CONTANDO HISTÓRIAS COM CAIXAS: RELATO DA EXPERIÊNCIA ... · Eixo temático 08: Educação...

14
CONTANDO HISTÓRIAS COM CAIXAS: RELATO DA EXPERIÊNCIA DESENVOLVIDA NO CELLIJ Luana Silva Neves Juliane Francischeti Martins Motoyama Renata Junqueira de Souza Universidade Estadual Paulista “Júlio Mesquita Filho” Campus de Presidente Prudente Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico [email protected] [email protected] [email protected] Financiamento: Programa dos Núcleos de Ensino da Unesp Eixo temático 08: Educação Infantil e Ensino Fundamental TELLING STORIES WITH BOXES: REPORT OF DEVELOPED EXPERIENCE CELLIJ Resumo: A literatura e contação de histórias são de suma importância na vida das crianças, por isso, o Centro de Estudos em Leitura e Literatura Infantil e Juvenil “Maria Betty Coelho Silva” (CELLIJ) localizado na Universidade Estadual Paulista “Júlio Mesquita Filho” na cidade de Presidente Prudente- SP, sob a coordenação da Profª Drª Renata Junqueira de Souza, trabalha para atender crianças, tanto da rede pública como particular, da cidade e de seu entorno. As ações desenvolvidas buscam envolver os pequenos no mundo mágico da fantasia, onde as histórias são apresentadas de maneira lúdica e interativa. O presente artigo tem o propósito de discutir a relevância da contação de histórias na vida das crianças, preparando para formar futuros leitores, capazes de exercerem um pensamento crítico reflexivo, a partir do prazer e gosto pela leitura literária. Para tanto, apresentamos a proposta de uso de diferentes caixas literárias para contar histórias na Educação Infantil. Seguido de um relato de experiência com a caixa de contação da história “A Galinha que Criava um Ratinho” da autora Ana Maria Machado (2010) que foi desenvolvido durante o mês de março de dois mil e quinze. Palavras-chave: Educação Infantil, Contação de histórias, Caixas Literárias. Abstract: Literature and storytelling are very important in children's lives, so the Study Centre in Reading and Children's and Youth Literature "Maria Betty Coelho Silva" (CELLIJ) located at the Universidade Estadual Paulista "Julio Mesquita Filho" in the city Presidente Prudente SP, under the coordination of Prof. Dr. Renata Junqueira de Souza, works to meet children, both public and private, of the city and its surroundings. The actions seek to involve small in the magical world of fantasy, where the stories are presented in a playful and interactive way. This article aims to discuss the importance of storytelling in children's lives, preparing to form future readers, able to exercise a reflective critical thinking, from the pleasure and taste for literary reading. Therefore, we present the proposed use of different literary boxes to tell stories in kindergarten. Followed by an account of experience with the story-box story "The Hen created a

Transcript of CONTANDO HISTÓRIAS COM CAIXAS: RELATO DA EXPERIÊNCIA ... · Eixo temático 08: Educação...

Page 1: CONTANDO HISTÓRIAS COM CAIXAS: RELATO DA EXPERIÊNCIA ... · Eixo temático 08: Educação Infantil e Ensino Fundamental TELLING STORIES WITH BOXES: REPORT OF DEVELOPED EXPERIENCE

CONTANDO HISTÓRIAS COM CAIXAS: RELATO DA EXPERIÊNCIA

DESENVOLVIDA NO CELLIJ

Luana Silva Neves

Juliane Francischeti Martins Motoyama

Renata Junqueira de Souza

Universidade Estadual Paulista “Júlio Mesquita Filho” Campus de Presidente Prudente

Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico

[email protected]

[email protected]

[email protected]

Financiamento: Programa dos Núcleos de Ensino da Unesp

Eixo temático 08: Educação Infantil e Ensino Fundamental

TELLING STORIES WITH BOXES: REPORT OF DEVELOPED

EXPERIENCE CELLIJ

Resumo: A literatura e contação de histórias são de suma importância na vida das

crianças, por isso, o Centro de Estudos em Leitura e Literatura Infantil e Juvenil “Maria

Betty Coelho Silva” (CELLIJ) localizado na Universidade Estadual Paulista “Júlio

Mesquita Filho” na cidade de Presidente Prudente- SP, sob a coordenação da Profª Drª

Renata Junqueira de Souza, trabalha para atender crianças, tanto da rede pública como

particular, da cidade e de seu entorno. As ações desenvolvidas buscam envolver os

pequenos no mundo mágico da fantasia, onde as histórias são apresentadas de maneira

lúdica e interativa. O presente artigo tem o propósito de discutir a relevância da

contação de histórias na vida das crianças, preparando para formar futuros leitores,

capazes de exercerem um pensamento crítico reflexivo, a partir do prazer e gosto pela

leitura literária. Para tanto, apresentamos a proposta de uso de diferentes caixas

literárias para contar histórias na Educação Infantil. Seguido de um relato de

experiência com a caixa de contação da história “A Galinha que Criava um Ratinho” da

autora Ana Maria Machado (2010) que foi desenvolvido durante o mês de março de

dois mil e quinze.

Palavras-chave: Educação Infantil, Contação de histórias, Caixas Literárias.

Abstract: Literature and storytelling are very important in children's lives, so the Study

Centre in Reading and Children's and Youth Literature "Maria Betty Coelho Silva"

(CELLIJ) located at the Universidade Estadual Paulista "Julio Mesquita Filho" in the

city Presidente Prudente SP, under the coordination of Prof. Dr. Renata Junqueira de

Souza, works to meet children, both public and private, of the city and its surroundings.

The actions seek to involve small in the magical world of fantasy, where the stories are

presented in a playful and interactive way. This article aims to discuss the importance of

storytelling in children's lives, preparing to form future readers, able to exercise a

reflective critical thinking, from the pleasure and taste for literary reading. Therefore,

we present the proposed use of different literary boxes to tell stories in kindergarten.

Followed by an account of experience with the story-box story "The Hen created a

Page 2: CONTANDO HISTÓRIAS COM CAIXAS: RELATO DA EXPERIÊNCIA ... · Eixo temático 08: Educação Infantil e Ensino Fundamental TELLING STORIES WITH BOXES: REPORT OF DEVELOPED EXPERIENCE

Mouse" the author Ana Maria Machado (2010) which was developed during the month

of March two thousand fifteen.

Key words: Early Childhood Education, Storytelling, Literary Boxes.

Introdução

A contação de histórias é uma prática milenar que acompanha os seres humanos

desde os primórdios da criação. Mesmo aqueles que dizem não saber como contar

histórias, narram fatos de seu cotidiano ou mesmo “fofocas” pela vizinhança, dando

sequência a uma teia de narrativas que se estende pelo universo. O objetivo deste texto é

retratar aos leitores como se dá o uso de caixas para a contação de histórias, assunto

pouco discutido nos textos que estudam a apresentação da literatura infantil e juvenil

para os pequenos.

Esse diálogo sobre contar histórias e técnicas que podem ser utilizadas para este

fim é importante porque através da literatura é possível para a criança compreender o

mundo, viajar a lugares inimagináveis, sendo as diferentes caixas de contação de

histórias um meio pelo qual podemos auxiliar os infantes a adentrar em um mundo

lúdico com a visualização.

Acreditando nessas concepções, o Centro de Estudos em Leitura e Literatura

Infantil e Juvenil (CELLIJ) vem há mais de vinte anos desenvolvendo diferentes ações

para a formação do leitor com base em experiências orais. Os resultados demonstram

que, após a mediação desenvolvida pelo contador de histórias entre a narrativa oral e os

ouvintes, muitos pequenos passam a interessar-se mais pelo universo literário. Sendo

assim, esse estudo apresenta a técnica de contar histórias tendo como principal recurso

uma caixa para desenvolver ao nosso público o interesse pela leitura.

Os procedimentos metodológicos utilizados para a construção deste relato foram

a pesquisa bibliográfica em diferentes fontes como Silva (1986) e Souza et. al. (2015)

que abordam a importância da leitura e contação de histórias para a formação do leitor.

Além disso, debruçamo-nos sobre uma análise mais pontual sobre a prática de contar

histórias com caixas que pode ser definida como estudo de caso no qual se discute o uso

desses materiais na formação de leitores na educação infantil, tendo como cenário as

atividades desenvolvidas no CELLIJ durante o mês de março de dois mil e quinze.

Page 3: CONTANDO HISTÓRIAS COM CAIXAS: RELATO DA EXPERIÊNCIA ... · Eixo temático 08: Educação Infantil e Ensino Fundamental TELLING STORIES WITH BOXES: REPORT OF DEVELOPED EXPERIENCE

Caixas que contam histórias

Uma lenda muito antiga conta que nos primeiros tempos, não haviam histórias

na Terra, pois Nyame, o Deus do Céu, as guardava todas para si em um grande e

precioso baú. Desejando compartilhar desse tesouro, Ananse subiu até o céu através de

uma teia de aranha que ele construiu e intercedeu junto a Nyame que lhe propôs um

desafio: se o homem aranha trouxesse Osebo, o leopardo de dentes terríveis, Mmboro, o

marimbondo que pica como fogo e Moatia, a fada que nenhum homem nunca viu, as

histórias lhes seriam dadas. Ananse cumpriu a missão e ganhou o direito de ser o

portador das histórias, mas ao recebê-las não guardou para si, abriu o baú e as deixou

voarem pelos ares chegando a todos os homens.

Desde a conquista de Ananse, todos os homens são capazes de contar histórias.

Inicialmente, as histórias eram contadas a beira do fogo em um círculo, talvez na calada

da noite, usando apenas a voz e a expressão do contador. Mas o homem é um ser em

desenvolvimento e como tudo aprimora, aprimorou também os modos de contar. No

decorrer do tempo, novos acessórios foram incorporados a contação, novas ideias foram

surgindo e a arte da narrativa foi se remodelando e sobrevivendo a passagem dos

séculos.

A contação de histórias é uma das formas de humanizar as pessoas, pois mexe

com as emoções e trabalha no fundo da alma. Para realizá-la existem diversos recursos.

Os mais conhecidos e utilizados segundo Silva (1986) são: a simples narrativa, a

narrativa com o auxílio do livro, o uso de gravuras ou história ampliada, flanelógrafo,

desenhos e a narrativa com interferências do narrador e dos ouvintes. No presente

artigo, mencionaremos algumas dessas técnicas já apresentadas por Silva (1986), mas

nos ateremos mais profundamente na apresentação da caixa de contação de histórias

uma dessas novidades que os contadores do século XXI trouxeram para incrementar a

arte.

A contação de histórias encanta as crianças, assim como adultos, por que faz

parte da oralidade, uma característica nata dos seres humanos, enquanto que a escrita é

uma ferramenta criada pela humanidade, mas que deve ser ensinada e adquirida ao

longo dos anos, portanto, necessita de maior esforço para aprendizagem. Basta observar

os primeiros anos de vida dos indivíduos para percebermos que as primeiras

experiências da vida humana seguem o seu percurso e se pautam na oralidade, sendo o

sujeito constituído inicialmente pela linguagem que o auxilia na abstração e

compreensão, assim como na formação do pensamento concreto. Os Contos de Fadas,

Page 4: CONTANDO HISTÓRIAS COM CAIXAS: RELATO DA EXPERIÊNCIA ... · Eixo temático 08: Educação Infantil e Ensino Fundamental TELLING STORIES WITH BOXES: REPORT OF DEVELOPED EXPERIENCE

por exemplo, estão ligados a tradição oral da humanidade, por este motivo são tão

aceitos pelos pequenos e fruem tão bem na oralidade.

[...] uma arte extremamente envolvente e que pede participação: a arte

de ler oralmente e de contar histórias. As histórias refletem a

expressão artística e o imaginário de uma pessoa, uma comunidade ou

um povo. Assim ler e contar oral e expressivamente são artes

próximas do teatro. Atraem crianças, sobretudo, mas também nos

adultos. Têm o poder de sair do fato local para o universal. Criam

intercâmbios entre as pessoas de realidades e nacionalidades

diferentes. (SOUZA, GIROTTO 2009 p. 21).

Portanto a contação de histórias recebe o status de arte por ser uma ação singular

e complexa que mexe com os que contam e com aqueles que o assistem de modo

profundo e único. Contar histórias é mais que apresentar uma narrativa, é dizer sobre

um povo e sua constituição, mais ainda, é dizer sobre um povo e sua vida de modo

mágico.

Existem diversos tipos de recursos diferentes para se contar histórias, cabe ao

contador selecionar qual a técnica com que ele se sente mais confortável e seguro. O

circuito literário, por exemplo, é uma delas. Nesta dinâmica, as crianças tem

participação direta, auxiliando o personagem principal a avançar durante todo o

processo da narrativa, assim como em um grande jogo de damas, no qual o tabuleiro

não é quadrado e sim circular. Segundo Ribeiro (2015), essa técnica é adequada para a

contação de histórias longas como, por exemplo, Alice no País das Maravilhas

(CARROLL, 2015).

O teatro de sombras, por sua vez, consiste em uma técnica milenar chinesa, que

consiste em manipular os personagens da história sob um fundo branco e contra a luz,

projetando uma sombra (SOUZA, 2015a). O uso desse método é adequado para

histórias com poucos cenários e personagens, mas com algum movimento para que a

criança possa visualizar nas sombras o desenrolar da narrativa.

Segundo autoras que estudam a contação de histórias como Silva (1986) e, mais

recentemente, Santos (2015), a simples narrativa é uma técnica utilizada desde a

antiguidade, isso porque, ela é uma forma acessível de transmissão de narrativas orais,

pois pode ser utilizada em qualquer lugar, e para pessoas de todas as idades, sem

requerer outros tipos de recursos e instrumentos a não ser a voz. Essa técnica é

adequada para narração de contos do folclore popular ou contos de fadas.

Page 5: CONTANDO HISTÓRIAS COM CAIXAS: RELATO DA EXPERIÊNCIA ... · Eixo temático 08: Educação Infantil e Ensino Fundamental TELLING STORIES WITH BOXES: REPORT OF DEVELOPED EXPERIENCE

A contação com o flanelógrafo é uma técnica que consiste na audição e

visualização da história que esta sendo contada. Ela se dá em um objeto produzido de

madeira ou papelão duro, com uma face coberta de flanela ou feltro, de modo que, os

personagens da narrativa possam ser manuseados e afixados em sua superfície. Os

objetos que serão utilizados como personagens e cenários podem ser confeccionados

pelo próprio contador, requerendo planejamento e organização antes do momento de

usá-lo (SILVA, 1986). Todavia, o flanelógrafo é pouco indicado para contações com

muitos cenários e/ou personagens, pois isso pode trazer desconforto e atrapalhar o

narrador no momento de realizar a troca de figuras da superfície.

Parente do já conhecido flanelógrafo, o tapete de contação de histórias é um

material que funciona bem quando se tem uma pequena quantidade de crianças ou

espectadores, não é recomendado para espaços onde se encontram muitos ouvintes, pois

não garante a visualização das ações que estarão transcorrendo no chão (FERREIRA;

MOTOYAMA, 2015). Assim como no flanelógrafo, é preciso estar atento ao número de

personagens e cenários para que eles possam ser expostos no tapete de modo coerente.

Esse recurso é indicado para contação de histórias circulares.

Por fim, a caixa literária é uma técnica de contação de histórias que consiste na

interação e visualização dos ouvintes, a partir da mediação de uma caixa que pode

assumir as mais distintas formas, sua produção se faz com uma caixa de papelão (que

pode variar o tamanho, desde uma caixa de sapato até algo de maior dimensão) de modo

que, as faces da caixa abriguem cenários e outras surpresas para os ouvintes.

Segundo Lima e Girotto (2007, p.07),

Essa maneira de contar histórias é uma alternativa metodológica para

que a criança seja efetivamente envolvida na atividade, sobretudo, por

buscar mobilizar o uso de capacidades mentais essenciais ao seu

desenvolvimento cultural: a memória, a atenção e a percepção

voluntárias, a imaginação, a linguagem oral, o pensamento, as

emoções, a função simbólica da consciência, a vontade.

Existem diferentes modelos de caixas para contar histórias, o modelo 1, foi

construído a partir de uma caixa de papelão grande (geralmente aquelas em que se

compra papel sulfite). No caso da caixa aqui apresentada, ela traz a história “A Galinha

que Criava um Ratinho” de Ana Maria Machado (2010).

Para construí-la, utilizamos diversas folhas coloridas de EVA, escolhemos os

principais cenários da história e reproduzimos nas faces da caixa, ou seja, quatro

Page 6: CONTANDO HISTÓRIAS COM CAIXAS: RELATO DA EXPERIÊNCIA ... · Eixo temático 08: Educação Infantil e Ensino Fundamental TELLING STORIES WITH BOXES: REPORT OF DEVELOPED EXPERIENCE

cenários, conforme se pode observar nas figuras 1 e 2. O primeiro é a casinha no alto do

morro, parte inicial da narrativa que vai apresentar o espaço como um todo; a segunda

face é a reprodução da sala de estar da família, local onde ocorrem os principais fatos da

narrativa; a terceira é o bosque por onde os personagens precisam passar para chegar ao

rio, cenário da quarta face da caixa. Os personagens também são construídos em EVA e

sustentados por palitos de madeira.

Figura 1: Faces da caixa

Fonte: As autoras Figura 2: Outras faces da caixa

Fonte: As autoras

Do lado de dentro da caixa mantém-se todos os instrumentos (personagens,

objetos citados no livro como, por exemplo, um bolo de milho) que iremos utilizar

durante a contação da história, conforme se pode observar na figura 3. Conforme as

ações vão transcorrendo na narrativa, o contador vai retirando os objetos da caixa e

mostrando para os ouvintes. Os cenários também devem ser mudados, para isso, basta

girar a caixa de posição. Para contar com esse tipo de caixa, as crianças devem sempre

estar à frente do narrador, pois assim, o contador pode escolher a face que deve ser vista

pelos ouvintes e manter as demais fora de cena para não confundir os expectadores.

Esse material pode ser utilizado desde a educação infantil até o ensino fundamental,

alterando-se apenas a história que será contada.

Page 7: CONTANDO HISTÓRIAS COM CAIXAS: RELATO DA EXPERIÊNCIA ... · Eixo temático 08: Educação Infantil e Ensino Fundamental TELLING STORIES WITH BOXES: REPORT OF DEVELOPED EXPERIENCE

Figura 3: Interior da Caixa

Fonte: As autoras

No entanto, existem caixas que se misturam com os livros. Neste caso, as caixas

são menores que a que foi apresentada anteriormente. O mais adequado neste caso é

fazer uso de uma caixa de sapatos com a tampa fixa. Encapa-se a caixa com tecido e

faz-se a reprodução do livro através de xerocopiadora ou de EVA. O livro é então

afixado na tampa da caixa ficando o texto visível para o contador e as imagens para os

ouvintes. No interior da caixa, fica sempre um objeto ou figura que remeta a história

que foi contada.

A caixa abaixo representada foi construída pela equipe da Faculdade de Filosofia

e Ciência, Unesp, Campus de Marília, para a contação da história “A Colcha de

Retalhos” (SILVA;SILVA, 2010). O livro foi xerocopiado as imagens foram recortadas

em E.V.A e destacadas com cola em auto relevo, assim as crianças podem visualizar e

também tocar as figuras, conforme a figura 4 mostra. Dentro da caixa, na figura 5, está

um coração com a palavra saudade, por ser este um sentimento central na história que

será narrada. Antes da contação, o professor abre a caixa e pergunta quem sabe o que é

saudade e conversa com as crianças se elas conseguem entender o que aquele

sentimento tem haver com a história que será narrada. Após a narrativa, as crianças irão

compreender o objeto perdido no interior da caixa e checar se suas hipóteses estavam

corretas.

Page 8: CONTANDO HISTÓRIAS COM CAIXAS: RELATO DA EXPERIÊNCIA ... · Eixo temático 08: Educação Infantil e Ensino Fundamental TELLING STORIES WITH BOXES: REPORT OF DEVELOPED EXPERIENCE

Figura 4: Faces da caixa

Fonte: As autoras Figura 5: Interior da caixa

Fonte: As autoras

Outras caixas são mais interativas e lembram uma tv, pois trazem as páginas dos

livros com as cenas impressas em suas laterais. A caixa literária da história “Quem

soltou o PUM?” (FRANCO; LOLLO, 2010) é toda revestida de EVA, com os cenários

principais que contém na narrativa, com cenários do banheiro, de uma personagem

fazendo o sinal de NÃO, dando sentido duplo ao título “quem soltou o PUM?”,

podemos visualizar conforme as figuras 6 e 7.

Figura 6: Faces da caixa

Fonte: As autoras Figura 7: Outras faces da caixa

Fonte: As autoras

No interior da caixa, conforme mostra a figura 8, se encontra o objeto chave para

compreensão da história (o animal PUM), assim após a contação as crianças se

envolvem com o objeto de pelúcia, brincando e fazendo a reconstrução da história.

Page 9: CONTANDO HISTÓRIAS COM CAIXAS: RELATO DA EXPERIÊNCIA ... · Eixo temático 08: Educação Infantil e Ensino Fundamental TELLING STORIES WITH BOXES: REPORT OF DEVELOPED EXPERIENCE

Figura 8: Interior da caixa

Fonte: As autoras

Não importa o formato da caixa escolhida pelo docente, o importante é que por

meio desta técnica de contação de histórias é possível que as próprias crianças, com a

ajuda do professor, recriem e reinventem a sua caixa de contação, com a história que

preferir.

O professor é o sujeito mediador e criador de mediações entre a

criança e a cultura historicamente elaborada e com possibilidade de

introduzir os pequenos e as pequenas no mundo da fantasia, dos bens

culturais e da apropriação de conhecimentos necessários ao seu

desenvolvimento pleno. (LIMA, GIROTTO, 2007, p.07)

Neste sentido, conta-se histórias para crianças para proporcionar prazer às

mesmas, formar leitores, espalhando pelos cantos a leitura, assim como faz os pássaros

com as sementes, brotando flores e formando florestas. Neste sentido, a hora do conto é

de suma importância na rotina da educação infantil. Quanto às caixas de contação, além

do fato da caixa ser de material reciclável cabe na mesma a imaginação, usar a arte

manual a seu favor para encantar as crianças.

Contando Histórias com Caixas: um relato de experiência

O presente relato trará a experiência desenvolvida no CELLIJ, com crianças da

educação infantil, durante o mês de março de dois mil e quinze com o uso da história “A

Galinha que Criava um Ratinho" (MACHADO, 2010). Essa narrativa traz a história de

um casal de aves, galo e galinha, que não tinham nenhum pintinho, e então resolveram

pegar um ratinho para criar, cuidavam muito bem do ratinho, um dia a mamãe galinha

antes de sair avisou ao papai galo e ao ratinho para tomarem cuidado, pois a raposa

estava pelas redondezas, mas o papai preguiçoso nem deu ouvidos ao que a mamãe

falou, e quando bateram na porta ratinho a abriu e no mesmo instante a raposa viu

Page 10: CONTANDO HISTÓRIAS COM CAIXAS: RELATO DA EXPERIÊNCIA ... · Eixo temático 08: Educação Infantil e Ensino Fundamental TELLING STORIES WITH BOXES: REPORT OF DEVELOPED EXPERIENCE

aquele ratinho e não interessava, ela gostava mesmo era de animais grandes e com

penas, engoliu o papai galo em uma bocada só. Mas a mamãe galinha é muito esperta,

ao invés de arrancar as penas da cabeça toma atitudes para livrar a sua família da mira

da raposa para sempre.

O contar histórias não é apenas colocar a narrativa para os pequenos. É preciso

um preparo por parte do docente para que as crianças possam passar por experiências

que sejam enriquecedoras e que formem o seu repertório leitor, por isso, é muito

importante a conversa antes e depois da contação.

Esse antes da contação é denominado por Matos e Sorsy (2005) como

“aquecimento”, pois prepara a criança para adentrar no mundo da imaginação. O

aquecimento pode ser uma atividade lúdica como música ou brincadeiras diversas, mas

precisa estar sempre relacionado à temática que será abordada no caso da contação da

história “A Galinha que Criava um Ratinho" (MACHADO, 2010) com a técnica da

caixa de contação usamos o aquecimento da concentração para adentrarmos no mundo

da fantasia.

A brincadeira da concentração consiste em, pedir para que as crianças adivinhem

o que é necessário para se ouvir histórias, então damos uma dica e dizemos que esta a

palavra que eles precisam adivinhar começa com a letra “C”, após um momento de

tentativas e erros, eles adivinham e falam “CONCENTRAÇÃO”. O passo seguinte é

tentar pegar a concentração com as mãos, em uma espécie de meditação, depois

perguntamos as crianças em qual lugar do corpo que iremos passá-la, os pequenos

dizem que é preciso passar na boca, para não conversar durante o momento da contação,

nos ouvidos, para ouvir bem, brincamos com eles e dizemos que sempre é preciso

passar concentração nos pés, para não ficar com cheiro de chulé, e no bumbum, para

não soltar pum, todos acham engraçado e riem.

Após o aquecimento, as crianças já estão calmas e podemos realizar a introdução

da história (MATOS; SORSY, 2005). Esse é o momento que pontua para a criança que

a história já vai começar como o famoso “Era uma vez” dos contos de fadas. No caso da

história “A Galinha que Criava um Ratinho" (MACHADO, 2010) a introdução já vem

pronta no texto escrito, bastando ao contador decorá-la:

Lá em cima daquele morro tem uma casinha branca, com teto de sapê.

É tão pequenina que nem dá para ver daqui. Mas eu sei que tem,

porque quando eu era pequena, assim que nem você, minha mãe me

disse que tinha, e me contou a história que tinha acontecido nessa

Page 11: CONTANDO HISTÓRIAS COM CAIXAS: RELATO DA EXPERIÊNCIA ... · Eixo temático 08: Educação Infantil e Ensino Fundamental TELLING STORIES WITH BOXES: REPORT OF DEVELOPED EXPERIENCE

casa. Uma história que minha avó contou pra ela e eu vou contar pra

você (MACHADO, 2010, p. 02)

A contação de histórias com a caixa consiste em colocar os diferentes objetos

que serão evocados durante a narrativa em uma caixa de papelão grande e de fácil

visualização para as crianças e, conforme se narra a história, esses objetos vão sendo

apresentados. Por exemplo, no trecho em que o narrador explica como a galinha e o

galo cuidavam de seu ratinho “davam comida, banho gostoso, contavam história,

cantavam música, inventavam brincadeira, davam beijo (de bico), abraço (de asa) e

faziam cafuné (do jeito bom que você imaginar)” (MACHADO, 2010, p. 05) o narrador

vai apresentando as ações, dando mamadeira para o ratinho, fingindo jogar água no

ratinho com o regador, assim por diante, como vemos na figura 9.

Figura 9: Contando história com a caixa

Fonte: As autoras

Neste caso, “a palavra contada não é simplesmente fala. Ela é carregada dos

significados que lhe atribuem, o gestual, o ritmo, a entonação, a expressão facial e até o

silêncio que, entremeando ao discurso, integra-se a ela” (MATOS; SORSY 2005 p.4),

portanto, a caixa confere um elemento a mais para enriquecer a compreensão e

visualização do ouvinte.

Após a contação, realizamos a finalização (MATOS; SORSY, 2005) para

pontuar o fim da narrativa para os ouvintes, no caso dessa história, utilizamos a frase

“essa história entrou por uma porta e saiu pela outra quer souber que conte outra”.

Todavia, o uso da caixa de contação não se esgota com o trabalho do

professor/contador. A riqueza do material está em sua versatilidade, pois é possível o

reconto da história por parte das crianças, espalhando a arte de contar histórias por onde

quer que passemos.

Page 12: CONTANDO HISTÓRIAS COM CAIXAS: RELATO DA EXPERIÊNCIA ... · Eixo temático 08: Educação Infantil e Ensino Fundamental TELLING STORIES WITH BOXES: REPORT OF DEVELOPED EXPERIENCE

Quando utilizamos a caixa literária para contar a história “A Galinha que Criava

um Ratinho” (MACHADO, 2010) as crianças aparentaram estar com vergonha. Essa

timidez se deu por conta de ser a primeira vez em que nos encontramos com as crianças

e o ambiente do CELLIJ era algo totalmente novo para elas, mas bastou a história

começar que logo essa situação se modificasse e as crianças começassem a interagir.

Fizemos uma brincadeira espontânea devido a timidez das crianças, que a raposa

(personagem da história) não havia engolido somente o papai galo (personagem), mas

também a língua das crianças, tirando assim risadas das mesmas. Esse tipo de

intervenção na educação infantil funciona bem porque as crianças possuem uma

imaginação fértil e sempre acabam acreditando e visualizando as coisas que são

colocadas pelos contadores.

Houve uma turma em que havia dois alunos, C. e S., que se soltaram mais,

interagindo conosco e com a história, fizeram conexão com a história de “Chapeuzinho

Vermelho”, no momento em que a mamãe galinha (personagem) corta a barriga da

raposa para retirar o papai galo e coloca pedras no lugar. Essas crianças, por possuírem

maior proximidade com outros textos literários, foram capazes de estabelecer conexões

coerentes entre textos literários (SOUZA; GIROTO, 2010).

Através do uso da caixa, foi possível perceber que as crianças compreendiam

melhor o que estava sendo apresentado para elas, pois já possuíam acesso ao material

imagético e focavam-se no que estava sendo narrado. Assim, as conexões entre o texto

lido e outros já conhecidos foram construídas, pois os pequenos tiveram espaço não

apenas para participar da atividade como também refletir sobre o texto.

A caixa literária foi uma novidade para todos, tanto para as crianças, que tinham

curiosidade em questão dos objetos que saiam do interior da caixa, quanto para nós, que

contamos pela primeira vez com esta técnica de contação de histórias, mas a experiência

foi muito gratificante.

Considerações Finais

A apresentação e o relato que foram apresentados neste texto se fazem

importantes, pois podem auxiliar os professores e contadores de histórias na formação

do futuro leitor. De tudo que aqui foi apresentado, o mais importante é compreender o

poder das histórias na formação dos pequenos, pois as contações de histórias com

diversos recursos podem levar os ouvintes à outra dimensão, a da fantasia, espaço onde

tudo é possível se você se deixar levar pelas histórias.

Page 13: CONTANDO HISTÓRIAS COM CAIXAS: RELATO DA EXPERIÊNCIA ... · Eixo temático 08: Educação Infantil e Ensino Fundamental TELLING STORIES WITH BOXES: REPORT OF DEVELOPED EXPERIENCE

A caixa de contação de história mostrou-se uma importante ferramenta não apenas para

aproximar as crianças do texto, mas também para trabalhar estratégias de leitura com a

organização sequencial do texto, o desenvolvimento da visualização, construção de

inferências e a possibilidade de criar conexões entre diferentes narrativas conhecidas

pelos pequenos. Neste sentido, é importante que sejam sempre oferecidas atividades

como essas para o enriquecimento do repertório dos leitores.

Referências

CARROLL, Lewis. Alice no país das maravilhas. Trad. De Clélia Regina Ramos. São

Paulo: Universo dos livros, 2015.

FRANCO, Blandina, LOLLO, José Carlos. Quem soltou o Pum?. Cia das letrinhas,

2010.

FERREIRA, Simônica da Costa; MOTOYAMA, Juliane Francischeti Martins. É só

sentar que a história já vai começar: tapetes para contar e encantar.In: SOUZA,

Renata Junqueira de [et al.]. A arte narrativa na infância: práticas para o teatro da

leitura e contação de histórias. Campinas-SP: Mercado de Letras, 2015.

MATOS, Gislayne Avelar; SORSY, Inno. O ofício do contador de histórias. São

Paulo-SP: Editora WMF Martins Fontes, 2005.

MACHADO, Ana Maria. A galinha que criava um ratinho. São Paulo- SP: Editora

Ática, 2010.

RIBEIRO, Taisa Andrade de Souza Silva. Alice que foi para o país das maravilhas e

nós fomos juntos: o circuito literário como proposta lúdica na contação de

histórias. In: SOUZA, Renata Junqueira de [et al.]. A arte narrativa na infância:

práticas para o teatro da leitura e contação de histórias. Campinas-SP: Mercado de

Letras, 2015.

SANTOS, Izabele Dias dos. A literatura oral na sala de aula: trabalhando a

narração de contos e causos a partir da simples narrativa. In: SOUZA, Renata

Junqueira de [et al.]. A arte narrativa na infância: práticas para o teatro da leitura e

contação de histórias. Campinas-SP: Mercado de Letras, 2015.

SILVA, Betty Coelho. Contar histórias uma arte sem idade. São Paulo-SP: Editora

Ática S.A., 1986.

SILVA, Nye Ribeiro da, SILVA, Conceil Correa da. A colcha de retalhos. Editora do

Brasil Sp, 2010.

SOUZA, Renata Junqueira de [et al.]. A arte narrativa na infância: práticas para o

teatro da leitura e contação de histórias. Campinas-SP: Mercado de Letras, 2015.

Page 14: CONTANDO HISTÓRIAS COM CAIXAS: RELATO DA EXPERIÊNCIA ... · Eixo temático 08: Educação Infantil e Ensino Fundamental TELLING STORIES WITH BOXES: REPORT OF DEVELOPED EXPERIENCE

SOUZA(a), Edna Mara da Silva de. A mágica das sombras: o teatro em cena. In:

SOUZA, Renata Junqueira de [et al.]. A arte narrativa na infância: práticas para o

teatro da leitura e contação de histórias. Campinas-SP: Mercado de Letras, 2015.

GIROTTO, Cyntia Graziella; SOUZA, Renata Junqueira de. Estratégias de leitura: para

ensinar alunos a compreender o que leem. In: SOUZA, Renata Junqueira; GIROTTO,

Cyntia Graziella; ARENA, Dagoberto Buim; MENIN, Ana Maria dos Santos (org). Ler

e compreender: estratégias de leitura. Campinas, SP: Mercado de Letras, 2010.

LIMA, Elieuza Aparecida de; GIROTTO, Cyntia Graziella Simões. Leitura e leituras

na educação infantil: Reflexões sobre as caixas que contam histórias. 16º COLE-

Associação de Leitura do Brasil. Campinas-SP. Disponível em: <

http://alb.com.br/arquivo-morto/edicoes_anteriores/anais16/>. Acesso em: 20 de maio

de 2016.