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Encruzilhadas
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Prefácio
Complexo labirinto, obscuros caminhos, paisagens
estáticas permeadas de cinza, desafios por vencer
na rapidez imposta pelo tempo,
Onde outrora desabrocharam as inocentes flores
campestres perfumadas de sonhos,
viu-se gradativamente a transmutação da paisagem,
primavera tardia, flores ausentes;
viver transformou-se em uma insana e por vezes
dolorosa luta em meio aos pontiagudos espinhos da
realidade descortinada sem pedir licença.
A exuberância das flores, o frescor da primeira
primavera, harmonia das pétalas, tudo fascinante,
tudo tão perene. Foram-se os ramalhetes, botões, e
caramanchões perfumados.
A terra outrora fértil tornou-se pela ação do
implacável contador da vida - o tempo - estéril,
dura, silenciosa, amarga, tristonha. A árida
vegetação formou-se com incrível rapidez - canteiros
demarcados pelo crescimento assustador das pragas,
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galhos entrelaçados formando um labirinto,
tornando impossível desvendar caminhos outrora
amenos.
O breve existir assemelha-se a um labirinto. O amor
revelado nas flores e as dores nos espinhos que
surgem em abundância, estabelecendo a sintonia
entre sonhos agonizantes e a dolorosa realidade.
Como a primeira rosa matinal, surge a menina lívida
com os olhos orvalhados de inocência.
Em um mundo infinitamente azul, encontra o
príncipe de todos os contos de fadas, e experimenta
o desabrochar do amor.
Anseios, receios, medos, segredos, desejos infindos,
tortuosas estradas, renúncias, paisagens, miragens,
lágrimas, nostalgia, coragem.
Os caminhos percorridos na dança do existir
tornaram-se etéreos palcos para as escuras teias
tecidas pelo amor distanciado.
Para iluminá-lo, a alma precisou lançar mão de
todas as estrelas guardadas no embornal da
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esperança, impedindo assim a morte prematura do
espetáculo.
Imortal- assim se desnuda o amor que a obra
descortina.
Porém, o tempo encarregou-se de construir
poderosas trincheiras onde pereceram os todos
sonhos esmagados pela realidade, quando em meio à
encruzilhada optou por dizer adeus no momento em
que o coração implorava para ficar.
Indiferentes ao sofrimento concreto, desfilam as
lembranças como que fotografias guardadas nos
porta-retratos da alma, preservando aromas, cores,
momentos, paixão, amor desmedido.
Em meio ao caos a empurrar o singelo existir,
sangram as chagas, grita o peito, chora a saudade.
Gradativamente a cura, o secar do pranto, a força
para carregar a saudade – é preciso seguir.
No vendaval das expectativas, colhe vez ou outra
flores do afeto, experimenta o perfume, se
reinventa, como passeia com galhardia através das
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letras, mesmo sabendo dos raros momentos, das
encruzilhadas.
Mais que uma surpreendente obra, este livro escrito
pela talentosa Sueli Aquino envolve o leitor de
forma intensa diante do compartilhar da emoção.
Ana Stoppa
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Palavras da autora
Todos os seres são mais que a aparência mostra.
Atrever-me-ia dizer que somos o que o momento da
vida nos exige.
Todos os seres têm histórias. Aqueles que não as
têm passaram pela vida e não viveram. Jamais
entenderão os que amaram e que amam sem exigir
nada em troca, sem manipular ou manobrar
acontecimentos; simplesmente sentem-se
privilegiados por amar, sem exigir do universo um
retorno, sem revolta com os acontecimentos.
Contentam-se em saber que o ser amado está
vivendo em algum lugar, que está cumprindo seu
destino. Seguem com um segredo dentro de si e que
uma encruzilhada jogou no labirinto sem fim...
***
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Encruzilhadas
Encruzilhadas... A vida está cheia delas.
Escolhas de caminhos sem volta!
O tempo... Uma aranha tecendo teias.
Envolve...
Prende...
Comanda.
Nos leva por caminhos sem surpresas,
porque sabemos para onde vamos...
Seguimos ao som de um som
repetitivo...
infindável...
Todos os dias!
Olhos que espreitam... Observam...
Não pode haver mudanças
nos nossos passos.
Seguimos... Seguimos...
Às vezes felizes
Às vezes tristes
Às vezes saudosos...
Não importa!
Só importa seguir
o caminho certo,
traçado por nós mesmos.
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A vida não dá direito a rascunho...
Uma certeza: a morte!
Eternidade... Lugar muito vago...
Para quem almeja guardar,
como algo precioso,
o som de uma voz,
a alegria de um riso,
a expressão de um olhar.
Avaliar?
Impossível.
O dia está lindo!
Que pena!!!...
***
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Quando há dor, aperta os dentes e segue em frente...
Alguns se lamentam em versos quando a alma é
ferida.
Quando recebi a primeira punhalada da vida, minha
Pena foi a primeira que caiu.
No meio da escuridão nem me lembrei de procurar.
Perdida na estrada em lugar desconhecido,
Meus pés correram procurando abrigo.
Ignorando as pedras, muitos cortes, pobres pés...
Um dia, no deserto da alma me cansei e sentei.
Na minha dor me abriguei. Sem motivação chorei.
E muito tempo se passou...
Um dia, me levantei e, mesmo sem querer, caminhei.
Enfrentei a escuridão! Dias embaçados pela neblina
da autocomiseração.
Covardia pela tempestade a me guiar, sem chance
nem coragem de erguer o olhar.
Se chovia ou o sol surgia, diferença não fazia.
A alma se mantinha enlutada.
Portas e janelas trancadas.
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Som de correntes de outro mundo sempre presentes.
Por necessidade, o corpo caminhava...
A mente funcionava
não vendo sentido nem na mudança da vida.
Aguardando o corpo a despedida,
lamentava a alma todas as feridas.
Longa caminhada... Muitas mãos nesse caminho,
umas às outras se apoiando,
Até o instante inesperado em que o momento
chegou.
Cadeados foram arrancados! A alma se encheu de
luz.
O corpo, de louvores.
Minha Pena, agradecida, no papel caminhou...
Brilhando, me encantou
.
Muitos caminhos a alma trilhou. Tantos que
guardou!
De cabeça erguida olha o caminho, faz o itinerário
da viagem.
Aprendeu que quando há reclamação, não há dor.
Quando há dor, aperta os dentes e segue em frente.
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***
Início
Diante da tela em branco, tendo nas mãos tudo que
meu coração ditou, me preparo para dar vida ao
livro há tanto planejado.
Muitas páginas impressas. Palavras e palavras a
você dedicadas.
Da primeira à última linha, meu norte é você.
Palavras eternizadas aqui neste livro adiado.
Necessário se faz registrar esses escritos.
Sei que entenderá este diário recheado de poesias.
***
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O Milagre
Muitos anos se passaram. Graças à tecnologia,
posso olhar para você numa tela de computador.
Ouço sua voz vinda de longe...
Não planejei esse momento, nessa madrugada
incomum. Como também não planejei o disparar do
meu coração, nem a emoção que toma conta do meu
ser. Ah! Se você pudesse ver meu rosto agora como
vejo o seu...
Que bom que não pode!
Contemplo sua face... Meu Deus, que emoção!
Analiso suas mãos e o brilho único do seu olhar.
Não resisto. Minha mão toca a tela...
Nada de sonhos nesse momento. Isto é a realidade
com ajuda da tecnologia, abrindo uma brecha no
tempo.
Tudo, que se sente, leva à realidade do encontro.
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Nada que se possa sentir num diálogo feito através
de uma tela, se compara ao encontro.
A cidade dorme. Madrugada. Lá vou eu com passos
que parecem flutuar na calçada.
O cavalheiro que abre a porta do carro ainda é o
mesmo que o fazia há muitos, muitos anos!
Debaixo desse mesmo céu...
Em muitas outras madrugadas...
A luz do poste ilumina nossos rostos. Não vejo os
sinais do tempo. Vejo o garoto com os mesmos
olhos... Não existe toque de corpos. Existe o toque
de almas.
Flutuei nesse momento sem palavras, perdida no seu
olhar. Momento único. Se o mundo acabasse ali,
não me importaria. No espaço de um carro, todos os
desejos do universo couberam.
Não me atrevi a pensar em nossos mundos. Palavras
seriam blasfêmias. Um toque de mãos, uma oração.
Começa a viagem com destino certo: o passado.
A menina e a inocência em constante mutação.
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***
Novidade
Diferentes ares, diferente cidade. Novidade.
Sem pedir licença, o sentimento invadiu o coração.
Menina não analisa inocência sem máscara.
Abre a porta. Entrou e fez morada.
O encantamento de uma voz falando sobre músicas.
Músicas francesas, fundo musical dessa iniciação.
Sem malícia, sem sedução.
Somente o receber de uma atenção.
Crise de ciúme, explodir de raiva sem hesitação.
Sem explicar o momento. A vida segue regida pelo
tempo.
Como uma aranha do Tempo, tece sua teia. Bem
longe o encontro pelo destino marcado.
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Era o escrito do Tempo que alguns insistem em
chamar de coincidência.
***
Reencontro
Não era o topo do mundo, era somente um quarto
andar com um corredor comprido. Um em cada lado.
Conspiração do destino, seres invisíveis sorrindo,
talvez aplaudindo em silêncio para não perturbarem
aquele momento.
Mesmos seres que escolheram a roupa daquela
manhã. A blusa verde, contrastando com longos e
negros cabelos. Herança índia misturada ao
ondulado da herança negra. Pele clara da herança
portuguesa. Tudo isso para vestir a juventude de um
corpo ainda em formação. Arautos anunciando a
mulher desabrochando.
A menina caminhou com passos de mulher.
Contemplou a admiração nos seus olhos. Consciente
se tornou o poder de te encantar. Não caminhava.
Só no seu encantamento.
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***
Com chapéu
Tarde sossegada... O mundo nosso cenário. Um
universo infinito e nós frente a frente.
Encantamento, magia, palavras indo e vindo,
bailando sobre a mesa. Ao som do brinde dos copos,
a noite chegou. Leves seres naquele momento da
vida!
Nossos passos lado a lado na calçada. Vez ou outra
cumprimentando conhecidos. Nossas faces sem
medo. Nada a explicar. Somente a desfrutar.
O chapéu azul entrou para a nossa história. Da sua
cabeça para a minha. Na praça colorida de luzes,
foi testemunha daquele beijo.
As cores das luzes não se podiam comparar ao arco-
íris que se acendeu dentro de mim.
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Não existia a malicia nem a maldade do mundo.
Somente aquele momento da abertura de um pacote
como presente.
***
Sábado
Finalmente o sábado chegou. O moço socialmente
vestido. O cuidado e a educação, suas marcas
registradas, não são enfeites para poesias, são reais.
A maciez da seda que cobria o meu corpo, o sapato
impecável. Sua mão na minha, nossos perfumes se
misturando, invadindo o espaço do nosso momento.
Lugar sossegado, música ao vivo. Além do
horizonte...
Fecho os olhos e sinto o cheiro da noite iluminada
pelo brilho dos seus olhos. Olhos castanhos e
guardiões dos meus sonhos.
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Olhos não de um príncipe de contos de fada e sim de
um pirata aventureiro.
Talvez fosse a leveza dos anos que fazia tudo
incrível!
***
Rotina
E seguíamos a caminhar naquele espaço de tempo.
Mãos sobre mãos percorrendo nossos mundos.
Rumos incertos, ingênuos risos.
Sol forte, chuva fina, tempestade, noite,
madrugada...
No escuro de um cinema, sentir um perfume, uma
presença...
Acompanham o ritmo da vida com seu compasso
Sem reservas nem medos,
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Entregando-se em um abraço.
Confiança de quem não conhecia a desilusão e a dor.
Loucura que a vida permite a alguns privilegiados,
que sem saber nem entender, AMAM !...
***
Espiritualidade
Deus que é o Senhor da vida e da morte também
observa o amor da menina.
Não intervém. Mesmo com uma aliança
indissolúvel, ainda lhe concede o livre arbítrio.
Livre arbítrio de cuidar do seu pote de ouro no seu
arco-íris de sonho.
Esquece a menina do seu compromisso.
O amor, que invade seu coração, ofusca o que
deveria reinar ali.
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Pobre menina tola!
Seu pote de ouro idolatrado era feito de carne e
osso, humano ser. E também possuía seus receios.
O amor abre o encantamento e cega a visão do que é
óbvio.
***
Escuridão iluminada
Dois seres completamente diferentes em sua
essência.
De um lado, águas calmas, barco que navega com
rumo certo. Calmaria na superfície e no interior.
De outro lado, águas calmas na superfície, barco
ansiando o mar aberto, o vento da descoberta no
rosto.
Encontro de seres opostos em um porto do
infinito da vida.
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Desejos ansiando a realização.
***
Desejo
Somente corpos, jovens corpos.
Na aurora da vida tudo explode em fantasia.
Amor vem acompanhado de desejo.
Dançam os corpos no salão da descoberta.
Rolam os corpos no tapete da ilusão.
Poeira nas roupas deixa recordação.
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A água do banho não é feita de paixão.
O alimento na madrugada vai deixar saudade
em outras estações.
A lua que ilumina o momento vai se virar em
compaixão.
A chuva que molha os corpos não alivia a tensão.
O sol que aquece o dia sorri dessa iniciação.
***
Dança
Dança em muitos mundos esse amor-paixão.
Em salões vazios baila a perfeição.
Em salões repletos, prazer, satisfação.
Tudo é perfeição nessa troca de afeição.
Na escuridão da noite...
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No frescor da madrugada...
No amanhecer aquecido...
Encantados são os dias, as noites, as madrugadas!
***
Felicidade
Oh! Plantinha frágil essa tal felicidade!
Quando floresce, enche de música o Ser.
Do seu mundo colorido, o preto e branco de outros
mundos, não vê.
Quanto mais alto a melodia toca, mais incomoda
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os outros mundos
Que não cobiçam as cores. Invejam.
Inveja é pior que a cobiça. Porque a cobiça quer ter
o que o outro tem. A inveja deseja que o outro não
tenha.
E por não guardar silêncio, o preço foi pago.
O universo levantou seus guerreiros vestidos com a
armadura da inveja.
Sua estratégia de batalha é agir em silêncio. Buscar
os pontos fracos do alvo e envenenar. Palavras são
armas poderosas. Quando semeadas no solo certo,
crescem como uma erva daninha.
***
Mover
E o mundo espiritual se move.
A questão não é acreditar ou entender.
E o espírito abandona o corpo.
Tão real esse flutuar!
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O fio de prata visível.
Tudo visível, o próprio corpo visível.
Tudo a indicar que algo estava acontecendo.
Nada acontece por acaso.
Nem a voz que convida a acompanhar,
Nem o amor que prende o Ser à Terra, um único
querer.
Tantos pensamentos passando
na mente em um momento.
Não era hora de ir. Tinha o pote de ouro
do seu arco-íris de sonhos.
E a resposta foi não quero ir, quero amar, quero
viver. Ser feliz.
Não no universo desconhecido, ser feliz no agora.
E o espírito retorna ao corpo. Corpo desperta
consciente daquela experiência que não entendia.
Porém real e vivida.
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***
Tempestade
E o mundo começa a mudar. As cores do arco Iris
desbotando e escorrendo, manchando a perfeição da
tela.
Os olhos castanhos se tornaram estranhos.
Pouco a pouco modificando.
Já não existiam os sorrisos espontâneos. Nem os
ritmos dos passos na madrugada vazia.
Tudo que existia era a desconfiança com suas garras
presentes apertando os momentos, sintomas de um
amor doente.
A cor da semente do ciúme espalhada pelos
guerreiros era negra. Devagar ia cobrindo o arco-
íris.
O momento era de conspiração.
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Todo o universo em transformação. A menina não
tinha escolha: ser ou não ser forte.
Quando se ama, não se joga algemas nem grilhões.
Lustram as asas do ser amado e o deixa partir.
Porque a felicidade consiste em saber que amor é
liberdade também de ir.
Decisão além de qualquer entendimento.
***
A encruzilhada
Tudo que era o universo se resumia ali. Uma decisão
diante de uma mesa de um lugar insignificante.
O mesmo lugar onde o sonho havia habitado
em outros momentos.
Palavras são poderosas e devem ser escolhidas
com cuidado.
Aquelas, ditas naquele momento, foram o punhal
penetrando a alma.
Podem ser ouvidas ecoando pela eternidade,
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fazendo morada dentro do Ser.
Palavras que seriam ouvidas em muitas noites de
dor. Que voltariam em dias claros afastando todo
amor.
Lembrando que amar dói, que confiar é perder.
Não existe pote de ouro nem arco-íris.
Existe a covardia de uma realidade que traspassa a
alma além do alcance, tamanho foi o mal.
Transforma dor em orgulho e decisão.
“Nunca mais” é muito tempo!
***
Esquecer
Mas guerreiros não se entregam. Ignoram o coração.
Pisam no campo de batalha da realidade porque
esta é sua única opção. Potes de ouro e arco-íris
desaparecem.
O coração endurece.
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A dor que se sente quando se é jogado na realidade,
somente quem já despencou sabe a sensação.
Para se proteger, a solução é não mais deixar o chão.
Caminhar no mundo seguro e preto e branco.
Abandonar tudo e todos que possam trazer
recordações.
Caminhar em terras paraguaias, cantar, dançar
para a dor aliviar. Pé na estrada muito longe do lar.
Quem se importa com o que vai ter que enfrentar?
Muitas águas a navegar. Vontade de nunca mais
voltar.
Entre a revolta e a dor existe um Deus de amor.
Ignorado pela dor e revolta, continua lá a amparar.
***
Sem escrever
A razão sabe que amar é deixar ir.
Porém o coração não concorda e chora.
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A razão toma conta da situação. Pega tudo que
consegue e tranca bem no fundo do coração.
Passa cadeados com luzes que acendem, põe cercas
que cortam como navalhas ao menor toque.
Dentro dessa sala está a Pena porque se havia
fundido ao amor. E a razão não pensou em separar.
Pés descalços na estrada, andar e andar...
Deixar tudo que pudesse trazer a mínima dor.
Afastar todas as lembranças daquilo que
machucava tanto e que um dia trouxera tanta cor!
Sem rancor, caminham os pés. Devagar vai
adormecendo sentimentos. Abafados são os sons dos
risos, o murmúrio das vozes...
Agora, a realidade se impôs. Obrigação a cumprir.
***
Tempo
Desenrolando o pergaminho do tempo...
Minutos, dias, anos...
Encruzilhadas
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E o universo abre os braços sem planejar.
De novo, frente a frente. O sentimento vivia e
sorria.
O tempo parecia não haver passado...
Era amor... Era desejo... Era paixão!...
Cada um desses sentimentos é diferente do outro.
Quando se juntam, uma mesa de um restaurante
perdido em algum lugar vira paraíso.
Pensamos que se poderiam mudar as opções feitas.
Descobrimos que isso é impossível!
Mãos sobre mãos se despedem...
Sem lágrimas nem ilusão.
Aquilo era a realidade que não admite negociação.
***
Proibido
A vida se renova. Outros olhos, outras mãos.
Encruzilhadas
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Outra página a ser escrita. Apagado está o
passado.
Trancada toda a fraqueza, toda a beleza...
Nada pode assustar o sobrevivente de uma
desolação.
Guardião de um segredo no seu baú cheio de medos.
Porém o coração é traiçoeiro. Vez ou outra se rebela
Quando vê um encontro de amores do passado.
O coração grita e esmurra a porta.
Todo o peso de uma lágrima desce pela face.
Face que se recompõe e caminha no seu mundo sem
nexo.
Quem não tem o direito de pensar?
Proibido estar a recordar?
***
Encruzilhadas
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Visita
É final da madrugada no coração da floresta.
Sono sem sonhos.
A luz do amanhecer expulsando as sombras com que
se veste a madrugada.
Quando num salto, os pés descalços tocam o chão.
O visitante está ali... Tão real!...
Sente o cheiro conhecido do seu corpo.
Sente a aproximação no sonho lúcido. O frio nos pés
descalços avisa que é real.
Sente a invasão do visitante passando por seu ser.
Ouve a realidade a chamar. E as lágrimas caem do
rosto sem nem ao menos tentar explicar.
Passa o dia todo a implorar
que a morte não tenha vindo buscar.
Implora a Deus uma vez mais tocar.
***
Encruzilhadas
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Caminho de águas
Flutua sobre as águas, guardada por um Deus
poderoso e único, toda bagagem acumulada pelo
caminho.
Navega com toda sentença que a si mesmo delegou:
Não acreditar em arco Iris, em pote de ouro, em
amor.
Tudo, que pudesse sofrer ainda, seria pouco para
absolvição, autoflagelo, sua punição.
Não conseguia liberar para si o perdão.
Não queria seu mundo por opção.
E a Pena, essa esquecida, jazia trancada no quarto
criado pela razão.
***
Encruzilhadas
38
Misericórdia!
O Deus poderoso e único sempre lembrado, porém ao
quarto nunca convidado.
Estendeu suas mãos e devagarinho guiou para a
direção.
Chegada era a hora de soltar as correntes
e arrumar aquela confusão. Permitiu a noite do
milagre.
Naquele momento o amor mostrou que era real.
Que não veio para causar dor;
veio ensinar o que era amar.
Naquele momento havia um mover
imenso no mundo espiritual
Todo o cenário preparado já estava.
Aguardava apenas a nossa rendição.
E ela aconteceu. Era mais que o aqui e o agora.
Encruzilhadas
39
Era a eternidade se fazendo real. Não era desejo,
nem paixão.... Muito além... Fascinação!
***
Entendi
Não importa as décadas, a mudança que o tempo
executou com perfeição.
Será para sempre um amor, intocável,
não vivido e vivido.
Vai bailar sempre no salão da recordação
em um mundo criado pelos nossos momentos.
Cada um cumprindo sua missão
da melhor forma possível.
Gostaria de crer em um encontro sobre esse céu,
porém isso seria ilusão. A menina entendeu que no
final do
arco-íris não tem um pote de ouro.
O que existe são escolhas e consequências nas
encruzilhadas da vida.
Encruzilhadas
40
Conseguiu perdoar a si mesma
pela escolha feita naquela encruzilhada.
***
Pena
E a Pena volta à mão a quem pertence.
Pena que rabisca e rabisca sem cansar.
Saiu da prisão quando o milagre aconteceu.
Na noite sob estrelas, testemunhas da
transformação.
Hoje, não existem estrelas, chove lá fora.
Lembrando que já estivemos a ouvir a mesma chuva
em madrugadas no passado.
Tudo no universo é transformação. Hoje, somos o
presente que construímos, um dia de cada vez.
Amanhã, seremos saudade. Nosso destino,
eternidade.
Encruzilhadas
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Despedida
Não houve palavras amargas nem doces.
Ambos não sabiam que era um adeus...
Houve somente palavras rotineiras.
Aquelas que amantes dizem
depois de uma noite de amor.
Porém, aos poucos o amargo da alma se fez sentir
Se sobrepondo ao desejo inviável de ficar.
Um cansaço repentino de ser como um Don
Quixote.
Lutando com moinhos de vento imaginando
dragões.
A consciência adormecida em um sono encantado
Despertando, devagarzinho...
Quando se persegue um sonho,
perde-se a noção da realidade.
Encruzilhadas
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Nessa perseguição, anos, meses, dias vão sendo
engolidos pelo tempo implacável.
Tempo que não perdoa, somente passa...
Passa nos presenteando com sorrisos,
lágrimas, lembranças...
Fragmentos de nosso universo pessoal.
De repente restam pedaços... Que recordamos sem
querer
E nos trazem de volta o som de um riso,
o gosto de um beijo...
A imensa falta de um abraço...
***
Encruzilhadas
45
Somente nosso pacto
Seres humanos têm um nome muito apropriado.
Sou humana, cometo erros primários, no meu
caminhar.
Coleciono derrotas e vitórias nesse percurso que, às
vezes, considero longo, outras vezes, curto demais.
Descobri que felicidade não existe. O que existe são
momentos felizes. Não posso prender um momento,
então procuro aproveitá-lo. Tantas são as
interrogações!
Escrevo sobre as vivências que colecionei pela vida.
Mesmo sem querer...
Amor! Um trono no coração... Nele, assentada a
ilusão de algo que nunca se concretizou.
Uma fuga, refúgio, escudo, proteção.
Perfeição? Não existe; somente palavras desenhadas
numa página em branco: “LIBERTAÇÃO”!
Atores que contracenaram comigo; que contracenam
neste imenso palco da vida. Cada um trazendo suas
vivências, misturando experiências. Atuamos sem
Encruzilhadas
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saber o texto; segredo do autor, que observa e decide
o contexto. Obtendo uma textura perfeita.
Religião, religiosidade. Quantas existem? Não sei.
Somente que, às vezes, me assustam. Deus não me
assusta. O que me assusta são os homens que criam
os deuses. O fanatismo humano. A ganância, a
enganação.... As regras que criam em nome de Deus.
Privacidade... Não me agradam os holofotes.
Prefiro a privacidade, uma caneta e um papel.
Minha iluminação.
Pessoas. Seres maravilhosos, únicos. Todos nós, com
nossos erros e acertos, formamos um momento único.
O nosso momento de passagem por este planeta
azul.
Sigo, dedicando-me, ansiando a perfeição na minha
atuação. Observando e aprendendo com a
convivência, nesse pacto com meus companheiros de
palco.
Encruzilhadas
47
***
Coração traiçoeiro
Um amor sem dúvidas.
Desconhecendo armaduras.
Habitando um coração
Banhado de inocência.
Senhor de todas as luzes,
Partiu, ficando a escuridão.
Décadas de apagão.
Esquecido fez-se o coração
Movendo-se na solidão.
Luzes artificiais brilharam...
Derrepente, iluminação!
Alegria, ilusões, constatação.
Nunca houve escuridão...
Encruzilhadas
48
Somente na imaginação.
***
Triste brilho da alma!
No meu mundo de conquistas, mais uma batalha
vencida. Ainda ecoa o som da comemoração.
Risos, abraços, congratulações!
Meu rosto brilha de satisfação.
Brilho próprio de guerreiros acostumados com
vitórias.
Embriagados na sua superação.
Tudo é brilho no meu mundo iluminado!
Por que então, minh’alma, foste para longe?
Ouço o chamado silencioso, de lágrimas...
Ferida aberta, clamando por socorro.
Lembrança presente do que ficou pelo caminho.
No campo de batalha, guerreiro não escolhe;
sobrevive.
A alma se despe da emoção, se veste com a razão.
Guerreiro fraqueja, vacila, ama. Mas nunca se despe
da razão...Vem, minha alma! As luzes se apagaram.
Cessou a comemoração. Podemos juntas atender ao
chamado silencioso, lágrimas...
Encruzilhadas
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Alívio para a ferida; bálsamo para o coração..
Ferimento profundo do qual não vamos morrer.
No final, só mais uma cicatriz trazida do campo de
batalha da vida.
***
Explode coração!
Vaguei por mundos numa busca incessante
Com um objetivo único: um olhar, um sorriso.
Nesse percurso encontrei seres envolventes..
Fui obrigada a parar, ouvir, falar.
Muitas vezes convidada a ficar. Recusei.
Vasculhei mundos movida pela esperança.
Mente alerta, coração aberto.
Dúvida inexistente.
Meu ser cantou na sua chegada.
Corpo, alma, coração...
Gritei minha prioridade: você!
Sua voz, meu guia...
Mover meu mundo e colocar você...
Virar malabarista... Equilibrista... Artista.
Alinhar mundos, colocar meu sol.
Derrepente, tudo explode... Sobra medo.
Razão ajuda o coração a guardar as armas da
Encruzilhadas
50
ilusão.
No final de tudo, só recordação.
***
Fascinação
Teu aniversário!
Venho deixar-te um cometa de palavras
Emoção, som, odor, melodia!
Vinho raro... Fascinação
Embriagando meu coração,
Provocando alucinação.
Além do corpo que te cobre
Essência da alma que me envolve.
Odor no ar, imaginação.
Melodia de outra vida.
Amor único.
No caminho da vida
Surpreende meu coração.
Nosso pacto a recordar
Nunca este amor macular.
Encruzilhadas
51
***
Passos.
Maravilhosos passos. Terríveis passos.
Sempre os passos conduzindo a outros passos.
Passos que se juntam a outros passos.
Arco Iris musicista, a musicar os passos.
Melodia inédita de passos.
Passos que se juntam e de repente se repelem
Perdem o compasso dos passos.
Afastam-se os passos, unem-se os passos...
Viram sorrisos, lágrimas, gargalhadas
Viram desejos, ternura admiração
Viram medos, mistério, alucinação
Sinfonia de passos, na estrada da ilusão.
Executando, às vezes, a Marcha Fúnebre
Outras vezes a Ode à Alegria
Executando de Beethoven, a Nona Sinfonia.
Inteligentes passos, ignorantes passos.
Encruzilhadas
52
Poderosos passos, frágeis passos,
Escondem do poeta a pena.
Rudes passos, ternos passos
Mergulhando a pena do poeta em melodias
Para que nunca esqueça a sinfonia dos passos.
***
Lição da águia
Lição da águia
Dolorosa transformação
Voar para longe
Esconder nas rochas
Quieta sem voar
Sentir dor sem reclamar.
Arrancar os sonhos
Esperar novos sonhos
Renascer.
Voltar a voar.
Encruzilhadas
53
***
Soprando o vento
Acordei antes do dia.
Corpo flutuando em rimas...
Alma livre, viajante,
Indo longe fazer rimas,
Ultrapassando horizontes.
Sem regras, nessa aquarela,
Sem escalas de cores,
Sem riscar a tela,
Sopra o vento nessa tela.
Movimentando com destreza
de velas a caravela.
Vento forte sopra as velas
Nessa viagem bela.
Tira o sono, molha a pena.
Com autoridade, ordena.
Encruzilhadas
54
Obediente, viajante embriagado,
Rende-se ao poder da pena.
Sopra, sopra o vento.
Leva longe o viajante
Que no mar da sedução,
Cativo já esta.
***
Valsa do adeus
Ao longe já tocou o clarim, anunciando a hora de
partir.
Contemplo o salão do baile.
Murcharam as flores, as estrelas apagaram.
A orquestra a embalar o nosso adeus.
Som triste para nosso bailar
A noite, brilhando em seu olhar, me deixa a certeza.
Sentirei seus passos ao meu lado, ao caminhar.
Caminhando e imaginando a sua voz
Sem nunca afastar meu coração do seu.
Valsemos nesse salão de fim de baile.
Nada mais a adorná-lo, nem flores nem estrelas.
Somente os acordes da sinfonia do adeus.
Encruzilhadas
55
Rodopiamos nesse salão... Embalados por Chopin.
Quanta perfeição nessa sinfonia,
Embalando essa dança, marcando essa agonia!
***
O trançar dos fios.
Oh! Que lindo o trançar dos fios!
Sala imensa, colorida.
Muito eficiente seu trançar.
Cada fio chamado alma. Infinitas, nem dá para
contar.
Minha alma incluída nesse entrelaçar imenso.
Mudam de cor esses fios. Sempre, sem cessar.
Cores interligadas nesse ligar intenso.
Cores, cores e mais cores.
Entrelaçando, mudando sem parar.
Os fios, mesmo apagados, continuam no penteado.
Ocupam espaço, com certeza. Mesmo apagados, não
Encruzilhadas
56
perdem a essência.
Fios que não escolhem os companheiros de
entrelaçamento.
Com alguns são transparentes. Com outros são
opacos.
Amarrados neles os sentimentos. Sempre presentes.
Entrelaçando para a eternidade um penteado
inalterável.
***
Roda da lembrança...
Um baile para dançar, um lindo parceiro a me
guiar.
Não quero me associar, meu coração penhorar.
Não se oferece o que não se tem. Cujo dono é alguém
Habitante de outras terras. De onde vem o som que
me eleva.
Ouço agogô, pandeiro, som do berimbau a lembrar o
fato. Junta o caxixi e a vaqueta. Bem seguras na
mão direita Executando o toque, marcando o ritmo
Um jogo de elegância, humildade, sagacidade,
Encruzilhadas
57
autoconfiança.
Meu coração a acompanhar.
Na roda da lembrança vejo seu corpo a girar.
Num jogo perigoso, onde sempre será mestre.
Ouço a ladainha das cantigas...
Lembrança para essa viajante
Do poeta jogador. Insuperável em seu destemor.
Pelo qual ainda guarda um único amor.
Inesquecível amor...
***
Elo de almas
Ah essa melodia infinita, tocando sempre sem
desafinar.
O barco navega em mar aberto, outras águas a
desvendar.
Ignora o lamento triste da alma em seu cismar.
Vivendo seus sonhos, tantos que não dá para citar.
Baixa a âncora nesse barco em momento de
descansar. Afasta os sonhos esse aquietar.
Realidade de um chamado toma o seu lugar.
Encruzilhadas
58
Põe a alma a viajar. Vai feliz sua realidade a
buscar.
Alma fiel, que pelo Eros não se deixa enganar.
Busca ao longe, lá em terra...
Certa alma a lhe esperar.
Brilhante alma no porto, sem nunca atrasar.
Despidas são as almas das vestes da razão.
Flutuam para o seu rumo.
Nunca erram a direção. Seu guia, o coração.
Engana a mente, enreda o corpo.
Mas no coração não tem dilema.
Seu rumo não tem desvios.
Ordena o coração, obedece a alma.
O resto é só fumaça, vento vindo, se dissipa.
Viram vivências a colecionar. Mais um retalho a
juntar.
Elo invisível, indestrutível.
Ignora o tempo, apaga as marcas. Transparentes,
Dançam as almas seu balé. Invade a eternidade seu
querer.
Seguem essas almas quando a âncora levantar
Um chamado sempre virá. Um lindo balé para se
dançar...
Encruzilhadas
59
No palco do coração, sempre um lugar seguro a
esperar!
***
Eu vou ver...
Eu vou ver
Olhos tão vivos e brilhantes
Marejando... Emocionados.
Mãos poderosas vacilarem
Com um livro nas mãos.
Sendo amado em cada palavra.
Se reconhecendo em cada rima.
Lendo, relendo, sonhando...
Mesmo que seja em pensamento,
Verei!
***
A Pena e o Tinteiro
Há momentos que criam vida.
Criam textos esquisitos.
Não se preocupam com o contexto.
Cheios de enigmas preocupantes
Direcionam esses textos
Encruzilhadas
60
Falam de mundos inexistentes
Onde visitei e não fiquei.
Loucos textos, reveladores textos.
Quando percebo já voaram
Como pássaros que não querem ser engaiolados.
Vão voar em outro mundo.
Onde não deviam nem andar...
Triste sina essa minha.
Depender da alma para controlar a Pena e o
Tinteiro.
Alma essa que não deveria andar e muito menos
escutar.
***
Elo
Espírito, essência da vida
Une a alma ao corpo
Permite-nos perceber o elo
Alma e espírito... Imortais.
***
Almas conversando
Tantos mundos essa alma visitou!
Tantos olhos a brilharem...
Encruzilhadas
61
Multidão de mundos.
Coleção de vivências
Sem querer acumuladas... Seus olhos castanhos...
Brilhando... Meu coração quase parando.
Brilho de décadas, nunca se apagando.
Nem conceitos, religiões, crenças.
Nem o tempo, outros amores.
Nada apaga esse brilho...
Brilho que apaga as vivências.
Freia o tempo. Desafia o poder da distância.
Transforma-nos em seres livres.
Poderosos para aprisionar o destino
em um toque de mãos.
Sempre esse brilho nos seus olhos...
Espelho refletindo o brilho dos meus olhos.
Sem cobranças... Sem promessas... Sem amanhã.
Almas conversando. Pelo olhar se entregando.
Alma em festa de gala, no palácio da emoção.
Grata ao Senhor do universo por essa iluminação.
***
Nem correntes... Nem grilhões
Encruzilhadas
62
Meu amor nunca me permitirá tomar algo de ti.
Nunca possuiu correntes para acorrentar-te
Nem grilhões para prender-te
Leão livre em tua savana
Rei absoluto dos teus caminhos.
Não necessito de correntes, nem grilhões...
Nada de armadilhas pelo chão.
O que te aprisiona é um encanto
Chama se amor, mora no teu coração.
E tu necessitas prendê-lo com as algemas da razão
Que de vez em quando têm a forma de paixão,
Fazendo o leão virar um gatinho e rolar pelo chão.
No aconchego do meu colo, ronronar de gratidão.
***
Luz acesa na janela
Encruzilhadas
63
Um dia numa parada da estrada eu me achei
esperta.
Saiu um minuto, eu abandonei o abrigo coberto.
Coberto pela inocência do amor.
Andei pouco e me perdi nas conseqüências.
Magicamente adquiri bagagem...
Voltar eu não podia, explicar eu não conseguia.
Concentrei na bagagem, sem perceber eu fugia.
Andei por planícies, vales, montanhas, desertos...
Às vezes sinto saudades do abrigo coberto
Mas me delicio no prazer da caminhada.
Bem ou mal, sobrevivi, fui alegre e triste.
Sorri, chorei, venci, perdi.
Gosto da luta, assim me sinto digna do descanso.
Saboreio cada mudança das estações da vida.
Um dia, vamo-nos sentar e contar o que vivemos.
Sem lamentações, celebrar o regresso.
Nosso lugar seguro, intacto, permanece a nos
esperar.
A luz acesa do amor sempre na janela a brilhar.
Impossível o caminho não encontrar!
***
Encruzilhadas
64
Alma calada ri e chora!
Dizem que o tempo é remédio, borracha.
Que ele muda tudo, que é poderoso.
Mas toda regra tem exceção.
Tem sentimentos que ele não pode tocar.
Ele acompanha a nossa dor.
Muda nossa aparência, pinta de branco nossos
cabelos.
Joga areia em nossos olhos, prejudicando a nossa
visão.
Sorri dos nossos óculos. E da mudança na nossa
feição.
Toca flauta e dança em volta da nossa prisão.
Vira as páginas do seu livro lentamente,
Assim vai caminhando minuto a minuto...
Que viram décadas... Mágica incrível desse tempo.
Sem clemência açoita o corpo. Causa dor.
Alma calada, em silencio ri e chora.
Mas não se entrega... Sobrevive. Mágica do amor...
Amor! Mesmo tão longe se mantém tão perto!
E ignora o tempo e suas armadilhas.
Rindo entre lágrimas o amor do tempo.
Tempo ignorante que não entendeu.
O amor...
Encruzilhadas
65
Não se preocupa com as mudanças.
Ama! Simplesmente... Ama!!! E espera.
***
Minha flor única...
Sentada na praia do Rio Negro.
Negras águas, lindas estrelas a brilhar.
A nostalgia a me dominar
todas as vezes que a estória do príncipe e da sua flor
única tem que ser contada. Aula cheia de sonho...
Imagino minha própria flor. Guardada bem distante
daqui.
Flor feita de amor. Amor único.
Contemplo as estrelas distantes, as águas negras,
perigosas.
Como estará agora minha flor? Foi regada de
saudade ou contempla o horizonte nessa hora. Cheia
de vaidade...
O pensamento abre as asas, alem do infinito viaja...
Corre a Pena nesse texto que no tinteiro da saudade
foi encharcada.
Que vontade de voltar para casa!
Encruzilhadas
66
***
Espelho
Em um dia, ao acaso,
Um encontro inevitável:
Você e seu espelho.
Nele, refletidos seus segredos,
Medos trancados.
Nem sabe ao certo onde!
Só tem uma certeza:
Você os trancou.
Confere diariamente os cadeados...
Agora, eles olham nos seus olhos...
Devagar, sente as cicatrizes...
Alma machucada
Implorando cura...
Lentamente desvia o olhar...
E vai reforçar os cadeados.
Encruzilhadas
67
***
Vôo
Voar... Silenciosamente, Às vezes é a melhor solução.
Evita uma constrangida explicação. Vôo triste, solitário.
Coração pesado, de palavras não ditas, carregado. Corpo ansioso, envolvido por fragrâncias,
Alma teimosa, agarrada a palavras. Mente exige uma solução
Para essa confusão, nem eu tenho explicação. Flutuando e esperando...
Quem sabe encontrar um guia! Nesse vôo solitário, uma mão. Mas... Sem ilusão! Porque a mão que desejo, não deseja a minha, não.
Encruzilhadas
68
***
Marionete
Marionete do tempo
Observando, estática...
Décadas..
Anos...
Meses..
Dias...
Minutos...
Segundos..
Cortejo infinito
Infindável...
Olhos buscando...
Procurando...
Você!
Encruzilhadas
69
***
Entendimento
Sem palavras.
Tempo parado.
Nosso segredo.
Cumplicidade, entendimento....
Olhares brilhantes....
Toques mágicos...
Instante incomparável..
Seres distantes...
Juntos...
Esquecimento? Impossível!
Prazer, loucura, paixão, ternura...
Desejo de invadir, possuir, gritar:
Ninguém é VOCÊ!!!
Encruzilhadas
70
***
Música
Ouço a música que toca dentro de mim...
Sinto-me frágil para seus acordes acompanhar.
Tento entender de onde vem o som...
Som que flui com precisão. Sinto-me flutuar...
Em desespero busco o chão sem convicção.
Pequenina diante de tanta emoção!
Olho o pergaminho intocável,
me sinto um grão de areia...
Tão diversos foram seus caminhos!
Perco as palavras e sou obrigada a procurar.
Essa lentidão no desenrolar...
Passo a passo sigo você nesse bailar.
***
Perto e Distante O amor que minha alma anela
Vive em sonho, em pensamento.
Encruzilhadas
71
Driblou o tempo. Ganhou a eternidade. Tão perto e tão distante!
Almas que fogem ao mesmo tempo Se encontrando em raros momentos
Programados pelo tempo!
*** Balança
Nosso encontro foi marcado por nossas almas.
Mesmo com as escalas. O destino está impresso e claro.
Nossos corpos aguardam o instante exato dessa colisão.
Antecipam esse momento com ansiedade! Aprendi a entender sua canção
Trazida pelo pensamento que me invade o ser. Rouba-me o sono. Embala-me o dia.
Quando consigo me desligar da canção... Lá vem você, fazendo surpresa a me encantar.
Assim volto novamente a viajar... A balança sempre a oscilar, razão e emoção.
Inevitável oscilar... Vai pender quando corpos e almas chegarem a seu
destino. Enfim no mesmo espaço
Se renderem ou se perderem...
Encruzilhadas
72
***
Gratidão
No amanhecer de um dia de domingo.
Acordei cedo sem tristezas no coração.
Sem motivo para chorar. Quero é festejar.
Ouvir o silêncio se encher dos sons do amanhecer.
Será que a natureza sabe que é horário de verão?
Apesar das batalhas da vida me sinto grata, em
paz.
De repente em um email, um vídeo...
La vem o Senhor a me abençoar.
Usando você para me iluminar.
Como posso me queixar de algo?
Se tudo que sinto é gratidão
Por mais um dia de missão?
***
Encruzilhadas
73
Lição
A vida é uma escola.
Às vezes precisamos repetir a lição
Para aprender a resolver a questão.
Uma vez aprendida pode mudar o enunciado.
Sabemos a resposta analisando as opções.
E entregamos o resultado sem vacilação.
Sem repetir os erros da lição.
***
Reciprocidade
Como o marinheiro que ama o mar
e retorna com júbilo ao seu lugar,
Como o guerreiro que luta, almejando a hora de
voltar
Meu coração se enche de festa, quando sua voz se
faz escutar.
Suas batalhas, minhas batalhas.
Mundos bem separados, limites respeitados.
Nosso mundo sem limites
Que respeitam os espaços.
Sem limites para sonhar, para as forças recuperar.
Encruzilhadas
74
Sem nada cobrar, apenas ofertar.
Reciprocidade é o segredo que nos faz sonhar.
Em um mundo onde a maioria somente espera
receber.
E se esquece que o maior prazer está em doar.
***
Quando...
Quando olho para você
Quando me vejo nos seus olhos
Quando sinto sua presença
Quando toco em você...
O que sinto não tem nome.
Já driblou o tempo.
E invadiu a eternidade!
***
Encruzilhadas
75
O rio corre para o mar...
Conhecer o amor
Ser amado e amar
Possuir força
Nessa verdade.
Descansado segue o caminho
Protegido pela certeza:
Os rios sempre encontram o mar
No momento certo..
***
Mudança de Visual...
O amor veste bermuda
Terno, smoking, chinela.
Anda de salto, tênis, rasteirinha.
Vestido de gala, pijama de bolinha.
Faz palestras, toma decisões.
Dá ordem e recebe seu ganho.
Usa óculos, sempre sérios.
Nesse desfile de momentos
Encruzilhadas
76
Trocamos de roupa a contento.
Quem escolhe a roupa é o Tempo.
Dentro do ser a alma despida
Aguarda seu momento
De se vestir sem a presença do Tempo.
***
Chamado
Bendito momento.
Música ao longe.
Enganou-se a previsão
Ouço o chamado.
Tão longe... Não dá para apreciar.
Passos deixando o tapete
Caminham pelo chão.
Encruzilhadas
77
Sentindo a liberdade.
No chão fresco da realidade.
Guiados pela cantiga.
Detêm-se na varanda.
Os olhos contemplam o bailar.
Sobre o manto da noite
Muitas gotas a brilhar.
Poesia a encantar.
Meu ser na rede a descansar.
***
Novembro
Final de novembro.
Preparando a despedida, o ano de 2011.
Hora de rever a trajetória.
As inevitáveis promessas no inicio da caminhada.
Usar a balança interior para pesar os erros e
acertos.
Encruzilhadas
78
Tantos momentos ficaram na lembrança!
Lutas, vitórias e derrotas.
Pessoas que simplesmente cruzaram o caminho.
Pessoas que chegaram para caminhar no mesmo
caminho.
Sem doenças, acidentes, tragédias.
Isso por si só bastaria para agradecer
E se acalmar. Não acabou, porém.
Falta ainda o fechamento do texto
Escrito por Deus e eu.
***
Viagem
Essa dor que na alma carregamos
O desejo de acordar do pesadelo
Esquecer o desespero.
Arrancar do coração a saudade
Encruzilhadas
79
Pisando firme na realidade
Encarando as responsabilidades...
Como trancar almas
Que voam livres pelo infinito,
Que ignoram o mundo
E se perdem em sonhos?
Uma visão de final de caminho
De um dia voltar ao seu lugar.
Luz acesa no infinito.
Duas almas a viajar
Sonho a compartilhar
Momentos a se intimar.
Almas que, de impossível,
Nunca ouviram falar.
Somente acreditar.
***
E teus olhos marejam...
Desde a tarde a alma está inquieta.
Na madrugada se impôs
Acordou o corpo e o pôs de pé.
Sem vacilar abriu a porta Que a razão evita abrir.
Encruzilhadas
80
Sem surpresa, contemplo-te aqui.
Meu coração implora e tu ouves.
Não diga nada, que evaporo. Viro nada e me
desfaço.
No silêncio nos contemplamos. Com respeito
observamos.
Nossos rastros tão opostos!
Leitura de atualização:
Duas almas se falando. Sem palavras desejando
Um encontro sem autorização.
Em algum momento se cruzaram.
No amanhecer da vida, se contemplaram.
Tão frágil o coração! Tão forte a emoção!!!
Vem a verdade na contramão:
Não é o momento... Ainda não!
Será aqui? Ou além da imaginação?
Sei que me lês...
E teus olhos marejam...
***
Preço
A realidade entrou pela porta da frente.
Encruzilhadas
81
Lembrando as marcas das correntes.
Bateu o vento do medo. Fez gelar o coração.
Quando a realidade chegar nessas páginas.
Balançando suas correntes na mão.
O preço vai ser alto por tanta confissão.
***
E o tempo...
Sentença do Tempo
Escrita no infinito
Há muito tempo
Ao pedido de recurso
Dá risada o Tempo.
Juiz implacável.
Seguimos nesse tempo
Respeitando o Tempo.
Indo em direção ao Norte.
A luz acesa na janela está lá.
Sempre a nos esperar.
***
Na falta da luz, usa-se vela
Encruzilhadas
82
Há uma luz na janela, concordo.
Mas falta muito para chegar lá.
Paciência não é minha melhor qualidade.
Essa é a sua. Então, me deixa viver.
A estrada é longa... Maravilhosa!
Não arrasto correntes. Dou risada e vou em frente.
Deixa a luz lá. Se precisar, uso uma vela.
Ilumina também... Às vezes, cansa versar para
utopia.
A vida foi feita para ser saboreada. É única.
Sei bem dividir os canais.
Quando chegar à luz da janela, real,
Estarei pronta. Por enquanto preciso viver.
Do meu para o seu mundo: paz, alegria, felicidade.
Que balancem as folhas da sua monotonia.
Não se preocupe, vou chegar inteira.
Viver não tira pedaço...
E para mim tudo é alegria!
***
Encruzilhadas
83
Guardiões...
Do alto da represa da vida
Podemos enxergar o rio da existência correndo.
Nas margens desse rio, dois mundos se destacando.
Dia e noite observamos os mundos que guardamos.
Importantes são os seres que neles colocamos,
Razão pela qual sempre da represa cuidamos.
Olhamos para o rio represado, por nós modificado.
Com pedras tão antigas foi edificado...
Ouvimos os sons que acompanharam a obra.
Não existe simpatia para nossas mãos unidas.
Mínimo vazamento é motivo de preocupação.
Abrir as comportas não é opção.
Acabaríamos em cima da palmeira
Como Peri e Ceci pelas águas levados...
***
Encruzilhadas
84
A vida é bela
Ontem, se sai do ventre.
Aurora da vida, sem tormento.
Ergue-se o sol da existência.
Hoje, se volta à terra.
Pôr do sol. Escuro céu.
Não se sabe o momento
De nascer nem morrer.
Só se pode desfrutar do maravilhoso dia
Chamado vida, que muitos insistem em chamar de
tormento.
Esses perdem as belezas das variações do clima
No dia único da sua existência.
***
Encruzilhadas
85
Nostalgia
Natal é uma data de nostalgia.
Não tem como evitar as lembranças de participar.
Trazem os fantasmas do que um dia foi real em
outros natais. Todos os que se foram, de alguma
forma nos visitam nessa data.
Com certeza somos fantasmas vivos nas lembranças
de muitos. A lembrança nos veste a todos com roupa
de gala. Elimina as imperfeições daqueles
momentos. Mesmo as lembranças mais sofridas nos
revelam sua parte boa.
Mesmo os que já partiram vêm para a festa no nosso
coração.
No livro da vida, os momentos são escritos sem
possibilidade de apagar ou corrigir. Ficamos
marcados e marcamos. Cada texto de uma existência
é escrito de forma diferente.
Momentos iguais narrados por escritores diferentes.
Somos feitos de pedaços de nossa existência.
Recordações fazem parte de nós. Mas não podemos
esquecer o texto que estamos redigindo no presente.
Esse natal será anexado ao livro da existência de
muitos. Usando da sabedoria que o tempo nos
presenteia a cada ano, devemos deixar textos dignos
Encruzilhadas
86
de releitura no livro dos que nos rodeiam.
Reverenciando os textos já escritos e escrevendo na
página do presente sem interferências. Deixando os
fantasmas e seus risos no seu lugar. Dentro da
mente. Abraçando o presente. Atenção aos
companheiros desse presente seria o melhor presente.
Lembrando que um dia, esse dia será mais um dos
fantasmas do arquivo da nossa mente.
***
Acumulados
Um sentimento idealizado
Adormecido entre ausências
Buscando pela presença
Sentido nos sentidos do copo.
Refletidos no espelho da alma
Por palavras sem sentido disfarçado
No seguir da vida se entrelaçando
Amarrado por desencontros
Um a um acumulados.
E no mover do Tempo
Segue sem previsão
Os desencontros no tempo.
***
Encruzilhadas
87
Escolhemos
O homem do passado...
Vive lá.
E nunca viverá no presente.
Na encruzilhada da vida, foi o momento.
Despedida escolhida.
Acabou...
Se lê meus rabiscos...
Não comenta.
Não mexo no mundo dele.
Se o encontro é por acaso
E sobre o passado não falamos...
Na encruzilhada, escolhemos
E pronto. Acabou.
Segue o tempo a desenrolar esse pergaminho.
Espera o amor o seu momento...
***
Encruzilhadas
88
Momento Roubado do Tempo
Momento roubado do tempo... Quando fizemos esse
pacto que não lembro?... Com o virar das páginas do
livro da vida, muita coisa fui entendendo.
No caminho, erros e acertos escrevendo...
Ninguém consegue ser feliz em débito consigo
mesmo.
Quando virei às costas e disse: “nunca mais é um
bom tempo”, era somente uma menina ferida na
alma. Por uma frase... Assim sou eu.
Sofri, como nunca havia sofrido por ninguém.
Nunca amei nada como amei você.
Sua tolice durou um mês, esse foi seu tempo. Mas eu
não estava mais no seu mundo. O meu mundo tinha
caído e usei a razão para reconstruí-lo... Enfim, o
fim.
Tempo depois, o reencontro. O sentimento estava
ali. Mas já não era nosso tempo.
E a vida seguiu. Adormeceu meu coração, o tempo.
Minha Pena abandonada no tinteiro endureceu.
Quando longe, rodeada de águas, ouvia o som dos
cânticos seus... Nunca, seus pés a bailar, minha
mente esqueceu... Não preciso fechar os olhos pra
Encruzilhadas
89
recordar cada detalhe seu. Um dia vi uma
reportagem, um casal de velhinhos se casando.
Diziam: “esperamos as responsabilidades
terminarem.”
Nesse momento, chorei...
Outro dia, no amanhecer,
sem avisar, invadiu o quarto sua presença.
Tão real sua essência...
Nesse dia me desesperei, pensei: “ele se foi. Não
podia o meu compromisso ignorar e ligar.”
Mas consegui um recado mandar:
“não se atreva a morrer.”
Enfim o horizonte, a “liberdade”...
Quando disse: “estou aqui.” Era só para avisar que
em algum momento de trabalho íamos nos
encontrar.
Enfim você veio. Quando seu rosto iluminou a tela
meu coração bailou no peito. Quando olhei nos seus
olhos, nada poderia me preparar para o que senti.
Minha mente procurava se concentrar no som das
rodas sobre o asfalto. Somos tudo que a sociedade
Encruzilhadas
90
espera de duas pessoas... Eu não me lembrava que
era daquele jeito. Aquilo não era desejo,
excitação, era mais...
tudo junto, concentrado em um toque de mãos. Era
o tempo aprisionado em um momento.
Não interessava a capa que te envolvia, era a
essência que se misturava com a minha.
Era emoção, sonho, refúgio, tudo.. Era grande
demais o pequeno momento roubado do tempo.
***
Apenas
Grande desejo de sair
Além das montanhas...
Ser uma senhora do tempo.
Desfazer tudo que você vê.
O domínio das rédeas do impossível.
Montar o vento.
Esquecer as limitações da realidade.
Encruzilhadas
91
Eu me perco em você na eternidade
Apenas por um momento.
***
O Coração continua...
Chegou no dia certo sem atraso.
Desejos de saúde e felicidade
Juntamente com os parabéns.
Quem se atrasou fui eu...
Engana-se alma brincando...
Brincando de ser feliz.
Distribui beijos ao vento.
Caminha no chão com contentamento.
Essa alma forte que habita essa capa...
A razão repetindo uma ladainha antiga
Dizendo: elos de almas, não existem...
Amor que resiste ao tempo é utopia.
Ah essa alma!
De repente vira poeta, explodindo em versos,
Vagando pelo universo, com o coração em festa.
Vira nada, desaparece toda razão...
Recebi muitos votos, muitos abraços, muita emoção.
Mas com você, eu sou somente coração.
Encruzilhadas
92
***
Para sempre...
Caminha a vida de mãos dadas com o tempo.
Tudo o que se via já não é igual.
Mudamos nós.
As paisagens pouco mudam.
A Terra para sempre continua.
Em cada pedaço dessa cidade
Uma recordação...
Seja no asfalto ou na grama.
Chapada interditada...
Natureza pelas mãos do homem tocada.
O sol continua a aquecer...
A chuva continua a cair...
Seja noite, dia, madrugada...
No escrito do Tempo,
Nossa história para sempre registrada.
Encruzilhadas
93
***
Eternidade de um Momento
Viver a eternidade em um momento...
É saber que tudo que desejou está ali
Na presença que se sente
No coração feito de emoção.
É sentir a alma flutuar no infinito.
É saber que se tivesse o poder de escolher
Pararia o tempo naquele momento.
É não ter palavras para descrever o sentimento
Que se vive naquele momento.
Encruzilhadas
94
***
Rabiscos
Rabiscando, segui na vida.
Nem me lembro em que momento os textos viraram
rabiscos...
Sonhos perdidos no tempo, a flutuar no ar.
Caminhos de enganos percorridos sem pensar.
Foi aí que me desequilibrei e o tombo me fez
acordar.
A dor, enfim, fez a alma respirar.
Banhados de sangue, meus pés a despertar.
Olhos, enfim, do chão se levantar
Fixos no céu, a única esperança buscar.
Recebendo o balsamo, o coração se fez gratidão.
Curada a alma, pés cicatrizados a correr pela
amplidão
Voltando a apanhar as migalhas.
Sabendo com certeza que no final encontraria você
Sorrindo da minha confusão. Para, enfim, nos meus
rabiscos fazer correção.
Encruzilhadas
95
***
Doação
Caminhando e modificando.
Seres que se tocam nesse caminhar.
Essências que se misturam
Especiais, por serem únicas.
Umas as outras modificando...
Nos caminhos da vida.
Milagre da doação.
***
Marca
O vento dissipa a fumaça.
A água apaga o fogo.
A palavra
Como a flecha disparada, não volta.
Mas quando uma porta se fecha
Encruzilhadas
96
Deus nos presenteia com portais.
Deus nos marca e não nos esquece.
Ainda bem!
***
Sentei na Praça...
Sua presença se faz presente em cada espaço.
No momento, minha alma caminha
Passos seguros por vários lugares.
Sento em algum lugar do presente
Minha alma pede licença e se ausenta.
Deixa-me na companhia dos meus olhos brilhantes
Do meu rosto sorridente. Olho esse flutuar
deliciada.
Desfruto do momento.
Nem Deus retirou meu amor por você...
Cada pedaço, cada rua, cada calçada...
Cada árvore desta praça...
Mergulhadas na tinta da recordação...
Minha emoção toca tudo sem lamento.
Ouço seu riso encher a praça
Encruzilhadas
97
na alegria de outros tempos...
Marejados estão os olhos que sorriram
um dia naquele momento.
Amor poderoso resistiu ao tempo,
vive em cada parte do pensamento.
Religiões, seitas, compromissos,
distâncias, desencontros, razão.
Ilusão de outras mãos...
Contemplo meu coração despido nesse momento.
Sem ódio, sem lamento.
Meus versos cobertos de agradecimento!
Quantos vivem sem viver... Outros jamais vão
entender.
Somente quem já sentiu e quem já pegou carona em
um cometa...
Segurando firme em uma mão, entenderá...
Nada vai mudar, somos e seremos sempre assim:
Algemados pelo Tempo a um amor sem seu tempo.
Encruzilhadas
98
***
Pequei...
Meu pecado não foi ter escrito a carta.
Meu pecado foi exigir a confirmação.
Chegou ao destinatário e daí?
Pedi a Deus uma coisa somente.
Pedi uma vez mais
Única vez... Ouvir sua voz... Tocar suas mãos...
Meu pedido foi atendido.
Frente a frente com a fera.
Quando o apito soou
E fui retirar a carta... Era tarde.
Já havia vindo sua resposta...
Levantei os olhos para o Pai.
Criança teimosa que bate o pé
Encruzilhadas
99
Dá birra e chora.
Tem tudo e quer a única coisa negada.
Vi-me soluçando e batendo o pé.
O coração dizendo eu quero...
De você não tenho medo...
Meu temor é do Deus que diz não.
***
Lembrança (ainda) viva...
Sinto falta do meu ontem.
Apenas não quero que ele volte.
Tudo que no passado ficou.
É impossível ser mudado.
Prefiro que seja contado em versos e prosas.
Jamais revivido ou tocado.
A caminhada pela vida nos transforma.
Perdemos algumas bagagens, adquirimos outras.
Mas a pureza e a inocência são irrecuperáveis.
Como apagar lembranças do que vivemos...
Impossível negar as mudanças. A metamorfose...
Nunca mais seremos o que fomos.
Então deixemos que a lembrança viva...
Prisioneira do tempo, sem rancor.
Encruzilhadas
100
Somente saudade, trará melancolia.
Mas no fim tudo será poesia.
Sem nunca ferir ninguém. Na alma a cicatriz...
Dolorida, mas somente nossa.
***
Coração...
Coração saudoso. Traz a melodia de outros tempos.
Perfeição de outros momentos.
Tudo guardado, com muito zelo conservado.
Encanta os acordes na orquestra do tempo.
Dolorida alma no salão da saudade.
Rodopia alem da realidade.
Coberta pelo véu da poesia.
Voa livre, atravessa décadas...
Esquece os pactos da realidade.
Tudo proibido está. Portas fechadas.
Trincos das escolhas...
Folhas do livro no infinito autenticadas.
Tudo feito sem alarde. Nada no livro humano
anotado.
Encruzilhadas
101
Nem nas nossas biografias citado.
Caminhamos eqüidistantes... Paralelos...
No salão da saudade rodopiamos.
Meus rastros invisíveis a te buscar...
Seus rastros no meu mundo a caminhar...
Segue essa procura...Toca a orquestra do tempo...
Rodopiamos ao som da melodia da saudade...
No salão da saudade, sonhamos.
***
Mágica
Invisível na multidão,
Protegida pelo anonimato,
Deleita-me o prazer de observar você.
São eficientes seu gestos a transmitir conhecimento.
Observo seus pés... Suas mãos...
Seu corpo a movimentar.
De repente você se aquieta...
Momento congelado no tempo.
Olhos perscrutando a multidão...
Encruzilhadas
102
Seu olhar encontra o meu.
Em respeito, os sons se calam, a multidão
desaparece.
Roubamos, do tempo, um pedaço.
Deliciosamente nosso esse momento.
Mágica que vence o tempo.
***
Marcas
Marcas que a alma possui.
Marcas dos passos. Marcas de caminhos.
Pedaços de vivencias. Divididos em momentos.
Muda o Ser através do tempo.
Adquire marcas na necessidade da caminhada...
Endurece o Ser com a dureza de certos caminhos.
Muitas vezes pés feridos, marca de passos.
Vermelhos passos...
No caminho muitas vezes solitário,
Encruzilhadas
103
em meio a uma multidão...
Mas a alma continua a mesma.
Alma que olha para traz e não se reconhece nos
caminhos do passado.
Alma que habita um Ser em constante mutação.
Ser carregado de risos, lágrimas, ilusões.
Bendita alma que não se rende a situação.
Sustentando o Ser segue a alma.
Lembrando sempre que o Ser necessita caminhar.
Alma que não deixa o Ser duvidar.
A luz da janela existe acesa a esperar.
***
Improviso
Quero te sentir na madrugada.
Passos soltos nas calçadas
Caminhando sem pressa
Vento no rosto, luzes de néon.
Multicores sonhos acompanhando nossos passos.
Frases soltas, improvisos...
Mãos dadas.
***
Encruzilhadas
104
Colcha de retalhos
A vida é um conjunto de vivências.
Como uma colcha de retalhos
Costurada pelo destino caprichoso
Que, com a ajuda das nossas escolhas, fornece a
linha para a costura.
Todos os pedaços ligados por esta linha de fios
indestrutíveis.
Difícil imaginar um ser humano que nunca parou e
se perdeu,
alisando os retalhos desta colcha que é sua vida.
Quantas cores possuem esses retalhos!
Quanto som ouviu de cada um deles!
Do primeiro a inocência da infância.
Seguidos de cada mudança de nosso ser.
Olhamos cores da alegria, sons de risos.
Nossos risos; presos no meio de tantas obrigações!
Cada um costurado ao longo do caminho.
Cada missão completada. Cada carga carregada.
Quantos retalhos!
Quantas emendas!
Quando usei esse tecido colorido alegre?
Encruzilhadas
105
Quando usei esse triste, eu me lembro...
Nossa quanta escuridão nesse preto disfarçado de
azul!
E finalmente a preocupação.
Quanto retalho falta para a finalização?
Desejando um arco-íris para colorir essa ilusão.
***
Asas curadas
Brindam o momento
Na liberdade de um alvorecer.
Juntos ver o sol nascer.
Se arrastando pela noite.
Asas feridas, tingidas de vermelho.
Sangrando seus sonhos. Cada gota um gemido.
Coração adormecido pela dor
Troca os passos vacilantes.
Pés sensíveis estranham o terreno firme.
Encruzilhadas
106
Mexe as asas, que horror!
Grita sua dor para a escuridão.
Além, existe seu mundo.
Tão longe suas inspirações!
Longe, além do breu está toda beleza.
Tudo aquilo lhe pertence, seu mundo além do tempo.
Sem limites para voar. Sem limites a respeitar.
Arrasta o Ser destruído, sentindo as asas feridas...
Sem opção se não caminhar.
Doloridos passos nesse chão a vacilar.
Refém do tempo a lhe afrontar.
Escuridão da noite a lhe cegar.
Caminha e já não grita. Aperta os dentes.
Coração não mais dormente...
Olhos recuperados, enxergando além.
Sentindo junto ao peito o passaporte para a
liberdade.
Sua Pena bem guardada no coração.
Com cuidado testa as asas, escondido, sem alarde.
Na hora certa ergue os olhos, sem medo da
escuridão.
Não mais uma inimiga, mas companheira de
viagem.
Asas abertas, enfim, brilhando. Pena na mão.
Voa o poeta para o infinito. Venceu a escuridão!
Encruzilhadas
107
***
Desencontros
Muitas vezes a realidade da vida atinge a alma.
Golpe inesperado abre a porta à tristeza.
Apagam-se as luzes. Somente o silêncio...
Busca a alma a solidão. Coloca sua vida sob o
lampião.
Põe-se a analisar sua trajetória. Abre o mapa das
escolhas. Observando os oásis, os desertos...
Mapa traçado pelo seu livre arbítrio.
Alma que não é perfeita nem imperfeita.
Somente alma. Cada escolha, uma razão.
Consequências de sua opção.
Não entendeu nada, apenas viveu...
Querendo ou não, encarar o que não tem solução.
Abre portas trancadas, retira a poeira, sem sonhos.
Lustra os móveis com lágrimas salgadas,
Olha o mapa ainda a terminar, lápis das escolhas,
por necessidade tem que caminhar.
Caminho de descida cada dia mais perto de
terminar.
Contempla a alma, a encruzilhada onde não pode
voltar.
Encruzilhadas
108
Lá deixou algo que nunca mais poderá recuperar...
Não existem mais sonhos nesse universo para
sonhar.
Nem menina, nem mulher. Somente uma guerreira
Que, por necessidade, continua a caminhar.
Respeitei o Deus que criou o homem.
Respeitei os deuses que os homens criaram.
Respeitei as convenções. Sem contradizer a sentença
escrita no infinito. Pela caneta do Criador
assinada. Confirmada pelos desencontros que nunca
permitiram um encontro. Sabia que no meu odre
levaria a solidão.
***
Adormecido
Adormecido Vesúvio em dois Seres. Danças de mistas explosões. Reconhecimento em
constante mutação. Alternadas explosões.
Encruzilhadas
109
Quanto mais tempo adormecido, pior será a erupção. Em constante perigo os seres que em volta habitam.
Vesúvio adormecido que um dia despertará... Dos que habitam em sua volta, não mais se
lembrará. Terrível e maravilhoso dia será.
***
Nossas Mãos
Venha se assentar comigo na varanda do castelo do tempo.
Contemplemos nossa caminhada na estrada incerta dos nossos momentos.
Repare nossas mãos como mudaram... Não mais puras nossas digitais. Como foi longa nossa trajetória!
Com certeza estava escrita nossa despedida naquela encruzilhada. Tolos viajantes insensatos em suas
escolhas! Mãos separadas para nunca mais se encontrarem. Mãos que pela caridade do tempo se
tocaram algumas vezes... Mãos sobre mãos por lágrimas molhadas. Mãos que, por necessidade, intocáveis se
transformaram. Como brilham essas mãos quando se tocam!
Desespero desses olhos que não conseguem enxergar o futuro. Pela fé contemplam uma luz em
Encruzilhadas
110
pensamentos. Dela vem a força. Força que sacode a poeira do tempo. Levantamos-nos, separados e
juntos. Seguimos em frente. Às vezes, choramos. Às vezes, rimos. Dor dividida. Escritos guardados... Livros
não publicados... Papéis amarelados... Amor derramado pela vida em palavras nunca lidas.
Mas nunca deixaremos de esperar o encontro marcado no lugar seguro. E o Deus de amor que nos
perdoe por tanto amor! ***
Pensamentos ao Vento
Nossos pedaços voando pelo ar Transformando a realidade em chão
E nossos pensamentos em vento Sem necessidade de nenhuma conexão avançada. Nesse mundo, somente um acessório bem-vindo, Sempre o aviso da intuição, que invade o ser de
saudade. Toque da corneta anunciando a alvorada no
coração. Sem surpresas seus rastros no único lugar certo. Visíveis passos revelados pelo brilho da saudade.
Sempre em dias iguais. Explicar como, essa transmissão de pensamento?
Tantas fotos onde a boca sorri e os olhos contradizem.
Encruzilhadas
111
De dois lados, o aviso trocado. Estou caminhando. Nas marcas do corpo, o segredo guardado.
No coração, muito amor reservado, intocado No silêncio mudo de dois mundos.
Vozes de seres acorrentados às suas realidades. Almas que, com as asas do pensamento, voam. Que não se preocupam com as marcas no corpo,
Presentes do tempo. Generoso tempo... Preservamos o caráter, a integridade. Somente uma falha nessa paisagem:
O amor que carregamos escondido na bagagem.
*** Inquietude e Urgência
Conquistei tanto na vida!
Mas o sonho almejado foi sempre adiado. Vez ou outra, distribuo palavras ao vento.
Desafios ao Tempo. Voando em pensamentos. Encaro os passos do Tempo.
Implacável esse Senhor Tempo. Consciente do caminho. Agora de descida...
Chegaremos muito mais rapidamente. Tão rápido passaram os anos...
Nem notamos seus passos sorrateiros. Nos levando pela mão a ilusão do amanhã.
Vejo grama, vejo árvores, jardim de descanso. Final do caminho aqui...
Encruzilhadas
112
Esperar para não ver ou ver. A visão de um túmulo coberto de grama. Quem sabe de pedras em um mausoléu...
Segredos guardados pelo Tempo. Nessa fila que desce, separados estamos.
Não é novidade, que a morte é a certeza que a vida nos concede.
***
Voltando
Cada dia mais perto de casa.
Sinto saudade quando a chuva cai e molha o jardim. Sinto saudade quando o balançar da rede
repete que não estás aqui. Sinto saudade quando a música dos pingos toca
solitária em meus ouvidos. Sinto o frio gelar os meus pés descalços
no chão da varanda. Sinto o calor do tapete da sala abençoar os passos.
Sinto necessidade de obedecer à voz da razão. Sinto o calor das almofadas receber o corpo.
Sinto o corpo agradecer essa dedicação. Sinto, pressinto, me ressinto.
Sinto na alma a certeza. Estou indo para casa.
Encruzilhadas
113
***
Madrugada
Madrugada. A chuva veio mansa. Descansou na terra.
Partiu, mas seu perfume ficou no ar. Deitada fiquei a escutar. Os seres na noite a
caminhar. O vento mansamente sussurrando para as folhas.
Almas insones viajando... Meu corpo rolando, buscando o sono.
Sem reclamar me junto às almas na iluminada estrada do infinito.
Elevando-me sobre o mundo. Contemplo estradas feitas pelos homens. Busco-te o corpo sentindo esse tormento.
A razão de repente tenta explicar esse intento. Num átimo, pés descalços no chão frio da razão.
Não tem porque buscar essa viajante, esqueceu as palavras que falar...
Volta à cama e se abraça com o tormento. Seu único alento encontra numa folha branca,
tingida pelo desabafo e lamento. E mesmo assim, não consegue se livrar desse
tormento.
Encruzilhadas
114
***
Incerteza
O tempo caminha lentamente. A razão não consegue abafar os sons dos acordes
dentro da mente. Dançam as lembranças no pensamento.
Cada detalhe do palco da vida traz uma referência. Nessa dança luto para ser guiada pela Razão.
Passos seguros. Precisos. Música calma nesse salão. Ladrilhos iluminados pela segurança,
sem improvisos nessa dança. De repente, trocado está o parceiro.
Pela mão da Emoção me vejo guiada. Mudados são os sons dos acordes,
rodopio tonta nessa ilusão. Sons invadindo o Ser. Mente anestesiada.
Torpor de prazer. Flutuo além do chão.
Não existe em meu Ser, espaço para a Razão. Nessa dança sou senhora, sou escrava.
Um Ser livre, escravo. Algemas de um querer.
Invadem o salão os ventos da liberdade. Dança de seres cobertos pelas vestes de um desejo
Encruzilhadas
115
certo. Sinfonia do Ser para um futuro incerto.
***
Infinito
Em quantos mundos caminhamos até chegarmos a um momento?
Trazemos na capa que nos envolve, a essência que nos diferencia.
Em um toque apenas a melodia dos mundos se faz presente.
Voa tantas lembranças no encontro de um olhar!... Na pele, o cheiro de outros ambientes...
A alma se delicia ao sentir o toque desse perfume... Reprises de outras falas na peça do infinito,
perfume soprado de outras existências... Endurecido coração a todos os lamentos;
amolecido coração ao toque desse momento. Foge e esconde do coração as indagações,
quer somente ignorar o chamado da razão. No topo da montanha, observando a imensidão... Consciente do infinito presente nos seus olhos...
Vazio, imensidão, liberdade, tudo, nada... o convite para simplesmente voar!...
E a única certeza? Eu adoro voar!
Encruzilhadas
116
*** Somente Nosso Pacto
Seres humanos têm um nome muito apropriado,
humanos. Sou humana, cometo erros primários no meu
caminhar. Coleciono derrotas e vitórias nesse percurso que, às vezes, considero longo, outras vezes, curto demais.
Descobri que felicidade não existe... Somente momentos felizes. Não posso prender um momento, então procuro aproveitá-lo, porque necessito dele. Tantas são as interrogações que carrego... Um baú
de indagações... Escrevo sobre as vivências que colecionei pelo
caminho. Mesmo sem querer... Amor!!! Um trono no coração. Nele assentada a ilusão de algo que nunca se concretizou. Uma
fuga... Refúgio. Escudo, proteção. Perfeição não existe; somente palavras desenhadas
numa página em branco; libertação. Atores que contracenaram comigo; que contracenam Neste imenso palco da vida. Cada um trazendo suas
vivências, misturando experiências. Atuamos sem saber o texto; segredo do autor, que observa e decide
Encruzilhadas
117
o contexto, obtendo textura perfeita. Religião, religiosidade. Quantas existem? Não sei. Sei somente que, às vezes, me assustam. Deus não me assusta. O que me assusta são os homens que
criam os deuses. O fanatismo humano. A ganância, a enganação. As regras que criam em nome de Deus. Privacidade; não me agradam os holofotes. Prefiro a
privacidade, uma caneta e um papel. Minha iluminação.
Pessoas; seres maravilhosos, únicos. Todos nós com nossos erros e acertos. Formamos um momento único. O nosso momento de passagem por este
planeta azul. Sigo me dedicando, ansiando a perfeição na minha
atuação. Observando e aprendendo com a convivência, Nesse pacto com meus companheiros de
palco.
***
A Madrugada e a Alma
Céu escuro, vento manso. Encontro delicioso no silêncio desse momento. Mergulha o Ser nos seus próprios sentimentos.
Embalado no momento abençoado da madrugada. Ser dividido entre o sentir e o querer.
Flutuando além do entendimento,
Encruzilhadas
118
Desejando entrar nos sonhos de certo Ser, nesse momento.
***
Templo A noite abriu seu manto.
Embrulhando o clima quente. Veio à brisa se transformando em vento.
Ventos embalando pensamentos. Duas mentes desejando um parêntese.
Saí à noite para a entrada da madrugada. Espetáculo feito em silêncio.
De repente, não existe lamento. O parêntese se faz presente.
Enfrenta o tempo. Na madrugada ergue um templo.
Somente para reverenciar um momento. Um encontro de mãos no presente.
***
O show tem que continuar!
Sou a coleção dos meus silêncios. Nesse palco da vida desejo a primeira música.
A sinfonia da inocência. Inocência que enchia o
Encruzilhadas
119
mundo com suas notas de confiança. Primeira interpretação. Primeiro ato. Só não me
informou a duração do contrato... Entrei e interpretei. Corpo, alma coração.
Era a confiança em uma realização. As luzes se apagaram. A realidade encerrou o ato.
Sem renovar o contrato. Mochila nas costas, artista mambembe.
Estrada longa, às vezes encantadora, às vezes não. Colecionei risos, lágrimas.
No fundo da mochila, saudade escondida... Vez ou outra, nesse teatro da vida,
Nos cruzamos, sentamos e recordamos. Que lindo foi aquele espetáculo!!!
Ainda hoje, em outros atos, imploro que a vida toque aquela sinfonia...
Um dia quem sabe a mágica da sinfonia seja ouvida, sentida, revivida.
Maestro, música!!!... Iluminador, luzes!!! Que se abram as cortinas!!!
O show tem que continuar!!!
*** Rastros
Caminhas dentro dos meus pensamentos.
Dentro de mim seus rastros pela areia do mar do encantamento.
Encruzilhadas
120
Sol nascendo sobre as águas, aquecendo o dia calmo. Mar de águas verdes, profundas e convidativas...
Ergue esse sol a aquecer o meio desse dia. Alimenta a alma esse calor, solidão...
Os sons do mundo não perturbam a tarde dessa imensidão.
Pôr do sol escurecendo as águas... Verde escura, essa tentação.
Encantamento da lua iluminando as águas, a areia fria, pés descalços...
Noite recebendo a madrugada, silêncio nesse cenário,
sua presença presente. Voa o pensamento em silêncio, rabisca versos, sem
tormento. Leito recebendo o corpo, seu encantamento
entorpecendo a mente... Voa a alma para o mundo dos sonhos, guiada pela
saudade, livre, finalmente! Encontra o descanso nesse mar...
Cabeça deitada em seu ombro. Diálogo de dois silêncios nesse momento.
***
Um dia
Será que um dia esse sonho ensaiado em silêncio, será autorizado a cantar? Cantar acompanhado
Encruzilhadas
121
pelas vozes da noite, tocando seus instrumentos Afinados pelo criador para acompanhar essa
melodia de encantamento... Tendo como plateia estrelas do firmamento,
reverentes iluminadoras desse palco enfim abençoado pelo brilho da lua?
Manto escuro e aconchegante dessa noite vivida em pensamentos... Loucos devaneios de uma mente
feita de coração somente... Segredos feitos de silêncios... Silêncios feitos de segredos...
Colcha de retalhos costurados em tantos momentos...
Será que sentes? Ou não se dá conta desse presente?
Olho e toco seu rosto em pensamento... Imagem embaçada, viva e transparente no meu
silêncio. Som de uma voz que pouco diz, somente enche de música meu silêncio. Recordação reverente para guardar sem tormento. Palavras loucas, essas brotadas do solo adubado com silêncios... Dois
silêncios... Um momento... Como me faz bem, fazer parte dessa composição de
tantos silêncios, Que se transformam em momento presente!
***
Encruzilhadas
122
Nem nós Sonhando com seu rosto
a me sorrir em uma noite enluarada Refletindo o brilho da lua a poça d’água na calçada Caminhando nós dois lado a lado ao sereno da noite
Passos em um só compasso... Ritmo sem descompasso.
Dorme a cidade iluminada de neon Segue a lua a invejar os nossos passos
Sons de automóveis na rodovia, sinal aberto para nossos passos...
Sons que não dormem nem silenciam. Não ouvimos sua sinfonia.
Caminhamos rumo à realidade. Nosso mundo de felicidade.
Janela aberta, vidraça bem lustrada, ali estaciona a lua.
Brilhando sobre os lençóis, nosso destino, o descanso sem voz.
Inveja a lua nosso Oásis de paz. Adormecemos misturados em nós
Vêm os pingos na vidraça, acordo. Descubro que não há lua...
nem nós...
***
Teu Nome
Encruzilhadas
123
Hoje, alguém falou de ti... Tu para mim és como o canto da sereia num mar
desconhecido Navego em Teus olhos,
no pensamento e me delicio. Tu és tempestade escondida sobre
águas aparentemente calmas. Mudo o rumo do meu barco de sonhos,
fujo do teu regaço. De repente, ouço o canto invadir todos os cantos.
Sinto o coração se encher de encanto Sinto o corpo clamar pelo encontro
Acalanto de um romance que tento esconder nas ondas do tempo.
Navegar nesse mar proibido pela razão, Razão que se perde quando te imagino aqui. Turbilhões de sensações, emoções, desejos... Tudo girando nessas linhas que te escrevo
Ao som dos remos na água de um querer insano Loucura vestida de fantasia
Dança pagã de dois corpos cristãos Loucura que vivi, sonhei... Recordei
Hoje, ao ouvir teu nome...
***
Encruzilhadas
124
Quem sabe, amanhã...
Sinto sua presença na realidade da sua ausência. Sem querer, viajo em nossos momentos. Quanta saudade de você meu ser sente!
Dentro da realidade do que eu sou e do que você é Me curvo penitente... Nesse teatro da vida, somos
conscientes E encenamos sob a luz do palco, na ribalta...
Voltamos à plateia. Escuridão em reverência... Lado a lado, sentados em silêncio.
Tão juntos e tão separados! Recordando as falas, evitando um olhar.
Quem sabe, amanhã... De repente, não seremos dois,
Mas apenas um Construindo uma realidade
Feita de presença!
***
Agosto
Caminhou em paz janeiro, agora vem agosto Seu aniversário! Caminhas sempre a minha frente,
Não tão distante, mas como quis o Tempo. Moço folgado, o Sr Tempo, passa sem passar.
Encruzilhadas
125
Estive a observar as marcas do seu rosto, Tatuagens feitas pelo Tempo. Olho as minhas. Nem percebemos ou escolhemos seus desenhos!
Devagar foi trabalhando o Sr Tempo... Adormecidos pela sinfonia do cotidiano,
nem percebemos a metamorfose ocorrendo. Décadas foram transformando nossos corpos.
Nossa voz, por vezes desconhecemos... Aqui, à beira do abismo das nossas escolhas,
atrevo-me a contemplar. Enxergo seus olhos dançando no olhar que nunca
esquecerei, porque esse é somente meu. Atrevo-me dançar com você no salão do coração,
Somente nós dois, viajando na recordação. Seu aniversário! Eu que gostaria de receber o
presente... Egoísta como sempre. Quem sabe esse presente um dia chegue, talvez! Devo pedir perdão ao Sr Tempo. Senti, escrevi e
enviei. Da minha saudade para a sua realidade:
FELIZ ANIVERSÁRIO!!! ***
Ser
Alma ferida. Sentimento de culpa no Ser.
Autoflagelação, punição.
Consciência da atitude sem volta.
Encruzilhadas
126
O Ser se cala, abandona seu eu.
Segue pela vida sem fala.
A dor da alma o cala.
Só o Ser entende.
Mistérios do Ser...
Ser que se resume em silêncio.
Anula-se e se rotula devedor.
Triste sina do Ser! Não consegue liberar o perdão
para si mesmo.
Um dia, de repente chega o fim.
Dívida paga, ferida cicatrizada.
Perdoou o Ser a si mesmo.
A paz invadiu o Ser.
Alma curada!
Todos os direitos autorais reservados ao autor,
Proibida a reprodução total ou parcial desta obra
Sem prévia autorização por escrito do autor em
questão.
IBSN: 978-85-912966-1-3