Edital 05 - EEB, ATB - Atendimento educacional especializado
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INTERFACES ENTRE O ATENDIMENTO EDUCACIONAL
ESPECIALIZADO, EQUIPE DIRETIVA E PROFESSORES: DESVELANDO
COMPREENSÕES E AÇÕES
Este painel se propõe a discutir as compreensões que diferentes profissionais da
educação básica têm sobre o Atendimento Educacional Especializado (AEE). O serviço
de AEE tem sido um dos pilares da Educação Especial na atualidade brasileira e da
mesma forma tem sido implantado e vivenciado de diferentes formatos. Para
compreender melhor sua implementação em algumas cidades da região sul do Brasil,
investigações sobre a temática foram desenvolvidas por um grupo de pesquisa de uma
Universidade Comunitária. A partir de algumas delas é que se elaborou o painel
proposto. As pesquisas aqui reunidas foram realizadas com diretores, orientadores,
supervisores, professores da sala comum e professores do AEE. Todas as investigações
derivam de dissertações de mestrado, estas utilizaram questionários e entrevistas para
coleta de dados e a análise de conteúdo para a categorização posterior dos mesmos. O
primeiro trabalho apresenta a compreensão da Equipe Diretiva escolar (diretores,
supervisores e orientadores) sobre o AEE. O segundo trabalho analisa o trabalho
docente realizado nas Salas de Recursos Multifuncionais (SRM) na concepção das
professoras da Sala Comum com foco nos processos de aprendizagem e
desenvolvimento dos alunos atendidos. E o terceiro estudo teve por objetivo conhecer
como as professoras especializadas compreendem o processo de escolarização e a
aprendizagem dos estudantes que frequentam o Atendimento Educacional Especializado
na escola, pelas vozes das professoras que atuam nesse serviço. Os resultados constatam
realidades semelhantes em diferentes escolas e apontam que as ações relacionadas ao
processo de escolarização destes estudantes ainda se dá de forma bastante marginal em
relação aos demais estudantes. Ainda que alguns dos profissionais pesquisados
destaquem a necessidade de um trabalho coletivo e de maior explicitação das
características e proposições deste serviço no projeto pedagógico das escolas denota-se
que estas ainda são metas não atingidas em sua totalidade.
Palavras-chave: Trabalho Docente. Educação Especial. Atendimento Educacional.
Especializado
XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira
11573ISSN 2177-336X
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CONCEPÇÕES DAS PROFESSORAS DA SALA COMUM SOBRE O
ATENDIMENTO EDUCACIONAL ESPECIALIZADO COM FOCO NA
APRENDIZAGEM
Andréia Heiderscheidt Fuck - UNIVILLE
Resumo: Este trabalho apresenta as concepções das professoras da Sala Comum sobre
o Atendimento Educacional Especializado (AEE) nas Salas de Recursos
Multifuncionais (SRM). Tem como objetivo principal analisar o trabalho docente
realizado nas SRM na concepção das professoras da Sala Comum com foco nos
processos de aprendizagem e desenvolvimento dos alunos atendidos. Para a construção
dos dados utilizou-se a aplicação de questionários a docentes do 1º ao 5º ano da rede
municipal de Joinville, sendo que 144 foram validados e analisados por meio da análise
de conteúdo de Franco (2012). Os resultados indicam que as professores da Sala
Comum de forma expressiva – 133 (92%) – acreditam no AEE como potencializador de
aprendizagem e desenvolvimento. No entanto, essa visão apresenta-se mesclada com os
desafios que as professoras da Sala Comum vivenciam no cotidiano do trabalho docente
e, de forma específica, na relação com os alunos público-alvo da Educação Especial.
Evidenciou-se ainda, falta de conexão entre as professoras da Sala Comum e as
professoras da SRM, já que a troca de informações entre os docentes se dá em uma
relação unilateral, as docentes da Sala Comum acreditam que é a professora
especializada que deve encontrar soluções, ter as respostas para as diferenças no
processo de escolarização dos alunos que frequentam o AEE, colocam-se como
receptoras de informações e não como participantes do processo. Conclui-se que existe
a necessidade de maior comunicação entre os profissionais envolvidos neste processo,
assim como maior entendimento das funções da professora especializada, para que
concepções que desvalorizam o trabalho docente nas SRM não passem a endossar o
entendimento que as professoras da Sala Comum tenham desse serviço no contexto
escolar.
Palavras-chave: Trabalho docente; Salas de recursos multifuncionais; Atendimento
educacional especializado.
Introdução
Segundo Pontes (1992), as ações, manifestações e soluções apresentadas para
problemas diários estão sempre embasadas em concepções. Estas são desenvolvidas
dentro de um processo histórico no qual estão incluídas as crenças e valores de cada
pessoa. As nossas concepções exercem um papel determinante em nossa forma de
pensar, agir e relacionar-se com os outros. Com essa compreensão, objetiva-se discutir
as concepções das professoras pesquisadas relacionando-as com os processos de
escolarização dos alunos com deficiência no contexto escolar.
Para Vasques e Baptista (2014, p.659), na contemporaneidade, a Educação
Especial é identificada como uma área de conhecimento em percurso de mudanças, e os
processos de escolarização das pessoas com deficiência constituem o centro dessas
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modificações, impulsionando a alteração dos caminhos, de propostas, da implantação de
políticas, “mas, sobretudo, reinvenção dos modos de se compreender quem são e como
se constituem esses sujeitos”. Para esses autores, o debate referente aos rumos da
Educação Especial se reveste de concepções antagônicas no meio social e acadêmico,
como o embate entre os que apostam na escolarização dos alunos com deficiência na
escola comum e aqueles que defendem a institucionalização e as escolas especiais; a
valorização de um conhecimento exclusivamente técnico (médico terapêutico) que
tende a esvaziar o investimento social e pedagógico nos estudantes com deficiência,
resultando na precariedade dos serviços e da formação de profissionais para assegurar a
escolarização de forma efetiva para os alunos público-alvo da Educação Especial. Nas
palavras de Kassar e Rabelo (2013, p.39),
Encontramo-nos hoje diante do desafio de construir possíveis caminhos que
levem à formação de uma educação especial que realmente colabore com a
educação escolar de crianças sob uma perspectiva educacional, sem, no
entanto, apagar ou ignorar as necessidades de indivíduos com
características muitas vezes bastante específicas (Grifos meus).
No que diz respeito ao processo de escolarização das pessoas com deficiência na
Sala Comum nos últimos anos, o AEE nas Salas de Recursos Multifuncionais (SRM)
passou a ser destaque nas discussões referentes à Educação. Baptista (2011, p. 60)
destaca que “entre os anos de 2005 e 2010, houve um grande investimento na sala de
recurso como espaço prioritário para a oferta do atendimento educacional
especializado”.
Estas discussões se intensificaram com a Política Nacional de Educação na
perspectiva da Educação Inclusiva – PNEE-EI de 2008, com indicativos de que o
Atendimento Educacional Especializado (AEE) não deveria substituir, mas
complementar ou suplementar o ensino em classes comuns, assim como a Resolução nº
04/2009 do CNE que define as diretrizes do AEE e em seu art. 1º regulamenta que:
§1° Os sistemas de ensino devem matricular os estudantes com deficiência,
transtornos globais de desenvolvimento e altas habilidades/superdotação nas
classes comuns do ensino regular e no atendimento educacional especializado
(AEE), complementar ou suplementar à escolarização ofertado em sala de
recurso multifuncional ou em centros de AEE da rede pública ou de
instituições comunitárias, confessionais ou filantrópicas sem fins lucrativos.
(BRASIL, 2009, p.1)
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Entretanto, o processo de implantação das Salas de Recursos Multifuncionais
teve início bem antes, com o Programa Educação Inclusiva – Direito à Diversidade
(2003-2010), que possibilitou a formação de gestores e educadores nos municípios
brasileiros, intensificando a relação entre a Secretaria da Educação Especial (SEESP) e
uma rede de municípios pólo nos diferentes estados. O município de Joinville, lócus de
investigação do presente trabalho, iniciou como município pólo em 2007 e recebeu as
primeiras nove Salas de Recursos Multifuncionais no ano de 2009, contando com 42
Salas já implantadas até 2013, ano de construção dos dados da presente pesquisa.
Diante destas regulamentações, a escola se vê frente a um novo serviço que
deve funcionar preferencialmente dentro da própria escola, mas que exige dos
profissionais o repensar de suas ações e a reorganização de suas estruturas para que este
atendimento se realize, a começar pelo próprio projeto político pedagógico. Questiona-
se, contudo, se este serviço de ensino em concordância com a PNEE-EI de 2008
contribuirá para a reestruturação das ações pedagógicas nas Salas Comuns e
consequentemente uma mudança nas estruturas organizativas da escola. Segundo Garcia
(2013) a política de Educação Especial no Brasil ganhou contornos que devem ser
analisados, devido as mudanças conceituais e estruturais, de maneira específica à
adoção de uma perspectiva inclusiva a educação nacional, o que torna indispensável a
discussão das políticas e práticas de formação dos professores. Com a finalidade de
contribuir com as discussões na área da Educação Especial tendo como enfoque o AEE
oferecido aos alunos com deficiência, este trabalho tem como objetivo analisar o
trabalho docente realizado nas SRM na concepção dos professores da Sala Comum com
foco nos processos de aprendizagem e desenvolvimento dos alunos atendidos.
Caminhos Metodológicos da Pesquisa e Seus Participantes
Para o desenvolvimento desta pesquisa adotou-se uma visão de homem
alicerçada em alguns conceitos do materialismo histórico e dialético, o qual “percebe os
sujeitos como históricos, datados, concretos, marcados por uma cultura como criadores
de ideias e consciência que, ao produzirem e reproduzirem a realidade social, são ao
mesmo tempo produzidos e reproduzidos por ela” (FREITAS, 2002, p.22).
Devido ao elevado número de participantes, caracterizou-se esta pesquisa como
do tipo survey. Atualmente este é um dos métodos empregados com maior frequência
na pesquisa social. Esclarece-se que o método survey pode ser relacionado à pesquisa
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quantitativa, qual não é a intenção deste trabalho, portanto este foi utilizado como um
instrumento que possibilitou coletar as informações, que por meio de uma análise
qualitativa passaram a representar as opiniões e concepções dos participantes.
Para realizar esta investigação foram estabelecidos critérios de participação,
dentre eles definiu-se que os respondentes seriam professores da Sala Comum do 1º ao
5° ano, de todas as escolas municipais de Joinville, que no ano de 2013 haviam tido ou
tivessem alunos em atendimento na Sala de Recurso Multifuncional; foram enviados
872 questionários. Desses, 542 foram devolvidos, 322 estavam em branco, 220
respondidos, 76 não atendiam aos critérios estabelecidos. Portanto, para análise dos
dados obteve-se 144 respondentes. O instrumento utilizado para a construção dos dados
foi um questionário autoaplicável contendo dezoito questões abertas e fechadas. Esta
pesquisa adotou como método de análise dos dados a Análise de Conteúdo (FRANCO,
2012), pois se entende que este procedimento permite valorizar o material a ser
analisado, abrindo possibilidades de contextualizá-lo. Para a organização dos dados,
todas as questões foram transcritas para planilhas do programa Excel.
Após a digitação de todos os questionários, as planilhas das questões abertas
foram impressas para se dar início à codificação, classificação e categorização dos
dados.
As Professoras, suas Concepções e os Processos de Escolarização dos Alunos com
Deficiência
De forma expressiva, das 144 professorasi pesquisadas, 133 (92%) acreditam no
AEE nas SRM como potencializador de aprendizagem e desenvolvimento. Para
justificar suas concepções, as respondentes destacaram três aspectos: aprendizagem,
dificuldades/necessidades e trabalho individualizado. No entanto, essas questões se
apresentam mescladas com as inúmeras dificuldades, desafios que as professoras da
Sala Comum vivenciam no cotidiano do trabalho docente e, de forma específica, com os
alunos público-alvo da Educação Especial.
As professoras que acreditam que o trabalho desenvolvido na SRM auxilia na
aprendizagem dos alunos, explicam que isso ocorre porque a professora do AEE, por
meio dos diferentes recursos, da identificação das habilidades e do atendimento
individualizado, possui maiores condições de identificar as necessidades dos alunos,
conforme se pode constatar nas falas a seguir:
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É um atendimento mais especial. Em sala, o aluno com necessidade especial
fica/divide a atenção da professora com todos os outros alunos, está incluído
nas atividades, mas na sala de recurso multifuncional ele recebe atenção só
para ele. Ajuda e muito (P35)ii.
Porque ela foi criada com esse objetivo: identificar as necessidades e
habilidades de cada educando e oferecer recursos que lhe possibilitem
reconhecer interesses e desenvolver habilidade, avançando no processo de
aprendizagem (P105).
Evidencia-se que as professoras referem-se à aprendizagem tendo como foco o
aluno e suas limitações, não apresentam preocupação com a dinâmica do trabalho
desenvolvido em sala de aula comum, não demonstraram estarem incomodadas se as
atividades desenvolvidas atendem as necessidades e potencialidades de todos e de
maneira específica o aluno com deficiência. Para Vygotsky (2007), um processo de
aprendizagem adequadamente organizado é capaz de ativar processos de
desenvolvimento. Nessa concepção, o que diferencia de forma crucial o “homem” dos
outros animais é a sua experiência histórica e a consciência dela. Esta é transmitida não
por herança biológica, mas pela trajetória social, pelo contato, pelo convívio com outros
homens. Assim, a aprendizagem é elevada a uma posição de extrema importância, na
medida em que se constitui em condição fundamental para o desenvolvimento das
características humanas não naturais, mas formadas historicamente.
Esses princípios reforçam o entendimento de que é nas relações com os seus
pares que o aluno com deficiência terá a oportunidade de aprendizagem e
desenvolvimento, por isso a importância do acesso à Sala Comum e aos processos de
escolarização, para que, por meio das ações realizadas no/com o coletivo, o indivíduo
possa aprender e desenvolver, o que explica o caráter suplementar e complementar do
AEE nas SRM, ou seja, a mola propulsora para a realização do trabalho da professora
especializada é o trabalho realizado na Sala Comum. Para Góes (2008), a Educação
Especial, assim como a Educação Geral, deve envolver o aluno na organização do
mundo comum, valorizar e possibilitar seu acesso a diferentes atividades e esferas, deve
ser uma educação que envolva o aluno na coletividade, uma educação social.
Contudo, entende-se que essa aposta na escolarização do aluno com deficiência
ainda se mostra um tanto quanto conflituosa no espaço escolar, sendo que foge aos
padrões historicamente construídos que coloca o aluno dito “normal” de um lado e o
dito “anormal” de outro, ou seja, “normais” e os “outros”. Nas palavras de Baptista
(2009), o movimento de inclusão tem suas origens nos limites de identificação dos
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sujeitos com necessidades educativas especiais, nos mecanismos de exclusão da escola,
nas alternativas paralelas de atendimento, com propostas minimizadoras dos desafios
pedagógicos, sendo que se encontra intrinsecamente ligado as nossas dificuldades de
propor e efetivar uma política educacional que de fato atenda a todos.
Essas reflexões devem acompanhar as discussões que referenciam a educação
contemporânea, de forma específica a educação inclusiva, para que não se atribua ao
presente a responsabilidade pela precariedade dos contextos educacionais.
“Possivelmente tais precariedades não sejam uma invenção da proposta inclusiva, mas
dêem continuidade a aspectos incipientes de nosso modo de fazer educação”
(BAPTISTA, 2013, p. 49).
Seguindo nas análises do entendimento das 133(92%) professoras que acreditam
no AEE como potencializador de aprendizagem e desenvolvimento, foi possível
perceber diferentes concepções sobre o processo de aprendizagem e desenvolvimento
dos alunos:
- Primeiro as professoras acreditam que o trabalho desenvolvido na SRM auxilia
na aprendizagem e desenvolvimento devido aos recursos, ao trabalho individualizado,
ao desenvolvimento das habilidades que resultam na aprendizagem dos alunos,
crenças que se mostram coerentes com a função desse serviço. Contudo, não se percebe
conexão desse ensino com a aprendizagem da Sala Comum, já que a troca de
informações entre as professoras não é citada nesse momento.
- Segundo, explicitam suas próprias dificuldades em trabalhar com as diferenças
na sala de aula comum, atribuindo à professora especializada melhores condições de
trabalho, o que possibilita eliminar as dificuldades e suprir as necessidades dos alunos;
nesse momento, conforme afirma a professora “a SRM é uma extensão do trabalho da
sala de aula sem a preocupação da fiel aplicação dos conteúdos, mas estimula os
alunos a partir de estratégias pensadas especificamente com a finalidade de adquirir
maturidade (P100). Percebem-se diferentes concepções de aprendizagem; parece que
aprender na Sala Comum é uma coisa, na SRM é outra. Na SRM, é possível conceber as
singularidades do processo de aprender, na Sala Comum todos têm que responder a um
currículo sistematizado, e quem não corresponde acaba por ficar fora do processo.
- Terceiro, concebem o trabalho individualizado como prioridade para que o
aluno se desenvolva, pois este possibilita focar na necessidade do aluno. Cabe esclarecer
que dentro dos objetivos estabelecidos para o AEE nas SRM, o trabalho individualizado
só terá sentido se eliminar as barreiras impostas pelo contexto escolar. Desconsiderar
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essa relação dialética que constitui a aprendizagem pode levar não só a depositar a
dificuldade no próprio aluno, como também, colocá-lo a margem do processo de
aquisição dos conhecimentos escolarizados. As consequências deste processo estão para
além da escola, nas palavras de Duarte (2011, p. 341):
Uma das formas mais básicas de alienação é aquela na qual os indivíduos
humanos são impedidos de apropriarem-se da riqueza material e intelectual
produzida socialmente e incorporada ao ser do gênero humano. Em outras
palavras, toda vez que um ser humano é impedido de apropriar-se daquilo
que faça parte da riqueza do gênero humano, estamos perante um processo de
alienação, um processo que impede a humanização desse indivíduo.
Com o objetivo de esclarecer as concepções de aprendizagem e desenvolvimento
e suas relações com a prática docente julgou-se importante discutir as respostas das
professoras, cuja opinião é de que o atendimento na SRM possibilita “eliminar as
dificuldades” dos alunos, reconhecendo suas necessidades:
Irão ajudar diante das limitações que esses alunos têm, trabalhando para
que o aluno possa desenvolver seja na cognição, discriminação visual,
auditiva, estimulando para que o aluno se desenvolva dentro de suas
possibilidades (P50).
Porque é no atendimento especializado e individual que o aluno tem a
oportunidade de expressar-se e manifestar suas dúvidas e solucionar suas
dificuldades (P48).
Percebe-se nas falas das professoras a compreensão da SRM como o lócus
privilegiado de trabalhar com o aluno público alvo da Educação Especial, o que justifica
o entendimento de que não é necessário um trabalho conjunto com a sala comum,
confirmando a visão de Garcia (2013), quando referencia que o formato proposto para o
AEE na SRM se mantém como paralelo ao trabalho realizado na sala comum. Entende-
se que de forma implícita as professoras da Sala Comum acreditam que as professoras
especializadas possuem melhores condições de trabalho, dispõem de recursos, número
reduzido de alunos, assim como não precisam seguir um currículo já estabelecido, pois
têm autonomia para realizar seu planejamento a partir das necessidades dos alunos.
Constata-se a crença de que o atendimento realizado no AEE promove a aprendizagem,
elimina as dificuldades dos alunos e estas possibilidades parecem estar intrinsecamente
interligadas a realização de um trabalho individualizado.
Em uma perspectiva histórico-cultural , entende-se “que a verdadeira direção do
processo de desenvolvimento do pensamento da criança não vai do individual ao
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socializado, mas sim do social ao individual” (DUARTE, 2011, p.286). Assim, seja na
sala de aula comum ou na SRM ou em qualquer outro espaço escolar, as intervenções
que as professoras realizam junto aos alunos são fundamentais para seu aprendizado
escolarizado. Compreende-se que o trabalho docente no AEE tem funções diferenciadas
daquele realizado na Sala Comum por meio de um planejamento sistematizado, de
atividades desafiadoras, a professora da sala comum deve considerar as
individualidades, porém entende-se que isso é realizado no coletivo. Já o trabalho da
professora especializada visa contemplar as especificidades observadas no coletivo,
àquilo que o aluno não conseguiu realizar no grupo e com o grupo, que necessitam de
maior investigação, de proposições diferenciadas, de recursos, de adaptações que só
adquirem significado quando do individual retornam para o coletivo, ampliando as
oportunidades de aprendizagem e participação do aluno. As professoras pesquisadas
concebem o trabalho individualizado como prioridade para que o aluno com
deficiência se desenvolva, pois este possibilita focar em suas necessidades. Porém,
entende-se que esse trabalho só terá sentido se eliminar as barreiras impostas pelo
contexto escolar.
Pensar as concepções que fundamentam o fazer pedagógico no processo de
escolarização torna-se central, já que o trabalho individualizado pode ser compreendido
como trabalho isolado. Romper com esse fazer e essas concepções que levam ao
entendimento de que trabalhar somente com o aluno daria conta de dar o suporte
necessário para que ele aprenda é fundamental dentro da concepção de que o aluno se
constitui nas relações e que, portanto, sua aprendizagem está ancorada nas condições
concretas de ensino.
Segundo Bueno (2013), as dificuldades apresentadas pelas professoras da sala
comum têm suas raízes na própria constituição histórica da escola, que “[...] com o
passar dos anos, sedimentou o princípio da homogeneidade, constituindo, no século XX,
um dos grandes traços da cultura escolar [...]” (MARIN, 2013, p.10). O aluno com
deficiência desestabiliza esse princípio e, assim, desestrutura o fazer pedagógico,
tornando-se um grande desafio para a escola que se habituou a trabalhar com um aluno
“ideal”, baseado em um modelo único de ensinar, justificando as diferenças nesse
processo considerando a diversidade humana apenas por meio de explicações
individuais, biológicas, afetivas ou por pertença às classes populares.
Os dados apontam para a necessidade de maior comunicação entre os
profissionais envolvidos no processo de escolarização dos alunos com deficiência,
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assim como o desenvolvimento de um trabalho colaborativo, para que opiniões como
“nunca tivemos retorno por escrito da avaliação da criança. Somente por telefone: o
que não é suficiente. Não houve „progresso das crianças‟ (P122)”, assim como outras
que desvalorizam o trabalho docente nas SRM, não passem a endossar a concepção que
as professoras da Sala Comum tenham desse serviço no contexto escolar.
Considerações Finais
Neste trabalho, evidenciou-se a falta de conexão entre o professor da Sala
Comum e o professor da SRM, já que a troca de informações entre os docentes se dá em
uma relação unilateral. Na concepção das docentes da Sala Comum, é a professora
especializada que deve encontrar soluções para as diferenças no processo de
escolarização dos estudantes que frequentam o AEE, colocam-se como receptoras de
informações e não como participantes do processo. As professoras pesquisadas
explicitam suas próprias dificuldades em trabalhar com as diferenças na sala de aula,
atribuindo à professora especializada melhores condições de trabalho, as quais
possibilitam eliminar dificuldades e suprir necessidades dos alunos. A SRM é citada
como extensão da Sala Comum, mas sem a responsabilidade de trabalhar com os
conteúdos, e esta não responsabilidade é apresentada como algo que confere às
professoras especializadas vantagens que se mostram associadas ao currículo, ou seja, a
professora especializada não tem a obrigação de dar conta de conteúdo já determinados
a priori. As professoras pesquisadas concebem o trabalho individualizado como
prioridade para que o aluno se desenvolva, pois este possibilita focar nas suas
necessidades. Porém, entende-se que esse trabalho só terá sentido se eliminar as
barreiras impostas pelo contexto escolar.
Na tessitura dos dados emerge a necessidade de maior comunicação entre os
profissionais envolvidos no processo de escolarização dos alunos com deficiência,
assim como o entendimento das funções das professoras especializadas. As professoras
da Sala Comum, por meio de suas concepções, apontam para a imprescindibilidade de
um repensar da própria instituição escolar no que se refere às concepções de
desenvolvimento de todos os alunos e, de forma específica, aos alunos público-alvo da
Educação Especial.
Bueno (2013) afirma que, se no passado os processos de seletividade se davam
pelo não acesso ou pelas retenções e evasões provocadas pela reprovação escolar, no
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momento atual, com a ampliação das possibilidades de acesso para a quase totalidade
das crianças com idade de ingresso no ensino fundamental e pelos mecanismos de
redução da repetência (sistema de ciclos, regime de progressão continuada etc.), hoje
essa seletividade se expressa também, e especialmente, pelos baixos índices de
aprendizagem, que continuam afetando, de forma contundente, os alunos com
necessidades específicas.
As constatações evidenciadas na pesquisa apontam para a necessidade de
maiores informações e formações no contexto escolar que tenham como foco os
processos de escolarização dos alunos com deficiência e o trabalho docente numa
perspectiva colaborativa.
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ATENDIMENTO EDUCACIONAL ESPECIALIZADO NAS VOZES DAS
EQUIPES DIRETIVAS: PRIMEIRAS APROXIMAÇÕES
Neusa Denise Marques de Oliveira - UNIVILLE
Resumo: Este trabalho é parte de um estudo de mestrado intitulado “O Atendimento
Educacional Especializado nas vozes da equipe diretiva”. Tem como objetivo investigar
a compreensão da Equipe Diretiva escolar sobre o Atendimento Educacional
Especializado (AEE). Para a construção dos dados aplicaram-se questionários em 11
escolas do 1º ao 9º ano da rede municipal de Camboriú – SC. Participaram da pesquisa
10 diretores, 12 supervisores e 10 orientadores educacionais. Os dados foram analisados
por meio da análise de conteúdo de Franco (2008). Evidenciou-se que uma porcentagem
significativa da equipe diretiva das escolas municipais de Camboriú são recentes na
função que exercem. No que concerne a compreensão específica sobre o AEE no
contexto escolar, observou-se que 53% dos participantes da pesquisa, compreendem o
AEE como um atendimento especializado centrado no estudante com deficiência, mas
não demonstram clareza quanto ao público alvo do AEE e 21% concebem o serviço
como um atendimento complexo que pressupõe a reestruturação e mudanças na
organização escolar, necessitando de espaços dialógicos para que se efetive. Acentua-se
assim, a importância do AEE estar contemplado no Projeto Político Pedagógico (PPP)
da escola, pois permite que os profissionais construam de forma coletiva, participativa e
comprometida um documento norteador da organização escolar e de suas práticas.
Ressalta-se que o AEE é um serviço que está se constituindo no município de
Camboriú, a partir do ano de 2013. Dessa forma, supõe-se que a divergência de
compreensão do AEE, pela equipe diretiva, compõe essa constituição, externando a
complexidade que é a educação especial, em seus contornos atuais, bem como sua
materialização.
Palavras-Chave: Equipe diretiva escolar. Educação especial. Organização escolar.
A Educação Especial e o processo de re-organização dos espaços escolares
Conforme Libâneo (2012), as reformas ocorridas no campo da educação, a partir
dos acordos internacionais iniciados na Inglaterra nos anos 1980 acentuaram as
desigualdades sociais, no Brasil, levando os sistemas de ensino a se reestruturarem para
atender as novas exigências do capitalismo, que necessitava de mão de obra mais
qualificada, para atender o mercado competitivo.
Michels (2006, p.560), salienta que a reorganização do capitalismo, “redefine a
organização escolar a partir de três pontos-chaves: Gestão, formação de professores e
inclusão”. Neste estudo daremos ênfase à gestão escolar e ao Atendimento Educacional
Especializado, lembrando que o impacto dessas mudanças ocorre em todos os níveis da
educação brasileira.
Contudo, as diretrizes se configuram em documento norteador da política, assim
a forma como acontece sua materialização é permeado também pelos interesses e
XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira
11585ISSN 2177-336X
14
compreensão dos gestores dos sistemas de ensino, que são responsáveis pela sua
organização. Essas diretrizes se configurarão de forma diferente em cada município e
em cada instituição escolar. É relevante destacar que as políticas de educação especial
não estão desvinculadas das políticas educacionais do ensino regular, logo, também
sofrem influências políticas, sociais e econômicas.
Neste sentido Libâneo (2015, p.18) salienta que,
[...] as escolas são parte do todo social. As políticas, as diretrizes
curriculares, as formas de organização do sistema de ensino estão
carregados de significados sociais e políticos, afetando as ideias, as
atitudes, modos de agir e comportamentos de professores e alunos,
bem como as práticas pedagógicas , curriculares e organizacionais.
Dentro do espaço escolar existem vários profissionais que atuam e viabilizam
seu funcionamento, porém, neste estudo daremos ênfase à atuação da equipe diretiva
escolar, que segundo Vasconcellos (2013, p.51), é “composta pelo Diretor(a),
Supervisor(a)/Coordenador pedagógico e Orientador(a) Educacional”, no
desenvolvimento de uma gestão participativa, junto aos estudantes, professores e
famílias, dentro dos espaços escolares, na promoção de uma educação para todos, que
garanta a formação integral do estudante, possibilitando seu desenvolvimento humano,
cultural, científico e tecnológico.
Ressalta-se assim, a importância da equipe diretiva na reestruturação e
organização dos espaços da escola, por meio da construção de momentos permanentes
de diálogos e formação, para isso, necessita promover a participação de todos que atuam
na escola, professores, demais funcionários, entre outros, proporcionando o debate sobre
as diretrizes educacionais, e sua implementação no âmbito escolar, bem como discutir
as dificuldades encontradas no processo de escolarização, construindo propostas
coletivas, que levem à transformação e efetivação do processo de escolarização, a partir
de objetivos educativos mediados por uma ação pedagógica mais participativa.
Convergindo com a discussão, Libâneo (2008, p. 109), expõe que,
A partir da interação entre diretores, coordenadores pedagógicos,
professores, funcionários e alunos, a escola vai adquirindo, na
vivência do dia-a-dia, traços culturais próprios, vai formando crenças,
valores, significados, modos de agir, práticas. [...] Essa cultura própria
vai sendo internalizada pelas pessoas e gerando um estilo coletivo de
perceber as coisas, de pensar os problemas, de encontrar soluções. [...]
Há em cada escola uma forma dominante de ação na interação entre as
pessoas.
XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira
11586ISSN 2177-336X
15
Vale lembrar que em cada momento histórico, econômico e político da
sociedade, a atuação da equipe diretiva no processo de escolarização dos estudantes,
configurou-se em formas diferentes. Estes profissionais na atualidade têm funções
específicas, mas que precisam estar articuladas, com o intuito de promover o processo
de escolarização dos estudantes de forma efetiva.
Rangel (2013, p.16), salienta que a articulação entre o supervisor e o
orientador(a) educacional, juntamente com o diretor é essencial, pois juntos “têm muito
a realizar nos projetos comuns”, de modo a contribuir com o processo de escolarização
dos estudantes, a exemplo na coordenação Conjunta de Conselho de Classe, nos quais
os professores se reúnem para a avaliação do aproveitamento escolar dos alunos, do
processo de ensino e aprendizagem, na realização de reuniões e encontros com pais,
entre outros, no planejamento da formação continuada dos professores, por meio de
estudos dos problemas encontrados no processo de escolarização dos estudantes.
Paro (2007) e Libâneo (2015), têm enfatizado que a gestão nos espaços escolares
se apresenta como um dos condicionantes para a melhoria do ensino.
Desse modo Libâneo (2015, p.22), defende que uma escola,
[...] bem organizada e gerida é aquela que cria e assegura condições
pedagógico-didáticas, organizacionais e operacionais que propiciam o
bom desempenho dos professores em sala de aula, de modo que todos
os seus alunos sejam bem sucedidos na aprendizagem escolar. As
pesquisas que buscam saber características de uma escola fazem
diferença no que diz respeito ao nível da qualidade de ensino, e que
ganham reputação na comunidade, mostram que o modo como a
escola funciona – suas práticas de organização e gestão – faz diferença
em relação aos resultados escolares dos alunos.
Para que a organização escolar seja realizada de forma adequada, é importante a
construção coletiva do projeto pedagógico da escola contemplando de forma detalhada
os itens citados a seguir, conforme ressalta Libâneo (2015, p.170),
a) Organização da vida escolar: Trata-se da organização dos
meios de trabalho escolar em função de sua especificidade e dos
objetivos educacionais, propiciando as melhores condições possíveis
para o desenvolvimento do ensino e da aprendizagem dos alunos. [...]
dizem respeito a: estrutura organizacional, legislação escolar,
organização do espaço físico, recursos materiais, didáticos,
financeiros, clima de trabalho, sistema participativo de tomadas de
decisão [...]
b) Organização do processo ensino aprendizagem: [...] suportes
pedagógicos, necessários à organização do trabalho escolar.
Compreende o currículo, a organização pedagógico didática, formação
continuada, conselhos de classe [...]
c) Organização das atividades de apoio técnico – administrativo:
[...] abrange as atividades da secretaria escolar, dos especialistas
pedagógicos, serviços auxiliares, serviços gerais [...]
XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira
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d) Organização de atividades que asseguram a relação entre
escola e comunidade: [..] níveis superiores de gestão do sistema
escolar, os pais, as organizações políticas e comunitárias [...]
Certamente há tensionamentos na construção coletiva do projeto pedagógico,
pois este perpassa questões culturais, sociais e políticas dos indivíduos participantes,
contudo é importante que as equipes diretivas das escolas, coloquem a construção do
projeto pedagógico no centro das discussões das práticas escolares. Que promovam
espaços para sua construção de forma conjunta e dialógica, pois é neste esforço que a
escola se fortalecerá, comprometendo todos os profissionais que atuam neste espaço
para a realização dos objetivos construídos coletivamente.
Desta forma percebe-se que uma educação para todos envolve esforços
coletivos, sendo necessária a eliminação de barreiras políticas, pedagógico-didáticas e
outras que impedem ou dificultam a escolarização da pessoa com deficiência no ensino
comum regular.
De acordo com Decreto nº. 7.611/11, que trata da Educação Especial, e do
Atendimento Educacional Especializado, o AEE é um serviço da Educação Especial,
que seleciona, organiza e produz recursos pedagógicos para a eliminação de barreiras e
promoção do processo de escolarização da pessoa com deficiência, levando em conta
suas especificidades e dando ênfase as suas potencialidades, como lócus prioritário de
atuação na Sala de Recursos Multifuncionais. Muitos autores têm apontado o AEE nos
espaços escolares, como potencializador do processo de escolarização da pessoa com
deficiência, quando implementado de forma dialógica envolvendo todos os profissionais
do coletivo escolar na sua efetivação.
Destaca-se assim a importância da equipe diretiva escolar na compreensão das
diretrizes que norteiam este atendimento, e na criação de espaço de discussão destas
diretrizes junto aos professores e demais funcionários, propiciando espaços de formação
permanentes dentro das escolas, que permitirá a construção e ressignificação de
conhecimentos, entre os profissionais, pressupõe assim, que hajam ações mais
comprometidas por parte destes, no desenvolvimento do AEE na instituição escolar.
Essas discussões culminarão na constituição de documento norteador da organização
escolar e de suas práticas, que precisa ser revisitado, acompanhado e avaliado,
permitindo que cada profissional, reconheça suas responsabilidades, que interfiram em
seus limites, que discutam as dificuldades encontradas, no processo de escolarização
XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira
11588ISSN 2177-336X
17
dos estudantes público alvo do AEE, estudantes com deficiência, altas habilidades,
transtornos globais do desenvolvimento ou não, buscando estratégias para minimizá-las.
Nesse sentido, o presente estudo teve por objetivo investigar a compreensão da
Equipe Diretiva escolar sobre o Atendimento Educacional Especializado (AEE).
Metodologia
O estudo realizou-se em uma abordagem qualitativa Gatti e André (2010). O
instrumento para coleta de dados foi um questionário autoaplicável, o qual continha 14
perguntas abertas e 16 fechadas. Para a seleção dos participantes da pesquisa, foram
utilizados alguns critérios, a exemplo: estar na função de direção, orientação ou
supervisão educacional, em escolas de 1° ao 9° ano do ensino fundamental, da Rede
Municipal de Ensino de Camboriú – Santa Catarina. Selecionados os participantes, a
pesquisa contou com 32 integrantes de equipes diretivas que trabalham em 11 escolas
da referida Rede Municipal de Ensino.
Após a aplicação dos questionários as respostas foram transcritas para uma
planilha de Excel, e posteriormente, analisadas e categorizadas. As respostas dos
questionários foram analisadas por meio da análise de conteúdo de Franco (2008), pois
se entende que este procedimento permite valorizar o material a ser examinado abrindo
possibilidades de contextualizá-lo.
Para Franco (2008, p.23), a análise de conteúdo apresenta-se como sendo “um
procedimento de pesquisa que se situa em um delineamento mais amplo da teoria da
comunicação e tem como ponto de partida a mensagem.”
Este processo levou à categorização por recorrência, contradição e
complementaridade a partir dos quais foram criados indicadores. Em posse dos
indicadores foram articuladas as categorias. Neste trabalho será apresentada a categoria
que discute a compreensão da equipe diretiva em relação ao AEE. As demais categorias
serão aprofundadas em estudos posteriores.
Análise e Discussão dos Resultados
Foram analisados os dados das 11 escolas que fizeram parte desta
pesquisa. Ressalta-se que o município de Camboriú, de acordo com as informações
obtidas por meio da coordenadora de Inclusão e da Coordenadora Geral da Secretaria de
Educação Municipal, têm 15 escolas municipais. Pode-se dizer que este estudo contou
XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira
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com a participação de um número expressivo de escolas. Dos 32 participantes
pesquisados, 10 eram diretores, 10 orientadores e 12 supervisores.
A questão aqui analisada se refere à compreensão da equipe diretiva escolar
sobre o Atendimento Educacional Especializado.
Dos participantes da pesquisa 91% são mulheres e 9% homens. Os participantes
possuem idades entre 24 e 61 anos e atuam 40 horas semanais nas escolas. Em relação
ao ingresso no cargo em que ocupam, 59% responderam que sua inserção na rede
municipal de ensino se deu por meio de concurso público, 28% informou que foi por
indicação da Secretaria de Educação, 10% indicou que foi por convite da Secretaria de
Educação e 3% que o ingresso foi por meio de processo seletivo, sendo que os
indicados ou convidados, referem-se ao cargo de diretor.
Assim, no que tange ao ingresso ao cargo, salienta-se, que as diretrizes
educacionais atuais a exemplo a Constituição Federal (1988), a LDBN 9.394/96, o
Plano Nacional de Educação (PNE), sancionado pela Lei no 13.005, de 25 de junho de
2014, vêm valorizando a gestão escolar democrática nos espaços escolares.
O Plano Nacional de Educação (PNE) em seu art. 2, inciso VI, evidencia a
“promoção do princípio da gestão democrática na educação pública assegurar
condições, no prazo de dois anos, para a efetivação da gestão democrática da educação,
associada a critérios técnicos de mérito e desempenho e à consulta pública [...]”. Apesar
de existirem legislações que preveem a gestão democrática, a eleição para diretores nas
escolas, como ponto de partida para uma ação mais participativa junto à comunidade,
nos espaços escolares é uma decisão que pertence aos gestores das esferas de governo
Federal, Estadual e Municipal.
O processo de eleição de diretores é o início de uma ação mais participativa
junto à comunidade escolar. Paro (2003, p. 124), clarifica que a introdução da eleição
nas escolas, não se dá de forma harmoniosa, “como todo instrumento de democracia,
não está livre dos conflitos e tensionamentos”, mas, constitui-se como uma forma de
permitir que um número maior de pessoas da comunidade escolar, se envolva nas
resoluções destes conflitos.
Ao analisar os dados constatou-se que 44% dos participantes têm de 1 mês a 1
ano de experiência no exercício da função; 41% de 3 a 6 anos; 11% de 7 a 10 anos e
4% mais de 10 anos. Evidencia-se assim que uma porcentagem significativa de
profissionais da equipe diretiva das escolas municipais de Camboriú são recentes na
XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira
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função que exercem. Dessa forma, pode-se dizer que a equipe diretiva está se
constituindo nos espaços escolares pesquisados.
Para contextualizar melhor as informações para análise dos dados agrupou-se na
tabela abaixo as escolas, de acordo com a situação que demonstra como o AEE se
apresenta nestas. Ressalta-se que utilizaremos “E” para se referir a escola, e o número
para demostrar a qual escola se está tratando. Faremos uso do mesmo procedimento
para mencionar as falas da equipe diretiva, utilizando “ED”, indicando equipe diretiva e
a letra subscrita “d, s, o”, nomeia qual dos integrantes da equipe diretiva está falando,
por exemplo: “EDd” é diretor(a), “EDs” é supervisor(a), ou o “EDo” para
orientador(a), e o número apresenta a escola a qual se está abordando.
Tabela1: Situando o Atendimento Educacional Especializado nas Escolas pesquisadas.
Situação Escolas
Escolas que ofertam o AEE na própria Escola E2 e E6
Escolas que têm o professor de AEE E2 e E6
Escolas que têm a Sala de Recursos Multifuncionais (SRM) E1, E2, E3, E6 e E8
Escolas que os estudantes do AEE recebem atendimento de um profissional
especializado na própria escola E4, E5 e E9
Escolas que encaminham os estudantes do AEE para uma escola Pólo. E7, E10 e E11
Fonte: Elaborado pela própria pesquisadora 2016.
No que concerne a compreensão específica sobre o AEE no contexto escolar,
observou-se que 53% das equipes diretivas das escolas, compreendem o AEE como um
atendimento especializado com foco no estudante com deficiência; 21% concebem o
AEE como um atendimento complexo que supõe a reestruturação nos espaços escolares;
21% silenciaram-se sobre esta questão e 5% informam na resposta que tem a sala de
recursos multifuncionais, mas não tem o profissional especializado para desenvolver o
trabalho junto aos estudantes com deficiência. Apresentam-se a seguir algumas falas das
equipes diretivas que pressupõe o atendimento com foco no estudante com deficiência:
ED4d “São alunos com dificuldade, que recebem atendimento
especializado na nossa escola, é com monitora”.
ED6s "Atendimento para auxiliar alunos com deficiência e
distúrbios”.
ED7o “Complemento para a formação e desenvolvimento do aluno
com necessidades específicas”.
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Constata-se que as respostas de 50% dos participantes, além de evidenciar foco
no atendimento ao estudante com deficiência, nota-se também, em algumas falas, falta
de clareza quanto ao público alvo do AEE.
No artigo 1º do Decreto n° 7.611/2011, institui-se como público-alvo da
educação especial, “[...] pessoas com deficiência, com transtornos globais do
desenvolvimento e com altas habilidades ou superdotação”. Assim, evidenciam
diferentes entendimentos no que tange ao público alvo do AEE, podendo desvirtuar este
atendimento nos espaços escolares. Percebe-se que há falas que se aproximam da
definição do público-alvo estabelecido na diretriz mencionada, e, há falas que se
distanciam, por exemplo, quando as participantes da pesquisa citam o seguinte: “alunos
com dificuldades”, “alunos com deficiência e distúrbio”, “alunos com necessidades
específicas”.
Nota-se divergência na compreensão da função do AEE entre a equipe diretiva
da mesma escola, tal como na escola E6, que já possui o AEE em funcionamento em
seu espaço escolar. A E2 que também possui o AEE em funcionamento, demonstra o
foco também no aluno com deficiência, como podemos verificar nas falas abaixo:
ED2d “Para atender e orientar alunos e pais destas crianças de como é
a melhor forma de agir para desenvolver atitudes no seu cotidiano".
ED2o “Por lei o aluno tem direito do atendimento especializado no
trabalho no desenvolvimento desse aluno. É um atendimento
individualizado, trabalhando suas habilidade".
Assim, as falas apontam para uma visão fragmentada da própria organização
escolar, denota ausência de proposta coletiva, que oportunize enxergar o AEE no
sentido macro, dentro de uma proposta pedagógica construída coletivamente, no qual os
participantes reconheçam a importância de suas ações na efetivação deste atendimento
no espaço escolar. O decreto n° 7.611/2011 estabelece em seu artigo segundo que
Atendimento Educacional Especializado (AEE) é um “serviço que seleciona, organiza e
produz recursos pedagógicos para a eliminação de barreiras” para a promoção do
processo de escolarização da pessoa com deficiência, levando em conta suas
especificidades e dando ênfase as suas potencialidades, com lócus prioritário de atuação
na Sala de Recursos Multifuncionais.
Entretanto o AEE não poderia ser compreendido pelos profissionais da
instituição escolar como um serviço a parte. É necessário compreendê-lo dentro da
proposta pedagógica da escola de forma transversal, sendo que todos os profissionais da
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21
instituição precisam estar envolvidos, compreendendo sua atribuição e contribuição no
processo de escolarização dos estudantes público-alvo do AEE.
Garcia (2008, p.21) contribui com a discussão ao expor que,
Ainda que a implantação de serviços especializados nas redes de
ensino signifique um ganho em termos de oferta educacional pública
para os alunos com deficiência, é necessário questionar qual o papel
exercido por tais serviços e como estão relacionados ao trabalho
pedagógico realizado na educação básica.
Percebem-se divergências nas falas entre os integrantes da equipe diretiva, ao
observar que parte da equipe diretiva das escolas pesquisadas compreende o AEE com
foco no atendimento ao estudante com deficiência, entretanto a outra parte que
compõem os 21% dos participantes da pesquisa, concebem o AEE como um
atendimento complexo que supõe a reestruturação nos espaços escolares. Compõe esse
entendimento, integrantes da equipe diretiva das escolas E4, E6, E8, e E11, como se vê
nas falas a seguir:
ED8s “Com relação a nossa unidade de ensino e do município em
geral a falta de espaço adequado e profissionais qualificados é de
grande expressão”.
ED11d “Uma inclusão do aluno com deficiência no ensino regular,
onde toda escola precisa de mudanças desde o espaço físico como
também no seu fazer do cotidiano”.
ED4o “Deveria ser mais abrangente, aplicado por todos. Mas, também
nunca se sabe o que realmente fazer”.
As falas de 5% das participantes da pesquisa informam que tem a sala de
recursos multifuncionais, mas falta profissional especializado, e, 21% dos participantes
conforme se destaca nas falas apresentadas consideram que o AEE na escola envolve
“mudança no seu espaço físico e no seu fazer cotidiano”, requer “espaço adequado e
profissionais qualificados”. Essas falas instigam a pensar possíveis caminhos na
viabilização e efetivação da política de educação especial nos espaços escolares.
Evidencia-se que parte da equipe reconhece a complexidade na implementação do AEE
nos espaços escolares. Contudo, é importante considerar que a implementação do AEE
na escola, pressupõe sua construção em um processo dialógico/coletivo de discussões e
tomadas de decisões. Destaca-se assim, a importância da equipe diretiva escolar, no
envolvimento de todos os profissionais da escola na discussão das diretrizes
educacionais e suas formas de serem implementadas e efetivadas no espaço escolar.
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Trata-se de um processo simultâneo de implementação da política educacional e de
criação de espaço permanente de discussão.
Logo, toda ação escolar envolve planejamento, que se pressupõe uma atuação
conjunta. Sendo assim, é importante nas escolas a criação de espaços de construção
coletiva, proporcionado pela equipe diretiva, no qual todos os profissionais, direção,
supervisão/orientação educacional e professores, demais funcionários, possam dialogar
e construir estratégias que contribuam com a promoção do processo de escolarização
dos alunos público-alvo do AEE.
Ressalta-se também, a importância da proposta do AEE ser contemplada no
projeto pedagógico da escola que é o documento que reflete a própria escola, congrega
todas as ações, meios e recursos disponíveis na escola, para seu funcionamento. Este
precisa ser construído de forma coletiva e participativa envolvendo todos os segmentos
da escola, necessitando ser revisitado, acompanhado e avaliado, permitindo que cada
profissional, reconheça suas responsabilidades no processo de efetivação das ações
planejadas.
Considerações finais
O atendimento educacional especializado está se constituindo no município de
Camboriú. Evidenciou-se divergência nas falas entre a equipe diretiva da própria escola,
mesmo daquelas que possuem o AEE em funcionamento em seu espaço escolar, como
verificou-se na discussão dos dados. Assim, constata-se a importância da equipe diretiva
escolar conhecer a legislação da Educação Especial e do Atendimento Educacional no
entendimento sobre seu público-alvo. Entende-se que não há como propor discussões de
algo que não se tem conhecimento. Desta forma, também, torna-se perigoso e
contraditório exigir mais envolvimento dos professores especializados e professores da
sala comum, se não houver envolvimento e interação entre a própria equipe diretiva. É
necessário repensar a implementação do AEE nas escolas, rediscutir as funções dos
profissionais que compõem a equipe diretiva, verificando se há clareza do seu papel no
processo de implementação e viabilização do AEE, bem como, o acompanhamento e
avaliação. Assim, constatando se este serviço potencializa ou não o processo de
escolarização do estudante com deficiência. Alguns integrantes das equipes diretivas
sinalizaram que a implementação do AEE no espaço escolar pressupõe reestruturação
dos espaços físicos, disponibilidade de materiais pedagógicos, profissional
XVIII ENDIPEDidática e Prática de Ensino no contexto político contemporâneo: cenas da Educação Brasileira
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especializado, formação dos profissionais que atuam na escola, envolvimento e
comprometimento dos professores da sala comum. Mas, como viabilizar essa ação?
Esse caminho apresentado nas vozes dos participantes da equipe diretiva se apresenta
como um dos desafios da equipe diretiva, na construção de espaços permanentes de
formação dentro do espaço escolar, envolvendo todos os profissionais da escola,
propondo a discussão das políticas educacionais, sua implementação e efetivação no
espaço escolar.
A pesquisa aponta para a necessidade de formação à equipe diretiva vinculada à
realidade social de suas respectivas escolas, favorecendo a construção de conhecimento
e subsídios para atuação destes profissionais, emergindo a necessidade de repensar as
concepções que permeiam os espaços escolares. A partir das vozes dos participantes
percebe-se também a necessidade de maior comunicação entre a equipe diretiva e os
profissionais envolvidos no processo de escolarização dos estudantes público-alvo da
Educação Especial.
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2011. Dispõe sobre a educação especial, o atendimento educacional especializado e dá
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25
PROFESSORAS ESPECIALIZADAS E SUAS VOZES SOBRE O PROCESSO
DE ESCOLARIZAÇÃO E APRENDIZAGEM DOS ESTUDANTES
Cleide A Hoffmann Bernardes - UNIVILLE
Andréia Heidersheidt Fuck - UNIVILLE
Resumo: O estudo teve por objetivo conhecer como as professoras especializadas
compreendem o processo de escolarização e a aprendizagem dos estudantes que
frequentam o Atendimento Educacional Especializado (AEE) na escola em uma Rede
Municipal de Ensino do Estado de Santa Catarina pelas vozes das professoras que
atuam nesse serviço. Para a construção dos dados, aplicaram-se questionários a essas 34
professoras atuantes na educação infantil e no ensino fundamental, os quais foram
tratados à luz da análise de conteúdo Franco (2012). Todas as participantes da pesquisa
são mulheres, com idades entre 31 e 50 anos, concursadas e atuam 40 horas semanais
como docentes no AEE. Pode-se dizer que as professoras especializadas são
experientes, já que 71% atuam há mais de 6 anos na Rede Municipal de Ensino.
Contudo, no que tange a experiência especificamente no AEE, 88% das professoras
estão no serviço há 3 anos ou menos, estando assim, num momento profissional de
descoberta e sobrevivência, em que são explorados os contornos desta nova função. As
participantes da pesquisa conseguem perceber uma série de fatores que interferem nas
possibilidades de desenvolver um trabalho que considerem de qualidade, mas associam
que para o estudante com deficiência aprender na sala de aula comum é necessário
apenas que o(a) professor(a) desta sala utilize estratégias e recursos diferenciados.
Predominam os aspectos pessoais e relacionais como indicativos de aprendizagem dos
estudantes na sala de aula comum, e, em pouca proporção, repercussões do trabalho do
AEE em atividades do/no contexto escolar. Por se tratar de um serviço recente no
município (2009) para atender os estudantes público alvo da Educação Especial, supõe-
se que muitas ações e entendimentos fazem parte de sua própria constituição, revelando
a processualidade e a complexidade do AEE.
Palavras-chave: Atendimento educacional especializado. Trabalho docente. Educação
Especial.
O PROTAGONISMO DO ATENDIMENTO EDUCACIONAL
ESPECIALIZADO (AEE)
A Educação Especial (EE) vivencia nas duas últimas décadas transformações em
discussões, políticas e legislações, principalmente quanto à implantação de serviços que
apoiem os estudantes considerados como público alvo da EE.1
Como serviço prioritário oferecido aos estudantes considerados da EE, o
Atendimento Educacional Especializado (AEE) assume protagonismo na atual Política
Nacional de Educação Especial na Perspectiva da Educação Inclusiva, 2008 (PNEE-EI).
Tal protagonismo deve-se à forma como esse serviço tem se configurado, agora não
mais substitutivo ao ensino comum, mas prestado de forma complementar/suplementar
aos estudantes público-alvo da EE que frequentam as escolas regulares. De acordo com
Garcia (2013) quando realiza uma análise documental da política de EE e os
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documentos representativos da década de 1990, esclarece que há uma mudança
conceitual de EE, de seu público e a organização dessa modalidade de ensino. Para a
Garcia (2013, p.106)
a ênfase já não se encontra sobre a ideia de uma proposta pedagógica, mas na
disponibilização de recursos e serviços. Nessa direção, o decreto n.
6.571/2008 nem mesmo menciona o termo “educação especial”, promovendo
uma substituição discursiva pelo termo “atendimento educacional
especializado”. Ressaltemos aqui que as funções de apoiar e substituir foram
retiradas da definição, assumindo a ideia de complementaridade e
suplementaridade à escola comum.
Para ofertar o AEE, o Ministério da Educação (MEC) instituiu as Salas de
Recursos Multifuncionais (SRM) as quais passam a ser o lócus prioritário para o AEE,
principalmente a partir de 2007 com o Programa de Implantação das SRM criado por
meio da Portaria nº 13 de Abril, o qual tem por objetivo “apoiar os sistemas público de
ensino, na organização e oferta do Atendimento Educacional Especializado e contribuir
para o fortalecimento do processo de inclusão educacional nas escolas comuns do
ensino.” (Art. 1º) Desse modo, a escola regular permanece com a responsabilidade pelo
processo de escolarização dos estudantes considerados da EE, mas passa a contar com
as SRM como lócus prioritário do AEE, não mais substitutivo ao ensino comum, pois a
Resolução nº 4/2009 orienta que este deva ser oferecido no turno inverso ao frequentado
na sala comum.
Para esse serviço é direcionado um(a) professor(a), com atribuições /funções
específicas no AEE, que conferem centralidade ao seu trabalho em relação às condições
para a aprendizagem do estudante da EE, já que, conforme o Artigo 13 da Resolução nº
4/2009, a este professor cabe:
I – identificar, elaborar, produzir e organizar serviços, recursos pedagógicos,
de acessibilidade e estratégias considerando as necessidades específicas dos
alunos público-alvo da Educação Especial;
II – elaborar e executar plano de Atendimento Educacional Especializado,
avaliando a funcionalidade e a aplicabilidade dos recursos pedagógicos e de
acessibilidade;
III – organizar o tipo e o número de atendimentos aos alunos na sala de
recursos multifuncionais;
IV – acompanhar a funcionalidade e a aplicabilidade dos recursos
pedagógicos e de acessibilidade na sala de aula comum do ensino regular,
bem como em outros ambientes da escola;
V – estabelecer parcerias com as áreas intersetoriais na elaboração de
estratégias e na disponibilização de recursos de acessibilidade; VI – orientar
professores e famílias sobre os recursos pedagógicos e de acessibilidade
utilizados pelo aluno;
VII – ensinar e usar a tecnologia assistiva de forma a ampliar habilidades
funcionais dos alunos, promovendo autonomia e participação;
VIII – estabelecer articulação com os professores da sala de aula comum,
visando à disponibilização dos serviços, dos recursos pedagógicos e de
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acessibilidade e das estratégias que promovem a participação dos alunos nas
atividades escolares. (BRASIL, 2009, Art. 13)
Jesus (2010) aponta que, para pensar e trabalhar a escolarização dos estudantes
considerados da Educação Especial são necessárias práticas de colaboração. Pensar e agir
assim é assumir que todos os estudantes são de toda a escola, e não apenas do professor da
sala de aula ou do AEE.
De acordo com as perspectivas acima e destacando o protagonismo do AEE e
também do(a) professor(a) que atua nesse serviço, o presente estudo teve como objetivo
conhecer como as professoras especializadas compreendem o processo de escolarização
e a aprendizagem dos estudantes que frequentam o AEE na escola.
Rego (1998) explica que a forma como professor pensa as origens das diferenças
humanas é particularmente importante, na medida em que suas formas de avaliação,
objetivos, ações pedagógicas e suas considerações acerca do desempenho dos estudantes
dependam intimamente da concepção de desenvolvimento humano adotada.
PERCURSO METODOLÓGICO
O estudo desenvolveu-se em uma abordagem qualitativa, com 34 professoras
especializadas que atuam nas 42 SRM da Rede Municipal de Ensino de uma cidade do
Estado de Santa Catarina, na qual em 2009 foram implantadas as primeiras SRM. A
coleta dos dados ocorreu por meio da aplicação de questionários contendo perguntas
abertas e fechadas. Denominaram-se de professoras especializadas as docentes
participantes desta pesquisa que atuam nas SRM, por entender que, embora essas não
tenham a formação específica para o AEE, o trabalho que desenvolvem configura-se
como especializado.
O método para a interpretação e análise dos dados desse estudo, tem por base a
análise de conteúdo, “metodologia de pesquisa usada para descrever e interpretar o
conteúdo de toda a classe de documentos e texto”. (MORAES, 1999, p.8).
Conforme Franco (2012, p.13), a análise de conteúdo
assenta-se nos pressupostos de uma concepção crítica e dinâmica da
linguagem. Linguagem, aqui entendida, como uma construção real de toda a
sociedade e como expressão da existência humana que, em diferentes
momentos históricos, elabora e desenvolve representações sociais no
dinamismo interacional que se estabelece entre linguagem, pensamento e
ação.
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A organização das respostas às questões deu-se com a utilização do programa
Excel, em que essas foram digitadas na íntegra e agrupadas conforme recorrência,
contradição e complementaridade, passos que estão de acordo com metodologia de
análise de dados adotada neste estudo.
PROFESSORAS ESPECIALIZADAS E AS VOZES1 SOBRE O PROCESSO DE
ESCOLARIZAÇÃO E A APRENDIZAGEM DOS ESTUDANTES: ANÁLISES E
DISCUSSÕES DOS RESULTADOS
Todas as participantes da pesquisa são mulheres, com idades entre 31 e 50 anos,
concursadas e atuam 40 horas semanais como docentes no AEE. Entende-se que essa
carga horária pode favorecer o diálogo entre as docentes do AEE e aquelas da sala de
aula comum, visto que estão na escola no mesmo período.
Pode-se dizer que as professoras especializadas são experientes, já que 71%
atuam há mais de 6 anos na Rede Municipal de Ensino. Contudo, no que tange à
experiência especificamente no AEE, 88% das professoras atuam no serviço há 3 anos
ou menos, estando assim num momento profissional de descoberta, em que conforme
Huberman (1995) são explorados os contornos desta nova função. Destaca-se ainda
que 47% das professoras apontam ser o primeiro ano que estão no AEE.
Em relação à formação inicial, predomina a graduação em pedagogia, 73% e a
especialização com enfoques diversificados, sendo que 94% das professoras indicam ter
esse nível de formação.
No que tange à formação específica para atuar no AEE, orienta-se no Art. 12 da
Resolução 4/2009 (CNE/CEB) que “[...] o professor deve ter formação inicial que o
habilite para o exercício da docência e formação específica para o AEE”. Das 34
professoras são somente 11 as que possuem especialização em AEE. Das 23 que
indicam não ter formação específica, 13 percebem necessidade de formação para atuar
na área. Uma professora complementa sua escrita dizendo, “a [formação] que estamos
recebendo não supre as necessidades” (P10)1.
Cabe ressaltar, que o município oferece a formação em AEE, entretanto, as
professoras participam da formação apenas quando já iniciaram o trabalho na SRM.
Essa situação, segundo uma das supervisoras do Núcleo de Educação Especial
responsável pelo serviço no município, acontece porque não há interesse de professoras
do ensino comum em trabalhar no AEE, o que acaba por dificultar a formação anterior
ao ingresso no serviço.
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Deste modo, pode-se dizer que as professoras especializadas atendem em partes
ao que os dispositivos legais - Resolução CNE/CEB n.º 4/2009 e Resolução CNE/CEB
n.º 02/2001- preconizam. A constatação de necessidades formativas para atuar no AEE
adverte para a importância de problematizar os aspectos que interferem no trabalho
docente e que podem trazer implicações ao processo de escolarização dos estudantes,
principalmente porque o professor que atua neste serviço torna-se referência para
comunidade escolar quando se fala dos estudantes considerados da EE.
Articulado à caracterização das participantes da pesquisa, buscou-se também
investigar se as professoras especializadas acreditam que o estudante com deficiência
aprende na sala de aula comum. Os dizeres sinalizam que eles podem aprender desde
que alguns aspectos sejam observados e garantidos. O saber-fazer do professor da sala
comum aparece de forma preponderante, como se vê:
“A partir do momento em que os conteúdos forem vivenciados numa
linguagem lúdica e ilustrada, todos irão alcançar o aprendizado”. (P27)
“Dependendo de como e qual maneira ou estratégia o professor usar”. (P1)
Quando há MUDANÇA DE PROCEDIMENTOS, estratégia, acontece [a
aprendizagem]. Caso contrário NÃO. (P34)
Essas falas nos remetem ao entendimento de que a diversificação e a adequação
da ação pedagógica são aspectos necessários para que os estudantes consigam aprender
na sala de aula comum. Nas vozes das professoras, há também uma simplificação
exagerada das condições para o aprender em sala comum, remetendo a uma visão quase
espontaneísta de aprendizagem
“Todos conseguem aprender, basta o professor [da sala comum] pensar em
estratégias diferenciadas para o desenvolvimento do aluno”. (P21)
“O simples convívio com os demais já possibilita a aprendizagem. Se os
envolvidos se organizarem com certeza os avanços serão maiores”. (P3)
“Sim, desde que o professor de sala de aula [comum] esteja aberto e
acredite nisso”. (P20)
Nesses dizeres a tendência é focar no trabalho da professora da sala de aula
comum e desconsiderar outros fatores que possam interferir no processo de
escolarização do estudante público alvo da educação especial. Reduzir a aprendizagem
do estudante ao “querer” do professor contraria o que as próprias participantes da
pesquisa assinalam como condições de que precisam para desenvolver o seu trabalho,
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como o trabalho em parceria, formação continuada, adequadas condições de trabalho e
recursos.
É possível também notar em algumas falas ideias que podem formatar condições
de uma inclusão perversa desses estudantes, como se o fato de apenas estar no espaço
escolar assegurasse a aprendizagem:
“Acredito que a interação com os outros alunos só tem a favorecer o
aprendizado”. (P4)
“Todos aprendem. Nem sempre há a aprendizagem do conteúdo escolar,
mas há no desenvolvimento psicossocial da criança, sensorial, linguagem”.
(P32)
“Acredito que cada um absorve ao seu tempo e ao seu modo”. (P29)
“Acredito que sim, mas cada um no seu ritmo”. (P17)
Essas visões apontam para uma naturalização da aprendizagem que se dá
somente por “estar num espaço” ou por “aprender a qualquer tempo”, endossando
apenas o direito à socialização dos estudantes, e não o direito a aprender.
Em alguns casos, as professoras contam não ser possível a aprendizagem na sala
comum:
“Depende da deficiência, porque em alguns casos eu acredito que se o
aluno estivesse na SRM ou fazendo alguma oficina, ele estaria aprendendo
alguma coisa. A SRM no contra-turno eu acho que deveria ser repensada,
tem aluno que renderia bem mais se estivesse em horário de aula, tipo, a
metade do tempo, frequentando a SRM”. (P11)
“Depende! Observo que alguns casos aprendem e outros não vejo evolução,
como por ex: um caso de aluno autista bem severo”. (P18)
Essas vozes remetem ao estudante que precisa aprender à parte, demarcando o
paradoxo da inclusão excludente. Tais vozes causam preocupação, pois as professoras
especializadas estão em uma função de apoio ao processo de escolarização na classe
comum de estudantes com deficiência e às suas professoras. Mas ao não acreditar na
aprendizagem em sala comum pode gerar um desinvestimento na escolarização desses
estudantes. Talvez as professoras se expressem desta forma por compreenderem que a
forma como a escola está organizada não tem sido um espaço de aprendizagem para
alguns estudantes com deficiência, o que marca “a descrença e reflexo de uma cultura
de que a escola não é para ele”, a qual “requer transformações significativas para que
seja inclusiva” (BEDAQUE, 2011, pp.127-128). Assim, o retrato que se forma é de um
estudante com deficiência que parece ser aceito no espaço escolar, mas insere-se no
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31
processo de forma marginal, ficando privado do direito de aprender o conteúdo
escolarizado.
Rego (1998, p.50) nos ajuda a entender tais questões ao compreender que a
concepção de desenvolvimento humano seguida pela professora, sua visão sobre a
origem das características individuais, “interfere na sua atuação prática, ou, ao menos
influencia sua maneira de compreender e explicar as relações entre o ensino e a
aprendizagem”. Por isso, e de acordo com o que se constatou nas falas das professoras,
nota-se que discutir na escola as questões de desenvolvimento e aprendizagem, é
particularmente importante,
na medida em que a proposição de conteúdos, metodologias e objetivos que
se quer alcançar, as formas de avaliação empregadas em determinada agência
educativa, os tipos de interações estabelecidas com as crianças, ou até mesmo
as explicações acerca do desempenho dos alunos, dependem intimamente das
concepções de desenvolvimento humano adotada. (REGO, 1998, p.50)
Da forma em que se configuram as análises emergem pistas de que é necessário
que os profissionais da escola tenham cada vez mais espaços e tempo para pensar em
ações fundamentadas em conceitos que valorizem uma abordagem pedagógica da
deficiência em detrimento daquelas que se orientam pelo aspecto orgânico.
O perigo dessas evidências é que se assente a responsabilidade no estudante,
como algo que nele precise ser reparado, ou na própria professora, sendo eles os
responsáveis pelo fracasso escolar. Tal compreensão limita olhar para as histórias de
fracasso no processo de escolarização como produção coletiva e discutir a estrutura
organizativa e pedagógica da escola.
A preocupação reside no deslocamento de questões institucionais, políticas e de
concepções sobre a aprendizagem e o desenvolvimento infantil, para o plano individual,
apresentando como indicativo dos problemas de aprendizagem questões biológicas, que
direcionam tais estudantes para um plano de inferioridade e incapacidade.
No dizer de Jesus (2010), uma das possibilidades de refletir sobre a
aprendizagem dos estudantes seria pensar nessa escola concreta,
enriquecer o trabalho realizado em sala de aula, apoiando-se na troca de
experiências, a avaliação em processo e na colaboração entre todos aqueles
que estão na escola comprometidos com o ato de ensinar e de aprender.
(JESUS, 2010, p.238)
Nas falas de algumas poucas professoras, há uma posição que se contrapõe às
concepções de desenvolvimento até então apresentadas. Para as professoras, existe
aprendizagem do estudante na sala de aula comum quando se tem o
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envolvimento/comprometimento de toda a comunidade escolar com o processo de
escolarização do estudante, o que sugere a percepção de que, para o estudante aprender,
além do trabalho do(a) professor(a), há necessidade de um trabalho colaborativo. As
falas apontam possibilidades:
“Algumas deficiências não têm dificuldade na aprendizagem como nos casos
de deficiência física. Em outros casos, vai depender do olhar do professor de
sala de aula comum, e da parceria entre o professor do AEE, professor da
sala de aula comum, família, supervisão, orientação e demais profissionais
que atendem o aluno”. (P12)
“Desde que haja adequação dos materiais, sala de aula, aceitação do
professor da sala comum e preparo da professora do AEE, bem como
aceitação de toda a escola”. (P24)
Percebe-se a valorização de vários aspectos que contribuem para um processo de
escolarização efetivo da pessoa com deficiência. Apesar de considerar esses múltiplos
fatores para que haja a aquisição do conhecimento na escola, o que se destaca são os
aspectos pessoais e relacionais dos estudantes que frequentam o AEE. As professoras
dizem desses aspectos:
"A melhora do comportamento, teimosia e algumas vezes autonomia". (P1);
“A interação em sala comum, autoestima que aumenta quando percebem
que são capazes”. (P25)
"Alunos com maior autonomia. Respeito às regras sociais". (P16);
“Autonomia; maior contato com atividades que proporcionam a
participação em sala”. (P29)
“Evolução da criança, alguns desde as necessidades básicas: alimentar-se,
comunicar-se, expressar suas vontades, ganhar certa autonomia”. (P23)
As vozes das professoras remetem para a inserção sociocultural do estudante
com deficiência, trazendo contribuições em sua participação e desempenho na escola e
nos grupos sociais dos quais faz parte. Para Padilha (2007, p.16), “[...] são as leis sócio-
históricas as diretrizes do desenvolvimento do homem” e “[...] a essência do processo de
desenvolvimento cultural consiste exatamente na apropriação e domínio do social”.
As falas das professoras remetem que as contribuições do AEE têm sido no
desenvolvimento e inserção social e cultural dos estudantes, o que pode indicar que
estes estejam com maior qualidade nas interações sociais. No entanto, chama a atenção
que preponderantemente as indicações de contribuições na aprendizagem dos estudantes
estejam centralizadas nessas questões, já que o objetivo do serviço é promover o apoio
ao processo de escolarização, o que implica aquisição de conteúdos escolares.
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33
Não se está afirmando que as contribuições que não se referem ao contexto
escolar não sejam positivas para os estudantes, mesmo porque, como função
complementar à sua formação, o AEE precisa disponibilizar serviços, recursos de
acessibilidade e estratégias que eliminem as barreiras para a plena participação na
sociedade e desenvolvimento de sua aprendizagem. Entretanto, tais achados parecem
conferir posição secundária ao processo de aquisição dos conteúdos escolarizados.
Dessa forma, há que se avançar nas ações pedagógicas do AEE, de modo a
apoiar e garantir o direito ao aprendizado escolar, mirando o trabalho da comunidade
escolar para a função que lhe cabe, o projeto de transmissão dos conjuntos de saberes e
conhecimentos que se definiram como fundamentais para os estudantes (MEIRIEU,
2005).
Algumas professoras sinalizam repercussões do trabalho do AEE diretamente no
contexto escolar, embora, em pouca proporção, refletem também na atuação do
professor da sala comum e nos demais envolvidos com o estudante. São mudanças na
ação pedagógica na sala de aula comum, alteração da percepção da comunidade escolar
em relação ao estudante público alvo da Educação Especial e também parceria/contato
com professores:
“Com as adaptações dos conteúdos e provas, bons rendimentos; autoestima;
ampliação dos conceitos e vocabulário; prática pedagógica do professor da
sala comum mais elaborada e ilustrada”. (P27)
"Já percebo evolução no aluno com deficiência quanto a sua autonomia. Nos
ambientes da escola e até a fala dos professores já demonstra um olhar
diferente para o aluno com deficiência". (P33);
“A escola passa a ver este estudante de uma forma diferente, a se
preocupar com o espaço adequado. O professor percebe que às vezes o
mudar a forma de aplicar certa atividade ajudará também outros
estudantes”. (P10)
"Acredito que orientando os professores, confeccionando material
adaptado, acompanhando o aluno em sala, auxilie em sua aprendizagem. A
frustração nos acompanha todos os dias e se o professor não acredita nesse
trabalho, neste aluno, fica muito difícil”. (P9)
Atribui-se destaque a essas falas, pois acredita-se que as contribuições do AEE
no contexto escolar seriam mais potentes se contemplassem o apoio à escolarização dos
estudantes de maneira abrangente, ou seja, o trabalho centralizado em toda a
comunidade escolar, aquele que busca entender as necessidade dos estudantes, família e
dos professores, “para que se garanta a existência de percursos escolares satisfatórios e
desafiadores para os alunos com deficiência” (BAPTISTA, 2013, p. 54).
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Finalizam-se aqui as discussões acerca dos dados da pesquisa levantados durante
este estudo, entendendo que, embora pudessem ter outras possibilidades de
interpretações, discussões e interlocuções, neste momento as tessituras deles foram
constituídas por meio de uma abordagem teórica determinada e das mediações possíveis
das pesquisadoras.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
As participantes da pesquisa conseguem perceber uma série de fatores que
interferem nas possibilidades de desenvolver um trabalho de qualidade, mas associam
que para o estudante com deficiência aprender na sala de aula comum é necessário
apenas que o(a) professor(a) desta sala lance mão de estratégias e recursos
diferenciados. Não há nesta percepção o mesmo entendimento das participantes sobre os
fatores que interferem no seu trabalho na SRM, como por exemplo, adequadas
condições de trabalho.
Nas vozes das participantes da pesquisa emergem problemáticas que se referem
aos processos de inclusão/exclusão nas atividades escolares da sala de aula comum dos
estudantes considerados da EE. De acordo com as falas das professoras, pode-se dizer
que os estudantes com deficiência estão na escola, mas o direito de aprender não está
assegurado, pois se evidenciam resistência em relação às ações para o processo
inclusivo escolar, assim como apontamentos de aprendizagem relacionados de forma
preponderante aos aspectos relacionais e pessoais, havendo um silenciamento da
aprendizagem dos conteúdos escolares em sala de aula comum.
Nessa perspectiva, é necessário que sejam provocadas reflexões acerca das
concepções de homem, aprendizagem e desenvolvimento adotadas pelo professor e
pelos demais profissionais da escola, já que estas se relacionam às ações educacionais
realizadas por cada um e no coletivo. A concepção de sujeito histórico-cultural, cuja
aprendizagem é entendida como um processo possível e de direito a todos os estudantes
– mesmo que variável em forma e ritmo –, da qual deriva o desenvolvimento, abre
possibilidades para que a escola e seus profissionais concebam o estudante como ser
único e em contínua transformação e se responsabilizem pelo processo de escolarização
de todos e de cada um.
Dessa forma, é preciso que nas escolas criem-se espaços para discussões acerca
das concepções de desenvolvimento humano, o ensinar e o aprender e sobre o que a
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escola quer, e está fazendo, para cumprir o dever ético de garantir a aprendizagem de
todos os estudantes, pois se acredita que o que as professoras pensam e fazem
dependem das concepções de desenvolvimento e aprendizagem adotadas e estão
intimamente articuladas as suas ações educacionais. É preciso colocar a aprendizagem
dos estudantes no centro das preocupações da escola.
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Diferenças e preconceitos na escola: alternativas teóricas e práticas. São Paulo:
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i A maioria dos participantes investigados nesta pesquisa pertence ao gênero feminino, motivo pelo qual
se optou em utilizar o feminino genérico ao se referenciar aos participantes da pesquisa, utilizando a
diferenciação de gênero quando necessário, conforme as regras gramaticais.
ii Como forma de organizar os dados coletados, os 144 questionários foram identificados com uma letra e
um número (Professora 1 = P1, Professora = P2 e assim sucessivamente), de maneira a nominar cada
participante da pesquisa.
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