Capao da Canoa

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Daily of daily wage in romance form. Writing in Portuguese language of Brazil.Diario de ferias - romance ilustrado com fotos, contando as coisas divertidas que ocorreram durante as férias que passamos em Capão da Canoa - RS (simulação do livro impresso)

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Capão da Canoa

Fábio Simões Grossi2007

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AUTORFábio Simões Grossi

REVISÃO DO TEXTOBesma Massad

PROJETO GRÁFICOJosé Luiz Valero Figueiredo

Grossi, Fábio SimõesCapão da Canoa / Fábio Simões Grossi – BauruSP : Fábio&Valero, 2007.1- Diário de férias - Romance

DADOS DE CATALOGAÇÃO

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ra dia de eclipse total da Lua, dia claro, boa visibilidade, fiquei à espreita.Parece que ninguém estava interessado em ver a sombra da Terra ir enco-

brindo a Lua. Resolvi alertar todo mundo. Claro que não podia deixar de telefo-nar para o meu querido amigo, Fábio. Quando Tauam me disse que o Fábioestava em Porto Alegre e que a Ana não tinha ido com ele, não acreditei. Ele foi como Paulo e a Li. Mais surpresa fiquei ainda, quando, de volta, Fábio me diz que tinhaescrito um livro sobre a viagem. E me mandou por email o texto para correção.Além do texto, há fotos, muitas e belas fotos, mostrando aeroportos, cidades,praia, o apartamento onde se hospedaram, a família da Li, as pessoas com quemconviveram, os lugares por onde passaram, enfim o mar e a montanha na exube-rante paisagem da serra gaúcha.As fotos foram tiradas de duas câmeras, do Paulo e do Fábio, que é um expert emfotografia. E não me surpreende que haja fotos deslumbrantes, verdadeiras obrasde arte, algumas bem impressionistas e que poderiam até ilustrar cartões postais.O texto flui fácil, numa linguagem clara, simples e objetiva, compondo um diárioou crônicas de um jornal, relatando fatos do dia-a-dia.

E

Prefácio

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O tom jocoso prende o leitor, na medida em que desperta o interesse nele deconhecer a seqüência imediata da narrativa. Um texto que revela bem a persona-lidade do Fábio, calmo, amável e gentil sempre.Lendo e corrigindo o texto, quantas vezes não conseguia conter a expectativa, aoquerer antecipar o desfecho dos acontecimentos com perguntas do tipo: E daí? Oquê aconteceu? As respostas vinham imediatas, satisfazendo minha curiosidade.Em resumo, um livro em que texto e imagem se harmonizam e se completamnaturalmente.

Besma Massad

PREFÁCIO

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Sumário

Prefácio . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 3Desde Sampa . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 7De Volta ao Relatório . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13A Bronca do Comissário de Bordo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 19Chimarrão de Boas Vindas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 25Os Gatos da Tia Lina . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 29Quem Será este Senhor? . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 39Capão da Canoa . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 45Um Presente para Iemanjá . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 516600 Metros . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 57Tinturaria Fábio’s Grossi . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 65Alegoria das Duas Nuvens . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 71Farofa com Tatuíra . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 73Churrascaria Estância Gaúcha . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 83Salvo pelo Photoshop . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 89Show de Câmera . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 103Sol, Mar e Lasanha ao Pene . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 111Sopinha de Tudo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 117Gramado e Canela de Lambuja . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 129Adeus Porto Alegre . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 147

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07h30 da manhã do dia 3 de março de 2007

IDesde Sampa

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stou em Porto Alegre, meio de carona nas férias de Paulo e Eliane.Convidaram a mim e a minha esposa Ana Maria (prima de Paulo), porém,

acabei vindo sozinho, para variar.Resolvi fazer um pequeno relatório da minha viagem desde que pegamos o aviãoem São Paulo.A viagem de avião foi algo emocionante. Minha única viagem anterior fora hámuitos anos e eu já não me lembrava das sensações que sentira àquela época.Chegamos ao aeroporto de Congonhas em São Paulo uma hora antes do embar-que para o check-in e nos apresentamos no balcão da Gol. Fazia muito calornaquele ambiente, provavelmente algum problema com o ar condicionado. Atodo instante eu me perguntava:—Será que eu esqueci alguma coisa?Passagem na mão, malas sobre o carrinho, esperando...Quando ouço ou leio emalgum lugar: “passagens e documentos à mão”. Paulo e Li estavam a minhafrente. Ele, visivelmente nervoso. É seu primeiro vôo.

Minha identidade, onde eu a deixei? Está numa pochette dentro da mala. Quevergonha, eu não devia mais estar usando aquela pochette. Está totalmente forade moda.Chega a nossa vez. Paulo e Eliane foram chamados para um balcão mais distante.O alaranjado da Gol se espalhava por toda parte central, mas a fila não andava.Vendo que alguns passageiros já se adiantavam para furar a fila, tratei de empur-rar o carrinho para junto do balcão, onde eles estavam por concluir o check-in eme apresentei.Horário do embarque, número da plataforma e bilhete de controle da bagagem...sófaltava uma coisa, o avião.

EEEE

Um diamaravilhosopara voar

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Nós nos dirigimos então para a espera do embarque, passamos por um amplosaguão, dobramos à direita, atravessamos algo como um túnel e chegamos aosetor de revista. Pusemos nossas malas e pacotes sobre a esteira do raio-x epassamos pelo detector de metais. Paulo e Li foram obrigados a voltar, ele paratirar o chaveiro do bolso e ela para o relógio, muito grande, que também acionouo alarme. Indagam sobre o conteúdo de uma das sacolas e Eliane brincou dizen-do ser uma bomba. Imediatamente Paulo desmentiu, explicando que era apenasum pequeno objeto de decoração, uma fonte daquelas que se põe na sala paraouvir o murmúrio d’água e relaxar. Chegamos à escada, que nos conduziriapara o nosso local de embarque. Eliane perguntou se não era melhor tomaremcafé na cantina daquele andar. Ambos pararam para um café e eu fiquei apreen-sivo, pois o horário do embarque estava marcado para dali a cinco minutos.O relógio me parecia mais acelerado, talvez fosse o compasso do coração,alterando a noção do tempo. Terminaram...fui ajudá-los com uma sacola paranos apressarmos.

Chegamos à sala de espera e nos acomodamos no conjunto de cadeiras emfrente ao portão 20. O tempo passa, o horário de embarque passa e nada doembarque acontecer, me dirigi até o rapaz que parecia querer se esconder atrásda tela do computador e o inquiri. O vôo estava atrasado, o avião acabara depousar. Assim que estivesse pronto, um novo horário e novo portão de embarqueseriam anunciados pelo sistema de som.A vontade de fumar me conduz até um funcionário para saber se havia por alialguma sala apropriada. O local disponível era longe demais, desisti de fumar evoltei conformado para a cadeira onde estavam minhas malas. Teria que esperar

DESDE SAMPA

No aeroportode Congonhas

Paulotransportaum pacote

suspeito

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mais de duas horas até o próximo cigarro. Paulo e Eliane foram ao banheiro. Aoretornarem ouvimos as novas instruções:...senhores passageiros do vôo 750 da empresa Gol com destino a PortoAlegre...queiram, por gentileza, se dirigir até o portão 11 e aguardar pela ordemde embarque.

Tenho que interromper o relatório. Estamos de saídapara uma visita ao pai da Li. Ela pretende chegar a sua

casa por volta das dez horas

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IIDe Volta ao Relatório

16h40 do dia 04/03/2007Já estamos em Capão da Canoa, Li e Paulo foram tirar

um cochilo. Aproveito para escrever mais um pouquinho

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portão 11 era bem distante de onde estávamos. Não tínhamos mais os carri-nhos do aeroporto para facilitar o transporte da bagagem. Mesmo assim,

sem ter mãos para tanta bagagem, começamos a registrar com fotografias anossa viagem.Estas são algumas de uma série de fotos que pretendo incluir no relatório.Começava a amanhecer. O céu, tingido de um azul avermelhado, podia servisualizado por detrás da parede envidraçada, que nos separava da pista. Recor-tado a todo instante pelo perfil dos aviões, que cruzavam a pista de embarque,prometia propiciar um vôo iluminado e tranqüilo.Sugeri que desligassem o flash da máquina para evitar o reflexo no vidro a nossafrente, e tiramos algumas fotos, antes do portão ser aberto para dar acesso aoavião, que já se encontrava ali, “estacionado”.Passa algum funcionário do aeroporto, de rádio-comunicador à mão, transmitindoem alto e bom som a posição de cada portão desocupado. Lembrei-me da épocaem que organizava a espera por mesas vagas, no restaurante do meu irmão.—Que coisa precária, pensei. Por que não usam câmaras, como as tantas quevimos espalhadas a nos vigiar!Mais uma vez os alto-falantes nos informam sobre como proceder à fila de embar-que, primeiro em português e depois em inglês.Não havia necessidade de pressa, registraríamos nossa entrada em forma decurtas tomadas de vídeo, para não esgotar a memória das máquinas. Sendo osúltimos a entrar ficaria mais fácil. Desci na frente e preparei o enquadramento.Eliane passou e eu não havia começado a filmagem. Pedi a Paulo que retornassee gravei sua passagem até juntar-se à Li, mais à frente.Filmei o nariz do avião, e desci a rampa filmando até a porta. Desliguei a máqui-na e entrei.Os comissários me olharam com ar superior. Parecia que eu podia ler seus pensa-mentos: Mais um passageiro de primeira viagem.Três bancos de cada lado, corredor estreito. Se alguma turbulência nos pegar pelocaminho e o deslocamento for inversamente proporcional ao tamanho da aeronave...Pensamento tolo. Tratei de silenciar os maus presságios.Minha cadeira era junto ao corredor. Eliane foi sábia em colocar o Paulo junto àjanela com a máquina fotográfica. Isso, certamente, o deixaria suficientementedistraído e menos tenso.

Três dias depois do vôo e ele não se cansava de repetir– Mas que delícia que foi... Já nem completava mais a

frase, pois estávamos carecas de saber

OOOO

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16 DE VOLTA AO RELATÓRIO

A chefe dos comissários apresenta a tripulação e passa as instruções sobre osprocedimentos de emergência, enquanto um de seus subordinados faz mímica eencena aquela baboseira de praxe.Por termos comprado passagens em dias diferentes, minha poltrona não é aolado deles, porém, sobram muitos lugares vazios no avião, inclusive a poltronado corredor junto a eles. Não tive dúvidas, sentei-me ali, esperando que os comis-sários não criassem problemas.Tudo bem, hora de levantar vôo.O comandante do avião nos dirige a palavra informando o motivo de algumademora e se posiciona atrás de duas outras aeronaves, junto à cabeceira da pista.Mais quinze minutos e subiríamos.—Prepare a máquina, filme toda a decolagem.—Olha, aquelas pessoas parecem formiguinhas!—E são formiguinhas, seu estúpido! Nós nem saímos do chão.Piadinha infame. Mesmo assim, Li acha graça.O avião anda um pouco. Alguns minutos e anda mais um pouco. E finalmente decola.A mesma sensação que eu sentira antes, é como dar a primeira volta naroda gigante.Dá um friozinho na barriga.

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Nosso aviãonos aguardana área deembarque

Paulo, juntoà janela pararegistrar adecolagem eainda muitonervoso

O aviãocomeça ataxiar

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IIIA Bronca do

Comissário de Bordo

18h21 do dia 05/03/2007Pela manhã fomos à praia, andamos seis quilômetros e

meio. Depois do almoço tomamos uma chuva pelocaminho e resolvemos dormir um pouco.

Paulo ainda dorme, Li resolveu preparar um mate, depoisde lavar roupa e dar uma varrida na casa...

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avião inicia uma subida interminável, Paulo registra tudo.Sinto um pouco de inveja de poder ver a paisagem se modificando. Olhar

para dentro do avião é angustiante. Ao mesmo tempo em que sentimos levesbalanços, por não termos a confirmação visual, as possíveis variações de altitudeparecem se agigantar na nossa imaginação.De repente, nada a fazer para preencher o tempo. Começamos a explorar asacomodações sem sair do lugar, uma vez que o aviso para manter o cinto não sedesliga, enquanto subimos.Abre mesa.Fecha mesa.Altera-se a inclinação do banco.Algumas fotos do interior.Muitas fotos do exterior.—Toma cuidado para não tirar muita foto da asa do avião, vai esgotar a memória.Relembro a história da viagem de meu filho Tauan ao Chile, quando gastou dois

filmes com fotos da asa. Naquela época ainda não tínhamos a digital.A pressão faz o ouvido pipocar. Li e Paulo mastigavam um chiclete para minimizaros efeitos. Ofereceram-me, mas eu recusei, já era tarde, meu ouvido já passavapela terceira pipocada.Finalmente o vôo se estabiliza na horizontal e o aviso se apaga.Dou uma olhada pelo avião para achar alguma janelinha livre, eu também queroregistrar a asa, (tosse) digo, a paisagem.Um mar de nuvens, crespas como flocos de algodão, parecem forçar passagempara cima sem poder passar daquela altura.Contenho-me e tento tirar a menor quantidade possível.O ar condicionado deixa o interior do avião bastante frio.

OOOO

Fotografao aviãopor dentro

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Retorno ao meu lugar, pois vão servir alguma coisa.Conversamos sobre as refeições e lanches, que eram oferecidos nos tempos remo-tos. Os bons tempos da Varig.Duas bolachinhas de água e sal, um biscoito recheado com chocolate.—Suco de pêssego ou manga, guaraná diet...? Repete incansavelmente paracada passageiro, que invariavelmente pede suco de pêssego, mas, certamente,preferiria poder tomar uma dose de algo mais forte e comer algo mais saboroso.—Que lanchinho fraco! Esse é o comentário de Paulo, que voa pela primeira vez.Passam novamente o carrinho, oferecendo nova dose das mesmas bebidas. Per-gunto se pode ser a barrinha com chocolate e recebo duas. Fico com uma e passoa outra. Depois do lanche, passam recolhendo copos e celofanes. Faltam 40minutos para o pouso. Volto para a janelinha no fundo do avião. Desta vezpretendo registrar o pouso em vídeo.Os dois lados da última fileira de banco estão livres.

Do lado esquerdo uma chance de me aquecer com uma réstia de sol. Do ladodireito a melhor chance de uma boa filmagem.Esperei até que o aviso fosse dado e então passei do direito para o esquerdo.Paulo já tinha esgotado a memória da sua máquina fotográfica. Ao aviso de queiríamos pousar e que não eram permitidos aparelhos eletrônicos, celulares e com-putadores, não deu bola. Pegou o notebook e começou a transferência. Acaboupor receber uma bronca do comissário.—Mas agora já iniciei a transferência, como é que eu faço?—O Sr só terá mais dois minutos pra desligar isso!

A BRONCA DO COMISSÁRIO

Fotografao exteriordo avião

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Esperei que os comissários tomassem acento e tirei a câmara da capinha.Registrei algumas tomadas curtas, enquanto o avião manobrava em curvas acen-tuadas, para se posicionar na direção da pista. –...nublado e com chuva, anun-ciou o comandante.—Ai meu Jesus Cristinho! pensei com meus botões.ora do avião, a asa parecia inclinar-se muito mais acentuadamente do que sepercebia, quando se olhava para dentro dele. Pura ilusão de ótica, nosso corpose inclina junto com as cadeiras e todo o resto.Reta final. Os flaps começam a se esticar para baixo e um rastro de vapor seforma e se alonga atrás da asa, provavelmente provocado pela pressão do ar.Sem perceber apertei um pouco o botão de zoom. A imagem passava a umavelocidade maior e a descida parecia muito menos suave do que deveria.O avião toca o solo e vibra um pouco. A imagem tremula violentamente, minhamão não consegue segurar a câmara com firmeza e então os freios entram emação. Com um belo susto desligo a câmara.

Penso se não pousamos longe do começo da pista e, talvez, ela não seja suficiente.A velocidade diminui e começamos a taxiar.Alívio!Mudo para o modo foto e registro nossa aproximação.

Depois datensão naaterrissagemregistro anossa chegada

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IVChimarrão deBoas Vindas

7h16 do dia 06/03/2007O dia amanheceu lindo7, céu claro como nunca esteve

durante todo o tempo até agora

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esembarcamos em Porto Alegre e seguimos até a esteira para pegar nossamala. Li aproveitou para ir ao banheiro. Ao retornar não nos encontrou e

ficou bastante assustada.Havíamos sido informados que nossa bagagem estaria disponível, na esteira dosegundo saguão.Depois de pegar a bagagem saímos doidos para fumar. Enquanto todos os outrospassageiros se apressavam para tomar um táxi, fumamos tranqüilos, parados alino ponto. Antes de pegar o táxi, porém, Eliane se lembrou que deixara o endere-ço num pequeno pedaço de papel na carteira de Paulo. Paulo não se lembravade nada, pois no dia anterior tinha bebido bastante. Achar o tal papel foi umamaratona, que demorou mais do que o tempo que usamos para fumar.Em pouco tempo chegávamos ao pequeno prédio amarelo. Subimos carregandotoda bagagem. Li aperta a campainha e nos alerta: —tem que falar alto, ela nãoescuta direito.Toca novamente a campainha, pois ninguém havia nos atendido.

Fomos atendidos pela prima Pedrolina, que abraça a Li calorosamente e explicaque pensaram que a campainha fosse na novela. Só perceberam que era nopróprio apartamento pela reação de indiferença dos protagonistas.Paulo a cumprimenta com seu jeito efusivo e me apresenta em seguida. Sempre ficopreocupado com a aparência dos meus cabelos por causa do comprimento. As pessoasmais velhas não são muito flexíveis, para aceitar comportamentos não convencionais.Tento agir com naturalidade e simpatia, mas acabo cometendo o maior dos peca-dos, rejeito a primeira oferta de chimarrão. Digo que estamos mais habituados abeber café.Depois do café, fomos todos para sala e as três puseram a conversa em dia,enquanto rodavam a cuia de mão em mão entre elas. Um ritual admirável. Foiquando me dei conta da gafe que cometera.

DDDD

Tia avóMaria eprimaPedrolina

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VOs Gatos da Tia Lina

6h33 do dia 07/03/2007Não consigo acordar mais tarde, amanhece

com sol e poucas nuvens

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ia Maria é uma simpatia, lembra muito minha avó nhanhã (Isabel). Muitofalante, toma sempre a iniciativa da resposta ou da pergunta.

Neci, a prima querida está no apartamento da praia em Capão da Canoa, paraonde devemos ir. A princípio estava combinado que iríamos com o carro dela,mas somos informados de que deveríamos ir de ônibus. Eliane liga para prima erecebe a confirmação, três tentativas de assalto a deixaram suficientemente assus-tada para não querer mais fazer o trajeto dirigindo. Oferece, entretanto, paraque usemos o carro para passear em Porto Alegre.Iríamos almoçar com tia Lina (uma das filhas da avó materna) em Pinheiro, bairrobem afastado de onde estávamos. As distâncias são enormes, o caminho sinuosocom um belo traçado urbano e muitos bons projetos arquitetônicos.Chegamos ao bairro, sobre o qual Eliane nos conta uma triste história de invasãopor grupos de sem teto. Coisa comum em países com diferenças sociais acentua-das como o Brasil.Novamente, Eliane é recebida com muita emoção, pode-se notar o quanto ela é querida.

A pequena casa abriga uma quantidade enorme de gatos. O primeiro se encon-tra refestelado sobre a mesa da sala, todo cinza, preguiçoso e sossegado. Mallevanta a cabeça para olhar as visitas que acabam de invadir o recinto. Eu ePaulo trouxemos nossos notebooks para trocarmos as fotos da viagem enquantoelas põem a conversa em dia.Depois das apresentações, pedimos licença para usar a mesa para instalar nossapequena central de informática. Desalojamos o primeiro gato de seu confortável repou-so e instalamos o equipamento. Tentamos inutilmente conectar os dois micros entre sicom um cabo usb, que eu havia comprado na Santa Efigênia, em São Paulo.

TTTT

Tias Edena(em pé) e Lina(sentando-se)

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Pausa para o almoço, uma comida com quase nenhum sal ou tempero, mas saudável,apetitosa e muito bem vinda. Depois do almoço, ligamos novamente o equipamento.Depois de exibir algumas fotografias das filhas da Li para as tias, sugerimosconectar o equipamento do Paulo na linha telefônica. Em poucos instantes, Elianeestava falando com a filha Mariana e Paulo com o filho Danilo pelo MSN.Minha preocupação era encontrar algum programa para auxiliar com o uso docabo. Procura infrutífera, mas ainda teríamos a alternativa de usar um cd-rw, queo Paulo trouxera.Finalmente tive a oportunidade de me redimir, experimento meu primeiro chimar-rão. Não esperava que fosse gostar, foi uma agradável surpresa. Estou doidopara ter uma boa cuia e criar um novo hábito na minha casa, em Bauru. Não sópelo sabor agradável, mas por todo o ritual.Hora de partir, Li queria apresentar sua cidade com um breve passeio pelocentro histórico.Complicado achar um local para estacionar no meio fio.

Mais uma coisa nos encanta em Porto Alegre, a venda do bilhete para a zona azulé automatizada com opção para moedas e cartão. Nada de ficar perdendo tempocom vendedores, que desaparecem, quando achamos uma vaga em Bauru.Antes de qualquer coisa entramos em um shopping. Não para comprar qualquercoisa, mas porque Eliane estava doida para ir ao banheiro.Saímos dali pelo piso inferior, ao nível da praça General Osório. Li senta-se emum banco e pede que tire uma foto. Sentado ao seu lado, a estátua de MárioQuintana simula uma conversa com Carlos Drummond, em pé atrás do banco.Tiramos fotos do monumento ao centro da praça e do prédio do correio, um beloexemplo de preservação arquitetônica.

OS GATOS DA TIA LINA

Meu primeirochimarrão

uma agradávelsurpresa

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Seguimos até o Museu de Arte do Rio Grande do Sul Ado Malagoli. Não sabía-mos se a entrada era franca e nos dirigimos à recepção. Não havia qualquerindício de cobrança de ingresso, as paredes estavam sendo pintadas, mas omuseu estava aberto à visitação.Pergunto se podíamos fotografar sem flash. – Só a fachada do prédio, as obrasnão, responde-me um dos recepcionistas. O olhar sisudo de ambos me faz guar-dar a máquina, instantaneamente. As exposições do térreo eram de fotos atuais,passamos rapidamente o olhar e fomos para o segundo piso. O ar condicionadoestava desligado e o calor era insuportável.

Paulo demonstrava pouco interesse pelas obras, tentei conduzi-lo com algumasdefinições de arte, mas a falta de conhecimento dos materiais, expostos ali, meimpediu de promover uma orientação segura e convincente. Sugiro continuarmosnosso passeio indo para a praça Júlio de Castilho.Uma ladeira acentuada nos separa de nosso destino, hora de suar a camisa.Caminhamos em passos lentos e tiramos algumas fotos pelo caminho, uma formade justificar as constantes paradas para tomar fôlego.O monumento é alto e rodeado de esculturas, entre as quais um pequeno dra-gão com as patas dianteiras levemente erguidas, em relação aos degraus daescada. Paulo deita-se sob a pata e pede que eu tire uma foto. Eu e Li tiramosvárias fotos. Repentinamente, quando já nos afastávamos do monumento em

Um gatogigantesobrea mesa

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direção à Catedral, olho para cima e me vejo abaixo da traseira de um cavalocom o rabo levantado. Não importa quantas pessoas já tiraram uma foto desseponto, imediatamente peço à Li que nos fotografe.Visitamos a Catedral, imponente e muito bonita. Dois lindos vitrais, absurdamen-te grandes, iluminam suas naves laterais. Tento discretamente tirar algumas fotosdo interior, mas a pouca quantidade de luz e a falta de um tripé, que mantenha acâmara estática, resultam em fotos pouco nítidas.O tempo, que já estava fechado, ameaça piorar.

Hora de voltar para casa. Todos os caminhos levam a Roma, mas qual delesdeveria nos levar ao apartamento das tias????Depois de muitas voltas e retornos, finalmente chegamos ao pequeno prédioamarelo, onde passaríamos a noite.Tomamos banho, a roupa suada foi substituída por algo mais leve e apropriado eentão saímos para um lanche.Paramos em um barzinho, lugar simples, mas com um dono muito simpáticoe atencioso.Providenciou rapidamente uma mesa de plástico, meio instável, onde mal se po-dia apoiar os cotovelos, pois esta logo se inclinava.Aceitamos a sugestão para um cachorro americano e pedimos uma Coca litro.

OS GATOS DA TIA LINA

Os detalhesarquitetônicos

do Banco Safra

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Eliane, MárioQuintanae CarlosDrummond

Antes devisitar omuseu umapose para um:eu estive aqui

Noinício daladeira

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36 OS GATOS DA TIA LINA

Calmacavalinho

em cima demim não!

Pauloe o

dragão

Arquiteturamovimentadae colorida dePorto Alegre

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Encarar aquele sanduíche era uma decisão complicada. Veio sobre dois papeisde tipos diferentes, incrustado em uma bandeja comprida de plástico colorido. Aslaterais do pão desapareciam em baixo de uma montanha de recheio, o qual nãoera possível comer sem enfiar o nariz pela metade. Tentei retirá-lo da bandeja equase o derrubo inteiro. A cada mordida, Paulo deixava cair parte do recheiopelo chão. Somente Eliane o conduzia com habilidade sem derrubar nada, masnão conseguiu evitar de se lambuzar.Da Coca-Cola sobrou um pouco mais da metade. Paulo tomou a iniciativa delevar o que restou para casa. Antes, porém, Li tinha que comprar pílulas e saímosà procura de uma farmácia aberta. Andamos uma quadra até a esquina de umaavenida movimentada e indagamos ao garoto, que se entretinha no chão comalguma brincadeira, onde ficava a farmácia mais próxima. Após nos indicar astrês farmácias da vizinhaça, o garoto pediu um gole da Coca-Cola. Aliviado pornão ter mais que carregar aquele peso, Paulo entrega-lhe o vasilhame com todaCoca-Cola que restara.

Andamos mais uma quadra e meia, até a única farmácia que ainda se encontra-va aberta. E já íamos saindo dela, quando descubro que alguma coisa do sandu-íche me provocara uma tremenda alergia. Comprei imediatamente uma caixa dePolaramine e tomei um comprimido, ali mesmo, sem água.Fui dormir mais cedo, bastante cansado e coçando muito, acabei perdendo oúltimo capítulo da novela.

Eu acho queesse cachorroestá fazendocaca aqui

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VIQuem Será este Senhor?

7h29 do dia 08/03/2007Saí bem cedo para tirar algumas fotos do nascer do sol.

O dia está meio nublado, não sei se dá praia

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o dia seguinte, ainda em Porto Alegre, acordei mais cedo que os outros.Arrumei algumas coisas na mala e fui fumar na sacada do quarto. Pouco

depois, ouvi barulho na sala, finalmente alguém com quem conversar. Tia Mariase encontrava deitadinha no sofá com um rádio de pilha apoiado sobre o peito,inclinado na direção do ouvido, ligado ao noticiário matutino.Surpreendeu-se com a minha presença, como se tivesse esquecido que havia visitana casa. Olhou-me como quem indaga: —Meu Deus, quem será este senhor?—Bom dia! exclamei.—Ouvindo as notícias? perguntei eu, tentando puxar assunto.Tia Maria sentou-se, antes que eu pudesse dizer para que não saísse do seuconforto por minha causa. Não consegui evitar, sentou-se para se sentir compostae passou a comentar as notícias, que ouvia ao rádio.Conversamos sobre a temperatura e o tempo. Assunto que me interessava porcausa da praia. Vi que ela não voltaria a deitar-se, enquanto eu estivesse por lá,então pedi licença e voltei para o quarto.

Tentava ver se pegava algum sinal de rede wireless no notebook, quando perceboo vulto da prima Pedrolina se levantando, no quarto semi-escuro. Tratei de desejarbom dia, antes mesmo de vê-la. Tarde demais, ela já vinha saindo ao corredor, sóde camiseta e calcinha.Que mancada! penso eu encabulado.Fecho a porta, ligo o notebook na sacada do quarto e decido começar um peque-no relatório de viagem, para não me esquecer o nome dos lugares visitados.(fotoda página 7)Escrever nunca foi o meu forte, tenho problemas tanto de gramática como deortografia. Porém, à medida que escrevo, sinto que me divirto e me sinto inspira-do, para absorver cada pequeno detalhe de nossas férias.

NN

Comprando apassagem paraCapão da Canoa

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Mal havia começado a redação e Paulo veio me avisar que sairíamos logo, paracomprar a passagem de ônibus e, após, iríamos almoçar na casa do pai da Li.Despedimo-nos, apressadamente, logo após o café da manhã. Retornaríamos aoapartamento depois do almoço para deixar o carro.Tivemos alguma dificuldade para entrar na rua, em frente à estação rodoviária.Paramos o carro em um estacionamento, atravessamos a rua e chegamos aoguichê de venda de passagens. Paulo entrou em uma fila e Eliane em outra. Acheique era exagero entrar em outra fila, pois eram todas muito curtas. Dei o dinheiroda minha passagem e pedi a máquina emprestada para registrar o momento.Tirei duas fotos do Paulo. Quando me preparava para fotografar a Li, um segu-rança me abordou perguntado se eu tinha autorização do DAER para fotografar.Surpreso por uma abordagem tão seca, não tentei argumentar.—Desculpe, eu não sabia que era proibido fotografar aqui.—É porque não sabemos com que intenção tu estás fotografando.Raios, pensei mais tarde.

Um lugar que nos filma de todos os ângulos e não se pode fotografar.A lei deveria nos garantir direitos iguais. Um dia ainda vou lutar por esse projeto.Atravessamos a rua em direção ao estacionamento.—Paulo, fotografa daqui de fora, disse eu ainda cismado com a história.—Eu já fotografei na entrada, disse ele sorrindo.Chegamos à casa do pai de Li, exatamente às dez horas.—Viu como eu sou pontual, disse que chegaria as dez e cheguei. Seu relógiohavia acabado de sinalizar hora cheia.Posiciona o carro em frente à casa e buzina para que o pai, que se encontrava nagaragem, abra o portão.Sr Ataídes, um encanto de criatura, simpático, descontraído e muito afetuoso.Fomos todos tão bem recebidos que não tenho palavras para agradecer.

QUEM SERÁ ESTE SENHOR

Elianepode matara saudade

do pai

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Sua segunda esposa Nina, também é muito simpática e parece cuidar do maridocom muito zelo.Inicialmente apenas ele nos recebeu, demonstrando muita felicidade pela visitada filha querida.Também, fazendo muita festa, um pequeno cachorro basset, ao qual constante-mente repreendem, para evitar que ele faça feio. Até hoje, nunca vi raça maisassanhada, têm todos um comportamento muito parecido.Convida-nos a entrar, acautelando-se de pedir desculpas pelo espaço apertadodos móveis.Sentamos todos em um sofá em frente à tv. Trocavam conversa, quando de repen-te entra correndo um gato. Ao nos ver, assustou-se e saiu cantando pneus pelamesma porta. Todos riram da reação desesperada do bichinho.—Ela queria atravessar a sala, mas é muito tímida com estranhos, disse o pai de Li.Eis que surge Nina carregando algumas sacolas com carne. Cumprimenta cadaum, demonstrando estar igualmente feliz com a visita de Eliane.

Agita o ambiente, colocando para tocar um disco de música regional gaúcha enos oferece cerveja.—Hoje eu também tomo, é dia de comemoração.Todas as palavras do Senhor Ataídes são de elogio ao genro e, à medida quebebemos, mais admiração e palavras de elogio são trocadas por ambos.—O senhor joga no meu time, diz Paulo todo contente. Eu vou levar seu pai praBauru, duvida?Enquanto conversamos, um churrasco estava sendo preparado. Eliane e Ninasaíram para comprar mais cerveja e cigarro.Seu Ataídes nos conta a história da luta contra um câncer maligno, que se instalouem sua boca e do padre que lhe apresentou a planta, que permitiu a completaregeneração, depois de uma terrível operação. Conta também a história da mulher,

Sr. Ataídes edona Ninaoferecemo autênticochurrascogaúcho

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que ele pode ajudar com a mesma planta e que fez questão de lhe mostrar o seiocompletamente recuperado. Peço a ele uma muda para levar para Bauru.Penso no meu cunhado e comento com Paulo. —Pena que não pudemos fazernada por ele. Quem sabe possamos ajudar outras pessoas.Enquanto ainda preparavam a comida, Paulo e eu ligamos nossos notebookspara trocar arquivos de foto. Uma pequena peça no DVD-room dele estava que-brada. Achamos o pedaço quebrado e o prendemos com um disco.De repente, o pequeno basset se põe a coçar o gato sob a mesa. Chama-me a atenção,como faz o gato para pedir ao cachorro para ser coçado. Esfrega-se de maneiraprovocante e se posiciona com a parte que deseja coçar próxima a sua boca.—Filma isso Paulo, tá digno do programa do Faustão.—Vamos almoçar pessoal, a comida está na mesa, convida-nos dona Nina.Uma quantidade exagerada, já tínhamos beliscado vários pedaços da costela,mas a comida estava convidativa. A cenoura ralada com uma cor viva, a alfaceverdinha, a maionese de batata muito saborosa e as carnes impagáveis.

Comi a me fartar. Paulo, no entanto, não é tão glutão e logo se satisfaz. Seu Ataídesse mostra indignado.—Que é isso, rapaz, não comeste nada!—Nós viemos aqui pra beber ou pra conversar? pergunta Paulo brincando.—Pra conversar, retruca seu Ataides.—Então estou indo embora, provoca PauloLogo estavam aos beijos e abraços. Era tudo alegria e Paulo repete incansavel-mente que quer levar o casal pra Bauru.—Temos que ir embora! nos apressa Li com medo de chegar atrasada a rodoviária.Ainda tínhamos que devolver o carro e pegar nossa bagagem.Estávamos todos meio altos, menos Li que volta dirigindo.

Cena do filmeO cachorro

mata pulgas

QUEM SERÁ ESTE SENHOR

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CAPÃO DA CANOA 45

VIICapão da Canoa

18h11 do dia 09/03/2007Depois de um almoço farto e saboroso na

Churrascaria Recanto Gaúcho, dormir era inevitávelDormimos a tarde inteira

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pressadamente, chegamos ao apartamento no prédio amarelo, devolvemoso carro. No apartamento, Li monta a fonte e deixa explicações sobre o

funcionamento para quando Neci voltasse da praia.Seria um presente surpresa, mas levá-lo à praia para Neci trazê-lo de volta, eraum inconveniente desnecessário.Chegamos à rodoviária com mais de uma hora de antecedência. Paulo estavatagarela, muito contente com tudo e, ora lembrava do vôo maravilhoso, ora lem-brava do sogro e da cerveja, que não podia faltar.Mal entramos na rodoviária, já paramos na primeira lanchonete para comprarcigarro e uma latinha para Paulo. Seguimos até a plataforma de embarque e nossentamos nas cadeiras vagas, não era exatamente em frente a nossa plataforma,mas em um lugar de onde podíamos ver o ônibus quando chegasse.Paulo continuava tagarela e falando muitos palavrões em tom mais alto que o normal.Mas tudo que entra, uma hora tem que sair. Queria fazer xixi e foi ao banheiro.

Voltou indignado, tinha que pagar um real para fazer um mísero pipizinho.—Puta que o pariu! Me dá um dinheiro aí, estão cobrando um real pra eu mijá.—Se pra dar uma mijadinha me cobram tudo isso, quanto vai custar uma cagada?—Fala baixo, Paulo, diz Li encabulada—Dá mais algum pra comprar mais uma latinha, essa já “elvis”.—Não tenho nenhum dinheiro trocado, fala Li tentando fazer com que ele pare de beber.—Toma aí, aproveita e traz uma Coca-Cola pra mim.Paulo retorna, trazendo minha Coca e falando mais palavrões do que antes.—Ai, meu Deus, onde fica o botãozinho pra desligar esse homem?

AAAA

Paulo voltatrazendooutra lata

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Paulo era pura felicidade e tagarelice. Faz uma pergunta retórica para a mulhersentada ao meu lado, que já não continha o riso por perceber sua evidente embriaguêz.Exausto, depois de tanta excitação, Paulo se deita com as pernas para o corredore a cabeça no colo de Li.Sento-me junto à janela do lado oposto ao do motorista. Quero apreciar a paisa-gem, embora o tempo esteja bastante enevoado e prometendo chuva.Logo ao sairmos da cidade, fotografo um jogo de futebol de várzea, o visor damáquina é tão pequeno que não enxergo os jogadores.Campos absolutamente planos se espalham até o horizonte. Os tons variadosde verde se alternam, indo quase do amarelo limão ao verde musgo.A janela do ônibus é um limitador terrível. Tudo que está próximo passa rápidoe tende a ficar fora de foco. Mesmo tendo uma paisagem que parece se repetirao infinito, fotografo muitas vezes.Exploro os recursos da máquina, tanto fotografando como filmando.

Paradas rápidas em rodoviárias de pequenos lugarejos também são registradas.Começa a chover e eu tento registrar os pingos de chuva na superfície do vidro,é difícil, a câmara teima em fazer o foco na área externa. Finalmente o ar frioembaça o vidro e a foto sai, não exatamente como eu queria, mas...Paramos em algum trecho da estrada em obras para alternância de pistas.As duas horas passam rápido e logo chegamos ao nosso destino. Vejo o maraparecer em alguns pontos ao longo das ruas.—Li, o mar é pra lá? pergunto entusiasmado.—Hummm, deixa eu ver...é, sim.

CAPÃO DA CANOA

Futebol devárzea nasaída de

Porto Alegre

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Respiro fundo. Finalmente o mar, depois de tantos anos sem ver praia, estou devolta ao meu elemento. O berço da natureza.Chegamos à rodoviária onde a prima Neci nos aguarda. As várias descriçõesfeitas por Li e Paulo, logo permitem que eu a identifique entre as pessoas.Sentada, aparentando muita tranqüilidade, guarda-chuva em punho, demora ase pôr em pé.Sorridente, decidida, extrovertida, são imagens da primeira impressão que nospassa sua figura de pequena estatura.Muito simpática e hospitaleira, foi aguardar nossa chegada na rodoviária, quefica a quatro quadras de seu apartamento.Ainda estava claro, embora nublado, não estava mais chovendo e então fomoscaminhando até o apartamento.A chuva havia deixado muitas poças d’água nas ruas que, por serem muito pla-nas, não apresentam bom escoamento.

Nossas malas, dotadas de rodinhas, cambaleavam no calçamento constantemen-te inclinado e eventualmente formado por ladrilhos de altura irregular.Ao atravessar a rua, tínhamos que erguê-las para não passar pelas poças.As malas de Paulo eram mais largas, mais estáveis e ele se pôs à frente de todos.Comecei a estranhar sua dianteira. Logo demonstra a razão de sua pressa, que-ria mostrar que não se esquecera do endereço.—Viu, como eu lembrei direitinho do lugar! exclama ele todo orgulhoso.Em poucos minutos e, mais uma vez, estávamos todos desfrutando de outra roda-da de chimarrão.

Começa achover no meiodo caminho

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Neci, já hospedava uma amiga gaúcha e agora hospedaria no pequeno aparta-mento de dois quartos mais três pessoas.Li conta a ela algumas coisas sobre nossa viagem e lhe diz sobre uma surpresaque deixou no apartamento, em Porto Alegre, para não lhe causar o desconfortode viajar daqui para lá, carregando mais um pacote.—O que é que tu me trouxeste, guria? pergunta curiosa.—Uma surpresa, só vais saber quando chegares lá. Deixei instruções com Pedrolinasobre como funciona.Repentinamente, no meio do lanche, Paulo diz algo sem pensar e revela a nature-za do presente surpresa. No entanto, isso acaba se convertendo numa vantagem,pois assim Li pode explicar alguma coisa sobre a troca das plantas artificiais, quevieram no enfeite, por outras naturais que ela arranjou depois.Assistimos o final da novela que eu havia perdido na noite anterior e chegamosao final de mais um dia dessa aventura deliciosa.

Arrumaram na sala o sofá-cama, onde eu iria dormir e eu pude sentir, com aporta entreaberta, a brisa suave e gostosa que vinha do mar.

CAPÃO DA CANOA

Neci nosrecebe na

rodoviária deCapão da

Canoa

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VIIIUm Presentepara Iemanjá

18h56 do dia 11/03/2007Pela manhã, usei a câmara FinePixe de Paulo para

fazer fotos do sol nascente, ficaram ótimasEstamos em contagem regressiva, o tempo não para

Tem certas ocasiões que eu gostaria de terpoderes para congelar o tempo

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ueríamos sair bem cedo para o primeiro dia de praia.No café da manhã, os pães do dia anterior se repetem, entre eles a cuca,

um pão doce recheado com doce de leite e coco ralado. Pego uma fatia epasso uma grossa camada de patê de fígado. Li me chama a atenção para oestrago que eu estava fazendo. Já era tarde, como tudo, alegando gostardaquela extravagante mistura. Confesso que não daria para repetir a dose,não combinava mesmo.Depois do café, Neci passa as instruções sobre as chaves e outros detalhes antesde sair. Fomos fazer passeios diferentes, Neci foi fazer caminhada, enquanto nósficaríamos nas proximidades do apartamento.Neci saiu antes da gente, combinando nos encontrar na praia mais tarde. Besun-tamos nossos corpos com protetor e saímos carregando alguns apetrechos. Sóduas cadeiras para nós três. Parei numa loja e comprei mais uma. Era dia quatro,em pleno domingo, no entanto o comércio estava todo aberto, aproveitando ogrande contingente de possíveis clientes.

A areia da praia estava bastante úmida, por causa da chuva do dia anterior.Procuramos um lugar para montar o guarda-sol, pois o dia amanhecera limpo,quase sem nenhuma nuvem.Uma brisa forte e constante soprava do mar em direção à praia, deixando asondas agitadas em todas as direções.Montei o guarda-sol de tal modo direcionado ao vento que, para gozar da som-bra, ficava sem visão das ondas. O medo de me queimar em demasia me acom-panhou por todos os dias. Uma experiência nas praias da Bahia tinha sido osuficiente para justificar minha cautela.

Q

De camisetaboné e pésà sombra

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Enquanto eu me protegia, Paulo e Li se expunham a mais não poder, estendiamsuas toalhas sobre a areia e se deitavam, desprezando qualquer regra de horário.Vendedores ambulantes passavam empurrando carrinhos com mantas e redes,supostamente produzidas no nordeste.Um deles se aproxima e me oferece seus produtos.—Vai levar uma, patrão, é só hoje, amanhã a gente já está saindo de volta como caminhão.Eu sempre fui apaixonado por rede e pergunto o preço de uma com um lindobarrado verde.—Esta está a setenta, mas eu vou lhe fazer um precinho especial, só sessenta real.Digo que está muito caro e ele abaixa para cinqüenta.—Não, obrigado.Ele se abaixa junto ao Paulo e lhe oferece por quarenta reais.Paulo não pensa duas vezes e aceita a oferta.—Aham, pra mim era cinqüenta, pra ele tu fez a quarenta? reclamei indignado.

—Por quarenta eu também queria! Não tem outra? perguntei em seguida.—Sinto muito, só aquela. Mas tem essa outra a trinta.—Essa não é tão bonita.—Vou lhe dar um brinde, a rede mais uma manta por trinta.Era uma ótima oferta, enganou-se, se achava que eu fosse recusar. O preço míni-mo da manta era dez reais, a rede sairia por vinte.Feita a compra, fui molhar os pés na água do mar. Para minha surpresa a águaestava numa temperatura muito agradável. Mas não estava disposto a dar unsmergulhos naquela hora.Apenas me benzi e fiz uma pequena oração. Um ritual que me acompanhadesde a infância.

UM PRESENTE PARA IEMANJÁ

Apenasà duas

quadrasda praia

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Voltei para a areia quando, repentinamente, uma onda mais forte se aproximoude onde Paulo e Li se encontravam deitados.—Olha a água chegando aí, gente.Saímos todos correndo, carregando nossas coisas para outro local maisdistante e seco.Neci chegou nesse meio tempo. Sentou-se em uma das cadeiras e ficamos conver-sando amenidades. Entre uma prosa e outra, nos faz um convite irrecusável.Iríamos conhecer Gramado antes de voltar para Bauru. Ao sair da praia se ofere-ceu para levar nossas compras. O volume de coisas era tão grande em relação asua estatura que ela mais parecia uma vendedora carregada de mercadoria.Curtimos mais um bom tempo, antes de nos decidirmos retornar ao apartamentopara o almoço.Quando íamos saindo, Li percebe que suas sandálias haviam sumido.Prefere acreditar que Iemanjá as tenha levado, a pensar que pudesse seralgum espertinho ali da praia.

O almoço seria uma gostosa receita de macarrão ao creme de leite.Macarrão na água e o gás acaba no meio do cozimento. Pedimos outro botijão,fazendo um interurbano no celular. Chique, né?O entregador veio e voltou com o botijão, pois se enganou com o número doapartamento. Tivemos que ligar de novo. Quando o almoço ficou pronto, pude-mos saborear uma massa com a consistência bastante alterada, mas especial-mente saborosa. Um sucesso! Era nosso primeiro almoço na praia.Durante a tarde, era necessário repor as energias dos meses de trabalho. Li ePaulo dormiram até bem tarde.Para compensar o almoço, resolvemos sair para um lanche leve.

Os ambulantescom seus carrinhosrepletos deredes e mantas

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Depois de um breve passeio, tentando descobrir o que parecia mais apetitosodecidimos experimentar uns pastéis. Pedimos duas porções. Uma espera intermi-nável e quando finalmente chegaram, eu e Li pegamos os recheados com carnede siri e com camarão.Paulo foi no tradicional. Pastel de queijo e óleo, muuuuuuuuito óleo, não paravade escorrer óleo daquele pastel. Paulo trocou por outro e deixou aqueleescorrendo...até o dia seguinte.

UM PRESENTE PARA IEMANJÁ

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IX6600 Metros

19h19 do dia 12/03/2007O penúltimo dia em Capão da Canoa foi sem nuvens,

porém acompanhado de um vento frio durante o dia todo.Acordamos todos às cinco horas da manhã para fotogra-

far o nascer do sol. Cada qual com uma câmara

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stávamos decididos a uma estadia saudável. Acordamos dispostos a fazeruma boa caminhada.

No dia anterior somente eu caminhara 2200 metros de praia. Nesse dia cami-nharíamos até a plataforma de pesca. Uma espécie de píer para pescadoresadministrado por um clube da região.De onde estávamos na praia, embora seja uma praia retilínea, não conseguía-mos vê-la por causa da bruma e da distância. Era uma caminhada e tanto, nossoponto de partida era o posto de salva-mar de número 76 e a plataforma ficavapróximo ao posto 65.Começamos o nosso passeio por volta das nove horas, sem cadeiras, toalhas ouguarda-sol. Pegaríamos esses apetrechos no apartamento depois da caminhada,devido à proximidade do mesmo.No entanto, como o asfalto se apresentasse com muitas pedrinhas soltas, e ma-chucassem nossos pés para atravessar as ruas, calçávamos sandálias, depois astirávamos para caminhar na beira da água. Era extremamente incômodo cami-

nhar carregando aquelas sandálias. Não sei dizer o que era pior, pois das vezesque fui descalço à praia, sempre amaldiçoava tal decisão, na ida e na volta.Naquele dia ventava muito e Li reclamava que o chapéu de palha tendia escapar-lhe da cabeça, por não ter uma baínha de tecido na parte interna.Lá pela metade do caminho, fiquei curioso sobre que distância estaríamos percorren-do e tentei calcular levando em conta as distâncias entre cada posto de salva-mar.—Você tem boa noção de distância? perguntei à Li.—Por que?—Que distância você acredita que tenha desse posto até o próximo?—Acho que deve ter uns trezentos metros.Paulo também não sabia precisar, mas arriscou algum número e Li apostou com ele.

EEEE

Ao fundo aplataformade pescaAtlântida

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Fui até o posto e perguntei ao salva-vidas.—Aproximadamente trezentos metros entre um posto e outro. Do bar Onda àplataforma de pesca são três mil e trezentos metros.Voltei com a resposta e Li vibrou.—Ganhei, ganhei a aposta! Tá vendo como eu tenho boa noção de distância?Eu estava com as sandálias em uma das mãos e a câmera, em sua capa, pendu-rada ao pescoço.Ao longe já se podia ver alguma coisa da plataforma.—Eu já consigo ver suas cores, azul e branco com uma parte em vermelho ebranco no começo, disse eu entusiasmadoCaminhávamos pela água, principalmente depois que passávamos pela águados canais.Embora fosse apenas esgoto pluvial, eventualmente apresentava cheirofor te e com nojo lavávamos os pés caminhando por dentro d’água poralguns metros.

Uma lufada de vento arranca o chapéu de Li, que sai girando pela borda comoum pneu. Tentei agachar, mas percebi que a máquina pendurada ao pescoçopoderia mergulhar na água e eu não teria outra mão para protegê-la, por causada sandália. Teria sido mais um presente para Iemanjá, se Paulo não pisasse neleafundando-o por inteiro.Curvou-se e tirou o chapéu amassado e ensopado. Senti-me culpado por não tê-lopego enquanto só suas abas giravam sobre a água e me justifiquei sobre a deci-são de não arriscar minha câmera para salvar um chapéu de palha.Pedi para ver o estado do cujo e repliquei.—Espera, que já dou um jeito nele.

6600 METROS

O chapéude palha

de Eliane

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Dei umas boas sacudidas e depois fiquei balançando o braço para frente epara trás, até que ele secasse ao calor do sol e a ação do vento. Ainda nãoestava de todo seco, mas o suficiente para Li pedi-lo de volta e colocá-lo nova-mente na cabeça.Chegamos na plataforma curiosos, se poderíamos ir até a ponta tirar algumasfotos. Os cartazes e tabelas eram bem claros e visíveis. Dois reais e cinqüentacentavos por pessoa. Intimidados pelos cartazes nem tivemos a ousadia de per-guntar, se nos permitiriam entrar por alguns instantes apenas para conhecer.Tiramos algumas fotos dali da praia mesmo e já íamos saindo quando algo nabase dos pilares me chamou a atenção. Pedi para que esperassem e voltei paratirar mais algumas fotos. Entre colônias de algum tipo de coral, muitos mariscos ealguns filhotinhos de siris. Tirei algumas fotos por baixo da plataforma e tambémdos detalhes da base dos pilares e então retornamos. Voltamos ao apartamento,pegamos os apetrechos e de novo para a praia.Eu já havia feito dois furos na areia e não acertava a inclinação do guarda sol.

Logo o garçom da barraca 16 veio nos atender. Experiente, com seu acessório defurar areia sempre em punho, se prontifica a nos atender. Usando algo semelhan-te a uma bomba de encher pneu de bicicleta, feito de canos de pvc de trêsquartos de polegada, logo perfura a areia na posição correta. Apresenta-nos umcardápio, barraca da vó Neide, uma folha impressa e plastificada com o preçode seus produtos.Pedimos cerveja e uma porção de isca de violinha.Na saída da praia, Paulo junta os cascos e os leva até a barraca para devolver.—Tá esperando que te dê algum desconto no preço da cerveja? pergunta-lhe vóNeide, desacostumada de atitudes cavalheirescas.

Na base do pilarcolônia de corais,mariscos efilhotes de siri

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Hora do almoço, provavelmente duas da tarde. Paulo tinha visto um Bufê Livre porsete reais e cinqüenta centavos, no caminho da rodoviária ao apartamento.Um pequeno restaurante adaptado em uma casa, todo cercado com umaespécie de tela, do tipo alambrado retangular. Sentamo-nos à mesa maispróxima da calçada, o lugar mais ventilado, por causa do calor. Pedimostrês Cocas e fomos nos servir.A comida era bem simples, corriqueira como a que se faz em casa. Não eradas mais saborosas, um único prato e não queríamos repetir nem mais umpedaço de nada.Depois da sobremesa, Paulo pergunta:—Quanto deu nossa conta?—Trinta com vinte, responde a menina responsável pelo caixa—Aceita cartão?—Não, senhor.—E tem muita louça pra lavar?—A essa hora não tem mais louça nenhuma, responde a menina com arde indignação.—E como é que a gente faz pra acertar a conta agora? pergunta Pauloainda gracejando.Eu tinha levado algum dinheiro, puxei do bolso e contei:—Eu tenho trinta.Mais do que depressa a menina trata de aceitá-los, para não ter que discutir.—Fica por trinta mesmo, está certo.—Depois a gente acerta, diz-me Paulo com intuito de me tranqüilizar.Voltamos para casa e a “sestchia” se estendeu pela tarde toda.De noite eu resolvi voltar à Lan House, que eu conhecera no dia anterior. Ali eupodia conectar o meu notebook e mandar fotos por e-mail. Esperava poder meconectar com o pessoal em casa pelo MSN.Ao entrar não avistei o dono. Um cara simpático, atencioso, meio gordo,com seus trinta e poucos anos e o corpo todo tatuado. Notei que havia umbando de garotos, jogando animadamente. Tossi limpando a garganta parachamar a atenção e localizar o responsável pelo turno. Logo um dos garotosse levanta e vem me atender.—Pois não!—Eu queria ligar o meu note.—Pode ligar ali.A bateria não estava mais segurando a carga, era necessário ligá-lo à tomada. Olugar que eu havia usado no dia anterior estava ocupado. Expliquei minha situa-ção e o garoto retrucou dizendo:—Infelizmente não tenho outra tomada disponível.—Então eu volto amanhã, disse eu indignado com a má vontade do garoto emresolver meu problema.

6600 METROS

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Tomandouma cervejapara recuperaras energias

No restaurantebufe livre acomida não eratão boa

Lan House RudáEra só atravessar arua e estávamosconectados com omundo

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Tomei o elevador imaginando como solucionar o problema. Era bastante simples,bastava ligar o cabo de força em qualquer uma das CPUs, usando a tomada dovídeo de qualquer um dos vários micros que ainda se encontravam disponíveis.—Garoto burro, por sua má vontade não merece meu dinheiro! pensei enquantoo elevador subia.Terminava ali mais um dia da nossa aventura em Capão da Canoa.

6600 METROS

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XTinturaria

Fábio’s Grossi

6h10 do dia 19/03/2007Acordei sobressaltado com o barulho dos gatos

Nossas férias em Capão da Canoa se foram e eu já estouem minha casa em Bauru, tentando resgatar da memória

os dias felizes que passamos por lá

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claro que não se deve levar muita roupa, quando passamos as férias napraia, qualquer tonto sabe disso. Nunca levem, como eu, cinco pares de

meia, oito cuecas, cinco calças, seis camisetas, uma camisa, dois pares de sapa-to e até um lenço, pois você só vai carregar peso morto e ficar sem espaço paratransportar as lembranças que comprar.Pois não é que o tonto, digo, pois não é que eu, no terceiro dia de praia, játinha quatro cuecas, duas camisetas para lavar e uma calça para tirar a man-cha da perna.Eu explico. As quatro cuecas deveriam ter sido lavadas durante o banho e, muitoprovavelmente, teriam sido apenas três, suficientes para toda viagem. As camise-tas não estavam sujas, mas suadas das caminhadas por “Sampa” e no passeioem Porto Alegre. Caminhadas não são meu forte.A perna da calça eu havia sujado em algum escapamento de carro no estaciona-mento, onde paramos para fazer compras na 25 de março. Era minha melhorcalça ou a mais nova e eu estava determinado a tirar aquela mancha.

Ainda era cedo, ninguém tinha levantado e eu fui para o tanque. Lavei as cuecas,pendurei e me preparei para enfrentar aquela mancha.Mergulhei a perna da calça na água, peguei uma escova, derramei um pouco desabão em pó e comecei a esfregar. A mancha diminuiu um pouquinho de tama-nho, mas continuava lá, indiferente ao meu esforço e me desafiando a exterminá-la. Não tive dúvidas.—Vou passar para algo mais forte, pensei apressadamente. Agachei e procurei entre os produtos embaixo do tanque, pegando o primeiroem que li o nome detergente. Era um tal de Ajax, detergente para limpeza geral.—É esse mesmo, toma sua danada. E esguichei um pouquinho.Na mesma hora a mancha empalideceu, ela e a calça também.—Meu Deus, o que foi que eu fiz?

ÉÉÉÉ

Vamos de novoà plataformamas, dessa vezEliane não levaseu chapéu depalha

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Joguei logo água por cima na tentativa de diluir o produto e recuperar a cor dotecido. A mancha se espalhou por mais alguns centímetros. A cagada estavafeita. Mergulhei a calça toda na água do balde e esperei por algum milagre, quenão aconteceu. Eu só me aventurei a lavar as camisetas, um dia antes de voltar-mos. Mas essa é uma história que fica para outro dia.Nesse dia não me lembro de nenhuma outra mancada, só sei que desisti datinturaria e voltei para o meu relatório. Também não tirei uma foto sequer, masPaulo tirou muitas e então eu posso descrever o que fizemos no resto do dia.Saímos para caminhar, pois fazia um lindo dia de sol. Li levou uma canga esuas sandálias, mas dessa vez desistiu do chapéu. Fomos novamente em dire-ção da plataforma e voltamos do meio do caminho, pois ela parecia ter ficadomais distante.Tiramos fotos sob o portal do “Verão Gaúcho”, para marcar nossa presença ebuscamos nossos apetrechos de praia para curtir mais um solzinho.

Eis que surge, entre os habituais ambulantes de rede, uma figura pitoresca,com seu palavreado cantarolado e sem nenhum sotaque regional, um vende-dor de pastéis.—Bom dia meussss senhores e minhassss senhorassss, é um lindo dia desssste anode dois mil e sete nessssta maravilhosa praia de Capão da Canoa. Vão quererrrrsaboriarrrrr um delicioso passsstel quentinho? Tem de siri, tem de camarão, temde queijo e tem de palmito, passstel assssado com massa fressssquinha, falava eleacentuando os esses e erres.Li, que parecia já conecê-lo de outras épocas, se apressou em pedir um pastelde camarão.Ofereceu-me uma mordida e eu logo percebi que não seria suficiente, pedi outrodo mesmo tipo, desta vez acompanhado por uma Liber, que leváramos num isopor.

TINTURARIA FABIO’S GROSSI

Na praia umdelicioso pastel

de camarão

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CAPÃO DA CANOA 69

—Muito obrigado, senhora e senhoresss, tenham todosss um bom dia e um bom ano dedois mil e sete e até mais verrr pois estaremosss aqui todosss osss diasss para atênde-losss, se Deusss quiserrrr e perrrrmitirrrr. Passem bem e muuuuuuiiiito obrigado!Era realmente uma figura engraçada. Parecia não ter noção do que falava, de tãoartificiais que eram suas construções verbais e a maneira como as repetia. Embora oseu pastel fosse maravilhoso, certamente, ele sabia que era daquela encenação queadvinha o seu sucesso nas vendas.Voltei da praia mais cedo, pois já eram 12h30 e o protetor já não era garantia denada. Paulo e Li ficaram mais um pouco e voltaram contando sobre as gracinhas docachorrinho do salva-vidas, que registraram em foto.Depois do almoço, sempre acompanhada por uma taça de um delicioso vinho rose,que a prima Neci nos presenteara, o descanso era inevitável.Desta vez, entretanto, acordamos mais cedo, eram 16h20 quando fomos à Lan Housepara nos comunicarmos com os nossos.

Tentei inutilmente encontrar alguém on-line, mas mandei um e-mail com algumasfotos para a família e os amigos.Gastei meus quinze minutos e fui acompanhar o tempo de Paulo e Li, que preferi-ram comprar meia hora. Ambos se revezavam falando com seus filhos no MSNde Paulo, ora ele conversava com Danilo, ora ela com as filhas.Fiquei controlando o tempo, achando que os ajudava.—Faltam cinco minutos...faltam dois...falta umPaulo saiu dali aborrecido por não conseguir falar direito com Danilo e por Li terusado o seu endereço de MSN e não o dela.Li, por sua vez, indagava se havia algo a esconder e não aceitava a argumenta-ção intransigente de Paulo.

Indo à Lan paramandar notíciaspara casa

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70 TINTURARIA FABIO’S GROSSI

Esta foto foitirada durante

o vôo entreSão Paulo e

Porto Alegre

No diaseguinte Paulo

ainda estava demal humor

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No dia seguinte os ânimos continuavam acirrados, mas não vou contar o queaconteceu. Em vez disso vou criar uma alegoria para nos lembrarmos de nãorepetir a dose.

ra uma vez, duas grandes nuvens que se conheceram em uma mon-tanha muito alta e muito linda. Seus dias eram de muita labuta e

reconstrução constantes.Toda vez que viam seus espaços diminuírem, por causa das chuvas, juntavamforças e agregavam logo novos flocos recém formados ao seu domínio.Certo dia, cansados da rotina que os alimentava, resolveram dar um passeiopela costa do continente. Pediram ao vento que os acompanhassem nessaaventura, pois que seria muito bem vindo para gozarem juntos de novos ares.Foi o vento, prontamente, sem pestanejar, pois já estava cansado dos uivosincessantes dos rochedos montanhosos.Partiram os três, curtindo os tobogãs montanha abaixo e sentido o friozinhoda sensação de liberdade que se oferecia.Passaram-se os dias e o sol escaldante do litoral já não tinha forças paralevantar mais nenhuma gota de orvalho do mar. Então as nuvens começarama se dissipar no imenso céu.—É por tua culpa. Disse ele à companheira sem refletir.—Agora queres voltar correndo para nosso lar? Pois não há uma brisa que nos leve.—Se é por minha causa, parto eu sem vós e os deixo buscar recursos no marabafado, disse o vento preocupado.Como não resolviam a pendenga, ela pôs-se a chover num canto e o vento se ocultou por algumas horas atrás de umpenhasco próximo.Vendo que suas palavras ríspidas tornavam mais difícil a solução do proble-ma, pois além de sua companheira se dissolver ainda mais rápido, não teriama força do vento para soprá-los de volta.Arrependido por seu julgamento precipitado e intolerante, voltou-se à com-panheira e ao vento amigo e desculpou-se.Rapidamente, como que por encanto, as forças da natureza se puseram a seufavor e espessos flocos solidários se juntaram. E o vento, que não sabia terum amigo tão consciente do valor dessa amizade, voltou a soprar forte, ten-tando tornar o passeio cada vez mais agradável e favorável, até que resolves-sem voltar para sua montanha.

E

Sei que a alegoria não corresponde em gênero, número e grau aos fatos que sedesenrolaram naquele dia. Minha intenção é estabelecer um ponto de referênciapara nossa própria intolerância, no cotidiano das relações humanas.Quantas vezes não acordamos mal humorados, esquecendo que nenhuma daspessoas ao nosso redor merece sofrer por nossa desarmonia interior?

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De fato, quando nossa natureza é orientada para o bem e para o justo, a tolerân-cia e a humildade devem nortear nossas ações.O fato é que, já de saída para o almoço, estávamos plenos da certeza que dalipara frente nada estragaria nossas férias novamente.Seguimos para o restaurante próximo, onde iríamos conhecer a qualidade dotradicional PF (prato feito).Decepcionamo-nos com o PF, mas adoramos a novidade que o local ofere-cia. Poderíamos levar nossos notebooks e conectá-los gratuitamente à Internetvia wireless.De noite, como havíamos prometido ao dono do estabelecimento, lá estávamos nós.Nove horas e quarenta e cinco minutos da noite, mais meia hora até quemeu equipamento conseguisse carregar todos os drivers e programas insta-lados e plim plim, a aldeia global entrava em ação... estávamos conectadoscom nossos filhos e filhas.Falei com minha querida filha Lara, que custou a configurar seu MSN para funci-onar com a webcam. Eu estava ansioso para contar as novidades sobre o local emais ainda para saber se estava tudo bem em casa.Saímos do bar quando faltavam quinze minutos para meia noite. Custou paraque conseguíssemos estabelecer uma comunicação perfeita.Estávamos determinados a voltar constantemente ao local, mas essa é mais umahistória que deixarei para depois.

TINTURARIA FABIO’S GROSSI

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CAPÃO DA CANOA 73

XIFarofa com Tatuíra

12h34 do dia 21/03/2007Fico cada dia mais entusiasmado em escrever meu

pequeno diário, relatório ou qualquer outro rótulo que sequeira dar. Hoje eu pesquisei na Internet sobre Tatuíra.

Tatuí (que significa pequeno tatu em tupi) ou tatuíra(Emerita brasiliensis) é o nome dado ao pequeno crustá-

ceo decápode, que mede cerca de 3 a 4 cm e que éencontrado fazendo escavações de pouca profundidadenas praias arenosas brasileiras. Tem coloração branca.Sua semelhança com os tatus valeu-lhe o nome comum

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CAPÃO DA CANOA 75

á estávamos no dia oito de março, nosso quarto dia na praia de Capão daCanoa. Acordei com pernilongos, pois me esqueci de fechar a janela ao

dormir. Acho que devia estar fazendo uma temperatura agradável e eu não ligueio ventilador de teto. Ele sempre ajuda a espantar os bichinhos impertinentes.Estava sem sono, ainda eram cinco horas da manhã, muito cedo para fazerqualquer coisa... ou talvez não.Sem fazer muito barulho, vesti bermuda, camiseta e boné, peguei minha P10 daSony e fui para à praia registrar o nascer do sol.—Será que é seguro? perguntei-me ao sair do prédio.Na quadra seguinte, o vigia do supermercado ainda estava trabalhando. O restoda rua estava totalmente deserto e somente as luzes da cidade a iluminavam.—Boa noite!—Boa noite! respondeu ele com ar desconfiado.—É seguro tirar fotos na praia a essa hora?

—Não tem perigo, não. respondeu com convicção.Tirar foto do quê nessa escuridão? foi o pensamento que ocorreu sobre o queestaria ele pensando a meu respeito.Mas em pouco tempo, antes mesmo que eu atingisse o final do quarteirão, umaluminosidade já se impunha contra o azul profundo, criando um imenso “degradê”de tons mais claros.

JJ

Caça aotatuíracom Pauloajudandoficou bemmais fácil

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Apressei o passo, não queria perder o grandioso espetáculo que, certamente, anatureza me ofereceria.Eliminadas as que ficaram fora de foco ou tremidas, ainda sobraram quarenta eoito registros dessa manhã maravilhosa. Já não tinha dúvidas sobre como ocuparminhas insônias matinais.Quando voltei ao apartamento, Paulo e Li já tinham se levantado e se prepara-vam para a praia.—Hoje no almoço vocês vão conhecer um novo prato, disse eu durante o caféda manhã.—Se você fizer um arroz pra acompanhar, eu preparo uma farofa de corrupto.—O que é corrupto? perguntou Li sem saber a quê eu estava me referindo.Expliquei que se tratava daqueles pequenos bichinhos, que se enterram rapida-mente na areia logo que a onda se afasta.—O pessoal do lugar os usa como isca.—Ah, tatuíra!? exclama ela em tom de dúvida.

—Não sei qual o nome que vocês dão aqui, eu e a Lara comemos isso na Bahiae é uma delícia. Lá a gente conheceu pelo nome de corrupto.Municiei-me de um saquinho plástico para pôr os bichos e fomos para a praia.Pensei em fazer minha caminhada pegando os bichos aqui e ali durante o trajeto,mas ao começar minha jornada de caça, notei que não conseguiria pegar osuficiente para forrar o fundo da frigideira.O bicho é ligeiro, mas quando o pomos de costas, se finge de morto. Eu queriaevitar o excesso de areia no saquinho para facilitar a limpeza e o preparo doprato. Desenterrava-o e com a mão semi-serrada mergulhava-o na onda paralimpar a areia. Pô-los no saquinho estava sendo a parte mais difícil, pois o ventonão colaborava nem um pouco. Soprava forte e quando eu abria a boca do saco,

FAROFA COM TATUÍRA

É um bicholigeiro, mas

não nadamuito bem

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CAPÃO DA CANOA 77

17ª fotoØ 24 mmdiaf f/5.2tempo 1/125 sISO 100

23ª fotoØ focal 8 mmdiaf f/5.2tempo 1/125 sISO 100

33ª foto do diaØ focal 10 mmabertura f/0,7comp. -1.3tempo 1/60 sISO 100luz do diasolarizada

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39ª fotoØ f 24 mmabert.f/5.2

comp. -1temp 1/125 s

ISO 100luz do diasolarizada

42ª foto do diaØ focal 9 mmabertura f/6.3

comp. -1tempo 1/100 s

ISO 100luz do dia

44ª foto do diaØ focal 8 mmabertura f/5.6

comp. -1tempo 1/100 s

ISO 100luz do dia

FAROFA COM TATUÍRA

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CAPÃO DA CANOA 79

ele se inflava e sacudia forte. Paulo se aproximou para fotografar e notandominha dificuldade, sugeriu que eu pusesse um pouco d’água no fundo. Fiz isso ea situação ficou um pouco melhor, mas o processo ainda era lento.Depois de tirar algumas fotos, Paulo resolveu me ajudar, passou a câmera para Lie começou a escavar em um único lugar, ampliando aos poucos o diâmetro doburaco. Esse processo mostrou-se muito produtivo, pois os bichinhos brotavam atoda hora, nadando no pequeno laguinho que se formara e eu os coletava comrapidez, já enxaguados. Não demorou nada para termos o suficiente.De volta ao apartamento, Paulo acompanhava descrente a movimentação nacozinha enquanto eu e Li preparávamos o almoço.Depois de lavado e escorrido, exprimi umas gotas de limão e deitei em umafrigideira quente. Usei margarina com um pouco de óleo de girassol paranão queimar.A cor era agradável, o cheiro inebriante, parecido com o de camarão frito. Umaspitadas de manjericão e para complementar uma cebola cortada em rodelas.

Esperei até que a cebola ganhasse aquele tom transparente, identificando macieze então finalizei com a farinha de mandioca, bem pouca para manter a umidadeda farofa.Enquanto aguardava que o arroz terminasse de cozinhar, tirei dois tatuíras dafrigideira e os coloquei sobre a pia para esfriar e eu poder prová-los. Provei um eLi provou o outro fazendo comentários elogiosos. Paulo, sempre mais reservado ecauteloso, tirou um direto da frigideira e, sem olhar para o bichinho para nãoperder coragem, mandou para dentro da boca. Provado e aprovado por todosservimo-nos de farta porção.—Nossa, dava pra vender na praia!—Com tanto bichinho dando sopa pela praia toda, ninguém ia querer comprar.—Duro deve ser convencer as pessoas a experimentarem.

Etapa depreparo dafarofa comtatuíra

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Conversa vai, conversa vem, não sobrou um tatuíra na frigideira.Mais tarde Paulo e Li tiveram azia, não se pode dizer que foi por causa da farofa,afinal eu não senti nada, mas os dois resolveram riscar essa iguaria do nossocardápio. Tatuíra, never more.À noite, voltamos ao bar com conexão wireless para notebook gratuita, comohavíamos combinado. Entramos sem muita cerimônia, uma vez que já tínhamosestado ali no dia anterior e o movimento da praia estava muito baixo, ou seja, obar estava com poucos fregueses.Pedimos as bebidas de praxe e uma porção de batatas, por sinal muito boa,macia, sequinha e crocante por fora.Eu, como sempre, vou de Líber — cerveja sem álcool por causa dos remédiospara controle do Parkinson — pois adoro o sabor da cerveja e essa marcame conquistou.Ocupamos as mesas mais próximas do roteador, por causa do sinal e instalamosnosso equipamento.

O lugar que nós estávamos era uma mistura de restaurante, bar, padaria, loja deconveniências e cyber café. Montado em uma casa com três espaços distintos einterligados. Na parte da frente, uma varanda coberta com algumas mesas; nocorpo da casa um balcão de padaria, o caixa e algumas gôndolas com produtos;na parte do quintal um terraço coberto com mesas, tv, uma ilha de computadorese espaço para karaokê.Eu estava feliz com a idéia de podermos mandar fotos e relatarmos nossaestadia com freqüência. Porém meu notebook não estava muito disposto acolaborar comigo. Estava demorando muito para ligar e começar a funcio-nar por causa do Norton Antivírus, programa muito pesado para o pobreprocessador Transmeta da PCChips.

FAROFA COM TATUÍRA

No barcom

conexãowirelessgratuita

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CAPÃO DA CANOA 81

Repentinamente, ouvimos alguns gritos e xingamentos vindos da parte interna da casa.Logo em seguida um garçom se apresentou, dizendo que teríamos que encerrarnossa conta, pois estariam fechando a casa por algum problema de cunho pessoal.Fui pagar a conta no caixa e notei que a mulher falava com alguém ao telefone,estava muito irritada com a ausência do dono do estabelecimento, possivelmenteseu marido.Pediu-me desculpas pelo inconveniente, deu-me o troco e voltou a resmungar epraguejar para os funcionários que não sabiam onde se enfiar.Saímos dali boquiabertos, supondo que a mulher estivesse com tpm.Embora a proposta do bar fosse muito interessante, não voltamos mais para con-ferir se o ânimo da mulher tinha melhorado.

8ª foto do diaØ focal 8 mmabertura f/2.8tempo 1/100 sISO 100

16ª foto do diaØ focal 24 mmabertura f/5.2comp. -1.3tempo 1/100 sISO 100

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XIIChurrascaria

Estância Gaúcha

16h00 do dia 22/03/2007Estou enrolando um pouco para reiniciar

o texto, não sei que ênfase dar aos acontecimentos dodia 9. Embora tenha sido um dia de muitos prazeres

culinários, não ocorreu nada curiosoou engraçado, digno de registro

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ela primeira vez levamos chimarrão para tomar na praia, é incrível como olíquido quente dessa bebida sacia a sede.

O dia estava muito limpo e com uma brisa suave, próprio para ficar curtindo aosol e ouvindo o murmúrio das ondas.Entretanto, eu estava decidido a fazer minha caminhada todos os dias e segui emdireção à plataforma de pesca mais uma vez. Lembrei-me que todas as vezes emque estive na praia colecionei algumas conchinhas para guardar de recordação.Como não tinha levado saquinho fui catando com uma das mãos e colecionando-as na outra após enxaguá-las. Pegava todas que achasse interessante, fosse pelocolorido ou pelo formato. Não havia muita variedade, mas quando cheguei naplataforma já estava com a mão cheia.Entrei por baixo da plataforma com a água batendo pela cintura e de um dospilares retirei dois mariscos grandes, era o que cabia na outra mão.Voltei apertando o passo, pois já tinha se passado muito tempo.

—Pensei que você tivesse se afogado, já ia comunicar seu sumiço ao salva-vidas,disse Paulo fazendo graça.Sentei numa das cadeiras e servi-me de uma cuia de chimarrão com o que restarade água quente na garrafa térmica.—He, vida dura! exclamei debochando.Li me conta que conseguira trocar uma das mantas pelo par correto. Desde quechegamos à praia, e compramos redes e mantas no primeiro dia, ela vinha ten-tando encontrar uma com padrão igual. Acabou comprando uma de padrãosemelhante, mas se arrependeu. Não sei quem teve mais sorte, se ela ou o vende-dor que, para trocar a manta, forçou a venda de mais uma.

PPPP

A mantade quatrotons deEliane

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Ficamos mais um tempo curtindo o mormaço e o ruído das ondas. Estávamos numparaíso: sol, sossego, brisa fresca e o pensamento perdido nos prazeres da vida.Por toda essa tranqüilidade, nos esquecemos do tempo e quando nos demosconta já era bem tarde. Tínhamos planejado almoçar fora e os restaurantes nãoestariam abertos depois das 14 horas.Tomei banho, me arrumei e enquanto eles tomavam banho cozinhei os dois mariscos.Comi um e dei o outro para Li experimentar.—Esse vai ser o nosso almoço de amanhã.Li aprovou a idéia, marisco ela já conhecia e não tinha medo que fizesse mal.Nosso café da manhã era sempre muito gostoso, mas nossas experiências dealmoço em restaurantes foram bastante frustrantes até então.Paulo tinha pego de um panfleto, distribuído na praia, que anunciava um bufêlivre com carnes grelhadas. O anúncio parecia interessante, pois se tratava deuma churrascaria. Seguimos então para o endereço que era bem próximo e

fomos os últimos a chegar. Logo depois de entrarmos, as portas foram fechadaspara encerrar o expediente.As opções do bufê eram bem variadas e o aspecto da comida bastante atraente.Como resultado, fiz um prato muito grande com um pouco de cada coisa. Emborativéssemos chegado tarde ao local, fomos muito bem tratados, o garçom trouxe-nos todos os grelhados de que a casa dispunha.Paulo fez questão de registrar o tamanho do meu prato e quando saímos Li tiroumais uma foto para mostrar os dois glutões de barriga estufada. Pura onda, Paulocome como um passarinho, nunca se excede a não ser na cerveja.

CHURRASCARIA ESTÂNCIA GAÚCHA

Paulo nãoperde tempo e

já tira uma fotodo meu prato

caprixado

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Não tínhamos alternativas. Depois de um almoço daqueles era necessário um descanso.O jantar já estava planejado, a carne que compráramos dias antes não dura-ria muito tempo na geladeira.Li vinha prometendo uma receita de rolo de carne ao forno muito gostosa. Recei-ta que tinha baixado na Internet e ambos já haviam provado e aprovado.Paulo fez o arroz, perfeito e soltinho. Mas a comilança do almoço não deixou muitoespaço para o jantar. E foi assim que pela primeira vez eu fui obrigado a aceitarapenas um pequeno pedacinho do rolo de carne, só para não fazer desfeita.

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XIIISalvo pelo Photoshop

13h17 do dia 23/03/2007Estou pronto para começar mais uma passagem divertida

de nossas aventuras nesse passeio delicioso. Cuia dechimarrão do lado do teclado e garrafa térmica com

água bem quente, um autêntico convertido.

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almoço do dia seguinte já estava garantido, embora muito saboroso nin-guém agüentou comer muito no jantar daquele dia.

Caí da cama outra vez. Propositalmente, é claro. Fiquei bem entusiasmado comas primeiras fotos do sol nascendo no mar de Capão da Canoa. Dessa vez saímais cedo, passei pelo vigia do supermercado, cumprimentando-o e segui rápidopara pegar os primeiros raios de sol.As cores estavam mais vivas, mais intensas. Segui pelo lado direito do canal parafotografá-lo despejando suas águas no mar. A praia em si não apresenta muitoselementos naturais como rochas, contornos ou vegetação que se possa incluircomo elemento de composição. Fotografar o canal era uma forma de criar fotosdiferentes das tiradas anteriormente.O reflexo do céu na água, que corta de forma sinuosa as areias da praia, cria umrecorte curioso transformando o pequeno e raso leito num largo espelho d’águaindo para o mar.

Tiro várias fotos, sem me importar muito com o lixo preso às bordas, são sacosplásticos e canudos de refrigerante fáceis de retocar no Photoshop.Se me detenho para retirar o lixo deixado por estúpidos usuários inconscien-tes, corro o risco de perder momentos fugazes desenhados pela luz que sealtera rapidamente.A praia era a mesma, a máquina também, mas a cor do céu, a luz filtrada pelasnuvens do horizonte e a disposição para criar elementos visuais diferentes fazemda fotografia uma forma de expressão ímpar. Com um pouquinho de boa vonta-de, é possível fazer centenas de fotografias de um mesmo tema sem se repetir.

OO

6ª fotoØ f 9 mmabert.f/3,2temp 1/40 sISO 100luz do dia

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Embora minha câmera seja de um modelo bem simples, não consigo fazer foto-grafia sem explorar cada recurso. Aumento e diminuo o fator de luminosidade,altero os tons usando a regulagem do branco para cada temperatura de luz, usorecursos automáticos de solarização, sépia e todos os demais. Toda essa marato-na tem que ser feita de modo rápido e preciso, são muitas fotos e algumas sãoeliminadas segundos depois se, pelo visor, percebo que não ficaram boas.Já havia tirado umas quarenta fotos, quando alguém me toca o ombro.—Oi! diz em voz tímida o garoto.Era o filho do zelador do prédio onde estávamos hospedados.Eu já havia conversado casualmente com ele em duas outras vezes. Uma vezquando pegava ondas sem prancha e o instruí, para que não levantasse a cabe-ça se quisesse ir mais longe com a onda. E uma segunda vez, quando o vipescando na beira da praia com um pedaço de tela de nylon e ele me dirigiu apalavra, contando que conseguiu ir muito mais longe no jacarezinho, seguindominha dica.

Desta vez ele trazia uma vara de pesca pequena de bambu e usava tatuíra comoisca.—Oi, veio de vara hoje, a rede não deu certo?—Deu sim, mas com vara eu pego peixes maiores.—E a isca?Ele abriu a mão mostrando o bichinho e eu fotografei sem regular a máquina.O foco estava regulado para infinito, sua mão ficou fora de foco e só os seus pése as bolhas de espuma deixada na areia da praia ficaram nítidos.Não tive coragem de apagá-la.—Vai ali que eu vou tirar mais uma.

SALVO PELO PHOTOSHOP

14ª fotoØ f 9 mm

abert.f/3.2temp 1/100 s

ISO 100

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CAPÃO DA CANOA 93

13ª fotoØ f 9 mmabert.f/3.2temp 1/80 sISO 100fluorescente

15ª fotoØ f 9 mmabert.f/3.2temp 1/40 sISO 100tungstênio

33ª fotoØ f 21 mmabert.f/5temp 1/80 sISO 100tungstênio

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94 SALVO PELO PHOTOSHOP

Segurandoa vara coma pontinhados dedos

O primeiropeixe do dia,tão pequenoque mal dápara vê-lo

Maisatenção

com o foco

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Ele se afastou e fez uma pose estudada, estufando o peito e segurando a varacom a pontinha dos dedos.Esperei que ele se distraísse com a pesca e tirei outras fotos. Voltei a fotografar osol e em três delas consegui um efeito que deixaram o mar dourado.Viro-me para onde estava o garoto e lá vinha ele todo eufórico com seu primeiropeixe do dia. Uma coisinha insignificante que mal aparece na foto. Mas a ima-gem ficou ótima, a espontaneidade do garoto e a iluminação deixaram a fotocom uma beleza surreal.Terminada a sessão de fotos, voltei para o apartamento e já nos preparamospara sair de novo. Desta vez vamos pegar mariscos nas colunas da platafor-ma de pesca.Minha coleção de conchas estimula Li a fazer uma igual, antes ela só colecionavaaquelas com o formato semelhante ao símbolo da Shell. Dessa vez saímos os trêscolhendo as conchinhas atraentes, que encontrávamos pelo caminho. Ela foi guar-dando todas no saquinho que levávamos para trazer os mariscos.

Curiosamente, estava muito mais escasso o número de conchas que no dia ante-rior. Lá pela metade do caminho, encontramos uma família e nas mãos da mãeum balde lotado das que estávamos sentido tanta dificuldade para encontrar.—Tá explicado! exclamei brincando.—Acordaram mais cedo.—Pois é, respondeu Li desanimada.É claro que brincávamos com a situação, tantas conchas daquele jeito devem tersido fruto de alguns dias na praia.Mesmo assim Li conseguiu juntar muito mais do que eu, afinal eram mais doisa ajudá-la.

Procurandoconchas nocaminho

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Chegamos ao nosso destino depois de lavar várias vezes os pés, por causadas águas nos canais. Numa das vezes entrei tanto na água que uma ondatraiçoeira molhou-me os bolsos das pernas da bermuda, onde eu havia postoo dinheiro. Paulo estava tão afiado com a câmera que registrou o momento,como se tivesse combinado.—Até chegarmos lá, a bermuda seca, disse Li se referindo à distância.Pois chegamos e ela realmente tinha secado, só que não tinha a mesma cor doresto. Tirei a camiseta, a bermuda e fiquei de sunga. Equilibrei a roupa dobradasobre um tronco fincado na parte seca da praia e já ia entrando, quando percebique havia outros banhistas por perto.Pedi a Paulo que ficasse de olho na roupa, enquanto eu fosse pegar osmariscos. Ele queria registrar o momento com sua câmera, então sugeriuque eu mudasse a roupa para outro lugar mais visível, usando a borda deconcreto que se projetava para fora da mureta, na altura do piso daplataforma.

Entrei n’água carregando uma pequena faca e pensei que Li estivesse me acom-panhando com o saco plástico. Li experimentou a temperatura da água e achouque estivesse fria demais. As ondas estavam mais fortes e junto aos pilares haviauma depressão acentuada. Consegui desgarrar dois mariscos do emaranhado devegetal ao qual eles costumam se fixar. Eram dos grandes, não havia muitosdaquele tamanho e seria trabalhoso tirá-los um a um com as ondas batendo tãoforte. Virei-me para pô-los no saco e então percebi que Li não tinha me acompa-nhado. Saí da água ao seu encontro explicando a situação: demoraria muitofazer aquela operação com ela tão longe. A um passo do pilar, era bem maisraso do que ela pensava, a água batia na altura da coxa.

SALVO PELO PHOTOSHOP

Surpreendidopela onda,

Paulo estavamuito atento

e regisrou

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Entrei novamente disposto a enfrentar a força das ondas, ela acompanhou tentan-do convencer-me a tirar uma penca para separá-los depois.Apalpando sob a água encontrei uma borda saliente por onde eu podia segurá-los. Puxei sem fazer tanta força e uma manta de mariscos desprendeu-se comfacilidade do pilar corroído. Dois tantos daquele foram suficientes para encher osaquinho, embora eu soubesse, numa primeira olhada, que muitos não seriamaproveitados. Devíamos tê-los escolhido ali mesmo na beira da praia, mas apressa e a inexperiência nos fez carregar um saco pesado, marcando-nos asmãos pelos três quilômetros de caminhada.Eu não tinha a noção do peso até que, a meio caminho da volta, tirei o saqui-nho das mãos de Paulo. Li vinha insistindo para carregá-lo, mas dois cavalhei-ros não podiam deixar uma dama carregar um peso daqueles. Complexomachista mais besta.Senti um alívio danado, quando já bem perto do apartamento Paulo se ofereceupara carregá-lo novamente.

Chegamos ao apartamento e fomos direto ao serviço, ninguém tomou banho.Sentamo-nos na varanda usando as cadeiras de praia, no chão um balde com osbichos e uma panela para os escolhidos.Paulo botou água para ferver enquanto separávamos uma porção consistente.Entre as pencas vários filhotes de siri se revelavam assustados. Paulo brincou comos bichinhos, registrando em filme um dos maiores, não passava do tamanho deuma tampa de refrigerante.Depois de cansá-los colocou todos enfileirados no beiral da sacada esarcástico perguntava:—Siri sabe voar? Em seguida os atirava do sétimo andar onde estávamos, nogramado do canteiro central da avenida dizendo:

Pegandomariscos nabase do pilar

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—Voa sirizinho, voa.Eu o repreendi por tamanha malvadeza, mas ele replicou dizendo que com opeso dos bichinhos e a grama macia eles teriam boa chance de sobreviverem.Separados os mariscos, fomos à cozinha preparar o almoço. Enquanto eu picavatomate e cebola para os mariscos, Li requentou o arroz, o rolo de carne e aindaseparou os moluscos das conchas depois de cozidos. Macios e com seu saborcaracterístico, os mariscos foram um gostoso complemento para aquele almoço.Estava tudo perfeito, mas ainda não tínhamos tomado nosso banho. Aproveiteienquanto eles se banhavam para descarregar as fotos no meu notebook. Aosaírem do banho encontraram-me irritado por terem me fotografado quase sem-pre de perfil. Tenho a coluna acentuadamente curvada e o abdomem se projetapara frente de uma forma antiestética.—Ah! Vocês querem ver eu acabar com essa barriga?Em menos de cinco minutos a foto estava retocada no Photoshop e esteticamente aceitá-vel. Paulo ainda deve ter a foto original, mas quem quiser vê-la, vai ter que falar com ele.

Depois do banho, saímos os três a passear pelo centro comercial do bairro.Fomos até o banco, Paulo queria tirar algum dinheiro, usando o sistema 24 ho-ras, mas não acertava a senha da conta recém criada na Caixa Econômica.Tentou duas combinações, não arriscou a terceira, pois teria o cartão bloqueado.Voltamos ao apartamento e tivemos a oportunidade de apreciar o mais lindo pôr-do-sol da temporada. O céu estava tingido de um vermelho tão intenso que maisparecia um gigantesco incêndio românico.Eu estava bastante cansado e ao invés de ficar assistindo tv com os dois, preferi irpara a cama mais cedo.Onze e trinta da noite ouço meu celular tocar insistentemente.

SALVO PELO PHOTOSHOP

Foi durocarregar

aquele sacode mariscos

até o apê

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CAPÃO DA CANOA 99

Selecionandoos mariscosmaires para amariscada

Combastantetomate ecebola

Depois decozidos algunsficam bemvermelhos

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100 SALVO PELO PHOTOSHOP

Salvo peloPhotoshop,

essa é a fotoretocada

Ao pôr do solparecia que a

terra estavapegando fogo

Foram rarosos momentoscom nuvems

como estas

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CAPÃO DA CANOA 101

—Alô?—E aí, tudo bem? disse a voz do outro lado da linha.Eu estava tão sonado que não consegui descobrir quem era. O sotaque tãodiferente e fora do padrão regional me deixou mais confuso ainda.Pensei que fosse engano, mas respondi de maneira mecânica.—Tá, tudo bem.—Está curtindo o passeio? E eu continuava sem saber com quem falava. Certa-mente, a pessoa do outro lado sabia quem eu era.—Tá ótimo, estou me divertindo muito.—Eu fiquei pensando se você tinha ou não levado o celular.—Trouxe, sim, mesmo de férias pode surgir alguma coisa importante...—Estou sentindo falta das nossas reuniões de quarta feira. Finalmente aliviado,descubro quem era o dono da voz misteriosa.—E aí Valero, está tudo bem aí em Bauru?—Está tudo certo. Quando é que você volta?—Dia 16, eu também sinto falta das nossas reuniões.—Então está bem, aproveite bastante, curta bastante.Conversamos rapidamente por mais alguns segundos. Eu não acreditava no queestava acontecendo. Isso que é um amigo de verdade. Está sempre ligado eprocurando fazer contato. Voltei para cama satisfeito e pensando em como erabom ter um amigo como ele.

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CAPÃO DA CANOA 103

XIVShow de Câmera

16h16 do dia 24/03/2007Estou conseguindo escrever um capítulo por dia, nesse

ritmo daqui cinco dias termino toda históriado nosso passeio

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CAPÃO DA CANOA 105

cordei ansioso para fotografar o nascer do sol mais uma vez. No dia anterior,vendo o resultado de minhas fotos, Paulo ofereceu sua FinePix para que eu

fizesse um teste.Desta vez poderia usar o zoom ótico de dez vezes, trazendo o horizonte paramais perto, comprimindo o campo entre o sol e a praia. Podia também enquadrarcenas mais amplas do que com a minha P10. Além disso, o visor interno ajudavabastante no enquadramento e visualização das fotos tiradas.—Maravilha! pensei entusiasmado com as possibilidades.Segui para a praia, mas desta vez não vi o vigilante em seu posto.—Acho que no domingo ele também descansa.Meus pensamentos mantinham uma espécie de diálogo, se isso é possível, eutinha que descobrir a melhor regulagem da máquina fazendo-me perguntas etentando respondê-las.—Qual a definição da imagem?—Três ponto cinco mega pixel, essa é a resolução máxima dela.

Sem os óculos tento ler o menu e faço uma opção errada. Confundo RAW comB&W. Tiro minhas quatro primeiras fotos em Preto e Branco.—O que fiz eu de errado, cadê a cor? Descubro a regulagem de dioptria e acertomelhor o foco do visor.—Imbecil! Está em PB.Examino as fotos, estão ótimas, não foi de propósito, mas decido guardá-las. Àsvezes o acaso nos surpreende positivamente.Não conheço todos os recursos da máquina, mas logo percebo que ela respondecom eficiência a todos os meu caprichos.

AAAA

5ª fotoØ f 15 mmabert.f/3,1temp 1/10 sISO 64

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Cinqüenta e seis fotos, não tinha contado, mas estava satisfeito, fotografei o sufi-ciente para um dia. Volto ao apartamento e descarrego no notebook para exami-nar melhor a qualidade do material.Paulo e Li acordam e me encontram embasbacado com a qualidade das imagens.—É uma mais linda que a outra, sua máquina é fantástica!—Olha que definição! Olha isso, ela congela a espuma, do jeito que eu queria.Eu estava simplesmente encantado.—Pode usar quando quiser, está à disposição, disse Paulo, demonstrando suaamizade incondicional.Eu não queria deixar o computador, mas a praia estava nos chamando.Pegamos nossos apetrechos e nos dirigimos para um novo local, desta vez fica-mos exatamente ao lado do posto de salva-mar. Não seria preciso montar oguarda sol, espalhamos nossas coisas, isopor com cervejas, cadeiras e toalhastomando conta da área sombreada.

Éramos os primeiros a chegar, ventava muito, mas o sol estava forte, irradiandouma luz dura, com céu bem limpo num tom de azul mais escuro.Luz dura é uma terminologia usada em fotografia para descrever a luz que provo-ca sombras bem definidas e muito contrastadas.O posto de salva-mar é uma estrutura de madeira em forma de pirâmide e pisoelevado, acho que tenho uma foto para ilustrar.A idéia de usar a sombra daquela estrutura não era exclusividade nossa. Pormais que delimitássemos nosso espaço com nossos apetrechos, um passo pra cáou um passo pra lá já não é território de ninguém. Foram chegando e se acomo-dando, em pouco tempo estávamos rodeados de gaúchos obesos e tagarelas,sem nenhuma noção de proxemia. Todos querendo aproveitar a mesma sombra.

SHOW DE CÂMERA

7ª fotoØ f 17 mmabert.f/3,1

temp 1/11 sISO 64

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CAPÃO DA CANOA 107

17ª fotoØ f 57 mmabert.f/3,1temp 1/150 sISO 400

53ª fotoØ f 15 mmabert.f/4temp 1/343 sISO 64

O posto desalva-mar erauma pirâmidecom pernasaltas

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108 SHOW DE CÂMERA

19ª fotoØ foco 57 mm

abert.f/3,1temp 1/350 s

ISO 400

20ª fotoØ foco 57 mm

abert.f/3,1temp 1/340 s

ISO 400

33ª fotoØ foco 57 mm

abert.f/3,1temp 1/350 s

ISO 400

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CAPÃO DA CANOA 109

Não nos alteramos, estávamos ali para curtir. Peguei minha câmera e resolvi quefaria apenas filmes. Queria registrar o ruído incessante das ondas daquele lugar.Diferente de outras praias, cujas ondas se quebram em intervalos mais ou menosregulares e compassados, as ondas em Capão da Canoa se quebram váriasvezes ao longo da praia. Isso gera um ruído forte e contínuo, bem menos relaxanteque o outro ao qual estou acostumado.Comento o fato com a Li, me esquecendo que esse é o ruído de mar com o qualela se identifica.—Eu acho relaxante, você não acha?! diz ela sem entender do que eu falava.Fui até a beira da água e entrei com cuidado para não ser surpreendido poronda mais forte que pudesse molhar a câmera. Comecei com cenas mais longas,acompanhando o movimento das ondas até passarem por mim. Depois, tenteiinutilmente registrar os peixinhos que vinham nas ondas atrás das tatuíras e volta-vam apressados junto com o refluxo.Voltei para o nosso guarda-sol coletivo e apontei a câmera na direção dos “pom-binhos” que se apressaram em mostrar seus dentes dizendo xis.Vendo-os imóveis alertei dizendo:—É filme.—É filme? repete Paulo desmanchando a cara para foto e caindo na gargalhada.—Dá um beijinho aí, propus brincando.Paulo se curva sobre Li e a beija com um forte ruído de beijo estalado.—Eu decidi que agora à tarde só farei filme, disse-lhes depois do corte de cena.Fiz uma tomada do entorno e voltei a apontar a câmera para os dois.Desta vez, não dizem nada, levantam os pés do chão e começam a pedalar no ar.Hora do almoço. Baterias esgotadas, deixamos recarregando e sem câmeras,fomos a outro rodízio de grelhados. Como não há registro, não sei dizer o nomedo lugar, mas lembro bem que um aviso alertava sobre a cobrança extra parapratos que voltassem cheios de comida.O coração de frango estava uma delícia e a banana empanada também, faziatempo que eu não curtia esse prato tão simples e fácil de fazer. Lembrei-me queem casa, domingo após domingo, a comida não traz opção diferente: Massa ejoelho de porco.—De onde será que vem essa tendência à obesidade?—Não seria da sua mamãe? perguntaria com ironia minha esposa.Aquele seria um domingo atípico, digno de recordação.

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CAPÃO DA CANOA 111

XVSol, Mar e

Lasanha ao Pene

00h52 do dia 26/03/2007Hoje eu desenvolvi o primeiro projeto gráfico

para uma possível edição impressa desse texto. Pensei napossibilidade de editar um cd, mas estou reticente

em relação a isso

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MMeu entusiasmo em relação à beleza do nascer do sol e as fotos que eu vinhatirando convenceram Paulo a acordar mais cedo.

Embora Eliane não estivesse muito convencida, pois esfriara um pouco durante anoite, resolveu acompanhar-nos com sua pequena câmera digital.Eu tinha sido contundente.—Não há tempo para escovar os dentes, café da manhã ou qualquer outraperda de tempo, deixem tudo para depois da sessão de fotos.Tanto exagero fez com que Li nem pensasse em colocar uma roupa mais fechada.Vestiu-se com o que estava mais à mão, uma blusa ridiculamente pequena daprima Neci.Na saída do prédio Paulo torce ligeiramente o pé e quase leva um tombo. Recla-ma dos bifocais, mas mesmo sentindo alguma dor, resolve continuar com o quehavíamos planejado.Chegamos à praia no horário previsto, mas por algum capricho da natureza o solestava sonolento e resolveu se levantar mais tarde.

—É esse o horário, gente! Senão não dá pra fotografar, quando os primeirosraios tingem o céu antes dele despontar no horizonte.—Mas não tem luz nenhuma, como é que eu vou fotografar? pergunta Paulo desconfiado.Ele havia levado um pequeno tripé e no horizonte podíamos ver as luzes de umaembarcação. Sugeri a ele que montasse o tripé sobre a mureta que separa apraia da calçada e tentasse usar o máximo do zoom para fotografá-las. Teria sidouma excelente foto, se ele conhecesse bem a regulagem de sua própria máquina.Paulo agachou-se junto à mureta, colocou a máquina sobre o tripé montado, mas nãohavia jeito dele acertar a mira. A posição incômoda ou algum outro motivo fez com queele se demorasse tanto, que a pequena embarcação foi-se embora sem ser fotografada.

19ª fotoØ foco 24 mmabert.f/5,2temp 1/3 sISO 100

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Sem tripé, eu e Li pusemo-nos a fotografar com a máquina apoiada na muretafazendo o enquadramento a esmo.O tempo de exposição era enorme e as máquinas registravam as luzes que aindanão víamos de forma plena.Os primeiros registros foram feitos em torno das cinco e quarenta e são imagensde grande efeito dramático.Cada um de nós tirou aproximadamente sessenta fotos, já eram seis e trinta quan-do resolvemos voltar.Reclamando do vento frio, Li estava ansiosa por sair dali. Porém, a meio caminhodo apartamento resolvo convidá-los para tomarmos café em alguma padaria,poupando Li do trabalho que se dispunha a fazer diariamente.Caminhamos na direção oposta à da padaria chegando ao único estabelecimen-to que encontramos aberto àquela hora, um posto de gasolina.—Não adianta Fábio, vamos embora. Nada aqui funciona antes das oito.Mesmo assim, fui até o posto e perguntei ao funcionário.

—A melhor padaria e a única que vão encontrar aberta fica logo alí, passan-do a sinaleira.Eu logo percebi que ele se referia ao semáforo, que denominam sinal em algumasregiões e farol em outras.—Vamos. Eu já sei onde é.Saí apertando o passo para alcançar o Paulo, que já se punha de volta por onde viemos.De repente, tropeço em uma saliência da calçada e saio catando cavaco porentre os dois que debocham dizendo:—Calma! Aonde vai com tanta pressa.Não cheguei a cair, mas depois da torção de pé do Paulo era bom ficar esperto.O saci devia estar solto por ali. E há quem não acredite nos pestinhas.

SOL, MAR E LASANHA AO PENE

16ª fotoØ foco 24 mm

abert.f/5,2temp 1/6 s

ISO 100

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CAPÃO DA CANOA 115

O café estava bem gostoso, embora com um sabor diferente que só mais tarde fuidescobrir que se tratava de uma máquina de Nescafé.Li pediu alguns biscoitos e nos ofereceu dizendo que se chamavam “cueca virada”.—Hummm, gostosinha essa cueca furada! exclama Paulo pouco depois.Voltamos para o apê onde, como sempre, nos besuntávamos com nossos proteto-res antes de ir para praia. Porém, desta vez o céu não estava muito limpo e o solbrincava conosco de esconde-esconde.Ao invés da tradicional caminhada, preferi lutar com as ondas e me despedir doquerido amigo mar, uma vez que no dia seguinte voltaríamos pra Porto Alegre.Para variar, resolvi não levar minha cadeira, pois raramente eles usavam as ca-deiras que insistiam em levar.Ao sair da água, com o sol encoberto pelas nuvens e o vento soprando um poucomais frio que os outros dias, encontrei-os sentados e sem intenção de se deitarem.—Justo hoje que eu não trouxe cadeira vocês vão ficar sentados?—Ah é, engraçadinho! Por que é que você não trouxe a sua? disse Paulo

—Porque vocês nunca se sentam, trazem cadeira, mas ficam sempre deitados nas toalhas.Peguei uma pequena prancha que se encontrava perdida na areia e sentei-mesobre ela.Eles estavam desanimados com a ausência do sol, mas não demorou muito elevoltou a aparecer. Paulo e Li estenderam suas toalhas, cedendo-me o lugar, eu sónão sei precisar a hora que saímos da praia.Sei, por ter anotado, no rascunho, que o almoço daquele dia foi macarrão peneao sugo e que depois saímos pelo centro comercial e tomamos chuva.A quantidade de macarrão que Li fez no almoço era tão grande que no jantar demosuma incrementada com queijo e presunto e ela se transformou numa saborosa lasanha.

45ª fotoØ foco 8 mmabert.f/5,6temp 1/100 sISO 100

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CAPÃO DA CANOA 117

XVISopinha de Tudo

16h00 do dia 26/03/2007Tentei criar outro projeto gráfico que ficou

bem melhor, mas o PageMaker é um programa difícile eu gastei a manhã inteira nisso

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CAPÃO DA CANOA 119

ltimo dia de praia e estamos querendo curtir ao máximo. Não estamos tristes,pelo contrário. O convite para conhecer Gramado nos entusiasma bastante.

Logo cedo, enquanto Li fazia uma rápida faxina no apartamento, Paulo e eufomos à rodoviária para comprar as passagens.Nossa intenção era pegar o último ônibus da tarde para chegar em Porto Alegre à noite.Fomos conversando pelo caminho sobre a maravilhosa férias que tivéramos e oquanto a Ana perdera por não ter aceito o convite.Chegando ao guichê, dei dinheiro a Paulo para que ele comprasse a minha passagem.—Quero três pra Porto Alegre.—Pois não, são cinqüenta e nove com dez.—Como é? Pergunta Paulo sem entender a conjugação numeral.—Cinqüenta e nove com dez. Repete a vendedora.Paulo fazia aquilo de pirraça, ele conhecia as diferenças regionais, mas nãoachava a lógica.—Cinqüenta e nove com dez dá sessenta e nove. Argumentava ele.

Ficamos fazendo troça da história e logo me lembrei:—Tenho que anotar isso no meu resumo, isso se eu não esquecer até chegarmos ao apê.—Então vamos registrar já.Paulo regulou a máquina para o modo filme e passou para as minhas mãos.—Tá legal, eu filmo você perguntando quanto é a passagem e respondo, imitan-do a moça.Aperto o botão e espero ele dizer:—Quanto é?—Cinqüenta e nove com dez.—Como?—Cinqüenta e nove com dez.Aperto novamente o botão e devolvo a máquina.

ÚÚÚÚ

Usei acâmera doPaulo paratirar algumasfotos com diamais claro

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Paulo resolve olhar a gravação para ver se ficou bom, mas nela só apareciamnossos pés enquanto ríamos da encenação.Eu apertara o botão errado da primeira vez.—Deixa quieto, você acha que eu vou esquecer disso?Olhando para o chão no caminho de volta, catei algo brilhante e dourado, masera apenas um pedacinho de plástico desprendido de algum brinquedo. Atirei-ode volta pensando:—Um dia ainda acho algo valioso.Na praia, eu já tinha me despedido das águas, não queria entrar novamente.Tudo que eu queria era fazer mais algumas fotos, agora em plena luz do dia.Minha máquina tinha ficado no apê para carregar a bateria, então peguei aFinepix do Paulo emprestada.Um tom de azul esverdeado e espumas muito brancas eram um convite ao deleite visual.Estava fotografando o mar vazio e já tinha feito quatro disparos, quando giro para olado e noto que uma moça magra – coisa rara nessa praia – vinha passando por mim.

Fiz um enquadramento rápido e disparei.A moça passou ligeiro fingindo me ignorar. Caminhava por dentro d’água comuma bolsa de pano levantada à altura do ombro para não molhar.Girei o corpo noutra direção e continuei a tirar fotos da arrebentação das ondas.Queria pegar o momento em que ela se eleva ao máximo, formando uma peque-na crista antes de quebrar.Mal tinha tirado mais três fotos, quando olho para o lado e vejo a mesmamoça caminhando na direção oposta. Passou bem perto, como se quisesse serfotografada novamente.A provocação não ficou sem resposta, mas desta vez fotografei-a de costas paracompletar o quadro.

SOPINHA DE TUDO

As coresnesse

horário sãocompletamente

diferentes

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CAPÃO DA CANOA 121

Olha opassarinho!

De novo!

Com maisluz fica maisfácil congelaro movimento

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122 SOPINHA DE TUDO

Um raromomento em

que ambosestão sentados

Com a luzcorreta asfotos ficammuito boas

Faço um novoenquadramentopara não ficar

repetitivo

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CAPÃO DA CANOA 123

Mais algumas fotos e voltei para o nosso guarda-sol e, ao me aproximar, ouçoPaulo comentado alto para que eu pudesse ouvir:—Aposto que ele esgotou a memória da minha máquina.Mostro as fotos que tirei e já aviso a Eliane que não apague as fotos da moça,pois eu que havia tirado.Paulo pede que eu tire algumas fotos caprichadas de Li.Deitada na areia e a contra-luz, Eliane faz algumas poses, mas as fotos ficamescuras demais.Eu não sabia onde ligar o flash forçado, então pedi que eles me acompanhassematé perto da água e com uma posição mais favorável da luz refiz a sessão.Na última pose, Li pede que eu a fotografe de costas, mas a areia agarrada àpele foi motivo para Paulo fazer algumas piadinhas.—Coxa à milanesa? dizia ele rindo muito.O tempo passava lento e gostoso, não havia pressa pra sair da praia.

Perto de onde estávamos um ambulante fazia uma oferta irrecusável a um se-nhor idoso e aparentemente rico.—Cento e cinqüenta, é minha última oferta, é pegar ou largar.Ele tentava vender uma linda rede amarela, semelhante à que Paulo comprara noprimeiro dia. Aproximei-me para examinar melhor o produto e mostrei que estavainteressado, porém o preço teria que ser negociado.—Meu amigo aqui pagou quarenta numa verde linda com barrado em diagonal,você sabe de qual tipo eu estou falando. Não sabe? Pois é o que eu ofereço.Quarenta reais, se você me fizer por esse preço eu fico.Vendedor astuto. Avalia-me da cabeça aos pés e jogando a rede em meu colodisse em tom de desafio:—E se eu aceitar teus quarenta, que tu faz?

Cuidado comos exageros!Lembra doque aconteceucom aCicarelli?

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—Eu aceito, respondi prontamente sem dar chance dele desistir da oferta.Já era o quinto produto volumoso que eu teria que transportar ao voltar para Bauru.—Não conta pro senhor aí ao lado o preço que tu pagou, tá?E saiu empurrando seu carrinho de três rodas, empilhado até as tampas commantas e redes.Tomaz, o garçom do quiosque da vó Neide, o de número 16, veio nos oferecerseus préstimos. Desta vez, como a praia se encontrasse com poucos clientes, sedemora mais na conversa fiada. Conta-nos que seu ex-patrão era bauruense, ecurioso por causa do comprimento dos meus cabelos pergunta:—O senhor é estilista?Conto-lhe um pouco sobre mim e ele fica meio surpreso. Como será que ele me via?É engraçado como algumas pessoas têm uma visão estereotipada de tudo. Atribu-em valores para a aparência e não para a essência, depois ficam surpresosquando o arquétipo não corresponde.

Aproveitamos a praia até o toco do osso, íamos almoçar fora e depois fazer ceraaté as 19 horas. Minha preocupação me leva a uma decisão crucial, eu nãoconseguiria enfiar todas as coisas que comprei na mala, que já estava bastantepesada. Eu teria que comprar um carrinho para aliviar o peso na coluna.Acreditando que nas pequenas lojas da proximidade encontraria um do tipodesmontável, avisei a Paulo que enquanto eles tomassem banho, eu faria isso elogo retornaria para almoçarmos juntos.A busca pelo tal carrinho levou-me a quilômetros de distância pelo centro dacidade, tudo que eu consegui encontrar foi uma daquelas sacolas enormes defibra plástica e zíper.

SOPINHA DE TUDO

Vó Neide eTomaz, o

garçon depraia

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CAPÃO DA CANOA 125

Voltei preocupado, sabendo que eles não esperariam todo aquele tempo. Subiao apartamento, procurando por algum bilhete que indicasse onde estavam.Nada de bilhete.Desci e fui ao bar mais próximo para fazer um lanche sozinho. Conversando como dono do bar, descubro que na esquina, em direção oposta a que eu escolheraantes, havia o tal carrinho para vender.Toda a economia que eu fizera na compra das mantas e redes ia agora nacompra daquele carrinho. Tive que pagar quarenta reais por um modelo que nocomércio em São Paulo custa somente dezoito reais. Eu só conseguia pensar noalívio de peso extra que ele proporcionaria.Retornei ao prédio quase ao mesmo tempo que eles. Percebendo que eu perderaa noção do tempo em minha empreitada, trouxeram-me um delicioso pedaço detorta que eu devorei vorazmente.Já não importava mais, até a cadeira de praia eu resolvera levar comigo.—O que você vai fazer com uma cadeira de praia em Bauru?

—Onde nós vamos enfiar essa cadeira no carro?Perguntavam indignados.A estrutura da cadeira permitiria dar maior firmeza ao conjunto, mas com o quêamarrar tudo ao carrinho?Voltei à loja e comprei dois elásticos com ganchos, próprios para essa finalidade.Minha bagagem estava pronta, bem amarrada e eu estava tranqüilo por saberque havia solucionado meu problema.As camisetas que eu deixei para lavar, um dia antes da partida, ainda estavamúmidas. Então, foram colocadas em um saco plástico dentro da mala. A muda daavelã eu mantive na areia no mesmo balaio feito de caixa de leite e só escorri oexcesso de água. No ônibus eu o colocaria no chão junto aos pés.

Paulo mefotografapronto parapegar umaonda

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Eu não conseguia me tranqüilizar. Enquanto Paulo e Li tiravam um cochilo,minha ansiedade aumentava.Fumei um cigarro sentado à varanda, mais um e mais um. Meus pésestavam inchados e eu me deitei no sofá da sala para aliviar a pressão ea sensação de peso.Não se passou muito tempo e já estávamos de partida.Cada qual arrastando sua mala e se virando com as bagagens de mão.Sobre a calçada irregular a mala de Eliane se desequilibrava a todo ins-tante, por causa da distância muito pequena entre as rodinhas. Então re-solvemos andar pela rua, próximos ao meio fio.Sem problemas! Fora da temporada as ruas estão vazias, sem tráfego.A grande sacola, com a rede e as mantas compradas por eles, não seestabilizava sobre a mala e Li parava a todo instante para reequilibrá-la.Sobre o meu carrinho, amarrado com os elásticos, coloquei toda a baga-gem mais pesada, mas o notebook continuava a tiracolo.

O carrinho não era suficientemente grande para suportar todo o volume.Ao chegarmos no pátio da rodoviária, olho para o chão e vejo umpequeno anel.—Opa! Achei alguma coisa.Agachei, peguei o anel e o coloquei no dedo mínimo.Mostrei-o a Li que exclamou:—Está todo riscado na lateral!—Alguém deve ter pisado nele, mas é bonitinho, disse eu meio melindrado.E voltei a pô-lo no dedo.Quando na volta para Bauru passamos numa loja de bijuterias na 25 de marçoem São Paulo, vimos o mesmo modelo de anel por 30 centavos a dúzia.

SOPINHA DE TUDO

A muda deavelã que o

Sr Ataídenos deu

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CAPÃO DA CANOA 127

O motorista enfiou minhas coisas no bagageiro com a tradicional delicadeza quelhes é peculiar.Tomamos nossos acentos no ônibus e deixamos Capão da Canoa. Estávamosfelizes porque tivéramos a oportunidade de desfrutar todos os dias daquelapraia encantadora.Minha cadeira era junto à janela, do mesmo lado que a do motorista, no meio doônibus e atrás do Paulo.Exatamente atrás de mim, sentou-se um sujeito resfriado que tossia e chupava onariz incessantemente.Ao meu lado, um sujeito troncudo não dava espaço para que eu apoiasse os braços.Toda vez que eu tentava reclinar o encosto sentia respingos de saliva do sujeitogripado, que parecia tossir propositalmente mais forte.Punha o encosto outra vez na vertical e já me sentia espremido e sem conforto.—Pessoas gripadas deviam sentar-se em lugares especiais, de preferência atrásdo motorista que tem um vidro a protegê-los, pensava eu indignado.Com o boné, que não saía mais da cabeça, onde quer que eu fosse, cobri o rostoo quanto pude e viajei por mais de meia hora com o banco parcialmente reclina-do. Foi quando eu descobri aliviado que, ao dormir, o sujeito da gripe não tossiamais. Reclinei meu banco e dormi tranqüilo o resto do caminho até Porto Alegre.Chegando lá pegamos um táxi. O motorista corria tanto e se mantinha tão colado aocarro da frente, que o nosso pensamento – meu, de Paulo e de Li – se tornaram um só:—Dá menos medo andar de avião do que andar com esse maluco, dirigindo assim.Chegamos rapidamente no nosso destino. Ao tirar minha bagagem do porta-malas, meio descomposta pelo movimento todo que veio sofrendo, a mala sedesconjunta do resto do carrinho e não consigo mais prendê-la na mesma posi-ção. Empurro o carrinho com uma das mãos e puxo a mala com a outra.Tivemos que dividir a carga para pegar o elevador. Subi na frente com uma parteda carga e Neci já nos esperava à porta de seu apartamento.Ajudou-me arrastando parte da bagagem e voltou ao elevador para receber Pau-lo e Li, que subiram logo atrás.Após o banho, Neci nos ofereceu uma gostosa sopinha de tudo.Sopa de tudo é aquela que tem um pouco de cada coisa e não se pode identificarum ingrediente que predomine. Era uma sopa deliciosa, feita anteriormente econservada no freezer, sem nenhum tempero forte que pudesse comprometer asaúde da tia Maria.Enquanto a sopa esquentava, sentamo-nos em volta da mesa na pequena cozi-nha e ficamos conversando.Sem nos conhecer direito, a garotinha Vitória e seu irmãozinho nos olhavamsorrateiramente. Ele, meio cansado das artes do dia, foi logo se deitar no sofá emfrente à tv e adormeceu.Vitória, a sobrinha de Neci, sentido seu espaço ser invadido, sentou-se irritada no meioda cozinha com seu porta-trecos repletos de pequenos brinquedos e não se movia.—Olha! Obedece a dinda, senão não vem mais, dizia Neci à pequena garotinha.

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—Você não quer sentar aqui com o tio, perguntei tentando convencê-la a sair dochão e desimpedir a passagem.Ela acenou com a cabeça, dizendo que não.—Eu te dou um anel, você quer?Ela novamente acena que não.Paulo não perde tempo, e me zomba:—A menina é esperta, ela sabe o valor dessa coisa.Fui ligar o notebook para descarregar as fotos da máquina de Paulo e mostrá-lasa nossa anfitriã.Vitória, curiosa como qualquer criança esperta, queria mexer no teclado. Ensinei-a como apertar o botão do mouse para alternar entre as fotos. A partir de entãoela não dava mais trégua, bastava eu ligar o computador e lá estava ela, estican-do o dedinho para apertar o botão que eu mandasse.A sopa ficou pronta. Logo de cara, já percebo algo diferente de todas a sopasque conhecia. Rodelas de milho verde, cortadas com sabugo eram servidas junta-mente com o resto.Não estavam ali apenas para enfeitar, devíamos pegá-las com as mãos, pois coma colher não era possível.Nada comum é o que fazíamos depois. Sem lavanda ou guardanapo, chupáva-mos os dedos como crianças, sem ninguém a julgar nossos modos ou ensinarregras de etiqueta.Contei-lhes, de forma breve, uma história passada por minha mãe sobre a sopade pedra. Na história, dois pobres, famintos, porém sábios, colocavam numapanela com água a ferver uma pedra bem lavada de tamanho médio. A todocurioso que passava, diziam estar fazendo a sopa de pedra e que seria bem-vindo se quisesse ficar para participar da ceia.Ninguém que parasse deixava de contribuir com algum produto para enriquecertal caldo absurdo.Ao final, reunidos a mais seis ou sete curiosos, retiravam a pedra e saciavam afome com uma suculenta “sopa de pedra”.Nunca vira, entretanto, uma sopa que nos fazia lamber os beiços e chupar osdedos como aquela.

SOPINHA DE TUDO

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CAPÃO DA CANOA 129

VIIGramado e Canela

de Lambuja

20h28 do dia 27/03/2003Estou pasmo com o tamanho do texto, já estou a onzedias em Bauru e não consegui terminá-lo. Minha irmã

acabou de ligar reclamando a falta de notícias

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CAPÃO DA CANOA 131

OOOO dia amanheceu depois de mim, eu já o aguardava de máquina em punhopara registrar seus primeiros sinais.

Aos poucos as outras pessoas da casa foram se levantando, tínhamos um longopasseio e devíamos sair cedo para aproveitá-lo bem.Sete e meia da manhã e estávamos no carro prontos para o passeio. Eu e Necino banco de trás, Eliane dirigindo e Paulo fotografando tudo que podia.Preparei minha máquina para registrar uma eventual mudança de cenário napaisagem da estrada, mas tudo que consegui perceber foi um enorme númerode fábricas instaladas ao longo da rodovia.—Isso se parece com uma cidade que meu filho construiu no SimCity – um jogode computador – era uma longa rodovia ladeada por indústrias de todo tipo.Longa mesmo, não chegávamos nunca e o espaço que eu tinha para mexer aspernas no banco traseiro do Pólo não era suficiente para aliviar a tensão, que obanco provocava em meu joelho. Se existe algum estudo de ergonomia paraesse carro devem ter usado crianças como modelo.

Eu não queria pedir que parassem o carro para eu dar uma esticada na perna,para não perceberem o meu desconforto no banco de trás. Massageava a per-na na tentativa de amenizar a dor e observava o tempo de estrada que aindatínhamos pela frente.Foi um alívio chegarmos ao posto de gasolina onde Eliane parou para usar obanheiro. Os banheiros eram trancados e devíamos pegar a chave no caixa. Acuriosidade do posto, além do jardim todo florido, era o tamanho da placapendurada à chave para que nenhum incauto esquecesse de devolvê-la ao sair.Eliane queria conversar com Neci, então passou para o banco de trás e cedeua Paulo seu lugar ao volante.—Vá no banco da frente, disse Eliane.Foi a frase mais reconfortante do dia.

CervejariaSkol naestrada paraGramado

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Neci queria nos mostrar o Parque da Ferradura, mas paramos ainda na cidadenum belvedere ao lado do hotel Toscana, de onde podíamos visualizar a grande-za do cenário montanhoso que teríamos para desfrutar.Comecei a fotografar avidamente e Li recomendou que tomássemos cuidado ouficaríamos sem espaço para o que tinha por vir.Seguimos até o Parque do Caracol e Neci se informou sobre a distância até oParque da Ferradura. Eram mais sete quilômetros de estrada de terra e pedriscos.Uma estrada rústica como aquela era o prenúncio do que teríamos pela frente,comecei a temer pelo que viria.—A Ana ia se sentir muito bem aqui, estradas e trilhas em terreno acidentado,pensei em silêncio.Comecei a puxar o fôlego, pois sabia que ia precisar de muito ar para um pas-seio daquele tipo. Tão diferente da praia, plana, tranqüila...Chegamos à portaria. Sete reais por pessoa, quatro reais para crianças e pesso-as com mais de sessenta e cinco.

—Alguém no carro tem mais de sessenta e cinco? pergunta Neci sugerindo uma piada.—Alguém com essa idade devia receber para fazer um passeio desses,pensei em silêncio.Não que eu achasse o passeio desinteressante, mas sou meio avesso a esforços desne-cessários. Por mim deveria ser tudo mecanizado com escadas rolantes e elevadores.Deixamos o carro no estacionamento e começamos a explorar o lugar. Trilhado...tantos minutos, trilha da...tantos minutos. Faríamos a menor delas, pois ain-da havia outros passeios planejados.Degraus irregulares, alguns altos demais até para mim que sou relativamente alto.Imaginava quando a Neci começaria a pedir ajuda. Mas ela se virou muito bem.

GRAMADO E CANELA DE LAMBUJA

Canteiroflorido no

posto degasolina

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CAPÃO DA CANOA 133

Vista dapaisagem emum belvederede Gramado

Hotel Toscanaao lado dobelvedere emGramado

Arquitetura deGramado chamaa atenção dovisitante

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134 GRAMADO E CANELA DE LAMBUJA

Plataformade observaçãono Parque da

Ferradura

Enorme paredãode rocha ao lado

da plataforma

Trilhas rústicas,sem conservaçãoe degraus muito

irregulares

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CAPÃO DA CANOA 135

Mais alguns metros e chegávamos a uma plataforma de madeira, um mirante de boasdimensões de onde podíamos ver todo o contorno do rio em forma de ferradura e quedá nome ao lugar.Tiramos várias fotos, mas nenhuma das máquinas tinha abrangência suficiente parafotografar todo o percurso do rio em uma única imagem. Nem me lembrei que poderiaemendar duas ou três em um programa gráfico.—Vamos? sugeriu Neci.—Agora é que a coisa pega, pensei.Começamos a escalada com coragem e determinação. Lembrei do filme limite vertical...No meio do caminho Paulo nota uma ponta de ferro fincada na terra, resto da estruturaque segurava um degrau e comenta conosco.—Temos que avisar alguém sobre essa ponta de ferro, disse eu preocupado que alguémpudesse espetar o pé.—Avisar a quem? pergunta Li.—Ao porteiro.

—E como vamos indicar a posição exata? pergunta Paulo.—Não faço idéia.Estávamos quase atingindo o cume, com a respiração ofegante e a camiseta ensopada,quando alguém solta:—Fuma, desgraçado!Imediatamente retruquei:—E isso por que eu fumo Dallas suave. Imagina se fosse do comum?Exageros à parte, o lugar é lindo, mas o preço do ingresso é exageradamente alto paraa estrutura que apresenta. Voltamos para o carro, pois não havia mais nada para ver-mos ou fotografarmos ali.

Fiqueiimaginando seNeci conseguiriasubir sem ajuda

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—Agora vamos ao Parque do Caracol, vocês vão conhecer a cachoeira véu denoiva, disse Neci.Eu só conseguia pensar em quando iríamos comprar os famosos e consagradoschocolates de Gramado.—Você não queria tirar uma foto do portal? pergunta Paulo ao deixarmos o local.Levantei a máquina através do teto solar e disparei de costas para o mesmo.Examino e vejo que a foto ficou torta com o horizonte inclinado, mas depois euacertaria no Photoshop.—Vamos embora, disse eu sem ânimo para outra tentativa.Chegamos ao segundo Parque. Neci gentilmente, como fizera no parque anteri-or, pagou os quatro ingressos. Eu já não temia tanto, pois a estrutura desse erabem melhor. Tinha até elevador e teleférico. Oito reais por pessoa, mas tudo ládentro era cobrado.—Que exploração! Paga para entrar, paga para andar. É por isso que vem tãopouca gente assim, pensei.

Sobrava-nos novamente a opção das trilhas, e lá fomos nós.Dessa vez, no entanto, a decida era suave e os degraus bem dimensionados e regulares.Chegamos em um entroncamento com duas opções, ou continuávamos a decidamais suave até o topo da cascata, ou teríamos que descer 927 degraus equiva-lentes a um prédio de 49 andares, num desnível aproximado de 160 metros paraatingir a base. Em um painel o texto em vermelho alertava:* Não recomendado para cardíacos, asmáticos, hipertensos, diabéticos, sedentários;...Em letras pretas e vermelhas dizia não ser permitido descer após as 16h30min.Que dúvida!—Alguém vai querer descer? perguntei com ironia.Ninguém respondeu.

GRAMADO E CANELA DE LAMBUJA

Entradado Parque da

Ferradura

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Portada doParque doCaracol, fotoda vistainterna

Painel deorientação aosvisitantes sobrea condulta e oshorários aobservar

CascataVéu de Noivano Parque doCaracol

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138 GRAMADO E CANELA DE LAMBUJA

Caminhamosaté alcançaro leito do rio

no alto dacachoeira

Paulo pedepara ser

fotografadoao lado doesqueleto

O trenzinhodos anões no

Parque doCaracol

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CAPÃO DA CANOA 139

Fomos descendo a trilha mais suave e fotografando a cascata de vários ângulos, àmedida que nos aproximávamos. Dessa vez Neci exausta e com medo de um retornopuxado decidiu parar no meio do caminho. Ficou aguardando que retornássemoscom a língua de fora. Mas se enganou redondamente. A subida foi tão tranqüilaquanto a descida. Bem, nem tanto. Mas também não foi nenhum pesadelo.Dentro do parque havia um lugar muito atraente para crianças chamado CidadeFantasma do Velho Oeste, onde o ingresso dava direito a uma volta no trenzinho.Na entrada a recepcionar os visitantes uma caveira vestida com uniforme desoldado americano ficava recostada em um canhão com rodas. Não sei o que ovelho oeste americano tem a ver com um parque nacional no Rio Grande do Sul,mas a caveira era muito engraçada e Paulo quis tirar uma foto ao seu lado. Maisadiante tiramos fotos ao lado de um mini trem transportando anões.Mais duas fotos e pronto, tinha esgotado toda memória da minha máquina.—Não foi por falta de aviso, disse Li sorrindo.

Ela e Paulo ainda tinham memória para muitas fotos, então fiquei despreocupadoporque, o resto da nossa viagem não ficaria sem registro.O parque era servido também de algumas lojas com artigos de recordação.Enquanto Paulo e Li compravam alguns imãs de geladeira e outras pequenaslembranças, entrei em uma loja de chocolates e perguntei o preço de alguns. Nãocomprei nada, iríamos a uma loja em Gramado cujos preços eram a metade dospraticados ali.Finalmente, em Gramado paramos na loja dos sonhos de qualquer chocólatra.Repleta de barras, bombons e outros formatos de confeitos daquela matéria-prima.Aquela, sim, representava uma boa lembrança de quem estivera em Gramado.

Comprandochocolate emGramado

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Preparei uma caixinha de barras variadas para a esposa, um pacote de bombonspara quem aparecesse em casa e três pacotinhos de chocolates com flocos dearroz para os filhos e o genro.—Dever cumprido! Visitei Gramado e estou levando a prova do crime comigo,pensei eu apressadamente.—Agora vocês são meus convidados para um café colonial no Bela Vista,disse Neci gesticulando de um jeito faceiro, próprio de pessoas felizes e debem com a vida.Paramos o carro do outro lado da rua, lugar sombreado em frente a uma loja decalçados, pois senão os chocolates estariam todos derretidos quando voltássemos.Neci sugeriu que entrássemos na loja para tentar disfarçar, afinal estávamosparando em vagas particulares da loja em questão. Senti que não fossenecessário entrarmos em bando e atravessei a rua aguardando do outro lado.Esqueci-me de como o gênero humano se distrai vendo coisa para comprar,

mesmo não tendo a intenção imediata em fazê-lo. Passaram-se alguns bonsminutos até que saíssem de lá.O ambiente formal e sóbrio do café Bela Vista era um convite a uma posturacerimoniosa. Até Paulo que é sempre efusivo se comportava de maneira maiscalma e comportada, até o momento em que começam a nos servir. A quantida-de, variedade e aparência da comida eram absurdamente ricas. Não sabíamospor onde começar, ora doce ora salgado, ora assado, ora grelhado, era tudosaborosamente degustado.Elogiávamos e comentávamos o sabor de cada prato até que Eliane lembrou:—Reservaram um lugar para a torta?Recostada na parede bem a minha frente um enorme balcão refrigerado ofereciaa mais variada quantidade de tortas doces que eu já vira em um restaurante.

GRAMADO E CANELA DE LAMBUJA

Café Colonialno Bela Vistaem Gramado

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Exagero egula juntosno mesmolugar

Neci se dizcansada edeita-se paraum cochilo nogramado doParque

Parque doLago Negroem Gramado

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142 GRAMADO E CANELA DE LAMBUJA

Passeio pelatrilha em volta

do Lago Negro

Gruta comimagens enascente

d’água noLago Negro

Mini MundoO sonho ea fantasia

de adultose crianças

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CAPÃO DA CANOA 143

Fomos todos nos servir, Neci foi a última e mereceu um comentário.—E se ela quiser pegar um pedaço na prateleira mais alta, não tem ninguémpara ajudá-la?Neci demonstrou ser perfeitamente capaz de se virar sozinha, se equilibrando naponta dos pés e com os braços totalmente esticados para cima, foi exatamente daúltima prateleira que habilmente retirou um pedaço de torta.Arrematando o delicioso café e para ajudar na digestão de tantos produtos, cadaqual pede um tipo de chá. Acostumado ao sabor do chimarrão, pela primeira vezconsigo tomar o meu, de maçã, sem usar açúcar.Saímos dali celebrando o pecado da gula, mais uma injustiça social num país detantos pecados. Mas o passeio ainda não terminara. Iríamos agora conhecer oLago Negro, até que enfim um parque com entrada franca.Formado por um enorme espelho d’água, de uma composição lodosa, o lago erarodeado por uma trilha plana de pedriscos bem compactados e ornamentadocom farta quantidade de hortênsias em ambos os lados.

Ao entrarmos no parque Neci se deitou no gramado viçoso dizendo:—Estou cansada, vou dormir um pouquinho.Pura onda. Foi logo fotografada e se levantou em seguida.Fizemos todo trajeto andando sem pressa e parando para fotografias de quandoem quando. Ao final do trajeto chegamos em uma mina d’água onde três ima-gens disputavam espaço numa pequena gruta.—Minha santinha, se eu perder essa barriga volto aqui ano que vem trazendouma vela do meu tamanho.—Nós ouvimos isso! disse Paulo rindo muito.

Eliane atirauma moedano Poço dosDesejos

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Do jeito que sou sedentário só mesmo no Photoshop ou na base do milagre pode-ria resolver meu problema.Pensei que voltaríamos para casa, mas Li sugere um novo passeio. Queria rever o minimundo, um parque temático com réplicas em miniatura de várias edificações mundiais.Eu já havia visto em fotos o tal parque e não me agradava em nada a forma comose apresentava. Embora as réplicas fossem bem feitas e guardassem boa propor-ção entre si, o resultado como um todo era catastrófico. Miniaturas de ferrovias,praias com banhistas e brinquedos de plástico dividiam o espaço tentando com-por um universo ficcional. Não sei dizer se é preconceito de minha parte, mastem certas coisas que não engulo com facilidade e uma delas é a do tipo queludibria o sentimento lúdico para oferecer soluções de gosto duvidoso. Pareceque a educação estética fugiu do nosso país.—Não é um encanto esse parque? pergunta-me Li entusiasmada.—Acho que deve agradar a muitas crianças, respondo sem muita cerimônia.—Crianças e adultos, contesta Li sem conhecer mais amiúde meu ponto de vista.

Não importava muito, na oportunidade adequada eu me explicaria.Retornamos a Porto Alegre. O transtorno com o joelho se repetiu, mas agora eusabia por quanto tempo eu teria de suportá-lo.Vitória clic-clic aguardava ansiosa por nosso retorno. No elevador do prédio Necirecomendou que não deixássemos a menina perceber que trazíamos chocolate.Enquanto tomavam banho, liguei o notebook para transferir o conteúdo das máquinas.Li planejara uma visita a sua prima Marli e ao sair do banho pediu que eu meapressasse. Respondi que embora estivesse agradecido de conhecer seus paren-tes, me encontrava cansado demais para ir a qualquer outro lugar naquele dia.

GRAMADO E CANELA DE LAMBUJA

Vitória clic-clicestá pronta parausar o mouse do

notebook

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Não tivesse meu joelho doído tanto naquele banco traseiro, eu teria ido commuito prazer.Aproveitei quando Vitória saiu para passear com eles e fui examinar meu chocolate.Tinham sido embalados em plástico bolha para evitar o calor, porém, os que nãotinham unidades embaladas individualmente fundiram-se todos num único bloco.—Paciência! Devem estar gostosos do mesmo jeito, pensei.Neci, que não tinha ido com eles, perguntou se eu aceitaria um prato da sopa.—Nossa, eu adorei aquela de ontem!—Pois é aquela mesmo, eu mantenho porções congeladas no freezer.Enquanto esquentava a sopa, aproveitei para tomar banho, vesti uma roupa maisconfortável e já estava terminando de tomar a sopa quando eles retornaram.Vitória ansiosa por mexer no PC não saía de perto, vendo que não lhe dávamosbola, aprontou um bico e correu para o colo da dinda com cara de choro.Percebendo a razão por que ela estaria chorando, me aproximei perguntando:—Quer que eu ponha um joguinho pra você brincar no computador?A manha cessou como por encanto. Levantou-se do colo e foi me puxando pelamão até o notebook.Liguei o jogo Pinball do Windows, em menos de cinco minutos ela já estavasabendo como jogar e até como reiniciar o jogo. Mostrei a ela como desligar oequipamento apenas baixando a tampa. O mais difícil foi Neci convencê-la dohorário de ir para cama, pois eu já tinha ido.

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XVIIIAdeus Porto Alegre

13h41 do dia 28/03/2007Sinto que poderia me alongar contando as histórias

e inserindo detalhes indefinidamente. Mas não me parecesensato fazê-lo, pois o primeiro objetivo desse trabalho

era passar as informações aos amigos

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ram cinco da manhã quando, já viciado pelo hábito, acordei procurando obotão da P10.

—Fotografias, aqui vamos nós.Neci sugerira que eu fotografasse a vista do entorno, subindo aos terraços dopavimento superior. Mostrou-me cada uma das varandas e disse que eu ficasse àvontade para subir, ainda que o sobrinho estivesse dormindo no sofá-cama dapequena saleta.Sem acender as luzes, para não causar incômodo, fui pé ante pé ao começo daescada. Descalço para não fazer ruído comecei a subir os degraus. Derepente...BAMMMM! Chutei sem querer o porta-treco que Vitória deixara no ter-ceiro degrau. A caixa foi ao chão provocando um forte barulho.Não havia o que fazer.Continuei subindo, tomando o cuidado de não esbarrar em mais nada que pudes-se despencar lá de cima.

A cama do jovem sobrinho tomava quase toda a extensão em frente da porta quedava acesso à varanda e, aos pés dela, uma cadeira empilhada de roupas termi-nava impedindo completamente a passagem.Decidi por tirar fotos da varanda lateral passando por um quarto tempora-riamente desocupado.Ao empurrar a porta provoquei um novo barulho, pois a dita cuja estava meioemperrada enroscando no batente. Saí rapidamente pela porta da varanda eenquanto ajustava a máquina para as primeiras fotos, ouvi alguém indo ao ba-

EEEE

Mal o solcomeça anascer e eu járegistro seusprimeirossinais

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nheiro do andar em que eu me encontrava. Provavelmente acordara o sobrinhoque voltou em seguida para a cama.De onde eu estava não tinha visão do sol nascente. Pensei em voltar para oquarto onde tinha dormido, pois de lá teria a visão desejada. Saí da varandavoltando pelo quarto e deparei com a porta deste fechada novamente. Sabia queao tentar abri-la provocaria um novo barulho.—Bem, lá vai! E...VRUMMM!!!!O jovem se sentou assustado olhando para mim.—Bom dia! Desculpe por ter te acordado, a Neci pediu que eu tirasse fotos donascer do sol aí da varada. Eu não queria te incomodar, mas já que você acor-dou, será que eu posso passar por aqui?E afastando a cadeira com roupas cheguei enfim ao lugar que queria.Tirei várias fotos e ao entrar o rapaz dormia profundamente.Passei pelos pés da cama tomando cuidado para não incomodá-lo mais.

O almoço desse dia seria na casa da irmã de Li. Não vou me alongar entrandoem detalhes desnecessários.Karina, a irmã querida, era vizinha das tias Lina e Edena. Recebeu-nos calorosa-mente e tratou de fazer perceber logo que não era pessoa de cerimônias. Enquan-to entrávamos na casa, lembro-me de Li dizendo:—Hoje viemos filar bóia na sua casa.—É só você me ajudar com a comida, respondeu Karina.De repente sinto minhas pernas serem abraçadas. Olho para baixo e um toquinhode gente, para quem eu mal dera atenção, estava me dando boas vindas.

ADEUS PORTO ALEGRE

As luzes dacidade se apagam

a medida que océu se ilumina

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Logo océu pareceincendiar, detão intensa asua cor

A pequenaBruna e umsorriso maroto

Li e Karinapreparandoo almoço

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152 ADEUS PORTO ALEGRE

Depois doalmoço a

soneca erasagrada

Amanhece emPorto Alegre, dia

de voltar paracasa em Bauru

No aeroporto,meu carrinho é

devidamenteembalado em

plástico

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Agachei-me sensibilizado com o gesto amistoso da pequena Bruna e correspondiao cumprimento da forma correta que deveria ter feito a principio.Mais tarde ouço as duas se falando na cozinha:—Quem acreditaria que nos damos tão bem a ponto de fazermos o almoçojuntas. Quando éramos mais novas brigávamos como cães e gatos.Enquanto preparavam o almoço atribuíram algumas tarefas a Paulo, quecorrespondeu resignado.Estendeu a roupa no varal, arrumou a mesa do almoço...Logo após o almoço, Li e Karina foram levar Bruna à escola maternal, pois elahavia perdido o horário da condução.O calor era muito forte e acabamos todos tirando um gostoso cochilo sob a brisado ventilador.Li havia se comprometido com Neci a devolver o carro até as cinco horas, masKarina e a tia Edena queriam comprar lembranças para suas duas filhas queficaram em Bauru. Foram conosco até o Carrefour e com Li orientando sobre

gostos e tamanhos, compraram tudo rapidamente. Despedimo-nos ali mesmo noestacionamento. Chegamos no prédio exatamente no horário combinado.Abrimos a porta do elevador e deparamos com Neci que já estava de saída comalguém que lhe oferecera carona. Mais tarde saíram os três para comprar algunspotes de nata, um creme de leite pasteurizado, com a consistência da nossamargarina, sem sal e que só se encontra por lá. De sabor suave é excelente paraacompanhar cucas e roscas. Pedi a Li que comprasse três potes para mim. Eramais um volume que se somava aos outros no caminho de volta.Voltaram do supermercado trazendo os potes e outras coisas que não reparei.

Mais umavez o aviãonos aguardano portão deembarque

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—Vamos ao banco retirar dinheiro? perguntei a Paulo, pois já eram 21h30 edepois das 22 horas o caixa eletrônico não funciona.Vitória, que já não desgrudava, percebendo que não iria, abriu um berreiro. Dacalçada se podia ouvir seus gritos no oitavo andar.Aos quinze minutos do horário de encerramento a porta automática já não nosdeu acesso.Ao voltarmos do banco de mãos abanando, a sopinha de tudo nos aguardavapela terceira vez.Acordamos bem cedo para o vôo que seria às oito horas.Pela manhã não tivemos problemas para sacar o dinheiro necessário para pagaros pedágios até Bauru.A bagagem não cabia toda no porta-malas do Polo, então uma das malas foicolocada no meio do banco traseiro.Escondida atrás da mala, só se podia ouvir a voz de Neci orientando Li sobre ocaminho a tomar até o aeroporto.

Desta vez eu estava preparado para filmar a decolagem e a aterrissagem. O vôotranqüilo e rápido só me emocionou mais fortemente quando, antes da aterrissa-gem, ficamos esperando uma vaga e sobrevoando a cidade de Santos.A praia da minha infância estava ali, ao alcance dos meus olhos, tão próxima daminha realidade e, no entanto tão distante no tempo.Ao aterrissarmos em São Paulo, um sentimento nostálgico ainda me acompanhava.O avião começou a taxiar quando ouço a aeromoça anunciar. O chocolate seencontra na parte dianteira da aeronave. Vou pedindo passagem para não meseparar dos amigos no desembarque e enfrentando caras feias pelo corredor. O

ADEUS PORTO ALEGRE

SobrevoamosSantos por trêsvezes antes de

pousar

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comandante anuncia que a saída poderia ser feita também pelas portas traseirasda aeronave e o grupo “rosnante” pelo qual eu passara se volta saindo por trás.—Cadê o meu?—O seu o quê, senhor?—O meu chocolate, vocês não ofereceram chocolates de brinde?Pedindo desculpas pelo mal entendido, ela explica que o chocolate pertencia aalguém que houvera perdido ao entrar no avião.Paulo e Li que me seguiam de perto saíram às gargalhadas debochando do meu mico.E aqui termino a redação desse relatório, esperando que você tenha gostadotanto quanto eu ao escrevê-lo.

18h10 do dia 28 de março de 2007

.

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auru, 29 de junho de 2007Fazer este livro foi uma aventura à parte. Eu não imaginava que tivesse

disposição para fazê-lo de forma tão profissional e disciplinada. Ao convidarmeus amigos diletos, Betina e Valero, para participarem comigo dessa empreita-da, sabia que não poderia deixar por menos. Afinal e sobretudo por serem meusamigos, não poderia jamais faltar-lhes com devido respeito profissional.A participação deles, fazendo a revisão do texto e o projeto gráfico, resultou emalgo que me deixou extremamente feliz e orgulhoso. Embora soubesse que meutexto era muito pessoal e sem grande valor literário, senti que ele cresceu e ga-nhou um significado especial. Virou um livro de verdade.Não quero aqui expressar meu agradecimento apenas a estes dois, que evidente-mente foram especiais, mas gostaria de agradecer também a todos que direta ouindiretamente contribuíram para que esse projeto se tornasse possível. Aos meusamigos Paulo e Eliane que tão gentilmente partilharam suas férias comigo, metratando como a um irmão e permitindo que eu fizesse uso de suas fotos, suashistórias pessoais, enfim, a intimidade de suas vidas particulares.

BB

Pós Texto

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Aos parentes e amigos do Rio Grande do Sul, que nos acolheram com um carinhoe consideração dignos de elogios. Foi um grande prazer conhecê-los e esperoque eles não se sintam ofendidos com os comentários ou uso de suas imagens.Espero que cada pessoa, a quem foi dada uma cópia dessa edição limitada,possa entender o que ela significa para mim em termos de realização pessoal. Écom um enorme prazer que eu compartilho com todos vocês os momentos diverti-dos dessa aventura que resolvi registrar e perpetuar para sempre.

Fábio Simões Grossi

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Identifique o autor pela inicial

E - Eliane Ap. do Canto MonteiroF - Fábio Simões GrossiP - Paulo Roberto Pires Maciel

pág . . . . . . . . . autor07 . . . . . . . . . . . . . P09 . . . . . . . . . . . . . P10 . . . . . . . . . . . . . F13 . . . . . . . . . . . . . P17 . . . . . . . . . P/E/P19 . . . . . . . . . . . . . E21 . . . . . . . . . . . . . P22 . . . . . . . . . . . . . P23 . . . . . . . . . . . . . F25 . . . . . . . . . . . . . P27 . . . . . . . . . . . . . P29 . . . . . . . . . . . . . F31 . . . . . . . . . . . . . F32 . . . . . . . . . . . . . P33 . . . . . . . . . . . . . F34 . . . . . . . . . . . . . P35 . . . . . . . . . F/E/F36 . . . . . . . . . E/E/F37 . . . . . . . . . . . . . P39 . . . . . . . . . . . . . P41 . . . . . . . . . . . . . F42 . . . . . . . . . . . . . P43 . . . . . . . . . . . . . P44 . . . . . . . . . . . . . p45 . . . . . . . . . . . . . F47 . . . . . . . . . . . . . E48 . . . . . . . . . . . . . F49 . . . . . . . . . . . . . F50 . . . . . . . . . . . . . F51 . . . . . . . . . . . . . F53 . . . . . . . . . . . . . P54 . . . . . . . . . . . . . F55 . . . . . . . . . . . . . P57 . . . . . . . . . . . . . E59 . . . . . . . . . . . . . F

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Índice Fotográfico por Ordem de Apresentação

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Este livro, com 160 páginas, de autoria de Fábio Simões Grossi, foi escrito emmarço de 2007. O texto foi revisado por Besma Massad (Betina) em maio domesmo ano. Seu projeto gráfico foi totalmente criado por José Luiz Valero Figueiredo,inclusive o projeto da capa.O texto foi composto em Futura Book, corpo 9, fonte desenhada por Paul Renner,entre os anos de 1927 e 1928. Os títulos de abertura de capítulos foram compos-tos em Bauer Bodoni, corpo 29, fonte criada em 1926 pelo tipógrafo HeinrichJost (1889-1949), para a Bauer. As legendas foram compostas em Bodoni BK BT,corpo 8, criada em 1790 por Morris Fuller Benton e Giambattista Bodoni.Os papéis usados foram: no miolo o Couché Lumimax, 115g/m² da Votorantim e nacapa o Triplex Art Premium, 250g/m² da Ripasa.A impressão digital do miolo foi realizada em Julho de 2007, em uma DocuColor250 da Xerox, na Gráfica e Editora sena. A impressão e o acabamento dacapa, com lombada costurada e capa colada, foram realizados pela gráficaAvalon,Bauru,SP.

Obs. Este livro só poderá ser publicado comercialmente com a autorizaçãode todas as pessoas mensionadas ou identificadas por imagem fotográfica.

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