Cátaros e Catarismo

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Cátaros e Catarismo Primórdios ocultos do catarismo!Freqüentemente são agrupados sob o nome de gnósticos grupos muito diferentes, até mesmo opostos, para ter um motivo para combatê-los, exterminá-los, e sobretudo caluniá-los. Os Essênios formaram uma comunidade gnóstica de judeus piedosos que claramente se distanciaram de seus compatriotas. Eles se diferenciavam pela pureza de seu caminho e de sua vida. Eles se distinguiam pela completa pureza de seus costumes. Eles aprovavam o casamento como forma de conservação do gênero humano, mas não se guiavam pelas volúpias da carne. Condenavam os juramentos, a propriedade de bens, a alimentação carnívora e abominavam a mentira. Eles viviam em perfeito desapego das paixões e conflitos humanos ordinários e dos bens terrenos. Eram chamados também de Terapeutas, porque curavam os doentes. Esta comunidade de “puros” se apresentava como a guardiã do verdadeiro sacerdócio hebraico. Ela preparava o nascimento da nova era de luz: a era cristã. Enviados e guiados da fraternidade dos essênios, dos “mestres da justiça”, eles representavam, por intermédio de suas vidas e atitudes, a vinda de um “novo homem”, do qual Mestre Jesus, o Cristo era o protótipo. Para os essênios, não era possível se aproximar dos mistérios divinos senão por uma vida no Espírito, pelo amor a Deus e pelo respeito aos homens e à vida. Devido a seu modo de viver como os primeiros cristãos, os Pais da Igreja os consideram como cristãos apostólicos.A Escola de Alexandria deve ser considerada como um período de fusão das principais filosofias da Antigüidade. Um gigantesco cadinho em que as religiões e filosofias do mundo vieram se mesclar: judaísmo, platonismo, cristianismo, gnosis cristã e egípcia. O helenismo aí revela a antiga sabedoria dos Mistérios, retirada da fonte original comum: o Egito. Ali se pode ver o magnífico paralelismo entre Fílon e Platão. Ammonius Saccas, fundador da doutrina neo-platônica, aí se tornou uma luz: pagãos e cristãos, que admirável, usavam seu nome. Clemente de Alexandria, Orígenes e cristãos encontravam-se com pagãos como Plotino e Porfírio. Os gnósticos se ocupavam ativamente em desembaraçar a filosofia, a ciência sagrada. Eles abordavam de maneira audaciosa os maiores problemas (a existência do mal, o tempo e a eternidade, a corrupção universal e o caminho da perfeição, o homem e Deus) e pretendiam resolvê-los graças à Gnosis, a revelação interior de Deus.Isso explica por que a maioria dos padres gregos, nutridos pela

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Preâmbulo sintético sobre a vida dos Cátaros

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Cátaros e Catarismo

Primórdios ocultos do catarismo!Freqüentemente são agrupados sob o nome de gnósticos grupos muito diferentes, até mesmo opostos, para ter um motivo para combatê-los, exterminá-los, e sobretudo caluniá-los. 

Os Essênios formaram uma comunidade gnóstica de judeus piedosos que claramente se distanciaram de seus compatriotas.

Eles se diferenciavam pela pureza de seu caminho e de sua vida.

Eles se distinguiam pela completa pureza de seus costumes.

Eles aprovavam o casamento como forma de conservação do gênero humano, mas não se guiavam pelas volúpias da carne.

Condenavam os juramentos, a propriedade de bens, a alimentação carnívora e abominavam a mentira.

Eles viviam em perfeito desapego das paixões e conflitos humanos ordinários e dos bens terrenos.

Eram chamados também de Terapeutas, porque curavam os doentes.

Esta comunidade de “puros” se apresentava como a guardiã do verdadeiro sacerdócio hebraico.

Ela preparava o nascimento da nova era de luz: a era cristã.

Enviados e guiados da fraternidade dos essênios, dos “mestres da justiça”, eles representavam, por intermédio de suas vidas e atitudes, a vinda de um “novo homem”, do qual Mestre Jesus, o Cristo era o protótipo.

Para os essênios, não era possível se aproximar dos mistérios divinos senão por uma vida no Espírito, pelo amor a Deus e pelo respeito aos homens e à vida. Devido a seu modo de viver como os primeiros cristãos, os Pais da Igreja os consideram como cristãos apostólicos.A Escola de Alexandria deve ser considerada como um período de fusão das principais filosofias da Antigüidade. Um gigantesco cadinho em que as religiões e filosofias do mundo vieram se mesclar: judaísmo, platonismo, cristianismo, gnosis cristã e egípcia.

O helenismo aí revela a antiga sabedoria dos Mistérios, retirada da fonte original comum: o Egito. Ali se pode ver o magnífico paralelismo entre Fílon e Platão. Ammonius Saccas, fundador da doutrina neo-platônica, aí se tornou uma luz: pagãos e cristãos, que admirável, usavam seu nome.

Clemente de Alexandria, Orígenes e cristãos encontravam-se com pagãos como Plotino e Porfírio. Os gnósticos se ocupavam ativamente em desembaraçar a filosofia, a ciência sagrada. Eles abordavam de maneira audaciosa os maiores problemas (a existência do mal, o tempo e a eternidade, a corrupção universal e o caminho da perfeição, o homem e Deus) e pretendiam resolvê-los graças à Gnosis, a revelação interior de Deus.Isso explica por que a maioria dos padres gregos, nutridos pela Gnosis alexandrina, guardaram essa impressão de alta espiritualidade: Clemente de Alexandria, João Crisóstomo, Orígenes.

Um século depois de Agostinho, que fora maniqueu antes de ser cristão católico , Atanásio, bispo de Alexandria, professava uma doutrina da alma digna de um verdadeiro gnóstico. Tertuliano teria sido um dos primeiros fiéis da Igreja dos “puros” (catharoï); como Montanius, fundador da primeira Igreja cátara em 140; como Novat, bispo cátaro em Cartago; como Novatiano, que se tornou papa, e permaneceu papa (em 250) durante vinte anos!

Foi nesse verdadeiro cadinho espiritual alexandrino que se confrontaram a sabedoria de Hermes, o essenismo e o neoplatonismo com o cristianismo, em cujo espírito o catarismo se desenvolveu.

Desde a aurora dos tempos, os que transmitiram a sabedoria, a Gnosis, incitaram a humanidade a descobrir que um caminho de regresso à perfeição original existe e que um processo imenso e

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misterioso leva à verdadeira vida, a vida do homem-alma-espírito.

Em verdade, de Rama, o arquidruida, até Hermes Trismegisto, de Hermes a Pitágoras, de Pitágoras a Virgílio, de Virgílio a Dante, é a mesma corrente espiritual e secular que gira. Celtismo e pitagorismo são irmãos. Druidismo e cristianismo se completam, e não é de modo algum por acaso! A essência da doutrina dos druidas é cristã em seus fundamentos puros, embora ela tenha sido elaborada antes de Cristo.

Índia, Egito, Palestina, Grécia e Alexandria;Pitágoras, Platão, Jesus; Dante, Gnosis islâmica;para finalmente aparecer na Europa com os cátaros, os templários, os rosacruzes...Uma longa corrente áurea, uma série de elos conectados uns aos outros.Mas é sempre o mesmo pensamento no trabalho, um fundamento espiritual idêntico que reencontramos sob símbolos diferentes: a Gnosis, o templo do Espírito, a Fraternidade Universal.O Mistério envolve todas as origens: a do mundo, a do cristianismo, a do homem.Cristo, ele próprio, trabalha em uma “nuvem luminosa”; e quando ele enraíza profundamente o trono divino, vemos surgir através do matagal confuso três ramos-raiz:

O ramo judeu e tradicional de São Pedro;O ramo grego de São Paulo;O ramo oriental, platônico e místico de São João.

A qual dessas três ramificações primitivas se ligam os cátaros, o catarismo dos Pireneus franceses, com o maniqueísmo aquitano, os templários e mais tarde os rosacruzes?Evidentemente à última, a de João, filho de Zebedeu, o discípulo bem amado do Senhor!Moisés desceu das nuvens trovejantes do Sinai portando as Tábuas da Lei. Cristo, ascendendo em sua glória, deixa ao mundo apenas seu Verbo. O Verbo se condensa em um evangelho primordial. Esse arqui-evangelho hebreu é dividido em quatro evangelhos gregos que se fragmentam em uma multiplicidade de lendas evangélicas escritas em idiomas orientais. Cada nação tem sua própria biografia de Jesus, cada grupo de fiéis modifica a imagem de Cristo de acordo com suas próprias idéias:

Para os judeus, ele é “filho de Abraão”;

Para os gregos, ele é “Filho do Homem” e suas origens remontam a Adão;

Os orientais ignoram toda sua genealogia humana e vêm nele apenas o Verbo, Filho de Deus.Cristo também tem sua mitologia. A igreja se arroga o direito de tornar proscrita essa diversidade de lendas apócrifas e considera verdadeiros apenas os quatro evangelhos: o homem, o leão, o touro e a águia. O concílio de Nicéia os declara “os únicos ortodoxos”. Mas a fonte dos quatro rios, o exemplar único e original, o arqui-evangelho, desapareceu! Gregório de Naziance, bispo greco-asiático do século IV, patriarca de Constantinopla, dizia:

“Mateus foi escrito para os hebreus;

Marcos, para os romanos;

Lucas, para os helenos;

João, para todos os povos do Universo.

”No lugar do “Verbo”, os cátaros invocavam o Paracleto.

O evangelho de João se constituía quase inteiramente sua Bíblia, onde sua história principiava.O Apocalipse de Patmos abria sua epopéia. Seu espírito tinha o temperamento da águia, símbolo de “Boanerges” (filho do trovão). Pelo apóstolo João, o “amado do Salvador”, e pelo seu evangelho, os cátaros eram não somente da mais pura linhagem evangélica, mas ainda da mais alta origem ortodoxa. Entretanto, eles ultrapassaram esse poderoso impulso até o mais alto ideal cristão. O evangelho espiritual estava ligado ao sentido da mais alta realização: o homem-espírito.

Eles não eram apenas místicos, eram também gnósticos.Seu cristianismo era uma “gnose”, um “conhecimento” dos mistérios divinos e uma pregação. Seu chefe era o Verbo que ensina. Como o Deus Salvador de Platão, ele salvava pela verdade, não pela expiação ou martírio.A razão nunca pôde explicar a coexistência simultânea do infinito e do finito, de Deus e do mundo. Se o Espírito é

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o Ser, a matéria é o nada. Se o Espírito é o bem, a matéria é o mal, ou seja, o não-ser. Deus, sendo o Ser infinito, a carne é apenas uma sombra, o mundo uma aparência, o destino um drama trágico, fantasmagórico!Havia gnósticos judeus e gnósticos greco-sírios. A estes últimos estava ligado o catarismo da região dos Pireneus. Eles eram gregos orientais.Greco-hindu, o catarismo rejeitava o judaísmo, os livros hebreus, as violências de Moisés, os trovões de Jeová.“Deus é Amor”.

Ele se distingue claramente do maniqueísmo persa ao rejeitar o dualismo entre o Espírito e a matéria, seu mal eterno, seus resquícios do mazdeísmo. Zoroastro lhe era tão estranho quanto Moisés.Cristão, anterior ao cristianismo do Concílio de Nicéia, o catarismo não aceita os livros judeus, nem os evangelhos judaicos, nem os símbolos da Igreja imperial, nem as pompas pagãs da teocracia romana.Ele está ligado, sobretudo, a Montanius, a Marcion, os primeiros “cátaros” (140-199), a Novat, a Novatiano (o papa cátaro).

Gnóstico, ele se separa dos outros gnósticos deixando de lado os éons, os Abraxas, os diagramas, os números cabalísticos. Ele se separa do tronco cristianismo pelo ramo-raiz de São João e forma como um neo-cristianismo mediante a elevada idéia geradora do Paracleto.“Religião do Espírito” (Mani, manas, mens, designando o pensar superior, o Espírito).

É a religião de Hermes, o Mercúrio da cultura latina.Nos ensinamentos “herméticos”, a tônica é colocada no pensamento superior que é a alma divina: somente a alma, nascida no coração, se liga ao Espírito. Ela “conhece” Deus. Ela serve a Deus pela razão esclarecida. Somente o Espírito, manifestado na Alma, salva o ser humano.

Inspirado por Alexandria, esse movimento se diferencia do neoplatonismo por rejeitar todas as mitologias e tradições órficas, homéricas e olímpicas, para se unir, por intermédio de João, a Cristo.O Evangelho de João é para ele, “o livro levado pelo anjo ao Zênite do Céu”.Ele se destaca de Francisco de Assis, bem como de Joaquim de Flore, pelos seus dogmas alexandrinos e por seu insuperável horror a Roma, dos horrendos processos da Inquisição, da morte dos hereges proclamada por Leão I em 447, da vergonhosa condenação do livre pensamento pelos grandes teólogos católicos, dos quais o modelo, sem sombra de dúvida, foi fornecido por São Tomás de Aquino.