Garcez & Zilles 2002 - Extranjerismos

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,.. ----- Fábio Lopes da Silva e Heronides Maurílio de Melo Moura (Organizadores) o DIREIT '. ALA A qusstáo do pr.econce'ito linqülstíco Editora SInsular

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extranjerismos - brasil - políticas lingüísticas

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    Fbio Lopes da Silva eHeronides Maurlio de Melo Moura

    (Organizadores)

    o DIREIT'.

    ALAA qussto dopr.econce'itolinqlstco

    EditoraSInsular

  • Editora Insular

    OmRBTO A FALAA questao do preconceito lingrstico

    Fbio Lopes da Silva eHeronides Maurlio de Melo Moura

    (Organizadores)

    Surnrio

    EditorNelson Robn de Moura

    Projeto Grfico e Editoraco EletrnicaSi/vana Fabris

    Introduco 9Fdbio Lopes da SIlva (UFSC) eHeronides Maurtlio de Melo Moura (UFSC)

    CapaMauro Ferreira A prosa de Lima Barreto: o que quer essa lngua? 17

    Ciaudio Cruz (UFSC)Supervso Editorial

    CarlosSerrao Os Aldrovandos Cantagalos e o preconceito lingstico 23[os Luiz Fiorin (USP)

    Ficha Catalogrfica

    Estrangeirismos: emprstimo ou ameaca? 39Pedro M Carcez (UFRGS) eAna M S. Z/Ies (UFRGS)

    D598 O Direito a Fala:a questo do preconceitolingstico j Fbio Lopes da Silva, HeronidesMaurlio de Melo Moura, organizadores.2a ed. rev. Florianpolis : Insular, 2002.128p.

    ISBN 85-7474-059-4

    Dois casos de preconceito lingstico na mdia 53FdbioLuiz Lopes da Silva (UFSC)

    1. Lingstica. Lngua. l. Lopes da Silva, Fbio. Il.Maurlio de Melo Moura, Heronides. Ill. Ttulo.

    As afasias entre o normal e o patolgico:da questo (neuro )lingstica a questo social '" 63Edwiges Mana Morato (UNICAMP)

    CDD 410A lngua popular tem razesque os gramticos desconhecem 75Heronides Maurlio de Melo Moura (UFSC)Editora Insular Ltda.

    Rua Osmar Cunha, 183 - B1.B - S. 1012 - Edificio Ceisa CenterCEP 88015-900 - FlorianpolisjSC

    Fonejfax: Oxx [email protected] - www.insular.com.br

    Filiada a CCL-amara Catarinense do Livro e ao SNEL-Sindicato Nacional dos Editores de Livros

    Brasileiro fala portugus:monolingsmo e preconceito lingstico 83Gilvan Mller de Oiiueira (UFSC)

  • Sobre o porqu de tanto dio contra a linguagem"polticamente correta" 93Kanavi!ltl Rnjagopa/an (UNICAMP)

    o uso de corpora na elaboraco de trabalhos de referncia:urna vacina contra o preconceito 103Marco Rocha (UFSC) e [uliana Se// do Va/e Pereira (UFSC

    L' tranzei direit . '1' . ? 113mgua es angeua: irer o ou pnvl egio .!osa/ha Ramalho Vieira (UFSC) eHeronides Maurio de Me/o Moura (UFSC)

    Bibliografa 125

    Introdugo

    Fbio Lopes da SIlva eHeronides Maurilia de Me/o Moura"

    A questo do preconceito lingstico tem voltado a ton anos debates dos estudiosos da lnguagem no Brasil. Um conjun-to de pesquisas (entre as quais podemos citar o livro de MarcosBagno (1999), o Boletim da ALAB 4-4 (2000) sobre o Projeto de Leicontra os Estrangeirismos, alm de mesa redonda sobre o tema emevento da ABRALIN na 53a Reunio Anual da SBPC) teve o m-rito de recolocar em discusso esse problema aparentemente su-perado do ponto de vista terico. Um postulado bsico daLingstica a diferenca entre urna visao normativa das lnguas(sem base conceitual e cientfica) e urna visao descritiva das 00-guas, desenvolvida com os instrumentos da cincia lngstca.A,primeira visilo, corporificada nas gramticas tradicionais e na tra-~ao escolar, urna tonte geradora de preconceitos na medidaem ue as socia, mesmo que ImplcItamente, avalia

  • EstrangeiriStnos:errrprst irno ou atneaga?

    PedroM Garcez e Ana M S. Ztlles'"

    Estrangeirismo o emprego, na lngua de urna comuni-dade, de elementos oriundos de outras lnguas. No caso brasilei-ro, posto simplesmente, seria o uso de palavras e express6es es-trangeiras no portugus. Trata-se de fenmeno constante no con-tato entre comunidades lingsticas, tambm chamado de~-Q!'stimo. A noco de estrangeirismo, contudo, confere ao em-prstimo urna suspeita de identidade aliengena, carregada devalores siblicos relaCIOnados aos falantes da lngua que origi-na o emprstimo.

    Acontece que diferentes grupos em urna comunidade po-dem atribuir valores diferentes as identidades ligadas aos falantes9-eoutras lnguas. Ento, os valores associados a urn estrangeirismoodem muitas vezes ser conflitantes dentro da comunidade que

    faiO" emprstimo. Por exemplo, os falantes do portugus brasilei-ro, tendo em mente a representaco que fazem de certos falantesde ingles, associam a eles e, por extenso, a lngua inglesa, valoresque van desde dinamismo progressista, consumo e comodidade,avance tecnolgico e poder vigoroso, aos quais desejam se associ-ar, at conservadorismo retrgrado, grosseria, artificialidade insen-svel e poder nocivo, que desejam combater.

    A noco de estrangeirismo faz do con tato lingstico urnaarena propcia ao desenvolvimento de certos episdios da vida

    Professores do Departamento de Lingstica, Filologia e Teoria Literria da UFRGS-Universidade Federal do Rio Grande do Sul,

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  • social da linguagem em que posces polticas e SOClalSconflitantes, de difcil tratamento direto e aberto, vm a pblicono debate sobre os comportamentos lingsticos dos grupos quedisputam o controle e a distribuico de recursos na comunidade.Embora o debate seja movido, no fundo, pelas posic;oes polticase SOC131Sdos diferentes grupos, ele trata, na su erfCle, de -ue;=tes mgusticas, e mo o que a arena, ento, se toma tambmterreno frtil para a produco de discursos superficiais e equivo-cados sobre a natureza da linguagem, sobre o uso restigioso e11correto" da lngua da comuru a e e sobre a prpria vida socialda linguagem. O propsito dessa movimentaco ideolgica es-tabelecer o que legtimo na lngua da comunidade, na lnguado poder - a variedade lingstica idealizada, simbolicamenteassociada ao exerccio do poder - e, em ltima anlise, identificarquem fala com legitimidade a Imgua da comunidade e, portanto,quem est apto a exercer o poder dentro dela e em seu nome.Assim como a discussao sobre o que portugues correto buscaestabelecer o valor, o capital social das formas lingsticas associ-adas a grupos internos da comunidade, a discussao sobre o que ~portugues legtimo busca estabelecef os valores de capitallingstico das formas associadas a repertrios externos l comu-nidade.

    Legitilllidllde e pllreZIl

    9 movimento se inicia quando,_ao se qualificar um em-rstimo como estrangeirismo, h urna suspeita sobre a legitimi-

    dade do elemento lingstIco. Devemos, ento, reexaminar a de-finico de estrangeirismo apresentada na abertura deste captulopara yermos se possvel determinar o que faz de um elementolingstico um emprstimo suspeito.

    Em primeiro lugar, importante notar que, embora pare-ea fcil, hoje, apontar home banking e coffee break como exemplosclaros de estrangeirismos, ningum garante que daqui a algunsanos nao estaro sumindo das bocas e mentes, como o match dofutebol e o rouge da moca: assim como ningum garante que naotero sido incorporados naturalmente l lngua, como o garc;om e

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    o suti, o esporte e o clube. Desse modo, urn primeiro exame dospossveis critrios que conferem a um emprstimo lingstico ocarter de estrangeirismo nos mostra que llem sempre claro Q.status de urn elemento emprestado. Status, por exemplo, termoiatino e, portanto ... seria portugus, pois, afinal, o portugus nao uma lngua que veio do latim? ou seria estrangeirismo, j quese trata de termo erudito, tomado emprestado do latim depoisque o portugus j era portugus"? E os termos rabes - frutosda domnaco da Pennsula Ibrica - que se agregaram ao portu-gues antes que este invadisse o territrio gigantesco que hojeocupa na Amrica? lcool, alqueire, alface: estrangeirismos? As-sim, urna breve reflexo sobre o que hoje parte legtima da ln-gua, mas nao foi ontem, j indica que nao simples dizer o que portugus puro, nem simples dizer como algo deixa de ser umestrangeirismo e passa a ser parte da lngua da comunidade.

    Sem dvida, os emprstimos recentes podem ser mais fa-cilmente identificveis, por ainda nao terem completado o pro-cesso de incorporaco l lngua pela padronizaco escrita. Em suaessncia como objetos lingstico s, no entanto, nao razoveltrat-Ios como diferentes dos ue vieram antes, . que sao todos

    tos o conta o gstico. claro que h ocasies em que al-gum pode querer marcar a identidade extica de urn emprsti-mo recente ou de escolha pessoal, por razes que podemos jul-gar, segundo critrio pessoal, como questionveis, afetadas oupreconceituosas. Tais ocasies sero especialmente comuns emsociedades cujos membros equacionam o que estrangeiro comqualidade, com prestgio. Isso, contudo, acontece tambm comrelaco a outras escolhas lingsticas, que nao envolvem estrangei-rismos, mas que julgamos estilisticamente inadequadas, porqueempoladas ou pomposas.

    De resto, os elementos estrangeiros que surgem do conta-to lingstico tem vida curta como muitas rias, ou sao inco o-rados e mo o to ntimo l lngua que os acolhe, pelos processos---1 Esta parece ser a posico de dicionrios brasileiros (cf. Aurlio, Nova Fronteira) e lusita-

    nos (cf. Almeida Costa e Sampaio e Melo, Porto Editora). Note que o mesmo status latinodeu em ~ portuqus,

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  • social da linguagem em que posices polticas e SOClalSconflitantes, de difcil tratamento direto e aberto, vm a pblicono debate sobre os comportamentos lingsticos dos grupos quedisputam o controle e a distribuico de recursos na comunidade.Embora o debate seja movido, no fundo, elas posic;oes polticase SOClalSdos diferentes grupos, e e trata, na su er ICle, e ues-tes ingusticas, e mo o que a arena, ento, se toma tambmterreno frtil para a produco de discursos superficiais e equivo-cados sobre a natureza da linguagem, sobre o uso restigioso e"correto" da lngua da comuru a e e sobre a prpria vida socialda linguagem. O propsito dessa movimentaco ideolgica es-tabelecer o que legtimo na lngua da comunidade, na lnguado poder - a variedade lingstica idealizada, simbolicamenteassociada ao exerccio do poder - e, em ltima anlise, identificarquem fala com legitimidade a lngua da comunidade e, portanto,quem est apto a exercer o poder dentro dela e em seu nome.Assim como a discussao sobre o que portugues correto buscaestabelecer o valor, o capital social das formas lingsticas associ-adas a grupos internos da comunidade, a discussao sobre o que ~portugus legtimo busca estabelecer os valores de capitallingstico das formas associadas a repertrios externos l comu-nidade.

    Legitimidllde e purezlI

    9 movimento se inicia quando, ao se qualificar urn em-rstimo como estrangeirismo, h urna suspeita sobre a legitm-

    dade do elemento lingstIco. Devemos, ento, reexaminar a de-finico de estrangeirismo apresentada na abertura deste captulopara yermos se possvel determinar o que faz de um elementolingstico um emprstimo suspeito.

    Em primeiro lugar, importante notar que, embora pare-ea fcil, hoje, apontar home banking e coJleebreak como exemplosclaros de estrangeirismos, ningum garante que daqui a algunsanos nao estaro sumindo das bocas e mentes, como o match dofutebol e o rouge da moca: assim como ningum garante que naotero sido incorporados naturalmente l lngua, como o garc;om e

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    L'

    o suti, o esporte e o clube. Desse modo, urn primeiro exame dospossveis critrios que conferem a um emprstimo lingstico ocarter de estrangeirismo nos mostra que llem sempre claro Q.status de um elemento emprestado. Status, por exemplo, termolatino e, portanto ... seria portugus, pois, afinal, o portugus nao urna lngua que veio do latim? ou seria estrangeirismo, j quese trata de termo erudito, tomado emprestado do latim depoisque o portugus j era portugus"? E os termos rabes - frutosda dominaco da Pennsula Ibrica - que se agregaram ao portu-gus antes que este invadisse o territrio gigantesco que hojeocupa na Amrica? lcool, alqueire, alface: estrangeirismos? As-sim, urna breve reflexo sobre o que hoje parte legtima da ln-gua, mas nao foi ontem, j indica que nao simples dizer o que portugus puro, nem simples dizer como algo deixa de ser umestrangeirismo e passa a ser parte da lngua da comunidade.

    Sem dvida, os emprstimos recentes podem ser mais fa-cilmente identificveis, por ainda nao terem completado o pro-cesso de ncorporaco l lngua pela padronizaco escrita. Em suaessncia como objetos lingsticos, no entanto, nao razoveltrat-Ios como diferentes dos ue vieram antes, que sao todos

    tos o conta o gstico. claro que h ocasies em que al-gum pode querer marcar a identidade extica de urn emprsti-mo recente ou de escolha pessoal, por razes que podemos jul-gar, segundo critrio pessoal, como questionveis, afetadas oupreconceituosas. Tais ocasies sero especialmente comuns emsociedades cujos membros equacionam o que estrangeiro comqualidade, com prestgio. Isso, contudo, acontece tambm comrelaco a outras escolhas lingsticas, que nao envolvem estrangei-rismos, mas que julgamos estilisticamente inadequadas, porqueempoladas ou pomposas.

    De resto, os elementos estrangeiros que surgem do conta-to lingstico tm vida curta como muitas rias, ou sao inco o-rados e mo o to ntimo l lngua que os acolhe, pelos processos....-

    1 Esta parece ser a posico de dicionrios brasileiros (el. Aurlio, Nova Fronteira) e lusita-nos (el. Almeida Costa e Sampaio e Melo, Porto Editora). Note que o mesmo status latinodeu em ~ portugus.

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  • normais de mudanca lingstica, que em duas geracss nem se-quer so percebidos como estrangeiros. Com efeito, em poucotempo, os que conhecem a lngua de origem nem reconhecemseus elementos quando usados como emprstimos. E, as vez es,urna lngua empresta a outra um termo e o toma emprestadoposteriormente, quando j nem se parece mais com o termo ori-ginal: doido foi emprestado ao ingles para nomear um pssarodas ilhas Seicheles, passando a dado; o pssaro, famoso comoexemplo de extin
  • sociedade na qual imensa a disparidade na capacidade de con-sumo dos cidadaos e na qual a classe social consumidora sofre degrande inse ran
  • dafalll e escrita" Gustificativa do Projeto de Lei Estadual/RS 65/2000, nfass acrescida).

    A posco poltica que busca justificar o controle social epelo estado da produ

  • mos poderiam manter intacto o seu carter estrangeiro, de modoque somente quem conhecesse a lngua original poderiacompreende-Ios. Conforme esse raciocnio, o estrangeirismoamea
  • ou menos como "b-djet". Nesse uso idiossincrtico, parece re-velar sua vontade de se associar a urn universo tecnolgico e ca-pitalista central. Entretanto, ao usar o termo, nao inclu quemconhece ingles.

    um preconceito lingstico supor que o que percebidocomo estrangeirismo hoje permanecer por muito tempo comoelemento estranho e alheio l lngua receptora, mantendo sua cargaaliengena. B!.t..ambm quem creia que, pelo uso continuado, osestran eirismos iriam pouco a pouco minando a ln a com ele-mentos aliengenas ISarc;a os, urna mvasao, urn cavalo de Tria.Se o desejo a forc;a que move o recurso a emprstimos, muitas~esnecessrios, o sentimento que move a aversao aos~strangeirismos parece ser o me do, medo da invaso que amea-ea o controle, que ameaca a suposta pureza da lngua e a nacio-nalidade monoltica. H inmeros exemplos para aplacar essemedo: o caso do ..Itebol emblemtico da natureza lingsticaque transforma um elemento a tal ponto que ele passa a ser vistocomo parte da identidade do grupo que fez o emprstimo. du-vidoso que os falantes de portugues brasileiro estejam sendo in-vadidos em seus coracas e mentes por emprstimos atuais maisdo que foram, por exemplo, por tantas palavras inglesas ligadasao esporte nacional por excelencia, esporte que, vale lembrar, sse estabeleceu entre ns h uns 100 anos.

    determinantes para as chances de acesso a bens sociais. Esse pro-Cesso de controle do que vale como lngua de poder nao siteio, ele tambm se d diante de elementos externos, as for-mas e maneiras de falar associadas a elementos estrangeiros, tra-tados por diferentes grupos internos corno sendo recurso aos seuspropsitos competitivos ou ento como ameaca de redefinicode um recurso que j se encontra em suas mos. Novamente,temos no uso linguagem urna arena para a constituico da vidasocial.

    No mbito do debate sobre os estrangeirismos, a consti-tuico da vida social se faz por asserces peremptrias sobre alinguagem. Em geral, tais asserces nem encontram respaldo noexame dos fatos estritamente lngstcos ou mesmo na crticados processos de constituico da vida social da linguagem. Emsuma, a discussao sobre estrangeiris~ - mais urna vez revgo-rada no Brasil - surge em discursos emocionados, recheados dealusoes a sentimentos de nacionalismo e patriotismo, baseadosno preconceito infundado de que h urna s lingua na comuni-aade nacional, a lingua padrao do poder, que deve ser defendidaae ameacas externas. 9 debate sobre estrangeirismos, entao, re-veIaUin esfor o de setores da classe dominante em manter sob.seu controle estrito a definic;ao a gua do poder diante de no-vos elementoSde repertorIos ligsticos externos e reforc;a ain-da mais a ideo logia lfugshca braslleira, segundo a qual somos-um nac;ao monolinge, uma unidade nacional forjada e mantida'pela unidade ligUlshca - talvez a maior fonte de preconceitoslffigsticos na nossa comUidade e a chave mVlslvel, mas le .ti-ma a, das prahcas exc udentes.

    DirJe,sidade illrJisrJel e rJida social da lillgtlagelll

    Parece ser arte da vida social da linguagem que os falan-tes se manifestem sobre o uso das ormas mglshcas. m especi-al, os atos ae notar, comentar e Julgar as formas de falar dos ou-tros tm funces de estabelecer quem pertence e quem nao per-tence a um grupo social, ou quem merece ou nao pertencer a umgrupo social. Dessa mane ira, definir o que vale como bom, agra-dvel, presti 'oso, certo - enfim, definir as formas' e os limites dalngua de oder - vem a ser urna atividade cave na competic;aope o acesso aos bens SOClatS Isputados pelos membros de dife-rentes gru os socials dentro de uma sociedade, j que a compe-tencia lingstica e comunica iva no uso da lngua do poder sao~-------------------------------------~------------50

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  • dessa situaco o caso do presidente Fernando Henrique Cardo-so. Seu conhecimento de vrias lnguas estrangeiras de prestgiofoi largamente explorado em suas duas campanhas eleitorais ena cobertura de sua gesto. Tornou-se comum assistir, durantesuas visitas ao exterior ou mesmo quando da presenca de chefesde estado estrangeiros no Brasil, as conversaces mantidas emlngua estrangeira. Mesmo que o protocolo diplomtico em nadaobrigasse a isso, o portugus era preterido, e a imprensa destaca-va o privilgio de termos um presidente poliglota. A comparacosubrepticia com o presidente anterior, o provinciano Itamar Fran-co, estava sempre presente nos espritos.

    Um exemplo ainda mais gritante desse esnobismo foi umaentrevista conjunta concedida, no Brasil, pelo Ministro da Fazen-da, Pedro Malan, e pelo Diretor do FMI, a propsito do emprs-timo concedido por esse fundo ao governo brasileiro. O leitortalvez se recorde do episdio no qual o diretor do FMI e o minis-tro respondiam em ingles as questes colocadas. Obviamente,nao de estranhar que o diretor do FMI falasse em ingles (paraisso existem os intrpretes), mas a utilizaco do ingles pelo mi-nistro brasileiro no mnimo questionvel. Ele exalava ali seupreconceito lingstico: para ele, a lngua do business o ingles, eera a elite que interage nesse mundo que se destinava a sua fala.Os outros que esperassem o intrprete.

    Essa stuaco tpica de contextos coloniais, em que aselites dos pases colonizados se exprimem na lngua do coloni-zador para obter o beneplcito deste. O Brasil nao urna colonia,mas o ministro da Fazenda se comportou como se assim fosse.

    Um enorme repertrio de casos se enquadra nessa situa-co que rotulamos a do poliglota esnobe. Sempre que uma ln-gua estrangeira usada nao para interagir com outra cultura,mas para marcar a diferenca cultural entre quem domina essalngua e quem nao a domina, estamos diante desse tipo de situa-co. Nesse caso, o que importa o cdigo, e nao a mensagem.

    Lutar contra os diversos tipos de preconceito lingsticoligados ao uso de lnguas estrangeiras nao uma tarefa fcil, massaber Identifica-los um passo importante.

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