DIANA CIANNELLA MARTINS DE OLIVEIRA - NUTES/UFRJ · O48t Oliveira, Diana Ciannella Martins de....
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UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO DE JANEIRO
NÚCLEO DE TECNOLOGIA EDUCACIONAL PARA A SAÚDE
PÓS-GRADUAÇÃO EM EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS E SAÚDE
DIANA CIANNELLA MARTINS DE OLIVEIRA
ANÁLISE DA INTEGRAÇÃO DE TECNOLOGIAS DIGITAIS DE INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO (TDIC) À PRÁTICA PEDAGÓGICA DE UMA PROFESSORA DE CIÊNCIAS DOS ANOS FINAIS DO
ENSINO FUNDAMENTAL
Rio de Janeiro
2017
DIANA CIANNELLA MARTINS DE OLIVEIRA
ANÁLISE DA INTEGRAÇÃO DE TECNOLOGIAS DIGITAIS DE INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO (TDIC) À PRÁTICA PEDAGÓGICA DE UMA PROFESSORA DE CIÊNCIAS DOS ANOS FINAIS DO
ENSINO FUNDAMENTAL
Tese de Doutorado apresentada ao Programa de Pós-Graduação Educação em Ciências e Saúde, do Núcleo de Tecnologia Educacional para a Saúde, Universidade Federal do Rio de Janeiro, como requisito parcial à obtenção do Título de Doutor em Educação em Ciências e Saúde.
Orientadora: Profª Drª Miriam Struchiner
Rio de Janeiro
2017
O48t Oliveira, Diana Ciannella Martins de.
Tecnologias digitais de informação e comunicação (TDIC) na prática pedagógica de uma
professora de ciências dos anos finais do ensino fundamental. / Diana Ciannella Martins de
Oliveira. – Rio de Janeiro: UFRJ/NUTES, 2017. 255 f.: il.; 30 cm. Orientadora: Miriam Struchiner. Tese (Doutorado) – Universidade Federal do Rio de Janeiro, Núcleo de Tecnologia
Educacional para a Saúde, 2017. Referências bibliográficas: f. 194-203. 1. Educação digital. 2. Tecnologia de informação e comunicação. 3. Tecnologia Educacional
em Saúde - Tese. I. Struchiner, Miriam. II. Universidade Federal do Rio de Janeiro, Núcleo de Tecnologia Educacional para a Saúde. III. Título.
Diana Ciannella Martins de Oliveira
TECNOLOGIAS DIGITAIS DE INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO (TDIC) NA PRÁTICA PEDAGÓGICA DE
UMA PROFESSORA DE CIÊNCIAS DOS ANOS FINAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL
Tese de Doutorado apresentada ao
Programa de Pós-Graduação Educação em
Ciências e Saúde, Núcleo de Tecnologia
Educacional para a Saúde, Universidade
Federal do Rio de Janeiro, como requisito
parcial à obtenção do Título de Doutor em
Educação em Ciências e Saúde.
Aprovado em:
______________________________________________________
Prof(a). Dr(a). Miriam Struchiner – UFRJ
______________________________________________________
Prof(a). Dr(a). Maria Auxiliadora Delgado Machado – UNIRIO
______________________________________________________
Prof(a). Dr(a). Ivanildo Amaro de Araújo – UERJ
______________________________________________________
Prof(a). Dr(a). Andréa Velloso da Silveira Praça – UNIGRANRIO
______________________________________________________
Prof(a). Dr(a). Paula Ramos – UFRJ
Agradecimentos
Agradeço a Deus, Jesus, Nossa Senhora e Frei Luiz, a quem sempre recorro nos momentos
difíceis e de vitória, que muito ouviram meus pedidos de força e sabedoria para vencer
todos os obstáculos, ao longo dessa trajetória de aprendizado e trabalho árduo que têm sido
minha formação acadêmica, desde a graduação, o mestrado e agora o doutorado. Muitas
vezes tive dúvidas, achei que não conseguiria concluir mais essa etapa, mas enfim, aqui está
a tese, a concretização física desses últimos 5 anos de dedicação intensa (desde a minha
aproximação ao grupo de pesquisa, em fevereiro de 2012 até este momento de defesa, em
2017).
Agradeço à minha família, pelo amor, confiança e incentivo constantes. Em especial à minha
mãe, Angela, uma guerreira que sempre valorizou o estudo para os três filhos, que sempre
acordou cedo com a gente, ajudando em tudo que podia, um lanche, um café, uma carona e
todas as orações e palavras de incentivo. À minha irmã, Flavia, pelo companheirismo, por
ouvir as minhas reclamações e me dar força para seguir em frente. Ao meu irmão Rodrigo,
que, mesmo longe, está sempre nos apoiando e torcendo.
Tenho muito a agradecer à professora Miriam Struchiner, minha orientadora, por ter
acreditado no meu potencial, afirmando que, mesmo tendo uma formação anterior distinta
da área de estudo do Nutes, da sua linha de pesquisa, todos são capazes de aprender o que
quiserem. A professora Miriam sempre esteve disposta a ensinar, esclarecer dúvidas, a
corrigir muitas e muitas versões de textos e sempre transmitindo entusiasmo e amor pelo
trabalho, pela pesquisa, pelos alunos. Miriam, você é um exemplo!
À todos os professores do Nutes, com quem muito aprendi nas disciplinas e seminários e
que acolhem todos os alunos do programa com respeito, carinho e se dedicam a
compartilhar e construir conhecimento conosco. Em especial agradeço a professora Taís
Giannella, com quem pude conviver mais de perto no grupo de pesquisa do Laboratório de
Tecnologias Cognitivas (LTC), colaborar em trabalhos e dar boas risadas. Agradeço a
professora Paula Ramos pela colaboração com o estágio docente.
Aos professores Andréa Velloso, Maria Auxiliadora Machado, Paula Ramos e Ivanildo Amaro,
que aceitaram o convite para participar da banca e contribuir para esse momento marcante
na minha trajetória.
Não posso deixar de lembrar também de todos os professores que passaram pela minha
vida, pessoas que admirei e que me inspiraram a trilhar esse caminho. Em especial agradeço
aqueles que marcaram minha formação na graduação, o professor Marcio Alves Ferreira,
com quem fiz iniciação científica na área de genética, e os professores Teo Bueno e Mariana
Vilela, com quem fiz o estágio docente da licenciatura. Na minha formação de mestrado, na
área de Biofísica Ambiental, agradeço o professor Jean Remy Davée Guimarães, que também
me acolheu quando eu quis mudar da genética para a biofísica e compreendeu quando eu
decidi seguir outro caminho no doutorado.
Agradeço aos amigos que estão comigo há mais tempo e aos que ganhei nesta fase. Vocês
foram importantes em todos os momentos, seja para dar conselhos, força, seja para aliviar o
estresse. Aos colegas de turma, Gabriela, Américo, Renata, Amanda, Fernanda, Maria
Augusta, com quem dividi as densas leituras e discussões de textos.
À Maria Augusta, que além de colega de turma, foi companheira no LTC, continuou me
dando força e torcendo por mim depois de ter concluído seu trabalho e voltado para sua
casa, no Ceará. Você se tornou uma grande amiga para a vida. À Lena, que também foi
companheira no LTC e, assim como a Augusta, me deu força e incentivo para concluir esse
trabalho, além das muitas caronas na volta pra casa. Você também foi uma grande amiga
que ganhei nessa caminhada.
À todos os amigos da família LTC, os antigos e os novatos, Rosilaine, Rodrigo, Lúcia, Glauce,
Camila, Fátima, Gabriela, Judith, Maria Augusta, Lena, Maristela, Marcelo, Raul. Todos os
momentos de aprendizagem, compartilhamento de angústias e risadas foram importantes. À
Sílvia e Edite por toda ajuda no dia a dia do laboratório e na construção dos trabalhos com o
grupo de pesquisa. Já estou com saudades.
Aos funcionários da secretaria de pós graduação, Lúcia e Ricardo, que sempre foram muito
atenciosos e cordiais.
À professora de Ciências, que concordou em fazer parte desse estudo e abriu as portas de
sua sala de aula para mim. Aos demais professores, coordenadora e diretora da escola onde
desenvolvi meu trabalho de campo, onde fui muito bem acolhida.
Agradeço o apoio da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes)
Muito obrigada!
“Humilde é aquela pessoa que sabe que não
sabe tudo, que sabe que outra pessoa sabe o
que ela não sabe, que ela e outra pessoa
saberão muitas coisas juntas, que ela e outra
pessoa nunca saberão tudo que pode ser
sabido”
(Mario Sergio Cortella)
RESUMO
OLIVEIRA, Diana Ciannella Martins de. Análise da integração de tecnologias digitais de informação e comunicação (TDIC) à prática pedagógica de uma professora de Ciências dos anos finais do ensino fundamental. 2017. 251p. Tese (Doutorado Educação em Ciências e Saúde) - Núcleo de Tecnologia Educacional para a Saúde, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2017.
O estudo apresenta uma análise acerca do processo de integração de Tecnologias Digitais de
Informação e Comunicação (TDIC) à prática pedagógica de uma professora de Ciências, de
uma escola pública do Rio de Janeiro, a qual conta com laptops educacionais para todos os
alunos, provenientes do Programa Um Computador por Aluno (PROUCA). O objetivo foi
investigar como a professora integrou as TDIC em sua prática pedagógica, suas motivações,
concepções e evolução no uso das TDIC ao longo do tempo, assim como os desafios
enfrentados nesse processo. A pesquisa foi conduzida sob a perspectiva de um estudo de
caso colaborativo, com o estabelecimento de uma relação de parceria entre a professora e a
pesquisadora, do segundo semestre de 2012 ao segundo semestre de 2014, período em que
as aulas de Ciências foram acompanhadas pela pesquisadora. Uma entrevista semi-
estruturada com a professora também foi realizada nesse período, a fim de ampliar a
compreensão dos dados coletados com a observação acerca das motivações da professora
para uso de tecnologia na sua prática de ensino, assim como ampliar a compreensão sobre
sua trajetória docente e sua relação com as TDIC, tanto na vida pessoal quanto profissional.
Os dados do diário de campo e entrevista foram organizados e analisados a partir da técnica
de análise de conteúdo. A partir da observação e entrevista, foi possível compreender que a
professora tem uma concepção de ensino tradicional, a qual influencia sua visão sobre os
alunos, assim como sua visão acerca do uso das TDIC no ensino. Nesse sentido, a professora
integrou recursos tecnológicos em estratégias pedagógicas semelhantes àquelas que já
desenvolvia, baseadas na transmissão de conteúdo e controle da disciplina. Não foi possível
observar mudança na perspectiva pedagógica das práticas com TDIC realizadas pela
professora, assim como a análise não indicou desenvolvimento do Conhecimento
Tecnológico Pedagógico do Conteúdo (TPACK), a partir do qual professores transformam
suas práticas tradicionais e integram as TDIC em novas abordagens centradas no aluno,
conforme defendem pesquisadores. Tal resultado pode ser atribuído às dificuldades do
contexto, em relação ao acesso à Internet, e às concepções da professora, formadas ao
longo de sua trajetória profissional e influenciadas pelas próprias condições do contexto de
trabalho. No entanto, considera-se que a parceria contribuiu para a reflexão da professora
de Ciências sobre suas práticas e para que ela explorasse recursos tecnológicos distintos ao
longo desse período, mesmo que não tenha sido possível implementar todas as atividades
planejadas. Estes podem ser considerados os passos iniciais do processo de desenvolvimento
de TPACK.
PALAVRAS-CHAVE: Tecnologias digitais de informação e comunicação. Estudo de caso
colaborativo. Parceria. Conhecimento tecnológico pedagógico do conteúdo. Concepções.
Práticas pedagógicas.
ABSTRACT
OLIVEIRA, Diana Ciannella Martins de. Análise da integração de tecnologias digitais de informação e comunicação (TDIC) à prática pedagógica de uma professora de Ciências dos anos finais do ensino fundamental. 2017. 251p. Tese (Doutorado Educação em Ciências e Saúde) - Núcleo de Tecnologia Educacional para a Saúde, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 2017. The study presents an analysis about the process of integrating Digital Information and
Communication Technologies (DICT) into the pedagogical practice of a Science teacher from
a public school in Rio de Janeiro. The school counted with educacional laptops for all
students, from the One Computer per Student Program. The objective was to investigate
how the teacher integrated the DICT in her pedagogical practice, her motivations,
conceptions, and evolution with the use of DICT over time, as well as the challenges faced in
this process. The research was conducted based on the colaborative case study perspective,
with the establishment of a partnership relationship between the teacher and the
researcher. This partnership was developed between the second half of 2012 and the second
half of 2014, when the science classes were accompanied by the researcher. A semi-
structured interview with the teacher was also carried out in that period in order to broaden
the understanding of observation data, about the teacher's motivations to use technology in
her teaching practice, as well as to broaden the understanding of her teaching trajectory and
her relation with the DICT, both in personal and professional life. The observation and
interview data were organized and analyzed using the content analysis technique. Based on
these data, it was possible to understand that the teacher hold a traditional teaching
conception, which influences her perceptions about students, as well as about the use of
DICT in teaching. In this sense, the teacher integrated technological resources into
pedagogical strategies in a similar way to those she had already developed without them,
based on content transmission and discipline control. It was not possible to observe changes
in the teacher pedagogical perspective about the practices with DICT. The analysis also have
not indicated the development of the Pedagogical Technological Knowledge of Content
(TPACK), which could enable teachers to transform their traditional practices and integrate
the DICT into new approaches such as student centered, according to researchers. The
school context limitations, such as Internet access and the teachers’ conceptions, developed
along her professional trajectory and influenced by all the school context conditions,
contributed to this result. However, it is considered that the partnership contributed to the
Science teachers’ reflection on her practices and that she explored different technological
resources throughout this period, even if it was not possible to implement all the planned
activities. These can be considered as initial steps of the TPACK development process.
KEYWORDS: Digital information and communication technology. Colaborative case study.
Partnership. Technological pedagogical content knowledge. Conceptions. Pedagogical
practices.
LISTA DE SIGLAS
FNDE - Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação
IMC – Índice de Massa Corporal
OLPC – One Lpatop per Child
PCK – Pedagogical Content Knowledge
PROINFO – Programa Nacional de Informática na Educação
PROUCA – Programa Um Computador por Aluno
TCK – Technological Content Knowledge
TDIC – Tecnologias Digitais de Informação e Comunicação
TK – Technological Knowledge
TPACK – Technological Pedagogical Content and Knowledge
TPK - Technological Pedagogical Knowledge
UCA – Um Computador por Aluno
LISTA DE QUADROS
Quadro 1. Diferenças entre as abordagens tradicional e construtivista..................................58
Quadro 2. Síntese dos principais desafios para a integração das TDIC à educação apontados na literatura.............................................................................................................................60
Quadro 3. Dados quantitativos do diário de campo................................................................85
Quadro 4. Unidades temáticas para análise dos dados de observação e entrevista.............120
Quadro 5. Síntese de concepções da professora e aspectos do contexto apontados na unidade temática I.................................................................................................................156
LISTA DE FIGURAS
Figura 1. Proporção de professores, por tipos de recursos obtidos na Internet para a preparação de aulas - Percentual sobre o total de professores de escolas públicas....................................................................................................................................37
Figura 2. Percentual de uso de ferramentas da Internet por professores de Ciências e Biologia....................................................................................................................................46
Figura 3. Representação da interligação entre os três domínios de conhecimento do professor (C – Conteúdo; P – Pedagogia; T – Tecnologia), indicando o Conhecimento Tecnológico Pedagógico do Conteúdo (TPCK) e os demais tipos de conhecimento das interseções entre os domínios C, P e T – Conhecimento Tecnológico Pedagógico (TPK); Conhecimento Tecnológico do Conteúdo (TCK) e Conhecimento Pedagógico do Conteúdo (PCK).........................................................................................................................................62
Figura 4. Representação do modelo TPACK incluindo o domínio do contexto........................64
Figura 5. Representação das etapas que compõem o processo de desenvolvimento de TPACK, de acordo com Niess et al (2009)................................................................................66
Figura 6. Exemplos dos slides que fazem parte do quizz. A – Capa; B – Regras do Jogo com orientações para responder as questões; C - Escolha do grupo animal representado por personagens animados; D – Texto de introdução para o grupo Anfíbios..............................105
Figura 7. Apresentação de atividades com TDIC ao longo do tempo – 2012/2; 2013; 2014 Exemplo de questões preparadas pela professora de Ciências para avaliação da turma de 8º ano.........................................................................................................................................112
Figura 8. Exemplo de questões preparadas pela professora de Ciências para avaliação da turma de 8º ano.....................................................................................................................133
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO........................................................................................................................18
1.1 APRESENTAÇÃO DA PESQUISADORA E MOTIVAÇÃO PESSOAL PARA O ESTUDO....................................................................................................................................18
1.2 PROBLEMATIZAÇÃO...........................................................................................................19
1.3 OBJETO DE ESTUDO...........................................................................................................21
1.4 OBJETIVO GERAL................................................................................................................21
1.5 OBJETIVOS ESPECÍFICOS.....................................................................................................22
1.6 JUSTIFICATIVA DO ESTUDO................................................................................................22
2 EDUCAÇÃO E TECNOLOGIAS DIGITAIS DE INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO......................24
2.1 PERSPECTIVAS ATUAIS D EDUCAÇÃO E TECNOLOGIA NA SOCIEDADE MODERNA................................................................................................................................24
2.2 O CAMINHO DA INTEGRAÇÃO DE TECNOLOGIAS NO SISTEMA EDUCACIONAL BRASILEIRO: BREVE PANORAMA DAS POLÍTICAS PÚBLICAS ........................................................................32
2.3 BREVE PANORAMA DO ACESSO, INFRAESTRUTURA E USO DE TDIC POR PROFESSORES NO BRASIL E OUTROS CONTEXTOS ...............................................................................................35
2.4 CONSIDERAÇÕES SOBRE O USO DE UM COMPUTADOR POR ALUNO EM SALA DE AULA: UM MODELO EM EXPANSÃO...................................................................................................40
2.5 RELAÇÕES ENTRE TECNOLOGIAS E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS NO ENSINO DE CIÊNCIAS..................................................................................................................................43
3 DOCÊNCIA E RELAÇÃO COM A TECNOLOGIA NA ESCOLA ..................................................48
3.1 A PRÁTICA DOCENTE NA SOCIEDADE CONTEMPORÂNEA.................................................48
3.2 PERCEPÇÕES SOBRE TECNOLOGIA E OS DESAFIOS PARA A INTEGRAÇÃO TECNOLÓGICA NA PRÁTICA DOCENTE.............................................................................................................55
3.3 CONHECIMENTO TECNOLÓGICO PEDAGÓGICO DO CONTEÚDO: UM CONHECIMENTO A SER CONSTRUÍDO PELO PROFESSOR........................................................................................61
4 METODOLOGIA.....................................................................................................................74
4.1 CONSIDERAÇÕES SOBRE O DELINEAMENTO METODOLÓGICO.........................................74
4.2 A COLABORAÇÃO ENTRE PROFESSOR E PESQUISADOR PARA A PESQUISA EM EDUCAÇÃO: UMA TENDÊNCIA DE PESQUISA E PRÁTICA ............................................................................78
4.3 CONTEXTO DO ESTUDO.....................................................................................................82
4.4 SUJEITO DO ESTUDO..........................................................................................................83
4.5 ANÁLISE DOS DADOS.........................................................................................................84
4.6 ASPECTOS ÉTICOS DA PESQUISA........................................................................................87
5 RESULTADOS, ANÁLISE E DISCUSSÃO..................................................................................88
5.1 RELATO DAS OBSERVAÇÕES – REGISTRO DO DIÁRIO DE CAMPO .....................................88
5.1.1 Eventos e problemas que ocorreram na escola ao longo do período de acompanhamento...................................................................................................................89
5.1.2 A entrada na escola: primeiras observações................................................................91
5.1.3 Período de Diagnóstico – Ano Letivo 2012....................................................................95
5.1.4 Continuidade das observações e parceria – Ano Letivo 2013.....................................102
5.1.5 Continuidade das observações e parceria - Ano Letivo 2014......................................108
5.1.6 Percepções sobre a professora, os alunos e suas relações.........................................115
5.2 CONSIDERAÇÕES DA PROFESSORA DE CIÊNCIAS - A ENTREVISTA SEMI-ESTRUTURADA 117
5.3 ANÁLISE E DISCUSSÃO......................................................................................................119
5.3.1 Unidade Temática I: O processo de integração das TDIC à prática pedagógica da professora / Categoria: A relação das concepções da professora com a prática pedagógica que desenvolveu com as TDIC / Subcategoria: Concepções da professora sobre a docência.................................................................................................................................122 5.3.2 Unidade Temática I /Categoria: A relação das concepções da professora com a prática pedagógica que desenvolveu com as TDIC / Subcategoria: Concepções da professora sobre os alunos e sua relação com a escola...................................................................................127 5.3.3 Unidade Temática I: O processo de integração das TDIC à prática pedagógica da professora / Categoria: A relação das concepções da professora com a prática pedagógica que desenvolveu com as TDIC / Subcategoria: Concepções da professora sobre TDIC para o ensino....................................................................................................................................137 5.3.4 Unidade Temática I / Categoria: A relação entre o contexto (escolar e extra escolar) com a prática pedagógica desenvolvida com TDIC..............................................................144 5.3.5 Unidade Temática I – Considerações Finais.................................................................155 5.3.6 Unidade Temática II / Categoria: Percepções da professora sobre a parceria ..........163 5.3.7 Unidade Temática II / Categoria: Possível contribuição da parceria para a prática pedagógica da professora com TDIC e desenvolvimento de TPACK....................................174 5.3.8 Unidade Temática II - Considerações Finais................................................................182 6 CONSIDERAÇÕES FINAIS DA PESQUISA.............................................................................185
6.1 CONSIDERAÇÕES FINAIS DA PESQUISADORA..................................................................192
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.............................................................................................195
APÊNDICE A - ATIVIDADES PEDAGÓGICAS REFERENTES AO PROJETO “COM-VIVER COM-CIÊNCIA E CIDADANIA”………..……………………………………………………………………………………………206
APÊNDICE B – ROTEIRO DE ENTREVISTA COM A PROFESSORA DE CIÊNCIAS......................210
APÊNDICE C - TRANSCRIÇÃO DA ENTREVISTA COM A PROFESSORA DE CIÊNCIAS.............213
APÊNDICE D – TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO DA PROFESSORA.......255
18
1 INTRODUÇÃO
1.1 APRESENTAÇÃO DA PESQUISADORA E MOTIVAÇÃO PESSOAL PARA O ESTUDO
A motivação para o envolvimento com este projeto nasce de minha formação como
Bióloga e licenciada em Biologia. Em 2007, concluí a graduação em Ciências Biológicas pela
Universidade Federal do Rio de Janeiro e logo em seguida optei por cursar a licenciatura. Ao
mesmo tempo em que cumpria o período de estágio docente, ingressei no curso de
Mestrado, na área de Biofísica Ambiental, pelo Instituto de Biofísica Carlos Chagas Filho,
também na UFRJ, onde já vinha atuando como estudante de iniciação científica. A
experiência com o estágio docente, em 2008, me levou à decisão de que após o Mestrado
(defendido em 2010), procuraria um curso de Doutorado na área de Educação.
No início de 2012, procurei a professora Miriam Struchiner, chefe do Laboratório de
Tecnologias Cognitivas do Núcleo de Tecnologia Educacional para a Saúde. Minha intenção
era trabalhar com um projeto voltado para a educação básica e especialmente para o ensino
de Ciências e, quando a professora Miriam me apresentou seu projeto, recém aprovado,
sobre Análise do Processo de Integração de Tecnologias de Informação e Comunicação em
Atividades Educativas no Ensino Fundamental no Contexto do “Programa Um Computador
por Aluno” (PROUCA), imediatamente me interessei e vislumbrei a possibilidade de trabalhar
com um professor de Ciências dentro do contexto de uma escola com o PROUCA
implementado. Assim que ingressei no curso, a professora Miriam me levou à escola onde
seu projeto se desenvolve e lá conheci a professora de Ciências que concordou com a
proposta de que eu a acompanhasse em suas aulas, observando sua dinâmica, e a apoiasse
no uso dos laptops educacionais pelos alunos em sala de aula, tanto no sentido do auxílio
com a máquina quanto no sentido pedagógico de desenvolvimento conjunto de estratégias
de uso.
19
1.2 PROBLEMATIZAÇÃO
O desenvolvimento da Ciência e da Tecnologia sempre trouxe mudanças para a
sociedade, mas o fato é que nos últimos anos, com a disseminação do computador e da
Internet, estamos vivenciando intensas e rápidas transformações nos nossos cotidianos que
demandam que estejamos cada vez mais preparados para usar essas tecnologias. Com isso,
muitos estudiosos vêm colocando que a educação não pode deixar de acompanhar a
evolução da sociedade e de considerar que seus alunos também mudaram. Fora da escola,
essas tecnologias estão presentes em suas vidas, e mesmo para os que ainda não dispõem
de computadores e Internet em suas residências, o mercado de trabalho lhes impõe essa
aproximação que vem se tornando cada vez mais inevitável. Portanto, espera-se que a
escola de hoje possa proporcionar tanto a inclusão digital de seus alunos (considerando que
ainda há regiões, principalmente afastadas dos centros urbanos, onde especialmente o
acesso à Internet é difícil, limitado), quanto a melhora das condições de ensino,
beneficiando-se do potencial das TDIC em criar ambientes inovadores de ensino-
aprendizagem, dando mais liberdade e responsabilidade ao aluno para construir seu
conhecimento e ao professor o papel de facilitador desse processo (FREITAS; LEITE, 2011;
KENSKI, 2007; TEZANI, 2011; ALMEIDA; VALENTE, 2012).
A disciplina Ciências, em especial, ganhou importância nesse cenário de mudança
social com o desenvolvimento científico e tecnológico, sendo a ela atribuída a função de
educar para o exercício da cidadania e tomada de decisão crítica perante questões científicas
e tecnológicas que se apresentam no nosso cotidiano (SANTOS, 2007; NASCIMENTO et al,
2010).
No entanto, é preciso considerar a complexidade da atividade docente e dos
aspectos que a influenciam, desde as concepções pessoais e pedagógicas inerentes a cada
professor até as questões de cada contexto de ensino, quando se discute a prática
pedagógica e possíveis mudanças na mesma, como é o caso da integração de tecnologias.
Muitos estudos demonstram que a simples inserção de tecnologias no ambiente escolar não
significa que as práticas escolares são alteradas ou evoluem para perspectivas pedagógicas
distintas das que já são tradicionalmente adotadas há gerações. Contudo, defende-se que as
20
TDIC podem favorecer o aprendizado por caminhos inéditos, que não seriam possíveis sem
elas e, por isso têm potencial pedagógico para inovar o processo de ensino-aprendizagem
(KENSKI, 2007; LIM; CHAI, 2008; COLL; MONEREO, 2010; ERTMER; OTTENBREIT-LEFTWICH,
2013). Nesse sentido, pesquisadores têm reforçado que o potencial de transformação da
educação pelas tecnologias depende da forma como os professores as utilizam e muitos
estudos têm buscado compreender que conhecimentos o professor precisa para integrar a
tecnologia e, de fato, transformar sua prática (MISHRA; KOEHLER, 2005; 2006; ERTMER;
OTTENBREIT-LEFWICH, 2013; BENSON; WARD; LIANG, 2015; TEE; LEE, 2015). Argumenta-se
que o professor precisa conhecer as tecnologias e articular esse conhecimento àqueles que
já possui sobre pedagogia e conteúdo, desenvolvendo nesse processo um tipo de
conhecimento particular conhecido como Conhecimento Tecnológico Pedagógico do
Conteúdo (Technological Pedagogical and Content Knowledge – TPACK) (MISHRA; KOEHLER,
2005; 2006).
Assim, considerando que ainda existem muitos desafios nesse sentido de uso
pedagógico das TDIC e de sua integração aos currículos escolares, muitas pesquisas são
necessárias para ajudar a enfrentar esses desafios, identificar os obstáculos e propor
caminhos. O tema da integração de TDIC à educação tem sido um foco frequente das
pesquisas colaborativas entre universidade e escola, buscando propostas de apoio e
construção de conhecimento junto aos docentes, uma vez que diversos estudos indicam a
necessidade de suporte ao professor para que possa integrar pedagogicamente as
tecnologias às suas práticas. Pesquisas desenvolvidas por meio de parcerias entre
pesquisadores de universidades e professores da escola básica, têm sido cada vez mais
relevantes, consideradas como uma forma de ampliar o conhecimento acerca das práticas
educativas e de aproximar teoria e prática (ERTMER; HRUSKOCY, 1999; PATTERSON et al,
2002; VOSGERAU, 2012; SARMENTO, 2014).
Portanto, entendendo a importância do tema da integração pedagógica das
tecnologias e sua relação com a expectativa de inovação das práticas educacionais, assim
como a necessidade de estudos que contribuam para a compreensão e planejamento de
ações nesse sentido, o presente estudo partiu da seguinte questão motivadora que orientou
a definição dos seus objetivos: Como ocorre a integração de TDIC à prática pedagógica de
21
uma professora de Ciências1 dos anos finais do ensino fundamental em uma escola que já
dispõe de alguns recursos tecnológicos, como computadores, projetores multimídia e acesso
à Internet? Dentro dessa questão inserem-se as seguintes subquestões: Quais as
possibilidades de uso desses recursos por essa professora?; Quais as dificuldades?; Quais as
concepções da professora em relação ao uso de TDIC na sua prática pedagógica? Estas
questões amplas, próprias como ponto de partida, foram posteriormente refinadas em
outras a partir do desenvolvimento do desenvolvimento da pesquisa, com a coleta de
análise dos dados, conforme apresentado no capítulo de metodologia.
1.3 OBJETO DE ESTUDO
Partindo das questões colocadas na problematização, a presente pesquisa
desenvolve-se em um contexto real de ensino de Ciências com a presença das TDIC. Baseia-
se no acompanhamento de uma professora de Ciências da rede pública de ensino
fundamental do Rio de Janeiro e investigação do seu processo de apropriação da tecnologia
e uso pedagógico no seu cotidiano. Sendo assim, o objeto desta pesquisa consiste no estudo
sobre o processo de integração de TDIC às práticas pedagógicas de uma professora de
Ciências e sobre os fatores que influenciaram este processo, com base em parceria
estabelecida com a pesquisadora.
1.4 OBJETIVO GERAL
O presente projeto de pesquisa tem como objetivo geral investigar como uma
professora dos anos finais ensino fundamental integra as TDIC em sua prática pedagógica na
disciplina Ciências, suas motivações, concepções e evolução no uso das TDIC em estratégias
pedagógicas, assim como os desafios enfrentados nesse processo.
1 A opção por uma professora de Ciências como sujeito do estudo deveu-se à própria formação da
pesquisadora, que também é Bióloga e professora de Ciências.
22
1.5 OBJETIVOS ESPECÍFICOS
(1) traçar o perfil pedagógico da professora pesquisada, investigando suas
visões/concepções com relação à docência e às tecnologias, suas habilidades e dificuldades
prévias para o uso das mesmas, a forma como as utiliza em sala de aula e suas motivações
para a escolha de estratégias pedagógicas e recursos tecnológicos em relação ao conteúdo
curricular;
(2) investigar os desafios enfrentados ao longo de todo o processo - do planejamento à
execução das ações de integração da tecnologia em sala de aula;
(3) dar suporte à professora no contato com a tecnologia, auxiliando-a a conhecer recursos
próprios do computador e da Internet, de acordo com suas necessidades e desenvolver, de
forma colaborativa com a professora, estratégias pedagógicas para o uso das tecnologias
disponíveis na escola (computadores para todos os alunos e projetores de imagem em todas
as salas).
(4) analisar a contribuição da parceria com a pesquisadora para a prática pedagógica da
professora de Ciências com TDIC, ao longo do período de acompanhamento de suas aulas.
1.6 JUSTIFICATIVA DO ESTUDO
Esta pesquisa se justifica pelo conhecimento que pretende gerar para a área de
estudo sobre a integração de tecnologias à educação, um tema ainda bastante pesquisado e
debatido, uma vez que a literatura discute intensamente a existência de muitos obstáculos
para que as TDIC possam fazer parte do processo educacional e beneficiá-lo com todo o seu
potencial pedagógico defendido por pesquisadores (KENSKI, 2007; KENSKI, 2013;
CORRADINI; MIZUKAMI, 2013; ALMEIDA; VALENTE, 2012; TEZANI, 2011, COLL; MONEREO,
2010).
Os resultados gerados a partir do caso específico desta professora podem ser
generalizados na medida em que outros sujeitos reconheçam, em seus próprios contextos,
23
as similaridades das questões e, mesmo a análise sendo voltada para a disciplina Ciências, é
possível que professores de outras áreas se identifiquem e encontrem semelhanças com
suas experiências. A importância de pesquisas com esta especificidade e profundidade é
apontada por alguns pesquisadores por contribuírem para a compreensão de como vêm
ocorrendo as relações pedagógicas com as TDIC (SOARES-LEITE; NASCIMENTO-RIBEIRO,
2012; GUZEY; ROEHRIG, 2009).
A proposta de acompanhamento de uma única professora, contribui também para
avaliar o potencial do modelo de parceria aqui desenvolvido, como estratégia tanto de
pesquisa quanto de aproximação e contribuição para a prática da professora no seu
contexto de ensino, sendo esta uma estratégia que vem sendo colocada como um
importante caminho para as pesquisas educacionais (PIMENTA, 2005; VOSGERAU, 2012;
DUNCAN; CONNER, 2013; WANG; ZHANG, 2014).
Portanto, este estudo contribui para a discussão sobre a complexidade dos aspectos
envolvidos no processo de integração de tecnologias à educação, em especial no contexto
de uma escola pública brasileira e de uma professora de Ciências do ensino fundamental.
Ciência e Tecnologia estão intimamente relacionados, uma vez que avanços em estudos
científicos contribuem para desenvolvimento de novas tecnologias, assim como novos
recursos tecnológicos contribuem para avanços e descobertas científicas. Assim, a disciplina
Ciências também pode se beneficiar com a integração pedagógica das Tecnologias Digitais
de Informação e Comunicação, as quais podem contribuir para a compreensão dos próprios
conteúdos da disciplina (WARSCHAUER, 2003; MCCRORY, 2006; SLYKHUIS; KRALL, 2012).
24
2 EDUCAÇÃO E TECNOLOGIAS DIGITAIS DE INFORMAÇÃO E COMUNICAÇÃO
Este capítulo apresenta considerações acerca da relação entre as tecnologias digitais
de informação e comunicação (TDIC) e a educação, com o objetivo de traçar um panorama
sobre sua importância, os caminhos de integração, assim como as atuais condições de
acesso e práticas dos professores com estas tecnologias. Portanto, o capítulo está
estruturado em cinco seções. A seção 2.1 discute a relevância das tecnologias na sociedade
moderna e seu potencial de contribuição para um processo educacional inovador e coerente
com esta nova sociedade. A seção 2.2 apresenta um panorama acerca das políticas públicas
brasileiras para integração de tecnologias à educação. A seção 2.3 apresenta dados acerca
das condições de acesso, infraestrutura escolar e uso pedagógico das tecnologias por
professores no Brasil e outros contextos, importantes para a compreensão do estado da arte
do processo de integração de maneira geral. A seção 2.4 traz considerações sobre um
modelo de integração de tecnologia que tem ganhado espaço em diversos contextos no
mundo, inclusive o brasileiro e especificamente o do presente trabalho, que é o modelo um
computador por aluno (UCA). Considerando a especificidade do presente trabalho, que trata
da integração de tecnologias às práticas de uma professora de Ciências, a seção 2.5
apresenta considerações acerca da relevância das tecnologias para o ensino desta disciplina
e dados de como seus professores têm utilizado tecnologias em sua prática pedagógica.
2.1 PERSPECTIVAS ATUAIS DE EDUCAÇÃO E TECNOLOGIA NA SOCIEDADE MODERNA
Ao falar em tecnologia, o senso comum remete aos produtos mais sofisticados que
estão ganhando o mercado. Porém, é preciso lembrar que nossa história com a tecnologia
começa quando nossos ancestrais pré-históricos percebem que podem utilizar recursos da
natureza, como galhos, pedras e ossos, dando-lhes múltiplas finalidades que trouxessem
benefícios para melhorar e transformar suas próprias condições de vida. Assim, considera-se
que a partir daí o homem começa a produzir e criar tecnologias (VERASZTO et al, 2008;
KENSKI, 1998). Conforme Veraszto et al (2008), o conceito de tecnologia se amplia para o
25
conhecimento que está por trás dos artefatos produzidos, desde a sua concepção e criação.
Ainda segundo os autores,
O que diferencia substancialmente a espécie humana do restante dos seres vivos é a sua capacidade para criar esquemas de ação sistemáticos e representacionais, aperfeiçoá-los, ensiná-los, aprendê-los e transferi-los para grupos distantes no espaço e no tempo, com o objetivo de avaliar os fatores prós e os contra, para assim poder tomar decisões de conveniência que irão apontar qual direção se deve seguir. E isso não se aplica somente à capacidade de desenvolver utensílios, aparelhos, ferramentas, etc, mas também a capacidade de desenvolver as tecnologias simbólicas (ou tecnologias da inteligência segundo Lévy, 1993) como a linguagem, a escrita e os mais diferentes sistemas de representação e de pensamento (VERASZTO et al, 2008, p. 18).
Atualmente, quando nos referimos às novas tecnologias que estão transformando o
mundo, estamos falando das tecnologias digitais que se caracterizam pela sua constante
evolução e pela sua base imaterial, cujo espaço de ação é virtual e sua principal matéria
prima é a informação (KENSKI, 2007). As tecnologias de informação e comunicação (TIC),
como rádio, jornal, cinema e televisão impuseram grandes transformações sociais e
atualmente as tecnologias digitais de informação e comunicação (TDIC), representadas
especialmente pelo computador e pela Internet, contribuem para a transformação de estilos
de vida, configurando uma sociedade cada vez mais dinâmica e globalizada, que comporta
novas maneiras de trabalhar, de comunicar-se, de relacionar-se, de aprender, de pensar e,
enfim, de viver (COLL; MONEREO, 2010; FREITAS; LEITE, 2011; KENSKI, 2007). Por conta
disso, a sigla TDIC será usada neste texto, uma vez que é a estas tecnologias que se referem
os autores aqui utilizados para discutir a sua integração à educação, assim como no contexto
do presente estudo.
Lévy (2010) coloca que a emergência do ciberespaço, termo usado pelo autor para se
referir à rede de interconexão mundial dos computadores, provavelmente proporcionou e
continua proporcionando, na sociedade moderna, um efeito tão radical sobre a pragmática
das comunicações quanto a invenção da escrita, em seu tempo. Nas sociedades orais, as
mensagens eram sempre recebidas no tempo e lugar em que eram emitidas, ou seja,
emissores e receptores compartilhavam o mesmo tempo e espaço, o mesmo universo de
significação. Segundo o autor, todo o saber era encarnado pela comunidade viva e quando
um indivíduo velho morria era como se uma biblioteca se perdesse com ele. Com o advento
da escrita, surge uma forma de comunicação antes desconhecida, pois torna-se possível o
acesso a mensagens produzidas por pessoas que se encontravam a milhares de quilômetros
26
de distância, pessoas mortas e ainda que viviam em diferentes contextos culturais e sociais.
A partir da escrita, os atores da comunicação não precisavam necessariamente dividir a
mesma situação em interação direta, pois o conhecimento pôde ser transmitido também
pelo livro, recurso indefinidamente interpretável e transcendental. De acordo com Lévy
(2010), o ciberespaço nos permite resgatar a situação de comunicação imediata anterior à
escrita, ao considerar que as mensagens trocadas em rede, em tempo real, privilegiam
novamente a interação direta entre os indivíduos, agora tanto em escala local quanto global.
Segundo o autor, desta vez, contrariamente à oralidade arcaica, o portador direto do saber
não seria mais a comunidade física e sua memória carnal, mas o ciberespaço, região dos
mundos virtuais, por meio do qual as comunidades descobrem e constroem a si mesmas
como coletivos inteligentes (pg. 166).
Por conta da disponibilidade cada vez maior de acesso e troca de informações de
maneira praticamente instantânea e a partir de qualquer lugar, possibilitada pelas TDIC, os
termos “sociedade da informação” e “sociedade do conhecimento” têm sido empregados na
literatura para designar esta sociedade contemporânea. Entretanto, alguns autores
(SANTOS, 2005; SCHNELL; QUARTIERO, 2009; COLL; MONEREO, 2010) colocam que estes
termos não são sinônimos, uma vez que informação consiste em dados a serem assimilados
e armazenados, enquanto conhecimento consiste na compreensão da informação, ou seja,
“a informação é o que vamos buscar e o conhecimento é o que podemos sistematizar a partir
dos dados obtidos” (SCHNELL; QUARTIERO, 2009, p. 107). Com esta concepção, a designação
mais adequada para a sociedade que vivemos hoje seria “sociedade da informação”,
considerando que estamos em uma fase em que muitas informações estão disponíveis, mas
os indivíduos ainda precisam compreender como trabalhá-las para construir o conhecimento
(SCHNELL; QUARTIERO, 2009). Coll e Monereo (2010) apontam que a abundância e a
facilidade de acesso à informação não garantem que os indivíduos estejam mais e melhor
informados. Argumentam que essa abundância e a ausência de critérios para selecionar e
confirmar a veracidade das informações, além da velocidade com que somos impelidos a
manipulá-las, exigindo maior rapidez de pensamento, pode levar à diminuição e dispersão
da atenção, à superficialidade e, por conseguinte, à dificuldade de reflexão e construção
efetiva de conhecimento.
27
Coll e Monereo (2010) destacam que, nesta sociedade, o conhecimento passou a ser
uma mercadoria, a mais valiosa de todas, e a educação compreendida como a via para
produzir e adquirir essa mercadoria. Portanto, para chegarmos de fato à sociedade do
conhecimento, as atenções se voltam para a educação e sua enorme responsabilidade na
formação desse novo cidadão.
Historicamente, mudanças na sociedade tendem a promover mudanças na educação,
que busca se adequar às exigências de cada época. No final do século XIX e início do XX,
quando os sistemas produtivos urbanos começaram a se tornar mais complexos, com a
organização de fábricas, surge a demanda pela educação em massa, concebida para formar,
desde cedo, trabalhadores aptos para o sistema industrial. Assim, entendia-se que as
crianças deveriam ser submetidas a rotinas diárias de atividades disciplinares, confinadas em
espaços fechados, com o interior idealmente diagramado para os fins específicos de cada
instituição, em intervalos regulares de tempo. A função primordial da escola nesta época,
portanto, não consistia apenas em instruir os alunos em determinados saberes, mas
principalmente em treiná-los para serem calmos, disciplinados e obedientes (SIBILIA, 2012).
Segundo Valente (1999), a educação em massa foi fundamental para superar uma educação
artesanal e restrita a uma pequena parcela da sociedade, de classe social mais favorecida.
No entanto, essa concepção de educação de massa, não atende mais a sociedade
atual, regida pela velocidade de evolução das tecnologias e novos estilos de vida. Percebe-se
hoje uma valorização do desempenho individual, da concorrência, uma ideologia da
autossuperação e busca pela elevação do rendimento e da criatividade instigados tanto pela
mídia, quanto pelo mercado (SIBILIA, 2012). Segundo Sibilia (2012), esse quadro implica a
necessidade de os indivíduos desenvolverem competências que a escola tradicional, com sua
concepção uniformizadora, controladora, não só parece incapaz de promover, como poderia
até abortá-las. Jovens que já nasceram nesta nova configuração social, que crescem
habituados aos ritmos acelerados das TDIC são obrigados a se submeter, todos os dias, a um
modelo escolar que representa um choque cultural incompreensível para eles. O
desinteresse e falta de entusiasmo demonstrado pelos alunos, seriam sintomas da lacuna de
sentido que a escola tem em suas vidas, o que é evidenciado também pelas altas taxas de
evasão escolar em todo o mundo (SIBILIA, 2012). Sibilia (2012) faz então uma analogia da
escola com uma tecnologia ultrapassada, ao compará-la a um dispositivo ou artefato
28
destinado a produzir algo e que aos poucos foi se tornando “incompatível com os corpos e as
subjetividades das crianças de hoje. A escola seria, então, uma máquina antiquada. Tanto
seus componentes quanto seus modos de funcionamento já não entram facilmente em
sintonia com os jovens do século XXI” (p. 13).
Na visão de Coll e Monereo (2010), as TDIC vêm promovendo uma nova cultura da
aprendizagem. De acordo com os autores, na sociedade da informação, os estudantes
precisam estar capacitados para selecionar, organizar e atribuir significado a toda essa
informação disponível para que possam enfrentar os desafios que a sociedade lhes
apresentará. Os autores argumentam, ainda, que em uma sociedade que muda de forma tão
rápida e na qual o aprendizado passa a ser possível em qualquer espaço, seja físico ou
virtual, a aprendizagem e a formação continuada ao longo da vida são imprescindíveis e, por
isso, é importante fomentar nos estudantes o desenvolvimento de capacidades de gestão do
próprio aprendizado. Além disso, os pesquisadores colocam que as TDIC ampliaram nossas
capacidades de apresentar, processar, transmitir e compartilhar grandes quantidades de
informação com cada vez menos limitações de espaço e tempo. Segundo eles, a novidade
das tecnologias digitais não está na sua natureza de servir para a informação e a
comunicação, pois o homem sempre utilizou tecnologias para transmitir informação, para se
comunicar e expressar suas ideias, desde sinais entalhados em pedra até o telégrafo, o
telefone, o rádio ou a televisão, passando também pelos gestos, linguagem de sinais,
linguagem oral e escrita. A verdadeira novidade das TDIC estaria, então, em permitir a
criação de ambientes que integram todos os recursos semióticos conhecidos (textos,
imagens, linguagem oral, sons, dados numéricos, gráficos) e permitem uma forma inédita de
se relacionar com a informação.
Lévy (2010) acrescenta que “trabalhar quer dizer, cada vez mais, aprender, transmitir
saberes e produzir conhecimentos” (p. 159) e que essa situação coloca em questão a divisão
clássica entre período de aprendizagem e período de trabalho, já que hoje em dia se
aprende o tempo todo, tornando ultrapassada a ideia de aprender uma profissão na
juventude para exercê-la por toda a vida da mesma forma.
Nesse contexto, discute-se a urgência de a escola adequar-se à essa realidade, de
aproximar-se das TDIC para transformar seu modelo tradicional de ensino-aprendizagem
29
centrado no professor, no qual o aluno recebe e memoriza a informação transmitida por ele
e evoluir para um modelo mais centrado no aluno, o qual passa a ter um papel mais ativo na
construção de seu conhecimento e o professor passa a ser o facilitador desse processo.
Segundo estudiosos, o potencial pedagógico destas tecnologias está em criar ambientes de
aprendizagem baseados em atividades colaborativas e problematizadoras, em que os alunos
podem desenvolver, com seus pares, reflexões a partir de questões e problemas concretos,
contextualizados em seu cotidiano (VALENTE, 1993; MORAN, 1997; VILARINHO; GOMES,
2004; KENSKI, 2007, COLL; MONEREO, 2010; CORRADINI; MIZUKAMI, 2013). A Internet
especificamente, permite o acesso a informações por conexões não lineares, que se ligam
por hipertextos, favorecendo a flexibilidade mental, e ainda, a adaptação a diferentes ritmos
por permitir a pesquisa individual, dando a cada aluno o seu próprio tempo, além da
pesquisa em grupo que estimula a colaboração. Em sua atual fase conhecida como web 2.0,
a Internet abre perspectivas inéditas de desenvolvimento de propostas pedagógicas pela
disponibilidade de aplicativos e serviços que permitem ao usuário criar e difundir seus
próprios conteúdos, assim como trocar, compartilhar e reutilizar os conteúdos criados pelo
próprio usuário e por outros (COLL; MONEREO, 2010). O termo web 2.0 se refere ao
conceito de Internet com uma plataforma participativa, em que os usuários têm à disposição
ambientes com os quais podem criar, interagir e colaborar com outros usuários na rede,
como wikis, blogs, compartilhamento de vídeos, redes sociais e outros. No início, a Internet
contava com um sistema do tipo web 1.0, no qual a experiência dos usuários era mais
passiva, uma vez que podiam apenas ler textos e ver imagens, assistir a vídeos, responder
questões de múltipla escolha ou interagir com jogos que se comportavam exatamente como
os programadores planejaram. O conceito atual da web 2.0 seria, portanto, uma evolução da
web 1.0 ao proporcionar ao usuário uma experiência muito mais dinâmica, embora não
tenha substituído a web 1.0 (WOLBRINK; BURNS, 2012).
Coll e Monereo (2010) lembram que, em pouco tempo, os primeiros computadores,
que eram grandes máquinas que serviam a muitos usuários ao mesmo tempo, tornaram-se
mais acessíveis e foi possível termos um computador pessoal para cada usuário. Atualmente,
chegamos ao ponto em que um usuário pode ter ao seu alcance vários dispositivos
(celulares/smartphones, tablets, notebooks), os quais podemos levar conosco para qualquer
lugar, seja para trabalhar ou para nos divertir. Além disso, os computadores estão presentes
30
em diversos espaços que fazem parte de nosso cotidiano, como bancos, mercados, lojas etc.,
tornando-se cada vez mais indispensáveis. Estas características de crescente presença em
todos os espaços e a mobilidade das TDIC faz com que estas recebam o título de tecnologias
ubíquas (COLL; MONEREO, 2010). Weiser (1991) foi quem utilizou essa expressão pela
primeira vez, fazendo a previsão de que chegaríamos a uma época em que os computadores
estariam presentes em toda parte até integrarem-se de tal modo a nossa paisagem cotidiana
que seriam invisíveis ou imperceptíveis. Para explicar essa invisibilidade, ele dá o exemplo da
escrita, que se tornou uma tecnologia de informação tão ubíqua (disseminada em livros,
revistas, jornais, anúncios de rua, etc.) que, quando uma pessoa olha para uma mensagem
qualquer na rua, ela rapidamente absorve aquela informação sem se conscientizar do ato da
leitura que foi preciso empreender.
Nesse sentido, Coll e Monereo (2010) discutem que o uso das TDIC, cada vez mais
frequente por conta dessa ubiquidade, pode ocasionar mudanças relevantes em nossas
habilidades cognitivas. Como exemplo, os autores comentam sobre o uso do editor de texto,
o qual amplia nossas habilidades por permitir que façamos mais coisas em menos tempo ou
melhor, neste caso tornando-nos mais eficazes em pensar formas alternativas de expressar
algo ou deixar nosso estilo de redação mais criativo com a possibilidade de alterar o texto a
qualquer momento com grande facilidade. Por isso, essas tecnologias poderiam ser
entendidas como ferramentas cognitivas, que contribuem para o desenvolvimento humano.
Lévy (2010) coloca que as grandes invenções tecnológicas não permitem apenas realizar
tarefas de forma mais rápida ou em maior escala, mas sobretudo que possamos fazê-las,
senti-las ou organizá-las de outra forma, levando ao desenvolvimento de novas habilidades
intelectuais. O autor acrescenta que estas tecnologias podem amplificar, exteriorizar e
modificar numerosas funções cognitivas humanas, como: memória, por meio de bancos de
dados e arquivos digitais de todos os tipos; imaginação, por meio das simulações; percepção,
por meio de sensores digitais, tele presença e realidades virtuais; raciocínio, por meio da
inteligência artificial e modelização de fenômenos complexos. Jonassen et al (1998) já
haviam proposto o termo de ferramentas cognitivas (mindtools), argumentando que essas
tecnologias auxiliam o estudante a interpretar e organizar o próprio conhecimento e que ele
deve aprender com a tecnologia e não a partir dela, o que seria, neste último caso, uma
forma de utilizar a tecnologia para continuar a reproduzir o modelo instrucional de
31
educação. Segundo os autores, usando programas disponíveis com o computador para
representar um determinado conteúdo que está sendo estudado, o aluno se envolve com
este conteúdo, refletindo sobre o mesmo e de forma autônoma constrói seu aprendizado.
Jonassen et al (1998) destacam que o uso das tecnologias como ferramentas cognitivas
representa uma concepção construtivista, a qual se propõe a criar ambientes de
aprendizagem onde o aluno participa ativamente na construção de seu conhecimento, em
vez de esperar que o professor interprete o mundo para ele. Com esta concepção, o
computador pode ser usado para promover habilidades quanto à reflexão, discussão,
tomada de decisão, planejamento e resolução de problemas, as quais são importantes não
apenas para o processo de aprendizado escolar, mas para a vida, para a cidadania.
Segundo Coll e Monereo (2010), por conta da dificuldade em se estabelecer relações
causais diretas entre a utilização das TDIC e resultados positivos na aprendizagem, muitos
pesquisadores têm voltado sua atenção para o estudo empírico dos usos efetivos que
professores e alunos fazem das tecnologias no cotidiano de suas atividades de ensino-
aprendizagem. Isto significa uma mudança no foco das pesquisas que inicialmente
concentrava-se especificamente nas características e potencialidades das TDIC para a
educação. Dessa forma, os autores argumentam que, de acordo com essa nova postura, o
caminho para compreender e avaliar o impacto das TDIC sobre a educação escolar está nas
atividades que professores e alunos conseguem desenvolver frente às possibilidades de
comunicação, acesso, processamento e troca de informação que estas tecnologias
oferecem. Portanto, os estudos têm se voltado para a investigação de como professores e
alunos integram as TDIC em suas atividades e para os fatores relacionados ao maior ou
menor grau de sucesso dessas atividades. Coll e Monereo (2010) refletem que, quando
falamos em potencial das tecnologias para revolucionar a educação, estamos tratando de
algo que pode ou não tornar-se realidade e, isso pode ocorrer, em maior ou menor medida,
em função do contexto no qual as TDIC serão utilizadas. Seriam, portanto, os contextos de
uso das TDIC, que acabam determinando seu maior ou menor impacto no processo de
ensino-aprendizagem. Destacam que as TDIC abrem horizontes de práticas educacionais que
não seriam possíveis sem elas e é a partir destas práticas que se espera alcançar a
transformação do sistema educacional coerente com a nova sociedade da informação. Pérez
Gomez (2015) comenta que a aprendizagem é subjetiva e que o ensino não causa a
32
aprendizagem, mas cria contextos, cenários e situações que podem oferecer melhores ou
piores condições de o indivíduo aprender. O autor acrescenta ainda a importância de a
aprendizagem e as práticas escolares estarem contextualizadas nas questões reais da vida,
pois quando há o distanciamento destas questões, converte-se na aprendizagem “da” escola
e “para” a escola, deixa de interessar o aluno e tem apenas valor de troca por notas,
certificações ou titulações no mercado escolar.
Para continuar crescendo, esta sociedade precisa de cidadãos criativos, atentos às
suas mudanças, capazes de refletir e tomar decisões criticamente, assim como trabalhar em
grupo. Esta postura deve resultar de um processo educacional que cria ambientes de
aprendizagem em que os estudantes podem vivenciar e desenvolver essas capacidades. Não
reconhecer a importância dessa transformação pode condenar a escola ao isolamento da
realidade e obsolescência de suas práticas (KENSKI, 2007; PÉREZ GOMEZ, 2015).
2.2 O CAMINHO DA INTEGRAÇÃO DE TECNOLOGIAS NO SISTEMA EDUCACIONAL BRASILEIRO:
BREVE PANORAMA DAS POLÍTICAS PÚBLICAS
Na realidade atual do sistema educacional brasileiro, nos defrontamos com duas
situações: alunos que já dispõem de conhecimentos tecnológicos e pleno acesso ao universo
de informações disponíveis nos meios virtuais e alunos que se encontram em plena exclusão
tecnológica, encontrando apenas na escola a oportunidade de contato com o computador e
a Internet (TEZANI, 2011). Kenski (2013) coloca que a desigualdade de acesso às redes
digitais contribui para a divisão do país entre os incluídos e os não incluídos digitalmente e
que
...sem a fluência digital, um contingente de pessoas, sobretudo jovens, mesmo tendo formação escolar regular, apresenta-se desqualificado para o trabalho, nos mais diferenciados setores. Perdem as pessoas, perdem os espaços profissionais pela desqualificação dos trabalhadores, perde o país. (p. 65)
Pretto (2006) acrescenta que inclusão digital é muito mais do que ter acesso às
máquinas, “é o exercício da cidadania na interação com o mundo da informação e da
comunicação” (p. 15). Promover a inclusão digital seria, portanto, uma forma de promover a
33
inclusão social, diminuindo as distâncias entre os que tem e os que não tem acesso às
tecnologias.
...falar em inclusão é articular temas como acesso às máquinas, conexão, software livre, universalização de serviços de comunicação, cidadania plena e transformação da escola em espaço de produção de cultura, em cada contexto na qual ela se insere. Ou seja, falamos de inclusão sociodigital. (PRETTO, 2006 p. 19)
Percebemos nas posições de Kenski (2013) e de Pretto (2006) duas características
importantes e que estão entre as motivações que influenciaram o governo brasileiro a
investir no desenvolvimento de políticas públicas de integração das tecnologias à educação:
a necessidade de promover o desenvolvimento econômico do país formando trabalhadores
qualificados para atuar em um mercado cada vez mais tecnológico e a necessidade de
diminuir a desigualdade social proporcionando acesso à toda rede de informações, educação
de qualidade e condições para cada indivíduo exercer sua cidadania. Estas motivações estão
expressas no Livro Verde - Sociedade da Informação no Brasil, lançado pelo Ministério da
Ciência e Tecnologia em 2000 (BRASIL, 2000).
Desde a década de 1970, diversos países já se dedicavam a investigações sobre o uso
de tecnologias na educação, com foco especial no desenvolvimento de software ou na
realização de experimentos piloto em escolas. A partir da década de 1980, países como
França, Portugal e Estados Unidos iniciaram a implementação de programas voltados à
introdução de computadores nas escolas, cada qual com características próprias (ALMEIDA,
2008). Estas iniciativas internacionais serviram de referência para o Brasil que, nesta mesma
época, desenvolveu a Política de Informática Educativa (PIE). Em 1981, foi realizado o I
Seminário Nacional de Informática na Educação, promovido pela Secretaria Especial de
Informática (SEI), pelo Ministério da Educação (MEC) e pelo Conselho Nacional de
Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), sendo o marco inicial das discussões sobre
informática na educação envolvendo a comunidade educacional. Nestas discussões, os
participantes julgaram importante deixar claro que os computadores não poderiam ser
vistos como a solução para os problemas da educação básica ou como substituto dos
docentes. Uma das principais recomendações deste I Seminário foi a criação de projetos
piloto, de caráter experimental, objetivando a realização de pesquisas sobre a utilização do
computador na educação antes de uma distribuição massiva. Em 1982 foi realizado o II
Seminário Nacional de Informática na Educação, que teve como tema central “O impacto do
34
computador na escola: subsídios para uma experiência piloto do uso do computador no
processo educacional brasileiro a nível de 2º grau”. No ano seguinte, foi aprovado o Projeto
Educom – Educação com Computadores – e foram estabelecidos cinco centros piloto (UFPE,
UFRJ, UFMG, UFRGS e Unicamp) para a realização de pesquisas e disseminação do uso de
computadores no processo de ensino-aprendizagem, pesquisas sobre a formação de
professores, além da produção de software educativo. Esta foi a primeira iniciativa oficial
para levar computadores às escolas públicas brasileiras. Desde então, outras ações foram
ocorrendo, como a criação de: primeiro Programa Nacional de Informática Educativa
(Proninfe) em 1989; Secretaria de Educação à Distância (SEED) do MEC, em 1996, com a
finalidade de atuar no desenvolvimento da educação a distância; Programa Mídias na
Educação, em 2005, para promover a formação continuada de professores na modalidade a
distância com suporte de uma plataforma digital – e-Proinfo (OLIVEIRA, 2012; ALMEIDA,
2008).
Uma das ações mais recentes para o avanço da integração da tecnologia digital à
educação básica é o Programa Um Computador por Aluno – PROUCA, cuja proposta é
disponibilizar um computador para cada aluno, professor e gestor de escola, prover
infraestrutura de acesso à Internet nas escolas e preparar os educadores para o uso desta
tecnologia (ALMEIDA, 2008). Lançado em 2007, este programa enfatiza em suas concepções
pedagógicas a necessidade de adoção de novas metodologias educacionais que favoreçam a
expressão, reflexão, troca de ideias, colaboração e aprofundamento dos saberes a partir de
novas atividades desempenhadas por professores e alunos com os novos recursos (FILHO et
al, 2012). Inicialmente foram selecionadas cinco escolas em cinco estados (SP, RS, TO, RJ e
DF) para uma fase experimental, chamada pré-piloto. Com a avaliação positiva da fase pré-
piloto, o governo brasileiro decidiu expandir o PROUCA e, em 2010, o projeto entrou em sua
segunda fase denominada piloto, com a proposta de ampliar o número de escolas
participantes do projeto para 300, entre as redes estaduais e municipais de ensino em todas
as unidades da federação (http://www.uca.gov.br/institucional/). Entretanto, o programa
chegou ao fim antes dessa meta ser atingida. Em 2014, já se encontrava um comunicado na
página oficial do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), anunciando que
o governo não está mais fazendo convênios, nem liberação de recursos para o PROUCA e
que as prefeituras interessadas em um projeto de informática devem fazer adesão ao
35
Proinfo, Programa Nacional de Tecnologia Educacional para a promoção de TICs na rede
pública de ensino fundamental e médio, regulamentado em 2007, e que distribui
computadores de mesa para laboratórios de informática nas escolas. A mais recente
iniciativa do Proinfo, informada na página do FNDE, é a distribuição de tablets para
professores de ensino médio que teve início em 2012.
(https://www.fnde.gov.br/fndelegis/action/ActionDatalegis.php?acao=abrirTreeview&codm
enu=1121&cod_modulo=21)
2.3 BREVE PANORAMA DO ACESSO, INFRAESTRUTURA E USO DE TDIC POR PROFESSORES NO
BRASIL E OUTROS CONTEXTOS
Diversas pesquisas vêm mostrando que, mesmo tendo acesso às tecnologias nas
escolas, os professores costumam utilizá-las de acordo com a perspectiva tradicional que já
estão habituados, inserindo as tecnologias nos mesmos modelos de práticas. Estas pesquisas
apontam que o uso mais frequente do computador costuma ser para exibição de filmes e
documentários, apresentação de slides e pesquisas na Internet. Isso indica que o potencial
construtivista e colaborativo das TDIC para a educação, defendido por estudiosos, ainda vem
sendo subaproveitado (MCCRORY, 2006; KENSKI, 2007; LIM; CHAI, 2008; CHEN, 2008;
FREITAS; LEITE, 2011; ERTMER; OTTENBREIT-LEFTWICH, 2013).
O Centro de Estudos sobre as Tecnologias da Informação e da Comunicação (CETIC)
divulga relatórios anuais de acompanhamento das TIC (o documento usa o termo TIC e não
TDIC) nas escolas brasileiras desde o ano de 2010. Dados referentes à pesquisa realizada em
2014 (pesquisa referente a 2015 ainda não foi divulgada), a partir de uma amostra de 1034
escolas (públicas e privadas - ensinos fundamental e médio) e entrevistas com 930 diretores,
881 coordenadores e 1770 professores, apontam que 92% das escolas públicas de áreas
urbanas contam com computador e algum ponto de conexão à Internet. Os principais locais
de instalação de computadores nas escolas públicas pesquisadas são a sala do diretor ou do
coordenador pedagógico (86%) e o laboratório de informática (85%). Em 39% destas escolas,
a instalação dos computadores foi realizada entre cinco e dez anos atrás (em 33% há mais de
36
10 anos). Equipamentos obsoletos e ausência de suporte técnico são citados por 88% dos
diretores como fatores que dificultam o uso pedagógico das tecnologias. Em 16% das escolas
o laboratório de informática não é usado e nas demais que possuem tal laboratório, 36%
contam com monitores ou técnicos e apenas 18 % com professores de informática que dão
apoio aos demais professores e alunos no uso dos computadores. Além disso, 91% dos
diretores apontou a baixa velocidade de Internet, o número insuficiente de computadores
por aluno e ainda de computadores conectados à Internet como outros fatores que também
dificultam o uso pedagógico das TIC nas suas escolas. Segundo o relatório, 41% das escolas
públicas ainda contam com conexão de baixa velocidade, de até 2Mbps, a qual é
compartilhada simultaneamente por vários computadores, o que torna a velocidade ainda
mais reduzida e, consequentemente, limita ou mesmo impossibilita usos que envolvam
download ou upload (CETIC, 2015).
Embora o tipo de dispositivo mais comum nas escolas ainda seja o computador de
mesa, o relatório destaca que há um aumento contínuo na proporção de escolas que contam
com computadores portáteis (de 49% em 2010 a 79% em 2014) e tablets (de 2% em 2012 a
29% em 2014). Desde 2012, o programa ProInfo Integrado do governo federal tem
disponibilizado tablets aos professores da rede pública, por meio do provimento de recursos
financeiros aos estados, além de experiências de redes estaduais e municipais que também
promovem a distribuição de tablets, como o programa Aluno Conectado, do estado de
Pernambuco, em que equipamentos híbridos de tablet e notebook são distribuídos aos
alunos do 2º e 3º anos do ensino médio (CETIC, 2015).
Com relação ao uso do computador e Internet pelos professores, 97% alegou que os
utiliza para buscar material para as aulas, sendo que os mais frequentes são imagens, vídeos,
textos e questões para provas e avaliações, citados por mais de 77% dos professores,
conforme o gráfico abaixo (figura 1), divulgado no relatório (CETIC, 2015).
37
Figura 1: Proporção de professores, por tipos de recursos obtidos na Internet para a preparação de aulas - Percentual sobre o total de professores de escolas públicas
Fonte: CETIC, 2015
A pesquisa revela também uma tendência de aumento do uso do computador para
aulas expositivas (tipo palestra), de 24% dos professores em 2010 para 62% em 2014, e
também para a atividade de exercícios para a prática do conteúdo curricular, de 23% dos
professores em 2010 para 57% em 2014, demonstrando que a inserção pedagógica das
tecnologias nas salas de aula vem ocorrendo predominantemente de forma instrucional,
associada às atividades que já são as mais frequentes sem o uso do computador e Internet
(CETIC, 2015).
Pesquisas realizadas em outros contextos, de outros países, também para avaliar a
situação de acesso, infraestrutura e uso de tecnologias nas escolas, revelam resultados
semelhantes aos encontrados no contexto brasileiro. O trabalho de revisão de Delgado et al
(2015), realizada no âmbito dos Estados Unidos, reunindo pesquisas desde 1986 até 2014, a
fim de verificar os investimentos, desafios e avanços na integração de tecnologia nas escolas
38
americanas, indica que o país tem investido fortemente no acesso e infraestrutura para uso
das tecnologias dentro das escolas. Aproximadamente 97% dos professores americanos têm
à disposição um ou mais computadores nas suas salas de aula, todos os dias, e 93% desses
computadores estão conectados à Internet, assim como os dispositivos trazidos pelos alunos
também têm acesso à Internet dentro das salas de aula. A quantidade de computadores
disponíveis para os alunos também vem aumentando, sendo a razão atual de 1,7 estudante
para 1 computador em sala de aula. No entanto, apesar do aumento do acesso à
computadores e Internet tanto para professores quanto alunos dentro das salas de aula, os
dados da pesquisa indicam que o uso pedagógico de TDIC ainda é baixo. Os professores
apontam que utilizam as TDIC mais comumente para atividades administrativas (96%),
acessar a Internet (94%) e para organizar notas dos alunos (80%), enquanto que o uso de
vídeos da Internet e podcasts são os recursos mais utilizados em atividades com os alunos
em sala de aula. Os estudantes apontam que utilizam TDIC principalmente para aprender ou
praticar habilidades básicas de uso dos dispositivos e fazer pesquisas na Internet (DELGADO
et al, 2015).
O trabalho de Wastiau et al (2013) apresenta dados de uma pesquisa realizada na
Europa (27 países), semelhantes aos divulgados pelo CETIC (2015) no Brasil, os quais indicam
que o acesso à tecnologias nas escolas européias têm crescido bastante, podendo-se
encontrar computadores disponíveis em muitas salas de aula, a média de um quadro
interativo e projetor multimídia a cada três salas de aula, assim como o acesso à Internet
que já é considerado quase ubíquo nas escolas (95% das escolas, sendo que em 2006 já era
de 65 a 75%). Segundo a pesquisa, há, em média, entre três e sete estudantes por
computador na Europa e os computadores estão frequentemente localizados nas salas de
aula, embora os laboratórios de informática ainda sejam frequentes. Contudo, o percentual
de escolas bem equipadas e conectadas (velocidade de Internet em 10 Mbps ou mais) difere
entre os países. Dinamarca, Finlândia, Noruega e Suécia são os países onde pelo menos 80%
dos estudantes dos níveis quatro e oito e quase todos do nível onze (considerando a
denominação K-12, que compreende todos os anos de escolaridade para educação básica
nesses países) estão em escolas altamente equipadas. Por outro lado, em países como
Bulgária, Croácia, Grécia, Itália, Hungria, Polônia, Romênia, Eslovênia, Eslováquia e Turquia,
menos de 20% dos estudantes do nível quatro e menos de 10% do nível oito estão em
39
escolas tão bem equipadas. A situação melhora para estudantes do nível onze apenas na
Croácia e Eslovênia, onde 60 a 80% desses estudantes estão em escolas bem equipadas
tecnologicamente, mostrando uma divergência no acesso às tecnologias entre os níveis de
educação e uma tendência de prioridade de investimento para os níveis de ensino mais
avançados. Com relação ao uso de TDIC, a pesquisa mostra que, embora muitos professores
já convivam com acesso às TDIC nas escolas há alguns anos, eles ainda as utilizam
basicamente para preparar suas aulas e poucos admitem utilizá-las durante as aulas com os
alunos, sendo o perfil das atividades ainda fortemente centrado no professor (WASTIAU et
al, 2013).
Portanto, apesar dos investimentos que vem sendo feitos para a inserção e
ampliação das TDIC na educação, seja no Brasil ou outros países, ainda é necessário mais
conhecimento acerca de como integrá-las pedagogicamente, do impacto que produzem
efetivamente nos resultados educacionais e em que condições isso ocorre. As políticas
públicas até o momento privilegiam o acesso às TDIC e o desenvolvimento de infraestrutura
nos espaços escolares, mas pouco discutem como promover a participação ativa e a
alfabetização digital de professores, coordenadores pedagógicos e diretores para que estes
integrem as tecnologias ao seu cotidiano de forma a produzir os resultados esperados na
qualidade da educação. Nesse sentido, trabalhos de observação sistemática sobre a
realidade das escolas e de seus processos de ensino-aprendizagem são essenciais para
indicar como essa relação com as TDIC vem ocorrendo e como podem transformar as
práticas tradicionais (SOARES-LEITE; NASCIMENTO-RIBEIRO, 2012).
2.4 CONSIDERAÇÕES SOBRE O USO DE UM COMPUTADOR POR ALUNO EM SALA DE AULA:
UM MODELO EM EXPANSÃO
O uso de computadores portáteis com acesso à Internet sem fio nas salas de aula,
buscando o modelo de um computador para cada aluno (1:1), vem se mostrando como uma
tendência mundial para as tentativas de integração das TDIC à educação. Acredita-se que
esta possibilidade amplia e facilita a adoção de diferentes estratégias pedagógicas, além de
permitir o uso da tecnologia no momento em que o professor julgar necessário (“just in
40
time” pedagógico), ao contrário do modelo de sala de informática em que o uso dos
computadores limita-se à disponibilidade de horário para agendamento da sala. Além disso,
o número de máquinas nessas salas frequentemente não corresponde ao número de alunos
das turmas, sendo necessário que os computadores sejam utilizados em duplas ou trios.
Além disso, espera-se que a disponibilidade dos laptops em sala de aula também favoreça o
desenvolvimento de atividades mais centradas no aluno, em que o professor atue mais
como um mediador do trabalho desenvolvido pelos alunos, algo que vem sendo debatido na
literatura e considerado como essencial para a educação moderna (BENTO; MARINHO,
2010).
O projeto One Laptop per Child (OLPC), lançado em 2005, é considerado o mais
ambicioso projeto de integração de tecnologia na educação dos últimos tempos. Idealizado
pelos pesquisadores Nicholas Negroponte e Seymour Papert do Instituto de Tecnologia de
Massachusetts (MIT/EUA), o projeto OLPC teve como proposta o desenvolvimento de
computadores portáteis de baixo custo e a sua distribuição para crianças acima de seis anos
de países em desenvolvimento (WARSCHAUER; AMES, 2010). Dois países implementaram o
XO (modelo de laptop desenvolvido pelo projeto OLPC) diretamente em nível nacional:
Uruguai e Nieu, uma ilha no Pacífico, com uma população escolar de 500 alunos
(WARSCHAUER; AMES, 2010). De acordo com a página oficial do OLPC, 44 países contam
com laptops XO. Conforme mencionado no tópico 2.2, o Brasil também investiu no modelo
1:1, com a implementação do Programa Um Computador por Aluno (PROUCA), em 2007,
inspirado no projeto OLPC.
Notícias recentes indicam que o projeto OLPC está chegando ao fim. Sua base
institucional de Boston encerrou as operações e atualmente apenas a base de Miami
continua com algumas das distribuições para Uruguai, Peru e Ruanda, além de alguns
contratos a respeito do tablet recentemente desenvolvido pela organização
(http://www.eldiario.es/turing/moviles_y_tabletas/OLPCOne_laptop_per_childlaptop_0_24
0076039.html;http://www.olpcnews.com/about_olpc_news/goodbye_one_laptop_per_chil
d.html).
Pesquisas realizadas em escolas brasileiras com os laptops UCA indicam que trabalhar
com este novo elemento na sala de aula exige mudanças também da própria gestão escolar,
41
como por exemplo com relação à estrutura da grade horária das disciplinas. Muitos
professores relatam que um tempo de aula de 45 minutos é insuficiente para trabalhar com
os laptops, pois a distribuição das máquinas aos alunos consome algum tempo da aula,
assim como recolhê-los e colocá-los para carregar depois do uso. Problemas técnicos das
máquinas e ausência de um profissional para dar apoio também são apontados como fatores
limitantes (SANTOS; BORGES, 2009; ALMEIDA; PRADO, 2009; NASCIMENTO et al, 2011;
ALVAREZ; MOLL; SOUZA, 2015).
Alvarez, Moll e Souza (2015) realizaram entrevistas com diretores de 13 escolas com
projeto UCA no Brasil, entre 2013 e 2014, e perceberam que a reivindicação mais frequente
é a de suprir a ausência de um técnico de informática para apoiar a escola. A capacidade da
bateria dos computadores também foi muito criticada. Um dos diretores declarou que
“depois de praticamente toda uma noite carregando não aguenta mais de 20 minutos!” (p.
46). Essa duração limitada da bateria, cria um outro problema que é a necessidade de
carregar os laptops durante as atividades em sala de aula. No entanto, a situação, na maioria
das escolas, era de tomadas precárias nas salas de aula e em número insuficiente. Quanto à
velocidade das conexões, Alvarez, Moll e Souza (2015) comentam que raras escolas
adquiriram contratos de maior capacidade além do básico fornecido gratuitamente pela
concessionária local, de 2MB, uma velocidade limitada para a demanda de tantos usuários
ao mesmo tempo. Problemas com conexão à Internet atrasando ou mesmo impossibilitando
planejamentos de professores são comuns em diversas pesquisas com o projeto UCA
(SANTOS; BORGES, 2009; ALMEIDA; PRADO, 2009; NASCIMENTO et al, 2011; ALVAREZ;
MOLL; SOUZA, 2015).
Apesar dos problemas, as pesquisas indicam que, de maneira geral, os professores
têm uma postura positiva com relação aos laptops, demonstram vontade de aprender mais
e de aumentar a frequência de uso, desde que os problemas apontados sejam solucionados
(BENTO; MARINHO, 2010; SANTOS; BORGES, 2009; NASCIMENTO et al, 2011; ALVAREZ;
MOLL; SOUZA, 2015).
Islam e Grönlund (2016) realizaram uma revisão acerca de projetos de
implementação de tecnologias 1:1 (considerando não apenas laptops, mas também tablets,
smartphones, ipods) no âmbito escolar, buscando pesquisas tanto de países desenvolvidos
42
quanto em desenvolvimento. No entanto, os autores perceberam que a maioria dos estudos
se refere a países desenvolvidos que apresentam alto índice de projetos 1:1, sendo os
Estados Unidos, o contexto de estudo mais frequente.
Na análise de 145 artigos, Islam e Grönlund (2016) buscaram evidências de impactos
sobre os estudantes, sobre os professores e sua prática, sobre o ambiente da sala de aula,
sobre a comunidade e ainda os desafios enfrentados. Segundo os autores, muitos estudos
sugeriram que iniciativas 1:1 contribuem para a motivação e maior envolvimento acadêmico
dos estudantes, melhoria da qualidade dos trabalhos que desenvolvem e maior colaboração,
maior autonomia no seu aprendizado e ampliação de habilidades básicas com as TDIC.
Quanto aos professores, dados sugerem que além da Internet facilitar o acesso a materiais
complementares para aulas, permite também oportunidades de colaboração, inclusive, com
docentes em outros contextos, compartilhando experiências e ideias. Estudos também
indicaram maior interação e colaboração entre os alunos, que se ajudam com o uso dos
dispositivos, e maior interação individual do professor com os alunos, que pode circular pela
sala, dando atenção a cada um na sua atividade. Diminuição de problemas com indisciplina
também são relatados e atribuídos à maior motivação dos alunos. Estudos também indicam
efeitos positivos para a comunidade, especificamente com a oportunidade de uso de
computadores e Internet pelos pais dos alunos, muitos de classe social desfavorecida e que
não tinham acesso a este dispositivo em casa (ISLAM; GRÖNLUND, 2016).
Com relação a aspectos negativos, alguns estudos revisados por Islam e Grönlund
(2016) relatam que dificuldades logísticas, técnicas e financeiras levaram várias escolas a
desistir dos projetos. A distração dos alunos no acesso à Internet também é apontada como
uma grande preocupação dos professores, com relatos de acesso até mesmo à pornografia,
atrapalhando o andamento da aula e o próprio aprendizado do aluno.
Quanto aos desafios, Islam e Grönlund (2016) encontraram menções à necessidade
de desenvolvimento profissional dos professores para uso pedagógico das TDIC, necessidade
de maior suporte dos gestores dos projetos com o desenvolvimento de planos de
monitoramento das experiências escolares. Segundo os autores, os estudos mostram que
sem um monitoramento contínuo, qualquer projeto de intervenção corre o risco de
fracassar em seus objetivos e sustentabilidade.
43
Com relação ao uso pedagógico de laptops ou outros dispositivos móveis nas salas de
aula, Islam e Grönlund (2016) identificaram que os usos mais comuns são para pesquisa na
Internet, escrever textos, criar apresentações de slides, organização de fotos, exibição de
vídeos e realização de testes, além do uso para comunicação entre professores e estudantes
e com pais dos estudantes. Assim, a revisão mostra que os usos desses dispositivos
tecnológicos ainda estão muito ligados às práticas tradicionais, e não promoveram portanto,
uma efetiva transformação cultural e pedagógica nas escolas em distintos contextos pelo
mundo.
Este breve panorama acerca da integração de TDIC na educação no modelo 1:1 deixa
claro que os esforços nesse sentido devem ir muito além da distribuição de máquinas para
os estudantes. Trata-se de um processo complexo e longo que, independentemente do lugar
onde se desenvolva e do projeto estabelecido, depende de fatores comuns como a formação
adequada do professor, a reestruturação do currículo, a promoção de ambientes de
aprendizagem com o envolvimento ativo do aluno, a infraestrutura adequada, avaliação
contínua etc. As pesquisas indicam que ainda é necessário mais conhecimento acerca das
consequências desse modelo de integração de computadores na educação, do impacto que
produzem efetivamente nos resultados educacionais e em que condições isso ocorre (ISLAM;
GRÖNLUND, 2016; ALVAREZ; MOLL; SOUZA, 2015; BENTO; MARINHO, 2010).
2.5 RELAÇÕES ENTRE TECNOLOGIAS E PRÁTICAS PEDAGÓGICAS NO ENSINO DE CIÊNCIAS
O ensino de Ciências é compreendido como de grande relevância, sendo-lhe
atribuído a responsabilidade de contribuição para a formação de cidadãos conscientes,
capazes de exercerem uma interpretação crítica do mundo e de colaborar para o
desenvolvimento do país (SANTOS, 2007; SANTOS; MORTIMER, 2001; NASCIMENTO et al,
2010). No entanto, em uma revisão sobre estudos dos últimos 12 anos, que buscaram
demonstrar evidências de interesse e motivação de estudantes do ensino básico acerca de
ciência e tecnologia, realizada na base ERIC (Education Resources Information Center),
Potvin e Hasni (2014) comentam sobre uma tendência de aparente perda de interesse dos
jovens por essa área, que se reflete no decréscimo pela procura por profissões de carreira
44
científica. Questionamentos acerca da qualidade do ensino de Ciências oferecido nas escolas
são levantados em alguns dos trabalhos que integraram esta revisão, sugerindo que essa
perda de interesse ocorre à medida que os estudantes avançam nos níveis escolares e que,
portanto, a percepção que os estudantes têm sobre ciência pode ser distorcida ou
enfraquecida por conta da “ciência escolar” aprendida. De acordo com Potvin e Hasni
(2014), as respostas dos estudantes a questionários de vários estudos, sugerem que existe
uma grande distância entre o que a escola oferece e o que os alunos desejam ou se
interessam. Fourez (2003) também já havia discutido sobre isso, colocando que o que os
alunos esperam do ensino de Ciências é compreender o mundo e, o fato de essa expectativa
não ser atendida, leva muitos jovens a não escolherem carreiras que tenham forte conteúdo
científico.
Potvin e Hasni (2014) comentam que os estudos revisados levantam importantes
questões que ainda precisam ser aprofundadas nas investigações, acerca do que está
acontecendo nas escolas, sobre a qualidade e objetivos do ensino e do entusiasmo que é
capaz de despertar. Os pesquisadores também perceberam que experiências positivas,
citadas nos estudos revisados, como por exemplo experiências de campo fora da escola
(acampamentos, visitas a museus) ou mesmo aquelas dentro da escola, como o ensino
baseado na investigação, favorecem o interesse e a motivação dos alunos perante a área de
Ciências. Além disso, a revisão destaca a importância da contextualização dos conteúdos,
trabalhos colaborativos, o contato com cientistas reais e pesquisas atuais sendo conduzidas,
como formas de enriquecer o ensino de Ciências e despertar o interesse dos alunos
(POTVIN; HASNI, 2014).
A integração das TDIC à prática educacional nesse sentido, apontado por Potvin e
Hasni (2014), também é colocada por muitos pesquisadores como uma forma de enriquecer
e aproximar o processo de ensino-aprendizagem da realidade dos estudantes, contribuindo
especialmente com o ensino de Ciências para formação de cidadania e consciência crítica
(KENSKI, 2007; MALAFAIA; RODRIGUES, 2008; CORRADINI; MIZUKAMI, 2013). Martins et al
(2005) e Guzey e Roehrig (2009), destacam que uma iniciação precoce aos discursos
científicos auxiliada pelos meios tecnológicos pode proporcionar maior riqueza nesse
processo de construção de atitudes e identidades em relação ao conhecimento científico e
ao cotidiano, além de contribuir para o entendimento do que é Ciência, da prática científica
45
e de sua importância para a sociedade. McCrory (2006) lembra que professores de Ciências
têm sido líderes no uso de tecnologia há muito tempo, com o uso de dispositivos
tecnológicos para experimentos de laboratório e de campo, seja para coleta de dados e/ou
demonstrações, como parte dos conteúdos lecionados em disciplinas de Ciências (Biologia,
Física e Química). Os estudantes podem, portanto, fazer o que os cientistas fazem ao coletar
e analisar dados, testar hipóteses, desenhar experimentos e gerar conclusões, utilizando
softwares que permitem criação de modelos e gráficos, equipamentos para coleta de dados,
como pH, temperatura ou salinidade etc. Com as TDIC pode-se trabalhar com representação
de ideias, fenômenos ou processos difíceis de serem explicados ou demonstrados, além de
ter acesso a informações recentes que não estão nos livros didáticos (MCCRORY, 2006). No
entanto, a autora coloca que os professores de Ciências, assim como os de outras disciplinas,
não têm aproveitado efetivamente o potencial das TDIC hoje disponíveis para o processo de
ensino aprendizagem.
Rolando, Salvador e Luz (2013) realizaram uma pesquisa com professores de Biologia
e Ciências participantes de cursos de aperfeiçoamento oferecidos pelo CECIERJ (Centro de
Ciências e Educação Superior a Distância do Estado do Rio de Janeiro). Um total de 454
professores responderam ao questionário proposto pelos pesquisadores (com questões
fechadas e abertas), cujo objetivo foi avaliar o perfil de uso de recursos de Internet desses
professores, seja para fins didáticos ou não. Com base nas respostas a esses questionários,
os pesquisadores construíram o gráfico abaixo (figura 2), que indica a predominância do uso
de recursos básicos, como pesquisa de informações, download e troca de e-mail.
46
Figura 2: Percentual de uso de ferramentas da Internet por professores de Ciências e Biologia.
Fonte: Rolando, Salvador e Luz (2013)
Os professores responderam, também, sobre os seus objetivos para o uso dessas
ferramentas, o que permitiu que os pesquisadores identificassem que o uso de recursos de
Internet para fins didáticos é o menos frequente, declarado por apenas 37,7% dos
professores e destes, 70,8% utilizam principalmente para download e pesquisa,
especificamente para ajuda-los a preparar aulas com materiais entre textos, animações e
vídeos. Em nenhuma das respostas houve menção ao uso de recursos de Internet com a
participação direta dos alunos, sugerindo que seu uso é predominantemente centrado no
professor, basicamente para exibição dos arquivos pesquisados (ROLANDO; SALVADOR; LUZ,
2013).
Os resultados apontados por Rolando, Salvador e Luz (2013) se assemelham aos
encontrados em outras pesquisas na literatura com professores de todas as disciplinas, seja
em contexto brasileiro ou outros países, conforme exemplos descritos no tópico anterior,
que mencionaram dados de uso de TDIC por professores de países europeus (WASTIAU et al,
2013), Estados Unidos (DELGADO, 2015) e Brasil (CETIC, 2015). Isso sugere que as
Ferr
ame
nta
s
% de professores
47
dificuldades de integração construtivista das TDIC independem da disciplina lecionada e são
comuns a professores em distintos contextos. Contudo, conforme mencionado por McCrory
(2006), o estudo da Ciência sempre se apoiou no uso de recursos tecnológicos de todo tipo,
muitos desenvolvidos para estudos específicos. Não se pode pensar em Ciência sem pensar
em tecnologia, a qual ajuda os cientistas a dar credibilidade e confiabilidade a seus dados e
conclusões, assim como a promover o avanço das atividades e do conhecimento científico.
Portanto, a relação com a tecnologia faz parte da Ciência e o estudo dessa disciplina na
escola só tem a se beneficiar com a integração pedagógica de recursos tecnológicos, pois
isso significa uma aproximação entre a disciplina e a essência da atividade científica e,
consequentemente, também aproxima o aluno dessa atividade.
Slykhuis e Krall (2012) realizaram um estudo de revisão acerca do uso de TDIC no
ensino de Ciências, a partir de trabalhos publicados nos últimos 10 anos nas principais
revistas científicas da área. Segundo os autores, ainda são necessários estudos acerca dos
efeitos das estratégias pedagógicas com TDIC sobre o aprendizado dos estudantes sobre
Ciências, a fim de que os professores possam ter uma orientação das práticas que melhor
podem contribuir para o desempenho acadêmico de seus alunos. Associado à essa questão,
os autores sugerem que outro aspecto igualmente importante a ser investigado, mas que
ainda tem menor ocorrência de estudos, é o efeito do uso das TDIC sobre as atitudes e
motivações dos estudantes para o aprendizado de Ciências. Assim, pode-se ter uma
compreensão mais ampliada sobre os recursos tecnológicos e formas de uso que mais
despertam o interesse dos alunos e contribuem para seu aprendizado e desempenho
acadêmico. Além disso, Slykhuis e Krall (2012), colocam que as pesquisas precisam avançar
sobre o uso de TDIC especificamente no nível de ensino fundamental, visto que, conforme
puderam verificar, a maioria das pesquisas sobre integração pedagógica de TDIC e
desenvolvimento de estratégias inovadoras se situa no ensino médio e no nível superior.
Nesse sentido, os autores apontam que são necessárias mais pesquisas com foco nessa
população de estudantes e no conteúdo de Ciências que estudam, o qual é voltado para as
ciências da natureza e corpo humano, enquanto as pesquisas nos níveis de ensino mais
avançados enfocam predominantemente o uso de recursos tecnológicos (simulações, jogos,
etc.) voltados para a área da Física.
48
3 DOCÊNCIA E RELAÇÃO COM A TECNOLOGIA NA ESCOLA
Este capítulo traz considerações acerca da complexidade de integração de
tecnologias à prática pedagógica e dos aspectos envolvidos nesse processo. Assim, o mesmo
se estrutura em três seções. A seção 3.1 apresenta considerações sobre a complexidade
inerente da prática docente, independente do uso de tecnologias. A seção 3.2 discute as
concepções dos professores acerca das tecnologias e os distintos fatores relacionados ao
contexto docente que influenciam suas decisões de uso ou não das tecnologias em suas
práticas. A seção 3.3 apresenta uma abordagem teórica, proposta a partir da compreensão
de que o processo de integração de tecnologias à prática pedagógica exige do professor o
desenvolvimento de um conhecimento específico, o Conhecimento Tecnológico Pedagógico
do Conteúdo.
3.1 A PRÁTICA DOCENTE NA SOCIEDADE CONTEMPORÂNEA
Uma das características centrais que distingue uma profissão de outra é a posse de
um corpo especializado de conhecimentos, exclusivo do grupo que o partilha e que legitima
esse grupo para o exercício da função profissional em questão. No caso da profissão
docente, sua característica central fundamenta-se no corpo de conhecimentos para o ato de
ensinar, o que pressupõe que o docente também precisa ter o conhecimento do conteúdo
específico a ser ensinado. Diferentemente de outras profissões em que os profissionais
conhecem um conteúdo específico, mas não precisam construir um conhecimento de como
ensinar esse conteúdo (ROLDÃO, 2007; MIZUKAMI, 2013).
Segundo Roldão (2007), existem duas vertentes para a compreensão do que significa
o ato de ensinar: professar um saber e possibilitar que alguém aprenda alguma coisa. A
primeira leitura está associada à postura mais tradicional do professor transmissivo,
enquanto a segunda está associada a uma visão mais ampliada sobre o processo de ensino-
aprendizagem, mais valorizada atualmente por estudiosos da área educacional. A autora
coloca que a função de ensinar já não é mais definida pela simples transmissão do saber, não
49
por razões ideológicas ou opções pedagógicas, mas por razões sócio históricas. A associação
de ensino à transmissão de saber foi socialmente pertinente quando o saber disponível era
muito menor, pouco acessível e o seu domínio limitado a um número restrito de grupos ou
indivíduos. Entretanto, quando a sociedade passou a se estruturar em torno da ampliação
do acesso à informação e do conhecimento como capital global, a partir da segunda metade
do século XX, essa interpretação do ensino perde sua coerência. Dessa forma, na sociedade
atual, o ato de ensinar caracteriza-se pela perspectiva da mediação (ROLDÃO, 2007).
Mizukami (2013) argumenta que os processos de aprender a ensinar, de aprender a
ser professor e de se desenvolver profissionalmente são complexos e lentos. Têm início
antes do espaço formativo dos cursos de licenciatura e prolongam-se por toda a vida, sendo
alimentados e transformados por diferentes experiências, tanto profissionais quanto
pessoais. Dentre as experiências pessoais, a autora comenta sobre as preconcepções sobre
ensino que os futuros professores construíram em suas vivências como alunos, observando a
prática de seus professores, o que chama de “aprendizagem por observação”. Estas
preconcepções podem ser determinantes para o que os professores fazem em sala de aula e
por que o fazem e, caso não sejam discutidas e compreendidas no momento do processo de
formação, podem comprometer a aprendizagem de novos conceitos ou mesmo promover
uma tradução equivocada destes. Mizukami (2013) destaca, ainda, que é importante que
futuros professores compreendam que a profissão não se reduz ao domínio de conceitos de
uma área específica e que requer igualmente o desenvolvimento de habilidades, atitudes,
comprometimento, investigação da própria ação, avaliação do próprio desempenho,
trabalho com os pares e a busca constante de aperfeiçoamento de sua prática pedagógica
relacionada ao conhecimento das populações específicas com as quais interage. No
cotidiano da profissão, os professores se deparam com uma multiplicidade de exigências e
situações que implicam negociações e reajustes a todo momento, como: organização do
trabalho pedagógico, muitos alunos com ritmos de aprendizagem e necessidades diferentes,
exigências burocráticas e de políticas públicas, relações com as famílias dos alunos etc.
Nesse sentido, é importante que os professores investiguem a própria prática e os contextos
diferenciados em que ela ocorre, de modo que tenham elementos para fundamentar suas
decisões e selecionar práticas adequadas para contextos e momentos específicos
(MIZUKAMI, 2013).
50
Considerando tais questões, é possível perceber que a docência envolve um conjunto
de fatores relacionados a aspectos pessoais, sociais e específicos da própria profissão e que
todos contribuem para torná-la extremamente complexa, despertando por isso, o interesse
de inúmeros estudos.
Mizukami (2004) comenta que as pesquisas sobre docência, até meados da década
de 1970, priorizavam a investigação do comportamento dos professores e buscavam
relacioná-lo ao desempenho dos alunos. Portanto, as pesquisas eram caracterizadas pelo
estabelecimento de relações entre as variações no rendimento ou atitudes dos alunos e
variações observadas nas ações dos professores. Os comportamentos dos professores eram
observados, mas analisados sem considerar suas intenções, os contextos e os conteúdos de
ensino. Entretanto, a partir de 1975, começam a se desenvolver estudos voltados para a
dimensão do conhecimento do professor, que passaram a investigar a percepção, reflexão,
teorias pessoais, resolução de problemas, tomada de decisões, construção de significados
etc. Nesta perspectiva mais ampla, de caráter interpretativo, passou-se a considerar desde
análises de interações verbais até análises das escolas ou comunidades. A autora relata que,
na década de 1980, o pesquisador Lee S. Shulman percebeu que, nos estudos voltados para
o conhecimento do professor, ainda havia uma questão importante que não estava sendo
contemplada: o conteúdo. Shulman passou a questionar como professores, que sabem o
conteúdo de sua disciplina de forma específica, o ensinam a alunos de diferentes contextos e
que possuem diferentes níveis de conhecimento, como por exemplo: “o que bons
professores de biologia de crianças de uma minoria urbana fazem e pensam?” (p. 4).
Shulman (1986) propôs dois referenciais para investigar os conhecimentos que os
professores precisam ter para a docência e os processos pelos quais eles são construídos e
utilizados, os quais o pesquisador denominou de: a base de conhecimento para o ensino e o
processo de raciocínio pedagógico. A base de conhecimento para o ensino consiste em um
conjunto de conhecimentos, compreensões e habilidades necessários para que o professor
possa atuar em diferentes contextos de ensino e possa promover a aprendizagem de
diferentes alunos. Os conhecimentos que compõe esta base são: conhecimento de conteúdo
específico (refere-se ao conhecimento do conteúdo da disciplina lecionada, incluindo as
compreensões de fatos, conceitos, processos, procedimentos etc. desta área específica de
conhecimento); conhecimento pedagógico geral (conhecimento de objetivos, metas e
51
propósitos educacionais, de ensino e aprendizagem, de manejo de classe e interação com os
alunos, de como os alunos aprendem, de estratégias instrucionais); conhecimento
pedagógico do conteúdo (refere-se à compreensão do que significa ensinar um tópico
específico, assim como os princípios e técnicas necessários para tal ensino – é
constantemente construído pelo professor ao ensinar a matéria). Portanto, para construir o
conhecimento pedagógico do conteúdo, o professor combina os dois outros tipos de
conhecimento, o de conteúdo específico e o pedagógico geral. Dessa forma, o conhecimento
pedagógico de conteúdo é o único de sua autoria, desenvolvido no exercício profissional,
enquanto os outros são aprendidos em cursos de formação (SHULMAN, 1986; MIZUKAMI,
2004; MIZUKAMI et al, 2010).
O processo de raciocínio pedagógico está intimamente relacionado à base de
conhecimento para o ensino, tendo como foco como esses diferentes tipos de
conhecimentos são acionados, relacionados e construídos durante o processo de ensino e
aprendizado. É constituído por seis etapas essenciais para o ato de ensinar: compreensão;
transformação; instrução; avaliação; reflexão; nova compreensão. O raciocínio pedagógico
do professor tem início com a compreensão de sua disciplina específica. Para que as ideias e
conceitos dessa disciplina sejam ensinados, o professor precisa transformá-las por meio de
um repertório que inclui exemplos, analogias, ilustrações, atividades diferenciadas etc. e
adaptar este repertório às características dos alunos, como estilos de aprendizagem, idade e
conhecimentos prévios, constituindo assim um conjunto de estratégias de ensino. A
instrução consiste no desempenho do professor em sala de aula no que se refere ao manejo
da classe, interação com os alunos individualmente ou em grupos, coordenação das
atividades, discussões, questionamentos, humor, disciplina etc. A avaliação ocorre durante e
após a instrução, verificando a compreensão dos alunos, suas possíveis dúvidas ou equívocos
na aprendizagem, por meio das próprias percepções do professor na interação com os
estudantes e pelos instrumentos sistemáticos como os testes, sendo uma etapa importante
para perceber os ajustes que precisam ser feitos. A reflexão envolve a revisão e análise
crítica das próprias ações pedagógicas em relação aos objetivos traçados. Por fim, a nova
compreensão é fruto de todo o processo de análise do ensino que fecha este ciclo de
raciocínio, mas pode dar origem a outros, já que enquanto estiver atuando o professor
estará sempre construindo conhecimentos (SHULMAN, 1986; MIZUKAMI, 2004; MIZUKAMI
52
et al, 2010). Portanto, é a partir desse processo de raciocínio pedagógico que o professor
constrói o seu conhecimento pedagógico do conteúdo, permitindo-lhe tornar o conteúdo de
sua disciplina acessível para os alunos.
No entanto, essa construção não é puramente individual, ocorre também na
interação com os pares e ainda é influenciada pelos contextos político-social e institucional
em que o professor está inserido (MIZUKAMI, 2013). A construção do conhecimento
pedagógico do conteúdo pode ser considerada como o fio condutor do desenvolvimento
profissional de professores, mas para isso necessitam de tempo e oportunidades de
aprendizagem que lhes permitam refletir sobre seus papéis e suas práticas. Dentre essas
oportunidades de aprendizagem, destaca-se o trabalho com os pares, dentro e fora da
escola, que proporciona o compartilhamento e debate de sucessos e fracassos, erros e
falhas, novas ideias e conhecimentos, constituindo, portanto, uma comunidade de
aprendizagem e apoio mútuo. É igualmente importante que as políticas públicas apoiem
esse desenvolvimento profissional do professor favorecendo a incorporação de distintas
oportunidades de aprendizagem à sua rotina na escola e não como meros treinamentos
pontuais, como o ensino de técnicas generalizadas. Assim, é preciso compreender o
desenvolvimento profissional, com a construção do conhecimento pedagógico do conteúdo,
como um processo contínuo e de longo prazo, em que as oportunidades de investigação,
experimentação, reflexão, avaliação e discussão possam fazer parte da organização do
trabalho diário do docente (MIZUKAMI et al, 2010).
É importante ressaltar também que o desenvolvimento do professor está
intrinsecamente relacionado à sua relação com os alunos, uma vez que o professor precisa
conhecê-los para planejar suas estratégias pedagógicas, suas formas de abordar o conteúdo,
assim como compreender o retorno dado pelos alunos com o próprio comportamento em
sala de aula e pelos instrumentos formais de avaliação, conforme mencionado no processo
de raciocínio pedagógico (SHULMAN, 1986). Sobre isso, Dutercq (2014) e Tunes, Tacca e
Júnior (2005) colocam que
Evidentemente, o docente tem um papel importante na instalação de uma situação propícia à aprendizagem, mas os alunos, em função daquilo que trazem do exterior, preocupações e conflitos diversos ou, ao contrário, o desejo de aprender e maneiras de aprender (às vezes diferentes daquelas usualmente admitidas pelos docentes) agem fortemente sobre o sucesso da construção desejada pelo docente. Este não pode ignorar isso e sua atenção deve ser intensa, para apreender as
53
oportunidades de ajuste que se revelam a ele: em alguns casos, ele pode reconduzir os alunos à sua aula tal como ele a havia preparado, mas deve, mais frequentemente, reorientar as suas previsões para levar em conta a capacidade receptiva dos seus alunos (DUTERCQ, 2014 p. 179).
Para o professor empenhado em promover a aprendizagem de seu aluno, há o imperativo de penetrar e interferir em sua atividade psíquica, notadamente seu pensamento. Essa necessidade antecede a tudo, e por isso mesmo, dirige a escolha dos modos de ensinar, pois sabe o professor que os métodos são eficazes somente quando estão, de alguma forma, coordenados com os modos de pensar do aluno. É nesse sentido, portanto, que podemos afirmar que o aluno dirige o seu próprio processo de aprender (TUNES; TACCA; JÚNIOR, 2005 p. 3)
Segundo Nóvoa (2014), “os docentes vivem num espaço carregado de afetos, de
sentimentos e de conflitos” (p. 229), o que também contribui para a complexidade da
atividade docente do ponto de vista emocional. Dessa forma, é compreensível que o número
excessivo de alunos em sala de aula, problema comum no sistema de ensino brasileiro,
intensifique a complexidade de interação pedagógica do professor com os alunos e gere
tensões cotidianas que trazem prejuízos tanto mentais quanto físicos aos professores,
conforme relatos de inúmeras pesquisas. Soma-se a essa questão, outros problemas
amplamente conhecidos, como baixos salários, perda de prestígio social da profissão,
expectativas de pais e gestores para o desempenho dos alunos, escassez de recursos
materiais, falta de apoio técnico-pedagógico e falta de incentivo ao aprimoramento
profissional, os quais colaboram para a desmotivação do docente e até o abandono do
magistério (LAROCCA; GIRARDI, 2011; LAPO; BUENO, 2002). Charlot (2008) argumenta que,
nestas condições de trabalho tão exigentes e complexas, os professores desenvolvem suas
próprias “estratégias de sobrevivência”. O autor explica que o primeiro objetivo do professor
é “sobreviver, profissional e psicologicamente, e só a seguir vêm os objetivos de formação
dos alunos. Quanto mais difíceis as condições de trabalho, mais predominam as estratégias
de sobrevivência” (p.23).
Charlot (2008) comenta que, a partir dos anos 1960 e 1970, a escola passa a ser
considerada de grande relevância na perspectiva do desenvolvimento econômico e social em
vários países do mundo, incluindo o Brasil. Nessa nova perspectiva, há um esforço para
universalizar a escola ampliando o acesso e a permanência de jovens das camadas sociais
mais desfavorecidas, que antes não ingressavam ou cursavam apenas as séries iniciais. A
partir de então, o fato de ter frequentado a escola, de ter obtido um diploma, passa a trazer
perspectivas de ascensão social e profissional e, portanto, começa a se estabelecer uma
54
nova visão de ingresso na vida adulta desses jovens, o qual articula o nível de estudos à
posição profissional e social. Segundo o autor, é a partir do estabelecimento desta nova
configuração escolar que começam a se estabelecer também alguns dos problemas
presentes até hoje no sistema educacional, como a relação dos alunos e pais com a escola e
os professores. Tal relação tornou-se tensa na medida em que o fato de ser bem-sucedido
ou não na escola passou a representar uma previsão do futuro desses alunos. A escola,
então, torna-se um espaço de concorrência entre as crianças, que têm que garantir as
melhores notas, diplomas, e consequentemente, conquistar as melhores vagas possíveis no
mercado de trabalho. Dessa forma, os professores passam a sofrer pressões, são vigiados e
criticados, pois os resultados escolares são compreendidos como importantes não só para os
alunos e suas famílias, mas para o futuro do país, impondo em seus ombros esta
responsabilidade. Hoje, espera-se do professor que ele seja capaz de adaptar sua ação ao
contexto, que desenvolva junto à escola um projeto político-pedagógico que leve em conta
as características dos alunos e das comunidades onde vivem, que desenvolva projetos com
os alunos que possibilitem melhorar a qualidade do processo de ensino-aprendizagem. Essas
novas exigências requerem uma nova cultura profissional do docente, entretanto a sua
formação ainda não consegue dar conta de toda a complexidade que constitui essa profissão
nos dias atuais (CHARLOT, 2008).
Lessard e Tardif (2014) colocam que ainda não emergiu ou se estabeleceu um novo
modelo de ensino pertinente e suficientemente consistente que possa substituir o que
prevalecia antes das mudanças históricas e sociais que se impuseram à escola e aos
professores e, nesta situação, “os docentes são abandonados a si mesmos, em sua relação
diária com os alunos e na construção do sentido que eles tentam encontrar ou dar à sua
experiência” (p. 259). Nesse sentido, Mizukami et al (2010) destacam a formação docente
como um dos desafios centrais a serem enfrentados nos dias atuais, pois é preciso pensar
em uma formação integral, que não se limite à transferência de conteúdos e métodos, mas
que também possa despertar e exercitar nos docentes aquilo que se quer que eles alcancem
com seus alunos: aprender a pensar, a refletir criticamente, a identificar e resolver
problemas, a investigar, a aprender.
Roldão (2007) argumenta que o professor não é aquele que apenas sabe um
conteúdo, mas sim aquele que sabe ensinar, sendo, por isso, um especialista dessa complexa
55
capacidade de mediar e transformar o saber curricular, ajustando-o ao conhecimento do
aluno e seu contexto. Este processo requer do professor um sólido conhecimento científico,
domínio técnico-didático, além de uma contínua postura analítica, de questionamento e
interpretação de sua ação.
3.2 PERCEPÇÕES SOBRE TECNOLOGIA E OS DESAFIOS PARA A INTEGRAÇÃO TECNOLÓGICA
NA PRÁTICA DOCENTE
Howard (2013) comenta que muitas das preocupações dos professores com relação
às TDIC e suas decisões pelo não uso das mesmas, muitas vezes estão ligadas a fatores
pessoais e de caráter emocional, representados pelo medo de correr riscos, como por
exemplo: arriscar o tempo de aula com um recurso que pode falhar ou arriscar sua própria
identidade profissional, já construída e consolidada com base em um determinado estilo de
práticas, para experimentar outras novas. A autora argumenta que os professores que se
sentem confiantes e competentes para usar o computador (no sentido de saber operá-lo
satisfatoriamente), têm uma percepção de que o risco para desenvolver práticas com a
tecnologia é mais baixo e, portanto, são mais propensos e abertos ao seu uso. Segundo a
pesquisadora, o medo de arriscar-se com as TDIC pode limitar a capacidade dos professores
em fazer avaliações mais profundas e racionais sobre a integração das tecnologias e suas
potencialidades pedagógicas. Dessa forma, Howard (2013) aponta que o não uso das TDIC
por estes professores, em geral, não está fundamentado em argumentos que possam
configurar uma posição ideológica contrária à tecnologia, mas sim relacionado à emoção do
medo, gerado pelo desconhecimento. Entretanto, não se pode desvalorizar essas razões,
pois são legítimas e, por isso, precisam ser discutidas tanto na formação docente quanto nos
contextos de trabalho dos professores que já atuam. A autora propõe que é a partir da
familiaridade com os recursos tecnológicos que os professores poderão reduzir suas
inseguranças e medos e que precisam vivenciar experiências pedagógicas positivas com as
TDIC, para que assim, possam tomar decisões mais racionais a respeito dessa questão.
Para além dessa questão emocional, conforme apontou Howard (2013), outros
autores vêm discutindo a influência das concepções pedagógicas dos professores quando
56
estes decidem pelo uso da tecnologia. Nesse sentido, as pesquisas se voltam para
compreender as formas como as TDIC estão sendo usadas na educação e a partir de quais
concepções pedagógicas (JUDSON, 2006; CHEN, 2008; ERTMER et al, 2012; ERTMER;
OTTENBREIT-LEFWICH, 2013).
Para Ertmer et al (2012), existem duas categorias de barreiras que interferem no
processo de integração das TDIC às práticas dos professores: barreiras externas e barreiras
internas. As barreiras externas são aquelas relativas ao contexto do exercício docente e
envolvem basicamente o acesso aos recursos tecnológicos, treinamento e suporte para usá-
los, enquanto que as barreiras internas estão relacionadas às concepções pedagógicas dos
professores, que influenciam sua visão sobre o papel da tecnologia no processo de ensino-
aprendizagem. Os pesquisadores consideram estas últimas mais difíceis de serem
transpostas, pois requerem tempo para que o professor aprenda a usar a tecnologia tanto
de forma técnica quanto pedagógica e, assim, adquira confiança para utilizá-la em sala de
aula e transformar sua prática. Ertmer e Ottenbreit-Lefwich (2013) discutem que aqueles
professores com fácil acesso às TDIC, mas com fortes concepções tradicionais, tendem a
limitar o uso das tecnologias a seus estudantes e a utilizá-las numa perspectiva também
tradicional. Sendo assim, destacam que não basta a inserção das tecnologias nas escolas
para que haja mudanças de abordagem, pois a tecnologia por si só não é capaz disso. A sua
contribuição para a transformação na qualidade do processo educativo depende, portanto,
de “como” usar a tecnologia em sala de aula e não de “qual”.
Alguns estudos mostraram que nem sempre as práticas dos professores são
condizentes com as concepções pedagógicas declaradas. Buscando analisar a relação entre
as concepções pedagógicas e a integração das TDIC à prática docente, estes estudos
verificam que embora a maioria dos professores afirme ter concepções construtivistas, a
observação de suas aulas, pelos pesquisadores, indica que suas práticas são
predominantemente tradicionais, mesmo que possam ter alguns elementos construtivistas.
Quando questionados sobre essa inconsistência, muitos atribuem ao contexto em que estão
inseridos: política, sociedade orientada por exames, currículo escolar orientado por
objetivos e calendários rígidos, falta de disponibilidade de equipamentos e infraestrutura
apropriada, falta de treinamento e exemplos de práticas de integração das TDIC, tempo
insuficiente para planejar, se familiarizar com os recursos e falta de suporte administrativo e
57
técnico adequado (JUDSON, 2006; LIM; CHAI, 2008; CHEN, 2008). Lim e Chai (2008)
acrescentam que a falta de familiaridade com as TDIC, assim como os problemas de contexto
apontados, podem fazer com que os professores nem mesmo reconheçam as
potencialidades e possibilidades das tecnologias para realizar práticas construtivistas. No
estudo de Chen (2008), a maioria dos professores participantes considerou que o
construtivismo era mais ideal do que viável.
Chen (2008) discute que as concepções dos professores e os fatores contextuais
podem afetar-se mutuamente e coloca como exemplo que, se uma instituição tem como
objetivo principal do ensino que seus estudantes alcancem boas notas nas avaliações que
priorizam a memorização, então os professores são pressionados a adotar estratégias e
mesmo a utilizar a tecnologia para atender a esse objetivo, reforçando, assim, concepções e
práticas tradicionais. No estudo de Lim e Chai (2008), os professores pesquisados
argumentaram que apesar de acreditarem que o processo de ensino-aprendizagem é
enriquecido com as TDIC, sua preocupação é que o uso dessas tecnologias, na perspectiva
construtivista, enfatiza mais os processos de colaboração, os quais não são avaliados pelos
exames a que os estudantes são submetidos. Assim, os pesquisadores argumentam que
ensinar para ajudar os estudantes a passar em exames é um objetivo que compete com o da
integração construtivista da tecnologia, o que pode contribuir para que os professores
deixem de investir no seu uso.
A abordagem pedagógica construtivista é amplamente defendida por pesquisadores
da área educacional por propor que o aprendizado deve ser um processo de construção e
reconstrução ativa do conhecimento, em que o professor atua como o orientador e
facilitador do aluno nesse processo, o que inverte a lógica da abordagem pedagógica
tradicional em que o professor atua como transmissor do conhecimento que é apreendido
pelo aluno de forma passiva (LIM; CHAI, 2008). Judson (2006) lembra que o construtivismo
não pressupõe o uso da tecnologia para que possa ser adotado pelos professores, mas que
as TDIC podem favorecer a realização das práticas nessa perspectiva, além de tornar a
prática educativa mais próxima da realidade tecnológica que vivemos em todas as áreas da
sociedade.
58
Lim e Chai (2008) colocam que a visão do processo educativo, como um todo, é
bastante divergente entre as abordagens tradicional e construtivista, inclusive com relação à
forma de integração da tecnologia. Os autores construíram um quadro onde apresentam
uma comparação entre as características de cada abordagem pedagógica a partir de
dimensões que os próprios pesquisadores utilizaram para identificar os perfis pedagógicos
dos professores que observaram em seu estudo, em Singapura (quadro 1).
QUADRO 1: DIFERENÇAS ENTRE AS ABORDAGENS TRADICIONAL E CONSTRUTIVISTA
Dimensões para Comparação
Abordagem Tradicional Abordagem Construtivista
Papel do professor
Expert; transmissor do conhecimento; direcionador de
experiências estruturadas
Co-construtor; facilitador; orientador; designer de experiências autênticas
Estilo de ensino Disseminação de
informações
Interativo e dialógico a partir de questões do
interesse dos estudantes
Papel do estudante
Receptor passivo do conhecimento; aprender
o que lhe é dado e reproduzir
apropriadamente
Construtor ativo e colaborativo do conhecimento;
desenvolver competências
Características do currículo
Hierárquico, sequencial, estático
Baseado em projetos/problemas que levem ao aprendizado de habilidades e informações
relevantes; dinâmico
Objetivos de aprendizagem
Baseados no domínio de conhecimento e fatos
Baseados no desenvolvimento de
habilidades nos estudantes para construir ou co-
construir seu conhecimento
Tipos de aula Palestra; trabalhos de
classe; testes
Projetos em grupo; experimentos feitos à mão;
pesquisa e síntese de informação; apresentação
Papel do computador
Ferramenta instrucional, como para exibir um
tutorial ou para atividades de repetição e memorização
Ferramenta para informar, construir, comunicar
Estratégias de avaliação Testes escritos e um Testes de
59
produto final, de natureza somativa
performance/desempenho, portfólios, de natureza
formativa
Fonte: LIM; CHAI, 2008 (traduzido pela autora)
Outra condição importante, também mencionada por pesquisadores, para favorecer
o processo de integração das TDIC à prática docente é a reconfiguração curricular
(MARINHO, 2006; COLL; MONEREO, 2010; TEZANI, 2011). De acordo com Coll e Monereo
(2010), não há muito sentido em promover a integração das TDIC à educação com o
argumento da sua relevância na sociedade da informação, mas ao mesmo tempo continuar
mantendo um currículo e uma organização do sistema educacional que ainda se baseiam em
objetivos e modos de aprendizagem tradicionais, que não são próprios da atual sociedade.
Os autores defendem que esta revisão curricular é necessária para o aproveitamento efetivo
das potencialidades das TDIC, mesmo que isso signifique a renúncia a objetivos e conteúdos
que talvez já tenham deixado de ser essenciais. Pérez Gómez (2015) coloca que o currículo
escolar deve priorizar uma seleção rigorosa e qualitativa do conteúdo a ser trabalhado para
assegurar ao indivíduo o desenvolvimento de capacidades cognitivas de ordem superior, que
lhe permitirão aprender ao longo de toda a vida. O autor comenta que os currículos
escolares atualmente têm “quilômetros de extensão e milímetros de profundidade” (p. 41), o
que leva a um relacionamento superficial com o saber e contribui para a identificação do
conhecimento com a reprodução de dados, datas, informações, fórmulas etc. Acumular e
reproduzir dados é uma tarefa que pode ser perfeitamente executada pelas ferramentas
tecnológicas atuais e, por outro lado, o pensamento crítico, criativo e a capacidade de
selecionar, avaliar e sintetizar são as habilidades estritamente humanas, de ordem superior,
mais valorizadas nos dias de hoje (PÉREZ GÓMEZ, 2015).
O quadro 2, a seguir, apresenta uma síntese dos desafios envolvidos na integração
das TDIC à educação, mais comumente citados pelos autores referenciados neste tópico,
seguindo uma classificação baseada no trabalho de Delgado (2013), que organizou os
desafios em seu texto em três níveis: macro (sistema educacional e políticas), meso
(infraestrutura escolar) e micro (fatores relacionados ao professor). É importante
compreender que, apesar da tentativa de categorização, todos os pontos estão intimamente
60
relacionados, indicando a complexidade do processo de integração das TDIC e a dificuldade
para o seu pleno desenvolvimento sem que todas estas questões sejam compreendidas e
resolvidas nos seus diversos contextos, por todos os sujeitos envolvidos, desde a gestão até
o professor na sua sala de aula.
QUADRO 2: SÍNTESE DOS PRINCIPAIS DESAFIOS PARA A INTEGRAÇÃO DAS TDIC À EDUCAÇÃO APONTADOS NA LITERATURA
NÍVEL MACRO (Sistema educacional e políticas)
VILARINHO, 2006; HACK; NEGRI, 2010;
TEZANI, 2011; ERTMER et al, 2012; COLL; MONEREO, 2010; PÉREZ GÓMEZ, 2015
- Sistema de ensino ainda muito centrado no professor, na transmissão de conhecimento; - Necessidade de apoio de especialistas/pesquisadores que auxiliem os professores no conhecimento da tecnologia e integração à sua prática (projetos de formação continuada) - formação inicial do futuro docente que contemple o uso pedagógico de TDIC; - Reconfiguração curricular; - Políticas públicas que privilegiam o acesso às TDIC e a infraestrutura, mas pouco discutem como promover a participação ativa de professores e gestores para que saibam como integrar as tecnologias ao seu cotidiano educacional;
NÍVEL MESO (Infraestrutura escolar)
VILARINHO, 2006; HACK; NEGRI, 2010;
TEZANI, 2011; ERTMER et al, 2012; ERTMER; OTTENBREIT-LEFWICH, 2013; JUDSON, 2006; LIM; CHAI, 2008; CHEN,
2008
- poucos computadores disponíveis; - turmas muito numerosas; - insuficiência da conexão à rede de Internet;
NÍVEL MICRO (Fatores relacionados ao professor)
VILARINHO, 2006; HACK; NEGRI, 2010;
TEZANI, 2011; ERTMER et al, 2012; COLL; MONEREO, 2010; ERTMER; OTTENBREIT-
LEFWICH, 2013; HOWARD, 2013; JUDSON, 2006; LIM; CHAI, 2008; CHEN,
2008
- dificuldade de controle sobre o acesso dos alunos à Internet; - insegurança e falta de domínio no uso de recursos tecnológicos; - falta de tempo adequado para o planejamento das aulas com TDIC; - concepções pedagógicas
61
É importante destacar que os professores não precisam saber tudo sobre todos os
recursos tecnológicos. O que eles precisam é de um repertório de tecnologias, aquelas que
estiverem disponíveis na sua escola e com as quais possam experimentar diferentes
estratégias para desenvolver sua prática docente e, assim, construir seu próprio
conhecimento sobre tecnologia e sobre como integrá-lo aos seus conhecimentos de
pedagogia e do conteúdo, o que se aproxima da proposta de Mishra e Koehler (2005; 2006),
abordada com mais detalhes no próximo tópico (MCCRORY, 2006).
3.3 CONHECIMENTO TECNOLÓGICO PEDAGÓGICO DO CONTEÚDO: UM CONHECIMENTO A
SER CONSTRUÍDO PELO PROFESSOR
Conforme pesquisadores têm reforçado que o potencial de transformação da
educação pelas tecnologias depende da forma como os professores as utilizam, os estudos
têm se voltado para compreender que conhecimentos o professor precisa ter para integrar a
tecnologia e, de fato, transformar sua prática (MISHRA; KOEHLER, 2005; 2006; ERTMER;
OTTENBREIT-LEFWICH, 2013; BENSON; WARD; LIANG, 2015; TEE; LEE, 2015). Para alcançar
uma perspectiva construtivista, que favoreça o uso das TDIC em distintas práticas
pedagógicas, conforme mencionado na seção anterior, o professor precisa, além de
conhecer as tecnologias, articular esse conhecimento àqueles que já possui sobre pedagogia
e conteúdo, desenvolvendo nesse processo, de acordo com Mishra e Koehler (2005; 2006),
um tipo de conhecimento particular, que os autores denominaram Conhecimento
Tecnológico Pedagógico do Conteúdo (Technological Pedagogical and Content Knowledge –
TPACK). Os autores construíram tal proposta a partir da ideia de Conhecimento Pedagógico
do Conteúdo (Pedagogical Content Knowledge – PCK), já introduzida anteriormente por
Shulman (1986), que discutiu que o PCK seria o conhecimento que existe na interseção entre
os conhecimentos de conteúdo e pedagogia, com o qual o professor é capaz de representar
o conteúdo para torná-lo compreensível a seus estudantes por meio de seu repertório
pedagógico (conforme já mencionado no tópico 3.1). Assim como os domínios de
conhecimento de conteúdo e pedagogia eram considerados independentes antes da visão
do PCK proposta por Shulman (1986), Mishra e Koehler (2005; 2006) colocam que, embora
62
ganhando importância e atenção das pesquisas, o conhecimento de tecnologia também era
considerado um domínio separado destes dois. Os pesquisadores propuseram, então, uma
abordagem teórica que integra o conhecimento de tecnologia aos demais conhecimentos
por considerar que os três estão intrinsecamente articulados na atividade docente, gerando,
com a interseção destes, o TPACK (inicialmente utilizava-se a sigla TPCK, mas atualmente
adota-se TPACK). Com o modelo proposto, figura 3, observa-se que além do TPACK e do
PCK, existem outras duas áreas de interseção que correspondem a outros dois tipos de
conhecimento, que seriam: Conhecimento Tecnológico do Conteúdo (Technological Content
Knowledge – TCK) e Conhecimento Tecnológico Pedagógico (Technological Pedagogical
Knowledge – TPK) (MISHRA; KOEHLER, 2005; 2006).
Figura 3: Representação da interligação entre os três domínios de conhecimento do professor (C – Conteúdo; P – Pedagogia; T – Tecnologia), indicando o Conhecimento Tecnológico Pedagógico do Conteúdo (TPCK) e os demais tipos de conhecimento das
interseções entre os domínios C, P e T – Conhecimento Tecnológico Pedagógico (TPK); Conhecimento Tecnológico do Conteúdo (TCK) e Conhecimento Pedagógico do Conteúdo
(PCK).
Fonte: MISHRA; KOEHLER, 2005; 2006
De acordo com Mishra e Koehler (2005; 2006), o domínio do conhecimento de
tecnologia (TK) compreende o conhecimento das tecnologias padrão, aquelas já
estabelecidas no ambiente escolar, como os livros, o giz e o quadro, e as tecnologias
C P
T
Conhecimento Pedagógico do Conteúdo - PCK
Conhecimento Tecnológico Pedagógico do Conteúdo
TPACK
Conhecimento Tecnológico Pedagógico - TPK
Conhecimento Tecnológico do Conteúdo - TCK
63
modernas representadas pelo computador e Internet. Este conhecimento envolve as
habilidades necessárias para operá-las, especificamente as TDIC. Considerando que as
tecnologias mudam constantemente, adquirindo novas características, o conhecimento
sobre elas precisa acompanhar tais mudanças, o que faz com que a capacidade de aprender
e se adaptar a novas tecnologias seja cada vez mais importante para o professor dos dias de
hoje.
O domínio do conhecimento tecnológico do conteúdo (TCK), que deriva da interseção
entre os domínios da tecnologia e conteúdo, consiste em saber como usar as tecnologias
para representar um conteúdo, tornando-o mais compreensível e até mais interessante aos
estudantes, uma vez que as tecnologias modernas podem oferecer novas e variadas
possibilidades de abordagem do conteúdo. No entanto, isso vai depender do nível de
conhecimento que o professor tenha dessas tecnologias (TK), já que, em geral, as mesmas
não são desenvolvidas para fins educacionais e por isso, precisam ser adaptadas de acordo
com cada conteúdo e planejamento do professor (MISHRA; KOEHLER, 2005; 2006).
O domínio do conhecimento tecnológico pedagógico (TPK), que deriva da interseção
entre os domínios da tecnologia e pedagogia, consiste em compreender como as tecnologias
podem favorecer o processo de ensino-aprendizagem dos alunos associando-as às
estratégias pedagógicas. Portanto, é preciso examinar as capacidades do recurso tecnológico
para reconhecer que funções pedagógicas podem ser enriquecidas com a implementação
deste recurso e, em última instância, favorecer o aprendizado dos estudantes. Para isso, o
conhecimento tecnológico (TK) também é importante, uma vez que o professor precisa
adaptar o uso da tecnologia para o seu objetivo pedagógico e, para isso, precisa conhecê-la
(MISHRA; KOEHLER, 2005; 2006).
O domínio do conhecimento tecnológico pedagógico do conteúdo (TPACK), que
integra os três componentes (conteúdo, pedagogia e tecnologia), consiste na compreensão
de: como trabalhar com estratégias pedagógicas que incluam tecnologia para ensinar e
representar os conteúdos, quais as dificuldades dos estudantes para aprender determinados
conceitos e como a tecnologia pode ajudar a tornar o aprendizado desses conceitos mais
fácil (MISHRA; KOEHLER, 2005; 2006). Para demonstrar como esse conhecimento pode se
concretizar na prática, os autores citam o seguinte exemplo: em uma aula de química
64
(conteúdo), o professor deseja utilizar representações simbólicas, como equações, ou
representações visuais, como diagramas moleculares (pedagogia) para favorecer o
entendimento do conceito ensinado aos alunos e, para isso, utiliza como recurso tecnológico
um software (CHIME, por exemplo), com o qual os alunos podem visualizar e até manipular
tais representações (tecnologia). Mishra e Koehler (2005; 2006) destacam que é essencial
compreender que não existe uma única solução tecnológica que se aplique a todos os
professores, todos os cursos ou todas as concepções de ensino e que, integrar tecnologia à
educação, requer a compreensão da complexidade das relações entre tecnologia, conteúdo
e pedagogia para, a partir daí, desenvolver estratégias e representações apropriadas e
contexto-específicas para cada docente. Conforme reconhecido pelos próprios autores e por
diversos pesquisadores que discutem aspectos contextuais (políticas educacionais, apoio
técnico ou da direção escolar, infraestrutura para acesso e utilização de tecnologias,
estudantes, comunidade etc.) que influenciam desenvolvimento de conhecimento do
professor (LIM; CHAI, 2008; CHEN, 2008; COLL; MONEREO, 2010; ERTMER ET AL, 2012;
HOWARD, 2013; NIESS, 2015; PÉREZ GOMEZ, 2015; ISLAM; GRÖNLUND, 2016), a
representação mais recente do modelo TPACK inclui o domínio do contexto, em volta do
domínio dos conhecimentos, para destacar sua relevância para a construção de
conhecimento dos docentes.
Figura 4: Representação do modelo TPACK incluindo o domínio do contexto.
Fonte: http://tpack.org
65
Após um estudo de quatro anos, acompanhando professores de Matemática, Niess et
al (2009) propuseram que o processo de desenvolvimento de TPACK ocorre por meio de
uma sequência de cinco etapas, pelas quais o professor passa a cada experiência de
integração de um recurso tecnológico à sua prática. Os autores basearam-se no processo de
decisão pela adoção ou rejeição de uma inovação, proposto por Rogers (1995), o qual
também é composto por uma sequência de cinco etapas. As etapas do processo de
desenvolvimento de TPACK, propostas por Niess et al (2009), que envolvem reflexão e ação
do professor com relação às TDIC e sua prática, são as seguintes:
1. Reconhecer (recognizing): quando o professor reconhece a possibilidade de que um
determinado recurso tecnológico pode ser usado para algum conteúdo de sua disciplina,
porém ainda não concretiza essa integração na sua prática de ensino;
2. Aceitar (accepting): quando o professor forma uma visão acerca do recurso tecnológico,
que pode ser favorável ou não ao seu uso no processo de ensino-aprendizagem;
3. Adaptar (adapting): quando o professor se envolve em atividades que lhe permitem
decidir pela adoção ou rejeição do recurso tecnológico para sua prática. Em geral, estas
atividades são semelhantes às que já realiza sem tecnologia;
4. Explorar (exploring): quando o professor implementa o recurso tecnológico,
experimentando estratégias pedagógicas inovadoras para o ensino de determinado
conteúdo;
5. Avançar (advancing): quando o professor avalia os resultados de sua decisão de integrar o
recurso tecnológico em sua prática;
A figura 5 representa o processo de desenvolvimento de TPACK com as cinco etapas
propostas por Niess et al (2009). À medida que o professor amplia seu conhecimento de
tecnologia, o articula aos conhecimentos de conteúdo e pedagogia e consegue promover um
processo de ensino-aprendizagem inovador com a integração das TDIC, em que os alunos
aprendem com as tecnologias, então o professor desenvolve seu TPACK. Os autores
destacam que o professor passa por essas etapas de desenvolvimento a cada novo recurso
tecnológico que planeja inserir em sua prática, o que significa que o processo de
66
desenvolvimento de TPACK se dá de maneira particular para cada professor, dependendo
tanto de suas concepções quanto do contexto.
Figura 5: Representação das etapas que compõem o processo de desenvolvimento de TPACK, de acordo com Niess et al (2009).
Fonte: Niess et al (2009)
Niess et al (2009) descrevem o exemplo de um professor de Matemática passando
por estes cinco estágios. Inicialmente, o professor reconhece que um determinado recurso
tecnológico, como uma calculadora, pode ser usado para apoiar processos matemáticos
como os que envolvem raiz quadrada. O professor, então, pode refletir e aceitar a
calculadora como uma alternativa ao cálculo algorítimico que leva ao resultado da raiz
quadrada, embora ainda se preocupe que seus alunos percam a habilidade de realizar esse
cálculo por conta do uso da calculadora. No estágio de adaptação, o professor se dispõe a
tentar alguma atividade na sala de aula, porém sem inovar a proposta pedagógica, inserindo
o uso do recurso tecnológico em uma atividade similar às outras que desenvolve sem
tecnologia. Nesse sentido, o professor pode propor que os alunos façam o cálculo manual da
raiz quadrada e depois comparem o resultado com a calculadora. Na etapa seguinte,
considerando que a experiência com as calculadoras em sala de aula foi bem sucedida e
sentindo-se mais confiante, o professor passa a explorar tópicos do seu currículo de
67
Matemática onde pode usar a função de raiz quadrada da calculadora como uma ferramenta
de trabalho para os alunos desenvolverem habilidades de raciocínio matemático mais
complexas, ampliando o foco da aula que se limitava a aprender a calcular a raiz quadrada
para a compreensão e aplicação da raiz quadrada em problemas matemáticos. Dessa forma,
o professor propõe uma atividade inovadora para si e seus alunos, que podem resolver
questões mais complexas que envolvam raiz quadrada e ter o apoio da calculadora para
fazer a parte mecânica do cálculo. Na quinta etapa, o professor avalia os resultados obtidos
na etapa anterior e, em caso de avaliação positiva, busca ampliar para todo o currículo a
experiência bem sucedida que teve anteriormente. Nesse sentido, esse professor avança
para incorporar a calculadora como ferramenta de trabalho pedagógico para seus alunos em
outros tópicos do currículo de Matemática, além da raiz quadrada, assim como a perspectiva
de foco no raciocínio matemático ao longo dos próximos conteúdos que forem trabalhados.
Percebe-se portanto, com este exemplo, que há uma mudança de perspectiva e
prática pedagógica desse professor de Matemática com a integração de TDIC quando este
alcança o quinto estágio do processo. As duas etapas iniciais (Reconhecer e Aceitar)
constituem-se essencialmente como momentos de reflexão do professor sobre a tecnologia
e a possibilidade desta ser usada para o ensino de algum conteúdo e como isso pode ser
feito. As outras três etapas (Adaptar, Explorar e Avançar) constituem-se não apenas como
etapas reflexivas, mas também de ação, nas quais o professor cria situações reais para
experimentar e avaliar a inserção da tecnologia em sua prática. Essa mudança no perfil
pedagógico de práticas do professor é uma expectativa comum, defendida por estudiosos
(MISHRA; KOHLER, 2005; 2006; HOFER; HARRIS, 2010; HARRIS; GRANDGENETT; HOFER,
2010; NIESS et al, 2009; NIESS, 2015). Espera-se que, com o desenvolvimento de TPACK, o
professor possa, em última instância, integrar as TDIC numa perspectiva pedagógica mais
centrada no aluno, que atenda a demanda de formação de cidadãos autônomos,
conscientes, criativos, capazes de refletir, colaborar e contribuir para as questões da
sociedade. Mishra e Koehler (2006), explicitam essa relação de TPACK com uma
transformação das práticas de ensino no seguinte trecho traduzido:
TPCK é a base do bom ensino com tecnologia e requer uma compreensão da representação de conceitos usando tecnologias; técnicas pedagógicas que usem tecnologias de formas construtivas para ensinar o conteúdo; conhecimento do que faz conceitos serem difíceis ou fáceis de aprender e como a tecnologia pode ajudar com alguns dos problemas que os estudantes enfrentam; conhecimento das
68
concepções prévias dos estudantes; e conhecimento sobre como as tecnologias podem ser usadas para construir sobre conhecimentos existentes e desenvolver novas epistemologias ou fortalecer as antigas. (p. 1029 – tradução nossa)
O modelo proposto por Mishra e Koehler (2005; 2006) traz também uma nova
perspectiva para a formação docente, que tradicionalmente enfoca o desenvolvimento de
conhecimento técnico sobre recursos tecnológicos e não como inseri-los na prática
pedagógica para ensinar um conteúdo. Este tipo de abordagem para a formação docente é
considerada descontextualizada, pois não remete à realidade da prática na sala de aula e à
reflexões sobre como integrar a tecnologia de forma consistente e transformadora (JAIPAL-
JAMANI; FIGG, 2015). Jaipal-Jamani e Figg (2015) comentam que as pesquisas têm
demonstrado que ter proficiência para o uso de recursos tecnológicos não necessariamente
se reflete em um uso construtivo ou inovador desses recursos no cotidiano das práticas
pedagógicas. Segundo os autores, isto reforça a compreensão de que o processo de
desenvolvimento profissional do docente não pode se pautar numa abordagem
tecnocêntrica, mas sim voltar-se para uma abordagem onde o foco está em aprender a
ensinar um conteúdo com a articulação da tecnologia.
Estudos vêm mostrando que projetos de desenvolvimento profissional de
professores que se baseiam na colaboração entre eles, para integração de TDIC no ensino,
têm adotado a abordagem teórica do TPACK como base para que os professores reflitam e
aprendam a construir práticas inovadoras com TDIC. Estas propostas têm proporcionado
melhores resultados na prática desses professores do que aquelas que se baseiam apenas na
formação de habilidades técnicas de uso da tecnologia. Os professores participantes desses
grupos de colaboração tendem a criar planos de aula integrando recursos tecnológicos de
maneiras distintas daquelas que eles declaravam desenvolver antes da experiência
colaborativa, sugerindo desenvolvimento de TPACK (ALBION et al, 2015; KAFYULILO; FISSER;
VOOGT, 2016). Nesse sentido, diversas publicações têm descrito experiências desenvolvidas
e organizadas entre os próprios professores e seus líderes escolares (coordenadores ou
diretores), incentivados por políticas governamentais, assim como entre professores, líderes
e pesquisadores de universidades, como parte de projetos de pesquisa educacional
(DUNCAN; CONNER, 2013; WANG; ZHANG, 2014; ALBION et al, 2015; KAFYULILO; FISSER;
VOOGT, 2016). Kafyulilo, Fisser e Voogt (2016) destacam que projetos que envolvem o apoio
de pesquisadores contribuem para a construção de conhecimento dos professores. Neste
69
caso, os pesquisadores auxiliam na discussão e desenvolvimento de práticas pedagógicas
com TDIC, contribuindo para a ampliação das visões dos professores acerca de suas
concepções e práticas.
Com o objetivo de ajudar o professor a pensar sobre o caminho para a integração de
tecnologia na sua prática, Hofer e Harris (2010) apresentam uma proposta, que serve como
uma orientação do que deve ser considerado ao longo do planejamento de atividades
pedagógicas. Segundo os autores, trata-se de uma abordagem que denominaram de “Tipos
de Atividade de Aprendizagem” (“Learning Activity Types” – LAT), com a qual pretendem
auxiliar os professores a articular metas de aprendizagem, atividades de aprendizagem para
conteúdos específicos e recursos tecnológicos. As etapas de planejamento pedagógico
seriam: 1) identificar os objetivos de aprendizagem que pretende que os estudantes
alcancem; 2) considerar o contexto da sala de aula e estilos de aprendizagem dos
estudantes; 3) selecionar e organizar tipos de atividades de aprendizagem para combiná-las
e criar uma experiência de aprendizagem voltada para um determinado conteúdo; 4)
selecionar estratégias de avaliação; 5) selecionar recursos que podem ajudar os estudantes
nesta experiência de aprendizagem.
Hofer e Harris (2010) argumentam que, o que eles compreendem como importante
nessa sequência de decisões, é que o processo começa com a identificação dos objetivos de
aprendizagem dos estudantes e termina com a escolha do(s) recurso(s) tecnológico(s)
apropriado(s). Dessa forma, o professor concentra-se, inicialmente, em seus conhecimentos
de pedagogia e conteúdo, para então articular ao conhecimento de tecnologia,
desenvolvendo seu TPACK como parte de um planejamento e implementação de práticas de
ensino que efetivamente são pensadas para favorecer o processo de aprendizagem do
aluno. Segundo os autores, quando o professor planeja a prática a partir da escolha de um
recurso tecnológico, está seguindo uma perspectiva tecnocêntrica, que coloca o foco no
recurso e não no aprendizado do aluno.
Considerando que TPACK se desenvolve na relação entre conhecimento do professor
e experiência em sala de aula, Hofer e Harris (2010) ressaltam que professores em serviço e
aqueles que estão em formação têm diferentes perspectivas para criar planejamentos de
aulas. Os professores experientes têm muito mais conhecimento pedagógico (PK),
70
conhecimento de conteúdo (CK) e conhecimento pedagógico do conteúdo (PCK) para
recorrer do que os professores que ainda estão se formando, além do conhecimento prático
de gerenciar uma sala de aula e experiência com a diversidade de estilos de aprendizagem e
preferências dos alunos. Segundo os autores, sua proposta de abordagem “Tipos de
Atividades de Aprendizagem” (LAT), pode contribuir para o desenvolvimento profissional de
professores em distintos estágios de carreira, ajudando-os a considerar a combinação de
uma grande gama de possibilidades de atividades de aprendizagem com tecnologias
apropriadas para estas atividades. Assim, eles apresentam, em Harris e Hofer (2011)2, uma
taxonomia com os tipos de atividades de aprendizagem, breves descrições das mesmas e
indicações de recursos tecnológicos que melhor se adequam a cada tipo de atividade
apontada. Com a colaboração de especialistas em tecnologia em diferentes áreas
curriculares, os autores desenvolveram taxonomias para matemática, ciências, estudos
sociais, música, educação física, artes visuais, alfabetização para nível primário, línguas
estrangeiras e língua inglesa e literatura para nível secundário.
A taxonomia proposta pelos autores para a área de Ciências se estrutura em três
grupos, cada um reunindo tipos de atividades de aprendizagem com focos distintos: 1)
ajudar o estudante a construir conhecimento sobre conceitos científicos (como por exemplo:
leitura de texto, discussão, visualização de imagens/objetos, pesquisa etc.); 2) ajudar o
estudante a construir conhecimento sobre procedimentos científicos, referentes à
investigação (como por exemplo: coleta de dados, medidas, observação, cuidados de
segurança etc.); 3) ajudar o estudante a expressar seu conhecimento sobre um conteúdo
científico (atividades que permitam ao estudante apresentar e compartilhar suas hipóteses e
compreensões de conceitos, procedimentos e suas relações – por exemplo: escrever um
relatório, criar uma imagem/representação, debate, desenvolver um modelo ou jogo etc.)
(HARRIS; HOFER, 2011).
Hofer e Harris (2010) colocam que essa proposta foi pensada para promover
experiências de desenvolvimento profissional de professores, seja em serviço ou em cursos
de formação. De acordo com os autores, uma vez que os professores determinam a
sequência de atividades de aprendizagem que vão adotar para um determinado projeto ou 2 A referência Harris e Hofer (2011) trata-se de uma página wiki criada pelos autores em 2009, conforme citação em Hofer e Harris (2010), porém a mesma foi atualizada pelos autores em 2011 e, por isso, é esta referência atualizada que é usada no presente texto.
71
unidade de conteúdo, eles podem avaliar as sugestões de recursos tecnológicos associados
às atividades selecionadas, para então determinar qual deles (ou talvez nenhum) pode ser
útil e enriquecer a experiência de aprendizagem que está sendo planejada.
Harris e Hofer (2014) comentam que, desde que foi introduzida por Mishra e Koehler
(2006), a abordagem TPACK tem sido foco crescente de diversos trabalhos de pesquisa. No
entanto, destacam que estes trabalhos têm se concentrado especialmente no ensino
superior, no contexto da formação de professores e discussões entre pesquisadores,
enquanto que a difusão de pesquisas no contexto escolar tem sido consideravelmente
menor. Por isso, os autores desenvolveram uma pesquisa acerca do uso da abordagem
TPACK em escolas com projetos de desenvolvimento profissional de seus professores e que
incluíram, em suas documentações, disponibilizadas na web, referências ao TPACK. Os
pesquisadores encontraram cerca de 60 escolas primárias e secundárias (principalmente na
América do Norte e Austrália) com estes projetos. A partir da leitura desses documentos, os
autores identificaram que 27 destas escolas pareciam ter incorporado TPACK como uma
abordagem fundamental para o desenvolvimento profissional dos professores, sendo que
em algumas delas foi criado até mesmo um cargo específico para isso, “TPACK coaches”, em
que professores teriam o trabalho específico de ajudar os demais professores da escola a
como e quando integrar tecnologia ao currículo e à prática pedagógica, atuando tanto
individualmente quanto em grupos, como mentores.
Um grupo de representantes escolares com descrições de usos distintos de TPACK
em seus projetos foi convidado para apresentar seus trabalhos em um simpósio organizado
pelos próprios pesquisadores. Todos os participantes destacaram que ainda estão no
processo de implementação da abordagem TPACK em seus projetos, mas que esta trouxe
uma visão mais holística para seus professores e que os fez perceber que, antes do TPACK,
estavam trabalhando de forma tecnocêntrica, o que não gerava os resultados esperados
pelos projetos escolares de integração tecnológica (HARRIS; HOFER, 2014). Harris e Hofer
(2014) perceberam que nenhum dos representantes das escolas falou sobre TPACK como
um conhecimento construído pelo professor para incorporar tecnologias ao processo de
ensino-aprendizagem, conforme compreendido por pesquisadores. Assim, para esses
participantes, o TPACK não parecia ser um conhecimento do professor, mas algo externo a
ele, como um guia orientador ou uma ferramenta de raciocínio para os
72
líderes/coordenadores e “coaches” (em duas escolas) do projeto, para que eles mesmos
pudessem avaliar as práticas com TDIC implementadas pelos professores. Para os
pesquisadores, isso sugere que os projetos apresentados não tinham como foco favorecer a
compreensão e o desenvolvimento de TPACK pelos professores, com o qual poderiam atuar
com independência em sala de aula.
Para Harris e Hofer (2014), são necessários mais estudos acerca de como TPACK é
construído e integrado entre os professores das escolas básicas, quais aspectos do contexto
podem influenciar o desenvolvimento de TPACK e a possibilidade de diferentes concepções
acerca desta abordagem e seu uso entre profissionais da educação básica e superior. Assim,
o estudo desses autores ressalta a importância da aproximação de pesquisadores a projetos
de desenvolvimento profissional docente, para que o conceito de TPACK possa ser
amplamente debatido e para que estes projetos tenham resultados sustentáveis. Essa
sustentabilidade está na independência do professor para construir suas práticas com
tecnologias a partir do TPACK que ele começa a desenvolver nesses projetos. Afinal, a ideia
não é que o professor dependa de alguém para criar planos de aula integrados a recursos
tecnológicos, mas que ele aprenda e compartilhe com alguém ou um grupo (professores e
pesquisadores) as possibilidades e experiências que existem para que ele mesmo decida
suas ações, criando nesse processo seu próprio TPACK.
Embora não tenham discutido especificamente o desenvolvimento de TPACK, o
estudo de Levin e Wadmany (2008) analisou os perfis de práticas e concepções de seis
professores de uma escola que lhes proporcionou amplo acesso a TDIC, inclusive em sala de
aula, a fim de verificar mudanças nesses perfis ao longo de três anos de observações de
aulas desses professores, além de questionários e entrevistas. Os autores, então,
identificaram três perfis distintos nesse grupo de professores acompanhado. O primeiro
correspondeu àqueles professores que apresentaram uma mudança apenas superficial ao
longo desses três anos, citando o exemplo de uma professora que tinha inicialmente uma
visão de que ela transmite e o aluno absorve a informação passivamente, para uma
percepção de que o aluno pode obter informação com o professor, mas também pode ter a
capacidade e independência de aprender com outras fontes externas. No entanto, a
perspectiva tradicional de ensino permaneceu, assim como a visão de tecnologia como
ferramenta para auxiliar sua prática tradicional.
73
No segundo perfil, os pesquisadores identificaram professores que apresentaram
mudanças mais significativas no sentido de demonstrarem maior conscientização da
necessidade de mudança no processo de ensino-aprendizagem com a integração de TDIC.
Estes professores também demonstraram mudança na visão sobre tecnologias, passando da
perspectiva inicial de ferramentas para apoiar o ensino tradicional a recursos para
empoderar tanto os alunos quanto os próprios professores e proporcionar atividades mais
criativas e colaborativas. Apesar de ainda apresentarem concepção tradicional, focada na
transmissão de conteúdo, os autores consideraram que houve um movimento de mudança
consciente de um posicionamento fortemente tradicional para uma direção mais
construtivista para esses professores.
No terceiro perfil apontado por Levin e Wadmany (2008), os autores perceberam
mudança mais radical nos professores, pois demonstraram, em suas falas e práticas,
concepção de ensino bastante distinta dos demais perfis, passando a implementar distintas
modalidades de atividades centradas nos alunos e lhes permitindo maior participação
inclusive com sugestões ao planejamento destas atividades. Quanto às TDIC, os professores
deste perfil demonstraram percepção de que as tecnologias são parte do processo de
ensino-aprendizagem, usadas para proporcionar aprendizagem baseada em investigação e
reflexão. Estes professores também valorizaram a colaboração entre colegas e
pesquisadores e demonstraram objetivo de continuar projetos de colaboração após o
período de acompanhamento dos pesquisadores na escola, sugerindo postura de auto-
confiança desses professores para seguirem com uma nova perspectiva de ensino por conta
própria. Assim, os professores deste terceiro perfil foram aqueles que passaram de uma
concepção tradicional, como os outros, para uma concepção mais construtivista de ensino e
uso das TDIC, mais próxima da que é defendida pelos pesquisadores.
O estudo de Levin e Wadmany (2008) é um exemplo concreto da complexidade e
individualidade do processo de mudança de concepções e práticas e, por conseguinte, do
desenvolvimento de TPACK, conforme outros pesquisadores têm discutido (HOFER; HARRIS,
2010; HARRIS; GRANDGENETT; HOFER, 2010; GRAHAM, 2011; CAVANAGH; KOEHLER, 2013;
NIESS, 2015). Segundo Niess (2015), o desenvolvimento de TPACK não é linear, pois requer
que, para cada novo conteúdo, o professor repense suas estratégias de uso das TDIC que
melhor apoiem cada conteúdo.
74
Mishra, Koehler e Henriksen (2011) ressaltam que a abordagem TPACK não oferece
diretrizes sobre qual conteúdo deve ser ensinado, que perspectivas pedagógicas são
apropriadas e nem sobre quais tecnologias devem ser usadas no ensino. O importante é que
os professores se perguntem o que os estudantes de hoje precisam aprender para serem
bem sucedidos na sociedade em que vivem e, portanto, desenvolvam seu conhecimento e
práticas nesse sentido.
4 METODOLOGIA
4.1 CONSIDERAÇÕES SOBRE O DELINEAMENTO METODOLÓGICO
Considerando a especificidade da presente investigação cujo alvo é uma determinada
professora de Ciências e suas práticas com TDIC, além das características metodológicas
adotadas no decorrer da mesma, pode-se dizer que tais características aproximam este
estudo do tipo de pesquisa qualitativa denominada como Estudo de Caso. De acordo com
Lüdke e André (2013), a pesquisa do tipo estudo de caso se caracteriza especialmente por se
dedicar a um caso bem delimitado, que pode ser similar a outros, porém é ao mesmo tempo
distinto por despertar um interesse singular. Um princípio básico do estudo de caso é que
para a maior apreensão do objeto, é preciso levar em conta o contexto onde ele se insere,
em que o pesquisador busca compreender e revelar a multiplicidade de dimensões
envolvidas na questão estudada. Assim, apesar do aspecto unitário do caso, valoriza-se o
aspecto da análise situada e em profundidade. A apresentação dos dados de pesquisa de um
estudo de caso pode apresentar um estilo informal, narrativo, descritivo, que permita uma
aproximação maior do leitor com a experiência relatada (LÜDKE; ANDRÉ, 2013).
Segundo André (2013), é a partir da década de 1980 que o estudo de caso começa a
ganhar mais espaço nas pesquisas da área educacional, demonstrando grande potencial
especialmente para as questões relacionadas à escola.
Se o interesse é investigar fenômenos educacionais no contexto natural em que ocorrem, os estudos de caso podem ser instrumentos valiosos, pois o contato
75
direto e prolongado do pesquisador com os eventos e situações investigadas possibilita descrever ações e comportamentos, captar significados, analisar interações, compreender e interpretar linguagens, estudar representações, sem desvinculá-los do contexto e das circunstâncias especiais em que se manifestam. Assim, permitem compreender não só como surgem e se desenvolvem esses fenômenos, mas também como evoluem num dado período de tempo (ANDRÉ, 2013, p.97).
Segundo André (2013), a definição do tipo de pesquisa é um dos itens a ser
mencionado na metodologia do trabalho, se sua tipificação é evidente e já se encontra
estabelecida na literatura, porém pode acontecer de não haver uma designação corrente
para o desenho metodológico que o pesquisador pretende desenvolver. Nesse caso, o mais
importante numa pesquisa qualitativa, segundo a autora, é a descrição clara do caminho
percorrido para alcançar os objetivos, o que indica a preocupação com o rigor científico do
trabalho, e não propriamente a atribuição de um nome ao tipo de pesquisa. Assim, esta
questão revela a flexibilidade com que as pesquisas qualitativas podem se desenvolver para
a investigação de distintas questões sob distintos focos e contextos, contribuindo para a
construção de distintas perspectivas de estudo, como foi o caso do presente trabalho.
Dentre os objetivos específicos desta pesquisa está o suporte à professora no contato
com as TDIC e o desenvolvimento de forma colaborativa de estratégias pedagógicas para o
uso de tecnologias, como forma de contribuir para a mudança das práticas desta professora.
Para tanto, foi estabelecida uma relação de parceria com a professora para discussão e
planejamento das estratégias de uso das TDIC. Nesse sentido, a atuação da pesquisadora foi
além da observação das práticas da professora, o que trouxe a especificidade da perspectiva
colaborativa entre pesquisadora e sujeito do estudo. Portanto, pode-se dizer que a pesquisa
foi desenvolvida com base em uma abordagem qualitativa amplamente difundida, que é o
estudo de caso, porém sob uma perspectiva própria, compreendida como a mais adequada
para atender a todos os objetivos propostos, denominada, para este trabalho, como estudo
de caso colaborativo.
O estudo de campo foi conduzido ao longo de dois anos e meio, compreendidos
entre o segundo semestre de 2012 e o segundo semestre de 2014. Neste período, as aulas
da professora de Ciências foram acompanhadas, na frequência de duas vezes por semana. O
período inicial, referente ao segundo semestre de 2012, foi considerado como um período
de diagnóstico, no qual a pesquisadora iniciou sua aproximação à professora e seu contexto
76
de trabalho, estabelecendo a negociação de como se realizaria a parceria e atuação da
pesquisadora no seu ambiente de sala de aula. Esta fase permitiu a compreensão real do
contexto e do perfil pedagógico da professora, sendo portanto, importante para o posterior
planejamento das ações de intervenção nas suas práticas pedagógicas que seriam propostas
e desenvolvidas em colaboração.
Ao longo deste período de acompanhamento da professora, os dados foram
coletados por meio das técnicas etnográficas de observação participante, diário de campo e
entrevistas, originárias da Etnografia, que também se trata de um método de pesquisa
qualitativa. Este método teve sua origem em estudos da área da Antropologia, porém suas
técnicas de coleta de dados se disseminaram e foram incorporados por outras áreas de
estudo, especialmente a Educação (NEVES, 2006; ROCHA; ECKERT, 2008).
A observação participante consiste no exercício do pesquisador em observar o grupo
de interesse a partir das perspectivas mútuas de estranho e membro do grupo, uma vez que
o pesquisador se engaja nas atividades que fazem parte do cotidiano dos sujeitos, tornando-
se com o tempo um membro do grupo, mas sem deixar de ser sempre um estranho. A
preocupação em manter um certo distanciamento é importante para que o pesquisador seja
capaz de perceber as particularidades dentro do cotidiano que tende a se tornar cada vez
mais familiar com o tempo, permitindo a constante reflexão sobre as questões que o
levaram à pesquisa (FLICK, 2009). Spradley (1980, apud FLICK, 2009) coloca que a observação
participante se desdobra em três fases: (1) observação descritiva; (2) observação focalizada
e (3) observação seletiva. Na fase inicial da pesquisa ocorre a observação descritiva, quando
o pesquisador está iniciando seu contato com o campo e tem a oportunidade de apreender
informações gerais sobre o grupo, estando atento a todas as situações e características
possíveis, realizando descrições não-específicas que o ajudarão a formular questões de
pesquisa mais específicas. A observação focalizada ocorre em seguida, a partir de uma
restrição do olhar do pesquisador àqueles processos e problemas que ele julgar essenciais
para sua pesquisa. Finalmente, a observação seletiva corresponde à fase final de coleta de
dados quando o pesquisador se concentra em encontrar mais indícios e exemplos sobre os
processos e problemas identificados na fase anterior. É importante ressaltar que a
observação descritiva continua sendo importante durante toda a etapa de coleta de dados
77
de modo que o pesquisador esteja sempre atento ao contexto geral do campo em que está
inserido.
O diário de campo é um instrumento essencial para o observador, pois é onde são
registradas todas as informações observadas e as conversas travadas com os sujeitos, ou
seja, tudo que esteja relacionado com sua proposta de pesquisa, consistindo em uma
matéria bruta de dados que mais tarde serão lapidados (TEZANI, 2004). Neves (2006) coloca
ainda que no diário de campo também devem ser registradas as impressões do pesquisador
com relação aos acontecimentos que observa, as quais representam a subjetividade do
pesquisador perante tais acontecimentos e serão fundamentais para a construção de seu
texto. Rocha e Eckert (2008) complementam colocando que o diário de campo constitui um
espaço para o pesquisador “avaliar sua própria conduta em campo, seus deslizes e acertos
junto às pessoas e/ou grupos pesquisados, numa constante vigilância epistemológica” (p.
15).
Assim como o diário de campo, a entrevista é uma outra técnica de registro
etnográfico que complementa a observação do pesquisador, pois contribui para a
compreensão que o pesquisador busca de seus sujeitos de pesquisa ao lhes dar a chance de
expor suas histórias, opiniões, angústias, experiências, etc. Com a entrevista, o pesquisador
tem a oportunidade de confrontar suas próprias interpretações do que observa com o que o
entrevistado lhe apresenta, podendo construir suas conclusões de forma mais profunda,
além de dar voz ao sujeito em sua pesquisa (MIGUEL, 2010). Segundo Rocha e Eckert (2008)
as entrevistas devem ser não diretivas ou semiestruturadas e, portanto, “livres, abertas,
semi-guiadas, repletas de trocas mútuas de conhecimento” (p. 14) assemelhando-se a uma
conversa, contribuindo para que o entrevistado se sinta à vontade para expressar suas
reflexões. Entrevistas do tipo estruturadas com perguntas fechadas, semelhantes a
questionários, não têm a flexibilidade do diálogo e podem restringir o desenvolvimento da
fala e da reflexão do entrevistado. Nesse sentido, Miguel (2010) coloca que o propósito de
uma entrevista para pesquisa qualitativa não é o de captar respostas para perguntas
específicas, mas de buscar tentativas de compreender a experiência de outras pessoas e os
significados que elas atribuem para essas experiências, implicando no modo como as
executam.
78
4.2 A COLABORAÇÃO ENTRE PROFESSOR E PESQUISADOR PARA A PESQUISA EM EDUCAÇÃO:
UMA TENDÊNCIA DE PESQUISA E PRÁTICA
Pesquisas desenvolvidas por meio de parcerias entre pesquisadores de universidades
e professores da escola básica, têm sido cada vez mais relevantes, consideradas como uma
forma de ampliar o conhecimento acerca das práticas educativas e de aproximar teoria e
prática. Propostas de estudo em parceria entre universidade e escola começam a surgir e
apontar resultados positivos por volta da década de 1970, quando a distância entre a teoria
acadêmica e a prática cotidiana dos professores passa a ser também questionada na
literatura. Estes estudos envolvem pesquisadores universitários e professores da escola
básica, que se propõem a desenvolver, de forma colaborativa, uma investigação acerca de
questões inerentes à prática educativa para melhorá-la e, consequentemente, beneficiar o
aprendizado dos estudantes. Nesse sentido, o pesquisador não se insere no espaço escolar
apenas para coletar informações a serem usadas como dados de sua pesquisa, mas para
desenvolver projetos com professores, voltados para suas preocupações e necessidades, por
meio de uma relação que permite tanto a troca quanto a construção de conhecimentos
entre esses profissionais (WANG; ZHANG, 2014; DUNCAN; CONNER, 2013). Segundo Duncan
e Conner (2013), pesquisas educacionais desenvolvidas em parceria universidade-escola são
atualmente uma das formas de pesquisa que mais recebe incentivo financeiro em diversos
países.
Nessa perspectiva de pesquisa, a escola e os professores parceiros são vistos como
produtores de conhecimento e, por isso, os pesquisadores analisam seus pontos de vista e
suas maneiras de enfrentar as situações, considerando os limites e recursos de seus
contextos, para que sejam desenvolvidos projetos de mudança de prática que sejam
coerentes com a realidade de cada escola e professor (WANG; ZHANG, 2014; DESGAGNÉ,
2007). De acordo com Desgagné (2007), a parceria pode ser vista simultaneamente como
uma atividade de pesquisa e de formação para os professores, uma vez que “aliar-se aos
professores para co-construir um objeto de conhecimento é também fazê-los entrar em um
processo de aperfeiçoamento sobre um aspecto da prática profissional que exercem” (p. 14).
79
Ainda segundo o autor, os professores não precisam necessariamente participar das tarefas
formais que cabem ao pesquisador, como a definição de um quadro conceitual para tratar o
objeto de pesquisa, metodologia de coleta e análise dos dados, embora possam sim se
engajar nas mesmas caso se interessem e considerem importante para seu desenvolvimento
profissional. No entanto, sem entrar nas tarefas formais de pesquisa, os professores podem
se unir aos pesquisadores em um processo de reflexão sobre algum aspecto ligado à sua
prática, que os levará a explorar uma nova situação ou perspectiva que os leve ao benefício
de sua prática, constituindo, assim, uma oportunidade de aperfeiçoamento profissional
(DESGAGNÉ, 2007). McLaughlin e Black-Hawkins (2004) acrescentam que o objetivo geral
das parcerias entre universidade e escola é desenvolver pesquisas que tenham impacto nas
práticas educacionais, porém, ao mesmo tempo, é preciso observar, conceituar e analisar
processos, estruturas, condições e ações que suportam e/ou limitam esse desenvolvimento.
Dessa forma, consideram que outra intenção implícita ao estudo, é pesquisar, também, a
evolução da parceria em si, a fim de compreender como essa modalidade de pesquisa pode
se aperfeiçoar e contribuir para a interação cada vez mais profícua, tanto para
pesquisadores quanto para professores e, consequentemente, contribuir para a melhoria do
processo educacional.
McLaughlin e Black-Hawkins (2004) colocam que os estudos baseados em parceria
universidade-escola precisam se adequar às condições particulares de cada contexto em que
se realizam e aos próprios projetos que pretendem desenvolver e, por isso, não há um
roteiro específico a ser seguido para a realização desse tipo de estudo, que pode se
estruturar de formas distintas. Entretanto, os autores apresentam alguns modelos que
identificaram a partir da análise de diferentes estilos de pesquisa colaborativa:
- Modelo 1: aquele em que a parceria é estabelecida individualmente com cada
professor, baseada em projeto e restrita a uma escola. O professor pode liderar as atividades
de pesquisa voltadas para sua prática, orientado pelo pesquisador, que pode ter um papel
de mentor desse professor, oferecendo-lhe todo o suporte de que necessitar, para a
investigação e para a reflexão. O impacto do projeto desenvolvido é geralmente restrito a
experiências na sala de aula do professor participante;
80
- Modelo 2: se caracteriza por se estender para a escola, indo além da sala de aula de
um professor e, portanto envolvendo grupos de professores e até estudantes. A parceria
pode se estabelecer entre pesquisadores e membros de um departamento ou área
curricular para investigar questões comuns à escola e a esses sujeitos. O papel da
universidade é orientar a investigação realizada por esses sujeitos na escola, oferecendo-
lhes o suporte necessário, seja treinando-os para técnicas de pesquisa, seja estimulando-os a
discutir e refletir sobre as questões investigadas. Há uma expectativa de que o impacto
dessa parceria seja de longo prazo e disseminado para toda a escola;
- Modelo 3: aquele em que os pesquisadores lideram a atividade de pesquisa, usando
a escola e seus sujeitos para suas investigações. Segundo os autores, este seria o modelo
tradicional em que as escolas são pesquisadas, ou seja, aceitam a entrada dos pesquisadores
e sua coleta de dados, mas não compartilham com os pesquisadores nenhuma etapa da
pesquisa, seus sujeitos não assumem nenhuma responsabilidade. A pesquisa pode ter foco
em uma escola ou mais, pode considerar aspectos amplos da escola ou se concentrar em
particularidades, como determinados professores, estudantes, área curricular, etc. O
impacto dessa pesquisa vai depender se a universidade der o retorno de seus resultados à
escola e de como isso é feito;
- Modelo 4: semelhante ao modelo 1, neste a atividade de pesquisa também é
realizada por professores na sua própria prática, baseada em projeto e orientada por
pesquisadores, como mentores. No entanto, enquanto o modelo 1 se caracteriza pela
parceria individual entre um professor e pesquisador, neste modelo as parcerias podem se
formar entre grupos de professores de diferentes escolas que compartilham um interesse de
pesquisa e são acompanhados por um ou mais pesquisadores. O tema geral da pesquisa é
proposto pelos pesquisadores, enquanto cada professor decide (podendo ter o auxílio do
pesquisador) sobre o foco específico de sua pesquisa. Embora o impacto dessa modalidade
de pesquisa também seja em experiências individuais nas salas de aula, a qualidade da
pesquisa é enriquecida pelo compartilhamento de conhecimento e experiências quando os
professores do grupo se reúnem para debater suas questões.
- Modelo 5: semelhante ao modelo 2, neste a atividade de pesquisa também se
estende à escola e envolve grupos de professores e até estudantes e os pesquisadores
81
atuam como orientadores dos professores que conduzirão as suas pesquisas. No entanto,
enquanto no modelo 2, a pesquisa e parceria é estabelecida com uma escola, neste modelo
5 a parceria se estende a mais escolas que compartilham e debatem suas pesquisas,
trabalhando e aprendendo juntas, sob a coordenação dos pesquisadores. Existe uma
expectativa de que o impacto dessa estrutura de parceria e pesquisa aproxime e beneficie
todas as escolas parceiras e que seja de longo prazo.
- Modelo 6: semelhante ao modelo 5 por também envolver escolas que trabalham e
pesquisam juntas, porém neste modelo, a natureza das relações entre pesquisadores e
membros das escolas é diferente. Enquanto no modelo 5 os pesquisadores ocupam uma
posição de experts, no modelo 6, todos os participantes da universidade e escola
compreendem que podem dar diferentes contribuições e que seus papéis se
complementam, ou seja, há um reconhecimento de que cada parceiro contribui com o
mesmo nível de importância para o processo de pesquisa e que, portanto, isto a torna mais
rica e robusta.
McLaughlin e Black-Hawkins (2004) apontam, ainda, as condições que consideram
mais importantes para o bom andamento das pesquisas em todos os modelos de parceria. A
primeira delas é a disponibilidade de tempo para dedicar à pesquisa. De acordo com os
autores, apesar de isso ser uma observação óbvia, é algo fortemente reiterado pelos
professores e, por isso, não pode ser ignorado. Quanto mais complexa é a proposta de
parceria, mais tempo é demandado, não apenas para a observação e coleta de dados, mas
para encontros e discussões entre os parceiros. No entanto, os autores colocam que
professores entrevistados em diversas circunstâncias de parceria argumentam que a
principal razão para não se envolverem em atividades de pesquisa é que eles já se sentem
sobrecarregados com as atividades próprias da escola e, consequentemente, isto tem um
impacto direto no desenvolvimento de parcerias.
A segunda condição importante para o bom desenvolvimento de parcerias de
pesquisa, apontada por McLaughlin e Black-Hawkins (2004), tem a ver com o
relacionamento e os papéis assumidos pelos parceiros. Segundo os autores, a natureza das
relações é crucial para a efetividade da parceria, em todos os modelos, especialmente
aqueles com a participação de muitos sujeitos, como os que envolvem a escola de forma
82
ampla ou os que envolvem mais de uma escola. Esse relacionamento deve ser construído
com base em respeito mútuo, confiança e valorização do conhecimento e trabalho de todas
as partes. Destacam ainda a importância de que os pesquisadores sejam acessíveis aos
professores e que compreendam sua realidade para que as demandas da pesquisa sejam
reais, ou seja, possam ser executadas de acordo com as condições do contexto de cada
escola ou cada professor, como o limite de tempo, por exemplo.
McLaughlin e Black-Hawkins (2004) ressaltam que a identificação desses modelos
ajuda a compreender a diversidade de propostas de parceria que têm se desenvolvido em
diferentes contextos, porém, na realidade, a pesquisa em parceria é muito mais rica e
complexa do que qualquer tipologia, podendo se desenvolver até mesmo por uma
combinação de modelos, dependendo das circunstâncias de cada pesquisa e dos sujeitos
envolvidos.
A integração de TDIC à educação tem sido um foco frequente das pesquisas
colaborativas entre universidade e escola, buscando propostas de apoio e construção de
conhecimento junto aos docentes, uma vez que diversos estudos indicam a necessidade de
suporte ao professor para que possa integrar pedagogicamente as tecnologias às suas
práticas (ERTMER; HRUSKOCY, 1999; PATTERSON et al, 2002; VOSGERAU, 2012; SARMENTO,
2014).
4.3 CONTEXTO DO ESTUDO
A Escola Municipal Madrid (CRE 02.09.008), onde o presente estudo se realizou,
localiza-se no bairro de Vila Isabel do município do Rio de Janeiro. Trata-se de uma escola
pequena, que oferece o segundo ciclo do Ensino Fundamental (6º ao 9º ano) a cerca de 300
alunos, distribuídos em dois turnos (manhã e tarde) e conta com 27 professores, todos
concursados com licenciatura plena e alguns possuem também pós-graduação em nível de
Mestrado e Doutorado. O público atendido é, em sua maioria, de alunos de classe média
baixa provenientes de bairros próximos - Andaraí, Grajaú, Tijuca, Maracanã. Em outubro de
2010 a escola recebeu a implantação do PROUCA, sendo a única do município a participar
83
desse projeto. A escola foi indicada para receber o projeto por ter uma boa classificação no
Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) dentre as escolas da rede municipal,
além de atender alguns dos requisitos do PROUCA, como ter até 500 alunos, estar próxima a
Núcleos de Tecnologias Educacionais (NTE – estruturas implantadas pelo Proinfo) ou
instituições de ensino superior que pudessem apoiá-la, além de estrutura física básica, como
energia elétrica, para permitir o uso dos laptops (http://www.uca.gov.br/institucional/).
A Escola Municipal Madrid recebeu laptops do modelo Classmate desenvolvido pela
Intel e produzido no Brasil pela Positivo Informática e pela CCE, além de rede wireless para
Internet sem fio. Os professores receberam capacitação presencial e a distância para uso do
laptop que utiliza o software livre Linux
(http://www.educacaopublica.rj.gov.br/jornal/materias/0351_1.html).
4.4 SUJEITO DO ESTUDO
A professora pesquisada possui 56 anos de idade, é casada, mãe de dois filhos
adultos e tem uma carreira de 29 anos no magistério, sendo 20 anos na rede municipal de
ensino do Rio de Janeiro, lecionando a disciplina Ciências, para turmas do 6º ao 9º ano
ensino fundamental. Na Escola Municipal Madrid, onde ocorreu o estudo, trabalha no turno
da manhã, em três dias da semana. A mesma também leciona na rede municipal de Duque
de Caxias, município vizinho ao Rio de Janeiro, onde cumpre horários à tarde e à noite,
também três vezes por semana. A professora pesquisada lecionava no ano de 2012 para as
turmas do 7º, 8º e 9º anos do turno da manhã e, a partir de 2013, passou a lecionar também
para a turma do 6º ano, tornando-se a única professora de Ciências a lecionar no turno da
manhã nesta escola. A escola conta com outra professora de Ciências que leciona no turno
da tarde, também para as turmas de 6º a 9º ano. Esta também foi consultada para fazer
parte da pesquisa, porém a mesma passava por alguns problemas pessoais que a levaram a
recusar o envolvimento no estudo. Por conta dessas circunstâncias, o presente estudo foi
desenvolvido com a participação individual da professora de Ciências do turno da manhã.
84
Esta professora se relaciona muito bem com os demais professores e gestores da
escola, assim como com os alunos. Destaco como uma característica marcante da professora
o seu bom humor. Desde o primeiro contato para a proposta da pesquisa, a professora
sempre foi muito receptiva, demonstrando interesse em usar os laptops educacionais
presentes na escola e a expectativa de que a presença da pesquisadora a ajudaria nesse
sentido.
A professora possui computador pessoal que utiliza, em sua residência, para
elaboração prévia de materiais como testes e exercícios e para a busca de vídeos. Portanto,
a professora demonstra não ser leiga quanto ao uso básico do computador. Em sala de aula,
utiliza pouco os laptops com os alunos, principalmente por conta de algumas experiências
que foram mal sucedidas devido a problemas com a internet e que impossibilitaram a
realização do seu planejamento, conforme ela mesma relatou em nossos encontros iniciais.
4.5 ANÁLISE DOS DADOS
A entrevista e o diário de campo foram analisados com base no método de Análise de
Conteúdo de Bardin (1977), o qual consiste na investigação de significados contidos em
algum tipo de comunicação, em que o pesquisador busca identificar ou inferir categorias
presentes nessa comunicação que o levem a seus objetivos de pesquisa. Bardin (1977)
coloca que “o analista tira partido do tratamento das mensagens que manipula para inferir
(deduzir de maneira lógica) conhecimentos sobre o emissor da mensagem ou sobre o seu
meio” (p. 39) e por isso, “a leitura efetuada pelo analista de conteúdo das comunicações não
é, ou não é unicamente, uma leitura à letra, mas antes o realçar de um sentido que se
encontra em segundo plano” (p. 41).
Segundo Bardin (1977), a análise de conteúdo ocorre em três fases: (1) pré-análise;
(2) exploração do material e (3) tratamento dos resultados, inferência e interpretação.
Neste sentido, na pré-análise do material obtido com diário de campo foi possível
identificar os tópicos que foram desenvolvidos como um relato das observações, no capítulo
85
5, de resultados, análise e discussão. Também foi possível levantar os dados quantitativos
deste período de acompanhamento, destacados no quadro 3 a seguir.
QUADRO 3: DADOS QUANTITATIVOS DO DIÁRIO DE CAMPO
Fase Ano Letivo Nº de dias
observados Turmas
acompanhadas Frequência
Período de Diagnóstico 2012 22 7º, 8º e 9º
2 vezes por
semana
Continuidade das observações e
intensificação da parceria
2013 29
6º, 7º, 8º e 9º
2014 34
Total de dias acompanhados: 85
Esclareço que o segundo semestre de 2013 foi marcado por dois períodos de greve
que explicam o fato de o número de aulas observadas ao longo de todo este ano ser baixo e
próximo ao número de aulas acompanhadas apenas no segundo semestre de 2012. O
primeiro momento de greve teve início em agosto e se encerrou em setembro, totalizando
quase um mês de paralisação das aulas. O segundo momento teve início no fim do mês de
setembro, portanto pouco tempo depois da retomada das aulas, após a primeira greve, e
perdurou até o mês de novembro, totalizando aproximadamente dois meses sem aulas. Por
conta disso, neste segundo semestre de 2013 a quantidade de aulas acompanhadas da
professora de Ciências foi bastante reduzida: sete dias, sendo dois em agosto, quatro em
setembro e um em dezembro. Em 2014, occorreu mais um período de greve, iniciado no
início de maio e encerrada no fim de junho, totalizando quase um mês e meio de
paralisação, o qual se seguiu do recesso por conta da Copa do Mundo de Futebol (que
ocorreu no Brasil e o Rio de Janeiro foi uma das capitais sede de jogos) e, assim, as aulas só
retornaram após o dia 13 de julho.
Quanto ao material da entrevista, com a pré-análise da transcrição foi possível
identificar alguns pontos que tinham proximidade entre si e que tinham potencial de serem
analisados como categorias (BARDIN, 1977). Contudo, foi a partir da exploração do relato
produzido com o material do diário de campo (tópico 5.1, capítulo 5) e aproximação destes
dados com os pontos inicialmente destacados da entrevista, que foi possível definir as
86
categorias finais e suas respectivas unidades de análise. Desse modo, a análise e
interpretação destas unidades e categorias, terceira etapa da análise de conteúdo, ocorreu
com a articulação entre os dados do diário de campo e entrevista.
A partir dos dados das observações e da entrevista, foi possível identificar que a
prática da professora foi influenciada por aspectos relacionados ao contexto escolar, ao
contexto social, assim como às suas próprias concepções sobre a docência, os alunos e sobre
o uso das TDIC para o processo de ensino-aprendizado. Além disso, foi possivel compreender
a percepção que a professora teve sobre a parceria com a pesquisadora e, em que sentido, a
parceria contribuiu para a sua prática.
Buscou-se compreender, portanto, como estes aspectos se relacionaram e
influenciaram a prática da professora de Ciências com TDIC, a fim de aprofundar a
compreensão do processo de integração de TDIC, vivenciado por ela, ao longo desse período
de acompanhamento, conforme o objetivo geral da pesquisa, que foi “investigar como uma
professora do ensino fundamental integra as TDIC em sua prática pedagógica na disciplina
Ciências, suas motivações, concepções e evolução no uso das TDIC em suas estratégias
pedagógicas, assim como os desafios enfrentados nesse processo.”
Nesse sentido, algumas questões foram consideradas pertinentes para reflexão e
discussão. São elas: (1) Como as concepções da professora sobre ensino, alunos e
tecnologias se relacionam com suas decisões para uso ou não das TDIC em sala de aula?; (2)
De que modo o contexto da escola influenciou as práticas da professora com as TDIC e por
quê?; (3) Qual a percepção que a professora teve sobre a parceria com a pesquisadora?; (4)
Como a parceria contribuiu para a prática da professora com TDIC?
As perguntas (1) e (2) remetem a questões que vêm sendo debatidas por diversos
autores na literatura, como Kenski (2007); Coll e Monereo (2010); Sibilia (2012); Ertmer e
Ottenbreit-Lefwich (2013), entre outros, que buscam compreender a diversidade e
complexidade dos aspectos envolvidos no processo de integração de TDIC à educação, desde
a especificidade dos contextos de trabalho dos docentes até suas concepções acerca do
processo de ensino-aprendizagem e das tecnologias e suas potencialidades para educação.
Assim, estes referenciais, já citados nos capítulos de fundamentação teórica, assim como
87
outros trazidos na discussão dos dados, contribuirão para discutir sobre tais aspectos no
caso específico da professora acompanhada neste estudo.
As perguntas (3) e (4) remetem a avaliação da parceria, considerada uma estratégia
que vem ganhando relevância entre diversos autores (ERTMER; HRUSKOCY, 1999;
MCLAUGHLIN; BLACK-HAWKINS, 2004; DESGAGNÉ, 2007; VOSGERAU, 2012; DUNCAN;
CONNER, 2013; WANG; ZHANG, 2014; ERTMER; OTTENBREIT-LEFTWICH; TONDEUR, 2015),
como uma possibilidade não só de pesquisa, mas de apoio e desenvolvimento profissional
para professores, a partir de questões do seu próprio contexto de ensino, especialmente
para a demanda de integração pedagógica de TDIC e transformação das perspectivas de
ensino. Assim, considerou-se importante analisar as contribuições que a parceria pode ter
proporcionado para a evolução da prática da professora de Ciências com o uso das TDIC ao
longo do tempo de acompanhamento, assim como para seu desenvolvimento de TPACK, o
que também seria um resultado esperado. Compreender a percepção que a professora teve
sobre a parceria também foi importante pois a mesma teve influência sobre o próprio
envolvimento da professora ao longo desse período de acompanhamento, assim como suas
ideias para os planejamentos de atividades.
No capítulo 6, apresento as unidades e categorias definidas para análise, assim como
as análises propriamente ditas.
4.6 ASPECTOS ÉTICOS DA PESQUISA
O projeto desta pesquisa foi submetido à avaliação do Comitê de Ética em Pesquisa
(CEP) do Instituto de Estudos em Saúde Coletiva (IESC/UFRJ) e foi aprovado com o parecer
de número 678.059.
88
5 RESULTADOS, ANÁLISE E DISCUSSÃO
5.1 RELATO DAS OBSERVAÇÕES – REGISTRO DO DIÁRIO DE CAMPO
Neste tópico apresento o relato das observações registradas em diário de campo ao
longo de todo o tempo de parceria, desde o segundo semestre de 2012 até o fim do ano
letivo de 2014. Buscou-se seguir um padrão de registros para compreender a dinâmica das
aulas, o perfil pedagógico da professora e relação com os alunos e possíveis problemas que
afetaram o seu trabalho. Sendo assim, o diário de campo foi construído com os seguintes
registros: conteúdo curricular trabalhado em cada dia com cada turma; como a professora
trabalhou o conteúdo (atividade, objetivo e recursos utilizados); comportamento da turma
perante a atividade (interesse ou dificuldade com o tema ou recursos); comportamento da
professora perante a turma (quanto à indisciplina ou interesse dos alunos); problemas para
uso dos recursos; diálogos travados com a professora em todos os momentos possíveis
sobre as aulas, atividades desenvolvidas, dúvidas e discussão quanto ao uso de
determinadas ferramentas do computador.
O relato segue a temporalidade das observações, apresentando um panorama inicial
da entrada da pesquisadora na escola, do primeiro contato com as turmas e da dinâmica das
aulas, seguindo com as observações específicas dos eventos de cada ano, sendo: um
subtópico para o segundo semestre do ano letivo de 2012, um subtópico para o ano letivo
de 2013 e, por fim, o subtópico com as observações do ano letivo de 2014. No entanto,
antes disso, destaco no subtópico 5.1.1, a seguir, alguns eventos ocorridos e condições
presentes no contexto da escola durante este período, os quais ajudam a compreender o
cenário em que a professora de Ciências e a pesquisadora atuaram e que,
consequentemente, se refletiu no presente estudo.
89
5.1.1 Eventos e condições do contexto da escola durante o período de acompanhamento
O aspecto mais frequente durante todo o período de acompanhamento da
professora foi a dificuldade de acesso à Internet na escola para as atividades pedagógicas.
No início do acompanhamento, a professora já havia comentado sobre experiências
anteriores em que tentou trabalhar com os laptops em sala de aula, para que os alunos
acessassem a Internet, mas isso não tinha sido possível. Ao longo do segundo semestre de
2012, em algumas experiências junto com a professora, o acesso foi bastante lento e,
inclusive uma das atividades planejadas foi impossibilitada, conforme relatado no próximo
subtópico.
Em 2013, este problema com a Internet continuou, porém em 2014, a situação se
agravou ao ponto de não ser mais possível conexão alguma com os laptops nas salas de aula,
mesmo que lenta. Logo no início do ano de 2014, a coordenadora pedagógica solicitou a
visita de um técnico da prefeitura e o mesmo informou que devia ser algum problema no
roteador central, mas que esse serviço deveria ser feito por quem fez a sua instalação. A
coordenadora explicou que o técnico da prefeitura não tem autorização para mexer nos
equipamentos referentes ao PROUCA, pois este programa não é do governo municipal e sim
federal. Segundo ela, nunca houve manutenção para os laptops e sua rede por parte do
PROUCA. Durante o primeiro semestre de 2014, ainda era possível acessar Internet em sala
de aula pela rede Educopédia, um programa da prefeitura que disponibilizou alguns laptops
apenas para uso de professores. Era a partir desses laptops que os professores projetavam
vídeos, slides etc. Contudo, essa rede também começou a apresentar problemas, não
permitindo mais a conexão no segundo semestre do ano. A coordenadora continuou
solicitando visitas técnicas, argumentando a necessidade de uso pedagógico da Internet, no
entanto, o problema persistiu até o fim do ano.
Conforme mencionado no tópico 5.5, capítulo 5, ocorreram também três momentos
de greve dos professores ao longo do período de acompanhamento, sendo dois deles em
2013 e um em 2014.
Neste período de acompanhamento, a escola contou com três monitores, que tinham
a função de ajudar os professores e alunos no uso dos laptops educacionais, mantê-los
90
carregados, cuidar do agendamento de uso dos mesmos para todos os professores, nos
turnos da manhã e tarde. Estes monitores eram bolsistas do projeto “Análise do processo de
integração de tecnologias de informação e comunicação em atividades educativas no ensino
fundamental no contexto do Programa Um Computador por Aluno – PROUCA”, o qual teve
vigência entre 2011 e 2014 (Edital Capes-SEED/CNPq – 2011-2014). Com o fim da vigência do
projeto no início de 2014, a partir desse ano, a escola deixou de contar com esse suporte. No
âmbito deste projeto, no segundo semestre de 2012, foi desenvolvido, de forma
colaborativa com professores de todas as disciplinas da escola, um conjunto de atividades
pedagógicas integrando o uso de TDIC. O objetivo era envolver professores e alunos em
atividades centradas no aluno, sugerindo-lhes distintas formas de integração pedagógica das
TDIC, tendo como temática comum a Saúde, a partir da sua perspectiva de amplo bem-estar
físico, mental e social e não apenas ausência de enfermidade (WHO, 1946).
Considerando que o objetivo de tal projeto se articulava ao objetivo deste estudo por
também se basear no desenvolvimento colaborativo das atividades com professores para o
uso de TDIC, estimulei a professora de Ciências a participar das reuniões de planejamento
com o grupo de pesquisadores e demais professores. Assim, a discussão sobre possibilidades
de atividades que se desenvolveriam articuladas às demais do projeto “Com-Viver Com-
Ciência e Cidadania” estariam, ao mesmo tempo, também articuladas ao nosso propósito de
desenvolver atividades de Ciências com TDIC.
Portanto, nos subtópicos a seguir, a participação da professora de Ciências nas
atividades do projeto “Com-Viver Com-Ciência e Cidadania” é comentada, assim como as
demais atividades desenvolvidas no âmbito exclusivo de sua disciplina e desta parceria.
Detalhes sobre as atividades desenvolvidas pelo projeto “Com-Viver Com-Ciência e
Cidadania”, inicialmente com uma turma no ano de 2012 e, posteriormente com demais
turmas nos anos de 2013 e 2014 são apresentados no apêndice A. No artigo publicado por
Struchiner e Giannella (2016), encontra-se uma análise dos resultados desse projeto de
pesquisa.
91
5.1.2 A entrada na escola: primeiras observações
O trabalho de campo teve início poucos dias após meu primeiro encontro com a
professora para apresentar a proposta de pesquisa. A professora leciona nesta escola às
terças, quartas e quintas feiras. Eu me comprometi a comparecer para as observações em
dois desses dias, na maior parte das vezes às terças e quintas por conta de compromissos
com as disciplinas do curso de doutorado.
O primeiro dia de observação foi 28 de junho de 2012. Era uma quinta-feira e a
professora tinha aulas em todos cinco tempos da grade horária. Às 07:10h começa o
primeiro tempo e a primeira aula foi com a turma de 8º ano. Os alunos estavam bem
agitados. A professora me apresentou, rapidamente, dizendo meu nome e explicando que
eu acompanharia as aulas até o final do ano para fazer uma pesquisa, sem mais detalhes. Em
seguida deu outros avisos à turma. Após um bom dia a todos, busquei uma carteira vazia no
fundo da sala para me acomodar. Alguns alunos correram para mostrar à professora os
materiais que haviam preparado, como uma maquete de uma célula. Outros tentavam
construir um aparato com garrafa PET e bolas de aniversário para simular um pulmão
respirando. A professora havia pedido que os alunos elaborassem materiais sobre alguns
assuntos que eles haviam estudado e, nesta aula, deixou que eles finalizassem esse trabalho,
enquanto circulava pela sala atendendo seus chamados e orientando a atividade.
No 2º e 3º tempos, a professora esteve em duas turmas de 7º ano, nas quais também
fez uma rápida apresentação da pesquisadora e logo seguiu para um estudo dirigido de
revisão para a prova que fariam em breve. Consistia em uma folha de exercícios, que eles
deveriam responder, consultando a apostila. No 4º tempo, ela retornou à turma de 8º ano e
aplicou um teste. No 5º tempo, ela entrou na turma de 9º ano. Esta turma foi diferente das
outras, pois reagiram à minha presença imediatamente, perguntando à professora quem eu
era, se era sua nova estagiária, antes que ela fizesse a mesma apresentação que tinha feito
nas outras turmas. Dessa vez, a professora deu espaço para que eu fizesse minha própria
apresentação. Então, falei sobre minha formação em Ciências Biológicas, que estava
cursando um curso de pós-graduação e que, por isso, estaria acompanhando as aulas da
professora de Ciências para fazer uma pesquisa relacionada ao ensino de Ciências e a
92
integração das tecnologias, o que era particularmente interessante naquela escola, já que
eles contavam com os computadores do PROUCA. Os alunos fizeram mais perguntas, como
por exemplo: “isso dá dinheiro?” Eu respondi que sim, que ganhava uma bolsa para fazer
essa pesquisa. Neste momento, a professora interrompeu a conversa e disse que tinha que
começar a aula. Nesta turma, ela também fez uma revisão de matéria para a prova que seria
na próxima semana, usando o quadro para esclarecer as dúvidas da turma.
Percebi que os alunos das outras turmas também ficaram curiosos, mas foram mais
contidos, pois não perguntaram abertamente à professora sobre mim. Entretanto, alguns
que estavam mais próximos do lugar onde me sentei ficaram me olhando e perguntaram
sobre o que eu estava fazendo ali e se eu poderia ajudá-los com os exercícios de revisão.
No 2º dia de observação, uma terça feira, dia em que a professora também leciona
nos cinco tempos, ela continuou com as revisões para as provas, corrigindo estudos
dirigidos. Quando a aula do terceiro tempo terminou e os alunos saíram para o recreio, a
professora mostrou os trabalhos que estava corrigindo, comentando que, apesar de valer
nota, vários alunos deixaram questões em branco, sendo que todas eram questões para
completar com termos que ela falou na revisão e eles ainda poderiam facilmente ter
consultado no livro didático em casa. Ela se perguntou por que eles fazem isso e era visível a
sua frustração. Disse que a maior parte da turma tinha nota abaixo de cinco e que muitos
alunos consideram cinco uma nota boa, por mais que ela tente dizer que não, que deveriam
se esforçar para alcançar notas maiores. A média para aprovação na escola é cinco (por
determinação da rede municipal), o que faz com que os alunos a tomem como parâmetro de
boa nota. Na aula após o recreio, a professora conversou com os alunos sobre o trabalho
que havia passado para casa e que a maioria não entregou, ficando com zero. Apenas um
grupo de alunos demonstrou insatisfação e foi conversar com ela. O restante pareceu não se
incomodar em ficar com zero na atividade.
Ainda nesta turma de 8º ano, neste 2º dia de observação, uma monitora bolsista pelo
projeto de minha orientadora, permaneceu na sala durante a aula de Ciências, arrumando os
laptops da turma no armário, pois os alunos haviam trabalhado com eles na aula do
professor anterior. Ao final da aula, depois que os alunos haviam saído para o recreio, fui até
a monitora para ver como os laptops eram arrumados no armário, que tem a função
93
também de carregar todos os aparelhos ao mesmo tempo. Neste momento, a professora de
Ciências falou: “Isso aí é um atraso de vida!” e foi saindo da sala. Em seguida, eu a encontrei
na sala dos professores e perguntei por que ela havia dito aquilo sobre os laptops. Ela
explicou que tentou usá-los para uma atividade no primeiro semestre de 2012, na qual os
alunos teriam que visualizar algo na Internet e isso não foi possível por conta da lentidão da
conexão. Como alternativa, a professora teve que recorrer a um vídeo que ela tinha em seu
pendrive e exibi-lo pelo projetor multimídia, equipamento disponível em cada sala de aula,
com o auxílio de um laptop disponibilizado apenas para os professores. Entretanto, a
professora disse que gostaria de usar os laptops educacionais em alguma atividade para o
próximo bimestre, mas que teria que ser com uma estratégia diferente, que provavelmente
seria reduzindo o número de laptops para a turma, o que significa que a atividade não seria
feita no modelo 1:1.
É importante mencionar que cheguei à escola no final do 2º bimestre. Portanto, era
um momento em que a professora estava concentrada nas revisões da matéria para as
avaliações que comporiam as médias do bimestre. Ela explicou que não poderia avançar com
a matéria, pois tinha que aguardar as novas apostilas da prefeitura chegarem para saber
qual conteúdo deveria seguir para o 3º bimestre, pois ao final de cada bimestre os alunos
fazem uma prova preparada pela prefeitura para avaliar o desempenho nesta disciplina.
No 3º dia de observação, a professora iniciou as matérias novas do 3º bimestre em
todas as suas turmas, utilizando quadro e livro didático para apresentar o conteúdo e passar
exercícios aos alunos. Durante o recreio ela pegou um laptop para testar se conseguiria
visualizar nele um endereço da Internet que ela gostaria de trabalhar com a turma. Ela
conseguiu abrir o site sem problemas e então resolveu que iria trabalhar com ele no próximo
dia de aula com as turmas de 7º e 8º ano e fez o agendamento com as monitoras para que
no dia de uso os computadores estivessem carregados.
Nestes primeiros dias de acompanhamento foi possível perceber que a professora
parecia desconfortável com minha presença, por saber que seria observada e por me ver
fazendo anotações. Essa impressão foi percebida logo no momento das apresentações a
cada nova turma em que entrávamos juntas, quando a professora foi muito sucinta e não
me deu espaço para falar diretamente com os alunos. Alguns alunos também demonstraram
94
algum incômodo ao me ver fazendo anotações e perguntaram se estas eram sobre eles e se
eu contaria à professora sobre o que eles estavam fazendo, referindo-se ao fato de estarem
conversando e brincando, em vez de fazer a tarefa proposta pela professora. Esclareci que as
anotações não eram sobre isso e que eu não estava ali para avaliá-los. Nesses dias, a
professora parecia distante, conduzia sua aula e parecia fingir que eu não estava ali,
evitando olhar na minha direção. No entanto, em pouco tempo, após esses primeiros dias de
estranhamento, percebi que tanto a professora quanto os alunos já se sentiam mais à
vontade com minha presença. Enquanto falava com turma, dando alguma explicação ou
chamando-lhes a atenção por algum motivo disciplinar, ela também olhava para mim, como
se estivesse buscando concordância para o que ela estava falando. Às vezes, até mesmo
citava a minha presença na sala para incentivar-lhes um comportamento melhor, como por
exemplo: “Vocês estão falando alto demais, a Diana vai ficar de cabelo em pé com tanta
bagunça! Coitada!”. Ela também se aproximava do lugar onde me sentava para comentar
sobre a atividade ou sobre o comportamento dos alunos. Da mesma forma, vários alunos
começaram a se aproximar para conversar em momentos em que a professora saía de sala
ou no corredor da escola, nos intervalos das aulas, por exemplo, e alguns até se
preocupavam em reservar um lugar na sala para mim, fazendo questão que eu me sentasse
perto deles.
A professora parecia ter um bom relacionamento com os alunos, porém parecia não
querer se aborrecer ou se desgastar demais para chamar-lhes atenção, pois eles
conversavam muito e não concluíam as tarefas que ela lhes passava. Ela chamava a atenção
algumas vezes, pedindo que parassem de conversar, pois tinham que concluir os exercícios,
mas rapidamente voltavam a se comportar do mesmo jeito e a professora parecia esperar
que o tempo da aula terminasse logo, enquanto fazia alguma coisa em sua mesa ou atendia
individualmente aqueles alunos que a solicitavam. Sua frustração com o desinteresse dos
alunos foi a primeira questão que a professora comentou comigo, em tom de desabafo,
quando mostrou os trabalhos que corrigia, logo no segundo dia de observação.
Quanto à parceria, percebi a expectativa da professora em ter apoio para o uso dos
laptops educacionais, quando se queixou sobre os mesmos, por não ter conseguido realizar
uma atividade e, em seguida, expressou vontade de tentar novamente, comentando sobre a
atividade que já tinha em mente, em que gostaria que os alunos visitassem um determinado
95
endereço de Internet que ela lhes indicaria. Com isso, a professora parecia estar aberta a
experiências com as TDIC e confiante com o apoio e parceria. Ao mesmo tempo, essa
expectativa de uso das TDIC estava também relacionada ao interesse dos alunos, pois a
professora comentou: “Vamos ver se dá certo...eles gostam dessa coisa de Internet né?”.
Assim, parecia que ela esperava que, com o uso dos laptops, os alunos tivessem mais
interesse pela aula.
No próximo tópico, apresento o perfil pedagógico da professora, percebido ao longo
das observações, assim como as atividades e estratégias de uso com os recursos
tecnológicos da escola (laptops educacionais, projetor multimídia) que a professora
desenvolveu entre os anos de 2012, 2013 e 2014.
5.1.3 Período de Diagnóstico - Ano letivo 2012
Conforme mencionado no capítulo da metodologia, o período de diagnóstico
corresponde àquele em que o pesquisador inicia sua aproximação ao indivíduo pesquisado e
ao seu ambiente de atuação, neste caso uma professora de Ciências e suas práticas
pedagógicas no ambiente escolar. Este período inicial foi importante para compreender seu
perfil pedagógico e, então, refletir sobre as estratégias que poderiam ser propostas para
desenvolvimento em colaboração com a professora, visando o uso de tecnologias que
favorecessem uma participação mais ativa dos alunos e a atuação da professora como
mediadora de sua aprendizagem, conforme defendem pesquisadores (PÉREZ GOMEZ, 2015;
COLL; MONEREO, 2010; KENSKI, 2007; JONASSEN, 1998; 2005).
Assim, ao longo deste período, foram observadas as ações da professora com e sem o
uso dos recursos tecnológicos disponíveis na escola, o comportamento das turmas perante
as atividades desenvolvidas por ela, o conteúdo trabalhado em cada ano escolar, assim
como os desafios para uso da tecnologia. O tipo de observação característica dessa fase foi a
observação descritiva, conforme mencionada no capítulo de metodologia. Segundo Spradley
(1980, apud FLICK, 2009), a observação descritiva ocorre exatamente quando o pesquisador
inicia seu contato com o campo de pesquisa e pode apreender informações gerais sobre o
96
grupo, estando atento a todas as situações, realizando descrições que o ajudem a formular
as questões de pesquisa subsequentes.
Sendo assim, considerou-se que este período de diagnóstico ocorreu desde o
primeiro dia na escola, em 28 de junho de 2012, até o último dia de observação desse
mesmo ano letivo, em 22 de novembro de 2012. Cabe esclarecer que, neste ano letivo, a
escola possuía, no turno da manhã, uma turma de 6º, duas de 7º, uma de 8º e uma de 9º
ano. A professora de Ciências lecionou para todas, exceto a de 6º ano.
Conforme mencionado no tópico anterior, logo no início do 3º bimestre, no 3º dia de
observação, a professora fez um teste com um dos laptops usados pelos alunos para
visualizar um site que ela gostaria de trabalhar. Sendo assim, no 4º dia de observação,
ocorreu a primeira atividade em que a professora utilizou algum recurso tecnológico, os
laptops educacionais, distribuídos no modelo de um para cada dupla, pois tinha receio de
que com a distribuição de um por aluno acontecesse o mesmo problema com a Internet da
sua primeira experiência de uso dos laptops, quando o trabalho não pode ser feito. A
atividade, neste 4º dia de observação, consistiu na visita dos alunos a uma página de
Internet que reúne texto, imagens e animações de Ciências (www.planetabio.com.br). A
professora foi orientando o que os estudantes deveriam ver no site, dando explicações e
tirando dúvidas. Ao final, os alunos receberam uma folha de exercícios que teriam que
resolver consultando a página. Essa estratégia foi adotada no mesmo dia com três turmas:
duas de 7º ano para trabalhar o conteúdo sobre poríferos - animais invertebrados, e uma de
8º ano para trabalhar sistema circulatório. Em todas as turmas, a monitora ajudou a
distribuir os laptops, verificou se todos tinham conseguido se conectar à Internet e ajudou a
resolver problemas apresentados por algumas máquinas. Acompanhei a atividade com um
laptop, visualizando o mesmo site que os alunos e, em momentos em que a monitora não
estava presente na sala e algum aluno tinha problemas com a sua conexão, a professora me
pedia para ajudá-lo. Dessa forma, me envolvi na atividade, auxiliando alguns alunos no
manuseio dos computadores. Foi possível perceber que em todas as turmas os alunos
reagiram bem à atividade, demonstraram interesse pelo que viam, pelos detalhes dos
esquemas e animações que o site dispõe e permitiram que a professora conduzisse a aula
falando confortavelmente, sem precisar elevar a voz como foi observado em aulas
anteriores por conta das conversas paralelas de grupos de alunos. Poucos foram os
97
desinteressados, que não acompanhavam o que a professora mostrava no site. A professora
comentou, no intervalo do recreio, que a aula tinha dado certo pois a Internet tinha
funcionado sem problemas, ela tinha conseguido mostrar tudo que queria e os alunos
tinham gostado. Assim, motivada por essa experiência bem sucedida, repetiu a atividade
com os laptops para visualizar o mesmo site nas mesmas turmas algumas aulas depois (9º
dia de observação), dando continuidade à matéria de animais invertebrados do 7º ano e
sistemas circulatório e linfático no 8º ano. Porém, nesta segunda experiência a professora
resolveu adotar o modelo de um laptop por aluno e, apesar de a Internet estar um pouco
lenta, todos conseguiram acesso. Foi possível perceber a vontade de cada aluno de usar o
próprio computador, pois eles faziam questão de ficar com o laptop que continha o seu
nome. Quando o laptop de algum aluno estava com problema, ele lamentava em ter que
usar o laptop de outro colega que havia faltado a aula, o que sugeriu que os alunos criaram
um vínculo com o laptop, embora as máquinas não pudessem ser levadas para casa. Assim
como na primeira experiência, a professora também ficou mais motivada e confiante com o
bom andamento dessa atividade. Estas atividades com os laptops foram conduzidas para
ilustrar e complementar a matéria que a professora já vinha dando em aulas prévias
utilizando apostila e livro didático.
Alguns dias depois, a professora comentou que encontrou na Internet um exemplo
de exercício que pode ser feito online, no qual o aluno poderia completar as respostas e, ao
final, acionar um botão “VERIFICAR”, que mostraria os erros. Ela disse que gostaria de usar
os laptops para que os alunos fizessem atividade semelhante e perguntou se poderia ajudá-
la com isso. Encontrei um site que permite criar questões em diferentes modalidades
(verdadeiro/falso, completar lacunas, múltipla-escolha) e proporciona o feedback de erros e
acertos tanto para o aluno quanto para o criador das questões, no caso a professora
(www.proprofs.com). Na sala dos professores, a professora explorou o site, testando a
criação de alguns exemplos de questões para entender como funcionava. Ela ficou bastante
interessada com as possibilidades de criar diferentes modalidades de questões e incluir
imagens e até vídeos nas mesmas. Comentou ainda que isso poderia facilitar o seu trabalho,
pois o próprio sistema lhe forneceria os nomes e pontuação de cada aluno que fizesse a
tarefa. Essa conversa ocorreu no final do mês de setembro e a professora disse que tentaria,
por conta própria, fazer provas online com este site até o fim do ano. Foi levantada ainda a
98
possibilidade de os alunos criarem questões neste site e que poderiam trocar com os
colegas, como uma forma de estudarem para criar as próprias perguntas e para responder as
dos colegas. No entanto, a professora se entusiasmou inicialmente com a ideia de utilizar o
site para provas online. No último dia de observação, em novembro, a professora pretendia
aplicar a prova online que havia conseguido concluir para a turma de 8º ano. Entretanto,
desde o dia anterior, a escola estava sem Internet. Antes do tempo de aula com esta turma,
ela fez um teste com um dos laptops dos alunos e verificou que o problema com a Internet
persistia, indicando que realmente não seria possível realizar a prova. A professora ficou
chateada, mas não se desinteressou da proposta, pois disse que tentaria usar esse recurso
no próximo ano.
Neste período de 2012, a professora também utilizou bastante o recurso do vídeo,
em cinco dias de aula acompanhados, sendo que em alguns deles, exibiu vídeos em mais de
uma turma. Na maioria das vezes, ela os trouxe já gravados em pendrive, a partir de busca
prévia feita em sua casa. Quando resolveu exibir um vídeo online, a tarefa foi complicada
pois, ao tentar exibí-lo, o mesmo foi interrompido várias vezes até que o carregamento
estivesse completo, o que deixou-a impaciente e os alunos dispersos. Apesar disso, os alunos
pareciam interessados em continuar acompanhando o vídeo (sobre animais anfíbios,
matéria do 7º ano que a professora já havia iniciado em aula anterior), pois pediram que a
professora não desistisse de passá-lo. Contudo, esse problema prejudicou o andamento da
aula, pois quase todo o tempo foi tomado para conseguir exibir um vídeo de apenas 10
minutos, já que a professora precisou recomeçá-lo algumas vezes.
Nestes cinco dias de aula em que a professora utilizou o vídeo como recurso
pedagógico, o mesmo foi usado principalmente após um determinado tema ter sido
introduzido previamente com o material tradicional (apostila ou livro), sugerindo seu uso
como uma estratégia para ilustrar e reforçar esse conteúdo. Na única aula, deste período,
em que o vídeo foi usado para introduzir um conteúdo novo, a professora relatou uma outra
motivação para usá-lo, além da sua contribuição para ilustrar e reforçar o conteúdo: a
indisciplina da turma. A professora queria introduzir o conteúdo sobre Eletricidade para a
turma de 9º ano e trouxe cinco vídeos que constituíam uma série em desenho animado em
que cada vídeo tratava sobre algum conceito, como circuito elétrico, resistência, campo
elétrico etc. Durante a exibição dos vídeos para a turma, a professora comentou que
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escolheu trazer essa sequência de vídeos propositadamente para ocupar todo o tempo da
aula e acrescentou: “está vendo? Todo mundo está prestando atenção...se eu tentasse não ia
conseguir falar isso tudo...(referindo-se às informações passadas no vídeo)...já que eles não
me deixam falar, eu trouxe o vídeo e pronto!” Em uma aula anterior com esta mesma turma,
a professora já havia comentado que não sabia mais o que fazer com esse grupo pois eles
conversavam muito e não lhe davam atenção: “já desisti dessa turma...”. Assim, ficou claro
que a intenção da professora ao adotar essa estratégia foi conseguir controlar a indisciplina
da turma e evitar o desgaste de dar uma aula oral em que poucos alunos prestam atenção, o
que realmente aconteceu já que a turma permaneceu calma, silenciosa e aparentemente
interessada nos vídeos. Após a exibição, a professora apenas esclareceu as dúvidas daqueles
que a questionaram e, em seguida, permaneceu em sua mesa corrigindo as apostilas até o
fim da aula, deixando que os alunos ficassem conversando livremente. Observou-se, ainda,
que em nenhum dia o vídeo foi utilizado de forma articulada com uma outra atividade
posterior, não sendo mais retomado depois de exibido.
Com relação ao projeto “Com-Viver Com-Ciência e Cidadania” (APÊNDICE A), a
professora de Ciências participou de duas atividades, Diário do Corpo e Saúde em Jogo. Na
primeira, a professora conduziu a realização de pesquisas em grupo na Internet sobre
alimentação, sua relação com hábitos de vida e com o estado nutricional. Os alunos
utilizaram os laptops para pesquisar e criar apresentações de slide, que foram apresentadas
para a turma posteriormente. Na atividade do jogo, a professora participou ativamente do
debate das perguntas com os grupos, conduzindo o jogo.
Os professores que participaram das atividades desta semana foram entrevistados,
posteriormente, pela equipe de pesquisadores para avaliarem o projeto. A professora de
Ciências destacou que um dos pontos fortes dessa semana foi a boa participação dos alunos,
o que superou suas expectativas. Relatou que, um mês antes, eles haviam recebido a visita
de uma psicóloga da secretaria de saúde para dar uma palestra sobre doenças sexualmente
transmissíveis e, segundo ela, a turma não participou bem dessa atividade, não dando muita
atenção à psicóloga. A professora atribuiu essa diferença de comportamento à metodologia
de trabalho adotada nesta experiência, conforme sua fala a seguir:
Quando foi a senhora da secretaria de saúde, os alunos não deixaram ela trabalhar. Se espalharam e o trabalho dela ficou vago. Poucos participaram só com perguntas.
100
O trabalho de vocês foi mais aberto, foram metodologias diferentes, os alunos participaram ativamente...houve abertura do diálogo, debate.
Quando questionada sobre o que ela considerou mais marcante durante essa
semana, a professora mencionou as dúvidas que os alunos demonstraram ter em relação às
doenças sexualmente transmissíveis. Ela se disse impressionada com isso, pois eram dúvidas
que ela achava que eles não deveriam ter mais, pois já tinham sido faladas nas aulas do 8º
ano, quando o currículo de Ciências aborda esse tema, e também pelo fato de considerar
que eles têm muito acesso a informação – “eles têm acesso à Internet, são dúvidas que não
deveriam ter mais”.
Com relação ao uso da tecnologia em todas as atividades, a professora colocou que
esta experiência em que todos trabalharam com seus computadores em sala de aula foi
muito interessante, pois mostrou uma possibilidade bem sucedida de uso dos laptops -
“mesmo para quem domina, colocar isso na aula ainda é muito difícil. É devagar, não temos
muitos exemplos de como as pessoas usam isso”.
Ainda antes do fim deste ano letivo, em novembro, apresentei à professora algumas
propostas de recursos que poderiam ser usados em atividades que poderíamos planejar para
o ano seguinte. Foi sugerida a possibilidade de trabalhar com histórias em quadrinhos em
sites (de acesso gratuito: www.toondoo.com e www.maquinadequadrinhos.com.br) onde os
alunos poderiam criar suas próprias histórias. A professora se interessou mais pela primeira
opção, pois considerou que era bem farto de opções de criação e que, por isso, os alunos
iriam gostar bastante e, ainda, pelo fato de julgar que o segundo site, que trabalhava com
personagens da Turma da Mônica, seria muito infantil. A proposta da história em quadrinho
era que este poderia ser um bom recurso de construção, com o qual os alunos poderiam
trabalhar com certa autonomia dentro de um conteúdo especificado pela professora. Seria
uma oportunidade de os estudantes interagirem com o currículo de forma diferente, já que
durante esse período de acompanhamento das aulas desta professora, ainda não tinham
sido observadas atividades em que seus alunos tivessem que criar, apresentar e discutir algo
com a turma, o que seria uma forma de participação mais ativa em sala de aula. Outra opção
apresentada à professora foi a de construção de palavras-cruzadas e caça-palavras, também
online (http://www.discoveryeducation.com/free-puzzlemaker/). Conforme observado, a
professora costumava incluir essas modalidades de jogo nas folhas de exercício que
101
preparava para suas turmas. Além disso, a própria professora já havia comentado que os
alunos gostavam muito de fazer exercícios com palavras cruzadas ou caça-palavras, mas que
ela só conhecia uma forma manual de criar esses jogos, o que lhe consumia bastante tempo.
Sendo assim, o site sugerido poderia ajudá-la a construir esses jogos de forma mais rápida e
fácil, pois o próprio programa monta a palavra-cruzada ou caça-palavra a partir das “dicas”
inseridas pelo autor. Além disso, foi sugerido que esse recurso também poderia ser usado
em alguma atividade em que os alunos poderiam criar seus próprios jogos em sala de aula, a
partir de qualquer conteúdo de Ciências, de modo que eles tivessem que estudar para criar
os jogos, seu gabarito e depois trocar com os colegas. Nesta reunião, a professora explorou
cada site, aprendendo como cada um funciona.
Diferente dos recursos anteriores, que necessariamente precisam de acesso à
Internet, também foi apresentada à professora uma terceira sugestão que pode ser utilizada
offline. Tratava-se da construção de questões com o programa Libre Office Impress que
acompanha o software Linux, instalado nos laptops educacionais dos alunos, similar ao
Power Point - Windows, que permite a criação de apresentações de slides3. Um tutorial
(também no modelo de uma apresentação de slides) foi preparado para a professora,
demonstrando como isso poderia ser feito passo a passo, usando o exemplo de questões
múltipla escolha, para que ela pudesse ter uma ideia concreta de como poderia criar uma
atividade com este recurso. Com uma questão desse tipo, o aluno pode clicar na opção de
resposta que desejar e isso o direciona para um slide que lhe transmite alguma mensagem,
como “certa resposta” ou “tente novamente”, por exemplo. Apesar de não exigir o acesso à
Internet para sua construção e leitura, a professora pode usar a rede para pesquisar imagens
e textos a serem acrescentados nessas apresentações, o que pode tornar o material mais
rico e interessante para os alunos. Trabalhos desenvolvidos com esse recurso poderiam
constituir-se como mais uma proposta diferente de interação dos alunos com o conteúdo,
que normalmente era feita por meio do livro, apostila ou folhas de exercícios, conforme
observado até então.
3 Este programa permite que se crie ações que funcionam como hiperlinks que direcionam o usuário a diferentes slides. Como um exemplo, pode-se criar um texto e adicionar uma ação (nome dado pelo próprio programa) a uma determinada palavra ou imagem que funcionará como um “botão”. Ao clicar nesta palavra ou imagem, a pessoa é direcionada a um slide específico que pode conter alguma informação sobre aquela palavra, uma outra imagem ou qualquer coisa que o autor tenha planejado. Com uma apresentação de slides criada nesse formato, o indivíduo pode fazer o próprio percurso de leitura.
102
A professora recebeu bem as sugestões e concordou em planejar atividades para
usar esses recursos com os laptops educacionais no próximo ano letivo, já que naquele
momento, o ano de 2012 já estava se encerrando, com as turmas se preparando para as
provas finais.
5.1.4 Continuidade das observações e parceria - Ano letivo 2013
O ano letivo de 2013 começou em fevereiro e por conta da saída da outra professora
de Ciências, que lecionava para o 6º ano, a professora acompanhada passou a ser a única a
lecionar esta disciplina no turno da manhã, assumindo, portanto, cinco turmas de 6º a 9º
ano.
No primeiro dia de aula, a professora anunciou para todas as turmas que, naquele
ano, eles fariam todas as provas online com os seus respectivos laptops, referindo-se ao site
(www.proprofs.com) que havia visto no ano anterior. Os alunos demonstraram bastante
surpresa e curiosidade para saber como seria esta novidade. Ela colocou ainda que essa
forma de avaliação, pela Internet, teria a vantagem de contribuir para economizar papel, o
que seria uma preocupação ecológica que todos deveriam ter.
No final de março, a professora planejou aplicar a primeira prova online com a turma
de 7º ano. No intervalo do recreio, mostrou a prova que ela mesma preparou, acessando
pelo computador da sala dos professores e verificou que estava tudo certo para que fosse
aplicada no próximo tempo de aula. Entretanto, na sala de aula, apenas quatro dos 38
alunos conseguiram acessar a prova. A professora circulou pela sala, verificando se cada
aluno estava digitando corretamente o endereço do site ou se havia algum problema com o
laptop para conseguir a conexão, solicitando ajuda para isso. No entanto, depois de
corrigidos os erros, a dificuldade de acesso persistiu. Esse problema tomou cerca de 20
minutos do tempo de aula e a professora decidiu imprimir a prova na sala dos professores.
Ela ficou visivelmente irritada, reclamou do trabalho que teve para fazer essa prova online, e
inclusive já tinha outra pronta - “Perdi meu tempo fazendo isso e agora não funciona...nunca
mais faço nada com esse computador!”. Mais tarde, na turma de 9º ano, soube por um dos
103
alunos, que a professora de Matemática estava trabalhando com os laptops nesta turma ao
mesmo tempo em que a professora de Ciências tentava aplicar a prova com o 7º ano. O
aluno disse que a turma havia trabalhado com os computadores no 3º e 4º tempos. Segundo
ele, no 3º tempo a Internet funcionou muito bem, mas no 4º tempo começou a falhar,
exatamente quando a professora de Ciências tentava aplicar a sua prova online com a outra
turma. Provavelmente a rede não suportou o acesso simultâneo de duas turmas com
aproximadamente 40 alunos cada.
Algum tempo depois, no final do mês de maio, a professora resolveu fazer uma nova
tentativa de teste online com o 9º ano, porém apenas três alunos conseguiram fazer o teste
na Internet. O restante dos laptops da turma indicava que estavam conectados, mas na
página onde deveria aparecer o teste, visualizavam uma mensagem de que aquele endereço
estava temporariamente indisponível. Assim, mais uma vez, a professora teve que imprimir
o trabalho para ser feito em papel, não conseguindo cumprir o seu planejamento com o uso
desse recurso. Por conta desta experiência mal sucedida, a terceira considerando a tentativa
também frustrada no final do ano de 2012, a professora não retomou mais essa proposta de
provas online.
Ainda neste primeiro bimestre do ano, a professora comentou que estava criando
palavras cruzadas para exercícios com o site (http://www.discoveryeducation.com/free-
puzzlemaker/) que havia sido apresentado na reunião citada no tópico anterior, no final de
2012. A professora mencionou que também gostaria de usar as histórias em quadrinhos
online para trabalhar com o 7º ano sobre o tema malária. Ao fazer um teste com o site
(www.toondoo.com) no laptop de um aluno, não conseguiu carregá-lo por completo em
cerca de 40 minutos de tentativa. O laptop estava conectado, mas a velocidade da Internet
não era suficiente para carregar um site tão “pesado”. Consequentemente, a professora
desistiu da ideia de trabalhar com as histórias em quadrinhos online, pois considerou que se
não era possível carregar a página com um laptop, também não seria possível com todos os
laptops em sala de aula.
Após o episódio com a prova online e o teste do site de histórias em quadrinhos, foi
possível perceber que a disposição da professora para investir em novas estratégias com os
laptops envolvendo a Internet ficou bastante abalada. Por este motivo, foi resgatada a ideia
104
de atividade offline, proposta sugerida no ano anterior, que consistia na criação de questões
com hiperlinks usando o programa Libre Office Impress. A professora concordou e sugeriu a
construção de questões de múltipla escolha sobre um conteúdo que seria abordado no
próximo bimestre, com o 7º ano: animais vertebrados. Dessa forma, haveria tempo para
planejar e buscar imagens interessantes para as questões. Segundo a professora, essa
matéria costuma despertar a curiosidade dos alunos, mas também gera muitas dúvidas
quanto às características que diferenciam cada grupo animal. Assim, ela considerou que com
esse trabalho poderia aprofundar mais detalhes que a apostila da prefeitura não menciona,
além de poder usar muitas imagens que, segundo ela ajudam bastante a compreensão. O
material demorou aproximadamente um mês para ficar pronto e fiquei responsável por
fazer toda a parte de criação dos slides e das ações (hiperlinks) necessárias entre eles, pois a
professora alegou que isso lhe tomaria muito tempo, já que ainda teria que planejar as aulas
das demais turmas, tanto desta escola quanto da outra em que também trabalhava. Dessa
forma, nós discutíamos na escola os temas das questões que deveriam compor o material,
eu as desenvolvia nos slides e apresentava e discutia com a professora no encontro seguinte.
O material foi denominado de “Quizz do Reino Animal - Os Incríveis Vertebrados”, o qual
contou com um total de 48 slides distribuídos entre questões dos grupos de Peixes, Anfíbios,
Répteis, Aves e Mamíferos, contendo breves textos sobre os animais e esquemas (figura 6).
A professora resolveu aplicar o quizz como uma atividade de revisão antes de um teste que a
turma realizaria em junho.
105
Figura 6: Exemplos dos slides que fazem parte do quizz. A – Capa; B – Regras do Jogo com orientações para responder as questões; C - Escolha do grupo animal representado por
personagens animados; D – Texto de introdução para o grupo Anfíbios.
A B
C D
Fonte: Elaborada pela autora
A professora usaria a estratégia de um computador por aluno e, por isso, no dia
anterior ao planejado para a atividade, foi necessário salvar a apresentação de slides em
cada laptop de cada aluno das duas turmas de 7º ano que fariam o trabalho. Para isso, foi
preciso aguardar o término das aulas do turno da manhã para retirar todos os computadores
dos armários que ficam dentro das salas de aula. Uma das turmas tinha 38 alunos e a outra
18, totalizando portanto, 56 computadores. A professora não pode ficar nesse horário para
fazer essa tarefa, pois teria que ir para a segunda escola na qual lecionava, em outro
município. Sendo assim, solicitei a ajuda da monitora bolsista que estava presente na escola
e, juntas, salvamos o arquivo em todos as máquinas. Em seguida, carregamos os
computadores para que não houvesse problemas com a bateria no dia seguinte.
As duas turmas fizeram a atividade com o quizz no mesmo dia, cada uma em um
tempo de aula de 50 minutos. Cada aluno recebeu o seu laptop e deveria resolver as
106
questões e marcar as respostas em um cartão de papel para entregar à professora. Os
alunos demonstraram bastante interesse pelo material, pois durante todo o tempo
permaneceram concentrados no que estavam lendo e fizeram toda a atividade praticamente
em silêncio. Esse comportamento surpreendeu a professora, que reconheceu que eles têm
um grande interesse pelo trabalho com o computador. Enquanto observava os alunos
fazendo o trabalho, ela comentou que gostaria de usar mais os laptops. Além disso,
discutimos que a modalidade de exercícios que estavam fazendo, múltipla escolha, era a
mesma que costumavam fazer em papel, mas a novidade de apresentação do trabalho havia
atraído a atenção deles. A professora lembrou que quando passa as folhas de exercício para
fazerem em sala, eles costumam ficar agitados, conversando muito e dificilmente
conseguem terminar a tarefa no mesmo tempo de aula em que foi passado, retardando-a o
máximo que podem. Sendo assim, a professora pareceu bastante satisfeita com o resultado
da atividade. Quanto aos alunos, além do interesse que demonstraram com o próprio
comportamento, alguns deles também elogiaram abertamente a criatividade da
apresentação por conta das figuras, especialmente os personagens de desenhos animados
que representavam cada grupo animal.
Ainda no primeiro semestre de 2013, a professora utilizou o projetor de imagens para
uma aula sobre células no 8º ano, exibindo o site www.planetabio.com.br, o mesmo que ela
já havia utilizado no ano anterior, porém com cada aluno visualizando o site em seu próprio
laptop. Por receio da instabilidade da Internet, a professora resolveu projetar o site, em vez
de pedir que cada aluno utilizasse o laptop para visualizá-lo e, neste dia, a Internet
funcionou bem, pois ela conseguiu mostrar todas as animações e esquemas que pretendia e
a turma prestou bastante atenção à aula. Alguns dias depois, ela fez uma segunda tentativa
de uso do mesmo recurso, mas desta vez a Internet não funcionou e ela trabalhou com a
apostila. O recurso do vídeo, trazido em pendrive, foi utilizado pela professora em cinco dias
acompanhados nesse período, associando um trabalho posterior ao vídeo, de perguntas
relacionadas, por duas vezes. Houve uma aula em que a professora preparou uma lista de
questões, no editor de textos, e projetou para que os alunos as copiassem. Dessa forma, a
professora pôde circular pela sala e verificar se eles faziam mesmo a cópia, o que não é
possível quando ela precisa escrever as questões no quadro.
107
A estratégia da cópia foi bastante usada pela professora desde o início das
observações, constituindo-se uma forma de tentar controlar a indisciplina e a conversa
demasiada das turmas. Os alunos reclamavam bastante desse tipo de trabalho, alguns
copiavam apenas alguns trechos, continuavam conversando e houve um momento em que a
própria professora avisou que quanto mais conversassem, mais cópia fariam, conforme sua
fala na turma de 9º ano: “Olha só! Eu estou usando esse critério com a 1601 (turma do 6º
ano). Quanto mais fala, mais eu passo dever!”. No último dia de aula, no 9º ano, antes do
recesso escolar de julho, a professora usou uma apresentação de slides que ela mesma havia
preparado. A turma esteve atenta, participou fazendo perguntas e a professora conseguiu
falar confortavelmente sobre o conteúdo durante todo o tempo de aula. Ela comentou que
iria preparar outras apresentações desse tipo para o 3º e 4º bimestres para todas as turmas,
justificando que os alunos prestam mais atenção com essa estratégia, ficam quietos e ela
consegue falar tudo o que pretende.
No primeiro dia de aula do segundo semestre, após o primeiro período de greve
deste ano, a professora mostrou algumas apresentações de slides que ela já tinha
conseguido preparar para aulas em todas as turmas, cumprindo a intenção que ela havia
comentado antes do recesso. No dia seguinte, utilizou duas dessas apresentações, uma com
o 9º ano e outra com o 7º ano. A professora acrescentou, ao final das apresentações, um
slide com questões para os alunos copiarem e outro slide com as respostas desses exercícios,
apresentado depois que a turma já havia terminado a tarefa e, então, poderiam corrigir o
trabalho. Comentou que gostou do comportamento da turma com essa estratégia, pois
ficaram mais silenciosos e a deixaram falar. Embora o momento da cópia e realização do
exercício tenha sido mais agitado, com mais conversa, a professora teve liberdade para
circular pela sala e verificar o trabalho. Em uma das aulas acompanhadas em setembro a
professora adotou a mesma estratégia de apresentação de slides para iniciar um conteúdo
novo e exercícios no final para cópia, também nas turmas de 9º e 7º ano.
Quanto às atividades “Com-Viver Com-Ciência e Cidadania” (APÊNDICE A), estendidas
para outras turmas em 2013, a atividade do Conceito de Saúde foi a única a ser realizada
com cada turma este ano por conta das greves. A professora de Ciências participou dessa
atividade nas turmas de 6º e 9º ano. Na primeira turma, a professora entrou no terceiro
tempo, quando a atividade já estav em andamento e os alunos estavam no momento em
108
que tinham que apresentar suas ideias e pesquisas que tinham feito online (cada um com
seu laptop) sobre saúde. Este momento culminou com o debate final sobre o que seria o
conceito ampliado, com o qual a professora contribuiu com suas ideias e também lançando
questionamentos à turma. Na segunda turma, 9º ano, a professora esteve presente no
segundo tempo de aula, quando os alunos estavam no momento de trabalho em grupo,
cada um com seu laptop, fazendo pesquisas seguindo a proposta da questão: “Quando eu
penso em saúde o que vem à minha cabeça?”. Nessa etapa, a professora participou
circulando pela sala e acompanhando e estimulando os grupos na tarefa. Portanto, com
estas duas participações, a professora teve a oportunidade de conhecer todas as etapas da
atividade, da qual ela não tinha participado em 2012, na Semana “Com-Viver Com-Ciência e
Cidadania” realizada somente com o 9º ano.
5.1.5 Continuidade das observações e parceria - Ano letivo 2014
No primeiro dia de aula, enquanto esperava a professora de Ciências na sala dos
professores, a professora de História comentava sobre os laptops e os problemas com a
Internet da rede UCA. Ao chegar e perceber que o assunto era sobre os laptops, a professora
de Ciências disse: “eu já desisti de usar isso, não funciona direito!” (referindo-se à Internet).
Argumentei que ainda era cedo para desistir, que talvez esse ano fosse melhor ou
poderíamos criar estratégias diferentes de uso. Ela disse que tentaria usar os laptops com o
8º ano, pois esta seria a turma pequena daquele ano letivo. Uma das salas de aula da escola
tem um espaço bem reduzido e só permite uma turma de no máximo 18 alunos. A
professora mencionou esta turma, considerando que, com um número reduzido de alunos, o
uso da Internet poderia ser mais viável. Ela lembrou das provas online que criou no ano
anterior e que não conseguiu aplicar. Sugeri que ela poderia tentar usar uma dessas provas,
preparadas para o 8º ano de 2013, para esta nova turma de 2014, não necessariamente
como prova, poderia ser um trabalho, e ela concordou.
Contudo, por conta de todas as dificuldades com a rede de Internet UCA, que
persistiram e se agravaram este ano, conforme mencionado no tópico 5.1.1, os planos de
109
realização de atividades com os laptops educacionais foram impossibilitados. Assim, o uso
de recursos tecnológicos pela professora, nas aulas acompanhadas em 2014, ficou limitado a
vídeos e apresentações de slides. A professora ainda conseguiu usar a Internet pela rede
Educopédia, em três dias de aula no primeiro semestre do ano, quando esta rede ainda
estava funcionando. Em dois desses dias ela exibiu vídeos e, em outro dia, exibiu o site
www.planetabio.com.br, com o qual já havia trabalhado outras vezes nos anos anteriores.
Nas demais aulas em que utilizou vídeos, ela os trouxe salvos em seu pendrive, sendo ao
todo oito dias de uso deste recurso durante todo o ano. Assim como observado no ano
anterior, na maioria das vezes (n=6) os vídeos não foram associados a outras atividades,
sugerindo uma função de ilustração, reforço de conteúdo dado ou mesmo entretenimento e
controle de indisciplina da turma, conforme nos outros anos. Em apenas duas aulas, o vídeo
foi associado a um trabalho posterior, com questões a serem respondidas a partir do vídeo.
A apresentação de slides preparada pela própria professora foi o recurso que ela
mais utilizou este ano, em 15 dias de aula acompanhados, sendo que em alguns dias a
professora utilizou-o em todos os cinco tempos de aula do dia, ou seja, com todas as suas
turmas. A professora utilizou esse recurso de quatro formas distintas: para apresentar uma
matéria nova (quatro aulas); para servir de consulta aos alunos que tinham que responder a
uma folha de exercício (uma aula); para exibir uma lista de exercícios que os alunos tinham
que copiar e responder em seguida (três aulas); para apresentar uma matéria nova seguida
de uma lista de exercícios a ser copiada ou a própria matéria deveria ser copiada (sete
aulas). Em vários momentos, apesar do silêncio que se fazia em sala para a professora dar as
explicações e passar os slides, alguns alunos reclamavam em voz baixa, para si ou para o
colega do lado, que não estavam entendendo nada do que a professora falava, mas em vez
de expressar suas dúvidas para ela, preferiam abaixar a cabeça na carteira, desistindo de
acompanhar a apresentação. Muitas vezes, a professora explicava rapidamente conceitos
novos para a turma, parecendo assumir que todos a estavam acompanhando, talvez pelo
fato de estarem em silêncio. Entretanto, nas aulas em que precisavam realizar exercícios
referentes à matéria dada, as dificuldades apareciam e a professora parecia impaciente por
ter que voltar as explicações.
Quanto às atividades “Com-Viver Com-Ciência e Cidadania”, estas só foram possíveis
com algumas adaptações para manter a articulação das TDIC e acesso à Internet em alguma
110
etapa de cada atividade, conforme mencionado no APÊNDICE A, levando em consideração a
ausência de Internet nas salas de aula neste ano de 2014. A professora de Ciências
participou das atividades acordadas para suas turmas de 6º (Conceito de Saúde e Jogo
“Saúde em Jogo”) e 8º ano (Conceito de Saúde e Diário do Corpo). O envolvimento da
professora nessas atividades foi uma possibilidade de continuar participando do
desenvolvimento de estratégias com o uso de TDIC, o que vinha ao encontro de nosso
objetivo de parceria.
Na atividade do Conceito de Saúde, a professora de Ciências conduziu o debate com
os alunos sobre o conceito ampliado de saúde. Ao final, os alunos se organizaram em grupos
e sortearam temas referentes a conteúdos que fazem parte do currículo de Ciências (Água,
Ar, Solo, Corpo Humano), com os quais cada um desenvolveria questões para o jogo, etapa
que ocorreria no próximo dia marcado para esta atividade. Contudo, nesta data, a greve dos
professores já havia iniciado. A professora de Ciências não havia aderido ao movimento e a
coordenadora pedagógica confirmou que as aulas estavam acontecendo normalmente com
os professores presentes. Entretanto, ao chegar à escola, os pesquisadores foram
informados que a professora de Ciências havia aderido à greve e, por isso, não
compareceria. Este encontro já havia sido adiado uma vez por conta de alguns problemas no
planejamento e a coordenadora pediu que não fosse adiado novamente, pois os alunos
estavam ansiosos pela atividade. Sendo assim, a atividade ocorreu com a condução dos
pesquisadores.
Antes do próximo encontro, no segundo semestre, que seria para concluir a
atividade, a professora se reuniu com os pesquisadores para discutir sobre o resultado das
questões que os alunos construíram na etapa que ela não participou. Na etapa em que se
realizou o jogo propriamente, a professora conversou com os alunos sobre as questões que
construíram, fez algumas correções e, em seguida, conduziu o jogo com os alunos
distribuídos nos mesmos grupos em que trabalharam na etapa anterior. O jogo consistiu de
recursos físicos, com tabuleiro, dados e cones e como recurso tecnológico, foi utilizada uma
apresentação de slides para exibir as questões em estilo de cartas numeradas (n=35) com
hiperlinks entre os slides, de modo que o aluno poderia selecionar o número de uma carta e,
clicando na mesma, era direcionado à respectiva questão e, deste slide, também poderia se
direcionar para a resposta, semelhante ao trabalho do Quizz do Reino Animal. A organização
111
desta apresentação de slides foi feita pelos pesquisadores. Ao final da atividade, a
professora comentou sobre o bom desempenho da turma, que gostou muito dessa atividade
e que percebeu o grande interesse e envolvimento dos alunos, que queriam continuar
jogando mesmo quando o tempo de aula terminou.
Na atividade Conceito de Saúde, com a turma de 8º ano, a professora de Ciências
participou da etapa de debate sobre as imagens de Saúde que os alunos haviam pesquisado
na Internet, acessada na sala de informática e sala de leitura, conforme mencionado no
APÊNDICE A. A professora de Ciências participou timidamente dessa discussão, pois ao
mesmo tempo em que fazia comentários com alunos sobre as imagens projetadas, ela
também estava tentando corrigir provas de outra turma. Assim que entrou na sala, ela foi
convidada pelos pesquisadores, que estavam acompanhando a atividade desde o início, para
assumir o quadro e o debate diante da turma, mas ela recusou e disse que iria sentar-se
junto aos alunos, deixando, portanto que os pesquisadores continuassem à frente da
atividade.
Na atividade do Diário do Corpo, também na turma de 8º ano, após o Conceito de
Saúde, a professora de ciências era esperada para participar da atividade no terceiro tempo
de aula, quando seria o momento de debate com a turma, após a exibição de um vídeo e da
avaliação antropométrica que fariam nos tempos anteriores. Ela estava ciente da atividade,
esteve envolvida nas reuniões de planejamento, mas, nesse dia, a professora não entrou na
sala de aula no horário que lhe cabia. Os pesquisadores, então, seguiram conduzindo o
debate com a turma quando a professora de Educação Física saiu, até que a professora de
Ciências entrasse na sala. Devido à sua demora, fui procurá-la e a encontrei no corredor,
conversando com algumas pessoas. Ela disse que iria logo, porém não apareceu. Parece que
ela utilizou esse momento, em que a turma estava acompanhada pelos pesquisadores, para
resolver alguma questão.
No esquema, a seguir, são sintetizadas as atividades realizadas com uso das TDIC pela
professora ao longo do tempo de acompanhamento, entre 2012 e 2014, considerando tanto
as atividades exclusivas das suas aulas de Ciências, quanto as atividades em que ela se
envolveu junto ao grupo de pesquisa para o projeto “Com-Viver Com-Ciência e Cidadania”.
112
Figura 7: Apresentação de atividades com TDIC ao longo do tempo – 2012/2; 2013; 2014:
2012/2
Primeira aula com uso de TDIC: Visita
à uma página de Internet com o uso
de um laptop por dupla de alunos. A
estratégia foi usada no mesmo dia
com três turmas – 7º e 8º ano. A
Internet funcionou.
Visita à uma página de Internet –
continuidade da matéria com as
mesmas turmas (7º e 8º ano) do 4º dia
de observação. Desta vez foi usado um
laptop por aluno. A Internet funcionou.
- “Semana Com-Viver Com-Ciência e
Tecnologia” – atividades Diário do
Corpo e Saúde em Jogo com uso de um
laptop por aluno em pelo menos uma
etapa das atividades. A Internet
funcionou.
- Exibição de vídeo – uma aula no 9º
ano. Offline.
- Exibição de vídeo – três aulas no 7º
ano. Duas aulas com exibição offline e
uma com exibição online.
- Exibição de vídeo – uma aula no 9º
ano. Offline.
- Primeira tentativa de realizar a prova
online com acesso a um endereço de
Internet específico usando um laptop
por aluno. A atividade não foi realizada
por falta de Internet.
JULHO AGOSTO
SETEMBRO
OUTUBRO
NOVEMBRO
113
2013
- Exibição de vídeo – uma aula no 6º
ano. Offline.
- Projeção de uma página da Internet para
demonstração de esquemas e animações –
uma aula no 8º ano. Internet funcionou.
- Primeira tentativa deste ano para realizar
uma prova online com acesso a um
endereço de Internet específico usando um
laptop por aluno. A atividade não foi
realizada por falta de Internet.
- Exibição de vídeo – dois dias de aula no 7º
ano. Offline.
- Projeção de uma lista de questões em
editor de texto para cópia – uma aula
no 9º ano. Offline.
- Segunda tentativa do ano para
realizar uma prova online com acesso a
um endereço de Internet específico
usando um laptop por aluno. A
atividade não foi realizada por lentidão
da Internet.
- Exibição de vídeo – uma aula no 7º
ano. Online.
- Atividade “Conceito de Saúde” –
referente ao projeto “Com-Viver Com-
Ciência e Cidadania” – uso de um
laptop por aluno no 6º ano para
pesquisa e debate sobre conceito
ampliado de saúde. Internet
funcionou.
- “Quizz do Reino Animal – Os Incríveis
Vertebrados” – questões de múltipla
escolha em apresentação de slides com
hiperlinks – uso de um laptop por aluno com
duas turmas de 7º ano – revisão de
conteúdo. Offline.
- Atividade “Conceito de Saúde” – referente
ao projeto “Com-Viver Com-Ciência e
Cidadania” – uso de um laptop por aluno no
6º ano para pesquisa e debate sobre
conceito ampliado de saúde. Internet
funcionou.
FEVEREIRO MARÇO
ABRIL
MAIO
JUNHO
- Projeção de slides para apresentação
de conteúdo ao 9º ano. Offline. - Projeção de slides para apresentação de
conteúdo às turmas de 7º e 9º ano com
inclusão de questões para cópia no slide
final. Offline.
JULHO AGOSTO
1ª GREVE DOS PROFESSORES!
Entre segunda semana de agosto e
segunda semana de setembro.
- Projeção de slides para apresentação de
conteúdo às turmas de 7º e 9º ano com
inclusão de questões para cópia no slide
final. Offline. (aula dada no intervalo dos
dois momentos de greve)
SETEMBRO
2ª GREVE DOS PROFESSORES!
Entre última semana de setembro e
última semana de novembro.
- Exibição de vídeo – uma aula no 7º ano.
Online. (última aula acompanhada neste
ano)
DEZEMBRO
114
2014
- Exibição de vídeo – duas aulas no 9º
ano. Uma aula offline e outra online.
MARÇO
- Atividade “Conceito de Saúde” com o 6º
ano – referente ao projeto “Com-Viver
Com-Ciência e Cidadania” – não houve uso
de recurso tecnológico, pois por falta de
Internet, os alunos foram orientados a
escrever ou desenhar o que significava
saúde para eles para depois discutir.
Contudo esta atividade foi considerada a
primeira etapa de outra: a construção do
jogo “Saúde em Jogo”, a qual envolveu
pesquisa na Internet.
- Exibição de vídeo – uma aula no 9º ano.
Offline.
- Projeção de slides para apresentação de
conteúdo novo – uma aula no 9º ano.
Offline.
ABRIL
MAIO
- Atividade de construção das questões
do jogo “Saúde em Jogo” com o 6º ano
– referente ao projeto “Com-Viver
Com-Ciência e Cidadania” - uso de um
laptop por grupo de alunos para
pesquisa de temas para questões.
Internet funcionou (rede da escola e
redes de celulares de pesquisadores).
- Exibição de vídeo – uma aula no 7º
ano. Online.
- Projeção de slides para apresentação
de conteúdo novo mais exercício para
cópia – uma aula no 8º ano. Offline.
GREVE DOS PROFESSORES!
Entre segunda semana de maio e última
semana de junho.
- Projeção de slides para apresentação
de conteúdo para cópia – uma aula no
7º ano e uma aula no 8º ano. Offline.
JULHO
AGOSTO
- Projeção de uma página da Internet para
demonstração de esquemas e animações –
uma aula no 8º ano. Internet funcionou.
- Projeção de slides para apresentação de
conteúdo ao 9º ano; projeção de conteúdo
para consulta dos alunos para responder
uma folha de exercício – 8º ano; projeção
de lista de exercícios para cópia – 6º e 7º
ano. Offline.
-
- Atividade final “Saúde em Jogo” com
o 6º ano - referente ao projeto “Com-
Viver Com-Ciência e Cidadania” –
projeção de slides com as questões
criadas pelos alunos e jogo
propriamente dito. Offline.
- Atividade “Conceito de Saúde” e
“Diário do Corpo” – uso de
computadores da sala de informática e
laptops para acesso à Internet em
ambos os casos, além de projeção de
imagens no caso do Conceito de Saúde
e de um vídeo para debate no caso do
Diário do Corpo.
- Exibição de vídeo – uma aula no 8º
ano e uma aula no 9º ano. Offline.
- Projeção de slides para apresentação
de conteúdo novo para cópia – três dias
de aulas no 9º e 7º ano. Offline.
SETEMBRO
- Projeção de slides para apresentação de
conteúdo novo e cópia – duas aulas no 9º
ano. Offline.
- Exibição de vídeo – duas aulas no 6º ano.
Offline.
- Projeção de slides para apresentação de
conteúdo novo – uma aula no 9º ano.
Offline.
OUTUBRO
NOVEMBRO
115
5.1.6 Percepções sobre a professora, os alunos e suas relações
Durante todo esse tempo de convivência com a professora e, consequentemente,
também com os alunos, foi possível observar e vivenciar situações que iam além das
atividades com TDIC, que faziam parte do objetivo do estudo.
A professora de Ciências era querida pela maioria dos alunos, provavelmente pelo
seu temperamento bem humorado e sua maneira afetuosa e brincalhona de falar, na
maioria das vezes. Em diversas ocasiões, os alunos vinham até o corredor oferecer ajuda
para carregarem seu material para a sala e ainda faziam brincadeiras dizendo que a amavam
e queriam abraçá-la, o que ela sempre retribuiu. Entretanto, isso não significa que os alunos
eram atenciosos em suas aulas, como ela gostaria. A maioria, em todas as turmas,
costumava ser bastante indisciplinada no sentido de conversar muito e não dar atenção à
aula e ao que a professora pedia como tarefa. Era possível perceber que a professora
chamava a atenção, algumas vezes em tom leve de brincadeira, em outras em tom mais
severo, porém com a continuidade da indisciplina, ela acabava desistindo de tentar controlá-
los e, às vezes, nem terminava de dar as explicações da matéria e deixava que conversassem,
enquanto se concentrava em algum trabalho em sua mesa. Certa vez, ela conversou duro
com uma turma sobre a sua falta de atenção e disse: “Poxa, eu me sinto aqui como uma
cantora de churrascaria! Aquela pessoa que fica lá se ‘esgoelando’ e ninguém presta atenção
nela...”. Houve vários momentos em que a professora apenas olhava na minha direção,
durante a aula, com expressão de desânimo e cansaço por pedir atenção dos alunos e não
conseguir.
Algumas vezes, a professora demorava para entrar em sala e iniciar uma aula. Às
vezes ela ia até a secretaria para imprimir um material, no horário da aula, e levava alguns
minutos para voltar ou demorava para começar o trabalho, pois ficava dando atenção a
alguns alunos que vinham até sua mesa conversar. Assim, de um tempo de aula de 50
minutos, apenas 30 ou 35 minutos eram de fato aproveitados. Nestes momentos em que a
professora se ausentava da sala, era possível observar a grande agitação das turmas, sempre
lotadas com mais de 35 alunos. Em uma destas ocasiões, fui obrigada a interferir em uma
briga de alunos do 6º ano, tendo que separá-los com a ajuda de outro aluno.
116
Essa situação começou a se apresentar logo no segundo dia de observação, em 2012,
quando a professora comentou, visivelmente frustrada, que não entendia porque os alunos
entregavam trabalhos com questões simples em branco, que ela já havia dado em sala de
aula e que poderiam facilmente ter consultado o livro ou apostila, conforme mencionado no
tópico 5.1.2. De fato, era frequente ver muitos alunos passando a aula toda conversando e
fingindo que estavam fazendo o trabalho, queriam copiar as respostas daqueles poucos que
faziam e, várias vezes, também pediam que eu desse as respostas para eles. Inclusive em
dias de prova, alguns alunos a entregavam em poucos minutos, aparentemente desistindo
de fazê-la por não saber ou não querer responder. Esse problema com a indisciplina dos
alunos não era sentido só pela professora de Ciências. Nos encontros com outros
professores no intervalo do recreio, esse assunto era constante, cada um comentando sobre
alguma situação e suas dificuldades.
A professora conseguia ter mais paciência e se relacionar melhor com a turma
pequena (18 alunos) do que com as outras, bem mais numerosas. O comportamento dos
alunos desta turma não era muito diferente dos outros, mas a professora conseguia
conversar com eles com mais facilidade, sem precisar gritar para chamar-lhes atenção, como
acontecia com os demais, já que o volume da conversa era muito mais alto, proporcional ao
número de alunos. Com isso, o trabalho rendia melhor, pois ela conseguia atender cada um
individualmente, quando solicitada. A própria professora comentou que gostava de
trabalhar com a turma pequena: “não é que eles sejam melhores, mais inteligentes do que os
outros, mas pelo próprio número de alunos, é mais fácil de dar aula, de conseguir ver o que
eles estão fazendo...”. Nas demais turmas, a professora dificilmente conseguia dar a mesma
atenção a todos e sempre havia aqueles alunos que lhe passavam despercebido pois não lhe
chamavam, enquanto outros a solicitavam demasiadamente para tirar dúvidas. Entretanto,
isso não significa que as estratégias pedagógicas com esta turma pequena eram diferentes
das demais, mantendo o uso de vídeos, slides, exercícios para cópia etc.
Com o tempo, a professora passou a adotar estratégias de imposição de controle e
autoridade com mais frequência para as turmas numerosas, como uma tentativa de facilitar
seu trabalho dentro dessa situação. A cópia de exercícios tornou-se mais frequente em 2014,
como uma estratégia declarada de punição, pois a professora anunciava para os alunos que
só pararia de passar exercícios quando eles parassem de conversar. O uso de vídeo e
117
apresentações de slides também foram estratégias de tentativa de controle da disciplina e
com os quais a professora encontrou também uma forma de se desgastar menos para expor
um conteúdo novo ou para passar exercícios, já que ela poderia projetá-los e circular
livremente pela sala controlando os alunos mais de perto.
A partir dessas observações, foi possível perceber que as decisões da professora
quanto ao planejamento de atividades pedagógicas com TDIC foram influenciadas ao mesmo
tempo por suas concepções pedagógicas, pelas condições do contexto escolar e pela própria
parceria com a pesquisadora. Portanto, estes aspectos e suas inter-relações são elementos
que se somam aos percebidos também com a entrevista para compor a análise e discussão
deste estudo.
5.2 CONSIDERAÇÕES DA PROFESSORA DE CIÊNCIAS – A ENTREVISTA SEMI-ESTRUTURADA
Para ampliar a compreensão dos dados obtidos com a observação, especificamente
sobre a professora de Ciências e suas concepções, foi realizada uma entrevista semi-
estruturada em 18 de setembro de 2014 (APÊNDICE C). O roteiro de entrevista (APÊNDICE B)
foi estruturado em três blocos, sendo os dois primeiros referentes a questões pessoais, uma
vez que estas poderiam trazer informações relevantes para aprofundar a compreensão de
sua relação pedagógica com a tecnologia, as motivações para usá-la e as estratégias
adotadas. Assim, o primeiro bloco tratou de questões acerca da escolha e trajetória na
carreira docente e sua visão sobre a mesma. O segundo bloco tratou de questões acerca da
relação da professora com as tecnologias na sua vida pessoal. O terceiro bloco tratou
especificamente de questões relativas à tecnologia na vida profissional da professora, a fim
de que a mesma pudesse expor suas concepções.
Apesar deste roteiro orientador, a entrevista foi conduzida como um diálogo,
deixando a professora à vontade para expor suas ideias e, assim, muitas questões do roteiro
foram abordadas não necessariamente na ordem em que estavam no documento, mas de
acordo com o andamento das falas, assim como outras surgiram espontaneamente.
118
De início, a professora comentou que escolheu estudar Ciências Biológicas por gostar
da área e que, embora a carreira docente não fosse sua meta ao ingressar no curso,
começou a gostar de lecionar e seguiu no magistério. No entanto, ao longo da entrevista, os
aspectos negativos apontados pela professora com relação à sua profissão, tiveram maior
ênfase do que os positivos, uma vez que estes foram apontados rapidamente, como seu
gosto pela docência e a flexibilidade de horário, enquanto os negativos foram mais
frequentes ao longo da entrevista. Nesse sentido, a professora apontou sua insatisfação com
relação aos alunos e sua mudança de perfil ao longo do seu tempo de carreira, colocando
que estes são muito desinteressados e indisciplinados e apontando o sistema educacional
como uma das causas, por contribuir para enfraquecer sua autoridade perante os alunos,
segundo sua visão. A professora apontou também as TDIC como fator que, na sua visão,
contribui para o comportamento desinteressado dos alunos, uma vez que eles teriam maior
interesse pelo que está na Internet do que pelos assuntos tratados na escola.
Portanto, ao longo de suas falas foi possível identificar concepções da professora
acerca da docência, dos alunos e das TDIC, no seu cotidano pessoal e no seu trabalho
pedagógico que estão diretamente relacionadas às suas práticas. Além disso, a professora
teceu considerações sobre aspectos do contexto da escola e fora dela que também tiveram
influência sobre suas práticas com TDIC. Contradições entre suas falas e práticas exercidas
por ela, observadas durante este período, também foram percebidas.
Considerações acerca da parceria e contribuição para sua prática também foram
tratadas na entrevista, o que permitiu identificar também a visão que a professora teve
sobre a parceria e a compreensão de suas atitudes ao longo deste período de
acompanhamento.
Todas essas questões, juntamente com os dados apresentados no relato das
observações, contribuíram para a construção do quadro de análise, apresentado na próxima
seção.
119
5.3 ANÁLISE E DISCUSSÃO
As unidades temáticas, categorias e subcategorias de análise foram organizadas a
partir das questões para discussão, apontadas no tópico 5.5, capítulo 5, as quais se
originaram dos dados de observação e entrevista: (1) Como as concepções da professora
sobre ensino, alunos e tecnologias se relacionam com suas decisões para uso ou não das
TDIC em sala de aula?; (2) De que modo o contexto da escola influenciou as práticas da
professora com as TDIC e por quê?; (3) Qual a percepção que a professora teve sobre a
parceria com a pesquisadora?; (4) Como a parceria contribuiu para a prática da professora
com TDIC?
A análise e discussão das categorias/subcategorias, permite a compreensão ampliada
sobre o processo de integração de TDIC à prática dessa professora de Ciências ao longo do
tempo de parceria com a pesquisadora. Dessa forma, no quadro 4, a unidade I, denominada
“O processo de integração das TDIC à prática pedagógica da professora”, reúne duas
categorias que se referem às questões (1) e (2), respectivamente. A categoria “A relação das
concepções da professora com a prática pedagógica que desenvolveu com as TDIC” se
subdivide em três subcategorias, relativas a três dimensões de concepções da professora
(sobre a docência; sobre os alunos e sua relação com a escola; sobre TDIC para o ensino), as
quais puderam ser percebidas a partir das considerações tecidas por ela na entrevista, mas
também pelas observações da pesquisadora. A categoria “A relação entre o contexto
(escolar e extra escolar) com a prática pedagógica desenvolvida com TDIC” reúne
considerações da professora e percepções das observações da pesquisadora sobre aspectos
do contexto escolar que influenciaram a prática da professora, assim como considerações
que emergiram espontaneamente na entrevista quando a professora comenta sobre
aspectos fora do contexto da escola que também têm influência sobre sua prática. Essa
categoria não foi dividida em subcategorias por considerar que não seria possível discutir
isoladamente aspectos do contexto escolar e extra escolar, visto que os mesmos estão
fortemente interligados.
A unidade II, denominada “A parceria desenvolvida entre a professora e
pesquisadora”, reúne duas categorias, “Percepções da professora sobre a parceria” e
120
“Possível contribuição da parceria para a prática pedagógica da professora com TDIC e
desenvolvimento de TPACK”, que se referem às questões (3) e (4), respectivamente. A
primeira categoria reúne considerações da professora em sua entrevista e atitudes durante
as observações que permitiram inferir sobre a visão que a professora teve acerca da parceria
com a pesquisadora. A segunda categoria reúne as percepções da pesquisadora sobre a
parceria e a possível contribuição para a professora, de acordo com o objetivo da parceria
em relação à mudança de prática da professora com a integração de TDIC e
desenvolvimento de TPACK como parte desse processo.
QUADRO 4: Unidades temáticas para análise dos dados de observação e entrevista
UNIDADE TEMÁTICA I O processo de integração das TDIC à prática pedagógica da professora
CATEGORIAS SUBCATEGORIAS INDICADORES REFERÊNCIAS
A relação das concepções da
professora com a prática pedagógica que desenvolveu
com as TDIC
Concepções da professora sobre a
docência
Considerações da professora, na
entrevista, sobre aspectos positivos e
negativos da profissão e seu papel como
professora;
Falas, atitudes e estratégias pedagógicas
da professora observadas pela
pesquisadora
SIBILIA (2012); NOVAIS (2004); SILVA; NEVES
(2006); FONTES (2010); PREISS et al
(2016); KENSKI (2007); COLL;
MONEREO (2010); PÉREZ GOMEZ
(2015); CHARLOT (2008); LESSARD; TARDIF (2014);
LAROCCA; GIRARDI (2011); ROLDÃO
(2007); MIZUKAMI (2013)
Concepções da professora sobre os
alunos e sua relação com a
escola
Considerações da professora na entrevista
sobre a mudança de perfil dos alunos ao
longo do seu tempo de docência e como estes se relacionam com a escola e professores;
Falas e atitudes da
professora em relação aos alunos observadas
pela pesquisadora
SIBILIA (2012); KENSKI (2007);
COLL; MONEREO (2010); PÉREZ
GOMEZ (2015); CORRADINI;
MIZUKAMI (2013); JONASSEN et al
(1998); LESSARD; TARDIF (2014); LELIS
(2014); POTVIN; HASNI (2014);
MCCRORY (2006);
Concepções da
Considerações da professora na entrevista
KARASAVVIDIS (2009); KENSKI
121
professora sobre TDIC para o ensino
sobre como a tecnologia deve ser usada no
ensino;
Estratégias pedagógicas com TDIC desenvolvidas
pela professora e observadas pela
pesquisadora
(2007); LIM; CHAI (2008); CHEN
(2008); FREITAS; LEITE (2011);
ERTMER; OTTENBREIT-
LEFTWICH (2013); WASTIAU et al (2013); CETIC
(2015); ROLANDO; SALVADOR; LUZ (2013); ARROIO; GIORDAN (2006); SANTOS (2015); SIBILIA (2012);
SANTOS; MARINHO (2016)
A relação entre o contexto (escolar e extra escolar) com a prática
pedagógica desenvolvida com TDIC
Considerações da professora em sua entrevista sobre
aspectos do contexto da escola e fora dela que têm influência em sua prática e uso de TDIC;
Aspectos do âmbito
escolar que podem ter influenciado a prática da professora, observados
pela pesquisadora
CETIC (2015); ERTMER et al (2012);
CHARLOT (2008); SANTOS; BORGES (2009); ALMEIDA;
PRADO (2009); NASCIMENTO et al (2011); ALVAREZ;
MOLL; SOUZA (2015); BUEHL; BECK
(2015); MCCRORY (2006); HOWARD
(2013); JONASSEN et al (1998); JUDSON
(2006); KENSKI (2007); LIM; CHAI
(2008); CHEN (2008); FREITAS;
LEITE (2011); ERTMER;
OTTENBREIT-LEFTWICH (2013);
ERTMER; OTTENBREIT-
LEFTWICH; TONDEUR (2015)
UNIDADE TEMÁTICA II A parceria desenvolvida entre a professora e pesquisadora
CATEGORIA INDICADORES REFERÊNCIAS
Percepções da professora sobre a parceria
Considerações da professora em sua entrevista sobre a
parceria;
CHARLOT (2008);
VANDERLINDE; VAN BRAAK (2010); BARTHOLOMEW;
122
Atitudes da professora, observadas pela
pesquisadora, em relação à proposta de parceria e aos
planejamentos desenvolvidos ao longo do
período de acompanhamento
SANDHOLTZ (2009); RICE (2002); BUTLER et al (2004);
MCLAUGHLIN; BLACK-HAWKINS (2004); DUNCAN;
CONNER (2013); WANG; ZHANG (2014); ERTMER; OTTENBREIT-LEFTWICH;
TONDEUR (2015); DUTERCQ (2014); TUNES; TACCA;
JÚNIOR (2005); SANTOS; MARINHO (2016); ERTMER;
OTTENBREIT-LEFTWICH; TONDEUR (2015); ERTMER
et al (2012)
Possível contribuição da parceria para a prática
pedagógica da professora com TDIC e desenvolvimento
de TPACK
Estratégias pedagógicas com TDIC e possível mudança de
suas características, ao longo do período de parceria
ERTMER; OTTENBREIT-
LEFTWICH; TONDEUR (2015); MISHRA; KOEHLER (2005; 2006); TERPSTRA (2015);
SHULMAN (1986); PHILLIPS (2013); HOFER; HARRIS
(2010); HARRIS; GRANDGENETT; HOFER
(2010); NIESS (2015); GRAHAM (2011);
CAVANAGH; KOEHLER (2013); HARRIS; HOFER
(2014); LEVIN; WADMANY (2008); MCLAUGHLIN;
BLACK-HAWKINS (2004)
5.3.1 Unidade temática I / Categoria: A relação das concepções da professora com a
prática pedagógica que desenvolveu com as TDIC / Subcategoria: Concepções da
professora sobre a docência
No início de sua entrevista, a professora comentou que a carreira docente não era
seu objetivo quando escolheu estudar Ciências Biológicas, porém começou a gostar de dar
aulas ao ser convidada para trabalhar em uma escola particular, quando ainda cursava a
faculdade e, por isso seguiu na docência. Entretanto, ao longo da conversa, a professora
teceu comentários que indicam certa frustração com as condições em que ela exerce a
123
profissão atualmente, até que afirma gostar mais dos seus primeiros anos de magistério do
que seus anos atuais. A professora relacionou aspectos negativos da profissão a um sistema
educacional que, no seu ponto de vista, enfraqueceu sua autoridade e autonomia perante os
alunos, enquanto estes adquiriram mais direitos:
...quanto aos pontos negativos, eu acho que é o sistema....o sistema é o ponto negativo...no meu ponto de vista a coisa só piora...eu acho que piora quando você tira do professor a autonomia pra cobrar do aluno, entendeu?...é, não é que o professor tenha que ser superior ao aluno, apesar de que tem que ser também...ele tem que ter uma postura diferente...;
...hoje você pega esse aluno e eleva ele acima do professor...então, qualquer coisa, o professor não pode falar nada com o aluno...se ele der um grito e esse aluno achar que o professor não devia dar, que tá errado, acabou, o professor já vai responder processo...você fica de mãos atadas, né...você não pode pegar esse aluno e botar de castigo...;
...e se a turma pegar no seu pé, acabou...não vai pra frente, então esse é um lado negativo...por que que não vai? Porque a figura do professor foi rebaixada, quer dizer, o fazer dele foi rebaixado...;
...eu ainda continuo gostando mais dos meus primeiros 15 anos do que os atuais, eu prefiro mesmo...eu acho que a gente conseguia uma resposta MUITO melhor dos alunos do que hoje...a resposta do interesse, do querer, da motivação, entendeu?
É interessante destacar que a professora não mencionou como aspectos negativos
alguns dos pontos que são frequentemente apontados na literatura (LAROCCA; GIRARDI,
2011; LAPO; BUENO, 2002), como baixo salário, pressão por desempenho, condições
precárias de trabalho ou falta de tempo. Quando comentou sobre não ter tempo de planejar
na escola e ter que fazer essa parte do trabalho em casa, a professora não destacou isso
como um aspecto negativo. Isso reforça que a questão da perda de autoridade perante os
alunos é o que, de fato, mais lhe incomoda. Ao longo de sua fala, em toda a entrevista, os
aspectos positivos tiveram menor ênfase, pois pouco falou sobre eles, apontando
rapidamente a flexibilidade de montar sua grade horária e o fato de gostar de dar aula. No
entanto, até mesmo nesse ponto, sua fala sugere o seu desgaste perante a dificuldade de
controle e imposição de autoridade com os alunos: “...quando você consegue realmente dar
aula, você consegue fazer com que os alunos parem, aí é muito bom... agora, quando você
tem que ficar brigando pra dar aula, aí é muito ruim...”.
Conforme alguns exemplos mencionados na seção de “Relatos das observações –
Registro do diário de campo”, durante o período de acompanhamento foram observadas
diversas situações em que a professora se desgastava pedindo atenção da turma, às vezes
124
olhando em minha direção com ar de desânimo. Foi possível perceber que, muitas
atividades, inclusive com TDIC, tinham o objetivo implícito de tentar controlar a indisciplina
dos alunos, a conversa demasiada e ocupá-los em alguma tarefa, como a apresentação de
slides com exercícios para cópia, por exemplo. Houve, inclusive, momentos em que ela
expôs tal objetivo, quando disse que trouxe uma sequência de vídeos com conteúdo novo
pois não a deixariam falar, assim como quando disse aos alunos que continuaria passando
cópia de exercícios enquanto continuassem a conversar. Assim, estas situações, práticas e
falas da professora, evidenciam e são coerentes com sua visão tradicional sobre a docência,
pautada na prevalência da autoridade do professor em aulas baseadas na transmissão de
conteúdo e passividade dos estudantes na sua recepção e reprodução.
As falas da professora em sua entrevista demonstram que a mesma possui uma longa
trajetória profissional, mas que assumiu uma posição negativa com relação ao sistema
educacional. Este, hoje, parece prezar mais pelo bem estar do aluno e sua formação cidadã
do que quando a escola de massa foi criada, para formar trabalhadores obedientes,
atendendo a uma demanda do sistema industrial emergente, conforme apontado por Sibilia
(2012). Quando comenta que hoje o aluno está acima do professor, que este precisa ter
cuidado com o que fala para evitar um processo, o que é possível por conta do Estatuto da
Criança e do Adolescente (ECA – BRASIL, 1990), a professora parece sentir falta de um
momento em que a autoridade e atitudes do professor em sala de aula não eram
questionadas. Assim, ela parece saudosa de um tempo em que considerava ter condições
melhores de atuar, segundo sua concepção de docência e que, inclusive os alunos lhe
pareciam mais interessados.
Essa questão da crise de autoridade docente é apontada e debatida em diversos
estudos (NOVAIS, 2004; SILVA; NEVES, 2006; FONTES, 2010; PREISS et al, 2016). Entretanto,
esse ressentimento pela autoridade enfraquecida ou pelo seu fazer rebaixado, nas palavras
da professora de Ciências, contrasta com a valorização do protagonismo dos alunos, com a
ideia de lhes proporcionar uma formação para autonomia e pensamento crítico, a partir de
um processo em que o professor deixa de ter o papel de transmissor, mas assume o de
facilitador (KENSKI, 2007; COLL; MONEREO, 2010; PÉREZ GOMEZ, 2015). Conforme
mencionado com Sibilia (2012), no tópico 2.1, capítulo 2, o desinteresse e a falta de
entusiasmo dos alunos seriam sintomas da falta de sentido que a escola tem em suas vidas.
125
Assim como os professores criam suas próprias estratégias de sobrevivência diante de todas
as dificuldades do contexto docente, às vezes fazendo o mínimo possível para cumprir seu
dever e não se desgastar mais (CHARLOT, 2008), os alunos também criam suas estratégias
para não cumprir o que lhes é imposto (LESSARD; TARDIF, 2014). Estabelece-se, assim, o
impasse da indisciplina que confronta a autoridade do professor e reforça sua desmotivação
a cada aula. Larocca e Girardi (2011) comentam sobre um estudo em que professoras
entrevistadas relataram a percepção de que sua falta de motivação influencia
negativamente os alunos, deixando-os também ainda mais desmotivados para as atividades
escolares, criando um círculo vicioso difícil de romper.
Pelo que foi observado e conforme a própria professora comentou na entrevista
(“...eu ainda tenho a vantagem deles gostarem de mim, né...não sei porque é uma
característica minha ser bagunceira...”), ela estabeleceu uma relação afetiva com os alunos,
que demonstravam gostar da professora, embora isso não correspondesse a um interesse
efetivo pelas atividades em sala de aula. Possivelmente, o bom humor que a professora
tentava trazer para as aulas, no modo de falar com os alunos, na maioria das vezes leve e
divertido, seja sua principal “estratégia de sobrevivência” (CHARLOT, 2008) e a diferencie de
outros professores que pareciam ser mais fechados e distantes dos alunos (conforme foi
possível notar em conversas na sala dos professores e alguns comentários dos alunos).
Soma-se a isso, as pequenas ações que a professora parece ter incorporado na sua rotina,
como: o atraso para entrar na sala, para começar a aula; a permissão de entrega de trabalho
com atraso, para dar nova chance aos alunos que não fizeram alguma tarefa; as vezes em
que encerrava a aula um pouco mais cedo e deixava que eles ficassem conversando; a
exibição de vídeos para transmitir o que ela julgava que não conseguiria falar ou mesmo
quando substituiu uma aula de revisão pela exibição de um filme comercial a pedido dos
alunos.
É perfeitamente compreensível a sensação de desrespeito e frustração sentida pela
professora ao tentar conduzir sua aula, da forma como acredita ser a melhor, e não ter a
devida atenção de seus alunos, assim como suas “estratégias de sobrevivência” (CHARLOT,
2008) em meio a essa situação. Sem dúvida, a autoridade é imprescindível ao professor, a
qual lhe é dada pela instituição escolar e pela sociedade, pelo reconhecimento de que ele é
o profissional que detém o conhecimento para auxiliar os alunos a aprender e para criar um
126
ambiente de aprendizagem propício. No entanto, frequentemente é o exagero da
autoridade, o uso de coerções, falta de negociações e diálogo, que caracterizam o
autoritarismo e que geram reação dos alunos, seja com a passividade e cumprimento
desmotivado das atividades, seja com a indisciplina, que vai desde pequenas ações
(conversas e brincadeiras durante as aulas) até o enfrentamento direto do professor,
inclusive com comportamento agressivo. Por outro lado, quando a autoridade é exercida
com o estabelecimento de normas claras e debatidas pelas partes envolvidas, a liderança
torna-se mais autêntica, tende a ser mais respeitada e a disciplina tende a ser um
comportamento voluntário (NOVAIS, 2004; SILVA; NEVES, 2006; FONTES, 2010; PREISS et al,
2016). Em um estudo sobre a percepção dos estudantes acerca de regras e autoridade na
escola, Preiss et al (2016), identificaram que as escolas em que os estudantes consideram o
ambiente excessivamente punitivo e injusto, tendem a ter mais problemas com indisciplina e
baixo desempenho acadêmico, reforçando a relação entre o aprendizado e a forma como os
estudantes veem e se sentem na escola. No caso da professora de Ciências, suas práticas e
suas falas na entrevista, demonstram que ela tem uma concepção autoritária da docência
(NOVAIS, 2004), ao se apoiar em algumas práticas de coerção dos alunos, especialmente a
de cópia de exercício como tentativa de controle e punição para a conversa demasiada, a
qual se tornou mais frequente no último ano de acompanhamento. Essa visão também se
refletiu na forma como a professora integrou tecnologia em algumas práticas, utilizando
apresentações de slides para exibir algum conteúdo que os alunos deveriam copiar,
enquanto ela poderia circular pela sala para acompanhar e cobrar de perto o cumprimento
da tarefa.
Em síntese, pode-se dizer que o perfil tradicional da professora de Ciências, que se
reflete nas práticas baseadas em transmissão de conteúdo, memorização e reprodução
pelos alunos, fundamenta-se na sua visão de docência, em que o professor é o detentor e
transmissor de conhecimento, enquanto o aluno deve ser o receptor passivo. Estas
características se aproximam das que são colocadas no quadro 1, apresentado no tópico 3.2,
capítulo 3, de autoria de Lim e Chai (2008), o qual compara as abordagens tradicional e
construtivista.
É importante reconhecer que a professora de Ciências construiu essa concepção
tradicional da docência ao longo de toda sua trajetória de vida, desde quando foi aluna na
127
sua educação básica até sua formação como professora, uma vez que, conforme coloca
Mizukami (2013), as preconcepções sobre ensino começam a ser construídas com a
observação da prática de seus professores e muitas vezes são consolidadas nos cursos de
formação. No entanto, essa interpretação tradicional do ensino já perdeu sua coerência com
as transformações da sociedade (ROLDÃO, 2007; COLL; MONEREO, 2010; SIBILIA; 2012;
PÉREZ GOMEZ, 2015) e a professora de Ciências percebe isso ao comentar sobre as
mudanças ao longo do tempo no sistema educacional e no perfil dos alunos, ponto que será
melhor abordado na próxima categoria de análise.
5.3.2 Unidade Temática I / Categoria: A relação das concepções da professora com a
prática pedagógica que desenvolveu com as TDIC / Subcategoria: Concepções da
professora sobre os alunos e sua relação com a escola
Apesar de não ter sido questionada especificamente sobre sua concepção acerca dos
alunos, a professora teceu comentários, na entrevista, que demonstraram que, na sua visão,
o perfil dos alunos mudou muito ao longo de sua carreira. Ela atribuiu essa mudança às
transformações ocorridas na sociedade, citando a disseminação das tecnologias como uma
das principais e que teria gerado um impacto negativo no perfil do estudante de hoje, sendo
a causa do seu aparente desinteresse pela escola. A professora considera que os alunos de
hoje são mais dispersos, apressados e sente que tem que competir com outros interesses
que eles têm distantes da escola, referindo-se à Internet.
...com toda a diversidade, né, externa, eles começam a ter atração por outras coisas e aí você começa a brigar com outras coisas...mesmo quando você vai tentando incorporar a internet, não é aquele ramo da internet que interessa a ele (o aluno)...aí você de qualquer forma você entra numa competição MUITO (ênfase dada na fala da professora) grande...;
...acho que hoje tem muita informação, quer fazer muita coisa ao mesmo tempo, ele (aluno) não presta atenção em nada, eles não sabem ouvir;
...então você encontra num universo de 200 alunos, 2 que conseguem parar, pensar, analisar o que tá fazendo...quer dizer, ele (o aluno) tem 1 hora e 40 minutos pra fazer, mas ele quer fazer em 10, 5 minutos, então a coisa passa batido...não para pra ver... e eu acho que há 20 anos atrás era um tempo mais pausado, mais parado, né...
128
A percepção da professora sobre a mudança de perfil dos alunos por conta das TDIC é
coerente com os estudos e análises desenvolvidas por diversos autores sobre tecnologias e
educação na sociedade moderna (SIBILIA, 2012; KENSKI, 2007; COLL; MONEREO, 2010;
PÉREZ GOMEZ, 2015). Sibilia (2012) argumenta que o atual modelo escolar, consolidado
desde o início do século XX, representa um choque cultural incompreensível para esses
jovens e “pelo menos até agora, a tríplice aliança entre os meios de comunicação, tecnologia
e consumo costuma competir, com fortes chances – e, por conseguinte, não raro com sucesso
– por conquistar a atenção e as graças do alunato do século XXI” (p. 66). A observação da
autora se alinha à sensação de competição descrita pela professora de Ciências na
entrevista. No entanto, conforme apontam os pesquisadores (JONASSEN et al, 1998; 2005;
KENSKI, 2007; COLL; MONEREO, 2010; CORRADINI; MIZUKAMI, 2013; PÉREZ GOMEZ, 2015),
os professores não precisam competir com as TDIC, mas sim aproveitar o seu potencial
pedagógico para integrá-las às suas práticas, inovando-as para resgatar o interesse dos
alunos pela escola, assim como o próprio interesse pela docência.
A professora relatou que o próprio sistema educacional contribui para estimular e
reforçar esse desinteresse dos alunos, pois, segundo ela, há um limite para as reprovações e,
com isso, muitos alunos que deveriam ser reprovados pelo fraco desempenho acabam
sendo passados adiante4. Ainda segundo a professora, isso desvaloriza a ideia de alcançar a
aprovação pelo próprio mérito ou esforço, pois o aluno entende que, mesmo não se
esforçando o suficiente para obter as notas necessárias (dentro de uma média estabelecida),
ele é aprovado.
...agora pode até soar retrógrado...mas eu acho o seguinte: adolescente, ele necessita ser cobrado, né...é muito mais prazeroso eu ficar na farra do que eu ficar fazendo alguma atividade que vai me dar trabalho, eu vou ter que parar...então, se a questão do mérito não acontecer, não vai adiantar...
...o sistema não deixa o mérito acontecer...então, o que que acontece? Eu que vou me esforçar, vou passar e vou conseguir e o outro que “leeeva” (a professora pronunciou a palavra com tom diferente, dando a entender que esse outro aluno não se esforça do mesmo jeito que o primeiro, mas também é aprovado) também vai conseguir...
4 Isso contrasta com a resolução da Secretaria Municipal de Educação do Rio de Janeiro, nº 1123, de 24 de janeiro de 2011, que não menciona nenhum limite de reprovação por série, exceto para o 1º e 2º ano do ensino fundamental, onde se determina que não haverá retenção devido ao caráter processual da alfabetização. Para os demais anos (3º ao 9º), a resolução estabelece que ficará retido o aluno que obtiver conceito global Insuficiente ao término do ano letivo. Tal conceito é atribuído ao aluno que, após a recuperação paralela, não atingiu os objetivos mínimos propostos para o período.
129
...na cabeça do adolescente, ele não percebe que ele se esforçando ele vai levar uma bagagem muito grande, ele quer o aqui e agora...então, se ele percebe que ele se esforçando e fazendo tudo, consegue o mesmo que esse cara daqui que não faz nada, é claro que ele vai parar de se esforçar...
Ao longo do período de acompanhamento, foram observados momentos em que
alunos apenas simulavam fazer alguma tarefa, copiavam de outros colegas e até mesmo
entregavam trabalhos ou provas incompletas, mesmo ainda tendo tempo para terminá-los,
sugerindo, conforme a percepção da professora, que não se importavam com as possíveis
notas baixas e que não estavam dispostos a se esforçar. Logo no segundo dia de observação,
a professora comentou o quanto isso lhe frustrava, conforme mencionado no tópico 5.1.2.
Esse comportamento dos alunos, de não se importar com notas baixas, pode sugerir ainda,
um enfrentamento, uma resistência a este recurso tradicional da escola, com o qual o
professor sempre pôde “ameaçar” os alunos (LESSARD; TARDIF, 2014). Se eles não têm mais
receio de obter notas baixas ou de serem reprovados, é compreensível essa sensação de
impotência que a professora de Ciências parece sentir.
Independente do sistema educacional, a presença do aluno na escola é uma
imposição social e familiar e não um ato espontâneo, o que, conforme Lessard e Tardif
(2014) comentam, leva grande número de jovens a vivenciar a escola apenas como uma
passagem obrigatória, e não como uma experiência significativa para suas vidas. Nesse
sentido, percebe-se que esses alunos demonstram pressa para sair da escola e criam suas
próprias estratégias para passar por ela com o mínimo de esforço, sem um envolvimento
verdadeiro na experiência educativa, o que também dificulta o relacionamento com os
professores e, consequentemente, o trabalho que estes buscam desenvolver (LESSARD;
TARDIF, 2014). Lelis (2014) lembra que as próprias condições de vida dos alunos influenciam
as práticas dos docentes, pois não é possível desconsiderar que questões como violência
familiar, distância dos pais no processo de escolarização dos filhos, consumo de drogas,
fome, dentre outras, interferem nas condições de aprendizagem, interesse e valorização da
escola por esses alunos. Sibilia (2012) comenta sobre um estudo brasileiro em que
economistas apontaram que a escolaridade ainda dá um retorno financeiro ao aluno que
opta por ela, embora os maiores ganhos de renda decorrentes do nível de instrução se
verifiquem na meia-idade, o que está muito distante do horizonte de planejamento do
jovem. Dessa forma, o argumento de que a educação seria uma boa aposta financeira a
130
longo prazo, que o esforço valeria a pena, não convence boa parte dos jovens, que têm
pressa para alcançar seus objetivos.
Assim, torna-se evidente a questão de que o que é tratado na escola precisa ter
relação com a vida do estudante para que, compreendendo a importância do conhecimento,
o aluno se interesse por ele e se esforce para se envolver nas atividades pedagógicas que
favorecem seu aprendizado. A própria professora comentou na entrevista sobre a pergunta
que alunos fazem “porque eu preciso aprender isso?”. No entanto, parece que, na sua
concepção, os alunos não percebem a importância dos conteúdos que devem aprender por
conta do seu desinteresse e falta de esforço. Este comportamento, no seu entendimento,
seria encorajado por um sistema educacional pouco rígido com a reprovação.
Algumas falas da professora sugerem, ainda, que esse crescente desinteresse dos
alunos, ao longo do tempo, refletiu também em atividades inerentes à sua disciplina. Ela
acredita que as atividades práticas de Ciências, os experimentos, não atraem mais o
interesse dos alunos como antes, por conta de seu interesse hoje estar voltado para o uso
das tecnologias e Internet.
...inicialmente a gente trabalhava muito com livro, o quadro, o giz....mas nós conseguíamos fazer aquelas experiências simples...como...é...do gelo, da água...aquelas bem simples de ciências...
...com o passar do tempo, eu acho que até vem a conjuntura externa à escola...com o passar do tempo, esse tipo de experiência já não atrai mais o aluno, não adianta dizer que, porque não atrai, né...não cria curiosidade, não cria nada...
Portanto, essa visão negativa da professora sobre os alunos parece desmotivá-la a
investir nessas atividades experimentais que fundamentam a disciplina que ela leciona. De
fato, ao longo de todo o período de acompanhamento, a professora não realizou nenhuma
experiência prática de Ciências com seus alunos, assim como nenhuma atividade de campo
fora da escola. Conforme mencionado no tópico 3.5, o estudo de revisão, de Potvin e Hasni
(2014), sobre o interesse de estudantes do ensino básico acerca da área das Ciências, indica
que há uma tendência de perda de interesse dos jovens por essa área, que se reflete no
decréscimo pela procura de carreiras científicas. No entanto, o estudo relaciona essa
tendência à qualidade do ensino de Ciências, sugerindo que a distância entre o que a escola
131
oferece e o que os alunos desejam é que seria a razão dessa perda de interesse pelas
Ciências.
Possivelmente, essa visão da professora, que associa o desinteresse dos alunos por
Ciências e pelas experimentações ao maior interesse que eles têm pelas TDIC,
especificamente ao que podem ver e fazer na Internet, se deva à própria mudança de perfil
desses alunos que ela apontou. Se estes alunos estão desinteressados dos assuntos da
escola como um todo, pode-se compreender que esse desinteresse também se estenda às
práticas experimentais específicas dessa disciplina. De acordo com McCrory (2006), a
disciplina Ciências sempre foi associada ao uso de tecnologia, com dispositivos próprios para
experimentos de laboratório e/ou de campo, que contribuem para tornar o seu ensino mais
próximo da prática científica, além de estimular sua curiosidade e motivação para o estudo
dos temas científicos. Assim, essa visão da professora que coloca as TDIC como causa do
desinteresse dos alunos, não coincide com o que diversos estudiosos têm defendido sobre o
potencial pedagógico das TDIC para toda a educação (JONASSEN et al, 1998; 2005; KENSKI,
2007; COLL; MONEREO, 2010; CORRADINI; MIZUKAMI, 2013; PÉREZ GOMEZ, 2015).
A professora comentou, na entrevista, que apenas em uma escola em que trabalhou,
havia um laboratório de Ciências e que permaneceu nessa escola por apenas seis meses.
Além disso, ela relatou algumas experiências que fez em determinados momentos, ao longo
de sua carreira, e as dificuldades enfrentadas com a falta de espaço adequado para sua
realização (citou um experimento que simula um vulcão e que não poderia ser feito em sala
de aula por conta do espaço e sujeira que poderia causar) e ainda o grande número de
alunos nas turmas. Portanto, a professora teve pouca oportunidade de desenvolver aulas de
laboratório, com condições e recursos tecnológicos apropriados. Associado a isso, é
compreensível que o repertório de experimentos que podem ser feitos em sala de aula, com
recursos obtidos pela própria professora, também é reduzido se comparado ao que se pode
desenvolver em um laboratório basicamente equipado. Possivelmente, essas circunstâncias,
limitaram sua percepção acerca do interesse dos alunos sobre esse tipo de prática. Além
disso, não se pode deixar de considerar a dificuldade de trabalhar sozinha com determinadas
atividades em turmas grandes, o que requer muita atenção para evitar problemas e até
mesmo acidentes, dependendo do material usado. Assim, é possível que estas sejam as
132
razões principais que levaram a professora a reduzir ou mesmo desistir de atividades
experimentais e não, propriamente, o fato de os alunos não demonstrarem mais interesse.
Quando conversamos, na entrevista, sobre a ideia de que o aluno precisa se envolver
em atividades que ele possa construir um projeto, algo que tenha a ver com seu cotidiano,
que o motive, a professora comentou que os alunos do ensino fundamental não têm
maturidade para trabalhar com independência em atividades que teriam um perfil mais
construtivista. Ela considera que esses alunos não conseguem nem mesmo responder
questões com suas próprias opiniões, dando a entender que eles apenas tentam repetir o
que a professora fala, sugerindo que ainda são muito dependentes do professor para
conseguir realizar atividades que lhes demandariam maior autonomia. Ela cita o exemplo da
atividade do jogo, que fez parte do projeto “Com-Viver Com-Ciência e Cidadania”, em que
eles teriam que criar as questões do jogo relacionando temas de Ciências, como água, solo,
ar e corpo humano ao conceito ampliado de saúde, que já havia sido debatido. A professora
concordou em estimular os alunos, em suas aulas, a fazer a relação dos conteúdos com
temas da vida deles para ajudá-los a construir essas questões, porém o desempenho teria
sido abaixo do esperado, o que ela ressalta como um exemplo concreto de sua percepção
sobre eles. Segundo ela, apenas do 8º para o 9º ano, é que seria possível realizar atividades
desse tipo, porém se a turma demonstra interesse e maturidade, o que nem sempre ocorre.
...por exemplo, no caso do jogo da saúde do 6º ano, né...ali eu fui colocando, colocando, colocando...aquilo na vida deles, o que acontece com a gente aqui no Rio de Janeiro, aí fui puxando lixo, fui puxando um monte de coisa e mesmo assim você consegue umas respostas bem...é...vamos dizer assim...bem menos desenvolvidas do que nós gostaríamos...ou eles começam a se repetir, né...ou eles vão repetindo o que você está falando...
...e quando às vezes você coloca uma questão pra eles que não tem resposta certa, é a sua opinião, não sai nada...
...não é que seja ruim, eu acho que você consegue isso já quando você vai chegando no 9º ano...se o 9º ano for uma turma interessada, do 8º pro 9º ano você já começa isso...então você vai conseguir isso muito a nível de segundo grau...eles não vão conseguir isso no ensino fundamental...aí você recebe aquelas respostas repetitivas, aquilo que você falou...aí você volta, não, não é isso, aí você vai ensinar a eles de uma certa forma a pensar.
...são raros...você vai construindo essa independência, aí você começa a ver aos poucos no 8º ano e no 9º, aí no 9º vai ficando...quando o 9º é interessado...aí você vai havendo essa liberdade...
Ao acompanhar as etapas de construção desse jogo da saúde com o 6º ano, pude
perceber a grande dificuldade dos alunos em desenvolver a proposta de criação das
133
questões. Muitos perguntavam o que eles teriam que escrever, como escrever, tentavam
copiar exemplos que a professora ou os pesquisadores davam, e ainda tentavam copiar
perguntas e textos que encontravam na Internet. Essa dificuldade reflete o quanto estão
habituados a uma prática de ensino em que recebem todo o direcionamento do que devem
fazer, do que responder, onde encontrar a resposta etc., conforme foi possível perceber ao
longo das observações das aulas. As questões dos exercícios que a professora passava, em
todas as turmas, eram sempre do tipo “O que é?”, “Qual a função?”, “Defina?”,“Cite”, as
quais exigiam respostas curtas, que podiam ser copiadas do caderno ou do livro e não
necessariamente exigiam que eles fizessem relações do conteúdo com questões do
cotidiano, conforme exemplo na figura abaixo.
Figura 8: Exemplo de questões preparadas pela professora de Ciências para avaliação da turma de 8º ano
Fonte: Elaborado pela professora de Ciências
Apesar de ter dito que são raros os alunos que conseguem fazer um trabalho com
independência, que talvez seja possível no 8º ou 9º ano, se a turma for interessada, a
própria professora comentou sobre um trabalho, que considerou como bem sucedido,
realizado pela turma do 9º ano de 2012 para a Mostra Pedagógica da escola. Os alunos se
organizaram em grupos e cada um criou apresentações de slides, com texto, imagens e
vídeos, sobre tipos de energia (eólica, solar, hidrelétrica etc.) para que eles mesmos
apresentassem aos colegas e demais visitantes do evento. Eles não fizeram esse trabalho
com a supervisão direta da professora, mas sim em casa, pesquisando na Internet e
134
construindo as apresentações por conta própria, a partir do tema que ela propôs. Em 2014, a
professora propôs o mesmo trabalho para o 9º ano, porém pediu que eles construíssem
maquetes sobre os tipos de energia. Embora a professora tenha expressado certa dúvida
(“vamos ver o que é que vai sair...”) e tenha comentado que poucos alunos nessa turma
eram interessados ou maduros (“aqui nesse 9º ano você pega o quê? você pega uns 8...o
restante...lá são 42... os outros estão a passeio...então o que não tem ainda? Maturidade...às
vezes eles falam: não, é porque eu sou burro...eu falo assim: não tem nada a ver com burrice
isso, isso tem a ver com interesse”), as maquetes apresentadas na Mostra Pedagógica (cerca
de um mês após a entrevista) foram muito elogiadas por todos. Novamente, os grupos se
organizaram, pesquisaram e construíram os trabalhos por conta própria, fora da escola e
com materiais que eles mesmos conseguiram. Além de expor as maquetes, os alunos
também explicavam para os visitantes o que elas representavam e tiravam dúvidas,
mostrando que haviam estudado e compreendido o tema do trabalho e, principalmente, que
podiam trabalhar com independência e maturidade em algo que lhes motivava.
Esses exemplos indicam uma contradição na concepção que a professora demonstra
ter sobre os alunos, pois ao mesmo tempo em que ela diz que poucos podem trabalhar com
independência e que por isso, seria difícil realizar práticas em que eles tenham mais
liberdade para criar e desenvolver projetos, ela mesma propôs esses trabalhos citados, nos
quais seu direcionamento se limitou a indicar o tema, a forma de apresentação e o prazo.
Assim, parece que a professora subestima o potencial dos alunos sem lhes dar grandes
oportunidades de mostrar se de fato podem assumir responsabilidades com propostas de
trabalho distintas, que lhes permitam desenvolver algo.
Ao longo desse período de acompanhamento, esses foram os únicos exemplos de
atividade em que os alunos foram demandados a construir e apresentar um trabalho, com
base em uma pesquisa conduzida por conta própria. Entretanto, ao longo desse tempo,
alunos de todos os anos, tiveram experiências com alguma atividade do projeto “Com-Viver
Com-Ciência e Cidadania”. Desde 2012, quando todas as atividades foram realizadas
inicialmente com uma turma de 9º ano, as mesmas foram consideradas interessantes e bem
sucedidas por todos os envolvidos, pesquisadores, professores, alunos e direção, tanto que
foi solicitado que, nos anos seguintes, as atividades se estendessem às demais turmas.
Nestas atividades, foi possível perceber que os alunos estavam dispostos e motivados a
135
cumprir as demandas e valorizaram especialmente o fato de terem saído da rotina e de
trabalhar com seus laptops, conforme a fala de um dos alunos, na atividade final, em que
fizeram uma avaliação da semana: “Eu gostei porque a gente saiu da rotina, a gente usou os
computadores, aprendeu coisas que a gente achava que sabia, mas não sabia nada”. Eles
tiveram suas dificuldades pois, conforme comentado anteriormente, sobre o exemplo do
jogo com o 6º ano, não estão acostumados a ter autonomia para construir seus trabalhos e
discutir sobre eles. No entanto, responderam bem às orientações dos professores e
pesquisadores e, todas as atividades foram concluídas. A própria professora, em 2012,
avaliou que os alunos participaram ativamente, atribuindo tal participação à abertura do
diálogo, do debate, metodologias diferentes, como ela mesma disse. Assim, essa experiência
com as atividades “Com-Viver Com-Ciência e Cidadania”, também mostrou que os alunos,
não apenas os mais velhos do 9º ano, mas os de todas as idades, respondem positivamente
a atividades que os estimulem, que lhes atribuam maior responsabilidade e autonomia, indo
de encontro ao que a professora comentou na entrevista.
A relação entre as concepções de professores sobre o potencial acadêmico de seus
alunos e as práticas pedagógicas que desenvolvem, tem sido alvo de diversos estudos. Estes
têm demonstrado que o julgamento que os professores fazem de seus alunos pode
influenciar o seu processo de aprendizagem, uma vez que as práticas pedagógicas podem ter
orientações distintas, dependendo da forma como o professor percebe o potencial de seus
alunos. Nesse sentido, quando os professores acreditam que seus alunos tem um grande
potencial para aprendizagem, eles tendem a desenvolver práticas que estimulem mais esses
alunos a construir conhecimento, do que quando subestimam o seu potencial. Como
consequência, as pesquisas têm demonstrado que, os alunos subestimados por seus
professores, tendem a ter menos chances de progresso educacional e que isso pode ter
impactos negativos em sua vida futura. Em geral, entre os alunos subestimados por seus
professores estão aqueles que vivem em condições socioeconômicas mais desfavoráveis,
porém aspectos como personalidade e características físicas também são apontados como
fatores que influenciam o julgamento que os professores fazem dos alunos (SOARES et al,
2010; READY; WRIGHT, 2011; URHAHNE et al, 2011; MACHTS et al, 2016). No estudo
realizado por Soares et al (2010), com 11153 professores da rede pública de educação básica
de Minas Gerais, foi percebida uma tendência dos professores em apresentar piores
136
expectativas de desempenho com relação aos alunos negros, do sexo masculino e que
tinham condições socioeconômicas desfavoráveis. Resultados semelhantes também foram
apontados no estudo de Ready e Wright (2011), no contexto dos Estados Unidos. Estas
pesquisas, assim como as de Urhahne et al (2011) e de Machts et al (2016), mostram que os
alunos cujo potencial de aprendizagem é subestimado, não apresentam diferença
significativa em relação aos outros alunos em testes cognitivos aplicados a todos, sugerindo
que esses professores podem construir suas visões sobre esses alunos com base em
preconceitos e estereótipos. Urhahne et al (2011) perceberam que alunos que
apresentavam ansiedade e baixa auto-estima com relação à sua capacidade de sucesso e
desempenho acadêmico, embora não apresentassem diferença significativa em testes
aplicados aos demais alunos, eram também subestimados pelos professores, sugerindo que
essas características de comportamento e personalidade dos alunos também influenciam o
julgamento dos professores. Segundo os autores, essa percepção dos professores contribui
para reforçar a baixa estima que esses alunos já têm de si mesmos e, é portanto, mais um
aspecto que pode desmotiva-los para o estudo, prejudicando o seu processo de
aprendizagem.
Dessa forma, os pesquisadores (SOARES et al, 2010; READY; WRIGHT, 2011;
URHAHNE et al, 2011; MACHTS et al, 2016) destacam a importância de que os professores
tenham consciência de que podem construir essas percepções dos alunos e que estas
podem ter efeitos negativos no processo educacional e até na vida futura de muitos
estudantes, por deixarem de ter experiências educacionais que lhes estimule a construir
conhecimento e ter perspectivas de vida mais promissoras a partir desse conhecimento.
Nesse sentido, destacam que a formação inicial e continuada precisa dar atenção a essa
questão, conscientizando o professor da importância da reflexão sobre suas práticas e
concepções. De acordo com Ready e Wright (2011), professores que refletem sobre sobre
suas atividades e atitudes e que avaliam seus estudantes por meio de um conjunto de
métodos distintos, podem conhecer melhor as habilidades de seus alunos e assim, formar
uma visão mais acurada dos mesmos.
Pode-se compreender que a percepção da professora de Ciências de que os alunos
não têm maturidade para trabalhar em atividades que exijam maior independência, apesar
dos exemplos em que eles demonstraram o contrário, se deva à sua forte concepção
137
tradicional de ensino e necessidade de ter o controle e protagonismo em sala de aula. Assim
como os estudos citados (SOARES et al, 2010; READY; WRIGHT, 2011; URHAHNE et al, 2011;
MACHTS et al, 2016) sugerem que o professor orienta sua prática em função da concepção
que tem dos alunos, essa visão da professora de Ciências sobre a imaturidade dos alunos,
associada àquela de que também são desinteressados e pouco esforçados, parece afetar
diretamente sua prática, que se limita a um pequeno repertório composto basicamente por
cópias e exercícios de perguntas e respostas para memorização do conteúdo, conforme foi
possível observar.
5.3.3 Unidade Temática I / Categoria: A relação das concepções da professora com a
prática pedagógica que desenvolveu com as TDIC / Subcategoria: Concepções da
professora sobre TDIC para o ensino
Quando questionada, na entrevista, sobre o que pensa a respeito da tecnologia para
seu trabalho docente, a professora comentou:
...eu acho que a tecnologia, ela pode ajudar, mas assim, tem que funcionar...
...agora atualmente estou trabalhando muito com Power Point, que me facilita, né? pela Internet não estar funcionando e pelas imagens....baixo filme no You Tube pra ver dentro da minha matéria o que é que eu posso utilizar...
Estas falas sugerem que a professora entende o uso da tecnologia no sentido de
favorecer seu trabalho docente, para a construção de material para suas aulas, como as
apresentações de slides e vídeos, que lhe ajudem a exibir o conteúdo. Ao mesmo tempo, ela
parece também justificar suas opções de uso desses recursos pela impossibilidade de uso
pleno das TDIC na escola, em virtude das dificuldades de acesso à Internet.
De fato, segundo as observações, as apresentações de slides e vídeos, foram os
recursos mais utilizados pela professora ao longo desse período de acompanhamento. A
professora parecia sentir-se segura com os mesmos, tanto para prepará-los com
independência, quanto para utilizá-los em sala de aula, segundo sua perspectiva tradicional
de transmissão do conteúdo.
138
Karasavvidis (2009) comenta que o projetor multimídia foi uma tecnologia
rapidamente incorporada na prática pedagógica de muitos professores pelo fato desse
instrumento ter o potencial de facilitar a prática que o professor já desenvolvia antes dele,
em vez de efetivamente causar alguma inovação. Dessa forma, o professor utiliza o projetor
para palestrar sua aula em frente à turma, como já fazia anteriormente, sendo que este
instrumento oferece a vantagem ao professor de acrescentar quantos slides quiser, sem se
preocupar em escrever ou apagar o quadro, o que também lhe permite uma otimização do
tempo e ainda lhe possibilita ficar o tempo todo de frente para a turma, uma vez que, sem o
projetor, o professor precisa ficar de costas para os alunos enquanto usa o quadro. Pode-se
considerar que o mesmo ocorre quando o professor utiliza quadros interativos e, é por conta
dessa compatibilidade com as práticas já estabelecidas dos professores, que estes
instrumentos tecnológicos costumam ser bem aceitos nas escolas e, consequentemente,
têm contribuído mais no sentido de sustentar práticas antigas do que inová-las
(KARASAVVIDIS, 2009). No caso da professora de Ciências, tanto o vídeo quanto as
apresentações de slides, que requerem o uso do projetor multimídia, foram usadas nesse
sentido de manutenção de suas práticas tradicionais de exposição de conteúdo. No entanto,
é importante mencionar que estes instrumentos tecnológicos não precisam ser usados
apenas para palestrar e transmitir informações, mas também, podem ser usados pelos
próprios alunos para construírem trabalhos de pesquisa que podem ser posteriormente
apresentados e debatidos com a turma, por exemplo, criando uma situação de ensino em
que os alunos se apropriam destas tecnologias para construírem projetos e tornar seu
processo de aprendizagem mais ativo.
Conforme mencionado nos tópicos 2.3 e 2.5 (capítulo 2), diversas pesquisas vêm
mostrando resultados semelhantes de predominância de usos de TDIC dentro dos mesmos
modelos de prática a que os professores já estavam habituados a lecionar, apontando a
grande frequência de exibição de vídeos, apresentações de slides e pesquisas na Internet
(KENSKI, 2007; LIM; CHAI, 2008; CHEN, 2008; FREITAS; LEITE, 2011; ERTMER; OTTENBREIT-
LEFTWICH, 2013; WASTIAU et al, 2013; CETIC, 2015). Em uma pesquisa brasileira,
especificamente com professores de Ciências e Biologia, Rolando, Salvador e Luz (2013)
identificaram que o uso de recursos de Internet para fins didáticos era o menos frequente,
entre os professores participantes da pesquisa e que, quando utilizados, eram apenas para
139
preparação de material a ser exibido em sala de aula, como textos e vídeos, indicando um
uso predominantemente centrado no professor. Os professores participantes da pesquisa de
Rolando, Salvador e Luz (2013) apontaram que, em suas vidas pessoais, utilizam a Internet
predominantemente para pesquisa de informações, download e troca de e-mail. Assim,
pode-se compreender que, dificilmente os professores terão habilidades para o uso
pedagógico inovador das TDIC, se não conhecem ou não exploram, em suas vidas
particulares, os distintos recursos que a Internet, em sua fase web 2.0, disponibiliza
atualmente.
Segundo Rolando, Salvador e Luz (2013), ficou evidente pelas respostas dos
professores na pesquisa, que estes tinham intenção de enriquecer suas aulas com o uso dos
recursos que buscam na Internet (textos, imagens, vídeos), uma vez que termos como
“enriquecer minhas aulas” e “trazer informações complementares e mais atuais sobre
biologia” foram comuns, além de despertar o interesse dos alunos, com alguns mencionando
especialmente o uso de recursos audiovisuais para esse fim. Segundo os pesquisadores, o
fato de esses professores perceberem e se disporem a usar a Internet como uma fonte de
recursos, que pode contribuir para a melhoria de sua prática de ensino, é importante e
promissor. No entanto, o que lhes falta para que o uso seja mais efetivo, é o
desenvolvimento de habilidades e conhecimento acerca dos próprios recursos e seu
potencial para uso educacional, associado a uma visão pedagógica mais centrada no aluno,
em que as TDIC possam ser usadas para contribuir com seu processo de aprendizado, de
construção de conhecimento, e não apenas para transmissão de informação. Trata-se,
portanto, de uma questão de “como” usar a tecnologia no processo educacional e não de
“qual”, conforme Ertmer e Ottenbreit-Leftwich (2013).
Além da questão do uso das TDIC para facilitar seu trabalho no preparo e uso de
material em sala de aula, as falas da professora de Ciências, citadas anteriormente, remetem
também à questão de ela considerar que o uso de imagens desperta o interesse dos alunos e
ajuda na compreensão de conceitos e fenômenos de Ciências. Isso parece ser um senso
comum entre os professores que, de maneira geral, costumam apontar essa percepção para
justificar a grande frequência de uso de recursos audiovisuais, como nas pesquisas de
Rolando, Salvador e Luz (2013) e CETIC (2015). Na entrevista, essa percepção fica clara
140
quando a professora cita o exemplo de uma aula sobre sistema circulatório em que o uso de
imagens lhe ajudou a explicar o conteúdo e ao mesmo tempo atrair a atenção dos alunos:
...então só você ter a imagem e essa imagem poder mostrar pra ele exatamente como é ou você ter essa imagem em movimento, né, isso chama atenção...eu acho que isso atrai ele (aluno) pro quadro, né o colorido, as imagens...se tiver movimento melhor ainda...quando eu botei o movimento do coração na 801 (turma de 8º ano), eles ficaram parados olhando, quer dizer então você tá vendo o movimento real, né... quando eu joguei a imagem grande do coração fazendo, aí ficou todo mundo parado... aí você começa a mostrar: tá vendo ó, tem a válvula, apertou aqui o sangue não volta porque a válvula fechou...então você consegue colocar a explicação, né, ali dentro...eu acho muito legal.
Conforme mencionado no relato das observações, foi possível perceber que, em
quase todas as aulas em que recursos audiovisuais, especialmente os vídeos, foram
adotados, os mesmos faziam parte de uma estratégia de ilustração e reforço de
determinado tema que já havia sido previamente introduzido em aulas anteriores com
materiais tradicionais, como livro e apostila. Na maioria das vezes, os vídeos encerraram as
aulas e não foram retomados ou associados a outras atividades. Poucas vezes, a professora
utilizou tal recurso associado a outra atividade como responder questões a partir do que foi
exibido, por exemplo.
De fato, a ilustração é eficaz para a compreensão de conteúdos abstratos ou que
tratam de realidades distantes do aluno, o que coincide com muitos temas tratados na
disciplina Ciências. Entretanto, essa forma de uso do recurso audiovisual apenas para ilustrar
o discurso verbal, sem articulação com outras atividades, não seria tão eficaz para o
aprendizado quanto o uso do audiovisual para introduzir um assunto, provocar a curiosidade
do aluno e explorar questionamentos (ARROIO; GIORDAN, 2006; SANTOS, 2015). É preciso
considerar também que, quando a tecnologia entra como um elemento novo na rotina da
sala de aula, não é surpreendente que os alunos se voltem para dar atenção ao que lhes é
apresentado com essa novidade. No entanto, para que esse interesse se sustente, é preciso
que as propostas de uso das TDIC sejam motivadoras, que estimulem a atuação ativa dos
alunos para busca, compreensão e construção de conhecimento (SIBILIA, 2012). A
professora chegou a comentar, na entrevista, que já fez atividades complementares
associadas à exibição de vídeos, como discutir e escrever no papel o processo visualizado,
como por exemplo de uma metamorfose, porém, no período acompanhado, não foi
observada atividade semelhante.
141
A visão da professora de que as TDIC são úteis para facilitar seu trabalho, na busca e
preparação de material para suas aulas e para atrair a atenção dos alunos, se aproxima do
resultado do estudo desenvolvido por Santos e Marinho (2016). Os pesquisadores
investigaram as representações sociais que 34 professoras de uma escola municipal, em
Minas Gerais, tinham sobre Internet e Internet na escola antes que as mesmas estivessem
envolvidas em um curso de formação que fazia parte do PROUCA, o qual viria a ser
implementado na escola, no ano de 2010. O objetivo era compreender as percepções que
essas professoras tinham sobre Internet e seu uso no ambiente escolar antes que estas
pudessem ser influenciadas pelas ações do projeto UCA, a fim de que a compreensão dessas
percepções pudesse contribuir para a compreensão das práticas pedagógicas com os
computadores e Internet. Os resultados mostram que a maioria das professoras vê a
Internet como um recurso com o qual podem obter informações atualizadas, tanto nas suas
vidas pessoais, quanto para suas aulas, além de exercer um grande “poder de sedução”
sobre os alunos, atraindo sua atenção e fazendo-os valorizar mais a escola. Assim, Santos e
Marinho (2016) comentam que a Internet é vista por essas professoras como um recurso
que complementa a forma como já trabalham didaticamente e que pode ajudar a suprir suas
fragilidades relativas aos conteúdos que ensinam. Os autores argumentam que essa visão
sobre a Internet se ancora na representação de escola que essas professoras já formaram
anteriormente, ao longo da vida, e em sua formação e atuação como docentes. Para que o
novo elemento “Internet”, possa fazer parte desse cenário escolar, ele passa a ser articulado
às práticas que já se encontram estabelecidas e consolidadas dentro desse referencial
tradicional de escola compartilhado por todos. Segundo os autores, a força das
representações já construídas dificulta que se veja a possibilidade de inovar.
Além de facilitar o trabalho e de perceber o interesse dos alunos pelas imagens, a
professora alegou, ainda, a necessidade de controlar a disciplina como motivação para o uso
de vídeo (conforme mencionado no relato das observações em que a professora declarou
que já havia desistido de uma determinada turma e que, por isso, havia trazido um vídeo
para ocupar todo o tempo de aula e transmitir tudo o que ela julgava que que não poderia
falar), assim como para o uso das apresentações de slides, que muitas vezes também foram
usadas para que os alunos fizessem cópias, estratégia com a qual a professora esperava
controla-los mais de perto.
142
Conforme comentado na subcategoria “Concepções da professora sobre a docência”,
a visão tradicional da professora sobre a docência é coerente com o desenvolvimento de
práticas que busquem o controle disciplinar e a transmissão de conteúdo e,
consequentemente, essa visão também influencia a própria concepção da professora sobre
o uso das TDIC, integrando-as em práticas que vão no sentido da manutenção dessa
perspectiva tradicional (LIM; CHAI, 2008). Além disso, a concepção da professora sobre o uso
de TDIC no ensino também é influenciada por sua concepção sobre os alunos, que segundo
ela, seriam imaturos para trabalhar com independência, por conta da faixa etária (11 a 15
anos), conforme comentado na subcategoria “Concepções da professora sobre os alunos e
sua relação com a escola”. De acordo com essa visão de imaturidade, a professora acredita
que o uso de tecnologias deve ser controlado por ela e, essa questão do controle, também
remete à sua visão de docência.
...no caso do ensino fundamental, a tecnologia, é....a gente ainda tem que ficar teleguiando ela, sabe?...a gente não pode escrever no quadro assim: entra no site tal, vamos pesquisar não sei o quê... e ficar lá na frente simplesmente explicando o que tá ali naquele site, porque ele não vai entrar naquele site...aí, como é um mundo paralelo, bem aberto, ele vai viajar, né...então, pra que você use essa tecnologia entrando em sites direto, pro aluno pesquisar ali, eu acho primeiro, né, que as turmas deveriam ser menores...não pode ser 42 alunos, né?...agora, se for 42, você, pelo menos, tem que ter umas 3 pessoas dentro da sala de aula, porque você vai estar girando o tempo inteiro, ele dentro da Internet e você está monitorando aquilo...não tem como você não monitorá-los, né?...se você não fizer esse monitoramento, a coisa vai degringolar, né...
No entanto, assim como foi percebida uma contradição nas falas da professora
citadas na subcategoria “Concepções da professora sobre os alunos e sua relação com a
escola”, acerca da possibilidade de os alunos trabalharem em projetos que eles mesmos
possam desenvolver com as TDIC, esse trecho da entrevista em que a professora comenta
sobre o uso “teleguiado” de tecnologia, especificamente a Internet, também apresenta uma
contradição com o que foi observado de suas práticas. Conforme apresentado no relato das
observações, na primeira aula acompanhada com o uso de tecnologia, em 2012, a
professora fez exatamente uma atividade como essa que ela diz que não seria possível. Ela
distribuiu os laptops por duplas de alunos para que eles visitassem a página
www.planetabio.com.br e seguiu a aula orientando o que eles deveriam ver, dando
explicações e esclarecendo dúvidas. A atividade foi realizada com três turmas em um mesmo
dia e, duas dessas turmas, tinham em torno de 40 alunos. Conforme foi possível observar,
poucos alunos pareciam desinteressados e tentaram acessar outros sites e, além disso,
143
minha participação na atividade limitou-se a ajudar alguns alunos com problemas de
conexão e não a controlar o que eles faziam com seus laptops. A própria professora
comentou que havia percebido que os alunos gostaram da atividade e isso a motivou a
repetir esse modelo de atividade, com as mesmas turmas, alguns dias depois, acessando o
mesmo site, porém, desta vez, com cada aluno utilizando seu próprio laptop. Novamente a
atividade foi bem sucedida, com boa participação dos alunos.
Portanto, essas duas experiências contradizem o que a professora comenta na
entrevista, quanto ao comportamento dos alunos, uma vez que nestes casos, eles se
mostraram bastante interessados e maduros o suficiente para cumprir o que a professora
lhes propôs naquele momento e, ainda contradizem o que ela comenta quanto à
necessidade de que haja três pessoas na sala de aula para monitorá-los. Apenas a questão
do uso “teleguiado”, comentado na entrevista, foi coerente com a forma como ela de fato
conduziu a atividade nessas duas ocasiões. No entanto, parece que estas duas experiências
não foram suficientes para causar alguma mudança na forte concepção que ela tem dos
alunos, da docência e, consequentemente, das TDIC no ensino, as quais veio construindo ao
longo de sua longa trajetória docente. Além disso, essas experiências aconteceram em 2012
e a entrevista em 2014 e, nesse intervalo de tempo, os problemas com a Internet da escola
prejudicaram os planejamentos de uso dos laptops com os alunos, o que pode ter
contribuído para reforçar sua visão negativa sobre o comportamento dos estudantes com as
TDIC.
É legítima a preocupação da professora com a dispersão dos alunos em atividades em
que eles tenham acesso à Internet, uma vez que isso realmente pode atrapalhar o
andamento da proposta de trabalho. Além disso, ter algum controle sobre a navegação dos
alunos na rede também é importante (para que não acessem páginas indevidas, como
pornografia, por exemplo) e, ao mesmo tempo, uma dificuldade real que a professora e
muitos outros professores certamente enfrentam ao integrar a Internet às estratégias
pedagógicas com turmas muito numerosas. A revisão de Islam e Grönlund (2016),
mencionada no tópico 3.4, capítulo 3, sobre impactos de projetos 1:1 em diversos países,
aponta como um dos aspectos negativos do uso de laptops em sala de aula, exatamente
essa preocupação dos professores com o que os alunos podem acessar indevidamente, o
que pode tirá-los do foco da aula e atrapalhar seu aprendizado. No entanto, dois pontos
144
parecem evidentes nesse caso: o pré-julgamento generalizado que a professora faz dos
alunos, como justificativa para limitar atividades que lhes deem mais autonomia no uso dos
laptops, conforme já comentado na subcategoria “Concepções da professora sobre os alunos
e sua relação com a escola”; a necessidade da professora em ter controle dos alunos e a
insegurança gerada pelo uso da Internet, por sua infinidade de navegação e dificuldade de
monitoramento, sem o auxílio de outros professores ou monitores que lhe deem suporte.
Quando questionada sobre o uso de tecnologias na sua vida pessoal, a professora
revelou ter pouco interesse ou conhecimento para explorar e incorporar em seu cotidiano os
distintos recursos de Internet, mesmo os de uso mais comum, como e-mail e redes sociais.
Segundo ela, o que já aprendeu a usar foi por conta própria, sem auxílio de curso ou de
outras pessoas. Dessa forma, essa pouca proximidade com as TDIC em sua vida pessoal,
assim como sua visão tradicional de ensino convergem para a concepção também tradicional
sobre a forma de uso das TDIC em sua prática pedagógica.
5.3.4 Unidade Temática I / Categoria: A relação entre o contexto (escolar e extra escolar)
com a prática pedagógica desenvolvida com TDIC
Ao longo da entrevista, a professora teceu comentários que indicaram que suas
práticas com as TDIC também estavam permeadas pelas condições do contexto escolar e
extra escolar. A questão da infraestrutura da escola relacionada ao acesso à Internet foi a
condição que, nesse período de acompanhamento, mais interferiu nos planejamentos de
práticas da professora com TDIC, especificamente com o uso dos laptops educacionais com
os alunos, conforme comentado no relato das observações. Na entrevista, a professora
comentou que, além da dificuldade de acesso à rede, havia também a dificuldade de realizar
algumas tarefas devido às próprias características dos laptops do PROUCA, como por
exemplo a memória para armazenamento muito limitada.
....não precisava ser tão simplório, né?...quer dizer, aí você pegou aquilo já com uma deficiência, vamos dizer assim, aí quando você vai usar você bate de cara com uma Internet que tá capenga...aí você tenta baixar um vídeo, aí ele não passa, aí você tem que passar pro outro pra fazer não sei o quê... eu fiz provas online, botei pra turma, lembra? só duas pessoas conseguiram fazer online, hehe....aquilo me
145
deu um nervoso e eu tenho várias feitas ali, porque eu fiquei entusiasmadíssima! Achei que ia ser muito legal! Aí eu fiz um monte...outro dia eu estava olhando em casa, eu falei: puxa...
...eu tava até falando que eu achei uns jogos online pro 6º ano...eu vou tentar baixar, gravar e ver se a gente consegue gravar (referindo-se ao computador do PROUCA)...se é possível, é...mas é isso que eu tô falando, ele me deu um instrumento que não me dá opção de uso...aí que que acontece, eu já tentei gravar um negócio ali de vídeo, que ele não gravou, não suportou...aí a aula passa e a bolinha tá girando...
...lembra que a gente quis trabalhar com história em quadrinho, aí a gente ficou um tempão aqui tentando baixar o “Toondoo”?...como é muito pesado, tem muita imagem, ele não conseguiu abrir...(pesquisadora)
...não baixou...não abre...
Nessas falas, pode-se perceber aspectos associados tanto do contexto da escola
quanto do programa do governo federal UCA. Por um lado, a escola não dispunha de uma
rede sem fio adequada para uso massivo de muitos alunos ao mesmo tempo e, por outro
lado, o projeto UCA foi levado a esta escola sem suporte suficiente de infraestrutura para o
pleno uso dos laptops, segundo o próprio modelo 1:1 defendido pelo programa, além da
qualidade do equipamento não atender as expectativas de uso pedagógico da professora. As
poucas atividades que ela conseguiu realizar com o uso dos laptops com os alunos foram
para visualização de uma página de Internet, conforme relato das observações, em 2012.
Porém, nos anos seguintes, nem mesmo uma atividade como essa foi possível em função
dos problemas com a rede. Portanto, a conjunção dessas dificuldades com Internet e
equipamento contribuiu para a limitação das práticas possíveis de serem realizadas pela
professora, considerando que é basicamente com acesso à Internet que se pode fazer uso
pedagógico de distintas ferramentas de construção, discussão, compartilhamento e busca de
informação, conforme argumentam estudiosos. Em um trecho dessa fala, a professora deixa
clara sua frustração por não ter conseguido concluir seu planejamento de provas online por
conta da falta de acesso à Internet, algo que a havia entusiasmado. Outras ideias de uso dos
laptops para possíveis atividades online também não foram adiante, como a proposta de
construção de histórias em quadrinhos, pois a página nem mesmo abriu devido à baixa
velocidade de conexão. Estas dificuldades, persistentes ao longo do tempo, foram
desmotivando a professora para o uso das TDIC.
146
Apesar de considerar excelente a proposta de trabalhar em sala de aula com um
computador por aluno (conforme fala na entrevista), a professora admitiu sua insatisfação
por conta dos problemas que impediram que este modelo se realizasse, nesta escola,
naquele período de tempo acompanhado. Estes também justificam o reforço de suas
práticas tradicionais, as quais a professora vê como única opção.
Além da frustração, outro trecho da entrevista, evidencia que o problema de
infraestrutura para acesso à Internet afeta também o tempo de trabalho da professora,
sobrecarregando-a com o planejamento de alternativas para a mesma aula, caso a Internet
funcione e caso não funcione.
...aí eu aprendi, né, quando eu tentei trabalhar com o UCA, que depois eu desisti, vou ser sincera...aí eu comecei a trazer o plano B e no final das contas era sempre o plano B que funcionava...aí eu falava: gente, isso é um cansaço...porque aí eu chego em casa, eu tenho que fazer duas atividades diferentes por turma...aí eu fui largando de mão...aí eu voltei para o power point, eu tenho vídeos no pendrive, aí quando a Internet tá funcionando, você entra num vídeo aqui, faz um outro trabalho, aí você vai se adaptando à carência...
Em outro trecho da entrevista também é possível perceber que, segundo a
professora, a escola não dispõe de infraestrutura adequada para que os professores
desenvolvam seus planejamentos com consultas à Internet, o que também faz com que ela
tenha que realizar essa tarefa em casa.
o que você acha do seu tempo de planejamento? Você acha que é adequado? É suficiente o tempo de planejamento que você tem? Dentro dessa carga horária ou você precisa...(pesquisadora)
não, porque eu acabo planejando fora da carga horária da escola, né...eu acho que eu faço mais planejamento em casa do que na própria escola...(professora)
por que na escola não dá tempo? (pesquisadora)
não, porque aí você pára...você começa a pesquisar lá na Internet pra pegar temas que você quer trabalhar, porque você vai fazendo uma adequação, né...aí você vai pegando não sei o quê e muitas vezes você chega aqui e você não tem a quantidade de... não tem computadores...e aí todo tempo que você tem livre aqui tem alguma coisa pra falar que a secretaria mandou, todo tempo é isso...aí eu trabalho em casa...(professora)
A sala dos professores dispõe de apenas dois computadores com acesso à Internet,
por uma rede distinta da rede dos laptops UCA. No entanto, parece que a professora
considera essa quantidade insuficiente para o número de professores, além do fato de o
próprio tempo livre na escola ser insuficiente para se dedicar ao planejamento, sendo, na
maioria das vezes, ocupado com conversas/orientações com a coordenadora pedagógica
147
acerca de questões da secretaria de educação e centro de estudos. Além disso, esses
computadores pareciam não ter manutenção e, ao longo desse período frequentando a
escola, não apenas a professora de ciências mas também outros professores reclamaram
sobre problemas como vírus e a perda de trabalhos e de pendrives por causa desses
computadores, o que os levava a evitar o uso dos mesmos. Assim, percebe-se que a falta de
infraestrutura adequada para acesso à Internet na escola afeta não só as atividades com os
alunos, mas também o próprio trabalho de busca de informações e planejamento de aulas
dos professores, mesmo aquelas mais tradicionais, mas que poderiam trazer materiais
obtidos na rede para acrescentar e enriquecer o conteúdo do livro e apostila. Se a
professora não tivesse acesso à Internet em casa, esse recurso dificilmente poderia fazer
parte de seu planejamento e aulas, já que as condições na escola não são muito favoráveis a
isso. No entanto, ter que fazer todo seu planejamento em casa, também representa uma
sobrecarga de trabalho com o consumo demasiado de tempo da professora fora do seu
ambiente e horário regular de trabalho.
Um outro problema que, assim como o projeto UCA, também demonstra a frágil
integração entre os grandes projetos do governo federal e as escolas e as secretarias de
educação dos municípios, é o caso do laboratório de informática. A escola conta com uma
sala reservada para funcionar como laboratório de informática, equipada com
computadores de mesa, disponibilizados pelo programa federal Proinfo, desde 2011. No
entanto, desde o início do acompanhamento da professora, em 2012, o laboratório não
podia ser usado por conta de problemas na rede elétrica, que seriam de responsabilidade da
prefeitura. Portanto, o laboratório indisponível foi outro exemplo de recurso com o qual a
professora não podia contar para seu planejamento de práticas. Apenas em 2014, o
laboratório de informática foi organizado e disponibilizado para uso, com rede de Internet
própria. Contudo, isso não significou que seu uso seria uma simples questão de
agendamento da sala para cada professor que a quisesse utilizar, pois ainda havia um outro
ponto a ser considerado: o número reduzido de computadores para as turmas com cerca de
40 alunos. Conforme mencionado no APÊNDICE A, o laboratório contava com 12
computadores, porém por conta de alguns problemas, apenas oito estavam em condições
de uso.
148
Uma das atividades do projeto “Com-Viver Com-Ciência e Cidadania”, o Conceito de
Saúde, utilizou o laboratório de informática em uma de suas etapas que necessitava de
acesso à Internet. No entanto, mesmo trabalhando com a turma pequena da escola, que
tinha apenas 18 alunos, oito computadores eram insuficientes e tivemos que distribuir os
alunos entre o laboratório e a sala de leitura, onde era possível acessar a rede do
laboratório, pela proximidade, usando os laptops educacionais. Essa estratégia só foi
possível com esta turma pequena. Com as demais turmas grandes, a mesma não poderia ser
feita, uma vez que não haveria espaço físico para todos no laboratório de informática e sala
de leitura, assim como a conexão com a Internet poderia falhar com tantos alunos buscando
acesso em seus laptops, ao mesmo tempo, algo que já havia acontecido em experiências
anteriores na sala de aula. Portanto, com tais dificuldades, o laboratório de informática não
parecia ser uma boa opção de uso de TDIC para a professora.
A escola também não possuía um laboratório de ciências, o que também implicava na
falta de um espaço próprio para a realização de experimentos, práticas próprias desta
disciplina e que também requerem o uso de tecnologias. A professora comenta na entrevista
que, quando chegou a esta escola, havia um armário com materiais que seriam para
experimentos de ciências, porém estavam impróprios.
...aí, quando eu cheguei eu dei uma olhada assim, eu disse: nossa, como tem coisa vencida aqui...estava tudo vencido, fechado...aí falaram assim: dá pra usar...eu disse: não, não vou usar ácido vencido, essa coisa toda vencida aí não, isso aí pode descartar...aí, não houve mais reposição...eu acho que isso também tem a ver com o modo como se vê, é....aí entra a política também, como se vê a educação como uma mercadoria, porque você não tem uma continuidade...então mudou o governante aquele projeto para e vai fazer outro projeto ou muda de nome ou faz não sei o que...aí você fica parado, tudo vai parando, é tudo estanque, então você não caminha com isso.
A fala da professora demonstra uma crítica à descontinuidade de projetos que
chegam à escola, mas com o tempo ou a troca de governo são abandonados, deixando a
escola e os professores desprovidos de condições e recursos que, em determinado
momento, tinham acesso. O próprio projeto UCA também foi encerrado em 2014 e a escola
ficou com os laptops educacionais, sem perspectiva de continuidade de uso dos mesmos por
conta das dificuldades de acesso à Internet e manutenção das máquinas que vão
apresentando problemas. Assim, pode-se compreender que essas descontinuidades de
projetos também contribuem para a descontinuidade e desmotivação de práticas dos
149
professores, especialmente as que vão no sentido distinto das tradicionais, pois, em geral,
requerem maior esforço e condições, como espaço e recursos adequados. A fala da
professora transparece a frustração com uma situação que parece ter sido constante em sua
trajetória docente.
Dados do relatório elaborado pelo Centro de Estudos sobre as Tecnologias da
Informação e da Comunicação (CETIC, 2015), mencionados no tópico 2.3, capítulo 2,
mostram que as condições de infraestrutura desta escola onde a professora de Ciências
leciona, em relação a computadores e Internet, são muito semelhantes às da maioria das
escolas públicas brasileiras. Segundo o relatório, a baixa velocidade de Internet, o número
insuficiente de computadores por aluno e de computadores conectados à Internet são
apontados, pela maioria dos diretores, como fatores que dificultam o uso pedagógico de
tecnologias nas suas escolas. Portanto, pode-se perceber que os problemas de infraestrutura
para desenvolvimento de práticas pedagógicas com TDIC, que constituem a primeira
barreira para a integração de tecnologias à educação (ERTMER et al, 2012), são uma
realidade na educação brasileira e que ainda não têm sido tratada com a devida eficiência
pelas políticas governamentais.
Em uma das falas destacadas anteriormente, em que a professora comenta sobre ter
um plano B para o caso de não ser possível realizar uma atividade inicialmente planejada
com o laptop, ela diz que vai se adaptando à carência. Pode-se dizer que esta carência se
estabelece não apenas na impossibilidade de acesso à Internet para trabalhar em sala de
aula com os laptops, mas em todas as demais fragilidades de infraestrutura da escola
apontadas anteriormente: o laboratório de informática com poucas máquinas para turmas
muito numerosas, poucos computadores disponíveis para uso dos próprios professores, falta
de suporte e manutenção das máquinas, falta de um laboratório de Ciências. Assim, essa
adaptação à carência mencionada pela professora é o que Charlot (2008) chama de
“estratégia de sobrevivência”.
Alguns estudos (SILVEIRA et al, 2014; YU et al, 2015; HOWARD; JOHNSON, 2004)
mostram que dificuldades como as enfrentadas pela professora de Ciências, seja na relação
com os alunos, seja com relação às condições de trabalho no ambiente escolar, constituem-
se como fatores estressantes ao professor, que podem inclusive ter sérios impactos em sua
150
saúde. De acordo com os mesmos, a forma como o professor lida com estes fatores se
reflete na sua prática. Silveira et al (2014) destacam que quanto maior o estresse do
docente, menos favorável é o ambiente de aprendizado dos alunos, considerando que,
nesses casos, o professor tende a dedicar o mínimo esforço para desenvolver suas aulas e se
afasta dos alunos. Nesse sentido, há estratégias de escape, em que o professor evita se
envolver ou buscar a fonte do problema, tentando contornar as situações estressantes sem,
de fato, enfrentá-las e há as estratégias contrárias, em que o professor assume o problema,
repensa suas concepções e práticas e busca apoio de colegas e direção da escola, sendo este
considerado um dos mais importantes caminhos para lidar com estas questões (SILVEIRA et
al, 2014; YU et al, 2015; HOWARD; JOHNSON, 2004). Pelas falas da professora de Ciências e
pelo que pode ser observado ao longo desse período de acompanhamento, a adaptação à
carência ou as “estratégias de sobrevivência”, fazem parte do cotidiano desta professora e
contribuem para desmotivá-la a desenvolver práticas distintas daquelas com as quais já tem
segurança em realizar, o que se estende ao uso de TDIC.
Algumas outras questões não foram apontadas diretamente pela professora em sua
entrevista, porém puderam ser percebidas em algumas falas, mas principalmente pelas
observações ao longo desse período de acompanhamento, como inerentes ao seu contexto
escolar e que têm relação com a prática que ela desenvolve. A questão do elevado número
de alunos por turma, em torno de 40, foi brevemente mencionado pela professora em um
trecho destacado na subcategoria Concepções da professora sobre TDIC para o ensino, em
que ela comenta que acredita que o uso de Internet para que os alunos façam pesquisas,
deve ser “teleguiado”. Segundo a professora, turmas grandes dificultam o controle do que
eles acessam, considerando que alguns alunos podem aproveitar o momento para consultar
páginas indevidas, que não fazem parte do trabalho proposto. Independente da visão de
controle sobre os alunos, relacionada ao perfil pedagógico da professora, já comentado
anteriormente, o elevado número de alunos sob responsabilidade da professora é uma
questão que influencia desde o planejamento de atividades até sua implementação em sala
de aula, seja com TDIC ou não. Considerando os problemas de infraestrutura da escola já
apontados – dificuldade de acesso à Internet, laboratório de informática com poucas
máquinas e ausência de laboratório de ciências – pode-se compreender que quanto maior o
número de alunos, mais esses problemas de infraestrutura se tornam difíceis de serem
151
contornados pela professora. O exemplo da atividade “Conceito de Saúde”, realizado com a
turma que tinha apenas 18 alunos, conforme mencionado anteriormente, evidencia essa
questão. Neste exemplo, foi possível pensar em uma alternativa para contornar as
dificuldades com acesso à Internet e poucas máquinas somente por conta do número
reduzido de alunos. Conforme mencionado no tópico 5.1.6, capítulo 5, a própria professora
comentou com a pesquisadora, em determinado momento das observações, que o trabalho
com a turma pequena da escola era melhor: “não é que eles sejam melhores, mais
inteligentes do que os outros, mas pelo próprio número de alunos, é mais fácil de dar aula,
de conseguir ver o que eles estão fazendo...”.
Foi possível observar que, nas aulas em que a professora trabalhou com laptops com
os alunos, em turmas grandes, os mesmos tiveram frequentes dúvidas sobre manuseio das
máquinas, com sistema operacional Linux, com o qual não pareciam ter muita proximidade e
sobre alguns pequenos problemas que surgiam, com relação à queda da conexão, bateria
etc. Nesta situação, vários alunos chamavam a professora ao mesmo tempo e ela tinha que
ir de mesa em mesa verificar o problema, o que lhe demandava tempo e, enquanto tais
problemas não eram resolvidos, os alunos ficavam sem ter como realizar o que era proposto
e pareciam ficar mais impacientes. Por esta razão, a professora solicitava à pesquisadora que
a auxiliasse para atender a estas dúvidas dos alunos, a fim de que a proposta da atividade
pudesse ser realizada dentro daquele tempo de aula planejado. Em uma situação como essa,
em que os alunos trabalham com seus computadores, quanto maior o número de alunos,
maior é a atenção que a professora precisa lhes prestar individualmente, o que é uma
questão que independe de sua concepção tradicional ou construtivista de ensino.
Portanto, é compreensível quando a professora diz que, para trabalhar com Internet
em turmas de grande porte, é necessário o suporte de outras pessoas em sala de aula. Com
tantos alunos, é difícil dar a devida atenção a todos, o que demanda tempo e, como foi
possível observar, um espaço de 50 minutos de aula, em geral não é suficiente para esse tipo
de trabalho, mesmo numa perspectiva tradicional como o desta atividade de visualização de
uma página de Internet, que parece ser mais objetiva. Conforme mencionado no tópico 3.4,
capítulo 3, pesquisas realizadas em escolas que também receberam o projeto UCA, mostram
problemas semelhantes com relação à insuficiência de um tempo de aula para o trabalho
com os laptops, apontando questões logísticas como a distribuição e o posterior
152
recolhimento das máquinas após o uso, e ainda a necessidade de carregá-los enquanto estão
em uso, o que demanda disponibilidade de tomadas suficientes em sala de aula, algo que
nem sempre ocorre (SANTOS; BORGES, 2009; ALMEIDA; PRADO, 2009; NASCIMENTO et al,
2011; ALVAREZ; MOLL; SOUZA, 2015). Estas questões logísticas também foram observadas
nas aulas com uso de laptops da professora de Ciências e são detalhes que precisam ser
levados em consideração no planejamento de qualquer atividade envolvendo os
computadores em sala de aula, pois a mesma pode ser prejudicada caso estes aspectos não
estejam funcionando corretamente. Mais uma vez, pode-se compreender que quanto maior
o número de alunos em sala de aula, mais difícil pode ser contornar essas pequenas
dificuldades que consomem tempo de aula e causam insatisfação tanto em professores
quanto alunos quando o planejamento de trabalho é prejudicado.
Conforme mencionado na subcategoria Concepções da professora sobre os alunos e
sua relação com a escola, o fato de a escola não dispor de um laboratório de Ciências
também é um problema difícil de ser contornado com turmas muito numerosas, pois
determinados experimentos podem envolver procedimentos e materiais que requerem não
apenas um espaço adequado, mas muita atenção dos alunos e da professora junto a eles.
Assim, pode-se compreender que, com turmas pequenas ou com a possibilidade de
organizar a divisão da turma em grupos contando com algum apoio na orientação dos
alunos, a professora poderia ter condições de realizar algumas práticas experimentais em
sala de aula ou outro espaço da escola.
Como é possível perceber, o número de alunos por turma é um importante aspecto
do contexto de trabalho da professora que influencia diretamente em sua prática,
especialmente com TDIC, sendo mais um a contribuir para sua desmotivação e reforço das
atividades tradicionais que lhe parecem mais seguras e não lhe demandam tanto esforço de
planejamento. Buehl e Beck (2015) comentam sobre estudos em que as questões de turmas
grandes e indisciplina são apontadas como obstáculos até mesmo por professores que dizem
ter concepções construtivistas, colocando que estas condições os impedem de desenvolver
as práticas pedagógicas que consideram apropriadas.
Outra questão que não foi alvo direto de comentários da professora na entrevista,
mas que faz parte do contexto da escola em que ela atua é a imposição de apostilas
153
pedagógicas preparadas pela prefeitura como um material a ser seguido pela professora. Ao
final de cada bimestre, os alunos são submetidos a uma prova para avaliação do seu
desempenho na disciplina Ciências, além de língua portuguesa e matemática e, ao final do
ano, estas provas compõem uma avaliação da própria escola dentro da rede municipal.
Assim, a professora se vê comprometida a dar conta de uma determinada sequência de
conteúdos por bimestre. Considerando que práticas com TDIC demandam bastante tempo
de aula, tanto por conta das dificuldades já mencionadas (acesso à Internet, aspectos
logísticos de uso de laptops em sala, número de alunos), quanto por conta das próprias
características das atividades (se a proposta for centrada no aluno, para o desenvolvimento
de algum projeto, o tempo demandado é maior do que uma atividade tradicional, centrada
no professor), pode-se compreender que a pressão para dar conta de conteúdos em um
prazo de tempo específico, pode levar a professora a optar pelas práticas que lhe pareçam
mais seguras e fáceis de realizar, aquelas com as quais já está habituada (MCCRORY, 2006;
HOWARD, 2013). Conforme McCrory (2006), quando a pressão pelo tempo é grande, é difícil
esperar que o uso das TDIC seja efetivo e de acordo com características construtivistas,
centradas no aluno como defendem muitos pesquisadores (JONASSEN et al, 1998; JUDSON,
2006; KENSKI, 2007 LIM; CHAI, 2008; CHEN, 2008; FREITAS; LEITE, 2011; ERTMER;
OTTENBREIT-LEFTWICH, 2013).
Um determinado trecho da entrevista mostra exatamente essa pressão pelo tempo
para dar conta de uma série de conteúdos em um bimestre. A professora comentou sobre a
imaturidade dos alunos da faixa etária com a qual trabalha e que, às vezes, turmas de uma
mesma série são diferentes, não acompanham o andamento da matéria no mesmo ritmo.
Nesse momento, a professora mencionou uma situação em que não foi possível trabalhar
todo o conteúdo da apostila para uma turma do 9º ano até a data da prova. Segundo ela, os
alunos não haviam conseguido compreender parte da matéria, o que fez com que ela não
conseguisse avançar para os demais conteúdos:
...que adianta eu sair do meio e ir até o final se o cara não entendeu até o meio? (referindo-se ao conteúdo da apostila)....aí fiquei eu voltando, voltando...eu só acabei a apostila do terceiro bimestre agora...e a prova?...a prova já foi há muito tempo....
Nessa fala, a professora mostra preocupação de que os alunos compreendam os
conteúdos e ao mesmo tempo, a pressão que ela enfrenta para atender uma demanda do
154
governo para avaliação da escola. No entanto, conforme comentado no relato das
observações (tópico 5.1.4), algumas vezes a professora parecia passar rápido pelas
explicações e alguns alunos comentavam, em voz baixa, que não estavam entendendo,
especialmente nas aulas em que ela usava apresentações de slides para apresentar os
conteúdos. Assim, compreende-se que o convívio com essa pressão externa por avaliação,
para dar conta de um conteúdo extenso em pouco tempo, além da pressão interna sofrida
no dia a dia da escola com turmas numerosas, dificuldade de uso dos recursos, indisciplina e
desinteresse dos alunos, conforme a professora aponta na entrevista, interferem
diretamente no seu planejamento de práticas, que precisa coordenar todos esses distintos e
complexos aspectos.
Pode-se perceber que o contexto da escola é permeado e influenciado pelo contexto
extra escolar, no qual algumas questões fazem parte da área educacional diretamente, como
as políticas e projetos de educação, mas as demais questões que estão na sociedade em
geral, também influenciam a escola, como instituição que faz parte desta sociedade.
Conforme mencionado na subcategoria Concepções da professora sobre os alunos e sua
relação com a escola, a própria professora percebe uma mudança no perfil dos alunos ao
longo do seu tempo de docência e atribui essa mudança à disseminação das TDIC na
sociedade, as quais parecem ser mais atrativas para os estudantes do que a escola,
resultando no seu grande desinteresse pelas práticas escolares. Além da influência das TDIC
na sociedade, a professora também comenta na entrevista sobre uma percepção de que há
um processo de desvalorização do conhecimento pela sociedade brasileira, o que também
influencia na postura do aluno perante a escola, que parece não entender o motivo de ter
que aprender determinados conteúdos.
...o que que acontece na verdade, eu acho que já é uma coisa assim...é...é a desvalorização que a sociedade brasileira tem, na sua grande maioria, em termos do aprendizado, do ensino...essa valorização não é passada pra eles...eles não veem...é...como aquela história: pra quê?...então eles estão sempre procurando, eles querem sim evoluir, né, ter mais bens materiais, etc...mas eles estão sempre procurando ir pelo lado mais fácil pra eles, na cabeça deles, né...é o jogar bola, é o fazer não sei o quê...é, e aí você então tem essa desvalorização...aí quando você manda ligar o computador, ele não quer entrar no que você quer, ele quer entrar no facebook, ele quer entrar não sei aonde, ele quer fazer não sei o que... é a desvalorização do conhecimento em si...
Na visão da professora, essa desvalorização da educação se reflete ainda na falta de
apoio das famílias dos alunos ao professor e à escola no processo educativo.
155
...quando você chama o responsável na escola, quando eu comecei lá (referindo-se ao início de sua carreira), ele vinha e falava assim: professora, o que aconteceu? Aí você diz: olha, tá acontecendo isso, isso, isso...a gente tá precisando da ajuda da senhora pra poder...ah, pode deixar (seria a resposta do responsável)....hoje?! ele vem na escola e diz assim: a senhora persegue o meu filho!...antes de você abrir a boca, você não consegue nem dizer o que está acontecendo...aí você fica parado olhando pra cara da pessoa e...ok, né...foi o que o pai da aluna fez semana passada.
Portanto, pode-se considerar que estas questões de contexto social também exercem
pressão sobre a prática da professora, seja com TDIC ou não e, talvez por ela não saber lidar
com as mesmas, podem contribuir para sua desmotivação pela própria docência. Um
sentimento de desânimo pode ser percebido quando ela mesma afirma que sentia que era
mais fácil dar aula no início da carreira do que agora e que gosta mais dos seus primeiros 15
anos de docência. Na época da entrevista, a professora já tinha dado entrada em seu
processo de aposentadoria.
Conforme mencionado no tópico 3.2, capítulo 3, alguns estudos mostram que mesmo
professores que afirmam ter concepções construtivistas, na prática realizam atividades
predominantemente tradicionais. Segundo estes estudos, a justificativa dada por esses
professores pela inconsistência entre suas práticas e concepções é a pressão exercida pelo
contexto, tanto social quanto escolar: política, sociedade orientada por exames, currículo
escolar extenso e calendários rígidos, falta de disponibilidade de equipamentos e
infraestrutura apropriada, falta de treinamento e exemplos de práticas de integração das
TDIC, tempo insuficiente para planejar, se familiarizar com os recursos e falta de suporte
administrativo e técnico adequado (JUDSON, 2006; LIM; CHAI, 2008; CHEN, 2008). Assim,
compreende-se que todos os aspectos que compõe o contexto em que o docente está
inserido são importantes para favorecer ou prejudicar sua prática e, por isso, não podem ser
negligenciados quando se pensa na evolução do processo educacional, seja no Brasil ou em
qualquer outro contexto.
5.3.5 Unidade Temática I – Considerações Finais
O quadro 5 a seguir apresenta uma síntese das concepções e aspectos relacionados
ao contexto apontados nas categorias anteriores e, conforme o que foi discutido nestas
156
categorias, pode-se dizer que tanto as concepções da professora quanto aspectos do
contexto da escola e fora dela, influenciam diretamente sua prática pedagógica.
QUADRO 5: SÍNTESE DE CONCEPÇÕES DA PROFESSORA E ASPECTOS DO CONTEXTO APONTADOS NA UNIDADE TEMÁTICA I
CONCEPÇÕES DA PROFESSORA
Sobre docência
Perspectiva de ensino tradicional, evidenciando sua necessidade de autoridade, cujo reconhecimento pelos
alunos não é mais tão forte como no início de sua carreira; considera que o trabalho do professor foi
rebaixado;
Sobre alunos e sua relação com a escola
Os alunos mudaram ao longo do seu tempo de carreira e hoje os considera mais dispersos e desinteressados;
alunos do ensino fundamental são imaturos para desenvolver atividades do tipo construtivista, que lhes
deem maior responsabilidade e autonomia;
Sobre TDIC para o ensino
As TDIC facilitam seu trabalho de busca e preparação de material usado em aula, prioritariamente
audiovisual, para transmitir conteúdo e ajudar no controle de indisciplina da turma; os recursos
audiovisuais são atraentes para os alunos, despertam seu interesse;
CONTEXTO
Escolar
Problemas de infraestrutura para acesso à Internet em sala de aula; ineficiência dos laptops educacionais do
programa UCA; laboratório de informática com poucas máquinas; ausência de laboratório de Ciências; poucos computadores na sala dos professores; turmas muito
grandes (cerca de 40 alunos); falta de tempo e computadores disponíveis para planejamento na
escola;
Extra escolar
Descontinuidade de políticas governamentais e falta de apoio para implementação e manutenção de projetos, como o próprio UCA; obrigatoriedade do uso de uma
apostila por conta de uma política de avaliação da secretaria de educação; desvalorização do
conhecimento pela sociedade; falta de apoio dos pais dos alunos;
Foi possível perceber que as concepções apresentadas pela professora sobre a
docência, sobre os alunos e sobre as TDIC no ensino, afetam-se mutuamente, pois a forma
como ela entende que deve ser a prática docente, no caso, uma forma tradicional, com
prevalência da autoridade, influencia sua visão sobre como os alunos devem se comportar e
157
aprender. Nesse sentido, é compreensível que a concepção acerca do uso das TDIC no
ensino se baseie nessas concepções anteriores, as quais a professora vem consolidando ao
longo de sua trajetória docente, levando-a a buscar meios de integrar as TDIC às práticas
tradicionais que já vinha realizando. Ficou evidente também o quanto os aspectos do
contexto, especialmente o escolar, com todas as dificuldades apresentadas, contribuíram
para o reforço dessas concepções tradicionais da professora, com poucas oportunidades de
experimentar modelos de atividades distintos com a introdução de recursos de TDIC. Além
disso, o contexto escolar é também diretamente afetado por aspectos do contexto extra
escolar, mais incisivamente pelas políticas de educação, mas também por questões sociais e
culturais que influenciam em mudanças de atitudes, conforme a própria professora comenta
acerca da mudança de perfil dos alunos e pais ao longo do tempo. No caso da professora de
Ciências, tanto suas concepções tradicionais sobre ensino, quanto as questões de contexto
apontadas, convergiram para que a professora buscasse a manutenção de suas práticas
pedagógicas tradicionais, associando as TDIC no sentido de facilitar tais práticas e não de
modificá-las. Assim, as questões 1 e 2 (“Como as concepções da professora sobre ensino,
alunos e tecnologias se relacionam com suas decisões para uso ou não das TDIC em sala de
aula?” e “De que modo o contexto da escola influenciou as práticas da professora com as
TDIC e por quê?”), que deram origem à esta unidade de análise, foram sendo discutidas em
cada categoria e subcategoria e evidenciando que a complexidade da prática desta
professora não pode ser analisada e explicada por um destes aspectos, mas por todos ao
mesmo tempo.
Buehl e Beck (2015) comentam sobre diversas pesquisas que indicam a existência de
diferentes perspectivas sobre como concepções e práticas docentes se relacionam. Há
trabalhos que apontam que as concepções influenciam a prática, perspectiva na qual se
entende que os indivíduos desenvolvem suas práticas com base nas suas concepções, o que
se percebe quando a prática do professor se alinha com a concepção que ele declara. Outra
perspectiva, segundo Buehl e Beck (2015), aponta que as concepções dos professores
podem ser desenvolvidas e transformadas ao se engajarem em práticas específicas, o que se
percebe em estudos que avaliam efeitos de programas de desenvolvimento profissional nas
concepções de professores experientes e efeitos de experiências de campo nas concepções
de professores em formação. Assim, esses estudos apresentam resultados que identificam
158
mudanças de concepções de professores que participam de tais iniciativas. Outros estudos
encontram resultados de desalinhamento ou inconsistência entre as concepções de
professores e suas práticas em sala de aula. No entanto, os autores colocam que, na sua
visão, a perspectiva mais adequada é aquela que entende que existe uma relação recíproca
e complexa entre concepções e prática, em que uma influencia a outra, conforme estudos
longitudinais têm demonstrado.
A análise dos dados deste estudo, nesta unidade I, corroboram com esta perspectiva
de reciprocidade entre concepções e prática docente defendida por Buehl e Beck (2015).
Pode-se dizer que as práticas da professora de Ciências não apenas refletiram suas
concepções, mas também influenciaram-nas no sentido de reforço. As práticas em que a
professora utilizou vídeos, apresentações de slides, cópias de exercícios e, com elas tinha a
impressão de ter maior controle sobre os alunos, tanto sobre a disciplina quanto sobre a
tarefa proposta, aspectos muito valorizados por ela, são exemplos que contribuíram para
reforçar suas concepções tradicionais. A professora tendia a repetir as estratégias que ela
considerava que lhe davam o retorno esperado, fazendo o mesmo com o uso dos recursos
tecnológicos.
Quanto à relação entre contexto e prática, Ertmer, Ottenbreit-Leftwich e Tondeur
(2015) colocam que estudos vem mostrando que professores considerados exemplares com
relação ao uso pedagógico de TDIC, em geral, atuam em ambientes escolares que têm em
comum a presença de outros professores usuários de TDIC, o apoio de administração da
escola, iniciativas para desenvolvimento profissional e turmas de tamanhos reduzidos. Estas
seriam, então, as condições necessárias ao contexto escolar para favorecer o uso pedagógico
de TDIC no sentido de inovação de práticas que se espera do professor. Pode-se dizer que,
no caso da professora de Ciências, essas condições não estavam plenamente presentes. A
maioria das turmas era numerosa, a direção da escola estimulava o uso dos computadores e
Internet, porém não dispunha de profissionais disponíveis para auxiliar os professores, assim
como não tinha projetos de desenvolvimento profissional dos professores para uso
pedagógico das TDIC e, pelo que foi observado em conversas na sala dos professores nos
intervalos de aulas, muitos deles não utilizavam nenhum recurso tecnológico ou os
utilizavam de formas semelhantes às da professora de Ciências. O projeto “Com-Viver Com-
Ciência e Cidadania”, desenvolvido pelo grupo de pesquisadores com os professores desta
159
escola, consistiu em uma iniciativa que tinha um caráter de desenvolvimento profissional em
serviço, cuja intenção era auxiliar estes professores a construir práticas construtivistas com
TDIC. No entanto, o mesmo, assim como o presente estudo desenvolvido, em particular com
a professora de Ciências, foi prejudicado pelos problemas de infraestrutura física da escola,
com relação à rede de Internet, conforme já comentado. Isso significa que o contexto
escolar em que a professora de Ciências atua ainda está longe de reunir as condições ideais
para favorecer o uso pedagógico de TDIC e que a primeira condição que precisa ser
assegurada é a da infraestrutura de acesso às TDIC e à Internet. Possivelmente, este aspecto
não foi mencionado por Ertmer, Ottenbreit-Leftwich e Tondeur (2015) dentre as condições
ideais de um contexto escolar, pois além de ser óbvio, o acesso aos recursos já vem
deixando de ser considerado um problema em muitos países desenvolvidos, conforme as
revisões de Wastiau et al (2013) e Delgado et al (2015), que abordam contextos de países
europeus e EUA, respectivamente.
De acordo com Ertmer et al (2012), mencionado no tópico 3.2, capítulo 3, os aspectos
relativos ao contexto onde o docente atua, desde o acesso ao apoio e oportunidades de
desenvolvimento profissional para uso pedagógico das TDIC, consistem em barreiras
externas. As concepções dos professores sobre ensino, sobre como os estudantes aprendem
e o papel da tecnologia para o processo de ensino-aprendizagem são as barreiras internas
dos professores. Estas últimas seriam as mais difíceis de serem transpostas, pois requerem
tempo para que o professor adquira conhecimento para usar a tecnologia, tanto de forma
técnica quanto pedagógica, para que possa experimentar suas possibilidades e, assim,
refletir sobre suas concepções e estratégias de ensino para, então, transformá-las se julgar
necessário (ERTMER et al, 2012). Ertmer, Ottenbreit-Leftwich e Tondeur (2015) comentam
que, quando o acesso ao computador e Internet começou a se disseminar, na década de
1990, houve um otimismo exacerbado entre educadores e formadores de políticas de que a
tecnologia poderia ser um catalisador para a reforma educacional, que já vinha sendo
debatida, com a defesa de que o processo de ensino-aprendizagem deveria ser mais
centrado no aluno. Acreditava-se que, com o tempo, os professores passariam a usar as
tecnologias de forma inovadora. No entanto, essa visão falhou ao não levar em consideração
as questões das concepções dos professores e do contexto em que lecionam, o que vem
sendo extensamente debatido em diversas pesquisas sobre a complexidade da integração de
160
TDIC na educação desde então. Segundo os autores, os estudos têm ressaltado que não
basta a inserção das TDIC nas escolas para que haja mudança no processo educativo, pois
esta é apenas a resolução da barreira externa do acesso. A mudança efetiva de prática
depende ainda da barreira interna das concepções dos professores, que precisam ser
compreendidas e discutidas com eles, além de proporcionar-lhes oportunidades de
experiências de práticas pedagógicas inovadoras com TDIC.
De acordo com Buehl e Beck (2015), os professores também podem apresentar
concepções contraditórias, dependendo do perfil dos alunos, do contexto, do conteúdo etc.
Na análise das subcategorias “Concepções da professora sobre os alunos e sua relação com a
escola” e “Concepções da professora sobre TDIC para o ensino”, foi possível perceber uma
contradição nas falas da professora de Ciências acerca de sua visão sobre as TDIC. Enquanto
na primeira subcategoria, a professora comenta sobre a mudança de perfil dos alunos ao
longo do tempo e aponta as TDIC como uma das principais causas do desinteresse dos
alunos pela escola, na outra subcategoria, ela comenta que considera que as TDIC ajudam a
despertar o interesse dos alunos pelo aspecto do audiovisual. Assim, a professora parece
considerar as TDIC ao mesmo tempo como a causa do desinteresse de seus alunos, mas
também as vê como recursos que podem contribuir para atrair o interesse dos estudantes.
No entanto, essa contradição nas concepções da professora sobre as TDIC tem coerência ao
se considerar que a disseminação das TDIC pela sociedade levou, de fato, a essa mudança do
perfil dos alunos percebida pela professora (SIBILIA, 2012, COLL; MONEREO, 2010; KENSKI,
2007; PÉREZ GOMEZ, 2015) e que as tecnologias também exercem forte atração sobre esses
alunos, sendo o aspecto da ilustração capaz não só de lhes chamar atenção, mas também de
lhes ajudar a compreender os conteúdos (ARROIO; GIORDAN, 2006; SIBILIA, 2012; SANTOS,
2015). Conforme Murphy e Rodriguez-Manzanares (2008), a introdução de novas
tecnologias no contexto escolar pode gerar contradições ao se chocarem com elementos já
estabelecidos, como práticas e concepções. Assim, pode-se compreender que a contradição
apontada não é exclusiva do contexto particular desta professora, mas está imposta ao
sistema escolar em todo o mundo, visto que cada vez mais escolas, nos mais distintos
contextos, se veem diante da questão de lidar com a cada vez mais inevitável integração de
TDIC ao processo educacional.
161
Outras contradições também foram percebidas com relação a concepções que a
professora expôs na entrevista e algumas de suas práticas, como o fato de ela considerar os
alunos dessa faixa etária do ensino fundamental como imaturos para desenvolver atividades
que lhes demandam responsabilidade e autonomia, mas ao mesmo tempo mencionar como
bem sucedidas as atividades em que alunos trabalharam em grupo e fora da escola para
criar trabalhos apresentados na Mostra Pedagógica. Outro ponto contraditório foi percebido
quando a professora comentou que o uso de tecnologia com alunos dessa faixa etária
precisa ser teleguiado, monitorado, pois acredita que em uma atividade de acesso a um
determinado endereço de Internet, os alunos vão se dispersar e aproveitar para acessar
outros endereços indevidos e ela não teria controle sobre isso. No entanto, a primeira
atividade com uso de laptops e Internet que a professora realizou, nesse período de
acompanhamento, foi exatamente essa e a própria professora a considerou bem sucedida e
decidiu repetir o modelo de atividade em outra oportunidade.
O que essas contradições têm em comum é a subestima da professora em relação
aos alunos, porém essa concepção da professora também pode ser compreendida como
uma forma de ela encobrir sua própria insegurança ou desconforto em proporcionar
atividades em que os alunos tenham maior controle do que estão fazendo do que ela
mesma. É interessante notar que a professora não atribui a dificuldade de realizar projetos
de perspectiva construtivista a suas próprias limitações de experiência, concepções e
conhecimento, mas sim ao perfil dos alunos. Assim, quando ela considera que é uma
questão de imaturidade, inerente à faixa etária do ensino fundamental, a professora
encontra uma justificativa que lhe permite se conformar com essa situação e continuar com
as práticas que ela acredita que são mais adequadas para esses alunos, o que se estende ao
uso das TDIC. Portanto, compreende-se que as oportunidades em que os alunos
contrariaram essa concepção da professora e mostraram condições de realizar atividades
com autonomia e responsabilidade, não foram suficientes para mudar sua percepção. Estas
oportunidades ocorreram em situações pontuais (Mostra Pedagógica, Projeto “Com-Viver
Com-Ciência e Cidadania” e dois dias de aula com possibilidade de acesso à Internet e uso
dos laptops), enquanto as práticas tradicionais, inclusive com uso de TDIC, estiveram mais
presentes na sua rotina.
162
A partir do que das observações e da entrevista, foi possível compreender que a
professora buscou fazer uso dos recursos tecnológicos da forma que ela julgou ser útil para
seu trabalho, no sentido de torná-lo mais fácil, tanto para trabalhar o conteúdo, quanto para
lidar com a dificuldade de indisciplina dos alunos, potencializando as práticas tradicionais
com as quais já trabalhava. Além disso, as circunstâncias vivenciadas neste período
contribuíram para a predominância deste tipo de uso mais restrito dos recursos pela
professora, já que as dificuldades de acesso à Internet impossibilitaram planejamentos que
ela havia feito. Diante dessas dificuldades de uso das TDIC na escola, a professora expressou
sua frustração que, consequentemente, reforçou sua falta de confiança tanto no uso dos
recursos quanto nas políticas que os trazem para a escola sem o apoio necessário.
Buehl e Beck (2015) comentam que vivenciar experiências de sucesso é importante
para que os indivíduos ganhem confiança para investir em novas experiências, como no caso
de práticas pedagógicas com TDIC. De acordo com Howard (2013), mencionado no tópico
3.2, capítulo 3, a decisão pelo não uso de TDIC, muitas vezes está ligada a fatores emocionais
do professor, como o medo de correr riscos, o que pode prejudicar a capacidade de avaliar e
reconhecer potencialidades pedagógicas das tecnologias, reforçando concepções negativas
em relação às mesmas. Conforme Buehl e Beck (2015), Howard (2013) também reforça a
importância de experiências pedagógicas positivas com as TDIC, para que as decisões pelo
seu uso possam ser mais fundamentadas na razão do que no medo e desconfiança. No caso
da professora de Ciências, poucas foram as oportunidades de experiências pedagógicas bem
sucedidas com as TDIC. Ao longo desse período de acompanhamento, as atividades que ela
considerou como bem sucedidas (por terem ocorrido conforme seu planejamento), com o
uso de computadores pelos alunos, foram as de visualização de uma página de Internet
indicada pela professora e o quizz dos animais vertebrados, preparado em slides. As
atividades do projeto “Com-Viver Com-Ciência e Cidadania” também foram consideradas
bem sucedidas, mas também foram prejudicadas, em alguns momentos, pelos problemas de
acesso à rede da escola e, além disso, a professora teve uma participação tímida em algumas
das atividades, conforme comentado no relato das observações. Portanto, pode-se
considerar que estas experiências esparsas e as dificuldades do contexto, pouco
contribuíram para estimular a confiança e motivação da professora acerca do uso
pedagógico das TDIC.
163
Assim, o que ficou evidente com a análise das categorias desta unidade I é a
complexidade de fatores que implicam e precisam ser compreendidos para o planejamento
de um processo de integração de TDIC à prática pedagógica para que este seja efetivo, seja
no caso desta professora ou de qualquer outro professor em qualquer contexto, visto que
não existe um modelo de integração que possa ser seguido, quando se considera a
complexidade do próprio ser humano. Tratando-se especificamente do ponto de vista dessa
professora de Ciências, pode-se dizer que suas concepções sobre docência, sobre os alunos e
sobre o uso das TDIC no ensino e suas respectivas práticas se distanciam da expectativa de
concepções e práticas construtivistas e integração de TDIC que pesquisadores tem com
relação à educação (KENSKI, 2007; COLL; MONEREO, 2010; ERTMER et al, 2012; BUEHL;
BECK, 2015; PÉREZ-GOMEZ, 2015; ERTMER; OTTENBREIT-LEFTWICH; TONDEUR, 2015).
Considerando-se que essa distância também é percebida por estes pesquisadores, nos
distintos contextos de estudo, com distintos professores, pode-se compreender a
importância da aproximação entre universidade e escola, para troca de saberes, reflexão e
desenvolvimento de experiências colaborativas que possam favorecer não só os professores,
que têm oportunidade de construir conhecimento e enriquecer sua prática, mas também os
alunos que têm oportunidade de também construir conhecimento, de forma criativa,
autônoma, crítica, desenvolvendo habilidades valorizadas na sociedade atual.
5.3.6 Unidade Temática II / Categoria: Percepções da professora sobre a parceria
Quando questionada, na entrevista, se a parceria com a pesquisadora havia
contribuído para seu processo de aproximação e uso das TDIC, a professora comentou:
...ajudou principalmente na busca de material na internet, né...porque leva tempo... porque você tem que baixar, você tem que assistir pra ver se pode ser utilizado na sala de aula...então você não assiste um vídeo, você assiste um, dois, três, quatro, cinco, seis...tem uma hora que você já não quer assistir mais nada, porque mesmo que ele seja de 20 minutos, são 6 vezes 20 minutos...
...então quando tem outra pessoa que manda um e-mail pra você e fala: ó, o vídeo tal dá pra casar com tal coisa...aí você vê e fala: ah, que legal esse vídeo, vou usar...então ajuda pra caramba.
164
Diferente de estudos sobre parceria pesquisador-professor, que relatam entre os
resultados, a valorização da prática colaborativa pelos professores participantes (BUTLER et
al, 2004; LEVIN; WADMANY, 2008), a fala da professora de Ciências sugere que ela valorizou
a parceria especialmente pelo aspecto da divisão de trabalho com a pesquisadora e não
propriamente pelo aspecto da colaboração para construção de um trabalho comum. De fato,
houve essa contribuição na busca e seleção de alguns vídeos, porém a colaboração entre
professora e pesquisadora foi além desse aspecto de reunir mais material em menos tempo
(que pode remeter ao cumprimento de tarefas separadamente), pois ao longo de todo o
período de acompanhamento, ambas discutiram e buscaram conjuntamente, por
possibilidades de atividades e estratégias de uso de recursos tecnológicos com os alunos.
Esta visão focada no aspecto da divisão de trabalho pode ter sido favorecida pelas próprias
condições do contexto de trabalho da professora, no qual ela precisa dar conta de extensos
conteúdos em cada série, tendo pouco tempo, dificuldade de acesso à Internet e poucos
computadores disponíveis para planejar suas aulas na escola, fazendo com que precise
realizar esse trabalho em casa, conforme comentado na unidade temática I. Assim, parece
que a professora viu na parceria uma oportunidade de dividir, pelo menos em parte, seu
trabalho de busca por recursos para diferentes conteúdos, otimizando assim o tempo gasto
com essa tarefa. Além disso, os próprios problemas de acesso à Internet, que prejudicaram a
possibildade de experiências inovadoras tanto para ela quanto para os alunos, podem ter
contribuído para essa visão da professora acerca da parceria com a pesquisadora.
Em outro momento da entrevista, a professora comentou sobre o uso da sala de
informática em uma outra escola em que trabalhou, onde contava com a divisão de trabalho
com a professora desta sala:
...a gente lá começava a fazer assim, é... pedia a pessoa que era a professora da sala de informática, a gente dava um tema, né e dizia quais eram os locais que tinha que entrar e já mandava o aluno com o trabalho pra lá, então eu cheguei a usar assim, foi bom...
Embora a professora não tenha comentado, pode-se supor que, nesta outra escola
em que trabalhou, as turmas também fossem numerosas, o que é comum no sistema
educacional brasileiro, e a sala de informática não tivesse computadores suficientes para
todos os alunos, consistindo portanto, em aspectos do contexto semelhantes aos que
ocorrem na escola onde se deu o presente estudo. Portanto, em tais condições, a
165
professorade Ciências também buscou a divisão de trabalho com outra professora, uma vez
que, sem essa possibilidade, seria muito difícil trabalhar sozinha com muitos alunos e poucos
computadores. Dessa forma, pode-se compreender que a divisão de trabalho é uma
alternativa que a professora busca para ajuda-la a lidar com as dificuldades impostas pelo
contexto escolar, como mais uma estratégia de sobrevivência (CHARLOT, 2008),
especialmente quando a atividade envolve o uso de TDIC pelos alunos. Conforme
comentado na unidade I, turmas muito grandes representam uma dificuldade de uso de
TDIC com os alunos, pois a professora fica insegura com o possível acesso a páginas
indevidas na Internet, além dos problemas de manuseio dos computadores que podem
surgir e prejudicar o andamento da atividade planejada. Embora a professora não tenha tido
essa percepção, é importante destacar que a importância do apoio pode ser entendida não
apenas pelo aspecto de ser uma ajuda ao professor para lidar com as dificuldades do
contexto, dividindo seu trabalho com alguém, mas também como uma possibilidade de
estímulo ao uso de TDIC, de reflexão e de construção de novas práticas e concepções,
quando esse apoio é desenvolvido como parceria, com a perspectiva de colaboração e não
divisão de trabalho.
O quizz do Reino Animal foi uma atividade planejada e construída em parceria com a
pesquisadora, mas que, por conta de sua logística para implementação, só foi possível
devido à divisão de trabalho entre a professora e a pesquisadora. Conforme mencionado no
relato das observações, o material da atividade, uma apresentação de slides com hiperlinks,
precisou ser salvo em 56 laptops (total de alunos contando as duas turmas em que foi
aplicado). Este procedimento foi realizado após o término das aulas, porém a professora
precisava ir para a segunda escola onde lecionava e, por isso, esta etapa foi realizada pela
pesquisadora e a monitora bolsista do projeto de minha orientadora que, na época, ainda
estava na escola. Além disso, a própria construção do material, que envolveu a inserção de
hiperlinks, algo que era novo para a professora, demandou bastante tempo, cerca de um
mês, com pesquisa e discussão das questões que seriam apresentadas. Portanto, pode-se
compreender que dificilmente a professora teria condições de construir e implementar esta
atividade, com estas características e demanda, sem nenhum apoio. O exemplo desta
atividade demonstra a dificuldade que esta professora e qualquer outro professor, de
maneira geral, deve enfrentar no seu cotidiano para inovar minimamente sua prática com o
166
uso de algum recurso tecnológico, mesmo que seja um recurso básico como o de
apresentação de slides e dentro de uma perspectiva tradicional, como foi possível perceber
no caso deste trabalho com o quizz. Isso pode explicar porque a professora não se motivou a
construir outros quizzes com outros conteúdos, mesmo tendo considerado esta atividade,
realizada com duas turmas de 7º ano, bem sucedida por ela e pelos alunos, que inclusive
elogiaram o material.
As atividades realizadas por conta do projeto “Com-Viver Com-Ciência e Cidadania”
também foram exemplos de atividades que só puderam se desenvolver da forma como
foram propostas, numa perspectiva construtivista, por conta da parceria dos professores
com os pesquisadores. Todas as atividades foram acompanhadas não só por um professor
em cada tempo de aula, mas também pelos pesquisadores (n=3), o que facilitava o
acompanhamento do trabalho que os alunos desenvolviam e, inclusive, uma certa disciplina,
uma vez que a dinâmica de organização em grupos, o diálogo necessário para que os alunos
discutissem o próprio trabalho e o uso dos laptops os deixava agitados. Às vezes,
conversavam em tom de voz muito alto, faziam brincadeiras exageradas e acessavam
endereços de Internet que não tinham relação com o trabalho, porém, com a presença de
quatro pessoas em sala de aula para orientá-los, era mais fácil restabelecer a ordem mínima
para que o trabalho fosse desenvolvido. Enquanto o professor poderia dedicar mais atenção
a um determinado grupo, ao mesmo tempo, um pesquisador poderia ajudar outro grupo. No
cotidiano, sem a presença de pesquisadores ou outros sujeitos que possam apoiar, uma
situação de trabalho como essa, com turmas com 40 ou mais alunos, é um desafio para o
professor que queira conduzir esse tipo de aula sozinho. Além disso, há a questão do tempo,
pois esse tipo de trabalho pode demandar, pelos menos, duas aulas seguidas (de 50
minutos), para que seja produtivo, uma vez que a própria organização dos grupos e a
proposta centrada no aluno para reflexão, pesquisa e construção do trabalho demandam
tempo. Considerando que a professora de Ciências tinha apenas três tempos de aula na
semana com cada turma e que, por conta da organização do quadro de disciplinas, não tinha
tempos de aula seguidos em algumas dessas turmas, pode-se perceber que esse pode ser
mais um obstáculo do contexto que dificulta o desenvolvimento de atividades como essas,
seja com uso de tecnologias ou não. Esse conjunto de fatores, elevado número de alunos,
agitação e indisciplina, dificuldade de dar atenção a todos e fiscalizar a navegação em
167
endereços indevidos na Internet, a maior demanda de tempo para atividades centradas no
aluno contrastando com o pouco tempo de aula com cada turma e a pressão de um
conteúdo extenso, pode explicar por que a professora não realizava atividades em grupo na
sala de aula.
Essa percepção da professora de parceria pelo aspecto da divisão de trabalho
também foi evidenciada em duas situações, relatadas no tópico das observações, em que o
grupo de pesquisa faria uma atividade do projeto “Com-Viver Com-Ciência e Cidadania” no
tempo de aula da professora, contando com sua participação, mas a mesma não
compareceu. Uma dessas situações ocorreu quando foi realizada uma atividade de
construção de questões pelos alunos do 6º ano para um jogo. Embora estivesse envolvida
nas discussões de planejamento da atividade e se comprometido em orientar os alunos em
suas aulas anteriores acerca dos conteúdos de Ciências que deveriam compor as questões,
no dia da atividade a professora não compareceu à escola por ter aderido à greve de
professores que já estava em curso há algum tempo. A professora comunicou apenas a
escola sobre sua ausência, mas não aos pesquisadores. A outra situação ocorreu quando foi
realizada a atividade do Diário do Corpo com o 8º ano e a etapa de debate com os alunos
seria no tempo de aula da professora de Ciências. Desta vez ela estava na escola, mas
aproveitou esse momento para resolver algum assunto pessoal fora de sala, apesar de saber
que os pesquisadores a aguardavam. Nas duas situações, parece que a professora não se
preocupou com sua ausência por considerar que a turma não seria prejudicada, já que os
pesquisadores poderiam substituí-la e conduzir a atividade conforme o planejado. Por um
lado, isso demonstra confiança nos pesquisadores, um aspecto importante e necessário em
qualquer trabalho de parceria e colaboração. Contudo, por outro lado, essa atitude sugere
que talvez a professora não sentisse que as atividades desenvolvidas com esse projeto eram
construções tanto suas quanto dos pesquisadores e, que sua participação fosse essencial,
não só para que os alunos entendessem que o projeto era algo da escola, mas também para
que ela mesma pudesse vivenciar essas experiências pedagógicas inovadoras junto com eles.
Outros exemplos de situações em que ela esteve presente em sala de aula, mas
participou pouco da condução da atividade e deixou que os pesquisadores tivessem maior
protagonismo, reforçam essa impressão. Por exemplo, quando ela aproveitou para corrigir
um material durante um debate (mesmo após ser chamada para estar diante da turma junto
168
com os pesquisadores). Entretanto, essa postura na implementação das atividades em sala
de aula, contrasta com sua participação espontânea em todas as reuniões de planejamento
e seu comprometimento a colaborar com os pesquisadores em cada especificidade de sua
disciplina que as atividades necessitassem. Possivelmente, o fato de a proposta desse
projeto ter um caráter explicitamente construtivista constrastou com a concepção
fortemente tradicional da professora e, por isso, ela pode não ter se identificado com as
atividades desse projeto, apesar de ter percebido a motivação dos alunos e tê-las
considerado bem sucedidas.
Sobre essa relação entre professores e pesquisadores e a complexidade de projetos
desenvolvidos em conjunto, visando aproximar pesquisa e prática, Vanderlinde e van Braak
(2010) colocam que uma tensão comum ocorre quando os professores esperam que os
pesquisadores lhes tragam soluções para problemas que enfrentam no seu dia a dia, em sala
de aula, enquanto os pesquisadores estão interessados em construir conhecimento.
Bartholomew e Sandholtz (2009) comentam que essa tensão entre professores e
pesquisadores pode ocorrer por conta de concepções distintas sobre o processo de ensino-
aprendizagem, dificultando assim o desenvolvimento da parceria e o alcance dos seus
objetivos. Analisando o projeto de parceria desenvolvido por esses pesquisadores e
professores de uma escola americana, Bartholomew e Sandholtz (2009) identificaram que,
além da concepção pedagógica distinta, os professores também não demonstraram intenção
de mudar suas práticas, embora tenham valorizado inicialmente a ideia de criar uma
comunidade de aprendizagem na escola. Segundo os autores, o que mais contribuiu para a
manutenção da postura pedagógica desses professores foi a pressão exercida sobre eles
para atender as diretrizes do sistema escolar, prejudicando o alcance do objetivo da parceria
de envolvê-los em atividades de reflexão, investigação, colaboração e, consequentemente,
desenvolvimento de conhecimento pedagógico e práticas em uma nova perspectiva. De
forma semelhante, os aspectos do contexto, destacados na unidade temática I (dificuldades
para uso pleno das TDIC, turmas numerosas etc.), também contribuíram para a manutenção
das práticas da professora de Ciências e sua concepção pedagógica tradicional.
Rice (2002) realizou uma análise de 20 estudos de caso de parcerias universidade-
escola, nos Estados Unidos, e identificou que, em 13 dos 20 casos, alguns dos professores
não estavam dispostos a deixar suas concepções tradicionais para se envolver em um
169
projeto de colaboração. Determinados projetos partiram de imposições dos sistemas
escolares, como parte de reformas educacionais que visavam o desenvolvimento
profissional dos professores e, portanto, algumas escolas foram selecionadas para
estabelecer tais projetos com universidades, sem que necessariamente seus professores
tivessem se voluntariado. Em alguns desses casos, houve professores que pediram
transferências das escolas que lecionavam quando o projeto de parceria se iniciou, o que foi
sugerido por Rice (2002) como uma forma que esses professores encontraram de se recusar
a participar das parcerias e, consequentemente, de se envolver em experiências que
pudessem lhes exigir mudanças de suas práticas e concepções. Por outro lado, nos casos em
que as escolas foram voluntárias ou se increveram para disputar com outras pela
implementação dos projetos de parceria, não houve relatos de transferência de professores
e os projetos de parceria alcançaram melhores resultados, mais próximos do que havia sido
planejado. A autora ressalta que a disposição para a reflexão e colaboração deve ser forte e
consciente em ambos os parceiros, professores e pesquisadores, para que o processo de
parceria e construção de conhecimento seja sustentável. No caso da parceria com a
professora de Ciências, sua proposta partiu da pesquisadora e, embora tenha sido bem
recebida pela professora, as concepções pedagógicas para desenvolvimento de práticas com
TDIC, alvo da parceria, eram distintas entre professora e pesquisadora. Tal divergência,
associada aos problemas enfrentados ao longo do período de acompanhamento, dificultou o
alcance do objetivo da parceria e ainda pode ter contribuído para a visão da professora de
que o foco da parceria seria a divisão de tarefas, conforme comentado anteriormente, e não
propriamente para promover uma mudança de perspectiva pedagógica com o uso das TDIC.
Butler et al (2004) apresentam resultados positivos de um projeto de parceria em
que professores tiveram postura e concepção alinhadas com a dos pesquisadores para
implementação de atividades de discussão e construção de estratégias pedagógicas que
favorecessem a inserção dos alunos em um processo de aprendizado construtivista. Segundo
os pesquisadores, logo no primeiro ano de parceria, foi possível perceber a forte disposição
dos professores para o desenvolvimento das atividades e conforme eles mesmos
mencionaram nas entrevistas, os alunos, em geral, também receberam e participaram bem
das propostas que lhes demandavam maior discussão e reflexão sobre os conteúdos
estudados em sala de aula. No entanto, a partir das entrevistas os pesquisadores puderam
170
perceber que os professores estavam muito dependentes do suporte dado pela sua
presença nas salas de aula durante a implementação das atividades, já que os pesquisadores
não atuavam apenas como observadores, mas também se envolviam na condução das
atividades junto ao professor, auxiliando e discutindo com os alunos sobre suas tarefas.
Muitos professores destacaram nas entrevistas que não teriam conseguido ou não saberiam
como realizar as propostas sem a presença dos pesquisadores. Isso levantou uma
preocupação entre os pesquisadores quanto à sustentabilidade das ações e da própria
perspectiva pedagógica trabalhada nesse período depois que a parceria se encerrasse.
Após o segundo ano de parceria e novas entrevistas de avaliação, Butler et al (2004)
perceberam que os professores não demonstravam mais insegurança, refletida na
dependência da presença do pesquisador em sala de aula para lhes dar suporte. A maioria
dos professores expressou que a perspectiva de ensino com a qual passaram a trabalhar
com a parceria seria mantida dali em diante, que este tinha sido um processo sem volta.
Além disso, os professores que participaram do projeto desde o início, demonstraram maior
capacidade de criar estratégias alternativas para eventuais problemas que aconteciam ao
longo da implementação das atividades do que professores que iniciaram sua participação
no projeto neste segundo ano. Os pesquisadores destacam que tal resultado reforça a noção
de que o processo de transformação de práticas e concepções pedagógicas necessita de
tempo, além das condições favoráveis tanto por parte dos indivíduos envolvidos quanto do
contexto em que se pretende desenvolvê-lo. Os autores ainda identificaram algumas
dificuldades enfrentadas por esses professores ao final desses dois anos de parceria, como a
resistência de outros professores que não aderiram ao projeto e também de alguns alunos
que rejeitaram estratégias que lhes demandavam mais esforço no seu processo de
aprendizado, especialmente os mais velhos, que têm maior tempo de escolaridade dentro
do processo de ensino tradicional. Os pesquisadores destacam que estes resultados
reforçam a noção de que o processo de transformação de práticas e concepções
pedagógicas necessita de tempo, além das condições favoráveis, tanto por parte dos
indivíduos envolvidos quanto do contexto em que se pretende desenvolvê-lo, condições que
estavam presentes nesse caso.
A partir da perspectiva que a professora de Ciências teve sobre a parceria, no sentido
de divisão de trabalho com a pesquisadora e dos diversos autores (RICE, 2002;
171
MCLAUGHLIN; BLACK-HAWKINS, 2004; BUTLER et al, 2004; VANDERLINDE; VAN BRAAK,
2010; DUNCAN; CONNER, 2013; WANG; ZHANG, 2014; ERTMER; OTTENBREIT-LEFTWICH;
TONDEUR, 2015) que destacam a relevância de projetos de parceria universidade-escola
para o desenvolvimento profissional dos professores, considerando especialmente a
integração de TDIC, pode-se compreender que o professor precisa de dois tipos distintos de
suporte nesse processo. O primeiro tipo é o da própria parceria com pesquisadores, que se
caracteriza como um suporte essencialmente intelectual, uma vez que o objetivo comum da
parceria entre pesquisadores e professores é o desenvolvimento de concepções e práticas
que contribuam para o aprimoramento do exercício docente, aproximando-o das demandas
educacionais da realidade social. Nesse sentido, a essência da parceria é a reflexão,
discussão, planejamento e construção colaborativa de práticas, embora a divisão prática de
tarefas também faça parte da implementação das ações. No caso descrito por Butler et al
(2004), a necessidade da presença dos pesquisadores em sala de aula para auxiliar os
professores na implementação das ações foi atribuída apenas à questão da falta de
confiança dos professores em realizar algo distinto do que estavam habituados, uma vez que
dificuldades inerentes ao contexto, que exigissem o suporte dos pesquisadores não foram
comentadas pelos autores. No caso da professora de Ciências, a presença da pesquisadora
em sala de aula foi importante para ajuda-la a sentir segurança em realizar as práticas
planejadas, mas também para auxiliar em questões operacionais de uso das TDIC junto aos
alunos. Conforme mencionado na unidade temática I, em condições de turmas muito
numerosas e quando o professor não tem domíno e confiança para o uso do computador e
recursos da Internet, como é o caso da professora de Ciências, pode-se compreender que
este tipo de apoio, que vai além do intelectual, é essencial para que as atividades planejadas
sejam bem sucedidas e, com isso, favoreçam o processo de reflexão e transformação
pedagógica.
Esse suporte para questões operacionais constitui-se portanto, como o segundo tipo
de suporte que os professores precisam para implementação de práticas inovadoras,
especialmente quando se fala em práticas com TDIC e em contextos que apresentam tantas
dificuldades como foi o caso da presente pesquisa. Dentre essas questões operacionais,
pode-se acrescentar aquelas relacionadas à logística para uso de computadores com os
alunos em sala de aula, como o carregamento prévio das máquinas, instalação de material a
172
ser usado na aula, como foi o caso da atividade do quizz do Reino Animal (comentado na
unidade temática I), ajuda com problemas para o acesso à Internet e demais dúvidas
relativas ao manuseio do computador. Mesmo em contextos em que não há a possibilidade
de uso de laptops em sala de aula para os alunos, mas apenas um laboratório de
informática, esse apoio operacional também é importante para conciliar o número de
máquinas com o número de alunos, com a acessibilidade da Internet e outras eventuais
condições de cada contexto. O caso em que a professora relata na entrevista sobre o uso da
sala de informática, em outra escola, com a ajuda da professora de informática, dividindo a
turma com ela, para que fosse possível a atividade, é também um exemplo da importância
desse suporte operacional. Nesta situação, a professora de Ciências fez todo o planejamento
e a professora de Informática atuou no apoio operacional da atividade.
Assim, pode-se considerar que o suporte intelectual do pesquisador é importante
para ajudar o professor nesse processo de reflexão e transição de práticas, porém este deve
ser temporário, pois a ideia é que o professor possa atuar, dentro da nova perspectiva
construída, com independência e segurança. Contudo, o apoio operacional, será necessário
enquanto as condições do contexto (falta de tempo, conteúdos extensos, turmas
numerosas, poucos computadores etc.) continuarem a pressionar o professor, dificultando o
desenvolvimento de atividades, especialmente de natureza construtivista e com integração
de TDIC. Conforme mencionado na unidade temática I, com o exemplo das atividades “Com-
Viver, Com-Ciência e Cidadania”, dificilmente a professora de Ciências poderia replicar tais
atividades sem o suporte operacional dado pelos pesquisadores. Entretanto, é importante
destacar que, tal suporte operacional não precisa ser proveniente apenas de pesquisadores.
Estes o oferecem como parte da proposta de parceria, porém, com o fim da mesma, o apoio
operacional para a implementação de atividades planejadas pelo professor pode ser dado
por indivíduos da própria escola, como outros professores, ou demais funcionários,
dependendo da disponibilidade de cada um e do incentivo da própria escola ou sistema
escolar.
Um outro aspecto a ser destacado é que, ao longo das falas da professora de
Ciências, em sua entrevista, foi possível perceber que, embora ela comente sobre a
mudança no perfil dos alunos e da sociedade e perceba a influência dessas mudanças no
interesse e processo de aprendizagem desses alunos, a professora não menciona a questão
173
da mudança da própria prática. Portanto, a professora não parece considerar a possibilidade
de mudança de sua prática pedagógica para acompanhar a mudança dos alunos e da
sociedade, que demandam um processo de ensino que ultrapasse o modelo tradicional.
Assim, se a professora não tem a percepção de que ela precisa transformar sua prática, nem
mesmo com a possibilidade de integração das TDIC, então isso também contribui para que
ela não perceba a parceria como uma oportunidade de mudança, mas sim como uma ajuda
no sentido de divisão de tarefas com a pesquisadora. Pode-se compreender que a
persistência de práticas que não se ajustam mais a esses novos alunos, pouco contribui para
o processo de ensino-aprendizagem, tanto para os alunos, que não se motivam, quanto para
a professora que se desgasta em uma competição cotidiana para realizar seu trabalho e que,
por fim, também a desmotiva, conforme observado ao longo do período de
acompanhamento e percebido em suas falas na entrevista.
Conforme comentado com Dutercq (2014) e Tunes, Tacca e Júnior (2005), no tópico
3.1, capítulo 3, o professor tem a função de criar uma situação propícia para a
aprendizagem, porém os alunos também podem influenciar a construção da proposta da
aula, em função daquilo que trazem do exterior, seus conflitos, maneiras de aprender etc.
Por isso, os autores colocam que os métodos de ensino precisam se aproximar dos modos de
pensar dos alunos para que o processo de ensino-aprendizagem seja mais eficaz. Assim,
compreende-se que, para que o professor reoriente sua prática em função do perfil dos seus
alunos, de acordo com estes autores, ele precisa estar consciente de que essa mudança
pode ser necessária, inclusive ao nível da perspectiva pedagógica, o que não parece ser o
caso da professora de Ciências.
No exemplo da parceria de Bartholomew e Sandholtz (2009) e professores de uma
escola americana, comentada anteriormente, os pesquisadores também perceberam que os
professores não tinham intenção de mudar suas práticas com o envolvimento na parceria.
Um resultado semelhante também foi percebido por Santos e Marinho (2016) em seu
estudo sobre as representações sociais, a respeito de Internet e Internet na escola, de
professoras de uma escola brasileira que iria receber a implementação do PROUCA,
comentado na unidade temática I. Segundo os autores, nenhuma das professoras
participantes do estudo apresentou, alguma representação ligada a um processo de
inovação pedagógica. Perceberam, nas falas das entrevistas, que as práticas tradicionais
174
escolares eram a base para a integração da Internet. Portanto, argumentam que há uma
dificuldade em reconhecer que a prática pedagógica pode ser diferente e que a Internet,
com suas infinitas possibilidades de construção, interação e informações tem potencial para
contribuir com essa mudança. Ertmer, Ottenbreit-Leftwich e Tondeur (2015) comentam que
um dos aspectos importantes para a inovação de prática do professor com a integração das
TDIC é a sua disposição ou abertura para a mudança (“openness to change”), uma
característica pessoal que pode agir a favor da inovação com as TDIC ou não, caso o
professor não sinta essa disposição para mudar. Nesse sentido, isso se constitui como uma
barreira interna para a integração de TDIC, apontada pelos autores como uma barreira
inerente ao próprio professor, às suas concepções. Considerando a receptividade positiva da
professora de Ciências em relação à parceria para integração de TDIC, as observações de
suas aulas e suas falas na entrevista, é possível que a professora estivesse, de fato, disposta
a usar as TDIC da escola. Porém, é possível que ela não estivesse necessariamente
consciente de que esse uso poderia ocorrer no sentido de inovar suas práticas, em uma
perspectiva pedagógica distinta da tradicional em que já atuava. Pode-se dizer que as
condições do contexto da escola, com as dificuldades para uso das TDIC, já apontadas na
unidade temática I, caracterizadas como as barreiras externas, de acordo com Ertmer,
Ottenbreit-Leftwich e Tondeur (2015), Ertmer et al (2012), contribuíram para reforçar tal
barreira interna da professora.
5.3.7 Unidade Temática II / Categoria: Possível contribuição da parceria para a prática
pedagógica da professora com TDIC e desenvolvimento de TPACK
Ertmer, Ottenbreit-Leftwich e Tondeur (2015) comentam que é difícil promover
efeitos de mudança simultaneamente nas práticas e concepções dos professores para o uso
das TDIC e que, por isso, ainda não é claro se os esforços para o desenvolvimento
profissional de professores devem enfocar um ou outro aspecto ou mesmo se uma
abordagem que vise efeitos de mudança em ambos, prática e concepções, ao mesmo
tempo, deve ser mais eficaz. No entanto, os pesquisadores sugerem como estratégia,
começar o esforço de mudança determinando quais são os recursos de computador que os
175
professores utilizam com mais frequência no seu cotidiano pessoal, como por exemplo, e-
mail, rede social, editor etc. A partir daí, os pesquisadores parceiros poderiam ajudar os
professores a considerar e criar formas de uso desses recursos, já conhecidos por eles, para
atividades pedagógicas em sala de aula. Ertmer, Ottenbreit-Leftwich e Tondeur (2015)
argumentam que, ter um nível mínimo de conforto com o recurso tecnológico parece ser
essencial para que o professor o integre para fins pedagógicos. Dessa forma, pode-se dizer
que a integração de TDIC e a mudança de prática do professor ocorrem em um processo de
transição, no qual o professor precisa reconhecer e experimentar possibilidades de uso
distintos dos recursos para desenvolver, refletir e consolidar, ao longo do tempo, essa
mudança.
A proposta de parceria da pesquisadora com a professora de Ciências se aproximou
dessa perspectiva de Ertmer, Ottenbreit-Leftwich e Tondeur (2015), de que a mudança
ocorre ao longo do tempo, em um processo de transição em que o professor precisa se
sentir confortável com os recursos e as experiências para que as inovações sejam
construídas aos poucos. Nesse sentido, foi importante observar e conhecer o perfil
pedagógico da professora para propor e planejar com ela estratégias de uso de TDIC que não
fossem muito distintas da sua realidade, a fim de que ela pudesse fazer essa transição de
uma abordagem tradicional para construtivista com a integração de TDIC, com confiança e
tempo para reconhecer o potencial de tal mudança não só para sua prática como professora,
mas também para o interesse e aprendizado dos seus alunos. No relato das observações,
comentei sobre uma reunião com a professora de Ciências, em 2012, em que conversamos
sobre possíveis recursos que poderiam ser usados em atividades com os alunos, usando os
laptops educacionais, como a construção de palavras cruzadas, histórias em quadrinhos e
construção de apresentações de slides com inserção de hiperlinks. Foram sugestões com
base em materiais que a professora costumava produzir para os alunos, que continham
algumas histórias em quadrinhos e palavras cruzadas como modalidades de exercícios, além
das apostilas da prefeitura, que também traziam esses modelos de exercício. Entretanto, a
ideia era que não só a professora poderia utilizar tais recursos da Internet para facilitar a
produção do seu material, mas que os alunos poderiam utilizá-los em sala de aula para que,
eles mesmos, criassem suas palavras cruzadas ou histórias em quadrinhos, por exemplo,
como parte de uma atividade. Esta perspectiva de construção de material próprio pelos
176
alunos, usando recursos da Internet, com seus laptops em sala de aula, já seria um passo
inicial de inovação pedagógica para a professora e alunos, algo que eles não costumavam
fazer, conforme foi possível observar nesse período de acompanhamento.
Contudo, observou-se que a professora tinha a tendência de pensar em
possibilidades de uso desses recursos de forma a integrá-los às atividades tradicionais que já
estava habituada. Isso ocorreu com a estratégia da prova online, a partir de um recurso que
também foi apresentado à professora nesta reunião de 2012. Considerando que o uso de um
recurso novo para a professora, dentro de sua perspectiva tradicional, poderia ser
interessante como uma experiência inicial, para que ela explorasse o recurso da Internet e
adquirisse confiança, tal estratégia foi estimulada. Embora não tenha sido bem sucedida,
conforme já comentado anteriormente, por conta dos problemas com a Internet da escola,
pode-se considerar positivo que a professora tenha se interessado e explorado um recurso
novo para preparar os materiais que acreditava serem motivadores para seus alunos. Porém,
a segunda fase de uso de tal recurso, que poderia ser parte de uma atividade de construção
dos alunos, não pôde ser planejada por conta dos problemas que persistiram na escola.
Dessa forma, pode-se compreender que o objetivo da parceria de contribuir para
essa transição de práticas da professora com a integração de TDIC e, implicitamente,
contribuir para que ela desenvolvesse TPACK ao longo desse processo, foi prejudicado pelas
circunstâncias do contexto escolar, já destacadas anteriormente na unidade temática I, além
da própria perspectiva tradicional da professora também ter sido uma barreira importante.
Considerando as cinco etapas propostas por Niess et al (2009) para o
desenvolvimento de TPACK, descritas no tópico 3.3, capítulo 3, pode-se dizer que a
professora de Ciências passou pelas duas primeiras etapas de reflexão (1 – Reconhecer:
quando o professor reconhece a possibilidade de que determinado recurso tecnológico pode
ser usado para algum conteúdo de sua disciplina, porém ainda não concretiza essa
integração na sua prática; 2 – Aceitar: quando o professor forma uma visão acerca do
recurso tecnológico, que pode ser favorável ou não ao seu uso na prática) em todos os
momentos em que discutiu com a pesquisadora sobre possibilidades de atividades e de uso
de recursos tecnológicos para cada turma. Algumas dessas atividades planejadas em
parceria não puderam ser implementadas pelas questões já relatadas e, por isso, nesses
177
casos, a professora de Ciências não ultrapassou a segunda etapa do processo descrito por
Niess et al (2009). Nas demais situações em que a professora desenvolveu atividade em sala
de aula com algum recurso tecnológico, pode-se dizer que ela alcançou a terceira etapa (3 –
Adaptar: quando o professor se envolve em atividades que lhe permitem decidir pela adoção
ou rejeição do recurso tecnológico e, em geral, estas se assemelham às atividades que
realiza sem tecnologia), porém não a ultrapassou, pois todas as suas atividades com TDIC
foram marcadas por sua perspectiva tradicional. Dessa forma, a professora não passou pelas
etapas quatro e cinco (4 – Explorar: quando o professor implementa tecnologia,
experimentando estratégias pedagógicas inovadoras; 5 – Avançar: quando o professor avalia
os resultados de sua decisão de integrar a tecnologia), que indicam uma disposição para
mudança no perfil de prática docente para integrar as TDIC e, consequentemente indica
desenvolvimento de TPACK. Pode-se dizer, portanto, que, de acordo com o processo
proposto por Niess et al (2009) e com a relação entre TPACK e mudança de práticas do
professor defendida por outros autores (MISHRA; KOHLER, 2005; 2006; HOFER; HARRIS,
2010; HARRIS; GRANDGENETT; HOFER, 2010; NIESS et al, 2009; NIESS, 2015), a professora de
Ciências não desenvolveu TPACK, durante esse período de acompanhamento.
Compreense-se que, em todas as atividades planejadas com o uso das TDIC, a
professora mobilizou seus conhecimentos de pedagogia e conteúdo, articulados no seu
conhecimento pedagógico do conteúdo (PCK), desenvolvido ao longo de toda sua trajetória
docente (SHULMAN, 1986), assim como mobilizou seu conhecimento de tecnologia. Desde o
início do estudo, a professora já havia demonstrado ter um conhecimento básico de
tecnologia, especificamente do computador, para uso pessoal e profissional, como por
exemplo, para manter uma conta de e-mail, busca de imagens e vídeos na Internet, uso de
editor de texto e apresentação de slides para algumas aulas. Contudo, tanto sua perspectiva
tradicional quanto as dificuldades enfrentadas no contexto, contribuíram para que a
professora se detivesse no terceiro estágio do processo.
No entanto, compreende-se que essas etapas iniciais que a professora vivenciou são
importantes e necessárias para o processo de desenvolvimento de TPACK e diversos estudos
demonstram resultados semelhantes, em que professores têm dificuldade em integrar TDIC
em suas práticas de formas distintas das tradicionais com as quais estão habituados e
seguros (KARASAVVIDIS, 2009; KENSKI, 2007; LIM; CHAI, 2008; CHEN, 2008; FREITAS; LEITE,
178
2011; ERTMER; OTTENBREIT-LEFTWICH, 2013; WASTIAU et al, 2013; CETIC, 2015), sugerindo
a complexidade da evolução do professor para a quarta e quinta etapa do processo proposto
por Niess et al (2009).
Considerando a proposta de Hofer e Harris (2010), apresentada no capítulo 3, tópico
3.3, o desenvolvimento de TPACK é favorecido quando o professor planeja suas práticas de
ensino visando diretamente o processo de aprendizagem do aluno, concentrando-se,
inicialmente, em seus conhecimentos de pedagogia e conteúdo, para então articular o
conhecimento de tecnologia e selecionar o recurso que melhor pode atender os objetivos de
aprendizagem para determinado conteúdo. Segundo os autores, quando o planejamento é
feito de forma contrária, ou seja, a partir da escolha do recurso tecnológico para então
elaborar a metodologia de ensino de determinado conteúdo, o foco do professor está
voltado para o recurso e não propriamente para o aluno. Este foco caracteriza, então, uma
perspectiva de ensino tecnocêntrica, que vai de encontro à perspectiva construtivista
defendida para a integração de TDIC na educação e de desenvolvimento de TPACK. A
professora de Ciências demonstrou essa tendência tecnocêntrica, uma vez que, em vários
momentos observados, ela planejou sua aula em função de um determinado recurso
tecnológico. A página de Internet apresentada pela pesquisadora é um exemplo, em que a
professora logo se interessou em criar provas online que poderiam facilitar seu trabalho de
correção, embora também houvesse a motivação de despertar interesse dos alunos, visto
que muitos não concluíam as provas em papel e pareciam não prestar muita atenção nas
questões. No entanto, as avaliações que ela criou nesta página online tinham as mesmas
características daquelas preparadas em papel, com questões do tipo múltipla escolha,
verdadeiro/falso, completar lacunas etc., o que pode significar que o uso desse recurso
favoreceria mais a professora (pela facilitação de seu trabalho) do que propriamente o
aprendizado ou a avaliação dos alunos. Outros exemplos que foram bastante frequentes ao
longo desse período de acompanhamento, foram os recursos de apresentação de slides e
vídeos, escolhidos pela motivação da professora de controlar a indisciplina da turma e
transmitir informações que ela julgava que não conseguiria por conta da falta de atenção
dos alunos.
É importante mencionar que a análise dos dados de observação e entrevista permite
inferir acerca da evolução da prática da professora de Ciências e de seu processo de
179
desenvolvimento de TPACK nesse período, mas não, propriamente, medir tal conhecimento,
algo de natureza complexa, que dificilmente pode ser medido ou quantificado. Phillips
(2013) argumenta que é difícil medir TPACK, pois trata-se de um tipo de conhecimento
pessoal, único para cada indivíduo, uma vez que depende de um conjunto de fatores
pessoais (concepções) e de contexto.
Comparando o perfil tradicional de concepções e uso das TDIC pela professora de
Ciências, que permaneceu no terceiro estágio (Adaptar) do processo de desenvolvimento de
TPACK (NIESS et al, 2009), com os perfis de professores identificados por Levin e Wadmany
(2008) no seu estudo, também mencionado no tópico 3.3, pode-se dizer que a professora se
aproxima do primeiro perfil identificado por estes autores. O estudo foi realizado com
professores de uma escola com amplo acesso às TDIC, a fim de analisar suas concepções e
práticas ao longo de três anos de observações. Os pesquisadores identificaram três perfis de
professores ao longo deste período de observação, relacionados à evolução de suas
concepções e práticas com TDIC, sendo que o primeiro perfil foi atribuído aos professores
que apresentaram uma mudança superficial de concepção sobre a contribuição das TDIC no
ensino, porém mantiveram a perspectiva tradicional. Embora não tenham mencionado
TPACK no seu estudo, pode-se compreender que, essa mudança superficial percebida por
Levin e Wadmany (2008), não representa uma mudança que possa indicar desenvolvimento
de TPACK. Por outro lado, os professores do terceito perfil, aqueles que apresentaram maior
mudança nas falas e práticas, implementando atividades com TDIC centradas no aluno,
distintas das que costumavam desenvolver, certamente foram aqueles que mais avançaram
no processo de desenvolvimento de TPACK.
Assim, conforme mencionado no tópico 3.3, o estudo de Levin e Wadmany (2008)
demonstra, com dados reais, a complexidade e individualidade do processo de mudança de
concepções e práticas e, por conseguinte, do desenvolvimento de TPACK. Cabe destacar
que, seu estudo foi conduzido com professores que compartilhavam o mesmo contexto de
uma escola que lhes oferecia condições favoráveis de acesso e infraestrutura para uso de
TDIC, tendo orientações (discussões e workshops) com o mesmo grupo de pesquisadores e,
ainda assim, foram encontrados três perfis distintos de evolução de concepções e práticas
dentro de um grupo reduzido de indivíduos (seis). Dessa complexidade para a mudança
também pode-se compreender a imprevisibilidade do prazo necessário para que se possa
180
observar transformação significativa nas práticas e concepções de professores. No caso de
Levin e Wadmany (2008), três anos de acompanhamento foi um prazo suficiente para
observar mudança em apenas parte dos professores. No estudo de Butler et al (2004), citado
na categoria anterior (“Percepções da professora sobre a parceria”), a maioria dos
professores acompanhados declarou, a partir do segundo ano de parceria com
pesquisadores, que a nova perspectiva de prática que tinham adotado era um processo sem
volta, também sugerindo desenvolvimento de TPACK. No caso da professora de Ciências,
com o tempo de dois anos e meio de acompanhamento não foi possível observar
transformação em suas concepções e práticas com TDIC. Embora no caso do presente
estudo, as condições do contexto tenham influenciado fortemente as possibilidades de
experiências que poderiam favorecer uma mudança no perfil da professora, não se pode
afirmar que tal mudança teria ocorrido com as condições favoráveis e nem mesmo estimar
quanto tempo seria necessário para observá-la.
Apesar de muitos estudos na literatura, a compreensão acerca da abordagem TPACK
e de como proporcionar o desenvolvimento deste conhecimento pelo professor ainda não é
clara entre pesquisadores, que discutem não só os meios de construí-lo junto aos
professores, mas também como avalia-lo (HOFER; HARRIS, 2010; HARRIS; GRANDGENETT;
HOFER, 2010; GRAHAM, 2011; CAVANAGH; KOEHLER, 2013; NIESS et al, 2009; NIESS, 2011;
NIESS, 2015). Niess (2011) destaca algumas questões que permanecem como desafio para a
pesquisa acerca de TPACK: Como professores em serviço e professores em formação
desenvolvem TPACK?; Como deve ser um programa de formação de professores baseado em
TPACK?; Como reconhecer o TPACK de um professor?; Como acessar o TPACK do professor?;
Existem níveis diferentes de TPACK?; Qual o efeito no TPACK do professor quando novas
tecnologias são introduzidas?; Que tipos de experiências contribuem para o
desenvolvimento de TPACK?
Conforme mencionado no capítulo 3, tópico 3.3, o estudo de Harris e Hofer (2014)
mostra que o desenvolvimento de TPACK e o objetivo de investir em tal conhecimento
também não é claro para professores e coordenadores de escolas, que desenvolvem
projetos de formação profissional na própria escola de forma espontânea e independente do
apoio de pesquisadores. Entretanto, ainda segundo Harris e Hofer (2014), a parceria entre
pesquisadores e professores pode ser um importante caminho para que, juntos, esses
181
especialistas, cada um na sua área de atuação, possam colaborar na discussão e construção
de experiências pedagógicas distintas com TDIC, processo no qual o TPACK pode se
desenvolver e permitir ao professor uma posterior autonomia e auto-confiança para o
exercício de suas práticas com TDIC em uma nova perspectiva pedagógica. À medida que o
professor sustenta as ações implementadas durante o período de parceria e continua a
avançar com independência em práticas construtivistas de integração de TDIC, o
desenvolvimento de TPACK, iniciado com a parceria, continua sendo refinado.
Levin e Wadmany (2008) sugerem que os projetos de desenvolvimento profissional
de professores em parceria com pesquisadores devem buscar uma combinação entre
trabalho em grupos de pesquisadores e professores para colaboração, debate e troca de
ideias, criando assim uma comunidade de aprendizagem e, ao mesmo tempo, um trabalho
mais individualizado, no qual um professor é acompanhado mais de perto por um
pesquisador. Dessa forma, seria possível focar particularidades de cada professor em
parcerias individualizadas e ainda proporcionar momentos de interações no grupo de
aprendizagem com colegas em estágios distintos de transformação.
Conforme mencionado no tópico 4.2, capítulo 4, com McLaughlin e Black-Hawkins
(2004), diversos modelos de parceria universidade-escola podem ser construídos e os
autores citam seis modelos que perceberam ser os mais frequentes na literatura. O modelo
de parceria desenvolvido com a professora de Ciências se aproxima do modelo 1 descrito
por esses autores, que trata de uma parceria com apenas um professor e tem impacto
restrito a experiências na sala de aula deste professor. Entretanto, a parceria do presente
estudo se diferencia pelo fato de o mesmo ser conduzido pela pesquisadora e não pela
professora, como ocorre no modelo descrito por McLaughlin e Black-Hawkins (2004), em
que o professor é o investigador de sua própria ação e o pesquisador é seu mentor. O
modelo sugerido por Levin e Wadmany (2008) se aproxima do modelo 4, citado por
McLaughlin e Black-Hawkins (2004), o qual parece ser uma ampliação do modelo 1 para a
participação de mais professores e pesquisadores formando um grupo colaborativo e de
discussão, em que cada professor pode ter seu próprio objetivo de pesquisa particular, mas
a discussão com o grupo favorece o compartilhamento e enriquecimento das ações. No
entanto, a sugestão de Levin e Wadmany (2008) se diferencia no aspecto de que não coloca
182
os professores como responsáveis por conduzir a investigação de suas práticas, como é o
caso do modelo 4 apresentado por McLaughlin e Black-Hawkins (2004).
Dessa forma, pode-se compreender que projetos de parceria universidade-escola
devem ser construídos para cada circunstância de contexto, objetivo de pesquisa e sujeitos
envolvidos, assim como refinados à medida que os resultados são avaliados. Além disso,
pode-se perceber, também, a partir dos modelos de parceria citados e sugeridos por esses
autores (LEVIN; WADMANY, 2008; MCLAUGHLIN; BLACK-HAWKINS, 2004), assim como a
partir da própria parceria deste trabalho, que a interação mais próxima entre um
pesquisador e um professor, numa parceria individualizada, é um importante caminho para
compreender as caraterísticas particulares de concepções e práticas do professor para,
então, refletir e contribuir para sua mudança. Um modelo de parceria mais amplo, com mais
sujeitos envolvidos para a construção de um grupo de discussão e aprendizagem, tem
importância para levar e estimular a questão da mudança em maior escala, favorecendo
também os alunos que, ao terem a maioria ou todos os professores envolvidos em projetos
de mudança de ensino, podem compreender e se engajar melhor em atividades com
perspectivas próximas. Contudo, conforme sugerido por Levin e Wadmany (2008), a
estratégia de parceria individualizada continua a ser necessária por conta da complexidade
inerente a cada indivíduo.
5.3.8 Unidade Temática II - Considerações Finais
Ertmer, Ottenbreit-Leftwich e Tondeur (2015) comentam que mudanças nas práticas
pedagógicas, para uma perspectiva mais construtivista em que o aluno é o centro do
processo, são discutidas na literatura há mais de 30 anos e que, o uso das TDIC, nos últimos
anos, foi incluído nessa demanda de mudança, para contribuir com essa nova perspectiva.
No entanto, a própria literatura tem demonstrado que a mudança de prática passa
essencialmente por mudanças nas concepções dos professores, assim como das condições
do contexto escolar, desde o sistema escolar pautado na memorização e exames ao número
de alunos em sala de aula e o acesso a recursos de TDIC, por exemplo. Levin e Wadmany
(2008) argumentam que a perspectiva construtivista de aprendizagem, que pressupõe que
183
os indivíduos construam conhecimento em um processo ativo, autônomo, situado em
questões reais de seu cotidiano, não se aplica apenas aos estudantes, mas também aos
professores. Colocam que as experiências de desenvolvimento profissional devem levar essa
perspectiva de aprendizado em consideração para o planejamento das ações que visam a
construção de conhecimento e mudança de prática dos professores. Além disso, os autores
argumentam que essas experiências de desenvolvimento profissional devem levar em
consideração as características pessoais de cada professor, mesmo que isso exija longos
períodos de projetos de acompanhamento e a construção de ações individualizadas para
cada professor, dentro de um grande projeto de desenvolvimento profissional que envolva
vários sujeitos.
Essa visão de parceria individualizada de Levin e Wadmany (2008) vem ao encontro
da proposta de parceria desenvolvida no presente estudo. Considerando a questão (“Como a
parceria contribuiu para a prática da professora com TDIC?”), que deu origem diretamente à
categoria “Possível contribuição da parceria para a prática pedagógica da professora com
TDIC e desenvolvimento de TPACK”, pode-se dizer que, embora não tenha sido possível
observar mudança de concepção e prática da professora de Ciências, a parceria contribuiu
para a sua reflexão sobre as possibilidades de uso dos recursos de TDIC disponíveis na
escola, mesmo que ainda dentro de sua perspectiva tradicional, assim como reflexão sobre
as próprias dificuldades do contexto para esse uso e busca de estratégias alternativas. Nesta
reflexão, considera-se ainda que a professora pôde perceber que a integração de tecnologias
é algo que também é do interesse dos alunos. Essa percepção foi evidenciada por
comentários da própria professora, em alguns diálogos com a pesquisadora e na entrevista,
sobre o comportamento e motivação dos alunos em aulas com uso de algum dispositivo
tecnológico, reconhecendo a mudança no perfil deles ao longo do seu tempo de profissão.
Considerando que a reflexão faz parte de todo processo de mudança, o reconhecimento das
dificuldades, sejam pessoais e/ou do contexto, além das buscas por alternativas a essas
dificuldades, podem ser consideradas como o primeiro estágio que pode levar à mudança. E,
portanto, foi nesse estágio inicial de reflexão e reconhecimento de possibilidades e
dificuldades de práticas com TDIC que a professora permaneceu durante esse período de
acompanhamento, assim como o seu TPACK, conforme a representação apresentada nesta
unidade. Pode-se considerar possível que o TPACK desta professora, assim como de outros
184
professores em situação de aproximação com as TDIC, se desenvolva à medida que haja
condições de experienciar novas práticas com TDIC, em perspectiva construtivista. Contudo,
é importante que estas condições sejam constantes no contexto escolar e não apenas
pontuais, como parte de um projeto de desenvolvimento profissional, sem o qual o
professor não tenha mais como sustentar as ações implementadas e concepções construídas
durante o mesmo.
No presente estudo, apesar de não ter alcançado as expectativas e de ter sido
reconhecida pela professora mais como uma divisão de tarefas do que como uma
oportunidade de aprendizado e mudança, pode-se considerar que a parceria foi bem
sucedida no sentido de a presença da pesquisadora ter sido bem aceita não apenas pela
professora de Ciências, mas pelos alunos de suas turmas e pelos demais professores e
direção da escola. Além disso, a perspectiva da parceria para discussão e reflexão sobre suas
práticas e possibilidades de inserção de TDIC já foi algo inovador para a professora, que
demonstrava receptividade para as ideias, embora prejudicadas pelos problemas do
contexto que impediram que muitas dessas ideias fossem adiante. Portanto, pode-se
considerar que o modelo de parceria empreendido é promissor, passível de ser adotado para
outros futuros estudos, além de coerente com o que autores sugerem sobre como podem se
desenvolver parcerias pesquisador-professor (LEVIN; WADMANY, 2008; MCLAUGHLIN;
BLACK-HAWKINS, 2004; BUTLER et al, 2004; DUNCAN; CONNER, 2013; WANG; ZHANG, 2014;
ERTMER; OTTENBREIT-LEFTWICH; TONDEUR, 2015)
185
6 CONSIDERAÇÕES FINAIS DA PESQUISA
O presente estudo se propôs a investigar e contribuir para a prática de uma
professora de Ciências com a integração de TDIC. Por meio de uma parceria entre a
pesquisadora e a professora, estabeleceu-se uma convivência ao longo de dois anos e meio
(segundo semestre de 2012 ao segundo semestre de 2014), em que a pesquisadora esteve
presente semanalmente observando as aulas desta professora, assim como discutindo com a
mesma sobre possibilidades pedagógicas de uso das TDIC disponíveis na escola e sobre os
desafios para este uso, diante das condições do contexto que se apresentavam. Conforme
detalhado no relato das observações e nas unidades de análise, a professora de Ciências tem
uma trajetória docente de quase 30 anos, constituindo um perfil tradicional de ensino. A
professora percebe que os alunos mudaram ao longo desse tempo e considera as mudanças
na sociedade, especialmente com a disseminação das tecnologias, como causa do grande
desinteresse dos alunos pela escola. A professora tem a sensação de estar competindo pela
atenção dos alunos, que lhe parecem mais interessados no que podem acessar na Internet,
do que no conteúdo de sua aula. Contudo, ela compreende que essas tecnologias, já
presentes na escola (com o PROUCA, além de um laboratório de informática e projetores
multimídia nas salas de aula), podem lhe ajudar a despertar esse interesse dos alunos por
sua disciplina, além de também facilitar seu trabalho na busca e preparação de material para
suas aulas, embora mantendo sua perspectiva tradicional com a tendência a usar as
tecnologias nas mesmas atividades que já realizava. Assim, a professora foi receptiva à
proposta da parceria para colaborar no planejamento e implementação de atividades com as
TDIC da escola, visando especialmente os laptops educacionais do projeto UCA, com a
inovadora possibilidade de trabalho no modelo 1:1. Entretanto, os problemas de acesso à
Internet prejudicaram muitos dos planejamentos de uso de computadores nas aulas, o que
por conseguinte, prejudicou o objetivo da parceria de promover experiências distintas com
as TDIC da escola, numa perspectiva construtivista e, com isso favorecer um processo de
mudança de prática e concepção da professora e, ao mesmo tempo, desenvolvimento de
TPACK.
186
Apesar de não ter observado mudanças substanciais na prática da professora, é
interessante destacar que, para quem já se encontrava em fim de carreira, ela demonstrou
muita disposição para experimentar o uso de TDIC, mesmo com as dificuldades persistentes
e todo o cenário de condições de trabalho dos docentes em geral (falta de tempo, baixos
salários, desvalorização da sociedade etc), que os desmotivam à inovação e muitas vezes até
mesmo a continuar na profissão. Tal persistência sugere que ela valoriza sua profissão e, por
isso, ainda tem interesse em melhorar sua prática, mesmo com a proximidade da
aposentadoria.
A análise dos dados obtidos com a observação e entrevista contribuiu para
compreender e discutir a complexidade da relação entre aspectos pessoais da professora
(suas concepções) e aspectos do contexto escolar e extra escolar que agem para conformar
suas práticas e integração das TDIC. Conforme foi possível perceber com os diversos autores
citados, as visões, as práticas da professora de Ciências, assim como o contexto desta escola
se aproximam de outros professores e outros contextos estudados por pesquisadores, seja
no Brasil ou outros países. Embora muitos dos autores aqui referenciados, tenham
desenvolvido estudos em países onde o acesso às TDIC com Internet, em sala de aula, é um
obstáculo já ultrapassado, na maioria de suas escolas (EUA, por exemplo), os mesmos
mostram que a mudança de prática para uso construtivista das TDIC é muito difícil e muitos
relatam concepções sobre ensino, alunos e sobre as TDIC, semelhantes às da professora de
Ciências (ERTMER; OTTENBREIT-LEFTWICH; TONDEUR, 2015; ERTMER; OTTENBREIT-
LEFTWICH, 2013; KARASAVVIDIS, 2009; LIM; CHAI, 2008; CHEN, 2008; WASTIAU et al, 2013;
DELGADO et al, 2015; CETIC, 2015). Assim, apesar deste estudo se limitar ao caso específico
de uma professora de Ciências, este proporcionou uma imersão na sua realidade, seus
desafios e suas concepções pedagógicas, e portanto, permitiu retratar com profundidade um
caso que representa o de muitos outros professores, tanto na realidade brasileira quanto em
outros lugares, conforme a literatura tem mostrado. A complexidade de aspectos envolvidos
para a integração de TDIC à prática pedagógica, revelados e discutidos com o caso desta
professora de Ciências, evidencia a necessidade da continuidade das investigações e
construção de caminhos que possam promover esse processo de transformação da
educação, uma demanda da sociedade atual.
187
Autores como Mioduser (2015), de Vries (2015) e Jones, Buntting e Williams (2015),
que escreveram capítulos para um livro com o objetivo de discutir as perspectivas futuras de
integração das tecnologias à educação (“The Future of Technology Education”), colocam que
o grande desafio, que não é propriamente novo por já ser apontado há bastante tempo, é
aproximar mais a pesquisa da prática e dos interesses do professor na escola, destacando
que, muitas vezes, as questões investigadas partem do interesse dos pesquisadores e não
dos professores. Além disso, destacam a necessidade de que resultados de estudos que já
apontam ações bem sucedidas, porém em escalas limitadas, sejam implementados e
disseminados para escalas maiores, fazendo com que as pesquisas possam contribuir mais
efetivamente para transformações na prática educativa. Jones, Buntting e Williams (2015)
ressaltam que um passo importante nessa direção de estreitamento de relações é tentar
envolver os professores mais diretamente nas pesquisas, em vez de serem vistos apenas
como informantes, estimulando-os a também ter um olhar atento sobre suas práticas. Estes
autores acrescentam que é importante que os pesquisadores também estreitem relações
com os professores que atuam na formação de novos docentes, aproximando assim a
pesquisa da formação inicial, momento importante para a discussão e construção de
práticas mais alinhadas com o que as pesquisas indicam. Além disso, sugerem que os
pesquisadores divulguem mais seus trabalhos em revistas e eventos voltados e acessíveis
aos professores.
Quanto à questão de envolver os professores nas pesquisas, colocada por Jones,
Buntting e Williams (2015), pode-se dizer que as pesquisas realizadas em parceria
universidade-escola seguem essa demanda de aproximação entre pesquisadores e
professores, tendo o princípio da colaboração entre os sujeitos e partindo de aspectos
inerentes à prática docente. Nessa perspectiva de parcerias, o professor é visto como
produtor de conhecimento assim como o pesquisador e a construção conjunta de um
projeto de pesquisa contribui também para a formação desse professor, que constrói
conhecimento à medida que discute e analisa suas ações, além de desenvolver novas
perspectivas de prática (WANG; ZHANG, 2014; DUNCAN; CONNER, 2013; DESGAGNÉ, 2007).
Conforme comentado no tópico 4.2, capítulo 4, pesquisas conduzidas na perspectiva da
parceria universidade-escola têm recebido muitos incentivos financeiros em diversos países
188
(DUNCAN; CONNER, 2013), indicando que este pode ser um importante caminho para essa
aproximação entre pesquisadores e professores da educação básica.
De acordo com Desgagné (2007), também comentado no tópico 4.2, nem sempre os
professores participam diretamente de todo o processo de pesquisa, como a definição do
quadro conceitual, coleta de dados etc., embora seja interessante terem essa possibilidade
caso desejem acompanhar de perto todas as etapas e detalhes do processo. Contudo,
mesmo sem esse envolvimento mais aprofundado com as tarefas formais de pesquisa,
quando estabelecem parcerias com os pesquisadores para a construção de um projeto
comum, os professores se envolvem em um processo reflexivo sobre uma determinada
questão de sua prática e seu contexto que estão sendo investigados, o que se constitui como
um passo inicial de aproximação da atividade de pesquisa, além de oportunidade de
aperfeiçoamento profissional. Esse foi o caso da professora de Ciências, que não se envolveu
nas etapas formais de estudo e análise de suas ações e integração das TDIC, porém
considera-se que discutir acerca das dificuldades e possibilidades de ações que poderiam ser
feitas, mesmo que ela tenha se frustrado com propostas que não puderam ser
implementadas, foi uma experiência inovadora para a professora, que nunca havia se
envolvido em um projeto de pesquisa.
Apesar de não ter desenvolvido TPACK e transformado sua prática, de acordo com os
estágios necessários apontados por Niess et al (2009), a professora pôde perceber que os
alunos têm interesse pelo uso de TDIC nas aulas, mesmo que seja na perspectiva tradicional
que ela manteve, conforme o envolvimento e atenção que eles demonstraram ter nas aulas
com exibições de vídeos, slides e visualização da página online com animações de Ciências.
Ter essa percepção pode ser um importante aspecto motivador para que a professora
continue a usar as TDIC e inclusive se arrisque em novas experiências de uso, caso as
condições do contexto se tornem mais favoráveis em algum momento. Além disso, a
professora teve oportunidade de conhecer e explorar recursos que lhe eram desconhecidos,
como a página em que criou as provas que poderiam ser aplicadas online; outra página de
Internet que permite criar caça-palavras e palavras cruzadas, jogos com os quais a
professora já trabalhava com os alunos como questões de exercícios, porém precisava
buscar exemplos prontos na rede ou fazê-los manualmente; uma página para construção de
histórias em quadrinhos online; a possibilidade de inserção de hiperlinks em apresentações
189
de slides, usada para criação do Quizz do Reino Animal. Embora não tenha conseguido
concretizar na prática todos os planejamentos feitos com esses recursos, a professora
reconheceu o potencial dos mesmos para atividades em sala de aula, o que também é
importante para que ela os tenha como repertório a ser usado nos momentos em que
considerar oportuno e possa avaliar a experiência pedagógica com os mesmos.
Além desta oportunidade de a professora refletir e ampliar seu conhecimento sobre
TDIC e potencial uso pedagógico, a proposta de parceria desenvolvida com este estudo
também foi considerada bem sucedida, pela receptividade percebida pela pesquisadora,
alunos e demais sujeitos da escola, assim como promissora para ser conduzida em outros
estudos na área, alinhando-se com propostas defendidas por autores como Levin e
Wadmany (2008), conforme mencionado na unidade temática II. Nesse sentido, pode-se
considerar que essa avaliação positiva do modelo de parceria aqui empreendido, abre
caminho para que este seja adotado em estudos com outros professores, seja de Ciências ou
outras disciplinas, tanto para integração de TDIC quanto para qualquer outro objetivo de
estudo na área educacional.
Conforme percebido na análise, um suporte do tipo logístico foi valorizado pela
professora, que viu a parceria com a pesquisadora como uma oportunidade de divisão de
seu trabalho, especialmente para ajuda-la a pesquisar recursos que poderia usar em sala de
aula. Esse tipo de suporte mostrou-se importante também para a organização e viabilidade
de atividades como a do Quizz do Reino Animal, que precisou ser gravado em cada laptop
dos alunos fora do horário de aula. A presença de monitores bolsistas pelo projeto de minha
orientadora (“Análise do processo de integração de tecnologias de informação e
comunicação em atividades educativas no ensino fundamental no contexto do Programa Um
Computador por Aluno – PROUCA”), também mostrou a importância desse suporte técnico e
logístico para uso de TDIC, uma vez que o grupo de pesquisa avaliou que a frequência de uso
dos laptops (com ou sem acesso à Internet), entre os professores da escola, aumentou no
período em que puderam contar com essa ajuda. Portanto, pode ser interessante que
futuros estudos em parceria pesquisador-professor considerem a possibilidade de envolver
sujeitos que possam dar esse apoio técnico, a fim de que pesquisador e professor possam
focar no planejamento e desenvolvimento das estratégias pedagógicas com as TDIC. Estes
sujeitos podem ser membros da própria escola ou alunos universitários, como foi o caso dos
190
monitores que estiveram nesta escola, interessados em aprender e contribuir com o projeto
de pesquisa.
Pode-se considerar que este modelo de parceria abre caminho para a ampliação da
perspectiva de pesquisas para escolas que dispõe de outros programas de acesso às TDIC,
como por exemplo os laboratórios de informática, que fazem parte do programa federal
Proinfo, vigente desde 2007. Enquanto o modelo de um laptop por aluno foi disponibilizado
para poucas escolas do país, pelo PROUCA, o qual não teve continuidade, o modelo de
laboratório de informática é, no momento, o mais comum entre as escolas, de acordo com o
relatório CETIC (2015). Além disso, outras propostas têm surgido, como a distribuição de
tablets para professores ou alunos (CETIC, 2015). É importante considerar também o
aumento do acesso dos próprios alunos a smartphones, os quais podem ser vistos como
potenciais recursos a serem integrados em ações pedagógicas pelos professores. Dessa
forma, o desenvolvimento de pesquisas em parceria com professores envolvidos nesses
contextos é importante para ampliar a compreensão de como as TDIC têm sido integradas
no cenário educacional brasileiro e como se pode contribuir para superar desafios e
construir novas práticas e conhecimentos entre os professores, que permitam aproximar o
processo educacional do que defendem pesquisadores (ERTMER; OTTENBREIT-LEFTWICH;
TONDEUR, 2015; PÉREZ GOMEZ, 2015; COLL; MONEREO, 2010; KENSKI, 2007; MISHRA;
KOEHLER, 2005; 2006; JONASSEN, 1998; 2005).
Outro importante contexto onde as pesquisas sobre integração de TDIC, com este
modelo de parceria, pode avançar é o da formação docente. Nesse sentido, a parceria pode
se dar tanto entre pesquisadores e professores que atuam na formação inicial de novos
docentes, quanto entre pesquisadores e professores em processo de formação inicial, uma
vez que as concepções e experiências construídas neste momento podem ter grande
influência sobre as decisões de uso ou não de tecnologias em suas aulas. Com o apoio das
parcerias para a reflexão e construção de distintas experiências pedagógicas com TDIC, em
perspectiva construtivista, tanto professores formadores, quanto os que estão em formação
poderiam desenvolver TPACK. A partir deste conhecimento, os novos professores podem
proporcionar, aos futuros alunos, um novo processo de ensino-aprendizagem, mais pautado
em práticas construtivistas, as quais podem se fortalecer e aperfeiçoar à medida que
consolidam sua experiência profissional fundamentada nessa perspectiva.
191
Todas essas perspectivas de estudos em parceria podem ser conduzidas em qualquer
área de ensino, porém, tratando especificamente da área do ensino de Ciências,
pesquisadores defendem que as TDIC podem contribuir para o processo de ensino-
aprendizagem de formas que não são possíveis sem as mesmas, citando exemplos de
recursos que permitem ao estudante simular experimentos e testar hipóteses em ambientes
de laboratórios virtuais, visualizar e interagir com estruturas complexas e abstratas como
moléculas de DNA, proteínas, etc. (JONASSEN et al, 1998; ARROIO; GIORDAN, 2006;
MCCRORY, 2006; WANG et al, 2012; SLYKHUIS; KRALL, 2012). Embora estes recursos não
dispensem o laboratório de Ciências, como um local físico onde o estudante pode realizar
distintas práticas científicas, os mesmos podem contribuir ampliando o repertório de
possibilidades de experimentações do próprio laboratório e, quando a escola não dispõe
desse espaço, como é o caso da escola onde foi realizado o presente estudo, as TDIC podem
ser a opção mais viável para que professor e estudantes possam trabalhar com
experimentação, além de desenvolver estratégias pedagógicas inovadoras. Conforme
mencionado no tópico 3.3, capítulo 3, Harris e Hofer (2011) disponibilizaram sugestões de
recursos tecnológicos que podem ser adequados para distintas atividades pedagógicas de
Ciências, de acordo com o objetivo de cada atividade, seja para o estudo de conceitos
científicos, procedimentos de investigação ou para o estudante expressar seu conhecimento
sobre determinado conteúdo científico. Cabe ao professor, a partir de seus objetivos, do
conhecimento que tem sobre seus alunos e disponibilidade de uso de TDIC, buscar e
explorar aquele que julgar mais adequado.
Conforme a revisão de Slykhuis e Krall (2012), mencionado no tópico 3.5, capítulo 3,
acerca do uso de TDIC no ensino de Ciências, as pesquisas ainda precisam avançar com
relação aos efeitos do uso pedagógico de TDIC no aprendizado dos conteúdos desta
disciplina, o que pode indicar aos professores que tipos de práticas e recursos mais
contribuem para a motivação e o desempenho dos estudantes. Outra perspectiva de
pesquisa importante apontada pelos autores é com relação ao nível de ensino fundamental,
onde há menos estudos do que nos níveis médio e superior. Segundo eles, a maioria dos
estudos se concentra no uso de TDIC para a área de Física, a qual predomina no currículo de
Ciências do ensino médio e cursos do ensino superior. Assim, Slykhuis e Krall (2012)
apontam a necessidade de avanço de pesquisas sobre o uso de recursos tecnológicos com
192
foco no conteúdo de Ciências do ensino fundamental, onde predominam as ciências da
natureza e corpo humano, assim como nos estudantes desse nível. Pode-se dizer que a
perspectiva da parceria pesquisador-professor também pode se adequar a estas sugestões
de pesquisas, especificamente relacionadas à integração de TDIC ao ensino de Ciências,
apontadas por Slykhuis e Krall (2012).
Portanto, de acordo com os resultados desse estudo, com as referências que
contribuíram para sua fundamentação e discussão e, ainda, de acordo com as perspectivas
de continuidade e ampliação das possibilidades de estudos baseados em parceria aqui
sugeridos, pode-se compreender que as pesquisas em torno da integração de TDIC à
educação e, especialmente ao ensino de Ciências, ainda têm muito a avançar e contribuir
para a melhoria da prática docente na sociedade atual.
Conforme destacado por Kenski (2007), fazer educação com a qualidade exigida na
sociedade da informação, demanda mudanças na estrutura e funcionamento das escolas,
mas estas por si só não são suficientes, embora sejam imprescindíveis. Do mesmo modo,
também não basta os professores adquirirem domínio técnico para uso de computadores,
mas precisam ir além disso, com uma formação pedagógica e crítica para desenvolvimento
de projetos educacionais inovadores com as TDIC. De acordo com a autora, “a escola do
tamanho do mundo, que se viabiliza pelo uso intensivo das tecnologias e das redes digitais,
precisa ser vista com uma nova mentalidade” (KENSKI, 2007, p. 125).
6.1 CONSIDERAÇÕES FINAIS DA PESQUISADORA
Para finalizar, gostaria de comentar sobre minha posição na parceria estabelecida
com a professora de Ciências. Conforme discutido anteriormente, apesar da receptividade
da professora, sua expectativa em relação à parceria era distinta do objetivo de inovação de
práticas com TDIC da pesquisadora. Desde o início das observações foi possível perceber a
concepção tradicional de ensino nas práticas que ela desenvolvia, porém foi quando lhe
apresentei algumas sugestões de recursos, como o site onde o professor pode criar questões
e enviar aos alunos, a criação de histórias em quadrinhos e jogos de palavras cruzadas e caça
193
palavras online, percebi que a mudança de perspectiva de suas práticas não poderia ser
rápida ou radical. Conforme relato nas observações, capítulo 6, quando discutimos sobre
tais recursos, forma mencionadas também formas de uso em atividades em que os alunos
usariam os mesmos para construir trabalhos com os conteúdos que estivessem estudando.
No entanto, essas sugestões de uso não despertaram, na professora, o mesmo entusiasmo
que a possibilidade de criação de provas online, ideia que partiu dela. Portanto, nesse
momento, entendi que seria importante para a professora explorar os recursos tecnológicos
em atividades que eram confortáveis para ela. Dessa forma, a professora poderia adquirir
confiança com relação ao manuseio dessas tecnologias e avaliar a participação e interesse
dos alunos nessas atividades. Assim, acredito que, a professora poderia aceitar desenvolver
práticas com características mais centradas no aluno com mais entusiasmo e segurança. Essa
necessidade de tempo para conhecer e vivenciar experiências positivas com o uso de TDIC é
discutida por diversos autores referenciados neste estudo (COLL; MONEREO, 2010; PÉREZ
GÓMEZ, 2015, POTVIN, HASNI, 2014; HOWARD, 2013), indicando que o uso inicial dessas
tecnologias dentro da perspectiva com a qual os professores já estão habituados é parte do
processo de integração.
Entretanto, as dificuldades de acesso à Internet na escola prejudicaram essa intenção
da pesquisadora de contribuir para o processo de transição de práticas da professora com as
TDIC. Ao mesmo tempo, estas dificuldades contribuíram para que ela não se sentisse segura
com as TDIC, já que para planejar uma atividade que exigisse acesso à Internet, deveria
planejar também uma outra, o chamado plano B, caso a Internet falhasse. Assim, em um
contexto que limita as possibilidades de planejamento da professora com a tecnologia, uma
vez que, sem Internet, o uso do computador é muito restrito, é compreensível que ela se
sinta mais segura com as práticas e recursos que construiu ao longo de sua carreira e rejeite
uma inovação que não parece confiável.
Diante dessa dificuldade de acesso à Internet e, portanto, de desenvolvimento do
objetivo da parceria, dediquei bastante esforço junto à coordenadora pedagógica e diretora
da escola para que esse problema fosse resolvido, insistindo nas visitas dos técnicos da
prefeitura e fazendo testes com os laptops para verificar se o problema havia sido resolvido.
Reconheço que, assim como a professora, também me senti limitada e, por diversas vezes,
tentei pensar no que seria possível fazer, que atividades poderia sugerir à professora que
194
não exigissem acesso à Internet e que, ao mesmo tempo, fossem interessantes para ela e
para os alunos, com alguma característica distinta do que já desenvolviam. O quizz do Reino
Animal, construído em apresentação de slides com hiperlinks, foi planejado por conta dessas
dificuldades, porém não se mostrou muito viável por conta da demanda de tempo para sua
construção, assim como por conta da dificuldade logística para sua implementação em sala
de aula.
Considerando ainda todas as outras dificuldades do contexto, como as turmas muito
numerosas, a cobrança para cumprir um currículo extenso em determinado prazo, com
respectivas avaliações, além da falta de tempo para planejar e organizar material para cada
turma, pode-se compreender que, dificilmente, a professora vai inovar sua prática. Esse
contexto, que se assemelha a tantos outros no Brasil e outros países, conforme diversos
trabalhos na literatura, não dá tempo e nem condições ao professor para experimentar
novas práticas. Consequentemente, não favorece a reflexão do professor sobre sua ação, e
não há mudança sem reflexão.
Portanto, a análise e discussão sobre a concepção e práticas tradicionais da
professora de Ciências não representa uma crítica a esta professora, pois compreende-se
que ela agiu segundo o que acredita ser a melhor forma de conduzir o processo de ensino-
aprendizagem. Ela precisava tomar decisões muito rápido diante de todas essas questões do
contexto e, por isso, é perfeitamente compreensível que se apoiasse nas práticas que lhe
pareciam mais seguras. Essa professora, assim como todos os outros que estão em
realidades semelhantes merecem ser respeitados, valorizados e ter condições de exercer sua
profissão com dignidade.
É neste sentido que as pesquisas educacionais e o presente estudo, pretendem
contribuir, visando em última instância, a melhoria da educação e da sociedade em que
vivemos.
195
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205
APÊNDICES
206
APÊNDICE A
ATIVIDADES PEDAGÓGICAS REFERENTES AO PROJETO “COM-VIVER COM-CIÊNCIA E
CIDADANIA”
Neste apêndice apresento as atividades que se desenvolveram na escola municipal Madrid
referentes ao projeto “Com-Viver Com-Ciência e Cidadania”, que foi desenvolvido pelo
grupo de pesquisa do Laboratório de Tecnologias Cognitivas/UFRJ, no mesmo período em
que o presente estudo também se desenvolvia nesta escola e do qual também participou a
professora de Ciências, sujeito da presente pesquisa, além de professores das demais
disciplinas, conforme mencionado no tópico 5.1.1, capítulo 5.
As atividades planejadas em colaboração com os professores, tendo como tema transversal
Saúde, foram implementadas com os alunos da turma de 9º ano (n=37), do turno da manhã,
no ano de 2012. As atividades articularam metodologias ativas (pesquisa, projeto, debate,
jogo etc.) ao uso dos laptops. Pesquisadores e professores discutiram como distintas
temáticas relacionadas à Saúde poderiam ser abordados em cada disciplina, relacionando-as
a cada conteúdo curricular específico. Assim, foram desenvolvidas atividades para cada dia
de uma semana (2ª a 6ª feira), seguindo a grade horária dos tempos de aula desta turma e
contemplando, portanto, todas as suas disciplinas. Dentre os temas tratados nas atividades
estão: sexualidade, gravidez na adolescência, bullying, alimentação e avaliação
antropométrica, o conceito de saúde na visão dos próprios alunos etc. Durante todos os dias
de atividades, os alunos trabalharam em grupos escolhidos por eles mesmos e cada aluno
com o seu laptop educacional. Esta experiência ocorreu em setembro de 2012 e todas as
atividades exigiam o acesso à Internet em alguma etapa e, apesar da lentidão da conexão
em vários momentos, as atividades foram concluídas sem que fosse preciso recorrer a
propostas alternativas. As atividades foram as seguintes:
2ª feira: Conceito de Saúde – a partir da questão motivadora “Quando eu penso em saúde, o
que vem à minha cabeça?”, os alunos deveriam pesquisar na Internet imagens que
representassem o que pensavam sobre Saúde, para posterior discussão sobre o conceito
ampliado de Saúde, que embasaria as discussões das outras atividades;
207
3ª feira: Diário do Corpo – atividade com temática sobre alimentação e estado nutricional,
na qual os alunos realizaram pesquisas na Internet, fizeram uma auto-avaliação
antropométrica e discutiram sobre os resultados;
4ª feira: Jogo Saúde do Adolescente – atividade que articulou um jogo de tabuleiro com
perguntas de temas diversos (sexo, doenças sexualmente transmissíveis, drogas, gravidez
etc.);
5ª feira: Debate Cidadão – exibição de vídeo, pesquisa na Internet e debate sobre bullying;
6ª feira: Roda de conversa – os alunos foram estimulados a dar suas opiniões sobre as
atividades desenvolvidas nos outros dias, comentar sobre a dinâmica das atividades, o que
aprenderam etc.
A professora de Ciências se envolveu nas atividades Diário do Corpo e Jogo Saúde do
Adolescente, conforme mencionado no tópico 5.1.2, capítulo 5. O passo a passo de
realização de cada atividade, a dinâmica de participação de cada professor, assim como uma
análise dos resultados desse projeto estão no artigo de Struchiner e Giannella (2016).
Considerando esta experiência bem sucedida, a coordenadora pedagógica da escola solicitou
que, em 2013, o grupo de pesquisa estendesse as atividades do projeto “Com-Viver Com-
Ciência e Cidadania” para as demais turmas. Decidimos que essa extensão poderia ser
realizada ao longo de todo o ano letivo de 2013. Planejamos trabalhar três atividades com
cada turma, sendo elas: Conceito de Saúde, Jogo Saúde do Adolescente e Diário do Corpo.
No entanto, por conta dos dois períodos de greve que ocorreram nesse ano, as atividades
“Saúde em Jogo” e “Diário do Corpo” não puderam ser realizadas.
Em 2014, tanto a coordenadora pedagógica quanto professores e o grupo de pesquisa ainda
tinham interesse na realização de atividades do projeto “Com-Viver Com-Ciência e
Cidadania”. No entanto, neste ano os problemas com a Internet da rede PROUCA se
agravaram, conforme comentado no tópico 5.1.1, capítulo 5. Por conta disso, algumas
adaptações foram necessárias. Na atividade do Conceito de Saúde, com o 6º ano, optou-se
por distribuir folhas de papel aos alunos e pedir que eles respondessem a questão “Quando
eu penso em saúde, o que vem à minha cabeça?”, com palavras ou desenhos, em vez de usar
os laptops para fazer pesquisas sobre o que representa saúde para eles, como era a
proposta original.
208
A atividade do conceito de Saúde, no 8º ano, teve uma dinâmica diferente da turma de 6º
ano. Por conta do número reduzido de alunos da turma de 8º ano (n=18), planejamos usar a
sala de informática, que possui 12 computadores e estava com a rede de Internet
funcionando. Alguns alunos teriam que trabalhar em duplas, mas isso não seria um
problema. A ideia era que os alunos fariam pesquisas de imagens na Internet e depois
discutiriam sobre elas e o conceito ampliado de saúde na sala de aula. No entanto, uma
semana antes do encontro com esta turma, estive na escola para que a professora de
História mostrasse a sala de informática e o seu funcionamento, assim como as senhas para
iniciar os computadores. Ao testarmos todos as máquinas, verificamos alguns problemas que
inviabilizaram o uso de quatro dos 12 computadores da sala. Sendo assim, restaram oito
computadores e, com isso a estratégia de trabalho com a turma foi repensada, considerando
que seria difícil trabalhar com os 18 alunos e apenas oito computadores, pois aqueles que
não teriam o contato direto com a máquina poderiam ficar dispersos na atividade. Verificou-
se que a sala de leitura, por sua proximidade com a sala de informática, recebia o sinal da
rede de Internet desta sala e, por isso, alguns laptops educacionais puderam ser conectados
ali. Dessa forma, ficou decidido que a etapa de pesquisa da atividade Conceito de Saúde
ocorreria com a turma dividida entre a sala de informática e a sala de leitura.
A atividade do jogo, desta vez, seria feita em duas etapas, em dias distintos, um para a
construção de questões para o jogo, pelos próprios alunos, do 6º ano, e o outro para jogar
propriamente. Para a primeira fase, foi planejado o uso de computadores com acesso à
Internet para que eles pudessem criar suas perguntas e respostas com base em pesquisas
em diferentes endereços. Como não seria possível usar os laptops UCA, os pesquisadores
conseguiram autorização da direção para usar laptops do programa Educopédia e trouxeram
outros laptops do laboratório de pesquisa, de modo que cada um dos sete grupos de alunos
tivesse um computador. Não foi possível conectar os laptops dos pesquisadores à mesma
rede que os laptops da escola, mas a partir de seus celulares, com Internet particular, foi
possível estabelecer conexão para esses computadores. Portanto, com esta alternativa
garantiu-se que cada grupo tivesse um computador com acesso à Internet para realizar esta
etapa da atividade.
Para a atividade do Diário do Corpo, no 8º ano, também dividimos a turma em dois grupos
distribuídos pela sala de informática e sala de leitura (com laptops) para que pudessem fazer
209
etapa de avaliação antropométrica, verificando o IMC (Índice de Massa Corporal) e
respectivo estado nutricional. A proposta desta atividade era que os alunos avaliassem seu
estado nutricional (abaixo do peso, peso ideal, sobrepeso, obesidade) a partir de uma
ferramenta de Internet idealizada em conjunto com as professoras de Ciências e Matemática
e desenvolvida pela equipe de pesquisadores. Nesta ferramenta, intitulada Diário do Corpo
(http://ltc-ead.nutes.ufrj.br/diariodocorpo), cada aluno pode realizar seu cadastro e inserir
seus dados de peso e altura, calcular seu IMC e assim verificar seu estado nutricional em um
gráfico. Antes de acessar os computadores na sala de informática e sala de leitura, cada
aluno coletou seus dados de peso e altura e depois seguiu para um computador livre. Após
essa etapa todos retornaram para a sala de aula, onde assistiram uma edição resumida, de
18 minutos, do documentário original “Muito Além do Peso”, disponível no site Youtube
(previamente salvo em pendrive), para debater em seguida sobre a questão da relação entre
hábitos alimentares, peso/IMC e saúde.
210
APÊNDICE B
ROTEIRO DE ENTREVISTA COM A PROFESSORA DE CIÊNCIAS
Este roteiro está organizado em três blocos temáticos.
I - Questões de ordem pessoal importantes para compor o perfil pessoal e profissional da
professora:
- Idade
- Motivos que levaram à escolha da graduação em Ciências Biológicas
- Motivos que levaram à opção de lecionar
- Tempo de exercício como professora e tempo de exercício especificamente na E. M.
Madrid / Quando pretende se aposentar?
- Possui outro emprego além da E. M. Madrid?
- Carga horária de trabalho total (dos dois empregos, se houver)
- Considera que o seu tempo de planejamento de aulas é adequado/suficiente?
- Já fez ou pretende fazer algum curso de pós-graduação ou especialização? Qual?
- O que considera como pontos positivos e negativos da profissão?
- Considera-se feliz ou satisfeita com sua profissão?
II - Questões relativas à tecnologia (especificamente computador e acesso à internet) na
vida pessoal da professora:
- Acesso à internet e frequência de uso
- Para que utiliza a internet (lazer, estudo, comunicação com amigos e parentes, etc...)
- Já fez algum curso relacionado à informática? Qual e por quê?
- Considera as tecnologias, especificamente computador e internet, importantes para sua
vida? Por quê?
III - Questões relativas à tecnologia na vida profissional da professora:
211
- Como vê a integração das tecnologias à educação? Considera uma relação possível?
- Antes da E. M. Madrid receber o Programa Um Computador por Aluno (PROUCA) já
utilizava a tecnologia em seu trabalho (mesmo que seja em equipamento próprio, em seu
domicílio)? Como utilizava? Ou por quê não utilizava?
- Como vê o PROUCA e o modelo 1:1 proposto pelo mesmo?
- Como utiliza a tecnologia após a implantação do PROUCA na escola?
- Considera que tem apoio e incentivo da direção e coordenação da escola para usar as
TDIC?
- Quais as motivações para usar a tecnologia nas suas aulas?
- Na sua opinião, a tecnologia contribui ou não para o ensino de ciências? Por que?
- Percebe contribuição da tecnologia para o aprendizado de ciências de seus alunos? Em que
sentido?
- Como percebe o comportamento (com relação à disciplina, atenção ou motivação) dos
alunos em aulas com o uso de recursos tecnológicos? Há diferença com relação às aulas em
que esses recursos não são utilizados? Qual(is)?
- Problemas e dificuldades enfrentados no cotidiano para o uso da tecnologia em sala de
aula? (desde o planejamento à execução da atividade em sala de aula)
- Tem preferência por algum tipo de recurso tecnológico para usar em suas aulas? Por quê?
- Exemplos de atividades ou estratégias pedagógicas que tenha usado tecnologias e que
considera bem sucedidas, por quê? Quais foram os recursos utilizados e quais eram as
intenções com as atividades?
- Exemplos de atividades ou estratégias que tenha usado tecnologias e que considera que
NÃO foram bem sucedidas, por quê? Quais foram os recursos utilizados e quais eram as
intenções com as atividades?
- No seu planejamento pedagógico para esse segundo semestre de 2014 há propostas de uso
de tecnologias? Fale sobre algumas ou por que não há planejamento?
212
- Há algum recurso tecnológico que gostaria de utilizar, mas ainda não teve oportunidade?
Qual? Por quê ainda não pôde utilizá-lo?
- Considera que precisa de algum tipo de auxílio no planejamento e execução de atividades
com tecnologias? Que tipo de auxílio?
- Considerações sobre o uso das tecnologias na sua profissão e na escola onde trabalha que
ainda deseje expressar?
213
APÊNDICE C
TRANSCRIÇÃO DA ENTREVISTA COM A PROFESSORA DE CIÊNCIAS
DATA DA ENTREVISTA: 18/09/14
PRESENTES: DIANA, MIRIAM (pesquisadoras) e professora de ciências - entrevistada
IDENTIFICAÇÃO NA TRANSCRIÇÃO: P1 (PESQUISADORA DIANA), P2 (PESQUISADORA
MIRIAM) E PC (PROFESSORA DE CIÊNCIAS)
LOCAL DE REALIZAÇÃO DA ENTREVISTA: ESCOLA MUNICIPAL MADRID (após o horário de
aulas do turno da manhã)
TEMPO DE DURAÇÃO DA ENTREVISTA: 1h:29min
P1: Eu preparei esse roteiro de entrevista, porque a entrevista é uma das ações que a gente
acha importante de ter no projeto porque além dos dados que eu coleto quando estou aqui
na escola observando e tal, mas a entrevista é um registro da sua fala que vai ser importante
pra não ficar só baseado no que eu tô vendo, só na minha interpretação....pra eu ter o seu
registro que vai contribuir para o trabalho...
P2: vem cá, você tem o termo de consentimento? já entregou para ela (referindo-se à
professora)?
PC: já, já..já te entreguei.
P1: então, eu pensei num roteiro em três blocos de temas das questões. O primeiro seria um
bloco de questões de ordem pessoal importante para a gente conhecer o seu perfil...
PC: olha a primeira pergunta: idade...pode uma coisa dessas? que coisa feia...
P1: hahaha....muita coisa a gente já conversou, né...algumas coisas eu já sei, mas...
P2: pode botar faixa etária se você preferir...aí faz uma faixa etária entre 40 e 50...
PC: haha...ih, já foi...vai lá, vamos embora...
P1: então é a faixa etária?
PC: não, não...idade: 55....sem problemas...
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P1: então, a outra coisa seriam os motivos que te levaram a fazer a graduação em biologia
PC: primeiro porque eu gosto muito da botânica, da parte da botânica, eu queria na verdade
no momento...era uma área que me atraía e eu queria trabalhar com botânica na época...aí
eu fui pela botânica...
P1: então foi por isso que você escolheu...e por que você escolheu ser professora?
PC: aí eu fiz estágios, né....e no meio da faculdade recebi uma proposta de trabalho numa
escola particular, que eu fiquei dez anos lá...e eu aceitei e aí eu comecei a gostar de dar
aula...e aí eu fui ficando...vicia, dar aula vicia...
P2: imagino, eu também sou assim...
PC: quando você consegue realmente dar aula, você consegue fazer com que os alunos
parem, aí é muito bom...
P2: acaba se sentindo com uma missão a mais...
PC: é, é...é muito bom...agora, quando você tem que ficar brigando pra dar aula, aí é muito
ruim...
P1: e qual é o seu tempo de exercício como professora? Aqui na escola madrid?
PC: só aqui? Na madrid...eu acho que eu estou...sei lá, acho que eu já estou com uns 8
anos...de município eu tenho 20, só de município...de sala de aula eu devo ter uns 28...mas
no município 20...
P2: poxa...
PC: é, em Caxias eu tenho 23 e tenho o tempo da particular...
P1: é uma trajetória...
P2: ainda mais com adolescentes, né...não é mole....
P1: e foi sempre com essa faixa etária?
PC: sempre com essa faixa...mas há uma diferença muito grande de quando eu iniciei para
agora...
P2: você nunca pensou em fazer pesquisa quando estava na faculdade?
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PC: não, não...
P2: você nunca teve essa dimensão? Eu acho que mudou muito também nesse período
todo...assim o espaço pra pesquisa aumentou...
PC: é, aumentou muito...apesar de ainda ser bem reduzido....houve uma...(uma pessoa
interrompe entrando na sala...)
P1: bom, e aí então... a gente já conversou sobre isso, mas quando é que você pretende se
aposentar?
PC: ano que vem...hahaha...se Deus quiser....
P1: e você tem outro emprego além daqui da escola Madrid?
PC: sim, Caxias...também é outra escola do município...
P1: e a carga horária total dos dois?
PC: dá...32, né? 16 com 16, 32 horas...é isso...
P1: mas isso dá todos os dias da semana?
PC: não. Terça, quarta e quinta.
P1: ahã...aí você condensa...é...e o que você acha do seu tempo de planejamento? Você
acha que é adequado? É suficiente o tempo de planejamento que você tem? Dentro dessa
carga horária ou você precisa...
PC: não, porque eu acabo planejando fora da carga horária da escola, né...eu acho que eu
faço mais planejamento em casa do que na própria escola...
P1: por que na escola não dá tempo?
PC: não, porque aí você pára...você começa a pesquisar lá na internet pra pegar temas que
você quer trabalhar, porque você vai fazendo uma adequação, né...aí você vai pegando não
sei o quê e muitas vezes você chega aqui e você não tem a quantidade de... não tem
computadores...e aí todo tempo que você tem livre aqui tem alguma coisa pra falar que a
secretaria mandou, todo tempo é isso...aí eu trabalho em casa...
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P2: Regina, uma coisa interessante é que nesses 28 anos de profissão que você já tem, você
já passou por diferentes fases, né...por exemplo, a primeira fase não tinha computador...
PC: não
P2: né, então é esse tipo de coisa que você...é...o tipo de planejamento...
PC: vai mudando...
P2: foi mudando...você podia falar um pouquinho sobre isso?...tentar pensar um pouco
sobre como era tua experiência, o que foi mudando ao longo do tempo por conta...
PC: olha só...inicialmente...é....
P2: porque é tão interessante pegar uma pessoa que tem 28 anos de trabalho...
PC: inicialmente a gente trabalhava muito com livro, o quadro, o giz....mas nós
conseguíamos fazer aquelas experiências simples...como...é...do gelo, da água...aquelas bem
simples de ciências...
P2: uma coisa mais empírica...
PC: é...então você conseguia trabalhar com isso...com o passar do tempo, eu acho que até
vem a conjuntura externa à escola...com o passar do tempo, esse tipo de experiência já não
atrai mais o aluno, não adianta dizer que, porque não atrai, né...não cria curiosidade, não
cria nada...
P2: eu me lembro, por exemplo, quando eu era pequena, que a coisa que eu mais adorava
era botar o feijãozinho pra germinar...e acompanhar o processo...
PC: é...hoje em dia eles dizem assim – que bobeira professora! - ...né, aí você, pra levar ele (o
aluno) a fazer aquilo, você...em grande parte desse tipo de experiência mais simples, quem
acaba fazendo é a gente, o professor...aí depois trabalha em cima daquilo, aí até abre
alguma coisa, alguma sensação neles...mas pra fazer mesmo é muito difícil...aí eles já não
querem fazer...querem fazer assim, por exemplo...o que ainda se interessam quando eu
faço, é o vulcão, porque aí eu vou na UERJ, pego todo o material químico, aí eu faço explodir
e eles acham o máximo, né...porque tá explodindo, fazendo um monte de coisa...mas outras
coisas assim simples eles não fazem mais...não adianta, é muito difícil fazer. Aí você vai
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passando por isso tudo, depois com toda a diversidade, né, externa, eles começam a ter
atração por outras coisas e aí você começa a brigar com outras coisas...
P2: a competir você quer dizer?
PC: é...mesmo quando você vai tentando incorporar a internet, não é aquele ramo da
internet que interessa a ele (o aluno)...aí você de qualquer forma você entra numa
competição MUITO (ênfase dada na fala da professora) grande...
P2: pelo que eu estou entendendo, o que você quer dizer é que mesmo você incorporando
coisas novas na sala de aula, que é a tecnologia, ele (o aluno) tem outros interesses na
tecnologia que não são da sala de aula...
PC: é...é...o tempo todo você tem que concorrer...e é uma concorrência desleal, você vai,
vai...o que que acontece na verdade, eu acho que já é uma coisa assim...é...é a
desvalorização que a sociedade brasileira tem, na sua grande maioria, em termos do
aprendizado, do ensino...essa valorização não é passada pra eles...eles não veem...é...como
aquela história: pra quê?...então eles estão sempre procurando, eles querem sim evoluir, né,
ter mais bens materiais, etc...mas eles estão sempre procurando ir pelo lado mais fácil pra
eles, na cabeça deles, né...é o jogar bola, é o fazer não sei o quê...
P2: mas são os valores da nossa sociedade...
PC: é, e aí você então tem essa desvalorização...aí quando você manda ligar o computador,
ele não quer entrar no que você quer, ele quer entrar no facebook, ele quer entrar não sei
aonde, ele quer fazer não sei o que...
P2: mas você não acha que talvez até porque ele consegue ter um lugar na sociedade mais
de destaque do que ele consegue ter por exemplo...pelo nível social, pelas condições né,
então ali na rede social ele pode ser uma liderança, ele pode ser....
PC: é, mas é isso que eu tô falando, é a desvalorização do conhecimento em si...
P2: é, é impressionante...
PC: porque vai só na aparência...
P2: é um fenômeno social...
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PC: é..é...
P2: mas, por exemplo, eu só queria voltar um pouquinho só pra gente ter um
panorama...por exemplo, você começou dizendo que no início era muito o livro didático que
era a melhor, a principal fonte de saber...
PC: é...
P2: não tinha laboratórios nas escolas quando você começou a lecionar?
PC: não...não...qualquer tipo de experimento que era feito...se o experimento fizesse assim
muita sujeira, vamos dizer assim, se espalhasse muita coisa, tinha que ir pro pátio...agora, se
não fizesse ficava dentro da sala mesmo...quer dizer, o vulcão faz no pátio, se você for
trabalhar com solo tem que ir pro pátio pra não sujar a sala...
P2: entendi...mas a ideia de laboratório, assim aquela coisa de que a ciências tem a coisa do
cientista, do experimento...
PC: não, não...eu só trabalhei em uma escola do estado, em Nova Iguaçu, que tinha
laboratório...aí eu fiz, fiz cultura de bactéria com eles...tinha estufa, tinha todo um local
próprio pra colocar, né...você tinha um lugar adequado pra fazer, aí a gente fez, né...fiquei
uns 6 meses, que eu assinei um contrato pra ficar 6 meses, aí ali eu trabalhei com eles em
termos de laboratório, mas foi o único lugar que eu encontrei laboratório...nesse tempo
todo foi o único lugar...o resto você vai fazendo as coisas, né...mas por que passa também a
diminuir o número de experimentos? Porque infelizmente, é...os nossos alunos, vamos dizer
assim...eles estão numa atividade enorme...então como em ciências eu vou envolver fogo,
eu vou envolver substâncias químicas, eu vou envolvendo um monte de coisa, então chega
uma hora que você olha e fala assim – não dá – ou eu faço, o que não vai adiantar nada, eu
sozinha fazendo, né, e uns 40 olhando...ou cada um fazer em grupos, né, fazer aquilo, e você
começa, né, a não ter...aí começa, além disso responsáveis reclamar porque tá usando isso,
tá usando aquilo...então aí eu fui deixando de mão, deixando de mão...
P2: aí, mas olha só, nessa trajetória alguma vez algum outro tipo de meio de comunicação,
por exemplo, televisão, filme...
PC: ah, sim...filme, música, né...porque você tinha aquela do Guilherme Arantes, Planeta
Água, tem aquela do Caetano Veloso, Verde Novo, né...então a gente joga e volta pra
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explicar o que que a música tá querendo dizer, porque às vezes eles não conseguem
captar...então eu usei sempre muito filme, essas coisas assim...e usava também aquelas
transparências que a gente projetava...esqueci o nome...
P1: slide?
P2: não, é retroprojetor...
PC: isso! também usei muito...eu tenho até hoje...não sei pra que que eu guardo aquilo, mas
ainda tenho...
P2: ah, guarda...eu também tenho milhões guardados, sabia?
PC: mas pra quê?
P2: eu tinha umas que eu ia botando uma em cima da outra, eu ia criando...
PC: é..é...então, a gente usava essas coisas...
P2: essas técnicas...
PC: agora, na realidade, a gente vê assim: mesmo o início sendo livro e giz e coisa, era muito
mais fácil dar aula do que hoje.
P2: mas as pessoas memorizavam mais...
PC: não, eu acho que não...eu acho que você conseguia explicar e a pessoa entender melhor
do que hoje...
P2: ah, é?
PC: acho que hoje tem muita informação, quer fazer muita coisa ao mesmo tempo, ele
(aluno) não presta atenção em nada, eles não sabem ouvir...então você não consegue
passar...é muito difícil, e anteriormente você conseguia fazer grupos, você conseguia botar
monitores nesse grupo, né...é, ele aprendeu mais rápido, porque consegue pegar mais
rápido ciências, então ele é o monitor desse grupo, eu fazia monitor...hoje em dia, você não
consegue fazer um trabalho de monitoria, pelo menos eu não consigo.
P2: é, existe todo um....é, agora a gente fala muito da tecnologia na informática, mas teve
um período que se discutia muito que o ritmo dos alunos era o da MTV...né? a MTV, que é
tudo muito corrido, muito cortado, que a imagem é muito cortada...então como eles
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estavam muito envolvidos com esses programas de televisão, que acaba sendo uma
linguagem que eles incorporam, então é muito assim, não se concentra em nada...
PC: isso...
P2: começa a fazer uma coisa, passa pra outra...
PC: é, eles querem fazer milhões de coisas e acaba não fazendo nada direito...
P2: é, porque a MTV é assim, tem um flash aqui, depois vai pra lá...não tem uma
continuidade, né? Então tem uma linguagem televisiva que ajuda...mas a tua percepção é
uma percepção de que isso é só uma questão de influência da mídia ou...tem uma questão
social também? O que você acha? Porque você acompanha de perto essa...
PC: eu acho que vem de todos os lados...eu acho que vem da mídia, né, mas a gente pode
observar que a mídia, ela vai buscar isso na sociedade, né...
P2: claro...
PC: ela tem que...a sociedade tem que dar a ela o ibope, o tão falado ibope, né...então, o
que que acontece? Na verdade as pessoas estão se aglomerando cada vez mais e elas
pararam de prestar atenção nas coisas...então você não tem mais atenção com nada que
você faz...a coisa é muito rápida...
P2: fluida, né...
PC: é, muito rápida...é como se fosse um celular, você compra esse aqui hoje, daqui duas
semanas ele é velho, ele tá caduco, então isso vai muito rápido e você tem que manter a
máquina funcionando...ninguém tá pensando em dar uma pausa nessa máquina, ir mais
devagar porque tá muito rápido, pensar sobre ela....então você encontra num universo de
200 alunos, 2 que conseguem parar, pensar, analisar o que tá fazendo...ou eles vão
repetindo o que o outro tá fazendo a vida inteira, porque às vezes você passa um trabalho
que ele vai tá...é...olhando, consultando, né...e ele copia do outro...e eu falo assim – mas
você leu a questão?(falando para um aluno) O que ele escreveu (outro aluno) não tem nada
a ver com a questão, você nem leu a questão...quer dizer, ele (o aluno) tem 1 hora e 40
minutos pra fazer, mas ele quer fazer em 10, 5 minutos, então a coisa passa batido...não
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para pra ver... e eu acho que há 20 anos atrás era um tempo mais pausado, mais parado,
né...mais devagar, então as pessoas...
P2: não tinham talvez tanto apelo...
PC: é, as pessoas paravam pra ver o que tava acontecendo...hoje em dia não se faz isso...às
vezes eu paro, olho e falo assim – você tá vendo o que você fez? (perguntando para um
aluno)...o que? O que? (resposta do aluno)...aí eu falo – não, volta e olha de novo (falando
para o aluno)...
P2: o que que a escola precisaria fazer pra poder reverter essa situação? Por exemplo,
porque tem uma coisa forte que tá acontecendo aí fora...mas ela precisa tomar...ela precisa
ocupar um espaço que vá ajudar até ele viver com essa...
PC: eu, agora pode até soar retrógrado, né...uma coisa assim bem antiga, mas eu acho o
seguinte: adolescente, ele necessita ser cobrado, né...é muito mais prazeroso eu ficar na
farra do que eu ficar fazendo alguma atividade que vai me dar trabalho, eu vou ter que
parar...então, se a questão do mérito não acontecer, não vai adiantar...
P2: você acha que a escola não tá...
PC: não...não, o sistema não deixa o mérito acontecer...então, o que que acontece? Eu que
vou me esforçar, vou passar e vou conseguir e o outro que “leeeva”(FORMA COMO A
PROFESSORA PRONUNCIOU A PALAVRA, COM UM TOM MAIS ARRASTADO, DANDO A
ENTENDER QUE ESSE ALUNO É DIFERENTE DAQUELE QUE TEM O MÉRITO DE SE ESFORÇAR
PARA PASSAR DE ANO, POIS NÃO SE ESFORÇA E PASSA DO MESMO JEITO QUE O OUTRO...)
também vai conseguir...na cabeça do adolescente...
P2: você diz na questão da aprovação?
PC: é, questão de tudo...na cabeça do adolescente, ele não percebe que ele se esforçando
ele vai levar uma bagagem muito grande, ele quer o aqui e agora...então se ele percebe que
ele se esforçando e fazendo tudo, consegue o mesmo que esse cara daqui que não faz nada,
é claro que ele vai parar de se esforçar...então o mérito, ele leva a isso...não é voltar...é,
quando a gente fala isso o pessoal fala - ah, quer voltar prova, tirou zero é zero... – não é
isso, é mostrar pra ele (aluno) que se ele não tiver um trabalho, um esforço, ele não vai
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caminhar, entendeu?....então quando isso deixou de existir, porque infelizmente deixou de
existir...
P2: isso não é culpa nem da tecnologia...
PC: não, isso é culpa do sistema...então, como isso deixou de existir, aí você vem com todos
os outros apelos sociais, né, que vão acabar te levando...(INTERRUPÇÃO DA
COORDENADORA PARA SABER SE IRÍAMOS ALMOÇAR NA ESCOLA) - ...aí, no caso esses
outros apelos que são muito mais prazerosos ganham...eu não preciso me esforçar aqui,
então deixa eu ir por aqui, isso aí é fato...e com um detalhe, né...você começa a ver que...é,
o pessoal fala muito em inteligência múltipla e a inteligência não é utilizada na escola.
P2: nenhum tipo de inteligência?
PC: não, porque ele não quer se esforçar pra entender...você fica batendo na mesma coisa, a
resposta é simplesmente: eu não sei, eu não entendo, eu não aprendo – eu falo: gente, não é
possível!
P1: tem um conformismo, né...
PC: é, tem um conformismo nisso e não vai...não vai tentar...ou então...
P2: é como se a escola fizesse parte de um outro universo...
PC: um outro universo...ou eu não preciso...uma vez a garota me perguntou: porque que eu
preciso aprender isso?
P2: mas isso é uma questão interessante...
PC: aí você vira pra ela e fala assim: bom, você...dependendo da área que você vai escolher,
você vai levar isso pra frente. Se você pegar uma área de humanas, você vai levar a biologia
e você vai ter que seguir a biologia até pra você poder se colocar no meio que você
quer...nesse caso...ah, então pra que que eu preciso de matemática? (possível pergunta que
essa aluna poderia lhe fazer)...bom, a matemática vai te acompanhar porque você vai ter
que fazer gráficos...
P2: pra sua vida...
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PC: aí você vai explicando isso tudo...e aí: ah, não sei pra que saber português...aí AH! MEU
DEUS DO CÉU! (ênfase de impaciência na fala da professora com relação ao exemplo de
diálogo com uma aluna). Aí você diz: então não sei mais pra que que você quer saber nada,
né? Entra dentro de uma caverna, fica lá sozinho que você não precisa de nada!
P2: mas isso é uma influência, eu acho, dos valores do meio que ela vive, da família...
PC: é...porque na verdade você tem um meio familiar que não pensa...em grande número
pensa em compensação...a educação se transformou numa compensação, né?....ah, eu
trabalho muito, então meu filho precisa de uma roupa assim, eu tenho que comprar, não sei
o quê...então não vou brigar, então não vou fazer, então virou um ramo de
compensação....ele pode tudo...não tem porque se esforçar, ele pode tudo!...é um grande
erro, mas ele pode tudo (falando no sentido do filho que pode tudo perante a família, o que
acaba se refletindo na escola)...não há motivo para mudar (quer dizer que esse aluno que
pode tudo em casa, não tem motivo para mudar seu comportamento/atitude)...e quando
você chama o responsável na escola, quando eu comecei lá (referindo-se ao início de sua
carreira)...ele vinha e falava assim: professora, o que aconteceu? Aí você diz: olha, tá
acontecendo isso, isso, isso...a gente tá precisando da ajuda da senhora pra poder...ah, pode
deixar (seria a resposta do responsável)....hoje?! ele vem na escola e diz assim: a senhora
persegue o meu filho!... antes de você abrir a boca, você não consegue nem dizer o que está
acontecendo...aí você fica parado olhando pra cara da pessoa e...ok, né...foi o que o pai da
aluna fez semana passada.
P1: bom, então eu queria que você falasse um pouco como você vê a sua profissão, pontos
positivos, pontos negativos...
PC: eu acho que ponto positivo tem o gostar, eu gosto, né...pode ser meio masoquismo mas
eu gosto (risos)...acho que também o positivo você tem, é....de uma certa forma, você
consegue montar o seu dia, o seu horário, as atividades que você vai fazer...então...
P2: você consegue uma certa liberdade.
PC: é, uma certa liberdade, uma grade que você movimenta sem ficar muito presa...você
monta no início do ano, você consegue coordenar bem...é uma coisa boa...
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P2: você acha que isso, só uma pergunta...que você se sente com essa liberdade, não é mais
devido à sua experiência do que realmente à estrutura e ao sistema? Ou é o sistema que
é....porque você é uma pessoa experiente....
PC: não, eu acho que é devido à minha experiência...
P2: é, eu também acho...
P2: é devido à minha experiência...porque na verdade eu tenho dois lados: antes de chegar
ao magistério eu trabalhei em empresas não ligadas a educação...então, você pega aquele
horário todo, né... e você não tem como, né...
P2: você fica presa...
PC: é, isso...então quando você consegue ter essa junção, eu consigo perceber que eu tenho
esse coisa...apesar de levar trabalho pra casa, a gente consegue fazer o trabalho...bom,
peraí, deixa isso aqui, daqui a pouco eu faço, né...você consegue fazer esse jogo, né...
P1: tem uma flexibilidade, né...
PC: é, flexibilidade...agora, quanto aos pontos negativos, eu acho que é o sistema....o
sistema é o ponto negativo...o sistema é péssimo...o sistema é muito ruim...não adianta
ninguém dizer que isso tá bom, não adianta dizer...no meu ponto de vista a coisa só piora...
P2: mas em que aspectos, por exemplo, da infraestrutura, da formação dos
professores...quais você acha que são?
PC: eu acho que piora quando você tira do professor a autonomia pra cobrar do aluno,
entendeu? você pega o professor e torna ele....é, não é que o professor tenha que ser
superior ao aluno, apesar de que tem que ser também...ele tem que ter uma postura
diferente...
P2: ele não tá lá à toa...
PC: é, não tá lá à toa...você pega esse aluno e eleva ele acima do professor...então, qualquer
coisa, o professor não pode falar nada com o aluno...se ele der um grito e esse aluno achar
que o professor não devia dar, que tá errado, acabou, o professor já vai responder processo,
vai responder isso, vai responder aquilo...aí você fica parado, você fica de mãos atadas,
né...você não pode pegar esse aluno e botar de castigo....vai ficar de castigo fazendo
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atividade que você não fez na sala de aula porque estava de bagunça, vai fazer agora!
(dando um exemplo de algo que não se pode mais fazer com o aluno)....se for 10, 5 minutos
depois (do horário regular da última aula), você não pode fazer, entendeu...você não pode
dizer: olha, vou chamar o responsável, olha isso, isso...vai pra casa...você não pode
fazer...você não pode fazer nada...a verdade é que você não pode fazer nada!...qualquer
coisa, qualquer atividade que você faça com o aluno (no sentido de aplicar algum
castigo)....não é uma questão de punição, é uma questão de educação, entendeu?....eu acho
que as pessoas confundiram muito...eu não tô aqui pra educar o aluno...
P2: mas isso é uma questão da escola, do sistema...
PC: é do sistema...eu tô aqui pra ensinar a ele a matéria que eu leciono...a educação, ela vem
em contrapeso, porque aí eu vou ver ele fazendo coisas que não deve, eu vou chamar
atenção dele, vou falar: olha, você faz isso, mas gostaria que fizesse com você? Quer dizer,
então eu vou puxar...a educação vem como uma bagagem extra, mas não é minha obrigação
educá-lo...a minha obrigação é transmitir a eles conhecimentos que eu tenho...
P2: isso o sistema que diz, né?
PC: não, eu que digo! O sistema diz pra mim que não...
P2: que você tem que educar?
P1: que você tem essa responsabilidade?
PC: também, a minha responsabilidade é quase total, o professor vira babá, mãe...
P2: eu sei, mas eles não querem que você repreenda, então como é que fica?
PC: isso é o que eu tô falando, não funciona!...se você não tem os meios de chegar lá, não
tem como você funcionar, entendeu? você tem que ser a mãezona, mas você não pode agir
como mãezona...então você fica girando em torno de um coisa, né...fica ali a vida inteira,
tentando despertar uma consciência que vai vir...
P2: despertar interesse, despertar interesse, motivar, animar...
PC; que vai vir, mas vai vir quando? Com a idade, né? a maturidade...alguns, não são todos
que vem (não vem a maturidade), porque eu trabalho à noite em Caxias e você pega um
garoto de 20 anos e você vê que não veio a maturidade, não veio nada e já tá passando da
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época...já passou, quer dizer...então você tem que trabalhar isso tudo e você tá tentando
tirar ali, mas isso não vai vir agora, talvez lá no meio do segundo grau...então a forma de agir
do ensino fundamental deveria ser completamente diferente...aí quando você liga a mídia, o
cara tá sempre lá falando da experiência dele com o ensino do segundo grau lá.... aí você
olha e diz gente, mas não é a mesma coisa! Você tá pegando uma criança de 7 até os seus
11, 12, 13 anos não é a mesma coisa de pegar um garoto de 16, 17 anos...então não pode
ser a mesma coisa...quando você começa a jogar tudo na mesma coisa não funciona...e pra
funcionar você tem que se desgastar, tem que pedir o apoio de casa e muitas vezes esse
apoio não vem...então pra mim, o contraponto, o ruim é exatamente isso...é uma corda
bamba, sempre sabendo o que você fala, aí qualquer deslize você volta e tem que pedir
desculpa, né...e um aluno falando o que o outro professor fez, eu digo: não é minha
responsabilidade, não quero saber, não é problema meu...porque eu ainda tenho a
vantagem deles gostarem de mim, né...não sei porque é uma característica minha ser
bagunceira, eles gostam de mim também...
P2: eles se sentem abertos...
PC: é, quando pegam o pé do professor, Jesus, acabou, ele não trabalha de jeito nenhum....e
eu vejo professor que não consegue trabalhar...se a turma pegar no seu pé, acabou...não vai
pra frente, então esse é um lado negativo...por que que não vai? Porque a figura do
professor foi rebaixada, quer dizer, o fazer dele foi rebaixado...
P2: e o aluno pode atrapalhar a vida mesmo do professor...
PC; ô!
P2: porque você tá falando...só pra te dar um exemplo, eu me lembro quando eu estava no
segundo grau, estudava no colégio de aplicação da UFRJ e a gente tinha licenciandos que
vinham dar aula na nossa sala de aula e era época da ditadura e a gente conhecia os líderes
estudantis da UFRJ, então a gente sabia quem era contra o movimento, contra a ditadura, ou
seja era a favor da ditadura...então eles avisavam a gente, a gente atrapalhava as aulas dos
licenciandos, que eles iam levar nota, a gente não perguntava, a gente deitava a cabeça,
fingia que estava desinteressado, a gente fazia coisas horríveis....
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PC: e adolescente faz, porque adolescente, como ele ainda tá na formação do caráter
dele...apesar de já ter uma caminhada muito grande ele não se percebe é....adolescentes, às
vezes eles são maldosos, eles são maldosos....entre eles e com o outro que ele não gosta...
P2: é porque ele também tá sofrendo muito...é uma fase muito sofrida...
PC: é, então é essa mudança, é a formação de caráter, então você tem que estar sempre,
né...sempre brigando ali...eu acho que isso é ruim, te tirar os meios até de proteção, né...os
meios de você...além de educar mesmo, que não era nossa função...
P2: agora só pra voltar no nosso tema, que é a coisa do uso da tecnologia, você tá pintando
um quadro do perfil do aluno, da relação dele com a escola, da relação da família com a
escola, e você no início falou da competição com a tecnologia, né...
PC: ahã...
P2: aí, dentro desse panorama, como é que você vê que poderia ser o papel da tecnologia,
ou pra ajudar ou pra atrapalhar mais essa situação?
PC: eu acho que a tecnologia, ela pode ajudar, mas assim, tem que funcionar (risos).
P2: eu sei...
PC: né?
P2: mas finge que ela funciona (risos)
PC: ah, finge que ela funciona...é, tá...eu acho que ela pode funcionar porque você tem um
campo muito aberto, né...no caso do ensino fundamental, a tecnologia, é....a gente ainda
tem que ficar teleguiando ela, sabe?...a gente não pode escrever no quadro assim: entra no
site tal, vamos pesquisar não sei o quê... e ficar lá na frente simplesmente explicando o que
tá ali naquele site, porque ele não vai entrar naquele site...aí, como é um mundo paralelo,
bem aberto, ele vai viajar, né...então, pra que você use essa tecnologia entrando em sites
direto, pro aluno pesquisar ali, eu acho primeiro, né, que as turmas deveriam ser
menores...não pode ser 42 alunos, né?...agora, se for 42, você, pelo menos, tem que ter
umas 3 pessoas dentro da sala de aula, porque você vai estar girando o tempo inteiro, ele
dentro da internet e você está monitorando aquilo...não tem como você não monitorá-los,
né?...se você não fizer esse monitoramento, a coisa vai degringolar, né....então você precisa
228
disso...agora, tem coisas assim muito boas, que eu mesma pego algumas coisas muito boas
na internet e trago, às vezes baixo vídeo e não sei mais o quê...agora atualmente estou
trabalhando muito com power point, que me facilita, né? Bastante...pela internet não estar
funcionando e pelas imagens....acho que estavam consertando ontem...estavam passando
cabo...
P2: eles detectaram que o cabo da rede do servidor estava entrando em conflito com o
roteador, então por isso é que estava tendo problema de rede...então eles separaram o
sistema, é...ela (a diretora) me explicou que é provável que agora fique bom....
PC: então a gente agora volta ao vídeo do youtube, tem muita coisa boa no youtube...
P2: agora, por exemplo, usar a tecnologia para os alunos construírem alguma coisa, pra eles
desenvolverem, em vez de só pesquisar...
PC: ah, sim, ver por exemplo....em termos de construção de sites, de jogos, isso eu não
tenho essa capacidade, né...mas em termos de construir tirando da internet para o caderno,
aí sim...no caso de um vídeo, assistir e depois discutir, conseguir resumir aquilo, né...fazer o
que eu já fiz com eles, que você vai relatando o que foi acontecendo naquele vídeo, ele
poder ver todo o processo que acontece numa transformação, numa metamorfose, porque
ele tá vendo a sequência e depois conseguir passar aquilo pro papel, mapeando aquilo é
legal...agora fazer na internet eu não tenho essa capacidade não...
P2: projetos não?...
PC: eu não tenho essa capacidade não....acho que alguns alunos até têm, mas eu
não...hahaha...
P1: de repente alguns têm...
PC: tá mais no mundo deles, né....
P2: existe um mito, não mito não, teorias até...mito é bobagem...mas que falam assim:
quando a gente envolve o aluno numa atividade que ele é o responsável por construir o
material, construir o projeto, alguma coisa que ele acaba se concentrando mais, que ele se
motiva mais e quando esse projeto tem relação com alguma coisa mais diretamente ligada à
229
vida cotidiana dele, pra ele poder entender pra que que ele tá fazendo aquilo, né...aquilo
também envolve ele mais...
PC: é...tem dois lados, porque por exemplo, no caso do jogo da saúde do 6º ano, né...ali eu
fui colocando, colocando, colocando...aquilo na vida deles, o que acontece com a gente aqui
no Rio de Janeiro, aí fui puxando lixo, fui puxando um monte de coisa e mesmo assim você
consegue umas respostas bem...é...vamos dizer assim...bem menos desenvolvidas do que
nós gostaríamos...ou eles começam a se repetir, né...ou eles vão repetindo o que você está
falando...
P1: tentando procurar uma resposta certa...
PC: é, e quando às vezes você coloca uma questão pra eles que não tem resposta certa, é a
sua opinião, não sai nada...
P1: difícil...
PC: é difícil...é por isso que eu tô falando...não é que seja ruim, eu acho que você consegue
isso já quando você vai chegando no 9º ano...se o 9º ano for uma turma interessada, do 8º
pro 9º ano você já começa isso...então você vai conseguir isso muito a nível de segundo
grau, porque isso já foi tudo construído e desconstruído no ensino fundamental...eles não
vão conseguir isso no ensino fundamental...aí você recebe aquelas respostas repetitivas,
aquilo que você falou...aí você volta, não, não é isso, aí você vai ensinar a eles de uma certa
forma a pensar.
P1: eles têm uma dificuldade nisso, de organizar o pensamento...
PC: de organizar o pensamento...de saber que não é porque está nas palavras dele que está
errado, entendeu?...então você vai ter que construir isso...então isso tudo vem sendo
construído aos poucos, no ensino fundamental são raros os que conseguem...muito raros...aí
você pega um monte de trabalho, você fica olhando assim..
P1: de conseguir trabalhar com independência, né?
PC: com independência, é...são raros...você vai construindo essa independência, aí você
começa a ver aos poucos no 8º ano e no 9º, aí no 9º vai ficando...quando o 9º é
interessado...aí você vai havendo essa liberdade...
230
P1: por exemplo, no 9º ano agora você passou aquele trabalho pra eles fazerem a maquete
sobre as energias...provavelmente eles vão procurar na internet, vão se basear na internet
pra construir um modelo...
PC: é, o que aconteceu?...a gente deu energia no início do ano, aí demos as energias
alternativas, enfim...aí querem que eu faça pra feira (referindo-se à Mostra Pedagógica da
escola) trabalho sobre energia...eu digo: gente isso dá um trabalho!....aí eu peguei no pé
deles, porque eles estão com a média muito boa (risos – isso foi uma ironia da professora
pois na verdade a média da turma não estava boa), eu falei assim: então a recuperação de
vocês é o trabalho.
P2: ah, legal...
PC: aí eu quero prós e contras, né...de um tipo de energia...então cada grupo ficou com um
tipo...tem a eólica, tem a solar, tem a biomassa, tem a energia das marés, tem a hidrelétrica,
então cada um vai pegar o seu tema e desenvolver. Eu fiz isso no ano retrasado com o 9º
ano, mas eu fiz no power point, eu tenho de todos eles...eles fizeram muito bem...
P1: aí eles fizeram as apresentações...
PC: eles que fizeram as apresentações e explicaram...não fizeram maquete...agora ela quer
maquete (referindo-se à coordenadora pedagógica), então vamos fazer maquete, pronto!
Vamos ver o que é que vai sair...
P1: provavelmente eles vão usar a tecnologia pra pesquisar e é uma forma deles estarem
usando pra uma construção, né? É um trabalho deles...
PC: é, também...aí eles falam: ah, mas energia das marés?! ...e eu falo pra eles: entra lá no
youtube que você vai ver...bota lá, energia das marés que ele vai te mostrar inclusive que já
é usada no Brasil, no nordeste, vai lá...já tem um protótipo que tá em teste...aí eles falam:
não, eu tô olhando, não sei o quê...isso, tem que procurar, porque se não, não vai pra frente,
você fica a vida inteira remoendo a mesma coisa e não anda...
P1: Bom, então, a gente já falou sobre várias coisas, mas eu vou tentar voltar um pouco no
roteiro. A segunda etapa do roteiro seriam questões relativas a tecnologia, especificamente
o computador e a internet na sua vida pessoal e na sua vida como professora. Pra gente
saber um pouco como é que você lida fora da escola, na sua vida pessoal...
231
PC: pessoal, eu na verdade utilizo pouco. Eu tenho facebook, tenho e-mail, mas utilizo
pouco, entro pouco...
P1: mas, assim, porque você não tem interesse mesmo ou porque você não tem habilidade...
PC: não, é porque me cansa...
P1: mas você sabe usar?
PC: sei usar, mas me cansa...eu entro, vejo o que tem que ver e....só as coisas que são
realmente importantes e vou embora, né...
P1: você não é muito ligada nisso...
PC: não, não....
P2: você faz as coisas úteis...
PC: úteis, é...não é aquele negócio de ficar passeando...
P2: aquele negócio também de ficar conversando fiado...
PC: não...não...eu gosto de conversar cara a cara...esse negócio de ficar...nem telefone eu
gosto de ficar telefonando...aí agora pra trabalho eu já pesquiso bastante...no google,
principalmente imagens, coisas pra fazer power point, baixo filme no youtube pra ver dentro
da minha matéria o que é que eu posso utilizar...aí eu uso bastante, mas na vida pessoal eu
uso o estritamente necessário.
P1: você acha que para o trabalho a tecnologia te ajuda?
PC: me ajuda bastante!
P1: deixa mais fácil?
PC: mais fácil...assim, em termos eu acho de visualização...porque eu acho que eu falar e ele
visualizar, eu acho que você tem dois meios para gravar, né...você tá vendo, tá ouvindo, quer
dizer, mesmo que você não lembre o que foi a matéria....é o que eu tava falando outro dia:
que lei é essa de ação e reação? (pergunta da professora para um aluno)...ah, não
lembro...(resposta do aluno)...você não lembra das meninas, uma puxando a outra?
Gêmeas? Da foto? (professora)...ah, é (aluno)...pois é (professora)...então, eu acho que você
232
puxa pela imagem, né, e ele já consegue captar o que é que tá acontecendo ali...eu acho
interessante...
P1: é verdade....e...bom, acho que você já falou um pouco sobre isso...de como é que você
vê a relação da tecnologia com a educação, você acha que é uma relação possível? De
integrar?
PC: é possível...quando funciona, hahaha....
P2: você usa e-mail bastante?
PC: não, não uso bastante não...já usei, mas depois me cansou também...ah, tem muita
besteira...
P1: mas você consulta todo dia?
PC: não, todo dia não...
P2: como é que você aprendeu a usar essas coisas?
PC: ah...por interesse mesmo...
P2: não fez nenhum curso?
PC: não, não...por interesse mesmo...
P2: alguém foi te ajudando?
PC: não...eu falo assim: Bruno, vamos fazer um e-mail aqui!
P2: Bruno é quem?
PC: Bruno é meu filho. Aí ele: ah, vai e faz assim e assim... e aí eu: ah, tá, tá bom....ah, tá
aqui meu e-mail...
P2: aí ele fala: tecla aqui, tecla ali...
PC: não, não...porque eles não têm essa paciência, né?
P1: você vai mexendo sozinha...
PC: é...é, meio curiosidade, né...aí você entra...
233
P2: às vezes as pessoas que usam muito, elas não conseguem fazer num ritmo pausado pro
outro acompanhar...
PC: é...quem usa...
P2: é porque elas nem sabem fazer pausado...
PC: não, porque o Bruno fala assim: poxa, já falei, é isso assim, assim...aí eu falo: ai, meu
Deus, então deixa pra lá! ...aí, por exemplo, vou fazer uma palavra cruzada (referindo-se à
um tipo de exercício que costuma usar com os alunos), eu entro lá (internet) e coloco
“palavra cruzada” e então vamos ver o que que acontece, né...até achei o Educolorir, que é
boa...aí jogo lá e vou fazendo...aí ele: tá fazendo?...aí eu: tô...deixa pra lá que eu me viro
aqui...aí vou fazendo...vou xeretando...
P1: na verdade os alunos também aprendem assim, a maioria das pessoas hoje em dia
aprende assim...
PC: é, mas na verdade porque eles já nascem nisso, né..
P2: não, e o computador tá cada vez mais fácil....
PC: é...e eles nascem nisso...eu nasci antes disso.
P2: mas você sabe que outro dia, na banca do Fernando, de um aluno meu, apareceu um
professor que falou uma coisa maravilhosa...porque a gente que estuda essa área tá
acostumado a dizer assim: ah, nós não somos nativos digitais...porque a juventude é nativa,
ela já nasceu na era da informática. Ele falou: eu não sou nativo digital...ele é mais velho até
que eu...mas eu vi a informática nascer (continuação da fala do professor citado)...
PC: eu também!
P2: você também, é exatamente! E a gente não pode se colocar nessa posição tão
diferenciada...
PC: não, é que quando a gente diz assim, o nativo...é porque quem é o nativo, ele faz a coisa
tão rápida que...aí você para e fala: não, peraí, peraí...que foi que você fez aí?....aaaahhhh!
foi assim, assim , assim (exemplo de resposta que o nativo digital dá)...quer dizer, ele não
explica pra você, ele faz pra você...
234
P1: é natural pra ele...
P2: e ele não tem paciência...
PC: é natural...ele não explica pra você, ele faz pra você, então você fica sempre parado sem
saber....aí eu vou pelo caminho deles....e se quebrar? Joga fora e compra outro, pronto,
vambora...e assim vai...
P1: e antes de aqui a escola ter o programa do PROUCA, com os computadores, você já
costumava usar a tecnologia com eles de alguma forma? Com um computador seu, você
trazia?
PC: não, a gente usava mais era o DVD, né...porque a gente sempre teve televisão...usava
por exemplo filmes comerciais até no caso, muitos deles, que você pode jogar na matéria,
tipo o “Formiguinhaz”, né...que no caso do 6º ano ainda é interessante, ainda conseguem
ver...então você vai procurando assim, se você vai dar no 7º ano, você pega “Eu sou a
Lenda”, que é do vírus, então você trabalha vírus...então você usava mais esse lado, né...
P2: em filme, né?
PC: é...
P2: agora, laboratório de informática, esse é o primeiro que tem aqui na escola ou já teve
antes, há mais tempo?
PC: não, esse é o primeiro....
P1: mas você ainda não usou...
PC: não...eu acho que não dá não...(responde baixinho, brincando, como se ficasse com
vergonha por responder negativamente)
PC, P1, P2: risos
P1: bom, a gente tentou...a gente tá usando nas atividades agora...(referindo-se às
atividades do conceito de saúde e diário do corpo que foram feitas com as turmas de 8º ano
– foram feitas envolvendo tempos de aula dessa professora de Ciências, mas também de
outros professores)
PC: e tá legalzinho, né?
235
P1: tá, tá funcionando....tem alguma coisa lá com alguns estabilizadores que não ligaram,
mas assim, de um modo geral a maioria dos computadores tá funcionando...
PC: eu acho também que você começa vendo o exemplo dos governantes, eles fazem as
coisas ao contrário, né...saindo até do computador que é um exemplo também, você manda
um monte de ar condicionado, mas não endireita a instalação elétrica! Então a instalação
elétrica não aguenta o ar condicionado, então como é que você liga? Não liga....a mesma
coisa acontece com os computadores...
P1: é o problema de lá (a sala de informática)
P2: não tem infraestrutura...
PC: é, você manda as máquinas sem infraestrutura...ou a coisa tá tão rápida que quando a
infraestrutura vem a máquina já caducou...
P2: é, é verdade...
PC: o próprio UCA é esse exemplo...
P2: é verdade, é verdade...
PC: né? Aí você pega um computador que já tinha uma deficiência, defasado, né...
P2: porque a filosofia dele era essa, ser o mais barato possível...
PC: peraí, mas não precisava ser tão simplório, né? Quer dizer, aí você pegou aquilo já com
uma deficiência, vamos dizer assim, aí quando você vai usar você bate de cara com uma
internet que tá capenga...aí você tenta baixar um vídeo, aí ele não passa, aí você tem que
passar pro outro pra fazer não sei o quê...eu fiz provas online, botei pra turma, lembra?
(perguntando para P1)...só duas pessoas conseguiram fazer online, hehe....
P1: eu me lembro...não funcionava a internet...
PC: aquilo me deu um nervoso e eu tenho várias feitas ali, porque eu fiquei
entusiasmadíssima! Achei que ia ser muito legal! Aí eu fiz um monte...outro dia eu tava
olhando em casa, eu falei: puxa...
P2: quem sabe se a rede funcionar...
236
PC: é, se a gente não consegue voltar a fazer, né...é porque ele (o aluno) tá interagindo
naquilo ali, você bota imagem até que se movimenta e ele vê o movimento da imagem, quer
dizer é uma utilização da tecnologia, aí você dá de cara com o troço que não....aí eu fui e tirei
xérox...aí voltou pro papel, eu falei gente: que horror, que bagunça que eu fiz...
P1: e é uma oportunidade deles usarem no modelo de um computador por aluno...
PC: pois é, e o troço não funcionou
P2: é, eu até queria voltar nisso, porque por exemplo, se a gente acompanhar assim, dentro
das escolas, num primeiro momento o que aconteceu é que houve nos anos 90 um grande
boom de laboratórios de informática...então, existia...
PC: quando eu cheguei tinha um armário, que eu não cheguei a usar, né, porque quando eu
cheguei já estava tudo ruim...tinha um armário parecido com esse assim, com substâncias
químicas...
P2: ah...tipo um laboratório...
PC: é...aí, quando eu cheguei eu dei uma olhada assim, eu disse: nossa, como tem coisa
vencida aqui...estava tudo vencido, fechado...aí falaram assim: dá pra usar...eu disse: não,
não vou usar ácido vencido, essa coisa toda vencida aí não, isso aí pode descartar...
P2: perigoso, né...
PC: aí, não houve mais reposição...eu acho que isso também tem a ver com o modo como se
vê, é....aí entra a política também, como se vê a educação como uma mercadoria, porque
você não tem uma continuidade...então mudou o governante aquele projeto para e vai fazer
outro projeto ou muda de nome ou faz não sei o que...aí você fica parado, tudo vai parando,
é tudo estanque, então você não caminha com isso.
P2: e no campo da tecnologia educacional, eu me lembro assim, que nos anos 90 existia o
laboratório de informática em algumas escolas, então o que que acontecia? Botava um
monitor, que normalmente era alguém da área de tecnologia, técnico, e aquele monitor
ensinava a usar o processador de texto...e era muito difícil fazer a relação entre o aprender a
informática e a sala de aula...
PC: é verdade...
237
P2: e existia uma crítica muito grande...
PC: eu quando trabalhava na Charles Anderson, que é uma escola também aqui do município
do Rio e tem um laboratório muito grande...acho que dá uns três desse aí (referindo-se ao
laboratório de informática da escola Madrid)...é uma sala bem grande e ela era usada assim,
só que o que a gente começou a fazer? A gente lá começava a fazer assim, é...pedia a pessoa
que era a professora da sala de informática, a gente dava um tema, né e dizia quais eram os
locais que tinha que entrar e já mandava o aluno com o trabalho pra lá, então eu cheguei a
usar assim, foi bom...
P2: dessa forma...
PC: é, dessa forma foi bom...por isso que eu tô dizendo que aqui funcionaria, porque lá eu
fazia assim...
P2: é, mas isso às vezes...é...tem vários autores que criticam porque dizem assim: bom, a
tecnologia tem que entrar na sala de aula, ela tem que ajudar a mudar o ensino, né...trazer
novas linguagens pra dentro do ensino e eu acho que dentro dessa filosofia é que existe a
questão do um computador por aluno, né...pra que em vez de o aluno sair da sala pra ir pro
laboratório e aí não interage diretamente com o seu professor de história, geografia, de
linguagem, de não sei o quê, e aí ele vai pra sala e dentro daquela problemática do cotidiano
daquela disciplina, seja ciências...ele vai usar a tecnologia pra poder acompanhar, aprender
aquela matéria no seu cotidiano....
PC: sim, mas aí o um computador por aluno não pode ser o UCA.
P2: isso é uma boa questão.
PC: é porque na realidade, é...
P1: mas você quer dizer o equipamento?
PC: exatamente...
P2: ele é insuficiente pro que você precisa...
PC: porque na verdade, olha só, a gente vai pegar um tema, vamos dizer que a gente vá falar
sobre energia ou qualquer outro tema, então vamos procurar o que tem na internet, vamos
montar um painel, vamos organizar um conhecimento...que não precisa nem ser dentro do
238
computador pra não gastar toda a memória do computador, mas esse computador vai ter
que ter alguma memória pra reter alguma coisa ali...
P2: exatamente...pra ele capturar...
P1: pra baixar...
P2: pra poder trabalhar em cima...
PC: pois é, pra trabalhar em cima daquilo ali, então não pode ser um aparelho desse...
P1: que não permite que salve nada...
PC: que no final das contas você não salva nada, você não pega nada e fica uma coisa muito
solta...
P1: você queria baixar jogos, né...
P2: então, no final das contas a gente poderia dizer que no fundo, no fundo, só serve pra
entrar na internet e olhar...
PC: pra entrar na internet e você fazer esse tipo de estudo direcionado...
P2: isso quando funciona...
PC: quando a rede funciona, porque se a rede não funcionar ele não vai...aí toda vez que...aí
eu aprendi, né, quando eu tentei trabalhar com o UCA, que depois eu desisti, vou ser
sincera...aí eu comecei a trazer o plano B e no final das contas era sempre o plano B que
funcionava...aí eu falava: gente, isso é um cansaço...porque aí eu chego em casa, eu tenho
que fazer duas atividades diferentes por turma...aí eu fui largando de mão...aí eu voltei para
o power point, eu tenho vídeos no pendrive, aí quando a internet tá funcionando, você entra
num vídeo aqui, faz um outro trabalho, aí você vai se adaptando à carência, o que eu acho
que também é um erro do professor...
P2: se acomodar...
PC: é um erro muito grande...a gente não deve se adaptar à carência, não tem não faz...faz o
relatório e diz: não tem! ...Porque na realidade, a coisa fica mascarada, sabe? Vai se
mascarando, mascarando...
P2: os problemas reais não aparecem...
239
PC: não aparecem porque o outro disse: não, está funcionando... aí você olha na cara do
cara, porque você tá lá dentro, você sabe que não tá funcionando!
P2: isso é muito importante o que você tá falando...
PC: você sabe que não tá funcionando, aí você fica: pô! Mas funcionou como?...aí tinha
época que eu falava assim: mas como é que funcionou com fulano se não funciona comigo?
Não é possível! Tem alguma coisa comigo. Aí eu fui ver o que é que estava funcionando e na
verdade não estava funcionando...o que tá procurando é um caminho, o tal do plano B. O
que que é o plano B? É eu fazer dois trabalhos, ou eu vou trazer xérox ou eu vou ter um
pendrive ou eu vou ter não sei o quê...aí, poxa, então não tá funcionando! Não é pra isso
que foi feito. Ah não, mas dá pra fazer...(exemplo de alguém argumentando com ela)...eu
falei: ah, mas não é assim! Dá pra fazer!...então a gente vira o quebra galho e não era pra
ser assim, né? É...uma das coisas que você perguntou o que era ruim na educação, é uma
coisa que me irrita muito, né...porque eu não sei se é pelo tipo de criação, não sei...é o que
tá certo, tá certo, o que tá errado, tá errado!...o que funciona, funciona, o que não funciona,
não funciona! Pra mim não existe o meio termo...é meio certo...eu falo: gente, ou tá certo ou
não tá certo, não existe isso...ou vai dar ou não vai dar...aí você fez todo o planejamento
aqui, aí trouxe, aí você olha e diz, não peraí que eu vou salvar isso tudo aqui no computador,
no pendrive porque se acontecer alguma coisa no pendrive tá gravado no computador, aí
você...pô! eu tô fazendo três trabalhos em vez de fazer um só! Aí a pessoa diz: você tem que
fazer o centro de estudos aqui porque você tem que cumprir a hora de planejamento...ah,
porque o que eu faço em casa não conta, né? Deixou de contar em alguma parte da minha
vida que eu não sei qual foi, mas parou...então isso me irrita muito...me irrita muito a pessoa
ir para os meios de comunicação e dizer que tudo dá certo, que é assim, que é assim...e você
olha praquilo e fala: Jesus, eu tô há mais de 25 anos em sala de aula, não está certo, tá
errado e a pessoa tá dizendo...
P2: ou não é isso que acontece de fato...
P1: não é essa a realidade, né...
PC: poxa, a gente se sente uma coisa totalmente fora da realidade, fora da época,
totalmente desnecessário, não sei...eu acho...
240
P2: você acha, por exemplo, que de alguma maneira, o fato de a gente (pesquisadores da
UFRJ) ter vindo pra cá fazer essa pesquisa e você ter tido uma parceria com a Diana ajudou
em alguma coisa nesse processo?
PC: ajudou principalmente na busca de material na internet, né...porque leva tempo...eu não
sei se é porque nós fazemos a coisa mais devagar, mas leva tempo porque você tem que
baixar, você tem que assistir pra ver se aquilo condiz com a realidade, pra ver se pode ser
utilizado na sala de aula, se tem alguma coisa que não pode ser utilizado na sala de aula,
então tem todo um procedimento...então você não assiste um vídeo, você assiste um, dois,
três, quatro, cinco, seis...tem uma hora que você fica parada assim, você já não quer assistir
mais nada, porque mesmo que ele seja de 20 minutos, são 6 vezes 20 minutos...
P2: é, eu sei, é....
PC: então quando tem outra pessoa que manda um e-mail pra você e fala: ó, o vídeo tal dá
pra casar com tal coisa...aí você vê e fala: ah, que legal esse vídeo, pô vou usar...então ajuda
pra caramba..
P2: faz uma parceria...
PC: faz uma parceria de você pegar material e você saber que aquele material você já vai
direto, já pode adequar...quer dizer, se no 6º ano eu ia perder uma hora e vinte, eu já perco
com o 9º...quer dizer, perco entre aspas...
P2: aí você tá multiplicando a sua possibilidade de usar mais...
PC: é no sentido de usar em várias séries, né...em vez de numa só...
P1: mas com relação a essa proposta de ter um computador por aluno, independente de
você usar ou não, a ideia...
PC: a ideia é excelente! Eu acho a ideia excelente, com um detalhe: a gente precisaria de
uma turma menor ou de no mínimo três pessoas dentro da turma...batendo sempre que a
gente tá formando o aluno, não adianta dizer que ele vai chegar aqui no 5º, 6º, 7º ano
formado e com a cabeça sabendo o que tem que fazer aqui e o que é pra fazer em casa, o
que ele pode fazer aqui e o que ele pode fazer no shopping...ele não tem essa cabeça...a
gente tá formando ele, então você precisa monitorar, né...porque, por exemplo, lá em
241
Caxias, eu estava dando aula e aí daqui a pouco chega uma mãe na escola com a XXX minha
(NÃO ENTENDI ESSA PARTE) e tá lá falando, falando, falando, né...as pessoas são muito
educadas (tom de ironia)...e eu tô na sala de aula, tô explicando a matéria, não sei o que...aí
vem: Regina, você pode dar um minuto?...eu falei: pode ser daqui um segundo?...aí a pessoa:
não, agora...aí falei: pô, eu vou interromper...bom, tudo bem...gente, espera só um
minutinho que eu já volto...aí fui na sala da coordenação...ela (a mãe de um aluno) estava
fazendo um escândalo, aí eu olhei pra ela e falei: não tô entendendo o que tá
acontecendo...ela disse: a minha filha está na sala de aula? Eu falei: ué, está...ela está na
sala de aula...e ela: como é que ela está na sala de aula e ela está postando no face?
(facebook)...aí eu olhei pra cara dela e falei assim: porque além dela, tem 43 alunos, eu estou
no quadro explicando, ela está sentada lá no final da sala, a sala é cheia, não tem como eu
pegar o celular dela e tirar...foi a senhora que botou internet no celular dela? Então a
responsabilidade não é minha, é sua, né...ela deveria saber que não é horário de usar...eu
não tenho como fazer isso, sou uma só, são 44 na sala de aula...
P1: é muita coisa...
PC: nem se eu tivesse uma visão de raio X, minha senhora, tá meio difícil, né? Super-
homem...aí ela: ah, que não sei o que....eu falei: não, a responsabilidade não é da escola
não...primeiro que não é material escolar, já tem uma regra que tem que ficar dentro da
mochila, quando a gente vê a gente manda guardar...agora não tem como você ver 44 ao
mesmo tempo...a senhora deveria chamá-la e não a mim...não sou eu que tô no face, é a sua
filha...não é não?...então você precisa ter uma redução do número de alunos na turma ou
então quando for usar esse tipo de material (referindo-se a um computador por aluno), ter
outras pessoas na turma que possam monitorar, entendeu?...com 44, cada um no seu
computador? Não tem, uma pessoa só não tem como fazer...não adianta, ele vai viajar com
certeza...
P1: agora com relação assim....você percebe que tem alguma diferença no comportamento
dos alunos, na atenção deles, na disciplina quando você usa algum recurso tecnológico e
quando não usa?
PC: ah, eu acho que tem, principalmente quando tem imagens...eu acho, porque eu desenho
muito bem, hehe...(ironia)...então só você ter a imagem e essa imagem poder mostrar pra
242
ele exatamente como é ou você ter essa imagem em movimento, né, isso chama
atenção...até imagens que não têm nada a ver com a matéria, porque às vezes eu tô fazendo
um exercício, aí bota uma imagem engraçada, aquilo puxa a atenção dele...então de
qualquer forma ele pensa que é só brincadeira botar o Catatau, né...mas não é só
brincadeira, ele é obrigado a olhar o Catatau, então ele vê o que tá em volta, então eu acho
que isso atrai ele pro quadro, né o colorido, as imagens...se tiver movimento melhor
ainda...quando eu botei o movimento do coração na 801 (turma de 8º ano), eles ficaram
parados olhando, quer dizer então você tá vendo o movimento real, né...porque você faz
com as mãos: olha gente, sístole, diástole...(a professora demonstra o movimento de sístole
e diástole com as mãos, como também faz em sala de aula)...ele tá vendo duas mãos
fechando, apesar de ser um movimento ele não consegue abstrair, né...aí quando eu joguei
a imagem grande do coração fazendo, aí ficou todo mundo parado...então você consegue
puxar mais a atenção dele, aí você começa a mostrar: tá vendo ó, tem a válvula, apertou
aqui o sangue não volta porque a válvula fechou, então ele tá descendo...então você
consegue colocar a explicação, né, ali dentro...eu acho legal, acho muito legal.
P1: especialmente em ciências, né...
P2: você já trocou e-mail com os teus alunos?
PC: não, nunca...nem quero!
P2: não, só pra saber...não tem problema nenhum, perguntei por curiosidade, hehe...
PC: hehe...é porque...
P1: e no face? Eles não te adicionaram? Não sabem que você tá no face?
PC: não, não sabem...e eu acho que também porque eu entro tão pouco, que eu acho que se
entrar vai demorar um tempo...
P2: eu também entro pouco...você me tem no face? (perguntando para P1)
P1: eu não tenho face, hehe....
P2: eu não entro quase...
243
PC: eu entro uma vez por semana, mais ou menos....aí eu entro, dou uma olhada, vejo se
tem alguma coisa que seja útil, ou até engraçada, pra rir e passo adiante...tão querendo que
eu bote whatsapp...zap zap...
P2: whatsapp é bom...
PC: aí eu falei: em nome de Jesus, não quero isso não...
P2: mas no whatsapp, a vantagem é que você pode mandar a mensagem e não pagar...
PC: é...
P2: né, porque se você pagar SMS...
PC: ah, mas toda hora aquele troço fica pi, pi, pi...eu vejo o telefone das minhas colegas...eu
falo: gente, toda hora isso vai ficar assim? Chamando? Não quero não, hehe...aí na verdade
eu...eu sou de gêmeos, eu tenho dupla personalidade, hahaha...
P2: ah é? Gêmeos é de que mês?
PC: junho...então é melhor não entrar no meu face, hahaha...até posso fazer uma parte pra
eles...eu tinha iniciado fazer um blog, depois eu me desinteressei e depois eu me interessei
de novo, mas eu perdi o treco do blog, eu tô catando lá em casa onde é que tá...
P2: mas se você quiser a gente te ajuda a fazer!
P1: eu já tinha pensado numa coisa assim que era interessante ter um lugar assim...você fez
as apresentações de power point que você passa pra eles, aí você podia falar: gente, quem
quiser ver a matéria, tá lá, eu coloquei lá no blog...
PC: eu já pensei nisso porque eu tô fazendo muitas coisas, né...
P2: ah, faz isso...a Diana pode te ajudar...
P1: é!
P2: a gente pode ajudar...
PC: porque eu tenho blog, agora eu tenho que descobrir onde é que tá, hehehe...né, porque
tá parado...
P2: mas você pode até começar um novo se você quiser...
244
P1: é...
PC: é uma boa ideia, mas eu acho que eu tenho o nome, não tenho é senha, essas coisas...
P2: você esqueceu, né?
P1: agora, e você tem preferência por usar algum tipo de recurso na aula?
PC: eu gosto muito de vídeo...
P2: ela já falou muito isso...
PC: muito de vídeo...
P2: claro, a questão da imagem...
P1: é, verdade...
PC: eu gosto muito de imagem...
P2: é, eu já reparei...
PC: é por isso que eu boto muita imagem, até nas minhas provas tem muita imagem...e eu
tento ensinar eles a ler a imagem, porque é uma forma de leitura, né?...é, por exemplo, no
6º ano eu botei a imagem de um urso caminhando e ele tava usando um cachecol e tem
folhas e era como se o vento estivesse passando e tudo voando, né...aí eu botei “como é que
eu provo a existência do vento?” aí bastava olhar a imagem, né? E muitos não conseguiram
ler a imagem...então eu fico mostrando depois: olha, tá na imagem a resposta, presta
atenção...então eles têm que também começar a ler a imagem, né? Eu não vejo a imagem
de você ler só em termos de escola, de matéria, se você tiver na sua vida social e você
souber ler uma imagem você vai saber o que fazer, então é necessário que você saiba que
essa comunicação existe...olha a imagem, olha o rosto da pessoa, olha os olhos da pessoa, vê
o que que tá acontecendo ali
P2: o que é que tá por trás...
PC: então, eles têm que aprender a ler imagem...então eu gosto muito de imagem e se a
imagem tiver movimento eu gosto mais ainda...até pra brincar, pra não sei o que, eu gosto
do movimento, eu gosto da imagem...
245
P1: e pensando especificamente na disciplina de Ciências, né, que é uma disciplina que
precisa ter muita abstração...
PC: é, eles não têm esse desenvolvimento...
P1: que só a gente descrevendo é difícil e com a imagem...
PC: a imagem puxa muito...
P1: bom...nossa, a gente já foi falando aqui muita coisa...
P2: várias coisas...
PC: embolou tudo, falou tudo, hehe...
P1: é...aí tinha aqui uma questão pra você falar de exemplos de atividades que você já tenha
usado tecnologia e que foram bem sucedidas...
PC: bem sucedidas?
P1: bom, além do vídeo...o vídeo é sempre bem sucedido, hehe...
PC: é, é...mas bem sucedida, eu tive nesse 9º ano...eles mesmos confeccionaram o material
deles...
P2: no computador?
PC: é, eles confeccionaram power point, botaram vídeos no power point...esse material que
eu tenho até gravado no pendrive...
P1: que é o do ano passado? (referindo-se ao trabalho sobre tipos de energia apresentado
na mostra pedagógica)
PC: é, do ano passado...foi muito bem sucedido...
P2: então, lembra quando eu tava falando que quando eles estão envolvidos numa atividade
que eles são os autores...
PC: é, mas teve que ter direcionamento...
P2: claro que tem...
PC: você tem que tá direcionando...
246
P2: mas eles que construíram...
PC: é, mas isso depende muito da maturidade, por exemplo, com esse 9º ano eu tenho
dúvidas se vai sair...
P1: então, não é só a idade, a questão do perfil da turma também...
PC: do perfil da turma também interfere muito...
P1: porque teoricamente eles estão na mesma idade...
PC: é maturidade que independe da idade da pessoa, né...
P2: e volta aquela questão que você falou da concorrência...porque que você vai ter que
concorrer pra fazer a atividade, né?
PC: é...aí, por exemplo, na turma passada, por mais que eles falassem, se eu começasse a
aula acabou e todo mundo parava...entendeu? eles conseguiam ouvir...essa turma não
consegue ouvir...você muda o aluno de lugar, quando você vira o aluno faz isso
(demonstrando com gesto o movimento do aluno de virar para o colega vizinho e
conversar)...foi o que a Andressa fez hoje, três vezes, eu olhei pra cara dela e disse:
Jesus!...então, não tem o que você fazer, vai muito da maturidade e a maturidade nem
sempre é a idade, né?
P2: é verdade...
PC: aí, aquele compromisso da pessoa, a pessoa saber o que ela tá fazendo ali...
P2: pra quê...
PC: aqui nesse 9º ano você pega o quê? você pega uns 8...o restante...lá são 42...e a gente
pode dar até nome: Maria Luiza, Raissa, Ivan, Caio, Amanda...o resto, os outros estão a
passeio...então o que não tem ainda? Maturidade...às vezes eles falam: não é porque eu sou
burro...eu falo assim: não tem nada a ver com burrice isso, isso tem a ver com interesse.
P2: interesse, envolvimento...
PC: né...eu parar toda hora e tá batendo: eu não sei, eu não quero, eu não entendo, não sei o
que...você cria uma barreira, você tem que transpor a barreira, não é assim...
P2: nossa, isso é tão importante...
247
PC: cada vez que você (o aluno de maneira geral) chega aqui, você bate e volta! Tenta
escalar! Você vai encontrar um monte de barreira aí fora, ninguém vai abrir cada porta pra
você não...você que tem que abrir a sua porta...aí é uma questão da maturidade...aí você vê
turmas que estão na mesma série, mesma idade e que são totalmente diferentes uma da
outra...é deles mesmos...é igual a prefeitura me mandar essa apostila e dizer pra mim que
eu tenho que seguir aquilo ali que vai cair tudo na prova...aí você vai, vai, vai na apostila e o
9º ano para aqui, que que adianta eu sair do meio e ir até o final se o cara não entendeu até
o meio (referindo-se ao conteúdo da apostila)?
P2: é verdade...
PC: aí fiquei eu voltando, voltando...eu só acabei a apostila do terceiro bimestre agora...e a
prova? (referindo-se à prova da prefeitura)...a prova já foi há muito tempo, mas eu falei: vou
fechar a apostila, mesmo que eles não vão usar...agora eu vou iniciar outra quando chegar,
porque ainda não chegou, né...vou iniciar outra, quer dizer eu já iniciei uma matéria
diferente que eu ACHO que está na apostila, então eu sei que é uma matéria que se dá, às
vezes eles não dão a matéria, mas eu já fui puxando Trabalho, Força (matéria de Física
dentro do currículo de Ciências)...aí eu falo: gente, tá todo mundo empurrando para um lado
só, pelo amor de Deus, presta atenção! (referindo-se à uma imagem colocada em sala de
aula pra explicar essa matéria)...o que que a gente faz se a gente tá levando tudo pra um
lado só? Eu falei: gente, é soma, é soma...hehe...quer dizer, é uma barreira que eles criaram
e quem vai romper essa barreira é eles...ninguém vai conseguir fazer isso por eles, tem que
ser eles, aí depende do quê? De maturidade...eu falei pra eles: vocês vão perder tanto tempo
quando vocês acordarem, aí vai ter que sair correndo atrás...quem corre atrás tá no prejuízo,
não conseguiu nada a tempo, tá no prejuízo...você no mínimo tem que andar lado a
lado...ah, mas eu não sei (fala de um aluno)...eu falo: mas você não precisa ser um expert em
matemática, nem expert em português, ela é expert em português, você pode ser só aquela
pessoa que anda lado a lado, mas nunca atrás...porque cada um vai gostar de uma coisa
diferente, senão eu seria professora de francês, ou de alemão, ou de não sei o que, todo
mundo daria aula da mesma coisa e não é assim...eu tenho mais facilidade com biologia,
porque eu amo essa área, eu gosto dessa área, assim como eu amo matemática, adoro...mas
eu não gosto de geografia, mas nem por isso eu deixei de aprender geografia, tenho que
aprender geografia, então você vai...ah, história é chato (exemplo de fala de um aluno)...não
248
é, é que você não faz o link da história com os acontecimentos, tanto passados, quanto os
atuais...
P2: começa a ficar uma história distante...
PC: é, começa a virar uma coisa que não faz parte da sua realidade...eu falei: faz o link, pega,
olha só, você tá perturbado porque o cara lá resolveu degolar todo mundo, essa gente que
faz tudo em nome de Deus, isso lá (referindo-se à um vídeo recente divulgado na mídia sobre
o assassinato de prisioneiros por um grupo terrorista)...mas você já percebeu que em
Pedrinhas (presídio brasileiro) aqui, os prisioneiros fazem isso? Porque que a gente se dói
tanto com lá e cá a gente não tá vendo que são seres humanos também? Tá erraram,
cometeram um erro, ok, mas não tá pagando? E não teria que pagar dignamente? Gente,
olha quantos morrem aqui, morre mais do que na Guerra do Iraque aqui por mês e ninguém
faz nada...quer dizer é uma visão...sei lá, eu acho estranha, acho estranho...e olha que eu
era pra ser super alienada...
P1: por quê?
PC: ah, porque eu venho de uma área assim bem pobre, eu trabalho desde os 8 anos de
idade, minha mãe é analfabeta, meu pai fez mal a 3ª série...quer dizer desde 8 anos de idade
que eu trabalho, trabalho mesmo, trabalho...quer dizer, você caminha, você abre...vim da
ditadura, quer dizer era pra ser, né, aquela coisa assim...não sou nem lá nem cá...aí eu olho
pra eles, penso assim: gente eu ia a pé pra escola, eu saía de Mesquita até Nova Iguaçu
andando a pé de manhã pra escola, voltava a pé, não tinha passagem pra eu ir, não tinha
uniforme, não tinha material, não tinha nada, se você quisesse ir você tinha que ir com o que
era seu...aí comprava aquele sapato que se chamava “tá na merda”, não sei se você se
lembra dele? (perguntando para P2)...a melissa é uma cópia daquele sapato, hehe...
P2: ah, sei qual é...
PC: sabe? Ele tinha um monte de buraquinho, aí o buraquinho era pro pé respirar, né...fedia
feito um troço, por isso que a gente chamava “tá na merda”...aí quando o buraquinho ia
unindo um com o outro a gente pegava linha preta e ia costurando o sapato porque não
tinha dinheiro pra comprar outro...hoje eu falo: hoje você recebem material, recebem
uniforme, recebem não sei o que...
249
P2: ah, é tudo recebido é?
PC: é por isso que eu acho que não tem valor, é por isso que eu falo da questão do
mérito...você recebe tudo, você recebe livro, você recebe caderno, você recebe, você
recebe...você briga porque tem que vir uniformizado, mas você recebeu o uniforme, você
briga porque tem que trazer o livro e você tem que receber o livro de graça...quer dizer você
não tem essa despesa, na realidade a educação que eu tive, que foi toda em escola pública,
a de hoje não chega nem aos pés e você tem todo o material pra trabalhar entendeu?
P2: eu também estudei em escola pública...
PC: aí eu fico olhando assim eu falo: gente, o que é isso?...
P2: eu acho que existia uma diferença...
PC: um compromisso, uma maturidade, uma cobrança em CASA...
P2: eram muito poucas pessoas também que iam pra escola...eu acho que o Brasil aumentou
muito o número de pessoas que estão na escola, então houve uma grande massificação, só
que a qualidade não acompanhou...
PC: isso, mas você tem que massificar sem perder a qualidade né...e isso tá acontecendo em
todos os níveis, porque cada vez mais você tá tirando a qualidade e massificando a coisa e
não é por aí...é isso que eu falo que tá tudo errado...você tem que dar oportunidade, todo
mundo tem que ir pra escola, mas você tem que dar a essa pessoa qualidade...não adianta
eu estar na escola se eu não vou aprender a ler, eu tenho aluno no 6º ano que não sabe
escrever...
P2: que coisa...
PC: e o que que fez ele chegar ali? O sistema, o cara não pode reter ele lá embaixo...ele (o
aluno) vai até o 4º ano, eu acho, sem ser reprovado...aí você vai reprovar no 4º ano porque
ele não sabe escrever?
P1: não pode ser reprovado?
PC: não, é automático...ele vai, vai, vai...aí você fica...
P2: você avalia o sistema...não tem aquela prova SAEB?
250
PC: é por isso que eu estou falando, o sistema não funciona...
P2: mas você avalia o sistema...(no sentido de que o que é avaliado com provas do tipo SAEB
é o próprio sistema)
P1: o ensino fundamental II pode reprovar, mas tem uma cota também né?
PC: tem, no 6º ano tem cota e no 9º ano também tem cota...aí quando o aluno fica
reprovado no 7º você faz um projeto...aquilo que tá ali (referindo-se à turma de projeto que
existe na escola Madrid)...e aí se o aluno ficar reprovado no projeto, você coloca ele de novo
na sala normal...que que você faz com esse aluno? Eu tenho três na 701, você sabe quais são
esses três (falando diretamete para P1)...mal sabem copiar, mal sabem ler...
P2: agora voltando à tecnologia, tem alguma coisa que você conhece sobre o uso de
tecnologias de computador e tal, que você gostaria de ter usado, além do power point que
você falou, que...
PC: que eu conheça? É, são os quiz né, as atividades e jogos online
P2: você não conseguiu usar...
PC: que eu não consegui usar, é, eu tava até falando que eu achei uns jogos online pro 6º
ano, que eu ia tentar baixar...porque também tem isso, né, tem um certo defeito entre o
teclado e a cadeira (ironia)...eu vou tentar baixar, gravar e ver se a gente consegue gravar
(referindo-se ao computador do UCA)...porque aí naquele caso ele teria que fazer pelo
menos grupos, né? (caso em que o jogo seria usado online, mas não daria para todos os
alunos jogarem com seu computador por conta do fraco acesso à internet, por isso a opção
pelos grupos)...no máximo 4 (grupo de 4 alunos)...
P1: você diz gravar (o jogo) nos uquinhas?
PC: é, no máximo 4...
P1: tem que ver se é possível....
PC: se é possível, é...mas é isso que eu tô falando, ele me deu um instrumento que não me
dá opção de uso...aí que que acontece, eu já tentei gravar um negócio ali de vídeo, que ele
não gravou, não suportou...
251
P2: aí o que tem que fazer é rodar no pendrive, mas aí fica lento....
PC: é fica girando a bolinha, girando a bolinha...aí a aula passa e a bolinha tá girando...
P1: lembra que a gente quis trabalhar com história em quadrinho, aí a gente ficou um
tempão aqui tentando baixar o “Toondoo”...como é muito pesado, tem muita imagem, ele
não conseguiu abrir...
PC: não baixou...não abre...
P1: e aí como é que vai ser com 40? Não dá...
PC: é...ali se eu for fazer o jogo tinha que ser de 4 a 4 (um computador para cada grupo de 4
alunos) ou então a gente fazer uma bagunça na sala de aula: meninas e meninos e projetar
no quadro...escreve a resposta e não fala...mas o lance não é esse, é ele clicar, né...porque
se você escreve a resposta, já saiu da tecnologia, né? Era ele clicar e o próprio treco ir
dizendo: ih, errou...ih, não...pra dar aquele entusiasmo, mas não sei nem se o treco
(uquinha) consegue suportar...
P1: mas você falou do blog também...
PC: é, o blog é legal...
P2: o blog eu acho que vale a pena hein...
PC: é, eu vou ressuscitá-lo...
P1: e aí você pode colocar material lá e avisar: olha, quem quiser ver, quem perdeu, tá lá no
blog...
P2: deixe sua opinião...
PC: até para os que faltam mesmo de verdade...
P2: pedir pra eles deixarem opinião sobre o material, se eles viram ou não viram...por
exemplo, você deixou um power point, pedir pros alunos se manifestarem, dizerem: eu vi,
achei isso, entendi...
PC: ou o que não entendeu, porque aí pode ver a resposta na sala de aula...gostei da ideia, tá
aí...eles interagindo, né...e mais uma coisa pra ficar entrando no computador e ver?
252
Hehe...é, porque eu trabalho em escolas de realidades completamente diferentes, né? Em
Caxias, o power point é o máximo, porque eu levo meu notebook, eu levo não sei o que...
P1: mas lá não tem data show em cada sala como aqui?
PC: lá tem uma TV de 32 polegadas e eu boto na TV...
P1: ah, tá...dessas TVs novas...
PC: é, aí pra ver imagem...
P2: legal...
PC: aí a gente faz assim...é...
P1: vai todo mundo pra sala da TV?
PC: não, a TV é leve, a TV vai até a sala...eu falo: fulano, pega a TV pra mim!...eles vão lá e
pegam...essas de plasma, né...já tem idade pra pegar, hehe...e pega direito, não deixa cair
não hein! Se eu tiver que pagar essa TV, você vai ver só...hehe...eles pegam, o porteiro
pega...a gente bota na mesa...se eu vou conectar tudo, aí eu troco a turma de sala, né...que
enquanto não tiver conectado eu levo a TV pra sala deles...mas aí a gente usa, eu acho que
facilita, eles conseguem ver, ver se abre um pouquinho o horizonte, ver que tem coisas
diferentes, não é só aquilo...eu falo pra eles: vocês entram na internet só pra besteira,
procura alguma coisa interessante...no 6º ano aqui eu usei aquele negócio da água, é...não é
papagaio não, é um tucano, sei lá que ave é aquela...ele falando e eles ficam entusiasmados
porque é uma coisa diferente, aí dá pra, né acordar um pouquinho a percepção deles...é o
jeito, a gente vai caminhando...
P1: acho que a gente já passou...
P2: é, tem alguma coisa que você acha que a gente não perguntou, que deveria ter
perguntado?
PC: não...
P1: você acha que você precisa acrescentar alguma coisa?
P2: assim, pra falar sobre tecnologia, sobre a tua experiência pessoal...é, uma coisa que eu
acho interessante quando você começou a falar sobre seus 28 anos e a gente
253
perguntou...acho que dá bem pra traçar um panorama do teu processo com a tecnologia,
né? A questão do livro, a questão do filme, o fator imagem, os problemas com o
computador, a questão do laboratório, porque o ensino de ciências tem esse componente...
PC: é, quando eu trabalhei com laboratório no Estado, que foi uma escola do Estado foi
excelente, porque eles tinham dois microscópios só e duas lupas fixas, né...então o que que
eu fazia com a professora? eu fazia assim com ela: vamos fazer o seguinte, a gente vai
jogando metade por metade...a gente trabalhava em conjunto, aí tá...então quem vai agora,
vamos do número 1 ao número 10...aí, ia, então você ia conseguindo movimentar com ele
naquele laboratório e ele (o aluno) vê o que ele não consegue ver a olho nu, né...que
realmente a bactéria existe, não sei o que...então você começa a ter uma percepção de
mundo diferente, né...do que tem aqui (na Escola Madrid, por não ter essa possibilidade do
laboratório)...
P2: mas por exemplo, a informática poderia oferecer uma simulação de um laboratório...mas
acaba que os recursos aqui são muito pequenos pra poder fazer isso...
PC: é, você vai esbarrando nos recursos que você tem...aí, a gente fazia aquilo ali foi muito
legal e eu ainda continuo gostando mais dos meus primeiros 15 anos do que os atuais, eu
prefiro, eu prefiro mesmo...e ainda mais que você consegue, é...eu acho que a gente
conseguia uma resposta MUITO melhor dos alunos do que hoje...eu acho...eu acho que a
resposta hoje em dia, assim não resposta de amizade, que tirando da sala de aula são todos
anjos, hehe...não essa resposta, não sei o que, de gostar, nada disso, mas a resposta do
interesse, do querer, da motivação, entendeu? Do saber porque que ele tá trilhando aquele
caminho, eu acho que eu prefiro lá, os meus 15 anos iniciais...nem início, né, 15 anos é
bastante tempo...sabe, eu acho que com o passar do tempo e com todo esse processo que
envolve a educação, acho que as coisas foram se deteriorando, deteriorando...
P1: e é um pouco por isso também que você está querendo se aposentar?
PC: que eu quero sair, é...eu acho que frustra um pouco...
P1: você acha que você não tem mais a mesma motivação hoje que você tinha?
PC: não!...do que eu tinha há três anos atrás, eu não tenho mais...
P1: três?
254
PC: há três anos atrás eu montei um aquecedor solar de garrafa PET lá em Caxias, eu só pedi
pra eles trazerem as garrafas PET, eles foram juntando, e caixas de leite...eu comprei tinta,
eu comprei cano, eu comprei as caixas d’água, eu fiz com eles...eu não tenho mais essa
paciência, infelizmente... e a água aqueceu!
Nesse momento entra a coordenadora pedagógica da escola...
P2: que entrevista boa!
Coordenadora: entrevista boa? Caramba! Professora, ainda tá aí!
P1: acabamos bem na hora!
Coordenadora: vem cá, porque vocês estão nesse calor?
PC: não, a gente já vai...eu tenho que ir pra Caxias...
P1: foi ótimo!
P2: arrasou! Foi maravilhoso...
255
APÊNDICE D
TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO
A Sra. está sendo convidada a participar voluntariamente do estudo intitulado “Análise da
Integração de Tecnologias Digitais de Informação e Comunicação (TDIC) à pratica pedagógica
de uma professora de Ciências do ensino fundamental”, que se refere a uma tese de
Doutorado conduzida pela pesquisadora Diana Ciannella Martins de Oliveira, do programa
de pós-graduação “Educação em Ciências e Saúde”, do Núcleo de Tecnologia Educacional
para a Saúde (NUTES)/Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), integrante da equipe
do Projeto “Análise do Processo de Integração de Tecnologias de Informação e Comunicação
em Atividades Educativas no Ensino Fundamental com uso do “Programa Um Computador
por Aluno” (PROUCA) submetido no Edital CNPq/CAPES/SEED-MEC nº 76/2010, coordenado
pela professora pesquisadora Miriam Struchiner (NUTES/UFRJ). O desenvolvimento do
estudo procura atender ao objetivo de investigar como uma professora do ensino
fundamental integra as Tecnologias Digitais de Informação e Comunicação à sua prática
pedagógica na disciplina ciências, sua evolução com relação ao uso dessas tecnologias, suas
visões e motivações para o uso das TDIC em suas estratégias pedagógicas, assim como os
desafios enfrentados nesse processo.
Sua participação nesse estudo se dará por meio de entrevistas concedidas à pesquisadora
responsável, assim como consentindo que a pesquisadora esteja presente em suas aulas
para observação e registro de suas atividades em todas as suas turmas do 6º ao 9º ano na
Escola Municipal Madrid, Rio de Janeiro. Cabe esclarecer que as entrevistas serão gravadas
em áudio e o registro das aulas será feito em caderno de campo e eventualmente em alguns
momentos será necessário o uso de recursos audiovisuais. Terão acesso ao conteúdo das
entrevistas e ao registro das aulas, apenas a pesquisadora responsável e sua orientadora,
profª.Miriam Struchiner.
Serão respeitadas todas as normas éticas destinadas à pesquisa envolvendo seres humanos
da Comissão Nacional de Ética em Pesquisa (CONEP – MS). Os objetivos da pesquisa são
estritamente acadêmicos e os dados poderão vir a ser publicados e divulgados, sempre
mantendo o sigilo quanto a sua identidade. Comprometemo-nos também a manter a guarda
de todo material pesquisado (entrevistas gravadas e transcritas e registros das aulas) por um
período de cinco anos; após esse prazo todo o material será destruído. Sua participação
nessa pesquisa é isenta de qualquer despesa, benefício ou riscos. A Sra. poderá deixar de
responder a qualquer pergunta que considere inapropriada ou que cause constrangimento
de qualquer natureza, ou recusar o acompanhamento de aulas ou atividades quando achar
necessário. A Sra. terá direito a se manter atualizada sobre os resultados parciais e finais da
pesquisa, bem como também tem o direito de retirar, a qualquer momento, o
consentimento para sua participação nessa pesquisa.
Caso tenha alguma consideração ou dúvida sobre a ética dessa pesquisa, por favor entre em contato com o Comitê de Ética em Pesquisa (CEP) do do Instituto de Estudos em Saúde Coletiva - IESC
256
Praça Jorge Machado Moreira, Cidade Universitária – Ilha do Fundão/Rio de Janeiro – RJ. Tels:(21)2598-9293, www.iesc.ufrj.br ; [email protected]
CONSENTIMENTO
Acredito ter sido suficientemente informado a respeito das informações sobre o estudo
acima citado que li ou que foram lidas para mim.
Eu discuti com a pesquisadora Diana Ciannella Martins de Oliveira, sobre a minha decisão
em participar nesse estudo. Ficaram claros para mim quais são os propósitos do estudo, os
procedimentos a serem realizados, seus desconfortos e riscos, as garantias de
confidencialidade e de esclarecimentos permanentes. Ficou claro também que minha
participação é isenta de despesas. Concordo voluntariamente em participar deste estudo e
poderei retirar o meu consentimento a qualquer momento, sem penalidades ou prejuízos e
sem a perda qualquer benefício que eu possa ter adquirido. Eu receberei uma cópia desse
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) e a outra ficará com o pesquisador
responsável por essa pesquisa. Além disso, estou ciente de que eu (ou meu representante
legal) e o pesquisador responsável deveremos rubricar todas as folhas desse TCLE e assinar
na última folha.
Nome do sujeito da pesquisa:
Ass do entrevistado: _____________________________________________________
Rio de Janeiro, _____/_____/_____
Pesquisador responsável: Diana Ciannella Martins de Oliveira
Ass: ________________________________________________________________
Aluna do Doutorado - Educação em Ciências e Saúde, NUTES/UFRJ
email: [email protected]
Rio de Janeiro, _____/_____/_____