CONSIDERAÇÃO SOBRE A RESPONSABILIDADE CIVIL …siaibib01.univali.br/pdf/Viviane Lorenzetti...
Transcript of CONSIDERAÇÃO SOBRE A RESPONSABILIDADE CIVIL …siaibib01.univali.br/pdf/Viviane Lorenzetti...
UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPS CURSO DE DIREITO
CONSIDERAÇÃO SOBRE A RESPONSABILIDADE CIVIL DO TRANSPORTADOR AÉREO
VIVIANE LORENZETTI BRANQUINHO ALONSO
Itajaí, novembro de 2010
UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPS CURSO DE DIREITO
CONSIDERAÇÃO SOBRE A RESPONSABILIDADE CIVIL DO TRANSPORTADOR AÉREO
VIVIANE LORENZETTI BRANQUINHO ALONSO
Monografia submetida à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel
em Direito. Orientador: Professor MSc. Clovis Demarchi
Itajaí, novembro de 2010
AGRADECIMENTO
A minha mãe Vilma, que me apoiou e sempre me incentivou, direcionando o melhor caminho para
alcançar o sucesso, pois sem ela esta graduação não aconteceria.
Ao meu esposo Victor, que esteve comigo nesse tempo, apoiando e ajudando nessa etapa da vida.
Ao meu orientador MSc. Clovis Demarchi, pela dedicação e atenção no desenvolvimento desse
trabalho.
iii
DEDICATÓRIA
A minha mãe Vilma... Me perdoe por todas as vezes que por falar
sem pensar te magoei. Por muitas vezes ao INVÉS DE LHE DAR
AS MÃOS, TE VIREI AS COSTAS. POR EM ALGUNS MOMENTOS NÃO SER AQUELE FILHO(A) QUE VOCÊ SEMPRE
QUIS. HOJE, DEPOIS DE TUDO PERCEBO QUE AINDA PRECISO MUDAR EM ALGUMAS
COISAS, E QUE UMA PESSOA SE FEZ ESSENCIAL NA MINHA VIDA: VOCÊ.
OBRIGADO POR TODOS MOMENTOS DEDICADO A MIM, PELAS PALAVRAS,
PELOS CONSELHOS, PELO AMOR, PELA HONESTIDADE, PELO AFETO, PELA
AMIZADE. SAIBA QUE NUNCA DEIXAREI de te amar,
e mesmo não parecendo quero que um dia todos estejam felizes, sem problema algum.
Torço muito pela nossa família. Torço muito por você, que durante toda sua
vida se mostrou uma pessoa capaz de conseguir tudo o que quer.
Me espelho muito em você, e és um exemplo a se seguir.
Hoje depois dos momentos que passamos juntos, olho para trás e vejo que tenho uma
pessoa em que me apoiar sempre que estiver necessitando de amor e
compreensão. Muito mais do que mãe você é minha amiga,
meu escudo contra todas as coisas ruins, pois a partir do momento em que
transpassam a sua barreira de amor, enfraquecem, me polpando do mal.
Só uma palavra pode exprimir ao exato o quanto estou grata.
OBRIGADA!!! (autor desconhecido) MÃE, Te amo muito.
TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE
Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte
ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Vale do
Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o Orientador de
toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.
Itajaí, novembro de 2010
Viviane Lorenzetti Branquinho Alonso Graduando
PÁGINA DE APROVAÇÃO
A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale do
Itajaí – UNIVALI, elaborada pela graduanda Viviane Lorenzetti Branquinho Alonso,
sob o título CONSIDERAÇÃO SOBRE A RESPONSABILIDADE CIVIL DO
TRANSPORTADOR AÉREO, foi submetida em 17 de novembro de 2010 à banca
examinadora composta pelos seguintes professores: Clovis Demarchi, orientador e
presidente da banca e Lucilaine Ignácio da Silva, examinadora, e aprovada com a
nota 9,85 (nove vírgula oitenta e cinco).
Itajaí, novembro de 2010
Professor MSc. Clovis Demarchi Orientador e Presidente da Banca
Professor MSc. Antônio Augusto Lapa Coordenação da Monografia
ROL DE CATEGORIAS
Rol de categorias que a Autora considera estratégicas à
compreensão do seu trabalho, com seus respectivos conceitos operacionais.
Consumidor
É toda pessoa física ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou serviço como
destinatário final. 1
Fornecedor
É toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem
como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividades de produção,
montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição
ou comercialização de produtos ou prestação de serviços.2
Contrato
É um negócio jurídico por meio do qual as partes declarantes, limitadas pelos
princípios da função social e da boa-fé objetiva, autodisciplinam os efeitos
patrimoniais que pretendem atingir, segundo a autonomia das suas próprias
vontades.3
Contrato de transporte
Contrato pelo qual alguém se vincula, mediante retribuição, a transferir de um lugar
para o outro, pessoas ou bens.4
Contrato de adesão
É aquele cujas cláusulas tenham sido aprovadas pela autoridade competente ou
estabelecidas unilateralmente pelo fornecedor de produtos ou serviços, sem que o
consumidor possa discutir ou modificar substancialmente seu conteúdo;5
1 Art. 2º da lei 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor) 2 Art. 3º da lei 8079/90 (Código de Defesa do Consumidor) 3 GAGLIANO, Pablo Stolze, FILHO, Rodolfo Pamplona. Novo Curso de Direito Civil. São Paulo:
Saraiva, 2006. p. 11. 4 MIRANDA, Pontes de. Tratado de Direito Privado. Rio de Janeiro: Borsoi, 1972. p.8.
vii
Responsabilidade civil
Constitui uma relação obrigacional que tem por objeto a prestação do
ressarcimento. Tal obrigação de ressarcir o prejuízo causado pode originar-se da
inexecução do contrato ou da lesão a direito subjetivo, sem que preexista entre
lesado e lesante qualquer relação jurídica que a possibilite6
Culpa
Ação ou omissão do agente que origina a indenização, geralmente decorre da
infração de um dever (que pode ser legal).7
Dano
Fato social, fruto de uma conduta irregular e indevida do agente (causador do dano)
defende-se assim a eterna reparação do dano.8
Empresa aérea
Toda sociedade comercial, constituída sob a forma de sociedade anônima ou por
cotas de responsabilidade limitada que tenha como objeto social a exploração dos
serviços de transporte aéreo público regular ou não regular de passageiro, carga ou
mala postal ou de serviços aéreos especializados que tenham cumprido as
exigências.9
5 Art. 54 da lei 8.078/90 (Código de Defesa do Consumidor) 6 SILVA, Marcus Vinícius Fernandes Andrade. O contrato de transporte aéreo, a responsabilidade civil
do transportador e a possível antinomia entre e Código de Proteção de Defesa do Consumidor, o Código Brasileiro de Aeronáutica e a Convenção de Varsóvia. In: Revista Jus Vigilantibus, 23 jun.; 2004
7 Silvio Rodrigues. Disponível em http://jusvi.com/artigos/19710. Acesso dia 23.10.2010 8 Disponível em http://br.monografias.com/trabalhos904/culpa-e-dano/culpa-e-dano.shtml. Acesso dia
23.10.2010. 9 Rubens Komnisk. Conceito de companhia aérea. Disponível em
http://www.sbda.org.br/neda/Consolid/cia_aerea.htm. Acesso dia 23.10.2010
SUMÁRIO
RESUMO............................................................................................ X
INTRODUÇÃO ..................................................................................11
CAPÍTULO 1 .....................................................................................14
DO TRANSPORTE E LEGISLAÇÃO AÉREA...................................14
1.1 CONCEITO DE DIREITO AERONÁUTICO ................................................... 14
1.2 CONSIDERAÇÕES SOBRE A LEGISLAÇÃO AERONÁUTICA................... 16
1.3 CLASSIFICAÇÃO DO TRANSPORTE AÉREO ............................................ 20
1.4 DO TRANSPORTE AÉREO DOMÉSTICO E INTERNACIONAL .................. 22
1.5 FONTES NORMATIVAS DO TRANSPORTE AÉREO .................................. 24 1.5.1 A Convenção de Varsóvia ........................................................................ 24 1.5.2 O Código Brasileiro de Aeronáutica........................................................ 25
CAPÍTULO 2 .....................................................................................28
DO CONTRATO DE TRANSPORTE AÉREO DE PESSOAS E BAGAGENS ..................................................................................28
2.1 CONCEITO GERAL DE CONTRATO............................................................ 28
2.2 CLASSIFICAÇÃO DO CONTRATO .............................................................. 30
2.3 DO CONTRATO DE TRANSPORTE AÉREO DE PASSAGEIROS .............. 32 2.3.1 Contrato de transporte.............................................................................. 32 2.3.2 Contrato de transporte aéreo de passageiros ........................................ 35
CAPÍTULO 3 .....................................................................................44
ASPECTOS DESTACADOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL .......44
ix
3.1 ESPÉCIES DE RESPONSABILIDADE CIVIL ............................................... 46 3.1.1 Contratual e extracontratual..................................................................... 46 3.1.2 Responsabilidade subjetiva ou teoria da culpa...................................... 47 3.1.3 Responsabilidade objetiva ou teoria do risco ....................................... 49
3.2 RESPONSABILIDADE CIVIL NO TRANSPORTE AÉREO........................... 51
3.3 RESPONSABILIDADE CIVIL POR ACIDENTE AÉREO............................... 54
3.4 RESPONSABILIDADE CIVIL POR EXTRAVIO DE BAGAGEM................... 60
3.5 RESPONSABILIDADE CIVIL POR CANCELAMENTO, ATRASO E ANTECIPAÇÃO DE VÔO, OVERBOOKING E NO-SHOW................................. 64 3.5.1 Cancelamento e atraso de vôo................................................................. 64 3.5.2 Responsabilidade Civil por overbooking e no show.............................. 68
CONSIDERAÇÕES FINAIS ..............................................................71
REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS...........................................76
RESUMO
Esta monografia apresenta um estudo sobre a
responsabilidade civil no transporte aéreo, no que diz respeito a responsabilidade
por acidente, extravio de bagagem, cancelamento, atraso, antecipação de vôo,
overbooking e no-show, analisando principalmente a responsabilidade objetiva e
subjetiva do transportador aéreo. O presente trabalho foi dividido em três capítulo
para melhor entendimento do assunto. O primeiro capítulo trata do transporte aéreo
e legislação, abordando a evolução do transporte aéreo, as legislações aeronáuticas
vigentes, a classificação do transporte aéreo, finalizando com as fontes normativas.
O segundo capítulo aborda o contrato de transporte aéreo de pessoas e bagagens,
conceituando e classificando os tipos de contrato. No terceiro capítulo trata do tema
principal, a responsabilidade civil do transportador aéreo, sua responsabilidade
acerca do Código de Defesa do Consumidor, onde este se sobrepõe na solução dos
conflitos no que diz respeito a transporte aéreo. Para a redação da presente
monografia utilizou-se o método indutivo.
INTRODUÇÃO
A presente monografia tem como objetivo o estudo da
Responsabilidade Civil no Transporte Aéreo Brasileiro.
O transporte aéreo tem sua legislação no Código Brasileiro de
Aeronáutica (CBA), Lei 7565/86, Convenção Internacional de Varsóvia e pelo Código
de Defesa do Consumidor (CDC), Lei 8.078/90, dessa forma, verifica a antinomia
entre essas normas no que diz respeito à responsabilidade do transportador.
Inicialmente é traçada a evolução história do direito
aeronáutico, sua origem e evolução através dos anos, abordando o transporte aéreo
doméstico e internacional bem como sua classificação e fontes normativas, que
conduzem esse tipo de transporte e Convenções que a regem.
Após, conceitua-se os tipos de contrato, suas finalidades,
natureza, analisando qual contrato é mais utilizado pelas empresas aéreas, como
surgiu o contrato de transporte e sua base jurídica do Código Civil Brasileiro. Em
seguida sua base jurídica no Código Brasileiro de Aeronáutica (dentre outras
legislações), diferenciando entre contratos de adesão, bilateral, consensual ou
oneroso, justificando sua base jurídica de acordo com o Código de Defesa do
Consumidor. Os órgãos são responsáveis pelo transporte aéreo no Brasil e qual a
finalidade de cada um destes.
O Transporte Aéreo Internacional ou Nacional é regulado por
várias convenções e há alguns conflitos na legislação interna de um País, como no
Brasil, onde há duas correntes com entendimentos opostos, será analisado qual é a
predominante e quais os motivos para tal entendimento.
Logo, abordando todos os temas acima, é feito uma análise
sobre a responsabilidade civil, seus conceitos e definições, distinção entre
responsabilidade civil contratual e extracontratual do direito civil, passando pela
responsabilidade subjetiva ou teoria da culpa e responsabilidade objetiva ou teoria
12
do risco, adentrando na responsabilidade civil no transporte aéreo à luz do Código
de Defesa do Consumidor, por final, a responsabilidade por acidente, extravio de
bagagem, cancelamento, atraso, antecipação de vôo, overbooking e no show.
Para a presente monografia foram levantados os seguintes
problemas:
a) Na relação entre a empresa aérea (fornecedor) e o passageiro (consumidor), qual o dispositivo legal aplicável a essa relação de consumo? b) Uma vez que existem normas conflitantes entre Constituição Federal, Código de Defesa do Consumidor, Código Civil, Código Brasileiro de Aeronáutica e Convenções, qual norma deve ser aplicada no tocante a responsabilidade civil? c) Qual a responsabilidade do transportador aéreo?
Ante os problemas estabelecidos, foram verificadas às
seguintes hipóteses:
a) Na relação entre a empresa aérea (fornecedor) e o passageiro (consumidor), o dispositivo legal aplicável a essa relação de consumo é o código de defesa do consumidor. b) Uma vez que existem normas conflitantes entre Constituição Federal, Código de Defesa do Consumidor, Código Civil, Código Brasileiro de Aeronáutica e Convenções, deve-se utilizar como parâmetro o Código de defesa do Consumidor. c) A responsabilidade do transportador aéreo é subjetiva, ou seja, há a necessidade de se demonstrar a culpa do agente.
Sendo assim, o Relatório de Pesquisa apresenta as suas
considerações, nas quais são apresentados pontos conclusivos destacados,
seguidos da estimulação à continuidade dos estudos e das reflexões sobre
Responsabilidade Civil no Transporte Aéreo.
A jurisprudência brasileira tem demonstrado adepto ao Código
de Defesa do Consumidor e ao Código Civil, seguindo o entendimento da
.jurisprudência Quanto à Metodologia empregada, registra-se que, na Fase de
13
Investigação10 foi utilizado o Método Indutivo11, na Fase de Tratamento de Dados o
Método Cartesiano12, e, o Relatório dos Resultados expresso na presente
Monografia é composto na base lógica Indutiva.
Nas diversas fases da Pesquisa, foram acionadas as Técnicas
do Referente13, da Categoria14, do Conceito Operacional15 e da Pesquisa
Bibliográfica16.
10 “[...] momento no qual o Pesquisador busca e recolhe os dados, sob a moldura do Referente
estabelecido [...]. PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. 11 ed. Florianópolis: Conceito Editorial; Millennium Editora, 2008. p. 83.
11 “[...] pesquisar e identificar as partes de um fenômeno e colecioná-las de modo a ter uma percepção ou conclusão geral [...]”. PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. p. 86.
12 Sobre as quatro regras do Método Cartesiano (evidência, dividir, ordenar e avaliar) veja LEITE, Eduardo de oliveira. A monografia jurídica. 5 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. p. 22-26.
13 “[...] explicitação prévia do(s) motivo(s), do(s) objetivo(s) e do produto desejado, delimitando o alcance temático e de abordagem para a atividade intelectual, especialmente para uma pesquisa.” PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. p. 54.
14 “[...] palavra ou expressão estratégica à elaboração e/ou à expressão de uma idéia.” PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. p. 25.
15 “[...] uma definição para uma palavra ou expressão, com o desejo de que tal definição seja aceita para os efeitos das idéias que expomos [...]”. PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. p. 37.
16 “Técnica de investigação em livros, repertórios jurisprudenciais e coletâneas legais. PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. p. 209.
CAPÍTULO 1
DO TRANSPORTE E LEGISLAÇÃO AÉREA
1.1 CONCEITO DE DIREITO AERONÁUTICO
No contexto do desenvolvimento da aviação a ciência jurídica,
naturalmente, não poderia resta indiferente à nova realidade fática vigente. Surge,
então, o Direito Aeronáutico, sendo que esta terminologia harmoniza-se com uma
visão mais moderna17, devido à preocupação dos países europeus com suas
fronteiras, isto é, a questão da internacionalidade e a preocupante “liberdade” dos
transportes aéreos entre Estados soberanos.
Segundo Milhomens18, o Direito Aeronáutico: “[...] é o conjunto
de normas e princípios que regulam a navegação aérea, e esta por sua vez possui
seu meio próprio, que é o espaço atmosférico”
Para Lacerda19, o Direito Aeronáutico: “[... é o complexo de
normas jurídicas relativas à navegação feita pelo ar, com foco no fenômeno da
locomoção aérea, não apenas relativo aos transportes.
Já Escalada20 sustenta que o Direito Aeronáutico “é o conjunto
de princípios e regras, de Direito Público e Privado, de ordem interna e internacional,
que regem as instituições e relações jurídicas nascidas da atividade aeronáutica, ou
por elas modificadas”
17 MORSELLO, Marco Fábio. Responsabilidade Civil no Transporte Aéreo. São Paulo: Atlas, 2007. 18 MILHOMENS, Jonatas. Direito Aeronáutico. Rio de Janeiro: Nacional de Direito, 1956. p.6 19 LACERDA, J.C. Sampaio. Curso de direito privado da navegação: direito aeronáutico. Rio de
Janeiro: Freitas Bastos, 1970. p. 26. v.2. 20 MORSELLO, Marco Fábio. Responsabilidade Civil no Transporte Aéreo. p. 7
15
Salinas21 formulou sua definição em sentido amplo: “como um
conjunto de normas que se referem à navegação aérea e problemas
correlacionados.
Também adotando sentido amplo, segue o entendimento de
Araújo22: “conjunto de normas jurídicas, convencionais e consuetudinárias, que
regulamentam o transporte, pelo espaço aéreo, por meio de aeronaves, de pessoas
e coisas, assim como as relações dele decorrentes”.
Desta forma, pode-se concluir que o Direito Aeronáutico
engloba as relações jurídicas vinculadas com a navegação aérea, tanto no campo
internacional como no doméstico, e a aviação civil de um modo geral.
A origem da norma de direito ou os princípios, nos quais o
Direito Aeronáutico se inspira, derivam duas classes de fontes deste Direito, são:
imediatas (convenções e tratados internacionais) que são usos, costumes e leis e
mediatas (direito comum), compostas pela doutrina, jurisprudência e prática
extrajudicial.23
Dessa forma pode-se observar que o Direito Aeronáutico é
regulado pelo Código Brasileiro de Aeronáutica, em seu art. 1º, pelos tratados,
convenções e atos internacionais que o Brasil seja parte, e pela legislação
complementar, formada pela regulamentação prevista no referido Código, pelas leis
especiais, decretos e normas sobre matéria aeronáutica, cabendo às autoridades
competentes do Ministério da Aeronáutica a orientação, coordenação, controle e
fiscalização das atividades relativas à referida matéria aeronáutica.24
É possível observar o art. 22, inciso I da Constituição Federal:
Art. 22 - Compete privativamente à União legislar sobre:
21 MORSELLO, Marco Fábio. Responsabilidade Civil no Transporte Aéreo. p.11 22 ARAUJO, Luis Ivani de Amorim. Curso de Direito Aeronáutico. Rio de Janeiro: Forense,
1998.p.12. 23 MILHOMENS, Jonatas. Direito Aeronáutico. p.8-9 24 PACHECO, José da Silva. Código Brasileiro de Aeronáutica Comentado. 2.ed. Rio de Janeiro:
Forense, 1998. p. 24.
16
I - direito civil, comercial, penal, processual, eleitoral, agrário, marítimo, aeronáutico, espacial e do trabalho;
Pacheco25 entende o Direito Aeronáutico como um ramo
autônomo do direito objetivo, que regula as relações, atividades e serviços
vinculados à utilização de aeronaves civis e comerciais. Dessa forma, a União edita
o Código Brasileiro de Aeronáutica, o que foi recepcionado pela Constituição.
1.2 CONSIDERAÇÕES SOBRE A LEGISLAÇÃO AERONÁUTICA
Conforme Silva26 o Direito Aeronáutico surgiu devido
necessidade de maior enfoque na questão da internacionalidade e a preocupante
liberdade dos transportes aéreos entre Estados soberanos.
Em 1919, com o objetivo de regular os espaços aéreos dos
países que desenvolviam atividade aérea, ocorreu a primeira Convenção
Internacional de Navegação Aérea e após esta Convenção foi permitido o tráfego
em espaços aéreos dos países signatários.
Em 1928 foi estabelecida a Convenção Pan-Ameicana, sendo
esta substituída pela Convenção de Chicago.
Em 1931 se constituiu a Convenção de Varsóvia, inserida no
Brasil através do Decreto 20.604/31 com o objetivo de amenizar conflitos da
responsabilidade do transportador aéreo. Nesse mesmo ano foi criado o
Departamento de Aeronáutica Civil tendo como função a execução dos serviços
aéreos.
Em 1941 foi criado o Ministério da Aeronáutica, em 1944 foi
estabelecida a Convenção de Paris, sendo esta substituída pela Convenção de
25 PACHECO, José da Silva. Código Brasileiro de Aeronáutica Comentado.. p. 24 26 SILVA, Marcus Vinicius Fernandes Andrade. O contrato de transporte aéreo, a responsabilidade
civil do transportador e a possível antinomia entre o Código de Proteção de Defesa do Consumidor, o Código Brasileiro Aeronáutico e a Convenção de Varsóvia. In. Revista jusvigilantibus. Disponível em http://jusvi.com/artigos/769. Acesso em 15 mar. 2010.
17
Chicago. No ano de 1955 como tentativa de aperfeiçoamento da Convenção de
Varsóvia através do Protocolo de Haia, com foco na alteração dos limites de
responsabilidade, inicia a vigorar no Brasil por força do Decreto 56.463/65;
Em 1999 foi estabelecida a Convenção de Montreal,
aperfeiçoando a Convenção de Varsóvia firmando em apenas um texto.
É incontestável a evolução no transporte aéreo no contexto da
globalização, pois o transporte aéreo possibilita maior integração entre países e
continentes de uma maneira cada vez mais rápida. Indubitável é a composição do
transporte aéreo no conceito de globalização. De acordo com Benjamin:
[...] a própria noção de ‘sociedade global’ deve muito aos extraordinários avanços tecnológicos ocorridos nos meios de transporte, principalmente o aéreo. Curioso, então, que um setor que é peça fundamental no mosaico da globalização – o fenômeno político, econômico, social e jurídico que marca este fim de século – ainda seja regido por um regime legal instituído no início do século XX, quando a indústria aeronáutica estava na sua infância.27
De acordo com esse contexto, até 1972, a União criava e
mantinha os aeroportos brasileiros e após pela Empresa Brasileira de Infra-Estrutura
Aeronáutica (INFRAERO), empresa vinculada ao Ministério da Aeronáutica, sendo
esta pública.
A Constituição da República Federativa do Brasil, CRFB/88,
em seu artigo 21 e 178, dispõe:
Art. 21. Compete à União:
[...]
XII - explorar, diretamente ou mediante autorização, concessão ou permissão:
[...]
c) a navegação aérea, aeroespacial e a infra-estrutura aeroportuária;
Art. 178. A lei disporá sobre a ordenação dos transportes aéreo, aquático e terrestre, devendo, quanto à ordenação do transporte
27 BENJAMIN, Antonio Herman Vasconcelos. O Transporte Aéreo e o CDC. Revista Direito do
Consumidor. São Paulo, n. 26, p. 33-44, abr./jun. 1998.
18
internacional, observar os acordos firmados pela União, atendido o princípio da reciprocidade.
Há diferentes normas quando se trata de transporte aéreo de
pessoas e podemos destacar as principais: Convenção de Varsóvia, Código
Brasileiro de Aeronáutica (CBA) e Código de Defesa do Consumidor (CDC).
O Código Brasileiro de Aeronáutica é um instrumento instituído
através da Lei n. 7565, de 19/12/1986, substituindo o Código Brasileiro do Ar28, que
teve vigência anteriormente, são elucidas por José da Silva Pacheco, na medida em
que o termo aeronáutico coaduna-se com qualificativo correlacionado com a
navegação aérea, ao passo que o termo do ar corresponderia a mais do que se
pretendia disciplinar, uma vez que o ar é suscetível de várias formas de utilização.29
O texto legal é aplicado ao transporte aéreo doméstico,
nacional ou regional, onde os pontos de partida, intermediários e de destino estejam
situados em território nacional. Quando, por motivo de força maior,a aeronave fizer
escala em território estrangeiro, estando em território brasileiro seus pontos de
chegada e de destino, conforme preceitua o art. 215, caput e parágrafo único:
Art. 215. Considera-se doméstico e é regido por este Código, todo transporte em que os pontos de partida, intermediários e de destino estejam situados em Território Nacional.
De acordo com art. 174 do Código Brasileiro de Aeronáutica,
os serviços aéreos são divididos em privados e públicos. Os serviços aéreos
privados estão dispostos no art. 177 a 179 e o público nos arts. 180 a 221 do
mesmo dispositivo legal.
Com fulcro no art. 177, os serviços aéreos privados [...] .são os
realizados, sem remuneração, em benefício do próprio operador (artigo 123, II)
compreendendo as atividades aéreas:
I - de recreio ou desportivas;
II - de transporte reservado ao proprietário ou operador da aeronave; 28 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil. 6.ed. São Paulo: Atlas, 2006. v.4. p.166 29 PACHECO, José da Silva. Código Brasileiro de Aeronáutica Comentado.. p. 9-10.
19
III - de serviços aéreos especializados, realizados em benefício exclusivo do proprietário ou operador da aeronave.”
Quando se tratar de transporte aéreo regular, os serviços
aéreos públicos dependerão sempre de prévia concessão ou de autorização no caso
de transporte aéreo não regular ou de serviços especializados.
De acordo com o Código Brasileiro de Aeronáutica, os
serviços aéreos públicos se subdividem em: serviços aéreos especializados públicos
e serviços de transporte aéreo públicos de passageiro. Assim preceitua:
Art. 175. Os serviços aéreos públicos abrangem os serviços aéreos especializados públicos e os serviços de transporte aéreo público de passageiro [...]
Conforme o art. 180 e 181 do CBA, a exploração de serviços
aéreos públicos se dá através de prévia concessão:
Art. 180. “A exploração de serviços aéreos públicos dependerá sempre da prévia concessão, quando se tratar de transporte aéreo regular, ou de autorização no caso de transporte aéreo não regular ou de serviços especializados.”
Art. 181. “A concessão somente será dada à pessoa jurídica brasileira que tiver:
I - sede no Brasil;
II - pelo menos 4/5 (quatro quintos) do capital com direito a voto, pertencente a brasileiros, prevalecendo essa limitação nos eventuais aumentos do capital social;
III - direção confiada exclusivamente a brasileiros.
Ou a autorização, de acordo com art. 182: “ A autorização
pode ser outorgada”:
I - às sociedades anônimas [...]
II - às demais sociedades, com sede no País [...]
Parágrafo único. Em se tratando de serviços aéreos especializados de ensino, adestramento, investigação, experimentação científica e de fomento ou proteção ao solo, ao meio ambiente e similares, pode a autorização ser outorgada, também, a associações civis.
20
Conforme exposto, a autorização será outorgada e referem-se
aos serviços de transporte publico não - regular.
Conforme preceitua o art. 181 a respeito de concessões, estas
somente serão ministradas às pessoas jurídicas, conforme disposto no art. 122 e
123 da mesma lei:
Art. 122 Dá-se a exploração da aeronave quando uma pessoa física ou jurídica, proprietária ou não, a utiliza, legitimamente, por conta própria, com ou sem fins lucrativos.
Art. 123. Considera-se operador ou explorador de aeronave:
I - a pessoa jurídica que tem a concessão dos serviços de transporte público regular ou a autorização dos serviços de transporte público não regular, de serviços especializados ou de táxi-aéreo.
Os serviços de transporte não-regular são divididos em:
transporte de passageiro, carga ou mala postal, conforme preceitua o art. 217,
“sendo necessária a autorização de funcionário do Poder Executivo”.
Os serviços aéreos especializados estão dispostos no art. 182
e os serviços de táxi aéreo está disposto no art. 220.
1.3 CLASSIFICAÇÃO DO TRANSPORTE AÉREO
De acordo com Morsello30, o transporte aéreo é dividido em:
Transporte Doméstico, Transporte Internacional, Transporte de Passageiros,
Bagagens e Mercadorias, Transporte Regular, Transporte Não-Regular, Transporte
Sucessivo, Transporte de Fato e Transporte Combinado ou Multimodal, com base no
Código Brasileiro de Aeronáutica e na Convenção de Varsóvia, que estão
sinteticamente, descritos a seguir
O transporte doméstico de passageiros, bagagens e cargas, o
Código Brasileiro de Aeronáutica dispõe em seu art. 215, que: “ Considera-se
doméstico e é regido por este código todo transporte em que os pontos de partida,
intermediários e destino estejam situados em território nacional.” 30 MORSELLO, Marco Fábio. Responsabilidade Civil no Transporte Aéreo. p.94-108.
21
O art. 216 do mesmo Código impõe que os serviços aéreos de
transporte público doméstico sejam prestados, exclusivamente, por pessoas
jurídicas brasileiras.31
O transporte aéreo internacional tem fulcro no art. 1° da
Convenção de Varsóvia, é todo transporte em que haja ou não interrupção de
transporte, estejam situados entre dois pontos do Território de outro Estado.
O transporte de passageiros, bagagens e mercadorias tem
fulcro no art. 222 do Código Brasileiro de Aeronáutica, pois este obriga o
transportador transportar passageiros, bagagens e carga, encomenda ou mala
postal, dentro do território nacional, por meio de aeronave, mediante pagamento.
O transporte regular e não-regular tem fulcro no Código
Brasileiro de Aeronáutica, art. 123, inciso I, e constitui a regra geral, sendo
operacionalizado por meio de acordos bilaterais ou convenções internacionais na
seara do transporte aéreo internacional ou por meio de instrumentos legais
nacionais na esfera do transporte aéreo doméstico. Para a prestação de serviços
aéreos não-regular de transporte de passageiros será necessária autorização de
funcionamento por parte do Poder Executivo, haja vista não haver regulamentação
específica.32
Transportador de fato, regido pelo Código Brasileiro de
Aeronáutica, art. 225, é aquele que, não sendo auxiliar ou preposto, efetua no todo
ou em parte o transporte aéreo, em virtude de autorização dada pelo transportador
contratual.
Transporte sucessivo, regido pelo Código Brasileiro de
Aeronáutica, art. 223, é o transporte entre o ponto de partida e o ponto de destino,
por mais de um transportador, ao abrigo de um único contrato de transporte.
31 Nesse sentido: PACHECO, José da Silva. Código Brasileiro de Aeronáutica Comentado. p.351-
354; ARAÚJO, Ivani Amorim de. Curso de Direito Aeronáutico. p. 69. 32 MORSELLO, Marco Fábio. Responsabilidade Civil no Transporte Aéreo. p.102.
22
O transporte combinado ou multimodal, regido pela
Convenção de Varsóvia, art 31, itens 1 e 2), um sujeito se obriga a executar, ou a
fazer executar, um transporte em que se encontram previstas, diversas modalidades
executivas, especificados na Convenção de Varsóvia.
Nesse estudo serão abordados o transporte aéreo doméstico e
transporte de passageiros, bagagens e mercadorias, com foco no transporte de
passageiros.
1.4 DO TRANSPORTE AÉREO DOMÉSTICO E INTERNACIONAL
Incide sobre o transporte aéreo duas regulamentações, uma
na esfera nacional e outra na esfera internacional.
Sobre a regulamentação do transporte aéreo, enuncia
Cavalieri Filho33:
O transporte aéreo doméstico pátrio e regulamentado pelo Código Brasileiro de Aeronáutica, Lei n, 7565/86, enquanto os vôos internacionais são disciplinados pela Convenção de Varsóvia, ratificadas por centenas de países e, no Brasil, pelo Decreto n.20.704/31. Frise-se que Convenção de Varsóvia sofreu emendas do Protocolo de Haia, dotado de 28 de setembro de 1955.
O transporte aéreo doméstico de passageiros está disposto no
Código Brasileiro de Aeronáutica, art. 215, que: “ Considera-se doméstico e é regido
por este código todo transporte em que os pontos de partida, intermediários e
destino estejam situados em território nacional.”
O parágrafo único do mesmo dispositivo legal dispõe que “ o
transporte não perderá esse caráter se, por motivo de força maior, a aeronave fizer
escala em território estrangeiro, estando, porém, em território brasileiro os seus
pontos de partida e destino”.
33 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. 7 ed. São Paulo, Malheiros,
2007. p. 290.
23
O art. 216 do mesmo Código impõe que os serviços aéreos de
transporte público doméstico sejam prestados, exclusivamente, por pessoas
jurídicas brasileiras.34
Pode ainda o transporte aéreo doméstico ter caráter regional
ou nacional, na medida em que, por meio do Decreto n. 7690, de 11 de novembro de
1975, houve autorização para a instituição de sistemas integrados de transporte
aéreo regional, constituídos por serviços aéreos de uma região, para o atendimento
de localidades de baixo e médio potencial de tráfego.35
Cumpre esclarecer que se aplica ao transporte doméstico,
além das nrmas previstas no Código Brasileiro de Aeronáutica, o Código de Defesa
do Consumidor, o Código Civil e a Constituição Federal.
O transporte aéreo internacional tem fulcro no art. 1° da
Convenção de Varsóvia, é todo transporte em que haja ou não interrupção de
transporte, estejam situados entre dois pontos do Território de outro Estado.
Dessa forma, mesmo que o ponto de partida e o ponto de
chegada estejam localizados em um único país, por exemplo, um vôo que parte da
cidade de São Francisco (EUA) com destino final no Alasca, na cidade de
Anchorage (EUA), se a aeronave fizer escala em outro país, na cidade de
Vancouver (Canadá), será considerado transporte internacional.36
Há de ressalvar que não basta o sobrevôo da aeronave pelo
território estrangeiro, é necessário que ocorra contato terrestre, mas a Convenção
não determina como deve ser o contato (escala), assim não há uma duração mínima
determinada e muito menos a exigência de desembarque dos passageiros.37
34 Nesse sentido: PACHECO, José da Silva. Código Brasileiro de Aeronáutica Comentado. p. 351-
354; ARAUJO, Luis Ivani de Amorim. Curso de Direito Aeronáutico. p. 69. 35 Nesse sentido PACHECO, José da Silva. Código Brasileiro de Aeronáutica Comentado. p. 353,
item 441. 36 MORSELLO, Marco Fábio. Responsabilidade Civil no Transporte Aéreo. p. 95. 37 MORSELLO, Marco Fábio. Responsabilidade Civil no Transporte Aéreo. p. 95 - 96.
24
Por fim é possível verificar que em um mesmo vôo é possível
existirem passageiros com direitos regulamentados pela Convenção de Varsóvia,
enquanto outros poderão ser regulamentos pelo Código Brasileiro de Aeronáutico.
1.5 FONTES NORMATIVAS DO TRANSPORTE AÉREO
Estabelecida tais ponderações, entre o transporte aéreo
doméstico e o internacional, passa-se a discorrer nesse item, sobre as fontes
normativas do transporte aéreo no âmbito internacional e doméstico, normas de
suma importância para possibilitar a fixação da responsabilidade civil do
transportador aéreo no caso do descumprimento do contrato de transporte.
1.5.1 A Convenção de Varsóvia
Conforme mencionado no item sobre a evolução do transporte
aéreo, em 12 de outubro de 1929, foi editada a Convenção de Varsóvia, esta foi
subscrita por 32 Estados, dentre estes o Brasil, cujo âmbito de regulamentação se
estende ao regime de responsabilidade do transportador aéreo internacional.38
Esta norma entrou em vigor com o objetivo de uniformizar,
através de regras claras e precisas, as normas internacionais referentes ao
transporte aéreo, regulando, inclusive as hipóteses de dano-evento, correlacionadas
com a morte, ferimento ou qualquer outra lesão a bordo, ou nas operações de
embarque, desembarque de passageiros (art. 17).
A Convenção buscou também regular as situações de perda,
destruição ou avaria de carga ou bagagem, durante o transporte aéreo (art. 18), bem
como o atraso no transporte aéreo de passageiros, bagagens ou mercadorias (art.
19).
Em tais ocorrências, fixou um patamar limite de indenização,
de 125.000 francos-Poincaré, equivalentes a US$8.300,00 por passageiro, e 250.00
38 MORSELLO, Marco Fábio. Responsabilidade Civil no Transporte Aéreo. p. 53.
25
francos-Poincaré, aproximadamente US$20,00 para bagagens ou mercadorias, até o
limite de 5.000 francos-Poincaré por volume.39
Os arts. 17 e 20 deste Convenção estabelecem que a
responsabilidade civil subjetiva com culpa presumida do transportador aéreo,
responde o transportador pelo dano ocasionado, desde que o acidente haja ocorrido
a bordo da aeronave ou no curso de qualquer operação de embarque ou
desembarque e que o transportador não responderá se provar que tomou todos os
cuidados necessários para que não produzisse o dano.
Portanto, o art. 37 §6 da Constituição Federal de 1988, inibiu a
aplicação de tais dispositivos, impondo a responsabilidade objetiva às pessoas
jurídicas de direito privado prestadoras de serviço público.
1.5.2 O Código Brasileiro de Aeronáutica
Conforme já exposto, a regulamentação do transporte aéreo
realizado dentro do território nacional é determinada pelo Código Brasileiro de
Aeronáutica, Lei 7565/86. Este adotou como regras os princípios da Convenção de
Varsóvia, objetivando fixar o limite de indenização nos casos em que ocorrer danos
na execução do contrato de transporte de passageiros ou cargas, no âmbito
doméstico e internacional.
Referente a cancelamento de vôo, ficou estabelecido o direito
de reembolso no valor já pago, conforme art. 229 do CBA: “O passageiro tem direito
ao reembolso no valor já pago do bilhete se o transportador vier a cancelar a
viagem.”
Em casos de atraso aéreo, o CBA determina às companhias
aéreas o dever de prestar assistência matéria aos passageiros somente a partir da
4º hora de atraso, nos termos dos arts. 230 e 231, abaixo colacionados:
Art. 230: Em caso de atraso da partida por mais de 4 (quatro)
horas, o transportador providenciará o embarque do passageiro, em vôo que ofereça
39 MORSELLO, Marco Fábio. Responsabilidade Civil no Transporte Aéreo. p. 54.
26
serviço equivalente para o mesmo destino, se houver, ou restituirá, de imediato, se o
passageiro o preferir, o valor do bilhete de passagem.
Art. 231. Quando o transporte sofrer interrupção ou atraso em
aeroporto de escala por período superior a 4 (quatro) horas, qualquer que seja o
motivo, o passageiro poderá optar pelo endosso do bilhete de passagem ou pela
imediata devolução do preço.
Dessa forma, no âmbito extracontratual também foi fixada a
responsabilidade limitada, por danos a terceiros na superfície ou por abalroamento
aéreo.40
Os limites de indenização fixados pelo referido Código,
comportariam exclusão somente nas hipóteses em que houvesse dolo ou culpa
grave do transportador e de seus prepostos conforme art. 248: “ Os limites de
indenização, previstos neste Capítulo, não se aplicam se for provado que o dano
resultou de dolo ou culpa grave do transportador ou de seus prepostos.”
O CBA não adotou a presunção de culpa, estabelecida na
Convenção de Varsóvia. Ao contrário, adotou a responsabilidade objetiva, tanto na
seara contratual quanto na extracontratual.41
Somente nos casos em que a culpa é exclusiva do passageiro,
a empresa aérea poderá se eximir de reparar os prejuízos
Ressalta-se ainda, que a responsabilidade do transportador
aéreo se estende aos passageiros transportados gratuitamente, ou seja, aquele que
viajarem por cortesia. 42
O mesmo Código vedou a inserção da cláusula de não
indenizar, ou estabelecer limites aquém do estabelecido por ele, conforme preceitua
40 MORSELLO, Marco Fábio. Responsabilidade Civil no Transporte Aéreo. p. 82. 41 MORSELLO, Marco Fábio. Responsabilidade Civil no Transporte Aéreo. p. 83. 42 MORSELLO, Marco Fábio. Responsabilidade Civil no Transporte Aéreo.. p. 83.
27
o art. 247 “ Art. 247. É nula qualquer cláusula tendente a exonerar de
responsabilidade o transportador ou a estabelecer limite de indenização inferior ao
previsto neste Capítulo, mas a nulidade da cláusula não acarreta a do contrato, que
continuará regido por este Código (artigo 10)”
O Código Brasileiro de Aeronáutica fixa limites e critérios para
as hipóteses de responsabilidade civil do transportador, em decorrência de danos
causados por este aos passageiros durante e execução do contrato.
No próximo capítulo tratar-se-á do Contrato de transporte
aéreo no que se refere a pessoas e bagagens, visando fundamentar as hipóteses de
responsabilização do transportador.
CAPÍTULO 2
DO CONTRATO DE TRANSPORTE AÉREO DE PESSOAS E BAGAGENS
2.1 CONCEITO GERAL DE CONTRATO
Contrato é um negócio jurídico por meio do qual as partes
declarantes, limitadas pelos princípios da função social e da boa-fé objetiva,
autodisciplinam os efeitos patrimoniais que pretendem atingir, segundo a autonomia
das suas próprias vontades.43
Não é possível falar em contrato sem que se tenha por sua a
manifestação de vontade das partes, pois não há negócio jurídico e não havendo
não há contrato. Tal manifestação de vontade deverá ser acompanhada pela
necessária responsabilidade na atuação do contratante.
Dado o enfoque ao conceito estabelecido acima, Maria Helena
Diniz 44conceitua:
contrato e o acordo de duas ou mais vontades, na conformidade da ordem jurídica, destinado a estabelecer uma regulamentação de interesses entre as partes, com o escopo de adquirir, modificar ou extinguir relações jurídicas de natureza patrimonial.
No mesmo enfoque, Gagliano e Pamplona Filho estabelecem
que :
contrato é um negócio jurídico por meio do qual as partes declarantes, limitas pelos princípios da função social e da boa-fé
43 GAGLIANO, Pablo Stolze, FILHO, Rodolfo Pamplona. Novo Curso de Direito Civil. São Paulo:
Saraiva, 2006. p. 11. 44 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2007. p.14.
29
objetiva, autodisciplinam os efeitos patrimoniais que pretendem atingir, segundo a autonomia das suas próprias vontades.45
A vontade das partes é o elemento principal onde se garante a
legitimação. Não é a lei a principal autoridade, pois é da vontade que se determina a
força obrigatória dos contratos, sendo a lei apenas instrumento para assegurar tal
cumprimento.
O Princípio da autonomia de vontade exige que haja a
liberdade de contratar ou não, de escolher o parceiro contratual, o conteúdo e a
forma do contrato.
Não é possível falar em contrato sem a manifestação de
vontade das partes, pois não há negócio jurídico e não havendo este não há
contrato.
Sendo o contrato é um negócio jurídico, Orlando Gomes46
enfatiza:
O negócio jurídico é a mencionada declaração de vontade dirigida à provocação de determinados efeitos jurídicos, ou, na definição do Código da Saxônia, a ação da vontade, que se dirige, de acordo com a lei, a constituir, modificar ou extinguir uma relação jurídica.
Corrobora Silvio Rodrigues47, ilustrando que “os negócios
bilaterais, isto é, os que decorrem de acordo de mais de uma vontade são os
contratos. Portanto, o contrato representa uma espécie do gênero negócio jurídico.”
Conforme Orlando Gomes48, contrato é:
uma espécie de negócio jurídico que se distingue na formação, por exigir a presença pelo menos de duas partes”. Assim, o “negócio bilateral ou plurilateral, que rejeita as partes à observância de conduta idônea à satisfação dos interesses que regularam.
45 GAGLIANO, Pablo Stolze e FILHO, Rodolfon Pamplona. Novo Curso de Direito Civil. 5 ed. São
Paulo: Saraiva, 2009. v.4. p.11. 46 GOMES, Orlando. Introdução do Direito Civil. 19 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2007. p. 280 47 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: Responsabilidade Civil. 20ed. São Paulo: Saraiva, 2003.p.9. v.4. 48 GOMES, Orlando. Introdução do Direito Civil. p.4; 10
30
Quanto os requisitos básicos do contrato, observa-se que são
necessários: a) a capacidade das partes; b) objeto lícito e c) Forma prescrita ou
não defesa por lei.
O Código Civil reservou um capítulo para definir o contrato de
transporte (arts. 730 a 742) sem trazer uma definição formal. Mas para que o
negócio jurídico tenha validade jurídica, não basta a vontade das partes, é
indispensável dois requisitos: de ordem geral e de ordem especial. De ordem geral
que são comuns a todos os atos e negócios jurídicos. O Código Civil assim dispõe:
Art. 104: A validade do negócio jurídico requer:
I – agente capaz;
II – objeto lícito, possível, determinado ou determinável;
III – forma prescrita ou não defesa em lei.
De ordem especial, o consentimento recíproco ou acordo de
vontades.
Para Maria Helena Diniz49: “[...] num contrato, as partes
contraentes acordam que se deve conduzir de determinado modo, uma e, face da
outra, combinando seus interesses, constituindo, modificando ou extinguindo
obrigações.”
2.2 CLASSIFICAÇÃO DO CONTRATO
O contrato pode ser classificado quanto à Natureza da
Obrigação, à Forma, à Denominação, o Tempo de Execução, e à Pessoa do
Contratante.
Quanto à Natureza da Obrigação: unilaterais (apenas um dos
contratantes assume obrigações em face de outro), bilaterais (direitos e obrigações
para ambas as partes) ou plurilaterais (mais de dois contratantes com obrigações 49 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. p.24
31
mútuas); onerosos (ambas as partes assumem obrigações) ou gratuitos (oneram
somente uma das partes) – de forma geral, os contratos bilaterais são onerosos e os
unilaterais gratuitos; comutativos (as prestações de ambas as partes são conhecidas
e se equivalem) ou aleatórios (no momento da celebração uma das prestações não
é conhecida); morte de um dos contraentes; e paritários (discussão de interesses em
pé de igualdade) ou de adesão (uma das partes adere as cláusulas previamente
estabelecidas pela outra , interpretação mais favorável ao aderente).
Quanto à Forma: solenes (contratos efetuados de acordo com
a lei) ou não-solenes (forma livre de efetuar contrato); consensuais (simples
declaração de vontade) ou reais (na medida em que exijam a entrega da coisa).
Quanto à sua Denominação: nominados ou típicos (possuem
denominação, têm nome e são regulamentados pela legislação) ou inominados ou
atípicos (para a sua validade basta que as partes sema capazes, objeto lícito,
possível e suscetível de apreciação econômica, não há requisitos definidos em lei).
Quanto ao Tempo de sua Execução: instantâneos (efeitos são
produzidos de uma só vez) ou de duração (é cumprido por meio de atos reiterados,
a duração pode ser determinada ou indeterminada).
Quanto à Pessoa do Contratante (pessoais; impessoais;
individuais; coletivos e normativos). Nos contratos principais (intuitu personar, a
pessoa do contratante é indispensável para sua realização, onde existem por si,
independentemente de outro, ou nos acessórios, onde sua existência supõe a do
principal (a pessoa do contratante é indiferente para a conclusão do negócio).50
Dessa forma, para a celebração do contrato é necessário
alguns princípios, tais como: Autonomia da vontade (liberdade de contratar, de forma
livre, as partes podem convergir vontades com o objetivo de criar, modificar ou
extinguir direitos reconhecidos pela ordem jurídica); Supremacia da Ordem Pública
(as partes são livres para, por intermédio de convenções, buscar os fins que lhes
convém, desde que não contrariem a moral, ordem pública e bons costumes);
50 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil. 27.ed. São Paulo: Saraiva: 2002. v.III. p. 25.
32
Consensualismo (simples acordo de vontades, não demandando forma solene para
que as partes sejam obrigadas); Força Obrigatória ou Teoria da Imprevisão (o
contrato faz lei entre as partes, dá segurança às relações contratuais); Boa-Fé (entre
as partes prevalece a confiança e lealdade, colaboração recíproca); Relatividades
dos Efeitos dos Contratos (eficácia, os efeitos são restritos às partes contratantes,
não pode ser opostos a terceiros).51
Devido o contrato ter características próprias, estas expressam
a liberdade contratual, dando liberdade aos contratantes escolherem a melhor forma
de realizar um negócio jurídico, de acordo com a legislação vigente.
Conforme preconiza o Código Civil, como regra, o local para
celebração do contrato deverá ser no lugar que foi proposto, sendo admitida
disposição contrária, desde que pactuado entre as partes.
Art 435: Reputar-se-á celebrado o contrato no lugar em que foi proposto.
Dessa forma, é possível concluir que existem vários tipos de
contratos, podemos destacar: compra e venda, troca e permuta, estimatório, doação,
locação, empréstimo, depósito, mandato, transporte seguro e fiança.
2.3 DO CONTRATO DE TRANSPORTE AÉREO DE PASSAGEIROS
2.3.1 Contrato de transporte
O contrato de transporte surgiu da necessidade de intercâmbio
entre os povos, para fins comerciais ou políticos, tornando-se necessário o translado
de pessoas ou objetos. O surgimento de melhores meios de comunicação exigiu o
estabelecimento de regras para diferenciar o transporte de coisas e de pessoas em
suas várias modalidades.52
51 SAMPAIO, Rogério Marrone de Castro. Direito Civil: Contratos. 4. ed. Sâo Paulo: Atlas, 2002
.p.18-24. 52 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: contratos em espécie. 4.ed. São Paulo: Atlas, 2004. V.III.
33
Marco Fábio Morsello define “Contrato de transporte trata-se
de contrato por meio do qual um sujeito (transportador) se obriga, frequentemente
(embora não necessariamente), por meio de contraprestação pecuniária, a transferir
pessoas ou coisas de um lugar ao outro.”53
Segundo Claudia Lima Marques, “Contrato de transporte é um
contrato de prestação de serviços, uma obrigação de resultado.”54
Pontes de Miranda define contrato como “Contrato pelo qual
alguém se vincula, mediante retribuição, a transferir de um lugar para o outro,
pessoas ou bens”.55
O Novo Código Civil traz um capítulo específico para definir
contrato de transporte.
Preceitua o art. 730: Pelo contrato de transporte alguém se
obriga, mediante retribuição, a transportar, de um lugar para outro, pessoas ou
coisas.
Preceitua o art. 732: Aos contratos de transporte, em geral,
são aplicáveis, quando couber, desde que não contrariem as disposições deste
Código, os preceitos constantes da legislação especial e de tratados e convenções
internacionais.
Alem do transporte aéreo ser regulado pelo Código Civil, há
outras legislações especiais sobre transportes que não contrariam este, tais como:
Convenção de Varsóvia, Código Brasileiro de Aeronáutica, Código de Defesa do
Consumidor entre outros.
53 MORSELLO, Marco Fábio. Responsabilidade Civil no Transporte Aéreo. São Paulo: Atlas,
2007. p. 91. 54 MARQUES, Claudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor: o novo regime das
relações contratuais. 5.ed. São Paulo: RT, 2006. 55 MIRANDA, Pontes de. Tratado de Direito Privado. Rio de Janeiro: Borsoi, 1972. p.8.
34
O transporte aéreo nacional é regulado pelo Código Brasileiro
de Aeronáutica e o transporte aéreo internacional pela Convenção de Varsóvia
(dentro outras legislações).
O Código Brasileiro de Aeronáutica, em seu art 222 dispõe:
Pelo contrato de transporte aéreo, obriga-se o empresário a transportar passageiro,
bagagens, carga ou encomenda postal, por meio de aeronave, mediante
pagamento.
Na Convenção de Varsóvia, alguns artigos, tais como 3 e 16,
também regulam as espécies de transportes.
No Brasil, o transporte aéreo é regulamentado pelo Governo
Federal através dos seguintes órgãos: Ministério da Aeronáutica (responsável
máximo pela navegação aérea e aeroportos no pais, ditando as normas a serem
seguidas pelo setor); ANAC – Agência Nacional de Aviação Civil (departamento
ligado ao Ministério da Aeronáutica, que controla a aviação nacional e internacional
no país) e INFRAERO - Empresa Brasileira de Infra-Estrutura Aeroportuária
(departamento ligado ao Ministério da Aeronáutica, que controla a aviação e
responsável pela administração e construção de aeroportos no Brasil, controle dos
armazéns d carga nas exportações e importações no terminais aeroportuários
brasileiros, bem como nos terminais de passageiros).
Por um lado do contrato o transportador que vende a
passagem aérea, por outro o consumidor a compra. Portanto, a relação contratual
envolve diretamente a companhia aérea e o consumidor, que mantêm uma relação
de contrato de transporte.
O transporte aéreo utiliza as chamadas “condições
contratuais” anexadas ao bilhete, quando não existe um contrato de adesão por
escrito.56
56 MARQUES, Claudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor: o novo regime das
relações contratuais. 5.ed. São Paulo: RT, 2006. p.446
35
Justamente, com fundamento na obrigação de transferir
pessoas de um lugar ao outro ou com retorno ao ponto de origem como fator típico
do referido contrato, viabiliza-se concepção unitária deste, independentemente da
onerosidade ou gratuidade da contraprestação.
Esse tipo de transporte, diferentemente de outros tipos de
transporte, há outras disposições, geralmente impressas.
No que concerne aos caracteres jurídicos, depreende-se que o
contrato de transporte de pessoas tem caráter consensual, sendo válida, inclusive, a
forma tácita no âmbito dos denominados contratos sociais e relações contratuais ex
facto.57
Nesse sentido, conforme Marco Fábio Morsello: “... para a
caracterização do transporte aéreo de pessoas, além da transferência destas, bem
como de suas bagagens, de um lugar ao outro, por via aérea, impõe-se a existência
de veículo de transporte (aeronave) apto à navegação aérea”58
2.3.2 Contrato de transporte aéreo de passageiros
Contrato de transporte aéreo trata-se de contrato por meio do
qual um sujeito, denominado transportador, se obriga a transferir pessoas ou coisas
de um lugar ao outro, por meio de aeronave.
Podemos definir como contrato de adesão, conforme preceitua
o artigo 54 do Código de Defesa do Consumidor:
Contrato de adesão é aquele cujas cláusulas tenham sido aprovadas pela autoridade competente ou estabelecidas unilateralmente pelo fornecedor de produtos ou serviços, sem que o consumidor possa discutir ou modificar substancialmente seu conteúdo,
Esse contrato tem a finalidade de agilizar as negociações, uma
vez que o contrato já está previamente, a parte contrária tem que aceitar as
cláusulas.
57 MORSELLO, Marco Fábio. Responsabilidade Civil no Transporte Aéreo. p.152 58 MORSELLO, Marco Fábio. Responsabilidade Civil no Transporte Aéreo. p.152
36
Entende-se que o consumidor expressa sua vontade somente
no momento de pagar, pois pode escolher as opções dadas pelo fornecedor e a
maneira de efetivá-lo.
Deduz-se que se trata de contrato bilateral, consensual e
oneroso, emergindo a última característica como elemento essencial.59
O transportador determina qual trajeto será percorrido, o
tempo médio de seu percurso, os pontos de parada, horários de decolagem e pouso,
peso da bagagem entre outros. O passageiro apenas adere no momento da
aquisição e a partir daí está celebrado o contrato.
Conforme Orlando Gomes: “O contrato de adesão caracteriza-
se por permitir que seu conteúdo seja preconstruído por uma das partes, eliminada a
livre discussão que precede normalmente à formação dos contratos”.60
O contrato de adesão é consumado apenas pelo acordo de
vontades, se uma das partes adere as cláusulas estabelecidas pela outra, está
celebrado o contrato.
O pagamento da passagem não condição efetiva para fechar o
contrato de transporte pois em muitos casos é feito somente depois da viagem
(prestações).
Nesse sentido, Gonçalves61 enfatiza que o transporte de
passageiros constitui típico exemplo da categoria de contrato de adesão. Quem
toma qualquer meio de transporte, tacitamente celebra um contrato de adesão com
a empresa transportadora, aderindo ao seu regulamento. Esta, implicitamente,
assume a obrigação de conduzi-lo ao seu destino, são e salvo.
59 PACHECO, José da Silva. Código Brasileiro de Aeronáutica Comentado.. p.361-363 60 GOMES, Orlando. Contratos. 26 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2007. p. 109. 61 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. 11 ed. São Paulo: Saraiva, 2008. p.283
37
Uma característica importante cláusula de incolumidade, pois
determina que a obrigação do transportador é de finalização, de resultado esperado,
e não simplesmente de meio; garante aos passageiros que o transportador tem o
dever de zelar para que o percurso da viagem seja bom e seguro, não permitindo
que nenhum acontecimento sinistro aconteça.
Dias62 discorre:
Com efeito, não se pactua sobre a incolumidade, tanto que não seria permitida uma cláusula que excluísse a obrigação de assegurá-la. A cláusula de incolumidade é inerente ao contrato de transporte de pessoas. Quem utiliza um meio de transporte regular celebra com o transportador uma convenção cujo elemento essencial é sua incolumidade, isto é, a obrigação, para o transportador, de levá-lo são e salvo ao lugar de destino.
Para Fernando Noronha, a cláusula de incolumidade “é
implícita ao contrato de transporte, de modo que, para a configuração de sua
existência, não é necessária disposição contratual expressa nesse sentido”63
O exclusivo momento em que a vontade pode manifestar sua
vontade é no momento do pagamento, pois este vai escolher de acordo com a
opções existentes. Esse contrato é comprovado através de bilhete, onde contém
algumas informações referente a obrigação do transportador, tais como local de
partida e destino, horários entre outras.
A predeterminação unilateral do conteúdo emerge quanto ao
modo de formação, contrato de adesão, como bem ressalta Alejandre Piccone
Segura, o qual destaca, outrossim, o caráter consensual e bilateral da avença,
ressalvando que a onerosidade, conquanto freqüente, não se erige a característica
essencial.64
62 COSSICH, Antonio Marcio Figueira. A Responsabilidade Civil do Transportador. JusNavigandi.
Teresina. a. 11, n. 1224, Nov. 2006. Disponível em http://www1.jus.com.br/ doutrina/texto .asp?id, acesso em 23.05.2010.
63 NORONHA, Fernando. A responsabilidade civil do transportador aéreo por danos a pessoa, cargas e bagagem. Revista Sequência. Florianópolis. UFSC. n. 45, 2002, p.9
64 MORSELLO, Marco Fábio. Responsabilidade Civil no Transporte Aéreo.p.152
38
O contrato de adesão, geralmente, não discute negociação
entre as partes, pois a aceitação do contrato não pode ser questionado
posteriormente, salvo se houve cláusulas abusivas ou contrariar a lei.
Ademais, muito embora a celeridade norteie o motivo
determinante da contratação, não é elemento de segurança e proteção, quando
confrontados em uma mesma situação.
Segundo Marco Fábio, o transportador tem o dever de
entregar o bilhete, com prazo de validade e reserva de assento na aeronave,
admitindo-se forma eletrônica, desde que, previamente ao embarque, haja tempo
hábil para a ciência inequívoca das condições gerais de transporte.65
No que diz respeito ao Transporte Aéreo Doméstico, o Código
Brasileiro de Aeronáutica preceitua:
Art. 227 - No transporte de pessoas, o transportador é obrigado a entregar o respectivo bilhete individual ou coletivo de passagem, que deverá indicar o lugar e a data da emissão, os pontos de partida e destino, assim como o nome dos transportadores.
Para Marco Fábio, muito embora não se questione a natureza
consensual do contrato de transporte aéreo, o bilhete aéreo desempenha importante
papel probatório e informativo, de modo que sua ausência ou irregularidade,
conquanto não possa desnaturar a existência e validade da avença, terá o condão
impeditivo de utilização pelo transportador do patamar-limite indenizável ínsito ao
Sistema de Varsóvia.66
O Código de Defesa do Consumidor, a favor do consumidor,
preceitua:
Art 47 - As cláusulas contratuais serão interpretadas de maneira mais favorável ao consumidor.
Art. 54 - Contrato de adesão é aquele cujas cláusulas tenham sido aprovadas pela autoridade competente ou estabelecidas
65 MORSELLO, Marco Fábio. Responsabilidade Civil no Transporte Aéreo.p.155 66 MORSELLO, Marco Fábio. Responsabilidade Civil no Transporte Aéreo.p.156-158
39
unilateralmente pelo fornecedor de produtos ou serviços, sem que o consumidor possa discutir ou modificar substancialmente seu conteúdo.
§ 3º Os contratos de adesão escritos serão redigidos em termos claros e com caracteres ostensivos e legíveis, cujo tamanho da fonte não será inferior ao corpo doze, de modo a facilitar sua compreensão pelo consumidor.
Todas essas hipóteses legais configuram elementos de
cognoscibilidade (conhecer), situando-se no plano da eficácia, vale dizer, sua falta
acarreta a ineficácia jurídica, ainda que não haja cláusula abusiva. Os contratos
existem juridicamente, são válidos mas não são eficazes. O direito do consumidor,
portanto, desenvolveu peculiar modalidade de eficácia jurídica, estranha ao modelo
tradicional do contrato. No lugar do consentimento, desponta a cognoscibilidade,
como realização do dever de informar. 67
O Transporte Aéreo Internacional ou Nacional é disciplinado
por várias convenções, mas a Convenção de Varsóvia e uma das mais importantes.
Há alguns conflitos na legislação interna de um país, no Brasil há duas correntes
com entendimentos opostos: a primeira e defensora do Código Brasileiro de
Aeronáutica para dirimir conflitos oriundos de contratos de transporte aéreo o outro é
a proteção do Código de Defesa do Consumidor, onde se trata de lei específica e
posterior ao Código Brasileiro de Aeronáutica, o que redundaria em verdadeira
derrogação a este.
Porém, para a aplicação do Código de Defesa do Consumidor
é necessário que haja uma relação jurídica de consumo, que se pode entender
como uma relação que pressupõe dois sujeitos: de um lado o consumidor e do outro
o fornecedor, tendo por objeto q aquisição de um produto ou a utilização de um
serviço. Portanto, as empresas que prestam serviços de transporte aéreo no
mercado de consumo, enquadram-se no conceito de fornecedor e, tanto os
67 LÔBO, Paulo Luiz Netto. A informação como direito fundamental do consumidor. JusNavigandi,
Teresina, a. 5, n. 51, out. 2001. Disponível em: <http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp>. Acesso 04 ago 2010.
40
passageiros como os equiparados são considerados consumidores, essa relação
configura-se típica de consumo e se aplica ao Código de Defesa do Consumidor.68
Em se tratando do inicio da execução do contrato do
transporte aéreo de passageiros, o Código Brasileiro de Aeronáutica dispõe:
Art. 233. A execução do contrato de transporte aéreo de passageiro compreende as operações de embarque e desembarque, além das efetuadas a bordo da aeronave.
§ 1° Considera-se operação de embarque a que se realiza desde quando o passageiro, já despachado no aeroporto, transpõe o limite da área destinada ao público em geral e entra na respectiva aeronave, abrangendo o percurso feito a pé, por meios mecânicos ou com a utilização de viaturas.
§ 2° A operação de desembarque inicia-se com a saída de bordo da aeronave e termina no ponto de intersecção da área interna do aeroporto e da área aberta ao público em geral.
Art. 234. No contrato de transporte de bagagem, o transportador é obrigado a entregar ao passageiro a nota individual ou coletiva correspondente, em 2 (duas) vias, com a indicação do lugar e data de emissão, pontos de partida e destino, número do bilhete de passagem, quantidade, peso e valor declarado dos volumes.
§ 1° A execução do contrato inicia-se com a entrega ao passageiro da respectiva nota e termina com o recebimento da bagagem.
Art. 245. A execução do contrato de transporte aéreo de carga inicia-se com o recebimento e persiste durante o período em que se encontra sob a responsabilidade do transportador, seja em aeródromo, a bordo da aeronave ou em qualquer lugar, no caso de aterrissagem forçada, até a entrega final.
A execução do contrato é vista pela hermenêutica literal no
momento que se iniciam as operações de embarque até o momento das operações
de desembarque, porém a responsabilidade do transportador vai além, inicia no
momento que o passageiro adquiriu o bilhete.
Caso a empresa não reconheça essa responsabilidade
poderá arcar com prejuízos que causar ao passageiro, pois a responsabilidade
68 GREGORI, Maria Stella.A responsabilidade civil do transporte aéreo nas relações de Consumo.
Disponível em http://erikataucci.blogspot.com/2010/05/transporte-aereo-do-direito.html . Acesso em 20/07/2010.
41
limitada é presumida na Convenção de Varsóvia ou objetiva no Código Brasileiro de
Aeronáutica, estas ligadas à execução do contrato.
O contrato de transporte aéreo é aquele pelo qual uma pessoa
se compromete a transportar por via aérea, de um lugar a outro uma pessoa e sua
bagagem ou mercadoria.
Em casos de atraso para partida do vôo e o atraso em escala,
o transportador é obrigado a indenizar, conforme preceitua o Código Brasileiro de
Aeronáutica:
Art. 230 Em caso de atraso da partida por mais de 4 (quatro) horas, o transportador providenciará o embarque do passageiro, em vôo que ofereça serviço equivalente para o mesmo destino, se houver, ou restituirá, de imediato, se o passageiro o preferir, o valor do bilhete de passagem.
Art. 231 Quando o transporte sofrer interrupção ou atraso em aeroporto de escala por período superior a 4 (quatro) horas, qualquer que seja o motivo, o passageiro poderá optar pelo endosso do bilhete de passagem ou pela imediata devolução do preço.
Conforme previsão legal, o transportador tem a obrigação de
embarcar o passageiro no horário previsto para o mesmo destino em vôo que
ofereça serviço equivalente. Em casos em que não seja possível, deverá este,
restituir, se assim preferir o passageiro, de imediato, o valor do bilhete de
passagem.69
Neste sentido, mostra-se acertada a decisão proferida pelo 4º
Juizado Especial Cível da Comarca de João Pessoa , na qual um passageiro
pleiteou indenização pelos danos puramente morais decorrentes da falta de
assistência da companhia aérea durante sua espera de 10 horas por um vôo que
partiria de São Paulo com destino à capital paraibana. 70
69 CAVALCANTI, André Uchôa. Responsabilidade civil do Transportador Aéreo. Riode Janeiro:
Renovar, 2002. p.144 69 PARAIBA. Tribunal de Justiça do Estado da Paraíba. Processo nº 2002006061715-6, 4º Juizado
Especial Cível da Capital, Juíza Daniella Cristhine Ramalho Costa, pub. DOE 09/03/2007.
42
O Código Brasileiro de Aeronáutica deve ser interpretado em
conjunto com o Código de Defesa do Consumidor, apesar do Código Brasileiro de
Aeronáutica excluir a responsabilidade civil do transportador nos casos de força
maior ou de comprovada determinação da autoridade aeronáutica, o Código de
Defesa do Consumidor afirma que não existem excludentes de responsabilidade
para os casos de vícios e que a responsabilidade do transportador é objetiva,
independe de culpa.
O dever da pontualidade é essencial na atividade de
transporte aéreo, vez que é em busca de rapidez e segurança que este serviço é
contratado. Por isso, a legislação procurou punir o atraso de vôo, almejando,
sobretudo a pontualidade do serviço.71
Quanto ao transporte de bagagem, apesar de não
reconhecidamente objeto direto do contrato de transporte, há de ser levado em
consideração dado o seu caráter acessório frente ao contrato de pessoas.72 Nesse
sentido, Gomes73 entende que “ao viajante é lícito fazer conduzir, no mesmo veículo,
sua bagagem, incluído o transporte no preço da passagem, desde que não exceda o
número de volume e o peso determinados no regulamento.
Conforme o Código Brasileiro de Aeronáutica, este contrato é
comprovado pela nota de bagagem. Assim dispõe:
Art. 234. No contrato de transporte de bagagem, o transportador é obrigado a entregar ao passageiro a nota individual ou coletiva correspondente, em 2 (duas) vias, com a indicação do lugar e data de emissão, pontos de partida e destino, número do bilhete de passagem, quantidade, peso e valor declarado dos volumes.
71 VIEIRA, Karina. Hipóteses de Responsabilidade Civil no Transporte Aéreo. 2005. O Direito.
Disponível em: www.odireito.com/acesso em 04 de junho de 2010. 72 GOMES, Orlando. Contratos.p.312 73 GOMES, Orlando. Contratos. P. 312.
43
Diniz74 afirma que o bilhete de passagem constitui a prova do
contrato de transporte. A falta, irregularidade ou perda do bilhete não prejudica a
existência e eficácia do contrato, dentro do seu prazo de validade.
Venosa75 ressalta que o bilhete de passagem, ou
simplesmente passagem, emitido pelo transportador ou seu mandatário, é a prova
do contrato de transporte de pessoas.
Sobre o transporte de bagagem
o peso é conferido na hora do check-in, mediante balança apropriada. O passageiro se desejar poderá declarar o valor da bagagem, podendo o agente do transportador, neste caso, verificar o conteúdo e apurar se é exato valor declarado. A declaração de valor é uma faculdade concedida ao usuário que deseja transportar bens de excepcional valor mediante pagamento de taxa suplementar de seguro. Ao aceitar o valor declarado pelo passageiro, a empresa aérea não poderá prevalecer-se dos limites de reparação estabelecidos pelas leis brasileiras [...]76
Para fins de liquidação de eventual dano, perda ou extravio de
bagagem, adotou-se a base de cálculo escudada no peso do volume transportado.
74 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. p.253 75 VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil. p.508 76 PACHECO, José da Silva. Código Brasileiro de Aeronáutica Comentado.. p.380.
CAPÍTULO 3
ASPECTOS DESTACADOS DA RESPONSABILIDADE CIVIL
A palavra responsabilidade tem sua origem na raiz latina
spondeo, pela qual se vincula o devedor, solenemente, nos contratos verbais de
direito romano. Dentre várias acepções existentes, destaca-se como aspecto da
realidade social. Toda atividade que acarreta prejuízo traz em seu bojo, como fato
social, o problema da responsabilidade. Destina-se ela a restaurar o equilíbrio moral
e patrimonial provocado pelo autor do dano.77
A responsabilidade civil é tratada no Código Civil e no Código
de Defesa do Consumidor nos artigos 927 a 954.
A idéia de responsabilidade está profundamente ligada com o
senso de justiça, o qual de uma maneira ou de outra sempre esteve presente nas
comunidades humanas, nos primórdios a idéia de responsabilidade era una, sempre
ligada ao dano.78
A responsabilidade civil passou por uma grande evolução ao
longo do século XX. Foi sem dúvida, a área da ciência do direito que sofreu as
maiores mudanças. Pode-se dizer, sem medo de errar, que os domínios da
responsabilidade civil foram ampliados na mesma proporção em que se
multiplicaram os inventos e outras conquistas da atividade humana, com o enorme
manancial das descobertas científicas e tecnológicas.79
77 GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: responsabilidade civil. São Paulo: Saraiva,
2007. v. IV. p.1 78 GOMES, Marcelo Kokke. Responsabilidade civil: dano e defesa do consumidor. Belo Horizonte:
Del Rey, 2001. p.19 79 DIREITO, Carlos Alberto Menezes; CAVALIERI FILHO, Sérgio. Comentários ao novo código
civil: da responsabilidade civil: das preferências e privilégios creditórios. 2. ed... Rio de Janeiro: Forense, 2007. v.13. p.1
45
Acerca da responsabilidade, Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo
Pamplona Filho conceituam:
Significa a obrigação que alguém tem que assumir as conseqüências jurídicas de sua atividade, contendo ainda a raiz latina de spondeo fórmula através da qual se inculava, no Direito Romano, o devedor nos contratos verbais. A acepção que se faz de responsabilidade, portanto, está ligada ao surgimento de uma obrigação derivada, ou seja, um devedor jurídico sucessivo, em função da ocorrência de um fato jurídico lado senso.80
Acrescenta ainda José Cretella Júnior:
A responsabilidade jurídica nada mais é do que a própria figura da responsabilidade, in genere, transportada para o campo do direito, situação originada por ação ou omissão de sujeito de direito público ou privado que, contrariando norma objetiva, obriga o infrator a responder com sua pessoa ou bens.81
Segundo Maria Helena Diniz, a responsabilidade civil constitui
uma relação obrigacional que tem por objeto a prestação do ressarcimento. Tal
obrigação de ressarcir o prejuízo causado pode originar-se da inexecução do
contrato ou da lesão a direito subjetivo, sem que preexista entre lesado e lesante
qualquer relação jurídica que a possibilite.82
Em contrapartida Silvio Rodrigues versa que:
Princípio geral do direito, informador de toda a teoria da responsabilidade, encontradiça no ordenamento jurídico de todos os povos civilizados e sem o qual a vida social é inconcebível, é aquele que impõe a quem causa dano a outrem, o dever de repará-lo.83
80 GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil. Obrigações.
11 ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 2. 81 CRETELLA JUNIOR, Jose. O Estado e a obrigação de indenizar. 2 ed. Rio de Janeiro: Forense,
2002.p.11 82 SILVA, Marcus Vinícius Fernandes Andrade. O contrato de transporte aéreo, a responsabilidade
civil do transportador e a possível antinomia entre e Código de Proteção de Defesa do Consumidor, o Código Brasileiro de Aeronáutica e a Convenção de Varsóvia. In: Revista Jus Vigilantibus, 23 jun.; 2004
83 RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: responsabilidade civil. 20 ed. São Paulo: Saraiva, 2007. v. IV. p. 13.
46
É possível concluir que o objetivo da responsabilidade é
atribuir as conseqüências do dano a pessoa que o causou, sendo este responsável
pelo dano causado.
3.1 ESPÉCIES DE RESPONSABILIDADE CIVIL
3.1.1 Contratual e extracontratual
O Código Civil disciplina a responsabilidade extracontratual
nos arts. 186 a 188 e 927 a 954 e a contratual nos arts. 389 e 395.
A responsabilidade extracontratual não deriva de contrato,
conforme preconiza o art 186 do Código Civil, todo aquele que causa dano a outrem,
por culpa em sentido estrito ou dolo, fica obrigado a repará-lo. É a responsabilidade
derivada de ilícito extracontratual, também chamada aquiliana.
Na responsabilidade extracontratual, o agente infringe um
dever legal, e, na contratual, descumpre o avençado, tornando-se inadimplente.
Nesta, existe uma convenção prévia entre as partes que não é cumprida. Na
responsabilidade extracontratual, nenhum vínculo jurídico existe entre a vítima e o
causador do dano, quando este pratica o ato ilícito.84
Segundo Maria Helena Diniz, a responsabilidade
extracontratual resulta de violação de preceito legal ou de dever geral de abstenção
pertinente aos direitos reais ou de personalidade.85
A responsabilidade é contratual quando deriva do
descumprimento do contrato, pois não precisa provar a culpa, basta prova que o
contrato não foi cumprido e, em conseqüência, houve o dano.86
Entre as duas espécies de responsabilidade civil um elemento
de diferenciação refere-se à capacidade do agente causador do dano. A capacidade
84 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil.p.26 85 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. p.93 86 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. p.28
47
sofre limitações no terreno da responsabilidade simplesmente contratual, sendo
mais ampla no campo da responsabilidade extracontratual. A convenção exige
agentes plenamente capazes ao tempo de sua celebração, sob pena de nulidade e
de não produzir efeitos indenizatórios.
Segundo Maria Helena Diniz, a responsabilidade contratual
decorre da violação de uma obrigação negocial preexistente, ou seja, é proveniente
de inadimplemento absoluto ou relativo no cumprimento de um vínculo
obrigacional.87
Assim, observa-se que na responsabilidade contratual, é
fundamental para sua caracterização a pré-existência da relação obrigacional. O
contrato e a principal fonte das obrigações.
3.1.2 Responsabilidade subjetiva ou teoria da culpa
A culpa era o fundamento da responsabilidade. Esta teoria,
também chamada de teoria da culpa, ou “subjetiva”, pressupõe a culpa como
fundamento da responsabilidade civil. E não havendo culpa, não há
responsabilidade.88
Diz-se, pois, ser “subjetiva” a responsabilidade quando se
esteia na idéia da culpa. A prova da culpa do agente passa a ser pressuposto
necessário do dano indenizável. Dentro desta concepção, a responsabilidade do
causador do dano somente se configura se agiu com dolo ou culpa.89
Neste sentido, Maria Helena Diniz entende:
[...] a multiplicação das oportunidades e das causas de danos, evidenciaram que a responsabilidade subjetiva mostrou-se inadequada para cobrir todos os casos de reparação. Esta, com efeito, dentro da doutrina da culpa, resulta da vulneração de norma preexistente, e comprovação do nexo causal entre o dano e a
87 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. p.93 88 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil.p.30 89 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil.p.30
48
antijuricidade da conduta do agente. Verificou-se que nem sempre o lesado consegue provar esses elementos. Especialmente a desigualdade econômica, a capacidade organizacional da empresa, as cautelas do juiz no auferição dos meios de prova trazidas ao processo nem sempre logram convencer da existência da culpa, e em conseqüência a vítima remanesce não indenizada, posto que admita que foi efetivamente lesada.90
O Código Civil Brasileiro adotou como regra à teoria
“subjetiva”. Em seu art 186, que tem o dolo e a culpa como fundamentos para a
obrigação de reparar o dano.
O Código de Defesa do Consumidor inova sua visão e
abandona o conceito de culpa, dispondo:
Art. 6º - São direitos básicos do consumidor:
VI- a efetiva prevenção e reparação de dados patrimoniais e morais, individuais, coletivos e difusos.
Diante desse artigo, Silvio Rodrigues91 conclui:
Verifica-se que no art. 186 do CC que, é posta em evidência a responsabilidade aquiliana, ou seja, é assegurado o castigo à um agente que causa dano a outrem, tendo em vista o ressarcimento do prejuízo que venha a causar, sendo decorrente de ato doloso ou culposo.
Porém, cabe ressaltar que na responsabilidade subjetiva, cada um responde pela sua própria culpa, e que a responsabilidade subjetiva se mantém como regra sem prejuízo de ser aceita a responsabilidade objetiva como princípio implícito para que o dano seja reparado.
Caio Mário da Silva Pereira adverte:
[...] a regra geral, que deve presidir à responsabilidade civil, é a sua fundamentação na idéia de culpa; mas, sendo insuficiente esta para atender às imposições do progresso, cumpre ao legislador fixar especialmente aos casos em que deverá ocorrer a obrigação de reparar, independentemente daquela noção. Não será sempre que a reparação do dano se abstrairá do conceito de culpa, porém quando o autorizar a ordem jurídica positiva... [...]92
90 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. p.92-94 91 RODRIGUES, Silvio. Direito civil: responsabilidade civil. p 11. 92 PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil: Contratos. 12 ed. São Paulo: Saraiva,
49
3.1.3 Responsabilidade objetiva ou teoria do risco
A lei impõe, entretanto, a certas pessoas, em determinadas
situações, a reparação de um dano cometido sem culpa. Quando isto acontece, diz-
se que a responsabilidade é legal ou “objetiva”, porque prescinde da culpa e se
satifaz apenas com o dano e o nexo de causalidade. Esta teoria, dita objetiva, ou do
risco, tem como postulado que todo dano é indenizável, e deve ser reparado por
quem a ele se liga por um nexo de causalidade, independentemente de culpa.
Nos casos de responsabilidade objetiva, não se exige prova de
culpa do agente para que seja obrigado a reparar o dano. Em alguns, ela é
presumida pela lei. Em outros, é de todo prescindível.93
A classificação corrente e tradicional, porém, denomina
objetiva a responsabilidade que independe da culpa. Esta pode ou não existir, mas
será sempre irrelevante para a configuração do dever de indenizar. Indispensável
será a relação de causalidade, uma vez que, mesmo no caso de responsabilidade
objetiva, não se pode acusar quem não tenha dado causa ao evento. Nessa
classificação, os casos de culpa presumida são considerados hipóteses de
responsabilidade subjetiva, pois se fundam ainda na culpa, mesmo que presumida.94
Pablo Stolze Gagliano e Rodolfo Pamplona Filho preceituam:
[...] os proveitos e vantagens no mundo tecnológico são postos num dos pratos da balança. No outro, a necessidade de o vitimado em benefício de todos poder responsabilizar alguém, em que pese o coletivo da culpa. O desafio é como equilibrá-los. Nessas circunstâncias, fala-se em responsabilidade objetiva e elabora-se a teoria do risco, dando-se ênfase a mera relação de causalidade, abstraindo-se inclusive, tanto da ilicitude do ato quanto da existência da culpa.95
2006 v.3. p.507
93 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil.p.30 94 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. p.31 95 GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil:
responsabilidade civil.
50
Para a teoria do risco, toda pessoa que exerce alguma
atividade cria um risco de dano para terceiros. E deve ser obrigada a repará-lo,
ainda que sua conduta seja isenta de culpa. A responsabilidade civil desloca-se da
noção de culpa para a idéia de risco, ora encarada como “risco-proveito”, que se
funda no princípio segundo o qual é reparável o dano causado a outrem em
conseqüência de uma atividade realizada em benefício do responsável (ubi
emolumentun, ibi ônus); ora mais genericamente como “risco criado”, a que se
subordina todo aquele que, sem indagação de culpa, expuser alguém a suportá-lo.96
Maria Helena Diniz diz que:
A responsabilidade, fundada no risco, consiste, portanto, na obrigação de indenizar o dano produzido por atividade exercida no interesse do agente e sob seu controle, sem que haja qualquer indagação sobre o comportamento do lesante, fixando-se no elemento objetivo, isto é, na relação de causalidade entre o dano e a conduta do seu causador.97
Determina, o art. 927 do Código Civil: “Haverá obrigação de
repara o dano, independente de culpa, nos casos específicos em lei, ou quando a
atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza,
risco para o direito de outrem”.98
A inovação desse artigo é significativa e representa um avanço
em matéria de responsabilidade civil. Pois a sua admissão da responsabilidade sem
culpa pelo exercício de atividade que, por sua natureza, representa risco para os
direitos de outrem, da forma genérica, possibilitará ao Judiciário uma ampliação dos
casos de dano indenizável.99
96 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. p.31 97 DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. p.51 98 BRASIL, Lei 10.406 de 10 de janeiro de 2002. Diário Oficial da União: Brasília, 2002 99 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. p.34
51
3.2 RESPONSABILIDADE CIVIL NO TRANSPORTE AÉREO
O contrato de transporte está disciplinado nos artigos 730 a
756 do Código Civil, que estabelecem a responsabilidade civil objetiva na reparação
de danos. O Código Brasileiro de Aeronáutica regula o transporte aéreo nacional, e
a Convenção de Varsóvia, ratificada pelo Protocolo de Montreal, disciplina o
transporte aéreo internacional de pessoas, bagagens e mercadorias.
[...] o transportador aéreo, por diversas vezes, é enquadrado na figura do fornecedor de serviços, descrita no artigo 4º. do Código de Defesa do Consumidor. Instaura-se, portanto, um aparente conflito de normas entre a legislação especial do transporte aéreo: Convenção de Varsóvia/Protocolo de Montreal, Código Brasileiro de Aeronáutica e Código Civil, e o Código de Defesa do Consumidor. A matéria mais controversa – e que atribui maior relevância a essa discussão – é referente à responsabilidade civil do transportador e seu dever de indenizar: se é limitado, de acordo com o disposto na legislação especial, ou se é integral, de acordo com a legislação consumeirista.100
Ainda na vigência do Código Civil de 1916, que estabelecia a
culpa como pressuposto da responsabilidade, veio a lume o Código de Defesa do
Consumidor, prevalecendo a responsabilidade como fato do produto ou do serviço e
responsabilidade independente da culpa, a partir de então, certo seguimento da
doutrina e também da jurisprudência passou a entender que, embora o Código
Brasileiro de Aeronáutica discipline o transporte aéreo interno e a Convenção de
Varsóvia (agora substituída pela Convenção de Montreal, a partir de 2006)
regulamente o transporte aéreo internacional, os limites de indenização nele
estabelecidos não prevalecem.101
Já no que se refere ao conflito criado pelo Código de Defesa
do Consumidor, este, por ser lei nova, prevalece sobre o Código Brasileiro de
Aeronáutica. Apesar de alguns dizerem que a lei geral posterior (CDC) não revoga a
lei especial anterior (CBA), não procede o argumento, pois tal regra não é absoluta e
não se aplica ao caso em exame. Conforme ensina Antonio Herman Benjamin, "o
100 SCHWARZ, Carlota Monte Alegre. A responsabilidade civil do transporte aéreo e o Código de
Defesa do Consumidor. Jus Navigandi, Teresina, a. 14 n. 2349, 6 dez. 2009. Disponível em: <HTTP://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=13968> . Acesso em: 20 set. 2010
101 STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil: doutrina e jurisprudência. p.326
52
Código de Defesa do Consumidor pertence àquela categoria de leis denominadas
‘horizontais’, cujo campo de aplicação invade, por assim dizer, todas as disciplinas
jurídicas (..) São normas que têm por função, não regrar uma determinada matéria,
mas proteger sujeitos particulares, mesmo que estejam eles igualmente abrigados
sob outros regimes jurídicos" .
É o Código de Defesa do Consumidor lei especial, no sentido
de atingir toda e qualquer relação de consumo; sempre que houver tais relações, aí
incidirá o Código. Assim, tratando-se de relações de consumo, o Código de Defesa
do Consumidor é lei própria, específica e exclusiva. O CDC é lei específica e própria
no que se refere à responsabilidade civil nos contratos de transporte aéreo que
envolvam relação de consumo, mesmo que, por acaso, sobrevenham a nova
Convenção de Montreal ou um novo Código Brasileiro de Aeronáutica.102
Os direitos do consumidor fazem parte da categoria que se
pode denominar novos direitos, surgidos todos no século XX, frutos das
transformações sociais e tecnológicas, e que colocam em berlinda o aspecto de
abrangência dos grandes Códigos. A sociedade de consumo, o mundo globalizado
colocou o direito do consumidor como um dos principais matizes desses novos
segmentos, em todas as nações ocidentais, sendo o CDC promulgado na CFB/88103
No caso de contratos de transporte aéreo, é fácil enxergar a
relação de consumo, pois se tem de um lado um consumidor, a prestação de um
serviço, mediante remuneração e no outro extremo o fornecedor empresa aérea..
Apesar disso, o próprio CDC, através de seu artigo 7º 104, não exclui outros direitos
decorrentes de tratados ou convenções internacionais de que o Brasil seja
102 http://www.sbda.org.br/revista/Anterior/1731.htm . acesso em 20. Set. 2010 103 VENOSA, Sílvio de Salvo. Direito civil: responsabilidade civil. p. 214-215 104 “Art. 7° Os direitos previstos neste código não excluem outros decorrentes de tratados ou
convenções internacionais de que o Brasil seja signatário, da legislação interna ordinária, de regulamentos expedidos pelas autoridades administrativas competentes, bem como dos que derivem dos princípios gerais do direito, analogia, costumes e eqüidade.
Parágrafo único. Tendo mais de um autor a ofensa, todos responderão solidariamente pela reparação dos danos previstos nas normas de consumo.”
53
signatário. Logicamente entende-se que este não contrarie os princípios
constitucionais e do próprio CDC e ainda trazendo maior benefício ao consumidor.105
Sérgio Cavalieri Filho preconiza: “Transportador aéreo
nacional e internacional, por serem prestadores de serviços públicos, estão
subordinados ao Código de Defesa do Consumidor”106
Prescreve o §3º do art. 14 do Código de Defesa do
Consumidor:
O fornecedor de serviços só não será responsabilizado quando prova:
I – que, tendo prestado o serviço, o defeito inexiste;
II – a culpa exclusiva do consumidor ou de terceiro.
[...] o dispositivo em questão cuida exclusivamente do fator culpa. O fato inevitável, porém, rompe o nexo de causalidade, especialmente quando não guarda nenhuma relação com a atividade do fornecedor, não se podendo, destarte, falar em defeito do produto ou do serviço.107
O Superior Tribunal de Justiça assim vem decidindo:
O fato do art. 14, §3º, do Código de Defesa do Consumidor não se referir ao caso fortuito é à força maior, ao arrolar as causas de isenção de responsabilidade do fornecedor de serviços, não significa que, no sistema por ele instituído, não possam ser invocados. Aplicação do art. 1058 do Código Civil [de 1916]108
Segundo Arruda Alvim,
reconhece-se na força maior o caráter de seccionada do nexo de causalidade, indispensável para que haja responsabilidade civil, mesmo nos sistemas em que prescinde da culpa, o que a faz servir como exoneradora da responsabilidade mesmo que não prevista expressamente na lei como eximente, porque permanece válida a
105 SILVA, Marcus Vinícius Fernandes Andrade. O contrato de transporte aéreo, a responsabilidade
civil do transportador e a possível antinomia entre o código de proteção de defesa do consumidor, o código brasileiro aeronáutico e a convenção de Varsóvia. Disponível em http://jusvi.com/artigos/769 Acesso em 26/09/2010.
106 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. p.308 107 GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. p.214 108 BRASÍLIA. Resp 120.647-SP, 3º t., rel. Min. Eduardo Ribeiro, DJU, 15-5-2000, p.156
54
regra de Direito Civil que reconhece à força maior a virtude de excluir a responsabilidade aquiliana.109
Sério Cavalieri Filho entende pertinente a distinção entre o
fortuito interno e o externo, no que respeita aos acidentes de consumo, observando:
O fortuito interno, assim entendido o fato imprevisível e, por isso, inevitável ocorrido no momento da fabricação do produto ou da realização do serviço, não exclui a responsabilidade do fornecedor porque faz parte da sua atividade, liga-se aos riscos do empreendimento, submetendo-se à noção geral de defeito de concepção do produto ou de formulação do serviço. (...). O mesmo já não ocorre com o fortuito externo, assim entendido aquele fato que não guarda nenhuma relação com a atividade do fornecedor, absolutamente estranho ao produto ou serviço, via de regra ocorrido em momento posterior ao da sua fabricação110
Assim, a “tempestade que desestabiliza e derruba uma
aeronave pode justificar a admissão do caso fortuito. Contudo, se, antes mesmo de
iniciar a decolagem, havia notícia do mau tempo e recomendação de se permanecer
em terra, então não se poderá atribuir a essa condição desfavorável a causa do
acidente, senão e apenas em razão da desídia, descaso e absurdo destemor dos
responsáveis pelo aparelho.”111
3.3 RESPONSABILIDADE CIVIL POR ACIDENTE AÉREO
A empresa aérea é responsável pelos danos causados aos
seus passageiros, sendo objetiva a responsabilidade do explorador da atividade.
Destaca-se duas legislações para a responsabilidade civil por acidentes aéreo: o
Código Brasileiro de Aeronáutica (Lei 7565 de 19.12.1986), aplicável às viagens
domésticas ou nacionais, que consagrou a teoria da responsabilidade objetiva; e a
Convenção Internacional de Varsóvia, de 1932, aplicável às viagens internacionais.
109 ALVIM, Arruda, ALVIM, Thereza, ALVIM, Eduardo Arruda, MARINS, James. Código do
Consumidor Comentado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995. p.127-128 110 CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. p.375-376 111 STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil: doutrina e jurisprudência. p.156
55
A Convenção de Varsóvia consagrou a teoria da presunção de
culpa do transportador e fixou um teto indenizatório. A superveniência do dispositivo
constitucional veio a consagrar o entendimento segundo o qual a responsabilidade
pelo transporte aéreo é sempre objetiva, fundada na teoria do risco administrativo da
concessionária ou da permissionária do serviço público de transporte.112
A Organização de Aviação Civil Internacional define acidente
como sendo toda e qualquer espécie de anormalidades em vôo, que, sem causar os
resultados constitutivos de um acidente, poderão colocar em risco a segurança da
aeronave, ou alterar os planos estabelecidos para referido vôo.
Na Convenção de Varsóvia, artigo 17, o termo acidente é
elencado como pré-requisito do dever de indenizar no transporte aéreo de
passageiros. Com efeito, referido dispositivo legal preceitua que
responde o transportador pelo dano ocasionado por morte, ferimento ou qualquer outra lesão corpórea sofrida pelo viajante, desde que o acidente, que causou o dano, haja ocorrido a bordo da aeronave, ou no curso de quaisquer das obrigações de embarque ou desembarque.113
Nesse aspecto o Código Brasileiro de Aeronáutica, nos termos
do art. 256, I, dispõe da mesma forma da Convenção de Varsóvia, pois impõe
responsabilidade do transportador pelo dano decorrente “de morte ou lesão de
passageiro, causada por acidente ocorrido durante a execução do contrato de
transporte aéreo, a bordo de aeronave ou no curso das operações de embarque ou
desembarque”.114
O Código Brasileiro de Aeronáutica demonstra, nessa parte,
retrocesso com relação ao Código anterior, seja no estabelecimento de valores, seja
na unidade monetária escolhida. [...] fixou valores de indenização infinitamente
inferiores àqueles estabelecidos na Convenção de Varsóvia, que já não são
112 LISBOA, Roberto Senise. Manual de direito civil: obrigações e responsabilidade civil. v.2. 2004.
p. 629. 113 MORSELLO, Marco Fábio. Responsabilidade Civil no Transporte Aéreo. p. 258. 114 MORSELLO, Marco Fábio. Responsabilidade Civil no Transporte Aéreo. p. 259
56
alentados, felizmente substituída pela Convenção de Montreal, com valores mais
consentâneos.
O pior, contudo, é que abandonou-se o salário mínimo como
parâmetro para adotar-se a OTN, hoje extinta e sem similar vigor. É fator de
perplexidade no momento de o magistrado fixar o quantum da indenização e de
angústia para as partes, que não têm notícia certa dos parâmetros que serão
utilizados.115
O Desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo utilizou
seguinte critério:
Quanto aos valores, o Código ainda se expressa em OTN (Obrigação do Tesouro Nacional), que deixou de existir, sendo substituída, por força de Lei 7801, de 11.07.89, pelo BTN (Bônus do Tesouro Nacional), à razão de Cr$ 6,17 para cada OTN; o BTN também já foi extinto pela Lei 8178, de 01.03.91, que o “congelou” no valor de Cr$ 126,8621, passando esse montante a partir dessa data a ser reajustado com base na TR (Taxa Referencial) ou no índice de atualização das Cadernetas de Poupança. Sucede que a Lei 8880, de 27.05.94, que instituiu a URV (Unidade de Referência de Valor), omitiu a forma de conversão dos valores mencionados nas diversas leis que fazem referência à OTN, BTN, etc. Como a URV, constitui padrão monetário dotado de curso legal, que, juntamente com o cruzeiro e o real, integra o Sistema Monetário Nacional, pode-se tomar os valores vigentes em 01.03.94 e convertê-los em URVs, com base no seu valor nessa mesma data, como segue:116
Morte ou lesão corporal: Limite 11.790 URV + ou – US$ 12.000,00
Atraso: Limite 505 URV + ou – US$ 511,00
[...] o julgador poderá entender que o Código de Aeronáutica já não dispõe mais de mecanismo próprio para o estabelecimento da indenização, considerando que a unidade de valor que foi estabelecida já não mais existe. 117
Por essas razões, uma vez a unidade extinta, tem decidido o
Supremo Tribunal de Justiça:
115 STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil: doutrina e jurisprudência. 7 ed. São Paulo:
Revista dos Tribunais, 2007, p.365-366 116 STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil: doutrina e jurisprudência. p. 366. 117 STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil: doutrina e jurisprudência. p.366
57
Responsabilidade civil. Acidente aéreo. Pedido indenizatório. Culpa gravíssima. Aplicação da legislação comum – “ A indenização decorrente da morte de passageiro em acidente aéreo, causada por culpa grave dos pilotos, equiparável ao dolo, não sofre a limitação tarifada, devendo ser arbitrada com base nas regras da legislação comum.118
Este Tribunal firmou o entendimento de que, havendo dolo eventual da empresa aérea, a indenização às vítimas há de ser plena, porquanto o art. 106 do DL 32/66 (atual art. 248 do Código Brasileiro de Aeronáutica) contempla esta exceção, devendo ser observado, na hipótese, o direito comum.119
Ação de indenização. Acidente aéreo. Vôo doméstico. Morte de passageiros. Danos pessoais. Recibo de quitação. Seguro obrigatório. Danos morais. Ação de indenização. Acidente aéreo. Vôo doméstico. Morte de passageiros. Danos pessoais. Recibo de quitação. Seguro obrigatório. Danos morais - O recibo de quitação de sinistro referente a seguro de risco aéreo de natureza obrigatória não exclui a pretensão de recebimento de indenização pelo direito comum. Precedente desta Corte. - A garantia de reparação do dano moral tem estatura constitucional. Assim a aplicação de indenização tarifada prevista no Código Brasileiro de Aeronáutica se refere a danos materiais não excluindo aquela relativa a danos morais. Ademais esta Corte também tem admitido a indenização por danos morais e afastado a limitação de tarifa prevista no Código Brasileiro do Ar tendo em vista o disposto no Código de Defesa do Consumidor.- A morte do pai dos autores em acidente aéreo quando contava apenas 37 anos de idade causou-lhes sofrimento intenso somando-se ainda à perda de amparo material e emocional faltando-lhes da parte do ente querido carinho e orientação sobretudo no caso dos autos. Indenização por danos morais corretamente concedido. IV - Recurso especial não conhecido. Vistos relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas acordam os Ministros da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça por unanimidade não conhecer do recurso especial. Os Srs. Ministros Nancy Andrighi e Castro Filho 120votaram com o Sr. Ministro Relator. Ausentes os Srs. Ministros Humberto Gomes de Barros e Carlos Alberto Menezes Direito.
De acordo com art. 944 do Código Civil, “mede-se a
indenização pela extensão do dano”.
118 BRASÍLIA. Superior Tribunal de Justiça. 3º T. – Resp.23.875 – Rel. Castro Filho – j.14.02.2006. 119 BRASÍLIA. Superior Tribunal de Justiça . Corte Especial- EDiv. No. REsp. 16.859- Rel. Francisco
Falcão – l. 19.04.2006.
120 RECURSO ESPECIAL 2000/0004184-0 Relator Ministro ANTÔNIO DE PÁDUA RIBEIRO - TERCEIRA TURMA 20.06.2005 p. 264REPDJ 05.09.2005 p. 396RNDJ vol. 69 p. 102RSTJ vol. 194p.
58
É possível mencionar o acidente aéreo envolvendo a empresa
Gol trouxe à pauta de discussões o pagamento de indenizações aos familiares das
vítimas. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) divulgou os precedentes do tribunal
sobre indenizações e responsabilidades por acidentes aéreos. Esse levantamento
mostra que, além da indenização material, o tribunal entende que a indenização por
dano moral também é possível. A demora para sair uma decisão judicial ainda é um
empecilho.
"Em São Paulo a demora é maior. Em outros estados esse tipo de julgamento leva cerca de cinco anos", diz o advogado Illan Goldberg, do Chalfin, Goldberg & Vainboim advogados. Um pouco mais rápido estão sendo as decisões judiciais sobre o acidente aéreo envolvendo a TAM, em 1996. Segundo a Associação Brasileira de Parentes de Vítimas de Acidentes Aéreos (Abrapavaa), parentes de algumas das 99 vítimas do acidente começaram a receber, no ano passado, indenizações que variaram entre US$ 500 mil e US$ 1,5 milhão. "A variação ocorre pelo fato de cada família ter uma história distinta", explica Goldberg. Indenizações Advogados explicam que o STJ tem se pronunciado contra o abuso no valor de indenizações. O processo contra a Vasp que teve início em 1965 seria uma dessas situações.
No Tribunal de Alçada Cível de São Paulo, a família da vítima
obteve decisão que determinou a penhora de 25% da receita diária da companhia
para o pagamento da dívida, que, em 1999, era de R$ 10,5 milhões. À época, o STJ
concedeu liminar à Vasp para suspender os efeitos da penhora. De acordo com a
advogada Jacira Teixeira Moura, do Noronha Advogados, supostos abusos no valor
das indenizações levam a prolongar a demanda no Judiciário. Ela explica que a lei
aeronáutica brasileira tem como base a da aviação internacional, que declara que a
família de vítimas de acidentes aéreos tem direito a uma indenização de até 100 mil
Special Drawing Rights (SDRs). Sendo que cada SDRs equivale hoje a ! 1.189.
O dano moral, de acordo com os precedentes do STJ, também
pode ser indenizado, mesmo que não seja comprovada a culpa do causador do
acidente. É o caso do acidente da Nordeste Linhas Aéreas Regionais. Os filhos de
uma das vítimas pediram indenização por dano moral, além da material paga pela
empresa. O STJ entendeu que a garantia de reparação do dano moral tem estatura
constitucional, sendo que a morte do pai no acidente teria causado aos filhos
59
sofrimento intenso, "somando-se ainda à perda de amparo material e emocional,
faltando-lhes, da parte do ente querido, carinho e orientação".121
Em relação ao seguro, o valor do seguro obrigatório que
indeniza as famílias de vítimas de acidentes aéreos subiu, após 13 anos sem
mudanças, de R$ 14.223 para R$ 40.950. A medida foi tomada pela Agência
Nacional de Aviação Civil (Anac) em agosto de 2008 e refere-se à indenização inicial
aos familiares de passageiros - ou aos próprios passageiros, em caso de haver
sobreviventes. Conforme estipula o Código Brasileiro de Aeronáutica (CBAer), isso é
apenas o ponto de partida para acordos entre famílias e companhias aéreas, mas
eventual entendimento extrajudicial não afeta o montante do contrato de
Responsabilidade do Explorador ou Transportador Aéreo (Reta). O seguro tem valor
fixado pelo CBAer em 3.500 Obrigações do Tesouro Nacional (OTNs), extintas com
a introdução do Plano Real. 122
De acordo com Gustavo Cunha Mello, professor da Escola
Nacional de Seguros e especialista no setor aeronáutico, no caso de vítimas fatais
de acidentes aéreos, a indenização geralmente é calculada com base na renda e na
expectativa de vida do passageiro. Portanto, quanto maior a renda em vida, maior
será o seguro a ser recebido pela família da vítima.123
Existe, entretanto, um valor-limite internacional, atualmente
pouco abaixo de US$ 400 mil por passageiro, definido pela Convenção de Varsóvia,
da qual o Brasil é signatário. Geralmente, segundo Mello, os acordos oferecidos
pelas companhias aéreas se baseiam nesse valor. Associações de vítimas de
acidentes aéreos do país dizem, porém, que é possível conseguir indenizações
superiores na Justiça. 124
121 http://www.anac.gov.br/imprensa/noticias/3110_noticia5.pdf. Acesso em 02/10/2010
122 http://gilbertomelo.com.br/jurisprudencias-e-noticias/32-correcao-monetaria-e-indexadores/2094-anac-aumenta-valor-de-seguro-para-acidentes-aereos. Acesso em 02/10/2010
123 http://pe360graus.globo.com/noticias/economia/financas-pessoais/2009/06/06/NWS,492042, 10, 193,NOTICIAS,766-ENTENDA-FUNCIONA-MERCADO-SEGUROS-CONTRA-ACIDENTES-AEREOS .aspx. Acesso em 02/10/2010
124 http://pe360graus.globo.com/noticias/economia/financas-pessoais/2009/06/06/NWS,492042,10 ,193 ,NOTI CIAS,766-ENTENDA-FUNCIONA-MERCADO-SEGUROS-CONTRA-ACIDENTES-AEREOS.aspx. Acesso em 02/10/2010
60
No caso do avião da Air France que caiu em alto mar, a
reportagem apurou que o valor da apólice da empresa envolve até US$ 750 milhões
para a indenização das vítimas e cerca de US$ 180 milhões pela perda da aeronave.
Considerando que houve 228 vítimas no acidente do voo AF 447, uma apólice de
US$ 750 milhões resultaria numa indenização de mais de US$ 3 milhões por
pessoa. Para Mello, professor da Escola Nacional de Seguros, o processo da Air
France envolverá dificuldades extras, como a emissão dos atestados de óbito, caso
os corpos não sejam encontrados. "O atestado é o primeiro passo no processo
judicial”, ressalta o especialista. 125
No Brasil, entretanto, um artigo do Código Brasileiro de
Aeronáutica (CBA) exige que as empresas que atuam no país, mesmo as
estrangeiras, paguem um seguro chamado Reta, que funciona nos mesmos moldes
do seguro obrigatório dos automóveis e garante uma indenização mínima às vítimas
de acidentes aéreos. A indenização prevista na legislação, segundo a Agência
Nacional de Aviação Civil (Anac), está pouco acima de US$ 40 mil por passageiro
atualmente.
Outra possibilidade de aumentar a indenização, no caso de
passageiros brasileiros, é a busca por um valor extra baseado no dano moral.
Segundo especialistas no mercado de aviação, o dano moral pode gerar uma
indenização de 500 salários mínimos (cerca de R$ 230 mil, considerado os valores
atuais).126
3.4 RESPONSABILIDADE CIVIL POR EXTRAVIO DE BAGAGEM
A palavra bagagem deriva do francês bagage, não se
confunde com carga, motivo porque é regulada em seção especial, constitui-se do
125 http://pe360graus.globo.com/noticias/economia/financas-pessoais/2009/06/06/NWS,492042,10,
193 ,NOTIC IAS,766-ENTENDA-FUNCIONA-MERCADO-SEGUROS-CONTRA-ACIDENTES-AEREOS.aspx. Acesso em 02/10/2010
126 http://pe360graus.globo.com/noticias/economia/financas-pessoais/2009/06/06/NWS,492042,10, 193,NOT IC IAS,766-ENTENDA-FUNCIONA-MERCADO-SEGUROS-CONTRA-ACIDENTES-AEREOS.aspx. Acesso em 02/10/2010
61
conjunto de objetos de uso pessoal dos passageiros acondicionados em amlas ou
valises de mão, tanto as despachadas no momento do embarque do passageiro
quanto as que vão em mãos do mesmo são consideradas bagagens acompanhadas,
porque vão junto com o viajante, na mesma aeronave.127
O contrato de transporte de bagagens é aquele, em virtude do
qual, uma das partes se obriga a transportar do ponto de partida ao de destino,
conjuntamente com o passageiro, seus pertences pessoais, adequados para sua
comodidade e uso, durante a viagem.
Luis Tapia Salinas define contrato de transporte de bagagens
como aquele mediante o qual uma empresa de transporte aéreo ou um simples transportador se obriga, em virtude de um contrato de transporte de passageiro, firmado anterior ou simultaneamente com aquele, a trasladar de um lugar ao outro e por via aérea, a bagagem do passageiro referido, abarcando aquela despachada, bagagem de mão, bem como eventual excesso de peso, superador de franquia, nas condições pactuadas pelas partes.128
Desse modo, a existência do contrato de transporte de
bagagem se encontra atrelada ao contrato de transporte de passageiros, o qual,
aliás, uma vez extinto, produzirá os mesmos efeitos em relação à obrigação de
transporte de bagagem, ainda que esta tenha sido objeto de prévia entrega ao
transportador.129
Atualmente, cotejando a vigência do Sistema de Varsóvia e
Condições Gerais IATA (art. I) depreende-se que a bagagem despachada (checked)
é aquela sobre a qual o transportador assume a custódia exclusiva, entregando, em
contrapartida, uma baggage check (nota de bagagem), de forma isolada. Ou, como
ocorre frequentemente, com base em iniciativa da IATA, por meio de inserção
conjunta com o bilhete aéreo, que dispõe de espaço para tal desiderato,
viabilizando, portanto, a representação do ato num documento único, o que justifica,
aliás, a denominação Passenger Ticket and baggage Check. A partir disto, na
127 PACHECO, José da Silva. Código Brasileiro de Aeronáutica Comentado. p. 20 128 MORSELLO, Marco Fábio. Responsabilidade Civil no Transporte Aéreo. p. 210. 129 MORSELLO, Marco Fábio. Responsabilidade Civil no Transporte Aéreo. p. 211.
62
vigência do referido sistema, afigura-se insuficiente a oposição do baggage
identification tag, como requisito válido, à luz da Convenção de Montreal.130
Quanto a responsabilidade de indenizar por dano à
bagagem, o Código Brasileiro de Aeronáutica preceitua em seu art. 260:
A responsabilidade do transportador por dano, conseqüente da destruição, perda ou avaria da bagagem despachada ou conservada em mãos do passageiro, ocorrida durante a execução do contrato de transporte aéreo, limita-se ao valor correspondente a 150 (cento e cinqüenta) Obrigações do Tesouro Nacional - OTN, por ocasião do pagamento, em relação a cada passageiro.
Outra novidade no texto em tramitação na Câmara é a
obrigação do pagamento de uma indenização antecipada ao passageiro que tiver as
bagagens extraviadas, perdidas ou danificadas. O valor deverá ser correspondente a
20% da indenização máxima, ou seja, R$ 5.400,00. A companhia aérea terá de
providenciar a entrega do dinheiro em até 12 horas e o pagamento tem de ser feito
na moeda do país em que o passageiro se encontrar.
A Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) também pretende
reformular a regulamentação que define as regras para o transporte de bagagens. O
aspecto mais falho da legislação atual, como reconhecem autoridades do setor
aéreo, é o que dá prazo de 30 dias para que a bagagem permaneça na condição de
extraviada, quando só então a empresa deve oferecer uma indenização ao
passageiro. De acordo com a Convenção de Montreal, uma bagagem deve ser
considerada perdida após 21 dias. Embora o Brasil seja um dos signatários do
acordo assinado na ocasião, a maior parte das normas que regem o contrato de
prestação de serviço entre companhias e passageiros, incluindo as relativas às
bagagens, ainda tem base na Convenção de Varsóvia, de 1929.131
O texto do Código Brasileiro de Aeronáutica (CBA) prevê
ressarcimento de até R$ 27 mil para cada passageiro em caso de extravio, perda ou
dano da bagagem. O valor é bem superior ao estipulado hoje – 150 Obrigações do
130 MORSELLO, Marco Fábio. Responsabilidade Civil no Transporte Aéreo. p. 211 131 http://aegoes.com.br/blog/index.php/aviacao/indenizao-por-extravio-de-bagagem-vai-chegar-a-at-r-
27-mil/ Acesso dia 10/10/2010
63
Tesouro Nacional (OTNs), índice extinto em 1989, mas que, atualizado pela inflação,
não chega a R$ 2 mil. Além de não cobrir os prejuízos causados, a atual redação do
CBA, de 1986, dá margem a dupla interpretação. O artigo seguinte ao que
estabelece o valor do ressarcimento abre a possibilidade de outro enquadramento,
que limita a reparação a 3 OTNs (R$ 39) por quilo de bagagem extraviada, perdida
ou furtada. “No item bagagem, a mudança do código foi nos marcos legais
europeus. É pesado para a companhia aérea e benéfico para o passageiro”,
assinala o depurado Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR), relator do projeto de lei que
atualiza o CBA. [...] o projeto deve ser levado para votação em plenário, se
aprovado, terá ainda de passar pelo Senado.132
A respeito do tema, vale notar o entendimento manifestado
pelo Egrégio Superior Tribunal de Justiça:
CIVIL. TRANSPORTE AÉREO. CARGA. MERCADORIA. EXTRAVIO. TRANSPORTADOR. INDENIZAÇÃO INTEGRAL. CDC. APLICAÇÃO. CONVENÇÃO DE VARSÓVIA. AFASTAMENTO. 1 – A jurisprudência pacífica da Segunda Seção é no sentido de que o transportador aéreo, seja em viagem nacional ou internacional, responde (indenização integral) pelo extravio de bagagens e cargas, ainda que ausente acidente aéreo, mediante aplicação do Código de Defesa do Consumidor, desde que o evento tenha ocorrido na sua vigência, conforme sucede na espécie. Fica, portanto, afastada a incidência da Convenção de Varsóvia e, por via de conseqüência, a indenização tarifada. 2 – Recurso especial conhecido e provido para restabelecer a sentença." (REsp 552553/RJ – relator Ministro Fernando Gonçalves – J. 01.02.2006)133
A jurisprudência também consolidou o entendimento de que
não se pode cogitar da indenização tarifada nas hipóteses de extravio ou destruição
de bagagens, com amparo na legislação internacional que regula a matéria,
conforme julgado do E. STJ acima transcrito. No mesmo sentido, cumpre transcrever
outro precedente daquela Colenda Corte de Justiça:
Processo civil. Agravo no agravo de instrumento. Reconsideração. Transporte aéreo. Extravio de bagagens. Danos morais. Convenção
132 http://aegoes.com.br/blog/index.php/aviacao/indenizao-por-extravio-de-bagagem-vai-chegar-a-at-r-
27-mil/ Acesso dia 10/10/2010 133SANCHES, José Alexandre Ferreira. A responsabilidade civil no transporte aéreo de bagagens .
Jus Navigandi, Teresina, a. 12, n. 1883, 27 ago. 2008. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=11648>. Acesso em: 10/10/2010
64
de Varsóvia. Limites indenizatórios. Inaplicabilidade. Alteração do valor da indenização em sede de recurso especial.
A Segunda Seção do STJ fixou o entendimento de que a prestação defeituosa do serviço de transporte aéreo, ocorrida após a vigência do CDC, não se subordina aos limites indenizatórios instituídos pela Convenção de Varsóvia. Agravo de instrumento não provido." (AgRg no Ag 574867/DF – relatora Ministra Nancy Andrighi – D.J. 28.06.2004)134
As companhias aéreas – tanto nos vôos dentro do território
nacional como nos vôos internacionais – emitem bilhetes de passagem contendo
avisos, esclarecimentos e condições mais ou menos padronizadas, tanto na língua
nacional como no idioma de destino. Nos vôos com escala nos Estados Unidos, por
força do acordo de Montreal, firmado por esse país com algumas companhias
aéreas filiadas à CAB – Civil Aeronautics Bordeau e à IATA – International Air
Transport Association, os bilhetes de passagem esclarecem os limites de
indenização diferenciados para essa hipótese, ou seja, 75.000 dólares americanos
por passageiro, incluindo despesas, ou 58.000 dólares americanos, com despesas
processuais e honorários incluídos.135
Pode-se concluir que a reparação integral envolve tanto os
danos materiais sofridos pelos passageiros com o extravio ou destruição de suas
bagagens, quanto os evidentes danos morais que essas situações representam.
3.5 RESPONSABILIDADE CIVIL POR CANCELAMENTO, ATRASO E
ANTECIPAÇÃO DE VÔO, OVERBOOKING E NO-SHOW.
3.5.1 Cancelamento e atraso de vôo
A evolução incontroversa do ramo aeronáutico sempre trouxe
em seu bojo a preocupação com a segurança e a celeridade do transporte,
134 SANCHES, José Alexandre Ferreira. A responsabilidade civil no transporte aéreo de bagagens .
Jus Navigandi, 135 STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil: doutrina e jurisprudência. p.355
65
destacando-se a última como elemento essencial, quando cotejada com os demais
meios de transporte existentes.136
Por tais razões, reputamos que a rapidez enseja pólo atrativo
fundamental junto aos usuários em potencial do mencionado transporte, não só para
fins empresariais, como também de lazer, educacionais e, até mesmo, emergenciais.
A partir disso, na definição do referido contrato, além do dever de proteção já
descrito, se afigurou fundamental a inserção do transporte nas condições de horário
efetivamente informadas, salvo eximentes ínsitas à responsabilidade objetiva, ou
seja, força maior extrínseca, culpa da vítima ou fato de terceiro.137
O Código Brasileiro de Aeronáutica em seu art 256, inciso II,
determina que o transportador responde pelo dano decorrente de atraso do
transporte aéreo contratado. Os arts. 230 e 231 da lei aeronáutica disciplinam a
questão das obrigações do transportador. As alternativas são limitadas e claras:
ultrapassado o lapso temporal de 4 horas do momento em que o passageiro deveria
ser embarcado, ou a companhia aérea o embarca em outra aeronave, da mesma
empresa ou de outra, realizando o transporte sucessivo previsto no art. 259 do
Código Brasileiro de Aeronáutica, ou devolve o valor do bilhete de passagem, caso o
passageiro não queira viajar em outro vôo que decolar além das 4 horas.138
Exime-se o transportador da responsabilidade se ocorrer
motivo de força maior ou comprovada determinação da autoridade aeronáutica, que
será responsabilizada (art. 256, §1º, b, do CBA).139
A respeito do tema Yussef Cahali observa que, embora a
questão pertinente aos danos resultantes de atraso na partida ou na chegada dos
vôos deva ser resolvida mediante juízo valorativo das circunstâncias do fato, a
questão comporta composição dos entendimentos desarmônicos, propondo os
seguintes enunciados:
136 MORSELLO, Marco Fábio. Responsabilidade Civil no Transporte Aéreo. p. 171 137 MORSELLO, Marco Fábio. Responsabilidade Civil no Transporte Aéreo. p. 172 138 http://www.sbda.org.br/revista/Anterior/1667.htm. Acesso em 10/10/2010 139 STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil: doutrina e jurisprudência. p. 351.
66
a- no pressuposto de que as companhias aéreas são obrigadas a operar com o risco zero, qualquer atraso da aeronave determinado em respeito às normas de segurança, inclusive com obrigatoriedade de mudança do aeroporto de pouso, exclui a empresa de responsabilidade civil do direito comum;
b- ainda que se aceite que a responsabilidade do transportador aéreo, por atraso de vôo, seja de cunho legal, independentemente de culpa ou dolo da empresa, a pretendida presunção de culpa da empresa não tem caráter absoluto (júris et de jure), podendo assim ser elidida sempre que o atraso não tenha como causa um fato imputável à transportadora identificado como “falha do serviço”;
c- o atraso do vôo pode, em tese, provocar danos patrimoniais, e excepcionalmente danos de natureza moral; o bom senso, porém recomenda para tanto que o atraso seja dilargado e anormal, com omissão da empresa em evitar-lhes as conseqüências; ainda que o dano moral se projete, no direito vigente, com maior extensão, os transtornos, aborrecimentos ou contratempos que afligem o passageiro podem eventualmente induzir a existência de um dano moral reparável, desde que verificados em circunstâncias absolutamente anormais.140
O contrato de transporte aéreo deve conter cláusulas
obrigatórias que impõem obediência às partes contratantes em razão de sua
bilateralidade. Constituem condições obrigatórias, entre outras, o estabelecimento
do dia, hora e local de partida e de chegada.141
Nesse sentido, o Tribunal de Justiça preconiza:
AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. TRANSPORTE AÉREO. ATRASO DE VÔO. INOBSERVÂNCIA DO DEVER DE PRESTAR ASSISTÊNCIA. DANO MORAL CONFIGURADO. MONTANTE INDENIZATÓRIO MANTIDO. INCIDÊNCIA DE JUROS MORATÓRIOS A CONTAR DA CITAÇÃO. (Recurso Cível Nº 71001800713, Terceira Turma Recursal Cível, Turmas Recursais, Relator: Ricardo Torres Hermann, Julgado em 29/01/2009)
Diante de vários incidentes e descumprimentos de legislações
no setor aéreo, a ANAC (Agência Nacional de Aviação Civil) criou em 09.03.2010 a
Resolução 141, que entrou em vigor no mês de junho de 2010 e trouxe obrigações
que são impostas às companhias aéreas para o melhor atendimento aos
passageiros.
140 STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil: doutrina e jurisprudência. p. 351. 141 STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil: doutrina e jurisprudência. p. 351.
67
De acordo com o presidente da Andep (Associação Nacional
em Defesa dos Direitos dos Passageiros do Transporte Aéreo), Cláudio Candiota
Filho, a Resolução retira direitos já assegurados por decisões judiciais
de vários tribunais do país.
A maioria dessas obrigações já existia antes da Resolução 141, mas não era cumprida pelas transportadoras aéreas; e muito menos tinham seu cumprimento exigido pela Anac, ou seja, fora a propaganda, trata-se de uma - espécie de faz-de-conta que a Anac está trabalhando em favor do consumidor-; nada vai mudar. O consumidor continua vulnerável.142
Já no que se refere ao cancelamento de vôo, é evidente que
poderá ensejar atraso em detrimento do usuário para chegada no local de destino,
de modo que, inexistindo prova de qualquer eximente ínsita à responsabilidade
objetiva, viabilizará, na hipótese, de compromissos profissionais, efetivo acolhimento
de pretensões ressarcitórias.143
A antecipação de vôo, sem o implemento do dever anexo da
ampla informação, caracteriza infração aos ditames da boa-fé objetiva, podendo dar
gênese, outrossim, a atraso na chegada ao local de destino, uma vez que o usuário
deverá utilizar vôo sucessivo da mesma companhia ou de congênere, caso inexista
disponibilidade de vôo na mesma companhia no horário posterior pretendido.144
Discorre o respeitado Tribunal sobre algumas decisões:
APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO DE INDENIZAÇÃO - CONTRATO DE TRANSPORTE AÉREO - RELAÇÃO DE CONSUMO - RESPONSABILIDADE OBJETIVA - CANCELAMENTO DE VOO - AUSÊNCIA DE ASSISTÊNCIA AOS PASSAGEIROS - DANOS MORAIS E MATERIAIS CONFIGURADOS - QUANTUM INDENIZATÓRIO - MAJORAÇÃO INDEVIDA. (APELAÇÃO CÍVEL N° 1.0024.08.069982-0/001 - COMARCA DE BELO HORIZONTE - APELANTE(S): S/A VIAÇÃO AEREA RIO GRANDENSE - APTE(S) ADESIV: KAMALLA INEZ FERREIRA PACHECO BORBA DE MOURA - APELADO(A)(S): S/A VIAÇÃO AEREA RIO GRANDENSE, KAMALLA INEZ FERREIRA PACHECO BORBA DE MOURA - RELATOR: EXMO. SR. DES. EDUARDO MARINÉ DA CUNHA )
142 http://www.sortimentos.net/?p=30160. Acesso em 15.10.2010 143 MORSELLO, Marco Fábio. Responsabilidade Civil no Transporte Aéreo. p. 176 144 MORSELLO, Marco Fábio. Responsabilidade Civil no Transporte Aéreo. p. 172.
68
APELAÇÕES CÍVEIS - RESPONSABILIDADE CIVIL - TRANSPORTE AÉREO - ATRASO DE VÔO - DANO MORAL - APLICAÇAO DO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR -ALEGAÇAO DE FORÇA MAIOR - NAO COMPROVAÇAO - MANUTENÇAO DO VALOR DA INDENIZAÇAO - JUROS MORATÓRIOS - CITAÇAO VÁLIDA - APELOS CONHECIDOS E IMPROVIDOS - DECIME. (TJSE - APELAÇAO CÍVEL: AC 2009201346 SE Parte: Apelante: PEDRO DIAS DE ARAÚJO JÚNIOR Parte: Apelado: VRG LINHAS AEREAS S A, Relator(a): DES. OSÓRIO DE ARAUJO RAMOS FILHO)
O que é possível perceber é a falta de assistência aos
passageiros quando se trata de situações atípicas ao transporte aéreo.
Com a Resolução da ANAC, as companhias aéreas têm que
se adequar e prestar auxílio imediato em casos de contratempos. Atraso superior a 4
(quatro) horas está ultrapassado, pois atrasos de 2 (duas) horas já podem causar
danos e indenizações a passageiros, de acordo com a ANAC, além de garantir
alimentação, acesso a internet, transporte e hospedagem, se for preciso.
3.5.2 Responsabilidade Civil por overbooking e no show.
O overbooking caracteriza-se, portanto, pela aceitação pelo
transportador de reservas para determinado vôo em quantidade superior à
capacidade da aeronave destinada para tanto.145
O jurista Antônio Herman de Vasconcellos e Benjamim definiu
overbooking como “sobrecontratação ou excesso de reserva”146
A ocorrência de overbooking tem gênese na análise de
inúmeras variáveis com especial destaque à rota fixada, à época do vôo, com as
correlatas repercussões vinculadas a alta e baixa estação, que propiciam exame de
probabilidade quanto à falta de apresentação no balcão da companhia para fins de
embarque no dia e hora determinados, fenômeno denominado no jargão técnico da
145 MORSELLO, Marco Fábio. Responsabilidade Civil no Transporte Aéreo. p. 180. 146 MORSELLO, Marco Fábio. Responsabilidade Civil no Transporte Aéreo. p. 180.
69
aviação de no-show, considerado pelas transportadoras a causa eficiente da referida
problemática.147
O chamado no show caracteriza-se como a reserva não
concretizada, ou seja, o interessado faz a reserva de passagem para dia e vôo
determinados, mas não comparece para embarque. O overbooking e o no-show
estão intimamente ligados, talvez um não existisse sem o outro.148
Antônio Henrique Browne Rêgo que,
as empresas aéreas sobrevendem seus vôos para reagir contra o fato de que alguns passageiros fazem reservas nos vôos e então modificam seus planos no último instante, ou simplesmente não aparecem para o embarque. Essa prática pode resultar numa situação em que um usuário, que tenha reserva confirmada, tenha o embarque negado porque não existe assento disponível no avião”. Esclarece, ainda, que “nem sempre o embarque é negado em razão da venda de número maior de passagens do que os assentos disponíveis, mas motivado, às vezes, pela troca de uma aeronave maior (com mais assentos) por outra menor, por razões econômicas ou meteorológicas. Conclui em sua exposição que essa prática do overbooking trabalha em benefício de ambos: empresa aérea e passageiro, porque as empresas aéreas estarão em condições de realizar o vôo com o máximo de taxa de ocupação, resultando em preços os mais baixos possíveis.149
Em termos puramente jurídicos, o overbooking mostra-se
também como ilícito contratual, dando cancha à reparação por dano material e
moral, caso fique comprovado que o adquirente de passagem suportou prejuízo pelo
fato de não ter embarcado no vôo programado e foi submetido a dissabores graves
de natureza psicológica. Isto pela razão simples de que o no show não se converte
em causa de excludente da responsabilidade do transportador [...] para minimizar
prejuízos.150
Francisco dos Santos Amaral Neto enfatiza que, como a
legislação de regência (Código Civil, Código Brasileiro de Aeronáutica e Convenção
147 MORSELLO, Marco Fábio. Responsabilidade Civil no Transporte Aéreo. p. 182. 148 STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil: doutrina e jurisprudência. p.356 149 STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil: doutrina e jurisprudência. 150 STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil: doutrina e jurisprudência. p.357
70
de Montreal) não está aparelhada com dispositivos sobre a matéria, aplica-se a
legislação subsidiária, por força dos princípios e regras de superdireito, como a
analogia, a equidade e os princípios gerais do Direito, fazendo-se a integração
analógica em preceitos que permitam a quantificação do valor da indenização em
casos tais. Isto porque a equidade também pode assumir função supletiva, dentre
outras.151
De acordo com o Código de Defesa do Consumidor, arts 20,
51, IV e XIII, o overbooking é ilegal, pois se configura como descumprimento da
oferta e do próprio contrato. Além das regras previstas na Resolução 141 da ANAC
de 09.03.2010, o passageiro tem o direito de endosso imediato de passagem,
sempre que indicar a necessidade de urgência na realização da viagem, conforme
garante decisão judicial em vigor.152
Discorre o Tribunal:
APELAÇÃO CÍVEL. TRANSPORTE AÉREO. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO. OVERBOOKING. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO TRANSPORTADOR. DANO MATERIAL E MORAL CONFIGURADOS. APLICAÇÃO DO CDC. (Negado provimento ao apelo. (Apelação Cível Nº 70019730936, Décima Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Jorge Luiz Lopes do Canto, Julgado em 27/03/2008).
Apesar do overbooking ser ilegal e gerar dano ao consumidor,
muitas empresas aéreas continuam praticando este ato, pois para elas parece mais
conveniente adotar essa prática e arcar com os danos ao invés de abolir e evitar
prejuízo.
151 STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil: doutrina e jurisprudência. 152 http://www.idec.org.br/emacao.asp?id=2355. Acesso em 15.10.2010
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A presente monografia teve como objeto o estudo da
Responsabilidade Civil no Transporte Aéreo Brasileiro.
O transporte aéreo tem sua legislação no Código Brasileiro de
Aeronáutica (CBA), Lei 7565/86, Convenção Internacional de Varsóvia e pelo Código
de Defesa do Consumidor (CDC), Lei 8.078/90, dessa forma, verifica a antinomia
entre essas normas no que diz respeito à responsabilidade do transportador.
A monografia foi dividida em três capítulos. Destaca-se quanto
ao primeiro capítulo:
Direito Aeronáutico engloba as relações jurídicas vinculadas
com a navegação aérea, tanto no campo internacional como no doméstico, e a
aviação civil de um modo geral.
Em 1919, com o objetivo de regular os espaços aéreos dos
países que desenvolviam atividade aérea, ocorreu a primeira Convenção
Internacional de Navegação Aérea e após esta Convenção foi permitido o tráfego
em espaços aéreos dos países signatários.
É incontestável a evolução no transporte aéreo no contexto da
globalização, pois o transporte aéreo possibilita maior integração entre países e
continentes de uma maneira cada vez mais rápida. Indubitável é a composição do
transporte aéreo no conceito de globalização.
O Código Brasileiro de Aeronáutica é um instrumento instituído
através da Lei n. 7565, de 19/12/1986, substituindo o Código Brasileiro do Ar.
O transporte doméstico de passageiros, bagagens e cargas, o
Código Brasileiro de Aeronáutica dispõe em seu art. 215, que: “ Considera-se
72
doméstico e é regido por este código todo transporte em que os pontos de partida,
intermediários e destino estejam situados em território nacional.”
O transporte de passageiros, bagagens e mercadorias tem
fulcro no art. 222 do Código Brasileiro de Aeronáutica, pois este obriga o
transportador transportar passageiros, bagagens e carga, encomenda ou mala
postal, dentro do território nacional, por meio de aeronave, mediante pagamento.
O transporte aéreo internacional tem fulcro no art. 1° da
Convenção de Varsóvia, é todo transporte em que haja ou não interrupção de
transporte, estejam situados entre dois pontos do Território de outro Estado.
Há de ressalvar que não basta o sobrevôo da aeronave pelo
território estrangeiro, é necessário que ocorra contato terrestre, mas a Convenção
não determina como deve ser o contato (escala), assim não há uma duração mínima
determinada e muito menos a exigência de desembarque dos passageiros.
Quanto ao segundo capítulo, destaca-se:
O Princípio da autonomia de vontade exige que haja a
liberdade de contratar ou não, de escolher o parceiro contratual, o conteúdo e a
forma do contrato.
Não é possível falar em contrato sem a manifestação de
vontade das partes, pois não há negócio jurídico e não havendo este não há
contrato.
O contrato de transporte surgiu da necessidade de intercâmbio
entre os povos, para fins comerciais ou políticos, tornando-se necessário o translado
de pessoas ou objetos. O surgimento de melhores meios de comunicação exigiu o
estabelecimento de regras para diferenciar o transporte de coisas e de pessoas em
suas várias modalidades.
73
O transporte aéreo nacional é regulado pelo Código Brasileiro
de Aeronáutica e o transporte aéreo internacional pela Convenção de Varsóvia
(dentro outras legislações).
O transportador determina qual trajeto será percorrido, o
tempo médio de seu percurso, os pontos de parada, horários de decolagem e pouso,
peso da bagagem entre outros. O passageiro apenas adere no momento da
aquisição e a partir daí está celebrado o contrato.
O Transporte Aéreo Internacional ou Nacional é disciplinado
por várias convenções, mas a Convenção de Varsóvia e uma das mais importantes.
Há alguns conflitos na legislação interna de um país, no Brasil há duas correntes
com entendimentos opostos: a primeira e defensora do Código Brasileiro de
Aeronáutica para dirimir conflitos oriundos de contratos de transporte aéreo o outro é
a proteção do Código de Defesa do Consumidor, onde se trata de lei específica e
posterior ao Código Brasileiro de Aeronáutica, o que redundaria em verdadeira
derrogação a este.
O Código Brasileiro de Aeronáutica deve ser interpretado em
conjunto com o Código de Defesa do Consumidor, apesar do Código Brasileiro de
Aeronáutica excluir a responsabilidade civil do transportador nos casos de força
maior ou de comprovada determinação da autoridade aeronáutica, o Código de
Defesa do Consumidor afirma que não existem excludentes de responsabilidade
para os casos de vícios e que a responsabilidade do transportador é objetiva,
independe de culpa.
Quanto ao terceiro capítulo, destaca-se:
O contrato de transporte está disciplinado nos artigos 730 a
756 do Código Civil, que estabelecem a responsabilidade civil objetiva na reparação
de danos. O Código Brasileiro de Aeronáutica regula o transporte aéreo nacional, e
a Convenção de Varsóvia, ratificada pelo Protocolo de Montreal, disciplina o
transporte aéreo internacional de pessoas, bagagens e mercadorias.
74
É o Código de Defesa do Consumidor lei especial, no sentido
de atingir toda e qualquer relação de consumo; sempre que houver tais relações, aí
incidirá o Código. Assim, tratando-se de relações de consumo, o Código de Defesa
do Consumidor é lei própria, específica e exclusiva. O CDC é lei específica e própria
no que se refere à responsabilidade civil nos contratos de transporte aéreo que
envolvam relação de consumo, mesmo que, por acaso, sobrevenham a nova
Convenção de Montreal ou um novo Código Brasileiro de Aeronáutica.
A empresa aérea é responsável pelos danos causados aos
seus passageiros, sendo objetiva a responsabilidade do explorador da atividade.
Destaca-se duas legislações para a responsabilidade civil por acidentes aéreo: o
Código Brasileiro de Aeronáutica (Lei 7565 de 19.12.1986), aplicável às viagens
domésticas ou nacionais, que consagrou a teoria da responsabilidade objetiva; e a
Convenção Internacional de Varsóvia, de 1932, aplicável às viagens internacionais.
O contrato de transporte aéreo deve conter cláusulas
obrigatórias que impõem obediência às partes contratantes em razão de sua
bilateralidade. Constituem condições obrigatórias, entre outras, o estabelecimento
do dia, hora e local de partida e de chegada.
Assim, quanto as hipótese levantadas observa-se que:
A primeira hipótese foi confirmada, ou seja: Na relação entre a
empresa aérea (fornecedor) e o passageiro (consumidor), o dispositivo legal
aplicável a essa relação de consumo é o código de defesa do consumidor.
Quanto a segunda hipótese: Uma vez que existem normas
conflitantes entre Constituição Federal, Código de Defesa do Consumidor, Código
Civil, Código Brasileiro de Aeronáutica e Convenções, deve-se utilizar como
parâmetro o Código de defesa do Consumidor também foi confirmada.
Em relação a terceira hipótese: A responsabilidade do
transportador aéreo é subjetiva, ou seja, há a necessidade de se demonstrar a culpa
75
do agente. A mesma não foi confirmada, visto que pela especialidade da atividade, o
transportador é responsável objetivamente.
Destaca-se que não houve, por parte da autora a intenção de
esgotar o assunto, mas apresentar novas discussões sobre o tema.
REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS
ALVIM, Arruda, ALVIM, Thereza, ALVIM, Eduardo Arruda, MARINS, James. Código do Consumidor Comentado. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1995.
ARAUJO, Luis Ivani de Amorim. Curso de Direito Aeronáutico. Rio de Janeiro: Forense, 1998.
BENJAMIN, Antonio Herman Vasconcelos. O Transporte Aéreo e o CDC. Revista Direito do Consumidor. São Paulo, n. 26, p. 33-44, abr./jun. 1998.
BRASIL, Lei 10.406 de 10 de janeiro de 2002. Diário Oficial da União: Brasília, 2002
BRASÍLIA. Resp 120.647-SP, 3º t., rel. Min. Eduardo Ribeiro, DJU, 15-5-2000, p.156
BRASÍLIA. Superior Tribunal de Justiça . Corte Especial- EDiv. No. REsp. 16.859- Rel. Francisco. Acesso em 02/10/2010
BRASÍLIA. Superior Tribunal de Justiça. 3º T. – Resp.23.875 – Rel. Castro Filho – j.14.02.2006.
CAVALCANTI, André Uchôa. Responsabilidade civil do Transportador Aéreo. Riode Janeiro: Renovar, 2002.
CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de responsabilidade civil. 7 ed. São Paulo, Malheiros, 2007.
COSSICH, Antonio Marcio Figueira. A Responsabilidade Civil do Transportador. JusNavigandi. Teresina. a. 11, n. 1224, Nov. 2006. Disponível em http://www1.jus.com.br/ doutrina/texto .asp?id, acesso em 23.05.2010.
CRETELLA JUNIOR, Jose. O Estado e a obrigação de indenizar. 2 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2002.
DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro. São Paulo: Saraiva, 2007.
DIREITO, Carlos Alberto Menezes; CAVALIERI FILHO, Sérgio. Comentários ao novo código civil: da responsabilidade civil: das preferências e privilégios creditórios. 2. ed... Rio de Janeiro: Forense, 2007. v.13.
GAGLIANO, Pablo Stolze e FILHO, Rodolfon Pamplona. Novo Curso de Direito Civil. 5 ed. São Paulo: Saraiva, 2009. v.4.
GAGLIANO, Pablo Stolze; PAMPLONA FILHO, Rodolfo. Novo curso de direito civil. Obrigações. 11 ed. São Paulo: Saraiva, 2009.
GOMES, Marcelo Kokke. Responsabilidade civil: dano e defesa do consumidor. Belo Horizonte: Del Rey, 2001.
77
GOMES, Orlando. Contratos. 26 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2007.
GOMES, Orlando. Introdução do Direito Civil. 19 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2007.
GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: responsabilidade civil. São Paulo: Saraiva, 2007. v. IV.
GONÇALVES, Carlos Roberto. Responsabilidade civil. 11 ed. São Paulo: Saraiva, 2008.
GREGORI, Maria Stella.A responsabilidade civil do transporte aéreo nas relações de Consumo. Disponível em http://erikataucci.blogspot.com/2010/05/transporte-aereo-do-direito.html . Acesso em 20/07/2010.
LACERDA, J.C. Sampaio. Curso de direito privado da navegação: direito aeronáutico. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1970. v.2.
LEITE, Eduardo de oliveira. A monografia jurídica. 5 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001.
LISBOA, Roberto Senise. Manual de direito civil: obrigações e responsabilidade civil. v.2. 2004.
LÔBO, Paulo Luiz Netto. A informação como direito fundamental do consumidor. JusNavigandi, Teresina, a. 5, n. 51, out. 2001. Disponível em: <http://www1.jus.com.br/doutrina/texto.asp>. Acesso 04 ago 2010.
MARQUES, Claudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor: o novo regime das relações contratuais. 5.ed. São Paulo: RT, 2006.
MILHOMENS, Jonatas. Direito Aeronáutico. Rio de Janeiro: Nacional de Direito, 1956.
MIRANDA, Pontes de. Tratado de Direito Privado. Rio de Janeiro: Borsoi, 1972.
MORSELLO, Marco Fábio. Responsabilidade Civil no Transporte Aéreo. São Paulo: Atlas, 2007.
NORONHA, Fernando. A responsabilidade civil do transportador aéreo por danos a pessoa, cargas e bagagem. Revista Sequência. Florianópolis. UFSC. n. 45, 2002.
PACHECO, José da Silva. Código Brasileiro de Aeronáutica Comentado. 2.ed. Rio de Janeiro: Forense, 1998.
PARAIBA. Tribunal de Justiça do Estado da Paraíba. Processo nº 2002006061715-6, 4º Juizado Especial Cível da Capital, Juíza Daniella Cristhine Ramalho Costa, pub. DOE 09/03/2007.
PASOLD, Cesar Luiz. Metodologia da pesquisa jurídica: teoria e prática. 11 ed. Florianópolis: Conceito Editorial; Millennium Editora, 2008.
78
PEREIRA, Caio Mário da Silva. Instituições de direito civil: Contratos. 12 ed. São Paulo: Saraiva, 2006 v.3.
RODRIGUES, Silvio. Direito Civil. 27.ed. São Paulo: Saraiva: 2002. v.III.
RODRIGUES, Silvio. Direito Civil: responsabilidade civil. 20 ed. São Paulo: Saraiva, 2007. v. IV.
SAMPAIO, Rogério Marrone de Castro. Direito Civil: Contratos. 4. ed. Sâo Paulo: Atlas, 2002.
SANCHES, José Alexandre Ferreira. A responsabilidade civil no transporte aéreo de bagagens . Jus Navigandi, Teresina, a. 12, n. 1883, 27 ago. 2008. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=11648>. Acesso em: 10/10/2010
SCHWARZ, Carlota Monte Alegre. A responsabilidade civil do transporte aéreo e o Código de Defesa do Consumidor. Jus Navigandi, Teresina, a. 14 n. 2349, 6 dez. 2009. Disponível em: <HTTP://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=13968> . Acesso em: 20 set. 2010
SILVA, Marcus Vinicius Fernandes Andrade. O contrato de transporte aéreo, a responsabilidade civil do transportador e a possível antinomia entre o Código de Proteção de Defesa do Consumidor, o Código Brasileiro Aeronáutico e a Convenção de Varsóvia. In. Revista jusvigilantibus. Disponível em http://jusvi.com/artigos/769. Acesso em 15 mar. 2010.
STOCO, Rui. Tratado de responsabilidade civil: doutrina e jurisprudência. 7 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007.
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil. 6.ed. São Paulo: Atlas, 2006. v.4.
VENOSA, Silvio de Salvo. Direito Civil: contratos em espécie. 4.ed. São Paulo: Atlas, 2004. V.III.
VIEIRA, Karina. Hipóteses de Responsabilidade Civil no Transporte Aéreo. 2005. O Direito. Disponível em: www.odireito.com/acesso em 04 de junho de 2010.