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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
PROJETO A VEZ DO MESTRE
O LÚDICO COMO FERRAMENTA PEDAGÓGICA
NO DESENVOLVIMENTO DA ALFABETIZAÇÃO
Por: Márcia Aparecida Cardoso Oliveira
Orientadora
Prof. Maria Esther de Araújo Oliveira
Cabeceira Grande-MG
2007
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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES
PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”
PROJETO A VEZ DO MESTRE
O LÚDICO COMO FERRAMENTA PEDAGÓGICA
NO DESENVOLVIMENTO DA ALFABETIZAÇÃO
Apresentação de monografia à Universidade
Candido Mendes como requisito parcial para
obtenção do grau de especialista em Educação
Infantil e Desenvolvimento.
Por: . Márcia Aparecida Cardoso Oliveira.
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AGRADECIMENTOS
A todos que se fizeram
próximos do meu coração: Pais,
irmãos, amigos, para quem eu AMO,
colegas de trabalho e de caminhada.
4
DEDICATÓRIA
Minha família, amigos,
educadores, às oportunidades de
melhorar e crescer.
5
“Ensinar é dispor de um tempo definido
para atingir objetivos.”
Philippe Perrenoud
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RESUMO
As alfabetizações têm sido alvo de grandes discussões por parte dos estudiosos da Educação. As dificuldades encontradas por alunos e professores no processo de alfabetização são muitas e conhecidas. A função primordial da psicoedagogia seria, no caso, propiciar aos alunos caminhos para que eles aprendam, de forma consciente e consistente, os mecanismos de apropriação de conhecimentos. Assim como a de possibilitar que os alunos atuem, criticamente em seu espaço social. No presente trabalho procurou-se abordar a perspectiva do lúdico enquanto recurso essencial e indispensável à alfabetização, pois através da intervenção psicopedagógica do brincar a criança tem a oportunidade de interagir com pessoas e objetos, liberar sua criatividade, explorar seus limites e adquirir repertórios comportamental-afetivos de forma reforçadora e prazerosa. Do que foi dito fica claro, do nosso ponto de vista, que as mudanças necessárias para enfrentar sobre bases novas a alfabetização inicial não se resolvem com um método de ensino, nem com novos testes de prontidão, mas com novos materiais didáticos e psicopedagógicos. Palavras-chave: Brincar, lúdico e alfabetização.
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METODOLOGIA
Os métodos que levam ao problema proposto, será a leitura de livros,
jornais, revistas, pesquisa bibliográfica, documental, bem como o estudo
comparado de autores, assim como a pesquisa via Internet.
O presente estudo estará dividido em cinco etapas, a saber:
1. levantamento do referencial teórico;
2. seleção do referencial teórico apropriado a presente investigação;
3. leitura crítico-analítica do referencial selecionado;
4. organização dos dados levantados e; elaboração do relatório final.
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SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ...........................................................................................
CAPÍTULO I – Alfabetização ......................................................................
1.1 O Lúdico como ferramenta pedagógica no desenvolvimento da
alfabetização ..............................................................................................
CAPÍTULO II – O Mundo do Brinquedo: um compromisso lúdico .............
2.1 A ludicidade no processo de alfabetização ..........................................
CONCLUSÃO ............................................................................................
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ..........................................................
ÍNDICE .......................................................................................................
FOLHA DE AVALIAÇÃO ...........................................................................
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INTRODUÇÃO
Através do processo de alfabetização, o indivíduo perde a sua condição
de ser natural para se tornar ser social e ativo. A alfabetização visa criar
situações básicas para que o educando possa aprender a desenvolver
habilidades que lhe serão exigidas nas etapas subseqüentes da sua formação.
Sem a solução adequada desta questão, as demais atividades educacionais
estarão comprometidas.
Cabe ao educador por meio da intervenção pedagógica propiciar
atividades significativas que levem a uma aprendizagem de sucesso. Para que
isso aconteça é necessário que o professor reflita sua prática pedagógica
percebendo o aluno mais que um mero executor de tarefa, mas alguém que
sente prazer em aprender.
Ensinar exige a convicção de que a mudança é possível e que
contribuirá significativamente para formação de cidadãos que atendam as
demandas do século XXI.
De acordo com FREIRE (1996, p.67) "Saber que deve respeito à
autonomia e identidade do educando exige de mim uma prática em tudo
coerente".
Palavras que levam a refletir sobre a importância de uma prática
pedagógica voltada a valorização e respeito da individualidade do aluno.
Mas a preocupação com uma educação significativa, atualizada e que
respeite o aluno, não começou hoje. Podemos perceber isso claramente
através das palavras de FREINET (1975, p.38) "o professor deve ter
sensibilidade de atualizar a sua prática".
O autor com essas colocações chama o professor a pensar sobre sua
prática visualizando a necessidade de uma constante atualização. Reflexão
essa que o autor e também educador já fazia nos anos vinte do século
passado, propondo uma mudança na escola que considera teórica demais.
Fazendo inclusive sugestões como o uso de: jogos pedagógicos,
trabalho em grupo, aulas passeio, jornal escolar, entre outras.
Defendia ainda a idéia de que a escola deveria ser um lugar bastante
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alegre com atividades prazerosas, como a brincadeira, por exemplo sobre o
qual nos fala WINNICOTT (1975, p32) "A criança brinca para buscar prazer,
para controlar ansiedade, para estabelecer contatos sociais, para realizar a
integração da personalidade, por fim para comunicar-se com as pessoas".
Considerando as palavras do autor, vemos que o ato de brincar para
criança é mais que uma atividade lúdica, representa um meio riquíssimo de
expressão.
E com base no Referencial Curricular Nacional Para Educação Infantil
(1998 V1, p.29). "A intervenção intencional baseada na observação das
brincadeiras das crianças oferecendo-lhe material adequado, assim como
espaço estruturado para brincar permite o enriquecimento das competências
imaginativas, criativas e organizacional”.
Mas para que isso ocorra o professor precisa ter sensibilidade ao intervir
permitindo que as crianças possam elaborar através da brincadeira de forma
pessoal e independente, suas emoções, sentimentos, conhecimentos e regras.
E o brincar é uma das atividades fundamentais da criança. Através da
brincadeira ela fala, elabora seus sentidos, busca compreender o mundo.
De acordo com OLIVEIRA (1995, p.36) "No brinquedo a criança
comporta-se de forma mais avançada do que nas atividades da vida real e
também aprende; objeto e significado". Ou seja, a brincadeira possibilita a ação
com significados, além disso as situações imaginárias fazem com que as
crianças sigam regras, pois cada faz-de-conta supõe comportamentos próprios
da situação, ao brincar com um tijolinho de madeira como se fosse um carrinho
por exemplo, ela se relaciona como o significado em questão (a idéia de carro)
e não com o objeto concreto que tem nas mãos.
O tijolinho de madeira serve como uma representação de uma realidade
ausente ajuda a criança separar objeto e significado.
Para VYGOTSKY (1979, p.45), "A criança aprende muito ao brincar. O
que aparentemente ela faz apenas para distrair-se ou gastar energia é na
realidade uma importante ferramenta para o seu desenvolvimento cognitivo,
emocional, social, psicológico".
Percebemos através das palavras do autor à importância da brincadeira
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na vida da criança e a necessidade que a criança tem de ser respeitada
enquanto brinca, pois seu mundo é mutante e esta em permanente oscilação
entre fantasia e realidade.
E a infância é tempo de brincar, está é uma verdade que não se pode
mudar. Para o adulto, o jogo e a brincadeira são atividades para as horas de
lazer, um passatempo. Para as crianças é algo muito sério, que permite dar
asas a imaginação, permitindo descobrirem a si mesmos e ao mundo.
Se estudarmos a história do jogo, veremos que sua importância foi
reconhecida em todos os tempos, como nos cita PIAGET (1978, p.47) "O
indivíduo, seja criança ou adulto, revive no jogo a maioria das atividades pelas
quais passou a espécie, em sua metódica evolução, durante milênios".
Desse modo vemos a importância do jogo na vida da criança, sendo o
mesmo, uma atividade construída socialmente e culturalmente. É uma forma da
criança entrar em contato com a cultura.
Segundo PIAGET (1978, p.29), "os jogos de regra são: a atividade lúdica
do ser socializado". Ou seja, através dos jogos de regras, a criança assimila a
necessidade de cumprimento das leis da sociedade e das leis morais.
E é principalmente na escola, que a criança começa a incorporar regras
de conduta, a se socializar, entrando em contato com uma aprendizagem mais
sistematizada, mas é preciso que a escola se apresente a criança não como
um bicho papão, mas um lugar prazeroso e importante.
Pois de acordo com KISHIMOTO (1996, p. 134) "O brinquedo, o jogo, o
aspecto lúdico e prazeroso que existem nos processos de ensinar e aprender
não se encaixam nas concepções tradicionalistas da educação".Ou seja, a
escola é um espaço que deve promover o desenvolvimento da criança,
promover uma aprendizagem significativa, mas esta não precisa ser forçada,
pode ocorrer através do prazer e da alegria que os jogos e brincadeiras
proporcionam.
E, ainda, sobre a importância do jogo, VYGOTSKY (1991, p.122), nos
fala:
"É na atividade de jogo que a criança desenvolve o seu conhecimento do mundo adulto e é também nela que surgem os
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primeiros sinais de uma capacidade especificamente humana, a capacidade de imaginar (...). Brincando a criança cria situações fictícias, transformando com algumas ações o significado de alguns objetos".
Desse modo a criança envolve-se em um mundo ilusório no qual todos
os desejos são realizáveis, desenvolvendo através do brinquedo sua
imaginação, onde através da fantasia um simples pedaço de pau transforma-se
de acordo com seu desejo. A criança cria um mundo de papéis e relações
sociais.
A respeito do jogo e das brincadeiras podemos lembrar também as
idéias de FINCK (1995), "os jogos diferenciam-se das brincadeiras livres. As
brincadeiras são atividades lúdicas inteiramente espontâneas. No entanto, os
jogos têm regras".
Destaca ainda que "os jogos favorecem a auto-expressão, desenvolvem
a capacidade física, favorecem a aprendizagem, oferecem atividades físicas
prazerosas".
E assim, os jogos despertam na criança interesse e atração, onde ao
mesmo tempo em que, participam com prazer desfrutam da oportunidade que
eles lhes oferecem para o seu desenvolvimento.
Enfim, através da brincadeira e do jogo, a criança aprende a lidar com o
mundo, formando sua personalidade, vivenciando sentimentos como amor e
medo. No jogo a criança se coloca em movimento num universo simbólico,
projetando-se no mundo ao seu redor.
A escola ao valorizar o lúdico, estendendo-o também ao ato pedagógico,
ajuda às crianças a formarem um bom conceito de mundo, um mundo onde a
afetividade é acolhida, a sociabilidade vivenciada, a criatividade estimulada e
os direitos da criança respeitados.
No presente trabalho procura-se abordar a perspectiva do lúdico
enquanto recurso essencial e indispensável à alfabetização, pois através da
intervenção psicopedagógica do brincar a criança tem a oportunidade de
interagir com pessoas e objetos, liberar sua criatividade, explorar seus limites e
adquirir repertórios comportamental-afetivos de forma reforçadora e prazerosa.
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Assim, acredita-se que no lúdico como ferramenta psicopedagógica na
contribuição do desenvolvimento da alfabetização e para tanto o assunto foi
abordado em dois capítulos distintos onde inicialmente fala-se sobre o
processo de alfabetização e posteriormente sobre o uso do lúdico nesta fase.
A metodologia utilizada para esta pesquisa foi de cunho estritamente
qualitativo, utilizando-se de pesquisas bibliográfica em artigos, livros e
legislações pertinentes ao assunto abordado.
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CAPÍTULO I
ALFABETIZAÇÃO
É recente a tomada de consciência sobre a importância da alfabetização
inicial como a única solução real para o problema da alfabetização remediativa.
Tradicionalmente, a alfabetização inicial é considerada em função da
relação entre o método utilizado e o estado de “maturidade” ou de “prontidão”
da criança. Os dois pólos do processo de aprendizagem (quem ensina e quem
aprende) têm sido caracterizados sem que se leve em conta o terceiro
elemento da relação: a natureza do objeto de conhecimento envolvendo esta
aprendizagem. Tenta-se demonstrar de que maneira este objeto de
conhecimento intervém no processo, não como uma entidade única, mas como
uma tríade: temos, por um lado o sistema de representação alfabético da
linguagem, com suas características específicas; por outro lado, as concepções
que tanto os que aprendem (as crianças) como os que ensinam (os
professores) têm sobre esse objeto.( BRASIL,1998)
Ao se interrogarem sobre o insucesso das escolas na alfabetizarem das
crianças os educadores têm feito, entre outras, estas perguntas: em que
consiste a alfabetização? Qual será o melhor método? O que se deve entender
por prontidão para a leitura?
Começa-se por explicar, de acordo com Lima (1991) o que significa ler
do ponto de vista cognitivo. Segundo a autora,
Pode-se dizer que todas as atividades da criança são “leituras de experiência”, ou seja, quando ela leva um objeto à boca, quando agarra, puxa e encaixa objetos, quando ouve e emita sons, etc., ela está lendo o mundo que a cerca. Toda criança possui um esquema de assimilação que evolui de acordo com a etapa de desenvolvimento que atravessa. Nos primeiros anos ele é mais sensório-motor e simbólico, ou seja, as experiências realizadas pela criança tornam-se essenciais para o seu desenvolvimento cognitivo e, portanto, para a aprendizagem. (LIMA, 1991, p.63)
De acordo com a citação acima a alfabetização deve ser entendida e
compreendida como qualquer processo que se inicie quando a criança pega,
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manipula, ouve, combina e experimenta objetos. E só após tal processo e que
passa-se ao passo seguinte, onde o mesmo consiste na leitura dos signos
gráficos – as palavras. A questão passa a ser a mudança de um código
auditivo/oral para um visual/escrito, isto é, os esquemas de assimilação usados
pela criança tornam-se operatórios.
De modo geral preocupa-se mais com a palavra escrita, em ensinar ler e
escrever. É fundamental, porém compreender que ler e escrever constitui
apenas uma das etapas do desenvolvimento e que, sem uma prévia estrutura
sólida – representada por riqueza de experiências, de vocabulários, dentre
outras, tal etapa será mais difícil de ser alcançada.
Para compreender melhor o processo de alfabetização, faz-se
necessário tomar como exemplo de aquisição da linguagem, as concepções de
Jean Piaget citadas por Lima (1991), onde é mencionado que,
Nesse processo a criança passa dos esquemas de ação sonsório-motora para os das representações cognitivas de uma maneira seqüenciada e natural, determinada pelo seu próprio ritmo. A aquisição da leitura e da escrita deve usar este modelo. Não devemos mitificá-la, nem transforma-la em um penoso ritual de alfabetização nas primeiras séries. Ela deve vir a seu tempo, juntamente com um conjunto de atividades atraentes e necessárias para as crianças nesse período (LIMA, 1991, p.64).
O que ocorre nas práticas pedagógicas, por um lado, é que elas não
concebem a leitura como um processo construtivo e seqüenciado, que
depende da globalidade das ações do sujeito na construção de seu próprio
conhecimento. Em geral a alfabetização é vista como um momento especial de
aquisição de um conhecimento específico, para o qual se volta toda a ação
pedagógica. Por outro lado, não percebendo a seqüência natural desta
assimilação e desconhecendo as etapas do desenvolvimento das crianças, ela
impõe métodos e repetições cansativas que, além de serem inúteis são
pesados para as crianças. (FINCK, 1995)
Entretanto quando a escola apresenta conteúdos seqüenciados e
organizados de acordo com o nível mental da criança e os transmite nas
formas próprias de manifestação de cada nível, leva a mesma a participar de
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maneira intensa e com sucesso das atividades propostas, bem como a utilizar
o conhecimento adquirido no seu dia-a-dia.
Segundo Alves (1994). “Uma criança pode ser alfabetizada antes,
durante e depois dos sete anos”. Existem tempos diferentes para cada criança
ser alfabetizada, isto é de acordo com o desenvolvimento de sua maturidade e
do meio no qual está inserida.
“Segundo o mesmo autor,” do ponto de vista da inteligência, isso não
significa nada qualitativamente. O que importa é que a criança chegue a um
determinado ponto de desenvolvimento, independente do tempo que levou
para alcançá-lo. ’
A maturação é um aspecto intrínseco ao indivíduo e desempenha papel
importante também em seu desenvolvimento cognitivo, uma vez que este se
constitui a partir das transformações ocorridas nos esquemas com os quais a
criança nasce. Já o meio físico é conhecido e conquistado através das
experiências que a criança realiza,. Em relação ao ambiente social, a criança
irá perceber inúmeras situações ocorridas em relação às pessoas, objetos e a
si própria.,o que proporciona a alfabetização.
Fink (1995) diz que “a idade cronológica não é fundamental, ao
contrário, o compromisso fundamental é com a ampliação do campo de ação
da criança, bem como de sua maturidade” entendo que isto, facilitará o seu
processo de alfabetização.
Do ponto de vista da psicologia e da psicopedagogia, segundo Leme,
(1998)
“O processo de alfabetização pode ser entendido através da análise das relações entre os significantes (palavras, desenhos, fotos, etc.) e os significados (objetos)”. Essas relações além de explicar o progressivo distanciamento do objeto feito pela inteligência servirão para os educadores compreenderem os processos de mudança de códigos (LEME, 1998, p.28)
Este desenvolvimento da capacidade que a criança tem de substituir um
objeto, uma ação, situação ou pessoa por símbolos -palavras - o que significa
que a inteligência da criança passa a realizar ações interiorizadas ou mentais:
ela se torna capaz de fazer esta substituição.
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Os indicadores mais claros das explorações que as crianças realizam
para compreender a natureza escrita, na opinião de Ferreiro (1988), são suas
produções espontâneas, entendendo como tal aquelas que não são o resultado
de uma cópia. Quando uma criança escreve tal como acredita que poderia ou
deveria escrever certo conjunto de palavras, está nos oferecendo um
valiosíssimo documento que necessita ser interpretado para poder ser
avaliado. Essas escritas infantis têm sido consideradas, displicentemente,
como garatujas, “puro jogo”, o resultado de fazer “como se” soubesse escrever.
As crianças que fazem a pré-escola recebem esse preparo. A familiaridade com papel e lápis, massinhas e brinquedos de encaixe, quebra-cabeças, canções, narrativas, jogos ajuda a preparar a criança para os saberes e as tarefas envolvidas na alfabetização (LEMLE, 1998, p.13).
Aprender a lê-las é um longo aprendizado que requer uma atitude
teórica definida. Se pesar que a criança aprenda só quando é submetida a um
ensino sistemático, e que a sua ignorância está garantida até que receba tal
tipo de ensino, nada pode-se enxergar. Mas se pensar que as crianças são
seres que ignoram que devem pedir permissão para começar a aprender,
talvez começa-se a aceitar que podem saber, embora não tenha sido dada a
elas a autorização institucional para tanto. Saber algo a respeito de certo objeto
não quer dizer, necessariamente, saber algo socialmente aceito como
“conhecimento”. “Saber” quer dizer ter construído alguma concepção que
explica certo conjunto de fenômenos ou de objetos da realidade. Que esse
“saber” coincida com o “saber” socialmente válido é um outro problema. Uma
criança pode conhecer o nome das letras, e não compreender exaustivamente
o sistema de escrita. Inversamente, outras crianças realizam avanços
substanciais no que diz respeito à compreensão do sistema, sem ter recebido
informação sobre a denominação de letras particulares.
As primeiras escritas infantis aparecem do ponto de vista gráfico, com
linhas onduladas ou quebradas, contínuas ou fragmentadas, ou então uma
série de elementos discretos repetidos. A aparência gráfica não é garantia de
escrita, a menos que se conheçam as condições de produção.
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A primeira coisa que a criança precisa saber é o que representam aqueles risquinhos pretos em uma página branca. Por isso é necessário entender o que são símbolos. (...) Esses exemplos de símbolos de uso comum em nossa vida servem para ilustrar a idéia de que a relação entre um símbolo e a coisa que ele simboliza é inteiramente arbitrária, ou seja a razão da forma de um símbolo não está nas características da coisa simbolizada. (...) As letras, para quem ainda não alfabetizou, são risquinhos pretos na página branca. O aprendiz precisa ser capaz de entender que cada um daqueles risquinhos vale como símbolos e um som da fala. (...) As letras do alfabeto têm formas bastante semelhantes o que exige refinamento na percepção (LEMLE, 1998, p.07).
O modo tradicional de se considerar a escrita infantil consiste em se
prestar atenção apenas nos aspectos gráficos dessas produções, ignorando os
aspectos construtivos.
Os aspectos gráficos têm a ver com a qualidade do traço, a distribuição espacial das formas, a orientação predominante, a orientação dos caracteres individuais. Os aspectos construtivos têm a ver com o que se quis representar e os meios utilizados para criar diferenciações entre as representações (FERREIRO, 1988, p.18).
Ainda seguindo a colocação de Ferreiro (1988), do ponto de vista
construtivo, a escrita infantil segue uma linha de evolução surpreendentemente
regular, através de diversos meios culturais, de diversas situações educativas e
de diversas línguas. Aí, podem ser distinguidos três grandes períodos no
interior dos quais cabem múltiplas subdivisões: a primeira distinção está entre o
modo de representação icônico e não icônico; a segunda, compreende a
construção de formas de diferenciação e; a terceira engloba a fonetização da
escrita. Todo sistema alfabético de escrita tem uma característica essencial: os
segmentos gráficos representam segmentos de som. (LEMLE, 1998)
Quem já tentou ensinar alguém a ler e a escrever certamente teve a
experiência de testemunhar um salto repentino no progresso do aprendiz. Há
um dado momento em que parece ocorrer um verdadeiro estalo, após o que a
pessoa faz rápidos progressos. O estalo ocorre quando o aprendiz capta a
idéia de que cada letra é símbolo de um som e cada som é simbolizado por
uma letra.\As coisas que acontecem entre sons e letras são um pouco mais
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complicadas do que essa perfeição de casamento monogâmico entre uma letra
e som.
O casamento entre sons e letras nem sempre é monogâmico. O modelo Ideal é o de que cada letra corresponda a um som e cada som a uma letra, mas essa relação ideal só se realiza em poucos casos. Temos em português pouquíssimos casos de correspondência biunívoca entre sons da fala e letras do alfabeto. Correspondência biunívoca é aquela em que um elemento de um conjunto corresponde a apenas um elemento do outro conjunto, é de um para um a correspondência entre os elementos, em ambas as direções. Da classificação feita a partir dos três diferentes tipos de acoplamento entre sons e letras em nosso sistema de escrita, podemos estabelecer objetivamente em critério pratico para avaliar os erros de escrita e de leitura cometidos pelo alfabetizando. Diagnosticar com bastante precisão em que etapa do processo de aquisição o aluno se encontra (LEMLE, 1998, p.16-30).
É de fundamental importância que o professor saiba diagnosticar e
avaliar as falhas de escrita cometidas por seus alunos. O professor deve cobrar
do aluno tarefas compatíveis com a etapa de saber atingida. Até mesmo,
tarefas que exigem a leitura das frases do enunciado da questão são
prematuras, em casos de alunos que apresentam erros de primeira ordem.
Tarefas como fornecer sinônimos ou antônimos, são prematuras para um aluno
que esta percorrendo o primeiro patamar do saber da escrita. Pra essas
tarefas, o estágio adequado é o do segundo patamar. A introdução de tarefas
prematuras só servira para retardar o progresso do aluno.
Há, basicamente, dois métodos possíveis oficialmente reconhecidos para conduzir o trabalho da alfabetização: mostrar primeiro as letras e ensinar as suas correspondências com sons e depois ensinar a compor com elas as silabas e as palavras; ou mostrar primeiro palavras – ou frases - e ensinar a identificar nelas as unidades componentes – as letras – e os sons que lhes correspondem.O método sintético consiste em sintetizar seqüências, dados os átomos componentes. Recitação do be-a-bá. O método analítico se parte das seqüências completas, sendo a tarefa analisá-las e identificar os átomos. Os dois métodos são caminhos diferentes para conduzir o alfabetizando a construir a primeira etapa do conhecimento do sistema ortográfico: a etapa da hipótese da monogamia (FERREIRO, 1989, p.52).
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Segundo Lemle (1998) há quem creia que a analise do percurso
cognitivo do alfabetizando seja bem outra: ele aprenderia globalmente, das
relações entre imagens gráficas, imagens fônicas e sentidas, em bloco.
Animais aprendem assim. Quem de fato aprendeu a ler e a escrever é capaz
de ler coisas que nunca leu e de escrever coisas que nunca escreveu. Ainda,
segundo a mesma autora, há observações que parecem favorecer a hipótese
de que a aprendizagem da leitura dá-se pela captação de um bloco não
direcional e indiviso de relação entre letras, sons e sentidos. Primeiro, porque
certas crianças mostram-se capazes de ler por adivinhação; segundo, porque
adultos lêem por saltos, captando a informação em blocos, inferindo muito e
soletrando pouco.
Tradicionalmente, as discussões sobre a prática alfabetizadora têm se
centrado na polêmica sobre os métodos utilizados: métodos analíticos versus
sintéticos; fonético versus global, dentre muitos outros. Nenhuma dessas
discussões levou em conta o que agora se conhece: as concepções das
crianças sobre o sistema de escrita. Daí a necessidade imperiosa de recolocar
a discussão sobre novas bases.
De acordo com a concepção de Ferreiro (1988)
“O método não pode criar conhecimento. Ao aceitar que a criança não é uma tábua rasa onde se inscrevem as letras e as palavras segundo determinado método; se aceitarmos que o ‘fácil’ e o ‘difícil’ não podem ser definidos a partir da perspectiva do adulto, mas da de quem aprende; se aceitarmos que qualquer informação deve ser assinalada para ser operante, então deveríamos também aceitar que os métodos não oferecem mais do que sugestões, incitações, quando não práticas rituais ou conjunto de proibições”(FERREIRO,1988,p.38).
A compreensão dos problemas tal como as crianças os colocam, e da
seqüência de soluções que elas consideram aceitáveis, é, sem dúvida,
essencial para poder ao menos imaginar um tipo de intervenção adequada à
natureza do processo real de aprendizagem. Mas reduzir esta intervenção ao
que tradicionalmente denominou-se “o método utilizado” é limitar demais nossa
indagação.
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De acordo com Ferreiro (1988, p. 31),
é útil se perguntar através de que tipo de práticas a criança é introduzida na língua escrita, e como se apresenta este objeto no contexto escolar”. Há práticas que levam a criança à convicção de que o conhecimento é algo que os outros possuem e que só se pode obter da boca dos outros, sem nunca ser participante na construção do conhecimento. Há práticas que levam a pensar que “o que existe para se conhecer” já foi estabelecido, como um conjunto de coisas fechado, sagrado, imutável e não-modificável. Há práticas que levam a que o sujeito fique de “fora” do conhecimento, como espectador passivo ou receptor mecânico, sem nunca encontrar respostas aos “porquês” e aos “para quês” que já nem sequer se atreve a formular em voz alta.
Nenhuma prática pedagógica é neutra. Todas estão apoiadas em certo
modo de conceber o processo de aprendizagem e o objeto dessa
aprendizagem. São provavelmente essas práticas que têm efeitos mais
duráveis em longo prazo, no domínio da língua escrita como em todos os
outros. Conforme se coloque a relação entre o sujeito e o objeto de
conhecimento, e conforme se caracterize a ambos, certas práticas aparecerão
como “normais” ou como “aberrantes”. É aqui que a reflexão psicopedagógica
necessita se apoiar em uma reflexão epistemológica.
Em diferentes experiências que tivemos com profissionais de ensino aparecem três dificuldades principais que precisam ser inicialmente colocadas: em primeiro lugar, a visão que um adulto, já alfabetizado, tem do sistema de escrita; em segundo lugar, a confusão entre escrever e desenhar letras; finalmente, a redução do conhecimento do leitor ao conhecimento das letras e seu valor convencional (FERREIRO, 1988, p.30).
De acordo com pressupostos já existentes em psicologia, não há forma
de recuperar por introspecção a visão do sistema de escrita que tivemos
quando éramos analfabetos. Somente o conhecimento da evolução
psicogenética pode nos obrigar a abandonar uma visão adultocêntrica do
processo.
Por outro lado, a confusão entre escrever e desenhar letras é
relativamente difícil de esclarecer, porque se apóia em uma visão do processo
de aprendizagem segundo a qual a cópia e a repetição dos modelos
apresentados são os procedimentos principais para se obter bons resultados. A
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análise detalhada de algumas das muitas crianças que são ‘copistas’
experientes “mas não compreendem o modo de construção do que copiam é o
melhor recurso para problematizar a origem desta confusão entre escrever e
desenhar letras”. (FERREIRO, 2001, p.32)
1.1 O lúdico como ferramenta pedagógica no desenvolvimento
da alfabetização
Repensar a prática pedagógica a partir do movimento como instrumento
lúdico no processo de alfabetização, buscando a valorização da criança e a
formação de sua cidadania, é um papel, sem dúvida, fundamental para a
aprendizagem da leitura e da escrita, permitindo o desenvolvimento da
iniciativa, da imaginação, da criatividade e do interesse.
Nesta perspectiva, existe necessidade de atualização dos professores
alfabetizadores a fim de proporcionar uma ação interdisciplinar facilitadora de
vivências lúdico-pedagógicas, imprescindível ao desenvolvimento dos alunos,
contemplando, assim, o caráter lúdico do movimento humano como fonte de
prazer e alegria, no ambiente escolar e, em especial, no processo de
desenvolvimento da alfabetização.
A desvalorização do movimento natural e espontâneo da criança em prol
do conhecimento formalizado expulsa o brinquedo e a ludicidade do espaço de
liberdade e exigências da cidadania, ignorando-se as dimensões educativas da
brincadeira e do jogo como forma de atividade particularmente poderosa para
estimular a vida social e a atividade construtiva da criança.
O jogo é um elo integrador entre os aspectos motores, cognitivos,
afetivos e sociais. Por isso, partimos do pressuposto de que é brincando e
jogando que a criança ordena o mundo a sua volta, assimilando experiências e
informações e, sobretudo, incorporando atividades, atitudes e valores.
(FERREIRO, 2001, p.30)
Toda a postura em relação à aprendizagem infantil vai depender do
conhecimento acerca do movimento do homem na história, não se podendo
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perder de vista o desenvolvimento humano (seu processo de auto e sócio-
realização) historicamente contextualizado.
Para compreender a educação pelo corpo em movimento, necessita-se
de uma visão geral das características do processo de desenvolvimento infantil.
Entender esse processo significa entender a amplitude das estruturas de
natureza motora, cognitiva, social e afetiva, inter-relacionando o movimento
corporal aos jogos e brinquedos das crianças.
Cunha (1998), por sua vez, coloca que "brincando a criança
experimenta, descobre, inventa, exercita e confere suas habilidades" (p. 9).
Acrescenta ainda que brincar é um dom natural que contribuirá no futuro para o
equilíbrio do adulto, pois o ato de brincar é indispensável à saúde física,
emocional e intelectual da criança.
O ato motor faz parte do movimento que começa a existir na vida fetal e,
originado do mais profundo do ser, vai se propagar no espaço exterior através
do ato voluntário, logo nos primeiros meses de vida da criança. Com ele, tem
origem o jogo, ou seja, investimento na ação. Então, "pegar" não é mais
receber, é a primeira manifestação de um ser que se afirma como sujeito.
Já é a escolha, o nascimento de um pensamento consciente, não
formulado, mas expresso no ato. É a descoberta de um poder sobre os objetos,
sobre o mundo, sobre o outro. A criança descobre o prazer de brincar com
suas mãos, com seus pés, depois com todos os seus outros segmentos. É o
prazer de viver o seu corpo que é essencialmente prazer do movimento em si
mesmo, sem outra finalidade. É a aprendizagem progressiva de "domínio do
corpo" através do jogo corporal, onde o movimento acompanha as diferentes
organizações funcionais, um denominador comum a todas as formas de
inteligência.
Wallon (1986, p.33) destaca essas formas de inteligência como: "a
inteligência expressiva-direção social-próxica" explicitando que "... as funções
de expressão precedem de longe às de realização". Assim segue situando a
"inteligência prática-direção física-próxica. Nesta perspectiva diz ““... o efeito
favorável desencadeia a repetição do gesto nocivo" (Wallon, 1986, p.53).
24
Como se observa a inteligência prática que já trabalha com o ato motor e
perspectivo já utiliza recursos da representação, mas igualmente já processa a
confecção, para a instalação da inteligência teórica.
Esta última inteligência pontuada por Wallon (1986) não aparece
estanque, mas é fruto da transição da inteligência prática para a teórica sendo
esta uma conquista intelectual importante do ser humano. Nesta etapa, volta-se
à atividade intelectual abstrata, que supera o movimento motor, interage com o
meio pela representação, ou pelo ato mental simbólico e conceitual. Supera a
ação motora pela ação mental. A criança vive um intenso processo de
desenvolvimento. Nela se expressa a própria natureza e, a cada instante, surge
uma nova função.
Ao entrarem em ação, essas funções impelem a criança a buscar o tipo
de atividade que lhe permita manifestar-se de forma mais completa. A primeira
atividade é brincar e é através desse brincar, que ela desperta para o mundo,
sendo o começo de uma série de outras atividades que se desencadeiam à
medida que se tornam ação, levando-a a descobrir novas formas de
aprendizagem, numa dialética permanente entre o eu e o mundo.
O movimento para a criança é a sua realidade imediata e espontânea
pela forma como experimenta as coisas e lhes dá vida própria. O domínio do
corpo e a conquista sensorial e intelectual do espaço estabelecem-se a partir
do momento em que são facilitadas as oportunidades de iniciativa através de
múltiplas experiências de movimento nos diversos locais em que se encontra.
Esta possibilidade de a criança poder perceber, programar e realizar ações
favorece a aquisição de aprendizagens básicas, importantes para o seu
desenvolvimento corporal e para a sua adaptabilidade social.
Os jogos podem contribuir significativamente para o processo de
construção do conhecimento da criança como mediadores das aprendizagens
significativas. Vários estudos a esse respeito vêm comprovar que o jogo, além
de ser uma fonte de prazer e descoberta para a criança, é a tradução do
contexto sócio-cultural-histórico refletido na cultura (experiências). Nesta
perspectiva, ele tem muito a contribuir com as atividades didático-pedagógicas
durante o desenvolvimento de qualquer aula. Porém, a contribuição do jogo
25
para o desenvolvimento das atividades pedagógicas, vai depender da
concepção que se tem de jogo, de criança, de aprendizagem e
desenvolvimento.
Winnicott (1975), Vygotsky (1987), Piaget (1994), Wallon (1986) e outros
estudiosos procuraram interpretar e classificar o jogo, assumindo várias
posições a respeito de sua importância e significado no processo de
desenvolvimento e aprendizagem da criança. Winnicott (1975,p.63),
psicanalista inglês, estudioso do crescimento e desenvolvimento infantil,
considera que,
(...) o ato de brincar é mais que a simples satisfação de desejos. O brincar é o fazer em si, um fazer que requer tempo e espaço próprios; um fazer que se constitui de experiências culturais, que é universal e próprio da saúde, porque facilita o crescimento, conduz aos relacionamentos grupais, podendo ser uma forma de comunicação consigo mesmo (a criança) e com os outros.
Analisando a concepção acima, podemos dizer que no ato de brincar,
tanto o adulto quanto a criança estão plenamente libertos para a criação. E é
através da criatividade, que o indivíduo torna-se pleno e sincronizado com a
vida, dando valor a esta, percebendo suas potencialidades, além da
importância das trocas interindividuais. A palavra jogo pode, pois, ter uma
gama de sentidos como divertimento, distração, passatempo.
Também Vygotsky (1988, p. 94), ao enfatizar o jogo, atribui relevante
papel ao ato de brincar na constituição do pensamento infantil. Explicita que,
a criança, através da brincadeira, reproduz o discurso externo e o internaliza, construindo seu próprio pensamento. A linguagem tem importante papel no desenvolvimento cognitivo da criança à medida que sistematiza suas experiências e ainda colabora na organização dos processos em andamento.
A ludicidade e a aprendizagem não podem ser consideradas como
ações com objetivos distintos. O jogo e a brincadeira são por si só uma
situação de aprendizagem. As regras e a imaginação favorecem à criança
comportamentos além dos habituais.
26
Wallon (1986, p.53), psicólogo francês, destaca que o jogo se confunde
muito com toda atividade global da criança, ainda que este seja espontâneo e
não receba seus objetivos das disciplinas educativas. Diz que os jogos das
crianças estão divididos em: puramente funcionais; de ficção; de aquisição, e
de fabricação.
• Os jogos puramente funcionais relacionam-se a uma atividade que
busca efeitos: mover os dedos, tocar objetos, produzir ruídos e sons,
dobrar os braços ou as pernas. São jogos elementares.
• Os jogos de ficção consistem em atividades cuja interpretação é mais
ampla, mas também mais próxima a certas definições mais
diferenciadas: o jogo de bonecas, de cavalo de pau etc.
• Os jogos de aquisição se relacionam com a capacidade de olhar,
escutar e realizar esforços para perceber e compreender: perceber e
compreender relatos, canções, coisas e seres, imagens etc.
• Os jogos de fabricação se resumem em agrupar objetos, combiná-los,
modificá-los, transformá-los e criar outros novos.
Ainda na concepção de jogo, aponta-se Piaget (1994, p.18-42), que
descreve quatro estruturas básicas de jogos infantis, que vão se sucedendo e
se sobrepondo. Destaca em síntese que o jogo é uma forma de atividade
particularmente poderosa para estimular a vida social e a atividade construtiva
da criança. Sendo assim, apresenta uma classificação que segue a presente
ordem:
• Jogo de exercício: simples prazer funcional, ou pelo prazer produzido
pela tomada de consciência de suas novas capacidades;
27
• Jogo simbólico: representação de um objeto ausente ou de simulação
funcional. O interesse está centrado nas realidades simbolizadas, e o
símbolo serve simplesmente para evocá-las;
• Jogo de construção: dos quatro aos sete anos as crianças fazem
reproduções exatas, e seus símbolos se tornam cada vez mais
imitativos; por esse motivo, o jogo simbólico se integra ao exercício
sensório-motor ou intelectual e se transforma, em parte, em jogo de
construção;
• Jogo de regras: combinações sensório-motoras ou intelectuais de
competência dos indivíduos e reguladas por um código transmitido de
geração em geração, ou por acordos improvisados. A importância do
jogo de regras surge quando aprendemos a lidar com a delimitação, no
espaço, no tempo, no tipo de movimento válido, na utilização dos
objetos e do corpo. É o que pode e o que não pode, é o que garante
certa regularidade e, portanto, organiza a ação (torna a ação orgânica).
Para Wallon (1986) a compreensão infantil é tão-somente uma
simulação que vai do outro a si mesmo e de si mesmo ao outro. A imitação
como instrumento dessa fusão representa uma ambivalência que explica certos
contrastes nos quais o jogo encontra alimento.
28
CAPÍTULO II
O MUNDO DO BRINQUEDO: UM COMPROMISSO LÚDICO
Quando se fala em brincar, duas idéias surgem facilmente em nossa
mente. A primeira refere-se à criança; e a segunda, a uma atividade rotulada
como "nada séria". Ninguém põe em dúvida que brincar não só faz parte da
vida da criança, mas é a própria criança. Quando se olha para uma criança e
quando escuta-se seus raciocínios ou observa-se seus comportamentos, pode-
se notar que toda sua vida é iluminada pelo lúdico.
Brinquedo e criança são duas coisas inseparáveis. Uma criança normal
brinca. Uma criança que não brinca é considerada patológica. Brincar é uma
atividade lúdica criativa. No brinquedo, entra em ação a fantasia. O indivíduo -
criança ou adulto - ao brincar, transforma a realidade e a realidade o
transforma; cria personagens e mundos de ilusão, coloca-se diante do risco, do
imprevisto, do suspense.
Não há necessidade do resultado a alcançar. Existem apenas
expectativas, pode dar certo como pode dar errado. É esse o dinamismo do
lúdico, que não pode ser identificado com determinadas atividades, mas, sim,
entendido como uma atitude, uma mentalidade ou uma intencionalidade.
Brincar com o corpo é descobri-lo e, portanto, descobrir a si mesmo. A auto-
descoberta se desenvolve a partir da percepção de suas possibilidades e
limitações.
Para Machado (1994)
“Mesmo na mais tenra idade, a criança busca significados, procura dar um sentido à sua existência, ao mesmo tempo em que, integra, aos poucos, sua personalidade, desenvolvendo o sentimento de estar dentro do próprio corpo, sentimento esse que vai surgindo com os cuidados corporais dispensados a ela.”(MACHADO,1994,p.12)
29
Entendo que a forma de cuidar da criança é fundamental: como os
adultos cuidaram dela quando pequena deste a sua alimentação até as formas
de brincar vai determinar sua atitude em relação ao seu corpo.
O brinquedo caracteriza-se, ainda, pela presença do outro. Brincar é
estar junto com o outro. É sentir o gesto, o olhar, o calor do companheiro. O
brinquedo aproxima as pessoas, torna-as amigas, porque brincar significa
sentir-se feliz, é descobrir o mundo que as cerca, socializar-se. Brincando e
jogando, a criança reproduz as suas vivências, transformando o real de acordo
com seus desejos e interesses. No brinquedo, a criança assimila e constrói a
sua realidade. Então, se os adultos estiverem em sintonia, sensibilizados,
olhando a criança como uma pessoa em crescimento, seu afeto e respeito
prevalecerão, e esse clima sentido por ela também prevalecerá. E esse será
um bom começo.
Pensando assim, podemos afirmar que a ludicidade deve permear o
espaço escolar a fim de transformá-lo num espaço de descobertas, de
imaginação, de criatividade, enfim, num lugar onde as crianças sintam prazer
pelo ato de conhecer.
É através da busca, da descoberta e da apropriação do mundo que os seres humanos inventam e reinventam palavras, atos, ações, objetos, leis e normas. Os brinquedos, historicamente, são criados e recriados pelo homem. E a criança que é um ser em pleno processo de apropriação da cultura elaborada historicamente, precisa participar deles de uma forma espontânea e criativa. Só assim elas serão curiosas, críticas, confiantes e participativas, na resolução de problemas relacionados ao conhecimento necessário para se apropriar do mundo da cultura civilizatória (SANTOS, 1998, p.58).
Daí, a necessidade de o professor ampliar cada vez mais as vivências
da criança com o ambiente físico, com brinquedos, brincadeiras e com outras
crianças, permitindo que ela aprenda com seu corpo em movimento, num
espaço de liberdade, despertando nessa criança a paixão de conhecer e o
prazer de descobrir o mundo, interligando a ética e o conhecimento necessário
para viver este novo milênio.
Alves (1994, p.26), diz que o jogo traz a visão do futuro. "O jogo tem a
visão do futuro em primeiro lugar porque seu espírito criativo está nas origens
30
da humanização. Em segundo lugar porque ele está vinculado à criança e ao
espírito infantil". O jogo, entendido sob a ótica do brinquedo e da criatividade,
terá maior espaço para ser entendido como educação na medida em que
busca desenvolver as capacidades inventivas e conduz à convivência fraterna.
Brincar é educar-se pela criação e pela convivência.
2.1 A ludicidade no processo de alfabetização
Só será possível ensinar e aprender prazerosamente quando
compreendermos melhor nossas crianças. Antes de freqüentar a escola, elas
vivem o seu mundo real. O desejo ou a paixão de conhecer tudo em volta de si
faz de seus movimentos e brincadeiras, seu mais sério meio de apropriar-se do
mundo e de comunicar-se com ele. Porém, ao chegar à escola, a criança
encontra uma realidade diferente da sua, a qual anula tudo aquilo que
representa sua forma de viver, compreender e apropriar-se de seu contexto
sócio-cultural.
Através da ludicidade, pode-se devolver à criança a liberdade de brincar,
de ser criativa, mas isso supõe olhar de outro modo, apegar-se de outra
maneira, isto é, fugir dos tributos da eficácia, do formal e arriscar-nos na
escolha de outros caminhos, nos quais o medo de errar seja substituído pelo
prazer e a alegria de criar.
O corpo em movimento, na sua agitação emocional e criativa, não é
admitido na escola, senão durante o recreio. É a vida por muito tempo
controlada que explode. Essa vida, esse movimento, parece ser a única
expressão verdadeira da criança, pois, segundo ensina Lapierre (1986, p.29):
Esse movimento perpétuo através do qual a criança se exprime, numa busca permanente de relação com os objetos e com os outros, essa necessidade irreprimível tem uma significação, uma razão de ser, uma finalidade na evolução desse movimento, não num plano neuro-motor ou cognitivo, mas no plano simbólico do movimento vivenciado das quais a compreensão, a evolução e a exploração constituem a essência mesma de nossa ação educativa.
31
Apesar de as teorias defenderem uma aprendizagem através dos jogos
e dos movimentos espontâneos da criança, ela está longe de usufruir de uma
pedagogia fundamentada na ludicidade, criatividade e na expressividade livre
de seus atos. Poucas são as instituições de ensino que respeitam o processo
natural de desenvolvimento das crianças. Na maioria das escolas, o corpo
infantil é apenas um "objeto" que deve ser transformado em "produto útil" para
o nosso mercado de trabalho. A visão utilitarista do ensino priva a criança do
seu mundo.
Ao entrar para a escola ela deixa de ser criança e passa a conviver com
um mundo totalmente diferente do seu. A metodologia da maioria das escolas é
baseada na disciplina rígida e nas normas e regras do mundo dos adultos. De
uma maneira brusca, a criança se desliga do seu cotidiano e é introduzida num
ambiente onde prevalece o poder do adulto, porque a fantasia, a alegria, a
curiosidade e a espontaneidade são trocadas por um amontoado de ordens e
exercícios rotineiros e atividades desinteressantes.
A rotina da escola é repetitiva, monótona e muitas vezes estressante.
Para que as aulas se tornem mais atraentes, precisamos mudar a nossa
postura em relação às crianças. Pensar a criança como um adulto em miniatura
é um equívoco. Esta precisa falar, correr, saltar, jogar, brincar, rir, sorrir, fazer,
para mais tarde compreender melhor o seu contexto sociocultural.
Ensinar com alegria é o que nos propõe Rubem Alves. É preciso, apesar
de todas as adversidades, criarem no interior da sala de aula um ambiente de
prazer, de alegria, de busca, de troca. Propor atividades que realmente
despertem na criança a paixão de conhecer e o prazer de aprender. A criança
é uma libélula, que sonha um dia transformar-se em uma linda borboleta. Se
ela não conseguir alçar todos os seus vôos, podemos, pelo menos, contribuir
para que ela seja um adulto feliz. O professor não tem o poder de transformar o
mundo, mas tem o poder da palavra e ela pode contribuir muito para a
formação total dos seus alunos.
Alves (1994), em seu livro Alegria de ensinar, ensina que, desde que
nascemos, somos transformados pela palavra. Ele fala da estória do príncipe
que, de tanto ouvir que ia virar sapo, acabou enfeitiçado e virou um sapo. E é
32
isto que nós, professores, fazemos com os nossos alunos. Feitiço existe.
"Feitiço é quando uma palavra entra no corpo e o transforma. O príncipe ficou
possuído pela palavra que a bruxa falou. Seu corpo ficou igual à palavra"
(ALVES, 1994, p.33). Essa metáfora pode ilustrar o nosso papel de professor.
Diz ainda Rubem Alves, que a estória do príncipe que virou sapo é a nossa
própria estória. É através da palavra que sofremos as transformações desde
que nascemos, e o corpo vira outra coisa, diferente do que era. "Educação é
isto: o processo pelo quais os nossos corpos vão ficando iguais às palavras
que nos ensinam. Eu não sou eu: eu sou a palavra que os outros plantaram em
mim" (ALVES, 1994, p.33-34).
Analisando a concepção acima, podemos afirmar que o sucesso
pedagógico vai depender da postura do professor. O seu papel como mediador
do processo nas atividades didático-pedagógicas vai contribuir ou não para
uma aprendizagem rica e significativa. Temos que repensar o papel do
educador na formação do homem no contexto atual. Precisamos formar mais
"príncipes e menos sapos". Apesar de estarmos vivendo uma nova era
tecnológica, a criança não é gente grande. Ela continua a ser criança. Ela
necessita de brincar com as coisas do mundo adulto, fazer-de-conta, fantasiar,
jogar, mexer e revirar esse mundo que fizeram para ela. A criança precisa jogar
com todas as possibilidades de vivências a sua volta para que, mais tarde,
além de deter o conhecimento necessário para a sua sobrevivência, ela seja
realmente aquilo que deseja ser.
Lapierre (1986, p.85) ressalta que,
Quando a criança reencontra ou conserva o dinamismo de sua pessoa, de seu ser, quando assume realmente a autonomia do seu desejo, torna-se surpreendentemente disponível. Ela integra rapidamente uma grande quantidade de conhecimentos sob a condição de que se forneçam alimentos ao seu desejo de conhecer e de fazer, sob condição, sobretudo, de que não a encerremos na estreita obrigação de um saber selecionado, atomizado, uniformizado e cronologicamente programado.
Analisando esta concepção, pode-se afirmar que a criança aprende
melhor quando levamos em conta o que ela quer saber, ou seja, quando lhe
33
proporcionamos o tempo e lhe fornecemos possibilidades de criar seus
próprios processos de pensamento e ajustá-los progressivamente à realidade
e, ainda, ter a clareza, enquanto educador, que são as intenções que
determinam a cada instante um trabalho pedagógico autêntico e não os
métodos, os procedimentos e as técnicas preestabelecidas. É preciso, ainda,
que estas intenções estejam em estreita relação com a prática pedagógica que
elas sustentam. É somente assim que a criança poderá assumir seu desejo de
ser e querer saber-fazer, num espaço onde predomine a liberdade de
expressão, a criatividade e a ludicidade, em prol de um processo de
desenvolvimento mais real, baseado na autenticidade e de um saber-viver
significativo.
Os jogos, enquanto contribuição ao processo de alfabetização, auxilia e
muito na educação integral do indivíduo, pois podem dar conta de uma reflexão
sócio-histórica do movimento humano, oportunizando à criança investigar e
problematizar as práticas corporais lúdicas, advindas das mais diversas
manifestações culturais e presentes no seu cotidiano, tematizando-as para
melhor compreensão. Entendemos que é possível criar na sala de aula um
ambiente favorável ao processo de desenvolvimento e aprendizagem das
crianças.
Para tanto, será necessário explorar a expressão livre e criadora das
próprias atividades das crianças, para alcançar os objetivos propostos. Neste
sentido, o grande desafio é alfabetizar a criança a partir do seu próprio
cotidiano, sem deixar de lado a aprendizagem social (conhecimento elaborado
historicamente), respeitando seu processo global de desenvolvimento.
Negrine (1994, p.20), em estudos realizados sobre aprendizagem e
desenvolvimento infantil, afirma que "quando a criança chega à escola, traz
consigo toda uma pré-história, construída a partir de suas vivências, grande
parte delas através da atividade lúdica". Segundo esse autor, é fundamental
que os professores tenham conhecimento do saber que a criança construiu na
interação com o ambiente familiar e socio-cultural, para formular sua proposta
pedagógica.
34
Nesta perspectiva, entendemos que o professor alfabetizador deverá
contemplar a brincadeira como princípio norteador das atividades didático-
pedagógicas, possibilitando às manifestações corporais encontrarem
significado pela ludicidade presente na relação que as crianças mantêm com o
mundo.
Incorporar a dimensão lúdica da cultura infantil, numa perspectiva
antropológica e sociocultural, que compreenda as brincadeiras e os jogos como
uma atividade social aprendida nas interações humanas, desde a mais tenra
idade, é resgatar o caráter lúdico do movimento humano (apropriação e
construção do conhecimento) em prol de um saber-viver significativo, tão
almejado por nós educadores. O jogo é elemento mediador da aprendizagem e
desenvolvimento humano e a educação pelo movimento é parte fundante
desse processo e, especialmente neste caso, da alfabetização.
As dificuldades encontradas por alunos e professores no processo
ensino-aprendizagem são muitas e conhecidas. Por um lado, o aluno não
consegue entender o que a escola lhe ensina, em síntese, não consegue
efetivamente ter acesso a esse saber de fundamental importância.
O professor, por outro lado, consciente de que não consegue alcançar
resultados satisfatórios junto a seus alunos e tendo dificuldades de, por si só,
repensar satisfatoriamente seu fazer pedagógico procura novos elementos -
muitas vezes, meras receitas de como ensinar determinados conteúdos - que,
acredita, possam melhorar este quadro. Uma evidência disso é, positivamente,
a participação cada vez mais crescente de professores nos encontros,
conferências ou cursos.
Percebe-se atualmente, um grande interesse dos professores pelos
materiais didáticos lúdicos e pelos jogos, mas, os professores nem sempre tem
clareza das razões fundamentais pelas quais, materiais lúdicos ou jogos são
importantes para o ensino-aprendizagem e, normalmente são necessários, e
em que momento deva ser usado.
Geralmente costuma-se justificar a importância desses elementos
apenas pelo caráter "motivador" ou pelo fato de se ter "ouvido falar" que o
35
ensino deva partir do concreto ou, ainda, porque através deles as aulas ficam
mais alegres e os alunos passam render mais.
Neste trabalho procurou-se abordar a perspectiva do brincar enquanto
recurso essencial e indispensável à educação, pois no brincar a criança tem a
oportunidade de interagir com pessoas e objetos, liberar sua criatividade,
explorar seus limites e adquirir repertórios comportamentais / afetivos de forma
reforçadora e prazerosa.
As crianças são, em geral, capazes de manejar situações psicológicas
aversivas através do brincar. Através do brincar e das brincadeiras, a criança
restabelece seu controle interior, sua auto-estima e desenvolve relações de
confiança consigo mesma e com os outros.
Os jogos de faz-de-conta, ricos em fantasias imaginativas, em especial
no que diz respeito aos super-heróis, são seres que apresentam interessantes
características: bondade, sabedoria, coragem, força; solucionam qualquer
problema; são líderes e guias para as pessoas e não recebem ordem de
ninguém; nunca se enganam, não estão sujeitos à dúvidas, frustrações e
fraquezas como a maioria das pessoas. São aprovados e reconhecidos pelos
adultos e todos querem ser seus amigos.
Em suma, é brincando que a criança mergulha na vida, podendo ajustar-
se às expectativas sociais, familiares e educacionais. Não se pode esquecer
que a auto-estima pode modificar-se significativamente, ser fortalecida e
através de experiências emocional-cognitivas que o brincar oferece e, assim as
crianças podem se beneficiar para seu crescimento pessoal.
36
CONCLUSÃO
Falar sobre alfabetização é abordar um assunto que, em maior ou menor
proporção, interessa a uma vasta gama de profissionais em educação.
Tradicionalmente, ou até em um passado próximo, a competência de gerir a
tarefa de alfabetizar crianças cabia, de modo inquestionável às escolas
normais – atuais cursos de magistérios – ou às faculdades de pedagogia.
Contudo, a chamada “democratização do ensino” desencadeada com o
governo da revolução na década de 60 deu lugar ao surgimento de um
fenômeno comumente designado por “fracasso de ensino”, que avultou de
forma mais acentuada nas classes de alfabetização.
Ora, como isso poderia acontecer? Teria a proposta de educação algo
errado em si mesma?
O que ocorreu é que, enquanto somente a elite tinha acesso às escolas,
as crianças, na sua maioria, aprendiam a ler e a escrever sem maiores
dificuldades, nos prazos previstos pelos sistemas educacionais. Mas assim que
a escola passou a ser povoada por crianças de classes menos oriundas,
passou-se a verificar o fenômeno inverso: o grande número de alunos, senão a
maioria, não conseguia vencer os programas destinados à aquisição da leitura
e da escrita, começou a defrontar com o fantasma da reprovação.
Teriam os métodos destinados a alfabetizar perdido sua eficácia? Ou os
professores já não estariam preparados para a sua tarefa? Que fatores, enfim,
poderiam ser responsabilizados pelo elevado de reprovações ou de abandono
escolar?
Sabe-se que o enfoque psicopedagógico, que durante muito tempo
predominou na alfabetização, revelou-se incapaz de, por si só, redimir a
situação de fracasso a que foram destinadas tantas crianças. Resultados
positivos nos testes de prontidão nem sempre garantiram ou garantem o
sucesso da criança; a seleção ou a mudança de método parece não ter
mudado muito as condições de aprendizagem. É que a alfabetização é um
processo que supõe condições outras que não apenas aquelas de caráter
37
psicopedagógico. Enquanto algumas dessas condições dizem respeito ao
educando, outras referem-se ao educador.
Do que foi dito fica claro, do nosso ponto de vista, que as mudanças
necessárias para enfrentar sobre bases novas a alfabetização inicial não se
resolvem com um método de ensino, nem com novos testes de prontidão, mas
com novos materiais didáticos e psicopedagógicos.
É preciso transpor os paradigmas por onde fazemos passar o eixo
central das nossas discussões. Temos uma imagem empobrecida da criança
que aprende: a reduzimos a um par de olhos, um par de ouvidos, uma mão que
pega um instrumento para marcar e um aparelho fonador que emite sons. Atrás
disso há um sujeito cognoscente, alguém que pensa, que constrói
interpretações, que age sobre o real para fazê-lo seu.
Um novo método não resolve os problemas. É preciso realizar as
práticas de introdução da língua escrita, tratando de ver os pressupostos
subjacentes a elas, e até que pontos funcionam como filtros de transformação
seletiva e deformante de qualquer proposta inovadora. Os testes de prontidão
também não são neutros. A análise de suas pressuposições mereceria um
estudo em particular, que escapa aos limites deste trabalho. É suficiente
apontar que a “prontidão” que tais testes dizem dizer avaliar é uma noção tão
pouco científica como a “inteligência” que outros pretendem medir.
Em alguns momentos da história faz falta uma revolução conceitual.
Acreditamos ter chegado o momento de fazê-la a respeito da alfabetização.
38
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Trad. J. Seabra Dinis. Lisboa: Moraes, 1986.
WINNICOTT, D.W. O brincar e a realidade. Rio de Janeiro: Imago, 1975.
40
ÍNDICE
FOLHA DE ROSTO ........................................................................................
AGRADECIMENTO .......................................................................................
DEDICATÓRIA ..............................................................................................
RESUMO .......................................................................................................
METODOLOGIA ............................................................................................
SUMÁRIO ......................................................................................................
INTRODUÇÃO ..............................................................................................
CAPÍTULO I
Alfabetização .................................................................................................
1.1 O Lúdico como ferramenta pedagógica no desenvolvimento da
alfabetização .................................................................................................
CAPÍTULO II
O Mundo do Brinquedo: um compromisso lúdico .........................................
2.1 A ludicidade no processo de alfabetização .............................................
CONCLUSÃO ................................................................................................
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ..............................................................
ÍNDICE ..........................................................................................................
FOLHA DE AVALIAÇÃO ...............................................................................
02
03
04
06
07
08
09
14
22
28
30
36
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FOLHA DE AVALIAÇÃO
Nome da Instituição: UNIVERSIDADE CÂNDIDO MENDES
Título da Monografia: O LÚDICO COMO FERRAMENTA PEDAGÓGICA NO
DESENVOLVIMENTO DA ALFABETIZAÇÃO
Autor: MÁRCIA APARECIDA CARDOSO OLIVEIRA
Data da entrega: ___/ ___/ ____
Avaliado por: Conceito: