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Mestrado em Tecnologia de Diagnstico e Interveno
Cardiovascular II Edio
rea de Especializao - Ultrassonografia Cardiovascular
ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN
OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM
CARDIOMIOPATIA HIPERTRFICA
Mrio Rui Antunes Loureno
Lisboa, Dezembro de 2013
Mestrado em Tecnologia de Diagnstico e Interveno
Cardiovascular II Edio
rea de Especializao - Ultrassonografia Cardiovascular
ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN
OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM
CARDIOMIOPATIA HIPERTRFICA
Mrio Rui Antunes Loureno
Orientadora:
Dra. Olga Azevedo
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MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA
iii
AGRADECIMENTOS
dra. Olga Azevedo, um agradecimento sentido pela orientao e constante
disponibilidade no desenrolar deste trabalho. Na prtica diria pela inspirao e
contnuo estmulo para fazer mais e melhor que me tem permitido um maior
crescimento pessoal e profissional.
Ao Centro Hospitalar do Alto Ave, na pessoa dos seus Exmos. Directores, por
permitirem a utilizao do laboratrio e equipamentos para a realizao e anlise dos
exames.
dra. Isabel Quelhas pela disponibilidade e compreenso demonstradas e pelo apoio
contnuo na elaborao deste trabalho.
A todos os elementos do laboratrio de ecocardiografia do Centro Hospitalar Alto Ave
que de uma forma ou outra contriburam para a colheita dos dados e a execuo do
trabalho.
A todos os meus colegas cardiopneumologistas no CHAA, especialmente a tcnica
Isabel Nogueira por ser uma fonte inesgotvel de apoio e pelo incentivo formao
profissional.
A todos os meus amigos mais chegados por me ajudarem sempre a ultrapassar os
momentos de maior stress e trabalho.
Aos meus pais pelo apoio incondicional sempre demonstrado, por nunca me deixarem
baixar os braos e pela dedicao e interveno na minha formao pessoal e
profissional.
minha irm por estar sempre comigo em todos os momentos e em mais uma etapa
esteve sempre presente para me apoiar.
Sara pela enorme compreenso, pacincia e carinho que me ajudaram muito na
concluso desta etapa. Partilhou comigo muito do stress derivado deste trabalho e
privou-se de algum tempo livre para me ajudar. Sem o seu apoio constante teria sido
bem mais rdua a tarefa de concluir este trabalho.
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MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA
iv
RESUMO
Introduo: A Miocardiopatia Hipertrfica (MCH) uma miocardiopatia caracterizada
pela presena de hipertrofia ventricular esquerda (HVE) e disfuno diastlica.
Disfuno sistlica subclnica tambm ocorre apesar da fraco de ejeco se manter
frequentemente conservada at uma fase tardia da doena. A avaliao
ecocardiogrfica da deformao miocrdica permite detectar e compreender melhor a
disfuno sistlica subclnica que ocorre na MCH.
Objectivo: Avaliao da funo ventricular de doentes com MCH atravs de strain
obtido por speckle tracking, com maior nfase no twist ventricular.
Metodologia: Estudo prospectivo incluindo 20 doentes com MCH, 16 doentes com
HVE secundria hipertenso arterial e 17 controlos. Colhidos dados demogrficos e
clnicos. Efectuado ecocardiograma transtorcico com avaliao da deformao
miocrdica por speckle tracking 2D, incluindo o twist ventricular.
Resultados: Os valores globais de strain e strain rate longitudinais foram menores na
MCH que nos outros grupos de indivduos. O twist ventricular estava aumentado nos
doentes com MCH comparativamente aos controlos. Mais especificamente, o twist
estava aumentado nos doentes com MCH obstrutiva, em comparao com os doentes
com MCH no obstrutiva e os controlos, nos quais o twist estava preservado
(27.99.0 vs. 15.34.4 vs. 15.95.8; p=0.001; p=0.001). O aumento do twist nos
doentes com MCH obstrutiva deveu-se a um aumento da rotao quer basal quer
apical do VE. O gradiente de presso na cmara de sada do VE foi preditor
independente do twist nos doentes com MCH.
Concluses: O twist ventricular est aumentado nos doentes com MCH obstrutiva por
aumento da rotao quer basal quer apical do VE.
Palavras chave: Miocardiopatia Hipertrfica; speckle tracking; strain; twist
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ABSTRACT
Introduction: Hypertrophic cardiomyopathy (HCM) is a cardiomyopathy characterized
by left ventricular hypertrophy (LVH) and diastolic dysfunction. Subclinical systolic
dysfunction also develops in spite of preservation of left ventricular ejection fraction
until a late stage of the disease. Echocardiographic evaluation of strain allows the
detection and better understanding of the subclinical systolic dysfunction that occurs in
HCM.
Aim: Evaluation of left ventricular function in patients with HCM using strain obtained
by speckle tracking, particularly ventricular twist.
Methods: Prospective study including 20 patients with HCM, 16 patients with LVH
secondary to arterial hypertension and 17 healthy controls. Demographic and clinical
data were obtained. Transthoracic echocardiogram was performed with evaluation of
strain by 2D speckle tracking, including ventricular twist.
Results: Global longitudinal strain and strain rate were lower in HCM than in the other
groups of individuals. LV twist was increased in patients with HCM, when compared to
controls. More specifically, LV twist was increased in patients with obstructive HCM,
when compared to patients with nonobstructive HCM and controls, in whom LV twist
was preserved (27.99.0 vs. 15.34.4 vs. 15.95.8; p=0.001; p=0.001). The increase
of LV twist in patients with obstructive HCM was due to an increase of basal and apical
LV rotation. The pressure gradient on the outflow tract was an independent predictor of
LV twist in patients with HCM.
Conclusion: LV twist is increased in patients with obstructive HCM due to an increase
of basal and apical LV rotation.
Key-words: Hypertrophic cardiomyopathy; speckle tracking; strain; twist
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INDICE
1. INTRODUO 1
1.1 Miocardiopatia Hipertrfica
a. Definio
b. Epidemiologia
c. Gentica
d. Fisiopatologia
e. Curso Clnico
f. Diagnstico
1
1
1
2
2
3
4
1.2 Ecocardiografia
a. Introduo
b. Avaliao da Hipertrofia Ventricular Esquerda
c. Avaliao da Funo Diastlica
d. Avaliao da Funo Sistlica
5
5
5
7
11
1.3 Deformao Miocrdica 12
1.4 Deformao Miocrdica na Miocardiopatia Hipertrfica
a. Strain longitudinal
b. Strain radial e circunferencial
c. Torso ventricular
d. Strain da AE
20
20
22
23
24
2. OBJECTIVOS 25
3. METODOLOGIA
3.1 Tipologia do Estudo e Mtodo de Abordagem
3.2 Populao e Amostra
3.3 Instrumento de recolha de dados
3.4 Procedimentos de Recolha de Dados
3.5. Reprodutibilidade Variabilidade inter-observador
3.6. Mtodos de Anlise de Dados
3.7. Consideraes ticas e Legais
26
26
26
32
33
37
38
39
4. RESULTADOS 40
5. DISCUSSO 56
6. CONCLUSO 64
7. REFERNCIAS 65
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1. INTRODUO
1.1. MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA
a. Definio
As Miocardiopatias so doenas primrias do miocrdio. Elliott et al., em nome
da Sociedade Europeia de Cardiologia, propuseram uma classificao para as
miocardiopatias em 2008,em que a miocardiopatia hipertrfica (MCH) definida como
a presena de hipertrofia ventricular esquerda (HVE), com aumento da espessura da
parede ou da massa ventricular, na ausncia de condies de sobrecarga
hemodinmica (nomeadamente hipertenso arterial ou doena valvular) suficientes
para o seu desenvolvimento(1). Esta classificao puramente morfolgica polmica,
pois no diferencia patologicamente a hipertrofia miocrdica da infiltrao intersticial
ou da acumulao intracelular, desta forma incluindo dentro da definio de MCH
doenas sistmicas como a amiloidose ou as doenas de armazenamento do
glicognio.
Por sua vez, Gersh et al. nas guidelines para o diagnstico e tratamento da
MCH, publicadas em 2011 pela American College of Cardiology Foundation/American
Heart Association, definem a MCH como um estado de doena caracterizado por HVE
inexplicada, associada a cmaras cardacas no dilatadas, na ausncia de outras
doenas cardacas ou sistmicas que por si seriam suficientes para causar a
magnitude da HVE existente num dado doente. Nestas guidelines, o termo MCH
refere-se apenas a HVE causada por mutao sarcomrica ou, no caso de estudo
gentico inconclusivo, a HVE na ausncia de manifestaes extracardacas ou
metablicas. Habitualmente os doentes com MCH apresentam uma espessura
mxima da parede ventricular esquerda (VE) 15mm, sendo os casos com 13 e
14mm considerados borderline. Contudo, necessrio fazer a ressalva dos doentes
com MCH poderem ser genotipicamente positivos e fenotipicamente negativos, ou
seja, ainda sem HVE manifesta(2).
b. Epidemiologia
A MCH a miocardiopatia gentica mais comum, com uma prevalncia
estimada de 0.2% (ou seja 1:500) na populao geral(3). Esta elevada prevalncia na
populao geral excede grandemente o pequeno nmero de indivduos que se
apresentam na prtica clnica cardiolgica, implicando assim que a maioria dos
doentes com MCH no se encontram identificados(2). Marian, numa reviso recente,
chama ainda a ateno para o facto da prevalncia da MCH poder ser ainda maior que
a identificada nos estudos de rastreio ecocardiogrfico realizados em jovens, pois a
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penetrncia pode ser incompleta e muitos doentes podero apenas apresentar HVE
ligeira ou de incio tardio(4).
A MCH uma doena global, afectando as vrias raas(5, 6) e com uma
distribuio idntica quanto ao gnero(7).
c. Gentica
A identificao da MCH como uma doena gentica ocorreu h mais de 25
anos. Em 1989, Jarcho et al. descreveram a primeira mutao causal de MCH num
gene de uma protena sarcomrica(8). Ao longo do tempo, outras mutaes causais
foram identificadas nos genes que codificam protenas sarcomricas (9, 10, 11), tendo
mais recentemente sido identificados casos de MCH associados a mutaes das
protenas da linha Z e de protenas envolvidas noutras funes do micito (como o
fosfolambo e a viniculina)(12).
A MCH assim uma doena gentica heterognea, tendo sido j identificadas
mais de 1400 mutaes causais em 14 genes(13). Contudo, actualmente o estudo
gentico apenas identifica mutaes em cerca de 50-70% dos doentes com MCH(9).As
mutaes nos genes da cadeia pesada da -miosina e da protena C ligada miosina
so identificadas em cerca de 80% dos casos(13).
O padro de hereditariedade da MCH na maioria dos casos autossmico
dominante(13). Charron et al., num documento de consenso da Sociedade Europeia de
Cardiologia, recomendam o rastreio familiar atravs da realizao de estudo gentico.
Nos casos em que o estudo gentico positivo, o ecocardiograma deve ser realizado
para pesquisar a presena do fentipo de MCH. Nos casos em que o fentipo ainda
negativo, est indicado o follow up regular com ecocardiograma(14). Nos casos em que
o estudo gentico negativo, o rastreio familiar deve prosseguir com a realizao de
ecocardiograma. O ecocardiograma deve ser realizado a partir dos 10 a 12 anos, cada
1-2 anos dos 10 aos 20 anos e cada 2-5 anos a partir dos 20 anos e at aos 50 a 60
anos.
d. Fisiopatologia
A MCH uma doena primria dos micitos cardacos que caracterizada por
hipertrofia e desarranjo dos micitos, fibrose intersticial, hipertrofia e hiperplasia da
camada mdia das artrias coronrias intramurais e anomalias dos folhetos valvulares
mitrais. O desarranjo dos micitos cardacos a marca patolgica essencial da MCH e
frequentemente afecta mais de 20% da massa VE(15).
Marian apresentou um modelo explicativo para a hipertrofia presente na MCH.
As mutaes afectam a estrutura ou o nvel de expresso das protenas sarcomricas,
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o que interfere com a interaco da actina com a miosina e com a actividade da
ATPase miofibrilar, levando activao de vrias vias sinalizadoras e expresso de
vrios marcadores envolvidos na hipertrofia(4).
Losi et al. apresentaram um modelo que relaciona a fisiopatologia da MCH com
a disfuno diastlica (Figura 1). No seu modelo, estabelecem como contribuintes para
a disfuno diastlica a alterao da sensibilidade ao clcio, o desarranjo das fibras
musculares cardacas, o aumento da matriz extracelular, a hipertrofia, a obstruo da
cmara de sada do ventrculo esquerdo (CSVE) e a presena de isquemia
miocrdica(16).
Figura 1 Mecanismos da disfuno diastlica
e. Curso Clnico
A MCH uma doena com um curso clnico heterogneo, podendo apresentar-
se em todas as faixas etrias desde a infncia at ao muito idoso(2). A maioria dos
doentes com MCH tem uma esperana de vida normal, sem grande limitao da sua
qualidade de vida(15). Esto contudo identificadas complicaes significativas que se
podem associar MCH(2):
Morte sbita devida a taquiarritmias ventriculares, com um risco de
cerca de 1% no global dos doentes com MCH, sendo contudo mais
frequente nos jovens com menos de 35 anos;
Insuficincia cardaca secundria a HVE e disfuno diastlica,
caracterizada por dispneia de esforo (com ou sem dor torcica), que
pode ser progressiva apesar da funo sistlica preservada e da
presena de ritmo sinusal. A disfuno sistlica ocorre num estadio
terminal de remodelagem VE caracterizado por extensa fibrose
miocrdica;
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Fibrilao auricular (FA) com um risco aumentado de tromboembolismo
sistmico e acidente vascular cerebral (AVC).
A MCH pode condicionar obstruo da CSVE, o que contribui para as
manifestaes clnicas dos doentes, nomeadamente as queixas de insuficincia
cardaca(2). Estudos realizados por Maron et al. mostraram que a obstruo existe em
cerca de 1/3 dos doentes em repouso e em mais 1/3 dos doentes em relao com o
exerccio fsico(17).
O mecanismo fundamental que actualmente se aceita como explicativo da
obstruo da CSVE o movimento sistlico anterior (SAM) da vlvula mitral.
Inicialmente julgava-se que era causada pela contraco local do septo basal
hipertrofiado. Posteriormente demonstrou-se que o posicionamento anormal do
aparelho valvular mitral, que atravs de um efeito de draga leva a que os folhetos
mitrais sejam puxados de encontro ao septo basal, condicionando assim a
obstruo(18). Pollick et al. demonstraram, j h algumas dcadas, a existncia de uma
correlao positiva entre a severidade do SAM e a severidade da obstruo da CSVE
avaliada invasivamente(19).
Para responder a estas formas de apresentao clnica existe uma variedade
de intervenes teraputicas que alteram o curso natural da doena, tais como
teraputicas farmacolgicas, miectomia septal cirrgica, ablao septal alcolica,
implantao de pacemaker e/ou CDI e transplante cardaco(20).
f. Diagnstico
O diagnstico da MCH baseado na ecocardiografia convencional(21). Este
diagnstico morfolgico estabelecido na presena de uma espessura de parede VE
15 mm, sendo espessuras de 13 e 14 mm consideradas borderline(2). A MCH
assume mais frequentemente um padro de HVE assimtrica de predomnio septal,
sendo a razo da espessura do septo/parede posterior superior a 1.3 em doentes
normotensos e a 1.5 em indivduos hipertensos(22).
Contudo, no existe nenhum parmetro da ecocardiografia convencional que
permita o diagnstico diferencial entre a MCH e a HVE associada HTA. O Doppler
tecidular tem-se mostrado til nesta diferenciao, observando-se velocidades mais
baixas de contrao e relaxamento miocrdico na MCH, sendo portanto a disfuno
diastlica e a disfuno sistlica subclnica mais graves na MCH que na HVE
secundria a HTA(23). Mais recentemente, as tcnicas de deformao miocrdica tm-
se mostrado promissoras neste diagnstico diferencial(24).
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A ressonncia magntica (RM) cardaca tambm pode ser til no diagnstico
de MCH, especialmente quando a MCH envolve apenas um segmento da parede
ventricular esquerda(21, 25) ou no diagnstico diferencial entre MCH e fenocpias, como
a amiloidose e a doena de Fabry. O padro tpico de realce tardio da MCH situado
nos pontos de insero do VE no SIV contrasta com o padro tpico de realce tardio
subendocrdico difuso da amiloidose e com o padro tpico de realce tardio infero-
lateral basal da doena de Fabry(26). Por outro lado, a HVE secundria a HTA no se
associa presena de realce tardio, pelo que na ausncia de realce tardio o
diagnstico diferencial permanece por resolver(21).
O estudo gentico poder contribuir para o diagnstico diferencial entre a MCH
e a HVE secundria HTA ou fenocpias, uma vez que a identificao de uma
mutao causal de MCH confirma o seu diagnstico. Contudo, a base gentica da
MCH ainda no completamente conhecida, pelo que o estudo gentico identifica
mutaes em apenas 70% dos doentes com MCH. Assim, a ausncia de identificao
de uma mutao causal no permite a excluso do diagnstico de MCH(27).
1.2. ECOCARDIOGRAFIA
a. Introduo
A ecocardiografia uma tcnica de imagem que compreende vrias
modalidades que permitem um extenso e aprofundado estudo anatmico e funcional
cardaco. O ecocardiograma transtorcico um exame disponvel, seguro, de baixo
custo e que fornece informao de forma rpida, fivel e reprodutvel, permitindo o
diagnstico, a compreenso da fisiopatologia, o seguimento, a orientao teraputica
e a avaliao do prognstico dos doentes com MCH(28).
b. Avaliao da Hipertrofia Ventricular Esquerda
Os primeiros critrios diagnsticos ecocardiogrficos de MCH foram
estabelecidos utilizando o Modo M e incluam: (i) hipertrofia assimtrica do septo
interventricular (SIV), (ii) SAM da vlvula mitral, (iii) VE pequeno, (iv) imobilidade septal
e (v) encerramento prematuro da vlvula artica(16).
A hipertrofia assimtrica do SIV implicava uma espessura 15 mm e uma
relao entre a espessura do septo e da parede posterior >1.3(29). O SAM da vlvula
mitral facilmente visualizado no Modo M como um movimento abrupto do folheto
anterior da vlvula mitral em direco ao SIV que atinge o seu mximo antes do pico
do movimento sistlico da parede posterior(30) (Figura 2). A hipertrofia septal
assimtrica e o SAM da vlvula mitral foram inicialmente assumidos como
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patognomnicos da MCH(16). Contudo, mais tarde foi demonstrado que estas
caractersticas poderiam estar presentes noutras formas de HVE, como a HTA(31),
Doena de Fabry(32) ou glicogenoses(33).
Figura 2 - SAM da vlvula mitral em doente com MCH obstrutiva
Segundo as associaes americana e europeia de ecocardiografia, a
determinao da espessura das paredes VE e dos dimetros telediastlico e
telessistlico do VE deve ser realizada na incidncia paraesternal eixo longo, a partir
do modo M ou bidimensional(34) (Figura 3). Valores acima de 15mm so utilizados no
diagnstico de MCH(22). Em termos prognsticos, a presena de hipertrofia mxima
extrema (espessura do SIV 30 mm)foi identificada como preditor de morte sbita nos
doentes com MCH(35), constituindo indicao para a implantao de CDI(2).
Figura 3 - Fentipo de MCH em ecocardiograma 2D (janela paraesternal eixo longo)
A massa VE considerada o melhor parmetro para a quantificao da HVE.
Contudo, a distribuio heterognea da hipertrofia na MCH constitui uma limitao
aplicao dos algoritmos habitualmente utilizados na ecocardiografia 2D para
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quantificar a massa do VE(34). Por esse motivo, vrios indexes ecocardiogrficos 2D
foram desenvolvidos para a quantificao da hipertrofia na MCH, sendo disso
exemplos os scores propostos por Wigle et al.(36) e por Spirito et al.(37). Contudo, a
ecocardiografia tridimensional (3D) a tcnica ecocardiogrfica mais fidedigna e
reprodutvel na quantificao da massa do VE(38), apresentando uma boa correlao
com a RM cardaca que considerada o gold standard(21).
A magnitude da HVE tambm no pode ser usada para diferenciar a MCH da
HVE hipertensiva, pois tambm neste caso a HVE pode ser significativa,
especialmente nos mais idosos(39).
A maioria dos doentes com MCH apresentam uma hipertrofia ventricular
assimtrica com envolvimento do septo anterior, mas mais raramente a hipertrofia
simtrica ou confinada ao pex do VE(40). Esta diversidade de padres de HVE nos
doentes com MCH torna impossvel a sua diferenciao de outras formas de HVE,
como a HTA ou outras fenocpias, baseada no padro morfolgico evidenciado pela
ecocardiografia bidimensional(2).
c. Avaliao da Funo Diastlica
A MCH cursa com disfuno diastlica secundria a hipertrofia, desarranjo da
arquitectura dos micitos, fibrose intersticial e isquemia(16).
Segundo as recomendaes europeias de 2009, a avaliao ecocardiogrfica
da funo diastlica na prtica clnica dever incluir a avaliao do volume e funo da
AE, do fluxo transmitral, do fluxo venoso pulmonar e das velocidades diastlicas do
Doppler tecidular(28).
Dimenso e Funo da Aurcula Esquerda
Nos doentes com MCH, ocorre dilatao da AE secundria a disfuno
diastlica, obstruo da CSVE e insuficincia mitral(16).
A avaliao da dilatao da AE frequentemente realizada atravs da medio
do seu dimetro linear no eixo longo paraesternal em modo M ou 2D. Nistri et al.
demonstraram que o dimetro da AE est relacionado com o risco de FA,
desenvolvimento de insuficincia cardaca e mortalidade cardaca, em especial se for
superior a 48mm(41). Woo et al. demonstraram ainda que o dimetro da AE um
preditor de sobrevivncia ps-miectomia em pacientes com MCH obstrutiva(42).
Num outro estudo, Briguori et al. determinaram que a fraco de encurtamento
da AE permitia estimar a presso telediastlica do VE(43). Alguns anos mais tarde, Losi
et al. determinaram que a reduo da fraco de encurtamento da AE para valores
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aumento da presso de enchimento do VE. A dificuldade de execuo apropriada da
manobra e a introduo do Doppler tecidular diminuram contudo a utilizao desta
tcnica. Finalmente, surge o padro restritivo caracterizado por uma relao E/A>2,
TD 0.5cm dentro da veia pulmonar
superior direita na incidncia apical de 4 cmaras permite obter a velocidade da onda
sistlica (S), a velocidade da onda diastlica (D), a relao S/D, a fraco de
enchimento sistlico (integral tempo-velocidade de S / integrais de tempo-velocidade
S+D) e a velocidade e durao da onda telediastlica (Ar)(28).
A relao S/D maior que 1 em indivduos normais com idade >40 anos,
diminuindo para valores 35cm/s sugere aumento da presso telediastlica
do VE. Contudo, a diferena de durao Ar-A o nico parmetro independente da
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idade e o primeiro indicador de aumento da presso telediastlica do VE, permitindo a
diferenciao de indivduos com alterao do relaxamento VE em indivduos com
presso telediastlica do VE normal e indivduos com presso telediastlica
aumentada mas com presso AE normal. Todos os outros parmetros de padro
pseudonormal j indicam aumento da presso da AE e uma fase mais avanada de
disfuno diastlica(28).
A principal limitao destes ndices est relacionada com a aquisio de curvas
adequadas que permitam as medies precisas, especialmente da onda Ar(28).
Doppler tecidular
O Doppler tecidular uma modalidade ecocardiogrfica que avalia o
movimento de grande amplitude e de baixa velocidade do tecido miocrdico. Durante o
ciclo cardaco, o pex mantem-se estacionrio relativamente aos segmentos basais,
pelo que os movimentos detectados ao nvel do anel mitral relativamente ao pex em
sstole e em distole so indicadores da contraco e relaxamento longitudinal do
VE(54). Aplicando o Doppler tecidular pulsado no miocrdio ventricular, imediatamente
adjacente ao anel mitral, a nvel septal ou lateral, e com um ngulo do feixe de
ultrassons em relao ao movimento cardaco 12 indica aumento da presso de
enchimento do VE. Nos doentes com MCH, Nagueh et al. demonstraram uma boa
correlao entre a relao E/E (utilizando o E da parede lateral) e a presso de
enchimento do VE(51). No entanto, noutro estudo mais recente, Geske et al. mostraram
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que existe apenas uma modesta correlao entre a relao E/E e a presso da AE
medida invasivamente. Neste estudo, cerca de 25% dos doentes com relao E/E >15
tinham presso da AE
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Este parmetro do Doppler tecidular tambm til para diferenciar a MCH de
outras variantes de HVE, nomeadamente a hipertensiva. Num estudo realizado por
Vinereanu et al. envolvendo pacientes com MCH, HVE hipertensiva, atletas e
controlos, a velocidade da onda S permitiu discriminar a hipertrofia fisiolgica das
variantes patolgicas, enquanto a heterogeneidade das velocidades sistlicas no anel
mitral permitiu diferenciar os pacientes com MCH (velocidades baixas e alta
heterogeneidade) dos pacientes com HVE hipertensiva (velocidades baixas mas baixa
heterogeneidade)(23).
Nos doentes com MCH estabelecida, a reduo da velocidade da onda S foi
identificada como preditora de morte e de hospitalizao por progresso da
insuficincia cardaca(62).
Contudo, o Doppler tecidular apresenta algumas limitaes importantes. Esta
tcnica permite a quantificao da velocidade de contraco miocrdica desde que o
vector esteja alinhado paralelamente ao feixe de ultrassons, o que restringe a sua
aplicao aos planos apicais. Por outro lado, uma tcnica que mede velocidades
absolutas e no a deformao miocrdica intrnseca, sendo influenciada pelos
movimentos de tethering e translao cardaca(63).
1.3. DEFORMAO MIOCRDICA
A avaliao da deformao miocrdica pode ser realizada atravs do Doppler
tecidular ou da tcnica de Speckle Tracking. Esta avaliao permite-nos obter os
seguintes parmetros:
Deslocamento, d, designa a distncia que um determinado ponto se move
entre duas frames consecutivas no ciclo cardaco. medido em centmetros (cm).
Velocidade, v, traduz o deslocamento por unidade de tempo e medida em
centmetros por segundo (cm/s).
Strain, e, representa deformao miocrdica, ou seja, a variao da
distncia (L1) entre dois pontos pr-definidos em relao sua distncia original (L0).
calculado pela seguinte frmula: L1-L0 / L0. Pode apresentar valores positivos (no
caso de um alongamento da distncia entre os pontos) ou negativos (no caso de um
encurtamento). Esta medida no tem unidades, pelo que apresentada na forma de
percentagem (ex: um strain de -50% significa que a distncia entre os dois pontos
encurtou 50%, ou seja, passou a metade da distncia original).
Strain rate, SR, designa a taxa a que o strain se altera e expresso em 1/s
ou s-1 (64).
a. Componentes da deformao miocrdica
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MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA
13
Strain longitudinal diz respeito ao movimento das fibras miocrdicas na
direco longitudinal, com encurtamento e movimento da base em direco ao pex
durante a sstole e movimento oposto durante a distole. Por se tratar de um
encurtamento, o strain longitudinal sistlico expresso em valores negativos.
Strain radial diz respeito ao movimento de contraco das fibras miocrdicas
em direco ao eixo que passa pelo centro da cavidade ventricular em sstole e
movimento oposto em distole. Por se tratar de um alongamento, o strain radial
sistlico expresso em valores positivos.
Strain circunferencial diz respeito ao movimento de contraco das fibras
miocrdicas que resulta na diminuio da circunferncia da seco ventricular em
sstole e respectivo aumento em distole. Por se tratar de um encurtamento, o strain
circunferencial sistlico expresso em valores negativos.
Rotao designa o movimento rotacional do miocrdio volta do longo eixo do
VE durante a sstole e expresso em graus (). No subendocrdio, a base roda em
sentido anti-horrio e o pex no sentido horrio. Pelo contrrio, no subepicrdio, a
base roda em sentido horrio e o pex em sentido anti-horrio. Como o raio de rotao
do subepicrdio maior que o do subendocrdio, o torque do subepicrdio maior,
pelo que a rotao cardaca depende sobretudo das fibras subepicrdicas, seguindo o
sentido horrio na base e o sentido anti-horrio no pex(65) (Figura 4 e 5).
Figura 4 - Rotao basal e apical no subepicrdio e no subendocrdio (65)
ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM
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14
Figura 5 - Rotao basal e apical do corao (65)
O valor absoluto da diferena da rotao do pex para a base designa o Twist,
tambm expresso em graus (). A Torso corresponde ao gradiente base-pex do
ngulo de rotao ao longo do longo eixo do VE, e expressa em graus por
centmetro (/cm)(66) (Figura 6).
Figura 6 - Conceitos de Twist e Torso ventricular(66)
O Untwist refere-se ao processo de recoil do twist, que contribui para a suco
diastlica, facilitando o enchimento ventricular precoce. Ocorre predominantemente na
fase de relaxamento isovolumtrico e termina na fase de enchimento ventricular
precoce, precedendo assim o alongamento longitudinal e radial. J o twist ocorre na
sstole simultaneamente com o encurtamento longitudinal e radial(64).
b. Relevncia da orientao das fibras miocrdicas para a deformao
miocrdica
A orientao das fibras miocrdicas um determinante fundamental para a
deformao miocrdica.
Na regio subendocrdica, as fibras miocrdicas esto orientadas quase
longitudinalmente a cerca de um ngulo de 80 em relao direco circunferencial,
ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM
MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA
15
apresentando assim uma orientao em mo direita. Desta forma, a regio
subendocrdica contribui essencialmente para a deformao longitudinal.
O ngulo de orientao das fibras miocrdicas diminui progressivamente at 0
na regio mesomiocrdica e continua a diminuir at -60, assumindo uma orientao
em mo esquerda, na regio subepicrdica. Desta forma, as regies mesomiocrdica
e subepicrdica contribuem predominantemente para a rotao (Figura 7).
Figura 7- Relevncia da orientao das fibras para a deformao miocrdica(65)
A regio subendocrdica a mais vulnervel leso miocrdica. A leso da
regio subendocrdica afecta a funo sistlica, resultando em diminuio do strain
longitudinal, mas com strain circunferencial e twist preservados e Fej do VE
preservada. Na presena de disfuno subendocrdica, a rotao subendocrdica
diminui, diminuindo assim a oposio rotao subepicrdica, o que pode resultar
num aumento da rotao cardaca e portanto do twist ventricular (Figura 8). A funo
diastlica tambm fica comprometida, com diminuio do strain longitudinal diastlico
precoce e untwisting reduzido e atrasado.
Figura 8 - Aumento da rotao ventricular na disfuno subendocrdica(65)
J a leso transmural resulta em disfuno concomitante das regies
mesomiocrdica e subepicrdica, com consequente diminuio do twist e do strain
ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM
MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA
16
circunferencial e radial, para alm do strain longitudinal, o que resulta em diminuio
da Fej do VE(64).
c. Valores de normalidade da deformao miocrdica
Os valores de normalidade de strain variam muito com a tcnica usada para a
sua medio e a marca do equipamento usada, assim como com a idade, condies
de carga e frequncia cardaca(64).
Os valores de normalidade obtidos por Doppler tecidular num estudo europeu
de grande dimenso foram os seguintes: strain longitudinal -18.5%; strain rate
longitudinal -1.0 s-1; strain radial 44.5%; e strain rate radial 2.45 s-1 (67).
Numa recente meta-anlise de Yingchoncharoen et al., foram definidos os
valores de normalidade obtidos por Speckle Tracking: strain longitudinal -18.9 a -
20.4%; strain rate longitudinal -0.94 a-1.01 s-1; strain radial 43.6 a 51.0%; strain rate
radial 2.23 a 2.52 s-1; strain circunferencial -22.1 a -24.6%; e strain rate circunferencial
-1.12 a -2.2 s-1 (68).
Os valores de strain longitudinal e circunferencial so maiores nos segmentos
apicais e mdios que nos segmentos basais. Usando uma tcnica diferente do speckle
tracking, o feature tracking, Bussadori et al. Encontraram valores de strain e de strain
rate longitudinal progressivamente maiores da base para o pex (-12.95 6.79 vs. -
14.87 6.78; p = 0.002; -0.72 0.39 vs. -0.94 0.48, p= 0.0001, respectivamente). A
mesma variao foi documentada para o strain e o strain rate circunferencial (-21.32
5.15 vs. -27.02 5.88, p = 0.002; -1.51 0.37 vs. -1.95 0.57, p = 0.003,
respectivamente)(69). Tambm Carasso et al., usando a tcnica do Velocity Vector
Imaging, documentou um aumento do strain longitudinal de 10% e circunferencial de
33% da base para o pex(70).
O strain longitudinal obtido por speckle tracking diminui com a idade, ao
contrrio do que acontece com o strain circunferencial, reflectindo uma diminuio da
funo subendocrdica com o envelhecimento(71). Este achado tambm foi confirmado
no estudo de Bussadori et al. comparando crianas e adultos pela tcnica de feature
tracking (strain longitudinal 22.18 3.06 vs. -19.05 3.05 p = 0.002, strain rate
longitudinal -1.30 0.20 vs. -1.07 0.19, p = 0.015; e strain rate circunferencial -1.83
0.60 vs. -1.67 0.55, p = 0.040)(69).
Os valores normais de twist dependem da idade e das condies de carga
ventricular, assim como da tcnica utilizada para a sua medio e da localizao da
regio de interesse (subendocrdio vs. subepicrdio)(64).
O twist aumenta ao longo da idade, desde a infncia precoce (5.81.3),
infncia tardia (6.82.3), adolescncia (8.82.6), meia idade (13.83.3)(72). Um outro
ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM
MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA
17
estudo de grande dimenso em indivduos saudveis documentou valores normais de
twist de cerca de 7.73.5. Este valor mostrou tambm um aumento com a idade,
sendo 6.72.9 nos indivduos com < 40 anos, 8.03.0 nos indivduos com 40-60 anos
e10.8 4.9 nos indivduos com > 60 anos(73). Na infncia, este aumento do twist
parece dever-se transio da rotao basal que deixa de ser em sentido anti-horrio
para passar a ser no sentido horrio. Posteriormente, o twist aumenta essencialmente
devido a um aumento da rotao apical com a idade(72). Deste modo, o twist ventricular
depende sobretudo da rotao apical, pelo que uma alterao da motilidade apical
altera significativamente o twist do VE. Com a idade h tambm uma reduo da taxa
e da magnitude do untwisting(74).
d. Strain obtido por Doppler Tecidular
O Doppler Tecidular permite a medio das velocidades de contraco e
relaxamento do miocrdio. Estas velocidades podem ser obtidas atravs de Doppler
pulsado ou Doppler de cor. O Doppler pulsado caracterizado por maior frame rate do
que o Doppler de cor, permitindo determinar as velocidades mximas, ao passo que
as velocidades obtidas por Doppler de cor representam velocidades mdias. Deste
modo, as velocidades obtidas por Doppler pulsado so cerca de 20 a 30% maiores
que as obtidas por Doppler de cor.
Contudo, o Doppler de cor apresenta a vantagem sobre o Doppler pulsado de
permitir ajustar o sample volume de forma a fazer o tracking de uma mesma regio de
interesse ao longo de todo o ciclo cardaco. Alm disso, permite a avaliao das
velocidades de vrias regies miocrdicas de interesse simultaneamente ao longo do
ciclo cardaco.
Aplicando o Doppler Tecidular, verifica-se que existe um gradiente de
velocidades da base (onde a velocidade maior) para o pex (onde a velocidade
nula). Existe ainda um gradiente de velocidades do endocrdio (onde a velocidade
maior) para o epicrdio (onde a velocidade menor).
A integrao temporal da velocidade permite-nos obter o deslocamento. O
strain rate representa o gradiente de velocidade entre dois pontos normalizado para a
distncia entre eles (r). calculado pela seguinte frmula: SR = V2 V1 / r. O strain
o integral temporal do strain rate.
A grande vantagem desta tcnica na avaliao do strain a melhor resoluo
temporal(64).
Limitaes do Strain obtido por Doppler Tecidular
ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM
MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA
18
O mtodo de avaliao do strain por Doppler Tecidular apresenta limitaes
importantes, que impedem a sua utilizao na prtica clnica diria.
O Doppler Tecidular avalia o movimento de um ponto em relao a outro ponto
que externo caixa torcica e que a sonda. Deste modo, as velocidades obtidas
por este mtodo so potencialmente enviesadas, podendo reflectir movimentos de
translao (movimento do corao na caixa torcica ao longo do tempo) ou de
tethering (movimento de uma regio acintica ao ser arrastada pela contrao de
uma regio contrctil), em vez de reflectir uma real contraco miocrdica da regio de
interesse. Este problema pode no entanto ser minorado com a utilizao de um menor
tamanho da amostra e a aquisio das imagens em apneia.
Por outro lado, o Doppler tecidular uma tcnica altamente dependente do
ngulo, sendo necessrio alinhar correctamente a regio de interesse a analisar com o
feixe de ultrassons para obter a determinao mais correcta das velocidades. Um
ngulo >20 resulta numa subestimativa importante das velocidades e numa alterao
dos timings dos eventos cardacos. Este problema pode ser minorado por um correcto
alinhamento da regio de interesse com o feixe de ultrassons e pela reduo da
largura do sector. Por este mesmo motivo, no possvel avaliar por Doppler tecidular
as velocidades em determinados segmentos (ex: segmentos infero-septais ou laterais
em curto eixo), pois no possvel alinhar estas regies com o feixe de ultrassons.
A avaliao do pex tambm est prejudicada por frequentes artefactos e
deficiente resoluo espacial proximal.
A integrao que usada para obter o strain rate resulta num shift da baseline,
obrigando a uma correco linear denominada drift compensation.
As curvas de strain e strain rate tm frequentemente rudo, dificultando a sua
interpretao, o que torna este mtodo pouco reprodutvel.
Outra limitao importante o facto de ser time-consuming(64).
e. Strain obtido por Speckle Tracking
Os speckles so padres acsticos nicos criados pela interaco dos
ultrassons com o miocrdio.
Blocos ou kernels de speckles podem ser seguidos frame by frame ao longo do
ciclo cardaco, em mltiplas regies num mesmo plano de imagem, sendo possvel
determinar o seu deslocamento, que ao longo do tempo se traduz em velocidade. A
variao da distncia entre dois pontos em relao distncia original que os unia
traduz o strain e a taxa a que este fenmeno ocorre representa o strain rate.
A obteno do strain pela tcnica de Speckle Tracking apresenta vrias
vantagens. Pode ser aplicada a imagens gray scale previamente adquiridas. uma
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MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA
19
tcnica semi-automatizada e por isso muito menos time-consuming e mais
reprodutvel. Permite a apresentao da informao na forma de bulls-eye, facilitando
a interpretao e anlise dos dados segmentares e globais.
Embora, tal como o Doppler Tecidular, tambm avalie o movimento das
estruturas em relao a um ponto externo que a sonda, esta tcnica, ao contrrio do
Doppler tecidular, muito menos dependente do ngulo, sendo possvel avaliar o
strain em todas as direes (e no apenas ao longo do feixe de ultrassons). Deste
modo, possvel avaliar o strain, nomeadamente o radial e o circunferencial, em todas
as regies miocrdicas num determinado plano de imagem, independentemente da
sua direco. Esta independncia do ngulo no no entanto completa, verificando-se
que o Speckle Tracking funciona melhor quando aplicado ao longo do feixe de
ultrassons.
A tcnica de Speckle Tracking apresenta maior resoluo lateral, permitindo a
avaliao selectiva do strain nos diferentes nveis do endocrdio, mesocrdio e
epicrdio(64).
Limitaes do Strain por Speckle Tracking
As desvantagens da tcnica de Speckle Tracking incluem uma frame rate mais
baixa (cerca de 50-90 fps) do que o Doppler tecidular (cerca de 100-250fps). Por esse
motivo, eventos mais rpidos do ciclo cardaco, como a contraco isovolumtrica,
podem no ser to bem detectados e a determinao das velocidades mximas e dos
picos de strain rate pode estar subestimada, sobretudo na presena de taquicardia.
Esta tcnica de avaliao de strain depende de uma boa qualidade da imagem
adquirida, ficando gravemente comprometida na presena de foreshortening do pex
ou de eixos curtos apicais no circulares.
Concretamente na avaliao do twist, podem surgir problemas na avaliao do
eixo curto do VE a nvel basal, devido necessidade de uma maior largura de sector a
esse nvel e ao movimento fora do plano da imagem que ocorre medida que a base
desce em direco ao pex na sstole. Ao nvel apical, fundamental garantir um eixo
curto circular para uma determinao correcta da rotao a esse nvel.
A tcnica do Speckle Tracking 2D pressupe que seja possvel fazer sempre o
tracking dos speckles de frame para frame, o que nem sempre possvel se existir
movimento fora do plano da imagem. Este problema poderia ser ultrapassado com a
avaliao do strain por Speckle Tracking 3D, que tem ainda a vantagem de permitir
uma avaliao ainda mais rpida e completa que em 2D, evitando o foreshortening
apical ou outras limitaes relacionadas com a aquisio dos planos 2D. A maior
ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM
MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA
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desvantagem da tcnica em 3D reside na frame rate que mais baixa que em 2D e no
facto da tcnica no estar ainda validada numa srie de cenrios clnicos.
Outra limitao implementao desta tcnica na prtica clnica a falta de
standardizao entre equipamentos de diferentes marcas(64).
f. Aplicaes clnicas das medidas de Deformao miocrdica
Potenciais aplicaes clnicas das medidas de strain incluem:
Avaliao da funo VE sistlica global e regional e deteco de disfuno
ventricular subclnica
Deteco de isquemia e viabilidade no ecocardiograma de stress
Pesquisa de dissincronia intraventricular, avaliao da resposta ao CRT e
determinao da localizao ideal para a sonda VE do CRT
Deteco de cardiomiopatia pr-clnica
Diagnstico diferencial de MCH vs. Corao de atleta
Diagnstico diferencial de Miocardiopatia restritiva vs. Pericardite constritiva
Avaliao da funo diastlica do VE
Avaliao da funo sistlica do ventrculo direito
Avaliao da funo auricular e do risco de FA(64)
1.4. DEFORMAO MIOCRDICA NA MCH
a. Strain longitudinal
i. O strain longitudinal permite distinguir MCH de outros tipos de HVE,
corao de atleta e controlos
Nos doentes com MCH, o strain longitudinal o tipo de strain mais estudado e
mais utilizado na prtica clnica.
Afonso et al. relataram que o strain longitudinal global tem uma excelente
capacidade discriminatria para distinguir os doentes com MCH dos doentes com HVE
secundria a hipertenso ou corao de atleta(75).
Richand et al. tambm demonstraram que o strain longitudinal pode ser
utilizado para distinguir MCH de corao de atleta e de controlos(76). Butz et al.
sugerem que um strain longitudinal global >-10% tem uma sensibilidade de 80% e
uma especificidade de 95% para distinguir MCH de corao de atleta e de controlos(77).
Num estudo baseado no Doppler tecidular, foi demonstrado que o strain
longitudinal da parede septal e posterior normal nos atletas, independentemente da
presena ou no de HVE(78). Outro estudo demonstrou ainda que os valores de strain
no diferem entre atletas e controlos(79).
ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM
MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA
21
ii. O strain longitudinal permite distinguir os doentes gentipo
positivo/fentipo negativo de MCH dos controlos
Yiu et al. sugerem que o strain longitudinal basal anteroseptal est diminudo
nos doentes com gentipo positivo/ fentipo negativo de MCH, podendo ser utilizado
para distingui-los dos controlos(80).
Tambm De S et al. no constataram nenhuma diferena no strain longitudinal
global entre doentes com gentipo positivo/fentipo negativo e controlos, mas
detectaram nos portadores em comparao com os controlos uma diminuio no strain
longitudinal basal septal e um aumento do strain longitudinal nos segmentos basal e
mdio posteriores(81).
iii. Existe uma correlao entre o strain longitudinal e a presena de
fibrose miocrdica
Chang et al. identificaram a espessura das paredes e a quantidade de realce
tardio regional como preditores independentes do strain longitudinal regional do VE
nos doentes com MCH. Relataram ainda que o ndice de massa do VE e o volume
total de realce tardio foram identificados como preditores independentes do strain
longitudinal global do VE(82). Tambm Ghio et al. tinham detectado uma associao
entre realce tardio e strain sistlico obtido por Doppler tecidular(83). Foi ainda
documentada uma associao entre o strain longitudinal do VE e o n de segmentos
fibrticos e a fibrose total(84).
Weidemann et al. demonstraram que os segmentos do VE que exibiam realce
tardio na RM cardaca apresentavam um sinal caracterstico, o double peak sign, no
traado do strain rate, constitudo por um pico precoce sistlico seguido por um
declnio rpido para valores prximos de zero e posteriormente por um segundo pico
no relaxamento isovolumtrico. A presena deste double peak sign parece constituir
um meio de diagnstico de fibrose regional(85).
Tambm Yajima et al. mostraram que nos doentes com MCH o strain
longitudinal pode ser utilizado para distinguir a natureza de uma leso detectada em
TC multicorte, sendo que o strain longitudinal est mais reduzido nas leses
miocrdicas fibrticas do que nas no fibrticas(86).
iv. Existe uma correlao entre o strain longitudinal e os dados
hemodinmicos invasivos
Garceau et al. encontraram uma associao entre a relao do strain rate
diastlico precoce para o strain rate sistlico (SrE/SrS) e a presso telediastlica do
VE. Neste estudo, a relao SrE/SrS tinha uma sensibilidade de 87% e uma
ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM
MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA
22
especificidade de 75% para detectar uma presso telediastlica do VE elevada
(>15mmHg)(87).
v. Existe uma correlao entre o strain longitudinal e a ocorrncia de
eventos clnicos cardacos
O strain longitudinal global est mais diminudo nos doentes com realce tardio
e nos doentes com eventos cardacos major(88).
Noutro estudo, Correia et al. identificaram o strain longitudinal global como
preditor de taquicardias ventriculares no sustentadas. Os doentes com estas
disritmias tinham piores valores de strain longitudinal global e regional localizado nos
segmentos mdio e apical do septo e segmento apical lateral. Um valor de strain
longitudinal no segmento mdio-septal >-10.5% era preditor de taquicardia ventricular
no sustentada(89).
J Di Salvo et al. encontraram reduo do strain longitudinal nos segmentos
basal e mdio septais e basal antero-septal nos doentes com MCH e taquicardia
ventricular no sustentada. Neste estudo, um strain longitudinal global >-10% foi
preditor de taquicardia ventricular no sustentada(90).
b. Strain radial e circunferencial
i. Na MCH existe tambm diminuio do strain radial e circunferencial
Os doentes com MCH assimtrica septal assim como os doentes com MCH
apical tm diminuio dos strains longitudinal, radial e circunferencial globais(91).
Abozquia et al. tambm mostraram que especificamente nos doentes com MCH no
obstrutiva tambm h uma diminuio dos strains longitudinal, radial e circunferencial
globais em comparao com os controlos. Os strains longitudinal, radial e
circunferencial globais do VE esto diminudos na MCH, mesmo na ausncia de
fibrose(84).
O exerccio aumenta significativamente todos os tipos de strain nos controlos,
enquanto que nos doentes com MCH esse aumento moderado e apenas se verifica
para o strain longitudinal(92).
ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM
MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA
23
c. Torso ventricular
i. Na MCH existe um aumento da torso ventricular e um atraso do
untwist
Young et al., num dos primeiros estudos baseados na deformao miocrdica
avaliada por RM cardaca, mostraram que os doentes com MCH tm um aumento da
torso do VE(93).
Saito et al., comparando doentes com MCH, hipertrofia hipertensiva e
controlos, demonstraram que a torso est aumentada quer nos doentes com MCH
quer nos doentes com hipertrofia hipertensiva. J o untwist est reduzido e atrasado
(94). Tambm Takeuchi et al. demonstraram nos doentes com HVE secundria HTA
que o twist est preservado e o untwist est reduzido e atrasado(95).
Especificamente nos doentes com MCH assimtrica septal, o twist tambm
est preservado nos doentes com Fej preservada, mas est prolongado, determinando
um atraso no incio do untwist(91, 96).
Nos doentes com MCH septal, o twist est aumentado em comparao com os
controlos aparentemente devido a um aumento da rotao basal. O twist parece ainda
variar de acordo com a morfologia do septo, sendo que os doentes com uma curvatura
septal sigmide tpica, em comparao com os doentes com curvatura septal reversa,
tm maior twist ventricular e maior rotao apical(96).
Usando a tecnologia de strain 3D, Urbano et al. demonstraram que os doentes
com MCH tinham um aumento do twist em relao aos controlos, essencialmente
custa de um aumento da rotao apical nos doentes com MCH obstrutiva. Tambm
neste estudo se mostrou que a torso nos doentes com MCH mais prolongada e o
untwist est atrasado(97).
No estudo de Wang et al., em doentes com MCH obstrutiva, o twist e o untwist
rate no so diferentes dos controlos, mas tambm neste estudo se mostra que o
untwist est atrasado, o que contribui para uma presso de enchimento do VE mais
elevada, um menor volume ventricular e menor tolerncia ao exerccio(98).
Especificamente nos doentes com MCH no obstrutiva, Abozquia et al. tambm
mostraram que, em comparao com os controlos, h um atraso do untwist, que est
associado a menor tolerncia ao exerccio(99).
Num dos primeiros estudos de torso ventricular avaliada por Speckle Tracking
2D, abrangendo doentes com hipertenso arterial, MCH ou amiloidose, verificou-se
que os doentes com disfuno diastlica ligeira tinham aumento da torso, enquanto
que os doentes com disfuno diastlica moderada ou grave tinham torso normal ou
reduzida(100).Noutro estudo comparando doentes com MCH e controlos, verificou-se
que a velocidade pico de untwisting e o untwist rate esto aumentados nos doentes
ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM
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24
com disfuno diastlica ligeira e diminudos nos doentes com disfuno diastlica
moderada ou severa(101).
Os doentes com MCH apical, em comparao com os controlos, apresentaram
uma diminuio da torso devido diminuio da rotao apical(102).
Notomi et al. demonstraram que quer em controlos quer em doentes com MCH
o untwisting contribui para gerar um gradiente de presso intraventricular da base para
o pex, ou seja, uma suco diastlica ventricular que contribui para o enchimento
ventricular precoce. Segundo estes autores, existe uma relao linear entre a taxa de
untwisting e o gradiente pico de presso de suco diastlica(103).
Num dos primeiros estudos da torso ventricular avaliada por Doppler em
indivduos saudveis, verificou-se que o untwisting ocorre normalmente durante a fase
de relaxamento isovolumtrico e enchimento precoce do VE. O exerccio fsico nos
indivduos saudveis resulta num aumento da torso e da velocidade do untwisting e
num aumento do gradiente intraventricular, facilitando a suco ventricular. Nos
doentes com MCH, a torso est aumentada e o untwist est atrasado em repouso,
mas nenhum deles aumenta com o exerccio fsico(104).
Soullier et al. tambm mostraram que nos doentes com MCH o twist est
aumentado em comparao com os controlos e que o exerccio leva a um untwist
reduzido e mais tardio(92).
d. Strain da AE
i. Na MCH ocorre diminuio do strain da AE, o que parece ser um
preditor de FA
Gabrielli et al. mostraram que o strain e o strain rate da AE esto
significativamente diminudos nos doentes com MCH em comparao com atletas e
controlos(104, 106). Um cut-off de strain da AE de -10.82% permite distinguir MCH de
outras causas de HVE com uma sensibilidade de 82% e especificidade de 81%(107).
Eshoo et al. tambm demonstraram que o strain rate diastlico tardio da AE obtido por
Doppler tecidular permite distinguir doentes com MCH de doentes com HTA e de
controlos(108).
Noutro estudo, o strain rate diastlico tardio foi identificado como preditor
independente da presena de sintomas de insuficincia cardaca(104). Girasis et al.
detectaram uma associao entre o strain rate da AE e a existncia de FA paroxstica
nos doentes com MCH(109). O strain da AE foi identificado como preditor de eventos
cardacos, incluindo hospitalizao por FA(110).
ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM
MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA
25
2. OBJECTIVOS
O objectivo geral deste estudo a avaliao da funo ventricular de doentes
com MCH atravs de strain obtido por speckle tracking, com maior nfase para o twist
ventricular.
Os objectivos especficos do trabalho so:
Caracterizao da funo ventricular de uma populao de doentes com
MCH por tcnicas de strain obtido por speckle tracking (incluindo strain
longitudinal, radial e circunferencial e twist ventricular) e sua comparao
com uma populao controlo;
Caracterizao da funo ventricular de uma populao de doentes com
MCH por tcnicas de strain obtido por speckle tracking (incluindo strain
longitudinal, radial e circunferencial e twist ventricular) e sua comparao
com uma populao de HVE secundria a HTA;
Avaliao do twist ventricular em doentes com MCH obstrutiva e no
obstrutiva;
Avaliao do twist ventricular em doentes com MCH e diferentes graus de
disfuno diastlica;
Determinao dos preditores independentes do twist ventricular em doentes
com MCH;
Estudo de variabilidade inter-observador na avaliao do twist ventricular.
ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM
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26
3. METODOLOGIA
3.1. Tipologia do Estudo e Mtodo de Abordagem
O presente estudo um estudo de amostragem, sendo os critrios de seleco
da amostra previamente definidos pelo investigador.
Este estudo do tipo observacional, pois no pressupe a realizao de uma
interveno controlada pelo investigador, no existindo assim uma interferncia directa
na evoluo dos doentes estudados.
Neste estudo foi utilizada uma metodologia transversal, pois a amostra
estudada num ponto determinado do tempo, sendo a quantificados todos os
parmetros previamente definidos, no existindo um seguimento ao longo do tempo.
Foi efectuado de forma prospectiva com a aplicao do protocolo de avaliao
pr-definido no incio do estudo a todos os doentes e controlos seleccionados.
Trata-se ainda de um estudo descritivo e comparativo, pois so descritas e
comparadas as variveis previamente definidas entre os vrios grupos de indivduos
(doentes com MCH, doentes com HVE secundria a HTA e controlos).
O mtodo comparativo utilizado foi o mtodo quantitativo, tendo-se aplicado o
estudo estatstico mais adequado para quantificar e avaliar a existncia de
associaes entre as variveis estudadas nos diferentes grupos de indivduos.
3.2. Populao e Amostra
A populao alvo deste estudo so os indivduos adultos (18 anos) com
diagnstico de MCH. Por conseguinte, foram recrutados para este estudo todos os
doentes adultos com diagnstico conhecido de MCH que eram seguidos na consulta
de cardiologia no Centro Hospitalar do Alto Ave (CHAA) - Guimares.
Foram ainda definidos dois grupos de comparao, totalizando assim 3
amostras diferentes:
- Grupo 1: Doentes com MCH
- Grupo 2: Doentes com HVE secundria HTA
- Grupo 3: Controlos
O grupo de doentes com HVE secundria HTA foi seleccionado a partir dos
doentes adultos hipertensos consecutivos que foram submetidos a monitorizao
ambulatria da presso arterial (MAPA) no perodo de Janeiro de 2009 a Dezembro de
2011. Deste grupo de doentes hipertensos, foram recrutados para este estudo apenas
aqueles que tinham realizado previamente ecocardiograma e que apresentavam HVE
documentada nesse ecocardiograma prvio. Estes indivduos foram ento submetidos
ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM
MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA
27
ao ecocardiograma do estudo, tendo sido includos no estudo apenas os que
mantinham critrios de HVE no ecocardiograma.
O grupo de controlos, representando a populao de indivduos saudveis, foi
seleccionado aleatoriamente a partir da populao de funcionrios do Centro
Hospitalar do Alto Ave Guimares. Desta amostra aleatria, apenas os funcionrios
saudveis foram submetidos a ecocardiograma, tendo sido includos no estudo apenas
os que no apresentaram HVE.
3.2.1. Critrios de incluso e excluso
Todos os indivduos includos deram consentimento informado por escrito antes
da realizao do ecocardiograma.
3.2.1.1. Grupo 1: Doentes com MCH
Critrios de Incluso
Foram includos neste estudo todos os indivduos adultos (18 anos), seguidos
na consulta de cardiologia do Centro Hospitalar do Alto Ave Guimares, com
diagnstico prvio de MCH.
Entende-se por doentes com MCH, todos aqueles que cumpriam os critrios
morfolgicos de diagnstico de MCH, tais como definidos no documento de consenso
sobre a Classificao Europeia das Miocardiopatias do Grupo de Estudos das
Doenas do Miocrdio e Pericrdio da Sociedade Europeia de Cardiologia (1). Desta
forma, foram includos os doentes que apresentavam no ecocardiograma um padro
de HVE com espessura mxima da parede VE 15mm, que no era clinicamente
justificvel por condies de sobrecarga, tais como HTA ou doena valvular. Do
mesmo modo, foram includos os doentes com formas apicais de MCH.
Critrios de Excluso
Foram excludos deste grupo os indivduos que cumpriam um dos seguintes
critrios:
1) HVE secundria a HTA;
2) HVE secundria a doena valvular;
3) HVE secundria a doena sistmica ou metablica estabelecida;
4) Diagnstico de MCH duvidoso ou que no esteja completamente
estabelecido;
5) MCH j submetida a miectomia ou ablao septal;
ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM
MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA
28
6) Doena coronria significativa;
7) Doena valvular moderada ou severa;
8) Cardiopatia congnita;
9) Ritmo de fibrilhao/flutter auricular, pacemaker ou outro ritmo que no o
sinusal;
10) Bloqueio auriculo-ventricular de 2 ou 3 grau.
3.2.1.2. Grupo 2: Doentes com HVE secundria HTA
Critrios de Incluso
Foram includos neste estudo os indivduos adultos (18 anos) que cumpriam
todos os seguintes critrios:
1) Diagnstico prvio de HTA (definida como um mnimo de 3 medies da
tenso arterial sistlica 140 e/ou diastlica 90mmHg);
2) Realizao prvia de MAPA no perodo de Janeiro de 2009 a Dezembro
de 2011;
3) HVE j conhecida e documentada em ecocardiograma prvio;
4) Ecocardiograma do estudo mostrando HVE com espessura mxima da
parede VE 13mm.
Critrios de Excluso
Foram excludos deste grupo os indivduos que cumpriam um dos seguintes
critrios:
1) HVE secundria a doena valvular;
2) HVE secundria a doena sistmica ou metablica estabelecida;
3) HVE com estudo gentico positivo para mutao de protenas
sarcomricas ou histria familiar de MCH;
4) Atribuio duvidosa da HTA como causa da HVE;
5) Doena coronria significativa;
6) Doena valvular moderada ou severa;
7) Cardiopatia congnita;
8) Ritmo de fibrilhao/flutter auricular, pacemaker ou outro ritmo que no o
sinusal;
9) Bloqueio auriculo-ventricular de 2 ou 3 grau.
ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM
MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA
29
3.2.1.3. Grupo 3: Controlos
Critrios de Incluso
Foram includos como controlos indivduos adultos (18 anos), funcionrios do
CHAA, que cumpriam todos os seguintes critrios:
1) Indivduos sem histria de doena cardaca e assintomticos do foro
cardiovascular;
2) Ausncia de HVE no ecocardiograma.
Critrios de Excluso
Foram excludos deste grupo os indivduos que cumpriam um dos seguintes
critrios:
1) HTA;
2) Doena valvular, coronria ou outra doena cardaca significativa;
3) Doena sistmica, metablica, congnita, neoplsica ou qualquer
disfuno orgnica grave (renal, respiratria, neurolgica ou outra).
3.2.2. Dimenses e Categorias do Estudo
Este estudo envolve trs grandes dimenses:
- Variveis Demogrficas e Clnicas
- Estudo Ecocardiogrfico/Doppler Convencional
- Estudo da Deformao Miocrdica por Speckle Tracking
Dentro da dimenso do estudo ecocardiogrfico/Doppler convencional definem-
se vrias categorias de estudo:
- Estudo ecocardiogrfico 2D + Modo M
- Estudo de Doppler pulsado
- Estudo de Doppler tecidular
Dentro de cada categoria ainda possvel definir vrios grupos de variveis.
ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM
MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA
30
3.2.3. Variveis
As variveis definidas neste estudo so qualitativas e quantitativas.
Tabela 1 Variveis Demogrficas e Clnicas.
VARIVEIS CATEGRICAS
Varivel Tipo Categorias
Gnero Nominal M/F
HTA Nominal S/N
Diabetes mellitus Nominal S/N
Dislipidemia Nominal S/N
Tabagismo Nominal S/N
Obesidade Nominal S/N
Doena coronria Nominal S/N
Doena valvular Nominal S/N
Doena cardaca congnita Nominal S/N
Ritmo de flutter/fibrilhao auricular Nominal S/N
Ritmo de pacemaker Nominal S/N
Bloqueio auriculo-ventricular de 2 ou 3 grau Nominal S/N
CDI Nominal S/N
CRT Nominal S/N
Doena cerebrovascular Nominal S/N
Doena arterial perifrica Nominal S/N
Doena pulmonar Nominal S/N
Doena renal Nominal S/N
Doena neurolgica Nominal S/N
Doena metablica Nominal S/N
Neoplasia Nominal S/N
Outra doena Nominal S/N
Sintomas Nominal S/N
Dispneia Nominal S/N
Classe NYHA Nominal S/N
Dor torcica Nominal S/N
Sncope Nominal S/N
Holter 24h realizado Nominal S/N
Taquicardia ventricular sustentada no Holter Nominal S/N
Taquicardia ventricular no sustentada no Holter Nominal S/N
Taquicardia supraventricular no Holter Nominal S/N
Fibrilhao/Flutter auricular no Holter Nominal S/N
Bloqueio de ramo esquerdo no Holter Nominal S/N
Bloqueio auriculo-ventricular de 2 ou 3 grau no
Holter
Nominal S/N
Ecocardiograma de esforo realizado Nominal S/N
Obstruo latente no ecocardiograma de esforo Nominal S/N
RM cardaca realizada Nominal S/N
Realce tardio na RM cardaca Nominal S/N
ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM
MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA
31
Estudo gentico realizado Nominal S/N
Estudo gentico alterado Nominal S/N
Teraputica com beta-bloqueante Nominal S/N
Teraputica com antagonistas dos canais de
clcio/outros antiarrtmicos
Nominal S/N
Teraputica com IECA/ARA II/Antagonistas dos
receptores da aldosterona
Nominal S/N
Teraputica com diurticos Nominal S/N
VARIVEIS NUMRICAS
Varivel Tipo Unidades
Idade Contnua anos
rea de superfcie corporal Contnua m2
ndice de massa corporal Contnua Kg/m2
Tabela 2 - Variveis da Ecocardiografia Convencional - 2D e Modo M
VARIVEIS CATEGRICAS
Varivel Tipo Categorias
HVE Nominal S/N
MCH Nominal S/N
Padro de HVE Nominal Assimtrica Simtrica
Apical No aplicvel
VARIVEIS NUMRICAS
Varivel Tipo Unidades
Espessura do SIV Contnua mm
Espessura da parede posterior Contnua mm
Dimetro telediastlico do VE Contnua mm
Massa do VE Contnua g
Massa do VE indexada rea de superfcie
corporal
Contnua g/m2
Dimetro da AE Contnua mm
Volume da AE Contnua mL
Volume da AE indexado rea de superfcie
corporal
Contnua mL/m2
Fej do VE Contnua %
Tabela 3 - Variveis da Ecocardiografia Convencional - Doppler
VARIVEIS NUMRICAS
Varivel Tipo Unidades
Velocidade da onda E Contnua m/s
Velocidade da onda A Contnua m/s
Relao E/A Contnua -
ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM
MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA
32
TRIV Contnua ms
TD Contnua ms
Velocidade da onda S Contnua m/s
Velocidade da onda D Contnua m/s
Velocidade da onda Ar Contnua m/s
Durao Ar A Contnua ms
Velocidade da onda E
(a nvel septal e lateral, mdia)
Contnua m/s
Velocidade da onda A
(a nvel septal e lateral, mdia)
Contnua m/s
Velocidade da onda S
(a nvel septal e lateral, mdia)
Contnua m/s
Relao E/E Contnua -
Gradiente de presso na CSVE Contnua mmHg
Tabela 4 - Variveis de Deformao Miocrdica
VARIVEIS NUMRICAS
Varivel Tipo Unidades
Global Longitudinal Strain Contnua %
Global Longitudinal Strain Rate Contnua s-1
Global Radial Strain Contnua %
Global Radial Strain Rate Contnua s-1
Global Circumferential Strain Contnua %
Global Circumferential Strain Rate Contnua s-1
Rotao da base Contnua
Rotao do pex Contnua
Twist do VE Contnua
3.3. Instrumento de recolha de dados
Para a realizao deste estudo, foi considerado que o instrumento de recolha
da informao mais adequado seria o formulrio. Foram assim construdos dois
formulrios, um para a recolha dos dados demogrficos e clnicos (Apndice 1) e outro
para a recolha dos dados ecocardiogrficos (Apndice 2).
ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM
MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA
33
3.4 Procedimentos de Recolha de Dados
A recolha de dados foi efectuada conjuntamente pelo mdico cardiologista e
pelo tcnico de cardiopneumologia no momento da realizao do ecocardiograma no
Centro Hospitalar do Alto Ave Guimares.
Os dados demogrficos e clnicos foram colhidos atravs de questionrio
dirigido ao indivduo e de consulta do respectivo processo clnico. Os dados obtidos
foram registados num formulrio devidamente criado para esse efeito.
Todos os indivduos participantes no estudo foram submetidos a um
ecocardiograma segundo um mesmo protocolo previamente definido. Os dados
ecocardiogrficos foram analisados e posteriormente registados num formulrio
devidamente criado para esse efeito (Figura 9).
Figura 9 Fluxograma do desenho do estudo
ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM
MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA
34
Protocolo de ecocardiograma
Todos os indivduos seleccionados para participar no estudo foram submetidos
a um ecocardiograma transtorcico realizado num ecgrafo GE Vivid 7,com sonda
multifrequncia M3S (1.5-4.3 MHz). O ecocardiograma foi realizado segundo as
recomendaes da Sociedade Europeia e Americana de Ecocardiografia (34). Foi
aplicado o seguinte protocolo ecocardiogrfico a todos os indivduos (Apndice 3):
1. Aquisio de cineloops de dois ciclos cardacos em modo bidimensional, na
janela paraesternal esquerda eixo longo, com frame rate superior a 50 fps;
2. Aquisio de cineloops de dois ciclos cardacos em modo bidimensional, na
janela paraesternal esquerda eixo longo, com Doppler de cor;
3. Aquisio de imagem em modo M na janela paraesternal esquerda eixo
longo ao nvel da vlvula mitral para pesquisa de SAM da vlvula mitral;
4. Aquisio de cineloops de dois ciclos cardacos em modo bidimensional, na
janela paraesternal esquerda eixo curto (a nvel dos grandes vasos, vlvula
mitral, msculos papilares e apx), com frame rate superior a 50 fps;
5. Aquisio de imagem de Doppler de cor na janela paraesternal esquerda
eixo curto a nvel dos grandes vasos e de Doppler pulsado ao nvel da
cmara de sada do ventrculo direito;
6. Aquisio de cineloops de dois ciclos cardacos em modo bidimensional, na
janela apical de 4 cmaras, mostrando quer as 4 cmaras quer os
ventrculos, com frame rate superior a 50 fps;
7. Aquisio de cineloops de dois ciclos cardacos em modo bidimensional,
com Doppler tecidular de cor, na janela apical de 4 cmaras, mostrando
quer as 4 cmaras quer os ventrculos;
8. Aquisio de cineloops de dois ciclos cardacos em modo bidimensional, na
janela apical de 4 cmaras, com Doppler de cor;
9. Aquisio de imagem de Doppler contnuo ao nvel da vlvula artica e
pulsado ao nvel da CSVE na janela apical de 4 cmaras para pesquisa de
obstruo ejeco ventricular;
10. Aquisio de imagem de Doppler contnuo ao nvel da vlvula tricspide na
janela apical de 4 cmaras para anlise do gradiente de presso entre o
ventrculo direito e a aurcula direita;
11. Aquisio de imagem de Doppler pulsado na janela apical de 4 cmaras ao
nvel dos tips da vlvula mitral para anlise do enchimento ventricular
esquerdo e ao nvel do anel mitral para determinao da durao da onda A;
12. Aquisio de imagem de Doppler pulsado na janela apical de 5 cmaras ao
nvel da CSVE junto do folheto anterior da vlvula mitral, de modo a registar
ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM
MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA
35
simultaneamente o fluxo de enchimento ventricular e o fluxo da CSVE e
assim obter o TRIV;
13. Aquisio de imagem de Doppler pulsado na janela apical de 4 cmaras ao
nvel da veia pulmonar superior direita para anlise do fluxo venoso
pulmonar;
14. Aquisio de imagem de Doppler tecidular na janela apical de 4 cmaras
com a amostra colocada ao nvel do lado septal e lateral do anel mitral para
anlise das velocidades de contraco e relaxamento miocrdico do VE;
15. Aquisio de imagem de modo M na janela apical de 4 cmaras ao nvel do
anel tricspide;
16. Aquisio de imagem de Doppler tecidular na janela apical de 4 cmaras
com a amostra colocada ao nvel do anel tricspide para anlise das
velocidades de contraco e relaxamento miocrdico do VD;
17. Aquisio de cineloops de dois ciclos cardacos em modo bidimensional, na
janela apical de 2 cmaras, mostrando quer as 2 cmaras quer o VE, com
frame rate superior a 50 fps;
18. Aquisio de cineloops de dois ciclos cardacos em modo bidimensional,
com Doppler tecidular de cor, na janela apical de 2 cmaras, mostrando
quer as 2 cmaras quer o VE;
19. Aquisio de cineloops de dois ciclos cardacos em modo bidimensional, na
janela apical de 2 cmaras, com Doppler de cor;
20. Aquisio de cineloops de dois ciclos cardacos em modo bidimensional, na
janela apical de 3 cmaras, mostrando quer as 3 cmaras quer o VE, com
frame rate superior a 50 fps;
21. Aquisio de cineloops de dois ciclos cardacos em modo bidimensional, na
janela apical de 3 cmaras, com Doppler de cor;
22. Aquisio de cineloops de dois ciclos cardacos na janela subcostal, quer
em modo bidimensional quer em modo M da veia cava inferior;
23. Armazenamento da imagem digital em formato raw data e posterior anlise
dos dados em estao de trabalho Echopac (GE);
24. Todas as medies ecocardiogrficas convencionais foram realizadas trs
vezes, tendo sido utilizada a mdia das trs medies;
25. Em anlise ps-processamento, foram determinadas a espessura das
paredes ventriculares e a massa ventricular pelo mtodo de Devereux; a
dimenso linear e o volume da AE; a fraco de ejeco e os volumes
telessistlico e telediastlico do ventrculo esquerdo pelo mtodo de
ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM
MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA
36
Simpson; o gradiente de presso na cmara de sada do VE; e a presso
sistlica estimada da artria pulmonar;
26. Tambm em anlise ps-processamento foram determinadas as
velocidades das ondas E e A, a relao E/A, o TRIV, o TD, as velocidades
das ondas S, D e Ar, a diferena de durao da onda Ar-A, as velocidades
das ondas E, A e S e as suas mdias e a relao E/E;
27. A anlise por speckle tracking da deformao miocrdica tambm foi
efectuada em ps-processamento, tendo sido utilizado um sistema semi-
automtico de tracking do miocrdio, com correco manual do bordo
endocrdico em telessstole e ajustamento da regio de interesse. A partir
do registo de Doppler pulsado do fluxo artico, foram marcados os
momentos de abertura e encerramento da vlvula artica. Foram analisados
18 segmentos em cada indivduo, tendo sido includos apenas para efeito de
anlise da deformao miocrdica aqueles cuja qualidade do tracking
miocrdico foi considerada adequada simultaneamente pelo sistema de
anlise automtica e pelo operador (mediante avaliao visual);
28. A partir das imagens das janelas apicais de 4, 2 e 3 cmaras, obtiveram-se
os valores no pico da sstole de strain e strain rate longitudinais globais
(Figura 10).
Figura 10 Strain longitudinal nas janelas apicais de 4, 2 e 3 cmaras e em formato bulls-eye num doente
com MCH obstrutiva
ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM
MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA
37
29. A partir das imagens da janela paraesternal esquerda eixo curto ao nvel da
vlvula mitral, msculos papilares e pex do VE, obtiveram-se os valores no
pico da sstole de strain e strain rate radiais e circunferenciais globais
(Figura 11). A partir das imagens da janela paraesternal esquerda eixo curto
ao nvel da vlvula mitral e pex do VE, obtiveram-se os valores de rotao
basal e apical e do twist ventricular (Figura 12).
Figura 11 Deformao miocrdica radial da base e do pex do VE
Figura 12 - Curvas de rotao basal (magenta) e apical do VE (azul) e de twist ventricular (branca) num
doente com MCH obstrutiva
3.5. Reprodutibilidade Variabilidade inter-observador
A reprodutibilidade depende da concordncia conseguida entre resultados
independentes obtidos pela mesma metodologia. A ecocardiografia uma tcnica
muito dependente do operador, pelo que a experincia fundamental para minimizar a
variabilidade inter-observador, que poder decorrer quer da tcnica de aquisio das
imagens quer da medio efectuada nas imagens adquiridas.
ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM
MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA
38
O mestrando desta tese apresenta uma grande experincia profissional quer na
aquisio das imagens quer na realizao das medies por ecocardiografia
convencional, apresentando contudo uma experincia mais reduzida na avaliao da
deformao miocrdica por speckle tracking. Por outro lado, algumas medidas
ecocardiogrficas, nomeadamente relacionadas com a deformao miocrdica,
acarretam maior variabilidade inter-observador, mesmo entre observadores
experientes.
Por estes motivos, logo aps a realizao do ecocardiograma, foi realizado um
segundo ecocardiograma por um operador mais experiente a um grupo aleatrio de 10
indivduos, de modo a avaliar a variabilidade inter-observador.
3.6. Mtodos de Anlise de Dados
Os dados colhidos foram inseridos numa base de dados criada para esse efeito
no programa de anlise estatstica SPSS (Statistical Package for Social Sciences)
verso 20.0.
Foi efectuada inicialmente uma anlise estatstica descritiva. Para as variveis
qualitativas, foram determinadas as frequncias e para as variveis quantitativas foram
determinadas as mdias, medianas, desvios padro e varincias.
Para os dados ecocardiogrficos, foi determinada a variabilidade inter-
observador, tendo-se optado pelo clculo da percentagem de variabilidade das
medies, obtida pela diviso da diferena absoluta pela mdia das duas medies.
Posteriormente foi efectuada uma anlise comparativa entre o grupo dos
doentes com MCH e o grupo dos doentes com HVE secundria HTA; e entre o grupo
dos doentes com MCH e o grupo dos controlos. Do mesmo modo tambm foi
efectuada uma anlise comparativa de doentes com MCH assimtrica obstrutiva vs.
no obstrutiva, MCH com disfuno diastlica grau I vs. grau II ou III e MCH com idade
inferior vs. superior mediana .
Para a comparao das variveis qualitativas foi utilizado o teste do Qui-
Quadrado, sendo definido um nvel de significncia de 95%.
Para as variveis quantitativas contnuas, foi avaliada a normalidade da
distribuio de cada varivel e dado que o n de cada grupo inferior a 50 optou-se
pela aplicao do Teste de Shapiro-Wilk. Para as variveis com distribuio normal, foi
aplicado o teste t de Student com um nvel de significncia de 95%. Para as variveis
que no apresentaram uma distribuio normal, foi aplicado o teste no paramtrico
de Mann-Whitney, tambm com um nvel de significncia de 95%.
ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM
MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA
39
Foi efectuada ainda uma anlise multivariada usando o mtodo de regresso
linear para identificar se a idade, massa do VE, espessura do SIV e gradiente de
presso na CSVE so preditores independentes do twist ventricular.
Os resultados da anlise estatstica dos dados foram organizados sob a forma
de tabelas e grficos.
3.7. Consideraes ticas e Legais
O investigador deste trabalho regeu-se pelas boas prticas ticas e legais.
O estudo foi submetido e autorizado pelo Conselho de tica do Centro
Hospitalar do Alto Ave - Guimares (Apndice 4).
Foi dada informao adequada sobre o estudo a todos os indivduos
participantes e obtido o seu consentimento informado por escrito (Apndice 5).
O anonimato dos dados foi garantido atravs da atribuio de um cdigo
numrico aos participantes, no constando assim dos formulrios ou da base de
dados informtica qualquer elemento identificativo dos mesmos.
Neste estudo foram respeitadas as recomendaes constantes das
Declaraes de Helsnquia e Tquio, da OMS e da Comunidade Europeia, bem como
a constante no DL 118/04 de 19 de Agosto, DR I Srie.
ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM
MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA
40
4. RESULTADOS
4.1. Caractersticas demogrficas e clnicas dos indivduos
Este estudo incluiu prospectivamente 20 doentes com MCH, 16 doentes com
HVE secundria HTA e 17 controlos.
As caractersticas demogrficas no eram significativamente diferentes entre
os doentes com MCH e os doentes com HVE secundria HTA. Os controlos eram
predominantemente mulheres, ao contrrio dos doentes com MCH que eram
predominantemente homens. Os controlos tambm eram indivduos mais jovens do
que os doentes com MCH. Estas diferenas aproximaram-se da significncia
estatstica, embora esta no tenha sido atingida. Os controlos por definio eram
indivduos saudveis, o que se reflecte num menor ndice de massa corporal (IMC)
(Tabela 5).
Tabela 5 Caractersticas demogrficas dos doentes com MCH, doentes com HVE secundria HTA e
controlos
CARACTERSTICAS DEMOGRFICAS
MCH
(n=20)
HVE HTA
(n=16)
CONTROLOS
(n=17)
p1 p2
Sexo masculino 14 (70%) 7 (43.8%) 6 (35.3%) 0.212 0.075
Idade (anos) 6013 6111 544 0.803 0.093
IMC (Kg/m2) 29.64.0 29.83.9 26.44.5 0.919 0.032 MCH, miocardiopatia hipertrfica; HVE HTA, hipertrofia hipertensiva; IMC, ndice de massa corporal p1, MCH vs. HVE HTA; p2, MCH vs. Controlos
Os doentes com HVE secundria HTA tinham todos por definio HTA, mas
de salientar que a HTA era tambm uma comorbilidade frequente nos doentes com
MCH (55%), possivelmente explicada pela idade mdia destes doentes.
Quanto s restantes caractersticas clnicas cardiovasculares, no foram
encontradas diferenas entre os doentes com MCH e os doentes com HVE secundria
HTA. Quer os doentes com MCH, quer os doentes com HVE secundria a HTA
apresentavam ainda histria de outras doenas no cardiovasculares, nomeadamente
do foro tiroideu, neoplsico ou psiquitrico (Tabela 6).
Os controlos eram por definio indivduos saudveis sem histria de doena
cardiovascular ou outra.
ESTUDO DA FUNO VENTRICULAR POR STRAIN OBTIDO POR SPECKLE TRACKING EM DOENTES COM
MIOCARDIOPATIA HIPERTRFICA
41
Tabela 6 Caractersticas clnicas dos doentes com MCH, doentes com HVE secundria HTA e
controlos
CARACTERSTICAS CLNICAS
MCH
(n=20)
HVE HTA
(n=16)
p
HTA 11 (55%) 16 (100%) 0.007
Diabetes mellitus 4 (20%) 1 (6.3%) 0.484
Dislipidemia 10 (50%) 10 (62.5%) 0.680
Tabagismo 4 (20%) 1 (6.3%) 0.484
Obesidade 3 (15%) 6 (37.5%) 0.245
Histria de fibrilhao auricular 3 (15%) 3 (18.8%) 1.000
Doena cerebrovascular 1 (5%) 3 (18.8%) 0.441
Doena arterial perifrica 1 (5%) 1 (6.3%) 1.000
Doena pulmonar crnica obstrutiva 1 (5%) 1 (6.3%) 1.000
Outra doena no cardiovascular 11 (55%) 5 (31.3%) 0.245 MCH, miocardiopatia hipertrfica; HVE HTA, hipertrofia hipertensiva; HTA, hipertenso arterial
Apenas os doentes com MCH apresentavam sintomas cardiovasculares,
nomeadamente sncope (20%), dor torcica (35%) ou dispneia (50%), sendo que
metade dos doentes se encontrava em classe I e a outra metade em classe II NYHA.
Apenas os doentes com MCH tinham histria de hospitalizaes por motivo
cardiovascular (40%), sendo os motivos mais frequentes a dor torcica (25%) e a
fibrilhao auricular (10%).
O ecocardiograma mostrava obstruo em repouso em 8 doent