MODERNIZAÇÃO, CIDADE E CONSUMO ... Encontro Nacional de Geógrafos 2 as mudanças que o aumento de...
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XVIII Encontro Nacional de Geógrafos
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Daniel Pereira Rosa
Professor da rede municipal de ensino da cidade do Rio de Janeiro
Mestre em Geografia/UERJ
Doutorando em Geografia Humana/USP
Bolsista Coordenação e Aperfeiçoamento de Pessoal de Ensino Superior
(CAPES)
Contato: [email protected]
MODERNIZAÇÃO, CIDADE E CONSUMO: APONTAMENTOS DE
ECONOMIA URBANA A PARTIR DA PERIFERIA
METROPOLITANA.
Este artigo integra notas de uma pesquisa de doutorado em curso , onde trazemos
para a seara da economia urbana o tema da modernização da cidade com um olhar mais
atendo para as cidades da periferia metropolitana fluminense.
Neste sentido, contribuímos com a seguinte questão: em que medida o consumo dos
moradores de áreas periféricas da metrópole altera o uso do território?
A ideia de modernização enquanto acréscimo de ciência e técnica (SANTOS E
SILVEIRA, 2001) é um dado empírico das áreas urbanas. Do mesmo modo, a questão do
consumo da cidade, transformada em mercadoria é um tema recorrente nos estudos
urbanos nas primeiras décadas do século XXI. Um elemento mais recente neste caso é
que com a ubiquidade das finanças e a intensificação da capilaridade do crédito
(CONTEL, 2006), (SILVEIRA, 2007), este chega também às áreas periféricas
fomentando o endividamento, o consumo e alterando a relação dos habitantes com o uso
territorial.
Integram este processo, as grandes cadeias de varejo, as redes de supermercado , os
shopping centers e um plantel de instituições financeiras que ofertam crédito para o
consumo de bens imediatos ao mesmo tempo em que funcionam como um intenso
mecanismo de drenagem de capital nas periferias urbanas.
A questão, aparece em Milton Santos (1978), Maria Laura Silveira (2003 & 2007) e
Marina Montenegro (2006 & 2014) que atentaram para os temas de globalização, trabalho
e pobreza nas periferias urbanas. É nesta linha de pesquisa que este trabalho se insere,
tendo como abordagem basilar a teoria dos circuitos da economia urbana para entender
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as mudanças que o aumento de crédito apontam para indivíduos e famílias que
historicamente residem em áreas da metrópole relegadas à condição de carências de
serviços públicos , de equipamentos de lazer e de oferta de empregos mais qualificados
do chamado terciário e terciário superior.
Tem-se então o paradoxo de ver o pequeno comércio submeter-se à lógica das redes de
atacado ao mesmo tempo em que os indivíduos e famílias de áreas periféricas mantém
esta condição, enquanto simultaneamente ganham acesso à bens de consumo e serviços
que antes só podiam ser adquiridos/acessados a partir do núcleo metropolitano.
Usamos como exemplo as quatro maiores cidades da periferia metropolitana
fluminense para exemplificar a necessidade do debate sobre o funcionamento dos
circuitos na redefinição das centralidades periféricas.
Palavras- Chave: Economia urbana; Periferia; Consumo.
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INTRODUÇÃO
Este trabalho, apresentado também no âmbito do Espaço de Socialização de
Coletivos, insere-se em uma série de estudos que vêm se desenvolvendo no Laboratório
de Planejamento (LABOPLAN) do Departamento de Geografia da Universidade de São
Paulo, nos últimos 10 anos.
Temos empreendido esforços conceituais, metodológicos e empíricos para
compreender aspectos da modernização do território sobretudo nas periferias urbanas,
buscando identificar os elementos que atuam de forma mais destacada na organização
espacial em áreas metropolitanas.
O destaque para as cidades periféricas devem-se ao foco de uma pesquisa de
doutorado em curso, que busca entender a dinâmica de consolidação de centralidades
periféricas em um contexto de uma metrópole extremamente concentrada, mas que tem
reduzido suas taxas de concentração ao longo dos últimos 10 anos.
Trata-se da Região Metropolitana do Rio de Janeiro, marcada por uma
concentração de bens , serviços, fluxos e pessoas que não encontra similar entre as demais
regiões metropolitanas brasileiras. Mesmo com uma dinâmica fortemente hierarquizada ,
é possível apontar para uma relação centro – periferia de menor verticalidade , propondo
formas de entender a dinâmica metropolitana abandonando o senso comum da relação de
dependência entre núcleo – periferia?
Podemos apresentar alguns elementos que contribuam para este debate, evocando
como leitmotiv a teoria dos circuitos da economia urbana como diapasão do papel da
periferia (no caso a fluminense) na divisão territorial do trabalho, indicando que, ao
contrário da inadequação do tratamento como cidades- dormitório que algumas cidades
ainda carregam, estas cidades também tem se se consolidado como lugar de trabalho e
consumo. Daí a necessidade de identificar as mudanças quantitativas e qualitativas no
período atual, considerando que mesmo cidades periféricas apresentam relações verticais
e horizontais na rede urbana.
UMA HIPÓTESE, ALGUMAS PERGUNTAS.
Embora sejam um dado estatístico elementar, a distribuição da população da
Região Metropolitana é um elemento importante para o entendimento da periferia como
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lugar de trabalho e consumo. Contando atualmente com 19 municípios, no início dos anos
1940 o município –núcleo concentrava 48,84% da população da unidade da federação e
80,24% dos habitantes da Região Metropolitana encontravam-se no município do Rio de
Janeiro.
A dispersão populacional ( ou concentração populacional na periferia) evoluiu até
que na primeira década deste século o município núcleo concentrasse 53,40 % da
população da Região Metropolitana. O dado é relevante para entendermos não apenas a
concentração populacional mas também gerar a percepção de que os demais municípios
da Região Metropolitana (as cidades periféricas) não formam um grupo homogêneo.
Maurício de Abreu (1997) definia para além do município núcleo, uma periferia
imediata - que coincidia com o subúrbio analisado por Pedro Geiger (1956) e Segadas
Soares (1968) e Lysia Bernardes (1990) , uma periferia intermediária e uma periferia
distante, mostrando a heterogeneidade desta hiperconcentrada Região Metropolitana.
Além de heterogênea, atualmente esta periferia torna-se mais complexa. Antigas cidades-
dormitório e subúrbios industriais tornam –se mais complexas, populosas e embora
apresentem um perfil misto em relação às atividades econômicas são majoritariamente
caracterizadas pela predominância das atividades de serviços.
Entre esta periferia intermediária, que em alguns autores como Tavares (2012) e
Lago (2006) tem sido chamada de periferia “consolidada” encontram-se os quatro
municípios de maior destaque na periferia metropolitana. Niterói e São Gonçalo à Leste
da Guanabara e Duque de Caxias e Nova Iguaçu na porção periférica denominada baixada
fluminense.
Estas cidades, próximas ao núcleo metropolitano, com centralidades na rede
urbana da metrópole e muito populosas, ao participar da divisão territorial do trabalho
beneficiam-se da aglomeração tornando-se não apenas mais heterogêneas e também mais
complexas.
Marina Montenegro (2011) afirmara que cidades mais populosas correspondem a
mercados maiores e mais extensos, assim como a uma segmentação da economia urbana
mais complexa, onde múltiplas divisões do trabalho coexistem em um meio construído
fragmentado e, ao mesmo tempo integrado. A priori esta é uma hipótese assumida para
as quatro cidades de maior destaque na Região Metropolitana Fluminense. A tendência
de crescimento e aumento da complexidade da rede urbana tem nexo causal como efeito
da aglomeração, o que pode ser notado pelo predomínio dos setores de serviços, comércio
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e administração pública nas maiores cidades periféricas da área metropolitana1.
Figura1: MUNICÍPIOS QUE INTEGRAM A REGIÃO METROPOLITANA DO
RIO DE JANEIRO.
Fonte: Fundação CIDE, 2013.
Desta hipótese emergem algumas questões como por exemplo; quais elementos
demonstram a complexidade intraurbana nas cidades periféricas? Quais são as diferenças
na divisão do territorial do trabalho? Que tratamento conceitual deve ser dado à periferia
metropolitana? Como os a modernização destas cidades afeta as relações de centralidade?
Assumindo que dentro da aglomeração há trocas que nem sempre são captadas
pelas pesquisas de grande escala, podemos listar algumas possiblidades baseando-nos nas
evidências quando observamos a periferia através da economia urbana.
O QUE A ECONOMIA URBANA TEM NOS MOSTRADO SOBRE A PERIFERIA.
1 Em relação ao peso das atividades econômicas no valor adicionado bruto de cada município, o setor de
serviços correspondia no ano de 2011 foi de 67,45% (Duque de Caxias), 85,75% (Nova Iguaçu), 78,35%
(Niterói) e 84,59% (São Gonçalo). Para este ano a exceção do município de Maricá, todos os municípios
da periferia metropolitana apresentaram maior peso no setor de serviços em relação à atividade
agropecuária e indústria. Fonte: Anuário Estatístico do Rio de Janeiro, CEPERJ, 2013.
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Na operacionalização de pesquisas sobre o desenvolvimento de funções urbanas,
admite-se que “ todo núcleo de povoamento é considerado uma localidade central,
equipado de funções centrais” (IBGE, 1993, p.16), corroborando a premissa de que as
aglomerações urbanas acabam por fomentar uma economia local que no caso das cidades
periféricas, acaba por diferenciar-se do núcleo pela raridade das funções, que por serem
de menor frequência acabam tendo uma área de influência mais extensa.2
Nos estudos da rede urbana brasileira, a divisão do trabalho prova-se fortemente
hierarquizada, o que tem sido mostrado pelos estudos de região de influências das
cidades3. Tais estudos comprovam uma rede urbana hierarquizada a partir de uma grande
metrópole nacional (São Paulo), seguida respectivamente em tamanho e influência por
Rio de Janeiro, Belo Horizonte e Brasília.
As ideias de centralidade máxima (grande metrópole nacional) e mínima4 (muito
fraco/ municípios subordinados) contém implicitamente uma estreita relação entre a
intensidade da centralidade e os circuitos da economia urbana. A proposição de Milton
Santos (1978) podem ser atualmente explicadas por María Laura Silveira que
apresentando a existência e o funcionamento dos circuitos discorre que “cuando los
grados de tecnologia , capital y organizacíon son altos, reconocemos um circuito superior
que tambíem posee uma porción marginal y, cuando son bajos, es del circuito inferior que
estamos hablando” (20015, p. 14).
Ainda segundo a autora, “las sucessivas modernizaciones capitalisas, tecnológicas
y organizacionales, associadas a las grandes ciudades de los países periféricos,
determinan el origem común de los circuitos de la economia urbana (2016, p,13) e é neste
sentido que a teoria dos circuitos foi incorporada aos estudos de níveis de centralidade na
busca de elementos que hierarquizem o “comportamento das cidades no espaço nacional
e a compreensão dos sistemas de cidades como função do desenvolvimento econômico”.
(IBGE, 1972, p.09).
É possível estabelecer a partir daí, quais elementos (fixos ou fluxos)5 diferem não
apenas a hierarquia urbana mas as verticalidades entre fluxos e corporações . O tema da
modernização do espaço enquanto acréscimo de ciência e técnica no território (SANTOS
2 Ver a respeito, o estudo Região de Influência das Cidades, IBGE, Rio de Janeiro, 1993. 3 Ver a respeito, Região de Influência das Cidades, IBGE, 1972, 1993 e 2007. 4 O estudo REGIC-1993, considerou como centralidade mínima todos os municípios que não se
enquadravam nos seguintes critérios : a) ser sede de comarca, b) contar com agência bancária, c) dispor de
médico residente na cidade, d) dispor de emissora de rádio AM. 5 A respeito, ver, Santos, (1996) a Natureza do Espaço. São Paulo, Hucitec.
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& SILVEIRA, 2001) é imprescindível na compreensão da realidade brasileira,
demandando também a atualização da teoria dos dois circuitos6 uma vez que a exemplo
das “REGIC’s”, os elementos que denotam centralidade e caracterizam os dois circuitos
tem se alterado com o avançar das inovações tecnológicas associadas, tanto à reprodução
do capital quanto da formatação da rede urbana em diversas escalas.
SOBRE EVIDÊNCIAS EMPÍRICAS
A ideia de que as metrópoles centralizam o comando da reprodução de capital é
um consenso disseminado na análise espacial. Dentro da hipótese proposta, chama
atenção para a necessidade de entendermos como os elementos de reprodução do capital
(ligados ao circuito superior) chegam também às periferias . Há uma gama de fixos que
denotam a espacialização do circuito superior (ou marginal) também nas periferias como
modo de drenagem de recursos.
Um destes elementos que sustentam a reprodução do capital entrelaçando os dois
circuitos é o crédito. Uma modalidade das finanças que , se não é nova, torna se ubíqua
(CONTEL, 2006) atingindo também espaços que outrora por estarem fora do núcleo
metropolitano encontravam-se alijados do consumo de mercadorias globais.
O sistema contemporâneo de finanças liberalizados e mundializados a qual se
refere Chesnais (1996) e que é corroborado por Harvey (2011) chega também as
periferias metropolitanas na forma de fixos que organizam a rede urbana e interferem no
consumo.
Entre os objetos e ações (SANTOS, 1996) que estruturam e dão suporte às grandes
corporações mundiais, as finanças na forma de crédito alteram os fluxos entre
centro/periferia na medida em que os meios de acesso ao consumo , antes
obrigatoriamente dependentes do núcleo metropolitano agora chegam integram as
periferias à rede urbana. Pode se afirmar ent ão, que a capilaridade bancária (CONTEL,
2006), tem uma relação estreita e imbricada com a difusão do consumo.
Em o “Enigma do Capital”, David Harvey explica esta mudança na “forma de
gerar riqueza” (TOFFLER, 1980), através das finanças, ao alertar que “a lacuna entre o
que trabalho estava ganhando e o que ele poderia gastar foi preenchida pelo crescimento
6 Tarefa que vem sendo executada por Maria Laura Silveira, Fabio Contel, Marina Montenegro e
pelo desenvolvimento de nossa tese, no âmbito do Laboplan-FFLCH_USP. (2013 até os dias atuais).
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da indústria de cartões de crédito e aumento do endividamento” (2011, p.227).
A respeito disto, Maria Laura Silveira adverte que :
Nos dias de hoje, existe uma oferta extraordinária de crédito de instituições
financeiras bancárias e não-bancárias, redes, franquias e outlet de
eletrodomésticos, roupas e materiais de construção. Uma profusão de formas
de crédito pessoal favorece o aumento do consumo e, simultaneamente, o
endividamento, a inadimplência e a insolvência. (SILVEIRA, 2009, p. 65)
Neste sentido, Araújo (2015) ao estabelecer entre 2004 - 2014 um ciclo de
expansão de crédito no Brasil mostra que desde 2004 a relação crédito/PIB passou de
26% para 59% em 2014, atingindo de forma generalizada, os setores de (agricultura,
indústria, comércio, outros serviços, pessoas físicas e imobiliário) entre instituições
bancárias privadas, estrangeiras e públicas.
O resultado desta expansão da liquidez dos bancos é notório na distribuição dos
fixos do circuito superior também na periferia metropolitana. Na periferia ‘oeste’,
destacam –se Duque de Caxias, que possuía 18 agências até o final o século XX e hoje
possui 38. Nova Iguaçu possuía 10 até o final do século XX e atualmente conta com 37
agências. Niterói, a antiga capital possuía 30 agências e atualmente conta com 70 e São
Gonçalo subiu de 12 para 36 agências no mesmo período8.
Além de destacar a expansão da rede bancária, que é superior às demais cidades
periféricas, chama atenção o fato destas cidades apresentarem também agências para
clientes de maior renda.9 Denotando que os bancos em suas diversas modalidades atuam
oferecendo crédito para o consumo dos pobres mas também apontam para uma elevação
da renda de um grupo de residentes nestas áreas da metrópole.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Tudo isto ajuda a compor nosso quadro de periferia como espaço fragmentado
mas também como lugar de trabalho e consumo. Se por um lado a ubiquidade das finanças
é um elemento real que integra a rede urbana é preciso avançar na compreensão de como
7 Retirado da edição eletrônica. A editora (BOITEMPO) optou por extrair desta versão as páginas em
branco que intercalavam os capítulos, índices etc. na versão impressa do livro. Por este motivo, é possível
que perceba-se saltos na numeração das páginas. 8 Fonte: FEBRABAN. 9 Prime do Bradesco S.A, Select do Banco do Brasil e Select do Banco Santander, exigindo renda minima
entre R$ 6.000,00 e R$ 8.000,00 como critério elegível dos clientes atendidos por este tipo de gerência.
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estes elementos permeiam o consumo, o trabalho e a experiência de estar em uma cidade
metropolitana.
A expansão do circuito superior para cidades periféricas denotam um aumento de
centralidade a exemplo d atividade bancária tanto na modalidade de agências , como redes
de varejo, e financeiras que vão até as periferias e altera a sua posição na rede urbana.
Ressalta-se também quem o consumo nas periferias acontece via circuito inferior,
mas cada vez mais grandes cadeias de varejo, shoppings e outras modalidades antes
símbolo das metrópoles ocupam espaços periféricos.
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