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AUTONOMIA DAS EMPRESAS
BRASILEIRAS NA FORMAÇÃO DO
CAPITAL CIRCULANTE LÍQUIDO - UM
ESTUDO EXPLORATÓRIO NO SETOR
DE BENS INDUSTRIAIS
ADAIL MARCOS LIMA DA SILVA (UFCG )
Mesmo sendo possível recrudescer o saldo do capital circulante
líquido com recursos próprios e de terceiros, o endividamento não
circulante deve ser evitado em virtude de a despesa financeira
prejudicar a geração de autofinanciamento. Sendoo assim, quanto
mais autônomo o processo de formação do capital circulante líquido,
menor o risco associado à perda progressiva de liquidez - provocada
por baixas taxas de geração de autofinanciamento. Este trabalho teve
como objetivo investigar a história recente das empresas brasileiras do
setor de Bens Industriais quanto ao grau de autonomia praticado em
face da necessidade de formação do capital circulante líquido. Sobre o
conjunto de dados empregados no processamento dos resultados:
amostras para ativo circulante, passivo circulante, ativo total, dívida
bruta, patrimônio líquido, liquidez corrente e capital circulante
líquido. Quanto ao conjunto de métodos estatísticos utilizados para a
obtenção dos resultados: estatística não paramétrica, com as
aplicações do teste Wilcoxon (amostra única), do teste Mann-Whitney-
Wilcoxon (amostras independentes), da correlação por postos de
Spearman e da regressão monotônica. Os resultados indicam um
período recente marcado pela predominância de saldos positivos ao
capital circulante líquido; superioridade do capital próprio nas
estruturas de financiamento das empresas; maior sensibilidade do
capital circulante líquido em relação ao capital próprio; inexistência
de associação entre capital circulante líquido e dívida bruta. A união
dos resultados mencionados ratificam às empresas do setor de Bens
Industriais a prática majoritária de manter o processo de formação do
capital circulante líquido de modo autônomo, sendo uma característica
relevante à prevenção de configurações financeiras desfavoráveis em
períodos de crise econômica.
Palavras-chave: Capital circulante líquido, formação autônoma, Bens
Indsutriais.
XXXVI ENCONTRO NACIONAL DE ENGENHARIA DE PRODUCÃO Contribuições da Engenharia de Produção para Melhores Práticas de Gestão e Modernização do Brasil
João Pessoa/PB, Brasil, de 03 a 06 de outubro de 2016.
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1. Introdução
Independentemente do tipo de análise empregada na investigação da situação financeira das
empresas segundo um horizonte de curto prazo, podendo a perspectiva da abordagem ser
estática ou dinâmica, o capital circulante líquido participa como variável explicativa para
diversas as configurações, quer sejam classificadas como favoráveis ou desfavoráveis –
configurações financeiras de curto prazo desfavoráveis, por exemplo, são majoritariamente
justificadas pela escassez de capital circulante líquido (BRASIL; BRASIL, 2002;
CAMARGOS; CAMARGOS; LEÃO, 2014; FLEURIET; KEHDY; BLANC, 2003; NEIVA,
2008; STARKE JUNIOR, 2008; SILVA et al., 2012; ZANOLLA et al., 2014).
Representando a parcela do ativo circulante financiada por fontes de longo prazo, o capital
circulante líquido pode ser fomentado com recursos próprios e de terceiros. Especificamente
em relação ao endividamento não circulante, deve seu emprego ser evitado devido à despesa
remuneratória intrínseca (juros) prejudicar a geração de autofinanciamento, mais indicado ao
financiamento da necessidade de investimento em giro (FLEURIET; KEHDY; BLANC,
2003). Sendo assim, quanto mais autônoma a formação do capital circulante líquido, menor o
risco decorrente da perda progressiva de liquidez a longo prazo.
Em períodos marcados pela vigência de crises econômicas, as empresas passam a enfrentar
dificuldades severas quanto à capacidade de gerar autofinanciamento, comprometendo
significativamente a adoção de uma política autônoma quanto à formação do capital
circulante líquido. Uma saída para enfrentar a escassez de autofinanciamento encontra-se na
adoção de estratégias direcionadas à adequação da capacidade instalada à nova realidade,
caracterizada pelo arrefecimento da demanda.
Com base no exposto, surge a seguinte questão de pesquisa: considerando o cenário
atualmente enfrentado pela economia brasileira, marcado por forte desaceleração, com o
produto interno bruto atingindo níveis inclusive negativos, como pode ser descrita a história
recente do setor de Bens Industriais quanto ao grau de autonomia implementado na formação
do capital circulante líquido?
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Destarte, este trabalho teve como objetivo investigar a história recente das empresas
brasileiras do setor de Bens Industriais quanto ao grau de autonomia praticado em face da
necessidade de formação do capital circulante líquido.
Os dados utilizados no desenvolvimento deste trabalho foram coletados exclusivamente do
site www.comdinheiro.com.br. Em relação ao tratamento quantitativo empregado: estatística
não paramétrica, com as aplicações do teste Wilcoxon (amostra única), do teste Mann-
Whitney-Wilcoxon (amostras independentes), da correlação por postos de Spearman e da
regressão monotônica.
2. Fundamentação Teórica
2.1 A Situação financeira das empresas e o capital circulante líquido
Independentemente da abordagem empregada na análise de liquidez, se estática ou dinâmica,
de forma predominante a participação do capital oriundo das fontes de longo prazo no
financiamento do ativo circulante (AC) deve ser tida como indispensável à manutenção da
folga financeira das empresas (BRASIL; BRASIL, 2002; FLEURIET; KEHDY; BLANC,
2003; CAMARGOS; CAMARGOS; LEÃO, 2014; NEIVA, 2008; STARKE JUNIOR, 2008;
SILVA et al., 2012; ZANOLLA et al., 2014).
O saldo dos recursos originários das fontes de longo prazo e alocados no AC recebe a
denominação de capital circulante líquido (CCL), podendo ser calculado com a Fórmula 01,
diferença entre AC e passivo circulante (PC), sua versão de cálculo elementar (ASSAF
NETO, 2015; FLORIANI; LAY; SILVA, 2015; LUSTROSA, 1997; MATARAZZO, 2010;
SILVA, 2013; SILVEIRA; ZANOLLA; MACHADO, 2015).
A tradicional análise de liquidez explica como a relação complementar entre as fontes de
curto e de longo prazos, no sustendo do AC, responsabiliza-se pelo tipo de configuração
identificada, se com ou sem alguma folga financeira – a partir da Fórmula 02, resultado do
isolamento do AC na Fórmula 01, tem-se como melhor compreender a referida relação
(ASSAF NETO, 2015; ASSAF NETO; SILVA, 2012; MATARAZZO, 2010).
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Quanto mais o CCL participar da composição do AC, mais intensa a folga financeira, isso de
acordo com a perspectiva estática de análise, amparada na quantidade residual de AC em face
da hipótese de ser exigida a liquidação integral do PC – abordagem do tipo falimentar, com
ênfase na solvência (BRASIL; BRASIL, 2002).
O índice de liquidez corrente (LC), por exemplo, confronta, a partir de um quociente, os
saldos do AC (numerador) e do PC (denominador), como mostra a Fórmula 03; trata-se da
iniciativa de averiguar a quantidade monetária existente de AC para fazer frente a cada
unidade monetária exigida pelo PC, no caso de a empresa avaliada ter encerrada suas
atividades fins exatamente no instante correspondente à apuração dos saldos do AC e do PC
(BRASIL; BRASIL, 2002; FLEURIET; KEHDY; BLANC, 2003; MATARAZZO, 2010).
A partir da Fórmula 04, resultado da substituição na Fórmula 03 do AC pela soma indicada na
Fórmula 02, percebe-se, em relação à abordagem estática de análise, como o CCL exerce
ingerência sobre o conceito de folga financeira (LUSTROSA, 1997; MATARAZZO, 2010;
SILVA, 2013). Primeiramente, tem-se a exigência de qualquer saldo positivo ao CCL para
LC > 1,00; o intervalo 1,00 < LC < 1,50 encontra justificativa em 0,00 < CCL < PC/2; para
1,50 ≤ LC < 2,00, necessariamente deve ocorrer PC/2 ≤ CCL < PC; finalmente, faz-se
indispensável CCL ≥ PC para justificar LC ≥ 2,00.
Assim como o LC, outros indicadores da análise de liquidez estática também podem ter suas
respostas justificadas a partir do volume assumido pelo saldo do CCL. Todavia, para este
trabalho, as explicações acerca dos valores obtidos ao LC são suficientes, dada a intenção de
esclarecer a dependência da capacidade de pagamento de curto prazo em relação ao saldo do
CCL (MATARAZZO, 2010; SILVA, 2013).
A transição do modelo estático para o dinâmico de análise de liquidez requer compreensão da
diferença entre ambos, em poucas palavras explicada, com grande precisão, por Brasil e
Brasil (2002, p. 4) da seguinte maneira: “é melhor ter um cliente vivo do que o seu espólio, de
valor sempre problemático”. Brasil e Brasil (2002, p. 2) ainda sugerem um pergunta como
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forma de esclarecer a abordagem dinâmica: “Como pode a empresa continuar a saldar seus
compromissos, mantendo-se em funcionamento?”
Tal qual como ocorre na perspectiva estática, na análise de liquidez dinâmica a folga
financeira também depende do saldo do CCL; enquanto a primeira confronta os saldos do
CCL e do PC, de modo a conseguir aferir a capacidade de liquidação do endividamento de
curto prazo em caso de falência, a segunda compara o CCL com a necessidade de
investimento em giro (NIG), devido à preocupação de saber se após o financiamento de suas
atividades fins uma empresa conseguirá manter algum saldo residual das fontes de longo para
garantir alguma folga de liquidez (CAMARGOS; CAMARGOS; LEÃO, 2014; SILVA et al.,
2012; SILVA, 2013; VIEIRA, 2008).
A Fórmula 05 facilita a compreensão dos objetivos do CCL (FLEURIET; KEHDY; BLANC,
2003): deve financiar a NIG, providenciando o cumprimento normal do conjunto das
atividades fins; e, ainda, proporcionar margem de segurança financeira, monetariamente
representada pelo saldo de tesouraria (T). A união entre o financiamento integral da NIG e a
formação de saldos positivos adequados ao T, exatamente a dupla função do CCL, torna a
contratação do crédito oneroso de curto prazo efetivamente errática, sem interferência
permanente sobre o funcionamento do ciclo operacional.
Tratado por Fleuriet, Kehdy e Blanc (2003) como margem de segurança financeira e por
Camargos, Camargos e Leão (2014) como folga de liquidez, o T efetivamente representa a
folga financeira em contexto dinâmico.
Quando, por diversos motivos, o saldo do CCL apresentar-se inferior à exigência mínima
oriunda da extensão do ciclo financeiro, precisamente a NIG, tem-se configurada uma
situação prejudicial, apresentando as seguintes características (BRASIL; BRASIL, 2002;
CAMARGOS; CAMARGOS; LEÃO, 2014; FLEURIET; KEHDY; BLANC, 2003; NEIVA,
2008; STARKE JUNIOR, 2008; SILVA, 2013; VIEIRA, 2008): aperto financeiro,
confirmado com o valor negativo do T; dependência do crédito oneroso de curto prazo para
atender a NIG – emprego permanente do crédito oneroso de curto prazo na viabilização das
atividades fins desencadeia a configuração financeira conhecida como efeito tesoura.
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Como dito no início, o saldo do CCL deriva do quanto do saldo do capital oriundo das fontes
de longo prazo é destinado ao financiamento do AC. Quanto à ingerência do endividamento
de longo prazo na administração do saldo do CCL Fleuriet, Kehdy e Blanc (2003, p. 43)
trazem a seguinte orientação: “De modo geral, o aumento do endividamento a longo e médio
prazos não é adequada para melhorar o capital de giro de forma sustentável”. A principal
justificativa também é esclarecida por Fleuriet, Kehdy e Blanc (2003, p. 45): “As despesas
financeiras reduzem o autofinanciamento e, por consequência, a taxa de autofinanciamento”.
A mesma compreensão cabe ao aporte de capital próprio, pois o pagamento de dividendos
também compromete a geração de mais autofinanciamento (FLEURIET; KEHDY; BLANC,
2003).
Ainda, Fleuriet, Kehdy e Blanc (2003, p. 42) explicam como deve ser evitado o efeito tesoura:
“O autofinanciamento da empresa deve ser suficiente para financiar, pelo menos, os aumentos
de sua necessidade de capital de giro (NCG)”.
3 Aspectos Metodológicos
Três investigações-chave foram determinantes ao alcance satisfatório do objetivo geral desta
pesquisa, todas contextualizadas em âmbito setorial: a primeira diz respeito à investigação da
participação das fontes de longo prazo no AC, em virtude da necessidade de saber se as
empresas do setor mantiveram ou não, predominantemente, saldos positivos ao CCL; a
segunda averigua as proporções assumidas pelas fontes de longo prazo na estrutura de capital,
dada a utilidade da informação quanto à ocorrência de participações equivalentes ou não para
PL e dívida bruta (DB); a terceira defende a análise detalhada e isolada das relações do CCL
(variável dependente) com PL (variável independente) e DB (variável independente), pois os
níveis de sensibilidade podem ser tidos como reflexos do modo como as empresas
conduziram o processo de formação do CCL, se com ou sem ingerência significativa da DB.
Cada investigação-chave mencionada representa um tópico da seção correspondente à
apresentação e análise dos resultados. Enfim, reunir informações sobre o saldo
predominantemente mantido ao CCL, as proporções das fontes de longo prazo na estrutura de
capital e os graus de sensibilidade do CCL em face das fontes de longo prazo, torna viável a
análise da autonomia com a qual as empresas brasileiras do setor de Bens Industriais
mantiveram saldos positivos ao CCL.
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Todos os dados empregados na viabilização deste trabalho são originários do site
www.comdinheiro.com.br; levando-se em conta os saldos trimestrais ocorridos no período de
31/03/2008 até 30/06/2015, portanto um histórico de 30 trimestres, foram levantadas cinco
amostras para cada empresa, vinculadas ao LC e aos saldos do ativo total (AT), do CCL, do
PL e da DB; das 34 empresas listadas na BM&FBOVESPA como pertencentes ao setor de
Bens Industriais, duas foram excluídas do processamento dos dados por não apresentarem
históricos suficientes à formação de uma ou mais amostras.
Para a primeira investigação-chave, buscou-se inferir se as empresas do setor de Bens
Industriais mantiveram, de forma predominante, o LC acima de 1,00, sendo o bastante ao
levantamento de conclusões acerca da manutenção de saldos positivos ao CCL; os 32
históricos reunidos (26 com 30 trimestres, dois com 29 e mais quatro com 28, 27, 26 e 22)
subsidiaram, para o LC, a consolidação de uma amostra composta de 941 valores distintos; a
partir do teste de Wilcoxon Amostra Única, aplicado segundo um nível de significância de
0,05, averiguou-se se as empresas do setor de Bens Industriais majoritariamente conseguiram
manter saldos positivos ao CCL – foram definidas H0: LC ≤ 1,00 (predominantemente as
empresas mantiveram saldos ao CCL menores ou iguais a zero) e H1: LC > 1,00
(predominantemente as empresas mantiveram saldos positivos ao CCL).
As investigações-chave segunda e terceira contaram com a participação de 24 empresas,
selecionadas com base nos seguintes critérios: exclusão dos trimestres com PL < 0,00;
exclusão dos trimestres com LC ≤ 1,00; finalmente, após a consideração conjunta dos dois
critérios iniciais, exclusão das empresas com menos de dez trimestres. Ainda, as inferências
realizadas utilizaram amostras para os indicadores DB/AT (participação da dívida no
financiamento dos ativos), PL/AT (participação do capital próprios no financiamento dos
ativos) e CCL/AT (valor relativo do CCL em relação ao total dos ativos); cada amostra
composta de 24 observações de médias trimestrais calculadas para as empresas – 24 valores
médios para DB/AT, PL/AT e CCL/AT.
Fazendo uso das amostras DB/AT e PL/AT, com o teste Mann-Whitney-Wilcoxon, aplicado
segundo um nível de significância de 0,05, a segunda investigação-chave buscou inferir sobre
como as empresas do setor de Bens Industriais utilizaram as fontes de longo prazo durante os
trimestres; foram definidas H0: DB/AT ≥ PL/AT (as empresas mantiveram saldos para o
endividamento não circulante maiores ou iguais aos saldos do capital próprio) e H1: DB/AT <
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PL/AT (as empresas mantiveram saldos para o endividamento não circulante inferiores aos
saldos do capital próprio).
Especificamente para a terceira investigação-chave: as amostras foram organizadas em dois
grupos de pares ordenados; 24 pares ordenados para CCL/AT (variável explicada) e PL/AT
(variável explicativa); 24 pares ordenados para CCL/AT (variável explicada) e DB/AT
(variável explicativa); para aferir o nível de associação entre as variáveis, em ambos os
grupos, aplicou-se o teste de correlação por postos de Spearman, segundo um nível de
significância de 0,05, com H0: rCCL/AT, PL/AT = 0,00 (inexistência de correlação significativa
entre CCL e PL) e H1: rCCL/AT, PL/AT ≠ 0,00 (existência de correlação significativa entre CCL
e PL), assim como H0: rCCL/AT, DB/AT = 0,00 (inexistência de correlação significativa entre
CCL e DB) e H1: rCCL/AT, DB/AT ≠ 0,00 (existência de correlação significativa entre CCL e
DB); para aferir o nível de sensibilidade, em ambos os grupos, aplicou-se o modelo de
regressão monotônica – regressão não paramétrica.
Como pode ser constato, os resultados deste trabalho foram construídos exclusivamente com
estatística não paramétrica; modelos de planilhas eletrônicas do Microsoft Excel foram
especificamente formulados para executar todos os procedimentos mencionados; os
ensinamentos prestados por Becker (2015) e Sheskin (2004) orientaram a construção do
referido conjunto de modelos de planilhas.
4 Apresentação e análise dos resultados
4.1 Saldo do CCL
Enfatizando a performance do setor quanto à capacidade de manter saldo positivo ao CCL, a
Figura 1 resume os resultados gerados com a aplicação do teste de Wilcoxon sobre a amostra
do LC, composta de 941 observações: estima-se em aproximadamente 31% (294 elementos) a
frequência de valores ao LC abaixo de 1,00, todos ocasionados por saldos negativos do CCL,
configuração conhecida como PC a descoberto; o complemento da amostra ratifica a maior
incidência de circunstâncias marcadas por CCL com saldo positivo, pois a frequência de
respostas acima de 1,00 ao LC gira próximo de 69% (647 observações); em decorrência do
modo como se encontra composta a amostra, rejeita-se ; a estatística de teste,
de 15,31, situa-se intensamente à direita da referência crítica, , estimada em 1,645;
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portanto, os valores do LC abaixo de 1,00, ocorridos no período, não impedem de considerar
o setor de Bens Industriais como capaz de manter, majoritariamente, saldos positivos ao
CCL.
Portanto, com base no tratamento estatístico contemplado na construção desta seção, percebe-
se ao setor de Bens Industriais desempenho favorável, precisamente no tocante à condução,
por parte de suas empresas, do saldo do CCL em níveis positivos – não faz parte do escopo
desta pesquisa saber se os valores dos CCL garantiram, simultaneamente, o sustento da
necessidade de investimento em giro e a manutenção de alguma folga financeira, tendo sido o
bastante averiguar somente se no setor as empresas foram capazes de utilizar,
predominantemente, fontes de longo prazo na viabilização dos investimentos de curto prazo.
4.2 Utilização das fontes de longo prazo na estrutura de capital
Contendo o resultado da confrontação entre as amostras dos indicadores DB/AT e PL/AT
com o teste de Mann-Whitney-Wilcoxon, aplicado segundo o nível de significância de 0,05, a
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Figura 2 subsidia a análise a seguir: o conjunto das 24 empresas selecionadas, cada uma
contribuindo com um par ordenado de valores médios históricos para DB/AT e PL/AT,
mantiveram em sutil superioridade o capital próprio em suas estruturas de capital; do total de
24 pares ordenados, em 14 (58,33%) verifica-se DB/AT < PL/AT; a estatística de teste, de -
1,71, abaixo do valor crítico, de -1,645, ratifica rejeição para H0: DB/AT ≥ PL/AT.
Até o presente momento, para o período de 31/03/2008 até 30/06/2015, tem-se o setor de
Bens Industriais como sendo constituído de empresas capazes de combinar, majoritariamente,
saldo positivo ao CCL e maior participação do capital próprio na estrutura de capital. Tal
arranjo representa um indício favorável à adoção de algum nível de autonomia quanto à
formação do CCL, a ser investigado com maior precisão no tópico a seguir.
4.2 Sensibilidade do CCL em face das fontes de longo prazo
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As Figuras 3 e 4 apresentam os resultados alcançados com o mesmo tratamento estatístico,
combinação entre o teste de correlação por postos de Spearman e a regressão monotônica,
mas respectivamente vinculadas às relações do CCL com a DB e o PL.
Precisamente quanto ao conteúdo da Figura 3, voltado à análise da relação do CCL em face
da DB: os 24 pares ordenados envolvendo DB/AT (variável explicativa) e CCL/AT (variável
explicada) evidenciam ausência de correlação entre CCL e DB, pois o coeficiente de
correlação de Spearman, praticamente nulo ( ), gerou uma estatística de
teste ( ) dentro do intervalo crítico da interpretação bicaudal para , por
isso não há como rejeitar ; na parte superior da Figura 3 consta uma
ilustração com a plotagem do melhor ajuste providenciado com a regressão monotônica, onde
foram necessárias 19 iterações com o algoritmo de blocos, resultando em e
fornecendo subsídios suficientes à compreensão da correlação nula; sendo assim, numa
perspectiva macro, e não isoladamente por empresa, o CCL no contexto do setor de Bens
Industriais se manteve sem associação significativa com a DB.
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Sobre a Figura 4, direcionada à análise do grau de sensibilidade do CCL em face do PL: os
24 pares ordenados envolvendo PL/AT (variável explicativa) e CCL/AT (variável explicada)
demonstram haver correlação entre CCL e PL, pois o coeficiente de correlação de Spearman,
apesar de moderado ( ), gerou uma estatística de teste ( ) fora
do intervalo crítico da interpretação bicaudal para , por isso rejeita-se
; o melhor ajuste obtido com a regressão monotônica, onde percebe-
se uma relação mantida ao longo do tempo segundo uma função monotônica ascendente,
demonstra o porquê da correlação moderadamente positiva, tendo sido exigido um total de 16
iterações (quanto menor, maior a sensibilidade) com o algoritmo de blocos, resultando em
(quanto menor, maior a sensibilidade); destarte, mais uma vez numa
perspectiva macro, e não isoladamente por empresa, o CCL no setor de Bens Industriais
mostrou-se significativamente sensível ao PL – diretamente proporcional.
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Finalmente, o teste de Spearman e a regressão monotônica proporcionam a seguinte
descoberta: durante os 30 trimestres analisados, do primeiro de 2008 ao segundo de 2015,
portanto ao longo da história recente da economia brasileira, o setor de Bens Industriais,
representado por 24 empresas selecionadas após a aplicação dos critérios detalhados na
metodologia, manteve a formação do CCL nitidamente influenciada por recursos próprios,
não tendo ocorrido relação significativa com o endividamento de longo prazo;
individualmente, algumas empresas podem ter mantido relação de maior sensibilidade com o
capital de terceiros, outras com relações equilibras entre capital próprio e capital de terceiros,
mas a grande maioria manteve maior sensibilidade em relação ao capital próprio, então a
situação do setor reflete a formação majoritária do CCL de modo autônomo.
5 Considerações finais
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De 31/03//2008 a 30/06/2015 as empresas brasileiras do setor de Bens Industriais conduziram
suas políticas de gestão financeira de curto prazo amparadas em dois pilares: manutenção da
capacidade de pagamento orientada à inibição da configuração conhecida como passivo
circulante a descoberto, pois a partir do teste de Wilcoxon rejeitou-se a hipótese de o índice de
liquidez corrente ser efetivamente menor ou igual ao patamar de 1,00; utilização majoritária
do capital próprio na formação do capital circulante líquido, exatamente como demonstrado
com o teste de Spearman e a regressão monotônica, revelando, portanto, destacado grau de
autonomia quanto ao uso das fontes de longo prazo no financiamento dos investimentos
circulantes.
Em virtude da intensidade da crise atualmente enfrentada pela economia do Brasil, o
consequente desaquecimento da atividade industrial traz severas pressões contrárias aos
pilares anteriormente mencionados pelo simples fato de existir maior propensão à conquista
de resultados líquidos negativos, quiçá em níveis apenas reduzidos ou estáveis, na melhor das
hipóteses; com o comprometimento do autofinaciamento necessário à continuidade da maior
influência do capital próprio sobre a formação do capital circulante líquido, possivelmente as
fontes externas passarão a exercer maior ingerência, e a depender da duração do período ruim
para a economia, a conversão do endividamento de longo prazo em curto prazo, bem como o
pagamento de juros, tende a gerar complicações preocupantes à manutenção da solvência em
condições satisfatórias.
Com base nas conclusões levantadas sobre a história recente das empresas do setor de Bens
Industriais quanto ao uso das fontes de longo prazo na formação do capital circulante líquido
e a crise econômica atualmente em vigor, torna-se de fundamental importância a realização de
novas pesquisas voltadas, principalmente, ao monitoramento da margem de lucratividade
líquida, pois quanto maiores seus percentuais, maior o potencial de gerar autofinanciamento,
consequentemente, maior a influência do capital próprio na formação do capital de giro.
Referências
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