Elementos para a leitura dos textos filosóficos Frédéric Cossuta.
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Elementos para a leitura dos textos filosóficos
Frédéric Cossuta
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Capítulo II – Os conceitos filosóficos
• A filosofia procede por conceitos.
• Porém, é preciso evitar a ilusão do positivismo lógico, que pretendia construir uma linguagem ideal sobre o modelo da lógica formal.
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O conceito é um intermediário entre o vivido e o abstrato
• A filosofia é reexame e redefinição de conceitos.
• Os conceitos não são dados, mas construídos.
• Esta elaboração constitui uma parte importante da atividade filosófica.
• É preciso, portanto, analisar o movimento que instala os conceitos fundamentais de uma teoria.
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Não há uma língua filosófica, mas um uso filosófico da língua
• A filosofia constitui o seu próprio vocabulário, apropriando-se das categorias oferecidas pela língua natural.
• Em uma filosofia unidades de sentido são fixadas, ligadas, hierarquizadas, constituindo um universo de significação autônomo, na medida em que obedece a regras rigorosas de coerência interna.
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• Uma densa rede de categorias tende a produzir um quadro de inteligibilidade do real.
• O conceito não é apenas uma entidade assinalável através de um vocábulo, mas exerce uma função de organização da ordem interna do discurso. Confere unidade ao discurso em suas reaparições.
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Análise da forma como esta função é elaborada nos textos filosóficos:
• A construção da função conceitual é um processo de instauração de sentido, ou seja:
a) Um conceito não é dado previamente a uma filosofia;
b) Os conceitos não são isolados, mas forma um sistema de relações e remissões;
c) A significação do conceito se constrói pela relação entre os diversos contextos discursivos em que ele é empregado;
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d) O sistema filosófico como um todo delimita o sentido dos conceitos;
e) Este sistema forma o ‘campo conceitual’ de uma filosofia;
f) É o conceito que faz o sistema, mas é também o sistema que faz o conceito (p. 65).
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Semântica Conceitual:
• É preciso distinguir o uso de um conceito das operações explícitas de determinação de seu sentido.
• O conjunto destas operações através das quais o filósofo deliberadamente explicita a significação das expressões que ele emprega denomina-se ‘semântica conceitual’.
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Nessas operações, o núcleo definicional deve conter:
• O termo significante (escolha do termo, fixação do significante);
• O sentido (diferenciação entre conceitos, relações entre conceitos; características ou traços definicionais; reintrodução do conceitos em contextos discursivos diversos);
• A referência (elemento extralingüístico, exemplo, caso particular).
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Podem ser acrescidas, ainda:
a) Explicitações metassemânticas: argumentos ou comentários externos ao conceito, mas que incidem sobre a justificação e o esclarecimento do uso do termo significante;
b) Explicitações metatextuais: comentários, no texto, que ajudem a elucidar o próprio texto onde são feitos esclarecimentos sobre o uso ou o significado dos conceitos.
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Conseqüências filosóficas:
• O filósofo deverá elucidar filosoficamente seu próprio uso da linguagem.
• Os procedimentos de instauração de sentido são fundamentais na elaboração de uma doutrina.
• As escolhas definicionais não são arbitrárias. Devem ser justificadas.
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• A justificação do próprio processo definicional, ou seja, a definição de definição ou as condições de definibilidade podem ser feitas em algum momento da obra de um filósofo.
• As preocupações que concernem à significação conceitual não são externas à atividade filosófica, mas desempenham um papel fundamental na constituição de um universo de significação autônomo.
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A semantização conceitual e a exploração das virtualidades da língua:
• Cada filosofia, de algum modo, reinventa a linguagem.
• Porém, o faz a partir da língua natural e deverá manter esta relação com a língua natural para o seu entendimento – isto é, há uma dimensão pedagógica do conceito.
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• Substantivação: A constituição de conceitos pressupõe um mecanismo que permite submeter todas as formas à categoria nominal.
• Exemplos:
ser – o ser – o ser no mundo...
Aqui – o aqui – o ser-aqui...
O mundo – a mundanidade...
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• Essa operação substantivante, tendo por vocação acentuar o movimento dos ‘existentes’ apreendendo-os através de suas formas originais, é a mesma que utiliza toda a tradição filosófica desde Platão para, ao contrário, ‘substantificar’, imobilizar as flutuações do devir sob categorias nominais.
• É um procedimento que permite fixar objetos-de-pensamento mediante uma forma lingüística.
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• Embora remetendo a objetos denotados, a conceitualização categoriza propriedades que são atribuídas apenas indiretamente a objetos do mundo.
• Embora constitua um universo autônomo de significação onde a referência ao mundo deve ser posta entre parênteses, há o paradoxo de que os conceitos devem ser relacionados com o vivido.
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O conceito como função:
• Um conceito categoriza o real ou o ser integrando-os no domínio do dizível.
• O conceito não é uma palavra, nem a coisa, nem a sua relação, como também não é a imagem mental que lhe está associada. Ele é um objeto do pensamento construído dentro da ordem da representação, pela qual tentamos reatribuir, de forma unívoca e explícita, a significação que queremos dar às palavras, às coisas e à sua relação.
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• Instauração e devir conceitual - Se uma das tarefas filosóficas essenciais consiste em proceder à conceitualização, é preciso considerar que uma outra parte desta tarefa consiste em retrabalhar o sistema de conceitos atribuindo-lhe novas propriedades ou reelaborando os elementos que o definem.
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• O estatuto dos conceitos em um texto filosófico supõe portanto a análise das operações pelas quais o filósofo explicita a relação entre termo significante, sentido e referência.
• Este trabalho de definição, de escolha de termos e das regras de uso, que instaura a conceitualidade de uma doutrina, constitui a semântica filosófica.
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• Definir um conceito consiste, portanto, em fixar sentido, referência, produzir suas relações e fornecer as regras que permitam sua reutilização. Ela deve:
a) Identificar o conceito e dar-lhe um ‘nome’;
b) Explicitar as propriedades do termo;c) Descrever um exemplo ou exposição
dos elementos denotados.
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• O núcleo de uma definição contém seus constituintes mínimos. Pode ser determinada através de uma ‘cláusula definicional’, como em Espinosa (p.54).
• A expansão de uma definição explicita ou enriquece este núcleo.
• Uma expansão pode dizer respeito à conveniência de um nome para o conceito ou: a) fornecendo exemplos; b) elaborando paráfrases que explicitem a referência e o sentido.
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As definições:
• Têm uma função ‘estabilizadora’ em uma doutrina;
• Articulam ‘sentido’ e ‘referência’;
• Geram o campo conceitual de uma doutrina.
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Porém:
• Embora o conceito esteja definido em algum lugar preciso de uma doutrina, ele se vê perpetuamente enriquecido no decorrer de suas utilizações, ao ponto de ser o sistema inteiro que constitui seu contexto de definição.
• Nada limita o enriquecimento da sua significação.
• Portanto, o conceito é mais que o fixado, mas consiste em uma função que coordena sentido, termo e referência, na multiplicidade de seus empregos e no desenvolvimento do seu uso.
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Assim:
• Pelo seu sucessivo enriquecimento, obtém-se duas formas de estruturação dos conceitos: a) pelas relações entre conceitos; b) pela hierarquização de conceitos.
• Estas duas formas de expansão e estruturação, presentes no texto filosófico, permitem ao mesmo um andamento interno em que o universo de sentido se desdobra sobre si mesmo.
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Da língua ao conceito:
• A língua natural não constitui não apenas o veículo, mas um meio dotado de autonomia e vida própria, dentro da qual o filósofo tenta abrir um caminho em direção ao conceito.
• Portanto, uma filosofia depende menos do vocabulário que ela emprega do que da maneira como o pensamento procede para produzir sentido.
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• Campo nocional – é o conjunto de terminologia preexistente à doutrina; são expressões semiconceitualizadas, extraídas de um uso exterior à doutrina de um filósofo.
• Campo conceitual – é formado pela integração da terminologia numa totalidade sistemática.
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• Na construção do campo conceitual podem ocorrer substantivações, construção de neologismos, recorrência às etimologias, metaforizações, dentre outros processos (vide, também, p. 64-65). Além disso, todos os recursos da língua comum podem ser utilizados.
• Não há conceito fora de um processo de pensamento.
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• O campo conceitual não visa diretamente ao ‘real’, mas constrói uma representação ‘ideal’ ou intelectual dele.
• A filosofia se caracteriza pela auto-explicação de suas categorias semânticas (onde, inclusive, as relações entre conceitos podem se tornar também conceitos; e onde o conceito de conceito se define internamente à doutrina).
• Ela própria está, enquanto objeto do mundo, sujeita ao esquema conceitual que ela organiza.