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EXPECTATIVAS SOBRE O PLANEJAMENTO DE CARREIRA: UMA EXPERIÊNCIA NA UNIVERSIDADE
Maria Sara de Lima Dias1 & Dulce Helena Penna Soares2
RESUMO Este trabalho consiste em um relato de experiência, necessário para um debate sobre o planejamento de carreira como preparo dos formandos para o processo de transição entre a universidade e o mercado de trabalho. Enfoca o levantamento de expectativa dos universitários matriculados na disciplina de Orientação e Planejamento de Carreira (OPC) desenvolvida em uma universidade federal. A disciplina tem como objetivos identificar valores, interesses, habilidades e prioridades individuais; refletir sobre as transformações que estão ocorrendo no mundo do trabalho e as influências e exigências na vida pessoal e profissional do trabalhador; planejar e preparar meios de organização na busca de uma colocação no mercado de trabalho. Configura-se também como uma possibilidade de auxiliar os formando a enfrentarem a ansiedade e o medo frente à transição para este mercado altamente competitivo. A partir da análise da narrativa obtida através da realização do cartaz das expectativas, configuraram-se cinco categorias empíricas: expectativas quanto à disciplina e visões de futuro, preocupações com a formação profissional; oportunidades no mercado de trabalho e o primeiro emprego; reflexões sobre formatura e as preocupações com o tempo. Estas categorias são discutidas à luz do referencial teórico apresentado.
Palavras-chave: carreira; sentidos do trabalho; formação profissional; função na universidade; transição universidade mundo do trabalho.
EXPECTATIONS ON CAREER PLANNING: AN EXPERIMENT AT THE UNIVERSITY
ABSTRACT This work consists of an experiment report, necessary for a debate on career planning as undergraduate students’ preparation for the process of transition from academic life to the work market. It focuses on surveying the college student expectation enrolled in the course of Career Planning and Guidance developed in a federal university. The course has the purpose of identifying individual values, interests, abilities and priorities; reflecting on the transformations occurring in the world of work and the influences and requirements in the personal and professional life of the worker; planning and preparing forms of organization in search of a placement in the work market. It also represents a possibility of assisting the graduating students whenever facing the anguish, anxiety and fear of transition to such highly competitive market. From the assessment of the narrative obtained through building an expectation chart, five empirical categories are outlined: expectations about discipline and views of the future, concerns around professional background, work market opportunities and first job; reflections on graduation and concerns with time. These categories are discussed in the light of the theoretical references presented.
Key-words: career; meanings of work; professional background; function of the university; transition from university to world of work.
1 Doutoranda do Programa de Psicologia da Universidade Federal de Santa Catarina. Mestre em Psicologia pela Universidade Federal do Paraná. Psicóloga especialista em dinâmica de grupos e gestão de Recursos Humanos. Docente da disciplina de Planejamento de Carreira pela UFSC 2 Psicóloga, Doutora em Psicologia Clínica pela Universidade de Strasbourg na França. Docente do Curso de Graduação e do Programa de Pós-Graduação em Psicologia da UFSC. Pesquisadora Produtividade PQ CNPq, 2006/2009. Coordenadora do LIOP – Laboratório de Informação e Orientação Profissional. Conselheira da ABOP – Associação Brasileira de Orientadores Profissionais. Publicou vários livros e artigos científicos no campo da orientação profissional
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EXPECTATIVAS SOBRE O PLANEJAMENTO DE CARREIRA: UMA EXPERIÊNCIA NA UNIVERSIDADE
Maria Sara de Lima Dias & Dulce Helena Penna Soares
Introdução
A sociedade organizada sob o regime capitalista apresenta uma grande
complexidade no que se refere ao processo de orientação do sujeito para o planejamento
de uma carreira profissional e de sua inserção produtiva neste coletivo. Diante de um
mercado de trabalho (MT) instável, muitas carreiras desaparecem, às vezes devido ao
desenvolvimento de novas tecnologias ou por mudanças em seu processo produtivo. O
estudante recém formando tem a expectativa de trabalhar na área na qual se formou, e,
muitas vezes, por diferentes impossibilidades, precisa buscar atuar em outra diferente da
sua formação original.
O sentido do trabalho tem adquirido novas configurações frente aos ditames do
mercado, deixando de se revelar como algo que dá sentido a uma vida futura, para
representar meramente uma forma de adquirir bens de consumo na sociedade. O
trabalhador torna-se cada vez mais uma mercadoria para produzir outras mercadorias. O
trabalho é percebido como uma forma de se obter dinheiro, portanto o seu sentido está
fortemente vinculado ao valor deste na sociedade de consumo.
É uma difícil decisão para o aluno escolher uma carreira futura na qual ele
encontre uma satisfação pessoal, desenvolvendo um trabalho com sentido e retorno
financeiro, compatível com seus esforços e qualificação profissional. Há pouco tempo
atrás, a decisão por um curso superior era apenas um ato do sujeito, com uma
expectativa em torno de uma carreira orientada por modelos de profissionais bem
sucedidos, e, portanto bem remunerados.
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O desenvolvimento da orientação profissional (OP) e do atendimento
psicológico neste processo de escolha tem demonstrado uma necessidade do sujeito em
relacionar seu curso superior com as ofertas de trabalho. Na escolha de uma profissão
de nível superior, é importante não só auxiliar o sujeito a identificar uma área que lhe
traga satisfação pessoal, como orientar para que esta profissão também lhe permita uma
inserção ocupacional com remuneração adequada para sua sobrevivência.
Pretendemos discutir o necessário resgate do papel da universidade na
intersecção entre o curso ofertado pela instituição e a sua real conexão com as ofertas e
demandas de trabalho real. É necessário atender aos jovens formandos, na sua fase de
enfrentamento com o futuro, bem como repensar a função da universidade, que entrega
para este mercado milhares de jovens anualmente.
Dentro das instituições de ensino superior é importante desmistificar a questão
do trabalho e da futura carreira como um profissional. Deve haver uma preocupação
com seus egressos e suas expectativas, pois muitos alunos, após a formatura, na busca
empregos, se percebem fora das qualificações e requisitos exigidos. Estar fora do perfil
solicitado pode significar não só um mal estar gerado com a perspectiva do desemprego,
mas também a possibilidade de aceitação do subemprego, da inserção sob condições
precárias ou de trabalhar na informalidade. É indispensável aos jovens universitários,
nesta fase de transição, pensar sobre o futuro e realizar um planejamento de carreira
torna-se cada vez mais necessário.
Revendo o tema de carreira, frequentemente debatido por autores como Chanlat
(1996), Sennet (1999) Martins (2001), Schein (1993), Dutra (1992) e Lisboa & Soares
(2000), pode-se afirmar que ao longo do tempo o conceito se modifica. Carreira é um
termo de origem inglesa que significa estrada para carruagens, aplicada ao trabalho é
entendido como um percurso das atividades econômicas desenvolvidas ao longo da vida
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do sujeito. Mesmo nas sociedades mais industrializadas a questão do emprego para os
jovens é inquietante, portanto o percurso profissional e a carreira dependerá das
possibilidades profissionais ofertadas em determinado contexto.
Parece um paradoxo pensar em carreira e OP considerando a falta de empregos,
o declínio da ética no trabalho e a probabilidade de um horizonte profissional cada vez
mais abreviado. Porém, ao apreciar os sistemas de formação acadêmica em crise e a alta
demanda de jovens dominados por preocupações quanto ao seu futuro nos parece
essencial que esta temática seja exposta ao debate.
Os pressupostos teóricos da OP trabalham com a concepção de sujeito, como
autor de sua própria vida, isto é, como ser capaz de realizar o seu projeto de vida, onde
o escolher está entre aceitar ou não uma escolha dada por uma diversidade de
circunstâncias. “O homem pode escolher dentro de um leque de opções oferecidas pelo
sistema econômico e delimitadas pela classe social a qual pertence e pelas influências
familiares. Portanto, neste espaço se insere a OP” (Soares, 2002:40). Escolha, neste
contexto, não se refere à negação das determinações objetivas da existência do sujeito
antes remete à possibilidade de superação dos condicionamentos sejam eles
econômicos, familiares, políticos ou sociais que são históricos e contextuais.
Como professoras de uma universidade pública e gratuita, ao trabalhar com
jovens em final de curso, de diferentes graduações, constatamos um sentimento da
angustia frente à formatura e a transição para o mundo do trabalho. Para os formandos,
é uma época de reflexões sobre o que fazer, a partir do agora: se entrar no mundo do
trabalho ou seguir se profissionalizando através de novos cursos de pós-graduação. Se
for procurar um emprego aparecem dúvidas: como montar seu currículo, como se
apresentar a uma entrevista de emprego, onde procurar uma vaga. Se o sonho era de ser
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um profissional, este está começando a se realizar, no entanto para isso é preciso sair em
busca de oportunidades e estratégias de ação que os auxiliem nesta fase de transição.
Os valores que inspiraram os primeiros grandes planos de carreira, há mais de 50
anos, já foram em muito ultrapassados. São menos enfáticas as idéias de contribuir para
o progresso da empresa e da nação e de sentir-se socialmente mais responsável e útil.
Hoje, as expectativas de preservar a individualidade, obter satisfação no trabalho, se
diferenciar de outros pelos bens materiais, tendem a prevalecer quando o tema é
carreira. Portanto “não é fácil resgatar o sentido de pertencimento de classe, que o
capital e suas formas de dominação (inclusive a decisiva esfera da cultura) procuram
mascarar e nublar” (Antunes, 2005: 205).
Preocupados em romper a barreira entre universidade e o MT, permeiam o
universo do jovem, questões de identidade, frente à necessidade de responder ao “quem
é você?” A real oportunidade de poder responder dizendo o que faz da vida, sendo um
profissional e atuando em sua área de formação impõe um desafio para o jovem.
Movidas pela experiência de acompanhar a ansiedade destes jovens propomos o
levantamento de expectativas dos universitários que buscam a disciplina Orientação e
Planejamento de Carreira (OPC). Pretendemos compreender este momento de vida dos
formandos em sua inserção no mundo do trabalho, e poder auxiliá-los nas possíveis
decisões desta fase transições.
A proposta da disciplina de Orientação e Planejamento de Carreira (OPC)
Num mundo com uma economia em crescente globalização, com alterações
profundas nos sistemas de valores individuais, familiares e sociais, as carreiras tendem a
caracterizar-se pela incerteza, imprevisibilidade e insegurança. As novas dinâmicas do
MT ditam as regras da profissionalização, e novos cursos são criados nas universidades,
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representando novas áreas de conhecimento e possibilidades de atuação. Para auxiliar a
pensar estratégias possíveis de inserção profissional, foi criada a disciplina OPC.
Considerada como inovadora no contexto universitário, a disciplina “Temas de
Psicologia: Orientação e Planejamento de Carreira” foi criada no Departamento de
Psicologia pelo LIOP – Laboratório de Informação e Orientação Profissional em
parceria com a Central de Estágio de uma universidade pública e gratuita, com o
objetivo de melhor preparar os alunos de graduação para a entrada no MT.
Originou-se de um antigo projeto denominado PAF - Programa de Apoio ao
Formando, quando foi constatada a demanda dos alunos, dos mais variados cursos que
buscavam informações sobre como se apresentar a uma entrevista de estágio, elaborar
um currículo, e iniciar a sua trajetória profissional. A disciplina tem sido ofertada em
nossa instituição desde o ano de 2003.
A disciplina apresenta dois créditos semanais, é optativa para todas as
graduações, tendo como requisito de freqüência às aulas os alunos estarem cursando
pelo menos a metade do curso escolhido, a fim de já estarem vivenciando este processo
de transição. Em sua maioria já estão na busca de estágios e na preparação para a
formatura.
Tem como objetivos refletir sobre as transformações do mundo do trabalho, as
influências e exigências na vida pessoal e profissional do trabalhador, identificar
valores, interesses, habilidades e prioridades individuais, desenvolver metas
profissionais a partir do conhecimento de sua realidade; planejar um esquema integrado
de ações e providências para atingir o futuro almejado.
O conteúdo programático divide-se em quatro eixos temáticos, a saber:
Informação Profissional, Autoconhecimento, Auto-Avaliação e Planejamento
Profissional. Caracteriza-se como um processo teórico e vivencial, onde cada aluno é
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estimulado à reflexão, ao autoconhecimento e à busca de respostas próprias às suas
questões profissionais. Ao final é solicitado um Planejamento de Carreira escrito e
individual que deve conter: missão e metas profissionais de curto, médio e longos
prazos, determinando as etapas das ações, os meios para alcançá-los e desenvolvendo
um cronograma do processo.
Assim a disciplina OPC abordando temas como a relação entre trabalho e
emprego, o currículo profissional, processos de recrutamento e seleção de pessoal, se
compromete com os egressos em explicitar e debater novas formas de trabalho e gestão
de seu planejamento de carreira. A disciplina tem muitas atividades grupais, e funciona
como uma oficina, ministrada nas salas de Dinâmica de Grupo do curso de psicologia.
Neste artigo, apresentaremos um levantamento sobre qual a expectativa dos estudantes
que se matriculam na mesma.
Conhecendo qual a expectativa dos alunos
O presente levantamento realizado não direciona a disciplina, mas traz
elementos para uma melhor compreensão das expectativas dos alunos e na medida do
possível estas vão sendo atendidas nas atividades e conteúdos desenvolvidos no
decorrer do semestre.
Para conhecer a expectativa dos alunos optou-se por desenvolver a técnica
“Cartaz das Expectativas”, descrita em Soares (1993:42). Esta técnica se insere na
metodologia qualitativa e incorpora a questão do significado e da intencionalidade como
inerentes aos atos, às relações e às estruturas sociais. O estudo qualitativo pretende
apreender a totalidade coletada visando conhecer a demanda dos formandos que buscam
a disciplina.
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Desta forma, questionamos as preocupações dos jovens sobre o planejamento de
suas carreiras. Que sentidos estes dão a esta fase de transição entre a universidade e o
MT. Para atingir este objetivo, não houve seleção prévia dos participantes, todos os
alunos matriculados na disciplina foram convidados a colaborarem com este
levantamento.
O perfil dos participantes é composto por alunos dos cursos de: enfermagem,
jornalismo, educação física, psicologia, farmácia, nutrição, engenharia civil, mecânica,
química, sanitária, alimentos, elétrica, arquitetura, pedagogia, contábeis, administração,
automação, economia e serviço social, perfazendo um total de cento e vinte alunos
distribuídos em seis turmas.
O procedimento de coleta das informações foi realizado no primeiro dia de aula,
com cada uma das seis turmas da disciplina. Solicitou-se que, em grupos de quatro a
seis alunos, produzissem um cartaz onde representassem através de figuras e palavras
recortadas de revistas, quais as suas expectativas em relação à disciplina OPC,
totalizando vinte e quatro cartazes.
A proposta de um ambiente receptivo e de uma técnica de grupo, além do fato
dos alunos serem de vários cursos diferentes e se encontrarem para partilham seus
interesses, medos e expectativas em relação ao futuro, permitiu manter o foco da
pesquisa. Conforme Schütze (apud Bauer & Gaskel, 2002), a produção das narrativas,
pretende criar uma situação que encoraje e estimule o jovem falar sobre sua vivência
enquanto formando de um curso superior, e foi isto que aconteceu.
Neste estudo analisaremos somente as palavras e frases nomeadas nos cartazes,
consideradas como narrativas. Não utilizaremos as figuras, embora também trouxessem
uma riqueza de imagens, pois não foi possível anotar todos os significados mencionados
pelo grupo relativos à produção das mesmas.
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Na análise das informações, foram desenvolvidos os seguintes passos: leitura
inicial do material coletado, classificação das frases relativas às expectativas dos
formandos, releitura do material coletado até a emergência de categorias empíricas,
análise do material partindo da leitura do núcleo de significados mais recorrentes e
análise "final", resultado de reflexões, articulando o trabalho empírico com algumas
inferências teórico-conceituais.
Considerando a opção teórico-metodológica adotada, apresentamos a seguir a
conceituação das cinco categorias empíricas eleitas para este estudo: expectativas
quanto à disciplina e visões de futuro, preocupações com a formação profissional;
oportunidades no MT e o primeiro emprego; reflexões sobre a formatura e as
preocupações com o tempo. Ressaltamos o esforço de integrar essas categorias para
apreender a totalidade sócio-histórica do sujeito.
Dimensões de analise e discussão
A narrativa do jovem sobre sua vivência na transição entre a universidade e o
mundo do trabalho fez emergir dimensões nas quais esses atores se integram a um
contexto micro e macrossocial, e determinam o seu modo de pensar, sentir e agir na e
para a vida. Na realidade estar conectado a um grupo de alunos com objetivo
semelhantes, possibilita estabelecer novas trocas afetivas com colegas de outros cursos
pertencentes ao mesmo contexto universitário.
Igual importância foi dada às categorias institucionais, determinando as
"posições objetivas" (escolares, profissionais...), e às categorias de linguagem utilizadas
pelos sujeitos, para tomar a sério falas sobre si mesmo vindo de um sujeito incitado "a
se narrar" e entrando num diálogo particular, verdadeiro "exercício espiritual" segundo
Dubar (1998). Esta narrativa nos permitiu compreender como um momento de
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reprodução e ao mesmo tempo de transformação da realidade social na qual ele constrói
o seu fazer cotidiano.
1) Expectativas quanto à disciplina e visões de futuro
Representam preocupações e expectativas, o que leva os jovens a buscarem a
disciplina. Demonstrando os tipos de discursos construídos no contexto universitário e
as visões do futuro originadas dos cursos diferentes cursos de graduação.
Partindo da produção textual dos alunos, percebemos que os processos
identitários de acordo com Dubar (1998), ou posições de sujeito podem ser apreendidos
a partir de suas escritas, nas quais os formandos se justificam e se posicionam em
relação em relação as suas expectativas, tal como expresso nas falas: a posição que você
alcança no mercado, tem muito a ver com a energia que te impulsiona. Esta narrativa
nos remete a uma valorização do empenho individual, a energia que te impulsiona, para
atingir seus objetivos e metas profissionais independente do contexto macro-social. O
sucesso é atingido pelo empenho e dedicação do sujeito, único responsável por seu
sucesso ou fracasso profissional.
Então, a expectativa de ter sucesso faz com que o aluno se interesse em buscar a
disciplina OPC, como expresso nestas narrativas: orientados para o futuro. É o maior
projeto do Brasil. Percebe-se uma preocupação crescente quanto ao futuro profissional,
sendo este um dos fatores que motivam os alunos a buscarem orientação, e a construção
de um projeto de futuro voltado para obtenção do sucesso.
Suas narrativas também revelam medo: não tenho o direito de errar. A gente
acha que chegou à hora de decidirmos nosso futuro. Manual de sobrevivência. A
disciplina OPC é vista pelos alunos como uma orientação que lhes permita tomar
decisões sem medo, ou pelo menos com menor grau de ansiedade. Se a carreira era vista
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no início do século como um caminho a trilhar e a seguir, hoje quando chega à hora de
decidir seu futuro profissional, o jovem precisa de um verdadeiro manual de
sobrevivência. Seu interesse é que o curso lhe permita atingir este objetivo.
As alterações no processo produtivo trouxeram conseqüências objetivas “ (...) o
processo produtivo trouxe o planejamento, a organização, o controle do trabalho, mas só
encontra a sua energia na geração incontrolável de mercadorias. O mundo se tornou o
mundo das mercadorias, onde todas as esferas da vida se vêem penetradas pelas
necessidades, “provenham elas do estômago ou da mente” (Cruz, 1999: 177).
A disciplina OPC aparece como uma possível solução para os problemas dos
jovens formandos, quase como uma garantia de seu futuro profissional: você pode:
garanta seu futuro. Programe a sua viagem. Passaporte. Tranqüilidade no lugar de
problemas. E difícil chegar lá sem determinação. Mas é impossível chegar lá sozinho.
Caminho para a vitória. É hora de dialogar. Ganhar equilíbrio. Expressões como
buscar tranqüilidade, equilíbrio e segurança são constantes, como alternativa para fugir
a sensação de insegurança ou desfiliação social, segundo Castel (1998). Uma sensação
de estar sozinho, ou isolado da sociedade como um todo, “um sentimento de ruptura das
redes de integração primárias dadas a partir de um desatrelamento com respeito às
regulações dadas a partir do encaixe na família, na linhagem, no sistema de
interdependências fundadas sobre o pertencimento comunitário” (Castel, 1998: 50).
Além deste medo de não integração do sujeito social, encontramos também um
sentimento místico e mágico em relação ao porvir, como se uma visão do destino
permeasse seus futuros profissionais, como um véu que encobre o amanhã: Mistério.
Inspiração oportuna. O futuro não lhe pertence, é mistério ou inspiração divina. Este
futuro também revela o medo de não conseguir colocação no mercado nacional, e
necessariamente precisar procurar emprego em outro país: nossos profissionais são
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como craques de futebol: fazem sucesso no Brasil depois vão para a Europa. Esta
narrativa reflete os efeitos da globalização sobre as práticas sociais dos formandos ao
buscarem inserção profissional. Ao se inscrever na sociedade é importante participar do
processo produtivo, é se inscrever como um trabalhador, retomando experiências dos
jogadores de futebol que fazem sucesso fora do país, muito jovens universitários
evidenciam a real possibilidade de seguir este modelo de trabalhador.
As expectativas explicitadas em suas narrativas apresentam-se permeadas pelos
efeitos da globalização e da política liberal. Refletem seus impactos sobre as oscilações
de oferta e procura por postos de trabalho, a busca de segurança para tomar decisões e
os limites de suas condições. O modo como os formandos percebem sua vida
profissional futura e a necessidade de ajuda, neste processo de transição, mostra uma
expectativa social de que não errem: eu não tenho o direito de errar.
2) Preocupações com a formação profissional
A opção pelo curso superior não resume a totalidade dos interesses dos jovens,
em sua maioria evidenciam a necessidade de ampliar seus conhecimentos e continuar
desenvolvendo sua formação acadêmica, condição fundamental para manter sua
perspectiva de emprego futuro. O seu fazer reflete o que pensam sobre a educação: a
educação é uma estrada. A educação é vista pelos alunos como uma possibilidade de
construção de uma trajetória profissional e muitas vezes, significa ascensão e
mobilidade social. Segundo valores constitutivos da classe-que-vive-do-trabalho,
conforme Antunes (2005) reporta que o compromisso com a educação é considerável,
visto como uma via que permite sua pensar uma carreira profissional.
Muitos estudantes buscam se identificar com personagens sociais, na produção
de seus cartazes, onde espelham seus projetos profissionais: é fácil reconhecer quem
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está no rumo certo. As imagens de pessoas bem sucedidas coladas nos cartazes
demonstram uma identificação com profissionais de sucesso a partir dos padrões de
vestimenta utilizados. Este reconhecer que está no rumo certo, em sua narrativa, nos
remete à aparência das pessoas de sucesso ou o status de cada profissão. “Para alguns,
os fatores sociais, a questão do status da profissão, as melhores possibilidades do
mercado de trabalho podem ser os verdadeiros determinantes naquele momento da
escolha” (Soares, 2002: 95).
A educação é um processo contínuo e necessário para se manter empregável na
constante busca de qualificação, o domínio de idiomas é essencial: Inglês. Sem um outro
idioma, não dá. Pesquise no mercado. O conhecimento assume o papel de principal
fator de produção na chamada “era da informação” assim a educação é vista como via
para o emprego, os cursos de pós-graduação são quase uma obrigação a ser cumprida.
Por outro lado os alunos demonstram uma grande necessidade de pesquisar o mercado,
de saber quais as exigências das carreiras para que consigam se adequar a elas.
Contudo a formação contínua significa também um investimento, nem sempre
acessível a todos. Assim, para muitos jovens, a preocupação com a formação
profissional se limita às suas possibilidades econômicas, posicionando o jovem dentro
de uma cultura do risco, analisam ser um risco pertencer a um grupo que sustente
apenas um diploma universitário. Apesar da intensificação da busca por uma maior
qualificação, esta se constitui como: uma imensidão de problemas. Investir e se
qualificar na ultima fase do curso, é assumir uma imensidão de problemas, mesmo para
os alunos mais privilegiados economicamente.
Contatamos, porém, no modo de vida dos formandos, que os investimentos em
educação, se concentram na busca por melhores resultados nos históricos escolares e se
relacionam sempre à perspectiva da competitividade. “A vida social é, então, pelo
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menos como tendência, assimilável a certo número de riscos (sociais). Estar coberto
contra o conjunto dos riscos seria estar em segurança total” (Castel, 1998:383) Como
enfrentar o risco? Para muitos, a preocupação com a formação profissional é a
possibilidade de fazer sozinho, de conseguir a almejada independência e autonomia,
sendo necessário todo o esforço para buscar alguma garantia de segurança, isto é, de
estar superqualificado.
O futuro profissional mais tranqüilo é visto pelos formandos através de uma
possibilidade se transformar de empregado em patrão: a sua empresa. Ser o dono de seu
negócio. O negócio é ser patrão. Ter a sua empresa é um fator de segurança contra o
desemprego ou um futuro incerto. Aqueles que já vivenciaram situações de desemprego
em suas famílias de origem ou através do discurso de outros colegas vêem a
possibilidade de serem donos de seus negócios futuros como uma forma de se colocar
ao abrigo das contingências do mercado.
Segundo Dubar (1998) qualquer trajetória dos sujeitos implica objetivamente em
uma seqüência de posições sociais e em uma história pessoal cujo relato atualiza visões
de si e do mundo. Como expresso neste trecho: Somos feitos de carne, mas temos que
viver como se fossemos feitos de ferro. Para sobreviver no mundo altamente
competitivo, percebem que devem se transformar em ferro, em ser superpoderosos. Na
elaboração dos cartazes, o grupo formula narrativas, expressando sentimentos presentes
na coletividade. Na esfera do trabalho futuro, é fundamental a luta por manter-se
empregável, e, cada vez mais consolidada, a visão do “homem de aço”, imbatível, e
capaz de viver no limite, para acompanhar a competitividade do mundo moderno.
Interessados em investir em sua formação profissional, a necessidade de auto-
estima é fundamental, para conseguir superar os obstáculos que se apresentam em sua
trajetória: sou o melhor. Tem que ser o primeiro em tudo na vida. Você é o que você faz.
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Segurança e vida melhor. Dúvidas não, sucesso. Ser o melhor, manter sua auto-estima
elevada, é evitar os acasos do futuro, os lances de sorte ou azar, é buscar a garantia de
segurança e de uma vida melhor.
A idéia de que a realização profissional só acontece com a satisfação pessoal é
expressa em suas narrativas: estou feliz, pois faço o que gosto. A vida é assim mesmo:
num dia a gente ganha, no outro a gente ganha de novo. O que constitui a centralidade
do discurso dos universitários é a necessidade de ser vitorioso, de ganhar sempre, de ser
o primeiro, deste modo, a visão de futuro é envolvida por uma “normalidade” no padrão
de competitividade assimilado pelos jovens.
A preocupação com a melhor formação possível, é uma busca de garantias para
o futuro profissional, onde só os alunos mais dedicados se encontram no caminho certo,
no caminho do ganha, ganha! O formando vive no terreno da instabilidade e da
insegurança em relação ao futuro, a única certeza preponderante é a da contínua
mudança e da necessidade de continuar estudando sempre para se manter empregável.
3) Oportunidades no mercado de trabalho e o primeiro emprego
As emoções que permeiam a visão do jovem sobre seu futuro na competição por
um mercado extremamente severo refletem imagens fortes: quando chegar a sua hora
vai ver um grande túnel. Missão quase impossível. Começou a disputa. Os formandos
têm consciência de que deverão enfrentar muitos obstáculos em sua trajetória
profissional. A começar pelas vivências dos processos seletivos, onde muitos candidatos
se debatem na seleção para as melhores oportunidades de estágio, e somente uns poucos
conseguem passar, vivenciando já na universidade a competitividade acirrada do MT.
Por outro lado, esta experiência muitas vezes pode desenvolver uma
insegurança: o que faremos de nossa vida profissional? Nós não vamos decidir. O
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desafio de ser o escolhido. Percebem que as tomadas de decisão sobre o primeiro
estágio ou emprego, sobre serem aprovados nos processos seletivos, não dependem
somente de seu empenho e dedicação. Outros fatores estão envolvidos: escolha o
melhor anúncio. Sobrevivência no Limite. Competitividade, isso vai pesar. Em pé de
guerra. Os conhecimentos técnicos adquiridos na universidade serão testados, e a
competitividade das disputas pelos melhores lugares afetam diretamente a subjetividade
dos indivíduos.
Consciente das transformações e solicitações do mercado, o jovem se sente
inseguro, principalmente sobre como se comportar nos processos seletivos, como fazer
para ser o escolhido ou o aceito. Buscam na disciplina OPC como uma forma de apoio e
orientação: estar com o jogo na mão. É difícil chegar lá sozinho.
Também apresentam a consciência da falta de estabilidade dos empregos atuais:
não adianta só conseguir o primeiro emprego, tem que ser bom o bastante para se
manter nele, mesmo diante da possibilidade e obter um emprego, é necessário
apresentar resultados para se manter nele. Assim o universo do jovem formando é
permeado por conflitos em relação ao seu futuro profissional, um misto entre fantasia e
realidade sobre o MT ainda desconhecido pelos jovens.
Esta consciência de que não se pode depender de seus empregos futuros, se
reflete em expressões como: mais cedo ou mais tarde vai surgir um executivo melhor
preparado que vai tentar tomar o seu lugar. Além da conquista do primeiro emprego, é
necessário todo um esforço para conseguir se manter diante desta instabilidade. Para
Dubar (1998) a categoria de "estabilização" é aplicada a todos os itinerários de inserção
de jovens, durante os três a sete primeiros anos após o fim de seus estudos.
Portanto as oportunidades de trabalho e as chances de obter um emprego ditam
normas de qualificação e disputa por perfis cada vez mais distantes de serem atingidos.
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As oportunidades que surgem são percebidas de uma maneira ou de outra como voláteis
ou com tendência a desaparecer, estas são condições que condicionam expectativas mais
ou menos otimistas de futuro profissional.
4)Reflexões sobre a formatura
Seus cartazes revelam os medos e expectativas dos jovens em relação à transição
e formatura deixa de ser um momento de celebração e comemoração por méritos
alcançados, para representar mais fortemente a ruptura entre o ambiente acadêmico e o
mercado profissional.
Este momento particular de suas vidas são expressos como metamorfoses e
transformações sociais, sentidas e sofridas: os últimos dias da lenta agonia. Mudança.
Caos. A vida em transformação. Mais perto do fim. Nas últimas fases de seus cursos de
graduação, a maioria dos alunos está envolta em trabalhos de conclusão de cursos, em
buscar estágios, ou conseguir um emprego. Para alguns, são tantas atividades
concomitantes envolvendo seu cotidiano no universo acadêmico, que simplesmente,
preferem focalizar sua atenção somente em passar de ano.
Somente vencer os obstáculos das notas e das disciplinas e conseguirem sua
formatura com o restante de sua turma, já é um grande objetivo a ser alcançado. Temem
seu futuro profissional, percebem que passaram a maior parte de seus anos de graduação
em atividades acadêmicas e desconhecem o MT, permanecem sem saber se possuem ou
não todas as qualificações exigidas.
Suas emoções são ambíguas, pois ao mesmo tempo em que sentem medo do
futuro, se orgulham da posição social ou status alcançado com a formatura: quem te viu
e quem te vê! Agora é só correr para o abraço. Opção pela qualidade. É hora de idéias.
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A vitória inacreditável. Vitória. Chance. A realidade. Este mês, seus desejos serão
realizados.
A imaginação do que é ser um profissional bem sucedido e feliz em sua
atividade parece depender unicamente da formatura. A carreira a ser trilhada se constitui
em uma outra etapa, quase que descolada de sua vivência no ambiente universitário.
Neste contexto, uma determinada posição social diferente do status de estudante é
esperada pelo formando, permeada de ansiedades. Sua rotina de sala de aula está para
terminar e ele deve necessariamente tomar decisões sobre o que fazer, onde estar, o que
escolher para sua trajetória profissional.
5) Preocupações com o tempo
Em seus cartazes, também revelam a compreensão da noção de tempo e espaço.
Para os formandos não existe tempo suficiente para pensar ou para tomar decisões,
mesmo assim devem fazê-lo. Estudando para provas, elaborando relatórios, o final do
curso é um tempo de escolhas: do estágio, trabalho ou do primeiro emprego. Todas estas
escolhas são necessárias e muitas vezes acabam por definir uma perspectiva de inserção
futura e, ao mesmo tempo, uma carreira profissional.
O seu discurso é permeado por sentimentos e emoções conflitantes: em busca do
tempo. Que horas são? “O tempo é minha matéria, o tempo presente os homens
presentes, a vida presente” (Carlos Drummond de Andrade em Mãos Dadas).
A pressa se faz presente no cotidiano dos formandos e devem estar sempre
atentos às oportunidades, para se inscreverem na sociedade como trabalhadores. Muitas
vezes estes jovens se sentem velhos, pelo que ainda não fizeram para se qualificar para
o trabalho: eu ainda não tenho o domínio de um idioma. Sou muito velho para ser
trainee em uma empresa. Conhecem alguns perfis das vagas e temem não terem
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conseguido construir uma qualificação adequada às demandas do mercado, durante o
período universitário.
Estão em busca de requisitos cada vez mais altos e a necessidade urgente de
tomadas de decisões: agora tenho que aprender mandarim, porque inglês todo mundo
já sabe. Seus projetos se alteram constantemente, mesmo sem terem um conhecimento
mais apurado de seu campo de atuação profissional. Na modernidade, com todas as
tecnologias desenvolvidas para facilitar a vida, há uma compressão do tempo e o
formando olha para seu futuro, sem tempo. Para enfrentar as necessidades presentes e
futuras de sua carreira, transforma sua vida diária em um constante desafio de superação
dos limites do tempo presente e do tempo futuro. Esta “correria” de final de curso leva a
perceber a carreira como um tempo que nunca chega.
Quanto ao futuro, os formandos de hoje, com cursos superiores, considerados
segundo (Antunes, 2005), no início do século XX como qualificados para o mercado,
não tem mais a segurança do diploma, e esta posição social já não é garantia de sucesso
pessoal ou profissional.
Considerações finais
Este relato pretendeu retratar a vivência das autoras na disciplina OPC como
uma forma de acolhimento aos estudantes em suas angústias e ansiedades sobre o
processo de transição entre a universidade e o MT. Direciona-se muito mais a revelar os
sentimentos e pensamentos da visão do sujeito sobre o seu futuro profissional, do que
em indicar propriamente um caminho a ser seguido.
Buscamos compreender as condições que influenciaram os alunos a se
matricularem na disciplina OPC. Nosso objetivo em sala de aula é constituir um espaço
para a expressão e reflexão de suas dificuldades, potencialidades, recursos e limitações,
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no enfrentamento desta fase de transição. Nesse sentido, através das vivências em grupo
e atividades realizadas, foi possível evidenciar as expectativas e visões sobre o futuro
dos jovens, revelando suas preocupações; oportunidades e temores diante deste
momento.
Buscando apreender a totalidade sócio-histórica dos sujeitos quanto às
expectativas sobre a disciplina OPC, o primeiro aspecto a ser considerado é que o
planejamento de carreira apresenta-se aos olhos dos formandos como uma possibilidade
de pensar sobre o futuro pretendido. As expectativas, nem sempre realistas, são de que a
disciplina OPC fosse um manual de sobrevivência, ou a solução dos problemas na
decisão sobre o futuro: programe a sua viagem, pois a proposta de ensino contempla um
processo de ajudar a pensar, a elaborar o currículo e a preparar-se para uma entrevista
de seleção.
O espaço criado pela disciplina OPC revelou jovens de fato preocupados em
conseguir se inserir e sobreviver em um MT altamente competitivo. Nos remete a
pensá-los como sujeitos concretos, inseridos numa realidade social e histórica, que se
depara a todo momento com dilemas para realizarem suas escolhas profissionais. São os
profissionais do futuro e pode-se dizer que a maioria dos graduandos pretende se inserir
na sociedade com uma atividade produtiva.
Sobre a visão do futuro, num mundo do trabalho em constantes oscilações, os
empregos bem pagos e mais ou menos estáveis, se tornaram um bem raro ou estão
desaparecendo. São suficientes os dados do desemprego, para afirmar que poucos
empregos qualificados e intelectualizados estão sendo disponibilizando aos jovens.
Neste sentido, os formandos vivenciam uma cultura do risco e imaginam a possibilidade
de que seus projetos não se efetivem. Portanto vêem o MT como um grande fantasma,
que os assombra e impõe barreiras, pelas faltas das qualificações exigidas.
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As poucas oportunidades do mercado e a questão do primeiro emprego são
vivenciadas como uma preocupação constante com os critérios de seleção profissional.
Crêem que as melhores notas serão avaliadas nos processos seletivos e estabelecem uma
convivência de disputa com seus pares por oportunidades de estágios. As reflexões
sobre a formatura aparecem de forma contraditória, permeadas por sentimentos de
sucesso de uma etapa vencida na vida, e ao mesmo tempo de angústia, quanto ao que
fazer depois da graduação. Determinantes estruturais macro-econômicos e
acontecimentos experienciados de desemprego na família, ou entre amigos, se refletem
na inquietação sobre o que fazer após o período universitário.
Frente aos ditames do mercado, os formandos expressam suas preocupações com
o tempo. Todo o tempo deve ser dedicado à profissionalização e a qualificação.
Emergem em suas narrativas, num futuro muito próximo, jovens envelhecidos e sem
tempo para o preparo profissional, resultante da interação do sujeito e seus pares e com
os mais diversos quadros da realidade.
O histórico da criação da disciplina e a perspectiva de aumento significativo do
número de alunos no decorrer dos anos, justificam para as autoras a importância da
centralidade do trabalho na vida dos formandos. Também nos remetem à seriedade em
analisar que condições são estas na modernidade, que levam os sujeitos a sentimentos
de angústia e medo quanto aos seus futuros profissionais, mesmo no contexto de
elevada escolaridade. Dependendo do grau de insegurança e dos esforços despendidos
durante o período acadêmico, muitos alunos chegam a sofrer de depressão nos últimos
anos universitários.
Este movimento de busca pela disciplina OPC, no seio de uma universidade
pública e gratuita, nos leva como professoras a refletir sobre a necessidade do
autoconhecimento, da informação profissional e da escolha, para os jovens nesta fase de
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transição. A OP deve ser um processo de “facilitação da escolha” (Soares, 2002:121)
sendo vista como possibilidade de trabalho possível, auxiliar a pensar, conscientizar
sobre os fatores que interferem na escolha.
Visa auxiliar a superação das angústias referentes às suas escolhas profissionais
intercalando o conhecimento teórico sobre o mundo do trabalho, do emprego e das
profissões, ou seja, a carreira objetiva com práticas de dinâmicas de grupos em sala de
aula que permitem espaço para compartilhar carreiras subjetivamente interiorizadas
pelos estudantes.
A possibilidade de compartilhar e de se comunicar com o grupo, permite retomar
temas como o MT, o emprego, os processos seletivos, que na maioria das vezes não são
abordados durante todo o período de graduação. O espaço da disciplina permite ao
jovem expressar suas ansiedades e medos em relação ao seu futuro profissional e, ao
mesmo tempo, a criar novos sentidos para o trabalho e repensar alternativas e
possibilidades de carreiras profissionais. Por mais que o futuro tende a se caracterizar
pela incerteza, imprevisibilidade e insegurança o fato de planejar afeta diretamente a
vida dos graduandos e os coloca ao abrigo de algumas das contingências a serem
enfrentadas.
Pretende-se com este estudo revelar a importância da psicologia atender aos
dramas destes sujeitos, que muitas vezes parecem invisíveis em nossas práticas diárias,
e carecem de entendimento e atenção. Quando o sujeito desencadeia processos
reflexivos na disciplina e estabelece relações grupais com outras áreas de conhecimento,
amplia sua visão de possibilidades de escolhas profissionais. Sobre seu futuro abre-se
um leque de alternativas até então não pensadas. A universidade deve auxiliar os jovens
no encaminhamento de soluções para os problemas vividos em sua futura inserção na
realidade social.
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Seria, portanto uma das tarefas da universidade, num mundo com uma economia
em crescente globalização, orientar sobre as alterações profundas nas formas e
oportunidades de trabalho. A disciplina OPC visa desenvolver um planejamento de
carreira com mais autonomia e iniciativa, auxiliando a enfrentar esta fase de sua vida,
refletindo sobre sua ação e podendo promover possibilidades de mudanças. Tem-se
consciência dos limites deste estudo, situado em uma problemática mais ampla, da
relação entre a universidade e o MT. Porém, pensamos ter contribuído, com este relato
de experiência, para o debate sobre as carreiras profissionais.
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