Mudanças Climáticas, Vulnerabilidade e Capacidade ......foco em oportunidades de geração de...
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VI Encontro Nacional da Anppas 18 a 21 de setembro de 2012 Belém – Pará – Brasil
Mudanças Climáticas, Vulnerabilidade e Capacidade
Adaptativa em Territórios da Amazônia: o caso dos municípios de Xapuri, Brasiléia, Epitaciolândia e Rio Branco – Acre
Juliana Dalboni Rocha (Universidade de Brasília)
Pós-doutoranda em Desenvolvimento Sustentável (UnB) e Pesquisadora da Rede Clima dalboni@ unb.br; [email protected]
Diego Lindoso (Universidade de Brasília)
Doutorando em Desenvolvimento Sustentável (UnB) e Pesquisador da Rede Clima
Flávio Eiró (Universidade de Brasília) Mestre em Desenvolvimento Sustentável (UnB) e Pesquisador da Rede Clima
Nathan Debortoli (Universidade de Brasília)
Doutorando em Desenvolvimento Sustentável (UnB) e Pesquisador da Rede Clima
Joana Araújo (Universidade de Brasília) Mestre em Desenvolvimento Sustentável e Pesquisadora da Rede Clima
Izabel Ibiapina (Universidade de Brasília)
Mestre em Desenvolvimento Sustentável e Pesquisadora da Rede Clima
Marcel Bursztyn (Universidade de Brasília) Professor do Centro de Desenvolvimento Sustentável (UnB) e Pesquisador da Rede Clima
Resumo A pesquisa teve como objetivo identificar a percepção das populações locais e dos formuladores de políticas públicas quanto aos impactos das mudanças climáticas em territórios da Amazônia e suas implicações nas atividades produtivas. Com foco na análise da vulnerabilidade e capacidade adaptativa, teve como área do estudo os municípios de Rio Branco, Brasiléia, Xapuri e Epitaciolândia, no Acre. O público-alvo foram atores da agricultura familiar, escolhidos pela relevância deste segmento como provedor de segurança alimentar e mantenedor de processos ecológicos e socioculturais em espaços rurais brasileiros. Mesmo com essa importância, esse segmento apresenta sérias defasagens, consideradas aqui como vulnerabilidades socioeconômicas e, por sua dependência de recursos naturais, está mais suscetível às alterações climáticas. A pesquisa coletou dados primários e secundários referentes às vulnerabilidades econômicas, sociais, ambientais, institucionais e tecnológicas, na literatura e localmente. Entrevistas privilegiaram a percepção dos agricultores quanto aos contextos e processos produtivos, mudanças no uso da terra e recursos naturais, vulnerabilidades e formas de adaptação. Constatou-se que grande parte dos agricultores e extrativistas é prejudicada por alterações no clima. Muitos tentam se adaptar às mudanças, por meio de novas tecnologias, mudança de cultivo, deslocamento do período de plantio ou substituição do extrativismo por outras atividades. Entretanto, essas atividades, quando não acompanhadas por um conhecimento técnico adequado, se tornam vulneráveis e dispendiosas ao pequeno agricultor e extrativista. O artigo inclui análise da capacidade adaptativa do território e propõe diretrizes de políticas a serem promovidas/fortalecidas, no que tange à vulnerabilidade e ao aumento da capacidade adaptativa.
1. Introdução
Os dois relatórios mais recentes do IPCC (2001 e 2007) afirmam que a mudança climática (MC) é
um fato inequívoco e se deve principalmente à ação do homem. Na Amazônia, as crescentes
pressões ambientais de origem antrópica, originadas do desmatamento – para pecuária,
agricultura de larga escala e coleta madeireira – e incêndios florestais, afetam a estabilidade
climática, ecológica e ambiental da floresta (NOBRE et al, 2007).
Na ótica social, os impactos das MC tendem a elevar os custos da produção e a causar prejuízos
nas atividades econômicas, principalmente na pequena produção rural. Frente às vulnerabilidades
e ameaças provocadas pelas MC, tem-se a necessidade de alternativas de desenvolvimento, com
foco em oportunidades de geração de renda e melhoria da qualidade vida, mediante identificação
da exposição aos riscos, da sensibilidade de cada sistema e da sua capacidade de adaptação.
Neste contexto, a pesquisa aqui apresentada realizou-se num esforço de medir a vulnerabilidade
da agricultura familiar às mudanças climáticas por meio da coleta de dados na literatura e
localmente, junto aos diversos atores sociais (instituições governamentais e privadas, ONG e
agricultores familiares), em municípios do Acre. Foram coletados dados primários e secundários
referentes às vulnerabilidades econômicas, sociais, ambientais, institucionais e tecnológicas,
presentes na área do estudo – municípios de Rio Branco, Brasiléia, Xapuri e Epitaciolândia.
A área selecionada para o estudo compreende a porção sudeste do estado do Acre, no trecho que
se estende entre os municípios de Rio Branco (capital do estado) e Brasiléia (fronteira com a
Bolívia) a 234 km da capital. Incluindo os municípios de Xapuri (a 175 km da capital) e
Epitaciolândia (a 230 km da capital), todos localizados na mesorregião do Vale do Acre (Mapa 1).
Mapa 1. Municípios do estudo de caso no estado do Acre. Elaborado por V. Nédelec.
Essa área é uma das mais povoadas do estado e, consequentemente, mais densa em atividades
produtivas, das quais destacam-se: agricultura tradicional; pecuária de corte; e o extrativismo
vegetal. Tal região teve, nos últimos anos, um aumento expressivo na quantidade de
assentamentos agrários e implantação de polos agroflorestais estaduais.
A seleção da área deu-se também pela facilidade de acesso (BR-317, integralmente asfaltada), o
que a diferencia de grande parte do estado (norte, centro e oeste), que permanece isolado
durante vários meses do ano (chuvas), dado o difícil acesso – BR-364 ainda não totalmente
pavimentada.
2. Metodologia
2.1 Coleta de dados
A pesquisa, predominantemente qualitativa, é baseada em estudos de caso em localidades em
que as populações percebem eventos climáticos extremos nos últimos anos (i.e seca,
inundações). Os eventos ainda não autorizam a ciência [com o atual nível de conhecimento] a
dizer que esses fatos foram fruto de mudanças climáticas globais, mas é um indicador de que há
alterações climáticas na região.
A pesquisa é exploratória, pois pretende levantar dados sobre um determinado fenômeno
utilizando a escala local para este fim. Foram utilizados: i) indicadores gerais (socioeconômicos e
ambientais) e específicos em escala municipal e estadual1; e ii) entrevistas semiestruturadas e
estruturadas aplicadas (em formato de questionário) a atores chaves (produtores locais; gestores
públicos; representantes de organizações locais, municipais, estaduais e federais), que
objetivaram capturar a percepção quanto às alterações climáticas,, identificar as vulnerabilidades
dos sistemas socioecológicos e as estratégias de adaptação.
Na abordagem mista, as características qualitativas e quantitativas se complementam,
possibilitando quantificar a realidade pesquisada, contextualizando esses dados com observações
mais amplas. Para a avaliação de vulnerabilidades e capacidade adaptativa (CA) foi adotado o
modelo de pesquisa não experimental: estudo sem a manipulação deliberada de variáveis no qual
observa-se os fenômenos em seu ambiente natural para depois analisá-los (SAMPIERI et al,
2006).
2.2 Público alvo e Seleção da Amostra
O conceito de agricultura familiar no Brasil vem sendo debatido e modificado ao longo das últimas
décadas e sua delimitação compreende aspectos históricos, culturais, sociais e ambientais de
relação com o trabalho e com a terra. Em anos recentes, modos de vida tradicionais de relação
com o meio natural, de trato com a terra, de subsistência, aprendizado individual, familiar e
comunal estão contemplados e incorporados no conceito de agricultura familiar. Exemplo desta
formalização está na Lei 11.326 de 24 de junho de 2006 2, que estabeleceu as diretrizes para a
Política de Agricultura Familiar e Empreendimentos Familiares Rurais no Brasil. Por este se tratar 1 Dados sobre os municípios foram adquiridos por meio dos web sites públicos do IPEA DATA, IBGE Cidades e SIDRA. Outros dados também foram adquiridos diretamente nos órgãos estaduais em Rio Branco, como Secretaria de Extensão Agroflorestal e Produção Familiar – SEAPROF. 2 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-2006/2006/Lei/L11326.htm
de um trabalho de análise e proposição de políticas públicas utilizou-se a definição trazida pelo
Art. 3º da referida lei 3.
A população ou universo da pesquisa são os produtores enquadrados na categoria agricultura
familiar na região amazônica, tendo como unidade de análise o estabelecimento familiar. Nos
municípios foram indicadas as comunidades de melhor acesso evitando fatores de aglomeração
que poderiam comprometer o estudo, como concentração geográfica, grupos de conhecidos e
atividades produtivas semelhantes.
Apesar da amostra não probabilística fazer uma seleção informal dos entrevistados, o cuidado
com fatores de invalidação permite fazer inferências sobre o universo estudado através dos dados
coletados. Especialmente no enfoque qualitativo, “as amostras não probabilísticas são de grande
valor, pois conseguem ao proceder cuidadosamente e com uma profunda imersão inicial no
campo – obter os casos (pessoas, contextos, situações) que interessam ao pesquisador e que
oferecem uma grande riqueza para a coleta e análise de dados” (SAMPIERI et al., 2006, p. 271).
Para a coleta de dados primários, foi construído um questionário baseado em trabalhos prévios de
pesquisadores participantes da pesquisa e na literatura especializada. O questionário, composto
de 75 questões, possuiu sete partes: dados gerais; atividade produtiva; aspectos econômicos;
aspectos sociais; aspectos político institucionais; aspectos ambientais; e aspectos climáticos.
Após a realização do campo, as respostas dos questionários foram transpostas em uma base de
dados no software SPSS (Statistical Package for the Social Sciences) – que permitiu o
cruzamento das informações.
A pesquisa de campo realizou-se nos municípios de Rio Banco, Epitaciolândia, Brasiléia e Xapuri,
com atores sociais chaves da agricultura familiar e de instituições governamentais e não
governamentais. Foram visitadas 29 comunidades (dentre colocações de seringal, glebas e
colônias, em projetos de assentamentos, polos agroflorestais e RESEX) e realizadas 149
entrevistas, com produtores rurais e extrativistas, assim como representantes de grupos
produtivos e de instituições governamentais e não governamentais.
2.3 Diagnóstico institucional e políticas públicas
No diagnóstico institucional foram levantadas instituições e políticas públicas com ações
relacionadas ao uso e à ocupação do solo, que favorecem ou não a capacidade de adaptação dos
pequenos produtores rurais às eventuais alterações climáticas. 3Considera-se agricultor familiar e empreendedor familiar rural aquele que pratica atividades no meio rural, atendendo, simultaneamente, aos seguintes requisitos: I – não detenha, a qualquer título, área maior do que 4 (quatro) módulos fiscais; II – utilize predominantemente mão de obra da própria família nas atividades econômicas do seu estabelecimento ou empreendimento; III - tenha percentual mínimo da renda familiar originada de atividades econômicas do seu estabelecimento ou empreendimento, na forma definida pelo Poder Executivo; ; IV – dirija seu estabelecimento ou empreendimento com sua família. São também beneficiários desta Lei: I – silvicultores que cultivem florestas nativas ou exóticas e que promovam o manejo sustentável daqueles ambientes; II – aquicultores que explorem reservatórios hídricos com superfície total de até 2ha (dois hectares) ou ocupem até 500m³ (quinhentos metros cúbicos) de água, quando a exploração se efetivar em tanques-rede; III – extrativistas que exerçam essa atividade artesanalmente no meio rural, excluídos os garimpeiros e faiscadores; IV – pescadores que exerçam a atividade pesqueira artesanalmente.
O quadro institucional do território de estudo inclui instituições governamentais federais, estaduais
e municipais, assim como organizações não governamentais. A visita em campo privilegiou
entrevistas com atores públicos e representantes de setores produtivos e grupos sociais, como
associações comunitárias, organizações não governamentais e associações de classes.
Os eixos orientadores das entrevistas foram: políticas existentes no território; capilaridade da
instituição; disponibilidade de recursos para execução; cooperação interinstitucional; limitações;
principais resultados alcançados; durabilidade (tempo de existência); continuidade das ações;
participação social nas políticas; e percepção sobre as mudanças climáticas.
3 Vulnerabilidade dos sistemas agroprodutivos 3.1 Características socioeconômicas
A Tabela 1 apresenta indicadores nas áreas social, econômica e demográfica dos municípios
estudados, em comparação com Acre e Brasil. Tais dados revelam, dentre outras características,
a baixa densidade demográfica e uma considerável concentração de população na área rural nos
municípios estudados (exceto na capital, Rio Branco).
Tabela 01. Indicadores comparativos nas áreas social, econômica e demográfica. Brasil, Acre, Brasiléia, Epitaciolândia, Rio Branco e Xapuri. Anos variáveis. Fonte/Ano Variável Brasil Acre Brasiléia Epitaciolândia Rio
Branco Xapuri
Censo 2010
População total 185.712.713 707.125 21.011 14.822 319.825 14.367
Censo 2010
Densidade demográfica
21,8 4,6 4,9 8,9 34,7 2,7
Pnad 2007 % pop. urbana 83,37% 77,49% 64% 69% 93% 51% Pnad 2007 % pop. rural 16,63% 22,51% 36% 31% 7% 48%
PNUD 2000
IDH 0,766 0,64 0,67 0,68 0,75 0,67
PNUD 2000
IDH municipal (educação)
0,849 0,76 0,73 0,76 0,86 0,72
PNUD 2000
IDH municipal (longevidade)
0,727 0,69 0,69 0,70 0,70 0,71
PNUD 2000
IDH municipal (renda)
0,723 0,70 0,59 0,59 0,70 0,58
2007 PIB per capita 8.161 8.208 10.464 7.717 Fontes: IBGE 2010; PNAD, 2007; PNUD, 2000. Elaboração própria
Quanto ao IDH, no ano de 2000, o Acre estava abaixo da média do país, sendo o subíndice de
educação, o mais comprometido, em análise comparativa Acre-Brasil. A renda per capita do Acre,
por sua vez, em 2000 (PNUD), foi de R$180,70 reais, enquanto a intensidade da indigência e da
pobreza4 alcançaram taxas pouco acima de 50%. Tal quadro muda no ano de 2003 (IBGE, 2012),
com menor incidência de pobreza (42%) no estado. Nessa análise, ressalta-se a importância de
programas de transferência de renda, nos últimos anos. O número de famílias beneficiadas pelo
Programa Bolsa Família atingiu, no Acre, 55.037 famílias em 2008 (IPEA DATA, 2012).
4 Sendo a pobreza medida segundo a proporção de pessoas com renda domiciliar per capita inferior à metade do salário mínimo vigente em agosto de 2000 (R$ 75,50).
Na análise de dados de infraestrutura, destaca-se a falta de pavimentação na área rural. Durante
a estação chuvosa grande parte do território fica inacessível (vias não pavimentadas, alagadas ou
mal conservadas). Isso determina a vulnerabilidade da população em termos de mobilidade e
desenvolvimento social e econômico – acesso à saúde e educação; escoamento da produção;
viabilidade de assistência técnica; entre outros. De acordo com o IBGE (2000), 29% das vias
rurais do Acre não são pavimentadas, chegando a 45,43% em Xapuri e 44,39% em Epitaciolândia.
3.2 Características Produtivas
O Censo agropecuário de 2006 (IBGE, 2006) demonstra que em 10 anos (entre 1996 e 2006) o
número de estabelecimentos agropecuários no estado aumentou em 24%. Esse crescimento foi
acompanhado por algumas características a serem destacadas, como o percentual das pessoas
ocupadas na atividade produtiva (assalariadas ou familiares), o tipo de produção, os cultivos etc.
Em relação ao pessoal ocupado com a atividade produtiva, verificou-se um aumento em 9% do
pessoal com laços de parentesco e uma queda de 20% de empregados contratados. Tais dados
indicam um fortalecimento da agricultura familiar. Na criação bovina, a taxa de crescimento
aproximada do número de estabelecimentos foi de 42%. Entretanto, o rebanho aumentou em mais
de 100%, evidenciando a maior concentração de cabeças por produtor. Quanto à área das
propriedades rurais (IBGE, 2006), o Brasil mantém taxa de 85% dos estabelecimentos rurais com
menos de 100 hectares. No Acre, tal taxa cai para 66%, seguindo a tendência de maior
concentração de terras na região amazônica.
A Tabela 2 apresenta a distribuição da produção agrícola e sua relação com a agricultura familiar,
no estado e municípios estudados. Um importante indicador da situação da agricultura familiar no
Acre é a produção de mandioca e feijão e o extrativismo de floresta nativa. Tais atividades não
demandam mecanização e correspondem à agricultura de subsistência (mandioca e feijão) e ao
extrativismo (borracha, açaí e castanha do Brasil).
Tabela 2 - Porcentagem (%) de estabelecimentos agropecuários por atividade desenvolvida (2006).
Mandioca Feijão5 Extrativismo florestal Brasil 16,1 33,3 2,4 Acre 37,2 17,8 5,0 Brasiléia 18,6 22,7 5,9 Epitaciolândia 14,0 25,1 7,9 Rio Branco 30,5 14,4 4,3 Xapuri 41,9 43,7 18,9
Fonte: IBGE, Censo Agropecuário (2006) O número de estabelecimentos rurais que produzem mandioca no Acre é proporcionalmente muito
superior ao do Brasil, e o inverso ocorre com o feijão. Isso se dá pela importância da mandioca na
alimentação das famílias amazônicas. Da mesma forma, o extrativismo em florestas nativas é
5 Valor agregado de feijão preto em grão, feijão de cor em grão, feijão verde e feijão fradinho em grão.
proporcionalmente duas vezes maior no Acre que no resto do Brasil, especialmente nos
municípios de Epitaciolândia e Xapuri, onde situa-se parte da Reserva Extrativista Chico Mendes.
Em entrevista com a Secretaria de Extensão Agroflorestal e Produção Familiar (SEAPROF) de Rio
Branco foram levantadas questões quanto à gestão dos serviços e à ineficiência das políticas
públicas, seja pela sobreposição de órgãos com funções semelhantes, seja pela falta de recursos
para contratação de um maior número de técnicos. A distância até as localidades a serem
atendidas é uma dificuldade, bem como o difícil acesso a algumas comunidades – nos casos dos
acessos por vias não pavimentadas, apenas veículos com tração chegam ao destino. Ademais, os
baixos salários colaboram para o êxodo de funcionários para outras instituições/atividades.
Em oposição às dificuldades locais e regionais, o projeto de mecanização agrícola da SEAPROF,
tem dado resultados positivos, apesar da quantidade de técnicos e maquinário ainda insuficiente
para o atendimento integral dos agricultores. Algumas parcerias com órgãos federais foram
estabelecidas – MAPA (Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento) e MDA (Ministério do
Desenvolvimento Agrário) – no entanto, tal esforço ainda é insuficiente.
Outro fator de dificuldade refere-se ao uso do fogo e preparo do solo. Após graves incidentes de
queimadas, o governo estadual proibiu, desde o ano de 2005, a utilização do fogo para o preparo
da terra antes do plantio. Sem a permissão para queimar, os agricultores carecem de maquinário
para efetuar o preparo mecanizado do solo e ficaram ainda mais dependentes dos técnicos das
instituições governamentais. Sem assistência, os agricultores são inviabilizados de continuar com
suas lavouras temporárias.
3.2.1 Pluriatividade
O perfil da agricultura familiar no Brasil sofreu grandes alterações nas últimas décadas. A
dependência de rendas externas ao estabelecimento rural é característica inerente à agricultura
familiar moderna. Por muito tempo a pluriatividade foi vista como sinal de fraqueza econômica, de
incapacidade de especialização, mas hoje é considerada uma virtude do agricultor (ABRAMOVAY,
1994). A dificuldade em criar sistemas agrícolas rentáveis foi relatada na pesquisa de campo no
Acre, com parte da renda sendo suplementada por outras atividades. Dentre os entrevistados,
8,5% têm ao menos uma pessoa da família que presta serviço na cidade. A estratégia de troca e
venda de diárias de trabalho dentro da própria comunidade também foi encontrada nas
comunidades visitadas, somando 17,1% dos entrevistados.
Enquanto a pluriatividade diz respeito à mão de obra empregada em atividades fora da
propriedade rural, outra característica da agricultura familiar observada na pesquisa é a
diversidade das atividades desenvolvidas dentro da propriedade rural. Lins de Góis (2002)
trabalha com uma definição de ‘multifuncionalidade’ que explica a diversificação de atividades
visando, dentre outros fatores, a segurança alimentar, a preservação do meio ambiente, o
desenvolvimento econômico e social e a preservação da cultura6. Com o possível crescimento de
perturbações climáticas, esse debate é reforçado e a multifuncionalidade e a pluriatividade podem
ser vistas como redutoras de vulnerabilidade.
3.2.2 Pecuária
É sabido que a pecuária é uma das principais atividades produtivas da região amazônica.
Contudo, durante o período da seca, com a redução da disponibilidade de alimento (capim), os
animais perdem peso e a produção de leite diminui. Segundo os produtores entrevistados,
enquanto no período de chuvas é possível obter 8-10 litros de leite/vaca/dia, na seca esse valor
cai para 2-4 litros/vaca/dia, comprometendo a renda familiar. Aqueles que dependem da renda
gerada pelo leite (16,2% dos entrevistados) precisam prover alimentação alternativa para o gado,
comprada ou feita pelo próprio agricultor, além da construção de açudes7 para retenção de água
no período de seca. Entretanto, estas opções exigem capital financeiro e/ou tecnológico de que
poucos dispõem. Além desses, existem entrevistados que possuem produção de leite somente
para subsistência da família.
O alto índice de produtores que criam gado de corte8 (36,7% dos entrevistados) é justificado pela
facilidade de venda dos animais e de um retorno financeiro imediato. Pequenos produtores
costumam trabalhar com o sistema de cria e venda, mantendo as fêmeas para aumentar o
rebanho e vendendo os machos. Apesar de tal sistema não ser muito vulnerável às variações
climáticas, já que não são vendidos por peso, é pouco rentável em pequenas áreas de criação9.
3.2.3 Avicultura
Atualmente, o estado do Acre promove alternativas à produção pecuária e de culturas temporárias
e permanentes. Nos municípios de Xapuri, Epitaciolândia e Brasiléia polos de produção avícola
foram incorporados ao sistema de agrohortifrutigranjeiros como alternativa à economia de
subsistência típica da região. De acordo com os entrevistados em dois polos de produção avícola
– um em Xapuri (Assentamento Polo Agroflorestal, na Estrada da Borracha Xapuri II) e outro em
Brasiléia (Nari Bela Flor) – o auxílio é garantido por meio da empresa estadual (ACREAVES)
fornecedora de financiamento inicial para a construção de aviários e prestação de assistência
6 Além de sua função de produção de fibras e alimentos, a atividade agrícola pode também moldar a paisagem, prover benefícios ambientais tais como conservação dos solos, gestão sustentável dos recursos naturais renováveis e preservação da biodiversidade e contribuir para a viabilidade socioeconômica em várias áreas rurais (...) A agricultura é multifuncional quando tem uma ou várias funções adicionadas ao seu papel primário de produção de fibras e alimentos (MOREIRA, citado por LINS DE GÓIS, 2002, p. 36). 7 Para efeitos de padronização do entendimento de termos neste trabalho, consideramos açudes àquelas escavações feitas no solo para armazenamento da água da chuva, ao passo que chamamos de represa o barramento de córregos e rios para armazenamento da água, alterando o perfil do corpo d'água de ambiente lótico para lêntico. 8 Com raras exceções, trata-se de gado da raça Nelore, chamado também de “gado branco”. Esta é a raça predominante na pecuária de corte do Brasil, principalmente devido à sua adaptação ao clima tropical e resistência. 9 Uma vaca adulta gera uma cria por ano e como a densidade deste tipo de pecuária extensiva gira em torno de 2 hectares de pasto por cabeça, dificilmente um agricultor familiar terá condições de incrementar suas condições de vida ou gerar excedentes para o investimento em outra atividade apenas com esta criação.
técnica no que tange a saúde do aviário, já a comercialização é controlada por um frigorífico
particular (AGROAVES) que efetua a compra direta das aves no momento do abate.
Apesar do pioneirismo do projeto uma série de entraves foram relatados pelos pequenos
agricultores familiares, como: i) assistência técnica fornecida apenas no momento da contratação
do financiamento; ii) proibição de outras criações (a saúde das aves pode ser facilmente
prejudicada por doenças geradas por outras espécies, como porcos, patos); iii) falta d’água; iv)
estradas de péssima qualidade, que dificultam o escoamento e a comercialização da produção; v)
perda significativa de animais durante o período de seca (verão), tendo em vista a sensibilidade
das criações ao aumento de temperatura; vi) problemas de infraestrutura, como as quedas
constantes no abastecimento de energia elétrica local; vii) a inexistência de um mercado de venda
exógeno ao monopólio instituído pelo frigorífico comprador.
De acordo os produtores há grande dificuldade em adaptar a atividade ao clima da região,
principalmente devido às altas temperaturas. Seriam necessários investimentos no melhoramento
das instalações para controle da temperatura. Entretanto, o baixo poder aquisitivo dos produtores
aliado a outros fatores impeditivos como a péssima qualidade das estradas, agrava a
possibilidade de expansão da atividade na região. Algumas alternativas têm sido aplicadas por
alguns produtores no sentido de amenizar o excesso de calor nos aviários como: o alargamento
dos telhados com palhas ou o plantio de árvores para sombreamento. Ressalta-se que tais
iniciativas não são acompanhadas por técnicos e podem gerar problemas de contaminação por
influenza dado a presença de aves silvestres nas árvores utilizadas para o sombreamento.
3.2.4 Extrativismo
O extrativismo no Acre baseia-se em dois produtos principais: a castanha do Brasil, proveniente
da castanheira e o látex, proveniente da seringueira. O fator comum a ambos é a dependência de
um ecossistema equilibrado para manutenção desta produção. Assim, fatores climáticos
compõem a sensibilidade de ambas as espécies e podem impactar a produção. Neste sentido,
pensar estratégias e políticas de manutenção do extrativismo, considerando as sensibilidades ao
clima e os desafios econômicos e de mercado, é essencial no estado do Acre.
Bertholletia excelsa (castanheira)
A castanha é coletada exclusivamente em floresta natural. Como planta social, a castanheira
depende da presença de outros exemplares da sua espécie para sua reprodução, daí sua
incidência concentrada em castanhais (PERES, 2003; SALOMÃO, 2009). O extrativismo da
castanha se apresenta como uma importante atividade no Acre, cuja contribuição para a produção
nacional é significativa. Em 2007, o Estado foi responsável por aproximadamente 37% do total de
castanhas extraídas no país (IBGE, SIDRA).
A safra da castanha no Acre corresponde ao período chuvoso, entre os meses de janeiro e abril. É
uma espécie sensível ao calor e ao déficit hídrico. Deste modo, alterações no regime de chuvas
da região podem impactar a produtividade. Nas entrevistas em campo, foi apontada perda de
produtividade no começo da safra (janeiro/2010) devido ao atraso no início do período de chuvas.
A produção média apontada pelas comunidades para um coletor seria de 200 latas por safra,
sendo a lata o equivalente a 10 kg da castanha retirada do ouriço, ainda em casca.
O preço da castanha é um fator importante para manutenção da viabilidade econômica da
atividade. No ano de 2010, o preço da lata de castanha variou entre R$8,00 e R$15,00.
Entretanto, quando a comercialização se dava diretamente entre o produtor e o comprador, o
preço era muito mais baixo, tendo casos de venda por até R$3,00/lata. Essa informação é
corroborada pela literatura, que aponta para o preço de comercialização no Estado do Acre, até
1998 de R$1,90 a R$ 2,50/lata e em 2006, para o valor de R$ 15,00/lata (MARTINS et al., 2008).
A associação dos extrativistas para a venda da castanha pode ser considerada uma estratégia de
diminuição da vulnerabilidade das comunidades, ao garantir maior margem de negociação com os
compradores – com um volume maior, conseguem manter um patamar mínimo do preço pago
pelo produto. O aumento na produção a partir do ano de 2004 deve ser compreendido à luz da
valorização do produto, que se deve, dentre outras causas, à certificação da castanha na região
do Alto Acre (COSTA et al. 2006).
Uma estratégia para diminuição da vulnerabilidade da atividade é agregar valor ao produto, seja
por meio de certificação, ou um controle de qualidade simples. Isto pode ser feito por meio da
triagem e controle de qualidade das sementes recolhidas – tanto na coleta, quanto no
armazenamento. Foi relatado que quando os integrantes da Associação Porongaba adotaram
esses cuidados, conseguiram o valor de até R$ 20,00 por lata de castanha.
Em suma, alguns cuidados devem ser considerados tanto no âmbito da vulnerabilidade da
castanheira, como espécie, como em relação ao sistema produtivo derivado da extração de sua
semente. Variações climáticas podem interferir na produtividade da castanha, mas algumas
medidas adaptativas podem amenizar tais impactos – como o reflorestamento e plantio de
castanhais e o cuidado com espécies dispersoras. Outro ponto central é a existência de uma
cadeia produtiva fortalecida a fim de valorizar o produto e garantir a continuidade da atividade.
Parte deste fortalecimento já vem sendo feito, por exemplo, com usinas de beneficiamento da
castanha (Rio Branco, Brasiléia e Xapuri) e venda centralizada por cooperativas de produtores.
Hevea brasiliensis (seringueira)
A maior utilidade econômica da seringueira é o látex extraído de seu tronco, que é transformado
em borracha. A dispersão natural da seringueira está circunscrita aos limites da região amazônica
brasileira, porém a árvore se adapta bem aos mais variados ambientes. Para extrair o látex, o
seringueiro abre estradas de seringas: um caminho na floresta para acessar as árvores. Uma
estrada possui, em média, 100 ha, o que corresponde a 100 a 150 seringueiras, que representam
a demanda diária de um seringueiro no processo de sangria (CASTELO, 1999).
Na seringueira, o início da produção de látex ocorre aos 6 ou 7 anos. Para a produção, o regime
pluviométrico anual favorável varia entre 1.300 a 3.000 mm, com chuvas distribuídas
uniformemente durante o ano10. Segundo Ortolani (1998), as variações da produção sazonal da
seringueira estão relacionadas com condições térmicas e hídricas. Valores térmicos mais
elevados, especialmente superiores a 32ºC, reduzem significantemente a umidade relativa do ar,
alterando desfavoravelmente a produção de látex e a eficiência fotossintética da seringueira.
Dessa forma, a atividade de extração do látex é vulnerável ao clima, uma vez que a elevação de
temperatura e a desregulação do regime de chuvas afetam a sua produtividade.
Segundo os entrevistados na pesquisa de campo de 2010, o período de extração do látex (corte
da seringueira) na Reserva Chico Mendes ocorre de abril a novembro (período seco). Nos
seringais visitados, o preço da borracha seca era de R$ 3,50/kg. Os seringueiros do Acre recebem
um subsídio de R$ 0,70 por kg de borracha comercializada11.
O Acre é um dos estados que mais produz borracha (látex coagulado) no Brasil. No entanto, nos
últimos anos houve uma redução da produção. A súbita queda da produção em 2005
possivelmente está associada à grande seca na Amazônia no referido ano (MARENGO et al.,
2008).
4. Percepção dos agricultores familiares e extrativistas
De acordo as entrevistas realizadas nos três municípios acreanos (Epitaciolândia, Xapuri e Rio
Branco)12 verifica-se que a maior parte dos entrevistados percebeu uma redução no período das
chuvas, bem como um atraso no início do período chuvoso e imprevisibilidade sobre o período
das chuvas. Dentre o total dos entrevistados, 45% percebeu uma redução do período chuvoso.
Quanto à quantidade de chuvas, mais de 80% dos entrevistados percebeu redução. Tal
percepção foi mais sentida no município de Xapuri e, em segundo lugar, em Rio Branco. Quanto
às perdas e prejuízos relacionados ao clima, cerca de 80% dos entrevistados já sofreram, de
alguma forma, prejuízos, em especial de lavouras e de animais. De forma geral mais de 75% dos
entrevistados na região reclamaram perdas na lavoura devido ao clima.
Cerca de 60% dos agricultores entrevistados perceberam um aumento nas tempestades em
relação aos últimos anos no Acre. Quanto à alteração nos ventos, mais de 60% perceberam uma
alteração significativa. De acordo com as entrevistas, os ventos estão mais fortes provavelmente
10 Fonte: <http://www.ipef.br/identificacao/hevea.brasiliensis.asp>. 11 O programa de subsídios à borracha natural do Governo do Estado do Acre, determinado pela Lei Estadual nº 1.277, de 13 de janeiro de 1999, posteriormente alterado pela lei nº 1.427 de 27 de dezembro de 2001, estabelece que os produtores da borracha recebam um subsídio pelos serviços ambientais prestados (SILVA e TEIXEIRA, 2004). 12 Nessas análises, as entrevistas realizadas no município de Brasiléia foram desconsideradas, pois foram pouco representativas em quantidade, quando comparadas ao número de entrevistas realizadas nos outros municípios. Como o município de Brasiléia faz divisa com o de Epitaciolândia, as realidades são muito semelhantes.
devido a áreas desmatadas. De acordo com os relatos e as entrevistas, grande parte dos
produtores e extrativistas são de alguma forma prejudicados por mudanças no clima, seja por
eventos meteorológicos esporádicos destrutivos, como ventos e tempestades de curta duração,
ou modificações na periodicidade das precipitações e a elevação das temperaturas.
Mudanças na fenologia de espécies economicamente lucrativas para o extrativismo, como a
Castanha do Brasil e a Seringueira, também afetam a produção local. Em relação à percepção
dos entrevistados, a agricultura familiar e o extrativismo no Acre sofrem principalmente com
redução nas chuvas, o atraso do período de plantio (devido ao deslocamento da época chuvosa),
as altas temperaturas, tempestades e ventos fortes.
Tais mudanças geram perdas nas lavouras, benfeitorias e animais. O acesso à água quando
interrompido ou limitado compromete a produção da pequena agricultura familiar, que tem a maior
parte de suas atividades dependentes dela. Uma vez comprometido esse fornecimento, as
probabilidades são de que o indivíduo subsista de auxílios, seguros e financiamentos que
possibilitem o contínuo desenvolvimento das atividades ou o cessar dos trabalhos, até que o
fornecimento de água se reestabeleça.
5. Capacidade Adaptativa da Agricultura Familiar no Acre
Neste trabalho, a capacidade adaptativa (CA) de uma região ou comunidade se traduz na sua
habilidade em se adaptar aos impactos das mudanças climáticas. É importante observar que a
adaptação não é unicamente um problema ambiental, é também a capacidade de resposta política
às mudanças. As políticas de adaptação devem atuar em várias áreas, tais como: agricultura,
saúde, proteção costeira, energia, finanças, indústria, comércio, recursos hídricos, entre outras. É
necessário o planejamento estratégico de ações de adaptação aos efeitos adversos das
mudanças do clima, seja por medidas preventivas ou emergenciais de reparação de danos
(MAROUN, 2007).
Segundo Maroun (2007), falar em adaptação às mudanças climáticas é retornar à questão de
combate à pobreza. Aumentar a CA de um sistema socioecológico seria uma maneira de reduzir
vulnerabilidades e promover o desenvolvimento sustentável. O maior desafio, então, é a criação
de políticas que resultem em práticas de desenvolvimento que ofereçam os recursos para superar
tanto a pobreza quanto a vulnerabilidade climática. Aspectos referentes à capacidade de
aprendizado e conhecimento acumulado, fluxos de informação, organização comunitária,
legislação, entre outros, aumentam a resiliência dos sistemas, reduzindo os riscos de mudanças
catastróficas (OLSSON et al, 2004). Assim, a governança adaptativa fortalece a resiliência de
sistemas socioecológicos (DIETZ et al, 2003).
Como visto na pesquisa no Acre, muitos agricultores e extrativistas tentam se adaptar às
mudanças no clima e na flora local. Essas adaptações podem ocorrer por meio da introdução de
novas tecnologias, mudança das culturas, deslocamento do período de plantio ou mesmo o
rompimento da cultura do extrativismo para outras atividades, como a agricultura e a pecuária.
Entretanto, essas atividades, quando não acompanhadas por um conhecimento técnico
adequado, também se tornam altamente vulneráveis e dispendiosas para o pequeno agricultor e
extrativista, que dispõem de poucos recursos e tem parte de sua subsistência atrelada a
programas de financiamento e repasse de benefícios por parte do governo federal.
5.1 Faixa etária e Escolaridade
A pirâmide etária é um importante indicador da(CA)de uma população. Durante a pesquisa de
campo, observou-se que os idosos eram mais resistentes à possibilidade de mudança. Isto está
associado à consolidação cultural de práticas agrícolas tradicionais. Já os jovens e os adultos
apresentaram maior abertura e disposição à aceitação de novas práticas. Tais constatações são
baseadas nas impressões dos pesquisadores e não possui análise estatística13.
A escolaridade é um importante componente de CA, pois influencia tanto na habilidade em
responder a eventos extremos, quanto na possibilidade de se prevenir. Nesta perspectiva, os
entrevistados em Xapuri se encontram mais vulneráveis, uma vez que 29% dos agricultores são
sabem de ler e escrever. Esse dado é de 25% em Epitaciolândia e 15% em Rio Branco. No outro
extremo, encontra-se Rio Branco, no qual 32% dos entrevistados possui pelo menos ensino
fundamental completo. Ressalta-se que a maior parte dos entrevistados possui nível fundamental
incompleto: 50% em Epitaciolândia, 44% em Xapuri e 41% em Rio Branco.
5.2 Associativismo
A existência de associações é um requisito importante para a mobilização da população em ações
adaptativas, tanto preventivas quanto reativas. Os entrevistados em Epitaciolândia apresentaram
melhor grau de associativismo: 91% dos agricultores familiares participam de associações,
sindicatos e/ou cooperativas. Os outros dois municípios visitados também apresentaram uma
elevada participação em grupos associativos, 84% em Rio Branco e 80% em Xapuri.
O capital social parece facilitar o acesso a linhas de créditos para investimentos coletivos no
beneficiamento da produção. Ao comparar o percentual de associados e não associados com
acesso a financiamentos e/ou linhas de crédito, vemos que os que participam de associações,
sindicatos e/ou cooperativas tiveram mais acesso a empréstimos (68%).
5.3 Fontes de renda que não da atividade produtiva
Tendo em vista que a totalidade ou parte da renda das famílias estudadas é proveniente de
atividades dependentes das condições climáticas, a alternativa de outras fontes de rendas menos
sensíveis às variações climáticas significa um importante fator de adaptação a ser considerado. A
13 Considerando o conjunto de agricultores entrevistados e suas famílias, observa-se que o percentual de idosos é relativamente baixo para a amostra. Os idosos estavam presentes em apenas 2% das famílias visitadas em Epitaciolândia, 3% em Xapuri e 6% em Rio Branco. Convém destacar que a maioria das pessoas que compunham as famílias visitadas eram jovens e adultos.
rentabilidade de atividades produtivas costuma ser sazonal ou pontual. No extrativismo, por
exemplo, a exploração da castanha e do látex acontece de forma alternada e não constante ao
longo de todo o ano. A mesma sazonalidade e intermitência acontecem para atividades agrícolas
ou para a criação de gado, que não geram renda regular ao longo de todo o ano.
Desse modo, as rendas alternativas (não provenientes de tais atividades produtivas) detêm um
importante papel no orçamento familiar, por sua regularidade e menor sensibilidade às condições
climáticas. As rendas alternativas consideradas foram os serviços prestados (no campo ou na
cidade) ou as provenientes do Estado, com programas de transferência de renda (Bolsa Família)
ou de seguridade social (aposentadorias). Esse indicador fornece um retrato sobre as condições
de vida da população e a capacidade de resposta e acesso a recursos, frente a um evento
climático que desestabilize a atividade produtiva.
Na amostra em questão (111 entrevistados), 76% afirmou receber renda adicional à atividade
produtiva, sendo Xapuri o município em que essa marca é mais significativa (83%). Dentre as
fontes de renda externas, a categoria de renda Aposentadoria/Pensão e a categoria Bolsa
Família/outro benefício foram as mais recorrentes. Em Xapuri, dos entrevistados que dispõem de
renda fora da atividade produtiva, 62% recebem Bolsa Família ou outro benefício do governo. Em
Rio Branco, o perfil é outro: prevalece a renda por meio de pensões ou aposentadorias (63% dos
entrevistados), frente aos 38% que recebem Bolsa Família ou outro benefício.
Outro ponto é o peso da renda externa no orçamento familiar frente ao gerado em atividade
produtiva. A fonte de renda externa foi apontada como fonte de renda principal por 47%
entrevistados que dispõem de renda externa e que responderam à pergunta referente a sua
importância no orçamento familiar. O peso da renda externa é um bom indicador da importância
da atividade produtiva nos orçamentos familiares. A depender das dificuldades enfrentadas pelos
produtores, a fonte de renda principal pode girar em torno de programas de assistência ou
prestação de serviço em outras localidades, o que de certa maneira diminui a autonomia dos
produtores em relação a seu orçamento. O fato da fonte de renda principal não ser mais a
atividade produtiva, pode ser um indicador da necessidade de mudanças no sistema produtivo a
fim de que ele se torne suficientemente lucrativo para garantir a autonomia dos produtores na
geração de sua renda.
Convém observar que programas governamentais suavizam as dificuldades em curto prazo. Caso
não sejam acompanhados de investimentos em infraestrutura e medidas de inclusão, sobretudo
em educação e geração de renda, acabam por assumir o caráter assistencialista emergencial,
necessário, sem dúvida, mas insuficiente no aumento da CA da população.
5.4 Assistência técnica
A disponibilidade de assistência técnica é essencial na busca por alternativas aos modelos
vigentes não satisfatoriamente adaptados a distúrbios climáticos. Tal adaptação pode ser
preventiva e desempenha um papel fundamental ao propor adequação do modelo produtivo a
formatos menos sensíveis às exposições climáticas específicas da região.
A dificuldade de produzir com o regime de chuvas variando foi uma constante reclamação dos
produtores e 73% dos entrevistados afirmam ter tido prejuízos decorrentes de causas climáticas.
A adaptação nos sistemas produtivos envolve iniciativas como: diversificação na produção;
adequação de manejo e práticas de preparo e uso do solo; acesso a técnicas e instrumentais,
como irrigação, incorporação de novas formas de plantio, tipo de cultivo mais apropriado à
realidade ecológica local; entre outras. Essas iniciativas e orientações podem fazem parte de um
arcabouço de alternativas a serem apresentadas aos produtores por meio da assistência técnica.
Dentre as principais dificuldades dos entrevistados para produzir na região, tem-se a ausência de
assistência técnica ou problemas afins, como terras degradadas e falta de maquinários. Os
elementos mais citados são: a falta de maquinário (29%), a falta de estradas (27%), as terras
fracas ou degradadas (21%) e a falta de assistência técnica (16%). Uma reclamação recorrente
dos produtores no campo foi o fato de não poderem dar continuidade ao plantio, a partir da
derrubada e queima de novas áreas. Contudo, a impossibilidade de abertura de novos roçados
em área de floresta requer maquinário e insumos para recuperação das áreas já derrubadas.
Desse modo, a necessidade de adotar novas práticas de manejo explica a recorrente menção da
falta de maquinário, como dificuldade levantada pelos produtores da região.
A manutenção do serviço de assistência técnica no Acre é um desafio. Além da carência de
recursos humanos e financeiros, existe a dificuldade logística: parte do território fica inacessível
durante o período chuvoso, o que interrompe a continuidade do processo de orientação.
6. Análise Institucional e das Políticas Públicas
O cenário da capacidade adaptativa e das vulnerabilidades na região de estudo aponta para a
necessidade de se reconhecer que já existem políticas públicas aptas a aumentar a CA e reduzir
vulnerabilidades de agricultores familiares. Porém, muitas dessas chegam via estruturas
institucionalmente fragilizadas, e com pouca força política e técnica para execução. A prioridade
do tema mudanças climáticas é crescente nas agendas estadual e local. Segundo depoimentos, o
tema entrou fortemente na pauta após o ano de 2005, quando o Acre testemunha um evento
climático de seca extrema, no qual cerca de 250 mil hectares de floresta sofreram queimadas
(MARENGO et al. 2008).
Importante enfatizar que uma política pública que trate especificamente de adaptações às
mudanças climáticas precisa incorporar políticas sociais, econômicas e ambientais. A adequação
a fatores climáticos em transformação requer uma integração das ações intersetoriais que sejam
capazes de projetar e coordenar respostas nos diferentes níveis de governo e, ao mesmo tempo,
acompanhar a multiplicidade de acontecimentos peculiares dispersos entre as escalas global e
local. A temática também exige a incorporação de visão e planejamento de longo prazo.
Políticas tipo guarda-chuva, que abarcam outras políticas e ações, como o PPCDAM – Prevenção
e Controle do Desmatamento na Amazônia, o PAS – Plano Amazônia Sustentável, e o próprio
Plano Clima, possuem enorme potencial integrador e disseminador de outras políticas importantes
para o alcance de resultados esperados (fortalecer a CA e reduzir as vulnerabilidades). Porém,
tais políticas, por serem abrangentes, dispersam e fragmentam ações. O desafio está em
encontrar um ponto de equilíbrio entre a abrangência e a especificidade necessária para atender
determinado contexto ou situação na Amazônia brasileira. As próprias regras para criação de
assentamentos pelo INCRA não foram desenhadas e nem contemplam as distintas realidades
produtivas de áreas de várzea e terra firme na Amazônia. Desta forma, o gestor local se depara
com grandes desafios de adequação e alcance de resultados.
As ações do PAC (pavimentação de rodovias, construção de pontes, Luz para Todos) trouxeram a
percepção de que as políticas públicas estão “voltando” a acontecer na região. A pavimentação da
BR-364, no trecho Rio Branco-Cruzeiro do Sul, ao tempo em que solucionará um problema de
décadas – o isolamento dos municípios do “coração” do acre – traz o risco da conhecida
problemática da abertura e/ou pavimentação de estradas na Amazônia: o desmatamento e a
ocupação nas margens da rodovia (numa média de 100 km em cada margem) (PERZ et al.,
2008). Este fenômeno já foi visto na mesma BR-364, em Rondônia: a abertura da rodovia
promoveu a ocupação do estado (junto à destruição das florestas), praticamente apenas ao longo
da mesma.
Segundo as entrevistas institucionais, a estratégia do governo do estado, de iniciar a
pavimentação deste trecho da rodovia por Cruzeiro do Sul ao invés de Rio Branco, é uma
alternativa ao retardamento da ocupação ao longo da pavimentação da estrada, enquanto se
planejava e criava ações alternativas e restritivas ao fenômeno.
6.1 Ações e políticas públicas voltadas à redução das vulnerabilidades
O estado do Acre pode ser considerado exemplo no desenvolvimento e na implantação de
políticas públicas, em especial, na área ambiental, com ações que visam a proteção do meio
ambiente aliada à geração de renda. Dentre elas, destacam-se quatro políticas/ações: i) a
implantação dos Pólos Agroflorestais (instalados próximo à zona urbana, em local já desflorestado
e degradado, com ações nas áreas de moradia, geração de renda e recuperação ambiental); ii)
Programa de Valorização do Ativo Ambiental Florestal (cada propriedade é acompanhada pela
SEAPROF por nove anos, a partir de um plano elaborado em conjunto com o agricultor. Visa
beneficiar os membros da família com políticas públicas, no sentido de “fechar” a cadeia produtiva
dos produtos produzidos pela família); iii) Programa de Certificação da Propriedade Rural
Sustentável (Selo emitido pela SEAPROF); iv) Plano de Prevenção e Controle do Desmatamento
– PPCD (inclui o monitoramento climático pela “Comissão Estadual de Gestão de Riscos”, que
elabora boletins eletrônicos diários sobre focos de calor, num alerta precoce a eventos extremos).
Na área produtiva, em especial de comercialização da produção, destacam-se outras três ações:
i) O funcionamento do Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), promovido pela CONAB/MDA,
e gerido localmente pela SEAPROF, nos pólos agroflorestais. Tal programa permite a compra
antecipada da produção pelo governo federal e também garante o escoamento da produção; ii)
Apoio às cooperativas de extrativistas. Destaca-se o apoio do governo estadual à CAEX14
(Cooperativa Agroextrativista de Xapuri), com maior incentivo a partir de 2008. Atualmente tem-se
agregação de valor em R$ 7,00 por lata de castanha do Brasil (quase 40%). Além disso, o valor
de compra da castanha pela cooperativa está acima do mercado, em cerca de 10 a 20%. Hoje,
60% da produção do estado é beneficiada, contra apenas 2%, no ano de 1999; e iii) Instalação da
fábrica de preservativo masculino NATEX em Xapuri. Com isso teve-se a garantia de mercado
para a produção de diversos extrativistas. A COOPERACRE é quem fornece a matéria-prima para
a NATEX e também capacita os extrativistas. Atualmente, o governo estadual subsidia parte do
valor pago por quilo da borracha nativa extraída15.
Também merece ser destacado o papel de algumas instituições, como: i) a EMBRAPA, pela
realização de pesquisas na área produtiva, com destaque para as culturas de mandioca, grãos e
seringa; ii) o SEBRAE, que desenvolve projetos conjuntos com as prefeituras, em especial o de
hortaliças e de castanha do Brasil. Destaque também para ações do SENAR e a UFAC.
Outra iniciativa relevante foi a instalação do CONDIAC (Consórcio de Desenvolvimento
Intermunicipal do Alto Acre), constituído pelos prefeitos dos municípios que integram a
mesorregião do Alto Acre – que inclui Brasiléia, Epitaciolândia e Xapuri. O CONDIAC é
considerado um avanço no acesso e na gestão das políticas públicas para a região. No plano das
políticas locais, os municípios de Xapuri e Rio Branco se destacam. Em Xapuri, são diversas
ações implantadas pelas secretarias de meio ambiente e de agricultura, entre as quais se ressalta
a recuperação de áreas degradadas com o plantio de seringueira, financiado pelo Pronaf Floresta,
e o Programa de Certificação da Propriedade sustentável. Em 2010, 300 famílias foram
beneficiadas com ações de recuperação de áreas degradadas, como a implantação de SAFs, a
recuperação de nascentes, o plantio de frutíferas e a introdução de leguminosas para recuperação
do solo e alimentação.
Em Rio Branco, o destaque é a implantação dos Pólos Agroflorestais. Tal política teve início no
ano de 1993, como uma ação municipal, na intenção de assentar a população rural que migrava
para a cidade em grandes áreas, já degradadas, no entorno da capital. Assim haveria facilidade
de acesso aos serviços urbanos, garantia de moradia e geração de renda, bem como recuperação
ambiental das áreas degradadas. Em 1999, foi incorporada como uma política estadual.
14 Criada por Chico Mendes em 1988. Considerada uma conquista e instrumento de viabilidade da RESEX Chico Mendes. Atualmente são 241 cooperados em Xapuri, com produção de 62.000 latas/ano. A castanha é processada e beneficiada (descascada e embalada a vácuo). Comercialização no mercado nacional. 15 1 kg da borracha = R$ 3,40 + R$ 1,40, de pagamento por serviços ambientais pelo governo = R$ 4,80.
6.2 Proposições de Diretrizes Estratégicas para Políticas Públicas
Frente ao que foi exposto sobre as principais vulnerabilidades e estratégias adaptativas
encontradas na região, e visando objetivar a proposição de diretrizes, foram elencados três eixos
principais de políticas a serem mais intensificadas no estado: i) Acesso à informação e às novas
técnicas de produção; ii) Apoio e promoção da produção rural sustentável; e iii) Minimização das
alterações climáticas – ações na área ambiental. Ressalta-se que tais proposições são apenas
diretrizes para a redução da vulnerabilidade da agricultura familiar na região, indicando as
políticas públicas que precisam ser fortalecidas.
Áreas nas quais políticas públicas deveriam ser priorizadas para a redução da vulnerabilidade e a
elevação da capacidade adaptativa são: i) incentivo à pesquisa na área da adaptação; ii)
assistência técnica aos agricultores familiares e extrativistas; iii) fortalecimento de associações e
cooperativas; iv) alfabetização de agricultores; v) acesso à energia elétrica (propriedades rurais);
vi) diversificação de culturas produtivas; vii) ampliação do crédito agrícola; viii) apoio à
comercialização dos produtos da agricultura familiar; ix) escoamento da produção rural; x)
manutenção dos ramais (estradas vicinais); xi) redução, prevenção e monitoramento das
queimadas e do desmatamento; xii) recuperação de áreas degradadas e das nascentes; xiii)
ordenamento territorial; e xiv) monitoramento da vulnerabilidade.
7. Considerações Finais
A agricultura familiar no Acre é caracterizada pela pluralidade de métodos de cultivo e diversidade
de culturas temporárias e permanentes. Dispõe de métodos primitivos, sendo a queima, corte e
estoca o mais comum. Verificou-se in loco que a agricultura familiar do Acre é dificultada por
diversos fatores, como: a instabilidade nos preços, as dificuldades no escoamento da produção, a
escassez hídrica, a ausência de mecanização e o alto valor dos insumos.
Nos últimos anos, os municípios pesquisados foram contemplados com projetos de
assentamentos Agrohortifrutigranjeiros (destaque aos Pólos Agroflorestais), nos quais a situação
de desenvolvimento da agricultura familiar encontra-se em diferentes estágios. A falta de
assistência técnica, o difícil acesso a novas tecnologias, a ausência de financiamentos,
prorrogaram a autonomia dessas localidades, no que tange à produção de alimentos.
Grande parte dos produtores e extrativistas entrevistados são afetados por alterações no clima
(eventos meteorológicos esporádicos destrutivos – ventos e tempestades – ou modificações na
periodicidade das precipitações e aumento das temperaturas). Sofrem com redução nas chuvas,
atraso do período de plantio (deslocamento da época chuvosa) e baixa no nível dos rios.
Adicionando-se as dificuldades de infraestrutura, aos baixos níveis de escolaridade, a falta de
assistência técnica e tecnologias. Mudanças na fenologia de espécies economicamente lucrativas
para o extrativismo, como a Castanha do Brasil e a Seringueira, também têm afetado a produção.
Muitos agricultores e extrativistas no Acre tentam se adaptar às mudanças de ordem física e
biológica, por meio do uso de novas tecnologias, mudança de cultivo, deslocamento do período de
plantio ou mesmo o rompimento da cultura do extrativismo para outras atividades, como
agricultura e pecuária. Entretanto, essas atividades, quando não acompanhadas por um
conhecimento técnico adequado, também se tornam altamente vulneráveis e dispendiosas para o
pequeno agricultor e extrativista, que dispõem de poucos recursos e tem parte de sua
subsistência atrelada a programas de financiamento e benefícios do governo federal.
O maior desafio para as iniciativas de adaptação é a criação de políticas que resultem em práticas
de desenvolvimento que ofereçam os recursos necessários para superar tanto a pobreza quanto a
vulnerabilidade climática. A estabilidade e a eficiência das instituições são fundamentais. Aspectos
referentes à capacidade de aprendizado e conhecimento acumulado, fluxos de informação,
organização comunitária, legislação, entre outros, aumentam a resiliência dos sistemas
socioecológicos, reduzindo os riscos de mudanças catastróficas.
A construção de capacidade adaptativa, por meio da melhoria das condições socioeconômicas e
fortalecimento das instituições formais e informais, são estratégias chave na redução das
vulnerabilidades locais. O Brasil já conta com um arcabouço político-institucional pronto para ser
usado na adaptação da agricultura familiar às mudanças climáticas. O desafio é compreendê-lo de
forma transversal e multidimensional, articulando em torno do eixo da adaptação às mudanças
climáticas instituições e instrumentos políticos, que hoje se encontram ancorados em esferas
governamentais distintas. É preciso que a temática seja incluída efetivamente na pauta das
discussões e de prioridades dos governos, em suas distintas escalas de gestão.
Outro desafio é a formação e fortalecimento de redes de pesquisa e inovação. Novas práticas e
adequação das práticas existentes podem moderar riscos e danos climáticos. A existência de
fundos de financiamento também é chave. O Fundo Clima é um bom exemplo, uma vez que
poderá representar importante fonte de recursos à adaptação da agricultura familiar na Amazônia.
Contudo, a disponibilidade de recursos, a existência de boas condições socioeconômicas e um
contexto político-institucional favorável não são suficientes para reduzir a vulnerabilidade da
agricultura familiar. Características individuais e coletivas são essenciais, tais como: atitudes
proativas e planejadas na escala do estabelecimento; capital social no âmbito da comunidade;
canais de comunicação de qualidade, por meio dos quais a informação chegue ao agricultor
familiar.
Agradecimentos Ao pesquisador Vincent Nédelec pela contribuição na coleta e tratamento dos dados em campo, bem como pela confecção dos mapas utilizados. Aos demais integrantes da Rede Clima, grupo de pesquisa no qual o projeto foi conjuntamente concebido, amplamente discutido e colocado em prática.
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