |q + 2α− k|
27
=1
2α− kln
∣∣∣∣ q
q + 2α− k
∣∣∣∣ .Substituindo esta integral em (2.16) temos que
1
2α− kln
∣∣∣∣ q
q + 2α− k
∣∣∣∣ = − rkt+ C,
sendo que C e a constante de integracao. Lembremos agora que q = p− α e entao voltando
para a variavel p, obtemos
1
2α− kln
∣∣∣∣ p− αp+ α− k
∣∣∣∣ = − rkt+ C.
Fazendo t = 0 na ultima igualdade obtemos C = 12α−k ln
∣∣∣ p0−αp0+α−k
∣∣∣. Assim,
1
2α− kln
∣∣∣∣(p− α)(p0 + α− k)
(p0 − α)(p+ α− k)
∣∣∣∣ = − rkt.
ou ainda,
ln
∣∣∣∣(p− α)(p0 + α− k)
(p0 − α)(p+ α− k)
∣∣∣∣ = −r(2α− k)
kt =
r(k − 2α)
kt.
Queremos agora isolar p na ultima igualdade a fim de obter uma expressao explıcita
para a funcao de populacao p(t). Assim, aplicando a exponencial em ambos os membros
obtemos(p− α)(p0 + α− k)
(p0 − α)(p+ α− k)= er(1−
2αk
)t,
e reorganizando
(p− α)(p0 + α− k) = (p0 − α)(p+ α− k)er(1−2αk
)t.
Separando no primeiro membro os termos envolvendo p, temos
p(p0 + α− k)− (p0 − α)per(1−2αk
)t = (p0 − α)(α− k)er(1−2αk
)t + α(p0 + α− k)
o que nos traz
p = p(t) =α(p0 + α− k) + (p0 − α)(α− k)er(1−
2αk
)t
(p0 + α− k)− (p0 − α)er(1−2αk
)t.
Como veremos agora, e indiferente se consideramos α = p1 ou α = p2. Se α = p2
entao α > k2 . Neste caso, temos (1− 2α
k ) < 0. Assim
limt→∞
er(1−2αk
)t = 0,
e portanto
limt→∞
p(t) = limt→∞
α(p0 + α− k) + (p0 − α)(α− k)er(1−2αk
)t
(p0 + α− k)− (p0 − α)er(1−2αk
)t
=α(p0 + α− k)
(p0 + α− k)= α = p2,
28
como havıamos previsto.
Por outro lado, se α = p1 entao α < k2 . Neste caso, temos (1− 2α
k ) > 0. Assim
limt→∞
er(1−2αk
)t =∞,
e portanto
limt→∞
p(t) = limt→∞
α(p0 + α− k) + (p0 − α)(α− k)er(1−2αk
)t
(p0 + α− k)− (p0 − α)er(1−2αk
)t
=(p0 − α)(α− k)
−(p0 − α)= k − α = k − p1 = p2,
como havıamos previsto.
2.5.3 Resfriamento de corpos
De acordo com a lei de resfriamento de corpos, de Newton, a taxa de resfriamento de um
corpo e proporcional a diferenca entre a temperatura do corpo e a temperatura ambiente.
Designando T (t) a temperatura do corpo no instante t, e que a temperatura ambiente seja
constante Tm, a lei de Newton podera ser expressa matematicamente por
d
dtT (t) = k(T (t)− Tm) = kT (t)− kTm.
Note que, como o corpo esta resfriando, temos a temperatura T (t) e decrescente e
assim dTdt < 0. Tambem decorre disto que T (t) > Tm. Para que a igualdade anterior seja
consistente devemos ter entao k < 0.
Tomando entao a equacao
d
dtT (t)− kT (t) = −kTm,
obtemos o fator de integracao
e∫−kdt = e−kt,
e entao a solucao da equacao de resfriamento e
T (t) = Tm + Cekt,
onde o valor da constante C podera ser encontrado considerando-se alguma condicao inicial.
Em geral esta condicao e a temperatura T0 do corpo no instante t = 0, isto e, T (0) = T0.
Esta condicao nos leva a C = (T0 − Tm). Temos portanto que, se T0 e a temperatura inicial
de um corpo inserido em um ambiente com temperatura constante Tm, entao a temperatura
do corpo no instante t > 0 sera dada por
T (t) = Tm + (T0 − Tm)ekt.
29
Note que tomando o limite, quando t→∞, temos T (t)→ Tm, ja que k < 0. Isto tambem e
confirmado pelo estudo dos pontos de equilıbrio. Trata-se de uma equacao autonoma, pois
T ′ = g(T ) = kT − kTm
com um unico ponto de equilıbrio T = Tm. E como g′(T ) = k < 0, a solucao de equilıbrio
T (t) ≡ Tm e estavel.
O valor da constante de proporcionalidade ainda pode ser determinado conhecendo-
se alguma outra informacao sobre o corpo. Em geral, esta outra informacao e a temperatura
em um determinado instante t1 > 0.
2.5.4 Diluicao de solucoes
Um reservatorio A, contendo V litros de um solvente puro (como agua, alcool ou eter), comeca
a receber uma mistura do mesmo solvente com um outro produto soluvel (como sal, acucar
ou corante) na concentracao de k quilogramas por litro, a uma vazao de a litros por segundo.
Um mecanismo de agitacao dentro do reservatorio mantem homogeneo o conteudo
do tanque. No momento em que a mistura comeca a ser inserida, comeca-se tambem a
retirada da solucao homogenea de dentro do tanque na mesma vazao de a litros por segundo.
O conteudo do tanque e entao sempre igual a V litros.
Queremos determinar a quantidade p(t) de produto soluvel, presente no tanque,
apos um tempo t. A taxa de variacao do produto e a taxa de entrada (por unidade de tempo)
menos a taxa de saıda (por unidade de tempo) do produto no tanque, isto e,
d
dtp(t) = entrada− saıda
onde naturalmente
entrada = ka quilograma por segundo
saıda =a
Vp(t) quilograma por segundo
Temos portantod
dtp(t) = ka− a
Vp(t).
A solucao desta equacao diferencial e
p(t) = V k + Ce−aVt,
e como a concentracao no instante t = 0 e zero, temos C = −V k, donde
p(t) = V k − V ke−aVt,
e a quantidade de produto soluvel no tanque decorridos t segundos. Quando t → ∞ a
quantidade p(t) tende a V k quilogramas, isto e,
limt→∞
p(t) = limt→∞
V k − V ke−aVt = V k,
30
e portanto uma concentracao de V kV = k quilogramas de produto por litro. Exatamente a
mesma concentracao de entrada.
Note que a equacao diferencial aqui e tambem autonoma, com solucao de equilıbrio
p(t) ≡ V k que e estavel.
Vamos agora complicar o problema um pouco. Suponha que a solucao que sai do
reservatorio entra em um segundo reservatorio que designaremos por B que contem V2 litros
de solvente puro. Este reservatorio tambem tem um mecanismo de agitacao para manter a
mistura homogenea e um sistema de vazao de a litros por segundo que comeca a funcionar
no instante que o reservatorio comeca a receber o excesso do primeiro reservatorio. O tanque
B recebe entao a litros por segundo, de uma solucao contendo p(t)V quilogramas de produto
soluvel por litro. Denotando y(t) a quantidade de produto soluvel no tanque B no instante
t, temosdy
dt= entradaB − saıdaB.
Mas
entradaB = saıdaA = ap(t)
V= ak − ake−
aVt quilograma por segundo
saıdaB = ay(t)
V2=
a
V2y(t) quilograma por segundo
e entaody
dt=(ak − ake−
aVt)− a
V2y(t).
Note que agora esta equacao nao e mais uma equacao autonoma. Apesar disto, sabemos
como determinar sua solucao. Considerando entao
d
dty(t) +
a
V2y(t) =
(ak − ake−
aVt),
multiplicamos ambos os membros desta igualdade pelo fator de integracao
e∫
aV2dt
= eaV2t
obtendod
dt(y(t)e
aV2t) = ake
aV2t − ake( a
V2− aV
)t. (2.17)
Precisamos tratar separadamente os casos em que V = V2 e V 6= V2, ja que o processo
de integracao que iremos realizar agora traz solucoes diferentes para estes dois casos.
Caso 1) Suponha V = V2, e entao a equacao (2.17) torna-se
d
dt(y(t)e
aVt) = ake
aVt − ak,
e integrando
y(t)eaVt = V ke
aVt − akt+ C,
31
e portanto
y(t) = V k − akte−aVt + Ce−
aVt.
A constante C pode ser determinada pela condicao inicial y(0) = 0, que leva a C = V k, e a
consequente equacao que determina a quantidade de soluto no tanque B no tempo t,
y(t) = V k − akte−aVt + V ke−
aVt.
Caso 2) Suponha agora V 6= V2. Neste caso a equacao (2.17) e diretamente integrada para
obter
y(t)eaV2t
= V2keaV2t − ak 1
aV2− a
V
e( aV2− aV
)t+ C.
Multiplicando por e− aV2t
e reorganizando os termos, obtemos
y(t) = V2k − kV V2
V − V2e−
aVt + Ce
− aV2t.
A constante C pode ser determinada pela condicao inicial y(0) = 0, que agora leva a C =
k V V2V−V2 − V2k = k
V 22
V−V2 . A equacao que determina a quantidade de soluto y(t), no tanque B,
no instante t e
y(t) = V2k − kV V2
V − V2e−
aVt + k
V 22
V − V2e− aV2t.
Observe que, em ambos os casos, ainda temos y(t) → V2k quando t → ∞, donde a
concentracao por litro y(t)V2→ k quando t → ∞. A mesma concentracao por litro que entra
no tanque A.
2.5.5 Decaimento radioativo
O nucleo de um atomo e formado por protons e neutrons. Algumas destas combinacoes sao
instaveis, isto e, tendem a desintegrar-se, geralmente transformando-se em outros elementos.
Nucleos ou atomos com esta propriedade sao chamados de nucleos radioativos.
Como exemplo citamos o isotopo de uranio U-235. Quando este isotopo recebe mais
um neutron, tornando-se U-236, fica instavel e sofre uma fissao nuclear, quebrando-se em dois
outros elementos, o criptonio Kr-92 e o bario Ba-141, e liberando energia, radiacao (gama)
e outros tres neutrons residuais. Estes tres neutrons residuais irao bombardear tres outros
atomos de uranio que gerarao mais energia e 9 neutrons residuais e assim sucessivamente,
numa reacao em cadeia que cresce e libera energia, em escala exponencial. Este e o princıpio
da bomba atomica (processo nao controlado) e tambem de uma usina nuclear (processo
controlado).
Uma lei quımica empırica diz que a taxa de desintegracao de uma substancia radi-
oativa, e proporcional a quantidade remanescente da substancia. Matematicamente, se q(t)
32
e a quantidade (em quilogramas, gramas, atomos) do elemento radioativo presente em um
instante t, entao temosd
dtq(t) = kq(t)
onde k e a constante de proporcionalidade que pode variar de acordo com o elemento ou o
isotopo em questao. De qualquer forma, como o elemento ou substancia esta se desintegrando
entao dqdt < 0 e portanto tambem devemos ter k < 0.
Nestes termos, temos uma equacao diferencial (autonoma), cuja solucao e dada por
q(t) = Cekt.
A constante C pode ser determinada conhecendo-se uma condicao inicial, isto e, a quantidade
inicial q0 do elemento disponıvel no instante t0 = 0. Admitindo entao
q(0) = q0
teremos C = q0 e portanto
q(t) = q0ekt
e a expressao que fornece a quantidade restante do elemento no tempo t.
Um ponto de equilıbrio, ou solucao de equilıbrio e q(t) ≡ 0. Esta solucao e assinto-
ticamente estavel, o que significa que quando t→∞, q(t) tende a esta solucao de equilıbrio.
Em outras palavras,
limt→∞
q(t) = 0.
A constante de proporcionalidade k pode tambem ser determinada conhecendo-se
alguma outra informacao sobre a decomposicao do elemento em questao. Esta informacao e
conhecida como a meia-vida do elemento. E o tempo necessario para que a quantidade do
material radioativo se reduza a metade da quantidade inicial q0. E entao um tempo tm onde
q(tm) =1
2q0.
Nestes termos, temos1
2q0 = q(tm) = q0e
ktm ,
ou ainda,1
2= ektm
donde podemos calcular o valor da constante de proporcionalidade k = 1tm
ln(12) = − 1
tmln 2.
Exemplo 20: Detectou-se que apos 1 ano, 20% da quantidade inicial q0 de um elemento
radioativo havia se desintegrado. Determine a meia-vida deste elemento. Se apos 5 anos
tivermos 100 gramas do elemento, qual era a quantidade inicial? �
Uma das mais importantes aplicacoes desta teoria e a datacao de corpos por Carbono
14 (C-14). Este isotopo e formado na atmosfera pela acao de radiacoes cosmicas. Em 1950 o
33
quımico Willard Libby percebeu que a razao entre a quantidade de C-14 e a quantidade de
Carbono comum (C-12) presentes na atmosfera e constante.
E natural entao pensar que esta proporcao e mantida em organismos vivos, em
virtude da absorcao do carbono da atmosfera pela respiracao ou mesmo pela alimentacao.
Quando o organismo morre, esta absorcao cessa, e o C-14 presente no organismo,
comeca a desintegrar-se. Medindo entao a quantidade de C-14 remanescente no organismo
morto, e comparando com a quantidade original, podemos determinar o momento de sua
morte.
Neste caso, a constante de proporcionalidade k, sera determinada pela meia-vida do
C-14, que sabe-se e cerca de 5600 anos. Meia-vida e o tempo necessario para que a quantidade
q do elemento seja metade da quantidade inicial. Isto e, q(5600) = 12q(0) = 1
2q0.
Exemplo 21: Um osso fossilizado contem 5% da quantidade original de C-14. Determine
a idade deste fossil. �
34
Capıtulo 3
Equacoes diferenciais lineares de
ordem superior
3.1 Teoria preliminar
Definicao 3.1.1. Dada uma variavel independente x e uma variavel dependente y = y(x), a
equacao diferencial
an(x)dny
dxn+ an−1(x)
dn−1y
dxn−1+ · · ·+ a1(x)
dy
dx+ a0(x)y = g(x), (3.1)
para an 6≡ 0, e dita uma equacao diferencial linear de ordem n. As funcoes ai(x), (i =
0, . . . , n), sao chamadas de funcoes coeficientes e g(x) e o termo independente.
Se g(x) = 0 entao a equacao resultante
an(x)dny
dxn+ an−1(x)
dn−1y
dxn−1+ · · ·+ a1(x)
dy
dx+ a0(x)y = 0 (3.2)
e dita homogenea. Se g(x) 6= 0 entao a equacao e dita nao-homogenea.
Um problema de valor inicial (PVI) para esta equacao e um problema da forma{an(x)y(n) + an−1(x)y(n−1) + · · ·+ a1(x)y′ + a0(x)y = g(x)
y(x0) = y0, y′(x0) = y1, . . . , y(n−1)(x0) = yn−1
(3.3)
onde x0 e um ponto do intervalo I, onde as funcoes ai e g(x) estao definidas.
O proximo teorema nos da condicoes para garantir quando um PVI possui solucao.
Teorema 3.1.2 (Picard). Sejam an(x), an−1(x), . . . , a0(x) e g(x) contınuas em um intervalo
I, com an(x) 6= 0 para todo x ∈ I. Se x0 ∈ I, entao existe uma unica solucao y(x) para o
problema (3.3), no intervalo I.
35
Um outro tipo de problema consiste em uma Equacao Diferencial de ordem n ≥ 2
juntamente com n restricoes especificadas em pontos diferentes. Em geral e um problema da
forma {an(x)y(n) + an−1(x)y(n−1) + · · ·+ a1(x)y′ + a0(x)y = g(x)
y(x1) = y1, y(x2) = y2, . . . , y(xn) = yn.
Um problema deste tipo e conhecido como problema de valor de contorno (PVC) ou problema
de fronteira. As condicoes y(xi) = yi para i = 1, . . . , n, sao ditas condicoes de contorno, ou
condicoes de fronteira. Nao esta nos nossos planos o estudo aprofundado de PVCs.
Com o intuito de estudar solucoes para a equacao (3.1), e util estudarmos primeiro
aspectos a respeito da equacao associada homogenea (3.2). Nestes termos, um dos conceitos
mais importantes para o nosso estudo e o de dependencia linear.
Definicao 3.1.3. Dizemos que as funcoes f1(x), f2(x), . . . , fn(x) sao linearmente indepen-
dentes em um intervalo I, se (e somente se), as unicas constantes c1, c2, . . . , cn tais que
c1f1(x) + c2f2(x) + · · ·+ cnfn(x) = 0
para todo x ∈ I, sao c1 = c2 = · · · = cn = 0.
A negacao desta definicao nos fornece a definicao para funcoes linearmente depen-
dentes.
Definicao 3.1.4. Se existirem c1, c2, . . . , cn, nao todas nulas, tais que
c1f1(x) + c2f2(x) + · · ·+ cnfn(x) = 0
para todo x ∈ I, entao as funcoes f1(x), f2(x), . . . , fn(x) sao ditas linearmente dependentes,
em I.
Um criterio para decidir sobre a dependencia ou independencia linear de um conjunto
de funcoes e conhecido pelo nome Wronskiano.
Definicao 3.1.5. Se f1(x), f2(x), . . . , fn(x) sao funcoes com (n− 1) derivadas contınuas em
um certo intervalo I, entao o Wronskiano destas funcoes, denotado por W (f1, f2, . . . , fn), e
a funcao determinante
W (f1, f2, . . . , fn)(x) =
∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣
f1(x) f2(x) · · · fn(x)
f ′1(x) f ′2(x) · · · f ′n(x)...
.... . .
...
f(n−1)1 (x) f
(n−1)2 (x) · · · f
(n−1)n (x)
∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣definida para x ∈ I.
Teorema 3.1.6. Sejam f1(x), f2(x), . . . , fn(x) funcoes (n − 1) vezes diferenciaveis em um
certo intervalo I. Se
W (f1, f2, . . . , fn) 6= 0
em pelo menos um ponto x ∈ I, entao as funcoes f1, . . . , fn sao linearmente independentes.
36
Prova. Provaremos a contra positiva. Suponha entao f1, . . . , fn linearmente dependentes em
I. Entao existem c1, c2, . . . , cn, nao todas nulas tais que
c1f1(x) + c2f2(x) + · · ·+ cnfn(x) = 0
para todo x ∈ I. Derivando (n− 1) vezes em x, obtemos
c1f′1(x) + c2f
′2(x) + · · ·+ cnf
′n(x) = 0
c1f′′1 (x) + c2f
′′2 (x) + · · ·+ cnf
′′n(x) = 0
...
c1f(n−1)1 (x) + c2f
(n−1)2 (x) + · · ·+ cnf
(n−1)n (x) = 0
para todo x ∈ I, exceto possivelmente nos extremos do intervalo I. Desta forma o sistema
nas variaveis c1, . . . , cn,c1f1(x) + c2f2(x) + · · ·+ cnfn(x) = 0
c1f′1(x) + c2f
′2(x) + · · ·+ cnf
′n(x) = 0
...
c1f(n−1)1 (x) + c2f
(n−1)2 (x) + · · ·+ cnf
(n−1)n (x) = 0
e um sistema linear homogeneo, de n variaveis e n equacoes, que possui solucao nao nula,
para qualquer x ∈ I. Como a solucao deste sistema nao e unica (ele tambem possui a solucao
nula), a matriz dos coeficientes tem determinante igual a zero. Isto e,∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣
f1(x) f2(x) · · · fn(x)
f ′1(x) f ′2(x) · · · f ′n(x)...
.... . .
...
f(n−1)1 (x) f
(n−1)2 (x) · · · f
(n−1)n (x)
∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣= 0
para todo x ∈ I. Mas este determinante e precisamente o Wronskiano W (f1, f2, . . . , fn),
donde
W (f1(x), f2(x), . . . , fn(x)) = 0,
para todo x ∈ I, exatamente como desejamos.
No caso em que as funcoes fi (i = 1, . . . , n) sao solucoes da equacao diferencial linear
homogenea (3.2), e possıvel mostrar que se f1, . . . , fn sao LI em algum intervalo I, entao o
Wronskiano destas funcoes e nao nulo, nao somente em um ponto x ∈ I, mas no intervalo
todo. Vejamos isto no proximo teorema.
Teorema 3.1.7. Sejam y1(x), . . . , yn(x), n solucoes para a equacao diferencial linear ho-
mogenea (3.2) em um intervalo I. Entao o conjunto y1, . . . , yn e linearmente independente
em I, se e somente se,
W (y1(x), y2(x), . . . , yn(x)) 6= 0
para todo x ∈ I.
37
Prova. A recıproca e consequencia imediata do teorema anterior, isto e, se
W (y1, . . . , yn)(x) 6= 0
para todo x ∈ I, entao as funcoes y1, . . . , yn sao linearmente independentes.
Para mostrar que se y1, . . . , yn sao LI, entao W (y1, . . . , yn) 6= 0 em todo I, procede-
remos contra positivamente. Assim, suponha que existe x0 ∈ I tal que
W (y1, y2, . . . , yn)(x0) = 0.
Desta forma o sistema homogeneo nas incognitas c1, c2, . . . , cnc1y1(x0) + c2y2(x0) + · · ·+ cnyn(x0) = 0
c1y′1(x0) + c2y
′2(x0) + · · ·+ cny
′n(x0) = 0
...
c1y(n−1)1 (x0) + c2y
(n−1)2 (x0) + · · ·+ cny
(n−1)n (x0) = 0
tem a matriz dos coeficientes com determinante nulo. Isto significa que a solucao deste
sistema nao e unica, e portanto existem c1, . . . , cn nao todas nulas, satisfazendo este sistema.
Definimos
y(x) = c1y1(x) + c2y2(x) + · · ·+ cnyn(x).
Notemos que y(x) definida assim, e solucao do PVI{an(x)y(n) + an−1(x)y(n−1) + · · ·+ a1(x)y′ + a0(x)y = 0
y(x0) = 0, y′(x0) = 0, . . . , y(n−1)(x0) = 0
Mas a funcao nula Y (x) ≡ 0 e tambem solucao deste PVI. De acordo com o teorema de
Picard, a solucao do PVI e unica em todo x ∈ I, e portanto
c1y1(x) + c2y2(x) + · · ·+ cnyn(x) = 0
para todo x ∈ I, donde y1, y2, . . . , yn sao linearmente dependentes.
Os dois proximos teoremas garantirao que a solucao de uma equacao diferencial
linear homogenea de ordem n e formada pela combinacao linear de n solucoes linearmente
independentes.
Teorema 3.1.8. Sejam y1, y2, . . . , yn, n solucoes linearmente independentes para a equacao
diferencial linear homogenea (3.2) em um intervalo I. Entao a combinacao linear
y(x) = c1y1(x) + c2y2(x) + · · ·+ cnyn(x),
para quaisquer constantes c1, c2, . . . , cn e ainda uma solucao da ED homogenea.
38
Prova. De fato, dadas constantes c1, c2, . . . , cn, temos
an(x)y(n) + an−1(x)y(n−1) + · · ·+ a1(x)y′ + a0(x)y
= an(x)(c1y1 + c2y2 + · · ·+ cnyn)(n)
+ an−1(x)(c1y1 + c2y2 + · · ·+ cnyn)(n−1)+
...
+ a1(x)(c1y1 + c2y2 + · · ·+ cnyn)′
+ a0(x)(c1y1 + c2y2 + · · ·+ cnyn)
= c1(an(x)y(n)1 + an−1(x)y
(n−1)1 + · · ·+ a1(x)y′1 + a0(x)y1)
+ c2(an(x)y(n)2 + an−1(x)y
(n−1)2 + · · ·+ a1(x)y′2 + a0(x)y2)
...
+ cn(an(x)y(n)n + an−1(x)y(n−1)
n + · · ·+ a1(x)y′n + a0(x)yn)
= 0 + 0 + · · ·+ 0 = 0,
o que prova que y(x) e solucao da equacao homogenea.
Teorema 3.1.9. Sejam y1, y2, . . . , yn, n solucoes linearmente independentes para a equacao
diferencial linear homogenea (3.2) em um intervalo I. Qualquer solucao Y (x) para esta ED
em I, e combinacao linear de y1, y2, . . . , yn, isto e, existem constantes c1, c2, . . . , cn tais que
Y (x) = c1y1(x) + c2y2(x) + · · ·+ cnyn(x).
Prova. Suponha y1(x), . . . , yn(x) as n solucoes linearmente independentes da equacao dife-
rencial (3.2) em I, e Y (x) uma outra solucao qualquer da equacao em I. A ideia aqui e
montar um problema de valor inicial no qual Y (x) seja solucao e uma combinacao linear das
funcoes yi tambem seja solucao.
Seja x0 ∈ I. Como W (y1, y2, . . . , yn) 6= 0 em todo o intervalo I, entao temos
W (y1(x0), y2(x0), . . . , yn(x0)) 6= 0.
Colocando w0 = Y (x0), w1 = Y ′(x0), w2 = Y ′′(x0), . . . , wn−1 = Y n−1(x0), construımos o
PVI, {an(x)y(n) + an−1(x)y(n−1) + · · ·+ a1(x)y′ + a0(x)y = 0
y(x0) = w0, y′(x0) = w1, . . . , y(n−1)(x0) = wn−1.
Tambem construımos um sistema de equacoes lineares nas incognitas c1, c2, . . . , cn dado porc1y1(x0) + c2y2(x0) + · · ·+ cnyn(x0) = w0
c1y′1(x0) + c2y
′2(x0) + · · ·+ cny
′n(x0) = w1
...
c1y(n−1)1 (x0) + c2y
(n−1)2 (x0) + · · ·+ cny
(n−1)n (x0) = wn−1
39
que e um sistema linear, nao homogeneo cuja matriz dos coeficientesy1(x0) y2(x0) · · · yn(x0)
y′1(x0) y′2(x0) · · · y′n(x0)...
.... . .
...
y(n−1)1 (x0) y
(n−1)2 (x0) · · · y
(n−1)n (x0)
tem determinante nao nulo. Existem portanto c1, c2, . . . , cn, unicamente determinados, solucao
do sistema. Tomamos estes ci e escrevemos a combinacao linear
F (x) = c1y1(x) + c2y2(x) + · · ·+ cnyn(x).
Notemos que esta combinacao linear e solucao do PVI construıdo acima. De fato,
o teorema 3.1.8 garante que a combinacao e solucao da equacao diferencial homogenea, e
as constantes c1, . . . , cn foram determinadas para cumprir as condicoes iniciais. Tambem a
funcao Y (x) e solucao do PVI, e portanto pelo teorema de Picard, as duas solucoes coincidem,
isto e,
Y (x) = F (x) = c1y1(x) + c2y2(x) + · · ·+ cnyn(x)
exatamente como desejamos.
Os teoremas 3.1.8 e 3.1.9 nos dizem que uma funcao y(x) e solucao da equacao
diferencial linear homogenea de ordem n, se e somente se, e uma combinacao linear de n
solucoes linearmente independentes. Nosso trabalho entao passa a ser procurar as n solucoes
linearmente independentes. Isto motiva a seguinte definicao de solucao geral de uma ED
linear homogenea de ordem n.
Definicao 3.1.10. Se y1, y2, . . . , yn sao n solucoes linearmente independentes da equacao
linear homogenea (3.2), de ordem n, em um intervalo I, entao a solucao geral para esta
equacao, no intervalo I, e
y(x) = c1y1(x) + c2y2(x) + · · ·+ cnyn(x)
para c1, c2, . . . , cn constantes.
Definicao 3.1.11. Um conjunto de solucoes y1, y2, . . . , yn linearmente independentes, para
a ED linear homogenea de ordem n em um intervalo I, e dito um conjunto fundamental de
solucoes.
Demos um passo importante para caracterizar as solucoes de uma equacao ho-
mogenea. Mas estamos interessados em obter solucoes para a equacao nao homogenea cor-
respondente. Os proximos dois teoremas nos dirao como sao as solucoes de uma ED linear
nao homogenea de ordem n.
40
Teorema 3.1.12. Sejam y1, y2, . . . , yn as n solucoes da equacao diferencial linear homogenea
(3.2) de ordem n, em um intervalo I, e yp uma solucao em I para a equacao nao homogenea
correspondente (3.1). Entao
y(x) = c1y1(x) + c2y2(x) + · · ·+ cnyn(x) + yp(x)
e ainda solucao da equacao nao homogenea para quaisquer constantes c1, c2, . . . , cn.
Prova. De fato,
an(x)y(n) + an−1(x)y(n−1) + · · ·+ a1(x)y′ + a0(x)y
= an(x)(c1y1 + c2y2 + · · ·+ cnyn + yp)(n)
+ an−1(x)(c1y1 + c2y2 + · · ·+ cnyn + yp)(n−1)+
...
+ a1(x)(c1y1 + c2y2 + · · ·+ cnyn + yp)′
+ a0(x)(c1y1 + c2y2 + · · ·+ cnyn + yp)
= c1(an(x)y(n)1 + an−1(x)y
(n−1)1 + · · ·+ a1(x)y′1 + a0(x)y1)
+ c2(an(x)y(n)2 + an−1(x)y
(n−1)2 + · · ·+ a1(x)y′2 + a0(x)y2)
...
+ cn(an(x)y(n)n + an−1(x)y(n−1)
n + · · ·+ a1(x)y′n + a0(x)yn)
+ (an(x)y(n)p + an−1(x)y(n−1)
p + · · ·+ a1(x)y′p + a0(x)yp)
= 0 + 0 + · · ·+ 0 + g(x) = g(x),
e isto prova que y(x) e solucao da equacao nao homogenea.
Teorema 3.1.13. Se yp e alguma solucao para a equacao linear nao homogenea (3.1) em
um intervalo I, e y1, . . . , yn sao n solucoes linearmente independentes da equacao homogenea
correspondente, no mesmo intervalo I, entao qualquer solucao Y (x) da equacao diferencial
nao homogenea e necessariamente da forma
Y (x) = c1y1(x) + c2y2(x) + · · ·+ cnyn(x) + yp(x)
para alguma constante c1, c2, . . . , cn.
Prova. Suponha Y (x) e yp(x) solucoes da equacao diferencial nao homogenea (3.1). Definimos
F (x) = Y (x) − yp(x). Entao esta diferenca e solucao da equacao diferencial homogenea
correspondente. De fato,
an(x)F (n)(x) + an−1(x)F (n−1)(x) + · · ·+ a1(x)F ′(x) + a0(x)F (x)
= an(x)(Y (x)− yp(x))(n) + an−1(x)(Y (x)− yp(x))(n−1) + . . .
+ a1(x)(Y (x)− yp(x))′ + a0(x)(Y (x)− yp(x))
= an(x)Y (n)(x) + · · ·+ a1(x)Y ′(x) + a0(x)Y (x)
41
−(an(x)y(n)
p (x) + · · ·+ a1(x)y′p(x) + a0(x)yp(x))
= g(x)− g(x) = 0.
Mas do teorema 3.1.9 toda solucao da equacao homogenea e uma combinacao linear
das n solucoes linearmente independentes y1, . . . , yn. Assim, existem c1, c2, . . . , cn tais que
Y (x)− yp(x) = c1y1(x) + c2y2(x) + · · ·+ cnyn(x),
ou ainda,
Y (x) = c1y1(x) + c2y2(x) + · · ·+ cnyn(x) + yp(x),
o que encerra esta demonstracao.
Determinar entao solucoes para a equacao diferencial (3.1), consiste basicamente
em duas etapas. Encontrar as n solucoes linearmente independentes da equacao homogenea
associada, e encontrar uma solucao particular yp. Estas duas etapas serao discutidas separa-
damente nas proximas duas secoes.
3.2 EDs lineares homogeneas a coeficientes constantes
Estamos agora interessados em obter as n solucoes linearmente independentes da equacao
homogenea
any(n) + an−1y
(n−1) + · · ·+ a1y′ + a0y = 0, (3.4)
onde os coeficientes an, an−1, . . . , a1, a0 sao constantes e an 6= 0.
Um fato interessante sobre esta equacao e que todas as solucoes sao exponenciais ou
sao obtidas atraves de exponenciais. Apenas como inspiracao inicial, vamos analisar um caso
mais simples com n = 2. Renomeando os coeficientes, temos entao um interesse na equacao
linear homogenea de ordem 2,
ay′′ + by′ + cy = 0, (3.5)
onde a, b, c sao constantes reais com a 6= 0.
Parece natural procurarmos uma solucao em termos da exponencial y = emx, ja que
dependendo das constantes a, b e c, e do valor de m, pode ocorrer cancelamento de todos os
termos no primeiro membro.
Procuramos entao os valores de m para os quais a funcao y = emx seja solucao de
(3.5). Temos entao
y(x) = emx
y′(x) = memx
y′′(x) = m2emx,
42
e substituindo em (3.5) temos
am2emx + bmemx + cemx = 0
ou ainda,
(am2 + bm+ c)emx = 0.
Mas, como emx 6= 0 para qualquer valor de x, a igualdade somente se verifica se
am2 + bm+ c = 0. (3.6)
Esta e uma equacao do segundo grau em m, dita equacao auxiliar de (3.5). Suas
raızes sao os valores de m para os quais y = emx e solucao de (3.5). Mas sabemos que as
duas raızes de (3.6) podem ser
1) reais distintas,
2) complexas conjugadas,
3) reais iguais.
Vamos analisar cada caso separadamente.
Caso 1) Suponha m1 e m2 solucoes reais (distintas) de (3.6). Entao
y1(x) = em1x e y2(x) = em2x
sao duas solucoes (3.5). Mais do que isto, sao solucoes linearmente independentes. De fato,
W (em1x, em2x) =
∣∣∣∣∣ em1x em2x
m1em1x m2e
m2x
∣∣∣∣∣= m2e
(m1+m2)x −m1e(m1+m2)x
= (m2 −m1)e(m1+m2)x.
Como (m2 −m1) 6= 0, pois as raızes sao distintas, e e(m1+m2)x 6= 0 para todo x ∈ R, entao
W (em1x, em2x) 6= 0
para todo x ∈ R. Isto prova que as funcoes y1 = em1x e y2 = em2x sao linearmente indepen-
dentes. Temos entao uma equacao de ordem 2 e duas solucoes linearmente independentes.
Segue do teorema 3.1.9 que toda solucao y(x) da equacao (3.5) e uma combinacao linear
destas duas solucoes, isto e,
y(x) = C1em1x + C2e
m2x,
para quaisquer constantes reais C1 e C2.
Caso 2) Suponha m1 e m2 raızes complexas conjugadas de (3.6), isto e,
m1 = (α+ iβ) e m2 = (α− iβ).
43
Entao
y1 = e(α+iβ)x e y2 = e(α−iβ)x
sao as solucoes de (3.5). Mas gostarıamos que estas solucoes estivessem em termos de funcoes
reais. Usaremos entao a formula de Euler
eiθ = cos θ + i sen θ
e assim, a solucao da ED (3.5) pode ser dada por
y(x) = C1eαx+iβx + C2e
αx−iβx
= eαx(C1eiβx + C2e
−iβx)
= eαx (C1 cos(βx) + C1i sen(βx) + C2 cos(−βx) + C2i sen(−βx))
= (C1 + C2)eαx cos(βx) + (C1i− C2i)eαx sen(βx).
Embora a segunda constante seja complexa, podemos verificar que
y1(x) = eαx cos(βx)
y2(x) = eαx sen(βx)
sao duas solucoes de (3.5) quando (α± iβ) sao raızes de (3.6). Deixamos isto como exercıcio.
Alem disso, y1(x) = eαx cos(βx) e y2(x) = eαx sen(βx) sao linearmente independen-
tes em R. De fato,
W (y1, y2) =
∣∣∣∣∣ eαx cos(βx) eαx sen(βx)
αeαx cos(βx)− βeαx sen(βx) αeαx sen(βx) + βeαx cos(βx)
∣∣∣∣∣= αe2αx sen(βx) cos(βx) + βe2αx cos2(βx)
− αe2αx sen(βx) cos(βx) + βe2αx sen2(βx)
= βe2αx(cos2(βx) + sen2(βx))
= βe2αx,
e como e2αx 6= 0 para qualquer x ∈ R, e β 6= 0 (se β = 0 as raızes seriam reais), as funcoes
y1(x) e y2(x) sao de fato LI. Logo, pelo teorema 3.1.9 toda solucao de (3.5) e da forma
y(x) = C1eαx cos(βx) + C2e
αx sen(βx)
= eαx(C1 cos(βx) + C2 sen(βx))
para quaisquer C1 e C2 constantes reais.
Caso 3) Suponha m a unica raız real de (3.6). Entao temos em
y1 = emx
uma solucao para (3.5). Para conhecer a solucao geral de (3.5) precisamos de mais uma
solucao que seja linearmente independente com y1 = emx. Para procurar uma segunda
solucao, usaremos a tecnica de variacao dos parametros usada anteriormente.
44
Desejamos obter uma funcao u(x), tal que, y2 = uy1 = u(x)emx ainda seja solucao
de (3.5). Entao,
y2 = uemx
y′2 = u′emx +muemx
y′′2 = u′′emx + 2mu′emx +m2uemx
e entao
ay′′2 + by′2 + cy2 = au′′emx + 2amu′emx + am2uemx
+ bu′emx + bmuemx + cuemx
= (am2 + bm+ c)uemx + (au′′ + (2am+ b)u′)emx
= (au′′ + (2am+ b)u′)emx.
Para que ay′′2 + by′2 + cy2 = 0, devemos entao ter
au′′ + (2am+ b)u′ = 0.
Mas note que sendo m raız da equacao auxiliar, entao m = −b2a , ja que ∆ = 0. Nestes termos,
(2am + b) = 2a(−b2a ) + b = 0. Resta que au′′ = 0, e como a 6= 0, entao temos finalmente que
y2(x) = u(x)emx sera uma solucao de (3.5) se
u′′(x) = 0,
ou ainda,
u(x) = k1x+ k2.
Nestes termos, temos
y2(x) = u(x)emx = k1xemx + k2e
mx.
Observe que podemos descartar k2emx (tomamos k2 = 0), pois esta parcela ja e multiplo
escalar de y1(x) = emx, portanto uma parcela linearmente dependente com y1, e como ja
mencionado, estamos interessados em y2 linearmente independente com y1. Desta forma,
reduzimos y2 para
y2(x) = k1xemx.
Tambem podemos fazer k1 = 1, pois o teste de dependencia linear pode ser feito com qualquer
multiplo de y2.
Temos portanto as solucoes
y1(x) = emx
y2(x) = xemx
e vamos verificar que tratam-se de duas solucoes linearmente independentes. De fato,
W (y1, y2) =
∣∣∣∣∣ emx xemx
memx (emx +mxemx)
∣∣∣∣∣45
= e2mx +mxe2mx −mxe2mx
= e2mx,
donde claramente W (y1, y2) 6= 0, para todo x ∈ R. Segue que y1(x) = emx e y2(x) = xemx
sao duas solucoes linearmente independentes da equacao linear homogenea (3.5) e portanto
pelo teorema 3.1.9 a solucao geral desta equacao e
y(x) = C1emx + C2xe
mx.
Com isto varremos todos os possıveis casos para as raızes da equacao auxiliar (3.6).
Temos entao o seguinte roteiro para uma ED linear homogenea de ordem 2 com coeficientes
constantes.
1- Dada a equacao ay′′ + by′ + cy = 0 montar a equacao auxiliar do segundo grau
am2 + bm+ c = 0.
2- Determinar as raızes da equacao auxiliar. Se as raızes forem:
a) Dois numeros reais distintos m1 e m2, entao a solucao e:
y(x) = C1em1x + C2e
m2x.
b) Reais e iguais, digamos a m, entao a solucao e:
y(x) = C1emx + C2xe
mx.
c) Dois numeros complexos conjugados (α± βi), entao a solucao e:
y(x) = eαx(C1 cos(βx) + C2 sen(βx)).
Exemplo 22: Determinar a solucao geral da equacao y′′ + y′ − 12y = 0. �
Exemplo 23: Determinar a solucao geral da equacao y′′ − 4y′ + 5y = 0. �
Podemos extender estas ideias para o caso geral. Considerando a equacao diferencial
linear homogenea de ordem n a coeficientes constantes
any(n) + an−1y
(n−1) + · · ·+ a2y′′ + a1y
′ + a0y = 0,
parece natural procurarmos solucao em termos da funcao exponencial y = emx. Determinando
as derivadas e substituindo na equacao, obtemos a equacao polinomial auxiliar
anmn + an−1m
n−1 + · · ·+ a2m2 + a1m+ a0 = 0.
Isto significa que a funcao y = emx sera solucao da equacao de ordem n se m for uma
raız da equacao auxiliar. As n raızes m1, m2, . . . , mn, desta equacao auxiliar determinarao
as n solucoes linearmente independentes que compoem a solucao geral.
46
a) As raızes reais e distintas mj produzem cada uma a solucao
yj = emjx.
b) As raızes reais de multiplicidade k, isto e,
mj = mj+1 = mj+2 = · · · = mj+k−1 = m
produzem as solucoes
yj = emx
yj+1 = xemx
yj+2 = x2emx
...
yj+k−1 = xk−1emx.
c) Cada par de raızes complexas conjugadas (α± βi) produzem o par de solucoes
yj = eαx cos(βx)
yj+1 = eαx sen(βx)
O que pode agora ocorrer (que nao ocorre com a equacao de ordem 2) e que a equacao
polinomial auxiliar de ordem n > 2 pode assumir raızes complexas com multiplicidade. Para
estas raızes, digamos com multiplicidade k, as solucoes podem ser obtidas pelo metodo de
variacao dos parametros, como no caso das raızes reais com multiplicidade k, e sao
yj = eαx cos(βx)
yj+1 = eαx sen(βx)
yj+2 = xeαx cos(βx)
yj+3 = xeαx sen(βx)
yj+4 = x2eαx cos(βx)
yj+5 = x2eαx sen(βx)
...
yj+k−2 = xk−1eαx cos(βx)
yj+k−1 = xk−1eαx sen(βx).
Observe ainda que este procedimento sempre nos permitira encontrar a solucao geral.
As vezes com um certo trabalho, pois encontrar as raızes de uma equacao de grau n pode
nao ser uma tarefa muito simples. Porem sendo o conjunto dos numeros complexos um corpo
algebricamente fechado, existem as n raızes complexas.
47
Exemplo 24: Considerando a equacao diferencial y′′′ − y′′ − 4y′ − 6y = 0, montamos a
equacao auxiliar
m3 −m2 − 4m− 6 = 0.
Esta equacao pode ser reorganizada como
(m− 3)(m2 + 2m+ 2) = 0,
e suas raızes sao portanto 3, −1± i. As tres solucoes linearmente independentes sao portanto
y1 = e3x, y2 = e−x cosx, y3 = e−x senx,
e a solucao geral e
y(x) = C1e3x + C2e
−x cosx+ C3e−x senx,
para quaisquer constantes C1, C2, C3 ∈ R. �
Exemplo 25: Para determinar a solucao da equacao y(4)−y′′′−3y′′+5y′−2y = 0, notemos
que as raızes da equacao auxiliar
m4 −m3 − 3m2 + 5m− 2 = (m− 1)(m− 1)(m− 1)(m+ 2) = 0
sao 1, 1, 1 e -2. Desta forma, as quatro solucoes linearmente independentes sao
y1 = e−2x, y2 = ex, y3 = xex, y4 = x2ex,
e a solucao e dada por
y(x) = C1e−2x + C2e
x + C3xex + C4x
2ex,
para quaisquer constantes C1, C2, C3 e C4. �
Exemplo 26: Para determinar a solucao da equacao y(4) − 4y′′′ + 9y′′ − 4y′ + 8y = 0,
tomemos a equacao auxiliar
m4 − 4m3 + 9m2 − 4m+ 8 = (m2 + 1)(m2 − 4m+ 8) = 0
cujas raızes sao (±i) e (2± 2i). As quatro solucoes linearmente independentes sao
y1 = e0x cos(1x), y2 = e0x sen(1x), y3 = e2x cos(2x), y4 = e2x sen(2x),
e a solucao geral e entao
y(x) = C1 cosx+ C2 senx+ C3e2x cos(2x) + C4e
2x sen(2x),
para quaisquer constantes C1, C2, C3 e C4. �
48
3.3 EDs lineares nao homogeneas a coeficientes constantes
Como vimos anteriormente as solucoes da equacao (3.1) sao da forma y(x) = yc(x) + yp(x),
onde yc(x) e a solucao geral da equacao homogenea associada.
Veremos agora alguns metodos para determinar uma solucao particular yp da equa-
cao nao homogenea
any(n) + an−1y
(n−1) + · · ·+ a1y′ + a0y = g(x),
para coeficientes constantes an, an−1, . . . , a1, a0 com an 6= 0, e g(x) alguma funcao definida
em um intervalo I.
3.3.1 Metodo da variacao dos parametros
Embora estejamos interessados em equacoes diferenciais com coeficientes constantes, este
metodo pode tambem ser aplicado a equacoes com coeficientes variaveis. Lembremos que
este metodo ja foi utilizado nas secoes 2.3 e 3.2, para obter uma solucao yp, a partir das
solucoes da equacao homogenea.
Apenas como inspiracao inicial, estudaremos a equacao de ordem 2
ay′′ + by′ + cy = g(x). (3.7)
Ja sabemos que a equacao diferencial homogenea associada, possui duas solucoes y1 e y2
linearmente independentes em algum intervalo I, e solucao geral dada por
yc(x) = C1y1(x) + C2y2(x),
em I, para C1 e C2 constantes reais.
Queremos determinar duas funcoes u e v, definidas em I, tais que
yp(x) = u(x)y1(x) + v(x)y2(x)
seja ainda uma solucao da equacao (3.7). A solucao particular procurada. Entao,
yp = uy1 + vy2
y′p = u′y1 + uy′1 + v′y2 + vy′2
y′′p = u′′y1 + u′y′1 + u′y′1 + uy′′1 + v′′y2 + v′y′2 + v′y′2 + vy′′2
e substituindo no lado esquerdo de (3.7), temos
ay′′p + by′p + cyp = a(u′′y1 + 2u′y′1 + uy′′1 + v′′y2 + 2v′y′2 + vy′′2)
+ b(u′y1 + uy′1 + v′y2 + vy′2) + c(uy1 + vy2)
= (ay′′1 + by′1 + cy1)u+ (ay′′2 + by′2 + cy2)v
49
+ 2ay′1u′ + by1u
′ + 2ay′2v′ + by2v
′ + au′′y1 + av′′y2
= 2ay′1u′ + by1u
′ + 2ay′2v′ + by2v
′ + au′′y1 + av′′y2
= 2ay′1u′ + by1u
′ + 2ay′2v′ + by2v
′ + a(u′y1)′ − au′y′1 + a(v′y2)′ − av′y′2= a(u′y1 + v′y2)′ + a(u′y′1 + v′y′2) + b(u′y1 + v′y2).
Como queremos que yp seja solucao de (3.7), queremos
a(u′y1 + v′y2)′ + a(u′y′1 + v′y′2) + b(u′y1 + v′y2) = ay′′p + by′p + cyp = g(x).
Uma das maneiras de conseguir esta igualdade e considerar que{u′y1 + v′y2 = 0
u′y′1 + v′y′2 = 1ag(x).
Note que este e um sistema nas variaveis u′ e v′, cuja matriz dos coeficientes e o Wronskiano
de y1 e y2, que e nao nulo em I, em virtude da independencia linear de y1 e y2. Resolvendo
entao este sistema encontramos u′ e v′, que (pela regra de Cramer) sao precisamente
u′ =W1
Wsendo W1 =
∣∣∣∣∣ 0 y2
1ag(x) y′2
∣∣∣∣∣ ,e
v′ =W2
Wsendo W2 =
∣∣∣∣∣ y1 0
y′11ag(x)
∣∣∣∣∣eW e o WronskianoW (y1, y2). Integrando agora, encontramos as funcoes u e v, e substituindo
em yp = uy1 + vy2 teremos a solucao particular desejada no intervalo I.
Generalizando entao este metodo para equacoes de ordem n, dada a ED linear nao
homogenea a coeficientes constantes
any(n) + an−1y
(n−1) + · · ·+ a1y′ + a0y = g(x),
tomamos a ED homogenea associada
any(n) + an−1y
(n−1) + · · ·+ a1y′ + a0y = 0
que possui n solucoes y1, y2, . . . , yn, linearmente independentes em um intervalo I. Procura-
mos u1, u2, . . . , un, tais que
yp = u1y1 + u2y2 + · · ·+ un−1yn−1 + unyn
seja a solucao particular da equacao nao homogenea. Tais funcoes satisfazem o sistema
u′1y1 + u′2y2 + · · ·+ u′nyn = 0
u′1y′1 + u′2y
′2 + · · ·+ u′ny
′n = 0
u′1y′′1 + u′2y
′′2 + · · ·+ u′ny
′′n = 0
...
u′1y(n−1)1 + u′2y
(n−1)2 + · · ·+ u′ny
(n−1)n = g(x)
an
50
e podem ser determinadas, pela regra de Cramer, por
u′i =Wi
Wi = 1, 2, . . . , n,
onde W = W (y1, y2, . . . , yn) e Wi e o determinante da matriz dos coeficientes (matriz do
Wronskiano), com a i-esima coluna substituıda pela coluna dos termos independentes
0
0...
g(x)an.
Por integracao obtemos as funcoes u1, u2, . . . , un e consequentemente a solucao par-
ticular procurada, yp = u1y1 +u2y2 +u3y3 + · · ·+unyn, que juntamente com yc(x), a solucao
geral da equacao homogenea associada, compoe a solucao geral da ED linear nao homogenea.
Exemplo 27: Determinar a solucao de y′′ − y = senh(2x). Temos a equacao homogenea
y′′ − y = 0, e a equacao auxiliar m2 − 1 = 0, cujas raızes sao m = ±1. Temos assim, y1 = ex
e y2 = e−x. Sao solucoes linearmente independentes em R, pois,
W (y1, y2) =
∣∣∣∣∣ ex e−x
ex −e−x
∣∣∣∣∣ = −1− 1 = −2 6= 0.
Queremos agora u1 e u2 tais que
yp = u1y1 + u2y2
seja solucao da equacao nao homogenea. As funcoes u1 e u2 satisfazem o sistema{u′1e
x + u′2e−x = 0
u′1ex + u′2(−e−x) = senh(2x)
Sao entao
u′1 =W1
W=−1
2
∣∣∣∣∣ 0 e−x
senh(2x) −e−x
∣∣∣∣∣ = −1
2(−e−x senh(2x)) =
ex − e−3x
4
u1 =ex
4+e−3x
12
u′2 =W2
W=−1
2
∣∣∣∣∣ ex ex
0 senh(2x)
∣∣∣∣∣ = −1
2ex senh(2x) = −e
3x − e−x
4
u2 = −e3x
12− e−x
4
Logo, a solucao particular e
yp =
(ex
4+e−3x
12
)ex −
(e3x
12+e−x
4
)e−x
=1
12
(3e2x + e−2x − e2x − 3e−2x
)51
=1
6
(e2x − e−2x
)=
1
3
(e2x − e−2x
2
)=
1
3senh(2x).
Segue que a solucao geral e
y(x) = yc(x) + yp(x) = C1ex + C2e
−x +1
3senh(2x),
para quaisquer C1 e C2 constantes reais. �
Exemplo 28: Determinar a solucao geral da equacao diferencial y′′′ − 2y′′ = x2. Temos a
equacao homogenea y′′′ − 2y′′ = 0, e a equacao auxiliar m3 − 2m2 = m2(m − 2) = 0, cujas
raızes sao 0, 0, e 2. Temos assim, y1 = e2x, y2 = 1 e y3 = x. Sao solucoes linearmente
independentes em R, pois,
W (y1, y2, y3) =
∣∣∣∣∣∣∣∣e2x 1 x
2e2x 0 1
4e2x 0 0
∣∣∣∣∣∣∣∣ = 4e2x 6= 0.
Queremos agora u1, u2 e u3 para que
yp = u1y1 + u2y2 + u3y3
seja a solucao particular da equacao nao homogenea. As funcoes u1, u2 e u3 sao obtidas pela
solucao do sistema u′1e
2x + u′2 + u′3x = 0
u′12e2x + 0 + u′3 = 0
u′14e2x + 0 + 0 = x2
Sao entao
u′1 =W1
W=
1
4e2x
∣∣∣∣∣∣∣∣0 1 x
0 0 1
x2 0 0
∣∣∣∣∣∣∣∣ =1
4x2e−2x,
u1 = −1
8x2e−2x − 1
8xe−2x − 1
16e−2x.
u′2 =W2
W=
1
4e2x
∣∣∣∣∣∣∣∣e2x 0 x
2e2x 0 1
4e2x x2 0
∣∣∣∣∣∣∣∣ =1
4e2x(2x3e2x − x2e2x) =
1
2x3 − 1
4x2,
u2 =1
8x4 − 1
12x3.
u′3 =W3
W=
1
4e2x
∣∣∣∣∣∣∣∣e2x 1 0
2e2x 0 0
4e2x 0 x2
∣∣∣∣∣∣∣∣ = − 1
4e2x2x2e2x = −1
2x2,
u3 = −1
6x3.
A solucao particular e entao
yp =
(−1
8x2e−2x − 1
8xe−2x − 1
16e−2x
)e2x +
(1
8x4 − 1
12x3
)+
(−1
6x3
)x
52
= − 1
24x4 − 1
12x3 − 1
8x2 − 1
8x− 1
16.
Note que podemos descartar da solucao particular os termos −18x e − 1
16 , pois sao linearmente
dependentes com y2 e y3, e somente nos interessam as parcelas linearmente independentes.
Temos entao a solucao geral da equacao
y(x) = yc(x) + yp(x) = C1e2x + C2x+ C3 −
(1
24x4 +
1
12x3 +
1
8x2
),
para quaisquer C1, C2 e C3 constantes reais. �
3.3.2 Metodo dos coeficientes indeterminados (superposicao)
O metodo dos coeficientes indeterminados, ou dos coeficientes a serem determinados, baseia-
se no fato de que talvez possamos observar g(x) e deduzir a forma da solucao particular yp,
ja que as derivadas de yp e que irao constituir g(x).
Se g(x) for um polinomio P (x) com grau(P ) = m. E natural pensar que yp tambem
seja um polinomio de grau igual (ou maior) a m. Isto porque as derivadas de um polinomio
ainda sao polinomios, e entao apos substituirmos as derivadas de yp na equacao diferencial
(3.1), os termos podem se reorganizar para obtermos uma igualdade.
Se g(x) for da forma g(x) = eαx, para α ∈ R. Neste caso, podemos imaginar que yp
seja tambem dada por esta exponencial, pois suas derivadas continuam sendo exponenciais,
e a substituicao em (3.1) pode realmente satisfazer a igualdade.
No caso em que g(x) e da forma g(x) = cos(βx) (ou g(x) = sen(βx)), para β ∈ R.
Podemos imaginar que yp tambem seja dada por estes senos e cossenos ja que as derivadas
sucessivas de senos e cossenos se repetem e podemos efetivamente obter uma igualdade em
(3.1).
O que pretendemos entao e “dar um chute” (um “bom chute”) de quem possivel-
mente sera a solucao particular yp, usando em yp coeficientes, que serao determinados para
que efetivamente yp se torne uma solucao particular de (3.1).
Este metodo somente sera bem sucedido em equacoes lineares, nao homogeneas, com
coeficientes constantes e nos casos em que g(x) e uma funcao cujas antiderivadas sejam pre-
visıveis. Isto e, uma funcao polinomial, uma funcao exponencial, uma funcao trigonometrica,
ou somas e produtos destas funcoes.
Observacao. A funcao constante e tambem uma funcao polinomial (de grau 0) e seno e
cosseno hiperbolicos sao somas de exponenciais. Isto significa que nestes casos este metodo
pode ser usado com sucesso.
Vejamos algumas possibilidades para g(x) e a escolha apropriada para yp. Na tabela
abaixo, P (x) e um polinomio de grau m, e α e β sao numeros reais.
53
g(x) yp(x)
P (x) Amxm + · · ·+A1x+A0
eαx Aeαx
P (x)eαx (Amxm + · · ·+A1x+A0)eαx
cos(βx)
sen(βx)
}A cos(βx) +B sen(βx)
cosh(βx)
senh(βx)
}A cosh(βx) +B senh(βx)
eαx cos(βx)
eαx sen(βx)
}Aeαx cos(βx) +Beαx sen(βx)
P (x) cos(βx)
P (x) sen(βx)
}(Amx
m + · · ·+A0) cos(βx) + (Bmxm + · · ·+B0) sen(βx)
Alem disso, se g(x) for uma soma destes tipos de funcoes, usamos o seguinte teorema
para obter yp.
Teorema 3.3.1 (Princıpio da superposicao). Dadas as funcoes g1(x), g2(x), . . . , gk(x), se
ypi(x) e uma solucao particular da equacao diferencial
any(n) + an−1y
(n−1) + · · ·+ a1y′ + a0y = gi(x)
no intervalo I, para cada i = 1, 2, . . . , k, entao
yp = yp1 + yp2 + · · ·+ ypk
e solucao particular para a equacao diferencial
any(n) + an−1y
(n−1) + · · ·+ a1y′ + a0y = g1(x) + g2(x) + · · ·+ gk(x)
em I.
Observe que este teorema ainda e valido para o caso de coeficientes nao constantes.
Deixamos a prova como exercıcio.
Exemplo 29: Obter yp para y′′ + 2y′ − y = x2 − 1.
Tentaremos uma solucao da forma yp = Ax2 +Bx+ C. Entao
y′p = 2Ax+B
y′′p = 2A.
Para que yp seja solucao da equacao dada, devemos ter
y′′p + 2y′p − yp = x2 − 1.
Substituindo e reorganizando os termos, temos
−Ax2 + (4A−B)x+ (2A+ 2B − C) = x2 − 1,
54
donde vem
−A = 1, 4A−B = 0, e 2A+ 2B − C = −1,
e A = −1, B = −4 e C = 9. Assim,
yp = Ax2 +Bx+ C = −x2 − 4x+ 9
e a solucao particular procurada. �
Exemplo 30: Determinar uma solucao particular yp da equacao y′′′+y′′−2y′+4y = 17xe3x.
Tentaremos uma solucao da forma yp = (Ax+B)e3x. Temos assim,
yp = Axe3x +Be3x
y′p = 3Axe3x +Ae3x + 3Be3x = 3Axe3x + (A+ 3B)e3x
y′′p = 9Axe3x + 3Ae3x + 3(A+ 3B)e3x = 9Axe3x + (6A+ 9B)e3x
y′′′p = 27Axe3x + 9Ae3x + 3(6A+ 9B)e3x = 27Axe3x + (27A+ 27B)e3x.
Substituindo na equacao diferencial, temos
y′′′p + y′′p − 2y′p + 4yp = 27Axe3x + (27A+ 27B)e3x + 9Axe3x + (6A+ 9B)e3x
− 2(3Axe3x + (A+ 3B)e3x) + 4(Axe3x +Be3x)
= 34Axe3x + (31A+ 34B)e3x = 17xe3x.
Assim,
34A = 17, e 31A+ 34B = 0
donde temos A = 12 e B = −31
68 , e portanto
yp =
(1
2x− 31
68
)e3x
e a solucao particular procurada. �
Exemplo 31: Determinar uma solucao particular para y′′ − 6y′ + 9y = (x − 1) + e2x.
Tentaremos yp = (Ax+B) + Ce2x. Assim,
y′p = A+ 2Ce2x
y′′p = 4Ce2x,
e entao
4Ce2x − 6(A+ 2Ce2x) + 9((Ax+B) + Ce2x) = (x− 1) + e2x,
e reorganizando os termos vem
9Ax+ (9B − 6A) + Ce2x = (x− 1) + e2x.
Nestes termos,
C = 1, 9A = 1, e 9B − 6A = −1,
55
o que nos leva a C = 1, A = 19 e B = − 1
27 . Temos entao que
yp =1
9x− 1
27+ e2x
e a solucao procurada. �
3.3.3 Metodo dos coeficientes indeterminados (anuladores)
Vimos anteriormente que para que o metodo dos coeficientes indeterminados seja produtivo,
precisamos “acertar o chute” da possıvel solucao particular yp. Em alguns casos porem pode
ser difıcil ter uma boa ideia do comportamento da solucao particular yp. Acompanhe os
exemplos a seguir.
Exemplo 32: Determinar yp para a ED y′′ + y′ − 2y = ex. De acordo com o que vimos
anteriormente, parece natural procurar uma solucao particular da forma yp = Aex. Nestes
termos, temos y′p = Aex e tambem, y′′p = Aex, e portanto o lado esquerdo da ED fica
y′′p + y′p − 2yp = Aex +Aex − 2Aex = 0,
e portanto nao conseguimos determinar uma constante A tal que Aex seja solucao particular
da equacao diferencial dada. Isto ocorre porque ex ja e solucao da equacao homogenea
associada. �
Exemplo 33: Determinar uma solucao particular yp para a ED y′′ − 3y′ + 2y = xex.
De acordo com o que vimos anteriormente, a solucao particular desta equacao e dada por
yp = (Ax + B)ex. Assim, y′p = Axex + (A + B)ex e tambem y′′p = Axex + (2A + B)ex.
Substituindo na equacao, o lado esquerdo fica
y′′p − 3y′p + 2yp = Axex + (2A+B)ex − 3Axex − 3(A+B)ex + 2Axex + 2Bex
= (A− 3A+ 2A)xex + (−A)ex
= −Aex
e novamente nao conseguimos determinar uma constante A que faca com que o lado esquerdo,
−Aex, seja igual a xex. �
Lembremos que para estes dois casos o metodo da variacao dos parametros, abor-
dado anteriormente, sera bem sucedido. A abordagem por anuladores permite determinar as
possıveis solucoes particulares, sem “chutar”. Antes de abordarmos o metodo em si, precisa-
mos de alguns conceitos importantes.
Definicao 3.3.2. Chamaremos de operador diferencial, um operador D, que a cada funcao
diferenciavel f , associa a derivada de f . Isto e,
D : C1(I;R)→ C0(I;R)
56
f 7→ Df = f ′ =df
dx,
para todo x ∈ I, onde I e algum intervalo no qual f e diferenciavel.
Temos entao que D(αf+βg) = αDf+βDg para quaisquer α, β ∈ R e f, g ∈ C1. Isto
significa que D e um operador linear. Alem disso, usaremos a notacao de potencia Dn para
designar a composta, de D com D, n vezes. Assim, se y e uma funcao n vezes diferenciavel,
entao
Dny =dny
dxn= y(n).
As propriedades de operadores lineares, sao similares as propriedades de produto
de numeros reais. Assim, podemos olhar a ordem das derivadas como se fosse realmente
potencia, e o operador D como se fosse uma variavel algebrica.
Notemos entao que uma equacao diferencial linear homogenea
any(n) + an−1y
(n−1) + · · ·+ a2y′′ + a1y
′ + a0y = 0
pode ser expressa em termos do operador diferencial por
(anDn + an−1D
n−1 + · · ·+ a2D2 + a1D + a0)y = 0.
Estas duas formas de representar uma equacao diferencial sao equivalentes e portanto deter-
minar solucoes para uma delas, e consequentemente para a outra, ainda consiste em analisar
as raızes da equacao auxiliar associada
anmn + an−1m
n−1 + · · ·+ a2m2 + a1m+ a0 = 0.
Definicao 3.3.3. Dada uma funcao f diferenciavel em um intervalo I, um operador diferen-
cial anulador, ou operador anulador, de f(x) e um operador diferencial L, tal que L(f) = 0
em todo o intervalo I. Dizemos tambem que L anula f , ou que f e anulada por L, em I.
A ideia e transformar uma ED linear nao homogenea com coeficientes constantes,
em uma ED homogenea. Notemos que se yp e uma solucao particular para uma ED nao
homogenea, entao
(anDn + an−1D
n−1 + · · ·+ a2D2 + a1D + a0)yp = g(x).
Aplicando agora o operador L, anulador da funcao g(x), em ambos os membros temos
L(anDn + an−1D
n−1 + · · ·+ a2D2 + a1D + a0)yp = L(g(x)) = 0.
Segue entao que a solucao particular yp, da equacao nao homogenea, e uma solucao de uma
equacao homogenea. A solucao geral desta nova equacao homogenea e mais simples de ser
determinada, e esconde dentro de si a funcao yp procurada.
Vejamos agora alguns resultados sobre operadores diferenciais, anuladores de certas
classes de funcoes.
57
Teorema 3.3.4. Dado α ∈ R, o operador diferencial L = (D − α)n anula cada uma das
funcoes
eαx, xeαx, x2eαx, . . . , xn−1eαx,
e por conseguinte, qualquer combinacao linear destas.
Prova. Demonstraremos isto usando o princıpio da inducao finita. Para n = 1 temos imedi-
atamente que
(D − α)eαx = Deαx − αeαx = αeαx − αeαx = 0.
Suponha agora o resultado valido para n, isto e, o operador (D − α)n anula cada
uma das funcoes
eαx, xeαx, x2eαx, . . . , xn−1eαx,
e portanto (D − α)nxkeαx = 0 para qualquer k = 0, 1, 2, . . . , n− 1.
Mostraremos que (D − α)n+1 anula as funcoes
eαx, xeαx, x2eαx, . . . , xn−1eαx, xneαx.
E claro que, da hipotese de inducao, temos imediatamente que se k = 0, 1, 2, . . . , n−1,
entao
(D − α)n+1xkeαx = (D − α)(D − α)nxkeαx = (D − α)0 = 0,
e assim resta provar que (D − α)n+1xneαx = 0. De fato,
(D − α)n+1xneαx = (D − α)n(D − α)xneαx
= (D − α)n(Dxneαx − αxneαx)
= (D − α)n(nxn−1eαx + αxneαx − αxneαx)
= n(D − α)n(xn−1eαx) = 0.
Segue portanto o resultado desejado pelo princıpio de inducao finita.
Corolario 3.3.5. O operador diferencial Dn anula qualquer funcao polinomial de ordem
n− 1.
Teorema 3.3.6. Dados α, β ∈ R, o operador diferencial L = [D2− 2αD+ (α2 + β2)]n anula
cada uma das funcoes
eαx cos(βx), xeαx cos(βx), x2eαx cos(βx), . . . , xn−1eαx cos(βx),
eαx sen(βx), xeαx sen(βx), x2eαx sen(βx), . . . , xn−1eαx sen(βx),
e portanto, qualquer combinacao linear destas.
58
Prova. Tomemos a equacao diferencial (D2 − 2αD+ (α2 + β2))ny = 0, ou equivalentemente,
(D2 − 2αD + (α2 + β2))(D2 − 2αD + (α2 + β2)) · · · (D2 − 2αD + (α2 + β2))y = 0.
Uma ED linear, homogenea, de ordem n, com coeficientes constantes. A equacao auxiliar
possui duas raızes complexas conjugadas α± iβ, ambas com multiplicidade n. As n solucoes
linearmente independentes desta equacao diferencial sao as funcoes
y1 = eαx sen(βx), y2 = eαx cos(βx),
y3 = xeαx sen(βx), y4 = xeαx cos(βx),
y5 = x2eαx sen(βx), y6 = x2eαx cos(βx),
y7 = x3eαx sen(βx), y8 = x3eαx cos(βx),
......
y2n−1 = xn−1eαx sen(βx), y2n = xn−1eαx cos(βx).
Dado que estas funcoes sao solucoes da equacao diferencial, temos que a equacao e satisfeita
por elas, donde (D2 − 2αD + (α2 + β2))nyi = 0, para qualquer 0 ≤ i ≤ n. Segue que o
operador diferencial (D2 − 2αD + (α2 + β2))n anula as funcoes citadas.
Corolario 3.3.7. Seja β ∈ R. O operador diferencial L = (D2 + β2)n anula qualquer uma
das funcoes
cos(βx), x cos(βx), x2 cos(βx), . . . , xn−1 cos(βx),
sen(βx), x sen(βx), x2 sen(βx), . . . , xn−1 sen(βx),
e tambem qualquer combinacao linear destas.
Teorema 3.3.8. Dados α, β ∈ R, o operador diferencial L = [D2− 2αD+ (α2− β2)]n anula
cada uma das funcoes
eαx cosh(βx), xeαx cosh(βx), x2eαx cosh(βx), . . . , xn−1eαx cosh(βx),
eαx senh(βx), xeαx senh(βx), x2eαx senh(βx), . . . , xn−1eαx senh(βx),
e portanto, qualquer combinacao linear destas.
Prova. Como nos teoremas anteriores, basta tomar a equacao diferencial
(D2 − 2αD + (α2 − β2))ny = 0.
A equacao auxiliar desta ED possui duas raızes reais distintas α±β, ambas com multiplicidade
n. As n solucoes linearmente independentes desta equacao diferencial sao as funcoes
y1 = eαx+βx, y2 = eαx−βx,
y3 = xeαx+βx, y4 = xeαx−βx,
59
y5 = x2eαx+βx, y6 = x2eαx−βx,
y7 = x3eαx+βx, y8 = x3eαx−βx,
......
y2n−1 = xn−1eαx+βx, y2n = xn−1eαx−βx.
Dado que estas funcoes sao solucoes da equacao diferencial, temos que a equacao e satisfeita
por elas ou por combinacoes lineares delas. Entao
(D2 − 2αD + (α2 − β2))n(C1xkeαx+βx + C2x
keαx−βx) = 0,
para qualquer 0 ≤ k ≤ n− 1. Mas observe que
C1xkeαx+βx + C2x
keαx−βx
= (C1 + C2)xkeαx(eβx + e−βx
2
)+ (C1 − C2)xkeαx
(eβx − e−βx
2
)= C3x
keαx cosh(βx) + C4xkeαx senh(βx).
Como as constantes C1 e C2 sao arbitrarias, sao tambem arbitrarias as constantes C3 e C4.
O operador diferencial (D2−2αD+(α2−β2))n anula portanto as funcoes mencionadas.
Corolario 3.3.9. Para β ∈ R arbitrario, o operador diferencial L = (D2 − β2)n anula
qualquer uma das funcoes
cosh(βx), x cosh(βx), x2 cosh(βx), . . . , xn−1 cosh(βx),
senh(βx), x senh(βx), x2 senh(βx), . . . , xn−1 senh(βx),
e qualquer combinacao linear destas.
Teorema 3.3.10. Se L1 e L2 sao dois operadores anuladores respectivos das funcoes y1 e
y2, entao a composta L1L2 = L1 ◦ L2 e um operador anulador da soma y1 + y2.
Prova. De fato,
L1L2(y1 + y2) = L1(L2(y1 + y2))
= L1(L2y1 + L2y2) = L1(L2y1) = L2(L1y1) = 0,
como desejamos.
Agora estamos prontos para utilizar este metodo na obtencao de solucoes particulares
da equacao diferencial nao homogenea
any(n) + an−1y
(n−1) + · · ·+ a2y′′ + a1y
′ + a0y = g(x),
ou equivalentemente
(anDn + an−1D
n−1 + · · ·+ a2D2 + a1D + a0)y = g(x).
60
A ideia e transformar esta ED em uma equacao homogenea aplicando em ambos os membros o
operador diferencial anulador de g(x). Fazendo isto, obtemos entao uma equacao homogenea
e determinamos a solucao geral desta nova equacao homogenea. Esta solucao sera composta
exatamente pelas n solucoes LI da equacao diferencial homogenea original e termos adicionais
que sao exatamente as parcelas da solucao particular a ser considerada.
Exemplo 34: Determinar a solucao geral de y′′ + y′ − 2y = ex. Sabemos que a equacao
auxiliar associada e m2 + m − 2 = 0, cujas raızes sao m = 1,−2, e portanto temos duas
solucoes LI para a equacao homogenea associada
y1 = ex, e y2 = e−2x.
Tomando o operador L = (D− 1), anulador de g(x) = ex, e aplicando em ambos os membros
de
(D2 +D − 2)y = ex,
obtemos
(D − 1)(D2 +D − 2)y = (D − 1)ex = 0.
Uma nova equacao diferencial cuja equacao auxiliar associada e (m−1)(m2+m−2) =
0, com raızes m = 1, 1,−2. Segue da teoria desenvolvida anteriormente que a solucao geral
desta nova ED e da forma
y = C1ex︸ ︷︷ ︸
y1
+C2xex + C3e
−2x︸ ︷︷ ︸y2
.
Nesta solucao temos as parcelas y1 e y2, solucoes da ED homogenea original, e
tambem a parcela xex a ser considerada como possıvel solucao particular. Assim, aplicaremos
o metodo dos coeficientes indeterminados a yp = Axex. Temos y′p = Aex + Axex e y′′p =
Axex + 2Aex. Substituindo na ED obtemos
y′′p + y′p − 2yp = Axex + 2Aex +Aex +Axex − 2Axex = 3Aex,
e para que isto seja igual a g(x) = ex, devemos ter A = 13 . Segue que a solucao geral da ED
procurada, e
y = yc + yp = C1ex + C2e
−2x +1
3xex
definida em todo o intervalo (−∞,∞). �
Exemplo 35: Determinar a solucao de y′′− 3y′+ 2y = xex. A equacao auxiliar associada e
m2−3m+2 = 0, cujas raızes sao m = 1, 2 e as solucoe linearmente independentes da equacao
homogenea associada sao
y1 = ex, e y2 = e2x.
Tomando o operador L = (D − 1)2, anulador de g(x) = xex, e aplicando em
(D2 − 3D + 2)y = xex
61
obtemos
(D − 1)2(D2 − 3D + 2)y = (D − 1)2xex = 0.
Obtemos uma nova equacao homogenea cuja equacao auxiliar (m− 1)2(m2 − 3m+
2) = 0 possui as raızes m = 1, 1, 1, 2. Sendo assim, a solucao geral desta nova ED e da forma
y = C1ex︸ ︷︷ ︸
y1
+C2xex + C3x
2ex + C4e2x︸ ︷︷ ︸
y2
.
Nestes termos, tentaremos yp = Axex +Bx2ex, e assim,
y′p = Bx2ex + (A+ 2B)xex +Aex, e
y′′p = Bx2ex + (A+ 4B)xex + (2A+ 2B)ex.
Substituindo, vem
y′′p − 3y′p + 2yp = Bx2ex + (A+ 4B)xex + (2A+ 2B)ex − 3Bx2ex
− 3(A+ 2B)xex − 3Aex + 2Axex + 2Bx2ex
= (B − 3B + 2B)x2ex + (A+ 4B − 3A− 6B + 2A)xex
+ (2A+ 2B − 3A)ex
= −2Bxex + (2B −A)ex.
Para que isto seja igual a xex devemos ter −2B = 1 e tambem (2B − A) = 0, ou
B = −12 e A = −1. Entao a solucao geral da equacao dada e
y = yc + yp = C1ex + C2e
2x − xex − 1
2x2ex
definida em toda a reta real. �
Exemplo 36: Para determinar a solucao geral da equacao diferencial y′′ + y = 3 cosx+ x,
consideramos primeiro a equacao homogenea associada y′′ + y = 0, cuja equacao auxiliar e
m2 + 1 = 0, de raızes ±i, e que nos leva a solucao geral
yc = C1 cosx+ C2 senx.
Tomando os operadores (D2 + 1) e D2, anuladores respectivamente das funcoes
3 cosx e x, e aplicando-os a equacao
(D2 + 1)y = 3 cosx+ x,
obtemos uma nova ED homogenea
(D2 + 1)D2(D2 + 1)y = (D2 + 1)D2(3 cosx+ x) = 0,
62
cuja solucao geral e dada por
y = C1 cosx+ C2 senx+ C3x cosx+ C4x senx+ C5 + C6x.
Tomando para yp, as parcelas que nao fazem parte da solucao yc, temos entao
yp = Ax cosx+Bx senx+ C +Dx.
Assim,
y′p = A cosx−Ax senx+B senx+Bx cosx+D,
y′′p = −2A senx−Ax cosx+ 2B cosx−Bx senx.
Substituindo na equacao diferencial, temos
y′′p + yp = −2A senx−Ax cosx+ 2B cosx−Bx senx+Ax cosx+Bx senx+ C +Dx
= −2A senx+ 2B cosx+ C +Dx.
Para que isto seja igual a 3 cosx + x, devemos ter A = 0, B = 32 , C = 0 e D = 1.
Segue que
yp =3
2x senx+ x,
e portanto
y = yc + yp = C1 cosx+ C2 senx+3
2x senx+ x,
para quaisquer C1, C2 ∈ R. �
3.4 Equacao de Cauchy-Euler
Definicao 3.4.1. Uma ED linear da forma
anxny(n) + an−1x
n−1y(n−1) + · · ·+ a2x2y′′ + a1xy
′ + a0y = g(x), (3.8)
onde an, an−1, . . . , a1, a0 sao constantes reais, e conhecida como equacao de Cauchy-Euler.
Note que, embora os termos ai sejam constantes, os coeficientes da equacao diferen-
cial sao aixi, e portanto, nao constantes. Obter solucoes de EDs lineares com coeficientes
variaveis, e uma tarefa mais complicada. De uma forma geral, o que podemos esperar e que
uma ED a coeficientes nao constantes
an(x)y(n) + an−1(x)y(n−1) + · · ·+ a1(x)y′ + a0(x)y = g(x)
tenha uma solucao explıcita dada por serie de potencias da variavel independente x. Este
tipo de solucao sera discutido mais tarde. A equacao de Cauchy-Euler no entanto, possui
tecnica de solucao mais simples.
63
De acordo com o que vimos no inıcio deste capıtulo, determinar uma solucao (geral)
para a equacao (3.8), significa determinar a solucao geral yc da equacao homogenea associada,
e uma solucao particular yp.
Comecemos entao com a solucao geral, yc, da ED homogenea de ordem n,
anxny(n) + an−1x
n−1y(n−1) + · · ·+ a2x2y′′ + a1xy
′ + a0y = 0.
Para obter ideias que possam ser estendidas ao caso geral de ordem n, vamos considerar
primeiro o caso mais simples com n = 2,
ax2y′′ + bxy′ + cy = 0. (3.9)
Parece natural procurarmos uma solucao na forma de monomios y = xm, pois neste
caso, todas as parcelas da equacao apresentam a mesma potencia para x, e dependendo dos
coeficientes, podemos conseguir o cancelamento total dos termos do primeiro membro e a
igualdade.
Vamos entao determinar para quais valores m a funcao y = xm e de fato solucao de
(3.9). Substituindo y = xm na equacao, obtemos
ax2m(m− 1)xm−2 + bxmxm−1 + cxm = 0,
ou ainda,
(am(m− 1) + bm+ c)xm = 0.
Naturalmente estamos interessados em uma solucao nao nula, e entao vamos considerar x 6= 0.
Neste caso, queremos entao que
am(m− 1) + bm+ c = 0,
ou ainda,
am2 + (b− a)m+ c = 0.
Esta e uma equacao quadratica em m, dita equacao auxiliar associada a equacao de Cauchy-
Euler homogenea. Suas raızes determinarao os valores de m que tornam y = xm uma solucao
da equacao homogenea (3.9).
Note que diferentemente dos resultados da secao 3.2, os coeficientes da equacao
auxiliar, agora nao sao diretamente iguais aos coeficientes da equacao diferencial.
A respeito destas raızes, elas podem ser
1) reais distintas,
2) reais iguais,
3) complexas conjugadas.
64
Caso 1) Se m1 e m2 sao raızes reais distintas, entao
y1 = xm1 e y2 = xm2
sao duas solucoes de (3.9). Alem disso, sao linearmente independentes. De fato,
W (y1, y2) =
∣∣∣∣∣ xm1 xm2
m1xm1−1 m2x
m2−1
∣∣∣∣∣= m2x
(m1+m2−1) −m1x(m1+m2−1)
= (m2 −m1)x(m1+m2−1).
Como (m2−m1) 6= 0, pois as raızes sao distintas, e x(m1+m2−1) 6= 0 pois consideramos x 6= 0,
entao W (y1, y2) 6= 0, e temos duas solucoes linearmente independentes para (3.9). Segue que
yc = C1xm1 + C2x
m2 .
Caso 2) Se m e raız de multiplicidade 2 da equacao auxiliar, entao
y1 = xm,
e uma solucao procurada de (3.9). Precisamos de uma segunda solucao que seja linearmente
independente com y1. Para procurar uma segunda solucao y2 usaremos o metodo da variacao
dos parametros. Procuramos por uma funcao u(x) de forma que
y2 = uy1 = uxm
ainda seja solucao da equacao (3.9). Assim,
y2 = uxm
y′2 = u′xm +muxm−1
y′′2 = u′′xm + 2mu′xm−1 +m(m− 1)uxm−2
e entao, substituindo, reorganizando os termos e levando em conta que 2am + b = a, o
primeiro membro da equacao (3.9) fica
ax2y′′2 + bxy′2 + cy2
= ax2(u′′xm + 2mu′xm−1 +m(m− 1)uxm−2) + bx(u′xm +muxm−1) + cuxm
= au′′xm+2 + 2amu′xm+1 + am(m− 1)uxm + bu′xm+1 + bmuxm + cuxm
= (am(m− 1) + bm+ c)uxm + (2am+ b)u′xm+1 + au′′xm+2
= au′xm+1 + au′′xm+2.
e temos entao
au′xm+1 + au′′xm+2 = 0,
65
ou ainda
axm+1(u′ + u′′x) = 0.
Como axm+1 6= 0 entao queremos que
u′′x+ u′ = 0,
que e uma equacao diferencial de segunda ordem em u e pode ser resolvida pela mudanca de
variaveis w = u′. Fazendo tal mudanca de variaveis, temos a equacao
w′x+ w = 0,
que por sua vez e uma equacao diferencial separavel, pois podemos escrever na forma,
dw
dx=−wx
=− 1x
1w
,
e determinar uma solucao pela equacao integral,∫1
wdw = −
∫1
xdx.
Resolvendo esta equacao integral, obtemos
lnw = − lnx+ C
ln(wx) = C
w =C
x.
Com isto, temos
u =
∫wdx = C lnx+ C.
Nestes termos,
y2 = uy1 = xm(C lnx+ C) = Cxm lnx+ Cxm.
Obviamente a parcela Cxm, nao nos interessa por ser linearmente dependente com y1.
Nota: Acabamos de tomar uma solucao y1 = xm e obter por variacao das constantes uma
segunda solucao y2 = xm lnx. Podemos verificar que, admitindo m raız de multiplicidade 3
da equacao auxiliar, partindo da solucao y2 obteremos outra solucao y3 = xm(lnx)2. Fica
como exercıcio verificar isto.
Vamos tomar y1 = xm e y2 = xm lnx e verificar que de fato tratam-se de duas
solucoes linearmente independentes para a equacao (3.9). De fato,
W (y1, y2) =
∣∣∣∣∣ xm xm lnx
mxm−1 mxm−1 lnx+ xm−1
∣∣∣∣∣= mx2m−1 lnx+ x2m−1 −mx2m−1 lnx
= x2m−1.
66
Como x2m−1 6= 0 pois consideramos x 6= 0, entao W (y1, y2) 6= 0, e temos duas solucoes
linearmente independentes para (3.9). Segue assim que
yc = C1xm + C2x
m lnx.
Caso 3) Sejam (α± iβ) as duas raızes complexas conjugadas da equacao auxiliar. Entao
y1 = xα+iβ e y2 = xα−iβ,
sao as duas solucoes procuradas. Entretanto, queremos que as solucoes sejam dadas em termos
de funcoes reais. Usaremos a identidade de Euler eα+iβ = eα(cosβ + i senβ) e escreveremos
xiβ = (elnx)iβ = eiβ lnx
= cos(β lnx) + i sen(β lnx).
Tambem
x−iβ = cos(β lnx)− i sen(β lnx).
A solucao procurada e entao
y = C1xα+iβ + C2x
α−iβ
= C1xαxiβ + C2x
αx−iβ
= xα(C1 cos(β lnx) + iC1 sen(β lnx) + C2 cos(β lnx)− iC2 sen(β lnx)
= (C1 + C2)xα cos(β lnx) + i(C1 − C2)xα sen(β lnx).
Embora as constantes sejam complexas, podemos ver que, se
y1 = xα cos(β lnx) e y2 = xα sen(β lnx),
entao
W (y1, y2) =
∣∣∣∣∣ xα cos(β lnx) xα sen(β lnx)
αxα−1 cos(β lnx)− βxα−1 sen(β lnx) αxα−1 sen(β lnx) + βxα−1 cos(β lnx)
∣∣∣∣∣= αx2α−1 sen(β lnx) cos(β lnx) + βx2α−1 cos2(β lnx)
− αx2α−1 sen(β lnx) cos(β lnx) + βx2α−1 sen2(β lnx)
= βx2α−1 cos2(β lnx) + βx2α−1 sen2(β lnx)
= βx2α−1(cos2(β lnx) + sen2(β lnx))
= βx2α−1.
Claramente β 6= 0 e tambem x2α−1 6= 0 e entao W (y1, y2) 6= 0 e isto significa que y1 e y2
constituem duas solucoes linearmente independentes para a equacao (3.9). Segue que
yc = C1xα cos(β lnx) + C2x
α sen(β lnx).
Isto finaliza todas as possibilidades para as solucoes da equacao de ordem 2 (3.9).
Com estas ideias podemos agora generalizar para o caso de ordem n. Temos entao o seguinte
roteiro ja para o caso geral.
67
1- Dada a equacao (homogenea)
anxny(n) + · · ·+ a2x
2y′′ + a1xy′ + a0y = 0
montar a equacao auxiliar de ordem n em m,
bnmn + bn−1m
n−1 + · · ·+ b2m2 + b1m+ b0 = 0.
2- Determinar as raızes da equacao auxiliar,
m1,m2,m3, . . . ,mn−1,mn.
O comportamento das raızes mi determinam as parcelas yi que compoem a solucao
geral yc da equacao homogenea, da seguinte forma:
a) Cada uma das raızes reais mi, distintas das demais raızes produzem uma solucao
yi(x) = xmi .
b) Cada raız real de multiplicidade k, mi = mi+1 = mi+2 = · · · = mk−1 = m
produz as solucoes
yi(x) = xm,
yi+1(x) = xm lnx,
yi+2(x) = xm(lnx)2,
...
yi+k−1(x) = xm(lnx)k−1.
c) Cada par de raızes complexas conjugadas mi = mi+1 = (α + iβ), produz as
solucoes
yi(x) = xα cos(β lnx) e yi+1(x) = xα sen(β lnx).
O que pode agora ocorrer (que nao ocorre com a equacao de ordem 2) e que pode-
mos ter raızes complexas conjugadas de multiplicidade k. Podemos verificar pelo metodo
da variacao dos parametros que, partindo das solucoes linearmente independentes y1 =
xα cos(β lnx) e y2 = xα sen(β lnx), encontramos outras duas solucoes
y3 = xα(lnx) cos(β lnx) e y4 = xα(lnx) sen(β lnx),
e com estas duas encontramos outras
y5 = xα(lnx)2 cos(β lnx) e y6 = xα(lnx)2 sen(β lnx),
o que leva a conclusao que se (α± iβ) sao raızes complexas de multiplicidade k entao temos
as solucoes
yi = xα cos(β lnx), yi+1 = xα sen(β lnx)
68
yi+2 = xα(lnx) cos(β lnx), yi+3 = xα(lnx) sen(β lnx)
yi+4 = xα(lnx)2 cos(β lnx), yi+5 = xα(lnx)2 sen(β lnx)
...
yi+2k−2 = xα(lnx)k−1 cos(β lnx), yi+2k−1 = xα(lnx)k−1 sen(β lnx)
O procedimento acima, obtem uma solucao geral yc para a equacao homogenea asso-
ciada. Com o intuito de obter uma solucao geral para a equacao (3.8), resta agora obtermos
uma solucao particular yp. Para isto, devemos usar o metodo da variacao dos parametros,
uma vez que o metodo dos coeficientes indeterminados somente se aplica a equacoes com co-
eficientes constantes. Vamos relembrar o metodo da variacao dos parametros ja apresentado
na secao
Dada a equacao diferencial de ordem n,
anxny(n) + an−1x
n−1y(n−1) + · · ·+ a1xy′ + a0y = g(x)
temos que a ED homogenea
anxny(n) + an−1x
n−1y(n−1) + · · ·+ a1xy′ + a0y = 0
possui n solucoes y1, y2, . . . , yn, linearmente independentes em um intervalo I. Procuramos
funcoes u1, u2, . . . , un, tais que
y = u1y1 + u2y2 + · · ·+ un−1yn−1 + unyn
seja uma solucao da equacao nao homogenea. Tais funcoes satisfazem o sistema linear nas
variaveis u′1, u′2, . . . , u
′n,
u′1y1 + u′2y2 + · · ·+ u′nyn = 0
u′1y′1 + u′2y
′2 + · · ·+ u′ny
′n = 0
...
u′1y(n−1)1 + u′2y
(n−1)2 + · · ·+ u′ny
(n−1)n =
g(x)
anxn
e as solucoes deste sistema podem ser determinadas pela regra de Cramer por
u′i =Wi
Wi = 1, 2, . . . , n,
onde W = W (y1, y2, . . . , yn) e Wi e o determinante da matriz dos coeficientes (matriz do
Wronskiano), com a i-esima coluna substituıda pela coluna dos termos independentes
0
0...
g(x)anxn
69
Exemplo 37: Para determinar a solucao da equacao x2y′′− 4xy′ = x4, tomamos a equacao
homogenea associada
x2y′′ − 4xy′ = x4
e a equacao auxiliar
m(m− 1)− 4m = 0,
cujas raızes sao m = 0 e m = 5. Segue que
y1 = 1 e y2 = x5
sao as duas solucoes da equacao homogenea, e sao linearmente independentes, ja que
W (y1, y2) =
∣∣∣∣∣ 1 x5
0 5x4
∣∣∣∣∣ = 5x4 6= 0,
para x 6= 0. Entao
yc = C1 + C2x5.
Para obter yp queremos u1 e u2 de forma que
yp = u1y1 + u2y2
seja a solucao particular da equacao nao homogenea. As funcoes u1 e u2 sao dadas por
u′1 =W1
W=
1
5x4
∣∣∣∣∣ 0 x5
x2 5x4
∣∣∣∣∣ =1
5x4−x7 =
−x3
5
u1 =−1
20x4
u′2 =W2
W=
1
5x4
∣∣∣∣∣ 1 0
0 x2
∣∣∣∣∣ =1
5x4x2 =
1
5x2
u2 =−1
15x3
A solucao particular e entao
yp =−1
20x4 +
−1
15x3x5 = − 1
20x4 − 1
15x2,
donde temos a solucao geral procurada
y(x) = yc(x) + yp(x) = C1 + C2x5 − 1
20x4 − 1
15x2,
para quaisquer constantes C1 e C2 que ainda podem ser determinadas conhecendo-se duas
condicoes iniciais. �
3.5 Aplicacoes
Vamos agora estudar alguns modelos matematicos ou fısicos que podem ser equacionados por
equacoes diferenciais de ordem superior.
70
3.5.1 Sistema massa-mola
Vamos considerar que uma mola extensıvel, de comprimento l em repouso, esteja presa verti-
calmente a um suporte rıgido. Prendemos entao um objeto de massa m a extremidade livre
da mola. Isto provocara uma distensao da mola, para um ponto de equilıbrio, por s unidades
de comprimento.
Parece natural que se deslocarmos a massa m e a soltarmos, esta massa oscilara
em movimento de sobe e desce. Queremos um modelo para determinar a sua posicao com
o tempo. Vamos equacionar o problema. Consideremos que nao existem forcas atuantes
no objeto alem da forca peso ~p e da forca de tracao da mola ~t, ambas com mesma direcao
(vertical) e sentidos contrarios. Fixemos entao um sistema coordenado com um eixo que
chamaremos y, cuja origem esta no ponto que dista L = (l+ s) do suporte rıgido, e cresce no
sentido do suporte.
O peso ~p, considerado negativo por estar em sentido contrario ao eixo fixado, e dado
por ~p = −mg. A forca de tracao ~t e dada pela lei de Hooke. A lei de Hooke diz que a forca de
tracao da mola e proporcional a distensao causada pela massa. Isto e, ~t = ks onde k > 0 e a
constante de proporcionalidade, conhecida como constante da mola, que depende do material
que a mola e composta.
Agora note que, como o sistema esta em equilıbrio, a forca resultante que e a soma
das forcas envolvidas e nula, isto e, ~p+ ~t = 0, o que nos leva a
ks−mg = 0.
Desloquemos a massa por uma quantidade y0, e deixamos o sistema livre para se
movimentar. Chamemos y = y(t) a posicao da extremidade da mola no instante t. Note
entao que a distancia entre o objeto e o suporte rıgido e d(t) = L− y(t).
Agora a forca de tensao ~t depende tambem (de acordo com a lei de Hooke) da posicao
y(t) do corpo. Temos assim,
~t = k(s− y),
pois a distensao da mola e (s− y). De acordo com a segunda lei de Newton (forca = massa
× aceleracao), temos
~F = m~a.
Mas ~F e a forca resultante ~t+ ~p. Nestes termos,
m~a = ~F = ~t+ ~p = ks− ky −mg = −ky.
A equacao que descreve o movimento y(t) do corpo e portanto
m~a = −ky,
71
e como a aceleracao ~a e a derivada segunda do movimento y, entao a equacao diferencial
y′′ +k
my = 0,
modela o movimento da massa m com o passar do tempo. Ainda temos as condicoes iniciais
y(0) = y0 e y′(0) = y1
que significam fisicamente a posicao inicial y0 e a velocidade inicial y1 (zero se o sistema e
solto do repouso). Temos entao o PVI,{y′′ + k
my = 0
y(0) = y0, y′(0) = y1.(3.10)
Vamos determinar a solucao deste PVI. A equacao diferencial e homogenea com
equacao auxiliar (em x)
x2 +k
m= 0.
Sendo k e m valores positivos, entao as raızes sao complexas x = ±i√
km . A solucao geral da
equacao diferencial e entao dada por
y = C1 cos(ωt) + C2 sen(ωt),
onde ω =√
km . Observe que o movimento e oscilatorio em termos de senos e cossenos. O
perıodo T desta oscilacao e T = 2πω . As constantes C1 e C2 sao determinadas pelo sistema{
y0 = y(0) = C1
y1 = y′(0) = C2ω
donde a solucao e
y = y0 cos(ωt) +y1
ωsen(ωt).
Observe que para conhecer esta equacao completamente ainda e necessario conhecer ω, e
para isto, precisamos do valor da constante da mola k. Este valor pode ser determinado
medindo-se o deslocamento s causado pela massa m, pois como vimos (ks − mg) = 0, ou
ainda, k = mgs = p
s , onde p e o peso do corpo (o modulo da forca peso ~p).
Este modelo pode ser complicado um pouco mais. Para ser mais preciso, o modelo
anterior e muito simples, pois supoe condicoes que na pratica sao impossıveis. As unicas
forcas consideradas sao a forca peso e a forca de tracao da mola, e isto supoe a ausencia de
outras forcas externas, como resistencia do ar. Este modelo precisa entao de vacuo perfeito.
Por este motivo, o sistema acima e dito sistema do movimento livre nao amortecido.
Um exemplo de complicacao do problema e considerar que a mola “envelhece”. Em
outras palavras, considerar que a constante k da mola, seja variavel com o tempo. Fisicamente
isto significa que a mola perde suas propriedades iniciais de deformacao com o passar do
72
tempo. Imagine que consideremos a funcao de elasticidade da mola dada por ke−αt com
k > 0 e α > 0. Temos entao uma equacao diferencial dada por
y′′ +k
me−αty = 0.
Uma equacao de ordem 2, a coeficientes variaveis, que nao pode ser resolvida pelos
metodos ate agora abordados. Sugerimos solucao por serie de potencias. Por outro lado, se
considerarmos a funcao de elasticidade da mola dada por k 1t para k > 0, entao a equacao
diferencial se torna
y′′ +k
ty = 0,
ou equivalentemente,
t2y′′ + kty = 0,
que pode ser resolvida pelos metodos da secao 3.4.
Outra complicacao que podemos causar e considerar que o corpo oscile imerso em
algum fluido, como ar, agua, oleo, entre outros. Isto obrigara a consideracao de alguma forca
externa de atrito agindo sobre o sistema, que amortece o movimento.
Em geral, uma forca de amortecimento ou de resitencia e considerada como sendo
proporcional a uma potencia da velocidade. Para que tenhamos uma equacao diferencial
linear, estudaremos o caso onde esta potencia e 1, isto e, a forca de atrito ~r e proporcional a
velocidade ~v. De outra forma,
~r = −λ~v,
para λ > 0. O sinal negativo e decorrencia de que a forca de atrito e contraria a velocidade.
Assim,
~F = ~p+ ~t+ ~r,
donde
m~a = ~F = ~t+ ~p+ ~r = ks− ky −mg − λ~v = −ky − λ~v.
Lembrando que ~a = y′′ e que ~v = y′ entao vem a equacao diferencial
y′′ +λ
my′ +
k
my = 0 (3.11)
sujeita as condicoes iniciais y(0) = y0 (posicao inicial) e y′(0) = y1 (velocidade inicial).
A solucao desta equacao agora e dada pelas raızes da equacao auxiliar (em x),
mx2 + λx+ k = 0,
para m, λ e k constantes positivas. As raızes sao
x =−λ±
√λ2 − 4mk
2m
Agora temos tres casos a considerar.
73
Caso 1. Se λ2 − 4mk > 0 entao temos duas raızes reais distintas
x1 =−λ+
√λ2 − 4mk
2m, e x2 =
−λ−√λ2 − 4mk
2m.
Neste caso, temos a solucao
y(t) = C1ex1t + C2e
x2t.
Observe que a unica possibilidade que leva o corpo a passar pela solucao de equilıbrio y ≡ 0
e quando
t =m√
λ2 − 4mkln
(−C2
C1
)e obviamente isto ocorre somente uma vez, e somente se C1 e C2 possuem sinais contrarios.
Resumindo, o corpo passa no maximo uma vez pela solucao de equilıbrio y ≡ 0.
Observe ainda que
x1 =−λ+
√λ2 − 4mk
2m<−λ+
√λ2
2m= 0,
x2 =−λ−
√λ2 − 4mk
2m< 0.
Isto garante que, independentemente das constantes C1 e C2, ou da posicao inicial e da
velocidade inicial a solucao do sistema tende a zero, quando t → ∞. Isto significa que o
movimento do corpo tende a cessar exponencialmente. E uma consequencia imediata de
uma constante de amortecimento λ muito grande. Neste caso dizemos que o sistema e super
amortecido.
Caso 2. Se λ2 − 4mk = 0 entao a unica raız real de multiplicidade 2 da equacao auxiliar e
x =−λ2m
,
o que nos traz a solucao
y(t) = C1ext + C2te
xt.
Note que ainda, temos x < 0 e portanto a solucao ainda decai (exponencialmente) para zero
quando t → ∞. Este sistema e dito criticamente amortecido, pois ainda e amortecido, mas
qualquer decrescimo na constante de amortecimento λ, o movimento se tornara oscilatorio.
Ainda neste caso, a solucao passa no maximo uma vez pela solucao de equilıbrio, e
se isto ocorrer, ocorrera precisamente quando
t = −C1
C2.
Caso 3. Se λ2 − 4mk < 0 entao temos duas raızes complexas conjugadas
x1 =−λ2m
+ i
√4mk − λ2
2m, e x2 =
−λ2m− i√
4mk − λ2
2m.
Neste caso, obtemos uma solucao oscilatoria dada por
y(t) = e−λ2m
t(C1 cos(
√4mk−λ2
2m t) + C2 sen(√
4mk−λ22m t)
).
74
Observe que mesmo sendo um movimento oscilatorio, o termo e−λ2m
t tende a zero quando
t → ∞. Isto significa que este movimento oscilatorio ainda tende a diminuir e cessar com o
tempo. Mais precisamente, tende a solucao de equilıbrio y ≡ 0.
3.5.2 O pendulo simples
Um pendulo consiste de um objeto de massa m preso, a um ponto, por uma corda de com-
primento L. Este objeto e solto de uma posicao inicial, onde a corda faz um angulo θ0 com
a perpendicular, e comeca a oscilar em movimento de vai-e-vem. Uma vez solto o pendulo,
o angulo θ que a corda faz com a perpendicular, varia com o tempo. Nestes termos θ e uma
funcao da variavel temporal t, isto e, θ = θ(t).
Vamos considerar que a corda (ou fio) tem comprimento fixo L, e indeformavel e tem
massa desprezıvel. Isto significa que o movimento do corpo se da em um plano bidimensional
e descreve neste plano uma trajetoria circular. Tambem vamos considerar que as unicas forcas
atuantes sobre o objeto sao a forca peso ~p e a forca de tensao ~t com a corda.
Fixemos um sistema coordenado bidimensional nas coordenadas tangencial e radial
ao movimento circular. Isto e, um dos eixos e tangente a trajetoria circular enquanto o outro
eixo e normal (perpendicular) a trajetoria circular. As forcas peso ~p e tensao ~t podem ser
devidamente divididas nas componentes tangencial e radial da forma
~p = (−mg sen θ,−mg cos θ)
~t = (0, T )
onde T e o modulo da forca de tracao da corda para com o objeto, m e a massa do objeto,
e g e a aceleracao da gravidade. Note que as componentes da forca peso estao em sentido
contrario ao referencial adotado, e pro isto temos as coordenadas com sinal negativo.
A forca resultante desta acao, que designaremos por ~F , e dada por
~F = ~t+ ~p = (−mg sen θ, T −mg cos θ).
De acordo com a segunda Lei de Newton, tambem chamado de princıpio fundamental
da mecanica, a resultante das forcas que agem em um corpo e igual ao produto da sua massa
pela aceleracao adquirida, isto e,
~F = m~a.
Mas
~a =
(d2s
dt2, 0
),
onde s = s(t) e o deslocamento circular do corpo. A componente radial e nula pois nao ocorre
movimento no sentido radial. O deslocamento s esta relacionado com o angulo θ e o raio L
75
do cırculo, pela relacao s = Lθ, e nestes termos
~a =
(d2s
dt2, 0
)=
(Ld2θ
dt2, 0
).
Entao temos que
(−mg sen θ, T −mg cos θ) = m
(Ld2
dt2θ(t), 0
)donde tiramos as equacoes {
mLθ′′ +mg sen θ = 0
T −mg cos θ = 0
Temos entao uma equacao diferencial de segunda ordem, porem nao e uma equacao
linear em θ e por isso, obter uma solucao para ela torna-se complicado.
Para contornar este problema, lembremos que do calculo temos o seguinte limite
limh→0
senh
h= 1.
Este limite significa que para valores pequenos do argumento h, temos que o numerador e
o denominador sao muito proximos. Podemos traduzir isto escrevendo que senh ≈ h para
valores pequenos de h.
Se a oscilacao for portanto pequena, poderemos usar a aproximacao sen θ ≈ θ e
reescrever a equacao diferencial na forma
θ′′ +g
Lθ = 0,
que representa a oscilacao do pendulo para valores pequenos de θ. Esta ultima equacao e
uma equacao linear, homogenea, de segunda ordem e com coeficientes constantes. A solucao
desta equacao esta relacionada com as raızes da equacao auxiliar (em x)
x2 +g
L= 0,
que sao complexas conjugadas x = ±i√
gL . A solucao e entao
θ = θ(t) = C1 cos(√
gL t)
+ C2 sen(√
gL t),
o que traduz um movimento oscilatorio. As constantes C1 e C2 poderao ser determinadas
impondo-se condicoes iniciais, que provavelmente serao θ(0) = θ0 e θ′(0) = θ1, isto e, a
posicao inicial na componente tangencial e a velocidade inicial. Uma vez determinadas as
constantes C1 e C2 poderemos determinar o valor do angulo θ em um determinado instante
t e com isto a posicao do objeto de massa m neste instante t.
Note que negligenciamos a equacao obtida da coordenada radial T = mg cos θ. Esta
equacao nao precisa ser utilizada para a determinacao de θ, mas pode ser utilizada, depois
de obtermos θ(t), para determinar a forca de tensao exercida sobre a corda.
76
Podemos complicar um pouco mais o problema. Na verdade o problema analisado
e tao simples que e irreal. A consideracao de que as unicas forcas atuantes no sistema sao
~p e ~t, pede que nao haja forcas como atrito atuando no pendulo. Isto somente e conseguido
no vacuo. Para tornar o sistema um pouco mais real, podemos considerar uma forca de
amortecimento (atrito) ~r agindo no pendulo. Fisicamente isto significa que o pendulo esta
oscilando imerso em algum meio como agua, oleo ou o proprio ar.
Normalmente forcas de amortecimento sao consideradas como proporcionais a uma
potencia da velocidade. Para manter a linearidade da equacao, vamos considerar que esta
potencia e 1. Neste caso, colocamos
~r = −λ~v,
onde λ > 0 e a constante de proporcionalidade, ~v e a velocidade, e o sinal negativo e de-
correncia de que a forca de amortecimento age no sentido contrario a velocidade. Natural-
mente
~v =
(d
dts(t), 0
)=
(Ld
dtθ(t), 0
),
e entao
~r = −λ~v =
(−λL d
dtθ(t), 0
)=(−λLθ′, 0
).
Assim, temos
~F = m~a =(mLθ′′, 0
),
com
~F = ~p+ ~t+ ~r = (−λLθ′ −mg sen θ, T −mg cos θ).
donde segue, da componente tangencial, a equacao diferencial
mLθ′′ + λLθ′ +mg sen θ = 0,
ou ainda
θ′′ +λ
mθ′ +
g
Lθ = 0,
valida para pequenas oscilacoes. Esta equacao diferencial (em θ) possui solucoes baseadas
nas raızes da equacao auxiliar
mLx2 + λLx+mg = 0.
A respeito destas raızes, temos tres casos a considerar.
Caso 1. Se a equacao auxiliar possui duas raızes reais distintas
x1 =−Lλ+
√L2λ2 − 4mLmg
2mL, x2 =
−Lλ−√L2λ2 − 4mLmg
2mL,
entao a solucao e da forma
θ = θ(t) = C1ex1t + C2e
x2t.
77
Mas note que
x1 =−Lλ+
√L2λ2 − 4m2Lg
2mL<−Lλ+
√L2λ2
2mL= 0
x2 =−Lλ−
√L2λ2 − 4m2Lg
2mL< 0
e portanto, o movimento do pendulo decai a zero exponencialmente. Isto deve-se ao valor
elevado da constante de proporcionalidade λ. Caso o pendulo passe pela solucao de equilıbrio
θ(t) = 0, isto somente podera ocorrer uma vez, exatamente no ponto
t =mL√
λ2L2 − 4m2Lgln
(−C2
C1
)e somente se C2 e C1 possuem sinais contrarios.
Caso 2. A unica raız real da equacao auxiliar e,
x =−Lλ2mL
=−λ2m
.
Neste caso, a solucao e dada por
θ = θ(t) = C1e−λ2m
t + C2te−λ2m
t = (C1 + C2t)e−λ2m
t.
Observe que ainda temos que a solucao vai para zero quando t → ∞. Tambem a solucao
passa uma unica vez pela solucao de equilıbrio, exatamente em
t = −C1
C2.
Caso 3. Se as raızes da equacao auxiliar, forem os numeros complexos conjugados
x1 = x2 =−λ2m
+
√4m2Lg − L2λ2
2mLi,
entao a solucao da equacao diferencial toma a forma
θ = θ(t) = e−λ2m
t
(C1 cos
√4m2Lg − L2λ2
2mLt+ C2 sen
√4m2Lg − L2λ2
2mLt
).
Observe que agora temos um movimento oscilatorio. Mesmo assim, a presenca da exponencial
com potencia negativa nos diz que o movimento tende a zero quando t → ∞. Porem agora
o valor da constante de proporcionalidade nao deve ser muito alto. Para ser mais preciso,
λ2 < 4m2gL . Isto significa que a convergencia para zero se da de forma mais lenta, permitindo
algum tempo de movimento de oscilacao.
78
Capıtulo 4
A Transformada de Laplace
4.1 Transformada de Laplace
Nesta secao apresentaremos a definicao de Transformada de Laplace e algumas proprieda-
des importantes desta Transformada. As definicoes e resultados apresentados aqui seguem
essencialmente em [?]. A transformada de Laplace, conforme apresentada em [?], pertence a
uma famılia muito vasta de transformadas integrais, que estabelecem uma relacao entre uma
funcao f e a sua transformada F , da forma
F (s) =
∫IK(s, t)f(t)dt. (4.1)
Uma Transformada particular necessita entao da definicao do nucleo K(s, t) e do
intevalo de integracao I, sendo estes escolhidos dependendo do interesse ou da aplicacao. As
Transformacoes mais utilizadas sao a de Fourier, que utiliza
I = R = (−∞,∞) e K(s, t) = e−ist, s ∈ R
e a de Laplace, que requer
I = [0,∞) e K(s, t) = e−st, s = a+ ib ∈ C.
Ja que s e complexo, a transformada de Laplace e uma generalizacao da Transfor-
mada de Fourier. Neste texto, entretanto, nao estamos interessados no trato com os numeros
complexos, e portanto consideraremos a transformada de Laplace quando s ∈ R. Nestes
termos, segue a definicao de Transformada de Laplace que utilizaremos.
Definicao 4.1.1. Seja f uma funcao definida para t ≥ 0. A integral
L(f)(s) =
∫ ∞0
e−stf(t)dt, (4.2)
quando existir, sera chamada de transformada de Laplace de f .
79
Quando a integral impropria acima existir, o resultado sera uma funcao da variavel
independente s. Iremos omitir todas as restricoes sobre s. Entendemos que s esteja sufici-
entemente restrito para garantir a convergencia da integral em (4.2). Usaremos geralmente
letras minusculas para denotar uma funcao e a letra maiuscula correspondente para denotar a
sua transformada de Laplace. Isto significa que F (s) = L(f)(s). E comum tambem escrever
F (s) = L(f(t))(s) mas para nao sobrecarregar a notacao omitimos a variavel t da funcao
f . Usaremos sempre, salvo mencao em contrario, t a variavel da funcao e s a variavel da
transformada de Laplace.
De uma certa forma, queremos garantir a existencia da transformada de Laplace de
certas funcoes, em especial, as de nosso iteresse. A proxima definicao da uma condicao para
a existencia da transformada de Laplace de uma funcao f .
Definicao 4.1.2. Dizemos que uma funcao f e de ordem exponencial c, se existem constantes
c, M > 0 e T > 0 de tal forma que |f(t)| < Mect para todo t > T .
Observe que se uma funcao f e de ordem exponencial c, entao a transformada de
Laplace de f existe para s > c, mesmo que f nao seja contınua. No que se segue vamos supor
que as funcoes envolvidas sao de ordem exponencial c para algum c ∈ R. Seria suficiente
supor que as funcoes de nosso interesse admitem transformada de Laplace pelo menos para
s > c. Uma funcao f que admite transformada de Laplace, isto e, uma funcao f de forma
que a integral (4.2) seja convergente, pelo menos para s > c, e dita uma funcao admissıvel.
Desta forma, estamos supondo deste ponto em diante que, as funcoes de nosso interesse sao
admissıveis.
A seguir veremos algumas propriedades envolvendo a transformada de Laplace. Esta
propriedades sao de interesse imediato para aplicarmos esta transformada na obtencao de
solucoes de EDOs lineares de ordem n a coeficientes constantes.
Proposicao 4.1.3. A transformada de Laplace e um operador linear. De outra forma, se
f e g sao funcoes cujas transformadas de Laplace existem e α, β ∈ R, entao L(αf + βg) =
αL(f) + βL(g).
Prova. Usando a linearidade do operador integral (quando as integrais existem) temos que
L(αf + βg)(s) =
∫ ∞0
e−st(αf + βg)(t)dt
=
∫ ∞0
e−stαf(t) + e−stβg(t)dt
= α
∫ ∞0
e−stf(t)dt+ β
∫ ∞0
e−stg(t)dt
= αL(f)(s) + βL(g)(s) = (αL(f) + βL(g))(s),
o que prova a linearidade do operador L.
80
Observe que a demonstracao anterior pode ser executada diretamente na integral
em (4.1). Nestes termos qualquer transformada definida pela expressao (4.1) e linear, em
virtude da linearidade da integral e da distributividade do produto em relacao a adicao.
Proposicao 4.1.4 (Transformada de uma derivada). Seja n ∈ N∗. Se f e f ′ forem contınuas
em [0,∞) e tais que as transformadas de Laplace existem, entao
L(f ′)(s) = sL(f)(s)− f(0).
Prova. Como
L(f ′)(s) =
∫ ∞0
e−stf ′(t)dt,
usando integracao por partes com u = e−st e dvdt = f ′(t) temos que du
dt = −se−st e v = f(t) e
assim,
L(f ′)(s) =
∫ ∞0
e−stf ′(t)dt
= e−stf(t)∣∣∞t=0−∫ ∞
0−se−stf(t)dt
= e−stf(t)∣∣∞t=0
+ s
∫ ∞0
e−stf(t)dt.
A integral do ultimo membro e precisamente L(f)(s) e notemos ainda que como a
transformada de Laplace de f existe, a integral converge no intervalo ilimitado [0,∞), e desta
forma, o integrando e−stf(t) deve tender a zero quando t→∞. Segue que
L(f ′)(s) = e−stf(t)∣∣∞t=0
+ s
∫ ∞0
e−stf(t)dt = sL(f)(s)− f(0),
e a prova esta feita.
Podemos usar esta proposicao repetidamente para obter expressoes que envolvem a
transformada de Laplace das derivadas de ordem superior de uma funcao f . Admitindo que
f , f ′ e f ′′ sao admissıveis, entao
L(f ′′)(s) = sL(f ′)(s)− f ′(0)
= s(sL(f)(s)− f(0))− f ′(0) = s2L(f)(s)− sf(0)− f ′(0),
e assim sucessivamente. O proximo corolario resume a expressao para o caso de uma derivada
de ordem n ∈ N∗ arbitraria.
Corolario 4.1.5. Seja n ∈ N∗. Se f, f ′, f ′′, . . . , f (n) forem contınuas em [0,∞) e tais que as
transformadas de Laplace existem, entao
L(f (n))(s) = snL(f)(s)−n−1∑i=0
sn−1−if (i)(0).
81
Prova. A prova e feita usando inducao sobre n ∈ N∗. Para n = 1 o resultado ja foi provado
na Proposicao 4.1.4. Suponha entao (por inducao) que o resultado seja valido para n − 1,
isto e,
L(f (n−1))(s) = sn−1L(f)(s)−n−2∑i=0
sn−2−if (i)(0).
Para n, temos que
L(f (n))(s) =
∫ ∞0
e−stf (n)(t)dt,
e usando novamente integracao por partes com u = e−st e dvdt = f (n)(t) temos que du
dt = −se−st
e v = f (n−1)(t) e assim,
L(f (n))(s) =
∫ ∞0
e−stf (n)(t)dt
= e−stf (n−1)(t)∣∣∣∞t=0−∫ ∞
0−se−stf (n−1)(t)dt
= e−stf (n−1)(t)∣∣∣∞t=0
+ s
∫ ∞0
e−stf (n−1)(t)dt.
Novamente a integral do ultimo membro e L(f (n−1))(s), e tambem o termo e−stf (n−1)(t)
deve tender a zero quando t→∞ ja que a integral impropria da transformada de Laplace de
e−stf (n−1)(t) converge. Assim,
L(f (n))(s) = e−stf (n−1)(t)∣∣∣∞t=0
+ s
∫ ∞0
e−stf (n−1)(t)dt
= −f (n−1)(0) + sL(f (n−1))(s)
= −f (n−1)(0) + s
[sn−1L(f)(s)−
n−2∑i=0
sn−2−if (i)(0)
]
= snL(f)(s)− f (n−1)(0)− sn−2∑i=0
sn−2−if (i)(0)
= snL(f)(s)− f (n−1)(0)−n−2∑i=0
sn−1−if (i)(0)
= snL(f)(s)−n−1∑i=0
sn−1−if (i)(0).
Usaremos agora a Transformada de Laplace para obter solucoes de uma equacao
diferencial. Para facilitar as ideias considere uma equacao diferencial linear a coeficientes
constantes na funcao y = y(t),
any(n) + an−1y
(n−1) + · · ·+ a2y′′ + a1y
′ + a0y = 0,
sendo que y(k) refere-se a derivada de ordem k da funcao y = y(t), e os coeficientes ak sao
constantes.
82
Aplicamos em ambos os membros desta equacao diferencial a Transformada de La-
place. Em virtude da linearidade e da propriedade da derivada obtemos
h(s)Y (s) = g(s),
sendo que Y (s) = L(y(t))(s) e a transformada de Laplace da funcao y(t), e as funcoes h(s)
e g(s) sao funcoes resultantes da reorganizacao dos termos. Esta nova equacao agora e uma
equacao algebrica na variavel Y (s). Resolvendo esta equacao algebrica chegamos a
L(y)(s) = Y (s) =g(s)
h(s).
Observe que com isto conseguimos encontrar, nao exatamente a solucao desejada y(t)
da equacao diferencial, mas sim a Transformada de Laplace da solucao da equacao diferencial.
Poderıamos recuperar a solucao y(t) se pudessemos inverter o processo. De outra forma, se
pudessemos aplicar a “Transformada de Laplace Inversa” em ambos os membros. Esta ideia
motiva a proxima definicao.
Definicao 4.1.6. Se F (s) = L(f)(s) representa a transformada de Laplace de uma funcao
f(t), dizemos entao que f(t) e a transformada inversa de Laplace de F (s) e escrevemos
f(t) = L−1(F (s))(t) = L−1(F )(t).
Escrever sobre as propriedades da transformada inversa... Principalmente a lineari-
dade...
Vamos determinar as transformadas de Laplace de algumas funcoes que aparecem
com frequencia na solucao de uma equacao diferencial.
Exemplo 38: Se f(t) = a e a funcao constante, com a ∈ R, entao
L(a)(s) =
∫ ∞0
e−stadt =a
−se−st
∣∣∣∣∞t=0
= − a
−s=a
s.
desde que s > 0. Fica claro que, quando s < 0, entao e−st =∞ quanto t→∞ o que garante
que a integral diverge se s < 0. �
Exemplo 39: Se n ∈ N e f(t) = tn entao,
L(tn)(s) =n!
sn+1,
para s > 0. Usaremos inducao finita sobre n ∈ N. Para n = 0 temos claramente (do exemplo
anterior) que
L(t0)(s) = L(1)(s) =
∫ ∞0
e−stdt =1
s.
Suponha agora valido para k, isto e, L(tk)(s) = k!sk+1 . Entao para k + 1 temos que
L(tk+1)(s) =
∫ ∞0
e−sttk+1dt.
83
Procederemos por integracao por partes. Escolhendo entao u = tk+1 e dvdt = e−st, entao
dudt = (k + 1)tk e v = 1
−se−st, e temos
L(tk+1)(s) =
∫ ∞0
e−sttk+1dt
= tk+1 1
−se−st
∣∣∣∣∞t=0
−∫ ∞
0(k + 1)tk
1
−se−stdt
=k + 1
s
∫ ∞0
tke−stdt
=k + 1
sL(tk)(s) =
k + 1
s
k!
sk+1=
(k + 1)!
sk+2,
desde que s > 0. O resultado fica entao provado por inducao sobre N. �
Exemplo 40: Se a ∈ R, entao para f(t) = cosh(at), temos
L(cosh(at))(s) =s
s2 − a2,
desde que s > |a|. Para provar isto, seja entao a ∈ R. Temos que
L(cosh(at))(s) =
∫ ∞0
e−st cosh(at)dt.
Vamos determinar a integral do segundo membro usando integracao por partes.
Escolhendo u = e−st e dvdt = cosh(at), temos que du
dt = (−s)e−st e v = 1a senh(at). Assim,∫ ∞
0e−st cosh(at)dt =
1
ae−st senh(at)
∣∣∣∣∞t=0
−∫ ∞
0(−s)e−st( 1
a) senh(at)dt.
Analisando e−st senh(at) quando t → ∞, verificamos que e−st = 0 e senh(at) = ∞.
Se aplicarmos L’Hopital nessa indeterminacao vamos sempre voltar na exponencial e no seno
hiperbolico. Entao vamos substituir senh(at) pela sua identidade exponencial que e eat−e−at2 .
Reescrevendo entao temos∫ ∞0
cosh(at)e−stdt =1
ae−st
eat − e−at
2
∣∣∣∣∞t=0
−∫ ∞
0(−s)e−st 1
a senh(at)dt
=1
2a(e−(s−a)t − e−(s+a)t)
∣∣∣∣∞t=0
+
∫ ∞0
se−st 1a senh(at)dt
=s
a
∫ ∞0
e−st senh(at)dt,
pois (s − a) > 0 e (s + a) > 0, ja que s > |a|. Novamente integrando por partes, colocamos
u = e−st e dvdt = senh(at) e com isto, du
dt = (−s)e−st e v = 1a cosh(at). Assim,∫ ∞
0cosh(at)e−stdt =
s
a
∫ ∞0
e−st senh(at)dt
=s
a2e−st cosh(at)
∣∣∣∞t=0− s
a
∫ ∞0
(−s)e−st 1a cosh(at)dt.
84
Vamos substituir novamente cosh(at), pela sua identidade exponencial eat+e−at
2 .
Entao obtemos∫ ∞0
e−st cosh(at)dt =s
a2e−st
eat + e−at
2
∣∣∣∣∞t=0
− s
a
∫ ∞0
(−s)e−st 1a cosh(at)dt
=s
2a2(e−(s−a)t + e−(s+a)t)
∣∣∣∞t=0
+s2
a2
∫ ∞0
e−st cosh(at)dt
=s
2a2(0− (1 + 1)) +
s2
a2
∫ ∞0
e−st cosh(at)dt.
Reorganizando os termos segue que(1− s2
a2
)∫ ∞0
e−st cosh(at)dt = − s
a2,
e multiplicando ambos os membros por a2,
(a2 − s2)
∫ ∞0
e−st cosh(at)dt = −s,
donde temos que
L(cosh(at))(s) = − s
a2 − s2=
s
s2 − a2,
para todo s > |a|. �
Como ja exemplificamos os metodos e nao estamos interessados em mais exemplos,
segue uma tabela de transformadas de funcoes importantes, com a respectiva restricao de s
para que a integral seja convergente.
f(t) L(f)(s) s
a as s > 0
tn n!sn+1 s > 0
eat 1s−a s > a
tneat n!(s−a)n+1 s > a
sen(at) as2+a2
s > |a|cos(at) s
s2+a2s > |a|
senh(at) as2−a2 s > |a|
cosh(at) ss2−a2 s > |a|
Tabela 4.1: Transformadas de Laplace.
Desta forma, com base nesta tabela, podemos construir uma outra tabela de trans-
formadas inversas. A ideia e que a transformada inversa, aplicada em F (s) = L(f)(s), devolva
a funcao f(t). Segue uma tabela de transformadas inversas baseada na tabela anterior.
85
F (s) L−1(F )(t)
as an!sn+1 tn
1s−a eat
n!(s−a)n+1 tneat
as2+a2
sen(at)s
s2+a2cos(at)
as2−a2 senh(at)s
s2−a2 cosh(at)
Tabela 4.2: Transformadas de Laplace Inversas.
Exemplo 41: Consideremos o problema de valor inicial{y′′′ − y′′ + y′ − y = 4e−t
y(0) = −1, y′(0) = 3, y′′(0) = 3.
e vamos usar a Transformada de Laplace para determinar a solucao y(t) deste sistema. Apli-
cando a Transformada de Laplace em ambos os membros da equacao diferencial temos que
L(y′′′ − y′′ + y′ − y)(s) = L(4e−t)(s),
e usando os resultados das proposicoes 4.1.3 e 4.1.4 e da tabela 4.1, temos que
(s3Y (s) + s2 − 3s− 3)− (s2Y (s) + s− 3) + (sY (s) + 1)− Y (s) = 41
s+ 1,
ou ainda,
(s3 − s2 + s− 1)Y (s) + (s2 − 4s+ 1) =4
s+ 1,
e portanto
(s3 − s2 + s− 1)Y (s) =4
s+ 1− (s2 − 4s+ 1) =
3 + 3s+ 3s2 − s3
s+ 1,
donde obtemos
Y (s) =3 + 3s+ 3s2 − s3
(s+ 1)(s3 − s2 + s− 1)=
3 + 3s+ 3s2 − s3
(s+ 1)(s− 1)(s2 + 1).
O que temos que fazer agora antes de aplicar a Transformada de Laplace Inversa
e organizar o segundo membro para podermos aplicar os resultados da tabela 4.2. Entao
usando a tecnica de separacao de fracoes parciais, queremos encontrar A, B, C e D de forma
que
3 + 3s+ 3s2 − s3
(s+ 1)(s− 1)(s2 + 1)=
A
s+ 1+
B
s− 1+Cs+D
s2 + 1
86
=A(s− 1)(s2 + 1) +B(s+ 1)(s2 + 1) + (Cs+D)(s− 1)(s+ 1)
(s+ 1)(s− 1)(s2 + 1),
e portanto de forma que
3 + 3s+ 3s2 − s3 = A(s− 1)(s2 + 1) +B(s+ 1)(s2 + 1) + (Cs+D)(s− 1)(s+ 1),
para todo s (com possıveis restricoes).
Com s = 1 obtemos imediatamente B = 2. Com s = −1 obtemos A = −1. Com
s = 0 obtemos D = 0 e finalmente com s = 2 obtemos C = −2. Segue que
Y (s) =3 + 3s+ 3s2 − s3
(s+ 1)(s− 1)(s2 + 1)=−1
s+ 1+
2
s− 1+−2s
s2 + 1,
e aplicando em ambos os membros a transformada inversa, temos que
y(t) = L−1(Y (s))(t)
= −L−1
(1
s+ 1
)(t) + 2L−1
(1
s− 1
)(t)− 2L−1
(s
s2 + 1
)(t)
= −e−t + 2et − 2 cos(t).
�
87
Capıtulo 5
Equacoes diferenciais nao lineares
Estamos agora interessados em analisar equacoes diferenciais nao necessariamente lineares.
Uma equacao diferencial geral na variavel independente x, e uma expressao da forma
F (x, y, y′, y′′, . . . , y(n)) = g(x),
onde y e uma variavel dependente de x, e F e g sao funcoes quaisquer. Neste caso e difıcil
estabelecer criterios para determinar se existem solucoes para esta ED, e mesmo que exista,
outro problema mais serio e determinar tal solucao.
5.1 Solucoes por serie de potencia
Quando uma dada equacao diferencial nao e linear ou quando os coeficientes nao sao cons-
tantes, pode nao ser muito facil determinar solucoes para esta ED.
Em geral, o melhor que podemos esperar e que exista uma solcucao y dada em forma
de serie de potencias da variavel independente x,
y =
∞∑n=0
bnxn = b0 + b1x+ b2x
2 + b3x3 + · · · ,
ou
y =
∞∑n=0
bn(x− c)n = b0 + b1(x− c) + b2(x− c)2 + b3(x− c)3 + · · · .
Determinar esta serie de potencias significa determinar os coeficientes bn para todo
n ∈ N. O metodo utilizado e por abordagem direta. Dada a ED, supomos que a funcao
y =∑∞
n=0 bnxn seja uma solucao desta ED, e a substituicao desta serie na equacao diferencial
pode nos levar ao calculo dos coeficientes bn.
Nesta abordagem, e necessario substituir todas as funcoes envolvidas na ED por
suas respectivas series de potencias.
88
Em geral nem todos os coeficientes bn serao determinados. Isto porque a solucao
de uma ED, como ja sabemos, depende de algumas constantes, que no caso sao alguns dos
proprios coeficientes bn. Uma vez determinada a serie de potencias, outro problema e de-
terminar o intervalo I de convergencia desta serie. Intervalo no qual esta serie define uma
funcao, e portanto, define uma solucao para a equacao diferencial por serie de potencia. Para
esta tarefa sugerimos consultar algum livro de Calculo (volume II), para conhecimento dos
diversos metodos que podem ser utilizados.
Embora este trabalho nao seja muito facil, existem vantagens. O metodo e bas-
tante geral, podendo ser aplicado a equacoes diferenciais desde lineares a nao lineares, com
coeficientes desde constantes a nao constantes.
5.2 Aplicacao: A catenaria
Catenaria e o nome da curva que descreve a trajetoria de equilıbrio de um cabo flexıvel, de
comprimento fixo e suspenso por duas hastes. O estudo desta curva desempenha um papel
fundamental nos cursos de engenharia.
Consideremos entao um cabo flexıvel, nao extensıvel, sustentado por duas hastes,
pelos pontos A e B. Fixemos um sistema coordenado cartesiano, onde o eixo Ox coincide
com a linha do solo, e o eixo Oy e perpendicular ao solo e esta posicionado no meio das
duas hastes. Chamemos D = (0, δ) o ponto mais baixo da curva, e que esta sobre o eixo
Oy. O cabo descreve uma trajetoria, neste sistema coordenado, que denotemos por y = y(x).
Tomemos um ponto P = (x, y) sobre esta curva (digamos a direita do ponto D).
Considerando a porcao do cabo entre os pontos D e P , temos as forcas ~h, ~p e ~t,
atuando sobre esta porcao do cabo. ~p e a forca peso, que e dada por
~p = (0,−ωL)
onde ω e o peso do cabo por unidade de comprimento e L e o comprimento do cabo (da
porcao do cabo considerada). ~t e a forca de tracao pela direita no ponto P = (x, y), e e
decomposta nas componentes vertical e horizontal por
~t = (t cos θ, t sen θ),
sendo que t e o modulo da tensao pela direita e θ e o angulo que o vetor tangencial ~t faz com
a horizontal. ~h e a forca de tracao pela esquerda no ponto D = (0, δ), dada por
~h = (−h, 0),
onde h e o modulo da tensao pela esquerda.
89
Figura 5.1: Forcas atuantes no cabo suspenso.
O sistema esta em equilıbrio, isto e,
~h+ ~p+ ~t = 0.
Entao
(−h, 0) + (0,−ωL) + (t cos θ, t sen θ) = 0,
e portanto
−h+ t cos θ = 0
−ωL+ t sen θ = 0.
Agora, sabemos do calculo que a inclinacao θ, do vetor tangente a curva em (x, y(x)), se
relaciona com a curva por
tg θ = y′,
donde temos que
y′ = tg θ =sen θ
cos θ=t sen θ
t cos θ=−ωL−h
=ωL
h.
Mas note que L nao e uma constante. L = L(x) e o comprimento da curva de D a
P e isto dependera da posicao do ponto P = (x, y). Sabemos (do calculo) que o comprimento
desta curva pode ser calculado pela formula integral,
L = L(x) =
∫ x
0
√1 + (y′)2 dx,
e assim,
y′ =ωL
h=ω
h
∫ x
0
√1 + (y′)2 dx.
Para eliminar a integral do segundo membro, derivamos ambos os membros da igual-
dade, e usando o Teorema Fundamental do Calculo obtemos
y′′ =ω
h
√1 + (y′)2,
90
ou ainda, elevando ambos os membros ao quadrado e reorganizando os termos,
h2(y′′)2 − ω2(y′)2 = ω2.
A esta equacao diferencial, juntamos as condicoes iniciais y′(0) = 0 e y(0) = δ. Em
outras palavras, temos um problema de valor inicial{h2(y′′)2 − ω2(y′)2 = ω2
y′(0) = 0, y(0) = δ.(5.1)
Esta equacao diferencial nao e uma equacao diferencial linear. Tecnicas desenvol-
vidas nos capıtulos anteriores nao podem agora ser utilizadas. Vamos determinar a solucao
deste PVI, para conhecer y, a funcao que descreve a curva catenaria. Mais de uma tecnica
pode ser utilizada para obter esta solucao, mas para exemplificar o conteudo desta secao,
obteremos uma solucao em serie de potencias de x. Isto e, desejamos encontrar uma solucao
da forma
y(x) = a0 + a1x+ a2x2 + a3x
3 + · · ·+ anxn + · · · .
Primeiro vamos reduzir a ordem da equacao diferencial em (5.1) escrevendo u = y′
e determinaremos primeiro
u(x) = b0 + b1x+ b2x2 + b3x
3 + · · ·+ bnxn + · · ·
solucao do PVI {h2(u′)2 − ω2u2 = ω2
u(0) = y′(0) = 0.(5.2)
Vamos encontrar as series de potencias de u2 e (u′)2, usando uma tabua de multi-
plicacao e depois substituiremos na equacao diferencial de (5.2) para obter os coeficientes bk.
Temos entao
u b0 b1x b2x2 b3x
3 b4x4 . . .
b0 b0b0 b0b1x b0b2x2 b0b3x
3 b0b4x4 · · ·
b1x b1b0x b1b1x2 b1b2x
3 b1b3x4 · · ·
b2x2 b2b0x
2 b2b1x3 b2b2x
4 · · ·b3x
3 b3b0x3 b3b1x
4 · · ·b4x
4 b4b0x4 · · ·
......
......
......
. . .
e assim, podemos escrever
u2 =∞∑n=0
(n∑k=0
bkbn−k
)xn.
Para u′, temos
u′(x) = b1 + 2b2x+ 3b3x2 + 4b4x
3 + · · ·+ nbnxn−1 + · · ·
e portanto a tabela produto fica
91
u′ b1 2b2x 3b3x2 4b4x
3 5b5x4 . . .
b1 b1b1 2b1b2x 3b1b3x2 4b1b4x
3 5b1b5x4 · · ·
2b2x 2b2b1x 4b2b2x2 6b2b3x
3 8b2b4x4 · · ·
3b3x2 3b3b1x
2 6b3b2x3 9b3b3x
4 · · ·4b4x
3 4b4b1x3 8b4b2x
4 · · ·5b5x
4 5b5b1x4 · · ·
......
......
......
. . .
donde podemos escrever
(u′)2 =
∞∑n=0
(n∑k=0
(k + 1)(n+ 1− k)bk+1bn+1−k
)xn.
Substituindo as series de potencia de u2 e (u′)2 na equacao (5.2), temos a equacao em series
de potencia
∞∑n=0
(n∑k=0
h2(k + 1)(n+ 1− k)bk+1bn+1−k
)xn −
∞∑n=0
(n∑k=0
ω2bkbn−k
)xn = ω2,
ou ainda,
∞∑n=0
(n∑k=0
(h2(k + 1)(n+ 1− k)bk+1bn+1−k − ω2bkbn−k
))xn = ω2.
Podemos olhar o segundo membro tambem como uma serie de potencias
ω2 = ω2 + 0x+ 0x2 + 0x3 + 0x4 + · · · .
Igualando entao os coeficientes dos dois membros, temosh2b1b1 − ω2b0b0 = ω2 (n = 0)n∑k=0
(h2(k + 1)(n+ 1− k)bk+1bn+1−k − ω2bkbn−k
)= 0 (n = 1, 2, 3, . . . ).
Vamos agora calcular os coeficientes, em termos de b0. Para n = 0, a primeira destas
equacoes nos fornece
b1 =ω
h
√1 + b20.
Para n = 1, temos
2h2b1b2 − ω2b0b1 + 2h2b2b1 − ω2b1b0 = 0,
que nos leva a
b2 =1
4h2b12ω2b1b0 =
1
2
ω2
h2b0.
Para n = 2,
3h2b1b3 − ω2b0b2 + 4h2b2b2 − ω2b1b1 + 3h2b3b1 − ω2b2b0 = 0,
92
donde encontramos
b3 =1
6h2b1
(2ω2b0b2 + ω2b21 − 4h2b22
)=
1
6h2b1
(ω4
h2b20 + ω2b21 −
ω4
h2b20
)=
1
6
ω3
h3
√1 + b20.
Para n = 3, temos
4h2b1b4 − ω2b0b3 + 6h2b2b3 − ω2b1b2 + 6h2b3b2 − ω2b2b1 + 4h2b4b1 − ω2b3b0 = 0,
que fornece
b4 =1
8h2b1
(2ω2b0b3 + 2ω2b1b2 − 12h2b2b3
)=
1
8h2b1
(2ω2b0
1
6
ω2
h2b1 + 2ω2 1
2
ω2
h2b0b1 − 12h2 1
2
ω2
h2b0
1
6
ω2
h2b1
)=
1
8h2b1
(1
3
ω4
h2b0b1 +
ω4
h2b0b1 −
ω4
h2b0b1
)=
1
24
ω4
h4b0.
Podemos observar um padrao nestes termos e deduzir que
bn =1
n!
ωn
hnb0 (n par)
bn =1
n!
ωn
hn
√1 + b20 (n ımpar).
Mas observe que a condicao inicial u(0) = y′(0) = 0 nos traz
0 = u(0) = b0 + b10 + b202 + b303 + · · · ,
donde b0 = 0. Feito isto,
bn = 0 (n par)
bn =1
n!
ωn
hn(n ımpar).
Logo,
u(x) = b0 + b1x+ b2x2 + b3x
3 + · · ·+ bnxn + · · ·
=ω
hx+
1
3!
ω3
h3x3 +
1
5!
ω5
h5x5 +
1
7!
ω7
h7x7 + · · ·
=
∞∑n=0
1
(2n+ 1)!
ω2n+1
h2n+1x2n+1
=
∞∑n=0
1
(2n+ 1)!
(ωhx)2n+1
= senh(ωhx).
Agora,
y(x) =
∫udx =
∫ ∞∑n=0
1
(2n+ 1)!
(ωhx)2n+1
dx
93
=
(h
ω
∞∑n=0
1
(2n+ 1)!
1
(2n+ 2)
(ωhx)2n+2
)+ C
=
(h
ω
∞∑n=0
1
(2n+ 2)!
(ωhx)2n+2
)+ C
=
(h
ω
∞∑n=1
1
(2n)!
(ωhx)2n)
+ C
=(C − h
ω
)+h
ω
(1 +
∞∑n=1
1
(2n)!
(ωhx)2n)
=(C − h
ω
)+h
ω
∞∑n=0
1
(2n)!
(ωhx)2n
=(C − h
ω
)+h
ωcosh(ωhx).
A constante de integracao C pode ser determinada pelo uso da condicao inicial
y(0) = δ,
δ = y(0) =h
ω+
(C − h
ω
)onde encontramos C = δ, e portanto a solucao procurada, isto e, a funcao y que descreve a
trajetoria do cabo suspenso e,
y(x) =(δ − h
ω
)+h
ω
∞∑n=0
1
(2n)!
(ωhx)2n
=(δ − h
ω
)+h
ωcosh(ωhx).
A curva catenaria e descrita por um cosseno hiperbolico. O termo de translacao
(δ − hω ) pode ser manipulado mudando-se a origem do sistema coordenado fixado sobre a
curva catenaria. Os fatores hω e ω
h determinam a abertura da curva.
94
Capıtulo 6
Sistemas de equacoes diferenciais
lineares
Em algumas aplicacoes que ja vimos, poderıamos modificar o problema de tal forma que
apenas uma equacao seria insuficiente para uma modelagem adequada.
Como exemplo, um sistema massa mola pode ser proposto com uma mola fixada a
um suporte rıgido sustentando uma massa m1. Nesta massa m1, podemos fixar uma segunda
mola que sustenta ainda uma massa m2. Neste caso, duas equacoes sao consideradas, para
modelar cada uma os movimentos u(t) e v(t) de cada uma das massas. Entretanto, como
o movimento de cada uma das massas afeta o movimento da outra, as equacoes nao sao
independentes. Formam portanto um sistema de duas equacoes diferenciais com duas funcoes
incognitas u(t) e v(t).
No modelo de crescimento populacional, podemos considerar duas especies compe-
tindo entre si pelos recursos naturais de uma regiao, como agua, alimento, ar, luz, entre
outros. Nestes termos, o crescimento de uma especie, afeta o crescimento da outra especie.
Problemas como estes, que envolvem duas ou mais equacoes diferenciais acopladas,
sao agora o alvo da nossa atencao.
6.1 Teoria preliminar
Temos particular interesse em sistemas de equacoes lineares, ja que equacoes nao lineares
apresentam certa dificuldade na obtencao de solucoes. Antes de mais nada, precisamos de-
finir adequadamente os sistemas de interesse e o que entenderemos por uma solucao de tais
sistemas.
Definicao 6.1.1. Se y1, y2, . . . , yn sao variaveis dependentes de uma variavel independente
95
t, entao um problema da formaL11y1(t) + L12y2(t) + · · ·+ L1nyn(t) = g1(t)
L21y1(t) + L22y2(t) + · · ·+ L2nyn(t) = g2(t)...
Ln1y1(t) + Ln2y2(t) + · · ·+ Lnnyn(t) = gn(t)
onde Lij sao polinomios no operador diferencial D = ddt , com coeficientes que podem depender
de t, e dito um sistema de equacoes diferenciais lineares. Se gi(t) ≡ 0 entao o sistema e dito
homogeneo.
Definicao 6.1.2. Uma solucao para um sistema de equacoes diferenciais lineares, em um
intervalo I, e uma n-upla
Y (t) = (y1(t), y2(t), . . . , yn(t))
que verifica as n equacoes do sistema para todo t ∈ I.
Vamos agora estudar alguns metodos para obtencao de solucoes de um sistema de
EDOs lineares.
6.2 Metodo de eliminacao algebrica
Este metodo e comumente utilizado para resolver sistemas de equacoes lineares algebricas.
Consiste em eliminar recursivamente uma das variaveis envolvidas, seja por adicao ou substi-
tuicao direta, obtendo um novo problema, que possui uma incognita e uma equacao a menos,
e com esta solucao determinar o valor da variavel eliminada.
Em alguns casos, o metodo da substituicao direta nao e tao imediato. Vamos entao
analisar o metodo da eliminacao por adicao. Este metodo se aplica a sistemas de equacoes
diferenciais lineares a coeficientes constantes, nao necessariamente homogeneas.
Para obtermos ideias, comecemos com um sistema de duas funcoes incognitas u =
u(t) e v = v(t), e duas equacoes, e depois vamos generalizar os resultados.
Primeiro colocamos o sistema na forma padrao{L1u(t) + L2v(t) = g1(t)
L3u(t) + L4v(t) = g2(t)
onde L1, L2, L3 e L4 sao operadores diferenciais a coeficientes constantes. AplicamosL4 na
primeira equacao e −L2 na segunda equacao obtendo,{L1L4u(t) + L2L4v(t) = L4g1(t)
−L2L3u(t)− L2L4v(t) = −L2g2(t)
96
e somando as duas equacoes, temos
L1L4u(t)− L2L3u(t) = L4g1(t)− L2g2(t),
ou ainda,
L1L4u(t)− L2L3u(t) = L4g1(t)− L2g2(t). (6.1)
Por outro lado, aplicando L3 na primeira equacao e −L1 na segunda, obtemos{L1L3u(t) + L2L3v(t) = L3g1(t)
−L1L3u(t)− L1L4v(t) = −L1g2(t)
e somando as duas equacoes vem
L2L3v(t)− L1L4v(t) = L3g1(t)− L1g2(t),
ou ainda,
L2L3v(t)− L1L4v(t) = L3g1(t)− L1g2(t). (6.2)
Agora (6.1) e (6.2) sao duas equacoes diferenciais lineares, a coeficientes constantes,
independentes uma da outra. Resolvendo entao estas equacoes independentes
(L1L4 − L2L3)u(t) = L4g1(t)− L2g2(t)
(L2L3 − L1L4)v(t) = L3g1(t)− L1g2(t)
usando algum dos metodos vistos nas secoes anteriores, encontramos as funcoes u(t) e v(t),
solucao do sistema.
Note que as identidades (6.1) e (6.2) podem ser dadas em termos de determinantes,
por ∣∣∣∣∣ L1 L2
L3 L4
∣∣∣∣∣u =
∣∣∣∣∣ g1(t) L2
g2(t) L4
∣∣∣∣∣ ,e ∣∣∣∣∣ L1 L2
L3 L4
∣∣∣∣∣ v =
∣∣∣∣∣ L1 g1(t)
L3 g2(t)
∣∣∣∣∣ .Note que os determinantes da esquerda sao operadores diferenciais aplicados a funcao incognita,
o nos determinantes da direita os operadores sao aplicados em g1(t) e g2(t).
Se neste caso ∣∣∣∣∣ L1 L2
L3 L4
∣∣∣∣∣ 6= 0,
isto e, o determinante e um operador nao nulo, de ordem n, entao temos duas equacoes nao
homogeneas de ordem n, lineares a coeficientes constantes. Suas solucoes sao
u(t) = uc(t) + up(t)
v(t) = vc(t) + vp(t)
97
onde uc e vc sao as solucoes gerais das equacoes homogeneas correspondentes. Mas note que
as equacoes homogeneas correspondentes sao identicas, isto e,∣∣∣∣∣ L1 L2
L3 L4
∣∣∣∣∣u = 0 e
∣∣∣∣∣ L1 L2
L3 L4
∣∣∣∣∣ v = 0,
donde as solucoes uc e vc sao iguais, exceto pelas constantes. Em geral, o numero de constantes
independentes sera igual a soma das maiores ordens das derivadas das incognitas presentes no
sistema. As solucoes particulares up e vp tambem sao obtidas por qualquer um dos metodos
ja estudados.
Generalizando, um sistema de n equacoes lineares nas incognitas y1(t), y2(t), y3(t),
. . . , yn(t), L11y1(t) + L12y2(t) + · · ·+ L1nyn(t) = g1(t)
L21y1(t) + L22y2(t) + · · ·+ L2nyn(t) = g2(t)...
Ln1y1(t) + Ln2y2(t) + · · ·+ Lnnyn(t) = gn(t)
tem solucao dada (se ela existir) atraves das solucoes das n equacoes independentes,
Dyi(t) = Di(t),
onde D e o operador determinante
D =
∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣
L11 L12 · · · L1n
L21 L22 · · · L2n
......
. . ....
Ln1 Ln2 · · · Lnn
∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣∣e Di e a funcao determinante, obtida substituindo-se a i-esima coluna da matriz de D pela
colunag1(t)
g2(t)...
gn(t)
Exemplo 42: Para resolver o sistema{u′ + 3v = et
u+ v′ − 2v = t
escrevemos na forma padrao, {Du+ 3v = et
u+ (D − 2)v = t
e temos o operador determinante
D =
∣∣∣∣∣ D 3
1 (D − 2)
∣∣∣∣∣ = D(D − 2)− 3 = D2 − 2D − 3.
98
Obtemos portanto duas equacoes diferenciais desacopladas
(D2 − 2D − 3)u =
∣∣∣∣∣ et 3
t (D − 2)
∣∣∣∣∣ = (D − 2)et − 3t = −et − 3t,
e
(D2 − 2D − 3)v =
∣∣∣∣∣ D et
1 t
∣∣∣∣∣ = (D)t− et = 1− et.
A solucao das EDs homogeneas associadas sao baseadas nas raızes da equacao au-
xiliar
m2 − 2m− 3 = 0,
e sao m = −1 e m = 3. Segue que
uc = C1e−t + C2e
3t
vc = C3e−t + C4e
3t.
Sabemos que nem todas estas constantes sao independentes. Substituindo em u′ +
3v = 0, temos
(−3C1 + 3C3)e−t + (3C2 + 3C4)e3t = 0,
donde
−C1 + 3C3 = 0 ⇒ C3 =1
3C1
3C2 + 3C4 = 0 ⇒ C4 = −C2.
Solucoes particulares podem agora ser obtidas. Usaremos metodo dos coeficientes
indeterminados. Tomamos up = Aet + (Bt+ C) obtendo
Aet − 2(Aet +B)− 3(Aet +Bt+ C) = −et − 3t.
Segue que
− 4Aet = −et ⇒ A =1
4
− 3Bt = −3t ⇒ B = 1
− 2B − 3C = 0 ⇒ C = −2
3
e entao up = 14et + (t− 2
3). Tomando agora vp = Aet +B, obtemos
Aet − 2Aet − 3(Aet +B) = 1− et.
Segue que
− 4Aet = −et ⇒ A =1
4
99
− 3B = 1 ⇒ B = −1
3
e entao vp = 14et − 1
3 . A solucao do sistema e portanto
u(t) = uc(t) + up(t) = C1e−t + C2e
3t +1
4et + t− 2
3
v(t) = vc(t) + vp(t) =1
3C1e
−t − C2e3t +
1
4et − 1
3.
�
Exemplo 43: Considerando o sistema{x′′ + x+ y′′ − 3y = e2t
x′ − x+ y − y′ = sen t
tomamos a forma padrao, {(D2 + 1)x+ (D2 − 3)y = e2t
(D − 1)x+ (1−D)y = sen t
e temos o operador determinante
D =
∣∣∣∣∣ (D2 + 1) (D2 − 3)
(D − 1) (1−D)
∣∣∣∣∣ = (D2 + 1)(1−D)− (D2 − 3)(D − 1)
= −2(D3 −D2 −D + 1)
= −2(D − 1)(D − 1)(D + 1).
Obtemos portanto duas equacoes diferenciais desacopladas
−2(D − 1)(D − 1)(D + 1)x =
∣∣∣∣∣ e2t (D2 − 3)
sen t (1−D)
∣∣∣∣∣ = −e2t + 4 sen t,
e
−2(D − 1)(D − 1)(D + 1)y =
∣∣∣∣∣ (D2 + 1) e2t
(D − 1) sen t
∣∣∣∣∣ = 0− e2t.
As tres raızes da equacao auxiliar
−2(m− 1)2(m+ 1) = 0,
sao m = −1, m = 1 e m = 1. Segue que
xc = C1e−t + C2e
t + C3tet
yc = C4e−t + C5e
t + C6tet.
Substituindo em x′ − x+ y − y′ = 0, e reorganizando os termos, temos
(−2C1 + 2C4)e−t + (C3 − C6)et = 0,
100
donde obtemos
−2C1 + 2C4 = 0 ⇒ C4 = C1
C3 − C6 = 0 ⇒ C6 = C3.
Vamos determinar as solucoes particulares xp e yp. Supondo xp = Ae2t + B sen t+
C cos t temos
− 2(8Ae2t −B cos t− C sen t) + 2(4Ae2t −B sen t− C cos t)
2(2Ae2t +B cos t− C sen t)− 2(Ae2t +B sen t+ C cos t) = −e2t + 4 sen t.
e entao
− 6Ae2t = −e2t ⇒ A =1
6
(2C − 2B − 2C − 2B) sen t = 4 sen t ⇒ B = −1
(2B − 2C + 2B − 2C) cos t = 0 ⇒ C = −1
e entao xp = 16e
2t − sen t− cos t. Supondo tambem yp = Ae2t, obtemos
−2(8Ae2t) + 2(4Ae2t) + 2(2Ae2t)− 2Ae2t = −e2t,
e consequentemente
−6Ae2t = −e2t ⇒ A =1
6
e entao yp = 16e
2t. Finalmente a solucao do sistema e
x(t) = xc(t) + xp(t) = C1e−t + C2e
t + C3tet +
1
6e2t − sen t− cos t
y(t) = yc(t) + yp(t) = C1e−t + C5e
t + C3tet +
1
6e2t.
�
6.3 Sistemas de EDs lineares de primeira ordem
O estudo de sistemas de equacoes diferenciais lineares de primeira ordem torna-se importante,
entre outras razoes, porque uma equacao diferencial de ordem n pode (sempre) ser colocada
na forma de um sistema de equacoes diferenciais lineares de primeira ordem. Deixaremos
como exercıcio verificar isto.
Claro que o metodo de eliminacao ja visto anteriormente pode ser utilizado para
resolucao de sistemas de primeira ordem tambem. Mas note que o caso for resolucao de uma
equacao de ordem n que foi colocada na forma de um sistema, entao o metodo de eliminacao
na verdade recuperara a equacao original de ordem n. O que nao ajuda.
101
Definicao 6.3.1. Um sistema de equacoes diferenciais de primeira ordem, e um sistema
formado de equacoes diferenciais todas de primeira ordem. E um problema da forma
y′1 = F1(t, y1, y2, . . . , yn)
y′2 = F2(t, y1, y2, . . . , yn)
...
y′n = Fn(t, y1, y2, . . . , yn).
Definicao 6.3.2. Se na definicao acima as funcoes F1, F2, . . . , Fn forem lineares nas variaveis
dependentes y1, y2, . . . , yn, entao o sistema e dito sistema de equacoes diferenciais lineares de
primeira ordem. Pode entao ser escrito na forma
y′1 = a11y1 + a12y2 + · · ·+ a1nyn + f1(t)
y′2 = a21y1 + a22y2 + · · ·+ a2nyn + f2(t)
...
y′n = an1y1 + an2y2 + · · ·+ annyn + fn(t)
onde os coeficientes aij podem depender de t, para 1 ≤ i, j ≤ n.
Observe que este sistema pode ser posto na forma matricial,y′1
y′2...
y′n
=
a11(t) a12(t) · · · a1n(t)
a21(t) a22(t) · · · a2n(t)...
.... . .
...
an1(t) an2(t) · · · ann(t)
y1
y2
...
yn
+
f1(t)
f2(t)...
fn(t)
.
Escrevendo a matriz das incognitas
Y = Y (t) =
y1
y2
...
yn
=
y1(t)
y2(t)...
yn(t)
,a matriz dos coeficientes
A = A(t) =
a11(t) a12(t) · · · a1n(t)
a21(t) a22(t) · · · a2n(t)...
.... . .
...
an1(t) an2(t) · · · ann(t)
,e a matriz dos termos independentes
F = F (t) =
f1(t)
f2(t)...
fn(t)
,
102
podemos reescrever a forma matricial do sistema de forma simplificada por
Y ′(t) = A(t)Y (t) + F (t). (6.3)
Esta equacao e conhecida como forma matricial associada a um sistema de EDs
lineares de primeira ordem. Desta forma, sempre que nos referirmos a esta equacao matri-
cial, estaremos nos referindo tambem ao sistema de EDs lineares de primeira ordem que ela
representa. Entendemos a derivada Y ′(t), da matriz coluna Y (t), como sendo a derivada dos
elementos desta matriz coluna.
No caso de um sistema homogeneo, isto e, F (t) ≡ 0, a equacao matricial associada
fica
Y ′(t) = A(t)Y (t) (6.4)
que e a equacao homogenea associada a equacao (6.3).
Definicao 6.3.3. Uma solucao para a ED matricial (6.3) em I, e portanto uma solucao para
o sistema de EDs lineares de primeira ordem associado, e uma matriz coluna
Y = Y (t) =
y1(t)
y2(t)...
yn(t)
,
cujos elementos sao funcoes diferenciaveis que satisfazem a equacao (6.3), e portanto o sistema
associado, em I.
Definicao 6.3.4. Um problema de valor inicial (PVI) consiste de um sistema de EDs, na
forma matricial e uma condicao inicial para o vetor solucao Y (t). E um problema da forma{Y ′(t) = A(t)Y (t) + F (t),
Y (t0) = Y0.
Teorema 6.3.5. Se os elementos das matrizes A(t) e F (t) forem funcoes contınuas em um
intervalo I e t0 ∈ I, entao existe uma unica solucao Y (t) para o PVI, definido em I.
De uma certa forma, o procedimento para obter solucoes de um sistema de EDs
lineares de primeira ordem, e similar ao metodo de obtencao de solucoes de uma unica
equacao. A solucao Y (t) do sistema, em um intervalo I, e dada por
Y (t) = Yc(t) + Yp(t)
onde Yp(t) e uma solucao particular para o sistema nao homogeneo em I, e
Yc(t) = C1Y1(t) + C2Y2(t) + · · ·+ CnYn(t)
103
e a solucao geral do sistema homogeneo em I, que e uma combinacao linear das n solucoes
Y1, Y2, . . . , Yn linearmente independentes do sistema homogeneo. Lembremos que um criterio
para decidir se as solucoes Y1, . . . , Yn sao LI em I, e verificar se a matriz cujas colunas sao os
vetores Yi, chamada matriz Wronskiano, tem determinante nao nulo, isto e,
W (Y1, Y2, . . . , Yn) =
y11(t) y12(t) · · · y1n(t)
y21(t) y22(t) · · · y2n(t)...
.... . .
...
yn1(t) yn2(t) · · · ynn(t)
6= 0,
em todo I, onde
Yi =
y1i(t)
y2i(t)...
yni(t)
.
Exemplo 44: A solucao do problema{u′ + 3v = et
u+ v′ − 2v = t
obtida no exemplo 42, e
u(t) = uc(t) + up(t) = C1e−t + C2e
3t +1
4et + t− 2
3
v(t) = vc(t) + vp(t) =1
3C1e
−t − C2e3t +
1
4et − 1
3.
Notemos que esta solucao e da forma Yc + Yp, colocando
Y (t) =
[u(t)
v(t)
]= C1
[e−t
13e−t
]+ C2
[e3t
−e3t
]+
[14et + t− 2
314et − 1
3
]
ou ainda,
Y (t) =
[u(t)
v(t)
]= C1
[113
]e−t + C2
[1
−1
]e3t +
[14et + t− 2
314et − 1
3
].
Note que Yc = C1Y1 +C2Y2 e a combinacao linear de dois vetores linearmente independentes,
que sao as duas solucoes linearmente independentes do sistema homogeneo. �
6.4 Sistemas de EDs lineares de primeira ordem a coeficientes
constantes
Estamos agora interessados em solucoes de uma equacao diferencial matricial (6.3) no caso
em que a matriz dos coeficientes A, nao depende de t. Lembremos que do que foi mencionado
104
anteriormente, estamos interessados em determinar Yc e Yp, que juntas comporao a solucao
geral do sistema. Primeiro, vejamos como obter Yc.
Na secao 3.2 vimos que na busca por solucoes de uma equacao diferencial homogenea
de ordem n, a funcao y(t) = emt se mostrou util, para certos valores de m. Observando
tambem o exemplo 42 vemos que a funcao exponencial tambem figura como parte da solucao
de sistemas homogeneos, porem neste caso, multiplicada por um vetor coluna. Desta forma,
parece util vasculhar funcoes exponenciais, na tentativa de encontrar solucoes para uma
equacao matricial de primeira ordem.
Procuramos uma solucao da forma
Y (t) = Kemt =
k1
k2
...
kn
emt =
k1e
mt
k2emt
...
knemt
,
para k1, k2, . . . , kn ∈ R. Vamos substituir Y = Kemt na equacao homogenea (6.4), e verificar
quais condicoes devem ser satisfeitas por K e m para que Y seja realmente uma solucao de
(6.4).
Temos entao que Kemt deve satisfazer
(Kemt)′ = AKemt.
A derivada no primeiro membro e entendida como sendo em cada elemento da matriz co-
luna, cujas entradas sao precisamente kiemt para 1 ≤ i ≤ n. Desenvolvendo a derivada e
organizando tudo no primeiro membro, temos
(A−mI)Kemt = 0,
onde I representa a matriz identidade. Como emt 6= 0, entao
(A−mI)K = 0.
Mas isto significa que m e autovalor da matriz A, associado ao autovetor K.
Resumindo, para localizar solucoes da forma Y (t) = Kemt devemos localizar os
autovalores da matriz A, e os autovetores correspondentes. Os autovalores da matriz A sao
determinados pelas raızes do polinomio caracterıstico de ordem n,
det(A−mI) = 0.
Feito isto, os autovetores associados, sao determinados pela equacao matricial
(A−mI)K = 0.
A respeito das raızes do polinomio caracterıstico, ou melhor, dos autovalores, podemos con-
siderar tres casos.
105
Caso 1) Autovalores reais distintos. Para cada um dos autovalores, mi real e distinto dos
demais, temos um autovetor associado Ki linearmente independente com os demais. Neste
caso, para cada um destes mi temos uma solucao
Yi = Kiemit.
Caso 2) Autovalores reais com multiplicidade s. Se
mi = mi+1 = mi+2 = · · · = mi+s−1
sao autovalores iguais de A entao ainda podem ocorrer duas situacoes.
Subcaso 1) Existem s autovetores K1,K2, . . . ,Ks, linearmente independentes, as-
sociados ao autovalor mi. Neste (sub)caso, temos que
Yi = Kiemit
Yi+1 = Ki+1emit
...
Yi+s−1 = Ki+s−1emit
sao as s solucoes linearmente independentes associadas aos s autovalores iguais.
Subcaso 2) Existe um unico autovetor Ki associado aos autovalores mi. Neste
(sub)caso, obtemos os vetores Ki,Ki+1, . . . ,Ki+s−1 por
(A−miI)Ki = 0
(A−miI)Ki+1 = Ki
(A−miI)Ki+2 = Ki+1
...
(A−miI)Ki+s−1 = Ki+s−2,
e a solucao associada a estes s autovalores e dada de forma agrupada por
Yi = Kits−1
(s− 1)!emit +Ki+1
ts−2
(s− 2)!emit + · · ·+Ki+s−2te
mit +Ki+s−1emit.
Caso 3) Autovalores complexos. Suponha que
mi = α+ iβ e mi+1 = mi = α− iβ,
sao dois autovalores complexos conjugados de A. Se Ki e o autovetor associado a mi, entao
podemos verificar sem dificuldades que o autovetor Ki+1 associado a mi+1 e precisamente o
conjugado de Ki. Segue que
Kiemit = Kie
(α+iβ)t
106
Kiemit = Kie
(α−iβ)t
sao as duas solucoes LI. Mas notemos que
Kie(α+iβ)t = Kie
αt(cosβt+ i senβt)
Kie(α−iβ)t = Kie
αt(cosβt− i senβt)
e pelo princıpio da superposicao, qualquer combinacao linear destas solucoes constitui ainda
uma solucao. Logo tomamos,
1
2(Kie
(α+iβ)t +Kie(α−iβ)t)
=1
2Kie
αt(cosβt+ i senβt) +1
2Kie
αt(cosβt− i senβt)
=1
2(Ki +Ki)e
αt cosβt+i
2(Ki −Ki)e
αt senβt
i
2(Kie
(α+iβ)t −Kie(α−iβ)t)
=i
2Kie
αt(cosβt+ i senβt)− i
2Kie
αt(cosβt− i senβt)
=i
2(Ki −Ki)e
αt cosβt− 1
2(Ki +Ki)e
αt senβt.
Mas note que os vetores
M1 =1
2(Ki +Ki)
M2 =i
2(Ki −Ki)
sao vetores reais. Mais precisamente sao
M1 = Re(Ki) e M2 = − Im(Ki).
Nestes termos podemos construir as duas solucoes reais
Yi = M1eαt cosβt+M2e
αt senβt
Yi+1 = M2eαt cosβt−M1e
αt senβt
associadas aos autovalores complexos conjugados mi e mi+1.
Vamos agora a obtencao da solucao particular Yp, do sistema nao homogeneo. Uma
vez obtida a solucao geral do sistema homogeneo
Yc = C1Y1 + C2Y2 + · · ·+ CnYn,
construımos a matriz Φ(t), cujas colunas sao exatamente as matrizes colunas Yi. Esta matriz e
chamada de matriz fundamental de solucoes do sistema homogeneo. Como os vetores solucao
Yi sao linearmente independentes entre si, entao det(Φ(t)) 6= 0 e portanto Φ(t) e invertıvel.
Note que a solucao geral do sistema homogeneo pode ser colocada na forma
Yc(t) = Φ(t)C,
107
onde C e a matriz coluna (de constantes)
C =
C1
C2
...
Cn
.
O metodo da variacao dos parametros pode ser usado e pressupoe que possamos
determinar uma matriz coluna
U(t) =
u1(t)
u2(t)...
un(t)
,de forma que
Yp(t) = Φ(t)U(t)
seja a solucao particular procurada. Nestes termos, substituindo na forma matricial do sis-
tema,
(Φ(t)U(t))′ = AΦ(t)U(t) + F (t)
Φ′(t)U(t) + Φ(t)U ′(t) = AΦ(t)U(t) + F (t)
(Φ′(t)−AΦ(t)) + Φ(t)U ′(t) = F (t).
Mas como Φ(t) e a solucao do sistema homogeneo, entao o termo entre parentesis
no primeiro membro e nulo, o que nos leva a
U ′(t) = Φ−1(t)F (t)
e portanto U(t) e dado pela formula integral,
U(t) =
∫Φ−1(t)F (t)dt.
Entendemos esta integral como sendo a integral em cada um dos elementos funcoes
da matriz coluna Φ−1(t)F (t). Obtemos entao
Yp(t) = Φ(t)
∫Φ−1(t)F (t)dt,
e a solucao do sistema de primeira ordem pode ser dada por
Y (t) = Yc(t) + Yp(t) = Φ(t)C + Φ(t)
∫Φ−1(t)F (t)dt.
Observe a semelhanca desta solucao com a solucao geral de uma equacao diferencial de
primeira ordem, dada por (2.6).
108
O metodo dos coeficientes indeterminados tambem pode ser aplicado, com os mesmos
cuidados exigidos no caso de uma unica equacao diferencial. Se os termos que compoem F (t)
forem previsıveis (funcoes exponenciais, trigonometricas, polinomiais) podemos dar um chute
Yp(t) = A1f1(t) +A2f2(t) + · · ·+Anfn(t)
onde fi sao os chutes baseados nas parcelas de F (t), e Ai os coeficientes que devem ser calcula-
dos para que este chute seja efetivamente uma solucao particular do sistema nao homogeneo.
Exemplo 45: A solucao particular do sistema do exemplo 42,{u′ + 3v = et
u+ v′ − 2v = t
equivalente ao sistema (na forma matricial)[u′
v′
]=
[0 −3
−1 2
][u
v
]+
[et
t
],
pode ser obtida tomando-se o chute,
Yp = Aet +Bt+ C
ou ainda
Yp =
[up
vp
]=
[a1
a2
]et +
[b1
b2
]t+
[c1
c2
],
pois em F (t) aparece a funcao exponencial e uma funcao polinomial de grau 1. Substituindo
entao
Yp =
[a1e
t + b1t+ c1
a2et + b2t+ c2
],
na equacao matricial (nao homogenea) Y ′p = AYp + F (t), temos[a1e
t + b1
a2et + b2
]=
[0 −3
−1 2
][a1e
t + b1t+ c1
a2et + b2t+ c2
]+
[et
t
]
=
[−3a2e
t − 3b2t− 3c2
−a1et − b1t− c1 + 2a2e
t + 2b2t+ 2c2
]+
[et
t
]
=
[−3a2e
t − 3b2t− 3c2 + et
−a1et − b1t− c1 + 2a2e
t + 2b2t+ 2c2 + t
].
Temos entao
a1 + 3a2 − 1 = 0,
3b2 = 0,
b1 + 3c2 = 0,
− a2 + a1 = 0,
109
b1 − 2b2 − 1 = 0,
b2 + c1 − 2c2 = 0.
Resolvendo estas equacoes chegamos a
b2 = 0, b1 = 1, c2 = −13 , c1 = −2
3 , a1 = 14 , a2 = 1
4 ,
e portanto
Yp =
[up
vp
]=
[1414
]et +
[1
0
]t+
[−2
3
−13
].
Compare com a solucao geral obtida no exemplo 42, que foi
Y (t) = Yc + Yp =
[C1e
−t + C2e3t
C113e−t − C2e
3t
]+
[14et + t− 2
314et − 1
3
]
�
Exemplo 46: Para determinar uma solucao particular para o sistema{x′ − 2y = et + t
y′ − y − x = −3t
ou equivalentemente o sistema[x′
y′
]=
[0 2
1 1
][x
y
]+
[et + t
−3t
],
procuramos
Yp = Aet +Bt+ C
ou melhor
Yp =
[xp
yp
]=
[a1
a2
]et +
[b1
b2
]t+
[c1
c2
],
pois em F (t) aparecem a funcao exponencial et e a funcao polinomial de grau 1. Substituindo
entao
Yp =
[xp
yp
]=
[a1e
t + b1t+ c1
a2et + b2t+ c2
]na equacao matricial nao homogenea Y ′p = AYp + F (t), temos[
a1et + b1
a2et + b2
]=
[0 2
1 1
][a1e
t + b1t+ c1
a2et + b2t+ c2
]+
[et + t
−3t
]
=
[2a2e
t + 2b2t+ 2c2
a1et + b1t+ c1 + a2e
t + b2t+ c2
]+
[et + t
−3t
]
=
[2a2e
t + 2b2t+ 2c2 + et + t
a1et + b1t+ c1 + a2e
t + b2t+ c2 − 3t
].
110
Temos entao que
a1 − 2a2 − 1 = 0,
− b2 − 1 = 0,
b1 − 2c2 = 0,
− a1 = 0,
− b1 − b2 + 3 = 0,
b2 − c1 − c2 = 0,
o que nos leva a
b2 = −1, b1 = 4, c2 = 2, c1 = −3, a1 = 0, a2 = −12 ,
e portanto
Yp =
[xp
yp
]=
[0
−12
]et +
[4
−1
]t+
[−3
2
],
o que e equivalente a
xp = 4t− 3
yp = −12et − t+ 2.
�
111
Referencias Bibliograficas
[1] Kreyzig, E. Introductory functional analysis with applications. Canada: John Wiley &
Sons, 1978.
112