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MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ
Promotoria de Justiça da Comarca de Barracão
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Excelentíssima Senhora Juíza de Direito da Vara Única da Comarca de Barracão-PR
O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ, por
intermédio da Promotora de Justiça que abaixo assina, com fundamento nos artigos 127,
caput, artigo 129, III, da Constituição Federal e nas Leis nº 7.347/85 e nº 8.429/92,
comparece respeitosamente perante Vossa Excelência para, a partir dos elementos de
prova colhidos no Procedimento Preparatório MPPR 0016.11.000135-7, propor a
presente
AÇÃO CIVIL PÚBLICA pela prática de ATO DE IMPROBIDADE
ADMINISTRATIVA
(com pedido de liminar conforme artigo 12 da Lei nº 7.347/85)
Em face das seguintes pessoas físicas:
(a) Joarez Lima Henrichs, brasileiro, casado, Prefeito Municipal de Barracão-PR,
portador de cédula de identidade 13/R-711.473-SC, inscrito perante o CPF/MF
sob o nº 385.752.999-72, com endereço profissional na Prefeitura de Barracão,
localizada na rua São Paulo, 235, Centro, Barracão-PR;
(b) Antenor Dal Vesco, brasileiro, casado, comerciante, portador de cédula de
identidade nº 643.162/PR, inscrito perante o CPF/MF sob o nº 280.934.029-34,
residente e domiciliado na rua 29 de Outubro, 14, Dionísio Cerqueira-PR; e
(c) Harry Miguel Hoffmann, brasileiro, solteiro, aposentado, portador de cédula
de identidade nº 9.092.145-2/PR, inscrito perante o CPF/MF sob o nº
065.848.290-49, residente e domiciliado na rua Santa Terezinha, s/n, Centro,
Barracão-PR.
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Em razão dos fatos e dos fundamentos que são descritos a
seguir.
I- Preliminarmente: a apresentação dos documentos em cartório
1. Em primeiro lugar, é necessário ressaltar que a presente ação civil
pública foi precedida da instauração do Procedimento Preparatório MPPR
0016.11.000135-7.
Há, assim, um volume considerável de documentos que o
integram e que precisarão ser consultados cotidianamente no curso da demanda.
Por essa razão, e em observância ao contido no artigo 11, §1º, da
Resolução nº 03/2009, do Tribunal de Justiça do Estado do Paraná, o Ministério Público
entregará, mediante protocolo e no prazo de 10 (dez) dias, os autos do mencionado
procedimento preparatório perante a Escrivania Cível, a fim de viabilizar a consulta aos
documentos que embasam a petição inicial.
II- Ainda preliminarmente: o objeto do presente feito
2. Indo adiante, deve-se esclarecer que o objeto da presente
demanda envolve o modo como se deu a aquisição do imóvel descrito na matrícula nº
10.536 do Registro de Imóveis da Comarca de Barracão-PR pelos réus, a posterior
alienação de parcela dele ao Município de Barracão e a superveniente valorização
imobiliária que daí decorreu.
Deve-se esclarecer, portanto, que não está em discussão qualquer
ato ou decisão do Poder Judiciário (seja em âmbito Estadual, seja em âmbito Federal).
De mesma sorte, não se censura ou se imputa qualquer ilicitude ao agir do Judiciário,
que nada sabia acerca dos fatos narrados neste procedimento.
Assim, as menções ao processo de desapropriação mencionado
neste feito dirigem-se, exclusivamente, a demonstrar o modo como atuou o Sr. Prefeito
Municipal e os réus.
De mesma forma, a menção ao novo Fórum no curso desta
petição tem a finalidade exclusiva de demonstrar que, ao fim e ao cabo, os réus
valeram-se desse dado como um instrumento para, dentre outros fins, valorizar os
imóveis que lhes pertenciam.
É o que se busca narrar na sequência.
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III- A legitimidade de partes
3. A legitimidade do Ministério Público para o ajuizamento da
presente demanda é inconteste, conforme reconhecido no verbete nº 329 de Súmula do
Superior Tribunal de Justiça:
O Ministério Público tem legitimidade para propor ação civil pública em
defesa do patrimônio público.
Portanto, dispensáveis digressões a respeito desse dado.
4. Quanto à legitimidade passiva, deve-se destacar que o réu Joarez
de Lima Henrichs é o Prefeito Municipal de Barracão-PR para a gestão 2009-2012.1
Foi incluído no pólo passivo da demanda, uma vez que os atos
administrativos que culminaram na prática ímproba são de sua autoria. Desses atos é que
as vantagens econômicas ilícitas puderam ser obtidas, o dano ao Erário foi praticado e a
ofensa aos princípios sensíveis da Administração Pública ocorreu.
Logo, foi arrolado como réu com fundamento no artigo 1º, 2º e 4º
da Lei nº 8.429/92.
5. Os demais réus – Antenor Dal Vesco e Harry Miguel Hoffmann
– foram incluídos no pólo passivo da presente demanda, uma vez que eram, ao lado do réu
Joarez de Lima Henrichs, os reais proprietários da área em questão no momento da
desapropriação. E, assim, beneficiaram-se dos atos de improbidade administrativa
praticados.
Portanto, foram incluídos na presente demanda com amparo no
artigo 3º da Lei nº 8.429/92.
IV- Os fatos
6. A efetiva compreensão dos fatos depende de exposição minuciosa e
pormenorizada, remontando-se a dados anteriores e posteriores à prática dos atos ímprobos
apurados por ocasião da instauração do Procedimento Preparatório MPPR
0016.11.000135-7.
Por isso, ao tempo em que se pede venia em decorrência da longa
exposição fática, esclarece-se que somente desse modo é possível compreendê-los de
forma precisa.
1 Trata-se de fato público e notório (art. 334, I, do Código de Processo Civil). De toda a forma, a
informação está disponível no sítio do Tribunal Regional Federal na Internet, mediante a consulta do
seguinte endereço: http://www.tre-pr.jus.br/internet2/tre/estatico/eleicoes/anteriores/resultados/
20081005A74497.pdf. Último acesso em: 09.02.2012.
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IV.1. A constituição da sociedade “Jardim Vale do Capanema Ltda.”
7. Em 1995, os ora réus Antenor Dal Vesco e Joarez Lima
Henrichs, ao lado das pessoas de Vera Janette Motta Barreiro, Nei Elpidio Fin, Gilvan
Camilo dos Santos Ortiz, Terezinha de Jesus Mota Barreiro Crestani, Wilson José
Opolski, José Barreiro da Silva, Edegar Silveira e Lígia Isabel Kury Poloni,
constituíram a empresa Jardim Vale do Capanema Ltda. (contrato social às fls. 175-
178/MPPR).2
Conforme a cláusula primeira do referido contrato social, a
atividade desenvolvida pela sociedade era “Loteamento urbano, Administração e Compra
e Venda de Imóveis Urbanos.” (fl. 176).
Ainda de acordo com a cláusula segunda do contrato social, todos
os sócios possuíam a mesma participação societária (fls. 176-177/MPPR)
IV.2. As formais alterações societárias da sociedade “Jardim Vale do Capanema Ltda.”
e o encerramento formal da referida sociedade
8. Em 12.11.2001, houve a primeira formal alteração do contrato
social.
A sócia Lígia Isabel Kury Poloni transferiu suas cotas sociais para
Angela Maria Damiani.3 Por sua vez, a sócia Terezinha de Jesus Mota Barreiro
Crestiani transferiu suas cotas sociais para a já sócia Vera Janete Motta Ribeiro.
9. Em 13.12.2001, houve a segunda formal alteração do contrato
social.
Nessa ocasião, o réu Joarez Lima Henrichs, ao lado de outros
sócios, retirou-se formalmente da sociedade. Como pagamento por sua participação
societária, recebeu os seguintes imóveis:
“lotes nº 01 e 10 da quadra nº 102; lotes nº 03 e 09 da quadra nº 104; lotes nº
05,09,11 e 15 da quadra nº 105; lotes nº 11 da quadra nº 107; lotes nº 07, 10 e 17
da quadra nº 108; lotes nº 08 e 09 da quadra nº 109; lotes nº 03, 08 e 09 da quadra
nº 110; lote nº 11 da quadra nº 111; lote nº 01 da quadra nº 112; lote nº 09 da
quadra nº 114; lote nº 04 da quadra nº 115; lote nº 05 da quadra nº 117; lotes nº 05,
08, 09 e 11 da quadra nº 118; lotes nº 02 e 14 da quadra nº 119; lote nº 11 da
quadra nº 120 e lote nº 12 da quadra nº 122 (fl. 185/MPPR)
2 A numeração de páginas aqui mencionada é a que consta do Procedimento Preparatório
0016.11.000135-7, da Promotoria de Justiça de Barracão, que instrui esta petição inicial. 3 Essa pessoa é bastante próxima ao Sr. Joarez de Lima Henrichs, atual Prefeito Municipal, já havendo
ocupado cargo em comissão em administrações anteriores do Sr. Joarez.
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Segundo a informação do Cartório de Registro de Imóveis, as
quadras onde estão localizados os referidos lotes integram o “Loteamento Jardim Vale do
Capanema” (fls. 284-298/MPPR).
Por sua vez, nesse momento, o réu Antenor Dal Vesco manteve-se
na sociedade ao lado do então-sócio Edegar Silveira (fls. 180-187/MPPR).
10. Em 6 de agosto de 2002, houve a formal dissolução da sociedade
(fls. 188-189/MPPR).
IV.3. O objetivo da constituição da sociedade “Jardim Vale do Capanema Ltda.” e o
imóvel descrito na matrícula nº 10.356: as declarações prestadas nos autos 554/2007 da
Vara Única de Barracão
11. O objetivo da constituição da sociedade “Jardim Vale do Capanema
Ltda.” era, especialmente, a comercialização de imóveis na área específica do atual bairro
Jardim Vale do Capanema, em Barracão-PR.4
Parte da área detida pelos sócios foi loteada e a parte remanescente
(ainda não loteada) constou da matrícula nº 10.356, do Registro de Imóveis de Barracão,
aberta em 31.05.2000.
12. O imóvel em questão estava inicialmente registrado em nome da
“Jardim Vale do Capanema Ltda.”
Em meados de 2000, foi formalmente transferido para três dos
sócios da referida sociedade: Wilson José Opolski, Gilvan Camilo dos Santos Ortiz e
Nei Elpidio Fin (matrícula às fls. 171-172/MPPR).
No entanto, e na verdade, seguia sendo de propriedade dos dez
sócios da “Jardim Vale do Capanema Ltda.”.5
13. Parte dos sócios passou a negociar a parcela que lhes cabia em tal
imóvel.
4 Não há como passar despercebido que o nome da empresa “Jardim Vale do Capanema Ltda.” deu nome
ao loteamento ali realizado “Loteamento Jardim Vale do Capanema” e ao próprio bairro. 5 Nos autos 554/2007, algumas das pessoas ouvidas relatam que essa manobra foi necessária porque eram
dez os sócios da “Jardim Vale do Capanema Ltda” e a área, ainda não urbanizada, precisava ser dividida
em módulos rurais. Como não era possível extrair da área dez módulos rurais, resolveram registrar o imóvel
em nome de apenas três dos sócios. Outros, no entanto, afirmam que o imóvel foi registrado em nome dos três
sócios, pois a pretensão era negociá-lo com o Município. Como, à época, eram sócios do empreendimento
pessoas ligadas à estrutura da Administração Pública Local (o Sr. Joarez de Lima Henrichs foi Prefeito
Municipal entre 1997-2000 e entre 2001-2004 e o Sr. Antenor Dal Vesco foi Prefeito Municipal entre 2005-
2008), resolveu-se registrar o imóvel em nome das pessoas que não possuíam essa vinculação.
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Por isso, as pessoas que figuravam como proprietárias na referida
matrícula (Wilson José Opolski, Gilvan Camilo dos Santos Ortiz e Nei Elpidio Fin)
outorgaram procuração para o Sr. Edegar Silveira, a fim de que ele passasse a negociar as
referidas parcelas do imóvel.
14. Ao que consta, conforme os dados colhidos na audiência de 08 de
fevereiro de 2010 (data da audiência realizada nos autos 544/2007), antes da
desapropriação do imóvel pelo Município de Barracão, excetuando-se os dois primeiros
réus (Sr. Joarez Lima Henrichs e Antenor Dal Vesco), todos os demais haviam alienado
a parcela que lhes cabia no imóvel ao Sr. Harry Miguel Hoffmann (localmente conhecido
como “Padre Harry”).
15. Todos esses fatos só vieram à tona porque, em meados de 2007, o
Sr. Edegar Silveira (pessoa que havia recebido a procuração para negociar as parcelas de
terrenos dos então-sócios da Jardim Vale do Capanema) houve por bem ajuizar ação de
adjudicação compulsória, em que pretendia instar uma das pessoas em nome de quem o
imóvel em questão estava formalmente registrado (Sr. Gilvan Camilo dos Santos Ortiz) a
lhe outorgar a escritura de compra e venda de 1/3 (um terço) do imóvel.
15.1. No curso da referida demanda, autuada perante este d. Juízo
sob o nº 554/2007, foi realizada audiência de instrução e julgamento no dia 8 de
fevereiro de 2010.
Lá, foram ouvidas as partes do processo e as testemunhas arroladas
por cada qual, as quais relataram os fatos até agora expostos.
Confira-se.
15.2. Primeiramente, foi ouvido Edegar Silveira (autor da ação de
adjudicação compulsória e um dos ex-sócios da Jardim Vale do Capanema Ltda.):
“perguntado sobre o contrato de negócio entre ele e Gilvan e como foi
negociada a compra e venda do imóvel, respondeu que eram sócios e quando
a sociedade do loteamento foi desfeita, ficou remanescente uma área de
244.000 m (duzentos e quarenta e quatro mil metros), que foi dividida
entre os 10 (dez) sócios e iam vender para a Prefeitura. Como o Prefeito e
o Vice eram sócios do loteamento, passaram essa área para o nome dos
outros sócios para poder negociar o terreno com a Prefeitura. Passaram
então a área para o nome de Gilvan Ortiz, Nei Elpidio Fin e Wilson
Opolski. O acordo era o de que, depois, o terreno seria dividido em um
lote para cada um dos 10 (dez) sócios. Como a área era rural ainda e teria
que ser um módulo de 30.000 m (trinta mil metros) e só havia 24.000 m
(vinte e quatro mil metros) deixaram no nome dos três. O tempo foi
passando e as pessoas começaram a vender as suas partes. A testemunha
comprou do Wilson, do Nei e a parte do Gilvan. Ele ficou com procurações
dessas terras para depois fazer a escritura. Tem os recibos e ordem de
pagamento de R$ 9.000,00. Comprou também a parte de Ligia Kury Poloni.
Ele teria, ainda, uma parte porque era sócio. Os outros sócios eram Vera
Janete Barreto, Terezinha Crestani, José Barreto da Silva, Joarez Henrich
e Antenor Dal Vesco. Afirmou que essa área foi passada somente para o
nome de três pessoas para poder vender para a Prefeitura. Depois as
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procurações em nome dos três foram canceladas porque a Prefeitura
cancelou a licitação. A parte que comprou do Wilson e do Nei foi em seu
nome, mas a terra era para o Padre Harry. Mas as procurações dessas partes e a
do Gilvan ficaram em seu nome. Não sabe porque Gilvan cancelou a
procuração e devolveu o dinheiro para ele. Acredita que a parte de Terezinha
Crestani e Vera Janete Barreto foram vendidas para o Padre Harry, porque foi
ele quem fez o contrato. Disse que não houve desentendimento entre os sócios,
mas que os três, que tinham a terra em seus nomes, estavam vendendo a terra,
mas não era toda deles. Perguntado porque no contrato particular de compra e
venda assinado por ele, Gilvan e Iliane, consta área de 81.458 mil metros, disse
que representa 1/3 (um terço) da área. Esse contrato foi feito porque ele
comprou a terra do Gilvan e tinha a procuração. A parte do Gilvan equivalia a
R$ 9.000,00, que foi o que ele pagou. Não sabe onde Gilvan devolveu seu
dinheiro porque não recebeu esse valor.” (g.n., fl. 150/MPPR e CD na
contracapa).
15.3. Depois, foi ouvido o réu da ação de adjudicação compulsória e
ex-sócio da Jardim Vale do Capanema Ltda., Sr. Gilvan Camilo dos Santos Ortiz:
“perguntando como foi a negociação da área de 244.000 m² (duzentos e
quarenta e quatro mil metros quadrados), disse que a área era o dobro
dessa. Que fizeram um loteamento com a metade. Essa parte que sobrou
pertencia aos 10 (dez) sócios do loteamento. O loteamento foi desfeito e
essa parte que sobrou passaram para o nome dele, do Wilson e do Nei.
Afirmou que tentaram vender o terreno para a Prefeitura. Que no registro
de imóveis consta o nome dos três. Mas de fato e de direito essa área
pertence aos 10 (dez) sócios. Os 10 (dez) sócios são: ele, Nei, Wilson, Edegar,
Vera Janete, Barreto, Poloni, Antenor, Terezinha, Joarez. Disse que com o
tempo foram vendendo. Ele vendeu sua parte, 1/10 (um décimo), para o Padre
Harry, que não foi feito contrato, mas o pagamento foi feito por intermédio de
Edegar. Assinou recibo para o Edegar. Vendeu essa parte por R$ 9.000,00.
Outros 6 sócios já haviam vendido seus terrenos para o Padre Harry. Não
venderam suas partes o Joarez, Antenor e Poloni (quanto a este último,
não tem certeza). Disse que fez uma procuração para o Edegar porque queria
tirar seu nome da escritura. Disse que o Edegar desde o começo era o gerente
dessa área, comprou, fez medição. Edegar era o gerente do condomínio
também. Disse que como a sua parte era 1/10 (um décimo), ele não ia
conseguir passar do seu nome para o Padre Harry. Então, foi feito um contrato,
como ele (Gilvan) vendendo 1/3 da terra. O Edegar pegou uma procuração
do Nei e do Wilson e iria passar 70% da terra para o Padre Harry, uma
parte para o Antenor, outra para o Poloni e outra para o Joarez. Como
eles ficaram sabendo que esse acordo não estava sendo cumprido, ele cancelou
a procuração que havia feito para o Edegar e o comunicou. Disse que assinou o
recibo de recebimento de R$9.000,00 de Edegar porque o Edegar só ia
conseguir transferir a terra com a procuração e o recibo, onde constava a venda
de 1/3 (um terço) da terra, mas que, na verdade, havia vendido apenas 1/10 (um
décimo), que era a sua parte. Esse recibo foi feito apenas para Edegar poder
passar a terra para o nome do Padre Harry, Antenor, Poloni e Joarez.
Depois que a procuração foi cancelada, esse recibo foi devolvido para ele.
Disse que esse terreno ainda consta na sua declaração do imposto de renda
porque não concretizaram a operação. Após, Edegar entrou com a ação para
que ele passe 1/3 (um terço) da terra para o autor, mas disse que esse 1/3 (um
terço) não pertence nem a ele e nem a Edegar. Confirmou que não tem mais a
sua parte porque vendeu para o Padre Harry. Disse que na época negociou o
valor da sua parte com o Padre Harry, mas que quem o pagou foi Edegar, em
nome dele. Disse que Nei e Wilson também cancelaram as procurações. Disse
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que tem certeza que Edegar vendeu a parte dele para o Padre Harry, porque ele
ligou para Edegar para saber se ele tinha pedido o mesmo valor do terreno
quando vendeu a terra para o Padre e o Edegar confirmou. Não lembra como
foi feito o pagamento dos R$9.000,00, se em dinheiro, cheque ou transferência
bancária. Disse que não chegou a devolver o dinheiro para o Edegar. Disse que
o recibo foi feito para dar baixa no seu imposto de renda e o cancelou para
incluir novamente a terra na declaração. Disse que o cancelamento do recibo
foi feito logo que soube que não estavam cumprindo o acordo. Não sabe dizer
porque até hoje não passaram a terra para o nome do Padre Harry” (fl.
151/MPPR e CD na contracapa).
15.4. Foi ouvido, também, José Barreto da Silva (ex-sócio da Jardim
Vale do Capanema Ltda.):
“sobre a área de 244.000 m (duzentos e quarenta e quatro mil metros)
disse que era sócio de toda a área, cerca de 500.000 m (quinhentos mil
metros) junto com: Edegar, Antonio Poloni, Gilvan, Wilson, Nei, Joarez,
Antenor, Vera Janete, Terezinha. O que sobrou do loteamento foi essa área
de 244.000 (duzentos e quarenta e quatro mil metros). A sua parte vendeu para
o Padre Harry. Acha que vendeu por R$ 6.000,00 (seis mil reais) na época. A
sua parte era 10% (dez por cento) do total, que correspondia a um alqueire.
Afirmou que Edegar também tinha 10% (dez por cento) dessa área. Sabe que
Edegar comprou a parte do Gilvan e do Poloni. Disse que um dia até
acompanhou Edegar para fazer a escritura onde ele trabalhava (não se recorda
se era Marmeleiro ou Medianeira). Acredita que hoje a terra é de Edegar, Nei,
Joarez, Antenor e do Padre Harry. Quanto ao Wilson, não sabe dizer. Que
na matricula consta o nome de Gilvan, Wilson e Nei. Lembra que um dia a
Prefeitura tentou comprar, mas, como existiam alguns sócios que eram
funcionários da prefeitura, pegou mal e desistiram da venda. Afirmou que
foi a Medianeira uma vez com Edegar para ver os negócios de contrato, para
reconhecer firma, não tem certeza se Gilvan foi junto. Também não sabe se
Edegar conseguiu resolver os negócios do contrato. Afirmou que o Padre lhe
pagou em dinheiro e não lembra se fizeram contrato. Disse que a venda da sua
terra para o Padre não teve intermediação de Edegar. Acredita que faz uns 5
anos que vendeu sua parte.” (fl. 152/MPPR e CD na contracapa).
15.5. Outro ex-sócio da Jardim Vale do Capanema Ltda., Nei
Elpídio Fin, declarou que:
“conhece a área que está sendo objeto da ação. Confirmou que está matriculada
no seu nome, do Gilvan e do Wilson Opolski. Disse que a terra pertence a:
Edegar, Gilvan, dele, Joarez, Antenor, Vera, Terezinha, Barreto, Poloni. Disse que a matrícula ficou no nome dele, Gilvan e Wilson porque [a pessoa
em nome de quem a matrícula seria registrada] precisava ter caixa para assumir
a declaração e eles três tinham na época. Não sabe o porquê [o imóvel] não foi
colocado em nome de todos os sócios. Depois de um tempo, foram vendendo.
Afirmou que vendeu sua cota para Edegar, mas a terrra era para o Padre. Sabia
que a terra era para o Padre. Edegar pagou em dinheiro vivo. Não fez contrato.
Disse que Edegar era o gerente, o homem de confiança e passou uma
procuração para seu nome, para que ele dar andamento e passar a escritura para
os compradores. Depois de alguns anos, o Antenor e o Joarez procuraram a
testemunha para informar que estavam ocorrendo problemas na
escrituração, porque tinha uma cota o Antenor e o Joarez uma ou duas
cotas. O restante está com o Padre Harry e não estavam se entendendo.
Pediram então para ele cancelar a procuração. A testemunha cancelou a
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procuração e desde então não fez mais nada. Não sabe para quem as outras
pessoas estavam vendendo as cotas, só sabe que o Padre Harry estava
comprando todas elas. Tem certeza que o Barreto vendeu para o Padre.
Acredita que o Gilvan vendou a cota dele para o Edegar, mas que também seria
para o Padre. Sabe que ainda hoje a terra está em seu nome, do Gilvan e do
Wilson. Hoje não tem mais cota e sabe que o Gilvan também vendeu. Não sabe
se Wilson ainda tem cota. O Antenor continua proprietário, o Joarez e o
Padre Harry também pelo que sabe. Disse que Joarez, proprietário de
uma ou duas cotas, é o Prefeito de Barracão. Sabe que uma parte dessa
terra foi desapropriada para a Prefeitura. Disse que o novo fórum vai ser
construído nessa área desapropriada, que é de 200.000 m² (duzentos mil
metros quadrados). Disse que o valor da desapropriação ainda não foi
levantado. Sabe que o advogado Dr. Gilberto Verona tem autorização para
tanto, mas não foi levantado ainda. Disse que para levantar esse dinheiro, terão
de ir os três que tem o nome na matrícula e depois decidir para quem vão
repassar [o dinheiro]. Vão repassar para quem apresentar o documento para
eles. Vão repassar para quem apresentar contrato de compra e venda.
Perguntado se ele sabe que o Padre Harry não tem nenhum documento da terra,
disse que sabe que o Padre tem umas procurações. Confirmou que hoje os
proprietários são o Joarez, o Antenor e o Padre. Não sabe para quem Poloni
vendeu a cota. Perguntado se apresentassem um documento como o de fl. 7 dos
autos [numeração dos autos de adjudicação compulsória 554/2007], se ele
passava a escritura para o nome, disse que teria de analisar qual parte foi
vendida, se um 1/3 ou a cota. No caso do contrato apresentado, disse que é de
1/3 do lote. Quanto ao documento de fl. 49 [numeração dos autos de
adjudicação compulsória 554/2007], indagado se seria hábil para transferir a
escritura, disse que só o recibo ele não aceitaria, mas se fosse um contrato
como o de fl. 7 [numeração dos autos de adjudicação compulsória 554/2007]
sim. Perguntado como pretende transferir as terras ou como vão distinguir
os sócios e porque não foi feito isso até hoje, respondeu que várias vezes
disse ao Antenor e ao Joarez para resolver. Disse que desde que vendeu a
terra e passou a procuração para Edegar queria resolver a situação e
transferir a terra, porque não gosta de ficar com bens em seu nome que
não são seus. Disse que nunca mais faria o que fez porque deu muita dor
de cabeça. (fl. 155/MPPR e CD na contracapa).
15.6. Ouviu-se, também, a ex-sócia Vera Janete Motta Barreiro.
Conforme suas declarações,
“Era uma das proprietárias [da área] e vendeu sua parte e da sua irmã
Terezinha para o Padre Harry. Disse que no início eram dez sócios: Edegar,
Poloni, Nei, Wilson Opolski, ela, Terezinha Barreto, Barreto, Gilvan, Antenor,
Joarez. Que a terra ficou no nome de Gilvan, Nei e Wilson, mas Gilvan vendeu
para o Padre. O Edegar perguntou se ela queria vender sua parte e ela vendeu.
O Edegar intermediou a venda da terra dela para o Padre Harry. Acredita que o
Barreto também vendeu a parte dele para o Padre Harry. Não sabe para quem o
Wilson vendeu a dele. Não sabe da parte do Antenor e do Joarez, mas ouviu
falar que o Padre tinha comprado tudo. Acredita que hoje é tudo do Padre
Harry. Disse que quando todos os dez ainda eram sócios, soube pelo Edegar
que ele havia vendido metade da cota para o Padre. Quando existia o
loteamento, acredita que este estava em nome da esposa do Poloni, a Ligia,
mas ela nunca participou de reunião, sempre quem participava era o Poloni.
Não chegou a ver documento. Disse que fez contrato e deu recibo pela venda
da sua parte para o Padre.” (fl. 156/MPPR e CD na contracapa).
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15.7. Por intermédio de carta precatória, foi ouvido outro ex-sócio da
Jardim Vale do Capanema Ltda, o Sr. Wilson José Opolski. Ele relatou que:
“foi sócio junto com as partes do presente processo e mais sete pessoas no
empreendimento que visava o loteamento da área de 244.374,39m²; que apesar
da sociedade ser de 10 pessoas, o imóvel foi colocado no nome de apenas três,
quais sejam, Gilvan, o depoente e o Nei Elpídio Fim; que acredita que, por
força disso, não poderia Gilvan ter vendido a Edgar 1/3 do total da área,
considerando que era titular apenas de 1/10, apesar do registro imobiliário (...)”
– fl. 145/MPPR
15.8 Ouviu-se, ainda, o Sr. Harry Miguel Hoffmann (“Padre
Harry”), pessoa que adquiriu parte da área dos ex-sócios da Jardim Vale do
Capanema Ltda. Segundo ele:
“acredita que a negociação começou através da formação da sociedade, entre
10 (dez) ou 11 (onze) sócios. Tinha o loteamento e uma área rural. Foi feito um
sorteio dos lotes. Que tinham 10 (dez) cotas e 11 (onze) sócios, porque uma
cota era dividida em duas. Que entrou no negócio comprando meia parte dessa
cota. Disse que os sócios eram: Edegar Silveira, Antonio Poloni, Nei Fin,
Wilson Opolski, Vera, Terezinha Barreto, Barreto, Gilvan, Antenor,
Joarez, Laide. Disse que sua parte comprou do Laide. Depois foi
comprando a área rural, um lote depois do outro. Afirmou que depois que fez a
compra geral dos lotes, Sadi comprou uma parte de sua terra, para juntar com
uma parte que já havia comprado, para fechar um módulo rural. Que possuía 7
cotas, menos uma que era do Sadi. Todas as aquisições de cotas foram
intermediadas pelo Edegar. Só a parte que comprou do Laide, o Edegar não
intermediou. Comprou as cotas de Wilson Opolski, Nei Fin, Gilvan,
Barreto, Vera Janete, Terezinha e meia cota do Edegar. Só não comprou
do Joarez, Antenor e do Poloni. Disse que agora o Edegar não tem mais
parte. Afirmou que o Edegar não comprou a cota de Gilvan. A testemunha
disse que o Edegar entregou a ele um documento que continha a relação dos
sócios e a porcentagem de cada um (leu esse documento que diz: Harry
Miguel Hoffmann seis cotas, totalizando 146.624,63 metros; Joarez
Henrichs, duas cotas, totalizando 48.874,88 metros; Antenor Dal Vesco,
uma cota, totalizando 24.437,44 metros; Wilson Opolski, uma cota,
totalizando 24.437,44 metros). Disse que comprou a terra do Wilson depois
que Edegar fez essa relação. Afirmou que se Edegar houvesse comprado a
parte de Gilvan, estaria escrito nesse documento. Hoje os proprietários dessa
terra são: Harry, Joarez, Antenor e Sadi. Pelo que sabe, o Poloni vendeu a
parte dele para o Joarez, mas não tem certeza porque a mulher do Poloni, a
Ligia, teria vendido a mesma cota para o Edegar. Afirmou possuir contrato da
compra de apenas alguns desses lotes porque todos foram feitos através do
Edegar, na boa confiança. Não sabe porque não regularizaram a documentação,
a matrícula da terra. Preocuparam-se apenas em vender os lotes e valorizar
a área. Nunca procuraram a testemunha para regularizar a
documentação. Não sabe dizer se hoje o Joarez ainda é sócio. Disse que
conversou com Antenor uns dias antes da audiência e que conversaram
sobre essa área de terra. Declarou que Antenor perguntou como devia
proceder na audiência e a testemunha disse para dizer a verdade. Antenor
deu a entender que ainda era sócio da terra. Sabe que essa área de 244.000
m (duzentos e quarenta e quatro mil metros) foi escolhida para ser o
Fórum. Disse que tem 10 (dez) alqueires que foi para fazer a construção. Afirmou que nunca pagou os impostos relativos à terra (fl. 154/MPPR e CD na
contracapa).
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15.9. Foi ouvido, também, o Sr. Sadi Mattoso Santana, que adquiriu
parcela de terra do “Padre Harry”. Ele declarou que:
“sabe que existe essa área de mais de 244.000 m² (duzentos e quarenta e quatro
mil metros quadrados), mas não sabe de quem, ao certo, é a propriedade. Disse
que adquiriu uma parte dessa terra do Jardim Vale do Capanema. Disse
que comprou do Padre Harry. A sua parte de terra é de 6.050 m² (seis mil
e cinqüenta metros quadrados) e pagou R$ 3.000,00 (três mil reais) em
dinheiro. Não fez contrato. Afirmou que procurou o Padre Harry para fazer a
documentação da terra e o padre mandou-o procurar o Edegar, para que ele
passar a terra para seu nome. Procurou o Edegar, mas ele disse que não tinha
mais poder para fazer [a transferência] porque não tinha mais procuração. Daí
deixou do jeito que estava mesmo. Afirmou que comprou a terra com o Padre
Harry, mas que uma parte era do Wilson”. (fl. 153/MPPR e CD na contracapa).
15.10. Inquiriu-se, ainda, Odacir Claro Fernandes, pessoa que utiliza
parte do terreno para plantar. Eis o que disse Odacir:
“disse que só ouviu comentários que vão construir naquele terreno o novo
fórum, mas não sabe o lugar exato. Disse que planta no Jardim
Capanema, perto da torre e que o Padre Harry ofertou o terreno para ele
plantar na época. Já plantava perto da igreja e daí passou a plantar nessa
área. Sabe que a propriedade do terreno é do Padre. Não sabe se o Edegar
tem terreno lá perto. Disse que foi notificado verbalmente e recebeu um
documento também, pelo oficial de justiça. O documento dizia que o
Edegar era o proprietário. Como ficou em dúvida, procurou o Padre e ele
afirmou que a terra era dele e que podia continuar plantando. Planta até
hoje lá. Disse que recebeu a notificação há uns dois anos. Não lembra ao
certo o que estava escrito na notificação, mas lembra que dizia que não
podia plantar porque a terra era do Edegar. Não fez contrato com o Padre
e paga para ele o arrendamento. Sempre pagou para o Padre e este nunca
lhe deu recibo. Disse que paga 10% da produção por ano, que ficou devendo
para o padre 59 sacas de soja ano passado, porque a safra foi ruim. Disse que
quando começou a plantar derrubaram umas árvores, mas que não era “madeira
de lei”, era figueira, coqueiro e na época o Padre autorizou (fl. 157/MPPR e
CD na contracapa).
15.11. Da oitiva judicial de todas essas pessoas, resta indubitável que, em
8.2.2010 (data da audiência realizada nos autos 554/2007, desta Vara Única), embora
o imóvel matriculado sob o nº 10.356 estivesse formalmente registrado em nome de
Gilvan Camilo dos Santos Ortiz, Nei Elpidio Ortiz e Wilson José Opolski, ele
verdadeiramente pertencia aos réus Joarez Lima Henrichs, Antenor Dal Vesco e Harry
Miguel Hoffmann.
IV.5. A desapropriação de parte do terreno registrado sob a matrícula 10.356, do
Registro de Imóveis de Barracão: autos 96/2009, da Vara Única da Comarca de
Barracão
16. Ocorre que, em meados de 2009 (portanto, em data anterior à
audiência realizada em 08.02.2010, nos autos 554/2007 desta Vara Única), o Município
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de Barracão houve por bem desapropriar parcela da área registrada sob a matrícula 10.356
do Registro de Imóveis de Barracão-PR para a construção do novo Fórum da Comarca de
Barracão.
16.1. Em fevereiro de 2009, o Sr. Joarez Lima Henrichs, Prefeito de
Barracão, expediu o Decreto nº 31/2009 declarando de interesse social justamente uma
parcela da área em comento.
De acordo com o referido Decreto,
“Art. 1º. Fica declarada de interesse social para fins de desapropriação a área
de 6.000,00 m² (seis mil metros quadrados), a ser desmembrado de um todo
maior do imóvel com área de 244.379,49, compreendido pelo Lote suburbano
nº 45, remanescente da Gleba 05 do Imóvel Flores e Conceição, matriculado
no Cartório de Registro de Imóveis da Comarca de Barracão, de
propriedade de WILSON JOSÉ OPOLSKI, GILVAN CAMILO DOS
SANTOS ORTIZ E NEI ELPIDIO FIN, conforme mapas e memorais descritos
em anexo, os quais passam a fazer parte integrante do presente Decreto.
Art. 2º. A declaração de Interesse Social funda-se no art. 2º, inciso VII, da Lei
Federal nº 4.132/62, com a finalidade de construção do prédio do Fórum destinado
ao Tribunal de Justiça do Estado do Paraná.” – fl. 198/MPPR
O referido Decreto foi alterado pelo Decreto nº 39/2009, que
ampliou a área a ser desapropriada para 7.000 m² (sete mil metros quadrados) e modificou
o valor unitário da indenização da área – fl. 202/MPPR.
16.2. Embora o decreto expropriatório haja omitido o número da
matrícula, a descrição do imóvel contida na matrícula 10.356, do Registro de Imóveis de
Barracão-PR não deixa dúvida de que era ele o objeto da desapropriação.
Por um lado, foi essa a matrícula que instruiu o processo de
desapropriação (fl. 206/MPPR).
Por outro, a imissão provisória de posse e, posteriormente, a
transferência definitiva de parte do imóvel para o Município de Barracão foram averbadas
na referida matrícula (fls. 171-172/MPPR)
16.3. Assim, e em resumo: ao início de 2009, declarou-se de interesse
social, para fins de desapropriação, parte da área registrada sob a matrícula 10.356
do Registro de Imóveis de Barracão.
17. O Município de Barracão propôs a ação para desapropriação dessa
parcela da ára em 19.02.2009 (fl. 193/MPPR).
17.1. A liminar para imissão provisória na posse foi deferida em
20.02.2009 (fls. 216-219/MPPR) e levada a registro na mesma data (fls. 171-172/MPPR).
17.2. A r. sentença que julgou procedente a desapropriação foi lançada
em 16.04.2009 (fls. 245-248/MPPR) e levada a registro em 22.04.2009 (fl. 172/MPPR).
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17.3. Portanto, em 22.04.2009 (isto é, em momento anterior a
08.02.2010 - data da realização da audiência nos autos 554/2007 e da colheita das
declarações antes transcritas), parcela do imóvel registrado sob a matrícula 10.356 do
Registro de Imóveis de Barracão foi incorporada, por meio de desapropriação, ao
patrimônio do Município de Barracão-PR.6
18. Ocorre que, conforme esclareceram as diversas pessoas ouvidas no
bojo dos autos nº 554/2007 desta Vara Única (declarações acima transcritas), o imóvel
expropriado originalmente pertencia aos ex-sócios da empresa Jardim Vale do
Capanema Ltda.
Embora a maior parte desses sócios haja vendido a parte que lhes
cabia no referido imóvel, fato é que, em 08.02.2010 (data em que foram colhidas as
declarações antes transcritas e posterior à desapropriação de parcela da área), as pessoas
ouvidas nos autos 554/2007 declararam que os reais proprietários da área, naquele
momento, eram os réus Joarez Lima Henrichs e Antenor Dal Vesco (que não
venderam suas “cotas” e o réu Harry Miguel Hoffmann (que adquiriu as cotas dos
ex-sócios da Jardim Vale do Capanema Ltda.).
Como é evidente, se, em 08.02.2010, os réus Joarez Lima
Henrichs e Antenor Dal Vesco ainda eram proprietários de parte do imóvel matriculado
sob o nº 10.356, torna-se claro que, no momento da desapropriação (levada a efeito no
cerca de um ano antes, em 2009) também o eram. Afinal, a informação é a de que essas
pessoas (ora rés) não alienaram, em qualquer momento, as suas participações no imóvel
em questão.
19. Não há como se ignorar, ainda, que o Sr. Joarez Lima Henrichs,
primeiro dos réus, é o atual Prefeito de Barracão, eleito para o mandato compreendido
entre 2009-2012.
Foi ele quem expediu os decretos expropriatórios da área em
questão e que viabilizaram o desencadeamento do processo de desapropriação (atos
juntados à fl. 198/MPPR e fl. 202/MPPR).
6 Note-se que o processo de desapropriação tramitou de forma extremamente célere (em menos de três meses,
a sentença definitiva já havia sido prolatada e registrada perante o Cartório de Registro de Imóveis). Essa
situação, no entanto, não derivou exclusivamente dos reiterados (e elogiáveis) esforços do Juízo para imprimir
rapidez à solução dos litígios. Diversamente, derivou da conduta dos formais expropriados, que se deram por
citados e concordaram com o valor previamente depositado, dispensando a realização da prova pericial (fls.
230/231). Dispensaram, ainda, o prazo recursal (fls. 249/251/MPPR). Embora hajam agido dessa forma, até o
momento da audiência realizada em 08.02.2010, conforme declaração ali prestada, os formais expropriados
ainda não haviam realizado o levantamento dos valores depositados. Mais: ao que tudo indica, até meados de
outubro de 2011, data em que foi remetida cópia integral dos autos 96/2009 ao Ministério Público, tal
providência ainda não havia sido adotada (fls. 192-260/MPPR).
Essa circunstância evidencia, uma vez mais, que as pessoas que detinham o registro do imóvel não eram os
reais proprietários do imóvel. Fossem eles, ainda que houvessem concordado com os valores, já teriam
levantados o valor da indenização.
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Assim, resta claro que o Sr. Joarez Lima Henrichs, no exercício
do mandato, levou adiante desapropriação de imóvel que, ao fim e ao cabo, era de sua
propriedade.
Mais: restou evidenciado que, após o processo expropriatório, ele
seguia sendo um dos proprietários da área que remanesceu da desapropriação.
IV.6. As matrículas imobiliárias que sucederam a de nº 10.356 do Registro de Imóveis
de Barracão
20. Depois da desapropriação de parcela da área registrada na matrícula
nº 10.356, do Registro de Imóveis de Barracão-PR, abriu-se a nova matrícula 14.439, do
mesmo cartório de Registro de Imóveis (conforme informação à fl. 172-v/MPPR)
Essa nova matrícula (nº 14.439) foi aberta em 29.12.2010 (portanto,
em data posterior à realização da audiência dos autos nº 544/2007) e envolveu a área
remanescente do imóvel (fls. 301-302/MPPR).
A área remanescente foi aí registrada em nome dos formais
proprietários que figuravam na matrícula 10.356, quais sejam: Nei Elpidio Fin, Wilson
José Opolski e Gilvan Camilo dos Santos Ortiz (fls. 301-302/MPPR).
No mesmo dia da abertura da nova matrícula, houve a transferência
da propriedade remanescente para o réu Harry Miguel Hoffmann (fls. 301-302/MPPR).
21. Como era evidente, assim como os nomes dos dois primeiros réus
não figurou na matrícula nº 10.356, também não figuraria na nova matrícula. Afinal,
Joarez da Lima Henrichs (gestão 2009-2012) é o atual Prefeito do Município de
Barracão-PR e já exerceu o mesmo cargo em duas oportunidades anteriores (1997-2000 e
2001-2004) e o Sr. Antenor Dal Vesco é o ex-Prefeito desse mesmo Município (gestão
2005-2008).
22. Parte desse novo imóvel remanescente (registrado sob a matrícula
14.439 do Ofício de Registro de Imóveis de Barracão-PR), foi objeto de nova
desapropriação.
Agora, amigável e destinada à construção do Fórum Eleitoral da
Comarca de Barracão.7
Gerou, assim, duas novas matrículas: a de nº 14.711 do Registro de
Imóveis de Barracão, relativa à área que segue de propriedade particular; e a de nº 14.713,
do Registro de Imóveis de Barracão, relativa à área transferida para a União para a
construção do Fórum Eleitoral.
7 Essa segunda desapropriação não é aqui discutida e o modo como ela ocorreu será objeto de instauração
de específico procedimento perante a Promotoria de Justiça.
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IV.7. A intensa valorização imobiliária do bairro “Jardim Vale do Capanema”
23. Conforme se depreende do teor dos decretos expropriatórios nº
31/2009 e 39/2009 e da petição inicial de desapropriação (autos nº 96/2009 deste Juízo), o
objetivo da expropriação é a construção do novo Fórum da Comarca de Barracão-PR (fls.
192-196/MPPR).
A par de a área em comento ser erma e de difícil acesso (o que, de
pronto, já coloca em xeque a escolha da Administração Pública Municipal)8, fato é que a
notícia de que o Fórum será ali construído gerou intensa valorização dos terrenos
localizados nas redondezas (dentre os quais está, justamente, a parcela remanescente do
imóvel registrado sob a matrícula 10.356, que seguiu sendo de propriedade dos réus
Joarez Lima Henrichs, Antenor Dal Vesco e Harry Miguel Hoffmann).
24. Essa valorização é fato público e notório nesta cidade de Barracão-
PR (artigo 334, I, do Código de Processo Civil), conhecido por qualquer um que aqui
reside.
De toda a forma, para que se possa bem apreender a envergadura
dessa valorização imobiliária, bastam algumas comparações.
24.1. Por ocasião da desapropriação do imóvel em comento (registrado
sob a matrícula 10.356), a comissão de avaliação do Município de Barracão apontou como
valor justo para indenização a quantia de R$5,00/m² (cinco reais o metro quadrado) – fl.
208/MPPR.
Entendeu-se, então, que a indenização justa para a desapropriação
de 7.000m² (sete mil metros quadrados) de área localizada no bairro Jardim Vale do
Capanema envolvia o valor de R$35.000,00 (trinta e cinco mil reais).
Nos dias de hoje, um lote no bairro Jardim Vale do Capanema, de
apenas 430 m² (quatrocentos e trinta metros quadrados), é anunciado por R$35.000,00
(trinta e cinco mil reais).9
Ou seja, o valor do metro quadrado ali praticado passou a ser de
R$81,39 (oitenta e um reais e trinta e nove centavos).
O exemplo é emblemático.
Com o valor que, em momento imediatamente anterior à
desapropriação, era possível comprar uma propriedade de 7.000 m² (sete mil metros
quadrados) no bairro em comento; nos dias de hoje, após o anúncio da construção do
Fórum, permite a aquisição de um terreno que não ultrapassa 500 m² (quinhentos metros
quadrados).
8 Confiram-se as fotos juntadas às fls. 264-271/MPPR (CD na contracapa).
9 Anúncio consultado em http://imobiliariaarnoldosantos.com.br/?content=detalhar&id=533. Último
acesso em 07.02.2012 (fl. 272/MPPR).
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24.2. Ainda, não se pode olvidar das declarações do Sr. Sadi Mattoso
Santana, que adquiriu parcela de terra do “Padre Harry”.
Ele disse “que adquiriu uma parte dessa terra do Jardim Vale do
Capanema. Disse que comprou do Padre Harry. A sua parte de terra é de 6.050 m²
(seis mil e cinquenta metros quadrados) e pagou R$ 3.000,00 (três mil reais) em
dinheiro.” (fl. 153/MPPR e CD na contracapa).
Portanto, à época, pagou o valor aproximado de R$0,50
(cinquenta centavos) o metro quadrado de área.
Com respeito, trata-se de valor significativamente inferior aos
R$81,00/m² (oitenta e um reais por metro quadrado) que vem sendo praticado na
atualidade na região do bairro Jardim Vale do Capanema.
Quanto a isso, é de se anotar, ainda, que outros anúncios de
imóveis na região não se distanciam daquele utilizado como paradigma no item anterior,
demonstrando a intensa valorização das áreas em comento (fls. 273/275-MPPR).
24.3. Não fosse o suficiente, a transferência do Fórum para um lugar
ermo e ainda não povoado exigirá intensos investimentos públicos no local.
Por certo, as ruas terão de ser asfaltadas, o acesso melhorado,
calçadas precisarão ser construídas, transporte público deverá ser disponibilizado etc.
Se, por um lado, essas providências são necessárias para o bom
funcionamento da prestação jurisdicional na Comarca; por outro, ampliará, ainda mais, a
valorização dos imóveis localizados nos arredores.
24.4. Dentre os imóveis agraciados pela valorização (e que tendem a se
valorizar ainda mais com a instalação de novos equipamentos públicos) estará, justamente,
a área remanescente da qual foi extraída a parcela desapropriada (pertencente aos réus) e
os lotes localizados no mesmo bairro.
IV.8. Breve síntese dos fatos
25. Em síntese, dos elementos colhidos no curso do Procedimento
Investigatório nº 0016.11.000135-7, extrai-se que:
(a) os sócios da Jardim Vale do Capanema Ltda. possuíam uma grande área no
bairro de mesmo nome, sendo que parte dela foi objeto de loteamento e o restante
restou registrada na matrícula 10.536, do Registro de Imóveis de Barracão-PR;
(b) a empresa Jardim Vale do Capanema Ltda. foi dissolvida em agosto de 2002,
sendo certo que o Sr. Joarez Lima Henrichs deixou a sociedade em momento
anterior (dezembro de 2001), mediante o recebimento de uma série de lotes no
mesmo bairro Jardim Vale do Capanema;
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(c) depois da dissolução societária da Jardim Vale do Capanema Ltda., os ex-
sócios da empresa formalmente registraram o imóvel matriculado sob o nº 10.356
em nome dos Srs. Wilson José Opolski, Gilvan Camilo dos Santos Ortiz e Nei
Elpidio Fin, sendo de ciência de todos os participantes do negócio que a
propriedade era, na realidade, de todos os então dez ex-sócios;
(d) os ex-sócios foram, paulatinamente, vendendo as parcelas que lhes cabia no
imóvel registrado na matrícula nº 10.536, do Registro de Imóveis de Barracão-PR
para o réu Harry Miguel Hoffmann;
(e) em 08.02.2010, por ocasião da audiência realizada nos autos 554/2007, desta
Vara Única, restou evidenciado que seguiam proprietários do imóvel em comento,
naquele momento, os três réus desta demanda: o Sr. Joarez Lima Henrichs, o Sr.
Antenor Dal Vesco e o Sr. Harry Miguel Hoffmann;
(f) em abril de 2009 (portanto, antes da realização da audiência de 08.02.2010),
parte do imóvel em questão foi desapropriada pelo Município de Barracão, a partir
de atos expedidos pelo Sr. Prefeito Municipal Joarez de Lima Henrichs;
(g) a desapropriação de parte do imóvel tem por objeto a construção do novo
Fórum da Comarca de Barracão-PR, dado que gerou (e gerará) intensa valorização
imobiliária da área remanescente (pertencente aos três réus da presente demanda);
e
(h) essa mesma desapropriação gerou (e gerará) intensa valorização imobiliária
dos lotes localizados no bairro Jardim Vale do Capanema, sendo certo que os lotes
recebidos pelo Sr. Joares de Lima Herichs quando de sua retirada da sociedade
Jardim Vale do Capanema Ltda. são ali localizados.
Com efeito, o modo como levada a efeito a desapropriação de parte
do imóvel registrado sob a matrícula nº 10.356 do Ofício de Registro de Imóveis de
Barracão pelo Sr. Prefeito Municipal implicou em prática ímproba.
Desse ato, beneficiaram-se os dois últimos réus, que seguiram
proprietários, ao lado do Sr. Prefeito, da área remanescente.
É o que se passa a demonstrar a seguir.
V. Os atos de improbidade administrativa praticados pelos réus
V.1. A “simulação” contemplada na matrícula nº 10.536, do Registro de Imóveis de
Barracão-PR
26. Como restou evidenciado pelos elementos de prova colhidos nos
autos, inicialmente, os reais proprietários do imóvel matriculado sob o nº 10.536 eram
todos os então-sócios da empresa Jardim Vale do Capanema Ltda.
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Esses ex-sócios foram vendendo suas participações no imóvel, de
molde que restaram como reais proprietários da área os Srs. Joarez de Lima Henrichs,
Antenor Dal Vesco e Harry Miguel Hoffmann.
Ocorre que, formalmente, o imóvel estava registrado em nome de
Wilson José Opolski, Gilvan Camilo dos Santos Ortiz e Nei Elpidio Fin, pessoas que
textualmente declararam não serem proprietárias de toda a área.
27. Rigorosamente, o registro da propriedade nos moldes como foi feito
(em nome de pessoas que não são as reais proprietárias de todo o imóvel) configura
exemplo clássico de “simulação”.
Afinal, “O negócio simulado, como disse excelentemente
FERRARA, é a máscara usada para ocultar negócio diferente” (Orlando Gomes,
Introdução ao Direito Civil. 1ª ed. Universitária, Rio de Janeiro: Forense, p. 371).
Ou, como bem define Francisco Amaral,
“Simulação é uma declaração enganosa de vontade, visando produzir efeito
diverso do ostensivamente esperado. Não é vício de vontade, pois não a atinge em
sua formação. É antes uma desconfomidade consciente da declaração, realizada de
comum acordo com a pessoa a quem se destina, com o objetivo de enganar
terceiros (...)” (Direito Civil: Introdução, 2ª ed., Rio de Janeiro: Renovar, 1998,
p. 486-487).
(...)
“Há, assim, um negócio externo e um acordo interno entre as partes, que traduz o
desejo de estas atingirem um efeito jurídico diverso do produzido pelo
aparentemente praticado.”(Direito Civil: Introdução, 2ª ed., Rio de Janeiro:
Renovar, 1998, p. 488).
V.2. O objetivo da referida “simulação”: desvio de finalidade com vistas a contornar as
vedações constitucionais e legais
28. Ocorre que o objetivo dessa simulação era, dentre outros motivos
eventualmente declarados, o de omitir que o Sr. Joarez de Lima Henrichs, Prefeito do
Município de Barracão-PR, era um dos proprietários do imóvel registrado sob o nº 10.356
na ocasião em que foi ele desapropriado pelo Município de Barracão-PR.
29. Primeiro, depois de ouvidas as partes e as testemunhas que
prestaram declarações nos autos 554/2007, que tramitaram nesta Vara Única, não há
dúvida de que um dos reais proprietários do imóvel em comento era o Sr. Joarez de Lima
Henrichs, Prefeito de Barracão-PR.
30. Ora, como é sabido, o administrador público deve guardar
obediência aos princípios da impessoalidade e da moralidade (artigo 37, caput, da
Constituição da República), não sendo lícito que pratique atos que venham em seu próprio
proveito.
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Aliás, os Srs. Prefeitos Municipais submetem-se ao regramento do
Decreto-Lei nº 201/67, que tipifica penalmente as condutas de apropriar-se indevidamente
de bens ou rendas públicas; de utilizar, em proveito próprio, bens, rendas ou serviços
públicos; e de aplicar indevidamente rendas ou verbas públicas (artigo 1º, I, II e III, do
Decreto nº 201/67).
31. Logo, é evidente que o Sr. Prefeito não podia desapropriar imóvel
próprio para a construção do novo Fórum da Comarca de Barracão-PR.
E, sendo assim, o modo encontrado para “contornar” essa proibição
constitucional e legal foi, exatamente, manter o imóvel em comento registrado nos nomes
das pessoas de Wilson José Opolski, Camilo dos Santos Ortiz e Nei Elpidio Fin.
32. Com respeito, o fato de o Sr. Prefeito ser um dos reais
proprietários do imóvel em comento somado à ausência de menção formal a seu nome
na matrícula desse mesmo imóvel e ao desencadeamento de processo expropriatório que
visava adquirir exatamente o referido terreno para a construção do Fórum já
demonstram, por si, que a simulação constante da matrícula 10.356 do Registro de
Imóveis de Barracão tinha em mira contornar as vedações legais a que o Sr. Prefeito
está submetido.
Já aí resta evidenciado o desvio de finalidade de que trata o artigo
2º, par. único, e, da Lei 4.717/65.
Afinal, “ocorre o desvio de poder quando o agente pratica o ato
com inobservância do interesse público ou com objetivo diverso daquele previsto
explícita ou implicitamente na lei. O agente desvia-se ou afasta-se da finalidade que
deveria atingir para alcançar resultado diverso, não amparado na lei.” (Maria Sylvia
Zanella di Pietro, Direito Administrativo. 22ª ed., São Paulo: Atlas, 2009, p. 242).
E, na medida em que, nesses casos, “o agente não declara a sua
verdadeira intenção”, isto é, “ele procura ocultá-la para produzir a enganosa
impressão que o ato é legal” (Maria Sylvia Zanella di Pietro, Direito Administrativo.
22ª ed., São Paulo: Atlas, 2009, p. 242), cabe ao Judiciário examinar conjuntamente os
atos antecedentes, o contexto em que foi praticado e as circunstâncias posteriores à
prática do ato para verificar a ocorrência do desvio de poder (Celso Antônio Bandeira
de Mello. “Desvio de Poder”; Grandes Temas de Direito Administrativo. São Paulo:
Malheiros, 2009, p. 138).
33. No caso concreto, essa tarefa é facilitada pela contundente
declaração das pessoas já ouvidas em Juízo nos autos 554/2007.
O objetivo visado pela simulação contemplada na matrícula 10.356
é textualmente extraído das declarações prestadas nos autos nº 554/2007 deste Juízo (já
transcritas acima e que, por sua relevância, são aqui reprisados).
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33.1. Primeiro, a intenção de se alienar o imóvel para o Município de
Barracão já era antiga (como também o era a necessidade de se afastar o “percalço” de
haver, entre os sócios, pessoas integrantes da Administração Pública Municipal).
Conforme relatou José Barreto da Silva (ex-sócio da Jardim
Vale do Capanema Ltda.),“acredita que hoje a terra é de Edegar, Nei, Joarez,
Antenor, e do Padre Harry. Quanto ao Wilson, não sabe dizer. Que na matricula
consta o nome de Gilvan, Wilson e Nei. Lembra que um dia a Prefeitura tentou
comprar, mas, como existiam alguns sócios que eram funcionários da prefeitura,
pegou mal e desistiram da venda.” (fl. 152/MPPR).
33.2. Segundo, essa ideia permeou a manutenção do imóvel em nome
de Wilson José Opolski, Gilvan Camilo dos Santos Ortiz e Nei Elpidio Fin.
Conforme declarou Edegar Silveira (autor da ação de
adjudicação compulsória e um dos ex-sócios da Jardim Vale do Capanema Ltda.):
“(...) eram sócios e quando a sociedade do loteamento foi desfeita, ficou
remanescente uma área de 244.000 m (duzentos e quarente e quatro mil
metros), que foi dividida entre os 10 (dez) sócios e iam vender para a
Prefeitura. Como o Prefeito e o Vice eram sócios do loteamento, passaram
essa área para o nome dos outros sócios para poder negociar o terreno
com a Prefeitura. Passaram então a área para o nome de Gilvan Ortiz, Nei
Elpidio Fin e Wilson Opolski (...)” – fl. 150/MPPR
Essa intenção foi também relatada por Gilvan Camilo dos Santos
Ortiz, réu na adjudicação compulsória, segundo quem “tentaram vender o terreno para a
Prefeitura” (fl. 151/CD na contracapa).
33.3. Terceiro, é tão nítido que o imóvel não pertencia às pessoas em
nome de quem estava registrado que, depois de depositado o valor da indenização do
terreno há quase um ano, o valor ainda não havia sido levantado pelos três formais
proprietários.
Quanto a isso, esclareceu um deles (o Sr. Nei Elpídio Fin):
“conhece a área que está sendo objeto da ação. Confirmou que está matriculada
no seu nome, do Gilvan e do Wilson Opolski. Disse que a terra pertence a:
Edegar, Gilvan, dele, Joarez, Antenor, Vera, Terezinha, Barreto, Poloni. (...).
Depois de um tempo, foram vendendo. Afirmou que vendeu sua cota para
Edegar, mas a terra era para o Padre. Sabia que a terra era para o Padre. Edegar
pagou em dinheiro vivo. Não fez contrato (...).
Depois de alguns anos, o Antenor e o Joarez procuraram a testemunha para
informar que estavam ocorrendo problemas na escrituração, porque tinha uma
cota o Antenor e o Joarez uma ou duas cotas. O restante está com o Padre
Harry e não estavam se entendendo (...).
O Antenor continua proprietário, o Joarez e o Padre Harry também pelo que
sabe. Disse que Joarez, proprietário de uma ou duas cotas, é o Prefeito de
Barracão. Sabe que uma parte dessa terra foi desapropriada para a
Prefeitura. Disse que o novo fórum vai ser construído nessa área
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desapropriada, que é de 200.000 m² (duzentos mil metros quadrados).
Disse que o valor da desapropriação ainda não foi levantado. Sabe que o
advogado Dr. Gilberto Verona tem autorização para tanto, mas não foi
levantado ainda.
Disse que para levantar esse dinheiro, terão de ir os três que tem o nome
na matrícula e depois decidir para quem vão repassar [o dinheiro] (...) -
fl. 155/MPPR e CD na contracapa.
Aliás, o Ministério Público requisitou cópia integral do processo de
desapropriação em outubro de 2011 (fl. 167/MPPR) e, conforme as cópias então
fornecidas (fls. 192-260/MPPR), não há qualquer indicativo de que o levantamento haja
sido feito.
V.3. O desvio de finalidade inerente à desapropriação de parte do imóvel em comento
(autos 26/2009): a destinação dos valores da indenização e a valorização imobiliária do
bairro Jardim do Capanema
34. Ocorre que o desvio de finalidade não se limita à mácula que atinge
a matrícula nº 10.356 anteriormente explicitada.
Além dela, os próprios atos praticados no bojo do processo de
desapropriação estão comprometidos pela ocorrência do desvio de finalidade.
35. Em decorrência dos princípios reitores da Administração Pública,
ao réu Joarez de Lima Henrichs não era dado escolher justamente o terreno de sua
propriedade para a construção do novo Fórum da Comarca de Barracão-PR.
Quando o fez, agiu em benefício próprio (e não em prol do interesse
público), o que configura desvio de finalidade.
Nesse ponto, Hely Lopes Meirelles consigna que:
“(...) o desvio de finalidade ou de poder se verifica quando a autoridade, embora
atuando nos limites de sua competência, pratica o ato por motivos ou com fins
diversos dos objetivados pela lei ou exigidos pelo interesse público.” (Direito
Administrativo Brasileiro. 15ª ed., São Paulo: RT, 1990, p. 92).
Ao ilustrar as ocasiões em que isso ocorre, o autor esclarece:
“Tais desvios ocorrem, por exemplo, quando a autoridade pública decreta uma
desapropriação, alegando utilidade pública, mas visando, na realidade, satisfazer
interesse pessoal próprio (...)” - Direito Administrativo Brasileiro. 15ª ed., São
Paulo: RT, 1990, p. 92.
E completa dizendo que o ato eivado pelo vício de desvio de
finalidade “há de ser surpreendido e identificado por indícios e circunstâncias que
revelem a distorção fim legal, substituído habilidosamente por um fim ilegal ou imoral não
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desejado pelo legislador (...)” (Direito Administrativo Brasileiro. 15ª ed., São Paulo:
RT, 1990, p. 92).
36. Aliás, a desapropriação para fins de construção de obra pública,
visando, ao final, a valorização das áreas localizadas nas redondezas já é exemplo
doutrinário de desvio de finalidade.
A ilustração é de Diógenes Gasparini, segundo quem está
caracterizado o desvio de finalidade em situação na qual o agente público “determina a
construção de uma escola para valorizar o plano de loteamento de seu correlegionário”
(Direito Administrativo. 11ª ed., São Paulo: Saraiva, 2006, p. 144).
37. Note-se que o desvio de finalidade tratado nos presentes autos não
envolveu, tão somente, o dispêndio de verbas públicas para a aquisição de área que, na
realidade, pertence ao Sr. Prefeito.
Diversamente, o desvio de finalidade ocorrido no presente caso foi
um passo além.
Implicou a intensa valorização da área remanescente do imóvel
(pertencente aos três réus) e a valorização dos lotes recebidos pelo réu Joarez de Lima
Henrichs quando ele deixou a sociedade Jardim Vale do Capanema Ltda.
38. Nesse ponto, não pode se deixar de mencionar que o local escolhido
pelo Município de Barracão para efetuar a desapropriação necessária à construção do novo
Fórum não atende, nem mesmo minimamente, o interesse público e o ideário de amplo
acesso à Justiça.
Ora, em uma comarca sediada em município que conta com menos
de 10.000 (dez mil) habitantes, o Fórum deixará a região central (que, como é evidente, é
de mais fácil acesso).
Passará a estar localizado em um bairro afastado (considerando as
dimensões do Município de Barracão), onde as ruas sequer estão asfaltadas e não há
calçamento (termo de vistoria e fotos às fls. 264-271/MPPR).
Esse dado está a demonstrar que, em última análise, não se buscou
decidir pelo local em que o cidadão barraconense seria mais bem atendido e acessaria de
modo mais fácil a Justiça.
Ao contrário.
Buscou-se justamente a área pertencente ao Sr. Prefeito e demais
réus, que lucrará com a extrema valorização decorrente da construção da obra.10
10
Também não impressiona eventual e futura afirmação no sentido de que o Poder Público Municipal
fornecerá os equipamentos públicos necessários ao bom funcionamento da Justiça (calçamento e
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V.4. A caracterização da improbidade administrativa
39. O modo como agiram os réus configura ato de improbidade
administrativa.
40. Primeiro, os artigos 1º, caput, 2º, 3º, e 4º da Lei nº 8.429/92
dispõem que:
“Art. 1° Os atos de improbidade praticados por qualquer agente público,
servidor ou não, contra a administração direta, indireta ou fundacional de
qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos
Municípios, de Território, de empresa incorporada ao patrimônio público ou de
entidade para cuja criação ou custeio o erário haja concorrido ou concorra com
mais de cinqüenta por cento do patrimônio ou da receita anual, serão punidos na
forma desta lei.”
“Art. 2° Reputa-se agente público, para os efeitos desta lei, todo aquele que
exerce, ainda que transitoriamente ou sem remuneração, por eleição,
nomeação, designação, contratação ou qualquer outra forma de investidura
ou vínculo, mandato, cargo, emprego ou função nas entidades mencionadas no
artigo anterior.”
“Art. 3° As disposições desta lei são aplicáveis, no que couber, àquele que,
mesmo não sendo agente público, induza ou concorra para a prática do ato
de improbidade ou dele se beneficie sob qualquer forma direta ou indireta.”
“Art. 4° Os agentes públicos de qualquer nível ou hierarquia são obrigados a
velar pela estrita observância dos princípios de legalidade, impessoalidade,
moralidade e publicidade no trato dos assuntos que lhe são afetos.”
41. No caso dos autos, vislumbram-se as três modalidades de
improbidade administrativa.
a) O enriquecimento ilícito: a configuração das hipóteses previstas no artigo 9º, caput,
da Lei nº 8.429/92
42. Conforme consta do artigo 9º da Lei nº 8.429/92,
“Constitui ato de improbidade administrativa importando enriquecimento ilícito
auferir qualquer tipo de vantagem patrimonial indevida em razão do exercício de
cargo, mandato, função, emprego ou atividade nas entidades mencionadas no art.
1º desta lei (...)”
43. Diante do modo como está redigido o caput, condutas ilícitas que
impliquem vantagem patrimonial indevida em decorrência do exercício de competências
administrativas configuram ato de improbidade administrativa independentemente do fato
de se adequarem (ou não) aos incisos previstos no referido dispositivo de lei.
Conforme ensina José Roberto Pimenta Oliveira,
asfaltamento de ruas, transporte público, etc.). Ora, não há dúvidas de que esses investimentos serão
realizados. Afinal, valorizarão, ainda mais, a área pertencente aos réus.
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“Governa os tipos do artigo 9º o desvalor da conduta do agente público que se
utiliza da função pública para obtenção de vantagem patrimonial indevida,
descumprindo o dever de honestidade. Na tentativa de descrever esta violação
jurídica, a norma pretende estabelecer as situações hipotéticas específicas já
consolidadas (os incisos) em que ocorre esta criação de utilidade privada a partir
do desempenho da função pública. Todava, consciente da multi-facetária atividade
ilícita passível de ocorrer no bojo da função pública, assegura a imperatividade do
dever de honestidade em tipo geral (o caput).” (Improbidade Administrativa e
sua autonomia constitucional. Belo Horizonte: Fórum, 2009, p. 252)
44. No caso dos autos, resta evidenciado que, em decorrência do
exercício das competências administrativas de Chefe do Executivo, o réu Joarez de Lima
Henrichs pode viabilizar a desapropriação de parte de área que lhe pertencia com a
finalidade de que ali seja construído o novo Fórum da Comarca de Barracão-PR.
Com isso, promoveu evidente (e ilícita) valorização do restante da
área em comento (que seguiu lhe pertencendo ao lado dos réus Antenor Dal Vesco e
Harry Miguel Hoffmann) e dos lotes que recebeu, tempos antes, nos mesmo bairro
Jardim Vale do Capanema.
O que, por certo, configura o enriquecimento ilícito de que trata o
artigo 9º, caput, da Lei nº 8.429/92.
45. Como é evidente, a atuação dos réus revestiu-se de dolo, pois
“O dolo que se exige é o comum, a vontade genérica de fazer o que a lei
veda, ou a de não fazer o que a lei manda. Não seria preciso que o
administrador violasse um concurso ou uma licitação por motivos especiais
(como para contratar parentes, beneficiar amigos ou prejudicar adversários). O
mero ato culposo é apto, na área civil, a determinar o dever de indenizar;
quanto mais o comportamento voluntário, que consiste em fazer
conscientemente algo em contrariedade com a lei.” (Hugo Nigro Mazzili,
A defesa dos interesses difusos em Juízo: meio ambiente, consumidor,
patrimônio cultural, patrimônio público e outros interesses. 24ª ed., São
Paulo: Saraiva, 2011, p. 204, g.n.)
Ainda sobre esse assunto, confira-se a lapidar lição de Marçal
Justen Filho:
“Lembre-se que existem situações em que o dever de diligência inerente a uma
certa função impõe certas ações ou omissões cuja infração se configura como
necessariamente dolosa (ainda que na acepção de um dolo eventual).
Um exemplo permite compreender a questão. Suponha-se um piloto de avião.
A natureza de suas atribuições exige integral atenção e dedicação. Se o piloto
se distrai e omite providência necessária a impedir um acidente, tem-se de
reconhecer não apenas a culpa, mas o dolo eventual. É da essência da atividade
do piloto manter integral e permanente atenção no desempenho de sua
atividade.
O mesmo se põe relativamente aos exercentes de certas funções públicas. Não
é juridicamente admissível escusa fundada, por exemplo, na ausência de
conhecimento específico, quando for da essencial da função a adoção de toda
as providências destinadas a impedir a consumação de danos. Em outras
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palavras, existem hipóteses em que a relevância da função é tamanha que
qualquer negligência se configura como imoral.
A jurisprudência do STJ se orienta nesse sentido. Reconhece, inclusive,
que certas condutas apresentam tamanha anomalia que a configuraçao da
improbidade resulta da dimensão de sua patologia em face do dever
objetivo de diligência que recai sobre o administrador público.” (Curso de
Direito Administrativo. 7ª ed., rev. e atual., Belo Horizonte: Fórum, 2011, p.
997).
46. No caso dos autos, a atuação intencional dos réus está sobejamente
demonstrada, pois tentaram eles, a todo custo, manter sob sigilo a real propriedade da área
registrada na matrícula nº 10.356.
O tema só veio à tona com o ajuizamento da ação de adjudicação
compulsória 554/2007 e respectiva oitiva das partes e testemunhas.
b) O dano ao Erário: a configuração das hipóteses previstas no artigo 10, caput, da
Lei nº 8.429/92
47. Por sua vez, o art. 10, caput, da Lei de Improbidade Administrativa
estatui que:
“Constitui ato de improbidade administrativa que causa lesão ao erário
qualquer ação ou omissão, dolosa ou culposa que enseje perda
patrimonial, desvio, apropriação, malbaratamento ou dilapidação dos
bens ou haveres das entidades referidas no artigo inaugural da Lei n°
8.429/92 (...)”
47.1. Primeiro, tal como ocorre em relação ao artigo 9º, o caput do artigo
10 é uma cláusula geral, que abrange qualquer situação que implique prejuízo ao Erário.
47.2. No presente caso, como meio para valorizar o seu próprio imóvel (e
dos demais proprietários da área remanescente), o réu Joarez Lima Henrichs viabilizou
a desapropriação de parcela de parte do imóvel de que era proprietário (ao lado de
Antenor Dal Vesco e de Harry Miguel Hoffmann).
Por conta disso, o Município de Barracão efetuou o depósito de
R$35.000,00 (trinta e cinco mil reais) – cópia do cheque à fl. 213/MPPR e do depósito à
fl. 221/MPPR.
Ainda que seja possível que o valor não haja sido levantado por
quem quer que seja (ao menos, como já mencionado, não consta informação na cópia dos
autos de desapropriação judicial enviada a esta Promotoria de que tal providência haja
sido levada a efeito), fato é que a referida quantia foi retirada dos cofres do Município de
Barracão-PR.
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E, portanto, o Município de Barracão segue impedido de utilizar o
valor ali depositado para outras finalidades públicas.
Houve, portanto, prejuízo ao Erário, o que igualmente configura ato
de improbidade administrativa.
48. Mesmo que se afirme que o valor depositado pelo Município de
Barracão deveria, mesmo, seguir para o patrimônio dos que foram despojados da área
expropriada, não se pode perder de vista que houve prejuízo ao Erário.
Em termos bastante simples: o Município de Barracão-PR teve
seu patrimônio diminuído em R$35.000,00 (trinta e cinco mil reais) para que o fim
ilegalmente visado com a desapropriação pudesse ser atingido.
O que, com o devido respeito, é suficiente para a caracterização
do dano ao Erário.
49. Aliás, o entendimento corrente é o de que a realização de despesa
ilegal, por si, é suficiente para a caracterização de dano ao Erário (ainda que algum bem
seja revertido à Administração).11
Como afirma Hugo Nigro Mazzili: “Não raro o administrador comete ilegalidades e, ao ser cobrado, diz que está
pronta a obra que mandou fazer sem licitação, ou que os funcionários que
contratou sem concurso trabalharam regularmente, e não teria, pois, havido
dano ao patrimônio público. (...)
Tal entendimento é inaceitável porque: a) o ordenamento jurídico admite em
vários casos a presunção de lesividade ao patrimônio público; b) ainda quando
não haja dano patrimonial, a lesividade ao erário pode decorrer da própria
ilegalidade do ato praticado; c) a Lei n. 8.429/92 não sanciona apenas os atos
que causem dando ao erário ou enriquecimento ilícito do agente, mas também
os atos que importem violação a princípios da Administração; d) as sanções da
Lei de Improbidade Administrativa independem, pois, da efetiva ocorrência de
dano ao patrimônio público, salvo quanto à pena de ressarcimento; e) é ato de
improbidade administrativa, que presumivelmente causa prejuízo ao erário,
frustrar a licitude do processo licitatório ou dispensá-lo indevidamente ou
ordenar ou permitir a realização de despesas não autorizadas em lei ou
regulamento; f) não só os danos patrimonais, mas também os danos morais,
devem expressamente ser objeto de ação de responsabilidade.” (A defesa dos
interesses difusos em Juízo: meio ambiente, consumidor, patrimônio
cultural, patrimônio público e outros interesses. 24ª ed., São Paulo: Saraiva,
2011, p. 204).
50. Portanto, e com todo o respeito, não há como se deixar de
reconhecer que os atos ímprobos praticados pelos réus implicaram prejuízo ao Erário.
11
Dado que, no presente caso, sequer se faz presente.
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c) A especial violação dos princípios reitores da Administração Pública: artigo 11,
caput; e inciso I, da Lei nº 8.429/92
51. Por fim, a atuação dos réus está abrangida no artigo 11, caput; e
inciso I, da Lei nº 8.429/92:
“Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os
princípios da administração pública qualuqer ação ou omissão que viole os
deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e
notadamente:
I- praticar ato visando fim proibido em lei ou regulamento ou diverso daquele
previsto e, na regra de competência”.
51.1. Primeiro, conforme exaustivamente exposto nos itens anteriores,
valendo-se de uma simulação (que viabilizou pudesse haver a desapropriação de um
bem que, na realidade, é do Sr. Prefeito), foram expedidos os decretos exproprietórios
de parte do imóvel descrito na matrícula nº 10.356 do Registro de Imóveis de Barracão.
Essa expropriação visou a obter o terreno para a construção do
novo Fórum de Barracão, o que gerou a intensa valorização imobiliária da área
remanescente (que seguiu sendo do Sr. Prefeito e dos demais réus) e, mesmo, dos
demais lotes que o Sr. Prefeito recebeu, anteriormente, no mesmo bairro.
51.2. Quando o réu Joarez de Lima Henrichs assim agiu, atuou
visando fim vedado em lei e diverso do previsto para a competência expropriatória que
lhe foi outorgada.
Por meio de tal atuação, viabilizou a si mesmo e aos outros dois
proprietários da área remanescente – Antenor Dal Vesco e Harry Miguel Hoffmann –
indevido benefício decorrente do referido ato, pois tiveram a área que lhes pertence
valorizada.
53. Indo adiante, a Constituição Federal impõe aos agentes públicos a
submissão aos “princípios da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e
eficiência.” (CF, art. 37, caput).
Os princípios contidos na Constituição Federal são os alicerces de
validade de todo ordenamento jurídico, de modo que todos os comportamentos
contrários a estes devem ser considerados inconstitucionais.
As condutas dos réus, além de se enquadrarem no artigo 9º, caput,
artigo 10, caput e artigo 11, inciso I, todos da Lei de Improbidade Administrativa,
caracterizam, também, atos de improbidade administrativa que atentam contra os
princípios da Administração Pública (artigo 11, caput, da Lei nº 8.429/92). 54. Como visto, as condutas dos requeridos não observaram os
deveres de imparcialidade, moralidade e legalidade.
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54.1. No que concerne ao princípio da impessoalidade, Lucia Valle
Figueiredo sustenta que a atividade administrativa deve afastar-se de “qualquer
interesse político”, sendo que “favoritismos ou desfavoritismos estão proscritos.”
Segundo a autora “a impessoalidade caracteriza-se pois, na atividade administrativa,
pela valoração objetiva dos interesses públicos e privados envolvidos na relação
jurídica a se formar, independente de qualquer interesse político.” (Curso de Direito
Administrativo, 5ª ed., São Paulo, Malheiros, 2001, p. 62).
Como é possível se cogitar que houve respeito à imparcialidade
quando o imóvel escolhido pelo Município para a construção do novo Fórum é,
justamente, do Sr. Prefeito Municipal?
Como se pode conceber que houve respeito à imparcialidade
quando, ao final, o anúncio da obra pública já valorizou (e a sua execução valorizará
ainda mais) os imóveis que pertencem aos réus?
54.2. Por sua vez, no que tange ao princípio da moralidade
administrativa, Hely Lopes Meirelles leciona que:
“A moralidade administrativa constitui, hoje em dia, pressuposto de validade de
todo o ato da Administração Pública (CF, art. 37, caput). Não se trata - diz
Hauriou, o sistematizador de tal conceito - da moral comum, mas sim de uma
moral jurídica, entendida como o „conjunto de regras de conduta tiradas da
disciplina interior da Administração. Desenvolvendo sua doutrina, explica o
mesmo autor que o agente administrativo, como ser humano dotado de
capacidade de atuar, deve, necessariamente, distinguir o Bem do Mal, o
honesto do desonesto. E, ao atuar, não poderá desprezar o elemento ético
de sua conduta. Assim, não terá que decidir somente entre o legal e o ilegal,
o justo e o injusto, o conveniente e o inconveniente, o oportuno e o
inoportuno, mas também entre o honesto e o desonesto. Por considerações de
Direito e de moral, o ato administrativo não terá que obedecer somente à lei
jurídica, mas também à lei ética da própria instituição, porque nem tudo que é
legal é honesto, conforme já proclamavam os romanos: „nom omne quod licet
honestum est‟‟. A moral comum, remata Hauriou, é imposta ao homem para sua
conduta externa, a moral administrativa é imposta ao agente público para sua
conduta interna, segundo as exigências da instituição a que serve e a finalidade
de sua ação: o bem comum.
[...]
O inegável é que a moralidade administrativa integra o Direito como
elemento indissociável na sua aplicação e na sua finalidade, erigindo-se em
fator de legalidade. Daí porque o TJSP decidiu, com inegável acerto, que „o
controle jurisdicional se restringe ao exame da legalidade do ato administrativo;
mas por legalidade ou legitimidade se entende não só a conformação do ato com
a lei, como também com a moral administrativa e com o interesse coletivo”
(Direito Administrativo Brasileiro. 19ª ed., São Paulo: Malheiros Editores, p.
83/83 e 85)
A moralidade, portanto, impõe padrões de ética e probidade no trato
com a coisa pública.
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Como é possível afirmar que tais padrões são atendidos em ocasião
na qual se admite a simulação perante o registro de imóveis (registrando o bem em nome de
pessoas que não eram os reais proprietários do imóvel)?
Como se pode afirmar que se atendeu aos padrões de moralidade
quando, sendo inequívoco que o bem pertencia, de fato, aos réus (dentre eles, o Sr. Prefeito
Municipal), resolveu-se realizar processo expropriatório “justamente” de parte dessa área
para a construção do novo Fórum da Comarca?
54.3. Esses mesmos dados demonstram a violação do princípio da
legalidade. Afinal, como explica Celso Antonio Bandeira de Mello:
“como é natural, no Estado de Direito, todas as manifestações da função
administrativa submetem-se a pressupostos de legitimidade para sua válida
expressão. Observa o mestre que todas as atribuições administrativas hão de se
conformar com a “Administração Legal”. Esta, no dizer de Fritz Fleiner,
caracteriza-se por ser „posta em movimento pela lei e exercida no limite de suas
disposições‟. A plena submissão à lei é um traço basilar do Estado de Direito. O
Princípio da legalidade administrativa significa que a Administração não só está
impedida de agir contra legem ou extra legem, mas também que só pode agir
secundum legem, conforme ensina Michel Stassinopoulos. Com efeito, a relação
entre a atividade administrativa e a lei é uma relação de subordinação, a qual se
manifesta quer em sentido negativo quer em sentido positivo. É o que esclarece
Renato Alessi, ao elucidar que a lei pode proibir determinadas atividades, seja
no que concerne às finalidades, meios ou formas (sentido negativo) ou pode
impor a persecução de determinadas finalidades, a adoção de determinados
meios ou formas, porém, mais que isto, a Administração só pode fazer aquilo
que a lei consente (sentido positivo)” (Legalidade – Discricionariedade – Seus
limites e controle, RDP 86: 42)
55. Por todo o exposto, tem-se que os requeridos praticaram atos de
improbidade administrativa que atentam contra os princípios da Administração Pública,
merecendo a aplicação de sanção.
VI- As sanções pela prática de improbidade administrativa
56. A Constituição Federal (ao consagrar o dever de probidade
administrativa) e a Lei n. 8.429/92 (ao tipificar as condutas consideradas como
ímprobas) não poderiam deixar de cominar sanções para a prática dos atos de
improbidade administrativa.
56.1. O §4º do art. 37 da Constituição Federal prevê as seguintes
sanções, verbis: “Art. 37 (...)
§ 4º - Os atos de improbidade administrativa, importarão a suspensão dos
direitos políticos, a perda da função pública, a indisponibilidade dos bens e
ressarcimento ao erário, na forma e gradação previstas em lei, sem prejuízo da
ação penal cabível.”
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56.2. Diante dos fundamentos de fato e de direito supra colacionados, os
requeridos, em função de suas condutas haverem gerado enriquecimento ilícito e causado
lesão ao erário público municipal, estão sujeitos às sanções do artigo 12, incisos I e II, da
Lei 8429/92:
“Art. 12. Independentemente das sanções penais, civis e administrativas,
previstas na legislação específica, está o responsável pelo ato de improbidade
sujeito às seguintes cominações:
I - na hipótese do art. 9°, perda dos bens ou valores acrescidos ilicitamente ao
patrimônio, ressarcimento integral do dano, quando houver, perda da função
pública, suspensão dos direitos políticos de oito a dez anos, pagamento de multa
civil de até três vezes o valor do acréscimo patrimonial e proibição de contratar
com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou creditícios,
direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica da qual seja
sócio majoritário, pelo prazo de dez anos;
II - na hipótese do artigo 10, ressarcimento integral do dano, perda dos bens ou
valores acrescidos ilicitamente ao patrimônio, se concorrer esta circunstância,
perda da função pública, suspensão dos direitos políticos de 5 (cinco) a 8 (oito)
anos, pagamento de multa civil de até 2 (duas) vezes o valor do dano e proibição
de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos fiscais ou
creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de pessoa jurídica
da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de 5 (cinco) anos;”
(...)
Parágrafo único. Na fixação das penas previstas nesta lei o juiz levará em conta
a extensão do dano causado, assim como o proveito patrimonial obtido pelo
agente.
56.3. De forma sucessiva, ad cautelam, caso este d. Juízo não entenda
configurados atos administrativos que importam enriquecimento e ilícito e dano ao
Erário, sustenta-se a aplicação das sanções cominadas para quem pratica ato de
improbidade administrativa que atenta contra os princípios da Administração Pública,
previsto no art. 12, inciso III, da Lei de Improbidade Administrativa:
“Art. 12. Independentemente das sanções penais, civis e administrativas,
previstas na legislação específica, está o responsável pelo ato de improbidade
sujeito às seguintes cominações:
III - na hipótese do art. 11, ressarcimento integral do dano, se houver, perda da
função pública, suspensão dos direitos políticos de três a cinco anos, pagamento
de multa civil de até cem vezes o valor da remuneração percebida pelo agente e
proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios ou incentivos
fiscais ou creditícios, direta ou indiretamente, ainda que por intermédio de
pessoa jurídica da qual seja sócio majoritário, pelo prazo de três anos;”
VII- Os pedidos acautelatórios: artigo 12 da Lei nº 7.347/85 c.c. artigo 19 do mesmo
diploma legal e artigo 273, §7º, do Código de Processo Civil
57. A presente demanda é ajuizada com vistas a apurar a prática de
ato de improbidade administrativa decorrente do desvio de finalidade incorrido quando
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da seleção e desapropriação do terreno destinado ao novo Fórum da Comarca de
Barracão.
58. O fumus boni iuris foi demonstrado acima, indicando-se que o
agir do administrador público implicou enriquecimento ilícito para si e para os demais
reais proprietários da área remanescente (réus Antenor Dal Vesco e Harry Miguel
Hoffmann), prejuízo ao Erário decorrente da destinação de verbas públicos para pagar
o quantum indenizatório decorrente do procedimento expropriatório e afronta aos
princípios constitucionais mais basilares ao escorreito funcionamento da Administração
Pública).
59. Ocorre, no entanto, que não há como se aguardar o curso da
demanda para que as providências comecem a ser adotadas.
Caso isso ocorra, há a séria probabilidade de que, com o passar do
tempo, o imóvel em questão e o bairro em que ele está localizado sofram profundas e
intensas modificações.
Tal circunstância impedirá que se apreenda, com exatidão, o real
estado do local em que se pretende instalar o novo Fórum no momento em que foi
realizada a expropriação.
Há, ainda, o sério risco de que as vantagens indevidas auferidas
em decorrência do ato ímprobo praticado pelo primeiro réu e de que se beneficiaram os
dois últimos requeridos sejam definitivamente incorporadas ao patrimônio de tais
pessoas, intensificando, ainda mais, os danos resultantes da conduta ímproba.
Caso aos réus não se imponha aos réus a obrigação de não-fazer,
consistente em deixar de alienar ou transferir a área remanescente e os imóveis a eles
pertencentes localizados no entorno, eles terão acesso às vantagens indevidas que
decorreram de se haver expropriado a área para a construção do novo Fórum.
Ao fim e ao cabo, terão acesso aos lucros da valorização
imobiliária da referida área.
Por isso mesmo, ordem semelhante à que aqui se pede foi
referendada pelo Eg. Tribunal de Justiça do Estado do Paraná.
Confira-se:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA POR ATO DE
IMPROBIDADE. DESAPROPRIAÇÃO. IMÓVEL DE PROPRIEDADE DA
PREFEITA DO MUNICÍPIO E DE SEUS FAMILIARES. ANTECIPAÇÃO
DA TUTELA DEFERIDA PARA VEDAR A DESAPROPRIAÇÃO
ADMINISTRATIVA OU AQUISIÇÃO ONEROSA DO IMÓVEL, ATÉ O
JULGAMENTO DA AÇÃO CIVIL PÚBLICA E CONDICIONAMENTO DO
JULGAMENTO DA DESAPROPRIAÇÃO À CONCLUSÃO DA AÇÃO
CIVIL PÚBLICA. PRESENÇA DOS REQUISITOS NECESSÁRIOS PARA
ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA. VEROSSIMILHANÇA DAS
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ALEGAÇÕES CONFIGURADA NO FATO DE SE TRATAR O IMÓVEL
OBJETO DE DESAPROPRIAÇÃO DE PROPRIEDADE DA PREFEITA E
SEUS FAMILIARES. POSSÍVEL DESRESPEITO AOS PRINCÍPIOS DA
PESSOALIDADE E DA MORALIDADE DOS ATOS ADMINISTRATIVOS.
FUNDADO RECEIO DE DANO IRREPARÁVEL OU DE DIFÍCIL
REPARAÇÃO CARACTERIZADO. RISCO À MUNICIPALIDADE COM A
EFETIVAÇÃO DO ATO EXPROPRIATÓRIO. AUSÊNCIA DE PREJUÍZOS
À SAÚDE DA POPULAÇÃO LOCAL. ANTECIPAÇÃO DA TUTELA QUE
EM NADA ALTERA AS CONDIÇÕES DE ATENDIMENTO À SAÚDE DA
POPULAÇÃO LOCAL, JÁ ESTABELECIDAS HÁ LONGA DATA.
RECURSO DESPROVIDO. (TJPR - 4ª C.Cível - AI 463475-5 - Icaraíma -
Rel.: Maria Aparecida Blanco de Lima - Unânime - J. 16.12.2008)
Em sentido semelhante, consulte-se o seguinte julgado:
AGRAVO DE INSTRUMENTO - AÇÃO CIVIL PÚBLICA - LIMINAR
DEFERIDA - BLOQUEIO DE BEM IMÓVEL - OBJETO DA DEMANDA -
IRREGULARIDADE DA VENDA - PROVAS. CABIMENTO. A existência
de razoável e coerente contexto probatório que indica irregularidade na venda
de imóvel público, com apuração pelo Tribunal de Contas, propicia
ponderáveis indícios de pertinência jurídica do deferimento de liminar do
bloqueio de venda ou oneração do bem, para que se garanta o resultado da
ação. Recurso negado (TJSP, 1ª Câmara de Direito Público, Agravo de
Instrumento 0493776-43.2010.8.26.0000, Des. Danilo Panizza, j. 22.03.2011)
60. Assim, e por todo o exposto, o Ministério Público requer, em sede
liminar: 1. seja determinado a um dos Oficiais de Justiça desta Comarca para que se
dirija até o local em que se localiza o imóvel registrado sob a matrícula nº
10.356 do Registro de Imóveis da Comarca de Barracão-PR e, nessa qualidade,
lavre auto de constatação (se possível, ilustrado por tomadas fotográficas),
atestando (i) o atual estado do imóvel em questão (tanto da área expropriada
pelo Município, quanto da área remanescente pertencente aos três réus), (ii) as
condições das vias de acesso ao referido imóvel (se asfaltadas e se contam com
calçamento); (iii) a disponibilidade atual de serviços públicos para
atendimento da região (água e esgoto, luz elétrica, telefonia móvel e fixa e
transporte público); e (iv) a existência (ou não) de outros órgãos públicos
instalados nas proximidades;
2. seja imposta aos réus Joarez de Lima Henrichs, Antenor Dal Vesco e
Harry Miguel Hoffmann a obrigação de não-fazer, consistente na
impossibilidade de alienação, a qualquer título e sob qualquer forma, da área
remanescente da matrícula 10.356 do Registro de Imóveis de Barracão-PR (e
que deu origem às subseqüentes matrículas 14.439 e 14.711 do Cartório de
Registro de Imóveis de Barracão-PR), determinando-se a averbação da
presente ordem perante as três mencionadas matrículas (10.356, 14.439 e
14.711) do Registro de Imóveis desta Comarca de Barracão-PR;
3. seja imposta ao réu Joarez de Lima Henrichs a obrigação de não-fazer,
consistente na impossibilidade de alienação, a qualquer título e sob qualquer
forma, dos “lotes nº 01 e 10 da quadra nº 102; lotes nº 03 e 09 da quadra nº 104;
lotes nº 05,09,11 e 15 da quadra nº 105; lotes nº 11 da quadra nº 107; lotes nº 07,
10 e 17 da quadra nº 108; lotes nº 08 e 09 da quadra nº 109; lotes nº 03, 08 e 09
da quadra nº 110; lote nº 11 da quadra nº 111; lote nº 01 da quadra nº 112; lote
nº 09 da quadra nº 114; lote nº 04 da quadra nº 115; lote nº 05 da quadra nº 117;
lotes nº 05, 08, 09 e 11 da quadra nº 118; lotes nº 02 e 14 da quadra nº 119; lote
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nº 11 da quadra nº 120 e lote nº 12 da quadra nº 122” por si recebidos por
ocasião de sua retirada da sociedade “Jardim Vale do Capanema Ltda.” (fl.
185/MPPR), determinando-se a averbação da presente ordem perante o Ofício
de Registro de Imóveis desta Comarca de Barracão-PR.
VIII- Conclusão 61. Por todo o exposto, o Ministério Público do Estado do Paraná
requer:
a) a autuação da presente petição inicial e o recebimento dos
documentos que a instruem (entregues em Cartório, conforme
artigo 11º, §1º, Resolução 03/2009-TJPR), processando-se a
presente demanda segundo o rito estabelecido na Lei n. 8.429/92;
b) o deferimento, inaudita altera pars, dos pedidos liminares
acima formulados (tópico VII da presente petição);
c) a notificação dos requeridos, no endereço constante desta
petição inicial, para oferecerem manifestação escrita, nos termos
do art. 17, § 7o, da Lei 8.429/92;
d) a notificação do Município de Barracão para os fins do artigo
17, §3º, da Lei 8.429/92;
e) após a resposta dos requeridos, seja recebida a inicial,
realizando-se a citação dos réus para que, se quiserem, contestem
o feito no prazo legal, sob pena de revelia (devendo constar do
mandado a advertência do artigo 285, segunda parte, do Código de
Processo Civil);
f) a produção de todas as provas necessárias à demonstração do
alegado, dentre elas o depoimento pessoal dos requeridos, ouvida
de testemunhas cujo rol será oportunamente apresentado, prova
pericial, bem como a juntada de novos documentos e daqueles que
estejam em poder de terceiros e dos próprios réus (inclusive, e em
especial, o documento lido pelo réu Harry Miguel Hoffmann por
ocasião da audiência realizada no dia 8.2.2010, nos autos
554/2007, deste Juízo);
g) a observância do art. 18 da Lei 7.347/85 e do art. 27 do Código
de Processo Civil quanto aos atos processuais requeridos pelo
Ministério Público;
h) a intimação pessoal do Ministério Público para acompanhar
todos os atos do processo;
i) o julgamento de procedência da presente demanda, impondo-se
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aos requeridos as sanções previstas no art. 12, I e II da Lei nº
8.429/92:
i.1) perda do acréscimo patrimonial ilicitamente obtido pelos réus;
i.2.) suspensão dos direitos políticos pelo prazo assinalado nos incisos
I e II do artigo 12 da Lei nº 8.429/92;
i.3) perda da função pública que estiver desempenhando;
i.4) proibição de contratar com o Poder Público ou receber benefícios
fiscais ou creditícios, direta e indiretamente, ainda que por intermédio
de pessoa jurídica da qual seja sócia majoritário, pelos prazos
assinalados nos incisos I e II da Lei de Improbidade Administrativa;
i.5) pagamento de multa civil, conforme previsão dos incisos I e II do
artigo 12 da Lei de Improbidade Administrativa;
i.6) ressarcimento integral do dano, restituindo ao Erário do Município
de Barracão os valores despendidos na expropriação, devidamente
corrigidos;
j) sucessivamente, caso não sejam acolhidos os pedidos constantes
no item “i”, requer-se a aplicação das sanções previstas no art. 12,
inciso III, da Lei de Improbidade Administrativa cominada para os
atos que atentam contra os princípios da Administração Pública
(Lei 8.429/92, art. 11);
k) a condenação dos réus ao pagamento das custas processuais.
Dá-se à causa o valor de R$ 1.000,00 (mil reais), por ser ela
inestimável.
Respeitosamente.
Pede deferimento.
Barracão, 9 de fevereiro de 2012.
Andreia Cristina Bagatin
Promotora de Justiça