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UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES CURSO DE PÓS - GRADUAÇÃO EM DOCÊNCIA DO ENSINO SUPERIOR MONOGRAFIA TEMA: CIDANDANIA, EDUCAÇÃO E ESCOLA ORIENTADOR: Professor/Mestre Marco Larosa Metodologia da Pesquisa AUTORA: GLEIDES CONCEIÇÃO BARBOSA Rio de Janeiro, 2001

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UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES

CURSO DE PÓS - GRADUAÇÃO

EM

DOCÊNCIA DO ENSINO SUPERIOR

MONOGRAFIA

TEMA: CIDANDANIA, EDUCAÇÃO E ESCOLA

ORIENTADOR: Professor/Mestre Marco Larosa

Metodologia da Pesquisa

AUTORA: GLEIDES CONCEIÇÃO BARBOSA

Rio de Janeiro, 2001

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I

DEDICATÓRIA

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II

• A minha MÃE que me colocou no

mundo, ensinou-me os primeiros passos, as

primeiras palavras, as primeiras orações,

para hoje ser quem sou.

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III

AGRADECIMENTOS

AMIGO, você foi presença na minha solidão, respeitou

profundamente a minha maneira única de ser. A sua companhia, o

seu sorriso, as suas palavras e mesmo a sua ausência foram

expressão de amor profundo.

Um muito obrigado por todas aquelas vezes que você me

ouviu e me deu apoio.

As alegrias de hoje também são suas, pois o seu amor,

estímulo e carinho foram as armas desta vitória.

AOS MESTRES, minha homenagem aqueles que

repartiram comigo os seus conhecimentos, colocando

em minhas mãos as ferramentas com as quais abrirei

novos horizontes, rumo à satisfação plena de meus

ideais profissionais e humanos.

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IV

A DEUS.

Eu ser privilegiada pela inteligência e apaixonada

pela vida, acredito na força realizadora da produtividade.

A você que me deu a vida e condição para chegar ao

fim...

Por vezes senti-me, só, vazia, desesperada e

descrente. E na descrença ofendi, e na ofensa tropecei, e no

tropeço caí. Na queda senti-me fraca.

Fraca procurei socorro. No socorro encontrei amigos.

Nos amigos encontrei ensinamentos e carinho. No carinho vi

nascer o amor. Com o amor vi um mundo novo e, no mundo

novo, resolvi viver. O que recebi, resolvi doar. Doando alguma

coisa, muito recebi. E, em receber, senti-me feliz. E, ao ser feliz,

encontrei a paz.

E tendo a paz, foi que enxerguei que, dentro de mim,

é que TU estavas...

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V SUMÁRIO Capítulo: Página 01. RESUMO...................................................................................01 02. METODOLOGIA.......................................................................05 03. INTRODUÇÃO.........................................................................07 04.CAPÍTULO I – Breve Revisão Histórica do Conceito de Cidadania........................................................................................................09 05. CAPÍTULO II- Cidadania Real e a Cidadania Declarada, no Brasil de Hoje.................................................................................................................19 06. CAPÍTULO III - Uma Análise das Relações entre o Papel da Escola e da Educação e o Exercício da Cidadania........................................................28 07. CAPÍTULO IV – Implicações de uma Nova Consciência em torno do ideal de cidadania............................................................................................38 08. CONCLUSÃO..........................................................................................42 09. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS......................................46 10. SÍNTESE...................................................................................48 11. ANEXOS...................................................................................50

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01

RESUMO

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02

Aos futuros “cidadãos”, proprietários e empresários de uma ordem

econômica global, cabe indagar sobre os limites de produtividade e de consumo relativos a

seus produtos, caso se mantenham os atuais níveis de escolarização da mão-de-obra. Cabe

indagar, ainda, sobre os limites das reservas de recursos naturais e de alimentos bem com

as influências que terão sobre o significado da cidadania. A cidadania não é um

patrimônio menos importante que o mundo ecológico.

Perguntamos, então , mais uma vez qual a relação entre cidadania e

educação ?

“...há e muita, no sentido de que a luta pela cidadania, pelo

legítimo, pelos direitos, é o espaço pedagógico onde se dá o verdadeiro

processo de formação e constituição do cidadão. A educação não é uma

precondição da democracia e da participação, mas é parte, fruto e expressão

do processo de sua constituição” ( Arroyo, in Buffa, 1996, pág. 79).

Apesar de não ser o único espaço possível destinado à educação, é

inquestionável a importância da escola na contribuição à luta pela cidadania. O Terceiro

Milênio não pode restringir o encurtamento de distâncias e a derrubada dos muros apenas

aos efeitos da informatização e da globalização. Devem ser encurtadas, também, as

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distâncias sociais, através de uma distribuição mais justa da riqueza, da propriedade, do

saber, dos direitos de todo cidadão.

Essas preocupações não podem continuar sendo encaradas exclusivamente

como deveres de um Estado que as resolve, se e quando as considerar convenientes. Ao

contrário, precisam transformar-se transformar-se em inquietação de toda a sociedade, em

demandas coletivas, onde todas as classes sociais compreendem os sérios riscos ao

equilíbrio social e econômico que representam. Assim conclui Ester Buffa:

“O Brasil é um país capitalista, com uma indústria competitiva

inclusive internacionalmente. Só que a realização do capitalismo, aqui, não se

dá nos mesmos termos em que ocorre na Europa. Aqui a realização do capital –

que afinal é o sujeito do capitalismo – se faz às custas da marginalização da

maioria dos brasileiros. Então fica a questão: como conseguir que, no limiar do

século XXI, os brasileiros se transformem em cidadãos ?” (Buffa, 1996, pág.

29).

Seja qual for o percurso escolhido para ampliar-se o acesso à educação e à

escolarização, ele deve passar necessariamente também pelos profissionais que nele atuam.

O processo de proletariação do magistério tem contribuído para a extinção da classe em

grande escala no Brasil, comprometendo os anseios por “qualidade”. O contraponto deste

lado é a precariedade da formação dada àqueles que ainda se dispõem aos cursos de

Licenciatura, em geral fracos em conteúdo e metodologias e, o que é pior, alienados da

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função social do educador. Como assinala Ricardo Bittencourt, “...a desvalorização do

magistério mata qualquer desejo ou vontade política”.

A distribuição da cidadania deve passar também pela classe dos

professores., Melhor ainda: deverá começar por esta heróica e sofrida classe. Como

cidadãos de primeira classe – assim é que cumpriria tratá-los.

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METODOLOGIA

Para se chegar ao resultado final deste processo de pesquisa, fez-se

necessário.

* Pesquisa Bibliográfica:

. Fonte de consulta na Biblioteca Nacional;

. Fonte de consulta na INTERNET;

. Fonte de consulta Jornais ( O Globo e o Brasil ).

* Pesquisa de Campo:

. Visita ao Colégio Estadual Barão de Mauá;

. Visita ao Instituto de Educação Roberto Silveira;

. Visita ao CEDUC ( Centro Educacional de Duque de Caxias ).

* Apoio Técnico:

. Professores:

Ana Lucia Pimentel – Diretora da Escola Estadual Barão de Mauá

Eliane Rocha – Didáticas ( Instituto de Educação Roberto Silveira)

Maria de Fátima Cabral – Metodologia do Ensino (CEDUC)

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. Contabilista:

Clevison Olívia Rodrigues ( Professor do SENAC )

. Economista:

Carlos Hamilton Barbosa ( Funcionárioda EMOND )

* Entrevistas:

Junto aos moradores de Xerám, município de Duque de Caxias, João

Firmino dos Santos e Rose Mary da Silva.

Junto aos moradores de Duque de Caxias, Solange Félix da Silveira e

Renata de Souza Cândido.

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07 INTRODUÇÃO

Levando em conta nossa condição profissional, decidi-me por um tema que

tem tudo a ver, quer com a realidade jurídica, quer com a realidade educacional brasileira.

O objetivo desta monografia é procurar mostrar as relações entre cidadania e

educação. O primeiro passo foi realizar um retrospecto histórico. Todos entendem como

berço da cidadania a antiga Grécia, apesar de várias contradições que aqui serão

mencionadas. A abordagem histórica passará, em seguida, pelo mundo romano e pelo

cristianismo até à Idade Média. Com o advento da burguesia e a consolidação das

diferentes nações modernas o conceito de cidadania vai se firmando como um direito

universal. Direitos humanos fundamentais passam a fazer parte das constituições dos

Estados.

Como são observados os direitos declarados ? São fielmente observadas por

governo e sociedade. Esta visão de uma cidadania real é analisada principalmente em

relação ao Brasil. Após breve retrospecto histórico, faz-se um apanhado da Constituição

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brasileira sobre o significado de cidadania. Igualmente a nova Lei de Diretrizes e Bases da

Educação Nacional é visitada.

Finalmente, se procura mostrar o estado atual da questão face à educação

brasileira. Vivemos numa cidadania autêntica ? Como a escola pública brasileira se

comporta a respeito ? As conclusões já, por antecipação, se prevêem. Sem dúvida, há

muito a fazer da parte das escolas e dos educadores. Sem uma conscientização da parte de

autoridades, professores e famílias, o ideal de cidadania corre o risco de ser mais um

daqueles valores que tanto proclamamos e pouco vivenciamos.

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CAPÍTULO I – BREVE REVISÃO HISTÓRICA DO

CONCEITO DE CIDADANIA

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Apenas com o surgimento da vida pública nasce a idéia de cidadania. Seus

primórdios remonta à Grécia Antiga. Foi quando se passou de uma organização sócio-

política, essencialmente estruturada em torno das grandes famílias, para a ampliação do

espaço político-jurídico, incorporado pelas cidades. Inicialmente só o pater-famílias era

cidadão de pleno direito a transição do caráter privado para o público da vida comum,

trouxe novas e necessárias questões e regras que redefiniram a sociedade.

1.1 - Na antigüidade ocidental

Cidadão, como conceito, é produto do universo da “polis” grega. Definia

quem é da cidade e, portanto, participante da vida pública. Embora a idéia de ‘demo-

cracia” brotasse do mesmo contexto, nem todos os indivíduos eram considerados cidadãos.

O fato de a Grecia manter a escravidão, discriminar as mulheres e os estrangeiros,

convivendo com a democracia, revela desde sua origem, os limites ao próprio conceito de

cidadania.

Ao longo de diversos períodos históricos, esse conceito e sua expressão

estiverem ligados ao de aristocracia, fosse ela formada por guerreiros ou por grandes

proprietários de terra.

A concessão da cidadania acompanhou sempre a produção e a concentração

da riqueza restringindo, de um modo geral, a participação política às elites. Entre os

atenienses havia a noção de identidade que tinha a ver com a idéia de cidadania. Eram

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considerados semelhantes os que tivessem elementos comuns com a língua, os cultos, os

antepassados. Subjetivamente representava o que, mais tarde, classificou-se como nacional

(de nação). Estrangeiros não eram cidadãos nas Cidades – Estados da Grecia e também não

eram os que viviam à margem do sistema de propriedade e de produção.

“Assiste-se, enfim, a um conflito entre as duas tradições

culturais, a dos aristocratas guerreiros e a do povo de produtores. A esse

conflito se entrelaçará um outro que, com base social semelhante, dará

origem à polêmica entre a excelência por nascimento e a excelência adquirida,

entre virtudes inatas e virtudes aprendidas, entre natureza e educação. Neste

conflito aparecerá o desprezo dos espíritos conservadores por qualquer

ascensão das classes populares através da aprendizagem. Píndaro zombará dos

mathóntes, isto é, aqueles que “sabem somente aquilo que aprenderam”(Nemea

III: 42; Olímpica, II: 94-96), porque não têm virtudes inatas.”(Manacorda

1989, pág. 45).

A educação na Antigüidade visava justamente ao preparo da aristocracia

guerreira, mantendo caráter eminentemente conservador, militar e aristocrático.

A rigidez utilizada na identificação do futuro cidadão chegava, em Esparta, a

admitir a eugenia. Segundo o historiador MARROU (1975) citando PLUTARCO, só os

belos, os bem formados e robustos eram aceitos. As crianças “...raquíticas e

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desinformes eram condenadas a ser lançadas no montouro, nos Apétetas”

(Marrou, 1975, pág. 41).

Em Atenas a educação continuará sendo, mesmo no período clássico, um

fator de aristocracia, orientada para a vida rica e ociosa do nobre, grande proprietário,

ainda que mais livresca e escolar. Na civilização helenística a Cidade-Estado, compara à

municipalidade atual, regulamentava a educação dos cidadãos, mantida pela coletividade.

Em todos esses períodos as mulheres foram excluídas da cidadania e, quase totalmente do

acesso à educação.

1.1.1- Entre os romanos

Em Roma mantém-se as restrições e são dificultados os meios para sua

obtenção. Entretanto, o caráter mais cosmopolita da sociedade romana imprimiu algumas

diferenças. O ensino da cultura grega, a partir dos séculos III e II a.C., atingia também as

mulheres da aristocracia romana. Elas freqüentavam as escolas primárias juntamente com

os homens, podendo ingressar, ainda, nas escolas secundárias destinadas à elite. Alguns

escravos de senhores ricos eram educados em escolas domésticas – “o paedagogium”- ,

que os orientavam para as necessidades do serviço e às boas maneiras. Uns poucos

acabavam “letrados”, servindo como secretários ou leitores a seus proprietários.

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O processo de romanização estendeu a cidadania a povos vencidos. A cultura

e a língua romana chegaram até aos “países bárbaros” e as escolas se disseminaram pela

Europa. Contudo, manteve-se o caráter aristocrático na medida em que permaneceram os

privilégios das classes dominantes. As primeiras escolas românticas foram uma espécie de

consideração às crianças das grandes famílias, clientela recrutada na elite social urbana,

excluídas as classes populares e os pertencentes ao meio rural.

1.1.2- A chegada do cristianismo

O Cristianismo não chega a alterar este quadro pois, em suas origens, a

educação cristã apesar de considerada douta, tem cunho iniciático, apenas agregando-se

aos modelos escolares já existentes. As escolas cristãs do tipo medieval são basicamente

monásticas e orientadoras da vida clerical prestigiando, mais ainda, o alcance da

cidadania. A Idade Média trouxe o declínio da vida urbana antes dominante e a

conseqüente ruralização expressa pelos feudos. Decresce por desuso, o conceito de

cidadania.

O conceito em si altera-se, já que a própria organização política se

fragmenta, convivendo com o poder existente de fato. No período feudal, a idéia de

Império Cristão, dividia-se entre um poder temporal (Rei) e um espiritual (Papa) . A

condição servil da maior parte da população reserva à Igreja Católica e aos nobres

proprietários a categoria do que entendemos por “cidadãos”’, isto é, os participantes da

vida política.

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Hoje a cultura e a educação, refugiam-se nos mosteiros, transformando o clero

no depositário da produção e conservação do saber. Deste modo, as escolas medievais,

eminentemente religiosas, mantinham-se como elemento de prestígio da classe dominante.

A princípio, os filhos dos nobres que ainda se ligavam à sobrevivência romana do

aprendizado das letras, eram aceitos nessas escolas de onde saiam servidores leigos dos

reis, príncipes ou suseranos.

Claro está que a servidão não exigia alto nível técnico do trabalho, o que

colaborou para que as chamadas populares se mantivessem completamente afastadas do

processo educativo.

1.2- Cidadania quando da revolução burguesa – Revolução Industrial

A transição do feudalismo para o capitalismo, se consolida no século XVIII

com duas Revoluções. A Industrial deflagrada na Inglaterra e a política na França.

Alteravam-se profundamente as formações sociais européias, o que se estendem à

América, domínio colonial da Europa. A ordem burguesa retoma os valores humanistas,

públicos e urbanos, redimensionando o conceito de cidadania. Os Estados Nacionais,

unificados no início da Época Moderna, opõem a nacionalidade – cultural, linguística,

geográfica, política – à fragmentação medieval. No entanto, a participação política

continuou restrita à nobreza e ao clero, expressão da representatividade social.

A implantação de uma sociedade compatível com os ideais culmina com o

Ilusionismo e com as Revoluções Liberais. Os critérios de organização sócio-política,

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ainda que se mantivessem vinculados à propriedade, trocam o caráter de rendas feudais

pelas rendas do capital em sua forma mais ampla. Governos representativos e

constitucionais , sob o lema da igualdade perante à Lei, incorporam a nova cidadania

acabando, em tese, com as camadas privilegiadas do Antigo Regime. Sonhou-se com a

eliminação da elite.

Na verdade, contudo, o limite à cidadania é imposto pelo voto censitário,

instituição amplamente usada nos últimos séculos, e que afasta as camadas populares de

decisões políticas. No Brasil o voto ao longo do Império era condicionado à fartura e à

propriedade. Nas primeiras eleições republicanas o colégio eleitoral mal passava de

4000.000 eleitores. As elites dominantes trocavam apenas de perfil. Igualdade, liberdade e

fraternidade sim, mas sem possibilitar o acesso total da massa aos cargos políticos. A

educação, apesar de quantitativamente Ter sofrido significativo crescimento pela

multiplicação de escolas, continuou reforçando as diferenças. As possibilidades que

restavam às camadas populares para obter prestígio (mas não riqueza), eram o sacerdócio,

o magistério e a burocracia governamental. Além do mais, nos grandes centros, destinados

à elite, atuavam os melhores professores, enquanto nas periferias e áreas rurais

predominava o trabalho de professores leigos, levando a grandes índices de fracasso

escolar.

Para BITTENCOURT, “diante dessa realidade, era preciso

explicar para a sociedade por que as crianças (principalmente das classes

populares) não tinham bom desempenho escolar (pág. 221) ainda que se

considerasse a educação a única via de mobilidade social. Esta contradição,

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associada a outros direitos permanentemente negados ou dificultados,

sobretudo o de propriedade, impossibilitavam a universalização da cidadania”.

1.2.1 – Uma visão da questão entre nós

No Brasil, a sociedade colonial escravista, por definição, era incompatível

com a existência de “cidadãos”. Havia, no máximo, súditos da Coroa portuguesa . A

grande massa escrava, constituída de negros africanos e descendentes, era excluída até

mesmo de sua “humanidade”, já que, para muitos, não existia alma nessas pessoas. Era a

expropriação em seu aspecto mais radical, não havendo a mais remota possibilidade de

cidadania. Os grandes proprietários rurais, que compunham a aristocracia local, foram

ampliando gradativamente seu espaço político, ligando-se às representações do governo

português na colônia. Eram, em sua maioria, tão analfabetos quanto os escravos. Só se

alterou tal quadro com a formação da sociedade mineradora, a partir do século XVIII. As

famílias enriquecidas com o ouro buscavam as Universidades européias para a formação de

seus filhos.

A educação básica, vivenciada através da catequese esteve a cargo,

principalmente, de jesuítas, como parte da Contra-Reforma católica. O ideal salvacionista

atingiu, por meio dos colégios jesuíticos, parte da camada dominante brasileira e, em outra

vertente, as representantes das populações indígenas. Esses últimos, apesar de não

pertencerem ao que se poderia aproximar da idéia de cidadão, foram aculturados como um

valor social de garantia da colonização.

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A expansão da sociedade industrial foi elemento decisivo no crescimento da

escolaridade das massas. A divisão e especialização do trabalho e a necessidade de se

manter um processo de produção disciplinado nas fábricas foram motivos fundamentais na

ampliação básica.

Aparentemente, na Lei escrita o Estado Liberal oferecia a todos a cidadania,

mas reforça, na prática as diferenças sociais. O objetivo é a reprodução do mesmo modelo

social e a garantia, no dizer de MARX, de que a sociedade conseguirá manter seus meios e

modo de produção. A uma minoria, que também concentra a renda e a propriedade,

destina-se a educação de 1º, 2º e 3º graus, ministrada em instituições preparadas para

formar o cidadão, aqui entendido como aquele que efetivamente participa da vida política.

O conhecimento científico assim transmitido, contando com professores e meios

adequados, visa a preparar a “elite dirigente”, tanto da produção econômica quanto da vida

político-administrativa.

Desgraçadamente à massa trabalhadora urbana o Estado oferece uma rede

escolar precária, limitada em sua eficiência pelas péssimas condições materiais e pelo

aviltamento salarial dos professores. Por lei estará incumbida de promover “o pleno

desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua

qualificação para o trabalho (Constituição Federal de 1988, Capítulo III,

seção I, art. 205). Mas na prática prepara-se, a massa, para a disciplina empresarial e

um estilo de consumo bastante precário.

O ingresso tardio da economia brasileira no modelo industrial moderno,

retardou, ainda mais, seus efeitos sobre a educação. Ocupando um lugar periférico na

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ordem capitalista internacional, prolongou-se no Brasil um escravismo mal disfarçado.

Nosso proletariado nascente foi composto por imigrantes. O fim da escravidão não alterou

o modelo oficial, já que não houve preocupação em se absorver o contigente de ex-

escravos no mundo do trabalho organizado e no pleno exercício dos seus direitos. Massas

rurais e urbanas foram se formando à margem da produção organizada e, portanto, da

cidadania.

Graças a uma substituição de importações a partir da Primeira

Guerra Mundial, a economia brasileira foi ampliando suas instalações

industriais e as necessidades de mão-de-obra. Paralelamente, a educação

institucionalizada vai aumentando seu alcance sem, contudo, merecer

preocupação com a qualidade. Uma reserva de mão-de-obra vasta e

precariamente formada é garantia de se manterem baixos os salários. Não se

observa com nitidez a elevação do nível social da população em função da

escolaridade. Educação e cidadania no Brasil não se correlacionam

diretamente.

(Comentário da Autora - Barbosa, Gleides)

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CAPÍTULO II – CIDADANIA REAL E A CIDADANIA

DECLARADA, NO BRASIL DE HOJE

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A República no Brasil, no que se refere à concepção de cidadania, é

marcada basicamente pela exclusão de grandes parcelas do povo. Em um primeiro

enfoque, de caráter político-jurídico, veremos que os textos constitucionais encarregaram-

se, muitas vezes, de referendar essa exclusão. Isto ficou demonstrado nas inúmeras

restrições a direitos do cidadão, desde o voto indireto até à liberdade de expressão e de

imprensa.

2.1.- Desigualdade social

Além da limitação ao exercício de direitos políticos fundamentais, a

cidadania no Brasil sofre o impacto de outras questões graves. A desigualdade é de hoje,

como foi no passado, o traço característico de nossa formação social. A riqueza e as

oportunidades, não sendo distribuídas, geram um modelo de concentração que traz a

exclusão como uma outra face. De um lado a concentração da renda, das terras, da

propriedade, de outro lado os sem-terra, sem-teto, sem-nada. O estado de miséria absoluta

a fome, que atingem cerca de 30% da população são, por si só, graves restrições à

cidadania.

As diferenças regionais, a existência de trabalho escravo na agricultura, o alto

índice de trabalho infantil, as doenças endêmicas trazidas pela miséria, a população de rua,

o desemprego, a mortalidade infantil produzida pela fome, a marginalização a que são

conduzidas crianças e adolescentes, a violência como expressão de todos esses fatores eis

alguns dos elementos que conduzem à reflexão sobre quem é cidadão no Brasil de hoje.

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2.1.2 – As minorias: mulheres negras e indígenas

Paralelamente a esses dados, que atingem vastos setores sociais, existem

outros relativos ao que convencionou chamar de “minorias”. As mulheres ainda são, em

grande parte, sobretudo as mulheres de classes populares, afastadas dos benefícios da

cidadania. A ausência de políticas de saúde e informação, de apoio à família da mulher

trabalhadora, a superposição de jornadas de trabalho profissional e doméstico, e

desigualdade de oportunidades e salários equivalentes aos do homem, a submissão forçada

a convivências violentas por causa dos filhos, o difícil acesso à escola, a prostituição

(inclusive infantil) como alternativa de sobrevivência impedem, inegalvemente, que grande

número de mulheres das camadas populares, rurais e urbanas, possam ser chamdas de

cidadãs.

A discriminação racial habitualmente mesclada, no Brasil, com a social,

revela-se como forte limite à cidadania de negros e índios. Os primeiros ainda lutam

contra o abandono em que foram deixados desde o fim da escravidão. Engrossando a

população de trabalhadores não qualificados nos campos, onde predominavam como mão-

de-obra, acabaram deslocando-se para as cidades, onde não lhes restou alternativa além da

marginalidade nos serviços e nas formas de habitação. As favelas são contundentes

exemplos.

As estatísticas mostram a desproporção entre o número de negros,

relativamente ao número de brancos, que chegam a cursar a universidades ou ocupar

cargos representativos no mercado e na política. Na rede pública de ensino, por exemplo, é

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notório o “branqueamento” dos alunos à medida em que se caminha para as séries

conclusivas, principalmente no 2º Grau.

Quanto à população indígena, após séculos de massacre e aculturação

violenta, ainda se mantém, uma política de proteção dúbia. Tornou-se difícil falar de

cidadania em relação a um contigente que, além de Ter cultura destruída, vê suas terras e

respectivas riquezas permanentemente invadidas e seus habitantes dizimados pela

violência de armas ou doenças.

Em que implica ser excluído da cidadania ?

“Cidadania pode ser definida como estatuto [...] pelo qual a pessoa

deve obediência [ao Estado] e a sociedade lhe deve proteção.”

“...estatuto baseado na regra da lei e no princípio da igualdade.”

...................................................................................................................................................

“A cidadania é, portanto, uma qualidade e um direito do

cidadão [...] e que importa em submissão à autoridade e às leis vigentes e no

livre exercício de certos direitos.”(F.G.V., 1986, pág. 177 e 178}.

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A exclusão pode ser total ou parcial. Predomina no Brasil miserávela

exclusão total. Claro está que os excluídos da cidadania estão também excluídos, em maior

ou menor grau, da educação formal. De acordo com Darcy Ribeiro (1997):

“... a gente rica sempre soube dar a melhor educação a seus filhos,

comprando-a . Aos pobres se dava a caridade educativa mais barata que

pudessem, indiferente à sua qualidade. De fato, nunca governo algum quis

dedicar ao povo aquela atenção escolar minimamente necessária para a

alfabetização generalizada” ( pág. 9).

Desta forma, educação e cidadania são, no Brasil de hoje, processos ainda

em construção e que trilharam caminhos desencontrados.

2.2 – Cidadania oficialmente declarada

2.2.1 – Na Constituição Federal

A Constituição de 1988, denominada por Ulisses Guimarães de

“Constituição Cidadã” e a Lei Darcy Ribeiro (Lei nº 9.394, de 1996), que Estabelece as

Diretrizes e Bases da Educação Nacional nos revelam como o Estado brasileiro concebe a

cidadania.

A atual Constituição Federal dedica a Seção I do Capítulo III à Educação,

destacando o preparo para o exercício da cidadania como um de seus fins. Neste caso, o

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sentido da expressão tem cunho político e moral, na medida em que a educação instrui o

indivíduo, inclusive quanto a seus direitos e deveres relativos à vida social. Por isso tal

objetivo vem associado aos de pleno desenvolvimento da pessoa e qualificação para o

trabalho, como propõe o Art. 205. Já no artigo seguinte verificam-se as primeiras

limitações práticas à aplicação da lei, considerando-se a realidade brasileira, anteriormente

analisada. Pretende a Constituição que haja igualdade de condições para o acesso e

permanência na escola (Art. 206, inciso I) e valorização dos profissionais do ensino (Art.

206, inciso V), além de garantia de padrão de qualidade (idem, inciso VII). O artigo 206,

jamais obedecido, torna inaplacável o artigo 205.

Já o artigo 208 dispõe sobre os deveres do Estado com a educação, que

deve garantir:

“I – ensino fundamental obrigatório e gratuito, assegurada,

inclusive, sua oferta gratuita para todos os que a ele não tiverem acesso na

idade própria;

II – progressiva universalização do ensino médio gratuito;

III – atendimento educacional especializado aos portadores de

deficiência preferencialmente na rede regular de ensino;

IV – atendimento em creche e pré-escola às crianças de zero a

sete anos de idade;

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V – acesso a níveis mais elevados do ensino, da pesquisa e da

criação artística, segundo a capacidade de cada um;

VI – oferta de ensino regular noturno, adequado às condições do

educando;

VII – atendimento ao educando, no ensino fundamental, através

de programas suplementares de material didático escolar, transporte,

alimentação e assistência à saúde. “ (Constituição).

O Capítulo III, Seção I da Constituição Federal discrimina ainda a

participação da União, Estados, Distrito Federal e Municípios, inclusive quanto a

arrecadação e distribuição de recursos aos respectivos sistemas de ensino. É garantida a

atuação da iniciativa privada (Art. 209) e o respeito à língua e à cultura no ensino

fundamental voltado para as comunidades indígenas (Art. 210, inciso II).

2.2.2 – Na lei magna educacional

A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional, sancionada a 20 de

dezembro de 1996, amplia alguns aspectos e confirma outros. O conceito de Educação

ganha maior alcance uma vez que é entendida como conjunto de vários processos

formativos, desenvolvidos na família, na convivência humana, no trabalho, nas

instituições de ensino e pesquisa, nos movimentos sociais e organizações da sociedade

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civil e nas manifestações culturais. Destaca ainda mais, no entanto, que a educação escolar

deverá vincular-se ao mundo do trabalho e à prática social (Art. 1º ).

O dever quanto à Educação iguala, nesta Lei, os papéis da família e do

Estado e afirma os princípios de liberdade e os ideais de solidariedade humana como

inspiradores da educação. Confirmam-se os fins da Educação previstos pela Constituição

de 1988, incluindo-se a garantia de padrão de qualidade, a valorização da experiência

extra-escolar e a vinculação entre a educação escolar, o trabalho e às práticas sociais.

Garante-se ao trabalhador, jovem e adulto, as condições de acesso e permanência na

escola (Art.4º , inciso VII). Definen-se os padrões mínimos de qualidade do ensino (idem,

inciso IX) como a variedade e quantidade mínimas, por aluno, de insumos curriculares

indispensáveis ao desenvolvimento do processo ensino-aprendizagem. O acesso ao ensino

fundamental é visto como direito público subjetivo (art. 5º) o que faculta a qualquer

cidadão o direito de acionar o Poder Público para exigí-lo.

A formação básica do cidadão é objetivo do ensino fundamental obrigatório,

mediante o desenvolvimento da capacidade de aprender (domínio da leitura, escrita e

cálculo); a compreensão do ambiente natural e social, do sistema político, da tecnologia, da

artes e valores; a aquisição de conhecimentos e habilidades e a formação de atitudes e

valores; o fortalecimento dos vínculos de família, dos laços de solidariedade humana e de

tolerância recíproca em que se assenta a vida social (Art. 32) .

O ensino médio busca reforçar tais objetivos e inclui a preparação básica

para o trabalho e a cidadania, a capacidade de adaptação a novas condições de ocupação, a

formação ética, o desenvolvimento do pensamento crítico (Art. 35). No artigo 39 define-se

a possibilidade de acesso à educação profissional para alunos egressos do ensino

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fundamental, médio e superior, sejam de jovens ou adultos. As necessidades dos

educandos especiais são amplamente protegidas pelos Arts. 58 a 60, não só quanto ao

ensino mas também na preparação para o trabalho. O Título VI assegura valorização dos

profissionais da educação desde sua formação até às condições de salário e trabalho.

Como se pode depreender da análise de nossa realidade social,

minuciosamente descrita e estampada em nossa mídia, reina total discrepância

entre as declarações da cidadania, belamente descritas em nossos textos

legais e a efetiva aplicação dos mesmos em parcela substancial da população

brasileira.

(Comentário da Autora - Barbosa, Gleides)

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CAPÍTULO III – UMA ANÁLISE DAS RELAÇÕES ENTRE

O PAPEL DA ESCOLA E DA EDUCAÇÃO E O

EXERCÍCIO DA CIDADANIA

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Os educadores, de um modo geral, superdimensionam o papel da escola,

educação como fator de desenvolvimento da cidadania. Talvez seja este um mito que a

escola ajuda a propagar e que pouco ajuda a tão relevante causa.

3.1 – A escola confere cidadania ?

A análise crítica da legislação sobre a educação, apresenta em seus pontos

mais gerais no capítulo anterior, nos remete a um fato inconteste. Trata-se da quase

impossibilidade de sua plena aplicação, nas condições atuais da realidade brasileira,

sobretudo em relação às camadas mais pobres. Esta realidade, contrariando a Lei, mostra a

decadência das políticas públicas. Revela a quem quiser a verdade dos fatos a deterioração

do ensino público. Patenteia as precárias condições de sobrevivência da população como

causa da exclusão de milhões de crianças e adolescentes da escola. O fato incontestável é

que a população vive um grave círculo vicioso, que vai da miséria à miséria. Portanto,

ainda está, a educação formal de qualidade, restrita a quem possa pagar por ela. Coloca-se

então como inevitável a discussão sobre a quem é concedido a cidadania. A todo brasileiro,

ou apenas aqueles que puderem comprá-la ?

Por outro lado, há que se questionar: por que a cidadania vem sendo,

insistentemente, vista como tarefa da educação ? É a educação o elemento que separa os

indivíduos em cidadãos e não-cidadãos ? Um critério desta natureza já não estaria, por si

só, excluindo milhares de pessoas da cidadania ? O “cidadão de fato” seria , então, o

indivíduo culto, com bom nível de instrução, que passou pelas instituições de ensino

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formais ? E como ficam aqueles, que não tiveram acesso a essas possibilidades ? Que

perspectiva podem alimentar de conquista da cidadania ?

Por outro lado é preciso definir como ficam entendidos outros aspectos

ligados ao bem estar individual e social, como acesso à saúde, à alimentação, à moradia, a

um emprego com remuneração digna, acesso a propriedade da terra, ao saneamento básico,

e assim por diante. Não se destinam a cidadãos ? Caberia adequadamente o nome de

cidadão a quem apenas concluísse a educação fundamental na precária rede pública de

ensino e passasse a vida em favelas, periferia ou zona rural, afastado dos benefícios

citados?

Muitas são as questões que se podem multiplicar a partir de uma reflexão

séria e crítica sobre a relação entre educação e cidadania, especialmente em países com um

modelo não distributivo de riquezas e benefícios. Os fatores que limitam o acesso à

educação são os mesmos que tornam discutível o acesso de todos à cidadania, como é fácil

demonstrar.

No Brasil onde tantos estão excluídos dos benefícios sociais, parece que só

há um momento em que todos usufruem do direito de cidadania, é nos dias de eleição

cumprindo o direito de voto, o “cidadão” recai na categoria de mero indivíduo e é

esquecido do Estado.

3.2 – Escola pública, escola dos cidadãos ?

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A igualdade de condições de acesso e permanência na escola, prevista pela

Constituição e pela nova LDB, esbarra em graves obstáculos que fazem parte da escola

viva das classes inferiores, rurais e urbanas. O acesso é impedido, muitas vezes, por razões

como a fome, a dificuldade de transporte, a inexistência de escolas próximas ou de vagas

suficientes, a desinformação e extrema pobreza da família.

A permanência na escola nos remete a um dado amplamente conhecido: o

alto índice de repetição e evasão na população de baixa renda. Os fatores mais atuantes

neste quadro são a incorporação precoce e despreparada do adolescente no mundo do

trabalho e as deficiências da escola. O fracasso escolar se exprime em baixos índices de

escolaridade, que envergonham o país perante nações congêneres.

Crianças e adolescentes fora da escola, sem chance de ascenderem ao

mundo do trabalho, representam grave limite à associação entre educação e cidadania. Por

um lado, se esse contigente precisa constar como mão-de-obra ativa e não de reserva, é

porque a família de onde se origina não tem, nos adultos, garantia de provimento da

subsistência do grupo.

Evidentemente, muitas são as justificativas para tais casos. No entanto,

qualquer uma delas que se escolha como objeto de análise revelará, direta ou

indiretamente, a falência das políticas públicas dirigidas aos cidadãos. De modo geral, a

criança ou o adolescente buscam o trabalho como meio de ajudar na renda familiar.

Despreparados, tem de encarar os baixos níveis salariais. Daí a elevada onde de

desemprego de grande parte dos trabalhadores adultos, especialmente daqueles que,

quando crianças, também, estiveram excluídos da educação formal e preparatória.

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No caso de famílias chefiadas por mulheres, hoje nos setores pobres da

população, é ainda mais comum a necessidade do trabalho infantil e adolescente. Além dos

cuidados com o grande números de filhos, as mulheres desse nível estão ainda menos

categorizadas para competir no mercado de trabalho.

É freqüente, em diversas regiões do Brasil, que a criança trabalhe para poder

sobreviver, ainda que precariamente. O corte de cana-de-açúcar (Estado do Rio) e do sisal

(Bahia) são alguns dos muitos exemplos de uso do trabalho infantil, quase em regime de

escravidão, tornando a escola um sonho longínquo. Vendedores de balas nos sinais de

trânsito, “flanelinhas”, carregadores de compras são alguns dos muitos “serviços”

reservados às crianças nas cidades. Atualmente, um número expressivo se dedica a

recolher, nos lixos, materiais vendáveis ou mesmo sobras de comida “aproveitáveis”.

Essas crianças das áreas mais pobres que, como disse Darcy Ribeiro,

“vivem famélicas” ao encontrarem uma escola cujo currículo e práticas acham-se tão

afastadas de suas experiências cotidianas, acabam se inibindo e se condenando ao

“fracasso”. Cansadas, subnutridas, muitas vezes doentes, devem integrar-se ao “mundo do

saber” institucionalizado, que não só despreza suas vivências como exige pré-condições a

que ela jamais teve acesso. As teorias e práticas pedagógicas costumam ter, como sujeito

ideal, a “criança perfeita” aquela que não tem nenhum tipo de dificuldade na

aprendizagem. Aquele que chega à escola após considerável processo de estimulação

sensório-motora e de conhecimento através de brinquedos adequados. Aquela que domina

seu corpo e controla as noções de espaço, capaz de manter excelente nível de atenção e de

absorção das informações transmitidas. Os livros didáticos e as atividades propostas, bem

como a linguagem utilizada e a disciplina formadora de convívio social apresentada em

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nossos modelos de escola, assemelham-se a uma injusta seleção subjetiva entre aptos e não

aptos.

Fruto desta realidade é a alternativa de dois caminhos, ambos equivocados,

que, não obstante orientam a prática pedagógica, em especial nas escolas públicas. Um

deles é a visão paternalista, que confunde a falta de condições adequadas com limitações

pessoais e insuperáveis dos alunos.

Reconhecendo a dificuldade de se alterar o “destino” dessas crianças e

jovens, esta falsa percepção prefere um gesto burocrático/caridoso, facilitando-lhes a

aprovação independente da aprendizagem conseguida. É o “credencialismo” em sua face

mais perversa.

O segundo caminho baseia-se no mesmo princípio mas conclui pela

“incompetência” e “incapacidade”, inerentes à crianças pobres. Sem que se tente

conhecer-lhes os motivos verdadeiros, são submetidos a sucessivas repetências que

culminam com o abandono da escola.

A permanência na escola do “futuro cidadão” como se vê, está determinada

por sua classe social, pela possibilidade de não ter que se preocupar com as condições

mínimas de sobrevivência, pela existência de um ambiente familiar de apoio que lhe

permita “amadurecer” para poder usufruir de determinado modelo de escola. Note-se que a

questão não é a incompatibilidade entre estar na escola e trabalhar, mas as condições em

que ocorrem essas duas experiências. Tanto que atualmente observa-se, em nossa

sociedade, um dado curioso. Enquanto as classes mais pobres não concluem ou concluem

cada vez mais tardiamente sua educação fundamental, as classes mais elevadas “encurtam”

a infância pelo ingresso cada vez mais precoce na escola básica e, por extensão, nos cursos

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de nível superior. É óbvia a desigualdade de oportunidades que se perpetua, produzindo

como diferentes categorias de cidadãos.

3.3 – A falsa saída do ensino supletivo e soluções paliativas

A oferta de ensino supletivo, pelo Estado, a jovens adultos trabalhadores,

que a ele não tiveram acesso na idade própria, está longe de ser uma solução eficaz. Muitos

dos problemas apontados no caso de escolarização de crianças trabalhadoras se aplicam a

tal situação.

Dificilmente a prática educativa é efetivamente adaptada às necessidades

específicas desse grupo, com o agravante de ser heterogêneo em idades e experiências

acumuladas. Apesar de contarem com a proteção legal, nem todos os jovens trabalhadores

conseguem a compreensão de seus chefes e patrões quanto a horários e disponibilidade

para que possam estudar. Os atrasos freqüentes, as faltas, o cansaço e a fome, associados às

distâncias, que separam escola e moradia do local de trabalho, passam a representar um

fardo extremamente pesado. As escolas são precárias e pouco atraentes, os currículos e

práticas educativas são previstas, na verdade, para jovens das classes mais altas. Também

os professores são desestimulados pela ausência de políticas pedagógicas e salariais que

compensem sua excessiva sobrecarga de trabalho. Há dificuldade na aquisição de material

didático.

Além de tudo isso as perspectiva sombrias quanto ao uso que poderão fazer

do tardio certificado escolar de conclusão de curso. Aí estão numa descrição sumária de

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alguns dos fatores que confirmam a exclusão inevitável desses grupos pela impossibilidade

ou de ingresso ou de permanência.

Esse conjunto de forças acaba por aprofundar, cada vez mais, a dicotomia

entre o mundo do trabalho e o mundo intelectual escolar, conduzindo a várias distorções

comuns em nossa formação histórica. No meio rural, o trabalho doméstico ou na roça é

espontaneamente melhor valorizado, ainda que o estudo seja considerado fundamental

pelas famílias. Entretanto, como a escola dificilmente se interessa pela realidade do aluno

trabalhador, acaba se distanciando e acaba por transformar-se em alternativa para os filhos

que “não dão para ao trabalho da lavoura”. No meio rural e urbano, a formação de

professores, quando acontece, é fraca, deficiente. Sua metodologia é fechada em um ciclo

de conhecimentos e exercícios estranhos à realidade rural. O que exigir desse professor,

que ignora as circunstâncias do meio rural ? E como falar em escolaridade regular se, na

prática, o plantio e a colheita esvaziam a escola, escrava de calendários inadequados ? É

muito difícil delegar aos diferentes modelos de escola brasileira a ingente tarefa de formar

cidadãos.

A continuação de uma leitura crítica da legislação atual nos remete a outras

limitações das condições materiais da vida que são, portanto, limitativas também, da

prática educativa e da construção da cidadania. Fazendo referência à parcela da população

que necessita de educação especial, a lei parece contentar-se em driblar um problema de

consciência. É especialmente romântica a opção preferencial pela rede regular de ensino

público como local de atendimento ao portador de alguma deficiência física ou mental.

Mais uma vez atribui-se à educação as demais condições que tornariam mais

provável aos deficientes, sobretudo aos das camadas mais pobres ascenderem às escolas

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“regulares”. Para isto não basta disposição legal e abertura de vagas. Essa parcela da

população precisa contar, ainda, com reais condições de tratamento multidisciplinar que

viabilize a estimulação de suas capacidades físicas, psíquicas e de integração social. Ora,

se as oportunidades mínimas de sobrevivência digna estão difíceis até para os indivíduos

ditos normais, especialmente e no acesso à saúde, o que se pode pretender para os lesados,

física e/ou mentalmente ?

Condicionar, como quer a Constituição, o acesso a níveis mais

elevados do ensino à atuação do Estado e à capacidade de cada um esbarra na

mais ingênua visão da sociedade brasileira. Para tanto, basta confrontar-se a

estatística a respeito de repetência escolar no primeiro e as informações

sobre a classe social mais presente nesta estatística com os dados ilustrativos

da clientela aprovada, por exemplo, nos vestibulares para as universidades

públicas. A “capacidade” está longe de direcionar a continuidade da vida

escolar, principalmente o “acesso a níveis mais elevado”. O apelo a este

conceito de “capacidade” só faz ampliar o sentimento de culpa dos que não

logram o direito de conquistar a plena cidadania. Não se reunindo as múltiplas

condições essenciais para a participação de todos os indivíduos brasileiros no

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processo educativo, o espírito das leis e a idéia de cidadania permanecerão

como meras especulações. Continuarão como discursos e não fatos.

(Comentário da Autora – Barbosa, Gleides)

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CAPÍTULO IV – IMPLICAÇÕES DE UMA NOVA

CONSCIÊNCIA EM TORNO DO IDEAL DE CIDADANIA

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Queiramos ou não a formação para a cidadania e sua conscientização

passam forçosamente pela escola. A nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional

retira da escola a prerrogativa de único espaço destinado à educação e multiplica as

“agências educacionais”. Representa um avanço. De creta forma, identifica-se um pouco

mais com a realidade ao reconhecer os movimentos sociais e organizações da sociedade

civil, as manifestações culturais e o próprio trabalho como espaços de educação. Admite

legalmente outros espaços em que podem ser desenvolvidos processos formativos. Este

enfoque tem a vantagem de ver o povo como sujeito de sua própria história, capaz de

conquistar e produzir não só a educação como também a própria cidadania.

Este é outro aspecto a ser revisto para equacionar devidamente a questão da

cidadania das camadas populares. Trata-se da fé no Estado moderno como instância capaz

de tutelar, educar, conduzir e proteger o povo contra si próprio, contra os seus instintos e

contra a irracionalidade de falsos condutores. Fé no Estado que referenda a cidadania,

constitui o cidadão formal, reconhecendo-lhe direitos, arbitrando sobre o papel político das

organizações e movimentos populares e assim por diante.

Têm-se dominado os modelos liberais há dois séculos, transformando a

cidadania em uma espécie de concessão feita pelo Estado a quem ele julgar em condições

de recebê-la. A redução da questão da cidadania à moralização, ou educação para o bom

convívio social acaba por se transformar em obstáculo à compreensão da questão da

cidadania. O pensamento pedagógico somente colocará o problema no devido lugar se

superar esse modelo de bom comportamento moral. Se partir da visão real da sociedade

como campo de conflitos, antagonismos e lutas.

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Portanto, a ênfase na vinculação entre educação e cidadania deve ser

repensada, alterando-se a concepção ingênua que pretende ver na escola a famosa

“preparação” para o ingresso numa sociedade civilizada. Mesmo porque o aumento dos

níveis de igualdade social através da educação escolar e a participação política não

caminham necessariamente no mesmo ritmo.

Evolui, deste modo, a LDBEN ao reconhecer outros espaços para o processo

educativo quer da pessoa quer do cidadão. Segundo um comentarista do novo texto legal:

“...os movimentos sociais que se organizam em torno da luta por

saúde, educação, moradia, liberdade, igualdade, justiça e leis justas,

conquistam progressivamente a cidadania de forma coletiva”(Adams, 1996,

pág. 136).

Daí seu caráter educativo, pois a educação é autoconstruída no processo

mesmo de tais movimentos. Marília Pontes Spósito, em sua pesquisa sobre educação e

movimentos sociais, mostra que esses movimentos ensinam muito na participação e

descoberta dos espaços públicos, gerando situações educativas. Por outro lado, nesses

mesmos movimentos, descobre-se que a ausência de escolaridade é fator de discriminação

social e de sujeição. Para suprir isso, a única saída é revitalizar a escola.

Mas recua a LDBEN ao especificar que o “preparo para a cidadania” é

objetivo do ensino médio e que deve vincular-se necessariamente ao mundo do trabalho.

Partindo-se do princípio de que, concretamente, a maior parte da população ( cerca de

90%) não tem acesso ao ensino médio, qual a proporção de cidadãos preparados pela

escola ?

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Caberia traçar outros esquemas para possibilitar a relação

educação-cidadania sob o ponto de vista daqueles jovens que, não estando

impedidos ou limitados por questões de sobrevivência “aprenderiam” cidadania

por outros caminhos. A vida profissional, o sindicalismo, a militância política

são outras tantas instâncias que podem e devem ser acionadas.

(Comentário da Autora – Barbosa, Gleides)

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CONCLUSÃO

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Conclusão número 1

Cercados pelo modelo mental neo-liberalismo, torna-se necessário que

se inclua,, nas práticas educativas, a discussão da cidadania como forma de exclusão de

grandes contingentes. Os ideais de solidariedade humana, citados como norteadores da

Educação, também merecem um confronto educativo com a realidade social em que

vivemos. Confirmando-se, através de uma pedagogia elitista, a reprodução dos padrões

atuais, graves riscos se anunciarão para um futuro no qual a desigualdade conduzirá a um

impasse/conflito na questão social. Se apenas a pobreza for distribuída, não restará outra

alternativa aos “cidadãos” das próximas gerações que a de se encastelarem entre fossos ou

trincheiras da miséria. Mas aí já será a guerra social.

Conclusão número 2

Se, para as camadas populares, a cidadania deve ser conquistada não só pela

educação mas também pelos meios dignos de sobrevivência, para as camadas médias e

altas deve vir respaldada por uma conscientização que as ajude a decidir para que tipo de

cidadania estão se preparando.

Além das questões relativas à Ética, cujo resgate poderia clarear algumas

das práticas políticas e econômicas, outras propostas merecem urgência.

Altamente válido seria um olhar crítico dos jovens, futuros dirigentes do

processo econômico e político, sobre as populações sem teto, sem terra, sem sala de aula,

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sem alimento, sem saúde. Esses líderes em formação se colocariam como co-participantes

do mesmo meio natural e social que eles. É grave constatarmos que a revolução da

informação esteja contribuindo para isolar tais jovens, aprisionando-os cada vez mais em

uma realidade virtual, impedindo-os, quem sabe, de enxergar os seres reais.

Transformando-os em autômatos insensíveis à realidade do Brasil social.

Conclusão número 3

O discurso neoliberal de globalização revela uma face, que se quer oculta,

representada pela crescente exclusão daqueles que não conseguirem se incorporar ao

modelo. E o individualismo, crescente, amplamente observável na vida social, é pré-

requisito para a consolidação desse lamentável projeto.

Em algumas previsões, oferecidas por estudiosos da administração de

empresas e de recursos humanos, já se fala no “fim do emprego”, nos moldes em que hoje

o conhecemos, e em sua substituição por prestações de serviços diversos. No perfil do

“trabalhador do futuro”, já rascunhado por consultorias especializadas, destacam-se, entre

outros traços, o certificado de conclusão do 2º grau (no mínimo), o conhecimento de

informática e uma sólida cultura geral. Há que se perguntar: o que fazer com o imenso

contigente de analfabetos, efetivos e funcionais, que formam a reserva de mão-de-obra

brasileira ? Seremos uma nação às tecnologias do futuro ?

Conclusão número 4

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A luta pela cidadania e contra a exclusão social é também a luta contra o

analfabetismo. Aqueles que já se encontram inseridos na produção organizada podem

receber, como se vem divulgando, programas à distância, de suplência escolar, no próprio

ambiente das fábricas. Aliás, a Lei Darcy Ribeiro, ao legitimar pela primeira vez na

história da educação brasileira o ensino à distância, possibilita o resgate da dívida com a

educação de massa. Em outros países, especialmente do Terceiro Mundo, não só o

analfabetismo como a oferta de outros níveis de ensino, foram supridos através dessa

modalidade.

È claro que, não se apoiando a nova metodologia com eficientes meios de

comunicação e com melhoria das condições gerais de vida dos receptores, programas desse

tipo cairão no vazio. Foi o que, no passado, ocorreu com o Mobral, um modelo que merece

ser analisado.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1 - ADAMS, Thelmo. “Contribuição da escola na luta pela cidadania “, in Educação e

classes populares, organizado por Nilton Bueno et Allii, Porto Alegre; Editora Mediação,

1996.

2 – BITTENCOURT, Ricardo Luiz. “Desconstruíndo o fracasso escolar: a construção

da escola possível para as classes populares”, in Educação e Classes Populares, organizado

por Nilton Bueno Fischer et Allii, Porto Alegre: Editora Mediação, 1996.

3 - BRASIL, Constituição da República Federativa do Brasil, Brasília. Editora do

Congresso, 1989.

4 – BUFFA, Ester, Arroyo, Miguel, NOSELLA, Paolo. “ Educação e Cidadania: quem

educa o cidadão ?” 6ª ed., São Paulo: Cortez, 1996.

5 – Dicionário de Ciências Sociais, Rio de Janeiro, Editora da F.G.V. 1986.

6 – MANACORDA, Mário Alichiero. “História da educação – da Antigüidade aos nossos

dias” . São Paulo 2ª Edição. Editora Cortez. 1989.

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7 – MARROU, “I. História da Educação na Antigüidade”. São Paulo : EPU, 1975.

8 – RIBEIRO, Darcy. Apud Jornal do Brasil, 21/01/97. Rio de Janeiro.

9 – SPÓSITO, Marília Ponte. “A Ilusão Fecunda: a luta por educação nos movimentos

populares”. São Paulo: Amcitec, 1993.

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ANEXOS

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FOLHA DE AVALIAÇÃO

UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES

Instituto de Pesquisa Sócio-Pedagógicas

Pós-Graduação “Latu Sensu”

Título da Monografia:

----------------------------------------------------------------------------------------------

----------------------------------------------------------------------------------------------

------------------------------------------------

Data da Entrega:------------------------------------------------

Avaliado por -----------------------------------------------Grau-----------------------

Rio de Janeiro --------de--------------------de 2001.

------------------------------------------------------------------

Coordenador do Curso

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SÍNTESE

01 - Dedicatória................................................................................................I

02 – Agradecimentos....................................................................................................III

03 – Sumário...................................................................................................V

04 – Resumo...................................................................................................01

05 – Metodologia............................................................................................05

06 – Introdução..............................................................................................07

07 – Capítulo I – Breve Revisão Histórica do Conceito de Cidadania..........09

1.1 – Na antigüidade ocidental........................................................................10

1.1.1 – Entre os romanos................................................................................12

1.1.2 – A chegada do cristianismo.................................................................13

1.2 – Cidadania quando da revolução burguesa – Revolução Industrial........14

1.2.1 – Uma visão da questão entre nós.........................................................16

08 – Capítulo II – Cidadania Real e a Cidadania Declarada, no Brasil de

hoje..................................................................................................................19

2.1 – Desigualdade Social...............................................................................20

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2.1.2 – As minorias mulheres negras e indígenas...........................................21

2.2 – Cidadania oficialmente declarada..........................................................23

2.2.1 – Na constituição Federal......................................................................23

2.2.2 – Na lei magna educacional...................................................................25

09 – Capítulo III – Uma Análise das Relações entre o Papel da Escola e da

Educação e o Exercício da Cidadania.............................................................28

3.1 – A escola confere cidadania ? .................................................................29

3.2 – Escola pública, escola dos cidadãos ? ...................................................30

3.3 – A falsa saída do ensino supletivo e soluções paliativas.........................34

10 – Capítulo IV – Implicações de uma Nova Consciência em torno do ideal

de cidadania.....................................................................................................38

11 – Conclusão...............................................................................................42

* número 1 ....................................................................................................43

* número 2.....................................................................................................43

* número 3.....................................................................................................44

* número 4....................................................................................................45

12 – Referências Bibliográficas..................................................................46

13 – Síntese..................................................................................................48

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14 – Anexos.................................................................................................50