Estudando a Praxeologia Em Museus

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Título: Estudando a Praxeologia em Museus 1. Afinal o que é Praxeologia? A Praxeologia origina-se como um conceito da Teoria Antropológica do Didático (ATD), e, de maneira geral, designa o estudo da estrutura mais simples da atividade humana, ou melhor, é tido como uma organização antrópica, que, em linguagem biológica significa dizer que é o estudo da ação humana sobre um meio. A ATD surge, na França, em meados da década de 1980, baseada nos pensamentos do teórico Yves Chevallard (matemático francês), oriunda de um programa de investigação denominado Programa Epistemológico que teve como ponto de partida os trabalhos de Guy Brousseau (pesquisador francês), pesquisador que tem se destacado desde 1960 no desenvolvimento dos estudos sobre a Didática da Matemática. Os teóricos filiados ao Programa Epistemológico (Brosseau, Chevallard, Gáscon) colocavam em pauta a problemática da formação docente no interior das instituições de formação – dificultavam o acesso e a compreensão do estudante para com a disciplina matemática (rigidez dos códigos escolares – normas, programas, currículos...) e as práticas centradas apenas no processo de ensino e de aprendizagem, e não no “estudo” como ele preconiza (Chevallard) . A ATD, neste contexto, aparece face às críticas apontadas, devida à popularização da Teoria da Transposição Didática (TTD) no meio educacional (formal e não formal), dentro e fora da França, o que acarretou, em alguns casos, uma descaracterização das noções contidas nos pressupostos dessa teoria, gerando críticas e colocando em dúvida, em alguns momentos, a sua legitimidade (Machado, 2011). A ATD começa a ser gestada, portanto, como tentativa de esboçar as noções de uma teoria formal do didático, ou melhor, da antropologia do didático (que originaria a ATD), momento em que Chevallard desenvolve a sistematização de noção da transposição didática, cujo objetivo, naquela ocasião, era o de buscar a emancipação epistemológica e institucional do campo educacional da matemática (Chevallard, 2007) (tirei do texto Machado, 2001). A ATD aponta que o estudo deve ser o eixo central do projeto educacional da sociedade humana, e a ATD se propõe justamente, a encontrar e/ou resgatar esse elo.

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Ttulo: Estudando a Praxeologia em Museus1. Afinal o que Praxeologia?

A Praxeologia origina-se como um conceito da Teoria Antropolgica do Didtico (ATD), e, de maneira geral, designa o estudo da estrutura mais simples da atividade humana, ou melhor, tido como uma organizao antrpica, que, em linguagem biolgica significa dizer que o estudo da ao humana sobre um meio.

A ATD surge, na Frana, em meados da dcada de 1980, baseada nos pensamentos do terico Yves Chevallard (matemtico francs), oriunda de um programa de investigao denominado Programa Epistemolgico que teve como ponto de partida os trabalhos de Guy Brousseau (pesquisador francs), pesquisador que tem se destacado desde 1960 no desenvolvimento dos estudos sobre a Didtica da Matemtica. Os tericos filiados ao Programa Epistemolgico (Brosseau, Chevallard, Gscon) colocavam em pauta a problemtica da formao docente no interior das instituies de formao dificultavam o acesso e a compreenso do estudante para com a disciplina matemtica (rigidez dos cdigos escolares normas, programas, currculos...) e as prticas centradas apenas no processo de ensino e de aprendizagem, e no no estudo como ele preconiza (Chevallard) .A ATD, neste contexto, aparece face s crticas apontadas, devida popularizao da Teoria da Transposio Didtica (TTD) no meio educacional (formal e no formal), dentro e fora da Frana, o que acarretou, em alguns casos, uma descaracterizao das noes contidas nos pressupostos dessa teoria, gerando crticas e colocando em dvida, em alguns momentos, a sua legitimidade (Machado, 2011). A ATD comea a ser gestada, portanto, como tentativa de esboar as noes de uma teoria formal do didtico, ou melhor, da antropologia do didtico (que originaria a ATD), momento em que Chevallard desenvolve a sistematizao de noo da transposio didtica, cujo objetivo, naquela ocasio, era o de buscar a emancipao epistemolgica e institucional do campo educacional da matemtica (Chevallard, 2007) (tirei do texto Machado, 2001).

A ATD aponta que o estudo deve ser o eixo central do projeto educacional da sociedade humana, e a ATD se prope justamente, a encontrar e/ou resgatar esse elo.

O termo estudo assume, na ATD, o estatuto de processo didtico que tem no ensino um meio para o estudo, e, na aprendizagem o objetivo do estudo a ser alcanado (Chevallard) ou seja, um elo perdido entre o ensino e a aprendizagem.

A ATD e as pesquisas em Didtica das Cincias defendem que existe (ou deva existir) um processo didtico prprio para cada situao de ensino e de aprendizagem, que seja vlido no sentido de fazer com que o estudante penetre no contexto de estudo da disciplina.

A ATD proporciona ultrapassar as particularidades de sua rea de origem. A didtica das cincias um campo de investigao de rpido crescimento, que se inscreve na categoria dos trabalhos que visam determinar os objetos do ensino cientfico, renovar as suas metodologias, melhorar as condies da sua aprendizagem para os alunos. (ASTOLFI et al ., 1997, p. 7).Objeto de estudo da ATD a manipulao dos saberes com inteno didtica e, em particular, o ensino dos saberes (Chevallard). necessrio a elaborao de uma antropologia didtica que possa revelar a didtica do conhecimento ou a didtica cognitiva que se relacionar de forma mais profunda com a antropologia dos saberes (no cruzamento entre a antropologia dos saberes e a antropologia didtica dos conhecimentos, se localiza a antropologia didtica dos saberes, cujo objeto a manipulao dos saberes com inteno didtica e, em particular, o ensino dos saberes.vii (CHEVALLARD, 2005b, p. 155, Psfacio).

Relao da ATD com prticas educativas em museus

Chevallard situa a ATD no campo da antropologia por ser a didtica uma ao humana e, portanto, deve pertencer ao campo que estuda o Homem (gnero humano). Sendo este o campo, Chevallard procura descrever e analisar as atividade humanas relativas produo e a difuso dos conhecimentos e saberes matemticos, em contextos especficos (particulares) do cotidiano da sociedade, por meio de uma educao forma e /ou no formal.

Se o objeto de estudo da TAD a manipulao dos saberes com inteno didtica, e o saber, por ser uma construo humana, designado por Chevallard, como uma obra, que inclui toda a produo da sociedade. Como exemplo de obra, ele cita a escola, uma obra humana que propicia ao aluno entrar em contato com outras obras, tais como, o currculo escolar das disciplinas (biologia, fsica, histria, matemtica, etc.), livros didticos, programas de ensino, dentre outras obras, e apropriar-se delas. Neste caso, podemos ter como exemplo de obra humana, o MUSEU, visto que os museus so, tambm, espaos de divulgao dos saberes produzidos pela atividade humana (?)Conceitos envolvidos na ATD: - transposio didtica

- vigilncia epistemolgica

- praxeologia

- nveis de co-determinao

Fundamentos tericos e epistemolgicos da Praxeologia

Entre 1980 e 1995, o estudo do fenmeno da transposio didtica foi formulado em termos de objetos do conhecimento e das relaes com os objetos (Chevallad, 1992, Artaud, 1993, 1995 Bulletin, 2006 p. 58) e, a busca consistia em desenvolver uma ferramenta mais detalhada que pudesse servir para modelar a prtica matemtica, incluindo a dimenso do material e o corpo de conhecimento matemtico, ambos, como prticas inseparveis, dando origem, portanto, noo da praxeologia.Este conceito se baseia na afirmao de que toda atividade matemtica tem que ser interpretada como uma atividade humana cotidiana, junto com outras formas de atividade, e prope um modelo geral das atividades humanas (as praxeologias) que esto relacionadas de igual importncia uma dimenso terica (conhecimento) e uma dimenso prtica (know-how) (Bulletin, 2006). Segundo Chevallard (2006):

A praxeologia , de alguma forma, a unidade bsica em que se pode analisar a ao humana (...) O que exatamente a Praxeologia? Ns podemos confiar na etimologia para guiar-nos pode-se analisar todo o fazer humano dentro de dois componentes principais: a PRAXIS, i.e., a parte prtica, por um lado, e o LOGOS, por outro lado. Logos uma palavra grega que, vinda dos pr-socrticos, tem sido usada de forma constante para referir-se ao pensamento e raciocnio humanos particularmente sobre o cosmos. (...) (De acordo com) um dos princpios fundamentais da ATD a teoria antropolgica do didtico no existe ao humana sem ser, pelo menos parcialmente, explanda, tornada inteligvel, justificada, responsvel por, em qualquer tipo de raciocnio tal como uma explanao ou justificao pode ser lanada. A Praxis, portanto, implica o Logos que in turn backs up prxis. Para a prxis necessita-se suporte, porque (? p. 59). claro, a praxeologia pode tornar-se ruim se tiver uma tcnica ineficiente tcnica aqui, uma palavra oficial para o modo de fazer -, e seu componente logos consiste quase que inteiramente de abusrdo pelo menos para o ponto de vista da praxeologia!Conforme a ATD , a praxeologica , ento, composta por um Bloco da Prxis (prtico) e um Bloco do Logos (terico). O Bloco da Prxis , constitudo pelas tarefas (questes/atividades) e pelas tcnicas (maneira de fazer algo) e o Blogo Logos, pelo discurso que justifica e interpreta a prtica, denominadas tecnologias e teorias.Machado (2011), em seus estudos, aponta que para uma melhor compreenso de um corpo de conhecimentos, em que vrios elementos esto envolvidos, necessrio estabelecer uma Organizao Praxeolgica (OP) condizente com a disciplina de estudo, ou seja, uma Organizao Biolgica (OB), e, paralela esta, uma organizao didtica (OD), muito bem delineadas e definidas, conforme esquema abaixo:

Relao da Praxeologia com prticas educativas em museus

Considera-se que a perspectiva terica-metodolgica aqui proposta, com base na ATD, o conceito de praxeologia se mostra potencialmente importante para estreitar as intenes tanto cientficas como didticas/museogrficas dos dioramas. A partir da identificao da praxeologia intencionada possvel caracterizar de maneira objetiva as finalidades envolvidas ao elaborar tais objetos para ensinar e divulgar nos museus. Com base nessa identicao possvel no somente avaliar se tais finalidades esto sendo compreendidas pelo pblico, mas tambm reformular esses objetos tornando seu discurso mais prximo das intenes inicialmente pretendidas.

Motivos que levaram a adot-la

A Praxeologia, tem-se mostrada uma ferramenta terica de anlise que permite identificar as intenes e os elementos relativos, por exemplo, ao tema biodiversidade presentes nos objetos museais que sero analisados.

O desenvolvimento cientfico e tecnolgico, a modernizao da sociedade e a redefinio do tempo e do espao social operada pela globalizao impem novas exigncias educacionais, com repercusses tanto na interface da educao com o mundo do trabalho, quanto da educao com o exerccio da cidadania.Essas novas exigncias educacionais consistem em um fenmeno de abrangncia internacional, cuja tentativa de soluo no tem prescindido do fortalecimento de instncias no formais de educao (Fensham, 1999; Jenkins, 1999), da valorizao da aprendizagem ao longo da vida, em especial na rea de cincias (Young e Glanfield, 1998), e das conexes entre educao formal e no formal (Cazelli et al., 1998; Allard et al., 1996; Van-Pret e Poucet, 1992).

Torna-se fundamental, portanto, elaborar e implementar programas de educao formal e no-formal que possam contribuir para a formao de cidados crticos, capazes de apreciar a cincia como parte da cultura, de procurar o prprio enriquecimento cultural cientfico permanentemente, de questionar o conhecimento difundido pela mdia e de interagir de forma consciente com o mundo ao seu redor (Shamos, 1995).

Neste contexto, os museus de cincia, enquanto espaos no-formais de educao e pelo trabalho que vm desenvolvendo, adquirem papel inquestionvel ao aproximarem a relao cincia, tecnologia e sociedade escola e ao currculo formal de forma que, os saberes produzidos possam ser acessveis aos indivduos, implicando uma prtica social que envolva processos de traduo e de recontextualizao (Krasilchick & Marandino, 2007). (Museus como espaos de prticas educativas)

Ao longo dos anos, tanto a pesquisa quanto as prticas educacionais e comunicacionais relacionadas s exposies e/ou atividades em museus tm se intensificado, tornando-se cada vez mais um campo de produo de conhecimento. Nesse caminho, estudos e estratgias nos referidos campos tm sido utilizados na tentativa de disponibilizar o conhecimento cientfico de forma acessvel e com qualidade para os visitantes dos museus. (Cazelli, Marandino, Studart, 2003).

Hooper-Greenhill (1994b, p.68), especialista inglesa em educao em museus, apresenta as principais perspectivas educacionais que tm marcado o trabalho educativo nessas instituies. Indica que essas perspectivas so norteadas por teorias educacionais que por sua vez sofrem influncias das teorias do conhecimento (epistemolgicas) e da aprendizagem. Dessa forma, duas abordagens se delineiam: a) a primeira, positivista ou realista, que compreende epistemologicamente o conhecimento como exterior ao aprendiz, como um corpo de conhecimento absoluto nele mesmo que definido na medida em pode ser observado, mensurado e objetivado; b) a segunda, construtivista, que compreende o conhecimento como algo construdo a partir da interao do aprendiz com o ambiente social e, nesse caso, a subjetividade parte dessa construo. Tais abordagens tm ascendncia tanto sobre o trabalho dos profissionais de museus, quanto sobre a forma de o pblico utilizar esses espaos.

De acordo com a autora em questo, no existe um consenso sobre a melhor abordagem educativa em museus. Levando em conta o quo complexo e cheio de nuances o processo de interpretao feito pelos visitantes nos museus, indica a necessidade de mais pesquisas nesse campo. Nesse aspecto, a negociao entre a exposio e o visitante e a relevncia da mediao no processo de resignificao so questes a serem discutidas

Cada vez mais se defende que as investigaes e as aes relativas ao papel

educacional dos museus sejam realizadas na perspectiva do visitante, das suas

concepes, da sua agenda, de seus conhecimentos e interesses. Outro aspecto a ser enfatizado refere-se formao dos profissionais que atuam em diferentes dimenses das prticas educativas realizadas nesses espaos (Nascimento e Ventura, 2001)

Hooper-Greenhill (1994a, p.3) destaca que ocorreram mudanas no papel dos profissionais que trabalham na rea de educao em museus. Esse papel vem ganhando nova configurao, embora ainda exista uma tendncia em ver a prtica educacional em museus como uma sesso de ensino para alunos. Cada vez mais se defende que o trabalho desses profissionais no deve se reduzir a uma mera sala de atividades educativas, mas deve incluir tambm a participao no desenvolvimento das exposies, a realizao de estudos de pblico, entre outras iniciativas. Segundo a autora, para se lidar com a complexidade do papel educacional dos museus, deve-se considerar trs aspectos: a educao, a interpretao e a comunicao. Alm disso, os estudos realizados no mbito dos museus no devem se restringir apenas aos aspectos de aprendizagem, mas incluir questes de abordagem sociolgica.

De acordo com Marandino (2004) a transformao do conhecimento cientfico com finalidades de ensino e de divulgao pode ser analisada no intuito de compreender a produo de novos saberes que ocorrem nesses processos.

Encontramos na teoria Antropolgica do Didtico, originada a partir do pensamento terico de Yves Chevallard e inspirada nos trabalhos de Guy Brosseu, o referencial terico para descrever e analisar as atividades humanas relativas produo e difuso do conhecimento em contextos especficos do cotidiano da sociedade, por meio da educao formal e/ou no-formal. No conceito da Transposio Didtica a necessidade de adaptaes do conhecimento quando se trata de ensin-lo, ou seja, a necessidade de que o contedo de saber definido como sendo saber a ensinar sofra um conjunto de transformaes adaptativas para torn-lo um objeto de ensino (Leite, 2007).

Ao entender o museu como um local de construo e reconstruo de saberes aparece, nesse contexto, o conceito de transposio museogrfica (Simonneaux e Jacobi, 1997), evidenciando que tambm na produo do discurso expositivo ocorre a adaptao do saber a ser apresentado com intuito de ser compreendido pelo pblico.

E no conceito de Praxeologia, a ferramenta terica de anlise das intenes e dos elementos relativos biodiversidade presentes nos objetos museais. Vrios meios museogrficos so usados na preparao de exposies de museu de cincias e, entre estes, destacam-se os dioramas (Van Praet, 1989, Oliveira & Marandino, 2010). O entendimento dos dioramas como objetos didticos, produzidos com a finalidade de ensino e aprendizagem, implica estud-los na perspectiva praxeolgica (Chevallard, 2007). Nos processos de elaborao das exposies, a tarefa expor determinados conhecimentos e objetos, em um espao, de forma inteligvel, para diferentes tipos de pblico. Essa tarefa envolve dimenses da prxis e do logos para sua realizao havendo, assim, uma praxeologia ou um complexo de praxeologias na produo de exposies. O estudo da praxeologia em museus foi recentemente desenvolvido (Mortensen, 2010) na busca de compreender as dimenses da prxis e do logos na produo desses objetos (Marandino, 2010). Assim sendo, busca-se nessa pesquisa o estudo da praxeologia de exposies de museus de cincias.

Estudar os processos educativos que ocorrem em museus de cincias uma preocupao atual tanto na esfera nacional como internacional. Frente consolidao das iniciativas de popularizao da cincia e necessidade de reconhecer os espaos de museus como fundamentais para educao ao longo da vida, tais estudos oferecem a possibilidade da anlise mais apurada das experincias educativas que vm sendo realizadas (Marandino, Mnaco, Oliveira, 2010).