Conhecimento cristão
-
Upload
silvio-dutra -
Category
Spiritual
-
view
22 -
download
1
Transcript of Conhecimento cristão
2
Conhecimento Cristão
Título Original: Christian knowledge: or, the
Importance and advantage of a thorough knowledge of divine truth
Por Jonathan Edwards (1703-1758)
Traduzido, adaptado e editado
por Silvio Dutra
Fev/2017
3
E26
Edwards, Jonathan – 1703-1758 Conhecimento cristão / Jonathan Edwards / Tradução , adaptação e edição por Silvio Dutra – Rio de Janeiro, 2017. 34p; 14,8 x 21cm Título original: Christian knowledge: or, the Importance and advantage of a thorough knowledge of divine truth 1. Teologia. 2. Vida Cristã 2. Graça 3. Fé. 4. Alves, Silvio Dutra I. Título CDD 230
4
“Porque, devendo já ser mestres pelo tempo,
ainda necessitais de que se vos torne a ensinar
quais sejam os primeiros rudimentos dos
oráculos de Deus; e vos haveis feito tais que
necessitais de leite, e não de sólido
mantimento.” (Hebreus 5.12)
Estas palavras são uma queixa que o apóstolo faz
contra os cristãos hebreus, por sua falta de
progresso no conhecimento da doutrina e
mistérios da religião.
O apóstolo se queixa de que eles não tinham
feito progresso na sua familiaridade com as
coisas ensinadas nos oráculos de Deus. Ele os
reprova, não apenas por sua deficiência em
espiritualidade e conhecimento experimental
das coisas divinas, mas pela sua deficiência em
um conhecimento doutrinal com os princípios
da religião e as verdades da divindade cristã;
como é evidente pela maneira na qual o apóstolo
introduz esta repreensão. A ocasião da sua
introdução no verso seguinte é esta, mas numa
anterior, ele menciona Cristo como sendo
5
"Chamado por Deus sumo sacerdote, segundo a
ordem de Melquisedeque." (Heb 5. 10).
Quanto aos oráculos de Deus, Melquisedeque
havia sido no Antigo Testamento, um tipo
eminente de Cristo, e seu sacerdócio continha
muitos mistérios do evangelho. Esses mistérios,
o apóstolo estava disposto a apontar aos cristãos
hebreus, mas ele concluiu que em razão da
fraqueza deles em conhecimento, não o
compreenderiam; portanto decidiu
interromper o discurso sobre ele, como se vê no
verso 11, "Sobre isso temos muito que dizer, mas
de difícil interpretação, porquanto vos tornastes
tardios em ouvir." Ou seja, há muitas coisas a
respeito de Melquisedeque que contêm
maravilhosos mistérios sobre o evangelho, e
que gostaria de dar conhecimento a vocês, se
não fosse o temor que tenho de que em razão de
sua fraqueza e atraso na compreensão dessas
coisas, vocês somente ficariam intrigados e
confundidos por meu discurso, e assim não
receberiam qualquer benefício, sendo muito
difícil para vocês, assim como é para um bebê se
alimentar com o alimento sólido.
6
Em seguida, vêm as palavras do texto: “Porque,
devendo já ser mestres pelo tempo, ainda
necessitais de que se vos torne a ensinar quais
sejam os primeiros rudimentos dos oráculos de
Deus; e vos haveis feito tais que necessitais de
leite, e não de sólido mantimento.” (Hebreus
5.12)
O fato de que muito se poderia esperar de vocês,
significa que deveriam saber o suficiente da
Sagrada Escritura para serem capazes de
entender e digerir tais mistérios, mas não é
assim com vocês. O apóstolo fala de seu
progresso em conhecimento, como é
transmitido pelo ensino humano, como se
depreende da expressão "Quanto ao tempo
decorrido deveriam ser mestres"; que inclui não
só a prática experimental, mas também uma
doutrinária, o conhecimento das verdades e
mistérios da religião.
Mais uma vez, o apóstolo fala de tal
conhecimento, em que os cristãos são capazes
de compreender essas coisas da divindade, que
são mais difíceis de serem compreendidas, e
exigem grande habilidade nas coisas dessa
natureza. Isto é mais amplamente expressado
7
nos dois próximos versos: "Ora, qualquer que se
alimenta de leite é inexperiente na palavra da
justiça, pois é criança; mas o alimento sólido é
para os adultos, os quais têm, pela prática, as
faculdades exercitadas para discernir tanto o
bem como o mal." (Heb 5. 13-14). É nesse
conhecimento, que consiste o progresso que
devem fazer os cristãos além dos primeiros
rudimentos da religião, como aqui; "Tendes
necessidade de que alguém vos ensine
novamente os princípios elementares dos
oráculos de Deus." Portanto, no início do
próximo capítulo, o apóstolo aconselha-os: "Pelo
que deixando os rudimentos da doutrina de
Cristo, prossigamos até a perfeição." (Heb. 6: 1)
Podemos observar que a culpa desse defeito
aparece, na medida em que não tinham feito
progresso de acordo com o tempo decorrido.
Pelo tempo de cristãos, eles deveriam ser
mestres. Como eram cristãos, seu negócio era
aprender e adquirir conhecimento sobre a vida
cristã. Eram estudiosos na escola de Cristo, e se
tivessem melhorado no uso do seu tempo na
aprendizagem, eles poderiam, pelo tempo em
que o apóstolo escreveu, terem sido aptos a
serem professores nesta escola. Os cristãos não
8
devem permanecer bebês para sempre, mas
crescer no conhecimento cristão, e deixando a
comida dos bebês, eles devem aprender a
digerir o alimento sólido.
Assim, todo cristão deve fazer um esforço para
crescer no conhecimento das coisas divinas.
De fato, isto é estimado como sendo o negócio
de teólogos e ministros, e comumente pensado
ser o seu trabalho pelo estudo das Escrituras, e
outros livros instrutivos para ganhar
conhecimento, mas não se pode pensar que isto
deve ser deixado para eles, como que não
pertencendo ao interesse de outros. Mas, se o
apóstolo tivesse entretido esta noção, ele nunca
teria culpado os hebreus cristãos por não terem
adquirido conhecimento suficiente para serem
professores.
Ao lidar com este assunto, vou mostrar porque
o conhecimento na divindade é necessário.
E por que todos os cristãos devem se esforçar
para crescer nesse conhecimento.
Parte I
9
O que se entende por divindade, como o objeto
do conhecimento cristão.
Várias definições foram dadas sobre este
assunto por aqueles que têm tratado do mesmo.
Podemos dizer resumidamente, que é a ciência
ou doutrina que compreende todas as verdades,
e as regras que dizem respeito ao grande
assunto da religião cristã.
Existem vários tipos de artes e ciências
ensinadas e aprendidas nas escolas, que são
versados sobre vários objetos; sobre as obras da
natureza em geral, como a filosofia; ou o céu
visível, como a astronomia; ou no mar, como a
navegação; ou a terra, como a geografia; ou o
corpo do homem, como a física e anatomia; ou a
alma do homem, no que respeita às suas
competências e qualidades naturais, como a
lógica e pneumatologia; ou acerca do governo
humano, como política e jurisprudência. Mas,
uma ciência ou tipo de conhecimento e
doutrina é acima de tudo o mais, como
concerne a Deus e ao grande assunto da religião.
Teologia não se aprende como outras ciências,
pela simples melhoria da razão natural do
10
homem, mas é ensinado pelo próprio Deus em
um livro cheio de instrução, que nos tem dado
para esse fim. Esta é a regra que Deus deu ao
mundo, para ser seu guia na busca desse tipo de
conhecimento, e é um resumo de todas as coisas
desta natureza, necessário para nós
conhecermos. Esta teologia é chamada de
doutrina, de arte ou ciência.
Na verdade, existe o que se chama de religião
natural. Há muitas verdades a respeito de Deus,
e nosso dever para com Ele, que são evidentes à
luz da natureza. Mas a teologia cristã
propriamente dita, não é evidente pela luz da
natureza; isso depende de revelação. Tais são as
nossas circunstâncias agora, em nosso estado
caído, que nada que é necessário para sabermos
a respeito de Deus, manifesta-se pela luz da
natureza, na forma em que é necessário para
que possamos conhecê-lo. Porque o
conhecimento de qualquer verdade na
divindade é de grande importância para nós, e
pertence ao evangelho.
Mas a luz da natureza não nos ensina qualquer
verdade nesta matéria, portanto não pode ser
dito, que se chega ao conhecimento de qualquer
11
parte da verdade cristã à luz da natureza. É
somente a palavra de Deus, contida no Antigo e
Novo Testamento, que nos ensina a teologia
cristã.
Esta compreende tudo o que é ensinado nas
Escrituras, e assim, tudo o que precisamos
saber, ou que deve ser conhecido a respeito de
Deus e de Jesus Cristo acerca de nosso dever
para com Deus, e nossa felicidade em Deus.
Teologia é comumente definida, como a
doutrina de viver para Deus, ou a doutrina da
vida de Deus por Cristo. Abrange todas as
doutrinas cristãs como elas são em Jesus, e
todas as regras cristãs nos orientando a viver
para Deus, por Cristo. Não há uma doutrina,
nenhuma promessa, nenhuma regra, mas o que
de alguma forma ou de outra, se relaciona com
a vida cristã e divina, ou a nossa vida para Deus,
por Cristo. Todos eles se relacionam com isso
em dois aspectos, como tendem a promover a
nossa vida para Deus, aqui neste mundo, em
uma vida de fé e santidade, e também como eles
tendem a levar-nos a uma vida de perfeita
santidade e felicidade, em pleno gozo de Deus.
Parte II
12
Que tipo de conhecimento da divindade,
destina-se na doutrina.
Existem dois tipos de conhecimento da verdade
divina: especulativo e prático, ou em outros
termos, natural e espiritual.
No primeiro, nenhuma outra faculdade, senão o
entendimento está em causa no mesmo. Ele
consiste em ter um conhecimento natural ou
racional das coisas da religião, ou de um
conhecimento, como é para ser obtido pelo
exercício natural de nossas próprias faculdades,
sem qualquer iluminação especial do Espírito
de Deus. Mas, o segundo (espiritual) não
repousa inteiramente na cabeça ou nas ideias
especulativas de coisas, mas o coração está nele
ocupado. Ele consiste principalmente, no
sentido do coração.
O mero intelecto, sem a vontade ou a inclinação,
não é a sede do mesmo. E isso não pode ser
chamado apenas de ver, mas sentir ou provar.
Assim, há uma diferença entre ter uma noção
especulativa correta das doutrinas contidas na
palavra de Deus, e ter o devido senso delas no
coração. O primeiro consiste no conhecimento
13
especulativo ou natural, mas o segundo consiste
no conhecimento espiritual ou prático das
doutrinas.
Nenhum deles se exclui na doutrina, mas
devemos procurar o primeiro (natural) com o
fim de atingir o segundo (espiritual). O
espiritual e prático é da maior importância,
porque um especulativo sem um conhecimento
espiritual é vaidade, e servirá ainda para fazer a
nossa condenação maior. No entanto, um
conhecimento especulativo também é de
importância capital, porque sem ele não
podemos ter conhecimento espiritual ou
prático.
Eu já mostrei, que o apóstolo fala não somente
de um conhecimento espiritual, mas de como
pode ser adquirido e comunicado de um para
outro. Ele desejava que os cristãos hebreus
buscassem a um, em ordem para o outro.
Portanto, o primeiro vem em primeiro lugar , e
com ele se pretende que os cristãos devem
através da leitura e de outros meios
apropriados, procurar um bom conhecimento
racional das coisas da divindade; enquanto o
segundo, se destina de forma mais indireta,
14
uma vez que deve ser procurado por intermédio
do outro.
Parte III
A utilidade e a necessidade do conhecimento
das verdades divinas.
Não há outro caminho, seja qual for, em que
quaisquer meios de graça possam ser de
qualquer benefício, senão pelo conhecimento.
Todo o ensino é em vão, sem aprender,
portanto, a pregação do evangelho seria
totalmente sem propósito, se ele não trouxesse
nenhum conhecimento para a mente. Há uma
ordem de homens que Cristo nomeou com o
propósito de serem mestres em sua igreja, mas
eles ensinam em vão, se nenhum conhecimento
nestas coisas é adquirido por seu ensino. É
impossível que seu ensino e pregação sejam um
meio de graça, ou de qualquer bem no coração
dos seus ouvintes, de qualquer outra forma que
não pelo conhecimento transmitido para o
entendimento. Caso contrário, seria um grande
benefício aos ouvintes, se o ministro pregasse
em uma língua desconhecida para eles.
15
Toda a diferença está em que a pregação em
uma língua conhecida transmite algo para o
entendimento, que a pregação em uma língua
desconhecida não o faz. Por conta disso, tal
pregação deve ser rentável. Em tais coisas que os
homens não recebem nada, quando nada
entendem, e não são de todo edificados, a
menos que algum conhecimento seja
transmitido à mente racional, conforme o
apóstolo se expressa em I Coríntios 14.2-6.
Nenhum discurso pode ser um meio de graça,
mas para transmitir conhecimento; caso
contrário, o discurso é tanto perdido como se
não tivesse havido ninguém lá, e se aquele que
falava, tinha falado apenas para o ar; uma vez
que segue na passagem que acabamos de citar,
onde lemos:
“6 E agora, irmãos, se eu for ter convosco
falando em línguas, de que vos aproveitarei, se
vos não falar ou por meio de revelação, ou de
ciência, ou de profecia, ou de doutrina?
7 Ora, até as coisas inanimadas, que emitem
som, seja flauta, seja cítara, se não formarem
16
sons distintos, como se conhecerá o que se toca
na flauta ou na cítara?
8 Porque, se a trombeta der sonido incerto,
quem se preparará para a batalha?
9 Assim também vós, se com a língua não
pronunciardes palavras bem inteligíveis, como
se entenderá o que se diz? porque estareis como
que falando ao ar.” (I Cor 14.6-10).
Deus lida com o homem como uma criatura
racional (Daí o apóstolo apontar a necessidade
da renovação da mente para o culto racional a
Deus – Rom 12.1,2 - nota do tradutor); e quando a
fé está em exercício, não se trata de algo que ele
não possa saber. Portanto a audição racional é
absolutamente necessária para a fé, pois a
audição é necessária para a compreensão. Rom
10. 14 "Como crerão naquele de quem não
ouviram falar?"
Da mesma forma, não pode haver amor sem
conhecimento. Não é de acordo com a natureza
da alma humana, amar um objeto que é
totalmente desconhecido.
17
O coração não pode ser ajustado em cima de um
objeto do qual não há qualquer ideia na
compreensão. As razões que induzem a alma ao
amor, primeiro devem ser entendidas, antes
que possa ter uma influência razoável sobre o
coração.
Deus nos deu a Bíblia, que é um livro de
instruções. Mas este livro não pode ser fonte de
qualquer tipo de lucro para nós, de qualquer
outra forma que não seja por transmitir algum
conhecimento à mente. Ele não poderia nos
beneficiar, não mais do que se tivesse sido
escrito na língua chinesa, da qual não sabemos
uma palavra. Assim, os sacramentos do
evangelho não podem ter um bom efeito de
nenhuma outra maneira, do que por transmitir
algum conhecimento. Eles representam certas
coisas por sinais visíveis. E, o que é o fim de
sinais, senão transmitir algum conhecimento
das coisas significadas? Essa é a natureza do
homem, que nenhum objeto pode vir ao seu
coração, senão pela porta do entendimento,
portanto não pode haver conhecimento
espiritual daquilo em que não há primeiro um
conhecimento racional. É impossível que
qualquer um deva ver a verdade ou a excelência
18
de qualquer doutrina do evangelho, que não
saiba o que é a doutrina, a qual é aprendida pela
mente racional.
Um homem não pode ver a excelência
maravilhosa e o amor de Cristo em fazer tais
coisas para os pecadores, a menos que seu
entendimento seja informado pela primeira vez,
de como essas coisas foram feitas. Ele não pode
ter o gosto da doçura e excelência da verdade
divina, a menos que primeiro tenha uma noção
de que existe tal coisa, por receber informação
delas de forma escrita ou falada.
Sem conhecimento da teologia cristã, ninguém
seria diferente dos pagãos mais ignorantes e
bárbaros. Os pagãos permanecem nas trevas
porque não são instruídos, e não têm obtido o
conhecimento das verdades divinas.
Se os homens não têm conhecimento destas
coisas, a faculdade da razão seria totalmente em
vão. A faculdade da razão e compreensão foi
dada para o entendimento e conhecimento real.
Se um homem não tiver conhecimento real, a
faculdade ou a capacidade da razão é de
nenhum uso. E se ele tem conhecimento real,
19
mas for destituído do conhecimento das coisas
que são o fim último do seu ser, e da causa do
conhecimento de que tinha mais entendimento
dado a ele, do que aos animais; então, sua
faculdade da razão ainda é em vão; ele poderia
muito bem ter sido uma besta como um homem.
Mas, assuntos divinos são as coisas a serem
conhecidas, pelas quais recebemos a faculdade
da razão. São coisas que tocam até o fim do nosso
ser, e são o grande negócio para o qual somos
feitos, portanto um homem não pode ter sua
faculdade de entendimento para algum bom
propósito, mais do que ele tenha conhecimento
da verdade divina.
Assim, este tipo de conhecimento é
absolutamente necessário. Outros tipos de
conhecimento podem ser muito úteis. Algumas
outras ciências, como a astronomia, filosofia
natural, e geografia, podem ser muito
importantes em sua espécie, mas o
conhecimento desta ciência divina é
infinitamente mais útil e importante do que a de
todas as demais ciências.
Parte IV
20
Porque todos os cristãos devem fazer seu
negócio se esforçar para crescer no
conhecimento da divindade.
Os cristãos não devem contentar-se com tais
graus de conhecimento da divindade como já
obtiveram. Não devem se satisfazer com o
quanto eles já sabem do que é absolutamente
necessário para a salvação, mas devem procurar
fazer progressos.
Este esforço de fazer progressos em tal
conhecimento não deveria ser atendido como
uma coisa ocasional, mas todos os cristãos
devem se empenhar nisto. Eles devem olhar
para isto como uma parte da sua atividade
diária, e deve ser atendido como uma parte
considerável do trabalho de sua elevada
chamada, porque:
1. Nosso negócio deve, sem dúvida, consistir
muito em empregar essas faculdades pelas
quais se distinguem dos animais. A razão pela
qual nós temos faculdades superiores às dos
animais, é que somos realmente concebidos
para um emprego superior. Isso que o Criador
planejou deve ser o nosso principal emprego,já
21
que nos deu poderes superiores. Portanto, sem
dúvida, deve ser uma parte considerável do
nosso negócio, melhorar as faculdades
superiores. Mas, a faculdade pela qual somos
principalmente distinguidos dos brutos, é a
faculdade da compreensão. Segue-se então, que
devemos fazer o nosso negócio principal
melhorar esta faculdade, porque é na verdade a
mais alta que temos.
Mas, não podemos fazer uma melhoria da nossa
capacidade intelectual, de outra forma, do que
fazendo um empenho para melhorar a nós
mesmos no conhecimento real.
Deus deu ao homem algumas coisas em comum
com os animais, como seus sentidos exteriores,
seus apetites do corpo, uma capacidade de
prazer corporal e dor, e outras faculdades
animais; porém algumas coisas que Ele lhes deu
são superiores às dos animais, e a principal
delas é a faculdade do entendimento e da razão.
Agora, Deus nunca deu ao homem essas
faculdades, para estarem sujeitas às que ele tem
em comum com os animais. Esta seria uma
grande confusão, equivalente a fazer do homem
um servo dos animais. Pelo contrário, Ele deu
22
esses poderes inferiores para serem
empregados na subserviência ao entendimento
do homem, portanto deve ser uma grande parte
do negócio principal do homem, melhorar sua
compreensão através da aquisição de
conhecimento, pois é com este que ele exerce
domínio sobre a criação, conforme lhe foi dado
pelo próprio Deus.
Os pagãos mais sábios foram os que entenderam
que o principal negócio do homem era a
melhoria e exercício de seu conhecimento, mas
eles não sabiam o objeto sobre o qual o
entendimento deve principalmente ser
empregado. A ciência que muitos deles
achavam que deveriam buscar pelo
entendimento, foi a filosofia; e,
consequentemente, fizeram dela o assunto
principal de seus estudos.
Mas nós, que apreciamos a luz do evangelho
somos mais felizes, porque não estamos neste
particular, nem errados nem no escuro. Deus
nos disse sobre as coisas que devemos
principalmente empregar nosso entendimento;
Ele nos tem dado um Livro cheio de instruções
divinas, retendo muitos objetos gloriosos sobre
23
o qual todas as criaturas racionais devem
principalmente empregar seu entendimento.
Estas instruções são acomodadas a pessoas de
todas as capacidades e condições, e adequadas
para serem estudadas, não só por homens
cultos, mas por pessoas de todos os tipos; cultos
e incultos, jovens e velhos, homens e mulheres.
Portanto, a aquisição de conhecimentos nestas
coisas deve ser um negócio principal de todos
aqueles que têm a vantagem de desfrutar das
Sagradas Escrituras.
2. As verdades da divindade são excelências
superlativas, e dignas de que todos devem se
esforçar para crescerem no conhecimento
delas. Elas são tão acima das coisas, que são
tratadas em outras ciências, como o céu está
acima da terra. (Nota do tradutor: nem tanto na
complexidade do conhecimento, mas na sua
essência e proveniência divina, celestial e
espiritual, e não natural). O próprio Deus, o
eterno Três em Um, é o principal objeto desta
ciência; e ao lado de Jesus Cristo, como Deus-
homem e Mediador, e a gloriosa obra da
redenção, a obra mais gloriosa que já foi feita,
seguida pelas grandes coisas do mundo
celestial, a herança gloriosa e eterna adquirida
24
por Cristo, e prometida no evangelho; a obra do
Espírito Santo de Deus nos corações dos
homens; o nosso dever para com Deus, e a
maneira em que nós mesmos podemos nos
tornar como anjos, e como o próprio Deus em
nossa medida; todos estes são objetos desta
ciência.
Tais coisas como estas têm sido o assunto
principal do estudo dos santos patriarcas,
profetas, apóstolos, e os mais excelentes
homens que já existiram; e elas também são
objeto de estudo para os anjos no céu; 1 Pedro 1.
10-12.
Elas são tão excelentes e dignas de serem
conhecidas, que o conhecimento delas vai
recompensar ricamente todas as dores e o
trabalho de uma busca sincera das mesmas. Se
houvesse um grande tesouro de ouro e pérolas
acidentalmente encontrado, e aberto em tais
circunstâncias que todos possam ter tanto dele
quanto pudessem pegar; cada um não poderia
pensar que valeria gastar seu tempo e esforço
neste propósito?
25
Mas esse tesouro do conhecimento divino, que
está contido nas Escrituras, e é fornecido para
cada um, para juntar para si mesmo o tanto
quanto ele possa, é muito mais rico do que
qualquer um de ouro e pérolas. Quão ocupados
todos os tipos de homens estão em todo o
mundo, no sentido de obter riquezas! Mas esse
conhecimento é um tipo de riqueza muito
melhor, do que a comumente perseguida.
3. Verdades divinas não são um assunto
exclusivo para ministros, mas de importância
infinita para todos os cristãos.
Elas são sobre aquelas coisas que se relacionam
com a salvação eterna, e felicidade de todos os
homens. As pessoas comuns não podem dizer:
“Vamos deixar esses assuntos para ministros e
teólogos; eles não nos dizem respeito, porque
são de importância infinita para cada homem.”
Aquelas doutrinas que se relacionam com a
essência, atributos e ordenanças de Deus, dizem
respeito a todos, pois são de importância infinita
para pessoas comuns, bem como para os
ministros, para saber que tipo de ser Deus é.
Porque ele é um ser "em quem vivemos, e nos
movemos, e existimos" (Atos 17:28), que é o
26
Senhor de todos; o ser diante de quem todos nós
somos responsáveis; é o fim último do nosso ser,
e a única fonte de nossa felicidade.
A doutrina também que se refere a Jesus Cristo
e Sua mediação, Sua encarnação, Sua vida e
morte, Sua ressurreição e ascensão, Sua
exaltação à direita do Pai. Sua satisfação e
intercessão interessa tanto às pessoas comuns,
bem como aos teólogos. O mesmo pode ser dito
da doutrina que se relaciona com a maneira de
justificação do pecador, ou a forma em que ele
se torna interessado na mediação de Cristo. Ela
também diz respeito a todos, porque têm igual
necessidade de justificação diante de Deus;
porque a condenação eterna, para a qual todos
somos naturalmente expostos, é igualmente
terrível. Assim, no que diz respeito às doutrina
que se relacionam com a obra do Espírito de
Deus no coração, na aplicação da redenção em
nossa regeneração eficaz e santificação, todos
são igualmente interessados nelas. Não há
qualquer doutrina da divindade que não seja de
alguma forma do eterno interesse de cada
cristão.
27
4. Podemos argumentar a favor da mesma
posição, desde as grandes coisas que Deus fez
para nos dar instruções acerca delas. Quanto a
outras ciências, Ele nos deixou à luz da nossa
própria razão, mas as coisas divinas sendo
infinitamente de maior importância para nós,
Ele não tem deixado para um guia incerto, mas
tem nos dado uma revelação da verdade nestes
assuntos, e tem feito grandes coisas para
transmiti-las e confirmá-las para nós;
levantando muitos profetas em diferentes
idades, inspirando-os imediatamente com o
Espírito Santo, e confirmando a Sua doutrina
com inúmeros milagres ou obras maravilhosas
fora do curso estabelecido da natureza. Sim, Ele
levantou uma sucessão de profetas, a quem
revelou a verdade por diversas eras.
Foi para este fim que Deus de forma
maravilhosa separou o povo de Israel de todas as
outras pessoas, e os manteve em separado; para
que Ele pudesse lhes entregar os Seus oráculos,
e a partir deles pudessem ser comunicados ao
mundo. Ele também, muitas vezes tem enviado
anjos para trazer instruções divinas aos
homens; e frequentemente aparecido em
símbolos milagrosos ou representações de Sua
28
presença. E, agora nestes últimos dias enviou
Seu próprio Filho para o mundo, para ser seu
grande profeta, e nos ensinar a verdade divina
(Heb 1. 1). Deus nos deu um livro de instruções
divinas, que contém a soma de divindade. Agora,
essas coisas que Deus fez assim, não é só para a
instrução dos ministros e homens cultos, mas
para a instrução de todos os homens, de todos os
tipos; cultos e incultos, homens, mulheres e
crianças.
Vemos em Jeremias 7.25 a afirmação de Deus de
que desde os dias de Moisés vinha levantando
profetas para ensinarem Sua vontade ao Seu
povo: “Desde o dia em que vossos pais saíram da
terra do Egito, até hoje, tenho-vos enviado
insistentemente todos os meus servos, os
profetas, dia após dia”. E vemos no verso 13: "Eu
vos falei, madrugando, e falando." Esta é uma
figura de linguagem, que significa, que Deus é
quem fez isso como um negócio de grande
importância, em que tomou muito cuidado, e no
qual tinha o coração muito envolvido.
Se Deus tem sido tão envolvido no ensino,
certamente não devemos ser negligentes na
aprendizagem, mas fazer do crescer no
29
conhecimento uma grande parte dos negócios
de nossas vidas.
5. Pode-se argumentar a partir da abundância
das instruções que Deus nos deu, e da grandeza
daquele Livro, que nos deu para nos ensinar
sobre a divindade, com a grande variedade de
assuntos que nele está contido. Muito foi
ensinado através da revelação que Ele fez a
Moisés no passado, e que foi transmitido até
nós; depois disso, outros livros foram de vez em
quando adicionados, e muitas e excelente são as
instruções comunicadas pelos profetas, porém
Deus não achou que tudo isso fosse suficiente,
porém após Cristo enviou seus apóstolos, por
quem é adicionado um grande e excelente
tesouro ao livro sagrado, que é para ser nosso
governo no estudo deste importante assunto.
Este livro (a Bíblia) foi escrito para o uso de
todos, e assim são direcionados para examinar
as Escrituras (João 5.v 39 - "Examinai as
Escrituras, porque julgais ter nelas a vida
eterna, e são elas que testificam de mim"; e Isa.
34. 16 - "Buscai no livro do Senhor, e leia.").
Àqueles que lerem e compreenderem são
pronunciadas bênçãos, (Apo 1. 3 - "Bem-
30
aventurado aquele que lê, e os que entendem as
palavras desta profecia."). Se isso for verdade em
relação a esse livro particular do Apocalipse,
muito mais é verdade em relação à Bíblia em
geral.
Deve ser considerado, que todas essas
instruções abundantes que estão contidas nas
Escrituras foram escritas para que pudessem
ser entendidas; caso contrário, não seriam
instruções. Aquilo que é dado e o aluno não pode
compreender, não é dado para a instrução do
aluno, a menos que nos esforcemos para
crescer no conhecimento da divindade, pois
uma grande parte dessas instruções será para
nós em vão, quando não podemos receber o
benefício na leitura das Escrituras, pois é
necessário que compreendamos o que lemos.
Temos razões para louvar a Deus por nos ter
dado tão variada e abundante instrução na Sua
Palavra; mas seremos hipócritas ao fazê-lo, se
depois de tudo, nos contentarmos com pouco
desta instrução.
Quando Deus abriu um grande tesouro diante
de nós para o atendimento de nossos desejos, e
Lhe agradecemos por nos ter dado tanto; mas ao
31
mesmo tempo, estamos dispostos a permanecer
na miséria, enquanto o temos ao nosso alcance,
porque somos preguiçosos demais para
recolhê-lo, isso não vai mostrar a sinceridade de
nossa gratidão.
Estamos agora sob muito maiores vantagens de
adquirir conhecimento da divindade, do que o
povo de Deus no passado, mas se somos
negligentes com as nossas vantagens, nunca
poderemos ser melhorados por elas.
6. No entanto, por mais diligentes que sejamos
em nossa aplicação ao estudo, há espaço
suficiente para aumentar nosso conhecimento
da verdade divina. Ninguém tem essa desculpa
para dar, por não se aplicar diligentemente para
adquirir conhecimento da divindade, com o
falso sentimento de já saber muito; nem podem
dar essa desculpa, por pensar que não há
necessidade de se aplicar diligentemente, a fim
de saber tudo o que há para ser conhecido.
Há espaço suficiente para empregar-nos para
sempre nesta ciência divina, com a maior
aplicação possível. Aqueles que se aplicaram
mais e têm estudado por muito tempo, e fizeram
32
as maiores realizações neste conhecimento
sabem, senão pouco do que há para ser
conhecido. O assunto é inesgotável.
O Ser divino, que é o tema principal desta
ciência, é infinito, e não há fim para a glória de
Suas perfeições. Suas obras ao mesmo tempo
são maravilhosas, e não podem ser levadas até a
perfeição de conhecimento, especialmente a
obra da redenção, sobre a qual a ciência da
divindade é principalmente focada, e cheia de
maravilhas insondáveis.
A Palavra de Deus, que é dada para a nossa
instrução na divindade, contém o suficiente
para dela nos ocuparmos até o fim de nossas
vidas.
7. É, sem dúvida, que diz respeito a cada um se
esforçar para se destacar no conhecimento de
coisas que pertencem à sua profissão ou
vocação principal. Se, se trata de homens para se
destacarem em qualquer coisa, ou em qualquer
sabedoria, ou o conhecimento, certamente lhes
diz respeito se destacarem nos assuntos de sua
profissão principal e trabalho. Mas a vocação e
trabalho de cada cristão é viver para Deus; isto é
33
dito ser sua vocação, Filipenses 3. 14. Este é o
negócio, e, se assim posso dizer, o comércio de
um cristão, seu trabalho principal, e na verdade
deveria ser o seu único trabalho, portanto
certamente o cristão deve se esforçar para ser
bem familiarizado com as coisas que pertencem
a este trabalho, para que possa cumpri-lo.
8. Pode-se argumentar, portanto, que Deus
determinou uma ordem de homens para este
fim, para ajudar pessoas em adquirir
conhecimento nestas coisas. Ele tem
determinado que eles sejam mestres, 1 Cor 12.
28 – “E a uns pôs Deus na igreja; primeiro
apóstolos, em segundo profetas, em terceiro
mestres.” Efésios 4. 11, 12 - "Ele deu uns para
apóstolos, outros para profetas, outros para
evangelistas, alguns para pastores e mestres,
para o aperfeiçoamento dos santos, para a obra
do ministério, para a edificação do corpo de
Cristo". Se Deus os chamou para serem mestres,
então o negócio deles é o de transmitir
conhecimento. Mas que tipo de conhecimento?
Não o conhecimento da filosofia, ou das leis
humanas, ou das artes mecânicas, mas da
divindade.
34
Se Deus tornou o negócio de alguns serem
mestres, segue-se, portanto que fez o negócio
dos outros serem aprendizes.
O nome pelo qual os cristãos são comumente
chamados no Novo Testamento é discípulos,
cujo significado é “estudiosos ou alunos”. Todos
os cristãos são colocados na escola de Cristo,
onde seu negócio é aprender, ou receber o
conhecimento de Cristo, seu mestre e professor
comum, bem como a partir desses professores
inferiores nomeados por Ele para instruir em
Seu nome.
9. Deus nos tem revelado claramente nas
Escrituras, qual é a Sua vontade; que todos os
cristãos devem diligentemente se esforçar para
se sobressaírem no conhecimento das coisas
divinas. É a vontade revelada de Deus, que os
cristãos não só devem ter algum conhecimento
das coisas desta natureza, mas que devem ser
enriquecidos com todo o conhecimento: 1 Cor 1.
4, 5. "Dou graças a Deus sempre em seu nome,
pela graça de Deus que vos foi dada em Jesus
Cristo, porque em tudo fostes enriquecidos
nele, em toda palavra e em todo conhecimento."
35
Então, o apóstolo orou fervorosamente, que os
cristãos filipenses abundassem mais e mais, não
só no amor, mas no conhecimento cristão;
Filipenses 1. 9. "E peço isto: que o vosso amor
aumente mais e mais no pleno conhecimento e
em todo o discernimento."
Assim, o apóstolo Pedro aconselha a "dar toda a
diligência para adicionar à fé a virtude, e à
virtude o conhecimento", 2 Pedro 1. 5.
O apóstolo Paulo, no próximo capítulo a esse em
que está o texto que estamos comentando,
aconselha os cristãos hebreus, a deixarem os
primeiros rudimentos da doutrina de Cristo,
para prosseguirem até a perfeição.
Ele não desejaria de modo algum, que eles
sempre descansassem apenas nas doutrinas
fundamentais do arrependimento e fé, da
ressurreição dentre os mortos, e o julgamento
eterno, em que foram instruídos quando foram
batizados, em sua primeira iniciação no
cristianismo.
36