MATHEUS DI OSTI ROMAGNOLLI - UEL · 2020. 6. 5. · ROMAGNOLLI, Matheus Di Osti. Geopolitics and...
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MATHEUS DI OSTI ROMAGNOLLI
GEOPOLÍTICA E O JOGO WAR: PARA ALÉM DO LIVRO DIDÁTICO
Londrina 2017
MATHEUS DI OSTI ROMAGNOLLI
GEOPOLÍTICA E O JOGO WAR: PARA ALÉM DO LIVRO DIDÁTICO
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Departamento de Geociências da Universidade Estadual de Londrina, como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em Geografia. Orientadora: Prof. Dra. Léia Aparecida Veiga
Londrina 2017
MATHEUS DI OSTI ROMAGNOLLI
GEOPOLÍTICA E O JOGO WAR: PARA ALÉM DO LIVRO DIDÁTICO
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Departamento de Geociências da Universidade Estadual de Londrina, como requisito parcial à obtenção do título de Bacharel em Geografia.
BANCA EXAMINADORA
____________________________________ Orientadora: Profa. Dra. Léia Aparecida Veiga
Universidade Estadual de Londrina - UEL
____________________________________ Profa. Dra. Eloiza Cristiane Torres
Universidade Estadual de Londrina - UEL
____________________________________ Prof. Dr. Marcos Antônio Fávaro Martins
Universidade de Marília - UNIP
Londrina, 24 de fevereiro de 2017.
A todos que acreditam na ação
transformadora do ensino.
AGRADECIMENTOS
Gostaria de agradecer especialmente à Professora Léia Aparecida
Veiga, que como orientadora, foi essencial para a conclusão deste trabalho,
dispondo-se sempre a auxiliar, discutir e orientar bem como pelo pensamento
positivo, sempre acreditando na transformação que queremos para o ensino.
Quero agradecer imensamente ao Professor Marcos Antônio Fávaro
Martins pelos seus ensinamentos e incrível conhecimento no campo da Geopolítica,
que me motivaram e mostraram o caminho que quero seguir.
Quero agradecer a Professora Eloiza Cristiane Torres, por aceitar
participar da avaliação deste trabalho, pelas contribuições valiosas durante a banca
e pela confiança ao destinar pibidianos para participarem deste projeto.
Gostaria de agradecer a minha família, especialmente minha noiva,
por toda sua compreensão e incentivo nesta fase da minha vida.
Gostaria de agradecer aos estagiários do Programa Institucional de
Bolsas de Iniciação à Docência, pela disposição e colaboração no auxílio do
desenvolvimento do trabalho, sendo eles: Adriane Camargo; Ariane Marino; Arthur
Aguiar; Caio Bragueto; Caio Silva; Caroline M. Salido; Elda Thainara de Faria;
Fabiano Souza; Felipe Dias; Fernando Mazetti; Gabriel Felippe; Gabriela Andrade;
Hugo Henrique Cristiano; Ítalo Castanho; Kemily Ferreira; Laura Corrêa; Matheus
Barbosa e Rafaela Macedo Seixas.
Agradeço a todos que estiveram envolvidos na construção desse
trabalho, as escolas nas quais desenvolvi o trabalho e a todas as pessoas que me
deram suporte, orientação e, principalmente, motivação para que fosse concluído.
ROMAGNOLLI, Matheus Di Osti. Geopolítica e o jogo War: para além do livro didático. 2017. 60f. Trabalho de Conclusão de Curso (Bacharelado em Geografia) – Universidade Estadual de Londrina, Londrina, 2017.
RESUMO
Dentro de muitas salas de aulas, os livros didáticos representam o suporte do conhecimento para os alunos, o local onde parte dos saberes que terá contato ao longo dos anos escolares, estará editado para estudos. A utilização desse recurso é considerável no processo de aprendizagem, pois complementa, ilustra, correlaciona e sistematiza as temáticas abordadas. Porém, o livro didático tem se revelado como o único recurso disponível para a classe estudantil e para alguns professores. As diversas formas de abordagem dos conteúdos tem sido deixadas de lado e o livro didático tornou-se quase exclusivo meio de complemento.A partir dessas verificações e vivências, buscou-se ampliar as possibilidades de utilização de instrumentos que vão além do livro didático, utilizando o jogo War como referência nas aulas de geopolítica. O trabalho se densenvolveu com a aplicação do jogo War em turmas do Ensino Fundamental II e Ensino Médio, de diferentes escolas e grupos sociais, com o auxílio de referências teóricas encontradas em livros, como nas obras de Harold Mackinder, Nicholas Spykman e Martin Wight, artigos científicos, dissertações e monografias. Verificou-se no decorrer do trabalho que a utilização do jogo War em sala de aula contribuiu de forma significativa para o aprendizado dos alunos, assim como, diálogos e trocas de ideias. Em termos de contribuição no campo pedagógico, o jogo War possibilita a discussão de conteúdos relacionados a geopolítica e cartografia de maneira lúdica e prazerosa. Palavras-chave: Ensino de Geografia.Geopolítica. Recurso didático. Jogo War.
ROMAGNOLLI, Matheus Di Osti. Geopolitics and the game War: Beyond the didactic book. 2017. 60f. Trabalho de Conclusão de Curso (Bacharelado em Geografia) – Universidade Estadual de Londrina, Londrina, 2017.
ABSTRACT
Within many classrooms, textbooks represent the support of knowledge for students, the place where some of the knowledge that will have contact throughout the school years, will be edited for studies. The use of this resource is considerable in the learning process, since it complements, illustrates, correlates and systematizes the themes addressed. However, the textbook proved to be the only resource available to the student class and some teachers. The various ways of approaching content have been left out and the textbook has become almost exclusively a means of complementing. Based on these verifications and experiences, we sought to expand the possibilities of using instruments that go beyond the textbook, using the War game as a reference in geopolitical classes. The work was developing with the application of War game in elementary school classes two and high school of different schools and social groups, with the aid of theoretical references found in books, as in the works of Harold Mackinder, Nicholas Spykman and Martin Wight, articles Scientists, dissertations and monographs. It was verified during the work that the use of the game War in the classroom contributes significantly to the learning of the students, as well as dialogues and exchanges of ideas. In terms of contribution in the pedagogical field, the War game allows the discussion of contents related to geopolitics and cartography in a playful and pleasurable way. Key words: Teaching Geography.Geopolitic.Didactic Resource. War Game.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
Figura 1 Em destaque a divisão continental no mapa
mundi...................................................................................................................
18
Figura 2 O coração do planeta segundo
Mackinder............................................................................................................
21
Figura 3 O Mundo segundo Mackinder
(1943)..................................................................................................................
23
Figura 4 Rimland – As frimbrias da Área Pivot segundo
Spykman..............................................................................................................
26
Figura 5 Pan-regiões de Haushofer................................................................................... 28
Quadro 1 Os conteúdos de Geopolítica em alguns livros didáticos do Ensino
Fundamental II e Médio segundo Gomes e Vlach (2007)...................................
35
Quadro 2 Os conteúdos de Geopolítica na coleção de livro didático Projeto Araribá
voltada para o Ensino Fundamental II e Médio segundo Araújo
(2012)..................................................................................................................
38
Figura 6 Tabuleiro do jogo War representando o mundo a partir de uma projeção
cilíndrica...............................................................................................................
41
Figura 7 Tabuleiro do jogo War representando o mundo a partir de uma projeção
azimutal/polar......................................................................................................
42
Figura 8 Tabela de “trocas” e exércitos bônus por continente conquistado.. 44
Figura 9 Alunos do 6º ano do Ensino Fundamental II de um estabelecimento de ensino
público jogando com o tabuleiro de War com projeção
cilíndrica...............................................................................................................
46
Figura 10 Alunos do 6ºano do Ensino Fundamental II de um estabelecimento de ensino
público jogando com o tabuleiro de War com projeção
azimutal...............................................................................................................
46
Figura 11 Alunos do 2º ano do Ensino Médio de um estabelecimento de ensino da rede
privada jogando War com projeção
cilíndrica...............................................................................................................
49
Figura 12 Alunos do 2º ano do Ensino Médio de um estabelecimento de ensino da rede
privada jogando War com projeção
Azimutal...............................................................................................................
49
Figura 13 Folhas de transparência sobre o tabuleiro e anotações feitas pelo professor
durante a discussão com os
alunos..................................................................................................................
51
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
CENTO Organização do Tratado Central
EUA Estados Unidos da América
ENEM Exame Nacional do Ensino Médio
IBGE Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística
ONU Organização das Nações Unidas
OTAN Organização do Tratado do Atlântico Norte Brasileira
OTASE Organização do Tratado do Sudeste Asiático
PIBID Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência
PNLD Programa Nacional do Livro Didático
UEL Universidade Estadual de Londrina
URSS União das Repúblicas Socialistas Soviéticas
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ................................................................................................. 10
1 GEOPOLÍTICA: BASES TEÓRICAS ............................................................... 12
2 GEOGRAFIA ESCOLAR E RECURSOS DIDÁTICOS:
BREVESCONSIDERAÇÕES ACERCA DO LIVRO DIDÁTICO ....................... 30
3 JOGO COMO RECURSO DIDÁTICO NAS AULAS DE GEOGRAFIA NO
ENSINO BÁSICO ............................................................................................. 40
3.1 O JOGO WAR ...................................................................................................... 40
3.2 EXPERIÊNCIAS PRÁTICAS EM SALA DE AULA COM O JOGO WAR ............................ 433
3.3 PONTOS DE EXPLORAÇÃO PELO EDUCADOR .......................................................... 52
CONSIDERAÇÕES FINAIS............................................................................ 555
REFERÊNCIAS ................................................................................................ 57
10
INTRODUÇÃO
O estudo da Geopolítica é fundamental para compreensão da
configuração internacional da política, dos cenários mundiais, assim como as
disputas e cooperações entre Estados.
Dessa forma, verificou-se a necessidade de aproximar esse
conteúdo complexo para as faixas etárias do Ensino Básico de maneira atrativa e
significativa, atraindo a atenção dos estudantes para o assunto e buscando
estratégias que aproximem a teoria de situações que os alunos possam vivenciar ou
simular. Mas como trabalhar com conteúdos de geopolítica sem prender-se somente
no livro didático?
Nesse sentido, o presente trabalho tem como objetivo principal
discutir as possibilidades de utilização do jogo War nas aulas de geografia, em que
pese, para trabalhar conteúdos relacionados a geografia, e principalmente, a
geopolítica.
Dentre as motivações desse estudo, pode-se destacar a ausência de
recursos didáticos variados nas escolas e o fato de conviver cotidianamente com
professores que trabalham conteúdos de geopolítica utilizando somente o livro
didático enquanto recurso pedagógico.
Essa pesquisa, de abordagem qualitativa, foi realizada a partir de
levantamentos primários (aplicação do jogo em diferentes séries do Ensino Básico) e
secundários (leitura de textos diversos como artigos científicos, livros, trabalhos de
conclusão de curso e dissertações).
A redação final desse trabalho foi organizada em três partes, onde,
inicialmente, realizou-se uma discussão teórica sobre o estudo da geopolítica e os
principais autores que contribuíram para a definição desse campo de estudos, e a
exposição de obras basilares que fundamentam esse trabalho. Nesse caso, os
autores Harold Mackinder (1861-1947) e Nicolas Spykman (1893-1943) são
considerados as chaves mestras da discussão. Também utilizou-se ao longo da
pesquisa autores como Martin Wight (1913-1972) e Ray Cline (1918-1996).
Em seguida, discutiu-se sobre o livro didático enquanto um recurso
didático, apontando aspectos negativos e positivos em relação a utilização do
mesmo nas aulas de geografia.
11
Por fim, apresentou-se o jogo War enquanto um recurso
didático/pedagógico, como possibilidade de desenvolver o conhecimento Geopolítico
de maneira lúdica, abordando teorias fundamentais para a análise do espaço
geográfico.
12
1 GEOPOLÍTICA: BASES TEÓRICAS
Antes mesmo do conceito de geopolítica existir já era possível
encontrar sua influência em obras de autores clássicos. Segundo Tosta (1984, p. 1),
“[...] Napoleão Bonaparte sentenciou um dia: a política de um país está na sua
geografia”. Ainda segundo Tosta (1984), autores como Maquiavel (1469-1527),
Rosseau (1712-1778) e Montesquieu (1689-1755), trataram a influência de fatores
geográficos no desenvolvimento e estrutura das nações em suas obras, como o
Livro XIV da grande obra de Montesquieu, „Espírito das Leis‟. Inúmeros eventos
históricos constituíram fatos geopolíticos, como a assinatura do Tratado de
Tordesilhas em 1494, que dividiu o mundo em esferas de influência portuguesa e
espanhola, e a compra do território de Louisiana pelos Estados Unidos no início do
século XIX, segundo o referido autor.
No final do século XIX, de acordo com Moraes (1990), a obra de
Friedrich Ratzel (1844-1904) o tornou o grande precursor da geopolítica, mesmo
nunca tendo utilizado esse termo. Segundo Moraes (1990), Ratzel introduziu o
estudo geográfico dedicado a discussão dos problemas humanos, significando que a
relação entre sociedade e condições ambientais deveria ser a principal linha de
investigação da geografia. Sua obra tornou-se uma vertente para estudos nos
campos geográficos, antropológicos e políticos. Para Ratzel, uma teoria de Estado
que não levasse em consideração o território, não poderia ter um fundamento
seguro, ou seja, o território se faz necessário para uma análise política.
Autores clássicos do ramo em discussão declararam influências
ratzelianas em suas obras, sendo, alguns deles, Harold Mackinder (1861-1947),
Rudolf Kjellen (1864-1922) e Karl Haushofer (1869-1946).
Rudolf Kjellen introduziu o conceito de geopolítica no debate sobre a
política de Estado (TOSTA, 1984). Segundo o autor
A geopolítica compreende o estudo do Estado como organismo geográfico, isto é, como fenômeno localizado em certo espaço da Terra como um dos ramos da política. O objeto de estudo não é a Terra, mas a Terra permeada pelo domínio político (TOSTA, 1984, p. 160).
A comparação de Estado como um organismo vivo mostra uma
visão de que os Estados podem viver, crescer e decair como seres vivos,
13
corroborando a influência ratzeliana em Kjellen. Os autores consideram homem e
solo elementos inseparáveis, sendo esse último, o elemento materialmente coerente
do Estado. É visível que a proposta de Kjellen estava em inserir a geografia nas
ciências políticas (TOSTA, 1984).
Foi a partir dessas correlações, entre várias outras realizadas por
inúmeros intelectuais, que a concepção de geopolítica como sendo a política feita
em decorrência das condições ou fatores geográficos se disseminou.
Outro grande renome de destaque foi o geógrafo britânico Harold
John Mackinder (1861-1947). Mackinder se destacou por criar um método geográfico
de análise da política de poder mundial. Resguardado em sua terra natal, o grande
Império Britânico. O geógrafo britânico fez uma análise sobre projeções de poder e
como o Reino Unido estava inserido nesse contexto. Em 1904, na eternizada
conferência “The Geographical Pivot of History”, o autor propôs uma análise das
fragilidades do império britânico, a luz de uma interpretação geográfica eurasiana.
Segundo ele, a segurança britânica passava em meio ao território russo e estava
ameaçada por uma aliança russo-germânica (MELLO, 1999).
Mesmo sendo criticado por outros autores, é inegável que a
compreensão geopolítica de Mackinder influenciou a política de poder durante o
século XX, e ainda, pode ser utilizada de maneira válida para elucidar a postura de
determinados Estados na atualidade.
A primeira proposta do autor foi divulgada em 1904 e editada
algumas vezes até sua morte na década de 1940. De fato, durante grandes eventos
do século XX que colocaram sua tese a prova, como as duas Guerras Mundiais e a
Guerra Fria, a proposta do poder continental sucumbiu ao poder marítimo. Porém, os
percursos da história não tiram o valor explicativo da teoria mackinderiana (MELLO,
1999).
A teoria mackinderiana é compreendida a luz da causalidade
histórica e geográfica e tem como elementos ordenadores, segundo Mello (1999, p.
27), “[...] a visão compreensiva do mundo como sistema político fechado, a ideia de
história universal baseada na causalidade geográfica e o postulado pela supremacia
entre poder marítimo e o poder terrestre”.
À época de sua obra, Mackinder encontrava-se em um mundo onde
praticamente não havia mais terras a serem descobertas após as diversas ondas
expansionistas que o autor denominou de era colombiana. Os avanços dos meios de
14
transporte, como barcos a vapor, canais interoceânicos e as locomotivas,
interligavam as diversas áreas do planeta. Os mercados espalhados pelo mundo
estavam repartidos entre as metrópoles coloniais, mesmo que de forma desigual. O
centro da política de poder mundial era baseado em poucas nações que
configuravam as grandes potências do início do século XX. Pode-se destacar o
Reino Unido, a França, Áustria-Hungria, Alemanha e Itália, inseridas no chamado
Concerto Europeu, além dos Estados Unidos e Japão que se encontravam em pleno
crescimento, porém, politicamente praticantes de uma postura isolacionista em
relação a Europa (WIGHT, 1985).
Segundo Wight (1985, p. 31-40), o status de grande potência foi
estabelecido no contexto da política internacional após o Congresso de Viena
(1815). Sua definição é contestada e incerta, porém, alguns traços e características
são considerados peculiaridades desse grupo seleto, como ações para garantir a
paz e segurança, o que é uma condição ambígua, uma vez que possuem
preferência nas tomadas de decisões, como visto no Congresso de Viena e na
Conferência de Paris (1919), preocupando-se com questões mundiais a todo
momento ou com necessárias coalizões para derrotá-las, segundo o autor.
Foi a partir desse contexto que Mackinder chegou à conclusão que
não existiam mais fenômenos locais, o mundo configurava-se num sistema fechado
de relações, como afirmou em sua conferência na Real Sociedade Geográfica:
De agora em diante, na era pós-colombiana, novamente nos defrontaremos com um sistema político fechado e, o que não tem menos importância, a sua esfera de ação será o mundo inteiro. Todas as explosões de forças sociais que se produzam, em vez de se dissiparem num circuito circunvizinho de espaço desconhecido no qual dominam a barbárie e o caos, serão fielmente refletidas desde os mais distantes rincões do globo e, devido a isso, os elementos débeis do organismo político e econômico do mundo serão destruídos(MACKINDER, 1962, p. 242 apud MELLO,1999, p. 30).
No plano político, a sociedade internacional encontrava-se em
estado de anarquia e o sistema de Estados era dominado por poucas nações que
disputavam o poder. Até o fim da Primeira Guerra Mundial (1914-1918), a guerra era
considerada um ato legítimo de relacionamento entre os Estados,
independentemente de sua natureza, segundo Wight (1985, p. 81). Com a criação
da Liga das Nações (1919), as condições que legalizavam a guerra foram
restringidas, porém, não ilegalizadas. A não existência de um governo executivo
15
central, e um legislativo coercitivo, caracterizava o estado de anarquia internacional
entre os Estados soberanos. A desconfiança mútua prevalecia e as potências não
podiam ter certeza das intenções de outras potências (WIGHT, 1975). Esse é o
estado de natureza descrito por Thomas Hobbes (1588-1679), o estado de medo
que constrói uma postura conflituosa para a garantia da segurança.
Mackinder possuía uma visão da história universal baseada na
causalidade geográfica. Similarmente a Karl Marx, o autor construiu uma visão
materialista dela, que no caso do britânico, a história da humanidade era
condicionada pelas realidades naturais. Os desafios impostos pela natureza, como o
relevo, o clima, os recursos naturais, a localização geográfica, influenciam a história
dos povos. Um dos pontos fundamentais da análise geopolítica foi expresso por
Mackinder e é essencial para sua compreensão.Segundo ele, “[...] os desafios
impostos pelo meio ambiente acabavam por influenciar decisivamente a história dos
povos, modelando em larga medida seu caráter nacional e desenvolvendo neles
uma vocação marítima ou continental” (MELLO, 1999, p. 35).Países territorialmente
insulares ou com litorais extensos teriam maiores propensões de se expandirem
maritimamente por meio das atividades navais, como observado no decorrer da
história com os portugueses, espanhóis, britânicos, holandeses, entre outros. Já
países rodeados por terra ou com acessos desfavoráveis e limitados aos mares e
oceanos, teriam tendências a se desenvolverem e expandirem continentalmente,
como os russos, os franceses e os alemães (MELLO, 1999).
A influência geográfica é um ponto axial para a compreensão da
principal contribuição da visão Mackinderiana. Segundo o autor, “[...] é possível
analisar os processos históricos a luz da oposição oceanismo versus
continentalismo” (MELLO, 1999, p. 36). Vale ressaltar que a proposta de Mackinder
fazia parte da análise da realidade do império Britânico, principalmente da ilha da
Grã-Bretanha.
A disputa secular entre forças terrestres contra forças marinhas foi
baseada na tentativa dos poderes continentais em firmar territórios basilares e se
expandirem centrifugamente para as margens até as saídas para os mares e
oceanos nas margens continentais. Já os poderes marítimos partiriam de suas
posições exteriores para dominar as margens sufocando as forças terrestres e
impedindo uma ascensão marítima (MELLO, 1999).
16
A história revela inúmeras disputas que podem ser interpretadas
dessa maneira, como as disputas entre franceses e britânicos durante os séculos
XVIII e XIX, ou como a rivalidade entre russos e britânicos, durante o século XIX.
Nesses casos, os britânicos representaram os interesses de uma potência marítima,
e franceses e russos interesses de potências continentais (MELLO, 1999).
Durante o chamado „big game‟1entre russos e britânicos, a disputa
entre o Estado expansionista russo, em busca da secular saída para águas quentes
ao sul de seu gigantesco território, e a „rainha dos mares‟ britânica, materializou o
confronto entre terra e água durante o século XIX. Mesmo possuindo o maior litoral
do mundo, os russos ainda precisavam de novas saídas para o mar. O fato é que
grande parte dessas margens litorâneas se encontram voltadas para o oceano
ártico, situação que dificulta a navegação e os colocam distantes dos principais
portos do mundo (MELLO, 1999).
Em compensação, o Império Russo se transformou na maior massa
de território continental do mundo. A saída se encontrava em redirecionar as
tendências expansionistas continentais para as margens sul, sudeste e sudoeste do
Império, em busca de novos litorais. Foi nesse momento que os interesses russos e
britânicos se chocam e a rivalidade entre os dois Estados cresceu. Os britânicos
tinham, nas margens do Império Russo, algumas de suas principais colônias, e a
possível presença russa em meio as essas bordas continentais significavam uma
ameaça ao equilíbrio de poder que beneficiava os britânicos (MELLO, 1999).
Ao sul da Rússia encontravam-se territórios Persas e as colônias da
União Indiana, além das posses do império Turco-Otomano no Oriente Médio. A
sudoeste encontrava-se uma zona de tensão no leste europeu, com a
independência de países que pertenciam aos Turcos-Otomanos e interesses Austro-
húngaros e Alemães na região, conhecida como Balcãs. A sudeste, o crescente
expansionismo japonês disputava as terras chinesas e coreanas, impedindo o
avanço da Rússia (MELLO, 1999).
1O Big Game fez parte das disputas relacionadas ao “Concerto Europeu” do século XIX e XX, onde
nesse caso, reunia as disputas de interesses entre britânicos e russos. O foco das disputas por territórios entre os dois países mudou de rumo no início do século XX, com o surgimento de outra potência no continente europeu, a Alemanha. Após a reunificação da Alemanha em 1872, havia surgido no centro da Europa uma potência descontente e com fortes condições econômicas e militares, capaz de confrontar a supremacia britânica (MELLO, 1999). É nesse momento que o modelo geopolítico de Mackinder interfere na conduta britânica desviando os interesses ingleses para a estratégia Alemã.
17
Entre os anos de 1904 e 1905, russos e japoneses travaram uma
guerra pela posse das regiões da Coréia e Manchúria, sendo vencido pelo poder
marítimo japonês.Os britânicos apoiaram os japoneses nessa disputa, seguindo a
lógica de evitar um possível crescimento russo nas margens continentais.
Segundo Wight (1985), desde o surgimento do sistema de Estados
até o termino da 2ª Guerra Mundial, a história da política internacional tem sido
dominada por potências marítimas. Ao se observar a superfície do planeta, percebe-
se que há mais água (aproximadamente 71% da área) do que terras emersas. Isso
significa que uma potência com acesso ao mar é capaz de manter-se em contato
com a maior parte do mundo, ao passo que uma potência terrestre depende da
travessia de territórios controlados por outras potências. O poder marítimo pode
alcançar potências terrestres inimigas em locais distantes, ou até mesmo, impedir o
comércio marítimo dessas a partir de bloqueios.
Para alguns estadistas europeus, o temor do poder marítimo
acabava sendo superestimado. Segundo eles, se uma força terrestre conseguisse se
expandir em direção as bordas continentais e detiver suficientes recursos naturais e
econômicos, seriam capazes de quebrar o estrangulamento marítimo (WIGHT,
1985).
O poder terrestre surgiu como uma nova interpretação à ordem
marítima, como um plano estratégico a partir de uma zona terrestre que se
desenvolveria a partir de uma percepção geográfica. Mackinder desenvolveu sua
lógica do poder terrestre baseado na possibilidade de uma potência continental se
expandir até as margens da Eurásia, podendo assim, se tornar também uma força
marítima (WIGHT, 1985).
Martin Wight (1985) ilustra o pensamento de Mackinder em alguns
pontos essenciais para a sustentação de sua lógica terrestre. Para ele, o poder
marítimo necessita de bases territoriais seguras e produtivas para se sustentar, ou
seja, sem raízes continentais acabariam perdendo sua capacidade de mobilização.
Considerava-se mais fácil uma potência terrestre se tornar também uma potência
marítima, do que o contrário. As fronteiras do mundo haviam se esgotado e as
sociedades passariam a um sistema político fechado. E ainda, a industrialização e a
revolução dos transportes acabariam com a superioridade marítima, podendo se
deslocar mais rapidamente pelo continente em detrimento do oceano, conforme
mostra a figura 1 a seguir.
18
Figura 1 – Em destaque a divisão continental no Mapa Mundi
Destaque para a Eurásia, massa continental contínua que agrupa os continentes: europeu (roxo) e asiático (amarelo). Fonte: IBGE – Atlas Escolar
A proposta do geógrafo britânico revela uma reorganização da forma
de se observar o espaço geográfico.Para Mackinder, a divisão dos oceanos em
Pacífico, Atlântico e Índico e mares abertos como o Mediterrâneo, Caribenho, da
China, entre outros pelo mundo,constituem uma única massa de água contínua e
interligada. Para ele só existe o chamado Great Ocean, o grande oceano. O restante
da superfície, cobrindo aproximadamente 25% da superfície, corresponde as terras
emersas divididas em continentes como a América, Europa, Ásia, África, Oceania e
Antártica (MELLO, 1999).
Para Mackinder, essa divisão continental poderia ser interpretada de
outra maneira. O continente Europeu e o Asiático, na verdade, constituem um corpo
contínuo, delimitados pelos Montes Urais na Rússia. A Ásia e África também estão
conectadas pelo istmo de Suez. Isso significa que 17% da superfície emersa do
planeta se encontra continuamente ligada. Para Mackinder, esses três continentes
19
formam uma única ilha, denominada de World Island, a Ilha Mundial. Como aponta
Mello:
Em resumo, a tradicional e oficialmente aceita divisão do planeta em diversos oceanos e mares, continentes e arquipélagos cedeu lugar a uma inovadora e arrojada concepção sintética de um oceano único envolvente, com uma grande ilha central e três ilhas periféricas menores. Quanto à distribuição demográfica, cerca de 85% da população mundial, segundo o geógrafo britânico, estavam concentrados na grande ilha eurásico-africana (MELLO,1999, p. 42).
As concepções cartográficas baseadas nas visões eurocêntricas,
disseminadas pelo mundo desde as grandes navegações, centralizavam a superfície
do globo no continente europeu. Mackinder quebra isso, readequando sua
cartografia a partir da Área Pivot mundial (MELLO, 1999).
Dentro da Ilha da Mundial mackinderiana, existe uma área
estratégica para a emanação do poder terrestre. Foi nesse momento que surgiu a
ideia da Área Pivot, também conhecida como Heartland, o coração do mundo. A
época de elaboração da teoria, essa região enquadrava-se aos limites territoriais da
Rússia e posteriormente da União Soviética. Ela encontra-sena parte norte e interior
da eurásia e é rodeada por quatro regiões marginais, a Europa a oeste, o Oriente
Médio a sudoeste, o subcontinente indiano ao sul e a China ao leste. Configura-se
como a maior área de planícies ou terras baixas do mundo, facilitando a mobilidade.
Além, de possuir uma rede hidrográfica, que se divide em rios exorréicos que
deságuam no Ártico, dificultando os acessos fluviais ao interior, e rios endorréicos,
que deságuam em mares fechados como o Cáspio (MACKINDER, 1954).A condição
de enclausuramento forneceria uma proteção natural ao poder marítimo,
diferentemente das margens da Área Pivot, que estão dentro dos limites de ações
oceânicas.
A Primeira Guerra Mundial foi um dos prenúncios a respeito das
oportunidades estratégicas do poderio terrestre em relação ao marítimo, mesmo a
Alemanha, potência terrestre em vigência, sucumbindo ao final do conflito. Uma
suposta vitória alemã poderia ter colocado sobre os domínios germânicos uma parte
da ilha mundial, tornando-se uma base para a disputa com as potencias marítimas
britânica e estadunidense (WIGHT, 1985, p. 58). A intervenção dos Estados Unidos
20
da América (EUA) na 1ª guerra revela uma preocupação além do socorro aos seus
aliados.
A representação cartográfica de Mackinder se pautava na posição
basilar da Área Pivot para a compreensão geoestratégica do poder terrestre.
Segundo o autor, as margens da Área Pivot, denominadas por ele de InnerCrescent,
o Crescente Marginal ou Interno. Esse arco ao entorno configurava, para Mackinder,
as áreas de expansão naturais do Heartland. Seria a primeira zona de confronto
entre poder terrestre e marítimo, atuando como uma área de amortização e
contenção, sendo a primeira linha de defesa.
Por fim, Mackinder agrupou o restante do mundo no chamado Outer
Crescent, o crescente insular, onde se localizavam potências como o Império
Britânico, os Estados Unidos e o Japão,como pode se observar no mapa a seguir
(figura 2).
Segundo Mello (1999, p.47), “[...] O controle do Inner Crescent pelas
potências insulares ou o veto destas ao seu domínio por uma potência continental,
assegurava o equilíbrio de poder na Eurásia e a hegemonia mundial do poder
marítimo. Os russos por diversas vezes se empenharam em expandir seu controle
territorial para o Inner Crescent. As disputas aconteciam justamente nessa região,
em meio a inúmeros “estados-tampões”. Para Wight, um estado-tampão é
uma potência fraca entre duas ou mais potências fortes, mantido ou mesmo criado com a finalidade de reduzir os conflitos entre elas. Uma zona-tampão é uma região ocupada por uma ou mais potências mais fracas entre duas ou mais potências mais fortes; as vezes é definida como um vácuo de poder. Cada uma das potências mais fortes terá geralmente um interesse vital em impedir a outra de controlar a zona tampão, e levará esse interesse adiante de duas formas, possíveis de acordo com sua força. Ela ou tentará manter a zona tampão neutra e independente, ou então procurará ali estabelecer o seu próprio controle, o que poderá levá-la a longo prazo a anexar a zona-tampão e convertê-la em uma província de fronteira (1985, p. 127).
No século XIX a zona-tampão mais importante era aquela que
dividia o império Britânico da Rússia, e se estendia do Oriente Médio até o Extremo
Oriente (WIGHT, 1985).
21
Figura 2. O coração do planeta segundo Mackinder
Na figura 2 chama-se a atenção para a porção denominada Área Pivot, também conhecida como Heartland, o coração do mundo. A mesma englobava os limites territoriais da Rússia e posteriormente do conjunto de países denominados de URSS. Porção estratégica principalmente do ponto de vista de localização e de recursos naturais. Fonte:MELLO, L. I. Quem tem medo da geopolítica?. São Paulo: Hucitec; Edusp. 1999.
22
A própria concordância em aceitar a independência e as
reivindicações nacionais de inúmeros países no leste europeu após a 1ª Guerra
Mundial, teve como intenção criar um „cordão sanitário‟ entre a Alemanha e a
Rússia, a fim de equilibrar o poder dentro da Europa evitando uma aliança entre as
duas (MELLO, 1999).
O final da Primeira Guerra Mundial (1914-1918), considerada para
alguns o fracasso das teorias mackinderianas, significaram para o autor, a
revalidação de sua tese. Para Mackinder, a derrota do poder Alemão foi ocasionada
pelo enclausuramento em duas frentes de batalhas, além do bloqueio naval
britânico, minando os recursos germânicos. Para Mackinder, a não ocorrência de um
erro estratégico, poderia ter mudado a história. Se os objetivos iniciais da Alemanha
estivessem centrados na tentativa de conquista do Heartland,o país possuiria
recursos fartos para prosseguir sua campanha de dominação e expansão pela
Europa, podendo se deslocar até as margens, e então, fortificar seu poder anfíbio se
estendendo aos oceanos (MELLO, 1999).
A última grande contribuição de Mackinder está presente em seu
último artigo conhecido como “The Round World and The Winningof the Peace” de
1943. O autor reavalia o dimensionamento do Heartland, reduzindo-o quase pela
metade, porém, mantendo as características essenciais dessa área, como a
dimensão continental, as terras planas e o isolamento terrestre. A mudança de base
cartográfica das projeções planas para uma visão cilíndrica do globo terrestre,
permitiu ajustes em sua proposta. Surgiu, então, um complemento a ideia de
Heartland, o Midland Ocean, conforme figura 3, a seguir.
Segundo Mello (1999, p. 65), “[...] O conceito abarcava toda a bacia
do Atlântico Norte, com seus mares subsidiários, suas áreas insulares e suas
regiões marginais”. Ambos situados no hemisfério norte, o Heartland e o Midland
Ocean eram margeados por uma vasta extensão de areia e gelo, que serviam de
zona-tampão para as nações subdesenvolvidas do hemisfério sul.
23
Figura 3 – O Mundo segundo Mackinder (1943)
Na figura 3 destaca-se a porção denominada Midland Ocean. Mackinder reduziu a área do Heartland (mas mantendo as características essenciais dessa área como a dimensão continental, as terras planas e o isolamento terrestre). E introduziu no mapa Midland Ocean, porção que englobava a bacia do Atlântico Norte. Fonte: MELLO, L. I. Quem tem medo da geopolítica?São Paulo: Hucitec; Edusp. 1999.
24
O conceito geográfico de Mackinder, Midland Ocean, elaborado em
1943, mostrou-se válido durante ocasiões históricas. O desembarque das tropas
aliadas no litoral da França, em 1944 durante a Segunda Guerra Mundial, seguiu os
mesmos pressupostos teóricos de Mackinder ao estabelecer uma base de recursos
materiais nos Estados Unidos e Canadá, uma base avançada de concentração no
Reino Unido e uma cabeça de ponte para desembarque na França (MELLO, 1999).
A criação da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN) em 1949 e do Pacto
de Varsóvia em 1955, durante a Guerra Fria, materializaram, respectivamente, os
dois blocos de poder, o Midland Oceane o Heartland conforme o autor.
As propostas de Mackinder se difundiram pelo campo da geopolítica
e da ciência política, influenciando inúmeros intelectuais pelo mundo. Nicolas
Spykman, holandês ratificado nos Estados Unidos, professor da Universidade de
Yale, parte dos manuscritos do geógrafo britânico para desenvolver sua concepção
geoestratégica. Para Spykman, a partir da análise dos fatores geográficos é possível
identificar problemas de segurança geográficos, e suas implicações devem ser de
uso para representantes do Estado encarregados de formular a política exterior.
Resumidamente, a “[...] base geográfica de um Estado tem grande influência na sua
política exterior” (TOSTA, 1984, p. 73).
Em seus estudos sobre políticas de segurança, Spykman posicionou
os Estados Unidos como o centro do mundo para se obter uma visão relativa dos
outros continentes (TOSTA, 1984).
Entre os anos 1919 e 1939, o debate entre idealistas e realistas
estiveram presentes em assuntos voltados a relações internacionais. Os idealistas
eram aqueles que buscavam a segurança de maneira coletiva, envolvendo uma
comunidade em torno disso. Os realistas se pautavam em “[...] critérios estritos da
segurança e dos interesses nacionais” (MELLO, 1999, p.94). Ao mesmo tempo,
havia aqueles que defendiam uma postura conservadora, aquém do mundo exterior,
se isolando dos assuntos externos.
Spykman além de defender um ideal realista, detinha uma postura
antagônica aos isolacionistas. Para ele, se as alterações no equilíbrio de poder
colocassem a segurança e os interesse do país em risco, a intervenção era a saída,
segundo o referido autor.
O sistema internacional, segundo Spykman, configurava-se como
uma mesa de bilhar, onde os países eram as bolas,sendo praticamente inevitável
25
evitar o choque entre elas. De acordo com Mello (1999, p. 95), “[...] A ordem
internacional é garantida por um grupo seleto de grandes potências que, pela
diplomacia ou pela força, controlam e subordinam as médias e pequenas potências”.
Para o referido autor, a política de poder entre os Estados visa a auto-preservação
ea garantia de segurança do país, que segundo Spykman, deveria partir das regiões
externas ao território americano. Isso significa que as primeiras linhas de defesa
deveriam se encontrar nos lados opostos do litoral Atlântico e Pacífico do país. O
primeiro front da costa atlântica deveria se encontrar na Europa, e o da costa do
pacífico, no extremo oriente, ou seja, nas pontas da World Island.
Diferentemente da visão mundial, a partir de projeções cilíndricas,
Spykman adotou uma visão cartográfica polar que altera as concepções de distância
entre os continentes, revelando uma proximidade entre a América do Norte e a
Eurásia, potencializando a importância das margens desse último bloco de terra.
(MELLO, 1999).
Essas foram as razões pelas quais Spykman percebeu a posição
estratégica do Inner Crescent de Mackinder. Para o estrategista americano, o
equilíbrio de poder na Eurásia encontrava-se nessa região. Foi então que surgiu o
conceito chave de sua obra, o Rimland, como pode-se observar no mapa abaixo
(figura 4).
Foi justamente nesse local onde esteve centrada a disputa
nevrálgica entre Estados Unidos e União Soviética durante a Guerra Fria.A
estratégia Americana estava fundamentada no antagonismo expansão-contenção,
na tendência russa de expandir até os mares e na contenção do poder russo nas
margens (MELLO, 1999).
26
Figura 4 –Rimland – As frimbrias da Área Pivot segundo Spykman
Na figura 4, Spykman destacou no mapa a proximidade entre a América do Norte (em verde) e a Eurásia (cor vermelha), potencializando a importância estratégica das margens da porção Eurasiana (parte vermelha), denominada de Rimland por Spyman.
Fonte: SEQUEIRA, Jorge Manuel Dias. As Teorias Geopolíticas e Portugal. Revista Militar, Lisboa, n. 2547, abr. 2014. Disponível em: <https://www.revistamilitar.pt/artigo/914>. Acesso em: 17 nov. 2016.
27
Durante a Guerra Fria, vários acordos militares foram estimados
seguindo a lógica Heartland versus Rimland. A Organização do Tratado do Atlântico
Norte (OTAN) visa conter a expansão soviética no Rimland europeu. A Organização
do Tratado do Sudeste Asiático (OTASE) e a Organização do Tratado Central
(CENTO) objetivavam o bloqueio do Rimland no sudeste asiático e no Oriente
Médio. Acordos bilaterais também foram estabelecidos com o Japão, Coréia do Sul,
Taiwan e Filipinas.
O caso do Japão chama a atenção, pois, logo após o fim da 2ª
Guerra Mundial, os invasores americanos foram responsáveis por sua reconstrução.
Os Estados Unidos permitiram até mesmo a remilitarização do Japão, como
estratégia de segurança para o equilíbrio do poder, bloqueando a União Soviética no
extremo oriente. Todos esses acordos colocaram em prática a proposta de
contenção americana, idealizadas por George Kennan e inspiradas nos trabalhos de
Spykman (MELLO, 1999).
Durante a Segunda Guerra Mundial, o principal receio de Spykman
era uma ascensão e partilha da Eurásia entre japoneses e alemães. Esse temor se
assemelhava com aquela preocupação de Mackinder durante o início do século XX,
de uma possível aliança russo-germânica (MELLO, 1999). Para Spykman, uma
suposta vitória do eixo nas extremidades do Rimland, liberariam a Alemanha e o
Japão para se voltarem contra seus outros inimigos, iniciando um movimento
extirpador no ocidente.
A partir dessa hipótese, de acordo com Mello (1999),a saída
encontrada por Spykman estava na integração do continente americano numa
ordem centralizada. Essa ideia remonta as proposições criadas pelo General-
geógrafo alemão, Karl Haushofer. A ideia central de Haushofer estava baseada
numa divisão de poder em regiões pelo mundo, cada uma dessas lideradas por uma
potência. Essas alianças fundamentavam-se na utilidade que a divisão de poder
proporcionaria a elas. Para ele, a Euráfrica se tornaria esfera de influência Alemã, o
território do Heartland mais o subcontinente indiano estariam sob posse da Rússia, o
extremo oriente e a Oceania seriam governadas pelo Japão, restando assim, o
continente americano, que formaria uma zona de influência dos Estados Unidos.
Essas quatro divisões foram chamadas por ele de pan-regiões e podem ser
observadas no mapa a seguir (figura 5).
28
Figura5 –Pan-regiões de Haushofer
Na figura 5 chama-se a atenção para a divisão de poder em regiões pelo mundo, cada uma dessas lideradas por uma potência, segundo Haushofer.
Fonte: TOSTA, O.Teorias Geopolíticas. Rio de Janeiro: Biblioteca do Exército, 1984.
29
Para Spykman, a única forma de compensar o poder das pan-
regiões era através da integração. O cenário ideal, segundo o estrategista
americano, seria o estabelecimento de um equilíbrio de poder na Eurásia.
A partir das ideias discutidas anteriormente, tem-se a possibilidade
de trabalhar com os alunos do Ensino Básico, principalmente do Ensino Médio,
algumas questões de suma importância para a compreensão da geopolítica mundial
nos períodos das duas grandes Guerras Mundiais e da Guerra Fria. No entanto, tais
abordagens não se fazem presentes nos conteúdos dos livros didáticos, principal
recurso didático impresso utilizado em sala de aula.
30
2 GEOGRAFIA ESCOLAR E RECURSOS DIDÁTICOS: BREVES
CONSIDERAÇÕES ACERCA DO LIVRO DIDÁTICO
Nas escolas brasileiras de Ensino Básico, públicas e privadas,
dentre os principais recursos didáticos2 utilizados em sala de aula pelo professor de
geografia, pode-se afirmar que o livro didático continua sendo um dos principais
recursos adotados. Para Castellar e Vilhena (2009, p. 51), a presença desse recurso
ocorre mesmo em tempos de inovação tecnológica nos estabelecimentos de ensino
(computador, multimídia), ou seja, os tempos são outros, mas, “[...] o livro didático
escolar continua sendo um dos suportes mais importantes no cotidiano escolar [...]”.
No entanto, diferente do cotidiano escolar, nos diversos cursos de
licenciatura, muito se discute sobre o uso do livro didático, havendo posicionamentos
contrários e favoráveis ao uso desse. O mesmo ocorre no campo da geografia,
campo fértil para discussão acerca desse instrumento que faz parte da geografia
escolar desde o período anterior a 1934, quando foi criado o primeiro curso de
geografia no Brasil. De acordo com Sene (2014, p. 35), um dos livros didáticos de
notória importância na geografia escolar brasileira
[...] foi publicado em 1913: Geographia do Brasil, de Carlos Miguel Delgado de Carvalho. Esse autor e também professor do Colégio Pedro II era um representante da Geografia moderna, de cunho cronológico, que buscava romper com os paradigmas da Geografia clássica, de cunho corográfico, até então vigente (o livro do padre Cazal era um representante dessa linha).
A adoção desse material foi crescente nas décadas posteriores a
1930, podendo ser classificada a partir de três momentos históricos: a) primeiro
momento ocorreu de 1913 a 1960, quando livros de autoria passaram a ser
adotados pela geografia escolar, tendo como principais autores: Delgado de
Carvalho e Aroldo de Azevedo; b) um segundo momento pode ser destacado a partir
do final da década de 1960, a partir da lei 5692/71 que instituiu o tempo de 08 anos
para a conclusão do Primeiro Grau (atual Ensino Fundamental I e II) e de 03 anos
para o Segundo Grau (atual Ensino Médio), período esse marcado por diversidade
2Segundo Souza (2007), recurso didático é todo material utilizado como auxílio no ensino-
aprendizagem do conteúdo proposto para ser aplicado pelo professor a seus alunos. Os recursos didáticos compreendem uma diversidade de instrumentos e métodos pedagógicos que são utilizados como suporte experimental no desenvolvimento das aulas e na organização do processo de ensino e de aprendizagem.
31
de manuais didáticos de geografia e da adoção das primeiras coleções didáticas; e
por fim, o terceiro período, que foi iniciado na segunda metade dos anos 1990, a
partir da organização curricular realizada e da promulgação da Lei de Diretrizes e
Bases da Educação Nacional, nº 9.394/96. Desde então, os livros didáticos têm sido
elaborados e avaliados conforme as novas bases curriculares (Parâmetros
Curriculares Nacionais para a Educação Básica) e os critérios indicados pelo
Programa Nacional do Livro Didático – PNLD do Ministério da Educação
(AZAMBUJA, 2014).
Período após período, o livro didático de geografia, desde 1913, tem
reforçado seu status de principal recurso didático no processo de ensino-
aprendizagem, ao mesmo tempo em que passou também a ser alvo de críticas
positivas e negativas por pesquisadores da academia.
Para Pina (2009), partindo dos apontamentos de Choppin (2004), é
possível sintetizar as principais críticas em termos de papel/funções ocupadas pelo
livro didático nas salas de aula de geografia da seguinte forma: função referencial;
função instrumental; função ideológica e cultural; função documental.
Na função referencial, segundo Pina (2009, p. 22), o manual escolar
passou a ser visto “[...] como um privilegiado suporte teórico de conteúdos
programáticos, instituídos por um determinado grupo social que seleciona o que
deve ser transmitido às futuras gerações”. Ou seja, embora os estudantes tenham
começado a ter acesso ao livro didático, o mesmo não perdeu sua importância na
formação de professores, ao passo que muitos desses utilizam esse recurso como
alicerce de sua prática pedagógica.
De acordo com Pina (2009), tal fato pode ser comprovado a partir da
análise das capas dos livros didáticos, que fazem menção a propostas de conteúdos
referendados em documentos curriculares oficiais estabelecidos para os diversos
períodos históricos do Brasil. Como exemplo a autora cita livros didáticos de
geografia com referência aos programas curriculares do Colégio Pedro II utilizados
nas primeiras décadas do século XX e posteriormente a partir das décadas de 1930,
1970 e 1990, cujas referências curriculares se encontram alicerçadas na legislação
de cada década.
Ao ser utilizado como suporte privilegiado de conteúdos, seja para
seleção do que será trabalhado junto aos alunos, seja para a formação de
professores (instrumento teórico-metodológico), ainda é comum, em muitas
32
escolas,professores que estudam o conteúdo e preparam as aulas a partir dos textos
do livro didático. Nas palavras de Rua (1998, p. 90), “[...] no livro didático muitos
estudam e preparam a aula”.
Katuta (2007, s/p), ao discutir sobre o professor das séries iniciais e
o livro didático, afirma que tal fato se deve a deficiência na formação de professores,
pois “[...] a questão da formação docente tem sido relegada a um segundo plano. O
que torna os professores, em sua grande maioria, reféns dos livros didáticos”. Porém
tal constatação não ocorre somente nas séries iniciais. Rua (1998, p. 89), ao discutir
a problemática tendo por base o ensino Fundamental II e o Ensino Médio, afirma
que o problema reside na formação do professor e nas condições de trabalho, ao
passo que
[...] A maioria dos professores vive massacrada pelas precárias condições de trabalho, sem tempo para ele mesmo elaborar o conhecimento e criar ideias próprias. Ideias que não sejam, apenas, aquelas contidas nos livros didáticos e que, também, não sejam as mesmas que ele recebeu na Universidade quando da época da sua formação. Na verdade, o que tem acontecido com grande parte dos professores, e que eles, por um lado, repetem o que receberam na universidade, não importa ha quanta tempo. Por outro, reproduzem o que o livro didático contém.
Para Rua (1992), no caso da formação do professor, o livro didático,
entendido enquanto modelo padrão, acabaria resultando na modelagem dos
docentes pelo recurso didático.
A segunda função/papel do livro didático seria a instrumental.
Segundo Pina (2009) e Dias (2010), nessa função o livro didático passa a ditar os
exercícios e/ou atividades objetivando a memorização dos conhecimentos, resolução
de problemas e também propondo métodos de aprendizagem. Pina (2009, p. 23),
assevera que tais características tornaram o livro escolar “[...] em muitos casos, o
mais importante e imprescindível para o desenvolvimento da prática didático-
pedagógica de alguns docentes [...]”. A esse respeito, Rua (1998, p. 90) afirma que
“[...] para a grande parte [...] o livro didático acaba se colocando como o grande
salvador, o único instrumento de trabalho e sendo o principal intermediador das
relações com os alunos”.
Essa adoção do livro didático como a única verdade ou última
instância ou padrão de excelência a ser adotado em sala de aula, distancia o
recurso do seu papel de auxiliar. Ou seja, “[...] o livro didático não serve aos
33
professores como simples fio condutor de seus trabalhos, mas passa a assumir o
caráter de „critério de verdade‟ e „ultima palavra‟ sobre o assunto” (RUA, 1992, p.
149)
A terceira função ou papel do livro didático denominada por Choppin
(2004) seria a ideológica e cultural, na qual segundo Dias (2010, p. 87), o livro
didático “[...] torna-se um dos vetores essenciais da língua, da cultura e dos valores
das classes dirigentes, inclusive para a construção da identidade”.
Acerca da questão ideológica X livro didático, seja por meio da
abordagem do conteúdo seja pelas imagens, no entendimento de Souza (2014, p.
16), o livro didático é
“[...] muito mais do que simples material didático, o livro se configura como um instrumento político, um espaço que sofre a ação do complexo processo das relações e interesses, sob a ação de grupos articulados com o poder instituído, além do que, a própria comissão responsável pela análise dos livros também não é isenta de ideologia e nem desatrelada dos próprios mecanismos reguladores do Estado, e determina o fragmento do conhecimento a ser transmitido.
Portanto, cabe ao professor estar atento a essa questão, tendo em
vista que o livro didático pode conter um projeto de manutenção e/ou criação de uma
sociedade desejada pelos grupos próximos ao poder, excluindo ao mesmo tempo
parcela significativa dos grupos sociais historicamente deixados a margem.
E por fim, tem-se a função documental, na qual o livro didático é
concebido enquanto um recurso didático repleto de documentos que, mediante a
observação e/ou confrontação, podem contribuir no desenvolvimento crítico do aluno
(DIAS, 2010). Pina (2009, p. 29), ao discutir a função documental, afirma que o livro
visto enquanto material repleto de documentos pode contribuir na medida “[...] em
que o aluno possa acessar documentos necessários ao desenvolvimento dos
conteúdos, assim como recorre a imagens (fotografias, mapas, imagens de satélites,
etc.) que para o ensino e aprendizagem de geografia são documentos
imprescindíveis”.
Essa função coloca esse recurso didático como material de apoio,
ou seja, passa a ser visto como um documento a mais e não como verdade absoluta
(DIAS, 2010; PINA, 2009).
34
Conceber o livro didático de geografia enquanto mais um recurso de
apoio e fonte de documentos diversos vai ao encontro das ideias discutidas por
Vesentini na segunda metade da década de 1980, quando o autor afirmara que
O professor pode e deve encarar o manual não como o definidor de todo o seu curso, de todas as suas aulas, mas fundamentalmente como um instrumento que está a seu serviço, a serviço de seus objetivos e propostas de trabalho. Trata-se de usar criticamente o manual, relativizando-o, confrontando-o com outros livros, com informações de jornais e revistas, com a realidade circundante (VESENTINI, 1989, p. 167).
Nesse sentido, Vlach e Gomes (2007, p. 18), afirmam que “[...] o
livro didático em sala de aula exige uma reflexão sobre suas reais funções e a
verificação de como ele está sendo utilizado na escola: como um recurso de apoio
ou como uma “bíblia”, a ser seguida à risca, sem criticidade”.
Portanto, não se trata de ser a favor ou contra o uso do livro didático
durante as aulas de geografia, mas sim de refletir como esse recurso tem sido
utilizado ao longo dos tempos nas inúmeras escolas brasileiras e propor ações
pedagógicas que possam potencializar a utilização do mesmo no contexto atual do
ensino básico no país. Até porque, em um contexto educacional com constante falta
de infra-estrutura nos estabelecimentos de ensino3, no qual inúmeros professores
pontuam a insuficiência de recursos e de material de apoio à pesquisa, não há lógica
em se descartar um dos poucos recursos didáticos presentes em todas as escolas
públicas.
É importante destacar que nesse percurso de entendimento do livro
didático de geografia enquanto fonte de documentos diversos (textos, figuras,
imagens de satélite, textos jornalísticos, etc.), nem sempre esse recurso poderá dar
conta dos conteúdos necessários para a formação do estudante, devido a sua
própria natureza enquanto material de apoio. Assim, defende-se que o mesmo
possa e deva ser utilizado nas salas de aulas, mas como um recurso didático de
apoio que, somado aos demais recursos, contribuirá no processo de ensino e
aprendizagem nas salas de aula.
3Nesse sentido, pode-se citar como exemplo o estudo realizado por Gomes e Vlach (2007, p. 18), que ao entrevistarem professores de distritos de Uberlândia/MG, obtiveram como resposta que as escolas possuem alguns mapas, livros, periódicos e atlas antigos.
35
Como exemplo, pode-se citar o caso dos conteúdos de geopolítica,
que dependendo do livro didático, são contemplados de forma superficial ou até
mesmo de forma não explícita, algo que pode ser verificado em estudos que buscam
discutir geopolítica e o ensino de geografia a partir da análise de livros didáticos.
Vlach e Gomes (2007), no decorrer de uma pesquisa realizada junto
com as escolas de áreas distritais de Uberlândia/MG (entrevistando professores,
alunos e analisando livros didáticos adotados por esses estabelecimentos de ensino
Fundamental II e Médio), verificaram os conteúdos de geopolítica presentes nos
livros didáticos adotados pelas escolas objeto da pesquisa (quadro 01),são
conteúdos geopolíticos que, embora apresentados em um livro didático com
abordagem crítica e a partir do uso de vários recursos (textos, mapas, figuras,
charges, etc), ainda são abordados de forma fragmentada de uma série para outra e
em linhas gerais, sem um aprofundamento maior.
Quadro 01 –Os conteúdos de geopolítica em alguns livros didáticos do Ensino
Fundamental II e Médio segundo Gomes e Vlach (2007)
Livro didático Nível Estrutura do livro Conteúdos de Geopolítica
LUCCI, ElianAlabi; BRANDO, Anselmo Lazaro; MENDONÇA, Cláudio. Território e Sociedade no mundo globalizado: Geografia Geral e do Brasil: Ensino Médio; volume único/ 1°. Ed. – São Paulo: Saraiva, 2005
Ensino Médio – 1º ao 3º ano.
* Geopolítica, meio ambiente, economia e sociedade são tratados de maneira abrangente. *Obra dividida em unidades temáticas e subdividida em capítulos, apresentando vários recursos (textos de apoio, imagens, mapas, gráficos, tabelas, quadros, textos literários e/ou poéticos, charges) e também sugestões ao final de cada unidade temática (questões de vestibulares/(ENEM), filmes e leituras complementares) GOMES; VLACH, 2007, p. 19)
* Embasados na Geografia Crítica, abordam a partir do contexto histórico e geopolítico do mundo atual os seguintes conteúdos: capitalismo e o espaço Geográfico no período entre – guerras e após a década de 1990, enfocando a supremacia de países pólos em cada momento; questão energética mundial; conflitos étnicos e o terrorismo mundial (GOMES; VLACH, 2007, p. 19)
Continua...
36
Continua ...
BOLOLIGIAN, Levon et. al. O espaço Geográfico mundial: o mundo subdesenvolvido. São Paulo: Atual, 2001. (Geografia: espaço e vivência).
Ensino Fundamental II – 8º e 9º anos
* Divididos em capítulos, os conteúdos são apresentados com textos reflexivos e algumas atividades de análise e interpretação. * Não são indicadas no decorrer de cada capítulo ou ao final de cada unidade propostas de atividades complementares, recursos como sugestões de leitura, vídeos e internet (GOMES; VLACH, 2007, p. 20)
* São abordadas questões de Geografia Política e Geopolítica de forma objetiva, preocupando-se com as desigualdades econômicas, políticas e culturais do mundo e a evolução tecnológica, tendo por base os seguintes conteúdos: 8º ano (a organização do espaço mundial, espaço, poder e territórios nacionais; as transformações mundiais recentes, a globalização e a fragmentação; o subdesenvolvimento, as influências externas e os problemas de integração na América Latina, o continente africano e o asiático, seus problemas econômicos, sociais e políticos, e a geopolítica do Oriente Médio); 9º ano [...] os Estados Unidos e sua influência na economia, cultura e geopolítica mundiais; os desafios econômicos, políticos e sociais da Europa; a Rússia, do Império Russo à formação e a desagregação da URSS, o seu atual papel geopolítico, os movimentos separatistas e o poder central russo; os conflitos e tensões na Comunidade dos Est. Indep. (CEI) e o separatismo no leste Europeu (GOMES; VLACH, 2007, p. 20)
Continua...
37
Continua...
VESENTINI, José William; VLACH, Vânia. Geografia Crítica. São Paulo: Ática, 2002.
Ensino Fundamental II – 8º e 9º anos
*Não foi destacado pelos autores do artigo.
* Tendo por base a perspectiva da Geografia crítica, dando ênfase a construção do conhecimento do espaço historicamente produzido, respeitando e relacionando assuntos globais com a realidade dos alunos, são abordados os seguintes conteúdos segundo Vlach e Gomes (2007, p. 20): 8º ano (mundo atual, sua unidade e diversidade; os problemas econômicos, socioculturais e políticos da América Latina da África e da Ásia, assim como a geopolítica desses continentes); 9° ano (continente europeu, seus problemas econômicos, sociais e políticos, a Europa Oriental, a antiga Iugoslávia, Eslovênia, Croácia, Macedônia, Bósnia-Herzegovina e a guerra do Kosovo, a CEI, a construção do Império Russo e a Federação Russa; Estados Unidos, Canadá, Japão, Austrália e Nova Zelândia; Perspectivas para o século XXI, com temas como a nova ordem e hegemonia mundial) (GOMES; VLACH, 2007, p. 20).
Fonte: GOMES, F. L.; VLACH, V. R. F. O Ensino de Geografia Política e Geopolítica nas escolas de Ensino Fundamental e Médio dos distritos de Uberlândia (Martinésia, Cruzeiro dos Peixotos, Tapuirama e Miraporanga). Horizonte Científico, v. 1, p. 1-22, 2007.
Essa superficialidade da abordagem dos conteúdos e fragmentação
de uma série para outra também podem ser verificadas na análise realizada por
Santoset al.(2014) conforme quadro 02.
38
Quadro 02 – Os conteúdos de geopolítica na coleção de livro didático Projeto Araribá voltada para o Ensino Fundamental II e Médio segundo Santos et al. (2014)
Livro didático Nível Estrutura do livro Conteúdos de Geopolítica
EDITORA MODERNA (org.). Projeto Araribá: Geografia. 3. ed. São Paulo: Moderna, 2010 (8º ano). EDITORA MODERNA (org.). Projeto Araribá: Geografia. 3. ed. São Paulo: Moderna, 2010 (9º ano).
Ensino Fundamental II – 8º e 9º anos
* A obra foi dividida em 8 grandes unidades, estando cada qual subdividida em 4 temas. O livro apresenta em cada unidade - além dos textos escritos – figuras diversas, mapas, caixas de textos com conceitos e com glossário, dicas de filmes. No final dos temas abordados em cada unidade, a obra apresenta de forma intercalada: a) páginas especiais denominadas „Saiba Mais‟ com informações complementares sobre o assunto já abordado na unidade; b) atividades de síntese, compreensão e sistematização dos conteúdos estudados; c) atividades relacionadas ao conteúdo que estimulam a habilidade de leitura de textos e imagens denominadas „Aplique seu conhecimento‟ e outras chamadas de „Desafio‟ que contemplam questões do Enem e de vestibulares de diversas instituições de ensino superior; d) representações gráficas a partir de um tipo específico de representação gráfica (projeções cartográficas, linguagem do mapa, mapa do tempo, mapas temáticos, mapas qualitativos e ordenados, mapas quantitativos e mapas dinâmicos,mapas topográficos, símbolos nacionais) contendo explicações e propondo atividades; e) compreensão de texto (textos diversos relacionados às temáticas da unidade, seguidos de atividades de leitura e compreensão) (SANTOS et al., 2014)
* Tendo por embasamento teórico a Geografia Crítica, a obra contempla os seguintes conteúdos: 8º ano - aspectos gerais (localização, formação histórica, socioeconômicos e sociais, naturais) do Continente Americano assim como de porções como América do Norte; Central, Andina e Guianas; Platina; Brasil. Os conteúdos de geopolítica se encontram explicitados na unidade 1 (Geografia e regionalização do espaço, com destaque para a Guerra Fria) e unidade 2 (A economia Mundial, com destaque para os Blocos Econômicos). 9ª ano - aspectos gerais (localização, formação histórica, socioeconômicos e sociais, naturais) dos Continentes: Europeu, Asiático, Africano e Oceania. Em se tratando da geopolítica, a mesma é abordada na unidade 1 (Países e conflitos mundiais) e no decorrer das demais unidades a partir do conteúdo de blocos econômicos (SANTOS et al., 2014).
Fonte: SANTOS, M. de S. et. al. Geopolítica mundial – análise e produção de material didático de Geografia. 2014. 25 f. Trabalho de Conclusão de curso (Licenciatura em Geografia) – Faculdade de Educação e Ciências Humanas, Universidade Metropolitana de Santos, 2014.
Em se tratando dos livros do Projeto Araribá para o 8º ano, além do
que foi apontado, segundo Araújo (2012, s/p.), também ocorre na ausência de
conceitos básicos de geopolítica. De acordo com a autora, no decorrer dos capítulos
39
que tratam de conteúdos de geopolítica, incluindo o que trata sobre Brasil, não são
explicitados “[...] conceitos fundantes da geopolítica, sendo alguns apenas citados
tais como Estado, Território e Povo, porém,distribuídos no texto sem a mínima
explicação do que venham a ser e o que representam para a geopolítica ou a
geografia”.
Os apontamentos de Gomes e Vlach (2007), de Santos et al.(2014) e
de Araújo (2012) em relação aos conteúdos de geopolítica nos livros didáticos,
podem ser tomados como indicativos da importância dos professores utilizarem os
mesmos a partir de sua função documental e como recurso didático de apoio. Além
do livro, devem buscar outros recursos que possam contribuir no aprofundamento
qualitativo das discussões de diversos conteúdos, em particular, de geopolítica, pois
“[...] se o papel da geografia é cada vez mais relevante na gestão de uma cidade e
de um Estado, não se pode deixar de fazê-la (re)conhecida nas escolas de Ensino
Fundamental e Médio” (GOMES; VLACH, 2007, p. 21).
Neste sentido, Gomes e Vlach (2007, p. 21), apontaram ações e
recursos que podem ser utilizados no decorrer das aulas, como: “[...] a análise crítica
de filmes, documentários, músicas e periódicos que tratam esses temas, bem como
organizar, junto à comunidade escolar, palestras, mini-cursos e debates”. A essa
lista, acredita-se que os jogos podem ser também muito significativos, em particular
para trabalhar conteúdos de geopolítica.
Alguns jogos podem contribuir para o aprofundamento das
discussões e até mesmo permitir o trabalho com abordagens geralmente ausentes
nos livros didáticos, como o caso do Jogo War, que além de permitir a retomada de
diferentes conteúdos de geografia, também permite a discussão de estratégias
geopolíticas, como no caso da Teoria elaborada por Mackinder, “[...] geógrafo inglês
[...] que elaborou uma teoria geoestratégica, visando à hegemonia britânica no
mundo. Privilegiava, em suas teorias, o poder terrestre e as formulava levando em
consideração fatores políticos e geográficos”, segundo Gomes e Vlach (2007, p. 3).
40
3 JOGO COMO RECURSO DIDÁTICO NAS AULAS DE GEOGRAFIA NO ENSINO
BÁSICO
A busca por instrumentos que diversifiquem a prática pedagógica no
cotidiano escolar é fundamental para ampliar o raio de ação do educador. Cada
indivíduo possui suas particularidades e necessita muitas vezes de estratégias
alternativas para alcançar a compreensão de determinados assuntos. Alguns jogos
oportunizam abordagens pedagógicas que expandem os recursos disponíveis a
classe estudantil. Esses instrumentos aliados as capacidades e formação do
professor aumentam as chances de compreensão de certas temáticas, além de
transformarem o conhecimento teórico em algo lúdico.
Neste sentido, será discutido nesta parte do trabalho jogo o jogo War
e possibilidades de aplicação pedagógica do mesmo tendo por base conteúdos de
geopolítica.
3.1 O JOGO WAR
A maneira encontrada para realizar a ponte entre conhecimento
teórico e atividades pedagógicas e lúdicas, que reproduzissem cenários e
discussões geopolíticas discutidas anteriormente, foi através do jogo conhecido
como War. Esse é um jogo de tabuleiro lançado na década de 1970 no Brasil,
inspirado em um jogo Americano com objetivos semelhantes, pela empresa Grow –
Jogos e Brinquedos S.A.
Os princípios do jogo estão pautados em habilidades como
estratégia, tática e sorte. O cenário do tabuleiro, onde o jogo desenvolve-se, é
representado por um mapa do mundo, nos formatos de uma projeção cilíndrica e
azimutal/polar, com divisões territoriais-políticas dentro dos continentes que não
seguem as mesmas existentes na realidade, porém, são mantidas as posições
aproximadas da realidade geográfica que não distorcem abruptamente a geografia
mundial. Vale destacar que existem diversas edições do jogo, algumas retratando
cenários específicos, como os territórios da Roma antiga. A divisão continental do
mapa do tabuleiro segue a mesma proposta divulgada atualmente, somente
excetuando a Antártida do jogo (WAR, 2004). É possível observar dois tipos de
tabuleiros utilizados durante o jogo (figuras 6 e 7).
41
Na figura 6 observa-se o jogo War representado em uma projeção
cilíndrica.Esse tabuleiro retrata o mundo numa visão eurocêntrica, semelhante a
projeção de Gerardo Mercator de 1569, onde o continente europeu localiza-se na
parte central-superior do mapa. Cada continente está representado por uma
determinada cor. O continente Americano é subdividido em duas partes, América do
Norte em laranja e América do Sul em verde. A Europa está representada com a cor
azul, a África com a cor rosa, Ásia com a cor amarela e a Oceania com a cor
vermelha.
Figura 6– Tabuleiro do jogo War representando o mundo a partir de uma
projeção cilíndrica
Fonte:O autor, 2016
Outro tipo de representação cartográfica de tabuleiro pode ser
visualizado na figura7. Nesse caso, o tabuleiro retrata o globo numa projeção
polar/azimutal, que são aquelas que “[...] se preocupam apenas com que os
azimutes ou as direções de todas as linhas vindas do ponto central de projeção
sejam iguais aos das linhas correspondentes na esfera terrestre” (FITZ, 2008, p. 44).
As cores que dividem os continentes são iguais as cores do tabuleiro da figura 6.
42
O propósito dos jogadores consiste em concluir seus objetivos,
podendo ser eles dominar uma quantidade determinada de territórios, conquistar
continentes específicos ou destruir um adversário. Como o jogo é desenvolvido por
no mínimo 3 e no máximo 6 jogadores, esses objetivos podem entrar em conflito,
possibilitando a oportunidade dos jogadores se mobilizarem entre si (WAR, 2004).
Como mencionou Spykman em sua analogia do sistema internacional, o mundo é
uma mesa de bilhar e os Estados são as bolas de bilhar, ou seja, o choque entre
eles é natural (MELLO, 1999).
Figura 7–Tabuleiro do jogo War representando o mundo a partir de uma
projeção azimutal/polar
Fonte: O autor, 2016
O jogo se inicia com a escolha da cor dos exércitos que cada
jogador optar, divididos nas cores azul, amarelo, vermelho, verde, branco e preto.
Após isso, segue a distribuição dos 42 territórios para os jogadores, distribuindo as
cartas em sentido horário. Os jogadores colocam um exército, representado por uma
peça pequena, em cada território sorteado a ele. A cada início de rodada do jogo, o
43
jogador recebe mais exércitos, que são distribuídos de acordo com seu objetivo e
contabilizados a partir da metade de territórios que possui (WAR, 2004).
Por exemplo, se um jogador possui 6 territórios no início de sua vez,
então ele receberá 3 exércitos naquela rodada, se possuir 9 territórios, irá receber 4
exércitos, já que a regra do jogo estipula o arredondamento para menos. Após
receber e distribuir seus exércitos, o jogador pode atacar outros territórios, quantas
vezes desejar, desde que compartilhem fronteiras e que tenham exércitos para
realizar essa ação.Territórios com apenas um exército, não podem realizar ataques.
Nesse momento os dados são jogados e vence quem obtiver o
maior número. Em caso de empate, o defensor vence.Se o atacante vencer, ele
desloca no mínimo um exército para o novo território e ganha uma carta território, a
mesma distribuída no início do jogo e que possui um símbolo geométrico na parte
inferior. Existem três tipos de símbolos nas cartas, triângulos, quadrados e círculos.
Se o jogador reunir três cartas que possuam o mesmo símbolo geométrico (três
quadrados, círculos ou triângulos) ou uma diferente de cada (um círculo, um
quadrado e um triangulo), no início de sua próxima vez, ele poderá realizar uma
“troca”, como é descrito na regra do jogo, e receberá mais exércitos ainda. A cada
“troca” realizada, o número de exércitos que o jogador adquire aumenta. Ou seja,
quanto mais vitórias e mais territórios ele acumular, mais exércitos ele pode reunir,
tornando-se um forte oponente.Se um jogador conseguir conquistar todos os
territórios de um continente, ele também é premiado a cada rodada com territórios
bônus para serem colocados dentro desse continente.É possível observar a imagem
(figura 8) da tabela com os informativos de trocas e exércitos bônus por continente
conquistado.
3.2 EXPERIÊNCIAS PRÁTICAS EM SALA DE AULA COM O JOGO WAR
O jogo foi aplicado em três séries distintas compreendendo três
etapas diferentes do processo escolar dos alunos. Foram selecionadas duas turmas
do 6º ano de um estabelecimento da rede estadual de ensino público, uma turma do
9º ano e uma turma do 2º ano do Ensino Médio de dois estabelecimentos da rede
privada de ensino. Vale destacar que a aplicação do jogo nas seguintes séries não
seguiu nenhum parâmetro científico de escolha. Buscou-se somente aplicá-lo em
séries distintas para observar o nível de compreensão e profundidade que poderia
44
ser abordado na exploração de determinados assuntos referentes a geopolítica, em
momentos oportunos durante o jogo. Também foi possível explorar outros conteúdos
como projeção cartográfica e regionalização em continentes.
Figura 8–Tabela de “trocas” e exércitos bônus por continente conquistado
Fonte: O autor, 2016
A aplicação do jogo nas turmas do 6º ano ocorreu durante o período
de aulas, onde a turma foi dividida em três grupos de seis alunos. Como havia mais
alunos do que vagas disponíveis para jogar, algumas duplas foram formadas para
que todas interagissem na atividade. Inicialmente, constatou-se que a maior parte
dos alunos não tinha conhecimento sobre o funcionamento do jogo. Assim, com o
auxílio de estudantes do curso de Geografia da Universidade Estadual de Londrina
(UEL), pertencentes ao Programa Institucional de Bolsas de Iniciação à Docência
(PIBID), os alunos foram orientados sobre as principais regras e brincaram
livremente no período de uma hora-aula.
Em situações como essa, onde somente poucos têm conhecimento
sobre o jogo, a exploração do jogo como ponte para outros conhecimentos é
45
dificultada. Isso significa que para aprofundar discussões e utilizar situações chave
para realizar intervenções de ordem geopolítica, ou de outros conhecimentos, é
necessária maior ambientação dos alunos com o jogo, a fim que compreendam
melhor a lógica de funcionamento e como podem desenvolver estratégias para
alcançar seus objetivos. Nesse caso, com ajuda dos estagiários da UEL, em um
primeiro momento, as intervenções estiveram mais centradas em instruções básicas
para aprenderem o jogo.
Nas aulas seguintes, estando os alunos mais familiarizados com o
jogo, a comparação das diferentes formas de representação do mundo nos
tabuleiros se mostrou de grande valia nessa série, tendo em vista que havia dois
tipos de tabuleiros distribuídos entre os alunos: projeção cilíndrica e projeção
azimutal (figuras 9 e 10).
Com os alunos organizados em equipes, foi colocado um mapa-
múndi, para que todos pudessem visualizar, sobre a lousa e foi requisitado que
comparassem as diferenças entre os mapas. O grupo que se encontrava com o
tabuleiro representado numa projeção azimutal, logo percebeu as diferenças e
começaram a questionar as diferenças. A princípio, eles acreditavam que o mapa do
tabuleiro estava incorreto, devido as grandes distorções.
Nesse momento, foi necessário retomar sobre o assunto,
destacando as particularidades desse tipo de projeção. Pelo fato do planeta ser
esférico, diferentemente dos mapas que são planos, existem diferentes formas de
representar o mundo em mapas, como a projeção azimutal do tabuleiro do jogo. Foi
discutido com os alunos do 6º ano que essa projeção foi criada a partir de uma visão
dos continentes partindo da observação do Pólo, sendo esse tipo de projeção válida
para compreender a proximidade das terras do extremo norte do planeta ao entorno
do oceano Ártico. O fato de existir um ponto de interesse, despertou a atenção dos
alunos para o assunto. Muitos conteúdos escolares trabalhos em sala de aula não
despertam a atenção dos alunos por não se mostrarem significantes para os alunos.
E no caso, o interesse foi despertado pelo ato de brincar.
46
Figura 9–Alunos do 6º ano do Ensino Fundamental II de um estabelecimento de
ensino público jogando no tabuleiro de War com projeção cilíndrica
Fonte: O autor, 2016
Figura 10– Alunos do 6º ano do Ensino Fundamental II de um estabelecimento de
ensino público jogando no tabuleiro de War com projeção azimutal
Fonte: O autor, 2016
A aplicação do jogo no 2º ano do Ensino Médio de um
estabelecimento de ensino da rede privada, por envolver uma gama maior de
conteúdos geográficos, próprios desse nível de ensino, a prática com o jogo se
mostrou mais próxima dos objetivos da pesquisa, ou seja, o jogo pode ser utilizado
47
como ponte de conhecimento para a geopolítica e as intervenções no sentido de
refletir sobre ela foram realizadas com maior ênfase.
Nesse caso do 2º ano do Ensino Médio, a turma foi dividida em
quatro grupos, cada qual com seis participantes. Também foram formadas algumas
duplas para que todos pudessem participar da atividade.
Após a fase inicial de distribuição de territórios e exércitos pelo
tabuleiro, foi realizada uma discussão antes do início das rodadas. Como os
territórios estavam distribuídos igualmente entre todos os participantes, os alunos
foram instigados a pensar sobre a concepção de equilíbrio de poder. Segundo Wight
(1985), o equilíbrio de poder é a aplicação da lei de autopreservação. Pode ser
comparada a uma balança, onde o crescimento ou o aumento de peso de uma
potência, precisa ser contrabalanceado, para se manter o equilíbrio e preservar a
segurança dos Estados. O equilíbrio de poder leva em consideração o potencial
militar, a iniciativa diplomática e o poderio econômico.
Os alunos foram levados a pensar sobre a seguinte estratégia: a
intenção não é evitar guerras, mas limitar a capacidade dos Estados de dominar
outros.Ou seja, naquele momento do jogo, a configuração do poder se encontrava
equilibrada, pois todos possuíam a mesma capacidade militar, único quesito passível
de análise. Foi discutido que a partir do momento que algum jogador começasse a
reunir mais poder que outros, esse equilíbrio estaria descompensado, o que seria
uma ameaça aos outros jogadores. Um exemplo seria um cenário de três potências,
onde duas entram em conflito e a terceira necessita contrabalancear a disputa
defendendo a mais fraca, a fim de evitar ameaças.
A discussão foi finalizada com uma passagem histórica que
representa muito bem essa lógica do equilíbrio estratégico. A recusa do Reino Unido
em participar de uma aliança com os Nazistas antes do início da Segunda Guerra
Mundial, em troca da preservação de seu território e suas colônias, passava pela
lógica de que para isso, precisariam compactuar com o aval para a Alemanha invadir
a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS)(MELLO, 1999). Naquele
momento, o equilíbrio de poder europeu e os escritos de Mackinder foram colocados
a prova. Como já abordado no primeiro capítulo, Mello (1999) aponta que o principal
temor estratégico de Mackinder permeava as relações entre as duas potências
continentais europeias, a Alemanha e a Rússia. Se por alguma razão a Alemanha
conseguisse dominar ou se aliar com a detentora do Heartland, nesse caso a URSS,
48
a tecnologia alemã teria a seu dispor os fartos recursos da Área Pivot,
transformando o Império Britânico num satélite europeu, e permitindo que o grande
poder terrestre de Mackinder se tornasse realidade.Inspirado nas proposições
mackinderiana, o geógrafo-general alemão Karl Haushofer (1869-1946), propôs uma
aliança estratégica germânica-soviética contra o império marítimo Britânico,
diferentemente das atitudes tomadas por Adolf Hitler (1889-1945) que preferiu uma
tentativa de aliança com os britânicos para depois tentar invadir a URSS (MELLO,
1999).
As discussões tiveram continuidade enquanto os alunos jogavam
War. No decorrer do jogo, o professor instigou discussões nos diferentes
grupos(figuras 11 e 12). Um ponto debatido com os grupos durante o jogo estava
centrado na estratégia de defesa de seus objetivos. Foi tomada como exemplo uma
situação de jogo onde o objetivo do jogador Z era o domínio do continente Norte-
Americano e da Oceania. Após a conquista da América do Norte, ainda lhe restava a
conquista da Oceania para o desfecho de seus objetivos. Sendo assim, tomamos a
ideia de Nicolas Spykman (1893-1943) sobre defesa estratégica, para demonstrar
como preservar o território já conquistado até a conquista do restante do objetivo.
Diferentemente de autores isolacionistas, que defendem a ideia da “fortaleza
americana” protegida pelo atlântico, Spykman parte de um ideal intervencionista e
propõe a primeira linha de defesa dos Estados Unidos nos lados opostos da
América. Ou seja, na Europa ocidental e no extremo oriente. Assim, o território dos
Estados Unidos seria, se necessário, a segunda linha de defesa. No caso do
jogador, foi proposta a mesma ideia, que nesse caso, a partir da ordenação do
tabuleiro, os territórios da 2ª linha de defesa estavam nos territórios da Islândia
(Europa),Venezuela (América do Sul) e Vladivostok (Ásia). Vale destacar que a
intenção da utilização dessas estratégias visa a abordagem de conteúdos
relacionados a geopolítica que possam tornar-se mais significativos aos
alunos/jogadores, e não elaborar táticas de jogo, já que a componente sorte é
essencial para vencê-lo.
49
Figura 11–Alunos do 2º ano do Ensino Médio de um estabelecimento de ensino da
rede privada jogando War com projeção cilíndrica
Fonte: O autor, 2016
Figura 12–Alunos do 2º ano do Ensino Médio de um estabelecimento de ensino da
rede privada jogando War com projeção Azimutal
Fonte: O autor, 2016
50
Por fim, foi realizada a aplicação do jogo junto a uma turma de 9º
ano de um estabelecimento de ensino da rede privada. Nesse terceiro caso, pode-se
afirmar que os resultados em termos pedagógicos do jogo foram mais satisfatórios
do que nos outros dois estabelecimentos de ensino, tendo em vista que o maior
tempo hábil (aulas geminadas) e a sala de aula com número reduzido de alunos
contribuíram para as discussões no início do jogo e também em cada grupo no
decorrer do jogo. Nesse caso, a própria proposta da escola permite a abertura para
este tipo de atividade. A sala de aula possuía apenas 06 alunos e foi formado um
único grupo, propiciando um atendimento individualizado e tempo suficiente para
questionamentos e dúvidas. Os alunos puderam jogar em três oportunidades, e
como já argumentado, um período de ambientação e compreensão da lógica do jogo
possibilita o aparecimento de mais situações de dúvidas que podem ser exploradas.
Dentre as situações de correlações com reflexões geopolíticas,
nessa turma de 9º ano, em determinado momento do jogo,foi realizada a seguinte
reflexão: um jogador X adquiriu uma quantidade de territórios muito superior aos
seus adversários, tornando-o uma ameaça aos objetivos dos outros jogadores. Pela
dinâmica do jogo já abordada anteriormente, quanto mais territórios ele obtiver,
maior o número de exércitos ele terá em suas rodadas. Subtende-se que, se ele
conquistou vários territórios, ele estava passível de realizar “trocas” por mais
exércitos. Combatê-lo era uma situação de segurança. Essa reflexão vai ao encontro
do que afirmara Cline (1975, p. 60) em sua avaliação do poder mundial, “[...] são as
percepções de poder, embora inexatas, que decidem o jogo de xadrez
internacional”.
O jogador X, nesse caso foi comparado a uma grande potência
como a Alemanha da primeira metade do século XX, como discutido por Wight
(1985, p. 38). Dois pontos foram abordados nesse momento com os alunos. O
primeiro, a identificação de uma grande potência, seguindo a proposta de Wight.
Segundo o autor, uma das formas de identificar a posição de grande potência de um
Estado, está no fato de conseguir contemplar a guerra contra qualquer combinação
possível de outras potências, ou contra qualquer outra potência individual (WIGHT,
1985, p. 40).
O segundo ponto abordado diz respeito a importância das alianças,
pois conforme apontado por Cline(1975, p. 61) “[...] as alianças, forçadas ou
voluntárias, representam uma face importante do poder”. A esse respeito, Wight
51
(1985, p. 99), identifica as alianças como relações baseadas na utilidade. Ainda
segundo o referido autor, algumas alianças são naturais e ocorrem devido as
circunstâncias e o contexto do equilíbrio de poder transitório. Um dos exemplos
apontados pelo autor diz respeito “[...] a aliança natural entre a Inglaterra, as
Províncias Unidas -Estado europeu antecessor da atual Holanda- e a França no
século XVI contra a preponderância da Espanha de Felipe II -1527 – 1598” (WIGHT,
1985, p. 101). No caso do jogo, três jogadores de um total de seis iniciaram
tratativas, como os países europeus daquele momento histórico, para se aliarem
contra o jogador X.
Após isso, foi realizado um trabalho de aprofundamento teórico,
especificamente sobre as teorias geopolíticas de Harold Mackinder (1870-1946) e
Nicolas Spykman (1890-1943) junto aos alunos, comparando as visões e suas
respectivas propostas. Na figura 13 é possível observar um esquema criado sobre o
próprio tabuleiro do jogo, com papéis de transparências, que serviu de base para o
debate sobre as teorias do Heartland e Rimland, nesse caso, abordando alguns
acontecimentos do período da Guerra Fria. A correlação com conteúdos estudados
na disciplina de História foi fundamental para sanar as dúvidas oriundas de lacunas
temporais, revelando a importância da interdisciplinaridade para o aprendizado de
conteúdos de geopolítica.
Figura 13–Folhas de transparência sobre o tabuleiro e anotações feitas pelo
professor durante a discussão com os alunos
Fonte: O autor, 2016
52
3.3 PONTOS DE EXPLORAÇÃO PELO EDUCADOR
O próprio jogo em que esse trabalho se fundamenta, chamado de
War, que significa guerra em inglês, pode ser utilizado como introdução para
caracterizar a realidade do direito internacional em aceitar a guerra como um
relacionamento legítimo entre os Estados, independentemente do fato da causa ser
justa ou não, até a criação da Liga das Nações em 1919. Mesmo após a criação da
Liga das Nações (1919) e com as restrições das condições sob as quais a guerra
poderia ser aceita, ela não foi considera ilegal (WIGHT, 1985, p. 81).
Segundo o autor, a principal causa da guerra está na ausência de
um governo central, o que ele caracteriza de anarquia entre os Estados soberanos.
O filosofo inglês Thomas Hobbes (1588-1679) aponta em sua obra o estado de
natureza do homem que é baseada no instinto de conservação e na luta pela
sobrevivência, ocasiona a guerra contra todos. Sendo assim, num cenário de
desconfiança mutua, uma potência nunca pode ter a garantia de que uma outra
potência não é malevolente (WIGHT,1985, p. 82). De acordo com o autor, esse seria
o medo hobbesiano. Existem diversos motivos que levam os Estados a situação de
guerra, mas todas as causas particulares operam dentro do contexto da anarquia
internacional e do medo hobbesiano.
É possível ainda, apontar três tipos de guerras divididas por suas
motivações. Wight(1985) as distingue como as guerras de ganho, guerras de medo e
guerras de doutrina. As guerras de ganho são aquelas destinadas a expansão de
fronteiras. As guerras de medo são aquelas que partem da preocupação com o
futuro, com a segurança da nação, e podem gerar guerras preventivas como guerras
defensivas. Por fim, as guerras de doutrina são utilizadas para reafirmar princípios e
ampliar uma causa. As guerras motivadas por medo e doutrinação ainda estão muito
presentes em nosso cotidiano.
As armas nucleares modificaram a interpretação sobre as guerras. O
medo do inimigo passou para o medo da própria guerra. Mesmo assim, as guerras
não diminuíram, somente mudaram de forma. Cline (1975) aponta que,
provavelmente, a maioria dos conflitos futuros será com forças convencionais não
nucleares.
Outro ponto que pode ser explorado pelo professor, diz respeito a
cartografia, pois como observado nas imagens dos tabuleiros, o jogo se desenvolve
53
numa planificação do globo terrestre e, nesse caso, foi representado por duas
formas de projetar o globo cartograficamente, uma cilíndrica e ou polar/azimutal.
Esse pode ser um ponto de partida para dois assuntos, podendo ser abordado pelo
professor. O primeiro assunto se refere às projeções cartográficas. Segundo Fitz
(2008), um mapa exige o estabelecimento de um método, segundo o qual, cada
ponto da superfície terrestre corresponda a um ponto no mapa. Ou seja, as
coordenadas geográficas se transformam em coordenadas planas e para se obter
isso utiliza-se os sistemas de projeções cartográficas. Existem diferentes modos de
se realizar esse procedimento, dependendo da finalidade e objetivos do autor da
projeção. Nenhuma projeção cartográfica é desprovida de distorções da realidade,
de forma que não é possível transpor uma superfície curva para uma plana, sem que
ocorram deformações. Utilizar o jogo com duas bases cartográficas com diferentes
objetivos pode ampliar o entendimento do aluno sobre os objetivos das projeções e
as leituras possíveis de serem realizadas em cada um dos mapas.
O segundo aspecto refere-se a importância da geografia para a
análise geopolítica. Como abordado no referencial teórico, a justificativa para se
analisar a política de poder entre as nações, a partir da geografia, se dá pelos
fatores constantes da geografia ao contrário das condições constantemente
mutáveis como a situação política, econômica e militar (CLINE, 1975). A leitura de
certos tipos de projeções cartográficas e a elaboração de teorias a partir delas,
também podem ser inseridas no debate, já que Spykman, em meio a sua análise do
poder terrestre e da fortaleza continental mackinderiana, faz críticas e revela as
debilidades da interpretação do mundo a partir de uma projeção cilíndrica, situação
que não expõe a importância das regiões polares do planeta.
Também podem ser discutidos conteúdos e ideias de cunho
geopolítico que não se fazem presentes nos livros didáticos, como: Heartland e
Rimland.
- Heartland: Harold Mackinder em 1904 frisou o significado do
controle político sobre os recursos materiais e humanos da massa terrestre central
eurasiana em seu ensaio intitulado „O pivô geopolítico da história‟. Nesse trabalho o
autor “[...] anteviu que o comando do Heartland levaria ao controle da eurásia, de
longe a maior de todas as massas terrestres, e, eventualmente, ao domínio de todos
os recursos e povos do mundo”. (CLINE, 1975, p. 60). Para Mackinder, havia uma
diferença fundamental entre potências terrestres da ilha mundial, formadas pela
54
Eurásia e África, e nações insulares, e receava o dia em que Eurásia e África, por
estarem ligadas por terra, formassem uma base única de poder marítimo capaz de
superar em termos navais do hemisfério ocidental e seus aliados insulares (MELLO,
1999)
- Rimland: Spykman propôs em 1943, a partir da análise da teoria da
Área Pivot mundial e da Pugna entre poder continental e marítimo, a estratégia de
contenção do Heartland, a partir de uma política intervencionista, pregando ações se
mudanças no equilíbrio do poder ameaçassem a segurança e os interesses dos
Estados Unidos. Ao observar o mundo a partir de uma projeção polar, percebeu a
proximidade entre as massas continentais da América do Norte e da Eurásia, e com
a modernização da aviação, percebeu-se a ineficácia de uma posição insular como a
dos Estados Unidos. Segundo Mello, na concepção do geógrafo americano, a
política internacional poderia ser resumida em duas linhas: “[...] Se a Europa e a Ásia
fossem dominadas por um grande poder ou por uma constelação de poderes,
acumulariam uma força não compensada que poderia projetar-se no atlântico e no
pacífico e cercar o hemisfério ocidental” (MELLO, 1999, p. 193). A estratégia de
segurança de Spykman se baseia no antagonismo entre expansão e contenção. A
expansão seria a tendência russa de chegada aos mares e a contenção o poder
americano para barrar os russos nas margens da Eurásia. Esse é o equilíbrio
estratégico eurasiano que perdurou durante toda a Guerra Fria.
A importância estratégica de determinadas regiões, pode ser
abordada durante o jogo em situações que as envolva durante a disputa pelos
jogadores.
- África Meridional: suporte de recursos as nações industrializadas
da Europa ocidental e rotas marítimas pelo cabo da boa esperança. A disputa por
territórios na África meridional remonta o período imperialista, onde países europeus
tinham a intenção de controlar territórios nessas regiões a fim de controlarem e
assegurarem acessos as matérias primas e rotas de navegação (britânicos e
alemães realizaram trocas de territórios visando a segurança de seus interesses em
1890 – ilha britânica de Helgoland no litoral alemão pelo território alemão de
Zanzibar na Tanzânia). Durante a Guerra Fria (1945-1991), EUA e URSS motivados
a abranger suas áreas de influência estratégica, envolveram-se indiretamente no
processo de descolonização de países da África Meridional como Angola e
Moçambique (CLINE, 1980).
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
A utilização do jogo War como instrumento de complementação dos
recursos didáticos disponíveis se mostrou de grande valia e utilidade no processo de
aprendizagem. O uso de diferentes bases cartográficas, utilizando tabuleiros do jogo
contendo projeções cilíndrica e azimutal/polar, possibilitou aos alunos contato com
diferentes formas de representar o mundo.Ao visualizar o mundo de diferentes
maneiras, como no caso da projeção polar, os estudantes perceberam que em
determinados momentos de disputa e tensão política, certos países não se
encontram tão distantes uns dos outros, como é o caso dos EUA e da URSS.
A experiência também revelou validade na preparação dos alunos
do 2º ano do Ensino Médio para o Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) de
2016. Inserida no caderno de questões da área de ciências humanas e suas
tecnologias, a questão 21 do caderno amarelo se refere a qual projeção cartográfica
o símbolo da ONU representa. A resposta coincidiu justamente com o tabuleiro do
jogo representado de maneira polar, que é também o símbolo da Organização das
Nações Unidas. Ou seja, a utilização de jogos não exclui a preparação dos alunos
para os exames e vestibulares.
A exposição de mapas com diferentes divisões e regionalizações
mostrou como a divisão atual continental dos países está concretada no imaginário
dos alunos, e revelou como na verdade isso é algo convencionado pelo homem e
pode ser alterado.
A utilização do jogo para assuntos específicos, como teorias
geopolíticas, mostra-se viável, ao passo que a própria essência do jogo está
fundamentada em realidades da política de poder internacional.
As possibilidades de explorar o jogo War como recurso transcendem
as utilizadas e relatadas. Alternativas como criar tabuleiros acrescentando projeções
cartográficas com os modelos preconizados por Harold Mackinder e Nicholas
Spykman permitirão beneficiar-se de visões de mundo e propostas geopolíticas
estratégicas que contribuem para uma visão crítica da realidade política
internacional.
As experiências vivenciadas junto às diferentes turmas indicam que
cada vez mais atividades lúdicas como essa, que são aceitas com entusiasmo e se
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enquadram no perfil atual desses alunos, podem ser utilizadas em sala de aula como
alternativa de trabalho para conteúdos geopolíticos de forma que desperte o
interesse dos estudantes e, principalmente, estimule a capacidade crítica e de
interpretação dos fatos atuais, expostos pela mídia de maneira simplista e genérica.
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