DESENVOLVIMENTO HUMANO: a identidade do psicólogo que … · 2014. 5. 2. · DESENVOLVIMENTO...

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UNIVERSIDADE DE TAUBATÉ Alissandra Calderaro Soares da Silva DESENVOLVIMENTO HUMANO: a identidade do psicólogo que atua junto a famílias em contexto de vulnerabilidade social Taubaté – SP 2012

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  • UNIVERSIDADE DE TAUBATÉ Alissandra Calderaro Soares da Silva

    DESENVOLVIMENTO HUMANO: a identidade do psicólogo que atua junto a famílias em

    contexto de vulnerabilidade social

    Taubaté – SP 2012

  • 0

    Alissandra Calderaro Soares da Silva

    DESENVOLVIMENTO HUMANO: a identidade do psicólogo que atua junto a famílias em

    contexto de vulnerabilidade social

    Dissertação apresentada como parte do processo para obtenção do Título de Mestre pelo Curso de Mestrado em Desenvolvimento Humano: Formação, Políticas e Práticas Sociais da Universidade de Taubaté. Área de Concentração: Desenvolvimento Humano, Políticas e Práticas Sociais. Orientadora: Profª Drª Marilza Terezinha Soares de Souza

    Taubaté – SP 2012

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    Ficha Catalográfica elaborada pelo SIBi – Sistema integrado de Bibliotecas – UNITAU

    S586d Silva, Alissandra Calderaro Soares da Desenvolvimento humano: a identidade do psicólogo que atua junto a famílias em contexto de vulnerabilidade social./Alissandra Calderaro Soares da Silva.- 2012.

    132f.: il. Dissertação (mestrado) - Universidade de Taubaté, Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação, 2012.

    Orientação: Profª Drª. Marilza Terezinha Soares de Souza, Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação.

    1. Identidade profissional. 2. Formação acadêmica em Psicologia. 3. Contexto de vulnerabilidade social. 4. Desenvolvimento humano. 5. Sistema Único de Assistência Social - SUAS. I. Título.

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    ALISSANDRA CALDERARO SOARES DA SILVA

    DESENVOLVIMENTO HUMANO:

    A IDENTIDADE DO PSICÓLOGO QUE ATUA JUNTO A FAMÍLIAS EM CONTEXTO DE VULNERABILIDADE SOCIAL

    Dissertação apresentada como parte do processo para obtenção do Título de Mestre pelo Curso de Mestrado em Desenvolvimento Humano: Formação, Políticas e Práticas Sociais da Universidade de Taubaté. Área de Concentração: Desenvolvimento Humano, Políticas e Práticas Sociais.

    Data:________________________

    Resultado:____________________

    BANCA EXAMINADORA

    Profª Drª Marilza Terezinha Soares de Souza Universidade de Taubaté/SP

    Assinatura _____________________________________

    Profª. Drª. Edna Maria Querido de Oliveira Chamon Universidade de Taubaté/SP

    Assinatura _____________________________________

    Profª. Drª. Ceneide Maria de Oliveira Cerveny Pontifícia Universidade Católica de

    São Paulo/SP

    Assinatura _____________________________________

    Profª. Drª. Maria Aparecida Campos Diniz de Castro Universidade de Taubaté/SP

    Assinatura _____________________________________

    Profª. Drª. Marianne Ramos Feijó Pontifícia Universidade Católica de

    São Paulo/SP

    Assinatura _____________________________________

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    Dedico este trabalho a:

    Meu grande e amado Avô Aparício – homem de fibra –, pelo estímulo ao estudo e à

    superação de meus desafios.

    Meus irmãos, tios e primos, que me fizeram vivenciar as diferenças e semelhanças,

    ensinaram-me a reflexão, o compartilhamento, interação e articulação, proporcionando-me

    pensar o interdisciplinar.

    Meus pais, Neda e Luiz, pelo apoio e retaguarda com os meus filhos durante esta jornada...

    E todas as outras em minha vida.

    Meu esposo, Marcos Aurélio, e filhos, Marcos Augusto e

    Gustavo, por me ensinarem que a persistência e a

    determinação superam qualquer obstáculo.

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    AGRADECIMENTOS

    À Profª Drª Marilza Terezinha Soares de Souza, pela habilidade, dedicação e paciência na

    orientação desse trabalho.

    Aos professores do Mestrado que contribuíram na construção do meu pensar nesta trajetória.

    Aos colegas de trabalho que participaram de minhas angústias, entenderam minhas ausências

    e contribuíram em minha reflexão sobre a difícil arte de caminhar junto a famílias em

    vulnerabilidade social.

    Às assistentes sociais, Fátima Farhat de Araújo, no importante auxílio com as transcrições das

    entrevistas, e Mariza Aparecida de Assis, coordenadora do Centro Especializado de

    Assistência Social (CREAS), pelo apoio, incentivo e liberação para dedicação a este estudo.

    À psicóloga Profª Drª Vera Lúcia Bonato, modelo profissional, que acompanhou meu

    nascimento, sentar, engatinhar e andar na Psicologia, durante a formação acadêmica e

    construção profissional, e, neste momento, apoiou-me, acolhendo e incentivando este vôo tão

    desejado.

    Aos psicólogos, colegas nesta jornada na Assistência Social, que construíram uma história

    profissional nessa área e contexto tão peculiar e que possibilitaram, com muita

    disponibilidade, a coleta de dados necessária.

    À Secretaria de Desenvolvimento Social e à Fundação Hélio Augusto de Souza, da Prefeitura

    Municipal de São José dos Campos, que permitiram a realização desse estudo com seus

    profissionais.

  • 5

    Há homens que lutam um dia e são bons, há outros que

    lutam um ano e são melhores, há os que lutam muitos

    anos e são muito bons. Mas há os que lutam toda a vida

    e estes são imprescindíveis.

    Bertold Brecht

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    RESUMO

    Este estudo teve por objetivo investigar e compreender o desenvolvimento da identidade

    profissional do psicólogo que atua na área da Assistência Social junto a famílias em contexto

    de vulnerabilidade social. Os conceitos de vulnerabilidade social, resiliência,

    interdisciplinaridade e sua relação com contextos que influenciam a formação identitária do

    psicólogo são abordados e analisados com o auxílio da Teoria Bioecológica do

    Desenvolvimento Humano. Trata-se de pesquisa qualitativa com o uso da entrevista

    semiestruturada para coleta de dados. Participaram desta pesquisa, 12 psicólogos que atuam

    na área da Assistência Social, inseridos no Sistema Único de Assistência Social (SUAS) e que

    atendem famílias em contexto de vulnerabilidade social. A análise do material coletado foi

    realizada por meio da Teoria Fundamentada nos Dados. Os resultados demonstraram que o

    psicólogo, ao iniciar na área da Assistência Social, depara-se com diversos desafios

    relacionados, tanto ao conteúdo teórico acadêmico, por ele considerado insuficiente diante à

    prática, quanto ao trabalho com a equipe de profissionais que a área exige; experiência essa

    que não obteve em sua formação acadêmica. O desenvolvimento de sua identidade

    profissional é caracterizado por um processo com fases permeadas pela sensação de choque

    no contato inicial com a prática na assistência, seguida por crises, desafios e superação,

    utilizando, como recursos para enfrentamento, a aquisição de conhecimentos teóricos

    diversos, bem como o desenvolvimento de novas estratégias de atuação no trabalho em

    equipe. O contato com a vulnerabilidade social desencadeia a revisão de seus valores

    pessoais, de sua prática e formação, numa espiral crescente no desenvolvimento profissional,

    levando-o à contínua busca por formação.

    Palavras-chave: Identidade profissional. Formação acadêmica em Psicologia. Contexto de

    vulnerabilidade social. Desenvolvimento humano. Sistema Único de Assistência Social

    (SUAS).

  • 7

    ABSTRACT

    HUMAN DEVELOPMENT:

    Psychologist identity assisting families in social vulnerability context This paper aimed to investigate and to comprehend the development of the psychologist

    professional identity who works in social work area assisting families in social vulnerability

    context. The social vulnerability and resilience concepts, and their relation to

    interdisciplinary contexts as well, that influences the identity development of the

    psychologist are discussed and analyzed with support of Bioecological of Human

    Development Theory. It is a qualitative study using semistructured interviews for gatering the

    data. The participants were 12 psychologists workers of social assistance area, all of them

    included in the Social Assistance Unique System – SUAS and assisting families in social

    vulnerability context. The data were analyzed with support of Grounded Theory

    Methodology. The results showed that the psychologist who begins working into social

    assistance area, faces with several challenges, as regarding to theorical academic knowledge,

    which is considered insufficient for the practice, as regarding to the work with a

    professional team that the area require, and this one also is an experience not approached in

    his undergraduation years. The development of his professional identity is caracterized by a

    process with phases, with a chock sensation in his initial contacts into de assistance pratice,

    following by crises, challenges and overcoming experiences, using as copping resources the

    acquisition of theorical knowledge and the development of new teamwork strategies as well.

    The contact with social vulnerability triggers the review of his personal values, his practice

    and background academic, making an upward spiral in professional development, leading

    him to the search for a continuous education.

    Keywords: Professional identity. Education in Psychology. Social vulnerability context.

    Human development. Social Assistance Unique System (SUAS).

  • 8

    LISTA DE QUADROS

    Quadro 1 - Dados sociodemográficos da amostra .................................................................... 77

    Quadro 2 – Categorias, subcategorias, códigos ou conceitos e segmentos ilustrativos das entrevistas ........................................................................................................ 85

  • 9

    LISTA DE FIGURAS

    Figura 1 – Fluxograma de categorias e subcategorias emergidas das entrevistas .................... 84

    Figura 2 – Processo de desenvolvimento de identidade do Psicólogo “X” .............................. 92

  • 10

    SUMÁRIO

    1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................................... 12

    1.1 Objetivos ......................................................................................................................... 15

    1.1.1 Objetivo Geral .......................................................................................................... 15

    1.1.2 Objetivos Específicos ............................................................................................... 15

    1.2 Organização do Trabalho ................................................................................................ 15

    2 IDENTIDADE E DESENVOLVIMENTO HUMANO ........................................................ 17

    2.1 Histórico e evolução do conceito de identidade ............................................................. 17

    2.2 A Teoria Bioecológica do Desenvolvimento Humano e as implicações para o estudo proposto ............................................................................................................... 25

    2.2.1 O estudo proposto à luz da Teoria Bioecológica...................................................... 30

    2.2.2 A identidade do psicólogo e sua relação com o macrossistema ............................... 32

    3 IDENTIDADE E DESENVOLVIMENTO PROFISSIONAL.............................................. 36

    3.1 Identidade profissional .................................................................................................... 36

    3.2 Formação acadêmica: A experiência formal/empírica na identidade profissional do psicólogo .................................................................................................................... 41

    4 A INSERÇÃO DO PSICÓLOGO NO ATUAL CONTEXTO DA POLÍTICA NACIONAL DE ASSISTÊNCIA SOCIAL .......................................................... 52

    4.1 A interdisciplinaridade no contexto da assistência social e a equipe de trabalho ........... 57

    4.2 Contexto de atuação com famílias: vulnerabilidade e resiliência ................................... 65

    4.2.1 Vulnerabilidade ........................................................................................................ 65

    4.2.2 Resiliência ................................................................................................................ 69

    5 MÉTODO .............................................................................................................................. 75

    5.1 Participantes .................................................................................................................... 75

    5.2 Instrumento de coleta de dados ....................................................................................... 78

    5.3 Procedimento .................................................................................................................. 78

    5.3 Análise dos dados ........................................................................................................... 79

    6 RESULTADOS ..................................................................................................................... 84

    6.1 Memorial Circunstancial do Psicólogo “X” ................................................................... 93

    6.1.1 A formação inicial .................................................................................................... 93

    6.1.2 O ingresso no trabalho na área da Assistência Social .............................................. 93

    6.1.3 As primeiras experiências ........................................................................................ 94

    6.1.4 O período de adaptação ............................................................................................ 94

  • 11

    6.1.5 O fortalecimento profissional ................................................................................... 96

    6.1.6 A leitura sobre minha formação acadêmica na graduação ....................................... 97

    7 DISCUSSÃO ......................................................................................................................... 99

    8 CONSIDERAÇÕES FINAIS .............................................................................................. 110

    REFERÊNCIAS ..................................................................................................................... 116

    APÊNDICE A - MODELO DE ENTREVISTA .................................................................... 127

    ANEXO A – Declaração do Comitê de ética em pesquisa..................................................... 128

    ANEXO B - TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO ....................... 129

    ANEXO C - TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO ....................... 131

  • 12

    1 INTRODUÇÃO

    Na área da Assistência Social, com o advento do Sistema Único de Assistência Social

    – SUAS (BRASIL, 2005), as intervenções técnicas do psicólogo passaram a ser normatizadas

    e regulamentadas. Um campo legitimado se despontou como política pública e área de

    intervenção profissional. Assim, intervenções subsidiadas teórica e tecnicamente são

    fundamentais na construção de novos parâmetros para a categoria. Como retrata Chamon

    (2003, p.25), “a identidade profissional é uma identidade social ancorada nas representações,

    práticas e saberes profissionais, que depende do contexto de exercício profissional”.

    As intervenções acima citadas caracterizaram novos aspectos da identidade

    profissional do psicólogo e as relações entre os diversos profissionais atuantes na área da

    Assistência Social, tais como assistentes sociais, advogados, pedagogos e outros.

    O espaço que se abriu nessa política nacional ofereceu amplo campo de pesquisa e

    objeto de estudo. No que tange à formação da identidade dos profissionais, a ação

    interdisciplinar que surge na área e nas características da população abordada possibilitou

    alterações na demanda de suas ações cotidianas.

    A partir da experiência profissional dessa pesquisadora em projetos e serviços da

    Assistência Social, no município de São José dos Campos, identificou-se a necessidade de

    investigar como se constrói a identidade profissional do psicólogo, tanto na relação com

    assistentes sociais e outros profissionais afins, quanto na intervenção junto às famílias em

    contexto de vulnerabilidade social.

    Esse interesse decorreu de desafios pessoais encontrados em atividades na área, o que

    possibilitou constatar que o aporte e formação acadêmica em Psicologia eram insuficientes

    para atender as demandas pertinentes a essa inserção profissional. A formação acadêmica

    permitia a leitura subjetiva da dinâmica e conteúdos psicológicos observados nas famílias e

    indivíduos, mas não instrumentalizava, de fato, a ação/prática, no contexto social de

    vulnerabilidade, ou seja, a formação acadêmica não se adequava ao contexto da prática.

    Corroborando a escolha dessa linha de pesquisa, a opção pessoal sempre esteve focada

    na prática. Escolhas por cursos, seminários e aprimoramentos sempre estiveram relacionadas

    às questões específicas inseridas no contexto da Assistência Social com uma ação qualificada.

    A prática reflexiva esteve presente, no entanto, pouco aprofundada na construção teórica e na

    pesquisa sobre os desafios dos profissionais nesse local de trabalho.

    Ademais, em reuniões para discussão sobre a prática do psicólogo com os demais

  • 13

    profissionais do município, inseridos na rede de proteção social1, os questionamentos e

    reflexões sobre essa prática eram recorrentes e perpassavam pelas questões sentidas

    individualmente. Os profissionais de outras áreas sempre esperavam e solicitavam que os

    psicólogos fizessem o atendimento clínico, buscando suprir a falta na rede pública, sem

    conseguir compreender a dimensão mais abrangente da atuação de um psicólogo no contexto

    da Assistência Social.

    Outro ponto que reforçou o interesse nesse estudo foi referente às dúvidas e incertezas

    sobre a atuação do profissional de psicologia diante da Política Nacional de Assistência Social

    – PNAS (BRASIL, 2004a), observadas nas discussões mensais do grupo de trabalho sobre

    psicologia e assistência social, formado pelo Conselho Regional de Psicologia – Subsede Vale

    do Paraíba e Litoral Norte2. Participar dessas discussões possibilitou a percepção de que os

    profissionais têm sofrido os mesmos questionamentos daqueles encontrados no

    microambiente de trabalho, ou seja, a experiência pessoal se configurava idêntica às

    experiências dos diversos profissionais que desenvolvem seus trabalhos nos demais

    municípios da região. Com essa oportunidade, reacende-se o desejo de aprofundar os

    conhecimentos, embasar teoricamente a prática pessoal, construir referências profissionais,

    enfim, contribuir na construção de conhecimentos na área.

    Vale ressaltar que, nesse processo de inserção e descoberta pessoais de caminhos na

    Assistência Social, o trabalho sempre foi permeado pela ação com outros saberes

    profissionais, cujas atuações foram marcadas por momentos multidisciplinares e

    interdisciplinares.

    Desde 1995, início da atuação na área da Assistência Social, componho equipes com

    profissionais de outras formações fora da Psicologia, principalmente com assistentes sociais,

    mas, na maior parte desse período, as ações eram bem diferenciadas para cada profissional:

    uma mesma equipe, com ações estanques. Em experiência que se estendeu de setembro de

    2002 a início de 2007, foi possível compreender o significado empírico de

    interdisciplinaridade. Nesse serviço, ocorreu o compartilhar do conhecimento, com reflexões

    sobre as ações de todos e as respectivas contribuições para o desenvolvimento do

    acompanhamento familiar, em busca do desenvolvimento humano. Foi essa vivência que

    consistiu, de fato, as primeiras experiências de ações interdisciplinares: a compreensão das

    especificidades profissionais, as interfaces, as interlocuções, as interações, as articulações

    1 Conforme a Política Nacional de Assistência Social - PNAS (BRASIL, 2004a), entende-se por proteção social as formas institucionalizadas que as sociedades constituem para proteger parte ou o conjunto de seus membros [...] 2 Nota da autora: Esse Grupo de Trabalho está sob minha coordenação desde setembro de 2008.

  • 14

    entre as áreas do saber.

    Nessa perspectiva cabe aqui ponderar sobre o conceito mencionado por Fazenda et al.

    (2009, p. 47) que discute a interdisciplinaridade e que também reflete a experiência

    profissional pessoal:

    A interdisciplinaridade é um movimento que se aprende praticando, vivendo, não se ensina; portanto exige-se um novo posicionamento diante da prática educacional e da vida, pois a interdisciplinaridade é o motor de transformação, de mudança social, em que a comunicação, o diálogo e a parceria são fundamentais para que ela ocorra. (FAZENDA et al., 2009, p.47).

    Essa forma de atuação se estende, até hoje, na vivência profissional pessoal, passando

    a ser um fator importante na construção da atuação do profissional que é influenciado e

    permeado por outros saberes, que a diferenciam, mas que também podem aproximar essa

    mesma atuação dos demais, na busca da sua identidade profissional.

    Esse período propiciou o fortalecimento da importância de uma formação acadêmica

    voltada para a peculiaridade da Assistência Social e do trabalho em equipe. Assim, questões

    que envolvem formação acadêmica, dificuldades contextuais e valores profissionais merecem

    estudo e análise, podendo contribuir na construção dos novos parâmetros de atuação dos

    profissionais na área da Assistência Social. Essa reflexão mostra-se pertinente ao disposto

    pelo Conselho Nacional de Educação/Conselho de Ensino Superior (CNE/CES), por meio da

    Resolução nº8/2004 (BRASIL, 2004b), em seu artigo 12, que permite flexibilidade curricular,

    na direção de recortes inovadores no campo da atuação.

    Este estudo pode, no contexto apresentado, contribuir para adequações e apontamentos

    quanto à direção da formação acadêmica dos profissionais psicólogos e identificar possíveis

    lacunas dessa formação ou até contribuir para o surgimento de outros fatores diagnósticos das

    dificuldades encontradas para a atuação na área da Assistência Social.

    A realização deste estudo compõe uma importante dimensão para a produção e

    sistematização de conhecimentos por meio de um olhar diferenciado pela prática profissional,

    indicando subsídios para a atuação do psicólogo na área da Política Nacional de Assistência

    Social, contribuindo para suprir lacuna existente entre a formação acadêmica e a prática

    profissional, com o estudo da atuação desse profissional na área e sistematização dos dados

    coletados, além da divulgação dos resultados encontrados.

    Assim, este estudo propõe compreender a construção da identidade profissional, que

    será analisada à luz dos processos de resiliência e desenvolvimento bioecológico,

    vislumbrando uma atuação qualificada e que proporcione desenvolvimento humano junto às

    famílias em contexto de vulnerabilidade social.

  • 15

    1.1 OBJETIVOS

    1.1.1 Objetivo Geral

    Investigar e compreender como se constrói a identidade profissional do psicólogo que

    atua na área da Assistência Social junto a famílias em contexto de vulnerabilidade social.

    1.1.2 Objetivos Específicos

    • Investigar a influência da formação acadêmica, sob a perspectiva do profissional,

    como instrumento para sua atuação.

    • Identificar quais desafios o profissional encontra em sua atuação na área da

    Assistência Social.

    • Identificar os recursos externos e os recursos internos (processo de resiliência) que o

    profissional precisa desenvolver para atuar junto a famílias em contexto de

    vulnerabilidade social.

    • Analisar se há interferências do contexto de vulnerabilidade social e da relação

    estabelecida com a família atendida na formação da identidade profissional.

    • Examinar se a interdisciplinaridade influencia neste processo de formação da

    identidade profissional.

    1.2 ORGANIZAÇÃO DO TRABALHO

    Este trabalho foi organizado em oito capítulos na construção das ideias que delimitam

    o estudo realizado. A Introdução apresenta o estudo proposto e comporta a justificativa e

    delimitação do estudo, problema de pesquisa, objetivo geral e objetivos específicos e a

    organização do trabalho. A revisão de literatura foi subdividida em três partes. Na primeira,

    abordam-se a identidade e o desenvolvimento humano, apresentando o histórico e a evolução

    do conceito de identidade e a Teoria Bioecológica do Desenvolvimento, bem como sua

    relação com o estudo proposto. Na segunda, serão discutidos a identidade e o

    desenvolvimento profissional, apresentando o conceito de Identidade Profissional, a formação

    acadêmica do psicólogo e a construção da identidade. Na terceira parte, apresentam-se a

  • 16

    inserção do psicólogo no atual contexto da Política Nacional de Assistência Social, os

    conceitos de interdisciplinaridade, vulnerabilidade e resiliência e a relação com o processo de

    identidade profissional do psicólogo. No capítulo Método, será apresentado o caminho

    utilizado pelo pesquisador para alcance dos objetivos propostos pela pesquisa, seguido pela

    apresentação dos resultados, discussão dos dados e considerações finais.

  • 17

    2 IDENTIDADE E DESENVOLVIMENTO HUMANO

    2.1 HISTÓRICO E EVOLUÇÃO DO CONCEITO DE IDENTIDADE

    Para a questão da pesquisa e seu objeto de interesse a ser retratado, é de suma

    importância que se conheçam as discussões acerca da questão da identidade, visando

    identificar os fatores que influenciam na atuação profissional. Será também importante

    abordar o conceito de identidade e como ele norteia nosso estudo. Assim, ao se tratar de

    identidade, serão estudadas as concepções de seu conceito e seu desenvolvimento histórico.

    As considerações sobre identidade são encontradas desde os povos primitivos,

    entretanto, o conceito de identidade é mais novo, sendo originário da filosofia, em que,

    segundo Bauer e Mesquita (2007), o atributo de ser idêntico a si e diferente dos demais foi

    descrito.

    Com base em Hall (2001), que discute a identidade moderna e seu caráter de

    fragmentação, apresentar-se-á uma abordagem da evolução histórica das concepções de

    identidade.

    • A identidade do sujeito no iluminismo, caracterizada como uma identidade centrada e

    unificada em si, em que o sujeito é racional, dotado de razão e consciência, e sua

    identidade é a mesma ao decorrer de sua evolução individual. A identidade é

    considerada como essência.

    • A identidade do sujeito sociológico advém da relação com os outros significativos,

    formada a partir da interação e do reconhecimento do outro, e o espaço entre o mundo

    pessoal e o mundo público. Surge de uma crítica da Sociologia à concepção

    individualista do sujeito. É uma concepção interativa da identidade do Eu. É um

    encontro entre o sujeito e os mundos sociais e culturais que ocupa.

    • A identidade do sujeito pós-moderno faz referência à sua fragmentação, na medida em

    que nesta nova sociedade o sujeito precisa possuir várias identidades, formadas e

    transformadas ininterruptamente. Perde-se a noção de identidade essencial ou

    permanente, tornando-se estratégica e proposicional.

    Lopes (2002), em artigo intitulado “Os caminhos da Identidade nas Ciências Sociais e

    suas metamorfoses na Psicologia Social”, apresenta um rico levantamento sobre a categoria

    identidade, com identificação de seus fundamentos no desenvolvimento teórico-histórico.

  • 18

    Esse levantamento passa pelo que o autor denomina “pré-história” dessa categoria, chegando

    ao período propriamente histórico de formação da categoria identidade. Encontra na fase

    Histórica da categoria da identidade seu surgimento simultâneo “na Antropologia e na

    Psicologia, como corpus teóricos que emergem num determinado momento histórico com

    respostas diferenciadas à problemática do agir humano.” (LOPES, 2002, p.7). A Psicologia,

    centrada na figura psicológica do indivíduo, teria, no comportamento, as elucidações das

    ações humanas, enquanto a Antropologia procuraria esclarecimentos no estudo do

    conhecimento da pessoa, especialmente por se deter ao conhecimento das sociedades ditas

    primitivas ou tradicionais, na qual se acreditava que as noções de indivíduo e de sujeito

    (histórico) estavam ausentes ou diluídas nas manifestações coletivas. Lopes (2002) aponta

    que:

    [...] por trás dos registros da consciência humana [...] que produzem a caracterização da pessoa, do indivíduo ou do sujeito, encontram-se contextualizadas identidades, pensadas respectivamente pelos vínculos ético-moral, ideológico e histórico-cultural- este último pensado na razão de um projeto social de classe (LOPES, 2002, p.18).

    Lopes (2002) afirma ainda a necessidade de um diálogo de saberes, interdisciplinar na

    categoria identidade, o que permitiria atravessar vários campos do saber, sem se firmar às

    especificidades de algum deles; necessitando das suas contribuições para se tornar universal,

    sem singularidades inerentes a cada ciência em que se manifesta.

    Oliveira (2003) menciona que o conceito de identidade abarca diversas “áreas do

    saber, como a sociologia, a antropologia, a filosofia, a psicologia, a psicopatologia e a

    psicanálise.” (p.50). Esse autor também aponta o caráter bidimensional do conceito, sendo um

    de ordem individual e outro de ordem coletiva, inter-relacionados, sendo o primeiro de

    interesse da Psicologia e o segundo de interesse de sociólogos e/ou antropólogos.

    Machado (2003), Oliveira (2003), Lima (2007), Bauer e Mesquita (2007), Ewald e

    Soares (2007) abordam o estudo do conceito identidade sob dois níveis: a identidade pessoal,

    que está ligada a uma construção individual do conceito de si, e a identidade social, que

    aborda o conceito de si na vinculação da pessoa a grupos.

    Portanto, as discussões envolvem a constituição da identidade pessoal e da identidade

    social ou coletiva. Assim, observa-se que o que demarca a identidade é a ambiguidade entre o

    individual e o coletivo – do que é igual e diferente, do que é próprio e do que é do outro.

    Segundo Chamon (2003, p.25), “[...] a noção de identidade está associada tanto à

    similitude, concordância, uniformidade quanto à singularidade e individualidade”. Cabe aqui

    mostrar a construção da identidade, em suas dimensões subjetivas (identidade pessoal) e

  • 19

    intersubjetivas (identidade cultural do grupo de pertencimento), bem como suas zonas de

    interseções, na formação da identidade do sujeito, conforme assinalam Ewald e Soares (2007).

    Assim, a identidade pessoal traz a singularidade das experiências de cada sujeito e a forma

    que a subjetiva, dando-lhe um significado único. A identidade social surge do sentimento de

    pertencimento aos grupos aos quais está inserido, dando-lhe significado na relação e no

    contexto, que é genérico ou grupal. O sucesso da construção da identidade se mostra na

    capacidade do sujeito de impor sua diferença na relação com o outro.

    Assim, observa-se que a definição de identidade pessoal está sendo vista como

    decorrente de uma construção psicológica, individual do conceito que cada sujeito edifica de

    si. A identidade pessoal caracteriza-se por uma busca contínua de unidade por parte do

    indivíduo. Preenche expectativas do outro sobre sua própria conduta e constitui um desafio

    constante na busca de equilíbrio entre o que se é e o que os outros esperam que ele seja.

    Considera que o processo de socialização constitui referencial na formação das identidades

    por meio de processos de identificação e internalização dessas identificações, o que se traduz

    em noção de si num processo dinâmico e múltiplo.

    Com isso, conclui-se que a singularidade das experiências e a forma como são

    subjetivadas produzem um significado que é único, a partir de sua internalização,

    caracterizando a identidade pessoal.

    A identidade social vem sendo caracterizada por Machado (2003), Oliveira (2003),

    Lima (2007), Bauer e Mesquita (2007), Ewald e Soares (2007) como uma representação do

    sujeito de si mesmo, por pertencimento a um grupo. Segundo Machado (2003), é um processo

    social dinâmico, continuamente evolutivo, que se constrói por semelhança e oposição. Assim,

    a identidade social também se caracteriza pela oposição aos grupos pelos quais o indivíduo

    não pertence. O sentimento de pertencer e a autopercepção como membro do grupo

    fortalecem e orientam a ação e a participação no grupo, e são as bases da identidade social.

    Pode-se entender que esses sentimentos de pertencimento aos grupos, nos quais se está

    inserido, dão o significado do indivíduo na relação e no contexto, genérica ou grupal, e,

    portanto, marcam a identidade social. Essa identidade social emerge de categorias e os

    indivíduos procuram sua contextualização buscando fortalecer suas identidades. Tais

    categorias identitárias podem ser diferentes, dependendo do contexto ao qual se está inserido,

    tais como: trabalho, escola, grupos específicos dos quais faz parte.

    Bauer e Mesquita (2007) apresentam a identidade como processo de identificação,

    “uma noção intuitiva do significado da identificação remete ao ato de identificar, que significa

    marcar ou destacar algo” (BAUER; MESQUITA, 2007, p.19). A identidade, como relação,

  • 20

    pode emergir pelo contraste com o diferente ou pela oposição ao antagonista, o que implica

    uma relação que significa reconhecer a importância do outro na composição de si mesmo,

    pois é só através desse outro, do diferente, que a identidade pode ser concebida como

    singular. A identidade, como construção social, afirma que a construção da identidade “se dá

    a partir da nossa socialização, como indivíduos, pela família, pela escola e por todas as

    instituições agregativas” (BAUER; MESQUITA, 2007, p.21). Estes autores concluem que

    “ambas as dimensões da identidade, dimensão individual e dimensão social, se imbricam.”

    (BAUER; MESQUITA, 2007, p.21).

    Conforme Lima (2007), a identidade é um conceito amplamente discutido na

    atualidade, está no centro dos debates, sendo de extrema importância e destaque. O autor

    considera que, no atual contexto histórico, o conceito de identidade possui abordagem de

    teóricos de tradições filosóficas, científicas e políticas diversas.

    Encontram-se, na literatura científica, concepções que variam desde as tradicionais até

    as pós-modernas, como a apresentada por Costa (1989, apud COUTINHO, KRAWULSKI E

    SOARES, 2007) de tradição psicanalista, que desenvolve uma concepção de identidade e que

    reconhece a dimensão dialética entre o indivíduo e a sociedade, em que um se identifica e se

    transforma a partir do outro. Segundo Ciampa (1989), são as denominadas identidades

    metamorfoses, frutos do atual contexto histórico e que determinam o indivíduo a uma

    constante construção e desconstrução de sua identidade, no dia a dia do convívio social e na

    multiplicidade das experiências vividas.

    Dubar (1997), referindo-se a Durkheim, apresenta a socialização como uma educação

    moral, basicamente como transmissão do espírito da disciplina, garantida pelo

    constrangimento, apoiada na ligação com os grupos sociais e na interiorização, a partir da

    autonomia da vontade. Sua perspectiva de socialização é baseada historicamente no

    constrangimento e na conformidade natural aos modelos sociais. O reconhecimento da

    individualização aumenta na medida em que, na vida social, as trocas se desenvolvem e se

    complexificam, sempre impostas pelo grupo, derivando sua identidade.

    Dubar (1997) concorda com Berger e Luckmann (1985), que aprofundam estudos de

    Mead (1952, apud BERGER; LUCKMANN, 1985), ao distinguir a socialização primária e a

    socialização secundária, dando grande importância a última, como fator de mudança social.

    Esses autores ressaltam a problemática da construção social da realidade, numa perspectiva de

    mudança social e não somente reprodução da ordem social. Subjetivamente, eles consideram

    a mudança social como inseparável da transformação das identidades. Berger e Luckmann

    (1985) também sinalizam que foi Mead (1952, apud BERGER; LUCKMANN, 1985) quem

  • 21

    primeiro abordou, de forma coerente, a socialização como construção de uma identidade

    social, na e pela interação com os outros.

    Dubar (1997) apoia suas conclusões em Berger e Luckmann (1985) ao afirmar a

    ligação entre a sociologia do conhecimento e o pensamento de Mead (1952), que sugere uma

    troca entre essas vertentes do conhecimento como uma “[...] possibilidade sociológica, isto é,

    uma psicologia que deriva suas perspectivas fundamentais da compreensão sociológica da

    condição humana” (BERGER E LUCKMANN, 1985, p.243). Berger e Luckmann (1985)

    buscam, com isso, uma complementaridade entre o conhecimento do individuo e a Sociologia,

    estabelecendo a dialética entre o que denominaram de realidades estruturais e a disposição

    humana no desenvolvimento histórico da realidade.

    Grigorowitschs (2008) destaca que os processos de socialização, segundo Berger e

    Luckmann, constituem-se ao se estabelecer correspondência entre a realidade objetiva/mundo

    social e a realidade subjetiva/identidade pessoal. Existe uma concepção de que as crianças são

    socializadas por outros que lhes são impostos, filtrando o mundo social para elas e

    encarregando-se de sua socialização. Na vida adulta, esses indivíduos experienciam uma

    socialização secundária que os insere nos novos setores sociais que ainda desconhecem, sendo

    sua socialização primária a base para a socialização secundária; isso ocorre na medida em

    que, quanto maior a interação na primeira, maior são a percepção e interação com o outro

    generalizado. Há, aqui, uma ênfase no caráter infindável do processo de socialização, que

    perdura a vida toda. Relata-se também que as compreensões de como tais processos ocorrem

    na infância nos permitem entender o desenvolvimento do self, identidades individuais e o

    “outro”.

    Berger e Luckmann (1985) objetivam demonstrar como a sua concepção de Sociologia

    do conhecimento compreende a realidade humana como uma realidade socialmente

    construída, provocando que a Sociologia ocupe espaço junto a ciências do homem, enquanto

    homem, considerando a “sociedade como parte de um mundo humano, feito pelos homens,

    habitados por homens e, por sua vez, fazendo homens, em um contínuo processo histórico”

    (BERGER; LUCKMANN, 1985, p 247).

    Discutindo as ideias de Mead3, Grigorowitschs (2008) aponta que os processos de

    socialização e individuação são dimensões correspondentes que tornam possível o

    desenvolvimento da identidade. O interagir social com o outro é algo que precisa ser

    desenvolvido, observando que crianças pequenas não possuem o mesmo grau de percepção de

    3 Mead (1952), citado por Grigorowitschs (2008).

  • 22

    suas interações com “o outro” que crianças maiores. Assim, a forma pela qual essa percepção

    se desenvolve é por meio do próprio interagir. Para compreender os processos de socialização

    na infância, é preciso entender como as crianças desenvolvem seu self, suas identidades

    individuais e o papel do ”outro” nesses processos. Dois elementos são fundamentais para o

    desenvolvimento do self, o I (identidade pessoal, única) e o Me (identidade social, imagem

    que tenho de como os outros me veem). O I permite/garante continuidade do Eu e o Me a

    unidade de diferentes sistemas de papéis que precisam ser desempenhados simultaneamente.

    Assim, identidade individual e mundo social estabelecem uma relação de interdependência e

    referencialidade mútua. O self é entendido como uma identidade unificada entre estes dois

    elementos, o que permite autovaloração e orientações do agir flexíveis, mas que é individual

    na interação e comunicação com coisas e pessoas. O self (composto por I e Me) é quem entra

    em comunicação com o “outro”, pois é um arranjo interindividual fundado em processos de

    interpretação ativos. É uma construção subjetiva do agir, em que a relação entre os selves do

    grupo social e o self individual, na construção/contestação de condutas e estruturas

    pertencentes ao grupo social (GRIGOROWITSCHS, 2008).

    De acordo com Dubar (1997), Habermas, retomando Hegel, discute o processo de

    socialização como unidade dialética, com três modelos de valor comparável: a representação

    simbólica, o processo de trabalho e a interação baseada na reciprocidade. Esse

    reconhecimento recíproco produz a intersubjetividade, resultante de um processo social.

    Identidade, portanto, seria o resultado de um reconhecimento recíproco, em que a identidade

    do Eu só é possível em função da identidade do outro que me reconhece, independente do

    meu próprio reconhecimento. É uma identidade do universal, pois revela o que é da espécie e

    do singular, ao reconhecer o que é de si próprio. Desenvolve essa mediação pela e na

    linguagem, colocando-a como estruturante da identidade. A socialização, aos seus olhos,

    situa-se na esfera, portanto, do trabalho e da troca; situa-se na raiz da identidade e da

    institucionalização do reconhecimento recíproco nas sociedades modernas.

    Em Silva (2000), encontra-se uma reflexão sobre identidade e diferença: como aquilo

    que é e aquilo que não é – tendo como referência a si própria, autocontida e autossuficiente;

    como criatura de linguagem – são criações sociais e culturais, criadas por meio da linguagem;

    não podem ser compreendidas fora dos sistemas de significação nos quais adquirem sentido.

    Identidade e diferença compõem uma estrutura indeterminada e instável; como o poder de

    definir e traduzem desejo de diferentes grupos sociais em acesso privilegiado a bens sociais.

    O processo de identidade oscila entre fixação e estabilização, sua tendência é para a fixação,

    ao mesmo tempo em que se mostra uma impossibilidade. Há uma tendência de subverter e

  • 23

    complicar a identidade ligada à ideia de movimento, deslocamento.

    Para subsidiar este estudo, empregar-se-á o conceito de identidade na concepção de

    Erik H. Erikson (1987), e para compreender sua visão de desenvolvimento humano,

    [...] em termos psicológicos, a formação de identidade emprega um processo de reflexão e observação simultâneas, um processo que ocorre em todos os níveis do funcionamento mental, pelo qual o individuo se julga a si próprio à luz daquilo que percebe ser a maneira como os outros julgam, em comparação com eles próprios e com uma tipologia que é significativa para eles; enquanto que ele julga a maneira como eles o julgam, à luz do modo como se percebe a si próprio em comparação com os demais e com os tipos que se tornaram importantes para ele. Este processo é, felizmente (e necessariamente), em sua maior parte, inconsciente – exceto quando as condições internas e as circunstâncias externas se combinam para agravar uma dolorosa ou eufórica consciência de identidade. Além disso, o processo descrito está sempre mudando e evoluindo; na melhor das hipóteses, é um processo de crescente diferenciação e torna-se ainda mais abrangente à medida que o indivíduo vai ganhando cada vez maior consciência de um circulo, em constante ampliação, de outros que são significativos para ele – desde a pessoa materna até a humanidade (ERIKSON, 1987, p.21).

    Portanto, Erikson (1987) enfoca a relação de troca entre o indivíduo e o contexto que o

    circunda, a importância de usar capacidade de transitar entre esse lugar que é social e que se

    mantém em constante mudança, e a forma como esse local é capaz de integrar o individuo em

    seu sistema de crenças, valores e metas com os quais deve estar engajado. O outro marca a

    diferença e as similaridades existentes, dando condições de estruturar a identidade. Clarifica

    que o processo é hegemonicamente inconsciente, embora possa tornar-se consciente mediante

    situações específicas vividas pelo indivíduo que deflagram tal consciência. Abarca um

    processo que muda e evolui constantemente, gradualmente diferenciando-se com o

    desenvolvimento do indivíduo. Tal processo ocorre individualmente e em nível universal.

    A identidade, na concepção de Erikson (1987), sob um ponto de vista psicanalítico,

    apresenta um olhar ampliado, podendo, assim, ser observada em seus escritos:

    [...] pois estamos tratando de um processo ‘localizado’ no âmago do indivíduo e, entretanto, também no núcleo central de sua cultura coletiva, um processo que estabelece, de fato, a identidade dessas duas identidades (ERIKSON, 1987, p.21).

    Em termos psicológicos, a formação da identidade se dá num processo de reflexão e

    observação simultâneas, um processo que ocorre em todos os níveis do funcionamento

    mental, pelo qual o indivíduo se julga da forma como se percebe em comparação a como os

    outros o julgam. Assim, a construção da identidade é pessoal e social, ocorre de maneira

    interativa, através de trocas entre indivíduo e o meio em que está inserido. Tem um caráter

    não-estático e mutável, que lhe protege a personalidade em sua estabilidade, mas é algo em

    constante desenvolvimento.

  • 24

    Para Erikson (1971), o desenvolvimento psicossocial do ser humano ocorre em oito

    estágios:

    1. Confiança básica versus desconfiança básica.

    2. Autonomia versus vergonha e dúvida.

    3. Iniciativa versus culpa.

    4. Indústria versus inferioridade.

    5. Identidade versus confusão de identidade.

    6. Intimidade versus isolamento.

    7. Produtividade versus estagnação.

    8. Integridade versus desesperança.

    Os quatro primeiros estágios ocorrem na primeira infância e meninice, o quinto ocorre

    na adolescência e os três últimos ocorrem a partir da maturidade. Deve-se considerar que

    esses estágios consecutivos não são determinados cronologicamente e Erikson (1971, 1987)

    confere grande valor ao período da adolescência, por servir de transição para a vida adulta.

    Cada estágio contribui para a formação da personalidade total e referem-se às qualidades do

    Ego básicas.

    De acordo com Hall e Lindzey (1984), na concepção de desenvolvimento psicossocial

    de Erikson, os estágios de vida da pessoa, do nascimento à morte, sofrem influências sociais

    na interação com um organismo em amadurecimento físico e psicológico. Hall e Lindzey

    (1984) afirmam que o agente interno ativador da identidade é o Ego em seus aspectos

    consciente e inconsciente. Sua concepção de Ego é muito socializada e histórica, em

    acréscimo aos fatores genéticos, fisiológicos e anatômicos, que ajudam a determinar a

    natureza do Ego do indivíduo. Para ele, as pessoas devem procurar suas identidades nos

    potenciais de suas sociedades, enquanto seu desenvolvimento implica as requisições da

    sociedade ou sofre sua influência.

    Aznar-Farias, Silvares e Schoen-Ferreira (2003) apontam que a identidade para

    Erikson é entendida como “uma concepção de si mesmo, composta de valores, crenças e

    metas com os quais o indivíduo está solidamente comprometido” (AZNAR-FARIAS;

    SILVARES; SCHOEN-FERREIRA, 2003, p.107). Assim, a construção da identidade envolve

    a definição de quem é a pessoa, bem como os valores e direções que busca para a vida.

    Dessa forma, conclui-se que, para Erikson (1987), a construção da identidade é

    pessoal e social; não é estática ou imutável; está em constante desenvolvimento, dependendo

    das condições que atravessa em cada estágio, e ocorre na interação e no intercâmbio entre o

  • 25

    indivíduo e o meio ao qual está inserido. Ainda segundo Erikson (1987), esse processo está

    em evolução contínua, acontece em diferenciação gradual, tornando-se mais abrangente

    através da troca com seu meio significativo.

    Para concluir, cabe salientar que são encontrados, nos autores apresentados, aspectos

    comuns no estudo sobre identidade, como o caráter individual e o caráter social de sua

    formação, variando a interferência e o modo como ocorre, dependendo do aspecto que cada

    abordagem considera mais importante. Alguns afirmam os aspectos individuais, a partir dos

    quais desenvolvem seu conceito, outros abordam os aspectos coletivo e social, com os quais

    defendem a estruturação da identidade. Para este estudo, como já mencionado, a concepção de

    identidade será a de Erikson, na qual existe uma relação entre a identidade pessoal e a

    identidade social e ambos os aspectos são importantes para a construção da identidade do

    indivíduo, a partir de preceitos e regras sociais e com implicação de seu desenvolvimento

    psicossocial.

    2.2 A TEORIA BIOECOLÓGICA DO DESENVOLVIMENTO HUMANO E AS

    IMPLICAÇÕES PARA O ESTUDO PROPOSTO

    Falar de formação, identidade e identidade profissional significa tratar de conceitos e

    contextos variados que se inter-relacionam e interferem diretamente na sua construção. Nessa

    perspectiva, a Teoria Bioecológica do Desenvolvimento Humano vem nos auxiliar na

    compreensão de como os ambientes podem interagir e influenciar esse processo que acontece

    ao longo de um período da vida e que se mantém em constante mudança.

    Para Cole (1996), na Teoria Bioecológica, cujo autor é Bronfenbrenner (1996), existe

    uma

    [...] preocupação em especificar o que as pessoas fazem, de uma maneira que possa ser generalizada além dos contextos da nossa observação. Ele enfatiza a importância crucial de estudarmos os ambientes nos quais nós nos comportamos, para podermos abandonar descrições particularísticas e processos sem conteúdo (COLE, 1996, p.xiii).

    Assim, esses contextos influenciadores perpassam pela família de origem, escola,

    valores e crenças pessoais, formação profissional específica, trabalho, política de serviços,

    processo de resiliência, equipe de trabalho, entre outros fatores. O contexto de vulnerabilidade

    social da população atendida na construção dessa identidade também foi abordado neste

    estudo.

  • 26

    Bronfenbrenner (1996) assim descreve:

    A Ecologia do desenvolvimento humano envolve o estudo científico da acomodação progressiva, mútua, entre um ser humano ativo, em desenvolvimento, e as propriedades em mudança dos ambientes imediatos em que a pessoa em desenvolvimento vive, conforme esse processo é afetado pelas relações entre esses ambientes e pelos contextos mais amplos em que estão inseridos (p.18).

    Ao pensar em tal referência verifica-se a relação existente entre o estudo proposto e a

    Teoria Bioecológica, os contextos de formação vivenciados por cada pessoa em sua família,

    comunidade, escola, ambiente de trabalho e a política social vigente. Assim, o momento

    histórico vivido e a forma como cada espaço propicia a potencialização de suas capacidades e

    de seu desenvolvimento possibilitam, ao sujeito, enfrentar obstáculos e desafios que o

    desenvolvimento impõe e deixa uma marca na sua atuação profissional, interferindo

    diretamente em sua construção identitária.

    Na Teoria Bioecológica, o desenvolvimento ocorre de forma dinâmica e inter-

    relacionada, pensado a partir de quatro níveis: Pessoa, Processo, Contexto e Tempo (modelo

    PPCT). Existe nessa perspectiva um resgate do papel ativo, interativo e protagônico do

    indivíduo como agente de mudança e núcleo do processo.

    Martins e Szymanski (2004) apontam que, nas duas últimas décadas, Bronfenbrenner

    vem modificando e reformulando sua abordagem, fortalecendo a bidirecionalidade existente

    em relação à pessoa e ao ambiente em que ela atua. Assim, deu-se mais importância às

    características biopsicológicas da pessoa em desenvolvimento, fazendo com que o modelo de

    estudo passasse de ecológico para bioecológico.

    A pessoa é compreendida em suas características individuais, que propulsionam o

    desenvolvimento, tais como: crenças diretivas, nível de atividade, índole, objetivos e

    motivações; seus recursos – experiências, inteligência e habilidades, e suas demandas, que são

    características de estímulo pessoal como idade, cor da pele e gênero.

    O Processo proposto nessa teoria pode ser entendido como motor do desenvolvimento,

    oferecendo possibilidades de interações entre o organismo ativo em evolução e as pessoas,

    objetos e símbolos em seu ambiente imediato. Aos poucos essas interações tornam-se mais

    complexas e se diferenciam, a partir das características pessoais de cada indivíduo e das

    características dos contextos, nos quais o indivíduo está inserido. Polonia, Dessen e Silva

    (2005) esclarecem que a interação caracteriza-se como processo proximal, de natureza

    bidirecional e que aparece através das formas de interação entre a pessoa e o seu ambiente

    físico, psicológico ou social. Os processos proximais – enquanto mecanismos primários de

    desenvolvimento – ocorrem através do tempo.

  • 27

    O conceito de processos proximais, no modelo bioecológico, conforme Martins e

    Szymanski (2004) descrevem, tem um sentido bastante específico, sendo seu processo de

    desenvolvimento mediado por influências em ambas às direções, havendo graus de

    reciprocidade com pessoas, objetos e símbolos.

    O contexto é traduzido “pelo conjunto de estruturas concêntricas, na quais cada uma

    abarca progressivamente a outra. Estas estruturas são chamadas de micro, meso, exo, macro e

    cronossistema” (POLONIA, DESSEN E SILVA, 2005, p. 77). Assim, esses ambientes

    oferecem possibilidades de desenvolvimento ao indivíduo e intermediam-se mutuamente,

    permeando valores, crenças, práticas, recursos e identidade, permitindo a compreensão das

    influências de tais ambientes no desenvolvimento. Os microssistemas são os mais próximos

    do indivíduo, tais como: família, escola, grupo de amigos e comunidade. À medida que se

    distanciam vão se caracterizando como meso e exo, tais como: políticas públicas, sistema

    econômico, até alcançar o macrossistema, mais remoto, caracterizado pela cultura.

    Esses sistemas se arranjam num sistema que ocorre por toda a vida e que caracterizam

    o quarto nível deste modelo teórico – o Tempo. O cronossistema marca o tempo histórico e os

    acontecimentos vividos pelo indivíduo. Seus eventos são fortes influenciadores do

    desenvolvimento humano. É no cronossistema que todo o desenvolvimento ocorre e nele

    percebe-se a ação e influência dos demais ambientes e relações proximais ocorridas. Como

    apontam Polonia, Dessen e Silva (2005), o tempo compreende dois sentidos: um processo

    microgenético de interação entre o indivíduo em desenvolvimento e aqueles que com ele

    convivem e a passagem do tempo histórico, que dimensiona e estrutura os diferentes sistemas

    culturais.

    Para Bronfenbrenner (1996), os efeitos principais estão na interação, e as explicações

    sobre aquilo que será feito serão encontradas nas interações entre as características das

    pessoas e seus ambientes, passados e presentes. Ao entender o desenvolvimento humano

    nesse conjunto de sistemas, também se vê a pessoa capaz de ser influenciada e os influenciar,

    determinando e, ao mesmo tempo, sendo determinada pelas mudanças que neles ocorrem.

    Nesse modelo, o desenvolvimento humano é visto como ligado à estabilidade e

    mudança dos seres humanos durante seu percurso de vida e também através das gerações, na

    medida em que sofrem e produzem influência sobre o macrossistema nas interações com os

    demais.

    A diversidade do ambiente ou contexto ecológico e suas inter-relações, não se

    caracterizam apenas pelos aspectos diretos, mas também pelos aspectos indiretos que exercem

    sobre o indivíduo.

  • 28

    O microssistema é assim denominado, pois se caracteriza pelo ambiente mais

    próximo, imediato ao indivíduo. De acordo com Polonia, Dessen e Silva (2005), constitui-se

    por padrões de atividades, papéis e relações interpessoais experienciados pelos indivíduos

    num dado ambiente em que suas características físicas, sociais e simbólicas particulares

    funcionam de maneira a estimular ou inibir as relações interpessoais. Com o passar do tempo,

    tais interações se complexificam, a partir das influências da natureza desse meio ambiente.

    No microssistema, constituem-se as atividades molares e as atividades moleculares. As

    primeiras têm como característica a persistência temporal e a significância para os indivíduos

    envolvidos no ambiente e expressam o mecanismo interno e as manifestações externas do

    crescimento psicológico, capacidade que cada indivíduo tem de invocar objetos, pessoas e

    eventos que não estejam no ambiente imediato – ecologia da vida mental. São os aspectos

    mais importantes, imediatos e significativos no processo evolutivo da pessoa. As segundas

    são atividades menos significantes e de pequena duração para o desenvolvimento da pessoa.

    Outro elemento do microssistema são as relações interpessoais, em que precisa haver

    afetividade, equilíbrio de poder e reciprocidade. Ocorrem sempre que uma pessoa presta

    atenção ao que a outra está realizando ou quando compartilha atividades num dado ambiente.

    Podem ocorrer através de uma díade – sistema de duas pessoas, bidirecional; pode ser

    observacional e de atividade conjunta, assim gerando reciprocidade equilíbrio de poder e

    relação afetiva.

    Os papéis no microssistema representam o comportamento típico de um indivíduo em

    relação a alguma profissão ou posição social; é entendido como sendo seu papel perante a

    sociedade e caracterizam um “conjunto de expectativas, atividades e atitudes esperadas

    socialmente a respeito da atuação da pessoa no seu espaço de relações” (POLONIA;

    DESSEN; SILVA, 2005, p. 80).

    Conforme Bronfenbrenner (1996), as mudanças de papel ou ambiente, ou ambos,

    ocorrem durante toda a vida (transições ecológicas), a capacidade de uma díade de servir

    como um contexto de mudança efetivo para o desenvolvimento humano depende da presença

    e participação de uma terceira pessoa. Se essa parte é ausente ou desempenha um papel

    perturbador, em vez de apoiador, o processo desenvolvimental, como um sistema, se

    interrompe. Assim, a importância das transições ecológicas está no fato de envolverem

    mudança de papel, ou seja, de expectativas de comportamento associados a determinadas

    posições na sociedade. Esse mesmo princípio se aplica às relações entre os ambientes,

    fazendo com que a capacidade de um ambiente de funcionar efetivamente como um contexto

    para o desenvolvimento dependa da existência e natureza das interconexões sociais entre os

  • 29

    ambientes, incluindo a participação conjunta, a comunicação e a existência de informações de

    cada ambiente a respeito do outro.

    O mesossistema compreende participação multiambiental, ligações indiretas,

    comunicação e conhecimento. Está marcado pelas “inter-relações entre dois ou mais

    ambientes em que a pessoa em desenvolvimento está inserida e participa de maneira ativa”

    (POLONIA; DESSEN; SILVA, 2005, p.80). Ele estabelece as relações entre microssistemas.

    Para Bronfenbrenner (1996, p.21), o mesossistema é “um sistema de microssistemas. Ele é

    formado e ampliado sempre que a pessoa em desenvolvimento entra num novo ambiente”.

    No mesossistema existe sempre uma transição ecológica quando a pessoa se envolve

    num determinado ambiente pela primeira vez, ou seja, passa de ambiente familiar a um

    desconhecido. Bronfenbrenner (1996) propõe quatro tipos possíveis de interligações entre os

    ambientes: 1) Participação Multiambiente: participação em múltiplos ambientes diferentes,

    assumindo papel ativo, criando rede de relações diretas e um vínculo primário de relações

    face a face e vínculos secundários ou suplementares, criados pela participação de outras

    pessoas no ambiente não-frequentes e sem serem sujeitos de atividades molares; 2) Ligação

    Indireta, quando a inter-relação entre os ambientes é garantida pela presença de uma terceira

    pessoa, com um vínculo denominado intermediário entre os participantes de dois ambientes;

    3) Comunicações Interambiente: comunicações entre ambientes, quando as informações são

    transmitidas de um ambiente para outro por via direta, comunicados telefônicos ou impressos,

    ou indiretamente, através de componentes da rede social, de modo bilateral ou unilateral; 4)

    Conhecimento Interambiente: caracteriza-se por informações, experiências, percepções,

    expectativas que existem de um ambiente em relação ao outro, que apresentam fontes diversas

    de comunicação.

    O exossistema é caracterizado como um ou mais ambientes que não envolvem a

    pessoa em desenvolvimento como um participante ativo, mas os eventos que acontecem

    nesses ambientes afetam ou podem ser afetados pelo que acontece no ambiente em que se

    encontra a pessoa em desenvolvimento. Segundo Polonia, Dessen e Silva (2005), o

    exossistema é composto pelas influências dos cenários externos nos demais ambientes que a

    pessoa tem contato.

    O macrossistema é constituído por um conjunto de valores e crenças de uma cultura ou

    subcultura, envoltos em um cabedal de conhecimento, recursos materiais, costumes, modo de

    vida, estrutura de oportunidades, barreiras e escolhas ao longo da vida. Nesse nível,

    produzem-se impactos culturais referentes ao desenvolvimento moral, valores educacionais,

    gênero, construção de identidade e traços de personalidade. Para Polonia, Dessen e Silva

  • 30

    (2005), o macrossistema representa a cultura, em que os grupos são os promotores do

    desenvolvimento. Conforme Bronfenbrenner (1996):

    O macrossistema se refere à consistência, na forma e conteúdo de sistemas de ordem inferior (micro, meso e exo) que existem, ou poderiam existir, no nível da subcultura como um todo, juntamente com qualquer sistema de crença ou ideologia subjacente a essas consistências (BRONFENBRENNER, 1996, p. 21).

    No modelo bioecológico, encontra-se a noção de pessoa não apenas com

    características idiossincrásicas, mas estimuladas ao desenvolvimento, por meio de sua

    subjetividade, que é composta por crenças valores, nível de atividade, traços de personalidade,

    temperamento, objetivos de vida, motivações e outros. Essas características são formadas por

    três elementos que lhe dão consistência e forma, modificando as interações entre o organismo

    e o ambiente, durante o percurso de vida. São: disposições, recursos bioecológicos e

    demandas, que moldam o desenvolvimento futuro da pessoa, expandem e integram a pessoa

    aos sistemas, que se acomodam e ajustam-se do micro ao macrossistema. (POLONIA,

    DESSEN E SILVA, 2005).

    Para Bronfenbrenner (1996):

    O desenvolvimento humano é o processo através do qual a pessoa desenvolvente adquire uma concepção mais ampliada, diferenciada e válida do meio ambiente ecológico, e se torna mais motivada e mais capaz de se envolver em atividades que revelam suas propriedades, sustentam ou reestruturam aquele ambiente em níveis de complexidade semelhante ou maior de forma e conteúdo (p. 23).

    Para concluir, é importante refletir sobre as contribuições de Bronfenbrenner e seus

    estudos para o desenvolvimento humano. Conforme apontamentos de Polonia, Dessen e Silva

    (2005), Bronfenbrenner amplia as investigações sobre o processo de desenvolvimento

    humano em toda sua complexidade e dinamismo; focaliza o conteúdo das interações, assegura

    uma unidade diádica aos comportamentos da pessoa, amplia o ambiente para uma dimensão

    social ou de outros ambientes mais remotos, abrange as atividades molares e os efeitos de sua

    complexidade e de seu desenvolvimento psicológico da pessoa; agrega a dimensão temporal

    do desenvolvimento, que a trajetória de modo bilateral ou unilateral da pessoa deve ser

    compreendida pelas mudanças ocorridas no seu desenvolvimento, associadas às

    transformações advindas do seu contexto histórico e social.

    2.2.1 O estudo proposto à luz da Teoria Bioecológica

    Pensar sob o viés da Bioecologia do Desenvolvimento Humano na formação da

  • 31

    identidade profissional de psicólogos que atuam na perspectiva da Política Nacional de

    Assistência Social, considerando sua formação acadêmica e os contextos que permeiam tal

    construção identitária, é o objetivo desta seção. Esses contextos de formação e

    desenvolvimento devem ser considerados, conforme aponta Koller (2004), na interação

    sinérgica de quatro níveis inter-relacionados: Processo, Pessoa, Contexto e Tempo, nos quais

    os processos psicológicos passam a ser propriedades dos sistemas descritos no modelo de

    estudo. Assim, faz-se necessário o desafio de transportar esse modelo para a compreensão de

    como isso acontece na formação profissional do psicólogo.

    Alguns contextos são mais significativos e influentes no desenvolvimento do

    indivíduo e sua identidade profissional: o contexto familiar, o contexto comunitário, o

    contexto educacional, o contexto profissional, o contexto político-social vigente, o contexto

    histórico-cultural vivenciado, entre outros. A forma de interação nesses ambientes marca a

    formação e atuação do profissional.

    A pessoa, em seu papel ativo, interativo e produtor de mudança, é o núcleo do

    processo. Para Koller (2004), ela é produtora e produto do desenvolvimento; influencia a

    forma, a força, o conteúdo e direção dos processos proximais, e é, ao mesmo tempo, resultado

    de interação conjunta dos elementos que se referem ao Processo, Pessoa, Contexto e Tempo.

    Conceitos a partir dos quais serão relacionados os demais.

    A identidade como base da formação profissional e as influências e interações de sua

    formação são grandes propulsoras de desenvolvimento. De acordo com Erikson (1971; 1987),

    há, na formação da identidade, uma adaptação mútua entre o indivíduo e o ambiente, o que

    implica definir quem a pessoa é; quais são seus valores, e quais as direções que deseja seguir

    pela vida. Trata-se de uma concepção de si mesmo, composta de valores, crenças e metas,

    com os quais o indivíduo está solidamente comprometido.

    Como indivíduos que vivem, marcam e são marcados pela sociedade, os seres

    humanos recebem e exercem interações, além dos microssistemas, que precisam de

    regularidade, do mesossistema – que apresentam efeitos cumulativos para resultados

    significativos. Segundo Koller (2004), podemos nos transportar para as escolhas profissionais,

    partindo do conhecimento que temos socialmente das profissões e que interferem em nossa

    escolha (exossistema). Compreender essa relação não é suficiente para que possamos

    desenvolver condições de atuação profissional; é preciso observá-la, inserida em outros

    microssistemas e influenciadas pelo exo e macrossistemas.

    O macrossistema é delineado por uma cultura nacional em que as diferenças são

    marcantes, e que, segundo Koller (2004), abarca expectativas e eventos de mudança dentro da

  • 32

    sociedade através de gerações. O profissional formado para atuar como psicólogo tem, em seu

    contexto de formação, uma direção para o atendimento das situações e das complexidades que

    se diferenciam no atendimento às famílias em contexto de vulnerabilidade social. A realidade

    em seu contexto histórico-social vivido, o microcontexto do profissional e sua formação, o

    microcontexto das famílias com as quais trabalhará se diferenciam muito, embora os

    ambientes estejam inseridos no mesmo macrossistema. Essa interação também é marcada pelo

    exossistema que se configura pela política social vigente.

    Os sistemas apresentam-se dinâmicos, ativos, interagindo mutuamente e

    proporcionando mudanças entre si. Além disso, o trabalho em equipes interdisciplinares

    também sofre e exerce os mesmos movimentos, transformando-se em novos sistemas (meso e

    exossistemas). Essa complexidade de inter-relações, interações, acontece ao longo do ciclo de

    vida e influenciam a trajetória dos indivíduos.

    O conteúdo das interações assegura um significado ao desenvolvimento do indivíduo,

    ampliando sua compreensão e intervenção nos ambientes ao qual está inserido. Isso é

    fundamental numa atuação profissional que promove desenvolvimento humano e, por isso,

    deve e precisa manter inter-relação com os contextos de vulnerabilidade social, no qual está

    inserido, requerido pelo seu papel social representado profissionalmente. Tal atuação merece

    zelo e um olhar expandido para que tenha um significado pessoal e social, possibilitando seu

    desenvolvimento psicológico e o desenvolvimento humano da população atendida.

    Ainda cabe ressaltar, conforme explica Koller (2004) – que traduz nossa intenção

    nesta leitura teórica –, que esse modelo contextualista e interacionista destaca que os

    processos ocorrem sempre dentro de contextos, através de interações em diversos níveis e

    sistemas. Há uma constante interação entre os aspectos da natureza e o ambiente, em que os

    hereditários influenciam e são influenciados pelo ambiente.

    Dessa forma, este referencial teórico mostra a importância do contexto e da interação

    existente na formação da identidade profissional do psicólogo. Da mesma maneira, torna-se

    relevante conhecer a Política Nacional de Assistência Social, a caracterização e seu contexto

    de criação.

    2.2.2 A identidade do psicólogo e sua relação com o macrossistema

    Na perspectiva deste estudo faz-se necessária a inserção do contexto socioeconômico e

    político na leitura do macrossistema, que marca a construção identitária do psicólogo. Temos

  • 33

    que considerar que estamos inseridos num contexto histórico multifacetado, com várias

    dimensões, tais como: psicológica, antropológica e, sobretudo, a dimensão do trabalho. Ao

    longo do tempo (cronossistema), várias facetas da interação ocorrem de forma constante, que

    influenciam as escolhas profissionais e as interfaces e serviços desenvolvidos, como

    mencionam Ludke e Boing (2004). Como o processo de trabalho e a produção de capital

    influenciam e são influenciados pelos ambientes micro, meso, exo e macro, é fundamental

    compreender o desenvolvimento, tanto das profissões, quanto das identidades dos indivíduos.

    Na história da humanidade, o trabalho surgiu como uma forma de inter-relação no

    atendimento às necessidades imediatas da sobrevivência, mas sofreu, durante os últimos

    séculos e decorrente de circunstâncias históricas específicas, uma gradual mudança, tornando-

    se criador de riquezas, associado à econômica. Isso impôs dificuldades no que tange os

    processos de identificações por seu intermédio e a construção das identidades profissionais,

    bem como na organização da sociedade como um todo.

    A Revolução Burguesa tratou de deslocar o processo de exploração, de diferenciação entre classes, do domínio divino-hereditário para o plano da livre concorrência- o poder herdado cede terreno ao poder adquirido. A trama econômico-social passa a depender da capacidade de apropriação do trabalho alheio, a mais-valia se dá então, na proporção do controle, na medida em que os ditames de sangue são substituídos pelos ditames da produção (CODO, 1989, p. 149).

    Assim, sob a perspectiva do capitalismo, a natureza do trabalho, modos de

    organização e gestão são alterados, assim como as relações interpessoais que os trabalhadores

    estabelecem nesse contexto.

    Nesse macrocontexto, a Psicologia nasce com o aparecimento da divisão social do

    trabalho no sistema capitalista e no ideário liberal. Os conhecimentos psicológicos surgem

    pela necessidade capitalista/burguesa de defesa da desigualdade e de domínio do corpo social,

    com métodos ajustados a ideologia liberal e a serviço da reprodução da ordem social. Dessa

    forma, seu conhecimento está atrelado ao interesse vigente no momento histórico vivido.

    Pode-se exemplificar, lembrando como assinala Patto (1990), que a Psicologia

    nascente teve como principal papel social descobrir os mais e os menos aptos ao sucesso na

    vida social. Para isso, utilizou-se da Psicologia Científica, através de explicação e mensuração

    das diferenças individuais pela psicometria, para apontar quem era “normal ou anormal”,

    quem tinha habilidades para “isso ou aquilo”, servindo, assim, para justificar o que era de

    interesse ao sistema vigente.

    A Psicologia nacional está inserida no contexto ocidental, fortemente influenciada por

    psicólogos europeus e norte-americanos. Assim, o macrossistema internacional, marcado pela

  • 34

    globalização, exerce influência também no contexto de formação identitária do profissional

    no contexto nacional.

    Observa-se que as ações da Psicologia no Brasil acompanham o contexto mundial e,

    ao mesmo tempo, o desenvolvimento da Psicologia como Ciência (macrossistemas)

    acompanha o processo de instauração do capitalismo e sua ideologia. Assim, independente do

    local ou do sujeito, o processo histórico-político-social interfere diretamente com as ideias e

    representações na identidade profissional. Dessa forma, também é possível pensar que o

    currículo das universidades e a formação do psicólogo estão vinculados a esse processo

    permeado pela globalização, mediada pelo capitalismo.

    Com isso, em nível mundial (macrossistema), esse sistema histórico-político-social,

    durante seu desenvolvimento (cronossistema), passou por momentos de crise, que

    desencadearam uma reestruturação produtiva do trabalho, cujas consequências foram:

    aumento do desemprego, precarização das relações de trabalho, mudanças na inserção dos

    membros da família no mercado de trabalho e diminuição da renda familiar. Tal

    reestruturação produziu e produz alterações na relação família-trabalho que estão relacionadas

    às transformações das atividades econômicas, que, possivelmente, influenciaram as mudanças

    das relações familiares e as condições de sua sobrevivência. Segundo Montali (2000), a

    ausência de políticas de emprego e de proteção social teve como consequências a precarização

    das relações de trabalho e a deterioração da renda familiar.

    Com o empobrecimento crescente das famílias, em consequência dessa forma de

    organização histórico-político-social, observam-se: crescente informalização do trabalho;

    redução do assalariamento e emprego industrial; diminuição do cumprimento dos seus papéis

    historicamente desempenhados; aumento da vulnerabilidade da família e dos riscos que seus

    membros são expostos, demandando novas intervenções de políticas públicas. Ainda de

    acordo com Montali (2000), alguns autores afirmam que o desemprego elevado e a

    precarização das relações do trabalho resultam da orientação macroeconômica, ou seja, fazem

    parte da estratégia de estruturação da política econômica vigente (macrossistema) que

    desconsidera as consequências sociais para a população (microssistema). A população dos

    países periféricos são as que mais sofrem as marcas dessa exclusão histórico-político-social e

    entender tal processo interfere diretamente na atuação junto às mesmas, no sentido de

    compreender a estruturação de sua forma de vida e de promover suas possibilidades de

    desenvolvimento.

    Entendendo essa perspectiva e considerando que essas mudanças e reflexões podem

    ser uma via para a leitura deste trabalho, realizou-se um recorte e optou-se pela Teoria

  • 35

    Bioecológica do Desenvolvimento Humano, como viés para utilização nesta pesquisa, pois

    essa teoria dá condições para uma discussão na amplitude do estudo proposto.

  • 36

    3 IDENTIDADE E DESENVOLVIMENTO PROFISSIONAL

    3.1 IDENTIDADE PROFISSIONAL

    A identidade integra uma identidade individual e uma identidade social. A identidade

    social, que apresenta diversas facetas, contém o necessário para se compreender a identidade

    profissional de um indivíduo. Os autores já citados concordam que a identidade social

    referencia a construção da identidade profissional, como uma das formas de relação com

    grupos específicos do coletivo/social, nesse caso relacionado ao desenvolvimento de uma

    atividade laboral. Alguns autores desenvolveram a discussão sobre identidade profissional e

    sua constituição.

    Machado (2003) relata que a socialização dos indivíduos no mundo do trabalho

    acontece como consequência das relações de poder, experienciada no contexto produtivo, que

    originam regras coletivas de comportamento e possibilitam a construção de uma identidade no

    trabalho.

    Segundo Gomes (2007), independentemente do local ou do sujeito, o processo

    histórico-político-social interfere diretamente com suas ideias e representações na identidade

    profissional. O autor aponta que, no que concerne à identidade profissional dos professores,

    ela sofre interferências do contexto em três situações: concepção de profissão que a nação

    tem; criação de mecanismos capazes de monitorar a identidade profissional, por meio do

    discurso oficial, e a identidade profissional se constitui como manobra a favor dos interesses

    sócio-político e históricos vigentes. Dessa forma, conclui-se que, nas demais profissões, o

    processo aconteça de forma similar.

    Para Gomes (2008, p.5), “[...] a identidade profissional é uma das identidades

    assumidas pelos sujeitos sociais” e afirma que tal identidade só pode ser caracterizada através

    do adjetivo profissional, o que envolve as atividades desenvolvidas e os interesses que

    marcam o exercício do trabalho de um grupo específico, entre outros.

    Coutinho, Krawulski e Soares (2007) resgatam que, na história da humanidade, o

    trabalho surgiu como uma forma de interlocução no atendimento das necessidades imediatas

    da sobrevivência, mas sofreu uma gradual mudança, durante os últimos séculos, decorrente de

    circunstâncias históricas específicas. O trabalho torna-se o criador de riquezas, com conotação

    econômica. Isso impôs dificuldades aos processos de identificações e à construção das

    identidades profissionais.

  • 37

    Assim, Coutinho, Krawulski e Soares (2007) defendem que “[...] sob a lógica

    capitalista, modificam-se a natureza do trabalho, seus modos de organização e de gestão e,

    principalmente, as relações interpessoais que os trabalhadores estabelecem no contexto

    laboral” (COUTINHO, KRAWULSKI E SOARES, 2007, p.34).

    Coutinho, Krawulski e Soares (2007) concebem uma mútua determinação entre

    trabalho e identidade, o primeiro como parte integrante e constituinte da identidade social do

    sujeito, e concomitantemente, a identidade profissional resultado da vinculação do ser

    humano a uma atividade laborativa, considerada no contexto e especificidade que interferem

    no sistema identitário discutido.

    A identidade profissional, para Chamon (2003), apresenta duas dimensões:

    1. a do Eu Profissional, caracterizado como um processo interativo e conflitual, produto

    da imagem que os outros recebem do sujeito “[...] Seria a imagem que o profissional

    construiu de si mesmo, na interação profissional, dentro de contextos profissionais”

    (CHAMON, 2003, p.25);

    2. a da Identidade Profissional, caracterizada “[...] como modelo (visto como conjunto de

    valores e opções adotadas) do ‘bom profissional’ que o indivíduo quer vir a ser”

    (CHAMON, 2003, p.25).

    Concluindo, Chamon (2003) sugere que, no campo da identidade profissional, podem

    ocorrer rompimentos identitários, quando as realizações e potencialidades do Eu Profissional

    não são respaldadas pelo grupo de significantes ao qual está inserido (no caso, profissional),

    contradizendo a imagem que o indivíduo tem de si.

    Bock (1999) defende que uma identidade em movimento, em constante mudança

    (metamorfose), produz uma identidade profissional que acompanha tal movimento da

    realidade e que, portanto, nunca estará pronta e nunca terá uma definição, estará sempre em

    construção.

    Rosa (1990) aborda que a “[...] identidade psicológica de um indivíduo está

    intimamente ligada à da escolha de uma profissão (p.116)” e que essa escolha são processos

    interligados de modo interessante, sem que se possa dizer qual é causa e qual é efeito. Além

    disso, Rosa (1990) relata que o ajustamento pessoal e social do indivíduo, bem como seu

    futuro, depende da escolha adequada da profissão. Todo processo de ajustamento emocional e

    social do homem é consequência da forma como ocorre sua adaptação à realidade do trabalho.

    Com base nos estudos de Erikson, Rosa (1990) postula que a identidade pessoal deve

    ser definida em termos de realidade social. Assim, a escolha por uma profissão pelo indivíduo

  • 38

    ocorrerá em decorrência da “forma de ser na sociedade e como afirmação de seu lugar no

    mundo criativo do trabalho e da produtividade” (ROSA, 1990, p.114).

    Existe, para Erikson (1971; 1987), uma relação entre a identidade pessoal e a

    identidade social, que se constrói na interação com os preceitos e regras sociais, mas com

    implicação em seu desenvolvimento psicossocial. Portanto, a construção de sua identidade

    profissional está fortemente influenciada pelo contato que estabelece com o meio em que

    vive. Assim, num processo proximal, a identidade e a identidade profissional são construídas

    num contexto de complexificação e diferenciação das características pessoal e contextual, ao

    qual o indivíduo está inserido.

    Nesse processo os ambientes/sistemas micro, meso, exo e macro interagem e mostram

    sua marca nessa formação identitária. Família, comunidade e escola caracterizam-se como

    ambientes próximos que influenciam as escolhas dos indivíduos. Conforme observa

    Bronfenbrenner (1996), esse processo ocorre nessa interação ao longo do ciclo de vida.

    A forma como cada pessoa vivencia a interação com esses ambientes potencializa suas

    capacidades de desenvolvimento e pode favorecer o modo como enfrenta os obstáculos e os

    desafios que lhe são interpostos, no decorrer de sua vida. Dessa forma, essa interação entre

    pessoa e ambientes influencia sua capacidade de respostas ao meio, podendo contribuir para a

    superação dos obstáculos que encontrará frente ao desenvolvimento profissional.

    Cabe aqui aprofundar como a construção da identidade para Erikson (1971) se

    relaciona a identidade profissional. Em sua teoria de desenvolvimento psicossocial, Erikso