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ELAINE APARECIDA DE LIMA
RESSIGNIFICANDO O SENTIDO DO CUIDADO NAS RELAÇÕES ENTRE PAIS E FILHOS DE FAMÍLIAS EM SITUAÇÃO DE
VULNERABILIDADE SOCIAL
RESUMO
Este trabalho teve como objetivo ressignificar os sentidos do cuidado nas relações entre pais e filhos em situação de vulnerabilidade social. A partir de uma revisão da bibliografia sobre o tema tentando articulá-la com as experiências vividas no estágio curricular obrigatório, buscou-se refletir sobre a importância do cuidado no desenvolvimento criativo do sujeito. Concebendo a família como um dos lugares centrais de constituição do sujeito e onde ele começa a estruturar sua vida psíquica, sinalizou a importância de práticas efetivas de cuidado, particularmente em situações de vulnerabilidade social. Foi visto que nesse contexto as famílias vivenciam um sofrimento psicossocial que influencia suas práticas afetivas de cuidado, sendo, então, necessário que o psicólogo se sensibilize para os sentidos de cuidado assumidos nessas famílias, de modo a compreendê-las autenticamente e facilitar a comunicação entre pais e filhos. Que em suas intervenções, atento aos diferentes modelos de família, possa compreender cada uma delas e, sem desvincular suas dimensões, psíquica e social, possa favorecer que os sujeitos apreendam outras possibilidades, promovendo uma ressignificação do cuidado compreendido como fragilizador para o cuidado reconhecido como fortalecedor. Assim, atuando como mediador, tradutor de linguagens de cuidado que se encontram camufladas em alguns comportamentos, poderá contribuir para a produção de saúde, cidadania e vida. Palavras-chave: cuidado; família; vulnerabilidade social
Recife 2010
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ELAINE APARECIDA DE LIMA
RESSIGNIFICANDO O SENTIDO DO CUIDADO NAS RELAÇÕES ENTRE PAIS E FILHOS DE FAMÍLIAS EM SITUAÇÃO DE
VULNERABILIDADE SOCIAL
Profa. Orientadora – Ms. Maria Aparecida Craveiro Costa – UNICAP
Profa. Examinadora – Dra. Iaraci Fernandes Advíncula – UNICAP
Prof. Examinador – Dr. Marcus Túlio Caldas – UNICAP
Recife 2010
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SUMÁRIO
1. INTRODUÇÃO....................................................................................................................04
2. CUIDO, LOGO EXISTO .....................................................................................................07
3. O CONTEXTO FAMILIAR NOS É MESMO FAMILIAR?...............................................12
4. EU CUIDO, TU CUIDAS...ELES CUIDAM ......................................................................19
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS ...............................................................................................29
REFERÊNCIAS .......................................................................................................................30
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1. INTRODUÇÃO
Este trabalho se propôs desenvolver reflexões que favorecessem ressignificações do
sentido do cuidado nas relações entre pais1 e filhos de famílias em situação de vulnerabilidade
social. O interesse por esse tema surgiu ao longo do estágio curricular obrigatório quando
pude vivenciar algumas experiências de intervenção com adolescentes e famílias em situação
de vulnerabilidade social. Pude observar que nessas famílias parece ocorrer uma dificuldade
na expressão dos sentimentos de afeto, e que o cuidado é muitas vezes percebido como
fragilizador. Isto me remeteu a trechos da obra Vidas Secas de Graciliano Ramos (1979, p.26-
27) como este, em que o pai de família pensa que os filhos naquela seca...
Precisavam ser duros, virar tatus. Se não calejassem teria o fim de Seu Tomás da bolandeira. Coitado. Para que lhe servia tanto livro, tanto jornal? Morrera por causa do estômago doente e das pernas fracas. Um dia... Sim, quando as secas desaparecessem e tudo andasse direito... Será que as secas iriam desaparecer e tudo andar certo? [...] Livres daquele perigo, os meninos poderiam falar, perguntar, encher-se de caprichos. Agora tinham obrigação de comportar-se como gente da laia deles. (grifos meus).
Surgiram, então, vários questionamentos: esse gesto seria mais representativo de
desamor ou amor? Será que podemos julgar tais atitudes como negligência? Poderíamos
enxergar nessas circunstâncias uma forma (ainda que diferente) de exercer o cuidado? Quer
dizer, haveria uma ação diferente daquela a que estamos acostumados a cultivar socialmente
como expressão de cuidado? Qual seria o sentido do cuidado predominantemente construído
ou reproduzido nas famílias de baixa renda?
Com esses questionamentos dei início a este trabalho, fruto de uma pesquisa
bibliográfica em que visitei autores como Leonardo Boff (2008), Luís Cláudio Figueiredo
(2009), Mark Poster (1979), Philippe Ariès (1981), Cristina Bruschini (1997), Bader Sawaia
(1995), entre outros que, de alguma forma me ofereceram subsídios para pensar sobre esse
tema.
Segundo Boff (2008), o esgarçamento das relações de cuidado na sociedade
contemporânea pode ocorrer devido à era do conhecimento e comunicação, que produz um
“encapsulamento sobre si mesmo”, quando as relações entre as pessoas se dão por meio do
mundo virtual. Nesse novo habitat, a relação com a realidade concreta – mediada pela
1 Todas as vezes que falar em pais ao longo deste trabalho estarei me referindo a qualquer pessoa que deva
exercer tal papel, independente de raízes biológicas, àquela pessoa que, teoricamente, exerce a
responsabilidade pelo cuidado de crianças e adolescentes.
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imagem virtual que é apenas imagem – é demarcada pela ausência do toque, do tato e do
contato humano.
Mas, e na população de baixa renda, onde o mundo da Internet ainda nem se
disseminou mais amplamente, seria também esse o motivo da escassa ou ausente relação de
toque? Será que nessas classes foi apenas a sociedade do virtual o pivô do abalo na
sensibilidade, no enternecimento e no cuidado?
Não se afirma que o cuidado deixou de existir, porém tem se vestido com outras
roupagens, daí a proposta de revermos por quais válvulas de escape o cuidado – tão essencial
à vida humana – tem saído. Porque, sendo essencial e não encontrando chances de se mostrar
pelas vias as quais nos habituamos a considerar, ele vai, muitas vezes, quando não é de um
todo sufocado até a morte, se esgueirar até sair do sufoco. Acredito que, enquanto psicólogos,
podemos e devemos estar atentos a essas formas com que sai, a maneira a qual está se
realizando aquilo que nos é fundamental, agenciando outros olhares a fim de propiciar seu
reconhecimento e sua reedição para que seja propulsor de bem-estar à vida.
Para conduzir a essas reflexões, no primeiro capítulo convido a pensar sobre o cuidado
e sua relevância no desenvolvimento criativo da pessoa. Boff (2008) afirma que “a essência
humana não se encontra tanto na inteligência, na liberdade ou na criatividade, mas
basicamente no cuidado. O cuidado é, na verdade, o suporte real da criatividade, da liberdade
e da inteligência” (p.11). Quer dizer, como os filhos da vulnerabilidade social que não se
sentirem cuidados ou que estiverem expostos à negligência do cuidado construtivo vão
ascender, desenvolverem-se criativamente sem sentirem-se fadados à repetição da exploração
a que foram submetidos seus pais? E, segundo o mesmo autor, se no cuidado se encontra o
ethos fundamental do humano, e este representa os princípios que fazem com que o
comportamento seja livre, consciente e responsável, precisamos assegurar uma relação em
que as pessoas se sintam cuidadas para promover a saúde, caracterizada pela potencialização
da liberdade, consciência e responsabilidade – o tripé da dignidade humana. (GUARESCHI,
2005)
O cuidado perpassa todas as relações humanas, seja ele cultivado ou negligenciado; o
meu foco foi, no entanto, para as relações familiares. Por isso, no segundo capítulo proponho
que nos debrucemos sobre os contextos familiares nos questionando se são, de fato, contextos
tão familiares, quer dizer, conhecidos, propondo, portanto, indagações em torno das
representações dominantes acerca da família. Foquei as relações familiares a fim de
compreendê-la como lócus de estruturação da vida psíquica, um espaço onde ocorrem as
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primeiras trocas afetivas e intersubjetivas, em que se transmitem formas de ser no mundo (por
meio de tradições, crenças e valores).
Deste modo, de acordo com Szymanski (2002, p. 12)...
As trocas afetivas na família imprimem marcas que as pessoas carregam a vida toda, definindo direções no modo de ser com os outros afetivamente e no modo de agir com as pessoas. Esse ser com os outros, aprendido com as pessoas significativas, prolonga-se por muitos anos e freqüentemente projeta-se nas famílias que se formam posteriormente.
Isto não quer dizer, entretanto, que todos estariam condenados a repetir as suas
histórias primárias porque, apesar do cuidado ser vivido em dependência com os modos
culturais e momentos históricos que modelam as práticas, embora dependa da forma como o
papel de cada um é interpretado na família, e isso vá construindo a identidade das pessoas
desde a infância e desenvolvendo seus relacionamentos com outras pessoas, objetos e idéias,
apesar de tudo isso, tal processo não ocorre isoladamente no meio familiar, nem somente no
período da infância, mas é contínuo e abarca possíveis modificações a partir das experiências
nos outros mundos nos quais o sujeito também está inserido. (SZYMANSKI, 2002).
Assim, desenvolvo, ainda, a idéia de que é no/do “cotidiano familiar que surgem novas
idéias, novos hábitos, novos elementos” (BRUSCHINI, 1997, p.77). Portanto, sugere esta
autora, é como “espaço possível de mudanças que se deve observar a dinâmica familiar”, é
nela que se “criam condições para a lenta e gradativa transformação da sociedade” (p.77).
Por fim, no terceiro capítulo articulando as concepções teóricas visitadas e as
experiências da prática em Estágio I e II, procuro refletir sobre as relações de cuidado nas
famílias em situação de vulnerabilidade social, compreendendo a eficácia com que o cuidado
tem sido aí vivido e questionando as possibilidades de cuidado para além dos referenciais a
partir dos quais nós, sujeitos sócio-culturais, costumamos avaliar/julgar modos de ser, pois,
acredito ser necessário nos reportarmos às particularidades de cada realidade, vez que cada
classe social é detentora de um universo simbólico próprio.
Assim, para serem melhor compreendidas, as relações de cuidado precisam ser
situadas no meio sócio-histórico,
Numa família, a linguagem, a metalinguagem, o modo de compreensão das experiências vividas e as disposições afetivas predominantes orientam um ser com o outro que irá se configurar de diferentes maneiras. Esse modo de proceder entre os membros de uma família refere-se, numa perspectiva existencial, ao cuidado ou solicitude, que pode ser vivida tanto de modo deficiente como autêntico. (SZYMANSKI, 2002, p. 12)
A atenção neste trabalho estará no sentido que o cuidado adquire nas famílias de baixa
renda, destrinchando seus modos de compreensão, voltando-se para as aparentes negligências
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de cuidado que parecem ser resultado da desafetação em que vivem que, por sua vez, pode ser
produto do sofrimento psicossocial a que estão expostos.
Se há na expressão do cuidado reflexos do modo de ser com o outro, e este modo de
ser nas famílias em situação de vulnerabilidade social está demarcado pelo descaso da
sociedade, em que são alvo de várias condições adversas, ocorre um distanciamento de sua
constituição enquanto núcleo de satisfação até de necessidades básicas do indivíduo, mal as
possibilitando de atuarem como um fator de proteção ao sujeito. (SZYMANSKI, 2002, p.20).
Procuro instigar reflexões sobre o quanto o sofrimento ético-político, o sofrimento
psicossocial repercute nas formas como o cuidado vai ser vivenciado.
E finalmente, como desfecho, convido-os a pensar nossa atuação, enquanto
psicólogos, nessa realidade na qual a vulnerabilidade social reflete na qualidade das relações
intrafamiliares, na metacomunicação entre pais e filhos. Proponho, então, que nós, psicólogos,
atuemos como mediadores/tradutores dessa linguagem de afeto camuflada e freada no
contexto de sofrimento psicossocial. Que tentemos facilitar que essas famílias sejam melhor
compreendidas por si mesmas, entre seus membros e pela sociedade mais ampla; não sendo
subjugados pelos modos de compreensão dominantes que lêem o cuidado sempre pela mesma
cartilha, pelos significados legitimados socialmente. Espero, enfim, que este trabalho possa
contribuir para o desenvolvimento de práticas profissionais que se sustentem numa real
compreensão dos sentidos que o cuidado assume em cada família em função de cada história
vivida, a partir de suas condições concretas de existência.
2. CUIDO, LOGO EXISTO
Que viria a ser esta atitude despendida consigo e com os Outros (referindo-se este a
pessoas e coisas) que se manifesta entre os seres desde o nascimento? A essa atitude deu-se o
nome de cuidado. E, será que poderíamos definir um modelo em que estabelecêssemos
características próprias dessa atitude e com isso identificarmos, nitidamente, quando ocorre e
quando não?
Tal questionamento é feito diante de uma sociedade que parece exaltar certos atos
como sendo identificadores do cuidado. Fechando-se nisso, deixa de considerá-lo como uma
atitude muito maior que o tato, as carícias tão facilmente rotuladas como cuidado; assim,
acaba por definir tal modelo social como único, esquecendo de considerar as idiossincrasias
socioculturais.
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O que, por ora, vou explanar nesse capítulo é uma compreensão mais ampla do
cuidado, aportada principalmente por Boff (2008) e Figueiredo (2009), para percebê-lo como
uma atitude a mais que o tato, que envolve preocupação, ocupação, inquietude, envolvimento
afetivo e responsabilização; pertencente à condição humana e, portanto, inseparável do
humano e irredutível à construção de um modelo universal.
Boff (2008, p.92) afirma que o cuidado “é um modo de ser-no-mundo que funda as
relações que se estabelecem com todas as coisas” e considera que não temos cuidado, mas
somos cuidado e que sem este deixamos de ser humanos. A partir desta visão podemos
considerar o cuidado como uma instância ontológica.
Ao dizer que o cuidado é ontológico não quero naturalizar as formas de vivenciá-lo,
mas, afirmá-lo como dimensão concernente a toda cultura enquanto forma de recepcionar algo
ou alguém, embora tais formas sejam, logicamente, diferentes em cada uma dessas culturas.
Sobre isso Figueiredo (2009, p.132) diz:
O ingresso de um recém-nascido na vida e no mundo propriamente humano é marcado por uma complexa trama de acontecimentos que estabelecem as condições e as formas de sua recepção e, em decorrência, do seu vir-a-ser humano. Cada cultura, cada sociedade e cada época se caracterizam por seus procedimentos específicos, mas nunca faltam algumas dimensões que parecem universais.
Os rituais de recepção têm em comum a efetuação de separações e ligações. Assim,
num batizado, por exemplo, pretende-se separar o sujeito do mundo do pecado original,
recebendo-o como filho de Deus; podemos pensar também nos procedimentos científicos, os
tratamentos, que buscam separar o sujeito da doença e ligá-lo à saúde. As dimensões que
parecem ser universais referem-se ao cuidado – a “dimensão da disposição do mundo humano
em receber seus novos membros” (FIGUEIREDO, 2009, p.133). Nas dimensões acima
existem certos cuidados: no âmbito da alma e do corpo. Mas as práticas de cuidado vão além
desses dois âmbitos quando se ocupam em criar sentido à existência humana. O cuidado é
“um fenômeno que é a base possibilitadora da existência humana enquanto humana.” (BOFF,
2008, p.34).
A principal importância do cuidado é dar ao sujeito a oportunidade de “fazer sentido”
(FIGUEIREDO, 2009). Heidegger mostra o cuidado como “fundamental para qualquer
interpretação do ser humano” (apud BOFF, 2008, p.90) e defende que só se for cuidado o ser
pode ter como morada um mundo significante (apud INWOOD, 2000, p.75).
O cuidado possibilita o “fazer sentido” da/na vida, para que não seja o ser um eterno
“lançado no mundo”, um quadro sem moldura, retalhos sem costuras. Os cuidados permitem
construir um “lugar humano para existir – um ethos” (FIGUEIREDO, 2009, p.135). Boff
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(2008) ainda acentua que o cuidado é a “força originante que continuamente faz surgir o ser
humano, impedindo, assim, que este permaneça como “um espírito angelical desencarnado e
fora do tempo histórico.” (p.101).
Daí percebe-se os comprometimentos que a ausência deste pode gerar na vida dos
sujeitos: aquilo que não encontra sentido, não é nomeado, gera um sofrimento psíquico
insuportável. Figueiredo (2009, p.134) descreve que
fazer sentido equivale a constituir para o sujeito uma experiência integrada, uma experiência de integração. [E] Tais experiências não se constituem se não puderem ser primeiramente exercidas, ensinadas e facilitadas pelos cuidados de que somos alvo.
Nessa tessitura de sentidos à existência humana, o cuidado, através da atuação e
comprometimento do “outro-cuidador”, oferece dimensões fundamentais ao desenvolvimento
do sujeito:
O sustentar (holding) – que propicia ao indivíduo um senso de realidade obtido pela
continuidade somatopsíquica, inicialmente, e posteriormente simbólica e identitária. Tal
sustentação geralmente é realizada por grupos, instituições e, principalmente, famílias.
O conter (containing) – referindo-se à nossa possibilidade de crescimento,
ressignificação realizada em/por nós através de nossas identificações projetivas. Isso nos
auxilia a transformar nossos sentimentos, emoções, fantasias “em conteúdos reconhecíveis,
interpretáveis e toleráveis” e, quando nos falta, favorece o sofrimento pela “sobrecarga de
experiências emocionais obscuras e perturbadoras que evocam em nós a ameaça de loucura.”
(FIGUEIREDO, 2009, p.137),
O reconhecer – que implica o encontro entre dois sujeitos que testemunham e
refletem o outro. Defendendo que este é um cuidar silencioso, definido pela capacidade de
prestar atenção e responder ao sujeito de acordo com a pertinência Figueiredo (2009, p.138)
afirma que
Muitas vezes, cuidar é, basicamente, ser capaz de prestar atenção e reconhecer o objeto dos cuidados no que tem de próprio e singular, dando disso testemunho e, se possível, levando de volta pro sujeito sua própria imagem. Tal aspecto do cuidar tem implicações na autoimagem e autoestima.
O interpelar e reclamar – que garante a característica indispensável ao encontro com
a alteridade: a diferença, a incompletude. Afinal de contas, devemos considerar que cuidar
não quer dizer atender prontamente, como gênio da lâmpada, aos desejos de seu amo (até este
tem limites: três pedidos!). Para ser introduzido na civilização o sujeito precisa aprender a
lidar com isto abrindo mão de alguns desejos, sublimando-os ou postergando-os, enfim,
precisa da interdição. Assim, é também sinal de cuidado a função de interpelar, reclamar, feito
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pelo outro diferente, com seus próprios desejos; é assim que o sujeito pode aceder à vida e à
humanidade. Além do mais, se tiver atendido todos os seus desejos, não se sentirá
impulsionado à vida, uma vez que é a falta que nos mobiliza, o furo que faz a cadeia de
significantes se mover. De tal forma, o outro-cuidador desperta a pulsionalidade e permite ao
ser humano a condição de vir-a-ser. E é deste modo que o sujeito é apresentado a fatores
cruciais da existência: a finitude, a morte, a alteridade e a lei (FIGUEIREDO, 2009).
É preciso, também, reconhecer é que o descuido não se reduz à carência de cuidado,
mas também a seus excessos, os quais dificultam o crescimento criativo/espontâneo do sujeito
desqualificando sua experiência de cuidado. O cuidado desta forma orienta-se de maneira não
saudável, segundo Szymanski (2002, p. 13),
pela desconsideração, impaciência, intolerância ou negligência, “para as quais a indiferença abre caminho”. Aqui o ser “com” assume as formas de ser “contra” o outro e “sem” o outro. Uma outra forma deficiente de se viver a solicitude é o que Heidegger chama de “saltar sobre o outro”, impedindo-o de cuidar de si mesmo. É quando se desenvolve a dependência e a dominação, tácitas ou não.
Mas há outra dimensão fundamental do cuidar ainda não mencionada: a disposição à
reserva, isto é, a moderação dos fazeres do agente cuidador, “ele ‘deixa ser’ seu ‘objeto’ e o
não cuidar converte-se em uma maneira muito sutil e eficaz de cuidado” (FIGUEIREDO,
2009, p.141). Agindo desta forma, o cuidador, segundo o mesmo autor, renuncia a sua
onipotência, seu domínio, e reconhece seus limites e finitude. Quando se põe em reserva, o
agente cuidador tem a chance de partilhar com outros a experiência do cuidar e também de ser
cuidado. Logo, “é preciso saber cuidar do outro, mas também cuidar de si e... deixar-se cuidar
pelos outros, pois a mutualidade nos cuidados é um dos mais fundamentais princípios éticos a
ser exercitado e transmitido” (FIGUEIREDO, 2009, p.141).
É nesse espaço de reserva propiciado pelo cuidar que se desenvolve o potencial
criativo do sujeito. “O cuidado é [...] o suporte real da criatividade, da liberdade e da
inteligência” (BOFF, 2008, p.11). Pela reserva do “outro” é que o “eu” pode criar, por si
mesmo, um mundo. E vivenciando as modalidades do cuidar harmoniosamente é que o sujeito
pode, além de tudo, desenvolver criativamente sua possibilidade de também cuidar (de si e do
Outro) – “Não apenas ser recebido na vida, no mundo e na história, mas ser ele mesmo um
participante ativo destes processos” (FIGUEIREDO, 2008, p. 144).
A possibilidade de cuidar que o sujeito desperta é fruto de uma introjeção das funções
cuidadoras pela própria vivência, não apenas de modo reduzido a uma técnica, ritual ou
procedimentos especializados, por exemplo. Tal introjeção é, de acordo com Figueiredo
(2009) criativa e enraizada nas capacidades do sujeito que são ativadas pelo outro-cuidador. O
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mesmo autor afirma: “apenas quem introjetou criativamente as funções cuidadoras e as exerce
com a mesma criatividade pode transmiti-las de forma criativa e eficaz, e ajudar na
constituição de sujeitos responsáveis.” (p.145).
Em função dessa responsabilidade adquirida pelos cuidados, é que nele se encontra o
ethos fundamental do humano (BOFF, 2008) e este é o conjunto de princípios que coordenam
o comportamento humano; isto implica em dizer que é no cuidado que se desenvolvem a
consciência, a liberdade e a responsabilidade – tripé da dignidade humana. (GUARESCHI,
2005).
E à medida que o cuidado gera atitudes de solicitude e atenção para o outro, também
pode levar à preocupação e inquietação, como mencionei no início, “porque a pessoa que tem
cuidado se sente envolvida e afetivamente ligada ao outro.” (BOFF, 2008, p.92) e, portanto
responsável com a existência sua e do Outro, assumindo o cuidado como a instituição da
coexistência dos seres, nada existe isoladamente, o ser humano é um ser entre outros
(INWOOD, 2000, p. 31).
Contudo, a sociedade contemporânea parece estar perdendo este senso de coexistência
e responsabilidade e nela, ao que tudo indica, predomina o mal da desafetação, por causas
distintas a depender da classe social. Talvez, o que esteja no cerne da questão seja o vazio
instaurado na vida das pessoas na pós-modernidade individualista. A capacidade de se afetar
está fragilizada – “Socorro não estou sentindo nada!”, canta Arnaldo Antunes numa música2.
Segundo Moreira e Freire (apud MOREIRA E SLOAN, 2002, p.234):
A sociedade contemporânea está doente dos afetos, contaminada pelas ideologias que impedem uma ética da alteridade, e, portanto, adoece, despotencializa e incapacita os indivíduos a viver significativamente, e impõe a ordem do desafeto, que se transforma em depressão e em outras patologias mentais
Assim, com relação ao cuidado, parece predominar a implicação exagerada na forma
de interpelação e reclamação e, também, o excesso de reserva, que se mostra numa frieza, ou
melhor, numa indiferença e distância afetiva. Na demasia da interpelação, o controle absoluto
e a correção minuciosa do outro-objeto de cuidados criam sujeitos traumatizados pela
impotência gerada pela onipotência e domínio do cuidador; sujeitos possuidores de uma
autocrítica exacerbada e um superego sufocante que ordena a adaptação perfeita ao ambiente,
o que engessa o sujeito impedindo-o de vivenciar a espontaneidade da vida. (FIGUEIREDO,
2009). Quanto aos exageros de reserva, vemos nitidamente os efeitos em nossa sociedade: um
2 “Socorro” – Arnaldo Antunes/Alice Ruiz, CD Um Som (1998)
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vazio provocado pelo sentimento de desamparo, carência, que promove uma busca
desenfreada por reconhecimento e limites.
Figueiredo (2009) sugere que é possível estarmos vivendo uma crise de cuidados, em
que cada vez mais os sujeitos não se sentem aprovados para exercer o cuidado e alguns o
fazem mecanicamente, porque, uma vez que as formas de cuidar são vivenciadas
negativamente, a introjeção dessas práticas será rejeitada ou incorporada de maneira similar,
fazendo com que repitam o padrão de vida que tiveram.
Considero que, uma vez cientes do significado do cuidado na existência humana, cabe
a nós, como cidadãos – responsáveis pela sociedade em que vivemos, e como psicólogos –
comprometidos com o cuidado na promoção do bem-estar das pessoas - questionar como
podemos, em nossas práticas, oportunizar a ressignificação das vivências para evitar que
sejam repetidas, o que impede o sujeito de prosseguir criativamente sua vida; atuarmos para
que este seja um autor, e não somente ator ou narrador das mesmas histórias. E assim,
recebendo cuidado saudável, possam encontrar sentido em sua existência.
Esse nosso olhar e cuidado precisam se voltar para o sujeito e também para a sua
família, o lugar em que ocorrem as primeiras trocas afetivas; ela precisa ser abordada como
âmbito original do cuidado (no sentido mesmo de “origem”). Este, através do envolvimento
afetivo, existe, seja de modo eficaz ou deficiente, e imprime marcas no psiquismo do sujeito.
Desta forma, estaremos reconhecendo a importância da família e do seu modo-de-ser na
constituição psíquica do sujeito. E é sobre esta, enquanto lócus de estruturação da vida
psíquica, que irei tratar a seguir.
3. O CONTEXTO FAMILIAR NOS É MESMO FAMILIAR?
A família é uma instituição defendida e atacada por muitos. Os que a defendem
consideram-na algo muito sagrado, respeitoso, que provê o equilíbrio para a vida do sujeito;
os que a atacam enxergam-na como o nascedouro das neuroses e da dominação.
o que não pode ser negado é a importância da família tanto ao nível das relações sociais, nas quais ela se inscreve, quanto ao nível da vida emocional de seus membros. É na família, mediadora entre o indivíduo e a sociedade, que aprendemos a perceber o mundo e a nos situarmos nele. É a formadora da nossa primeira identidade social (REIS, 1984, p.99)
A família, bem como todas as redes sociais, responde a um papel social. Salem (1980
apud REIS 1984) diz que há dois aspectos a serem considerados ao falarmos de “papel”: as
expectativas de desempenho sobre um ator que ocupa determinada posição social, gerando
padrões interacionais; e o desempenho efetivo do ator ao exercer sua função. Esse
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desempenho traz consigo comportamentos observáveis e também as suas representações, sua
lógica própria de retratar e explicar suas práticas.
Reis (1984, p.115) ainda destaca o caráter interacional dos papéis sociais e diz que
seu desempenho exige um contra-papel que o complemente ao mesmo tempo que significam também cristalizações de padrões de conduta. Além disso, os papéis sociais são engendrados pelas relações sociais e inseridos numa rede de significações. Por isso, não podem ser separados da ideologia dominante.
Em função disso, seria válido afirmar que existe um consenso, por assim dizer, uma
“norma interacional” que rege as formas de atuação e representação dos pais de famílias
socialmente vulneráveis. Há uma rede de significação que lhes impõe que a vida é dura e,
portanto, precisam ser rígidos e ríspidos uns com os outros de modo a garantir que seus filhos
estejam melhor preparados para enfrentar os percalços que, inevitavelmente, irão surgir.
Nesse contexto, o cuidado é visto como fragilizador, porque entendido como mimos,
superproteção e não em seu sentido autêntico.
Ao falar no papel de cuidar enquanto inscrito nas expectativas em torno da família, é
preciso considerar que ela assumiu diferentes modelos em diferentes contextos históricos e
que esse papel foi sendo alterado e intensificado com o passar do tempo.
Por volta do século XVI e XVII, na aristocracia, a separação entre público e privado,
quando existia, era muito tênue e a função da família se limitava a “transmissão da vida, a
conservação dos bens, a prática de um ofício, a ajuda mútua e a proteção da honra e da vida
em caso de crise” (BRUSCHINI, 1997, p. 51), não lhe cabendo, portanto, as funções afetivas
e de socialização. No entanto, em torno do século XVIII ocorreu a privatização da família,
surgiu a família nuclear burguesa e definiu-se que a esta caberia a socialização, bem como o
cuidado e proteção das crianças. O cuidado, antes reduzido às questões de sobrevivência
física, é ampliado para questões afetivas, portanto, de sobrevivência psíquica. Assim, a
família deixa de ser, de acordo com as idéias de Ariès,
uma unidade econômica e tende a tornar-se um lugar de refúgio, de afetividade, onde se estabelecem relações de sentimento entre o casal e os filhos e lugar (bom ou mau) de atenção à infância. A família desenvolve novas funções: absorve o indivíduo, recolhendo e defendendo-o. (ARIÈS apud BRUSCHINI, 1997, p.52)
Ainda para Ariès (1981), passa-se a exigir que a família supra todas as necessidades
afetivas e sociais de seus membros, tornando-a uma instituição absoluta, onipresente e
onipotente. A relação entre pais e filhos, sua vinculação afetiva, passa a receber atenção
especial tendo em vista sua importância para a saúde psíquica dos sujeitos.
Na Psicologia, Sigmund Freud é um importante nome para a consideração da
importância da família na estruturação psíquica dos sujeitos. Em sua teorização acerca da
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infância, Freud aponta como a estrutura da psique é constituída na infância “através de um
longo processo de formação da personalidade e de estabelecimento de vínculos afetivos e
emocionais, que ocorre dentro da estrutura familiar.” (FREUD apud POSTER, 1979, p.62).
Isto não quer dizer que aí se finaliza o processo de estruturação psíquica, porém, como afirma
Rialland (1997), este início deixa marcas profundas no inconsciente, embora sempre exista a
possibilidade da ressignificação.
Poster (1979) comentando sobre a família afirma que é inconcebível a compreensão do
sujeito de modo isolado:
As características mais pessoais e particulares da vida íntima do indivíduo permanecem obscuras, somente se tornando sinais significativos quando remetidos à origem no corpo medicamente significante da família. Logo, a família é o segredo do indivíduo. (p.22, grifos meus).
Todo sujeito encontra-se imbricado em alguma rede familiar, e mesmo que esta
família possa estar, efetivamente, presente ou ausente, é nela que ele irá desenvolver as bases
de seu psiquismo. Bruschini (1997, p.62) diz que depois das considerações freudianas não se
pode analisar as relações em família sem considerar “o nível psicológico das relações sociais
que se passam em seu interior”.
No entanto, é válido salientar que a teoria freudiana está assentada na concepção de
família nuclear burguesa. Proponho que, apesar de considerar sua existência e importância, é
preciso abrir mão de tal modelo de família como ideal, a fim de não patologizarmos as
famílias com arranjos divergentes do nuclear, como são, no geral, as famílias em situação de
vulnerabilidade social. Os modelos de família diferem no tempo e espaço, ela “é definida por
diferentes sociedades em termos largamente divergentes e conferem-se-lhe graus muito
diversos de importância” (POSTER, 1979, p.159).
É patente que os valores sociais têm seu quinhão nessas divergências de estrutura
familiar, como afirma Szymanski (2002, p.17), “classe social [...] é um dos fatores dos modos
de relacionamento interpessoal” (grifo meu). A família é atravessada por um conjunto de
variáveis sociais, políticas, econômicas, culturais, porém, para Poster (1979), ela mantém
relativa autonomia no que diz respeito à estruturação psíquica de seus membros. Assim,
haverá sempre uma relação dialética entre as experiências singulares de cada família e os
padrões emocionais ali vividos o que originará diferentes estruturas familiares.
Deste modo o autor mencionado aponta a família como “o lugar onde se forma a
estrutura psíquica e onde a experiência se caracteriza, em primeiro lugar, por padrões
emocionais.” (p.161). Para abordar essa questão me deterei em dois pontos, também sugeridos
por Poster (1979), da relação entre pais e filhos que demarcam os padrões emocionais: o amor
15
(a afeição) e a autoridade dos adultos sobre as crianças – os quais nos permitem refletir sobre
a liberdade, seus limites e possibilidades como questão vital ao sujeito.
Sabendo que a própria necessidade de amor e autoridade não é, exclusivamente, uma
necessidade biológica, mas modificável de acordo com as formas atuais de família e com as
necessidades em nós injetadas, é importante notar que há uma parcela de amor e autoridade
essencial para nos desenvolvermos criativamente. Essa parcela se deve a aspectos biológicos e
também à psique que pede a expressão de amor e autoridade através de um cuidado que
atenda àquelas dimensões discutidas no primeiro capítulo: sustentar, conter, reconhecer e
interpelar. Não esquecendo, ainda, que a parte biológica e a cultural encontram-se
interligadas.
Considerando o que acima foi dito sobre a importância do padrão de amor e autoridade
apresentado à criança, vemos que determinados padrões emocionais se inscrevem na
formação psíquica da criança. Sobre isto Poster (1979, p.168) diz: “A criança desenvolve
padrões que são duradouros e dizem respeito às principais questões da vida social.”
E na prática, como se pode visualizar o que foi dito? Tomando os estágios oral, anal e
genital apresentados por Freud como referência, vemos como cada tipo de família cria suas
estratégias para lidar com questões como alimentação, controle dos esfíncteres e práticas
masturbatórias. Tais estratégias vão formando na criança um conjunto de sentimentos em
relação ao corpo, sua identidade sexual, seu ego com suas formas de interagir com a
sociedade e responder à autoridade externa (POSTER, 1979). Elas configuram modelos
emocionais os quais geram um conjunto de respostas do sujeito e vêm dar forma à sua psique.
Na estruturação do psiquismo ocorre, ainda, um processo de identificação da criança com o
adulto, na qual ela apreende o outro como sendo ela própria, instituindo um “padrão de
identificação que consolida os vínculos entre os adultos e as crianças” (POSTER, 1979,
p.173).
Mas além de tudo o que foi considerado, é preciso salientar que há algo além do nível
psicológico: o cotidiano familiar e a relação entre a família e a sociedade, isto é,
compreender...
quem são os membros da família como personagens no drama social. O conhecimento da vida cotidiana da família e sua relação com a sociedade é a base para a análise no nível psicológico. [...] a análise psicológica da família não pode ir muito longe sem uma sólida noção da vida cotidiana da família [para não ser insensível às diferenças emocionais] (POSTER, 1979, p. 173 – 177).
E é considerando isto que agora passarei a pensar mais restritamente sobre as famílias
em situação de vulnerabilidade social, compreendendo as repercussões dos valores sociais na
16
estrutura familiar, apesar de seu nível de autonomia. Isto não será feito, como bem alerta
Poster (1979), reduzindo a importância do aspecto psicológico, mas enriquecendo sua
compreensão. Winnicott (1993) assim afirma:
A ‘contribuição’ que os pais podem dar à família que estão construindo depende em grande medida do seu relacionamento geral com o círculo mais amplo que os envolve, ou seja, seu contexto social imediato [...] cada grupo social depende, para ser o que é, de seu relacionamento com um grupo social mais vasto (p.61, grifos meus).
O contexto social imediato ou a realidade das famílias brasileiras em situação de
vulnerabilidade social é bastante amplo; aqui abordarei alguns de seus aspectos, na crença de
que “é necessário especificar as estruturas e condições interacionais precisas que explicam a
estrutura psíquica de cada classe” (POSTER, 1979, p.74).
Em primeiro lugar gostaria de pensar sobre a arquitetura das moradias, questionando,
como sugere Poster (1979), como as moradias auxiliam a organizar as funções da vida
cotidiana, “como sua disposição interna regula ou limita as interações entre os membros da
família” (p.176).
É evidente o padrão de residência da população de baixa renda: as casas têm estrutura
precária, às vezes barracos; as divisões dentro da casa, quando existem, são poucas; o espaço
entre as demais moradias também é mínimo, fazendo com que a intimidade seja pouco
preservada; no geral, dormem no mesmo cômodo (às vezes único), nas mesmas camas,
quando as têm. A arquitetura inadequada das moradias aponta para a delimitação de espaços
internos (subjetividade) pelos espaços externos.
Além disso, tais moradias, de modo geral, encontram-se situadas em locais sujos, sem
saneamento básico, sem investimento de políticas públicas, etc. Neste ambiente é comum a
exposição ou envolvimento com a violência, o tráfico de drogas, a prostituição, a dependência
a drogas ilícitas e lícitas, o desemprego... Enfim, uma série de fatores agravantes, embora nem
sempre de exclusividade dessa classe.
Se nós acreditamos e defendemos que somos seres de (con)vivência, ser-no-mundo-
com, em contínua interação, constante troca com o mundo circundante, é evidente que fatores
como os considerados acima hão de repercutir nas subjetividades dos sujeitos, como
repercutem, também, embora de modo diferenciado, nos que estão “de fora” dessa realidade.
Cardoso (et al. 2009, p.792) comenta: “Essa conjuntura expõe as famílias a circunstâncias de
riscos e de vulnerabilidades de ordens diversas, com repercussões diretas no seu cotidiano, na
sua auto-imagem e na integridade de cada um de seus membros.”
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Outro ponto a considerar é que, geralmente, as casas são pequenas, mas a família é
extensa. E é importante perceber que a noção de família não se dá em função de parentesco ou
consangüinidade, mas em torno de um eixo moral, como sugere Cardoso (et al 2009): “[a
família é] constituída em função de um eixo afetivo” (p. 782), quer dizer, pode compor a
família um padrinho, uma pessoa que foi criada junto, ou que mora na mesma casa por não ter
possibilidades concretas de moradia e sobrevivência.
Um fator bem presente também é a quantidade de filhos. Com freqüência, pela
ineficiência das políticas públicas, não existe um planejamento familiar, o que agrava a
situação sócio-econômica em que vivem. E além da situação mesma de prover condições
físicas está a necessidade de prover condições psíquicas. Pensar se este filho(a) é desejado, é
acolhido, o que se espera ou não dele.
E, sem pretender afirmar algo de forma alienada, mas analisar o que é ponderado sobre
o assunto, exponho uma reflexão de Bianco (1981). Ela diz que os pais devem proporcionar
aos filhos atenção e bem-estar, e que para esta tarefa ser bem sucedida é importante a
limitação da prole, e afirma: “As dificuldades econômicas são fatores que também contribuem
para a desatenção com as crianças, e, portanto, devem ser combatidas.” (p.156). Não pretendo
afirmar que famílias numerosas caracterizam-se, necessariamente, pela desatenção dos pais
para com os filhos. Prefiro pensar que o sucesso nesses requisitos de atenção e bem-estar
passa muito mais pela ordem dos desejos (antes, durante e pós concepção do filho); mas
também não posso deixar de notar um fato concreto na afirmação da autora: as dificuldades
econômicas repercutem sim na qualidade das relações.
Por fim gostaria de me deter um pouco nos tipos de relações criadas entre os membros,
porque “não há como pensar em família sem considerar as relações interpessoais que ocorrem
nesse contexto” (CARDOSO et al 2009, p.790). Será que as relações, especialmente entre
pais e filhos, se estruturam do mesmo modo independentemente do tipo de família? Pensar
que sim seria ir contra tudo aquilo que vem sendo construindo ao longo deste trabalho. Assim,
por acreditar que, embora com algumas semelhanças, tais relações são marcadas pela
singularidade de cada família, considero ser necessário rever alguns conceitos importantes das
ciências, mais particularmente, da Psicologia. Com esse intuito, irei me ater, agora, sobre as
idéias desenvolvidas por Freud acerca da dependência da criança para com seus pais.
Poster (1979, p.35) afirma que a dependência justifica o vínculo tecido entre pais e
filhos e cita Freud: “A longa dependência da criança para com os pais é um fato biológico de
imensa importância”. Sim, existe uma dependência real da criança, a princípio, no sentido de
18
chegar a um mundo novo e precisar se socializar via mediação do adulto. Mas, tal
dependência não deve ser inscrita numa dimensão natural de que sempre haverá uma parcela
determinada de dependência entre pais e filhos. O próprio Freud diz: “À criança... é ensinado
que a sua segurança na vida depende dos pais... amando-a e sendo capazes de acreditar que
ela os ama” (FREUD apud POSTER, 1979, p.35). Com essa afirmação está posto não a
naturalização do desenvolvimento da dependência, mas, seu caráter de aprendizado; e se
assim é, quer dizer que se pode ser ensinado de modos diferentes: cada cultura ensina um
modo de relação entre pais e filhos, que pode incitar à maior ou menor dependência.
Mas, de modo geral, predominam as representações que vinculam amor, dependência
e cuidado como próprios da relação pais-filhos, como algo natural e existente em qualquer
tipo de família. Contudo, Luc Boltanski defende que é “inútil qualquer investigação sobre as
práticas maternas [ou familiares] que não levem em conta o ethos de classe” (apud BIANCO,
1981, p.160). Embora, pelo grau de hierarquização da sociedade, as classes altas ditem os
modelos a serem seguidos, é essencial perceber e considerar que há sempre uma
reinterpretação realizada através dos valores e saberes concernentes a cada classe. (BIANCO,
1981)
Porque é importante perceber isso? É que, enquanto acreditarmos e defendermos que
esta maneira de vivenciar o cuidado e o amor faz parte da natureza da relação entre pais e
filhos, tenderemos a patologizar comportamentos que não se enquadram na postura entendida
como natural. Discuti no primeiro capítulo sobre a ontologia do cuidado e sua importância
para o desenvolvimento da pessoa, mas em nenhum momento afirmei a naturalidade de sua
expressão. Acredito ser necessário ficarmos atentos às condições oferecidas no meio e aos
significantes construídos nas relações intrafamiliares, visando compreender os esquemas que
têm norteado as ações, sentimentos e pensamentos de pais e filhos.
Tendo chegado a essa reflexão, posso passar ao próximo capítulo, uma vez
sensibilizados suficientemente a perceber parte das idiossincrasias das famílias em situação de
vulnerabilidade e como elas afetam diretamente ou indiretamente a estruturação psíquica de
cada sujeito; a compreender as diferentes formas de se vivenciar o cuidado e como os
significantes que circulam no âmbito da família contribuem para a saúde ou o adoecimento
dos sujeitos; e, por fim, como nós, psicólogos, podemos intervir nessa realidade para facilitar
as ressignificações necessárias e o diálogo baseado na ética do cuidado entre pais e filhos.
19
4. EU CUIDO, TU CUIDAS... ELES CUIDAM
Como vimos, a realidade socioeconômica traz repercussões em várias dimensões da
família, delimitando as concepções, estruturas e dinâmicas familiares. Uma realidade de
descaso social – desemprego, violência, pobreza..., dá origem e fomenta o sofrimento
psicossocial dos sujeitos, despotencializando-os uma vez que
[...]sofrem a falta de amparo externo real (falta de controle absoluto sobre o que ocorre) e a falta de amparo subjetivo (falta de recursos emocionais para agir). Adquiriram, nas relações sociais cotidianas, a certeza da impossibilidade de conquistar o objetivo desejado e desenvolveram a consciência de que nada podem fazer para melhorar seu estado. (SAWAIA, 1995, p.158).
Assim, por exemplo, pais e filhos que vivem em situações-limite, numa relação de
constante atrito, inferem que não há mais jeito, desconfiam de qualquer tentativa de mudança
acreditando que esta não tem possibilidade de acontecer. Em minha experiência de estágio
curricular num projeto social acompanhei Maria3, uma adolescente que tinha sérios conflitos
com a mãe; quando essa mãe, a partir dos atendimentos psicossociais, tentava ser mais dócil
com a filha, Maria dizia: “Ela deve tá querendo alguma coisa... Tá dando uma de
boazinha...”. Essas pessoas foram levadas a crer que suas realidades são imutáveis e
encontram-se enfraquecidos e descrentes para achar que podem eles mesmos intervir no que
ocorre, devido à “falta de amparo externo real e subjetivo.” Sawaia (1995, p.159) ainda afirma
que há:
[...] falta de recursos emocionais, de força para agir e pensar e [...] desânimo em relação à própria competência. É um auto-abandono aos próprios recursos internos, e a consciência de que nada se pode fazer para melhorar seu estado. É a cristalização da angústia.
Nessa mesma linha de raciocínio Figueiredo (2009) aponta que “quando o sentido se
cristaliza ou é recebido ou tomado de forma cristalizada, o processo se interrompe e a
criatividade se estiola.” E, quando há cristalização ou falta de sentido, a decorrência é “o real
não simbolizado, as forças passionais primitivas e, no limite, o traumático em sua dimensão
desestruturante.” (p.116).
Essa cristalização também ocorre nas idéias da sociedade mais ampla quando só se
admite, por exemplo, um padrão de exercício do cuidado, o que, a meu ver, indica um
adoecimento social, se considerarmos qualquer cristalização um modo adoecido de viver. É o
que sinaliza Dejours (apud SAWAIA, 1995, p.162) ao afirmar que “saúde é liberdade de
3 Nome fictício.
20
movimento do corpo e da mente, ao contrário de doença que é a ‘fixação, de modo rígido, dos
estados físicos e mentais’”.
O processo de ganhar consciência dessa realidade na qual estão imersos e
(re)significá-las é muitas vezes negado pelos próprios sujeitos. É como se dissessem: “é
melhor não pensar nisso que gera tanto sofrimento, sabendo que conhecendo minha dor não
terei como mudá-la” – e é esse pensamento que comanda as resistências. Todo trabalho de
(re)significação, é verdade, gera um nível de sofrimento a princípio que, no entanto, é mais
suportável que o sofrimento psicossocial a que estão adormecidamente acorrentados.
Adormecidamente porque, segundo Sawaia (1995, p.159)
O comportamento emocional que caracteriza o tempo de morrer [o sofrimento psicossocial] pode ser definido como um estado letárgico de apatia, que vai ocupando o lugar das emoções até anulá-las totalmente, um estado de tristeza passiva que transforma o mundo numa realidade afetivamente neutra, reduzindo o indivíduo ao ‘zero afetivo’ (Sartre, 1965:60) e ativo.
Esse comportamento é de desafetação, quer dizer, para evitar o sofrimento psíquico,
para proteger-se dele, criam-se couraças que levam sujeitos a uma aparente falta de
sentimentos, de afetividade (“zero afetivo”). É desta forma que se afastam das posturas de
enternecimento, e do cuidado que se caracteriza pela disponibilidade afetiva. O sofrimento
psicossocial atua rompendo a ligação entre agir, pensar e sentir, ou seja, suprime-se a emoção
“por senti-la suspeita e por não saber transformá-la em pensamento e ação.” (SAWAIA, 1995,
p.50). Logo, por exemplo, os pais podem sentir enternecimento por seus filhos, mas o
suprimem ou bloqueiam uma vez que têm dificuldades em traduzi-lo em ações.
O sofrimento psicossocial é um estado de ânimo ao qual as famílias em situação de
vulnerabilidade social estão expostas, devido, por exemplo, àqueles fatores estressores
mencionados no capítulo anterior, como desemprego, tráfico, fome, abusos sexuais,
violências, moradias inadequadas, políticas públicas enfraquecidas e os vários descuidos
praticados pela sociedade como um todo. E vimos no primeiro capítulo que a capacidade para
exercer o cuidado está entrelaçada ao ter sido alvo de cuidados. Quer dizer, cobra-se desses
sujeitos atitudes de cuidado, mas não se tem cuidado deles nem em suas necessidades básicas.
Todos esses fatores “causam impacto tanto na concepção de família quanto na sua estrutura,
na dinâmica e nos aspectos mais cotidianos de sua existência.” (CARDOSO et al 2009,
p.781).
As condições de pobreza fragilizam os sujeitos podendo se constituir numa
experiência traumática que deixa marcas profundas (MOREIRA e SLOAN, 2002, p.221). A
saúde mental está diretamente atrelada a questões sociais, ela está
21
relacionada a um estado de coisas em que certas necessidades básicas são supridas, dependendo em grande parte, portanto, de condições socioeconômicas que proporcionem qualidade de vida. A capacidade dos pais de proporcionar amor e segurança ao desenvolvimento sadio de seus filhos se vincula à sua própria qualidade de saúde mental (MOREIRA; SLOAN, 2002, p.149)
Então, se o estado de ânimo desses pais é de sofrimento, um estado que tende a se
tornar permanente se continuarmos com essa “cegueira social” (MOREIRA; SLOAN, 2002),
a promoção de bem-estar e cuidado aos filhos será fragilizada. Como posso promover algo
que desconheço?
O estado de ânimo das pessoas reflete-se na metacomunicação e vai dar o tom da relação entre os membros de uma família. Nela, adultos e crianças reagem ao sentimento que o outro está transmitindo – às vezes, mais do que às suas palavras (SZYMANSKI, 2002, p.11)
E sendo as famílias consideradas “fábricas que produzem personalidades humanas”
(PARSONS apud POSTER, 1979, p.83) ou, simplesmente “fábrica de gente” (VALENTE
apud CARDOSO et al 2009, p.790), é no seu interior que uma pessoa se constitui, como
discuti no segundo capítulo. Assim, o “modo dos membros familiares serem uns com os
outros [...] [o modo] como cuidam das relações entre si” (SZYMANSKI, 2002, p.10-11) vai
dar tonalidade à constituição do sujeito e afinar sua subjetividade; é isto, a meu ver, que se
expressa quando, Maria, a adolescente a qual me referi anteriormente, ao falar sobre sua
família e a sociedade em geral disse: “A gente é tratado como bicho, aí vira bicho!”.
Contudo, de acordo com Szymanski (2002, p.14),
Pais e mães compreendem sua tarefa socializadora de diferentes maneiras e assumem esta incumbência conforme os modos de ser que foram desenvolvendo ao longo de suas vidas. Aquelas não ocorrem em um vazio, mas situadas social e historicamente.
Assim, acredito que essas famílias, mesmo submetidas a condições tão inóspitas,
criam, de acordo com suas disposições, formas próprias de cuidar, e isto precisa ser notado.
Isto é, as relações de cuidado para serem compreendidas precisam ter situados os sentidos de
cuidado que as permeiam. E é isso que fiz ao me debruçar sobre o sofrimento psicossocial e
as marcas que desenha nas relações. Ele atinge diretamente a afetividade dos sujeitos, deste
modo, como afirma Szymanski (idem, p.12): “As trocas afetivas na família imprimem marcas
que as pessoas carregam a vida toda, definindo direções no modo de ser com os outros
afetivamente e no modo de agir com as pessoas.”
As trocas afetivas ou os padrões emocionais estabelecidos vão demarcar as diferenças
existentes entre cada família. Os padrões emocionais vão constituindo os significantes que
circulam as práticas intrafamiliares. Vejamos dois exemplos: na Europa pré-industrial bater
22
nos filhos era comportamento comum em uma família camponesa, não significava rejeição
como hoje pode representar para uma família de classe média. E embora causasse dor
fisicamente, ao nível emocional, por ter um sentido diferente do que tem hoje, era encarado
como uma ocorrência normal e não representava grande hostilidade por parte dos pais
(POSTER,1979). O outro exemplo diz respeito às relações intrafamiliares de uma família de
comunidade rural e de uma família paulista de classe média: a primeira tem padrões de
conduta moral baseados numa ideologia introjetada ao longo de anos de submissão; a segunda
desenvolve padrões individualistas, competitivos na vida social e isolados nas famílias
nucleares. Os filhos da família que incorporou a submissão serão criados de modo a
reproduzir a ideologia dominante “usando-se a força para impor obediência, que é o objetivo
último de sua tarefa socializadora.” (SZYMANSKI, 2002, p.15).
É por isso que não se deve ficar desatento e insensível às diferenças emocionais,
porque é a partir delas que são estruturadas e verdadeiramente compreendidas as atitudes no
interior das famílias. Poster (1979, p.171) diz:
Quando a família é estruturada no nível emocional, exige-se da parte do cientista uma extraordinária sensibilidade. Já que o mesmo comportamento pode significar coisas diferentes em dois contextos, a cuidadosa elaboração do padrão familiar total adquire uma importância absoluta.
Desta forma questiono: será que quando julgamos não haver cuidado em determinadas
relações de famílias em situação de vulnerabilidade social não o fazemos aprisionados aos
nossos parâmetros emocionais de cuidado? Não estaremos apenas reafirmando, legitimando
nossos próprios padrões ou os dos grupos dominantes? Não quero dizer que não haja
descuidos nas famílias socialmente vulneráveis, ocorrem sim, como também ocorrem nas
diversas relações sociais, mas são norteados por outros sentidos. Assim também, quando há o
cuidado ele é perpassado por outros padrões emocionais que precisam ser igualmente
reconhecidos e legitimados. O que é preciso perceber é se tal forma de cuidado, vivido como
é, está sendo autêntico, ou seja, está vendo “o outro como legítimo outro na sua expressão
pessoal.” (SZYMANSKI, 2002, p.15).
Convido-os primeiramente a refletir sobre por quais razões a solicitude (o cuidado)
não estaria sendo exercida em algumas famílias em situação de vulnerabilidade social. Como
ponto de partida é importante ressalvar que cada uma delas terá seus motivos peculiares, por
ora, neste trabalho, é possível analisar em linhas gerais o motivo que leva a não-vivência do
cuidado que, na minha compreensão, é o sofrimento psicossocial, sobre o qual já discorri,
apesar deste não impedir terminantemente a expressão do cuidado, mas, como defende
Guimarães (1998 apud SZYMANSKI, 2002, p.20), há
23
reflexos no modo de ser com o outro, na expressão da solicitude, quando a família é submetida a condições tão adversas que, longe de constituí-la em um núcleo de satisfação das necessidades básicas do indivíduo, mal possibilitam que ela atue como um fator de proteção contra a indigência e a miséria.
Quando de forma extrema ocorrem descuidos nas relações, há algumas repercussões
sobre a vida do sujeito. Falando da importância dos familiares, Winnicott (1993) nos chama a
observar as dificuldades acarretadas pela privação familiar na vida das pessoas, afirmando que
“a ausência de familiares de quem possamos reclamar, a quem possamos amar, odiar ou temer
constitui uma deficiência terrível, podendo levar a uma tendência a desconfiar até dos
vizinhos mais inofensivos.” (p.60). E essa ausência de familiares pode se dar mesmo quando
estão fisicamente presentes, pois, faltam em presença implicada e se transformam numa
ausência afetiva, fazendo com que os sujeitos muitas vezes não se sintam protegidos, seguros
e confiantes, ficando mais comprometida a capacidade de desenvolver relações de confiança
com as pessoas posteriormente. “A dor da desilusão e da solidão na presença do outro é
sempre profunda” (BELMONT, 1995, p.176)
Também de acordo com Winnicott (1993), quando uma criança foi privada de um
ambiente suficientemente bom, mas, num sinal de saúde ainda conserva a unidade de sua
personalidade, ela passa a buscar tal ambiente que lhe foi negado. Os sintomas anti-sociais
como, por exemplo, o roubo, representam essa busca e corroboram a necessidade da criança
ter assegurado não apenas o direito de nascer em uma família, mas de nela poder crescer e
adolescer para enfim conquistar uma vida autônoma.
Este autor defende que o self nos estágios primitivos de desenvolvimento está
começando a se estabelecer e depende de um ambiente facilitador para efetuar progressos
pessoais. É esse ambiente que oferecerá à criança padrões da realidade externa. Assim, por
exemplo, se para a mãe (esta compreendida não como mãe-biológica-mulher, mas como uma
função) há uma compreensão de que a vida é dura e que o afeto, o cuidado, fragiliza os
sujeitos frente à dureza da vida, é assim mesmo que a criança introjetará sua compreensão de
mundo e criará em torno de si “couraças” de desafetação para imunizar-se do cuidado que
fragiliza, precisando, pois, de uma ressignificação do cuidado como fortalecedor.
Vê-se, novamente, a explicitação da importância do cuidado. É ele que permite o
desenvolvimento humano, o crescimento criativo, o estabelecimento do self. Winnicott (1993,
p.68) diz que
Em condições favoráveis [...], o bebê humano é capaz de manifestar uma tendência inata à integração, que faz parte do processo de crescimento. (...) [E, por sua vez,] A criança que se desenvolve bem, e cuja personalidade foi capaz de realizar internamente sua integração por força das capacidades inatas de crescimento
24
individual, exerce um efeito integrativo sobre seu ambiente externo imediato. Essa criança ‘contribui’ para a situação familiar.
Estabelece-se, assim, um ciclo cuidador: os pais cuidam da criança e esta aprende a
cuidar da família. É o princípio exposto no primeiro capítulo de que ser cuidado é ter a
possibilidade de aprender a exercer cuidado.
Agora, vamos pensar sobre as vivências de solicitude, reconhecendo que estas nem
sempre se dão de modo autêntico. Szymanski (2002, p.16) afirma:
Há modos culturais e momentos históricos que impõem determinadas práticas e as pessoas adaptam-se mais, ou menos, a elas. A solicitude, entretanto, depende da maneira como o mundo em torno e a função de cada um na família são interpretados, em especial por parte dos adultos.
As famílias em situação de vulnerabilidade social são perpassadas por várias questões
na experiência do cuidado. Vejamos algumas delas.
A questão já mencionada da submissão socialmente introjetada que faz com que as
relações entre pais e filhos sejam acentuadamente assimétricas, reproduzindo no micro os
padrões do macro; esse modelo de dominação motiva toda atitude dos pais em relação aos
filhos. São valorizadas regras enrijecidas, tradições imutáveis (como o papel da mulher, por
exemplo). Segundo Szymanski (2002), nesses casos, dificilmente a solicitude é vivida no
modo da autenticidade:
A submissão às regras e à autoridade torna-se o modo habitual de ser e pode-se ter, como conseqüência, o afastamento mútuo. Obviamente isso não significa que não deva haver regras e autoridade, mas que a maneira como são vividas define modos de compreensão de si mesmo e do mundo. (p.15-16).
Outro fator é a exclusão a que estão socialmente submetidos e que os leva a buscar
formas de se enquadrar/atender aos comportamentos valorizados e ditados pela camada
dominante da sociedade. Se esta julga que bons pais são aqueles que dão de tudo aos seus
filhos, farão o impossível para conseguir isso; essa postura já existe em alguns casos sob o
pensamento de querer dar aos filhos, mesmo à custa de inúmeros sacrifícios, tudo aquilo que
não tiveram na vida. Quando socialmente se define que os pais precisam ser rígidos, procuram
fazê-lo, às vezes até ultrapassando os limites. Szymanski (2002) traz um depoimento de uma
mãe que fingia bater no filho... “para não ouvir as admoestações da vizinhança de que não era
severa na educação de seus filhos. O cuidado com o filho era permeado pela ‘satisfação’ que
tinha que dar à vizinhança.” (p.15).
Também pode circundar as famílias em situação de vulnerabilidade social o medo da
realidade hostil a que estão expostos, medo do envolvimento de seus filhos em situações de
delinqüência e prostituição, por exemplo, e com todas as identidades negativas construídas
25
dos/nos moradores de comunidades. Os pais podem lidar com esse medo de maneira a
controlar os filhos ou superprotegê-los. Na primeira forma, o cuidado é exercido de modo
controlador, abafando as expressões individuais dos seus filhos (SZYMANSKI, 2002, p.16);
na segunda, “a preocupação excessiva com a segurança e bem-estar dos filhos pode também
criar um modo de ser na dependência e uma compreensão de mundo desvelando apenas seu
aspecto hostil e pouco da sua condição provedora.” (SZYMANSKI, 2002, p.16). Ou até,
numa atitude extrema, mas que também expressa o intuito de proteger da realidade hostil,
podem adotar “práticas educativas cada vez mais punitivas e violentas, na crença de que
evitarão que seus filhos sejam cooptados pelo tráfico de drogas.” (SZYMANSKI, 2002, p.21).
Às vezes, ocorre também nas relações de cuidado entre pais e filhos um esgarçamento
da responsabilidade dos pais pela presença de várias outras instâncias como a creche (que
não deixa de representar um cuidado dos pais que precisam trabalhar fora para garantir o
sustento dos filhos mesmo), a escola, os projetos sociais, mas acima de tudo, o Conselho
Tutelar. Certa vez no estágio, uma mãe foi chamada por causa do envolvimento do filho numa
briga no espaço do projeto; ao longo da conversa, desabafando sobre os conflitos com os
filhos disse que os mandaria para o Conselho Tutelar e que, inclusive, os ameaçava com essa
idéia. O que nota-se com essa afirmativa: o Conselho transformado num órgão utilizado para
resolver os problemas intrafamiliares, ou como estratégia utilizada pelos pais para se livrarem
de responsabilidades que lhes competem. É como se esses pais se sentissem impotentes no
exercício de suas funções cuidadoras, precisando recorrer a órgãos externos. Em outra
situação, uma mãe e uma filha adolescente, em uma briga em que ocorreram, inclusive, troca
de agressões físicas, se ameaçaram mutuamente de ligar para o Conselho Tutelar, revelando
mais uma vez a incapacidade intensa em dialogar uma com a outra, requerendo a presença de
um terceiro para mediar a relação.
Entre todas essas questões levantadas como demarcadoras da experiência do cuidado,
considero que o cerne da vivência do cuidado nas famílias em situação de vulnerabilidade
social se expressa na tão disseminada frase: “a vida é dura”. Se a vida é dura para todos,
imagine para aqueles que estão sujeitados a vários descuidos sociais? Para esses, a vida é
encarada como extremamente dura. É esse o sentido que ela adquire. Levando em conta,
como já afirmei, a importância de se compreender o “sentido e ideologia que levaram as
pessoas a escolher uma ou outra forma de constituição de família, uma ou outra forma de
solicitude dentro da família.” (SZYMANSKI, 2002, p.16), é necessário perguntar: qual o
sentido imperante? Se a vida é dura, cuidar daqueles que dependem de mim, os meus filhos, é
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prepará-los para a vida dura que encontrarão, para o mundo que os espera... Com isso, não
pretendo discutir se tal preparação é ou não correta. Não pretendo lançar juízos de valor
baseados em minha própria moral, mas atentar que é percebendo os sentidos por trás das
práticas que poderemos compreender e auxiliar essas micro-sociedades e a sociedade como
um todo.
Se os pais compreendem o cuidado como fragilizador do sujeito, apenas estão
reproduzindo o sentido geral que ele adquiriu na sociedade: cuidado como dispensa de
mimos, carinhos, etc. Assim, aspereza e rigidez para não fragilizar os filhos com muito afeto
também podem significar cuidado e desvelo na medida em que revelam a preocupação em
prepará-los para a vida.
Diante disso, acredito que, enquanto psicólogos, podemos e devemos facilitar para as
pessoas a apreensão de outras possibilidades, promovendo uma ressignificação do cuidado
compreendido como fragilizador para o cuidado reconhecido como fortalecedor; buscando
quebrar o ciclo de descuidos (abaixo representado) que intensifica seus sofrimentos.
Primeiro, é preciso fortalecer esses sujeitos que se encontram despotencializados tanto
social quanto psiquicamente; fortalecer sua auto-imagem e a do outro e sua integridade que se
encontra abalada para que possam se sentir capazes de cuidar e serem cuidados. É necessário
que o cuidado tenha início consigo mesmo para estar fortalecido o suficiente para cuidar do
outro.
Cuidar e ser cuidado são, de fato, necessidades humanas que quando não atendidas
adoecem cada vez mais as pessoas. É isto que se percebe nos constantes atritos entre Maria e
sua mãe. Esta mãe, que reconhecia sua dificuldade em se aproximar da filha e fazer um
carinho, exercia sua necessidade de cuidar através de seu trabalho: era cuidadora de um cão.
Ela, como tantos, precisava descobrir suas potencialidades, ir desvelando aos poucos as
metacomunicações de cuidado imersas em sua história, em seu dia-a-dia. Sua vida foi bastante
conturbada. Quando a filha ainda era criança, o marido vivia envolvido com drogas e eram
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constantes as cenas de violência doméstica. Ela, então, resolveu levar a filha para morar com
a avó, tratando-a com aspereza e rejeição. Certa vez, Maria contou com mágoa que caiu da
escada e, toda ferida, foi pedir ajuda à mãe, mas esta gritou mandando que fosse embora.
Porém, à noite, deixou um remédio para ela na casa da avó. O que está latente nessa história?
A rejeição da mãe podia representar uma forma de cuidar do futuro da filha, no sentido de que
ela não fosse exposta àquelas violências e pudesse vir a repetir a trajetória de vida de sua mãe,
intencionava, assim, afastá-la dessa trágica história. Isso precisa ser traduzido para a mãe,
para que não se perceba como cruel e displicente, e para a filha, para que não se sinta
profundamente rejeitada e “desamada”, conseguindo encontrar algum sentido nas atitudes,
mesmo que não-eficientes, da mãe.
É assim que nós, psicólogos, atuamos como mediadores, tradutores de linguagens de
cuidado que se encontram camufladas em alguns comportamentos. Acredito que isto é
absolutamente necessário vez que as experiências do cotidiano...
são continuamente interpretadas no contexto de sentimentos e disposições afetivas em que ocorrem, em leituras sucessivas da linguagem verbal e da metalinguagem contida na não-verbal. [...] as pessoas interpretam-se mutuamente e a si mesmas no decorrer das trocas intersubjetivas. (SZYMANSKI, 2002, p.11).
Tendo, através da tradução das linguagens, fortalecido os sujeitos pelo reconhecimento
de suas potencialidades, é preciso partir para a reedição dos sentidos imbricados no exercício
do cuidar; é preciso reconstruir as posturas refletindo que, embora compreensíveis, as atitudes
escolhidas nem sempre garantem o bem-estar dos filhos, e às vezes, pelo contrário, geram
indignação e agressividade, não assegurando que eles não venham a repetir a história dos pais
(que foi, inclusive, o que aconteceu no caso de Maria).
Então, cabe ao profissional de psicologia reconhecer e legitimar as expressões de amor
e cuidado ainda não reconhecidas, facilitando o desenvolvimento de outras posturas
importantes, para deste modo possibilitar que os sujeitos se tornem cada vez mais “livres de
ditaduras impostas às suas emoções, ações e pensamentos, e abertos à alteridade” (SAWAIA,
1995, p.52). Com isto estaremos contribuindo para que os sujeitos possam superar seu
sofrimento psicossocial, pois, segundo a autora
[...] enfrentar o sofrimento psicossocial é devolver ao homem os meios para traçar um caminho pessoal e original na organização de sua vida, meios estes que não se restringem, apenas, à capacidade de reflexão, mas à possibilidade de ter esperança e potencializar essa esperança em ação.(p.52)
E ter esperança em ação significa enxergar as possibilidades, perceber e buscar algo
diferente do instalado, sem cristalizações. Quando as cristalizações ainda imperam, nós
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devemos apontar, por vezes até conduzir a outras posturas, diferentes daquelas que se
encontram rígidas e reduzidas a únicas alternativas.
Considerar essas possibilidades de mudança é assumir basicamente duas convicções.
A primeira nos diz que, embora a estruturação psíquica se inicie na família, e que esta seja
responsável por marcas carregadas pela vida toda dos sujeitos, lhes inserindo modos de ser-
no-mundo-com-os-outros, essa estruturação continua ao longo da vida do sujeito e “comporta
modificações advindas das experiências nos outros ‘mundos’ em que se vive.”
(SZYMANSKI, 2002, p.16); assim, espero ter conseguido, com as reflexões aqui
desenvolvidas, sensibilizar os profissionais de diversas áreas, principalmente nós psicólogos,
a prover parte desses outros “mundos” nos quais o sujeito possa circular e (re)significar as
experiências. A segunda convicção é a de que o ser humano é capaz de fazer escolhas nos
seus modos de ser, de compreender a si mesmo e ao mundo. Mesmos que sua realidade seja
limitada e limitante, imprevisível e, às vezes até um tanto castradora, são escolhas, pois,
definem um rumo e não outro. E é na suposição de que foram escolhas, mais, ou menos, conscientes é que se pode pensar em intervenções que objetivem um aprimoramento das relações interpessoais na família. Assim sendo, novas formas de ser com o outro podem ser ensaiadas e instituídas. (SZYMANSKI, 2002, p.16).
É só depois dessas reflexões que posso sugerir a sensibilização das pessoas que
buscamos atender em nossas intervenções. Sejam estas psicossociais, escolares, clínicas,
hospitalares, organizacionais, sempre serão permeadas pelos nossos modos de compreensão,
pelos sentidos que nós e aqueles a quem dirigimos nossas intervenções dermos as nossas
vivências. Assim, compartilhando saberes, ressignificando experiências, e buscando o sentido
implícito nas práticas e nos discursos, acredito que poderemos contribuir para a otimização de
suas vidas.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A partir deste trabalho foi possível desconstruir aos poucos algumas representações
dominantes em nossa sociedade, como as de cuidado, de família e de vulnerabilidade social.
No caso do cuidado, vimos que, por vezes, nos limitamos às nossas próprias perspectivas,
àquilo que pensamos e praticamos como cuidar. Ao me debruçar para descobrir que o
contexto das famílias nem sempre é tão familiar (no sentido de conhecido), e que é necessário
valorizarmos a presença e importância de outros arranjos familiares, fui lançando mão de
outras vivências, despercebidas formas de experienciar afetos, idéias e ações.
Ao me dar a chance de desvelar realidades outras – como a da vulnerabilidade social –
compreendendo suas particularidades, pude me dar conta que cada uma delas traz suas
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limitações e necessidades que precisam de suporte, compreensão e acolhimento, como
também são dotadas de potencialidades e saberes que, por sua vez, devem ser notados,
valorizados e estimulados.
Por falta desse suporte, compreensão e valorização, certas famílias, particularmente
aquelas em situação de vulnerabilidade social, vão se despotencializando até o ponto de
submergirem no sofrimento psicossocial; e vão, adormecidamente, intensificando um ciclo de
descuidos iniciado na própria fragilização das políticas públicas que não atendem de forma
equânime e eficaz às suas necessidades mais básicas. O que se tem criado, cada vez mais, são
órgãos destinados à cobrança dessas famílias pelo exercício do cuidado com seus filhos e
cumprimento dos seus direitos. É claro que cabe ao Estado zelar para que os direitos das
crianças e adolescentes sejam respeitados, porém, é preciso dar aos pais ou responsáveis, as
mínimas condições para que possam exercer a função de cuidadores nos colocando
disponíveis para acolher suas demandas.
É pensando em atender tais demandas que acredito ser necessário que nós psicólogos,
que nos formamos para compreender as pessoas e ajudá-las a encontrar por si mesmas a
melhor forma de lidar e, se possível, superar suas dificuldades, possamos entender os
significantes que guiam suas práticas. Ou seja, só posso ajudá-las quando me disponho a ouvir
suas linguagens verbais e não-verbais, e não subjugá-las aos meus próprios modos de
compreensão.
Por acreditar que é possível rever conceitos e ressignificar práticas, ousei sugerir neste
trabalho, que o psicólogo atue como tradutor das linguagens de cuidado camufladas em
algumas ações, auxiliando os modos de compreensão e potencializando a capacidade para
exercer o cuidado, como já dito, tão essencial ao nosso bem-estar e desenvolvimento humano
criativo. Poderemos, em nossa prática profissional, ampliar nosso olhar para captar a
complexidade nas formas de organização familiar que faz com que cada grupo tenha sua
linguagem própria. Estaremos deste modo, respeitando os valores e culturas de cada família
sem, no entanto, nos ausentarmos do compromisso de oferecer aos seus membros o suporte
necessário para seu crescimento enquanto pessoas plenas. Isto poderá ser feito,
disponibilizando o conhecimento adquirido pelas observações e análises e desenvolvendo
programas que visem o apoio, principalmente, às famílias de baixa renda para que possam se
constituir no lócus que acolha e favoreça o desenvolvimento saudável, pelas suas práticas
educativas e de socialização.
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Espero que as reflexões aqui propostas possam contribuir para outros estudos que
venham a fazer uma comparação mais explícita sobre as vivências de cuidado nas famílias em
várias classes sociais, aprofundando a análise sobre as conseqüências do contexto social sobre
o desenvolvimento dos sujeitos ou como este repercute nas relações intrafamiliares. E, além
disso, buscando respostas para questões do tipo: como as vivências de descuido refletem nas
relações do sujeito com a sociedade mais ampla? Tem a formação acadêmica propiciado aos
estudantes de ciências sociais, principalmente aos de psicologia, uma real compreensão das
idiossincrasias sociais em contínua dialética com as psicológicas?
Creio que estando sensíveis a essas questões poderemos oferecer serviços à sociedade
que atendam a pessoa em sua integralidade, devolvendo-lhe suas potencialidades que se
encontram arrancadas ou desativadas. Quando devolvermos às famílias seu potencial de
exercer o cuidado e seu direito de serem cuidadas, por exemplo, estaremos devolvendo-lhes
algo há muito perdido nas condições em que sobrevivem: o sentido de viver.
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