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CONSELHOS GESTORES DE POLÍTICAS PÚBLICAS E A INTERVENÇÃO PROFISSIONAL DO SERVIÇO SOCIAL Suzana Pinho Lima 1 Kedna Kelly de Sousa Gomes 2 Resumo Os conselhos gestores e de defesa de direitos foram alguns dos espaços de participação e controle social com força legal para atuar nas políticas públicas. Neste artigo se propõe compreender a relação existe entre o processo de participação nos conselhos gestores de políticas públicas, em interface com a intervenção do profissional de Serviço Social. Parte-se do pressuposto que tais instâncias de controle social colocam-se atualmente como campo de atuação dessa profissão, a qual pode contribuir para a socialização de informações que subsidiem a formulação e gestão de políticas, bem como o acesso a direitos sociais. Palavras-chave: conselhos gestores, Serviço Social, controle social. Abstract Management councils and advocacy were some of the areas of participation and social control with the force of law to act in public policy. This paper proposes to understand the relations hip between the process of participation in public policy management councils in the interface with the professional intervention of Social Services. It starts from the assumption that such instances of social control is currently placed as a field of expertise of that profession, which may contribute to the socialization of information that supports the development and management policies, as well asaccess to social rights. Keywords: social work, social control, concils. 1 Bacharel. Universidade Federal do Ceará – UFCE. [email protected] 2 Estudante. Universidade Federal do Ceará – UFCE [email protected]

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CONSELHOS GESTORES DE POLÍTICAS PÚBLICAS E A INTERVENÇÃO

PROFISSIONAL DO SERVIÇO SOCIAL

Suzana Pinho Lima1

Kedna Kelly de Sousa Gomes2

Resumo

Os conselhos gestores e de defesa de direitos foram alguns dos espaços de participação e controle social com força legal para atuar nas políticas públicas. Neste artigo se propõe compreender a relação existe entre o processo de participação nos conselhos gestores de políticas públicas, em interface com a intervenção do profissional de Serviço Social. Parte-se do pressuposto que tais instâncias de controle social colocam-se atualmente como campo de atuação dessa profissão, a qual pode contribuir para a socialização de informações que subsidiem a formulação e gestão de políticas, bem como o acesso a direitos sociais. Palavras-chave: conselhos gestores, Serviço Social, controle social.

Abstract

Management councils and advocacy were some of the areas of participation and social control with the force of law to act in public policy. This paper proposes to understand the relations hip between the process of participation in public policy management councils in the interface with the professional intervention of Social Services. It starts from the assumption that such instances of social control is currently placed as a field of expertise of that profession, which may contribute to the socialization of information that supports the development and management policies, as well asaccess to social rights. Keywords: social work, social control, concils.

1 Bacharel. Universidade Federal do Ceará – UFCE. [email protected] 2 Estudante. Universidade Federal do Ceará – UFCE [email protected]

1 INTRODUÇÃO

A Constituição Federal de 1988, construída em um contexto de crise

econômica e de efervescência dos movimentos sociais, foi um das expressões da luta

por direitos sociais e políticos. Além da descentralização e municipalização das

políticas sociais, foi assegurado o direito a participação popular no controle e gestão

dessas políticas.

Propõe-se neste trabalho o debate sobre as modalidades de intervenção do

Serviço Social nos conselhos gestores de políticas públicas. Ao se considerar a

histórica intervenção da profissão no âmbito das políticas públicas, primeiramente na

execução, mas atualmente, sendo chamando para atuar na gestão dessas políticas,

são postos a esses profissionais distintos espaços sócio-ocupacioanais, em que o

direito à participação e ao controle social aparece como dimensão para atuação juntos

às políticas sociais.

Esse novo espaço sócio-ocupacional para os assistentes sociais é colocado

por Iamamoto (1997) como a insurgência de outras possibilidades de trabalho abertas

principalmente ao nível de municípios, de reforço do poder local, ampliando dessa

forma os canais de participação da população na formulação, fiscalização e gestão de

políticas sociais. Apesar de a autora ressaltar que pode também funcionar como

reforço do populismo, da pequena política que se orienta por interesses particularistas,

demarcando a tradição política brasileira.

Os Assistentes Sociais podem vir a ter uma dupla inserção nesses conselhos,

segundo Bravo (2009), a saber: uma que se caracteriza por ser essencialmente

política, quando atuam enquanto conselheiros; e outra forma de intervenção que é

quando desenvolvem ações de assessoria aos conselhos e/ou alguns de seus

segmentos, sejam eles trabalhadores, usuário ou ao próprio poder público, esta

segunda forma de atuação, por sua vez, caracteriza-se como um novo espaço sócio-

ocupacional para esses profissionais.

2 A PARTICIPAÇÃO E O CONTROLE SOCIAL NOS CONSELHOS GESTORES DE

POLÍTICAS PÚBLICAS

Uma das idéias centrais presente nas políticas de participação popular da

década de 1980 era a de que elas deveriam ser incorporadas ao planejamento

administrativo, desde que fossem construídas não da maneira como havia sido

predominante até 1970, ou seja, “de cima para baixo e de fora para dentro”. O que se

requisitava era um planejamento participativo que não se resumisse a meros debates,

mas que se estabelecesse a partir de um processo de relação entre o governo e a

comunidade (Gohn, 2007). Dessa forma, o eixo articulatório nos anos de 1980, no que

tange a participação, era a ocupação de espaços físicos para que se fizessem valer

outras vozes, além das quais estavam no poder. Essa luta centrava-se na seguinte

direção: junto às administrações locais, como grupo de pressão aos governantes e a

representantes do legislativo federal com o intuito de estabelecer a institucionalidade

dos canais de participação, que se respaldasse em leis mais democráticas.

Ainda durante o período supramencionado desenvolve-se no país, o

estabelecimento de um campo democrático no âmbito da sociedade civil, a partir de

distintos movimentos sociais e pluriclassistas, tais como o de mulheres, negros e etc,

por lideranças sindicais, por parlamentares e partidos políticos oposicionistas e ONGs

então emergentes no cenário político nacional. Esse novo contexto democrático

permite a criação de uma cultura política que, dentre outros fatores, caracterizava-se

pela mobilização e pressão direta, como ações articuladoras para a viabilização das

demandas que compunham suas reivindicações políticas.

Dentre as conquistas, ressalta-se a descentralização e municipalização das

políticas sociais, em que se assegura o direito à participação da população e ao

controle e gestão dessas políticas (Constituição Federal, art. 10; 194, inciso VII; 198,

inciso III; 204, inciso II; 206, inciso VI, 1988).

Alguns dos espaços constituídos para o exercício desses direitos foram os

conselhos gestores de políticas públicas, que se configuram como formas de

“participação social”, legalmente reconhecidos, e têm como objetivos o controle e a

fiscalização das políticas públicas setoriais e/ou a defesa de direitos de segmentos

específicos da sociedade. Vale ressaltar que tais conselhos não são os únicos canais

de participação da sociedade, entretanto, possui características particulares, já que

tem o caráter de serem permanentes e de possuírem um aparato jurídico-formal.

A experiência dos conselhos gestores de políticas públicas vem se

operacionalizando no Brasil, com destaque a partir da década de 1990, sobretudo em

políticas sociais públicas que, em suas leis ordinárias, apontam a constituição de

conselhos como um dos requisitos para o acesso de estados e municípios aos

recursos públicos. Tatagiba (2002), ao apontar as particularidades de diversos

conselhos (gestores, temáticos ou de direitos) no Brasil, nas áreas de saúde,

assistência social, conselhos de direitos de criança e adolescente, etc., identificam-os

como espaços públicos deliberativos, de composição plural e paritária entre Estado e

sociedade civil, cuja função é formular e controlar a execução das políticas públicas

setoriais.

Ultrapassada a necessidade de sua implantação, pois vários conselhos são

assegurados por leis, estudos apontam que seus maiores desafios dizem respeito à

representatividade e à capacitação dos conselheiros, à efetivação das propostas, e,

especialmente, às relações entre Estado e sociedade civil.

Dagnino (2002) mostra que, nos espaços públicos emergentes no Brasil, dentre

os quais enfatiza os conselhos gestores, a construção de uma “nova cidadania” é

balizada pela linguagem do direito é confrontada por diversos fatores. Os “encontros”

e relações entre Estado e sociedade são permeados por conflitos não apenas

derivados de sua lógica de atuação, de suas características intrínsecas, mas,

sobretudo, dos projetos políticos3 que cada uma dessas esferas encarna e reproduz.

Tal relação também é atravessada pelo dilema da partilha do poder, limitada tanto pela

resistência do Poder Executivo em acatar as demandas sociais, como da constante

busca de segmentos da sociedade civil em realizar o controle democrático sobre o

Estado.

Nesse contexto, os conselhos gestores de políticas públicas se apresentam

como um novo espaço sócio-ocupacional para o Serviço Social, o qual pode intervir

nesses espaços a partir de duas formas, as saber: enquanto conselheiros ou enquanto

assessores.

3. ATUAÇÃO DO SERVIÇO SOCIAL NOS CONSELHOS GESTORES DE

POLÍTICAS PÚBLICAS

3 Por “projeto político” Dagnino (2002) entende o conjunto de crenças, interesses e concepções de mundo que orientam a ação política dos sujeitos e sua forma de representar a vida em sociedade.

O Serviço Social tem como objeto de intervenção a questão social4, realidade

impensável sem a articulação com a sociedade capitalista, pois esta ao mesmo tempo

em que promove o desenvolvimento das forças produtivas, expande e aprofunda as

relações de desigualdades sociais, a miséria e a pobreza. Nesse processo a profissão

se insere a fim de lançar estratégias de intervenção nessas múltiplas expressões, que

estão perpassadas por interesses e projetos sociais em disputa.

Em sintonia com o Código de Ética Profissional(1993), a Lei de

Regulamentação da Profissão(1993), em seu art. 4º, estabelece as competências do

assistente social, tais como: a elaboração, implementação, execução e avaliação das

políticas sociais junto à órgãos de administração pública direta ou indiretamente,

empresas e demais entidades; elaboração, coordenação, execução e avaliação de

planos, programas e projetos que sejam de âmbito do Serviço Social a partir da

participação da sociedade civil; prestação de assessoria e consultoria à órgãos da

administração pública, direta ou indiretamente, empresas privadas e demais

entidades; prestação de assessoria aos movimentos sociais em matéria relacionada

às políticas sociais, no exercício e na defesa dos direitos civis, políticos e sociais da

coletividade.

Ademais, no art. 5º da referida lei trata-se das atribuições privativas do

Assistente Social, sendo pautada também a atribuição de prestação de assessoria e

consultoria à administração pública direta e indireta, empresas privadas e demais

entidades, mas agora em matéria de Serviço Social.

Como podemos atestar a prestação de assessoria e/ou consultoria está

contida, seja nas competências e/ou atribuições, na Lei que regulamente o exercício

profissional em Serviço Social. A prestação desse serviço às entidades públicas e/ou

privadas faz parte da competência do profissional de Serviço Social.

Nesse estudo, enfoca-se a atuação do Serviço Social enquanto assessoria nos

conselhos gestores de políticas públicas, entendendo que estes atualmente

apresentam-se como novos espaços ocupacionais. Esse tipo de inserção dos

profissionais de Serviço Social necessita ser fortalecida com os princípios norteadores

da atuação profissional consubstanciados no Código de Ética profissional, Lei de

Regulamentação e nas Diretrizes Curriculares da profissão, como assevera o autor a

seguir: “(...) assessoria/consultoria é mais uma possibilidade de trabalho posta aos

4 A questão social pensada na relação conflituosa entre capital e trabalho, “(...) diz respeito ao conjunto das expressões das desigualdades sociais engendradas na sociedade capitalista madura, impensáveis sem a intermediação do Estado” (IAMAMOTO, p.26, 2002).

assistentes sociais para a efetivação do atual projeto de profissão, que necessita ser

fortalecido, visando a sua efetivação por meio de sua prática concreta”. (Matos, 2010,

p. 30)

Diante dessas considerações o autor supramencionado define a atividade de

assessoria/consultoria como:

Assim, definimos assessoria/consultoria como aquela ação que é desenvolvida por um profissional com conhecimentos na área, que toma a realidade como objeto de estudo e detém uma intenção de alteração da realidade. O assessor não é aquele que intervém, deve, sim, propor caminhos e estratégias ao profissional ou à equipe que assessora e estes têm autonomia em acatar ou não as suas proposições (...) o assessor deve ser alguém estudioso, permanentemente atualizado e com capacidade de apresentar claramente as suas proposições (MATOS, 2010, p. 31).

Além disso, surgem como ampliação dos espaços ocupacionais atividades

relacionadas à implantação e orientação aos conselhos gestores de políticas públicas,

a capacitação de conselheiros, elaboração de planos de assistência social e demais

políticas públicas, acompanhamento e avaliação de programas e projetos. Essas

novas demandas acabam exigindo o domínio de conhecimento no que se refere à

realização de diagnósticos sócio-econômicos de municípios, bem como a análise de

orçamentos públicos, dentre outros. Somam-se a essas possibilidades de atuação,

nos níveis de assessoria e consultoria, requisições no campo de pesquisa, estudos e

planejamentos.

Além dessas, citaria outra atividade que compete ao profissional de Serviço

Social e que poderia estar sendo realizando nos conselhos que é a de mobilização das

classes populares, já que esta é uma das funções desse profissional. No entanto,

ressalta-se o fato de que esse processo de mobilização tanto pode assumir uma

direção de construção’ de autonomia como também a de subalternização pelos

setores das classes dominantes.

A atuação do Serviço Social nos conselhos pode ter distintas formas de

intervenção, mas a que se propõem e defende neste estudo são aquelas em que o

direcionamento dados as suas ações, seja no sentido de ampliação e defesa dos

direitos das classes populares.

5 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Nesse processo de descentralização das políticas sociais públicas, com

enfoque na sua municipalização, os assistentes sociais, bem como outros

profissionais, são chamados a responder a novas funções e competências. Dentre

estas, estão sendo requisitados profissionais que disponham de competências para

atuarem na esfera da formulação e avaliação das políticas, bem como do

planejamento e gestão, inseridos em equipes interdisciplinares que tencionem sua

identidade profissional (IAMAMOTO, 2002).

A categoria de assistentes sociais, em seus distintos espaços ocupacionais, é

capaz de realizar uma análise crítica da realidade em que estão inseridos para e a

partir daí lançarem respostas de intervenção e enfrentamento das demandas e

situações sociais que se apresentam especificamente no cotidiano em que estão

situados.

O Serviço Social tem sido chamado a atuar nos conselhos de gestão e de

defesa de direitos, contribuindo para o surgimento de um consenso, distinto do

dominante, ao reforçarem interesses de segmentos majoritários da sociedade. Ao

atuarem dessa forma poderão contribuir para a socialização de informações que

subsidiem a formulação e gestão de políticas, bem como o acesso a direitos sociais;

ao viabilizarem o uso de meios legais em defesa dos interesses da sociedade civil

organizada; ao interferirem na gestão e avaliação dessas políticas.

6 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ABEPSS. Diretrizes Curriculares da ABEPSS 1996. Disponível em: http://www.abepss.org.br/documentos.php. Acesso em: 11/11/2010. BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF. Senado, 1988. BRAVO, Maria Inês Souza. O trabalho do assistente social nas instâncias públicas de controle democrático. CFESS, ABEPSS. Brasília, 2009. CFESS. Código de Ética Profissional do (a) Assistente Social de 1993. Disponível em: http://www.cfess.org.br/legislacao.php. Acesso em: 10/11/2010.

_______. Lei 8.662/1993 de Regulamentação da Profissão do(a) Assistente Social. Disponível em: http://www.cfess.org.br/legislacao.php. Acesso em: 10/11/2010. _______. Parâmetros para atuação do Assistente Social na Política de saúde. Série 2: trabalho e projeto profissional nas políticas sociais. Brasília, 2010. DAGNINO, E. Sociedade Civil e Espaços Públicos no Brasil. São Paulo: Paz e Terra, 2002. GOHN, Maria da Glória. Conselhos Gestores e participação sociopolítica. 3 Ed. São Paulo: Cortez, 2007. IAMAMOTO, Marilda Vilela. Atribuições do(a) Assistente Social: em questão. CFESS, 2002. ____. Marilda Vilela. O Serviço Social na contemporaneidade: dimensões históricas, teóricas e ético-políticas. CRESS-CE, nº 06, 1997. MATOS, Maurílio Castro. Assessoria e consultoria: reflexões para o Serviço Social. In: BRAVO, Maria Inês de Souza; MATOS, Maurílio Castro (Orgs.). Assessoria, consultoria e Serviço Social. 2 ed. São Paulo: Cortez, 2010. TATAGIBA, Luciana. Os Conselhos Gestores e a Democratização das Políticas Públicas no Brasil. In: DAGNINO, Evelina (Org.). Sociedade Civil e Espaços Públicos no Brasil. São Paulo: Paz e Terra, 2002.