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MAJOR ANTÓNIO JOSÉ DA MOTA
09-04-1908 / 06-11-1972
1º centenário do nascimento
O Major Mota (como foi identificado e imortalizado pelo povo deste concelho aquele que, durante 9 anos, a todos ilimitadamente serviu como Presidente da Câmara), foi um autarca que, reunindo um conjunto raro de qualidades, teve o mérito (e, no caso, o consequente risco) de assumir corajosamente a antecipação do futuro.Evocar António José da Mota, 43 anos após a cessação das funções de Presidente da Câmara e 30 após a sua morte, é um acto de justiça que, pecando por muito tardio, me parece particularmente oportuno. Tardio, porque a dimensão e o mérito da obra do Major Mota há muito reclamavam do Município uma distinção institucional que claramente excedesse a da simples consagração toponímica, ainda por cima num arruamento de escassa saliência no contexto espacial da Cidade. (Há claramente, homenagens que o não são – e, no caso do Major Mota, foi mais o povo anónimo que lhe guardou e perpetuou a memória do que o município que ele tão apaixonadamente serviu). Oportuna esta evocação porque, além de o ser em qualquer tempo, ocorre quando de algumas comprovadas excepções à regra do bom serviço autárquico se tenta generalizar, colocando todo o poder
local sob perspectivas de observação e de apreciação nada condizentes com o gigantismo e a qualidade do trabalho que, na generalidade dos municípios, tem sido a principal alavanca de desenvolvimento e de bem-estar das populações.Evocar o Major Mota – seguramente, um dos melhores Presidentes de toda a história do Município da Póvoa de Varzim – e fazê-lo pela forma que melhor o representa na inteireza da sua figura altiva e firme, é, mais que o apagamento de uma dívida que o tempo ia avolumando, o apontar de um caminho que vale a pena seguir: a Comunidade não esquece quem a serve!E, quem sabe? da interrogação que os mais jovens farão sobre quem foi este Poveiro e o que fez pela sua Terra de adopção, talvez resulte, em alguns, uma nova disponibilidade par a servir e, sobretudo, um novo olhar sobre os modos de serviço público que valem a pena.
Póvoa de Varzim, Junho de 2003
O Presidente da CâmaraJosé Macedo Vieira
In: Monumento ao Major António José da Mota [1908-1972]: a homenagem
e a gratidão da Póvoa de Varzim. 16 Junho 2003.
O Major António José da Mota nasceu na freguesia de
Ruivães, concelho de Vieira do Minho, em 9 de Abril de
1908 e faleceu na sua residência à Rua da Conceição, 18-B,
na Póvoa de Varzim, no dia 6 de Novembro de 1972.
Iniciou os seus estudos secundários nos Seminários de
Braga; tendo desistido de seguir a vida eclesiástica,
alistou-se no Exército onde foi subindo na escala
hierárquica, graças ao seu mérito próprio, ao estudo
e à sua dedicação pelo serviço, tendo atingido o posto de
Major. Serviu na Unidade Militar da nossa terra, na qual
exerceu o cargo de Chefe da Secretaria.
Fixado definitivamente no nosso concelho (primeiro em
Nabais, onde sua esposa era professora, depois na Póvoa
de Varzim), aqui lhe nasceram 6 dos seus 8 filhos. Chefe de
família exemplar, bom marido e bom pai, homem de uma
só Fé e com fibra de antes quebrar que torcer, soube criar
e educar a sua numerosa prol dando-lhe destinos
promissores. Deixou aos filhos o exemplo de um bom
marido, de um devotado pai e de um modelo de educador,
incutindo-lhes sempre o caminho de bem servir.
Foi o Major Mota o modelo de cidadão inteiramente
devotado ao próximo – serviu sempre e nunca se serviu.
Poveiro pelo coração e prestável como poucos, esteve
sempre disponível para dar o seu valioso préstimo a toda e
qualquer instituição da nossa terra; daí o ter passado pela
direcção das mais diversas colectividades poveiras, desde
que os seus serviços fossem gratuitos. Nunca aceitou
cargos remunerados. De entre as muitas funções que cá
desempenhou, sempre desinteressadamente, saliento a
sua presidência da delegação local da Intendência Geral
dos Abastecimentos, aquando do racionamento dos
géneros alimentares por ocasião e no após a Segunda
Guerra Mundial, cargo que desempenhou com toda a
isenção e justiça distributiva, defendendo sempre as
classes mais pobres e mais desfavorecidas.
Foi um dinâmico Comandante dos Bombeiros Voluntários,
de 1946 a 1963.
Saliento ainda a sua acção como Presidente da Câmara da
Póvoa de Varzim, cargo que desempenhou de 22 de Janeiro
de 1951 a 22 de Janeiro de 1960 com tal dedicação que era
frequente ser visto a qualquer hora do dia ou da noite junto
dos mais modestos trabalhadores municipais, também de
pá e picareta nas mãos, a ajudar e a incentivar a reparação
de certas avarias nas canalizações da nossa terra e que
urgia serem rapidamente reparadas.
Nota biográfica
Pouco depois de se sentar no cadeirão presidencial, queria
recusar-se a assinar uma folha de processamento de
algumas dezenas de escudos que legalmente lhe eram
devidos, como emolumentos de multas aplicadas,
alegando que nunca receberia qualquer centavo pelo
exercício das suas funções. Tendo-lhe sido explicado que
por lei teria de receber esses parcos emolumentos,
assinou o documento com a condição de essa importância
não lhe passar pelas mãos e ser entregue directamente na
Beneficente. Era assim o então Capitão Mota.
Não raras vezes o pessoal de limpeza do edifício da Câmara
Municipal ainda o encontrava a trabalhar, no seu gabinete,
manhãzinha cedo, de madrugada ou ao arrebol da manhã,
quando esse serviço era iniciado. Não tinha horário de
trabalho e tirava muitas horas ao seu descanso para as
dedicar de todo o coração e com todo o empenho ao
serviço da Póvoa, acabando assim por prejudicar a sua
saúde e encurtar a sua vida, falecendo prematuramente
aos 64 anos de idade. [...]
Podemos afirmar, sem receio de desmentido, que o Major
Mota viveu e sentiu intensamente todos os problemas da
nossa terra, desde os mais importantes aos mais ligeiros e
mais pequenos. A ele não se poderá aplicar o velho
aforismo latino: De minimis non curat praetor (o pretor
não trata de coisas insignificantes, como quem diz uma
pessoa importante não se ocupa de ninharias).
Barbosa, Jorge - Toponímia da Póvoa de Varzim.
In: Póvoa de Varzim: Boletim Cultural.
Vol. XXVII , n.º 2 (1990), p. 552-553.
Presidente da Câmara da Póvoa de Varzim de 1952 a 1960
In: O Comércio da Póvoa de Varzim. (26 Jan. 1952), p. 2 e 4.
Comandante dos Bombeiros de 1946 a 1963
Em mais de onze lustros de vida consciente conheci muitas pessoas votadas, de alma e coração, aos nossos Bombeiros – tanto entre os membros das Direcções, como entre os do Corpo Activo [...] Sem desprimor para tantas e tão grandes dedicações, vou referir-me ao Comandante Major António José da Mota e relatar um episódio picaresco e pouco conhecido, do qual ele foi protagonista e que por ele próprio me foi contado.Há exactamente 30 anos (foi em 1947) a Casa dos Poveiros do Rio de Janeiro ofereceu uma nova ambulância aos nossos Bombeiros, comprada na América do Norte, em Nova Iorque, à fábrica Chevrolet, e daquela cidade enviada para Portugal. Tornava-se necessário conseguir isenção de direitos aduaneiros, ao desalfandegá-la, em Lisboa, por se tratar de uma viatura considerada de utilidade pública e oferecida pela generosidade benemérita de dedicados poveiros ausentes. Para tal, a Casa dos Poveiros valeu-se dos préstimos do Comandante Tenreiro, que prometeu conseguir a tão desejada isenção. Pois bem, o tempo foi passando, as folhinhas diárias, semanais ou mensais, do calendário iam-se virando, caindo ou substituindo e, a respeito de notícias da almejada licença e ordem de levantamento da ambulância... nada! [...]Tudo deve ter um fim (e tem!); até que, em reunião conjunta da Direcção dos Bombeiros e do Comando, em meados de Dezembro de 1947, e dada a proximidade da festa do aniversário da Associação, resolve o Comandante Mota tirar-se de cuidados e ir pessoalmente a Lisboa tratar directamente do caso e, de todo o modo, trazer a ambulância, convicto da eficácia do velho e acertado ditado: quem quer vai, quem não quer manda.– Garanto-vos que, por alturas da festa, cá estarei com ela – asseverava o Comandante Mota. […] Chegado o Capitão Mota (era este, então, o seu posto) a Lisboa, começa o seu calvário […] pois descobrira, então, que, a despeito dos pedidos de isenção de direitos e não obstante a insistência dos mesmos, tanto de cá como do Brasil, de nada se havia tratado, por descuido, desleixo, esquecimento ou falta de tempo de peticionário. Havia, portanto, que recomeçar com todas as diligências. […]Em face da constante insistência e da audácia do Capitão Mota, que afirmava que, de qualquer modo, teria, hoje mesmo, de ser recebido, procurando avançar na direcção da porta do gabinete e abrir o caminho que lhe estava a ser estorvado e impedido, disparou-lhe o zeloso funcionário a seguinte pergunta: - Mas afinal quem é o senhor, para estar tão arrogante e teimoso em ser recebido hoje mesmo?- Ó Rapazes! – Contou-me o saudoso Amigo. – Subiram-me uns verdetes à cabeça, que não me contive! Rapo da carteira, abro-a , e começo a deitar para cima da mesa do meu opositor, os cartões que me identificavam... Sou o Comandante dos Bombeiros! – Sou… - E também sou sócio do Varzim! [...]Derrotado o inimigo com tais e tão convincentes argumentos, abriram-se-lhe as portas, é conseguida a audiência e arrancada a desejada isenção dos direitos alfandegários, seguindo-se in continenti o ansiado telefonema para a Póvoa: - Tudo conseguido! O Ismael que venha já no primeiro comboio! Assim aconteceu; no dia seguinte desembarca o Sr. Ismael em Santa Apolónia, dirigindo-se para a Alfândega, onde recebe do Comandante Mota as seguintes instruções: - Temos de estar na Póvoa amanhã! Vamos em rodagem, mas puxe o mais que for possível. Ponha a sirene a tocar, como se levássemos um doente ou um sinistrado, siga pelo caminho mais directo para a estrada do Norte, mesmo que seja em sentido proibido! [...]Feita uma paragem em Leiria, para descanso e pernoita, é retomada a viagem, na manhã seguinte (com uma breve passagem por Fátima), rumo à Póvoa. E, nesse mesmo dia, uma quinta-feira, 8 de Janeiro de 1948, pelas 17,30 horas, é a ambulância entusiástica e festivamente recebida na Póvoa, com grandes manifestações de regozijo.Missão cumprida - e bem cumprida!
Barbosa, Jorge - “Argumento de peso... eficaz”
In: Boletim comemorativo do I centenário da Real Associação Humanitária dos
Bombeiros Voluntários da Póvoa de Varzim [1877-1977], p. 67.
In: O comércio da Póvoa de Varzim, (14 Jul. 1956), p. 1.
In: Ala Arriba. (11 Nov. 1972), p. 1 e 4.
Ficha Técnica:Pesquisa documental: Lurdes AdrianoGrafismo: Joana Santos
Biblioteca Municipal Rocha PeixotoRua Padre Afonso Soares4490-664 Póvoa de VarzimTelefone: +351 252 616 000 / Fax: +351 252 617 069E-mail: [email protected]: http://www.cm-pvarzim.pt/biblioteca
Catálogo elaborado no âmbito das comemorações do primeiro centenário do nascimento do Major António da Mota. Os conteúdos encontram-se disponíveis em http://www.cm-pvarzim.pt/biblioteca
In: Notícias da Estela. Nº 82 (Jun.2003), p. 2.
Revista de imprensa[...] A obra realizada na Póvoa de Varzim pelo Major
António José da Mota é muito vasta e outros poderão
descrevê-la com maior detalhe do que eu. Sempre
direi, porém, que os primeiros sanitários
subterrâneos aqui construídos foram os do Passeio
Alegre, a ele se devendo também a grande
remodelação do velho jardim em 1952, a qual depois
se manteve no decurso de muitos anos.
Ficou famosa e fez história a sua intervenção junto ao
Ministro das Obras Públicas, Engº Arantes e Oliveira,
acerca da conclusão do nosso porto de pesca (cujas
obras estiveram paradas anos a fio), intervenção essa
que acabou por trazer o citado Ministro à nossa terra,
em 1958, para anunciar o recomeço das mesmas, com
vista à sua conclusão. As obras recomeçaram, mas
infelizmente, os factos vieram demonstrar que era
necessário ter-se ido mais além…
Em dias difíceis para a Póvoa de Varzim, no momento
em que a Zona de Jogo correu sério risco
de desaparecer em 1958, foi ainda o Major Mota que,
acompanhado do empresário e concessionário Artur
Adriano Aires, conseguiu em Lisboa impedir que
interesses estranhos levassem esta Zona de Jogo para
outra localidade, obtendo do Poder que fosse
renovada a concessão, a qual se tem mantido
sucessivamente até aos dias de hoje.
O ano de 1958 foi também o da criação do Boletim
Cultural da Póvoa de Varzim, que teve como primeiro
Director o saudoso Prof. Fernando Barbosa. E, numa
época em que ninguém falava ainda em preocupações
ecológicas e os direitos dos peões eram
subalternizados, ele foi pioneiro neste País, retirando
o trânsito automóvel da Rua da Junqueira, dando a
esta via um formato próximo do hoje existente – tudo
debaixo da gritaria dos interesses instalados que não
perceberam as vantagens da decisão. E porque nessa
época defendi num semanário local esta corajosa
posição, também eu passei uns maus bocados, que
a imprensa de então pode testemunhar...
Ao Major António José da Mota foi, postumamente,
concedida a Medalha de Prata do Reconhecimento
Poveiro e, em 3 de Janeiro de 1980, o seu nome foi
atribuído a uma rua da nossa terra. Simples
homenagens são estas, prestadas a um homem que
pôs a causa pública acima de todos os seus interesses,
mesmo os mais pessoais e legítimos, que deste modo
tanto prejudicou!
E é com imensa saudade que hoje aqui o recordo, pois
sempre o verei como uma inesquecível referência,
onde moravam a honradez, a honestidade, o altruísmo
e a solidariedade!
Rodgério N. Viana
In: O Comércio da Póvoa de Varzim, (22 Nov. 2001), p. 10.
[...] No verão de 1955 teve lugar a I Missão
Internacional de Arte da Póvoa de Varzim, uma
iniciativa do Professor Fernando Barbosa, vereador da
cultura e do turismo, inédita em Portugal. Tendo já
concluído o Serviço Militar Obrigatório e estando
disponível, aceitei o convite deste grande amigo e do
então Capitão Mota, Presidente da Câmara, para
colaborar graciosamente nessa Missão como elemento
de ligação com os artistas plásticos participantes na
Missão e a Câmara. Deste modo acompanhei-os
diariamente aos recantos mais carismáticos do concelho
como os “Campos Masseira” então ainda intactos e
vários em preparação, à faina da apanha do sargaço e à
extensa e limpa praia do Rio Alto, à Cividade de Terroso,
ao Cruzeiro de S. Lourenço e aos Marcos de Rabão, do
Couto de Tibães e da Casa de Bragança, ao Monte de S.
Félix e a Laúndos onde assistiram às festas da romaria da
Sra. da Saúde e tomaram apontamentos do “morto-
vivo”, isto é, das promessas de andar de caixão 3 voltas
à Capela com a banda de música a tocar, etc.
Recordo o dia passado no bucólico laranjal da Casa da
Quinta, em Laúndos, de minha avó materna e a rica
merenda que ela proporcionou aos artistas que
ficaram encantados e não se cansaram de tomar
apontamentos para as suas pinturas e esculturas.
Pude testemunhar a atenção e o carinho que o
Presidente Mota dedicou aos artistas de distintas
sensibilidades e diversas nacionalidades e a carta
branca que deu ao vereador Fernando Barbosa para
que a inovadora Missão correspondesse à expectativa.
E ciceraneei nessa e noutras ocasiões o então
Presidente pelos caminhos, veredas e lugares da Estela
de modo a que melhor conhecendo a extensa
freguesia, algo de bom pudesse fazer por ela e pelo
bem estar dos seus habitantes.
Em 1957 e 1958 recordo as facilidades que me
concedeu nas gravações com o Rancho Folclórico
Poveiro para os disco “Alvorada” e “Melodia”, sem
aceitar qualquer pagamento em virtude da
“divulgação da Póvoa de Varzim que esses discos iriam
proporcionar”, segundo as suas palavras.
Efectivamente esses trechos correram mundo e o disco
com o trecho “O mar enrola na areia” foi o mais tocado e
vendido em Portugal no ano do seu lançamento. Mais
tarde foi também editado em cartridgs, cassetes e em cd's.
Em 25 de Outubro de 1959 esteve o Major Mota na
Estela, creio que pela última vez como Presidente da
Câmara, no almoço de formatura de meu irmão Isaías,
o 2.º estelense a licenciar-se em Direito e igualmente
colaborador deste jornal.
Alberto Eiras