Filosofia

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Revista de Filosofia Ano levo Ano VIII - N.º 1 2012 / 2013 AMOR A SABEDORIA ESCOLA BÁSICA E SECUNDÁRIA PADRE MANUEL ÁLVARES

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Revista de Filosofia, EBSPMA

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Revista de Filosofia Ano letivo

Ano VIII - N.º 1 2012 / 2013

AMOR A SABEDORIA

ESCOLA BÁSICA E SECUNDÁRIA PADRE MANUEL ÁLVARES

FICHA TÉCNICA

Organização:

Colaboração:

Capa:

Revisão:

Versão On-line:

Grupo 410 - Filosofia

2011/12:10ºE;11ºA;11ºB;11ºE;11ºC;12ºE

2012/13:10ºA;10ºB;10ºD;10ºG;11ºB;11ºE;EFA ST6

Inês da Silva Almeida ( 10ºB)

Graça Magalhães, Lurdes Sousa e Martinho Macedo

Escola B + S Padre Manuel Álvares - 2013

Página

Editorial ............................................................................................................................................. 3

Sapere aude—Ousa Pensar!

“Pensar por si próprio” .......................................................................................................... 4

Somos audazes?!? ................................................................................................................. 5

Kant-referências bio-bibliográficas ........................................................................................ 6

À luz da ‘Alegoria da Caverna’… ........................................................................................................ 7

A mesma narrativa, um outro registo ...................................................................................8

Para saber mais .....................................................................................................................8

E-mail entre Cavernas ...........................................................................................................9

Uma outra imagem da caverna - o filme Matrix ...................................................................9

Matrix como Prisão .............................................................................................................11

Evoluímos? ..........................................................................................................................12

Seremos todos egoístas dissimulados? ..........................................................................................13

PENA DE MORTE: Moral ou imoral? ................................................................................................15

Para saber mais. ..............................................................................................................................17

Á volta da linguagem .......................................................................................................................18

O que é argumentar? .......................................................................................................................19

Filosofia, retórica e democracia. .....................................................................................................20

O que será moralmente aceitável? ..................................................................................................22

Até onde podemos tolerar? .............................................................................................................24

Qual a natureza dos valores? ..........................................................................................................25

O Papalagui nunca tem tempo. .......................................................................................................26

A Filosofia vai ao cinema-In Time ....................................................................................................29

Pensadores do Século XX– Popper e Heidegger ..............................................................................30

E se, Milagros, os sonhos são mentira? ...........................................................................................32

Visita de Estudo. ..............................................................................................................................35

Consolida, passando o tempo..........................................................................................................37

Sugestões de leitura ........................................................................................................................39

NESTA EDIÇÃO:

Amor à Sabedoria Página 3

Fonte:http://filosofialogos.blogspot.pt/

“ É urgente o amor, é urgente permanecer”

(Eugénio de Andrade)

A poesia faz-se presente enquanto pensamos no percurso realizado na elaboração da revista que

apresentamos.

Apercebemo-nos que a vida tem urgência e que grita essa urgência enquanto o transitório se faz

ouvir e seguir pelos distraídos. Urgência em que cada um de nós assuma o exercício da reflexão como

uma prática que permite a re – organização do pensamento em quadros de inteligibilidade cada vez

mais claros, lúcidos, que revelem propostas felizes de solução para os problemas da vida.

O Homem, ser biopsicosocioespiritual, dotado de múltiplas dimensões, caminha pelos séculos em

busca de conhecimento. Apesar das adversidades, envolto nos destroços dos momentos vividos, na

intimidade do Ser permanece essa necessidade existencial da procura da Verdade.

Às vezes perde-se o rumo e o vazio decorrente da descrença ecoa por detrás dos rostos desencan-

tados. Mas, o tempo, transcendendo qualquer tentativa de definição, arrasta as sequelas da irrefle-

xão, do desvario, da ausência, e faz-nos acordar. Permanece inquestionável o amor à sabedoria!

Trazemos até ao leitor os trabalhos que os alunos forjaram a partir dos desafios lançados nas au-

las. Convidamos o leitor a entrar nas suas reflexões, nas suas perguntas, vestidas da vontade de en-

contrar respostas que resistam à crítica.

Gostaríamos de traduzir em palavras o que foi desenhado para além dos textos, mas não temos

recursos verbais para o fazer. Sendo assim, resta-nos agradecer a todos os alunos, e a cada um, pelos

momentos vividos, pelo trabalho realizado, pelos gestos, pelos sorrisos, pela dedicação.

Em nós habita o sentimento de gratidão por permanecerem!

A todos desejamos uma boa leitura!

EDITORIAL

Página 4 Amor à Sabedoria

de. Homens e mulheres em todas as épo-

cas escolheram dar resposta ao desafio de

fazerem sempre mais e melhor. Kant desig-

nou menoridade como a incapacidade do

Homem de exercer o exercício do pensa-

mento por si próprio sem orientação de

outrem.

Kant defende que

o Homem assume-

se menor quando

considera que pen-

sar por si próprio é

uma tarefa exausti-

va que não lhe

traz vantagens. Tal

atitude, Kant afir-

ma agravar-se,

quando ao dar-se

de conta que ou-

tros podem exercer

esta tarefa aborre-

cida, assume-a acessória, não se esforça e,

por preguiça, deixa-se acomodar ainda mais.

Trata-se de uma dependência agravada,

pois, segundo Kant, os tutores, muitas vezes,

aproveitam-se da falta de coragem e da co-

bardia dos que se assumem menores e recu-

sam dar-lhes liberdade. Os tutores saem

beneficiados, pois continuam a desenvolver

as suas capacidades e, de boa vontade, assu-

mem o seu cargo de superioridade.

Na realidade atual, o Homem acomoda-se

e serve-se cada vez mais do trabalho dos

outros.

Do meu ponto de

vista, existem pelo

menos três tipos de

tutores. Uns, como

defende Kant,

aproveitam-se da

cobardia e pre-

guiça dos menores

e chegam a servir-

se deles em seu

próprio proveito.

Outros ficam indife-

rentes a esta me-

noridade, deixando que os menores se sir-

vam do seu trabalho, porém sem tirar parti-

do desta atitude. Por fim, alguns tentam aju-

dar aqueles que se assumem menores a li-

bertarem-se e a perceberem que detêm tan-

tas capacidades quantas eles próprios de-

têm. Quando os tutores tentam ajudar os

menores duas situações podem ocorrer: os

menores podem ficar ainda mais dependen-

“PENSAR POR SI PRÓPRIO”

Q ue cómodo é ceder à vontade indis-

ciplinada que se acomoda na inér-

cia, na preguiça, na ausência!

Cómodo, sem dúvida! Mas distante da desco-

berta das próprias capacidades de auto – rea-

lização.

Como seres humanos que somos, em nós

existe o potencial de grandes realizações. A

história está repleta de testemunhos grandio-

sos daqueles que não aderiram à menorida-

“A menoridade é a incapacidade de se

servir do entendimento sem a

orientação de outrem. Tal menoridade

é por culpa própria se a sua causa não

reside na falta de entendimento, mas

na falta de decisão e de coragem em se

servir de si mesmo sem a orientação de

outrem. Sapere aude! Tem a coragem

de te servires do teu próprio

entendimento!”

Kant, Paz perpétua e outros

opúsculos (Edições 70)

Amor à Sabedoria Página 5

O Homem tem duas possibilidades: ou

deixar-se ficar, sem refletir, sem as-

sumir compromissos, passando a ser

comandado pelas circunstâncias, pelos outros;

ou, pelo contrário, optar por ser livre ao agir

segundo os princípios que a sua inteligência

permite descobrir.

O segundo caminho é o mais difícil porque

implica o esforço reflexivo no desocultar do

caminho a seguir, assim como a coragem da

responsabilidade. Esta dificuldade, que se evi-

dencia no imediato, faz com que muitos ho-

mens prefiram seguir o caminho mais fácil que

não vislumbra outra realidade que não seja o

caminho das vantagens do prazer imediato, da

preguiça, mas que deixa rapidamente o sabor

amargo do vazio, de quem não se preenche

com as suas próprias escolhas, com as suas

próprias decisões, de quem não se comprome-

te com a humanidade.

No primeiro caminho, o homem limita-se a

seguir o rebanho. Ao assemelhar-se com um

animal domesticado torna-se embrutecido: é

um homem que nunca chega à maioridade e

que, apesar de não ser livre, nem autónomo,

considera-se inteligente por viver a seguir as

decisões de outrem.

Segundo Kant, o homem livre é aquele que é

autónomo e a autonomia é a capacidade de

autodeterminação. Um agente qualquer só

pode ser considerado autónomo quando as

suas acções são verdadeiramente suas, racio-

nais, e não motivadas por influências ou fato-

res externos. Para Kant a vontade deve agir de

acordo com a lei própria da razão em oposição

à vontade heterónoma, a qual orienta-se pelo

desejo e não pela razão.

SOMOS AUDAZES?!

tes ou conseguirem, por si próprios, alcançar a maioridade.

A menoridade é um ciclo vicioso e de difícil saída, pois aquele que se assume menor pensa estar a

agir em seu benefício, porém apenas está a contribuir para o desenvolvimento das capacidades de

outrem em detrimento do seu próprio crescimento interior.

Kant refere que sair da menoridade não é tão perigoso como parece aos que se assumem menores,

nem como os tutores mencionados por Kant fazem com que se pareça. Para Kant, sair da menorida-

de não é perigoso, pois com este crescimento interior o Homem volta a andar por si próprio, ou seja,

a pensar por si e a desenvolver as suas capacidades de forma autêntica.

Pensar por nós próprios torna-nos hábeis para enfrentar as adversidades da vida, no entanto, um

conselho de outrem com mais experiência de vida contribui para o desenvolvimento das nossas pró-

prias capacidades. Só assim, pensando por nós próprios e com o apoio de quem nos ama e nos quer

bem, seremos capazes de crescer interiormente e alcançar a felicidade autêntica, pois estaremos ap-

tos para encontrar o sentido da vida.

Vanessa Ramos, 11ºA, 2011/12

Página 6 Amor à Sabedoria

BREVES REFERÊNCIAS BIOBIBLIOGRÁFICAS

Filósofo alemão, natural de Königsberg (então capital da Prússia Ori-

ental, hoje Kaliningrado, na Rússia), nasceu em 1724 e faleceu em

1804. Um dos pensadores mais influentes da modernidade, notabili-

zou-se, entre outros, pelas suas três Críticas à Razão; […]

Atento aos recentes êxitos da física que, com os trabalhos de New-

ton, se conseguira afirmar como uma disciplina dotada de um grau

de cientificidade próximo do da matemática e da lógica, Kant procu-

rou conferir à filosofia uma dignidade semelhante, restaurando-lhe a

credibilidade, pela superação das posições antitéticas do dogmatismo

racionalista e do empirismo cético através de uma investigação críti-

ca dos métodos da metafísica, entendida como ciência unificadora da multiplicidade empírica.

[mais detalhes, consultar: http://www.infopedia.pt/$immanuel-kant]

Entre as obras do período crítico é de salientar:

- Kritik der reinen Vernunft (Crítica da Razão Pura), 1781 e 1787 (2.ª ed.).

- Prolegomena zu einer jeden künftigen Metaphysik, die als Wissenschaft wird auftreten können (Prolegómenos a Toda a Metafísica Futura que Possa Apresentar-se como Ciência), 1783.

- Kritik der praktischen Vernunft (Crítica da Razão Prática), 1788.

- Kritik der Urteilskraft (Crítica da Faculdade de Julgar), 1790.

- Zum ewigen Frieden (Para a paz perpétua), 1795.

- Die Metaphysik der Sitten/Rechtslehre/Tugendlehre (A Metafísica dos Costumes/Doutrina do

Direito/Doutrina das Virtudes), 1797.

Defendo que o homem deve ser autónomo, corajoso e ter vontade de querer algo mais do que o

imediato, que o homem deve tomar iniciativa e nunca ficar indiferente perante as coisas e as situa-

ções. Tudo o que for submetido à razão, apresenta-se como aceitável, digno, verdadeiramente hu-

mano. A aplicação do imperativo categórico Kantiano assim o exige: “Age de tal modo que queiras

que a tua máxima seja universalizável”.

Maria Isabel Marques Rodrigues,11ºA, 2011/12

Amor à Sabedoria Página 7

A «Alegoria da Caverna» fala sobre

prisioneiros que vivem agrilhoados

por correntes numa caverna, desde o

nascimento. Desde que nasceram passam a

sua vida a olhar a parede do fundo, que é ilu-

minada pela luz de uma fogueira. Nessa pare-

de são projetadas sombras de estátuas repre-

sentando pessoas, animais, plantas e objetos,

mostrando cenas e situações do dia-a-dia. Os

prisioneiros sem nada mais para fazer atribu-

em nomes às imagens, às sombras, analisando

e julgando as situações sem qualquer questio-

namento crítico: acreditam que a Verdade

corresponde às suas crenças.

Mas um dia, um dos prisioneiros foi forçado

a libertar-se das correntes, entrando, assim,

em contato com outras realidades. Nele deu-

se a tomada de consciência da falibilidade das

crenças até aí acolhidas e a constatação da

visão distorcida da realidade em nome de inú-

meras falsas verdades.

Ao sair da caverna e entrar em contato com

o mundo real a sua mente fechada, numa vi-

são rígida, inflexível e superficial da vida sen-

tiu a dor de quem constata o próprio erro. As

possibilidades revelaram-se gradualmente

fascinantes e a vontade firme de ver para

além dos velhos hábitos levou o prisioneiro a

abrir espaço para a dúvida, para a percepção

de perplexidades e as certezas passaram a ser

encaradas como imagens desfocadas de uma

realidade ainda desconhecida. De etapa em

etapa, os preconceitos enfraqueceram na jus-

ta proporção em que o espírito crítico se for-

taleceu. Mudou a imagem de si próprio e mu-

dou a imagem da vida. Conquista após con-

quista saiu dos velhos dogmas e descobriu

novos valores: saiu da caverna, isto é, re-

estruturou a sua maneira de pensar e desco-

briu novas capacidades em si.

Quando se viu fora da caverna, não conse-

guiu deixar de pensar nos companheiros dos

velhos tempos, presos na própria ignorância,

e decidiu auxiliá-los. Voltou! Voltou e o ines-

perado poderia ter mutilado os seus sonhos:

quando se dispunha a levar a luz do conheci-

mento até à escuridão mental dos que conti-

nuavam sem outros sonhos que as sombras

que tomavam como realidade, foi ridiculariza-

do. Chamaram-no de louco, ameaçaram-no de

morte. Mas … a conquista do discernimento

sobre as suas próprias fragilidades, tornou-o

forte em relação às críticas do mundo.

Com esta alegoria, Platão afirmou que, nós,

seres humanos, temos uma visão distorcida

da realidade: vemos e acreditamos apenas em

imagens criadas pela cultura, conceitos e in-

formações que recebemos durante a vida. A

caverna simboliza a ignorância, a prisão de

quem não exercita a sua capacidade de pen-

sar e vive adormecido, guiando-se pelas ideias

À LUZ DA ‘ALEGORIA DA CAVERNA’…

Um

a vida n

ão exam

inad

a não

merece

ser vivida'. SÒ

CR

ATES

Página 8 Amor à Sabedoria

das maiorias. Quantos exemplos poderíamos

enumerar? Muitos! É fácil de identificar o toxico-

dependente, o alcoólico, como exemplos daque-

les que se colocam sob a ditadura da irracionali-

dade. A sua compreensão da vida reflete o ape-

go inquestionado a uma influência que não con-

trolam. Mas o avarento, o ciumento, o maledi-

cente que apenas valoriza o mal à sua volta, são

outros de muitos mais exemplos de prisioneiros

que preferem a ilusão, as algemas, à liberdade.

Cegos que não identificam a própria cegueira,

nos quais a ilusão da autonomia mascara a de-

pendência: o pensamento crítico recusa exami-

nar-se a si próprio.

Seremos nós verdadeiramente autónomos,

abertos à auto – análise, ao autoconhecimento e

à consequente transformação das próprias fragi-

lidades escondidas? Examinamos a vida com o

olhar lúcido que não se contenta com a ilusão

ou acreditamos que a ilusão é só propriedade

dos outros?

Maria Zita Fiqueli de Abreu, 10ºB, 2012/13

Curta metragem animada sobre o texto de Platão.- "The Cave: An Adaptation of Plato’s Allegory in Clay"

(http://www.youtube.com/watch?v=LUrJirK5TwI)

“Quando nasci, os problemas que me ocuparam já estavam problematizáveis e a vida seguia o seu curso. Então meti-me nele e fui andando com os outros. Mas houve um momento em que chamei a mim esses problemas para lhes aceitar ou recusar a solução alheia. E nesse momento eu nasci realmente e fui único no mundo.”

Vergílio Ferreira, Pensar, pág. 312

A CAMINHADA ASCENDENTE

Amor à Sabedoria Página 9

P latão, a nossa caverna não é mui-

to diferente da tua. Continuamos

a pensar que sabemos tudo, não

conseguimos muitas vezes nos aperceber

de que erramos e quando nos apercebe-

mos, por vezes, mantemo-nos em silêncio

(se calhar pela vergonha ou até mesmo por

não nos apercebermos o quanto ignoran-

tes somos).

Hoje em dia, as pessoas só se importam

com o dinheiro, com os bens e com a saú-

de. São gananciosas e não se importam

com os outros. Mas, como é claro, algumas

pessoas ainda são «boas» e ajudam os

mais necessitados e cuidam das crianças

abandonadas. Infelizmente, com o passar

do tempo, essas pessoas estão desapare-

cendo.

Alguns de nós vivem em boas casas,

conduzem bons carros… resumindo têm

uma boa vida. Mas terão o mais importan-

te: o amor? Há pessoas que vivem com

pouco, mas vivem felizes com a sua família.

Irá haver sempre algo que nos impede

de sermos felizes: por alguma doença ou

por sentirmos falta de alguém. O ser huma-

no nunca está completamente feliz. Quan-

do quer algo e o consegue, apercebe-se

que falta outra coisa e volta a se sentir in-

feliz. Nunca nos sentiremos completamen-

te livres, pois há sempre coisas que nos

prendem: a nossa vida, os outros, as leis,

os deveres, enfim, a lista não tem fim.

Na nossa caverna atual o que vemos

mais é o desemprego e a pobreza. Já não

há quase nada que nos alegre. De madru-

gada até ao pôr-do-sol as pessoas só falam

e repetem as coisas tristes e más.

O ser humano só se importa com o di-

nheiro e o sucesso material.

Meu amigo do passado, a Alegoria da

Caverna irá continuar o seu caminho. Nós

somos prisioneiros da ignorância e o que

nos torna ainda mais ignorantes é não ad-

mitirmos que não sabemos.

Susana Soares, 10.ºD, 2011/12

E-MAIL ENTRE CAVERNAS

UMA OUTRA IMAGEM DA CAVERNA O FILME MATRIX

1 - Matrix - o que é?

Com o evoluir da tecnologia o homem deixou de conseguir viver

sem as máquinas. Para se deslocar, por exemplo, precisa do carro,

para comunicar precisa do telefone. Com a evolução tecnológica

as máquinas passaram a dominar o Homem. Resumindo, a matrix

é um software inventado pelas máquinas que passou a dominar o

Homem.

http://www.youtube.com/watch?v=Kowrcja_1lg

Página 10 Amor à Sabedoria

2 - Inteligência artificial versus Inteligência humana

A inteligência artificial é tudo o que o nome indica, ou seja, é um ramo da ciência de computação

que tem como objetivo criar dispositivos que simulem a capacidade de raciocínio humano. O objeti-

vo é criar máquinas capazes de aprender mais depressa que os humanos e de forma mais eficiente,

assim como seguir rotinas pré-programadas não esquecendo a fácil adaptação a qualquer meio.

Por outro lado temos a inteligência humana, ou seja, a inteligência humana não significa apenas

uma representação de alguma atividade humana ou a capacidade de executá-la É um conceito am-

plo e diverso que abrange não apenas a mente humana, mais toda a estrutura corporal e cognitiva

do ser humano. De uma forma bem simples e rápida, inteligência é um conjunto de sub-inteligências

que é dividido de acordo com cada tipo de atividade humana. O conjunto dos nove tipos de sub-

inteligência: a sub-inteligência espacial; a sub-inteligência linguística; a sub-inteligência musical; a

sub-inteligência lógica-matemática; a sub-inteligência corporal; a sub-inteligência intrapessoal; a sub

-inteligência interpessoal; a sub-inteligência existencial; a sub-inteligência naturalista forma o con-

ceito de inteligência humana e estabelece a sua grande amplitude que abrange, além da mente e da

cognição, a capacidade motora, o físico, as emoções e as relações humanas.

3 - O que é o real, irreal e o virtual?

Realidade significa em uso comum "tudo o que existe". No seu sentido mais livre, o termo inclui

tudo o que é, seja ou não percetível, acessível ou entendido pela ciência, filosofia ou qualquer outro

sistema de análise.

O predicado “é irreal” significa “carece de realidade” ou, simplesmente, “não é real”. Mas dizer

que algo é irreal é o mesmo que dizer que há algo que é irreal; mas se há algo, não pode ser irreal,

mas real. Esta dificuldade, contudo, não é grave: por um lado, pode alegar-se que há um modo de

usar o predicado “é irreal”, que consiste em aplicá-lo ao sujeito “não ser” (ou o não ser, ou o nada,

ou simplesmente um não ser).

Com o desenvolvimento das comunicações computadorizadas em rede, se popularizaram os ter-

mos "virtual" e "virtualidade". Popularmente, chama-se "virtual" tudo aquilo que diz respeito às co-

municações via Internet. Nesse sentido, a Wikipedia poderia ser chamada uma "enciclopédia virtu-

al", embora essa aceção da palavra seja imprópria porque "virtual" implica o conceito de uma simu-

lação, o que nem sempre é verdade. Em muitos casos de expressões como "amigo virtual" ou

"universidade virtual" o adjetivo "remoto" ou "à distância" se encaixaria com mais propriedade.

4 - Ciência, poderes e riscos.

A ciência é fundamental na oferta de bens e descobertas necessárias para o desenvolvimento do

país e para vários setores industriais (desenvolvimento de técnicas, desenvolvimento da medicina,

desenvolvimento de novos meios de comunicação e divertimento), sobretudo raciona projetos que

contribuem para uma melhor qualidade de vida.

Em contrapartida, apresenta risco na medida em que a ciência pode ultrapassar o ser humano. Se

isto acontecer, a vida humana está em perigo, pois, a ciência apesar de ser desenvolvida e pensada

pelo homem, pode em consequência, escapar ao aos limites e virar-se contra o homem.

Amor à Sabedoria Página 11

É necessário estabelecer objetivos, para que possamos usufruir da ciência e da tecnologia, sem

romper com princípios e valores humanos, e para que possamos retirar mais vantagens que desvan-

tagens.

Outra desvantagem é a dependência científica do ser humano. Cada vez mais, a ciência e a tecnolo-

gia substituem as capacidades do homem fazendo com que este se desvalorize quando comparado

com uma máquina (que produz mais e em maior quantidade) o que contribui para o desemprego em

todas as atividades, desde a indústria à agricultura.

A ciência é o estudo rigoroso da natureza de acordo com um método científico estabelecido, já a

técnica é a aplicação do conhecimento científico para conseguir um resultado prático. Podemos e

devemos desenvolver científica e tecnologicamente, mas com limites.

Turma 11.º B, 2011/12

O s agentes da Matrix, programas que

têm a aparência de seres humanos,

“criaram” uma sociedade totalmen-

te manipulada, moldada para que fôssemos

todos iguais mas divididos em categorias. Era

um mundo em que todos funcionariam perfei-

tamente, e tudo fosse esquematizado de ma-

neira que todos fôssemos simplesmente mol-

dados de acordo com o sistema que era im-

posto. Mas havia algumas “pessoas” que esta-

vam cientes das ações que os agentes toma-

vam e tentaram detê-los com a ajuda do esco-

lhido.

Morpheus identifica Neo como sendo a pes-

soa dentro da Matrix a quem ele acredita ser o

escolhido, aquele que se espera que derrote

os Agentes da Matrix.

Neo duvidava inicialmente de ser o

“escolhido” mas Morpheus levou-o a conhecer

a Oráculo, que lhe dissera que ele era o esco-

lhido. Oráculo também lhe disse que as esco-

lhas que fazemos agora já foram pré-

designadas por nós, mas isso só faz sentido

com a reencarnação. Antes de reencarnar co-

nhecemos uma parte do nosso destino, já es-

colhemos certas provas pelas quais iríamos

passar, porém ao nascer esquecemos isso…

Mais tarde, ao fazer certas escolhas, não te-

mos consciência que já as tomámos antes de

reencarnar, mas o nosso destino já tinha sido

pré-conhecido por nós, assim faz sentido: “a

nossa escolha é a repetição das nossas esco-

lhas” como a própria Oráculo dissera. Antes

escolhemos, depois reencarnamos e vamos

passar pelas provas que escolhemos, vamos

vivê-las.

Também é-nos mostrado que a força da

mente é maior que a do corpo e sem a mente

o corpo não é nada, o ser humano não conse-

gue viver. Isso é-nos mostrado quando os per-

sonagens estavam ligadas à Matrix: elas não

estavam lá fisicamente, no entanto o corpo

físico delas (no mundo real) reagia aos estímu-

los. Se na Matrix eles fossem feridos ou mor-

ressem, no mundo real o corpo físico deles

sofria as danificações que tinham ocorrido na

Matrix.

No meio de tudo isto, no grupo aparente-

mente forte, unido para destruir os Agentes

da Matrix, surgiu um traidor o Cypher. Ele es-

tava cansado de viver na realidade; a comida

era péssima; o ambiente pouco atraente; não

havia aquele prazer ilusório da Matrix mas ele

queria voltar a viver na Matrix, comer aquela

comida saborosa (mesmo que ilusória); ter

acesso a todos os prazeres. A ilusão era mais

saborosa que a realidade, por isso ele queria

MATRIX COMO PRISÃO

Página 12 Amor à Sabedoria

esquecer tudo e voltar a viver na Matrix:

“ignorância é felicidade”, dizia. Muitas pessoas

fazem o mesmo, não querem aceitar certas

verdades por serem dolorosas demais, prefe-

rem viver felizes na ilusão, mas com menos

preocupações.

No filme há uma parte em que é-nos mostra-

da em câmara lenta para mostrar que as capa-

cidades dos robots são superiores às nossas.

Tornando-nos prisioneiros das máquinas, das

nossas próprias criações e consecutivamente

da Matrix, uma criação dos robots que nós

próprios construímos. Os robots conseguiram

“ultrapassar-nos” em tudo, ou quase tudo…

Esqueceram-se do poder dos sentimentos. O

beijo que a Trinity deu ao Neo mostrou-nos

que o amor é poderoso. Fez com que Neo

“ressuscitasse” e conseguisse derrotar os

Agentes da Matrix, demonstrando assim que

ele era o escolhido.

Andreia Rodrigues, 11ºB, 2012/13

O tempo transcorreu ao longo dos séculos e ao atendermos ao Homem de hoje, aper-

cebemo-nos que, apesar do progresso realizado, muito há a fazer no que diz respeito

às relações humanas.

A sede de conhecimento nas diferentes áreas do saber é imensa, mas devido às ilusões, vícios e

a uma visão distorcida acerca das coisas, o pensamento prende-se e não consegue ser live, impor-

ta-se mais com o supérfluo e o desnecessário e em obter prazeres fugazes do que com a Verdade.

Quando olho em volta dou-me de conta que as pessoas realmente só se importam com a apa-

rência, se veio bem vestida, se está bem apresentada e até mesmo se tem uma “boa figura”. Esta

maneira de ver as coisas pode ser considerada uma “doença” social. Um mendigo que está na rua

é olhado de parte, devido ao seu aspecto e pelo que ele representa. Mas quem nos diz que, real-

mente, ele não é uma pessoa culta e inteligente? Não bastam a postura ereta, o ser bípede ou po-

legar oponível para ser Humano. Basta para isso verificarmos que, às vezes, os homens têm com-

portamentos piores que os animais. Muitas das vezes esquecemo-nos que magoamos os outros e

ultrapassamo-los para podermos atingir os nossos objectivos .

Outro dos grandes problemas deste século é o consumismo versus o desperdício. Quanto mais

coisas de marca e de qualidade possuo, melhor é a impressão que poderei causar nos outros. Con-

funde-se o ser com o ter. Muitas vezes desperdiçamos sem nos importarmos com aqueles que

morrem à fome, não tendo consciência das necessidades dos outros. É ser egoísta e, ainda assim,

não fazer um esforço para mudar. Somos desumanos, “frios” e ignorantes! Este estado de coisas é

sinal de CEGUEIRA.

Cegos que somos, rapidamente entramos na maledicência não nos apercebendo que, em 1º

lugar, temos que olhar para nós para, então, avaliar os outros.

Estas são as nossas ilusões: a descriminação, a lei do mais “forte”, a valorização da aparência, o

poder do dinheiro, o não pararmos para pensar, a quantidade de objectos de que necessitamos

para organizar o nosso dia a dia, o desperdício, o egoísmo.

Diogo Gomes, 10ºD, 2012/13

EVOLUÍMOS?

Amor à Sabedoria Página 13

N a minha opinião, é a situação que

o define. Existem certamente

mais momentos nos quais o ego-

ísmo se sobrepõe ao altruísmo, pois o Homem

é movido, direta ou indiretamente, por inten-

ções egoístas como o desejo de reconheci-

mento público, o prazer da satisfação pessoal

ou, mesmo, com esperança de recompensa

divina.

Imagine-se um homem que faz um elevado

donativo monetário a uma instituição de cari-

dade e que, consequentemente, é alvo de um

grande reconhecimento e admiração por par-

te da sociedade. O que carece de análise nes-

ta situação é confirmar se, de facto, esta ação

se baseia em princípios altruístas e desinteres-

sados ou se, pelo contrário, a ação e os seus

efeitos foram premeditados. Ou seja, a dificul-

dade da análise encontra-se em descobrir se o

reconhecimento público foi um efeito preten-

dido e previsto da ação ou se se trata de uma

consequência não calculada.

Ao afirmar que há sempre um fim egoísta

entre os efeitos pretendidos de qualquer ação

praticada pelo Homem, podemos contra-

argumentar dizendo que, por vezes, o ser hu-

mano ajuda desinteressadamente mesmo

aqueles que não conhece. Por exemplo, quan-

do alguém doa dinheiro a uma associação de

solidariedade, pode perfeitamente estar a

fazê-lo apenas para ajudar e não pretenden-

do, com o seu gesto, ser admirado ou elogia-

do.

Ainda que se assevere que “A “piedade”

consiste em imaginar ou fantasiar as nossas

próprias calamidades futuras, partindo da

consciência das calamidades de outrem.”,1

não considero que as ações sejam sempre

movidas por fins egoístas. O texto afirma que

sentimos mais piedade duma pessoa boa do

que duma pessoa má, visto que, intrinseca-

mente, nos identificamos melhor com pessoas

boas, achando-nos igualmente bondosos.

Ora, na maioria das vezes, ao fazermos do-

ações de dinheiro, não temos a menor ideia

do destinatário do nosso dinheiro. Não sabe-

mos se as pessoas a quem entregamos o nos-

so dinheiro e boa vontade são de facto consci-

entes e responsáveis pelo seu destino, ou se-

ja, ajudamos sem saber, apenas movidos pela

vontade de ajudar os outros. Contrariamente,

há pessoas que fazem doações só para obter

“Durante uma viagem, Abraham Lincoln discutia com um amigo sobre as motivações do comporta-mento humano e defendia a ideia de termos uma natural inclinação para sermos egoístas mesmo quando fazemos bem aos outros. O seu amigo discordava.

A certa altura a carruagem em que viajavam passou por uma ponte e viram uma porca cujos lei-tões estavam prestes a afogar-se. A porca fazia um barulho terrível.

Lincoln ordenou ao cocheiro que parasse, saiu e correndo para a água, retirou os leitões do lodo e colocou-os em segurança na margem do rio. Quando regressou o seu amigo perguntou: «Então Abe, o que tem este episódio a ver com a tua ideia de que somos todos egoístas? Lincoln retorquiu: «Deus te abençoe Ed, isto foi a própria essência do egoísmo. Ficaria com a consciência pesada todo o dia se tivesse ignorado o sofrimento da porca. Fiz o que viste para ficar bem comigo próprio, não percebes?»

In Filosofia-10º ano, Luís Rodrigues - Plátano Editora,p.212

SEREMOS TODOS EGOÍSTAS DISSIMULADOS?

1 - RACHELS, James, Elementos de Filosofia Moral, 2004. Lisboa: Gradiva, pp. 98-109

CO

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ITE À R

EFLEXÃ

O...

Página 14 Amor à Sabedoria

reconhecimento público ou pelo prazer pessoal, isto é, ajudam só com o objetivo de se sentir bem

e que, pelo facto de ajudarem, são “melhores” pessoas, podendo sustentar-se e contribuir tam-

bém para o sustento de outrem.

Adicionalmente, a amizade é outro exemplo. Quando temos amizade ou amor por outra pessoa

(até porque o Homem só se define na relação com o Outro) , tentamos sempre zelar pelo bem

dessa pessoa. O motivo que nos move em busca da felicidade do Outro é puramente altruísta.

Ainda assim, há quem ajude os seus amigos apenas com o intuito de não perder a sua amizade.

Nessa situação , apesar da boa ação realizada, os princípios que os demovem é o egoísmo. Esta

amizade, ainda que aparentemente verdadeira, não é senão uma amizade falsa.

A amizade verdadeira é repleta de ações genuínas

e sem premeditação de resultados. Por exemplo,

quando uma pessoa dá dinheiro a um amigo seu

com necessidades sem exigir devolução, a sua ação

só pode ser considerada altruísta se for praticada

com a intenção de ajudar o amigo e não baseada no

receio de perder a sua amizade.

Por tudo isto, o Homem não se pode definir verda-

deiramente como altruísta nem verdadeiramente

como egoísta.

Michael, 10º A, 2012/13

“ O comportamento egoísta é o com-

portamento que ignora os interes-

ses dos outros em circunstâncias

nas quais não deviam ser ignorados.” E, as-

sim sendo penso que todos têm uma porção

de egoísmo à mistura com tantas outras ca-

racterísticas que formam a personalidade

das pessoas. Se analisarmos bem, no nosso

caso, em que somos maioritariamente cris-

tãos, e crescemos com influência dessa mes-

ma religião (que adotamos ou que nos foi

“impingida”), fomos educados de maneira a

sermos egoístas. Devemos fazer o bem, res-

peitar o próximo, ajudar os idosos e os mais

desfavorecidos, para quando chegar a nossa

hora termos um lugar reservado no céu ao

lado do “Todo-Poderoso”. Ou seja não faze-

mos o bem porque está certo fazer o bem e

porque alguém precisa que o façamos, mas

sim porque queremos reconhecimento divi-

no. Fazemos o bem com um prepósito, com

uma segunda intenção.

Recorrendo ao exemplo dos idosos e à opi-

nião de Thomas Hobbes sobre a caridade,

podemos tirar a conclusão que o homem é

caridoso, porque tem necessidade de provar

e mostrar aos outros que não é apenas capaz

de cuidar de si mesmo mas também de ou-

trem que não tem a mesma capacidade que

ele. Ou seja, está apenas a exibir-se e sente

Amor à Sabedoria Página 15

piedade (mais quando uma pessoa é boa do

que quando uma pessoa má se encontra a so-

frer), porque imagina que o mesmo lhe poderia

acontecer a si próprio. Mais uma vez cada um

de nós pensa ser boa pessoa e por essa mesma

razão sentimos piedade quando associamos o

sofrimento as nossas possíveis infelicidades

futuras.

O homem faz sempre o que mais deseja fazer

e o que o faz sentir melhor, embora por vezes

faça coisas que não queria fazer, mas que são

um meio necessário para atingir um fim deseja-

do, e quando age de maneira altruísta é para se

sentir bem consigo próprio e para ter reconhe-

cimento por parte da sociedade onde está inte-

grado.

Tal como considero todos os outros seres

humanos egoístas, mas não totalmente, consi-

dero-me a mim mesma também. Não total-

mente porquê? Porque todos têm como priori-

dade as suas próprias necessidades e desejos,

embora possam nutrir alguns sentimentos co-

mo a pena, ou piedade pelos mais desfavoreci-

dos. Se fôssemos totalmente egoístas, não iria-

mos sentir pena, nem nos iríamos importar,

mas se fôssemos completamente altruístas,

também não iríamos ter como prioridade as

nossas próprias necessidades e/ou desejos.

Acho até, que (por vezes) nem temos noção

de que somos egoístas e estamos completa-

mente convencidos que agimos unicamente

em prol do bem dos outros. Acho que o egoís-

mo é, também, consequência do tipo de socie-

dade que é a nossa, onde: a aparência, a opini-

ão alheia e o reconhecimento são fatores de

muito valor, havendo um género de competi-

ção, principalmente no que toca aos famosos

em relação a quem dá mais, ou quem é mais

solidário, sendo tudo uma questão de aparên-

cias e de se sentir bem consigo próprio. (Se

calhar uma maneira arranjada para redimir um

pouco o consumismo, ou os remorsos que isso

pode causar.) Caso contrário penso que não

haveria egoísmo e que seríamos todos total-

mente altruístas.

Carlota, 10º A, 2012/13

A pena de morte, também designada

por pena capital, é a sentença apli-

cada pelo poder judiciário, que

consiste em retirar legalmente a vida a uma

pessoa que cometeu, ou é suspeita de ter

cometido, um crime. Portugal foi um dos

primeiros países a abolir a pena de morte

na Lei da Reforma Penal em 1867.

Mas será a pena de morte, no caso de cri-

mes muito graves, uma forma de castigo

moralmente justificável?

Em Filosofia o exercício do pensamento crítico e da capacidade argumentativa, leva-nos a procurar

os fundamentos sobre o que é legítimo aceitar como racionalmente defensável.

Eu considero que, mesmo no caso de crimes muito graves, não deve ser aplicada a pena de morte.

Defendo que a pena de morte deve ser abolida pois vai contra a Declaração Universal dos Direitos

PENA DE MORTE: MORAL OU IMORAL?

Página 16 Amor à Sabedoria

Humanos, nomeadamente o artigo 3º que diz

que “Todo o indivíduo tem direito à vida, à

liberdade e à segurança pessoal” e o artigo 5º

que diz que “Ninguém será submetido a tor-

tura nem a penas ou tratamentos cruéis, de-

sumanos ou degradantes”. Esta Declaração

foi adotada pela Organização das Nações Uni-

das e é a base da luta universal contra a opres-

são e a discriminação. Defende a igualdade e a

dignidade das pessoas e reconhece que os

direitos humanos e as liberdades fundamen-

tais devem ser aplicados a cada cidadão do

planeta, por isso deve ser respeitada e nin-

guém deve violar a mesma. A defesa destes

princípios torna, no meu ponto de vista, ilegíti-

ma a aplicação de um castigo que recorrendo

à defesa que é ilegítimo matar, autoriza a mor-

te de um ser humano.

Contestam-nos referindo que uma pessoa

que cometeu crimes muito graves como o ho-

micídio, a violação ou o tráfico de pessoas me-

rece a morte dado a gravidade dos mesmos.

Defendem, tantas vezes que dever-se-ia pagar

na mesma moeda pelo crime cometido pois,

assim, aquele que for executado não comete-

rá mais crimes.

Defendo que os criminosos podem ser casti-

gados de maneiras menos cruéis, como a reali-

zação de serviço comunitário, a prisão perpé-

tua, as multas ou associando estas penas. De-

fendo que ninguém tem o direito de tirar a

vida a outra pessoa mesmo em casos extre-

mos e que a pena de morte é uma resposta

inapropriada e inaceitável que só serve para

criar vítimas e perpetuar a violência. Defendo

que a existência de castigos desencoraja a vio-

lação da lei, quer pela pessoa que é castigada,

quer pelas outras que sabem que o castigo

existe e que lhes será aplicado se violarem a

lei.

Defendo, ainda, a reabilitação, que consiste

em reeducar os criminosos e ajudá-los a per-

ceber que o que fizeram foi um crime, condu-

zindo-os ao arrependimento e a mudanças no

seu caráter, fazendo com que assim não vol-

tem a cometer crimes. Parece-me que defen-

der a pena de morte é defender a falta de

competências sociais para promover a reabili-

tação. Considero, ainda, urgente a educação

daqueles que constituem grupos de risco e em

relação aos quais a sociedade não pode alhear

-se da responsabilidade de criar condições que

promovam mudanças comportamentais.

Dizem-nos que as pessoas nem sempre se

conseguem reeducar e nem sempre chegam

ao arrependimento. Considero que não acre-

ditar na possibilidade da mudança, por muito

remota que, às vezes possa parecer, é não

acreditar na humanidade. Lembro-me, neste

momento, que nem sempre a aplicação da

pena de morte é na cadeira elétrica e, nem

sempre decorre de crimes de morte. Nos paí-

ses árabes, por exemplo, as mulheres são con-

denadas a apedrejamento até à morte quando

são acusadas de adultério.

Por fim, acredito que a pena de morte pode

levar à execução de pessoas inocentes, punin-

do a pessoa errada e os danos, nesse caso, são

irreparáveis, não podendo voltar atrás para

remediar o erro.

Concluindo, acho que não devia haver pena

de morte pois ela só cria vítimas e perpetua a

violência. Considero que, defender a pena de

morte é não acreditar na reabilitação e na

possibilidade de transformar a vida para me-

lhor, o que vai contra a Declaração Universal

dos Direitos Humanos. É um castigo cruel, de-

sumano e degradante que gera ódio, vingança

e injustiça e vai contra os direitos da vida. Nin-

guém tem o direito de tirar a vida a outra pes-

soa independentemente do crime cometido

ou do criminoso e pode haver pessoas inocen-

tes a serem executadas, não podendo voltar

atrás para remediar o erro.

Amor à Sabedoria Página 17

«Lapidação ou apedrejamento é uma forma de

execução de condenados à morte. Meio de execu-

ção muito antigo, consistente em que os assisten-

tes lancem pedras contra o réu, até matá-lo. Como

uma pessoa pode suportar golpes fortes sem per-

der a consciência, a lapidação pode produzir uma

morte muito lenta. (…)

SABIAS QUE…

PENA DE MORTE EM PORTUGAL

Até hoje essa pena ainda é praticada em alguns países muçulmanos. Apesar de o Corão não men-

cionar a lapidação como pena, a Lei islâmica aplicada em certos países justifica essa prática por rela-

tos da vida de Maomé.»

Wikipédia, Lapidação.

1852: Abolida para crimes políticos (artigo 16º do Ato Adicional à Carta Constitucional de 5 de Julho,

sancionado por D. Maria II).

1867: Abolida para crimes civis, exceto por traição durante a guerra, em julho em 1867 (Lei de 1 de

julho de 1867). A proposta partiu do ministro da Justiça Manuel Baptista, sendo submetida à discus-

são na Câmara dos Deputados, onde teve oposição do deputado Manuel Carvalho. Transitou depois

à Câmara dos Pares, onde foi aprovada. Mas a pena de morte continuava no Código de Justiça Mili-

tar. Em 1874, quando o soldado de infantaria nº 2, João Borda, assassinou o alferes Manuel Beirão,

levantou-se grande discussão sobre a pena a aplicar.

1911: Abolição para todos os crimes, incluindo os militares. 1916: Readmitida a pena de morte para traição em tempo de guerra.

1976: Abolição total.

http://pt.wikipedia.org/wiki/Pena_de_morte_em_Portugal

Página 18 Amor à Sabedoria

À VOLTA DA LINGUAGEM

E xistem dois tipos de linguagem: temos a linguagem humana e a linguagem animal. Estes

dois tipos de linguagem diferem em vários aspetos. Na linguagem animal, temos a presença

de uma linguagem inata porque não resulta de uma aprendizagem, enquanto que, na lin-

guagem humana, temos a presença de uma linguagem aprendida. Outro aspeto da linguagem ani-

mal é que é uma linguagem não verbal porque não tem a presença de variações sonoras, não dan-

do origem a palavras, enquanto que na linguagem humana existem variações sonoras, dando ori-

gem à diversidade de palavras. A linguagem animal é também uma linguagem concreta, ao passo

que a linguagem humana é uma linguagem simbólica na medida em que as palavras substituem os

objetos.

O homem tem uma dimensão da realidade diferente à dos outros seres. O homem passou o uni-

verso físico para um universo simbólico. Passou a ter crenças, a dar nome e valor aos objetos, a so-

breviver no seio de uma cultura que tem de seguir. A natureza do homem é muito mais evoluída do

que a dos outros seres.

As nossas emoções e sentimentos, os sonhos, as perguntas, os problemas e todas as experiências

que são vividas por cada ser só ganham sentido e significado através da linguagem. Daí podermos

concluir que a linguagem é a “ponte” entre o nosso pensamento e o mundo. Por conseguinte,

quanto maior for o número de palavras que tivermos, mais extenso será o nosso conhecimento

acerca do mundo e mais fácil será a expressão do nosso pensamento acerca das coisas.

A partir das premissas anteriores, a relação que o homem estabelece com a realidade passa a ser

indireta porque com a ajuda dos símbolos o homem não necessita de estar presente nos vários mo-

mentos da vida . Por exemplo, ele assim poderá falar do passado, das coisas ausentes e do que não

é imediatamente acessível.

A relação também pode ser mediata, quando há um elo mediador entre o homem e a realidade.

Com isto conseguimos representar coisas e acontecimento passados ou até mesmo proceder a

comparações entre coisas diferentes e distantes no tempo e no espaço.

Finalmente, a relação também pode ser racional porque podemos pensar/questionar/criticar as

nossas experiências expressando-as oralmente, escrita ou gestualmente. Agora percebo o encadea-

mento entre conceitos, juízos, raciocínios, teorias, sistemas e paradigmas.

Turma 11.º E, 2012/13

FILOSO

FIA N

A EB

SPM

A

Amor à Sabedoria Página 19

C apacidade argumentativa, é a capaci-

dade que o ser humano tem para ar-

gumentar, ou seja, ter arte de con-

vencer e capacidade de persuadir, usando ar-

gumentos fortes, mesmo que não sejam ne-

cessariamente verdadeiros. O objetivo é con-

vencer e fazer com que os outros acreditem

no que estamos a dizer sem deixar margem

para qualquer dúvida. O importante é ter uma

argumentação válida.

Nem toda a gente tem a mesma capacidade

argumentativa, uns têm mais facilidade que

outros. No caso dos políticos e empresários, a

argumentação é fundamental, pois é a chave

do sucesso. Um bom orador visa a manipula-

ção e através dela consegue apelar às emo-

ções do seu auditório. Tudo aquilo que é dito

tem de funcionar praticamente como uma lei.

Quem não tem arte de argumentar e se dei-

xa afetar facilmente pelas emoções, perde a

capacidade para contra-argumentar, perden-

do, desse modo, a causa. É caso para dizer

que, nesta situação, a emoção supera a razão.

Argumentos fortes nem sempre procuram a

razão, mas sim a validação das suas teses.

Nem sempre há argumentos suficientes para

assegurar uma causa, contudo, a palavra final

é sempre nossa, o último argumento é decisi-

vo e tem de ser o mais válido possível para

poder “matar” o assunto. A argumentação

acompanhar-nos-á ao longo da nossa vida,

pois ela é tudo. Essencial à comunicação, cha-

ve de todo o entendimento, organização e

clarificação de ideias. Argumentação passa

por apresentar provas, mas nunca nos fiando

nelas, é preciso ter cartas na manga para usar

na altura certa, porque a verdade de hoje po-

de ser a mentira de amanhã.

Linda Margarida J. Sousa,

Turma EFA ST6, 2012/13

As nossas crenças mais justificadas não têm qualquer outra garantia sobre a qual assentar,

senão um convite permanente ao mundo inteiro para provar que carecem de fundamento.

John Stuart Mill

O QUE É ARGUMENTAR?

Página 20 Amor à Sabedoria

A filosofia, a democracia e a retórica são

três conceitos dependentes.

A filosofia é o amor à sabedoria através da

procura crítica, reflexiva e aprofundada da

verdade. A democracia desde sempre esteve

dependente da reflexão, pois a ponderação

dos prós e contras na tomada de uma decisão

importante deve ter por base um debate, uma

argumentação que permita a discussão de

ideias para que se chegue à melhor solução

para a “polis”, a cidade. Por outro lado, a retó-

rica, segundo Aristóteles, correspondia à arte

de discursar em público, fundamental na par-

ticipação dos cidadãos na vida democrática,

ainda mais por esta ser

direta, pois, só assim po-

deriam proceder à proble-

matização, esclareci-

mento e resolução de as-

suntos da “polis”.

Após a análise da temá-

tica “Filosofia, Retórica e Democracia”, aper-

cebi-me de que há diferenças notáveis no uso

da palavra se compararmos a democracia gre-

ga com a atual, bem como a conceção dos

filósofos e sofistas quanto ao uso da retórica.

Com isto, considero pertinente formular o

seguinte problema: “Afinal o que é fundamen-

tal no uso da palavra na democracia antiga e

atual?” A minha posição assenta numa pers-

petiva próxima da defendida pela filosofia,

isto é, a palavra deve ser usada na procura da

verdade, ou o mais próximo desta, daquilo

que possa ser verosímil.

A vida é uma realidade percetível e concre-

ta. Qualquer verdade pertence a uma realida-

de percetível e concreta. Logo, a vida é uma

verdade inquestionável. A questão é o que é

que na vida corresponde à verdade? A respos-

ta pode parecer demasiadamente complexa,

relativa ou abstrata mas, talvez seja porque

usufruímos de um longo percurso de vida para

a encontrar. Penso que essa verdade não é

relativa a diferentes povos, etnias ou culturas;

acredito que essa verdade seja comum, pois a

nossa natureza humana, independentemente

da forma como a manifestamos, é também

comum a todos os seres humanos. Com isto,

pretendo demonstrar que existem vários per-

cursos a tomar que, livremente, os seres hu-

manos escolhem, quer no que diz respeito às

grandes decisões da vida, quer no uso da sua

palavra.

Existem os que optam

por manipular e persuadir

e os que optam por um

discurso dialógico e

pelo espírito crítico de

forma a procurar a verda-

de. Mas, se todo o ho-

mem procura a verdade, fará sentido enganar

os outros com a própria ignorância? Clara-

mente que não! É profundamente irracional

pensar de tal maneira! No entanto, pergunta-

mo-nos por que razão há tanta irracionalidade

desde os mass media até à política? Por que

razão é que se privam de um bom discurso

argumentativo e se rendem às técnicas de

persuasão, como a retórica? Uma resposta

possível é porque é mais cómodo e aparente-

mente mais vantajoso manipular os outros,

dominá-los, o que aparenta representar poder

e riqueza, tudo o que realmente parece inte-

ressar ao homem. Este tipo de raciocínio fala-

cioso, muito frequente nos nossos dias, decor-

rente de atitudes egocêntricas e insensatas,

está a conduzir-nos a um declínio total dos

sistemas democráticos, quer por falta da raci-

onalidade, quer por falta de intervenção dire-

FILOSOFIA, RETÓRICA E DEMOCRACIA

“(…) se todo o homem

procura a verdade, fará

sentido enganar os outros

com a própria ignorância? “

FILOSO

FIA N

A EB

SPM

A

Amor à Sabedoria Página 21

ta dos cidadãos na vida política. Todos os defensores das estratégias persuasivas e manipuladoras

que se enganem, pois são eles próprios a grande personagem que tanto iludem com a própria igno-

rância e o caminho da ignorância que seguem é o caminho da mentira. Por isso, jamais poderão

atingir a verdade. Ainda que contra-argumentem que a retórica é capaz de superar a ciência, sabe-

mos que sim, mas só nas condições de um auditório ignorante que adere à excelente máscara que

lhe apresenta, persuadindo-se por tal ilusão. Mas, por outro lado, se se tratar de um auditório escla-

recido capaz de questionar a essência da palavra de tal retor, este encontrar-se-á numa situação

constrangedora a que a sua palavra não tem respostas.

A democracia exige uma genuína discussão pública de ideias. Isso só será possível se formos alta-

mente imparciais, nos livrarmos das nossas convicções ilusórias e analisarmos todas as ideias, por

mais insignificantes que nos pareçam na sua estrutura racional. O debate público, honesto na procu-

ra de soluções, é o que sustenta uma democracia porque aceitamos o pressuposto de que ninguém

é dono da verdade. Por outro lado, servir-se deste debate como forma de manipulação é o que de

mais insensato pode existir. Debater ideias publicamente é procurar a verdade com boa vontade,

sinceridade e honestidade inteletual.

A retórica reaparece na atualidade e tem como vantagens o facto de permitir que as pessoas

aprendam a pensar por si próprias, a desenvolverem o espírito crítico. Esta deve ser a sua finalidade

e nunca a manipulação. No entanto, verificamos que esta idealização da retórica na atualidade não

corresponde à realidade já que, muitos cidadãos desconhecem muitos dos seus direitos e deveres

como cidadãos, mantendo uma participação muito pouco ativa na vida da cidadania, outras mani-

festam-se pouco interessadas e acham mesmo que é um assunto alheio que não lhes diz respeito,

embora não se esqueçam de reclamar o estado decadente da política do país. Como vivemos sob

um período de crise, penso que o interesse pela vida política aumentará na generalidade das pesso-

as, porque veem em risco a sua vida privada. Lamentável é que só nos apercebamos de que é ne-

cessário mudar e de que mudar é importante, para a vida de cada um, só quando nos encontramos

em situação extremas.

Termino com um apelo à participação dos cidadãos na tomada de importantes decisões para a sua

“polis” e para a revalorização do discurso político. Só assim poderemos caminhar para a verdade,

com a contribuição de todos e a participação de cada um!

Bibliografia:

http://criticanarede.com//fimdapolitica.html, “O Fim da Política”, Desidério Murcho;

Manual de Filosofia: ABRUNHOSA, Maria António e Miguel Leitão, Um Outro Olhar Sobre o Mundo

(vol.1), Edições ASA, 1ª edição 2008.

Lúcia Abreu, nº23, 11ºA, 2011/12

Página 22 Amor à Sabedoria

O s Himba são uma tribo do século

XXI, que conserva as caraterísticas

dos povos primitivos.

O tempo parece ter parado na constante

rotina em Oupwo, no Sul de África, na Namí-

bia, onde as temperaturas oscilam entre os

de 40 graus de dia e os 12 graus à noite.

Para suportarem os dias, os Himba aplicam

em todo o corpo e nos cabelos uma banha

de boi com argila

vermelha em pó,

num ritual que de-

mora três horas.

Diariamente o resul-

tado é fantástico

e aquela cor verme-

lha da argila parece

ser a cor natural da

pele. Os Himba são

conhecidos como ‘o

Povo Vermelho’.

De tradições culturais ancestrais, apesar

de viverem perto do Parque Natural de

Etosha, e tendo contacto com as visitas de

turistas, mantém a sua forma de vida, fecha-

dos a qualquer inovação, a outros conheci-

mentos, a outros valores. O roubo de uma

vaca, de um boi, de um bode, de uma cabra

ou somente da carne, é considerado um dos

crimes mais graves na comunidade. Aquele

que o praticar pode vir a ser condenado à

morte por asfixia. Adeptos da pena de mor-

te são contra o uso de facas para matar seja

o que for – os próprios animais são mortos

por asfixia.

Fechados nos seus próprios padrões cultu-

rais, orientam-se por critérios de discrimina-

ção sexual: a mulher é considerada inferior

ao homem. Às mu-

lheres, por um lado,

estão vedadas mui-

tas práticas e, por

outro lado, são-lhe

exigidas as responsa-

bilidades que

sustentam a vida

comunitária. Às mu-

lheres não é permiti-

do o banho. Elas per-

fumam-se, mesmo

nas zonas mais ínti-

mas, com uma fumaça de um incenso feito

através de ervas – a água é escassa e esse

direito está reservado ao homem. Mas são

as mulheres que realizam todas as tarefas

domésticas, para além de irem buscar lenha

e água para toda a comunidade. Entre ou-

tras práticas é normal que para as mulheres

começarem a sua refeição - sempre a mes-

ma para toda a tribo, sejam homens ou mu-

lheres, constituída por uma papa de farinha

de milho com açúcar, água e/ ou leite; a car-

ne é cozinhada sem nenhum tempero e só é

comida em alguma ocasião especial apesar

de terem muito gado - têm de esperar que

todos os elementos masculinos da tribo aca-

bem de comer.

Vamos imaginar que nós somos levados a

O QUE SERÁ MORALMENTE ACEITÁVEL?

Ao contactarmos com tradições tão

diferentes da nossa, qual a atitude mais

correta a tomar? Será legítimo anular as

tradições culturais dos Himba à luz dos

nossos padrões valorativos? Será legítimo

evitar o contacto por nos considerarmos

superiores? Que atitude é moralmente

aceitável quando no mesmo espaço

geográfico convivem culturas tão

diferentes?

Amor à Sabedoria Página 23

ter que viver nesta cultura ou que alguns ele-

mentos desta cultura vêm viver para o aparta-

mento ao lado do nosso. Ao contactarmos com

tradições tão diferentes da nossa, qual a atitu-

de mais correta a tomar? Será legítimo anular

as tradições culturais dos Himba à luz dos nos-

sos padrões valorativos? Será legítimo evitar o

contacto por nos considerarmos superiores?

Que atitude é moralmente aceitável quando no

mesmo espaço geográfico convivem culturas

tão diferentes?

Nós, europeus, consideramo-nos civilizados

pois fazemos parte do mundo em que a ciência

permite-nos tanto ter acesso ao mundo mi-

croscópico, como ir à lua ou ir ao fundo do

mar. Será que com avanço tecnológico – cientí-

fico já conquistado é aceitável ao homem mo-

derno rejeitar outro ser humano por ele pensar

e compreender o mundo de forma diferente?

Justificar-se-á a atitude etnocêntrica?

Ao refletir sobre os direitos que devem assis-

tir a qualquer ser humano, concluímos que não

podemos observar as outras culturas em fun-

ção da nossa própria cultura, limitando, por

isso, o processo da aculturação à nossa manei-

ra de entender a vida. Impor tradições ou ser

submetido a tradições é uma atitude contrária

à defesa da dignidade humana.

Destacamos a desvalorização das mulheres

na tradição dos Himba, sendo dada ao homem

prioridade em várias rotinas do dia-a-dia. Con-

siderando que, racionalmente, não se justifica

o etnocentrismo, teremos que aceitar a opres-

são da mulher? Esqueceremos a sua dignida-

de?

Os relativistas culturais responderiam de ou-

tra forma relativamente às questões colocadas

inicialmente em relação à hipótese de irmos

viver na tribo dos Himba ou dos seus elemen-

tos virem partilhar o mesmo espaço geográfico

próximo. Eles considerariam que todas as prá-

ticas morais são aceitáveis, já que não existem

valores objetivos, válidos para todas as cultu-

ras. E, nesse contexto, tornariam legítima a

defesa da discriminação sexual, na medida em

que é a decisão inquestionável da tribo. Ques-

tionar os valores admitidos como moralmente

válidos por outra cultura é considerado falta de

tolerância.

Como solução racionalmente aceitável pro-

pomos o diálogo intercultural com base em

valores aceites por ambas as culturas. Conside-

ramos que só a procura de critérios trans-

subjetivos de valoração permite a base para o

entendimento entre diferentes realidades cul-

turais.

A vivência do contato com culturas diferentes

à nossa confronta-nos com o problema sobre o

que é racionalmente aceitável ou legítimo nes-

se contato. Deparamo-nos com as possibilida-

des etnocêntrica, relativista ou de diálogo a

partir de valores comuns e que possibilitam a

comunicação para além das diferenças cultu-

rais. Consideramos, ainda, que o intercultura-

lismo, a partilha das práticas culturais, a refle-

xão acerca das diferenças garante a defesa dos

Direitos Humanos.

Nélio Tiago, 10º G, 2012/13

Página 24 Amor à Sabedoria

“Hotel Ruanda” é um filme de 2004 baseado em acontecimentos

reais. Nele vemos um Ruanda (país africano) como cenário das

atrocidades vividas durante o genocídio ocorrido em meados dos

anos 90 do século passado. Em apenas 4 meses, os extremistas

Hutu que consideravam os Tutsi culpados pela morte do presiden-

te do país, mataram mais de um milhão de Tutsi (a quem chama-

vam “baratas”). Durante o conflito, Paul Rusesabagina, que per-

tencia à tribo Hutu, deixa os ideais da sua tribo para ouvir a sua

voz interior. Protege a família e os mais chegados, fazendo tudo o

que estava ao seu alcance (inclusive subornando os militares com

dinheiro, whisky e cerveja) para salvar a família e todos os amigos

que pediram refúgio na sua casa. Posteriormente acaba por

abrigá-los no hotel que geria, conseguindo assim evitar o geno-

cídio de um número considerável de Tutsis.

A partir da visualização desta narrativa podemos levantar uma questão filosófica muito perti-

nente. Podemo-nos questionar se, afinal, existem ou não limites para a tolerância?

Na minha opinião tudo, inclusive a tolerância, tem limites e a justificação que apresento é

bem simples… Na minha perspetiva “nem tudo vale”. Considero que não deverá haver tolerância

para com aqueles que assassinam inocentes, que comentem chacinas, violam mulheres e crian-

ças, traficam pessoas e órgãos humanos. Não devemos ser tolerantes, como é retratado no filme,

com terroristas que, em nome de sua religião, cultura ou partido político cometem crimes e ma-

tam, sem piedade, ou mutilam genitalmente as mulheres. Contra isso, contra todas estas atroci-

dades, valem os direitos humanos. A quem, ainda assim, cometer a ousadia de as violar deverão

ser aplicadas severamente as leis.

Será que ao não permitirmos tais práticas estaremos a ser intolerantes? Não, neste caso esta-

mos a ser firmes e a agir conforme a justiça porque, ninguém tem o direito de impor sofrimento

a outro sem razão nenhuma. Os limites da tolerância são os do sofrimento salvaguardado na De-

claração Universal dos Direitos Humanos. A tolerância acaba quando as pessoas são desmoraliza-

das e mal tratadas, quando os seus direitos não são assegurados.

A tolerância, tal como a liberdade, precisa de uma certa proteção por parte da lei. Todos so-

mos livres para fazermos e tolerarmos o que quisermos, mas temos de agir conforme a lei. Se a

lei diz que não é correto fazer alguém sofrer, mesmo que eu seja livre de o fazer ou possa tolerar

que o façam, a lei irá guiar-me de maneira que não o faça, ou não o tolere.

Assim sendo, recorrendo ao que podemos ver no filme, não deverá haver tolerância perante

as atrocidades cometidas pelos Hutu, porque mataram inúmeras pessoas (crianças, adultos ou

idosos, não era relevante para eles), aproveitaram-se das mulheres Tutsi e causaram muito sofri-

mento, derrubando qualquer barreira, quer fossem direitos humanos, quer o próprio sofrimento

causado.

Carlota Inês Gomes Abreu, 10ºA, 2012/2013

Para ver o filme completo: http://www.youtube.com/watch?

ATÉ ONDE PODEMOS TOLERAR?

Amor à Sabedoria Página 25

D esde há muito tempo que o ser

humano possui um calendário de

épocas festivas. Existem festas

como a Páscoa, o Carnaval, o Dia das Bruxas,

mas sem dúvida a mais importante de todas é

o Natal, pelo menos na nossa cultura (nem

todos os seres humanos vivenciam o Natal da

mesma forma, pois alguns possuem crenças,

costumes e valores distintos da nossa cultura).

É nesta época natalícia que a nossa socie-

dade vive intensamente, isto é, em família,

com as limpezas a fundo, com a montagem da

lapinha, com as prendas e sem dúvida com a

confeção da comida. Além disso, é nesta altu-

ra que a maioria dos seres humanos, na civili-

zação ocidental, revelam os seus melhores

valores, os quais durante o resto do ano estão

guardados, embora felizmente existam pesso-

as que durante todo o ano demonstram valo-

res de bondade através dos seus comporta-

mentos e atitudes, não os deixando só para a

altura do Natal. Neste contexto surge a neces-

sidade de definir valor. Valor é um conceito

que pode se referir ao que é abstrato como a

paz e a beleza ou, então, pode-se referir ao

que é mais concreto, como a coragem e fideli-

dade. Os valores não são coisas, mas qualida-

des que se atribuem às coisas e estes podem

ser negativos, como o racismo e a agressivida-

de ou positivos, como a verdade e a bondade.

Ao pensarmos nos valores surge-nos uma per-

gunta: “Qual é a natureza dos valores?” Será

que os valores são objetivos ou subjetivos? Na

minha opinião eu acho que os valores são

subjetivos, ou seja, são dependentes do sujei-

to pois os valores são criações humanas tem-

porárias e mutáveis. Além disso, acredito que

os valores dependem do sentimento de agra-

do ou desagrado do sujeito que os profere

estando sempre associados a uma época ou a

uma cultura. Vejamos a visão da cultura afri-

cana acerca da morte: a morte é encarada

com alegria e até existem festas com danças e

comida, o que não acontece na nossa cultura

pois nós encaramos a morte com muita triste-

za, agonia e era impensável fazermos uma

festa quando alguém morre. Podemos afir-

mar, assim, que para além dos valores serem

relativos aos indivíduos, também são relativos

a cada cultura.

Há quem diga que os valores são de natu-

reza objetiva, mas não acredito pois os valo-

res não valem por si mesmos, independente-

mente do sujeito. Não valem por si mesmos

pelo seguinte: imaginemos que não existissem

seres humanos na face da terra, acham que os

valores continuariam a existir? Claro que não,

pois são os seres humanos que criaram os

valores e se eles não existissem, os valores

não existiam. Logo, os valores não valem por

si sós, sendo estes dependentes dos seres hu-

manos. Os valores não são absolutos nem

imutáveis dado que mudam consoante a cul-

tura.

Concluo que os valores são de natureza

subjetiva pois nascem dentro de nós e são

mutáveis de pessoa para pessoa ou de cultura

para cultura. Os valores são de ordem subjeti-

va e podemos dizer que qualquer juízo pode

ser considerado verdadeiro, desde que o su-

jeito que o profere o considere verdadeiro.

Assim o que tem valor para mim, pode não

ser o que tem valor para ti.

Jéssica Patrícia Sousa Faria, 11ºE, 2011/12

QUAL É A NATUREZA DOS VALORES?

Página 26 Amor à Sabedoria

Apanha os botões de rosa enquanto podes

O tempo voa

E esta flor que hoje sorri

Amanhã estará moribunda

Walt Whitman (1819-1892)

«O que é o tempo? (…)Se ninguém mo perguntar, eu sei; se o quiser explicar a quem me fizer a pergunta, já não sei.»

Santo Agostinho, CONFISSÕES, Livraria Apostolado da Imprensa, Porto, 1984, 11ª edição, pág. 304.

“ O Papalagui adora o metal redondo e o

papel forte. Gosta de encher a barriga

com uma série de líquidos provenientes

de frutos mortos, e com carne de porco, boi e

outros horríveis animais, mas acima de tudo

gosta de uma coisa que não se pode agarrar e

que no entanto existe: o tempo. Leva-o muito

a sério e conta toda a espécie de tolices acer-

ca dele. Embora não possa haver mais tempo

do que o que medeia do nascer ao pôr-do-sol,

isso para o Papalagui nunca é o bastante.

O Papalagui nunca está contente com o

tempo que lhe coube e censura o Grande Es-

pírito o não lhe ter dado mais. Chega mesmo

a blasfemar contra Deus e a sua grande sabe-

doria, dividindo e subdividindo cada novo dia

que nasce, segundo um plano bastante preci-

so. Corta-o como se cortaria em pedaços uma

noz de coco mole com um cutelo. As várias

partes têm, todas elas, um nome: segundo,

minuto, hora. O segundo é mais pequeno que

o minuto e este mais pequeno do que a hora.

As horas são feitas de todos os segundos e

minutos juntos, e é preciso ter sessenta minu-

tos e muitos mais segundos para fazer uma

hora.

É uma coisa muito confusa que eu na reali-

dade nunca percebi, pois me indispõe refletir

mais do que o devido sobre coisas tão pueris.

O Papalagui, contudo, faz disso toda uma ci-

ência. Os homens, as mulheres e até mesmo

as crianças que ainda mal se têm nas pernas

trazem consigo, quer presa por grossas cadei-

as de metal que lhe pendem do pescoço, quer

atada ao punho com a ajuda de uma correia

de coiro, uma pequena máquina achatada e

redonda onde podem ler o tempo, o que não

é mesmo nada fácil. Ensinam isso às crianças

encostando-lhes a máquina ao ouvido, para

lhes despertar a curiosidade.

Pode-se facilmente pegar em tal máquina só

com dois dedos; lá dentro tem umas máqui-

nas parecidas com as que há no bojo dos

grandes barcos que todos vós conheceis. Mas

nas cabanas há outras máquinas do tempo,

grandes e pesadas, e outras ainda suspensas

O PAPALAGUI NUNCA TEM TEMPO

Amor à Sabedoria Página 27

no cimo das mais altas cabanas, para que se

veja bem de longe. Quando decorreu um certo

tempo, isso é-nos indicado por dois dedinhos

postados na parte de fora da máquina; ao mes-

mo tempo que ela solta um grito e um espírito

bate num ferro que há lá dentro, fazendo-o

ressoar. Sim, há um barulho enorme, um formi-

dável estrondo, nas cidades europeias, ao fim

de determinado tempo.

Ao ouvir o barulho da máquina do tempo,

queixa-se o Papalagui assim: “Que pesado far-

do! Mais uma hora que se passou!”. E, ao dizê-

lo mostra geralmente um ar triste, como al-

guém condenado a uma grande tragédia. No

entanto, logo a seguir principia uma nova hora!

Como nunca fui capaz de entender isto, julgo

que se trata de uma doença grave. “O tempo

escapa-se-me por entre os dedos!”, “O tempo

corre mais veloz do que um cavalo!”, “Dá-me

um pouco mais de tempo” – tais são os queixu-

mes do homem branco.

Dizia eu que se deve tratar de uma espécie de

doença … Suponhamos, com efeito, que um

Branco tem vontade de fazer qualquer coisa e

que o seu coração arde em desejo por isso:

que, por exemplo, lhe apetece ir deitar-se ao

sol, ou andar de canoa no rio, ou ir ver a sua

bem-amada. Que faz ele então? Na maior parte

das vezes estraga o prazer com esta ideia fixa:

“não tenho tempo de ser feliz”. Mesmo dispon-

do de todo o tempo que queira, nem com a

melhor boa vontade o reconhece. Acusa mil e

uma coisas de lhe tomarem o tempo e, de mau

grado e resmungando, debruça-se sobre o tra-

balho que não tem vontade nenhuma de fazer

e que ninguém, a não ser ele próprio, o obriga a

fazer. Quando de repente se dá conta de que

tem tempo, que tem realmente todo o tempo à

sua frente, ou quando alguém lhe dá tempo - os

Papalaguis dão frequentemente tempo uns aos

outros, é mesmo a ação que mais apreciam -,

nessa altura, ou já não tem vontade, ou já se

cansou desse trabalho sem alegria. E geralmen-

te deixa para o dia seguinte o que podia fazer

no próprio dia.

Pretendem alguns Papalaguis que nunca têm

tempo. Correm desvairados de um lado para

outro como se estivessem possuídos pelo aitu

(morcegos) e causam terror e desgraça onde

quer que cheguem, só porque perderam o seu

tempo. Esse estado de frenesi e demência é

uma coisa terrível, uma doença que nenhum

homem de medicina pode curar, doença que

atinge muitos homens e que os leva à desgraça.

Como vivem obcecados pelo medo de perde-

rem o seu tempo, todos os Papalaguis – sejam

homens, mulheres ou crianças de tenra idade -,

sabem com exatidão quantas vezes nasceu o

sol e a luz desde que viram pela primeira vez a

luz do dia. Este acontecimento é considerado

tão importante que o celebram, a intervalos de

tempo fixos e regulares, com flores e grandes

festas. Reparei, muitas vezes, que eles, no meu

lugar, se sentiam envergonhados quando, ao

perguntarem-me a idade que tinha, eu não era

capaz de responder a tal pergunta, que só me

dava vontade de rir! “Mas não podes deixar de

saber a tua idade!”. Eu calava-me, pensando

para comigo: mais vale não saber.

Ter uma idade, quer dizer: ter vivido um de-

terminado número de luas. Isto de se perguntar

qual o número de luas apresenta grandes peri-

gos, pois foi assim que se acabou por determi-

nar quantas luas dura em geral a vida dos ho-

mens. Ora acontece que cada um, sempre mui-

to atento a isso, passadas que foram já inúme-

ras luas, dirá: “Pronto! Não tarda muito que eu

morra!” Nada mais então lhe causa alegria e, de

facto, acaba por morrer daí a pouco tempo.

Raros são os que, na Europa, dispõem real-

mente de tempo. Ou talvez nem sequer exis-

tam. É por isso que eles passam a vida a correr

à velocidade de uma pedra lançada ao ar. A

Página 28 Amor à Sabedoria

maior parte olha para o chão, quando cami-

nha, e balança muito os braços para ir mais

depressa. Quando os detêm, gritam indigna-

dos: “Que ideia a tua, de me vires perturbar!

Não tenho tempo! E tu, trata de empregar

bem o teu!”. Tudo se passa como se o que an-

da depressa tivesse mais valor e bravura do

que o que vai devagar.

Vi um homem cuja cabeça parecia prestes a

estoirar, e cujo rosto passava sucessivamente

do vermelho ao verde, um homem que rolava

os olhos em todos os sentidos, que abria a bo-

ca como um peixe que vai morrer e batia com

os pés e com as mãos, tudo porque o seu cria-

do chegara um pouco mais tarde do que tinha

prometido. Esse atraso mínimo representava

para o amo uma perda enorme e irreparável.

O criado teve que se ir embora da cabana, pois

o Papalagui expulsou-o, dizendo: “Já me rou-

baste muito tempo! Quando um indivíduo não

tem a mínima consideração pelo tempo, só

estamos a perder o nosso com ele!”.

Encontrei, uma única vez, um homem que

não se queixava de estar a perder tempo e que

o tinha de sobra; mas esse era pobre, sujo e

desprezado. As pessoas desviavam-se, para o

evitar, e ninguém o respeitava. Não entendi tal

comportamento, pois ele andava devagar e

tinha um olhar sorridente, calmo e bondoso.

Quando lhe perguntei qual a razão disso, o seu

rosto crispou-se e respondeu-me com voz tris-

te: “Nunca soube empregar o meu tempo de

maneira útil; é por isso que passo de um pobre

-diabo desprezado por toda a gente!”. Aquele

homem tinha tempo, mas nem mesmo ele era

feliz.

O Papalagui emprega todas as suas forças,

bem como a sua capacidade de raciocínio, em

tentar ganhar tempo. Utiliza a água, o fogo, a

tempestade e os relâmpagos para parar o tem-

po. Põe rodas de ferros nos pés e dá asas às

palavras, só para ganhar tempo. E porquê tan-

ta canseira? Como é que o Papalagui emprega

o seu tempo? Nunca percebi muito bem, em-

bora, pelos seus gestos e palavras, sempre me

tivesse dado a impressão de alguém que o

Grande Espírito tivesse convidado para um

fono.

A meu ver, é precisamente por o Papalagui

tentar reter o tempo com as mãos, que ele se

lhe escapa por entre os dedos, como uma ser-

pente por mão molhada. O Papalagui nunca

deixa que ele venha ao seu encontro. Corre

sempre atrás dele de braços estendidos, não

lhe concede o repouso necessário, não o deixa

apanhar um pouco de sol. Tem que ter sempre

o tempo ao pé de si, para lhe cantar ou contar

qualquer coisa. Mas o tempo é calma, é paz e

sossego, gosta de nos ver descansar, estendi-

dos na nossa esteira. O Papalagui não se aper-

cebeu ainda do que o tempo é, não o compre-

endeu. É por isso que o maltrata, com os seus

modos rudes.

Oh! Meus queridos irmãos! Nós nunca nos queixámos do tempo, amámo-lo e acolhemo-lo tal como ele era, nunca corremos atrás dele, nunca tentámos amalgamá-lo ou cortá-lo em pedaços. Nunca ele nos deixou desesperados ou acabrunhados. Se algum de nós há aí a quem falte tempo, que diga! Todos nós o pos-suímos em quantidade, não temos razões de queixa. Não precisamos de mais tempo do que o que temos, temos sempre tempo suficiente. Sabemos que atingiremos o nosso alvo a tem-po, e que muito embora ignoremos quantas luas se passaram, o Grande Espírito nos cha-mará quando lhe aprouver. Devemos curar o Papalagui de sua loucura e desvario, para que volte a ter noção do verdadeiro tempo que tem perdido. Devemos destruir as suas peque-nas máquinas do tempo e levá-lo a confessar que há muito mais tempo do nascer ao pôr-do-sol do que ao homem lhe é dado gastar.”

O Papalagui, (discursos de tuiavii, chefe de tribo de tivéa nos mares do sul, recolhidos por Erich Scheurmann), Tradução de Luíza Neto Jorge, Antí-gona, Lisboa, 2009, pp: 33-38.

Amor à Sabedoria Página 29

“IN TIME”

N o mundo de In Time, o tempo virou moeda. As

pessoas param de envelhecer aos 25 anos. Os

ricos conseguem "ganhar" décadas de uma só

vez, podendo até se tornar imortais. Os outros têm de pedir

esmolas, pedir emprestado ou roubar mais horas para chegar

vivo até o final do dia. Ao ser falsamente acusado de ter rou-

bado todo o "tempo" de um homem, o que teria provocado

sua morte, Will Salas, morador da periferia, terá de provar a

sua inocência e descobrir uma maneira de destruir o sistema.

O filme “in time” mostra-nos uma ideia de um futuro um

pouco diferente daquela que temos. Neste futuro a moeda usada pelas pessoas é o tempo, paga-se

tudo através do tempo que está marcado no braço das pessoas. Neste futuro, as pessoas ao chega-

rem aos 25 anos deixam de envelhecer e só morrem quando o seu tempo se esgotar. Aos ricos é-

lhes dada a possibilidade de viverem eternamente uma vez que possuem os recursos para isso. To-

dos os outros têm que trabalhar para ter tempo, roubam ou pedem esmola.

O filme fala-nos de um jovem que recebe uma oferta de um século de vida dada por um se-

nhor. De uma hora para a outra este jovem fica rico mas é acusado de homicídio, e tenta provar o

contrário. Envolve-se com uma jovem filha de um milionário que o ajuda a levar o dinheiro onde

este deveria estar (roubar aos ricos para dar aos pobres).

Quem nunca pensou em viver para sempre? Quem nunca quis ficar sempre jovem? Mas não

podemos. Não desta maneira… a única maneira de marcarmos um lugar nosso na terra só é possí-

vel se lutarmos por aquilo em que queremos fazer a diferença.

Com o filme aprendi que nunca devo desistir. Ao não desistir vou ser eterno para alguém pois

marquei o meu lugar na terra fazendo o bem.

Para finalizar acho que as pessoas importam-se demasiado com o dinheiro além de se importa-

rem com o tempo, pois o dinheiro é uma coisa que ao perdermos podemos reconquistá-lo, tê-lo de

novo. Mas o tempo não! O tempo não volta, só passa (e não de maneira lenta), por isso preocu-

pemo-nos com o tempo, pois sem ele nada seremos.

José Xavier, 10.º E, 2011/12

Para conhecer melhor o filme:http://cinema.sapo.pt/filme/in-time

A FILOSOFIA VAI AO CINEMA

Página 30 Amor à Sabedoria

K arl Popper, foi um filó-

sofo da ciência austría-

co, nasceu em Viena a

28 de julho de 1902 numa família

de classe rica de origem judaica.

Foi educado na Universidade de

Viena e concluiu o doutoramento

em filosofia em 1928 e ensinou

numa escola secundária entre

1930 a 1936. Reformou-se da vida

académica em 1969 apesar de ter

permanecido ativo inteletualmen-

te até à sua morte em 17 de se-

tembro de 1994. É considerado

por muitos como o filósofo mais

influente do século XX a tematizar

a ciência. Foi também um filósofo

social e político de dimensão con-

siderável, um grande defensor da

democracia liberal e um oponente

do totalitarismo. Ele é bem mais

conhecido pela defesa do falsifica-

cionismo como um critério de de-

marcação entre a ciência e a não-

ciência e da defesa da sociedade

aberta. Sendo ele judeu, aquando

da ascensão nazi, foi vítima de per-

seguição por parte destes, conse-

guindo apenas, em 1937,quando

tinha 35 anos, refugiar-se na Nova

Zelândia e depois em Inglaterra

onde permaneceu até ao fim da

sua vida.

(continua na próxima página)

ENTREVISTA A KARL POPPER

Rai - Qual é o critério de cientificidade de uma teoria?

Popper — Nas minhas primeiras publicações propus co-mo critério do carácter científico (ou empírico porque em inglês o termo "ciência" denota a ciência empírica) a falsificabilidade ou controlabilidade, isto é, a possibilida-de de submeter a teoria a controlo. Procurei mostrar que a controlabilidade equivale à falsificabilidade. Uma teo-ria é controlável se existem ou podemos conceber testes que possam refutá-la. Trata-se de algo semelhante ao exame de um estudante. Um estudante é examinável se existem possíveis perguntas que permitam testar se não sabe nada ou se sabe o suficiente para passar no exame. Falsificabilidade significa que uma teoria pode ser exa-minada e, no caso de não passar no exame, ser declara-da falsa. Mas isto não significa que essa teoria seja de deitar para o caixote. Podemos de facto, corrigir a nossa teoria, modificá-la. E, por vezes as correções, mesmo limitadas, podem fazer uma enorme diferença, pode acontecer que uma pequena correção reforce de tal mo-do a teoria que ela acabe por explicar muito mais do que esperaríamos. O falsificacionismo pode conduzir, nos casos extremos, à rejeição total de uma teoria e, noutros casos, pode conduzir a um melhoramento extraordiná-rio. Segundo a minha conceção, todos os testes ou con-trolos científicos, os experimentos, são tentativas de re-futação.

Rai — Isso é verdade no que respeita a uma refutação conseguida. Mas e quando não conseguimos refutar ou provar a falsidade de uma teoria?

Popper - Se o teste não refutar a teoria, só podemos di-zer que a teoria passou no exame. Não podemos dizer muito mais. Não tem grande significado o facto de a teoria passar numa certa prova. Significa simplesmente que nada nos obriga a abandonar a teoria e que, se até agora não a tínhamos levado muito a sério, é altura de o fazer. Mas isto não nos leva a muito. E muito menos a afirmar que a teoria seja verdadeira. O que podemos dizer é que a teoria foi controlada sem ser refutada e nada mais. Não podemos chamar "verificação" à passa-gem no exame ou teste a que a teoria foi submetida. À letra, o termo verificação significa tornar verdadeira uma teoria, "veri-ficar-la" (verificar vem do latim verum facere). Na realidade, não podemos "fazer verdadeira" nenhuma teoria, nem mesmo mostrar que é verdadeira. O único objetivo dos testes a que submetemos as teorias é o de falsificá- -las, não o de verificá-las.

Entrevista de Karl Popper à R. A. I. em 26 de Julho de 1989 no site da Enciclopedia Multimediale delle Scienze Filosofiche

http://www.emsf.rai.it/interviste/ (Adaptado)

PENSADORES DO SÉCULO XX

Amor à Sabedoria Página 31

Martin Heidegger foi um filósofo alemão nascido a 26 de

setembro de 1889. Estudou na Universidade de Friburgo

onde se tornou professor em 1928. A partir de 1911, influ-

enciado pelo filósofo Heinrich Rickert, Heidegger estudou as

obras de Hegel, Schelling, Kierkegaard, Nietzsche, Kant, Dos-

toievsky, Rilke, Trakl, e começou a redigir textos que resulta-

riam em obras posteriores. Em 1927 publicou a sua maior

obra filosófica “Ser e Tempo” e após o lançamento dessa

obra, Heidegger foi considerado o maior nome da filosofia

metafísica. É seguramente um dos pensadores fundamen-

tais do século XX, quer pela recolocação do problema do ser

e pela refundação da Ontologia, quer pela importância que

atribui ao conhecimento da tradição filosófica e cultural.

Morreu a 26 de maio de 1976. Foi o mais famoso filósofo a

apoiar os nazis, pois inscreveu-se no Partido Nazi, tendo sido

posteriormente nomeado reitor da Universidade de Frei-

burg. Incluiu a saudação nazi nas suas aulas e conferências e

foi contra a influência judaica na vida cultural alemã. Embo-

ra fosse um aderente do nazismo, teve uma relação amoro-

sa com uma aluna judia, Hannah Arendt, uma política e filó-

sofa alemã (que, também por causa da ascensão nazi, emi-

grou para os Estados Unidos). Diz-se, por isso, que se reve-

lou contra as perseguições anti-semitistas a professores da

Universidade, tendo por causa disso se demitido do cargo

de reitor.

Embora Popper e Heidegger tenham sido ambos grandes

filósofos durante o nazismo, estes o viam e encaravam de

maneiras diferentes: Popper evitava-o, e de certo modo

confrontou-o, e Heidegger aceitava-o e aderiu durante certo

tempo a esta política extremista e comunista tão marcante

como foi.

Miriam Gonçalves, 11ºC, 2010/11

“ Quando o recanto mais remoto

do globo tiver sido conquistado

pela técnica e explorado pela

economia; quando um qualquer

acontecimento se tiver tornado

acessível em qualquer lugar, a

qualquer hora e com uma rapi-

dez qualquer; quando se puder

“viver” simultaneamente um

atentado a rei na França e a um

concerto sinfónico em Tóquio;

quando o tempo for apenas rapi-

dez, momentaniedade e simulta-

neidade e o tempo enquanto

história tiver desaparecido da

existência de todos os povos;

quando o pugilista for considera-

do o grande homem de um po-

vo; quando milhões de manifes-

tantes constituírem um triunfo,

então continuará a pairar e a

estender-se como um fantasma

sobre toda esta maldição, a

questão: Para quê? - Para onde?

– E, depois, o quê?

(Heidegger, Introdução à

Metafísica, 1935)

Página 32 Amor à Sabedoria

N a minha vida, enquanto professo-

ra de Filosofia, nunca uma per-

gunta me pareceu tão difícil de

responder como esta: E se, professora, o meu

melhor não for suficiente? Falávamos de so-

nhos. Mais exactamente, do sonho desta alu-

na de ser Médica. Nestes 20 anos de profis-

são habituei-me a responder, ou a esquivar-

me, a perguntas difíceis: Professora, para que

serve a Filosofia? Professora, Deus existe?

Professora, acredita em extraterrestres? Pro-

fessora, a minha catequista diz que viemos

de Adão e Eva, a ciência diz que descende-

mos do macaco, quem é que nos anda a en-

ganar? Professora, como começou o mundo?

Professora, Deus morreu? Professora, o que

quer dizer infinito, o que é o tempo? Profes-

sora, há vida depois da morte? Professora, a

vida tem sentido? … E lá lhes vou dizendo

que a Filosofia tem mais perguntas do que

respostas e que as minhas respostas, se é

que as tenho, de nada lhes servem pois são

eles que terão de encontrar as suas. E, assim,

me vou safando de dar respostas que me

comprometam, ou a eles, demasiado.

Hoje não pude fazer isso. Hoje fiquei desar-

mada, impotente, desassossegada. Hoje não

consegui encontrar as palavras que precisava

e respondi apressada: Tens de ter um plano

B! Se não podes alcançar o teu sonho, então,

arranja uma enxada que te permita sobrevi-

ver. Que resposta idiota! Isto é tudo o que eu

não queria ter dito. Desconcertada com a

pergunta e furiosa com a idiotice da minha

reposta, dei comigo a pensar porque raio é

que hoje, em Portugal, tantos adolescentes

sonham ser médicos? E porque raio é preciso

que tenham uma média de 19 valores para

entrarem num curso de Medicina? E percebi,

também, que para responder à minha aluna,

de forma mais ou menos séria, teria de colo-

car duas questões que me parecem funda-

mentais: Primeiro, aonde vão eles buscar es-

te sonho de serem médicos? Segundo, o que

é preciso para ser médico?

Quando procurava a resposta para a pri-

meira questão, dei com os olhos incrivelmen-

te azuis do meu pai a sorrirem com o brilho

trocista do «Eu não te disse?», a lembrarem-

me uma história, de que eu nunca gostei na-

da, a história do menino que sonhava ser Pa-

pa e só chegou a coveiro, a que o meu Pai

acrescentava para me apaziguar - pois esta

foi sempre para mim uma história terrivel-

mente cruel -, «se ele não tivesse feito o pon-

to tão alto, o homem que ele veio a ser, nem

a coveiro chegava». O meu Pai nunca explica-

va as suas histórias, limitava-se a fazer-nos

pensar. Mas creio que o que nos queria dizer

é que nunca é inútil sonhar, mas que para se

ser homem é preciso ser capaz de estar, mais

do que à altura dos nossos sonhos, à altura

da nossa vida. Pode-se ter sonhado ser Papa

e viver, feliz e dignamente, como Coveiro.

Podemos não estar à altura dos nossos so-

nhos, especialmente daqueles que não são

genuinamente nossos, mas temos de estar

sempre à altura da nossa vida. Muitos dos

nossos sonhos podem ser mentira, mas a vi-

da, essa, é sempre verdadeira e não podemos

deixar de a viver, tanto e tão bem quanto nos

for possível.

Julgo que este sonho de ser médico é, para

a maioria dos nossos alunos, uma grande

mentira, mas não é uma mentira inócua, é

uma mentira que pode ter consequências

muito sérias a nível da sua auto-estima, espe-

cialmente quando não se aprendeu a lidar

com a frustração. Costumo, no início do ano

letivo, apresentar-me com um texto, ainda

que breve e superficial, sobre o que penso da

E SE, MILAGROS, OS SONHOS SÃO MENTIRA…

Amor à Sabedoria Página 33

filosofia, do ensino, da Ilha onde nasci, da vida

e do que espero dos meus alunos, convidando-

os a fazerem o mesmo, dado que dizer o nosso

nome a quem não nos conhece não diz rigoro-

samente nada sobre nós. E quando, por insegu-

rança ou timidez, não querem dizer nada de si,

peço-lhes que inventem uma história, na espe-

rança de ser capaz de os ler nas entrelinhas. De

há três ou quatro anos para cá, não sei preci-

sar, tenho verificado que no décimo ano, de

forma mais ou menos assumida, quase todos

os alunos sonham ser médicos, independente-

mente do curso que frequentam. Perguntei-

lhes porquê e a resposta foi: Morangos com

Açúcar, professora! Não percebi, apesar das

explicações, a relação entre este sonho e os

Morangos com Açúcar, mas percebi que este

sonho lhes era, decididamente, impingido.

De facto, muitos dos nossos sonhos são men-

tira. Criamos uma imagem de como devemos

ser, com base naquilo que julgamos que os ou-

tros valorizam e querem que nós sejamos, para

sermos aceites por eles. E assim vamos fazen-

do o que podemos para correspondermos a

essa imagem. Porém, a imagem que formamos

de nós para nós mesmos não é, hoje, influenci-

ada apenas por aqueles que nos são mais pró-

ximos, o que configuraria um universo de so-

nhos, de certo modo, exequíveis, representa-

dos por modelos atingíveis, mas também pelo

que a Comunicação Social nos vai, mais ou me-

nos sub-repticiamente, apresentando como

ideal de vida e de humanidade, levando-nos a

colocar, quase infalivelmente, como condição

si ne qua non do prestígio, do reconhecimento,

que humanamente desejamos e, consequente-

mente, como fundamento da auto-estima, a

fama e o dinheiro. Ora, para além daquelas

profissões tão queridas aos adolescentes, e a

que já nos habituamos, como jogador de fute-

bol, cantor, guitarrista e afins, ser médico é

hoje uma profissão da moda, altamente dese-

jável, porque no nosso país é a única que ainda

parece ter algum futuro com dinheiro e, uma

vez que exige médias muito elevadas para en-

trar na Universidade, ela apresenta-se, simulta-

neamente, como altamente prestigiante: ser

aluno de medicina não é para qualquer um, só

para os excepionalmente inteligentes. E nisso

reside a sua fama. Como se a inteligência se

pudesse medir por isso e como se para ser mé-

dico isso bastasse, mas, enfim, é assim que pa-

rece aos olhos da maioria, especialmente, aos

olhos dos nossos alunos e dos pais.

Porém, julgo que para ser médico não basta

conhecer, de cor e salteado, os nomes de to-

dos os músculos, ossos ou veias, e não sei mais

o quê, desta máquina chamada «corpo», nem

os mecanismos do seu funcionamento, porque

o corpo não é uma máquina, nem o médico é

um mecânico de corpos, o corpo não é uma

coisa, nós somos o corpo que temos e o corpo

que temos é, também, o homem que somos. O

médico não conserta, antes de mais e acima de

tudo, como lembrou o neuropediatra Nuno

Lobo Antunes, numa entrevista recente, na

RTP1: «O médico não cura. O médico cuida». E

para cuidar não chega ser uma barra a Físico-

Química, Biologia ou Matemática, por muito

útil que isso seja, é preciso ser um ser humano

completo, capaz de empatia, capaz de se colo-

car no lugar do outro para o socorrer e cuidar.

Ao médico não cabe “reparar” os outros, mas

tratar, amparar, pessoas que se encontram

numa situação de extrema fragilidade e isso

exige delicadeza de espírito, que não se avalia

com as notas de Físico-Química ou Matemáti-

ca, isso exige sensibilidade e uma formação

verdadeiramente humanista, isto é, a formação

e valorização de um carácter incompatível com

o egoísmo crescente, do salve-se quem puder,

que temos verificado em algumas destas tur-

mas de «ciências exactas», porque nada é mais

importante do que ter boas notas. O direito a

entrar num curso de medicina devia, para ser

justo, avaliar, não só o QI dos alunos, isto é, a

sua capacidade de raciocínio lógico e habilida-

Página 34 Amor à Sabedoria

des matemáticas, como também a sua Inteli-

gência Emocional, a capacidade de se coloca-

rem no lugar do outro, de se darem ao outro,

porque eles vão cuidar de pessoas e não con-

sertar aparelhos. Não percebo porque é que

as Universidades Portuguesas continuam, ao

contrário de outras como as dos Estados Uni-

dos, a ignorar esta questão, que não precisa

mais do que o bom senso para se apresentar

como fundamental.

Quero com isto dizer que, apesar das notas

de Físico-Química, Matemática ou Biologia,

poderem vir a impedir muitos dos nossos alu-

nos de realizarem o seu sonho, é injusto con-

cluírem daí, sem mais nem menos, que são

inferiores aos outros e que não estão à altura

do que sonharam, porque se calhar até estão,

mas os critérios para o acesso ao curso de

medicina, impendem-nos de o saberem. Por

outro lado, os alunos com excelentes notas às

disciplinas ditas de “ciências exactas” teriam

sempre vantagem, se aliassem a isso sensibili-

dade e humanidade e os outros teriam de

compensar os que lhes falta em “ciências exa-

tas” com excelência em sensibilidade e huma-

nidade, com isso, creio, ganhariam os alunos,

as universidades, os médicos e, sobretudo, os

pacientes e a humanidade. Porém, os sonhos

à Morangos com Açúcar podem ter um efeito

perverso e conduzirem-nos à auto-rejeição,

porque arrastam consigo o sentimento de não

estarmos à altura do que os outros esperam

de nós e, consequentemente, de não estar-

mos à altura de nós mesmos. E isso vale tanto

para os que não entraram num curso de medi-

cina, como, e penso que, sobretudo, para

aqueles que entraram e se vêem numa profis-

são que julgaram ser um sonho e que o não é,

porque o sonho, afinal, era uma mentira, era

de outros. Esta mentira, de uma forma ou de

outra, conduz-nos à rejeição de nós mesmos,

ou porque não somos o que queríamos ser e

desistimos de nós, ou porque não estamos à

altura do que julgamos ser o nosso sonho e

culpamo-nos por isso. E ninguém nos pode

fazer tanto mal como nós a nós mesmos.

Por isso, minha amiga, tem cuidado com o

que sonhas, certifica-te que esse sonho é teu

e não de outros. E se o procuras realizar ape-

nas para agradar aos outros, desiste, não vale

a pena, o preço que terás de pagar é demasia-

do elevado, se é teu, então, continua a lutar

por ele, se não conseguires ser médica, vive

tentando sê-lo, mas não menosprezes a vida

que entretanto fores vivendo, vive-a com o

mesmo entusiasmo, cuidado e dedicação que

a viverias se fosses médica. Porque o tempo,

acredita, o tempo não é dinheiro, o tempo é

VIDA.

Afinal, tantas palavras para voltar a dizer o

mesmo: Dá corda ao sonho, mas mantém os

pés no chão.

Imaculada Pacheco

Henri Cartier Bresson

Fonte: http://jaderresende.blogspot.pt/2012/03/cartier-bresson-fotografo-e-anarquista.html

Amor à Sabedoria Página 35

N o dia 8 de maio de 2012, a turma

do 12ºB, do Curso Tecnológico da

Ação Social, da Escola Básica e Se-

cundária Padre Manuel Álvares, participou

juntamente com a turma do 12ºA do Curso

Tecnológico de Desporto, numa visita de es-

tudo ao Centro de Reabilitação Psicopedagó-

gico da Sagrada Família, no Funchal, em São

Roque, entre as 8:30 e as 12:00 horas, com o

objetivo de conhecer a Instituição de Solidari-

edade Social, criada pelas Irmãs Hospitaleiras

do Sagrado Coração de Jesus.

Esta Instituição investe na promoção da saúde mental de crianças e de jovens com ida-

des entre os 3 e os 18 anos. As suas áreas de intervenção são a deficiência mental (ligeira,

média e profunda), a deficiência motora e as paralisias cerebrais, multideficiências, e ou-

tras situações do foro psiquiátrico. Esta instituição tem objetivos específicos de intervenção

na vertente da saúde e da pedagogia: desenvolver ao máximo as potencialidades das crian-

ças e dos adolescentes; promover a aprendizagem escolar e o ensino básico, quando é pos-

sível, e até onde o permitam as capacidades das crianças; e impulsionar a formação profis-

sional e a integração socioprofissional de acordo com as capacidades e aptidões de cada

jovem. Este Centro de Reabilitação trabalha em cooperação com a Secretaria Regional dos

Assuntos Sociais, com a Secretária Regional de Educação e a Direção Regional de Educação

Especial e Reabilitação.

Quando chegámos ao local fomos recebidos pela Irmã Albina que nos encaminhou nu-

ma visita guiada às instalações, apresentando-nos a equipa técnica e os colaboradores. Esta

Instituição é composta por: 1 igreja, 1 sala de desporto, 1 piscina com água quente, 18 uni-

dades e 1 residência feminina e masculina. Cada unidade é constituída por: sala de estar,

sala de jantar, sala de ocupação, refeitório, casas de banho, quartos e gabinete de enfer-

magem. Tem uma escola, onde se encontram 31 crianças, duas delas com autismo. Têm

uma Unidade de Curto Internamento, ou seja, uma Unidade onde permanecem os jovens

em recuperação de problemas de saúde psicológica como esgotamentos e anorexias, entre

tantos outros problemas. Esta Unidade é formada por: sala de reuniões, sala de terapia fa-

miliar, sala de estar, sala de visitas, refeitório, quartos, casas de banho, centro de enferma-

gem, gabinete técnico e um jardim. Existe também outra Unidade, onde acolhem jovens

com deficiências profundas desde o nascimento ou por acidente. Têm 21 jovens. A Irmã

Albina deu-nos a conhecer entre outras situações, uma que nos sensibilizou em particular:

VISITA DE ESTUDO

Página 36 Amor à Sabedoria

um jovem que nasceu normal e teve um acidente que o deixou com grandes limitações

físicas e isso tornou-o o mais agressivo da Instituição, por nunca ter aceite a mudança bru-

tal que ocorreu na sua vida.

A Unidade maior tem 2 fisioterapeutas que ajudam os jovens ou crianças com paralisias cere-

brais, problemas respiratórios, doenças neurológicas e ortopédicas. Nesta sala usam cadeiras es-

pecializadas para cada caso e acompanham o crescimento de cada criança.

Existe uma sala de SNOEZELEN, chamado o Canto do Céu. Esta sala é multisensorial e tem co-

mo objetivo a estimulação sensorial ou a diminuição dos níveis de ansiedade e de tensão. Esta

sala proporciona o conforto através do uso de estímulos controlados e oferece uma grande quan-

tidade de estímulos sensoriais que podem ser usados de forma individual ou combinada dos efei-

tos da música, sons, luzes, estimulação táctil e aromas. Ex: colchão de água, sofás, espelho de mul-

tiplicação e bola de visão ótica. O ambiente que a sala proporciona é sempre seguro, promovendo

o auto conforto, autonomia, descoberta e exploração: permite estimular os sentidos primários,

tais como o paladar, a visão, o som e o cheiro.

Na parte da residência estão instalados 6 jovens que trabalham na quinta. Eles fazem de tudo

um pouco: lavam a roupa e fazem o comer com a ajuda de uma orientadora. Estes jovens têm que

conseguir gerir os seus bens para quando chegar o dia de sair da Instituição poderem estar prepa-

rados para seguir com autonomia as suas vidas.

Depois de acabarmos a visita guiada, fomos até ao pátio, onde estava a decorrer uma ativida-

de de jogos tradicionais. De seguida a nossa professora Graça apresentou-nos uma senhora que já

lá vive há alguns anos. Ela chama-se Marília e tem uma doença semelhante a Parkinson. Ela escre-

ve poemas e recentemente publicou um livro: ‘Ecos de Amor’.

Regressamos, então, à nossa Escola!

Eu concluo que esta visita ao Centro foi uma mais-valia para todos nós, porque tivemos a

oportunidade de refletir sobre situações da vida, que até aqui nunca tínhamos conhecido direta-

mente.

Queremos agradecer todo o apoio, atenção e disponibilidade demonstrado pela Irmã Albina e

pelos técnicos de saúde que nos receberam com tanta amabilidade.

Verónica, 12ºE, 2011/ 12

Amor à Sabedoria Página 37

Horizontais 1: Multiplicidade de conhecimentos articulados segundo uma ideia de totalidade Verticais 2: Escola filosófica da Idade Média, cujo principal representante é Santo Tomás de Aquino Horizontais 3: Que não existe em nenhum lugar Verticais 4: Sistema filosófico de William James, que subordina a verdade à utilidade e reconhece a primazia da ação sobre o pensamento Verticais 5: É a ciência que tem Deus por objeto Horizontais 6: Parte da Filosofia que se ocupa com o valor do comportamento humano. Investiga o sentido que o homem imprime à sua conduta para ser verdadeiramente feliz Horizontais 7: Doutrina dos que pretendem basear os seus postulados apenas na autoridade, sem admitir crítica nem discussão Verticais 8: Estado de coisas ou declaração que se faça sobre elas, que aparentemente implica algu-ma contradição Horizontais 9: Teoria dos valores em geral, especialmente dos valores morais Horizontais 10: Verdade que não precisa de demonstração, por ser evidente por si mesma Horizontais 11: Aquilo que se refere à descoberta e serve de ideia diretriz numa pesquisa Verticais 12: Representação inteletual de um objeto Verticais 13: Parte da Filosofia que se ocupa do ser enquanto ser Verticais 14: Doutrina filosófica moderna (séc. XVII) que admite a razão como única fonte de conhe-cimento válido Horizontais 15: Doutrina que admite que o nada, além de ser, ou de haver, é capaz de ser pensado

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Página 38 Amor à Sabedoria

AJUDE O FILÓSOFO A ENCONTRAR A VERDADE.

Verticais 16: Forma de conhecimento que permite à mente captar algo de modo direto e imediato Horizontais 17: Expressão verbal de um raciocínio Horizontais 18: Ato de afirmar e de negar, ao mesmo tempo, uma mesma coisa Verticais 19: Raciocínio que nos permite tirar de uma ou várias proposições uma conclusão que delas decorre logicamente Horizontais 20: É um raciocínio falso que se apresenta com aparência de verdadeiro Horizontais 21: Ramo da Filosofia que trata dos problemas filosóficos relacionados com o conheci-mento e ciência Verticais 22: Ciência das leis ideais do pensamento e a arte de aplicá-los corretamente na pesquisa e na demonstração da verdade Horizontais 23: Caráter comum dos sistemas filosóficos que consideram a experiência como único critério de verdade Horizontais 24: Doutrina que preconiza a liberdade política ou a liberdade de consciência

Amor à Sabedoria Página 39

SUGESTÕES DE LEITURA

Cartoon de MOA.

Fonte:http://duvida-metodica.blogspot.pt/search/label/Leitura

Página 40 Amor à Sabedoria

TÍTULO: História da Filosofia Sem Medo Nem Pavor

AUTOR: Fernando Savater

EDITORA: Planeta

Sinopse (da editora): Ao ouvir falar de Filosofia, muitas pessoas assustam

-se, e algumas começam logo a tremer: a Filosofia? O que é isso? De certe-

za que não é para mim! Estão errados, porque as perguntas básicas da

Filosofia todos as fizemos alguma vez: tratam da morte, da verdade, da

justiça, da natureza, do tempo … Fazer filosofia não é senão refletir sobre

a nossa humanidade. Mas… quem foram os grandes filósofos? Pessoas

como nós, inquietas ao longo dos séculos pelas mesmas coisas que nos

incomodam agora. A sua História é um relato de aventuras racionais, de

genialidade e inteligência, onde não faltam perseguições, calabouços,

martírios e também descobertas surpreendentes. Este livro pretende ape-

nas contar com simplicidade e não com pedantismo, para que, quem leia,

desfrute sem medo nem pavor da sua emoção intelectual … e possa conti-

nuar a pensar por si próprio.

TÍTULO: Que Quer Dizer Tudo Isto? Uma Iniciação à Filosofia

AUTOR: Thomas Nagel

EDITORA: Gradiva

“Que sabes realmente sobre aquilo que se passa na mente de qualquer

outra pessoa? É claro que só observas os corpos de outras criaturas, inclu-

indo os das pessoas. Observas aquilo que fazem, escutas aquilo que dizem

e os outros sons que produzem, vês como respondem ao ambiente que as

rodeia – quais as coisas que as atraem e quais as que lhe repugnam, aquilo

que comem, e assim sucessivamente. Também podes abrir outras criatu-

ras, observar o interior dos seus corpos e comparar mesmo a sua anato-

mia com a tua.”

Thomas Nagel, O que quer dizer tudo isto? - Uma iniciação à Filosofia,

Gradiva, Lisboa, 1995, pp. 22

TÍTULO: O Mundo de Sofia

AUTOR: Jöstein Gaarder

EDITORA: Presença

O Mundo de Sofia é a prova de que Demócrito, Aristóteles, Kant, Espi-

nosa, Freud e os outros são fabulosos personagens romanescos. Um

thriller filosófico à boa maneira, com a vantagem de possuir uma elegan-

te e inexcedível clareza.

EBSPMA

MARÇO DE 2013