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Biopatologia 2006/2007
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“O que de facto vamos discutir hoje são os mecanismos subjacentes às lesões que
observaram nas aulas práticas. Neste capítulo concreto, nós preferimos confrontar-vos primeiro
com as lesões e agora discutirmos quais são as alterações que estão por detrás delas.
Então vamos começar! O tema da aula de hoje é especificamente a inflamação aguda,
mas eu vou tentar pôr-vos um pouco em contexto relativamente a algumas coisas que têm
obrigação de saber agora.
A primeira coisa que nós vamos rever rapidamente são conceitos que já discutiram
noutros seminários: quais são as características gerais da resposta inflamatória?
Primeiro, a resposta inflamatória é uma resposta geral (e inespecífica) de defesa do
organismo, isto é, em princípio é o que se verifica com a resposta inflamatória, apesar de que
depois, as particularidades desses agentes da resposta inflamatória podem causar lesões.
Segundo, a resposta inflamatória pode ser causada por agentes de natureza muito diversa,
sejam eles de natureza física (radiações, químicos, ácidos), microbiológicos ou traumáticos.
Há também uma circunstância que é muito importante para a resposta inflamatória, a de
saberem que a resposta inflamatória só ocorre em tecidos vascularizados! Assim, os tecidos
unicelulares que não têm vasos por definição, não são capazes de montar uma resposta
inflamatória. Não quer dizer que não tenham mecanismos de defesa de agressões, só que não é
uma resposta inflamatória.
Portanto, estas três características são características que são importantes que tenham
claro na vossa cabeça!
Resposta geral e inespecífica de defesa;
Agentes causais de diversas naturezas;
Só ocorre em tecidos vascularizados.
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Aula nº4 25 Setembro 2006
Inflamação Aguda
Aula leccionada por: Fátima Carneiro
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Quais são os aspectos e a maneira como identificamos a resposta inflamatória? Todos nós
já ouvimos falar nos Sinais Cardinais de Celso♣. E quais é que aqui reconhecemos nestas
“imagens”?
RUBOR! Estamos de acordo. Estamos aqui a ver uma mão e sobre as superfícies
articulares estamos a ver áreas ruborizadas.
EDEMA! TUMOR! Portanto, os dedos desta mão (parece ser uma mão pequenina) estão
tumefactos, têm uma deformação localizada.
Estas características que estão a descrever de rubor e tumor estão também presentes neste
apêndice. Têm aqui ao lado um apêndice esternotópico??? Para poderem comparar e não é difícil
verificarem que há uma tumefacção, portanto há tumor e há um rubor intenso.
Para além do rubor e tumor, que outros sinais é que nós depreendemos como sendo
característicos da expressão da inflamação?
CALOR!
DOR! E..
ALTERAÇÃO FUNCIONAL! Que é aquilo que se pretende demonstrar aqui de uma
forma caricata: o rubor, o tumor, o calor e aqui está a chama, a tal flama de que é originada após
a inflamação como já descobrimos, a dor e a alteração funcional.
A alteração funcional resulta de duas coisas. Resulta em parte do tumor e resulta também
necessariamente da dor. Portanto este foi acrescentado posteriormente à definição de Celso.
O que era o Celso? ROMANO! E descreveu os Sinais antes de Cristo ainda…!
(Hum…☺)
SINAIS DE CELSO
Rubor;
Tumor;
Calor;
Dor;
Alteração funcional (devido ao tumor e à dor;
acrescentado posteriormente).
♣ Sinais: são os que podemos verificar. Sintomas: são os que o doente nos pode reportar.
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Outro aspecto que nós já focámos e que vamos focar várias vezes ao longo do ano é que
há três grande grupos de processos lesionais no organismo e que de uma forma simplificada
podem ser divididos em processos degenerativos, inflamatórios e neoplásicos.
Os processos inflamatórios, isto é, a inflamação, é um conjunto de alterações que têm um
universo próprio, mas que não é independente dos restantes; quero com isto dizer que há muitas
vezes sobreposição de processos inflamatórios a processos de outra natureza, sejam eles
degenerativos ou neoplásicos. Isto é um assunto que é plenamente aceite hoje e que, por
exemplo, num número recente de uma revista de elevado prestígio que é a Science, dedicavam
um volume à discussão de inflamação que era apresentada de uma forma chamativa com “esta
imagem” atribuindo-lhe a designação de “secret killer”. Talvez seja um bocadinho exagerada
porque chama a atenção para os aspectos negativos da inflamação, mas a principal mensagem é
de vos salientar o papel de charneira entre a inflamação e patologias de outra natureza, de vários
órgãos. Seja por exemplo a patologia vascular cardíaca que vocês vão ver já esta semana no
seminário; vão ver que a patologia vascular aterosclerótica tem muitas alterações inflamatórias.
A inflamação sobrepõe-se também ao cancro: há muitos cancros que se desenvolvem em
contextos de inflamação crónica (vão depois discutir isso este ano); e sobrepõe-se também a
alterações degenerativas como por exemplo a doença de Alzheimer. Portanto, quando estamos a
falar em inflamação e a definimos daquela forma simples que vos apresentei no princípio da
aula, não se deve com isto escamutear-se* um contexto mais genérico em que isto se desenvolve
e com sobreposição a quadros lesionais de outra natureza.
Estamos a ver uma imagem: qual é o tecido? PELE! Porquê? Em primeiro lugar porque
diz ali e em segundo lugar porque estamos perante um epitélio pavimentoso estratificado com
queratina que até prova em contrário é pele (quem é que não se lembra de histologia, quem é..?)
e nesta pele estamos a ver no tecido subjacente, vasos e estamos a ver muitas células. E estamos
a ver esta pele com um agente cortante e parece ter criado uma porta de entrada para uma
infecção com microorganismos. E portanto, de uma maneira pictórica, o que vos está a ser
chamado a atenção é para o contexto em que o processo inflamatório se desenvolve, isto é, é um
processo que se desenvolve em tecidos vascularizados, e eu volto a chamar a atenção para este
aspecto, e que nós podemos, de uma maneira esquemática dizer, que no processo inflamatório
temos que ter em consideração o cenário, e o cenário são os tecidos vascularizados, e qualquer
tecido vascularizado do nosso organismo pode ser sede do processo inflamatório. Neste cenário
vai haver a participação de actores, e são actores muito dinâmicos, muito intervenientes e esses
actores são as células inflamatórias. E os actores têm que comunicar entre si e comunicam não
por palavras ditas, mas através de outro tipo de linguagem que é uma linguagem química e que é
* Bem… Cuidado com a linguagem meninos! Há que elevar os parões… Upa upa!
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efectuada através de mediadores químicos da inflamação. E nós vamos ter que gastar algum
tempo com os mediadores da inflamação, temos que começar hoje a abordar superficialmente os
mediadores e na próxima aula vamos ter que mergulhar um bocadinho mais em profundidade.
Isto é apenas um aviso que vai dar algum trabalho a entrarmos bem nisto.
PROCESSO INFLAMATÓRIO
Cenário: tecidos vascularizados;
Actores: células inflamatórias;
Guião/Linguagem: mediadores químicos da inflamação.
E sendo assim, quais são neste cenário os elementos mais importantes? Por um lado são
os vasos e por outro lado são as células.
O que é que se pretende salientar com esta representação esquemática nestes vasos? Qual
é o território, o leito vascular onde se desenvolve o processo inflamatório de uma maneira
dominante? É o periférico! E é periférico envolvendo o leito capilar, incluindo a arteríola pré-
capilar e a vénula pré-capilar. É este o território periférico onde se desencadeiam as alterações
mais importantes do processo inflamatório.
E então quais são os elementos celulares que participam no processo inflamatório?
Olhando para este esquema, quais serão? Polimorfonucleares que podem ser neutrófilos,
eosinófilos; monócitos; linfócitos; as plaquetas também têm um papel importante no processo
inflamatório. Eu estou a chamar a atenção para células inflamatórias sanguíneas, que andam na
corrente sanguínea, mas também é importante saberem que para além das células circulantes, há
células inflamatórias nos tecidos que também participam no processo inflamatório: macrófagos,
fibroblastos e mastócitos. Têm um papel importantíssimo. Reparem estas células têm grânulos no
citoplasma (mastócitos, polimorfonucleares, monócitos…); são grânulos que estão carregados de
mediadores inflamatórios e reparem que eu estou a chamar a atenção para isto porque nós vamos
voltar a isto.
Então e quais são as alterações que nós vemos no tal território capilar?
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O que se pretende demonstrar nesta imagem é a comparação entre a circulação periférica
num território vascular normal com aquela que acontece no decurso de uma inflamação aguda. E
sabemos todos que no território periférico há um jogo entre forças de pressão hidrostática e
osmótica. Fazem com que no território pré-capilar, por efeito da pressão hidrostática haja saída
de líquido de outros vasos para o interstício, o qual volta a reentrar no leito vascular por efeito
agora da pressão osmótica no componente venular deste território.
O que é que acontece na inflamação? Na inflamação, nas alterações vasculares, uma da
primeira alteração que acontece é a vasodilatação. E esta vasodilatação é acompanhada de
aumento do fluxo sanguíneo. Tudo isto funciona como aumento muito importante na pressão
hidrostática no lúmen destes vasos. O aumento desta pressão faz com que haja uma força que
leva à saída do líquido do interior dos vasos para o interstício. Reparem que quando isto
acontece, as proteínas e os constituintes intersticiais vão ficar de alguma forma diluídos, há
portanto também uma diminuição da pressão osmótica, isto faz com que no território agora em
que se deveria fazer a reabsorção do liquido saído na rede pré-capilar, por efeito da pressão
hidrostática ainda maior do que o habitual e da pressão osmótica menor do que o habitual, essa
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reabsorção do líquido intersticial não é feita de uma forma eficaz. Resulta portanto a acumulação
no espaço extravascular do líquido e esta acumulação do líquido no espaço extravascular
designa-se por… EDEMA!
Se esse líquido for pobre em proteínas, esse edema designa-se por… TRANSUDADO!
Na inflamação, no entanto, muitas vezes, depois da fase inicial de vasodilatação, a saída de
líquido é acompanhada pela saída de proteínas, nomeadamente de fibrina. Passamos portanto a
ter um edema rico em proteínas que sabemos que se designa por… EXSUDADO! E o exsudado
é caracteristicamente o edema em que ???? e que muitas vezes é enriquecido para além das
proteínas, com a presença de numerosas células. E portanto, o que nós estamos agora a salientar
são para além das alterações vasculares, as alterações celulares com a transmigração de células
para o interstício. Isto faz-nos pensar um pouco sobre os mecanismos que permitem que este
líquido de proteínas e células saiam do compartimento vascular para o interstício. Isto
subentende no processo inflamatório alterações da permeabilidade, isto é, aumento da
permeabilidade vascular, especificamente, aumento da permeabilidade no local onde ela
efectivamente ocorre que é no leito das vénulas pós-capilares. É aí que se verificam os efeitos
mais importantes do aumento da permeabilidade. E então porque é que aumenta a
permeabilidade nestes territórios vasculares? Por vários mecanismos. Esta imagem é do vosso
livro.
o Em parte o aumento da permeabilidade é devido à contracção das células endoteliais,
do que resulta um aumento do espaço intercelular entre estas.
E porque é que as células se contraem?
Contraem porque têm fibras no seu citosqueleto que são susceptíveis de serem
fosforiladas, e assim constituírem ligações entre os restantes elementos do citosqueleto,
levando à sua contracção e à abertura dos espaços entre as células endoteliais vizinhas.
- Resposta rápida e transitória.
- Ocorre predominantemente nas vénulas pós-capilares.
o Outro mecanismo é aquele que resulta de uma agressão directa ao endotélio
(queimaduras, exposição a um químico, traumatismo violento, etc.). Por vezes este tipo
de agressões condicionam lesões do próprio endotélio, que pode levar ao destacamento
do mesmo, e com tudo isto condiciona acarreta o aumento da permeabilidade desses
vasos. Estas alterações são devidas a uma lesão endotelial directa, estabelecem-se muitas
vezes de uma forma rápida, mas como o endotélio é lesado são mais sustentadas do que o
primeiro mecanismo (que era transitório). Aqui já não há uma restrição tão grande às
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vénulas pós-capilares, já que estas alterações se vão verificar em arteríolas, capilares ou
vénulas, dependendo do local onde a agressão se verifica e da sua intensidade.
o O outro mecanismo, e que é importante, é que as próprias células inflamatórias,
nomeadamente os polimorfonucleares, são capazes através do sistema enzimático dos
complexos lisossomais, e pela libertação do seu conteúdo, de causar lesão no próprio
endotélio. Portanto, o endotélio pode ter uma lesão que é induzida, dependente da
activação fagocitária. Este é um mecanismo que é mais retardado e de longa duração,
porque se subentende, por um lado, a activação dos leucócitos - portanto não é imediata -
e é de novo de longa duração porque há lesão e desprendimento do endotélio.
o A estes três mecanismos que são os mecanismos principais do aumento da
permeabilidade, juntam-se mais dois, um que é relativamente comum – o da activação
da transcitose (capacidade de transportar do interior do vaso para o interstício líquido
plasmático através de vesículas que atravessam o sistema vacuolar da célula) - e o outro
mecanismo que se associa à neo-formação de vasos. Fica apenas esta menção muito
breve, porque vamos voltar a este assunto noutra aula - “regeneração e cicatrização” –
porque no decurso do processo inflamatório e depois da fase aguda pode haver a
constituição de um tecido com a formação de neo-vasos, em que há neoangiogénese, e
estes neovasos resultam de gomos de células endoteliais que depois se reorganizam em
canais, e nas fases muito precoces da sua constituição a adesão entre as células
endoteliais não é perfeita, permitindo portanto que a permeabilidade vascular seja maior
do que a habitual.
Portanto, estes são os mecanismos pelos quais há aumento da permeabilidade. Ao falar destes
mecanismos fala-se de situações em que se criam espaços que permitem uma passagem passiva
do conteúdo intravascular para o interstício, seja ultrafiltrado do plasma, proteínas, células, etc. E
no processo inflamatório há alterações que são muito mais do que fenómenos passivos, há
fenómenos activos, que subentendem activação de mediadores, de receptores, de ligandos e tudo
isto está subjacente a um aspecto muito importante do processo inflamatório que diz respeito às
tais alterações CELULARES de que vimos a falar desde o início.
(Apresentou-se uma imagem de um vaso- vénula pós-capilar - com polimorfonucleares na
periferia).
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A primeira coisa que acontece no processo inflamatório é a marginação, em vez de se
deslocarem ao acaso na coluna sanguínea, passam a deslocar-se na porção periférica da mesma –
marginação relativamente ao eixo da coluna sanguínea. Seguidamente eles vão rolar sob o
endotélio, para depois, numa determinada fase, aderirem de uma forma intensa ao endotélio.
Eles precisam de aderir para não serem arrastados pelo fluxo sanguíneo e para serem capazes de
chegar ao espaço intercelular (entre células endoteliais adjacentes) e migrarem através desses
espaços para o interstício.
Portanto, esta é uma descrição muito simples de vários fenómenos celulares:
• Marginação
• Rolamento
• Adesão
• Transmigração ou diapedese
• Quimiotaxia – Deslocação de uma célula inflamatória desde o local de onde saiu do vaso
até ao local onde se encontra o estímulo que desencadeou o processo inflamatório, onde
há produção de mediadores inflamatórios, e este deslocamento condicionado por um
gradiente de concentrações da substância que o condiciona
(Vamos ver mais adiante que há outros processos celulares que são importantes no processo
inflamatório nomeadamente quando este é desencadeado por bactérias.)
Para dois destes processos, rolamento e adesão, é muito importante a participação de
moléculas de adesão intercelular. Para o primeiro destes processos as mais importantes são as
selectinas, e para a adesão as moléculas mais importantes são as integrinas.
Com mais detalhe, o que acontece às células inflamatórias durante o processo que vimos a
descrever, é a marginação, o rolamento (importância das selectinas), a adesão (importância das
integrinas), diapedese. O que podemos verificar é que há um processo de activação
progressivamente mais intenso, está portanto subjacente a tudo isto a noção de que todos estes
mecanismos são mediados através de processos que são activados quimicamente.
Então como é que isto acontece?
Quando nós temos um vaso sanguíneo normal, com fluxo sanguíneo normal, o que aqui temos
representado é o endotélio, e ao longo do vaso, células inflamatórias, nomeadamente
polimorfonucleares. E normalmente na superfície do endotélio, e na superfície dos leucócitos, há
moléculas de adesão. Aquelas que vão ter importância nos fenómenos que estamos a descrever:
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� selectinas – há dois tipos principais de selectinas no endotélio, nomeadamente a selectina
E (endothelium selectine) e a selectina P (platelet selectine). Esta última pode ser
produzida pelas plaquetas e pelo endotélio.
As selectinas são moléculas de adesão que têm como ligando um carbohidrato sialilado
que é o Syalil-Lewis X, que constitui o sacárido terminal de muitas glicoproteínas da
nossa superfície celular, nomeadamente na superfície do leucócito. Portanto os nossos
leucócitos na superfície da membrana celular têm oligossacacarídeos de tipo Sialyl-Lewis
X, e estes são ligandos de moléculas de adesão – as selectinas. Quando há uma activação
deste processo, no decurso da inflamação, por um lado as selectinas são expostas em
maior quantidade na superfície do endotélio e o Sialyl-Lewis X destes sacáridos têm
assim capacidade de terem maior número de pontes de ligação sobre o endotélio. E esta
ligação entre o Sialyl-Lewis X e as selectinas E e P, constituem o substrato agora
bioquímico para o processo que descrevemos antes como rolamento – é pela acção das
selectinas e pela sua ligação ao Sialyl-Lewis X.
� Na adesão o que se passa agora é o envolvimento de moléculas de outro tipo, as
integrinas. Na fase de rolamento as integrinas estão ainda numa forma não activa, mas a
participação dos mediadores inflamatórios activa-as tornando-as mais ávidas dos seus
receptores, receptores estes que existem no endotélio, na membrana celular, e um dos
mais importantes é o ICAM-1 (intercellular adhesion molecule 1) – molécula de adesão
da superfamília das imunoglobulinas, e que é receptor para as integrinas activadas, e é
por esta ligação entre integrinas activadas e ICAM-1 que se desenvolve o processo de
adesão firme dos leucócitos à superfície endotelial.
� É seguida esta fase pela de transmigração ou diapedese, em que aqui as moléculas de
adesão são semelhantes no endotélio e na superfície dos leucócitos, e aqui a molécula
mais importante é a PECAM-1 (platelet endothelium cell adhesion molecule 1ou CD31),
e que é expressa na superfície dos leucócitos e também na superfície endotelial, e que
permite a transmigração ou diapedese dos leucócitos.
Como tem vindo a salientar-se, este processo é activo, mediado por intervenientes da
linguagem química, os mediadores inflamatórios, e que aqui se apresentam alguns exemplos:
• A histamina e a trombina fazem com que algumas moléculas de adesão, nomeadamente
selectinas, que estão acumuladas nos corpos de Weibel-Palade das células endoteliais,
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sejam expressas na superfície do endotélio. Portanto, na inflamação, é expresso um
número maior de selectinas na superfície endotelial, do que na ausência de inflamação.
• Outros mediadores inflamatórios como as citocinas, para além de expressão aumentada,
levam também à activação de receptores destas moléculas de adesão.
• Há ainda outros mediadores inflamatórios que participam na activação, por exemplo,
das integrinas. Portanto, isto não é mais do que um complemento para vos dar a ideia de
que todos estes processos celulares na inflamação são processos dinâmicos, activos e
mediados por mediadores químicos da inflamação. E é isto que está por trás de todos
estes mecanismos que estão por trás das alterações que viram durante estas duas semanas
quer nas aulas práticas, quer no seminário.
Alguns polimorfonucleares neutrófilos estão em marginação ou
em diapedese.
(Apresentou-se uma imagem de uma vénula com PMNs na periferia – marginação –
aspectos de diapedese e acumulação de exsudado no componente extravascular, não estando
representados o rolamento e a adesão por ser uma imagem estática).
O componente extravascular por vezes pode ser um espaço, como é por exemplo o
espaço alveolar, ou cavidades serosas (peritoneal, pericárdica, pleural, etc). Como também já
descobrimos e vimos no seminário e nas aulas práticas, para além das células, o exsudado tem
muitas vezes uma constituição que leva ao aparecimento desta estrutura fibrinilar que constitui
uma rede – fibrina – estamos a ver neste caso um exsudado fibrino-leucocitário.
O que estamos aqui a descrever são alterações no plano microscópico, depois de termos
percebido os mecanismos que estão por trás do seu aparecimento. (Mas lembram-se que no
seminário que demos sobre lesões inflamatórias vimos também a expressão macroscópica.)
Imagem do encéfalo com
área de congestão e
exsudado purulento
Imagem do coração com congestão e exsudado fibrinoso (pericardite fibrinosa)
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Em síntese:
Alterações principais do processo inflamatório:
⇒ Vasculares – vasodilatação e aumento do fluxo sanguíneo e permeabilidade.
⇒ Celulares – marginação, rolamento, adesão, diapedese e quimiotaxia.
Quando a inflamação é desencadeada por microorganismos estamos a falar de uma infecção.
Mas no decurso de qualquer processo inflamatório pode haver outros agentes que despertam os
fenómenos que vamos discutir a seguir.
Vou-me referir agora a dois outros processos que são a opsonização e a fagocitose. A
opsonização facilita o reconhecimento dos microorganismos, os quais ficam assim mais
susceptíveis à fagocitose; se a fagocitose tiver como alvo as bactérias, têm um efeito bactericida.
Estamos portanto a falar de um processo de fagocitose de corpúsculos estranhos que é
facilitado quando existem determinadas proteínas na superfície destes que os tornam susceptíveis
à fagocitose. As proteínas que têm esta função são nomeadamente fragmentos do complemento e
imunoglobulinas, que se fixam à superfície dos microorganismos — opsonização. Por sua vez as
células com actividade fagocítica têm receptores complementares para estas mesmas proteínas
(componentes do complemento e imunoglobulinas) o que facilita a adesão das partículas
opsonizadas à superfície das células com actividade fagocítica — fagocitose.
Nem sempre a fagocitose é mediada pela opsonização; por exemplo as células macrofágicas
têm receptores para a manose que é um açúcar muito frequente nas estruturas sacarídeas da
parede de bactérias e não dos humanos. Portanto os macrófagos têm receptores para açúcares das
bactérias. Como já vimos, os macrófagos têm também receptores para as moléculas de
opsonização (opsoninas) o que promove a adesão das partículas estranhas à superfície celular.
Este acontecimento estimula a emissão de pseudópodes, os quais por sua vez vão envolver a
partícula recentemente aderida e vão constituir um fagossoma ou vacúolo fagocítico. O
fagossoma vai fundir-se dentro da célula com os lisossomas e da fusão do lisossoma com o
lisossoma resulta um fagolisossoma.
Reparem que neste processo de adesão muitas vezes podem libertar-se do conteúdo dos
grânulos dos lisossomas, enzimas que podem sair para o interstício e aí causar lesão (embora o
seu efeito seja desejável por levar à lise dos microorganismos, podem levar a alguma destruição
do tecido envolvente se saírem para o exterior).
Então o que se passa dentro do vacúolo fagocítico?
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O processo bactericida em grande parte é mediado pela produção de radicais livres de
oxigénio que são altamente tóxicos e bactericidas; participam também neste processo algumas
enzimas, nomeadamente uma oxidase, que tem um componente citoplasmático e um de
membrana. Esta oxidase faz a transformação de NADPH em NADP e como consequência deste
processo o O2 é transformado no anião superóxido (O2-) que é altamente tóxico e que por sua vez
conduz à produção de peróxido de hidrogénio (H2O2), a água oxigenada. Este pode depois
decompor-se no radical hidroxilo (OH-) que também é muito tóxico, ou através de uma enzima
que é a mieloperoxidase (MPO), levar à formação de hipoclorito (OCl-), um constituinte da
lixívia.
Estamos portanto a falar da constituição do interior do vacúolo fagocítico ou
fagolisossoma; tem produtos químicos que são altamente tóxicos e que participam de uma forma
muito activa na actividade bactericida.
Estes mecanismos que nós temos vindo a discutir, quando alterados (e muitas vezes são
alterados por defeitos genéticos) são responsáveis por doenças que perturbam a adesão dos
leucócitos, a actividade microbicida das células ou antes dela, a fagocitose. Estas doenças em
que há perturbação destes mecanismos são doenças que se exprimem clinicamente por infecções
de repetição em doentes infectados.
Há doenças em que:
— a adesão está perturbada:
doença de tipo I: alterações que afectam as integrinas;
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doença de tipo II: ausência do Sialyl-Lewis X (o tal ligando para as selectinas).
— a actividade microbicida está alterada por defeitos da oxidase de NADPH; surge a
doença granulomatosa crónica, em que os doentes, muitas vezes crianças, têm infecções de
repetição.
— a fagocitose está comprometida, havendo deficiência na formação de
fagolisossomas, há uma doença que é designada por síndrome de Chédiak-Higashi. Neste
síndrome as células macrofágicas não têm a capacidade de fagocitar material exógeno,
especificamente microorganismos.
Portanto há várias doenças genéticas que perturbam a capacidade de resposta inflamatória
e em que estes mecanismos estão alterados.
Foi mostrada uma adaptação da tabela 2.2, pág. 43 do nosso livro (Robbins), referente aos
defeitos da função leucocitária: aqui a mensagem é dizer-vos que para além de doenças
genéticas, as alterações destes mecanismos inflamatórios podem também ocorrer em doenças
adquiridas, de muita e variada natureza: diabetes, neoplasias malignas, situações de
imunodeficiências, etc. Nestas pode também haver alteração da adesão, da fagocitose e da
actividade microbicida das células macrofágicas. Portanto o entendimento destes mecanismos é
fundamental para perceber os processos que temos vindo a ver e também para perceber alguns
quadros lesionais com que se vão defrontar um dia mais tarde na vossa actividade clínica.
Momento Sobrinho Simões ☺:
“Nos recém nascidos não é um problema de doença, é um problema de maturidade (nas
adquiridas). A neonatologia põe problemas interessantes porque a maior parte das doenças do
recém-nascido não são doenças estruturais, são doenças por insuficiente maturação”.
Vamos voltar a fazer uma síntese:
Nós já varremos muito bem os tecidos vascularizados e já discutimos muito bem as
células inflamatórias. O que nós ainda não discutimos é quem são os mediadores do processo
inflamatório. Mas já dei algumas pistas, já falei da histamina, trombina, lisossima, citocinas (IL-
1, TNFα) e dos fragmentos do complemento.
Há 2 grandes grupos de mediadores do processo inflamatório:
► Existentes no plasma (têm origem maioritariamente no fígado, estão na forma inactiva,
se estivessem activos passávamos a vida inflamados!)
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Ex. componentes do sistema complemento
► Origem celular:
▪ Pré-formados e acumulados em grânulos das células inflamatórias
Ex. histamina nos mastócitos, basófilos e plaquetas
▪ Sintetizados de novo
Ex. citocinas
Como é que estes mediadores plasmáticos se organizam?
Eles constituem cascatas de activação sequencial e são fundamentalmente 4: a cascata das
cininas, cascata da coagulação, sistema fibrinolítico e cascata do complemento. A que todos nós
conhecemos muito bem é a cascata de coagulação. O primeiro factor que leva à activação desta
é o factor XII, também designado factor de Hageman. Sempre que ele é activado leva à activação
da cascata de coagulação cujo produto final é a fibrina. Reparem agora que se num processo
inflamatório apenas fosse activado a cascata de coagulação, era activada a produção de fibrina,
constituíam-se trombos, nós entupíamos os nossos vasos e íamos desta pa melhor... Portanto este
sistema de coagulação é contrabalançado por um outro que leva à lise da fibrina: o sistema
fibrinólitico, cujo produto final é a plasmina. A plasmina actua sobre a fibrina levando à sua
degradação e ainda activa a cascata do complemento. Por sua vez o sistema fibrinólitico tinha
sido activado pelo sistema das cininas. O sistema das cininas leva à produção da bradicinina
que é um importante mediador inflamatório com efeitos muito marcados nas alterações
vasculares que discutimos.
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Portanto nós temos no plasma vários sistemas de que resultam mediadores do processo
inflamatório; alguns com efeitos antagónicos, como a fibrina ser lisada pela plasmina. Há um
outro aspecto comum a estes sistemas: têm retroalimentação e portanto um feedback que se
pretende negativo mas que nem sempre funciona muito bem. A existência desta regulação
evidencia a necessidade absoluta de que estes sistemas funcionem de forma coordenada.
Importância do efeito de contrabalançação dos efeitos dos mediadores
inflamatórios:
Exemplo: Suponhamos um vaso com lúmen ocluído devido à formação de um trombo
que tem fibrina e leucócitos. Se este processo não for contrabalançado pela lise deste trombo, ele
pode estender-se e levar a uma coagulação disseminada, que é uma situação clínica muito grave.
Assim o sistema fibrinolítico, através da formação da plasmina, promove a degradação da fibrina
e assim atenua os efeitos do trombo.
Em síntese, nós tínhamo-nos proposto a discutir inflamação aguda.
Já vimos que só ocorre em tecidos vascularizados, tem causas muito diversas e que levam
à produção de mediadores inflamatórios que são de 2 grandes grupos: actividade baso-activa ou
factores quimiotáxicos para células. Dos primeiros resultam alterações vasculares, dos segundos
resultam alterações celulares com recrutamento de células inflamatórias que são geralmente
Biopatologia 2006/2007
Faculdade de Medicina da Universidade do Porto 16 de 16
diferentes na inflamação aguda e na inflamação crónica. Os elementos celulares predominantes
na inflamação aguda são os polimorfonucleares (+ importantes), as plaquetas, e os mastócitos…
Exemplo de processo inflamatório agudo:
� Vasodilatação
� Edema sob a forma de exsudado
� Rico em polimorfonucleares
� Instalação rápida e de curta duração (minutos, horas, dias).
Os processos de inflamação aguda e crónica são distintos embora não haja fronteiras
claras uma vez que o primeiro pode evoluir para o segundo. No processo inflamatório crónico
(tema da próxima aula), os processos vasculares relativamente à vasodilatação são muito pouco
proeminentes para não dizer ausentes (há alterações de outro tipo que vamos discutir) e as
células inflamatórias são predominantemente macrófagos, linfócitos e plasmócitos.
Ufa! Ufa! Não chateamos mais! Basta dizer o que toda a gente pensa: espero que esta
aula seja muito útil para dia 15!!! Por isso não se esqueçam dela! Boa sorte!!
E pa descontrair…