Exposições Universais: Londres 1851
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E X P O S I E S U N I V E R S A I S
LONDRES 1851 Nicolau Andresen Leito
Texto
Nicolau Andresen Leito
Reviso de Texto
Fernando Milheiro
Design Grfico
Luis Chimeno Ganido
Coonlenao de Edio
Fernando Lus Sampaio
Coordenao de Produo
Diogo Santos
Lus Pedro Aguial'
Fotocomposio, Seleco de COl' e Fotolitos Gabinete Grfico Mal'ia Esther
Impresso
Fel'nandes e Tel'ceil'o, Lda,
Depsito Legal
79429/94
I.S,B,N, 972 - 8127 - 03 - O
Tiragem
2000 exemplal'es
Lisboa, Julho de 1994
Uma Edio
EXPO'Q8'
o esprito de UlUa poca.............................................................. 9
I A Gr-Bretanha da Grande Exposio O prncipe Alberto de Saxe-Coburgo-Gota .................................. 13 A Sociedade das Artes e Henry Cole . .............. . . .. . . ................... ..... 14 As exposies nacionais francesas ................................................. 17 A Comisso Real de 1851 ................................................................ 20 A Comisso para o edifcio.............................................................. 27 Os opositores. . . . . . .. ... .............. ....... ...... .... ....... .... ....... ........... ........ ...... 29
II O Palcio d e Cristal de 1851 O jardineiro de Chiswick ............................................................... . 33 A construo do Palcio de Cristal ........... .......... ..... ............... ...... 37 A cerimnia de inaugurao.......... ............... .................................. 44
III A geografia da Feira A presena britnica........................................................................ 51 O Sr. Schweppes............................................................................... 57 Retoma-se a visita ............................................................................ 60 A poltica das entradas........ ..................................... ....................... 63 A presena estrangeira.................................................................... 66 A presena da Pennsula Ibrica................................................... 71 O encerralnento................................................................................ 73
IV O sucesso da Exposio A vitria pessoal do prncipe Alberto ........................................... 78 A Comisso Real da Exposio hoje em dia ............ ..................... 78 Outras consequncias da Exposio............. ... .... . .. . ...... ................ 79 A importncia da Imprensa .. .. . . .. . ... . . . . . . .. . . ............ .. . . . . . . . . . . . . .... .. ..... . 81 A histria subsequente do Palcio de CristaL............ ..... ........... 82 O Palcio de Cristal do Porto . . . . . .. . . . . . . . .. . . . ............ . . . . .... . . ... . . . . . . .... . . 84 O que a Exposio no conseguiu.................................................. 85 Fim . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 86
Notas . . . . . . . . . ..... . . . . . . . .. . . . . . .. . . . . . . ......... .... . .. . . . .. . ............... ... ...... ............... 87
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IIhistria do mundo no regista evento comparvel, na promoo
da indstria humana, como o de
A Grande Exposio dos Trabalhos
da Indstria de Todas as Naes, de
1851. Um povo extraordinrio convi
dou todas as naes civilizadas para
um festival, para comparar os tra
balhos de percia humana. Foi reali
zado por organismos privados; foi
auto-suficiente e independente de
impostos e do emprego de escravos
que os grandes empreendimentos dos
tempos antigos tinham exigido. Um
prncipe de sabedoria proeminente, de
esprito filosfico, com sagacidade,
com o poder de chefia e grande habi
lidade prtica, colocou-se frente do
empreendimento, e conduziu-o a um
xito retumbante . "
Henry Cole, Comissrio da Exposio de 1851
o ESPRITO DE UMA POCA
11 1 de Maio de 1851 abriu ao pblico, em Londres, A Grande Exposio dos Trabalhos da Indstria de Todas as Naes. Uma
data que ficar na Histria por ser a primeira exposio internacio
nal de indstria. Pela primeira vez na histria do mundo, os homens
das Artes, Cincia e Comrcio foram autorizados pelos seus respecti
vos governos a reunir-se para discutirem e promoverem os objectivos
para os quais as naes civilizadas existem I. Este acontecimento ficaria a dever-se vontade de um prncipe ale
mo, Alberto de Saxe-Coburgo-Gota, casado com a rainha Vitria de
I nglaterra, que teimara em realizar na sua nao adoptiva uma
Exposio com o intuito de apresentar um verdadeiro teste e um
panorama real do nvel de desenvolvimento que a humanidade intei
ra atingiu ... e um novo ponto de partida, de onde todas as naes
podero dirigir os seus renovados esforos 2. A Frana viria a aceitar o repto de realizar a segunda Exposio Internacional em Paris,
em 1855.
O Reino Unido da Gr-Bretanha e da Irlanda, com a Exposio do
Palcio de Cristal de 1851 , inicia o perodo mais ureo da sua hist
ria como a nao mais poderosa do globo, dona e senhora do mais
extenso imprio que o mundo jamais vira e duma frota naval maior
que a do resto do planeta todo junto 3. Uma realidade de que os Ingleses tinham plena conscincia e que lhes dava uma confiana
suprema na sua nao e nas suas instituies. Poder-se- dizer, sem
presuno, que um acontecimento igual a esta Exposio no poderia
ter-se realizado em qualquer perodo anterior, nem talvez por outro
povo que no fosse o nosso 4 , afirma-se no prefcio do Catlogo
Oficial da Exposio. Sem qualquer sinal de modstia, a publicao
enumera as razes de tal afirmao: A confiana amiga que as
outras naes depositam nas nossas instituies, a pelfeita segurana
dos bens, a l iberdade de comrcio e a facilidade de transportes que a
Inglaterra proeminentemente possui, podem ser apresentadas como
as causas que contriburam para a realizao da Exposio em Lon
dres 5.
A Exposio de 1851 , para alm do objectivo de demonstrar a supe
rioridade da indstria do Imprio Britnico tinha objectivos morais -
a famosa moral vitoriana com os seus cnones: a religio, o trabalho,
a paz, o comrcio livre, a responsabilidade cvica dos cidados, todos
pelfeitamente enquadrados na magnfica organizao da sociedade
britnica representada pela sua constituio monrquica. Na cerim-
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nia de abertura, o prncipe Alberto, na qualidade de comissrio da
Exposio, manifestou a esperana de que a primeira impresso
que esta vasta coleco causar ao ser vista ser a de uma profunda
gratido ao Todo-Poderoso pelas bnos que Ele j nos concedeu; e
a segunda, a convico de que elas s podem ser realizadas em pro
poro ajuda que ns estamos preparados a dar um ao outro -
portanto, s pela paz, amor e assistncia mtua, no apenas entre
indivduos, mas entre as naes da Terra 6.
O comissrio rgio no restringia as suas preocupaes morais aos
seus discursos; como presidente da Sociedade para o Melhoramento
das Condies das Classes Trabalhadoras mandou erguer, em frente
da entrada do Palcio de Cristal, uma casa-modelo para as classes
trabalhadoras, no fosse o visitante da Feira esquecer-se da difcil
situao das classes menos afortunadas. O cuidado em conciliar o
progresso moral e o progresso material era uma preocupao no s
deste prncipe, mas da sociedade vitoriana em geral. Qual a vanta
gem do homem ganhar o mundo inteiro se perder a sua alma? 7, perguntava uma das oraes proferidas pelo arcebispo de Canturia na
cerimnia de inaugurao.
Se correcto afirmarmos que o prncipe Alberto se ter inspirado
nas feiras medievais de Francoforte para propor a realizao da pri
meira exposio internacional de indstria, no ser menos correcto
dizer-se que o conceito de exposio nacional de indstria se deve
Frana revolucionria nos anos que se seguiram a 1789. Para alm
de adoptar um novo sistema poltico e outras inmeras alteraes, a
Frana realiza em 1797, ano quinto do novo calendrio republicano,
a primeira exposio industrial do mundo moderno. A Frana da
Repblica procurava, igualmente, uma revoluo na sua economia.
O sucesso da primeira exposio industrial francesa pode ser confir
mado pela realizao de exposies em 1801 , 1802 e 1806; mas foi a
partir de 1819 que estas exposies se realizaram regularmente e
que o seu impacte atingiu um mbito europeu. O pas conhecia
diversas metamOlfoses polticas que iam ficando para a histria - o
Impri o , o regresso dos B ourbons, a d inast ia dos Orlees e a
Segunda Rpublica. Mas a paixo dos Franceses por exposies
industriais venceu todas as peripcias da sua histria.
A exposio francesa de 1844 e, especialmente, a de 1849 causaram
um profundo impacte junto dos meios influentes da sociedade brit
nica. Aps uma visita Exposio de Paris de 1 849, Henry Cole,
membro da direco da Sociedade das Artes, prope que se realize
em Londres uma feira semelhante, em 1851. A proposta foi pronta
mente aceite pelo presidente da Sociedade, o prncipe Alberto.
A questo que Henry Cole lhe colocou a seguir determinou o lugar
na histria da Exposio: Eu perguntei ao prncipe se ele tinha con
siderado que a Exposio deveria ser uma Exposio Nacional ou
Internacional. Os Franceses tinham-se questionado se a sua prpria
Exposio devia ser Internacional, e preferiram que fosse apenas de
mbito nacional. O prncipe reflectiu durante um minuto, e depois
disse: E acrescentou, com
nfase: 8 .
A GR-BRETANHA DA GRANDE EXPOSIO
o PRNCIPE ALBERTO DE SAXE-COBURGO-GOTA
la parte sul de Hyde Park existe um dos monu mentos mais conhecidos de Londres, o Albert Memorial, uma esttua dedica
da a um dos homens mais extraordinrios que viveu na poca vitoria
na, Alberto de Saxe-Coburgo-Gota. Como o seu nome indica, o prn
cipe Alberto no era ingls mas alemo. Uma das facetas menos
conhecidas do Imprio Britnico consiste no facto de um grande
nmero das suas figuras pblicas no serem de origem inglesa. Eis
alguns exemplos flagrantes: Disraeli na poltica, os Warburg ou os
Rothschild nas finanas, e a prpria rainha Vitria - alem dos qua
tro costados. Se verdade que a sociedade britnica deve muito aos
seus cidados de origem estrangeira, no menos verdade o facto de
que estes tudo deram Gr-Bretanha, onde vieram encontrar refgio.
A importncia para a histria de Sua Alteza Real Francisco Alberto
Augusto Carlos Emanuel, duque da Saxnia , prncipe de Saxe
-Coburgo-Gota, mais conhecido apenas por prncipe Alberto, comea
com o seu casamento, com a rainha Vitria, a 10 de Fevereiro de
1840, quando ambos contavam vinte anos de idade. At sua morte
prematura em 1861, o prncipe consorte viria a ser uma das figuras
dominantes da Gr-Bretanha.
Na Idade Mdia, na terra natal do prncipe Alberto realizava-se uma
das feiras mais relevantes da Europa, havendo mesmo quem dissesse
ser a mais importante: A riqueza desta feira tal, e to diversifica
da, que de certa forma engloba todas as outras em si prpria, pare
cendo que elas derivam dela como os rios da sua nascente, e tal
como Roma era antigamente chamada o Compndio do Mundo,
penso que estarei dentro dos l imites se di sser que a Feira de
Francoforte devia ser considerada o eptome de todos os mercados de
todo o mundo I . Como se poder verificar pelo estilo, estas palavras reportam a um autor do sculo XVI, mas no so menos actuais se
nos lembrarmos que Francoforte a cidade escolhida para a sede do
novo Banco Central Europeu. Para o prncipe Alberto a importncia
das feiras, na histria da Alemanha, no era novidade.
A entrada em cena do prncipe na sociedade e na poltica britnicas
esteve repleta de dificuldades. O ttulo de prncipe consorte em nada
ajudava, designando apenas as suas funes de garante da sucesso
na Coroa. A sua mulher, rainha h trs anos por altura do casamen-
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to, mostrou-se inicialmente relutante em deix-lo imiscuir-se nos
assuntos de Estado, chegando ao ponto de no lhe mostrar os do
cumentos oficiais que aguardavam a sua assinatura. Embora esta
situao fosse rapidamente ultrapassada, o prncipe no podia fugir
ao facto de ser estrangeiro, o que levantava algumas resistncias,
sobretudo pela classe poltica, dividida na altura entre l iberais e
conservadores - os primeiros contra a intetferncia da Coroa e os
segundos profundamente desconfiados das influncias do estrangeiro
e dos estrangeiros . A fora de vontade e a capacidade de trabalho
deste jovem prncipe seriam severamente postas prova pela socie
dade britnica.
Ao contrrio da maioria dos membros das famlias reais europeias, o
prncipe Alberto acreditava no progresso industrial, tal como acredi
tava em Deus. Ambos eram inseparveis. A procura deste progresso
material devia ser acompanhada pelo progresso moral, nomeadamen
te na preocupao pelo bem-estar das classes menos afortunadas.
A SOCIEDADE DAS ARTES E HENRY COLE
11m 1843, trs anos aps o seu casamento com a rainha Vitria, o prncipe Alberto torna-se presidente da Sociedade das Artes.
Esta instituio, fundada em 1754, tinha como objectivo incentivar a
aplicao das cincias e das artes indstria; A Sociedade realizara
a sua primeira exposio de artigos manufacturados em 1 760. Em
1847, em carta rgia assinada pela rainha Vitria, a Sociedade passa
a ser conhecida por Real Sociedade das Artes, e realiza a primeira
de trs exposies anuais com o ttulo de Manufacturas de Arte .
Esta exposio inicial conheceu imensas dificuldades para a sua
concretizao. Se no fosse a aco decisiva de um dos membros do
Comit da Real Sociedade, Henry Cole, de quem falaremos mais adi
ante, a Feira de 1 847 teria sido um fracasso total. Cole no esteve
com hesitaes e, soconendo-se das suas relaes de amizade com
um grande nmero de fabricantes, foi aos seus armazns escolher os
artigos necessrios para a realizao da exposio.
Na Gr-Bretanha, exibies deste gnero no eram inditas. Desde
1829, a Royal Dublin Society vinha realizando uma mostra de produ
tos agrcolas, de produtos fabricados e de arte irlandesa, de trs em
trs anos. Em 1845, a Liga contra a Lei dos Cereais, assim se chama
va a instituio, promoveu um Bazar de Manufacturas, em Covent
Garden, para angariao de fundos. A cidade de Birmingham conse
gue mesmo, em 1 849, uma Exposio representativa da indstria
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Henry Cole, depois de visitar uma Exposio Comercial
em Paris, levou a ideia para Londres e conduziu
as negociaes para a construo
do Palcio de Cristal. De obscuro funcionrio pblico
passou a figura polmica da sociedade britnica.
britnica. Mas as feiras britnicas eram, de modo geral e se exceptu
armos a de B irmingham, de alcance reduzido, de carcter regional,
destitudas de apoios oficiais e resultantes de iniciativa privada.
Os industriais ingleses em geral, ao contrrio dos seus congneres
franceses, no consideravam que a realizao de exposies ajudasse
ao desenvolvimento das actividades comerciais. Alguns at se quei
xavam, dizendo que este tipo de actividade s ajudava os concorren
tes a roubarem-lhes as ideias! Em 1845, a Real Sociedade das Artes,
pela mo de Robelt Stephenson, propusera aos fabricantes a realiza
o de uma Exposio de Produtos da Indstria N acional, o que foi
recebido pela classe com indiferena - alguns dos mais eminentes
at se mostraram hostis proposta 1. Um fabricante de chita de Clitheroe, algures na Gr-Bretanha, respondera que a gazeta dos fali
dos e a sepultura no lhe deixavam tempo para exposies! 2 Poder-se- perguntar como que a Gr-Bretanha realiza, em 1851, a
primeira Exposio Internacional do mundo quando, pouco tempo
antes, a maioria dos fabricantes era hostil a este tipo de evento.
A resposta est na repercusso que a Exposio Nacional de Paris,
de 1849, teve na Gr-Bretanha.
Henry Cole foi uma das figuras mais marcantes da sociedade vitoria
na. Se o seu nome hoje praticamente desconhecido, mesmo na
Gr-Bretanha, tem uma razo de ser, pois Henry Cole era funcion
rio pblico e, como todos os bons funcionrios pblicos, prezava a
discrio acima de tudo. O seu cargo no era impOltante - era um
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Charles Dickens, autor de Oliver Twist e David Copperfield, entre outros ttulos, foi uma das vozes que se ergueu contra a realizao da Exposio. Achava que, perante as dificu ldades de grande parte da populao, aquele espectculo de opulncia era ofensivo.
dos seIS chanceleres-assistentes do Arquivo Pblico . Mas Henry
Cole tinha o talento de conseguir atingir as metas que se impunha.
A sua passagem pelo Arquivo Pblico fica assinalada pela maior
reorganizao que a instituio sofreu durante o sculo XIX, tornan
do-o conhecido pela sua extraordinria eficincia. Como no se sen
tisse satisfeito apenas com esta actividade, Cole aproveita o seu
tempo para reorganizar os Correios britnicos . Tarefas ciclpicas
para vrios homens mas que Cole desempenhava com um -vontade
surpreendente.
Mas as qualidades de Cole no ficam por aqui . Nos seus tempos
livres ocupava-se com a edio de publicaes sobre arte, design,
msica e pintura, desempenhando, naturalmente, o lugar de editor.
Era crtico de arte, de msica e de design, escrevia guias, catlogos e
panfletos, sob o pseudnimo de Felix Summerly, e era amigo dos
maiores pensadores da sua poca, entre eles John Stuart Mill.
As actividades deste homem eram mltiplas e a sua infuncia reve
lou-se fundamental na resoluo de medidas em variadssimos secto
res da vida pblica.
Foi igualmente responsvel pela Real Escola de Msica, por uma
escola de culinria e, entre 1853 e 1873, precursor do Victoria & Albert Museum e do Museu de SOlIth Kensington.
Cole no teria s ido uma das mais influentes personalidades da
Exposio de 1851 se, seis anos antes, as suas preocupaes estti
cas no o tivessem levado a desenhar um servio de ch. Sob o pseu-
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dnimo de Felix Summerly, ganharia um dos prmios atribudos pela
Real Sociedade, em 1845. O servio viria a ser fabricado pela fbri
ca Minton, em Stoke, com um enorme sucesso. A Real Sociedade no
se limitou apenas a reconhecer o seu talento na rea do designo
Os seus conhecimentos, energia e habilidade para atingir objectivos
no passaram despercebidos Sociedade que ir encarreg-lo de
escolher os melhores trabalhos de arte decorativa para a atribuio
de prmios . Entre esta nomeao e a sua entrada para a Real
Sociedade foi um passo. O seu gnio organizativo era necessrio para
a realizao da Exposio de Manufactura de Arte, destinada a
aliar a percia mecnica com a arte que o presidente da Sociedade,
o prncipe Alberto, desejava realizar no ano seguinte, em 1847.
Esta primeira exposio, organizada sob a sua orientao, atraiu
mais de vinte mil pessoas. No ano seguinte, a mo segura de Cole
conseguiu chamar setenta mil pessoas segunda exposio. Em
1849, a Terceira Exposio de Manufactura de Arte atingiu o respei
tvel nmero de cem mil visitantes. Em pouco tempo conseguira
transformar em sucesso o que parecia estar condenado ao fracasso.
Mas, nesse ano, as atenes da Europa, incluindo as da Gr
-Bretanha, estavam concentradas em Frana, onde se realizava a
11 fi Exposio de Paris.
AS EXPOSIES NACIONAIS FRANCESAS
1I0ram os Franceses que inventaram as exposies. Inicialmente, os motivos eram meramente comerciais, ou seja, aumentar as
vendas dos produtores. Mas rapidamente as exposies adquiriram
outros motivos para justificar a sua existncia, medida que aumen
tavam de durao e tamanho e, subsequentemente, de importncia.
A primeira exposio do mundo moderno realiza-se em 1 797, no
ptio do Louvre. A iniciativa partiu do marqus d'Aveze, um dos
poucos ar is tocratas que sobreviveu ao perodo da Revoluo
Francesa, e que era um dos responsveis pelas fbricas estatais de
Sevres, Les Gobelins e La Savonnerie. Estas indstrias, que fabrica
vam respectivamente cermica, tapearias e tapetes, enfrentavam um
problema comum s outras indstrias francesas - o escoamento dos
seus produtos. O tradicional campo das exportaes estava larga
mente vedado pelos Ingleses que bloqueavam os portos franceses,
numa guerra econmica sem trguas, atitude que s viria a terminar
em 1815 com a derrota final de Napoleo.
Regressemos a d'Aveze e Exposio de 1797, no Louvre. A origem
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dos produtos era em grande parte das fbricas estatais que o mar
qus administrava. A exposio durou apenas quatro dias e foi um
sucesso, no s em termos comerciais mas tambm em termos de
pblico. Ficou provado que uma mostra comercial deste gnero era
capaz de atrair as atenes das pessoas, mesmo que estas no esti
vessem interessadas em comprar.
O sucesso d a Exposio de 1 797 despertou a cur ios idade de
Franois de Neufchteau, ministro do Interior. Este, juntamente com
d'Aveze, planeou a realizao de uma segunda exposio para o ano
seguinte, 1798, a efectuar em instalaes temporrias no Champ de
Mars. irnico pensar que os dois responsveis pelas exposies da Frana republicana eram aristocratas, ou de apelidos aristocr
ticos.
Ao conceito comercial por detrs da exposio era acrescentado o
conceito de excelncia na produo e na comercializao dos produ
tos. Este segundo conceito da responsabilidade de Neufchteau,
preocupado com o desenvolvimento industrial e com a capacidade da
indstria britnica para exportar produtos a preos sem concorrn
cia. Mesmo o prprio mercado francs, em reas to tradicionais
como a cermica e os txteis, estava sob a ameaa das exportaes
inglesas . Neufchteau expressou os seus obj ectivos ao realizar a
segunda exposio: Os Franceses tm surpreendido a Europa com
a rapidez dos seus feitos militares, e tm que avanar com o mesmo
ardor nos caminhos do comrcio e da paz . . . No meramente um
episdio no esforo contra a indstria inglesa, mas tambm a primei
ra pedra no poderoso edifcio que apenas o tempo pode completar e
que ser anualmente ornamentado pelos esforos conjuntos da inds
tria e do comrcio I .
A Exposio de 1 798 ultrapassou largamente a do ano anterior, com
cento e dez participantes organizados num Templo da Indstria,
concebido pelo mais famoso artista da Frana revolucionria, o pin
tor Louis David. Este artista concebera uma praa temporria, com
sessenta arcos de grandes dimenses, para albergar a exposio.
Outra novidade, que se revelaria de uma popularidade duradoira, e
que se viria a associar s exposies, eram as actividades paralelas
que se organizavam volta do acontecimento. Raro era o dia em que
no havia uma parada militar, um baile, fogo-de-artifcio e um sem
-nmero de outros eventos. Data igualmente desta segunda exposio
a publicao do catlogo oficial com os artigos e os endereos dos
seus fabricantes. Estes, compreenderam logo a sua utilidade apoian
do rapidamente a sua edio com verbas publicitrias. A deciso
mais importante ligada Exposio de 1798 foi a resoluo governa-
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mental de realizar regularmente este gnero de evento, devido
popularidade que a segunda exposio revelara junto dos Franceses.
At 1849, a Frana realizaria dez exposies nacionais. Estas viriam
a aumentar sucessivamente de tamanho e durao, ao ponto de des
pertarem a curiosidade dos outros pases europeus. A Exposio de
1801 atraiu o dobro dos expositores de 1 797. No ano seguinte, 1802,
a Exposio atraiu quinhentos e quarenta industriais e assinala a
fundao da Socit d'Encouragement, por Chaptal, sucessor de
Neufchteau. A partir desse ano, esta Sociedade seria responsvel
pela escolha de jris constitudos para a atribuio de medalhas aos
produtos mais notveis. Uma novidade que se associou s exposies
durante largos anos.
At 1839, as exposies realizavam-se em edifcios j existentes,
como o Louvre, por exemplo. A partir desse ano, as exposies regres
saram definitivamente aos Campos Elsios e s estruturas tempor
de Ma
rias, o que viria igualmente a caracterizar estes acontecimentos. Outra
caracterstica duradoura da Exposio de 1839 foi a sua durao de
seis meses, perodo que seria aceite para as futuras exposies inter
nacionais. Paris no era a nica cidade francesa a realizar exposies,
embora estas fossem certamente as mais importantes. As cidades de
Bordus, Toulouse, Nantes, Lille e Dijon, entre outras, tambm reali
zaram exposies de realce.
O desenvolvimento das exposies francesas era acompanhado com
crescente interesse pelos outros pases da Europa. Os eventos nacio
nais franceses comearam, inclusive, a ser visitados regularmente
por estrangeiros. Este interesse e admirao pela capacidade dos
Gauleses em realizar estes acontecimentos levou algumas cidades
europeias a organizar as suas prprias exposies - Munique,
Estocolmo, Madrid, Moscovo e Berlim, entre outras -, embora, na
verdade, fossem plidas imitaes das exposies francesas.
O nico passo que a Frana no deu no captulo das exposies foi
no sentido da sua internacionalizao. O motivo fcil de explicar: o
apetite voraz com que as exportaes inglesas da poca consumiam
os mercados locais no deixava lugar para os prprios fabricantes
nacionais . Afinal, um dos motivos da realizao das exposies
anunciadas por Neufchteau tinha sido um esforo contra a inds
tria inglesa . Havia entre os Franceses quem argumentasse contra
esta poltica nacional, mas mesmo na Exposio de 1849, que tanto
impacte iria ter na Gr-Bretanha, a deciso dos industriais havia
sido contra a sua abertura aos produtos estrangeiros.
A COMISSO REAL DE 1851
lIIenry Cole, para alm do seu cargo oficial na funo pblica, continuava a editar a revista de design, a assegurar a Terceira
Exposio da Real Sociedade das Artes desse ano, e a planear uma
Exposio de Artes Decorativas do Mundo Antigo e Medieval .
Insatisfeito com apenas estas actividades, planeava desdobrar a
Exposio da Real Sociedade numa mostra da indstria britnica,
a real izar de trs em trs anos - nit idamente inspirado nas
Exposies quinquenais francesas que tanto sucesso estavam a ter.
E ntre os s e u s m lt iplos afazeres , no descura uma v is i ta
Exposio Nacional de Paris, em companhia do seu amigo e fabri
cante do servio de ch, o Sr. Minton. Se Cole j se debatia com os
problemas da realizao duma feira nacional britnica, antes da visi
ta Exposio de Paris, a sua ida capital francesa confirmou essa
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importncia. Cole e Minton verificaram em Paris que a indstria
francesa, embora no to poderosa quanto a britnica, ultrapassava-a
em certas reas. Outra realidade que puderam constatar foi o papel
didctico, a par de uma saudvel rivalidade, que a Exposio de
Paris provocava entre os fabricantes.
A Exposio francesa de 1844 j levara diversos sectores ligados ao
comrcio e indstria a pressionar o Governo britnico para realizar
exposies semelhantes, mas este, na mais bela representao do
laissez-faire, considerava que estas propostas ultrapassavam larga
mente os mbitos da governao. Mesmo em 1848, uma proposta do
prncipe Alberto para a realizao de uma exposio organizada por
uma Comisso Real, esbarrou de encontro hesitao governamen
tal. Doravante ficaria claro que o projecto nunca teria qualquer tipo
de apoio governamental. Esta constatao no desanimaria os impul
sionadores de 1851 , mu i to pelo contrrio. Uma grande parte do
sucesso a que a instituio desta Exposio tem assistido , escreveu
Cole pode ser atribuda sua independncia do Governo; pode ser
que fi vanglria dos nossos concidados que a Exposio originou, foi conduzida e completada independenle de qualquer ti po de ajuda
governamental, excepto a sua sanol. Uma poca realmente dife
renle da nossa.
Ch ega d o da Exposio de Paris , Co le v is i ta o presidente da
Sociedade para lhe transmitir as impresses da vi sita e a ideia de
realizar uma Exposio semelhante em 1851. O acordo do prncipe
Alberto, como presidente da Sociedade e como segunda figura da
Gr-Bretanha, era vital. A deciso do prncipe ele tornar a Exposio
Internacional deve-se tanto ao relatrio que Cole apresentou ele Paris
como sua prpria sagacidade . O prncipe Alberto conclura que
havia vantagens, mesmo nas reas onele a indstria britnica estava
menos desenvolvida, em abrir a Exposio parlicipao estrangei-
1'a. Para o esprito liberal britnico, a competio industrial era con
siderada saudvel.
21
Mesmo antes da deciso do prncipe Alberto em tornar a Exposio
de 1851 num projecto internacional, Hemy Cole debatera-se com
dois problemas fundamentais para a sua realizao. O primeiro era o
das patentes . Os fabricantes consideravam que os produtos que
punham no mercado eram pouco ou nada protegidos da concorrncia
menos escrupulosa. Na ptica dos mais receosos, a realizao de
exposies apenas exacerbava o problema, permitindo aos seus
rivais copiarem as invenes que eventualmente estariam em expo
sio. Mesmo antes da sua partida para Paris, Cole enviara uma
delegao ao Ministrio do Comrcio para resolver a questo. Esta
medida levaria o Parlamento britnico a emitir legislao que prote
gia os direitos de patente dos fabricantes.
O segundo problema com que Cole se debatia era o de espao.
As instalaes da Real Sociedade tinham-se revelado exguas em
1849. Cole conseguira licena para utilizar o ptio de um dos edif
cios pblicos, Somerset House. Mas se esta soluo j em si era de
recurso, com a deciso do prncipe Alberto em tornar a Exposio
internacional, o local era manifestamente inadequado. sugesto de Leicester Square por parte do monarca, Cole sugeriria Hyde Parle.
Era um dos locais com espao no centro de Londres - no s todo o
empreendimento seria enaltecido pela localizao privilegiada, mas
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Vista de Paris, cidade onde se realizavam frequentemente Exposies Comerciais.
o acesso seria igualmente facilitado. A soluo era de uma eficaz
simplicidade.
O mbito da Exposio Internacional ultrapassava as competncias da Real Sociedade das Artes. O seu prprio presidente fora o primeiro a reconhecer esta realidade no momento em que decidiu
admitir a participao estrangeira. Partiu do prncipe a sugesto que
deveria ser criada uma Comisso Real para organizar o grande
evento. As vantagens eram bvias. A Comisso Real seria indepen
dente de qualquer organismo estatal ou local, tal como todas as
exposies que at ento se tinham organizado na Gr-Bretanha.
A sociedade britnica da era da Revoluo Industrial considerava
que o Estado, e mesmo as autoridades municipais, deviam interferir
o mnimo possvel na sociedade civil.
Por outro lado, o reconhecimento de uma Comisso Real conferia
uma dignidade e uma importncia ao organismo de molde a que este
pudesse fazer vingar as suas posies j unto do Governo e de outras
entidades, uma posio sufic ientemente elevada aos olhos do
pblico . . . longe do risco de ser influenciado pelos sentimentos dos
concorrentes para colocar fora de hiptese qualquer acusao de
parcialidade ou influncia indevida 2. O facto do futuro presidente da Comisso ser o marido da rainha, e o seu futuro vice-presidente,
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o marqus de Granville, ser membro do Governo, no retira a inde
pendncia jurdica e prtica do proposto organismo.
A constituio da Comisso Real seria um autntico Wha's wha da
sociedade britnica - para alm do prncipe Alberto e do marqus
de Granville, constavam os nomes de John Russell, primeiro-minis
tro da poca; Robert Peel, ex-primeiro-ministro e um dos homens
mais influentes e reconhecidos da poca e um grande entusiasta da
Exposio; William Gladstone, membro do Governo e futuro primei
ro-ministro; o pensador Richard Cobden; o arquitecto Charles Barry,
responsvel pela reconstruo do Parlamento britnico que ardera
uns anos antes; e, finalmente, William Cubitt, presidente do Instituto
de Engenheiros Civis.
Entre os meses de Agosto e Setembro de 1849, Henry Cole visita
Glasgow, Belfast, Dublin, Huddersfield, Bradford, Leeds, Sheffield,
Manchester e Liverpool, no descurando as inmeras cidades do
algodo ou da cermica. Alm dos industriais, Cole no se esquece
de visitar igualmente as autoridades locais a fim de angariar o mxi
mo de apoios para o projecto. Em Londres, obtm o apoio da podero
sssima Companhia Inglesa das ndias Orientais.
A 7 de Outubro, H. Cole apresenta o seu relatrio, em Mansion House, perante o presidente da Cmara de Londres e mais de cem
capitalistas. A apresentao convincente e Cole no despreza
nenhum pormenor para garantir o apoio dos presentes. A concluso
do relatrio apresentava o mapa industrial de Sua Majestade a favor
do evento. J haviam sido nomeados comissrios locais e perto de
cinco mil pessoas influentes tinham-se registado como promotores
da Exposio 3 . E Cole no quis deixar de garantir o sucesso junto
do pblico londrino dessa noite. Ao terminar o seu relatrio sobre a
provncia, Cole apontou os benefcios que a realizao da Exposio
traria para a cidade de Londres. Os aplausos assinalaram o apoio
entusiasmado da assistncia. O seu relatrio constitui pea funda
mental para o Governo apoiar a consti tuio da Comisso Real .
Formalmente , este organismo reunia pela primeira vez a 11 de
Janeiro de 1850, embora na verdade j tivesse iniciado os seus tra
balhos no ano anterior.
A Comisso Executiva da Comisso Real reuniu, de facto, trinta e
nove vezes em 1849 sob a presidncia inicial do engenheiro Robert
Stephenson e, posteriormente, do coronel de Engenharia Reid.
Inevitavelmente, Henry Cole fazia parte deste organismo - tendo
obtido entretanto licena sem vencimento da funo pblica. A pri
meira deliberao importante diz respeito deciso de financiar a
Exposio por subscrio pblica.
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A rainha e o prncipe Alberto foram os primeiros a dar o exemplo
com contribuies respectivas de mil e de quinhentas libras. Uma
firma de construo de caminhos-de-ferro foi a primeira entidade
privada a avanar com uma garantia bancria de cinquenta mil
libras. Em finais de 1850, as garantias bancrias j tinham ultrapas
sado as duzentas e cinquenta mil libras. A opo da Comisso por
uma subscrio pblica implicou a denncia do contrato com a firma
Munday, que adiantara vinte mil libras para um fundo de prmios.
Ciente de que qualquer atitude menos correcta nesta denncia teria
repercusses negativas, a Comisso Executiva nomeou um dos seus
membros, Robert Stephenson, para arbitrar a compensao a atribuir
firma Munday. Esta compensao foi de cinco mil cento e vinte
libras - uma boa recompensa, visto que o investimento se realizara
pouco tempo antes.
A segunda medida da Comisso Executiva a realar foi a criao de
comisses locais e estrangeiras. Para as primeiras, foram contactados
os municpios no sentido de incentivarem a criao destas comis
ses. Uma novidade na Gr-Bretanha visto que, at data, todas as
exposies realizadas no haviam procurado o auxlio das autorida
des locais e, mais uma vez, os contactos desenvolvidos por Cole no
seu priplo pelas Ilhas Britnicas vieram a revelar-se importantes .
Os convites aos pases estrangeiros para organizarem comisses
nacionais foram da responsabilidade do ministro dos Negcios
Estrangeiros britnico, Lord Palmerston.
Para assinalar o apoio pblico dos mais importantes municpios da
Gr-Bretanha realizao da Exposio, o presidente da Cmara de
Londres organiza um jantar, a 21 de Maro de 1850, na sua residn
cia oficial - Mansion House -, decorada para o efeito com brases
e exemplares da produo nacional. Para alm do prncipe Alberto e
da Comisso assistem o primeiro-ministro, o arcebispo de Canturia,
o COlpo diplomtico e mais de cem presidentes de Cmara.
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A COMISSO PARA O EDIFCIO
ms organizadores da Exposio esperavam ser esta a maior de - todas j realizadas. A indstria britnica dos meados do sculo XIX era a mais poderosa do mundo, e a abertura participao
estrangeira garantia, desde logo, este optimismo, ao mesmo tempo
que colocava problemas de espao. Os expositores britnicos pedi
ram perto de quarenta mil metros quadrados de espao - a Catedral
de So Paulo em Londres multiplicada umas vinte vezes!
Esta pretenso no podia ser satisfeita, mas explica bem o problema
enfrentado pela Comisso encarregue de escolher o edifcio para
albergar a exposio. O prazo era curto, e a Comisso deu apenas
trs semanas para a entrega dos proj ectos. A principal exigncia
desta Comisso era que o edifcio a ser construdo viesse a cobrir
uma rea de oitenta mil metros quadrados, que fosse desmontvel
aps o encerramento e que ficasse localizado em frente a Prince's
Gate, em Hyde Parle
Foram apresentados duzentos e quarenta e cinco projectos. Destes, a \?r 7. , .... ,.
:0.
2 7
Comisso distinguiu sessenta e oito, com uma meno honrosa, e
mais dezoito com uma alta distino honrosa - curiosamente, des
tes, doze eram da responsabilidade de arquitectos franceses. Mas o
que queria dizer esta Comisso com meno honrosa e alta dis
tino honrosa ? Muito simplesmente que no escolhia nenhum pro
jecto. Para se explicar esta concluso, que na opinio de um autor
era de uma honestidade muito duvidosa 9 , teremos que avaliar a
Comisso para o edifcio. A Comisso era composta por trs dos mais
eminentes arquitectos da altura, o j mencionado Charles Barry, res
ponsvel pela reconstruo do Parlamento; o Sr. Donaldson, profes
sor de Arqui tectura da Uni versi ty College da Uni versidade de
Londres e Charles Cockerell. Os engenheiros eram representados por
William Cubitt, o j referido presidente da Ordem dos Engenheiros
Civis, que presidia igualmente a esta Comisso, Robert Stephenson
e Isambard Kingdom Brunel, dois dos engenheiros mais reputados da
poca, responsveis por inmeras pontes e caminhos-de-ferro . Este
ltimo, em particular, desenhara um dos primeiros paquetes a vapor,
o Great Eastern, a ponte suspensa de Clifton em Bristol - uma das
estruturas mais elegantes que resta desse perodo -, para
alm de inmeras armas de fogo, portos e caminhos-de-
-ferro.
Rejeitando todas as propostas que lhe foram
submetidas, a Comisso decidiu chamar
a si prpria a tarefa de desenhar o
edifcio para albergar a Exposio.
A soluo que apresentou provocou
a ira dos Ingleses . O duque de
B u c c l e u c h e o m a r q u s de
Ellesmere, que faziam igualmente
parte desta Comisso, aristocratas
pouco ou nada entendidos em
assuntos de volumetria , tiveram
q u e sofrer as c o n s e q u n c i a s
pblicas d e u m projecto em gran
de parte ela responsabilidade de
Brunel. O problema era a propos
ta de Brunel ser desmedida. Este
pro p u n h a u m e d if c i o q u a tro
vezes maior em comprimento e
duas vezes a largura da Catedral de
So Paulo, com uma cpula gigantes
ca de ferro . Poeler-se- adiantar que
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seriam necessrios quinze milhes de tijolos para a sua construo.
Pondo de lado o aspecto esttico, que levantava srias reservas, o
edifcio era tudo menos uma estrutura temporria, pois o custo da
sua demolio equivalia exactamente ao preo da sua construo.
E nem mesmo os materiais utilizados poderiam ser revendidos para
aligeirar o investimento. E um outro factor jogava a favor da recusa
do projecto - estava-se em finais de Julho de 1850, a nove meses
da abertura da Exposio.
OS OPOSITORES
10m a celeuma suscitada pelo proj ecto de Brunel, e dada a envergardura do empreendimento, a Exposio teve os seus opo
sitores ferozes. Os motivos variavam - uns vlidos, outros menos.
Pol i t i c a mente , o pr imeiro lugar dever ser atribudo a Lord
Brougham, um ilustre aristocrata que fora um dos principais apoian
tes da reforma parlamentar de 1832, mas em 1850 estava ultrapassa
do no mundo da poltica. Mas, se tivermos que atribuir o prmio de
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oposio Exposio, este iria inegavelmente para o coronel Charles
de Laet Waldo Sibthorp, na altura com 67 anos, ilustre membro da
Cmara dos Comuns pelo crculo de Lincoln. Sibthorp era contra
tudo o que entendia serem medidas liberais . Concepes polti
cas corriam pela sua mente numa gloriosa confuso: mas, no fundo,
todas se reduziam aos muitos aspectos do declnio da Inglaterra por
causa do comrcio livre I . As consequncias da Exposio de 1851
para Sibthorp seriam terrveis - a Gr-Bretanha ver-se-ia inundada
de produtos estrangeiros baratos, sociedades secretas viriam assassi
nar a rainha, Londres seria invadida por ladres e anarquistas, os
papistas provocariam a idolatria, o cisma, a peste e as doenas ve
nreas. O culpado, para este coronel, era bvio - o prncipe
alemo .
Por incrvel que parea, o ilustre membro pelo crculo de Lincoln
levantava-se na Cmara dos Comuns, e dirigindo-se ao Governo, per
guntava: H estrangeiros a alugar casas em Kensington (perto do
futuro local da Exposio em Hyde Park) para bordis, o que que o
Governo de Sua Maj estade tenciona fazer? Infelizmente para os
opositores da Exposio, as figuras ridculas de Sibthorp, se algum
efeito causavam, era o de enfraquecer as suas posies. Todos os
patifes actualmente espalhados pelo pas sero atrados a Hyde Parle
E, sendo assim, aconselharia s pessoas que residem perto do Park a
tomarem todo o cuidado com as sua colheres e g31fos de prata, e tam
bm com as suas criadas 2 . . . Pouco tempo antes, o coronel opusera-se igualmente Lei das Bibliotecas Pblicas, com a lgica irrefut
vel de que ele prprio nunca tinha gostado de ler 3 . Os Britnicos prezam as suas excentricidades. Enquanto em Portugal,
por exemplo, a palavra tem por vezes conotaes pejorativas, no reino
de Sua Majestade a excentricidade estimada e considerada parte do
carcter nacional. A principal objeco que a opinio pblica tinha
contra a escolha de Hyde Park, como local de exposio, para alm
do edifcio de Brunel, era o facto de se terem que cortar meia dzia
de olmeiros crescidos, e dez de tamanho mais pequeno! Um dos raros
momentos em que Sibthorp conseguiu algum apoio nos Comuns, foi
quando se referiu a estes olmeiros: Os comissrios vieram como um
ladro durante a noite e cortaram estas lindas rvores. Um cavalheiro
que vivia perto do Park, e pagava pela sua casa cento e dez libras de
renda por ano, contou-me que estava a admirar as rvores , uma
noite, antes de ir para a cama, e quando de manh se levantou para
fazer a barba elas tinham desaparecido