Compreender Spinoza - Resumo

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FACULDADE PADRE JOÃO BAGOZZI Ronaldo Ferreira Marcelo Marques Duarte Vitor Luiz Rigoti dos Anjos Compreender Spinoza

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Compreender Spinoza - Resumo

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FACULDADE PADRE JOO BAGOZZI

Ronaldo Ferreira

Marcelo Marques DuarteVitor Luiz Rigoti dos Anjos

Compreender SpinozaCURITIBA / PR

2010

Ronaldo Ferreira

Marcelo Marques DuarteVitor Luiz Rigoti dos Anjos

Compreender Spinoza

Trabalho da disciplina de Metafsica, do curso de Filosofia da Faculdade Padre Joo Bagozzi.Professor: Osmar PonchirolliCURITIBA / PR

2010ndice

Introduo4Biografia e Introduo ao pensamento de Spinoza4O status de falsidade5O indivduo6O esprito como ideia do corpo6Fsica da individualidade7A afirmao ontolgica do indivduo8A Tenso da Experincia: As paixes e o poder9Uma lgica passional: a imitao afetiva9Uma histria passional do poder11O Imaginrio e a Razo: A consistncia do imaginrio12Status da Revelao e do conhecimento proftico12O mtodo de interpretao da Escritura13Teoria do imaginrio religioso13A Lei e a obedincia14A Poltica e a Potncia15O Direito e a Potncia15Os limites da problemtica jurdica do pacto social15A emergncia do poder poltico e a constituio de um direito comum16Comunicao dos afetos e instituies polticas: a individualidade composta do Estado16A Virtude e a Beatitude17A crtica dos valores17O modelo da natureza humana como princpio de seleo18O devir ativo do indivduo18O desejo racional e o til prprio19O universal concreto19A experincia da necessidade como libertao19A virtude, o tempo e a eternidade20Concluso20Introduo

Este trabalho dedicado a mostrar em poucas pginas a vida e a obra de Baruch (Bento) de Spinoza, seus principais pensamentos e os conceitos que derivam de uma leitura de suas obras feita por Hadi Rizk, autor do livro Compreender Spinoza, de onde foram tiradas as informaes contidas nas pginas a seguir.Biografia e Introduo ao pensamento de Spinoza Spinoza nasceu em 24 de novembro de 1632, em Amsterd, de uma famlia de negociantes Judeus de origem Portuguesa. Morreu aos 44 anos de tuberculose.

Em 1639, Spinoza comea seus estudos na escola, no talmud, e aprende o Hebraico. Aos vinte anos, participa das atividades de negcios da famlia.

Na dcada de 1650, Espinosa se aproxima de Francisco, um ex-Jesuta que se tornou livre-pensador partidrio do regime republicano das provncias unidas. Spinoza se recusa a renegar as opinies destas e racionalistas que lhe so apresentadas; rompe com a comunidade Judia da qual excludo no dia 27 de julho de 1656.

Ele se forma no ofcio de lapidador de vidros de tica para ganhar a vida, mas ajudado, financeiramente, por amigos ou personagens influentes. Spinoza estuda o cartesianismo, avalia as controvrsias suscitadas pela filosofia inaugurada por Descartes e situa-se crtico em relao s objees feitas a Descartes e s respostas dadas por este.

A leitura de Descartes permite que ele se afaste um pouco mais da escolstica e se aproprie dos instrumentos conceituais forjados por Descartes (sobre a infinitude de Deus). Ele escreveu o tratado sobre a reforma do entendimento, sobre o qual ele leciona a um crculo de amigos e de amadores da nova prtica da filosofia. Em 1663, publica os princpios da filosofia de Descartes, seguidos de pensamentos Metafsicos.

Ele faz uma apresentao de anlise e de trabalho terico sobre os principais conceitos da metafsica. Em sua obra tica segundo a ordem geomtrica, ele fala de Deus como potncia infinita de produzir, da natureza verdadeira do esprito, da teoria do indivduo, das paixes e, enfim, do itinerrio suscetvel de conduzir os homens beatitude.

No ano de 16691670, Spinoza vive em Haia, onde publica, sob anonimato, o Tratado Teolgico Poltico. Este livro constitui a interveno filosfica de Spinoza na crise poltica religiosa que agita os Pases Baixos.

A concepo Spinoziana da substncia a mais radical que j se props em um campo filosfico. Aristteles dizia: a substncia aquilo que no existe em outro e no se predica de outro. Para a metafsica antiga, alm disso, as substncias eram mltiplas e hierarquicamente ordenadas e o prprio Descartes havia se pronunciado a favor da existncia de uma multiplicidade de substncias. Spinoza prossegue nessa linha, mas dela tira as consequncias extremas. A substncia aquilo que existe em si, e existe concebido por si mesmo, e uma vez que todas as coisas ou existem em si ou existe em outro, Spinoza coloca-se em oposio ao pensamento cartesiano, partindo da definio clssica do conceito de substncia como aquilo que no precisa de nada para existir. Para Spinoza, s uma substncia pode existir, e essa substncia deve ser Deus; a matria e o esprito no devem ser considerados substncia, mas sim atributo (manifestaes) da nica substncia. Spinoza d a definio de Deus como substncia (aquilo que no precisa de nada para existir) e faz uma srie de consideraes: Deus nico, perfeito, auto-suficiente, dotado de infinitos atributos, que s em parte os homens conseguem perceber e compreender.Enfim, o convite leitura de Spinoza requer que o leitor abandone todos os seus preconceitos e refgios para compreender a natureza humana, que no estar abandonada, pois est inserida no seio da natureza do ser humano.

O status de falsidade

Nada existe de positivo nas ideias que constitua a forma de falsidade. Ora, a falsidade no pode consistir numa privao absoluta (no so, com efeitos, os corpos, mas as almas que erram e se enganam); nem tambm numa ignorncia absoluta; com efeito, ignorar ou enganar-se so as coisas diferentes. Consiste, portanto, numa privao de conhecimento que est envolvida num conhecimento inadequado das coisas, isto , nas ideias inadequadas e confusas.

Da se segue que o esprito humano uma parte da inteligncia infinita de Deus; e, consequentemente, quando dizemos que o esprito humano percebe tal ou tal coisa, no dizemos que Deus, no enquanto infinito, mas enquanto se exprime pela natureza do esprito humano, ou seja, enquanto constitui essncia do esprito humano, tem tal ou tal ideia, no somente enquanto constitui a natureza do esprito humano, mas enquanto tem tambm, simultaneamente como esprito humano, a ideia de outra coisa, ento dizemos que o esprito humano concebe essa coisa parcialmente, ou seja, inadequadamente.

Ora o conhecimento adequado dos corpos exteriores, do mesmo modo que o conhecimento das partes que compem o corpo humano, existe em Deus enquanto ele considerado no como afetado pelo esprito humano, mas por outras ideias dessas afeces, consideradas nas suas relaes apenas com a alma humana, so como consequncias sem as suas premissas, isto (o que evidente por si), ideias confusas.

O status da falsidade com ideia inadequada revela, pois, uma dificuldade de que se encontra no prprio corao da definio do Esprito humano: de fato, o esprito humano no somente uma parte do entendimento divino e um modo do pensamento, mas tambm uma ideia do corpo.O indivduo

A compreenso da individualidade necessria para explicar a estrutura das ideias inadequadas no seio do entendimento humano.

Para conhecer a existncia do homem, preciso mudar de campo e estudar certas modificaes dos atributos de Deus.

O esprito como ideia do corpo

A ideia constitui, em primeiro lugar, a realidade do esprito humano.

O sentimento em nosso esprito a ideia de alguma coisa que no o nosso esprito, uma ideia que, alis, no poderia ser reduzida s s claras e distintas do entendimento puro.

O indivduo aparece assim com um modo singular da potncia de ser e de produzir, o que implica uma nova concepo da finitude: longe de ser uma privao, ou ainda o status de uma criatura que depende de um ser transcendente, o indivduo o resultado do processo finito de causas finitas. Com efeito, caso se compreenda conceitualmente a distino radical entre o corpo e o esprito, deve-se poder conceber a igualdade de ser do corpo e do esprito, porque exprimem a mesma modificao de ser de uma realidade absolutamente infinita. Por esse motivo intil, at perigoso, procurar isolar pelo pensamento o corpo e o esprito como duas coisas separadas que deveramos em seguida unir realmente sob uma terceira substncia.

Numa palavra, a experincia individual a experincia de um devir afetivo tico, experincia de uma transformao tica da existncia em que pode ser afetada a passagem do esprito como conhecimento da essncia do corpo, nos atributos de Deus. Somente num segundo tempo, quando o esprito, em seguida a um dever cada vez mais ativo do indivduo, forma ideias adequadas, que pode conhecer a essncia do corpo.

Fsica da individualidade

O indivduo uma realidade constituda pela unio de corpos que concorrem entre eles, segundo leis mecnicas. Por coisas singulares Spinoza entende as coisas que so finitas e que tm uma existncia determinada. Se acontecer que vrios indivduos concorrem para uma mesma ao, de tal modo que todos em conjunto sejam a causa de um mesmo efeito, considerando-os, ento, todos juntos como constituindo uma mesma coisa singular.O corpo em geral uma parte da extenso, cuja identidade numrica alterada se uma parte da matria que o compe subtrada; em compensao, o corpo do homem est unido a uma alma cuja unidade indivisvel se aplica realidade psicofsica assim formada: o corpo do homem evolui durante a existncia, partes suas so retiradas, outras so acrescentadas a ele, por exemplo, durante o crescimento, mas sua unidade de conjunto permanece apesar de tais variaes.

Isto quer dizer que o indivduo deve ser compreendido como uma realidade composta, que s vezes segundo as relaes mecnicas da matria e como afirmao de uma potncia de ser. Tal fora a expresso, nesse ser singular, da causalidade do infinito, imanente a todas as coisas. preciso acentuar que a essncia do corpo, assim como o corpo existe atualmente, depende de Deus; ela no se produz por ela mesma, mas possui em Deus, a sua causa. A essncia mantm no atributo uma relao qualitativa de comunidade com todas as outras essncias singulares.

Na realidade, Deus, ou o infinito, sempre causa prxima do finito; a prpria produtividade do infinito que se compreende no atributo, onde as essncias de modo constituem intensidades singulares, na extenso modal, onde se manifestam corpos distintos uns dos outros, tendo a existncia de cada um deles por condio, em parte, a ao de outros corpos. Do finto ao indivduo, o ser da substncia se exprime na potncia singular como potncia do mltiplo.

Os corpos simples se distinguem entre eles pelo movimento e pelo repouso, pela velocidade e pela lentido. No formam um indivduo distinto seno sob a nica condio que um, por exemplo, se desloca, enquanto o outro permanece imvel, ou se movem a velocidades diferentes; seu contato limita-se ao princpio da inrcia.Assim fica claro que a identidade individual no pode ser concebida fora das relaes que o indivduo suscetvel de manter com o mundo exterior. O corpo humano , por conseguinte, um indivduo marcado pela riqueza de suas afeces, quer dizer, das suas relaes com o mundo exterior. Ele pode modificar o mundo e ser modificado ele em razo de sua aptido a ser afetado, que ao mesmo tempo ampla e est em condies de evoluir.

A afirmao ontolgica do indivduo

As aptides do indivduo a ser afetado contm, por conseguinte, afeces ativas e passivas. Mas como o indivduo no causa de si, sofre a ao de outros corpos que agem sobre ele, quer dizer que produzem nele ou o foram a produzir afetos que no so explicados s pela potncia, na medida em que esta est bloqueada, impedida, ou ainda separada de sua prpria potncia enquanto causa adequada de tais efeitos. A potncia do agir de uma coisa singular real, mas no infinita nem onipotente.

No entanto a essncia do indivduo, enquanto grau de potncia, permite pensar a verdadeira tenso ontolgica que marca a exigncia do indivduo.

De fato, o indivduo no pode tudo e sem importar o qu; sua existncia se explica pela causa sui, mas permanece distinta dela, em razo da diversidade dos modos que afetam e determinam o seu ser. As variaes da potncia de agir derivam da histria do indivduo, das relaes que o curso de sua existncia tece, ao passo que a sua potncia de agir depende, enquanto tal, da essncia eterna.

O ser infinito coextensivo vida individual cuja finitude envolve sempre uma essncia atual e, sobretudo, atuante. O esforo pelo qual cada coisa tende a perseverar no seu ser no envolve tempo finito, mas um tempo indefinido.

As coisas manifestam o sinal de nossa impotncia atravs do poder real que nossas iluses lhe prestam. Na ideia de finalidade, ideia que as coisas so regidas por intenes, a causa da dificuldade em compreender especulativamente o sentido da necessidade. O contato a afirmao existencial da causalidade prpria de um indivduo. O desejo se desenvolve como uma tendncia a buscar seletivamente as paixes que aumentam a potncia de agir ao encher a aptido a ser afetada de relaes que se compem com a proporo que constitui a unidade do indivduo.

Tal indivduo no uma totalidade fechada, encerrada sobre si mesma, mas um ser constitudo de relaes internas entre suas partes constituintes e de relaes externas com os outros indivduos.

A verdadeira vida consiste em aumentar o seu poder de agir, constituindo-se o mais adequadamente possvel. Tal determinao por si confunde-se com o amor unitivo a Deus, a sua potncia infinita. Fica claro assim que Deus, quer dizer, a Natureza, forma a condio e horizonte de uma afirmao ontolgica da potncia humana de agir e de produzir; o ser pura potncia de afirmao da existncia; o ser infinito coextensivo vida individual e ontologia, finalmente, inteiramente uma tica, quer dizer uma inveno seletiva do que aumenta a potncia de agir.

A Tenso da Experincia:

As paixes e o poder

A antropologia das paixes um ponto privilegiado entre a metafsica e a poltica. A unidade do indivduo no explicada pela unidade substancial de alma e corpo vindo a alma garantir uma individuao do corpo composto , mas por relaes invariantes de movimento e de repouso.

Tal ligao modal entre os corpos determina as paixes como relaes fsicas de troca de potncia; o jogo das paixes apresenta assim uma amplitude infinita que comporta relaes interindividuais de harmonia e de unidade como relaes de divises e de oposio.

Uma lgica passional: a imitao afetiva

A relao de poder nasce na experincia das paixes da prova dos limites da potncia. O efeito de nosso desejo real, atravs da valorizao que provoca da coisa desejada e da busca que desencadeia. O fim que guia nossa ao se apresenta ento ficticiamente como o preliminar e o motor do desejo, impondo-se a ele como imagem de perfeio da coisa. Os homens procedem em todos os seus atos com vista a um fim, a sabe, a utilidade, de que tm apetncia; daqui o motivo por que sempre se empenham em saber o somente as causas finais dos acontecimentos j passados e ficam tranquilos quando as ouvem dizer, certamente no por terem uma causa que os leve a propor dvidas para alm disso. Se no puderem, porm vier a sab-las por outrem, nada mais tm a fazer do que voltarem-se para si mesmos e refletirem sobre os fins por que habitualmente se determinam em atos semelhantes, e desta maneira, julgam necessariamente a compleio alheia pela sua prpria.

Aps ter interpretado a natureza segundo uma finalidade imaginria, os homens projetaram a sua prpria imagem falsa de si mesmos sobre o comportamento desses diretores da natureza ou deuses, que se pensava que organizavam todas as coisas em vista do homem, para recompens-lo ou puni-lo.

A alteridade das coisas se conjuga com nossa prpria finitude e este mecanismo bata para produzir a estranheza das coisas, que se aparenta com um poder, por trs do qual se perfilam a inteno transcendente e o poder misterioso de Deus. Ento transferimos a eles nossa prpria potncia pelo simples fato de que somos passivamente afetados por elas e viemos imaginariamente essa situao. Na medida em que as coisas nos resistem ou nos escapam, nosso desejo experimenta a sua prpria impotncia, acentuada por sentimento de medo, de esperana e de desespero, numa oscilao infernal que vai da esperana ao desespero, do desespero a superstio, da superstio a novas frustraes.

A imitao das afeces produzida como uma experincia pr-reflexiva, que determina uma identificao com a outra como a mesma que si mesmo, numa extenso de nossa imaginao ao corpo e s afeces de outrem.

No de admirar que um dos primeiros sentimentos atingidos pela imitao seja a piedade (ou comiserao), no podemos nos regozijar com a tristeza de uma coisa semelhante a ns, pois isso seria indiretamente o dio em relao a ns mesmos.

assim que a piedade, ou comiserao, engendra a benevolncia, que um desejo do indivduo de usar todo o seu poder para destruir o que gera a tristeza do outro. O primeiro empreende o mximo para ajudar o segundo e p-lo assim em situao de dependncia em relao a ele; ao destruir aquilo que causa a sua tristeza, ele destri ao mesmo tempo o perigo para ele mesmo de experimentar a mesma alterao de sua potncia de agir.

Podermos desde j indicar, a propsito deste gnero de poder, que se baseia menos na vontade que nos desejos e nas aes; um poder que faz fazer e desejar, mais do que impede ou reprime.

A ambio o prolongamento lgico da comiserao, o desejo de obrigar o outro a se submeter ao nosso poder, levando-o a nos reconhecer como a causa da sua alegria. A glria, enfim, coroa este ciclo.

As ocorrem como se nos amssemos a ns mesmos atravs do amor que inspiramos nos outros, dado que esse amor que nos leva a outro o reconhecimento de nosso poder, bem como o desejo de tirar proveito dele.

Tambm este outro, ao qual o primeiro estava unido no ciclo de benevolncia, de ambio e de glria, se torna um ser oposto, um rival, at um inimigo, quando o benfeitor experimenta afeces pelas quais includo em outras redes de desejo, de amor e de dio. Corre risco de encontrar-se na posio daquele que procura o poder (piedade), ora na posio daquele que oferece o poder (benevolncia). A ambio pode sempre transformar-se em desejo de hegemonia, at de dominao, quando buscamos impor-nos ao outro, que se tornou terceiro, que compartilha nossas prprias afeces.

a inveja, no fundo, que pe um freio ambio de dominao.

A imitao das afeces no produz espontaneamente nenhuma unidade real. Para existir, a concrdia deve ser comandada por um objeto verdadeiramente comum a todos, de tal maneira que o desejo de tal objeto suscite uma relao de unio de todos tanto mais forte porque acompanhada de um aumento de potncia de agir de cada um.

Uma histria passional do poder

Como no estado natural cada um senhor de si prprio enquanto pode defender-ser de forma a no sofrer a opresso de outrem, e porque, individualmente, o esforo de autodefesa se torna ineficaz sempre que o direito natural humano for determinado pelo poder de cada um, ou pelo menos s ter na realidade uma existncia puramente terica, porquanto no h nenhum meio seguro de conserv-lo.

Esse tem o outro em seu poder, que o mantm aprisionado, ou ao qual tomou todas as armas, qualquer meio de se defender e de escapar, ou a quem soube inspirar temor, ou que a si ligou por favores, de tal maneira que esse outro lhe queria agradar a si mesmo, e viver segundo o desejo de seu senhor mais que vier consoante o seu prprio desejo. Mas o primeiro e o segundo meios de manter um homem em seu poder concernem ao corpo e no alma enquanto que atravs do terceiro meio ou do quarto apoderamo-nos do corpo e da alma, mas no os dominamos seno enquanto duram o temor e a esperana; se estes sentimentos vm a desaparecer, aqueles de que se era senhor torna-se seu prprio senhor.

Trata-se ento de um processo circular, mas esse crculo auto-produtivo, isto , obedecemos porque o poder forte, mas esse poder forte porque obedecemos a ele e ele no outra coisa que o poder da multido (quer dizer, de todos), assim como esse poder se forma no jogo das paixes interindividuais que afetam o estado de natureza. O poder nasce no estado natural pelo fato de que uma mesma coisa a potncia de todos pe-se a inspirar em todos o temor e a esperana.

O Imaginrio e a Razo:A consistncia do imaginrio

A imaginao no contm, como tal, nenhum erro e no , portanto, um mal; a falsidade consiste somente em que o esprito est privado do conhecimento de uma ideia que exclui a presena das coisas que a imaginao representa como atuais.

Status da Revelao e do conhecimento proftico

Certamente possvel considerar a Revelao como um conhecimento fictcio, construdo com a ajuda de sinais exteriores, impressionantes, emprestados da sensibilidade. Quanto ao conhecimento que se pode chamar de proftico, ele apela para a sensibilidade e a imaginao.

O poder imaginativo mais vivo acompanhado de um conhecimento terico bastante fraco.

Toda certeza proftica repousava, pois, sobre estes trs fundamentos:

1. Eles imaginavam as coisas reveladas com muita vivacidade, como ns nos acostumamos a fazer quando, duramente a viglia, somos afetados por objetos;2. O sinal;3. E principalmente o seu corao no tinha inclinao seno para o justo e bom.

Acuidade da imaginao, piedade e sendo do Bem, do Justo e, a importncia, enfim, do sinal milagroso permitem assegurar-se da autenticidade da revelao; este sinal, ligado ao temperamento e s crenas do profeta, persuade este ltimo, bem como aquele que os escutam.

Podemos adiantar assim que a realidade do imaginrio de fato a realidade do pensamento que imagina e a do objeto imaginado, em relao com uma existncia que experimenta corporalmente as coisas do mundo.

O mtodo de interpretao da Escritura

A ideia-fora que os significados devem ser abordados como fatos.

O significado cobre um leque de sentidos, que podem ligar a mesma palavra a diversas ideias ou imagens, do abstrato ao concreto, do liberal ao figurado, do objetivo ao conceitual, etc. Noutros sentidos, a experincia, bem como a cultura e a histria de um povo que vm guiar a interpretao, ao limitar os riscos arbitrrios.

Um enunciado claro ou obscuro conforme seu sentido facilmente ou dificilmente percebido pela Razo que se serve do contexto; pois aqui nos ocupamos com o sentido dos textos e no com sua verdade.

necessrio completar essa subira progressiva para os princpios e as leis gerais, procedendo da mesma maneira que nas cincias da natureza, descendo em seguida a investigao para os fatos particulares.

Do Pentateuco so coerentes em sua fatura e seu tipo de inteligibilidade com o sentido e a funo da Escritura, que consistem em persuadir os homens a obedecer aos mandamentos de Deus como se emanassem de um senhor todo-poderoso.

As questes fundamentais relativas a existncia humana so postas e elaboradas num texto marcado pela imaginao; essas questes so formuladas segundo uma lgica de pensamento afetivo ou imaginrio, mas os significados e as avaliaes produzidas esto efetivamente presentes na experiencial.

Teoria do imaginrio religioso

Convm lembrar que toda afeco compreende um carter particular, que exprime a ordem e as afeces do corpo individual, visto que a afeco envolve a natureza do corpo prprio e a do corpo exterior. As relaes de inadequao e de passividade no probem que o imaginrio produza afeces que sejam ao mesmo tempo passivas e comuns, a saber, uma forma de comunicao intersubjetiva est presente nas avaliaes feitas das afeces de bom e de mau.

A teoria do imaginrio religioso compreende uma parte explicativa, que explica a lgica afetiva. completada com uma interpretao que prope um comentrio prtico e normativo do sentido desse discurso. Por isso necessrio pr em evidncia as crenas e estudar os significados que elas esto em condies de desenvolver: afeces partilhadas, esperana e medo, valores como justia e a piedade.

O imaginrio transforma completamente a abordagem da religio. No deixa de ser indispensvel contestar a aparncia de transcendncia que o poder poltico, tambm, procura dar a si mesmo, ao dissimular o fato que todo poder procede da prpria potncia dos indivduos.

A Lei e a obedinciaA palavra lei, tomada de modo absoluto, aplica-se todas as vezes que os indivduos, tomados de um a um, quer se trate de totalidade dos seres ou de alguns da mesma espcie, se conformam com uma s e mesma regra de ao bem determinada; por outro lado, uma lei depende ora de uma necessidade da natureza, ora de uma deciso dos homens.O homem pertence natureza e no pode formar algo como um Estado no Estado, que escaparia s leis gerais da natureza; na realidade, porque o homem uma parte da natureza, portanto uma parte de sua potncia, que certas leis so explicadas por decises humanas, que so as causas prximas.A transformao metafrica da lei como relao de necessidade numa lei que exprime o mandamento de um legislador tem por origem o fato de que os homens desarrazoveis tem necessidade de representar-se uma ligao em exterioridade entre as regras de uma conduta racional e os efeitos gerados por uma ao esclarecidas. Em contrapartida, a educao do homem entregue as paixes necessita que a lei esteja ligada a uma recompensa ou a uma punio.A Poltica e a Potncia ... o direito natural da Natureza inteira, e consequentemente de cada indivduo, estende-se at onde vai a sua capacidade ... pois ... a prpria potncia da natureza a mesma potncia de Deus, que tem sobre todas as coisas um direito soberano.

A potncia infinita no depende de um poder, no deve ser imaginada como uma liberdade em funo de um modelo exterior. A substncia existe como ... aquilo cujo conceito no carece do conceito de outra coisa do qual deva ser formado.

A causa infinita imanente a seus efeitos, age nela mesma, sobre ela mesma e no sai de si: Deus a potncia infinita de existir.O Direito e a Potncia O direito soberano de Deus a sua potncia infinita, em ato e cheia de efeitos que dela decorrem. O homem parte da natureza, seu direito exprime a potncia de agira e produzir, decorrente de sua essncia particular; assim. todos os seres tm um direito natural que depende de sua potncia. Direito ou potncia de uma indivduo o desejo ou esforo que ele faz para perseverar no seu ser no uma faculdade subjetiva, uma fora ilimitada, mas finita. A poltica uma interveno de todos sobre a relao de poder para que haja ordem e unio das potncias de agir dos indivduos no pode limitar-se instaurao voluntria da soberania.Os limites da problemtica jurdica do pacto social O direito natural inalienvel, o desejo, a potncia de ser do indivduo como o indivduo pode renunciar a esse direito-potncia sem renunciar a ser ele mesmo?

No se renuncia ao direito natural; apenas certos desejos do indivduo encontram-se determinados pelos de outrem. Spinoza lembra que s o til prprio pode determinar o nosso agir; adeso lei do soberano segundo seu decreto prprio; no pode haver abandono total de soberania pelos indivduos. Existem limites da religio na constituio da ordem poltica: a fico teocrtica torna frgil a unidade poltica cabe ento ao poder poltico criar e reforar as instituies pelas quais os mandamentos e as leis chegam a ser desejados e seguidos.A emergncia do poder poltico e a constituio de um direito comum O poder poltico existe pelo poder annimo e coletivo produzido pelo jogo passional das potncias individuais, sob influncia de uma paixo comum, enriquecida pela indignao (dio que sentimos por quem faz mal a algum semelhante a ns), a qual dissolve a diviso do temor e forma uma conjuno de foras. A conjuno de foras no exige qualquer mediao ou conveno possvel que a multido se reaproprie do seu prprio poder, tornando-a direitos reais distribudos a cada um dos membros, levando a um reforo da disciplina coletiva, a uma melhor cooperao, uma unio cada vez mais adequada e uma reciprocidade mais ativa.Comunicao dos afetos e instituies polticas:a individualidade composta do Estado A natureza no cria povos, mas indivduos homens no nascem cidados, mas tornam-se cidados: o indivduo no pertence ao todo do Estado como um rgo. A poltica tem a tarefa essencial de fazer cada um se identificar ao mximo com o sentido do Estado. Para isso, as instituies servem como aparelhos de integrao efetiva, produo e desenvolvimento da unidade almejada pela poltica. So trs as modalidades do poder de decidir e comandar: poder consultivo, poder executivo e poder de controle existem para o aumento da potncia de agir individual, circular o poder, fortalecendo a cidade ao reforar o poder de cada um. O direito da cidade definido pelo poder das massas vivendo em paz e concrdia todos desenvolvem seus recursos e sua existncia. O regime de propriedade, o exrcito e a religio devem ser arranjados de modo que tudo se desenvolva favorecendo a entreajuda e cooperao, limitando os riscos de antagonismo e estabelecendo o equilbrio coletivo. O Estado como um indivduo coletivo, homlogo ao indivduo fsico sua fora o consentimento efetivo entre indivduos ligados em interdependncia: ningum aliena ou transfere sua potncia seno para efetuar o poder e conquistar novos direitos.A Virtude e a Beatitude O ser individual chamado a juntar-se ao modelo que ele fixou para si mesmo e a atingir seu destino, a perfeio visada: de um si-mesmo inacabado a um si-mesmo realizado. Spinoza busca uma maneira de viver e existir, uma afirmao espontnea e reflexiva, normativa e imanente, do desejo como fora de ser e do ser como potncia desdobrada, real e atuante. Tal maneira de viver reflete-se na potncia tica: a afirmao da fora e da razo, realizao do desejo e do universal concreto, exaltao do til prprio e da aliana com os outros. A tica subverte a preocupao mortal em proveito da virtude como conhecimento e apropriao reflexiva pelo ser singular de sua prpria essncia.A crtica dos valores Noes como (im)perfeito so criticadas como modos de pensar, fices devidas a comparaes malfeitas ou a uma projeo ilusria do desejo sobre a realidade das coisas. H segundo Espinosa a relao: Perfeio conformidade ao desgnio finalidade relativa, sentido/objeto do desejo; este a ideia de afeco do corpo a ser vivida como realizao de uma inteno e busca de um sentido. A noo de fim uma fico com a qual se alimentam todas as morais, e que pode aparecer como um operador da realidade. O aumento da potncia de agir se torna o horizonte de existncia do indivduo concebido como realidade finita, inscrito no tecido da natureza, exposto a ser arrastado numa direo.O modelo da natureza humana como princpio de seleo Em Deus h igualdade da potncia de agir e da potncia de existir; os seres finitos so dependentes de uma sequncia indefinida de outras causas e sujeitos a afeces muito diversas. As noes seriam um modo de relacionar algum a um modelo construdo da realidade humana para normatizar as condutas. Tal modelo concebido como um ideal, um uso retificado da ideia da existncia baseado na seleo de afeces e aes, orientadas para uma finalidade: bom significa assim til com certeza Imperfeio relacionada com uma realidade efetiva da potncia de agir, que cresce ou diminui em funo das afeces; a essncia no varia, somente a proporo entre afeces pode mudar.O devir ativo do indivduo Desafio tico: desdobrar a potncia de agir mxima de modo que a essncia se exprima ao mximo na existncia. Como Spinoza entende por desejo todos os esforos, impulses, apetites e volies do homem, variveis e no raro extremamente opostas, ele mostra que ideias adequadas tornam o desejo mais ativo; nossa potncia mxima de agir nos ajuda a formar ideias mais adequadas, que conduzem a experincias mais ricas, a desenvolver a razo. Cada um se esfora para perseverar no seu ser: o homem tem potncia de inveno, de desenvolvimento e de afirmao do ser finito, numa intensidade que excede a si mesma por exprimir a fora do infinito no prprio corao do finito.O desejo racional e o til prprio O desejo nossa nica fora, inseparvel do esforo para imaginar a buscar tudo o que aumenta a potncia de agir desejo, corpo e mundo no so rejeitveis. O empreendimento da tica realizar efetivamente o combate do bom contra o mau em vez de perder-se no combate por valores. Spinoza mostra o ser como abertura ao infinito cada indivduo deseja exprimir-se atravs da experincia tica do corpo: a potncia de agir se afirma como unidade em ato da razo, da atividade e da virtude. Quanto mais cada um se esfora e pode procurar o que lhe til, isto , conservar o seu ser, tanto mais dotado de virtude.

O universal concreto Spinoza conceitua a virtude como o desejo de ser, cada vez mais atuante, como um conhecer e uma prtica da necessidade, que coordena a experincia segundo o til prprio aberto, pela razo, em direo do outro. Cabe a cada um exprimir essa natureza, inventando-a como um universal concreto: Nada mais til ao homem que o homem sugere o esforo conjunto de todos em conservarem seu ser, em concrdia. O universal e a unio de foras vo lado a lado ningum pode desejar: possuir a beatitude [felicidade], agir bem e viver bem, sem desejar ser, agir e viver, isto , existir em ato. O homem racional deseja um bem comum a todos: o bem supremo daqueles que seguem a virtude comum a todos, e todos podem igualmente alegrar-se com ele.

A experincia da necessidade como libertao O indivduo experimenta a potncia de sua prpria razo medida que toma conhecimento dela, provando ao mesmo tempo a alegria que nasce da compreenso de sua potncia de agir como causa adequada do que lhe acontece. o conhecimento de Deus, o qual a razo visa como objeto supremo, aquilo que pode libertar-nos de toda a iluso dos outros mundos: quem conhece a si mesmo e suas afeces clara e distintamente ama a Deus [...] este amor para com Deus deve ocupar o Esprito acima de tudo.

A razo exprime a potncia do Esprito sobre as afeces e fundamenta ao mesmo tempo a liberdade humana.

A virtude, o tempo e a eternidade A razo busca dominar a temporalidade segundo uma lgica da necessidade, combatendo os efeitos imaginrios suscitados pela alternncia da presena e da ausncia tpicas da existncia do corpo. a experincia do corpo como esforo seletivo e desejo racional que torna o Esprito apto a conhecer a necessidade infinita, conhecendo sua prpria essncia no atributo pensamento de Deus. Sente-se e prova-se a eternidade em referncia experincia do corpo e mudana do regime de necessidade o desejo racional conduz ao Esprito puro, o qual goza de sua prpria essncia no amor intelectual de Deus.

Concluso

precisamente o ser infinito e eterno que determina a experincia. Esta exprime, em sua prpria atualidade, a potncia do ser, atravs do tempo e das relaes que se estabelecem entre os seres finitos. Tambm a prpria eternidade achar-se- de alguma maneira produzida, como a adequao progressiva a ela mesma da potncia do indivduo, no prprio campo da experincia.

A experincia aparecer como o trabalho em curso de uma tenso que afeta o prprio tempo. A durao de manifesta, por conseguinte, na sua prpria continuidade como o excesso da presena com relao sua reduo a um agora pontual e repetido. Spinoza nos dispe assim a uma destinao ainda indita de um poder-ser da singularidade relativa potncia.

Nada pode libertar o indivduo da experincia, toda operao inventada e realizada nela. E se evidente que nenhuma mudana da essncia de um ser concebvel, h certamente uma adequao maior ou menor dessa essncia, quer dizer, o aumento ou a diminuio da potncia de agir do ser modal.

Spinoza registra a autonomia ontolgica da deciso humana em matria de leis, reiterando que o homem no poderia formar um Estado no Estado que fugisse das leis gerais da natureza. Para permitir a associao dos homens e uma vida pacfica, existe o regime social, no qual a multido deve esforar-se para desenvolver as paixes, dentre as que so comuns a todos os membros, que so suscetveis de fundamentar uma apropriao do poder que atravessa as relaes interindividuais.

Spinoza continua nico na sua demonstrao da pertena plena, inteira e no acessria das coisas realidade. Sua interrogao racional da finitude e da potncia o leva a reconhecer que a determinao finita igualmente infinita, porque exprime a potncia do infinito, imanente em todas as coisas. No faz sentido separar ou opor a potncia infinita de Deus potncia singular das coisas naturais.

Mais do que um sistema, o Spinozismo uma atitude intelectual. Alm de toda questo especfica de doutrina, Spinoza tomou da tradio hebraica, particularmente, essa atitude mental, essa maneira de considerar o problema mais geral, o problema da vida em si.