Gestoras e Gestores Negros
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GESTORES NEGROS NO BRASIL DE HOJE
Conforme matéria da Revista Exame, histórias de executivos negros no
Brasil são raríssimas:
“EXAME entrou em contato com cerca de 100 empresas, em busca de
executivos negros. Foram encontrados 12. O negro, em geral, pertence às
camadas mais pobres da população, os negros no Brasil têm pouco acesso à
educação, aos bons colégios e às boas faculdades — isso quando conseguem
chegar à faculdade.
O problema pode ser analisado por outro prisma: o conceito brasileiro do
que seja ser negro. Pessoas que para os americanos e europeus seriam negras
aqui são brancas ou se encaixam numa categoria como pardos, caboclos,
mulatos claros e por aí afora. Para um americano ou europeu, o número de
executivos negros no Brasil é bem maior do que parece para nós, brasileiros.
As empresas brasileiras, aparentemente, não têm nada contra os negros.
Pelo menos é o que afirmam os headhunters: „Eu nunca ouvi um
representante de empresa dizer que não queria contratar negros‟, diz
Guilherme Velloso, diretor da PMC - AMROP International, „mas também
não me lembro de ter visto um executivo negro conversando no nosso
escritório‟.
Gladys Zrncevich, uma consultora da Korn/Ferry, outro grande escritório
de headhunting, também não conhece executivos negros brasileiros. Afirma
que gostaria de conhecer: „A partir do advento da globalização e com os
programas de diversidade instalados nas empresas, muitas delas acham que
seria interessante poder fugir do perfil do candidato que tem de ser branco, de
classe média e formado em boas escolas‟, diz Gladys.
Será, então, que não existe preconceito de raça no Brasil? Ou existe e é tão
velado que faz com que algumas pessoas realmente acreditem que somos
diferentes dos americanos?
„O preconceito começa nos anúncios de empregos que pedem candidatos
de boa aparência e, por isso mesmo, excluem os negros‟, diz Valdir José de
Quadros, diretor do Instituto de Economia da Unicamp. „Eles nem podem
competir com os brancos nesse quesito, pois num processo de seleção entre
candidatos com a mesma competência sempre saem perdendo‟.
„São poucas as empresas que não se utilizam desse expediente para barrar
a entrada dos negros‟, afirma Milton Barbosa, coordenador do Movimento
Negro Unificado.
„É burrice uma empresa deixar de pegar um executivo de bom calibre por
ser judeu, japonês ou negro‟, afirma Carlos Salles, presidente da Xerox.
Mas o que ocorre se houver uma disputa entre um negro e um branco em
igualdade de condições? As empresas brasileiras fazem benchmarking de
quase tudo o que vem da América do Norte, mas será que isso já está valendo
para as atitudes politicamente corretas?
Pense na seguinte situação: o cliente de uma empresa marca almoço com
um diretor que só conhece por telefone. Quando esse cliente chega ao
restaurante, tem uma surpresa: o diretor é negro. „É, de fato, um impacto‟,
afirma Wilton Santos, o presidente da Xerox na Colômbia. „Quando isso
acontece, as pessoas, em princípio, duvidam da sua competência e ficam
esperando que a qualquer momento você faça ou fale uma bobagem. Depois,
à medida que percebem sua segurança e conhecimento profissionais, a
situação fica normal‟.
Wilton tem 45 anos, é mineiro de Uberlândia e admite que esse tipo de
constrangimento ocorreu algumas vezes em sua carreira.
Ele veio de uma família de classe média com treze filhos. Seu pai era
comerciante e sua mãe, professora primária. Foi convidado para desenvolver
um trabalho no centro de atendimento a clientes do escritório de Nova York.
A empresa estimava que o projeto levaria dois anos para ficar pronto. Santos
se desincumbiu da tarefa em seis meses e hoje dirige uma unidade cujo
faturamento é de 100 milhões de dólares. Seu salário está entre 90 000 e 100
000 dólares anuais.
A vida para os executivos negros costuma ser mais dura que para os
brancos. São obrigados a conviver com comentários jocosos, de mau gosto, e
enfrentar situações difíceis de lidar.
O executivo gaúcho Leomar Paulo Pacheco Joaquim, 41 anos, assumiu a
gerência técnica de um braço do grupo Votorantim. Estão sob a
responsabilidade de Joaquim um orçamento de 2,3 milhões de dólares. Ele
ocupa o segundo escalão da empresa, tem participação nos resultados e, em
breve, terá um carro, entre outros benefícios.
O começo de sua carreira foi difícil. Tudo o que se pode imaginar que
aconteça em termos de discriminação ocorreu com ele. Filho de uma família
pobre — o pai era sargento da Polícia Militar e a mãe, empregada doméstica
—,precisou da ajuda dos patrões da mãe para estudar. Cursou faculdade de
engenharia de operação e mecânica. Sua primeira decepção profissional
ocorreu no primeiro dia no primeiro emprego: „Eu era o técnico, mas me
mandaram abrir buracos na rua para instalar postes de luz‟, diz Joaquim.
Mais para a frente, foram comuns coisas como competir com um branco e
este levar a melhor no final, ou ouvir dos chefes que a sua cor poderia
constranger clientes importantes.
A história de Joaquim ilustra bem o que geralmente acontece com os
negros. Eles têm frequentemente de ser melhores que os outros para chamar a
atenção dos chefes.
Luiz Carlos dos Santos tem um cargo de gerente na Itaú Seguros em São
Paulo. Com 48 anos de idade e há vinte na empresa, ficou conhecido no
mercado das seguradoras como o Black do Itaú: „O apelido surgiu logo que eu
entrei porque havia um homônimo meu que era branco e nós andávamos
muito juntos, daí a brincadeira do black and white’. O apelido pegou de tal
forma que consta até do cartão pessoal do executivo.
Hoje faz parte de uma comissão do Instituto de Resseguros do Brasil, onde
representa a Itaú Seguros e outras seguradoras. Certa vez, numa reunião,
avisou ao cliente, uma empresa multinacional, que o banco não concordava
com o que lhe fora colocado: „As pessoas me fuzilaram com os olhos e senti
que se questionavam como um negro poderia estar discordando delas‟. Ele
acabou sendo convidado para almoçar com o presidente da empresa com
quem se antagonizara na reunião e acredita ter conquistado seu respeito”.
(Sganzerla, V. Raça e carreira: a trajetória de executivos negros no Brasil. Exame, 08/04/1996).