Artigo Sobre Jogos

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Artigo extraído do site http://www.portaldosprofessores.ufscar.br/ bibliotecaDetalhe.jsp 26/08/09 OS JOGOS NO ENSINO DE MATEMÁTICA: POSSIBILIDADES DE DINAMIZAÇÃO DAS PRÁTICAS PEDAGÓGICAS Anelise Belão Pott Regina Maria S. Puccinelli Tancredi UFSCar Considerando que os processos educativos relacionados ao ensino de Matemática na educação básica têm sido motivos de preocupação por parte dos educadores, esse texto tem como objetivo apresentar algumas considerações sobre o uso de jogos como estratégia metodológica importante para a dinamização das aulas e para a aprendizagem dos alunos. Parte-se do princípio de que na escola, não é apenas o fato de participar de jogos que favorece a aprendizagem intencional dos alunos nos diferentes componentes curriculares, mas a interferência dos professores nesses momentos, através da proposição de jogos dirigidos para esse fim, a discussão das regras, o acompanhamento das jogadas e sua interferência, no sentido de questionamentos e de proposição de atividades complementares, quando “a partida” tiver sido concluída. O texto se apóia fortemente na

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1 A importncia do jogo no ensino de Matemtica

Artigo extrado do site

http://www.portaldosprofessores.ufscar.br/bibliotecaDetalhe.jsp26/08/09OS JOGOS NO ENSINO DE MATEMTICA: POSSIBILIDADES DE DINAMIZAO DAS PRTICAS PEDAGGICASAnelise Belo PottRegina Maria S. Puccinelli Tancredi

UFSCarConsiderando que os processos educativos relacionados ao ensino de Matemtica na educao bsica tm sido motivos de preocupao por parte dos educadores, esse texto tem como objetivo apresentar algumas consideraes sobre o uso de jogos como estratgia metodolgica importante para a dinamizao das aulas e para a aprendizagem dos alunos. Parte-se do princpio de que na escola, no apenas o fato de participar de jogos que favorece a aprendizagem intencional dos alunos nos diferentes componentes curriculares, mas a interferncia dos professores nesses momentos, atravs da proposio de jogos dirigidos para esse fim, a discusso das regras, o acompanhamento das jogadas e sua interferncia, no sentido de questionamentos e de proposio de atividades complementares, quando a partida tiver sido concluda. O texto se apia fortemente na abordagem construtivista, sob a tica de Piaget e seus seguidores.

1 A importncia do jogo no ensino de Matemtica

A brincadeira faz parte da vida, um meio de aprendizagem espontneo e exercita hbitos intelectuais, fsicos, sociais e/ou morais. O encantamento, fascnio e fantasia dos brinquedos e jogos acompanham o desenvolvimento da humanidade. O jogo um transmissor e dinamizador de costumes e condutas sociais. Pode ser um elemento essencial para preparar de maneira mais integral os jovens para a vida.Mesmo sabendo que os jogos fazem parte da vida, de acordo com Macedo, Petty e Passos (1997), a escola tem proposto exerccios sem sentido. Ela ensina - smbolos, linguagem, Matemtica - contedos com regras vazias e, portanto, sem valor. Alguns crem que a funo da escola instrumental, ou seja, os adultos mantm seus filhos na escola visando aos futuros cidados que estes devero ser, mas para a criana essa funo da escola muito abstrata e terica. Se esse conhecimento necessrio para a vida for tratado como um jogo, provavelmente vai ter mais significado para ela.

De acordo com Valenzuela (2005), a antropologia encarregou-se de mostrar que aspectos muito sofisticados do saber humano so adquiridos por meio de relaes mais ou menos ldicas e informais. Do mesmo modo, as novas pedagogias fomentam a atividade ldica como meio de educao, amadurecimento e aprendizagem. Mas a pedagogia tradicional rechaa o jogo por considerar que ele no tem carter formativo.

Ortiz (2005) complementa esta idia dizendo que o jogo no era bem visto pela pedagogia tradicional; a educao e o jogo no eram considerados bons aliados. Apesar disso, as crianas aprendem jogando, j que fazem da prpria vida um jogo constante. Felizmente, a posio da pedagogia atual converteu o princpio do jogo ao trabalho em mxima na didtica infantil. O jogo deve ser utilizado como meio formativo na infncia e na adolescncia. A atividade ldica um elemento metodolgico ideal para dotar as crianas de uma formao integral.

Alm disso, o professor Barco (1998) salienta que a escola ignora a individualidade, dando muito mais importncia ao currculo e levando assim os alunos a pensarem igualmente e no serem criativos. Cury (2003) diz que a educao clssica clama para que o aluno seja repetitivo, e que tambm ns hoje no produzimos idias surpreendentes, criaes maravilhosas porque o nosso pensamento est engessado. Todos estamos engessados, at mesmo o professor na sua forma de ensinar. De acordo com Ponte e Serrazina (2000), o professor que no tenta novos mtodos, novas atividades, cai em uma rotina, estagna, em vez de se desenvolver profissionalmente, causando assim um maior desinteresse por parte dos alunos e no proporcionando um ensino da qualidade esperada.

Podemos ento indagar: se a criana brinca tantas horas por dia sem aparente cansao, porque no educ-la aproveitando o jogo no como fim em si mesmo, mas como meio para a construo de suas aprendizagens? Nesse sentido, acreditamos que as dificuldades nas aprendizagens escolares tm sua origem na metodologia utilizada pelo educador, sempre to distante do que motiva o aluno.

Garfano e Caveda (2005) mostram como o professor deve atuar atualmente no ensino/aprendizagem:

... necessrio que o adulto/educador considere o seu papel de mediador entre o aluno e as novas aprendizagens, devendo preparar um ambiente que favorea a predisposio ativa da criana para a aprendizagem, proporcionando materiais potencialmente significativos para tanto e adaptando-os aos diferentes nveis de desenvolvimento, interesse e motivao e apresentando-os de forma adequada (p. 61).

Valenzuela (2005) complementa dizendo que nos jogos, o educador deve ser o animador, um professor flexvel, motivador, buscando desafiar e dialogar.

Mesmo conhecendo as excelncias do jogo como instrumento educativo de primeira ordem, na sociedade em que vivemos, na qual brincar e jogar se ope ao trabalho, esse instrumento acaba sendo deixado de lado pelo educador, ao consider-lo til apenas para o descanso do trabalho. Tal atitude fortalece a pouca aceitao e o reduzido reconhecimento do valor da brincadeira pela rigidez das aprendizagens escolares que outorgam pouco tempo ao jogar na escola (GARFANO e CAVEDA, 2005).

Ortiz (2005) destaca que as caractersticas do jogo fazem com que ele mesmo seja um veculo de aprendizagem e comunicao ideal para o desenvolvimento da personalidade e da inteligncia emocional da criana. Divertir-se enquanto aprende e envolver-se com a aprendizagem fazem com que a criana cresa, mude e participe ativamente do processo educativo.

Por isso, os jogos, como Almeida (2001) escreveu, despertam no aluno a vontade de aprender atravs dos desafios propostos. Kishimoto (2003) destaca que o jogo leva a criana ao mundo das idias e tambm desenvolve a sua ateno e a memria ativa. Alm disso, o jogo fundamental para o desenvolvimento do raciocnio, contribuindo muito para a aprendizagem, principalmente se houver a possibilidade de jog-lo com freqncia (MACEDO, PETTY e PASSOS, 1997). Assim, podemos perceber que o jogo deve ser considerado como um instrumento que impulsiona a aprendizagem, porque ajuda a criana a consolidar habilidades e destrezas. Nesse sentido, desempenha um papel muito positivo sobre o desenvolvimento psicolgico. Por isso, devemos fazer com que nossas crianas dediquem a essa atividade o maior tempo possvel, abandonando a idia de que a brincadeira incompatvel com a aprendizagem e destacando que o prazer, a diverso e o entretenimento derivados da atividade ldica tambm so incompatveis com a aquisio de novos conhecimentos e habilidades. (ORTIZ, 2005).Outra habilidade muito importante que criana tambm aprende observar o que est fazendo, criando assim, o hbito de refletir sobre a sua prpria ao. Segundo Macedo (1994), no jogo ela consegue, por si s, verificar a contradio, o conflito e a no-coerncia entre suas repostas. E algumas vezes ela encontra respostas provisrias para perguntas que no sabe ainda responder. Portanto, o jogo um instrumento muito til para tornar o erro um observvel (MACEDO, PETTY e PASSOS, 1997). Ele tambm um dos melhores recursos para o professor obter informao sobre os alunos e verificar se eles adquiriram as aprendizagens definidas pelos critrios de avaliao.Alm da funo educativa e avaliativa dos jogos, o professor pode trabalhar com os valores humanos inseridos nestes, suscitando discusses sobre a cidadania responsvel e comprometida com respeito diversidade cultural (ALMEIDA, 2001).

Podemos destacar outros objetivos dos jogos e Valenzuela (2005) aponta alguns, e destaco os de maior importncia:

Comunicar-se por meios de expresso verbal, corporal, visual, plstica, musical e matemtica, desenvolvendo o raciocnio lgico, verbal e matemtico.

Utilizar, na resoluo de problemas simples, os procedimentos oportunos para obter a informao pertinente e represent-la mediante cdigos, considerando as condies necessrias para sua resoluo.

Identificar e organizar questes e problemas a partir da experincia diria, utilizando recursos disponveis com a colaborao de outras pessoas.

Atuar com autonomia nas atividades habituais e nas relaes de grupo, desenvolvendo a iniciativa.

Colaborar no planejamento e na realizao de atividades em grupo, aceitar normas e regras democraticamente estabelecidas, articular seus pontos de vista com o do grupo, respeitando pontos de vista contrrios.

Almeida (1997) resume este tema da seguinte maneira:

O jogo (...) pode significar para a criana uma experincia fundamental, de entrar na intimidade do conhecimento, de construir respostas por meio de um trabalho que integre o ldico, o simblico e o operatrio. (...) pode significar para a criana que conhecer um jogo de investigao (p.142).Na Proposta Curricular paulista (1992) de Matemtica no so abordados, especificamente, os jogos como metodologia de ensino, mas deixa-se claro, no captulo Contedos e observaes de ordem metodolgica, que eles podem trazer um grande benefcio para os estudantes. Nela destacado o valor metodolgico que vrios materiais manipulativos tm. Entre os jogos/materiais indicados encontramos o Tangran, o Domin, o Geoplano, palitos, poliedros etc. Estes recursos so de suma importncia para que as crianas tenham uma melhor aprendizagem durante seus anos na escola.

Destaco a seguinte frase contida na Proposta Curricular para o ensino de Matemtica:

A introduo de smbolos numricos deve ser feita a partir de situaes que sejam significativas para a criana: registro do resultado de um jogo, da sua idade, do total de crianas de seu grupo, etc. Um jogo interessante o domin de smbolos e quantidades, onde cada smbolo dever ser justaposto quantidade correspondente... ( p.31).

Conclumos ento que os jogos so, de forma indiscutvel, uma maneira de dar significado ao contedo formal da sala de aula, devendo dessa forma, ser utilizado todas as vezes que for possvel e oportuno.

2 Tipos de jogos

Para caracterizar os tipos de jogos apoiamo-nos em Macedo, Petty e Passos (1997) e tambm em Fuentes (2005). Os trs primeiros autores dizem: importante que o profissional se preocupe com a adequao da atividade para no propor tarefas impossveis (p. 82).O professor deve considerar o grupo, a idade das crianas e a quantidade delas, o tempo disponvel e tambm se o jogo conhecido ou no. Tem que ter muito cuidado ao explicar a atividade, podendo propor jogar uma partida na lousa para que as regras fiquem claras para todos os alunos.

Abaixo esto os diversos tipos de jogos de que o professor pode lanar mo, considerando, anteriormente, tudo o que foi anteriormente destacado.

Os jogos podem ser estruturados basicamente em trs formas: de exerccio, simblicos ou de regra.

Jogos de exerccio

Os jogos de exerccio caracterizam-se pela repetio ou assimilao funcional. Esta repetio ocorre, pois a ao uma fonte de satisfao ou prazer. So aes que carecem de normas internas e se realizam pelo prazer que produz a ao em si mesma, sem que exista outro objetivo diferente do da prpria ao.

o que acontece com as crianas em seus primeiros anos de vida. Pela repetio de suas aes elas passam a criar hbitos, que, como analisado por Piaget (apud Macedo, Petty e Passos, 1997), so a principal forma de aprendizado no primeiro ano de vida e constituem a base para as futuras operaes mentais. Mesmo sendo o tipo de jogo predominante nos primeiros anos de vida, ele no desaparece depois dessa idade; diferentes formas desta atividade so detectadas na vida adulta, como andar de bicicleta, brincar com um lpis, ir a uma festa etc.Assim, podemos perguntar qual a importncia da repetio ou assimilao funcional na construo do conhecimento na escola?

Primeiramente, a repetio leva a uma regularidade fundamental para a vida escolar e pessoal. Fazer algo uma nica vez no tem sentido na escola, mas tambm fazer algo por mera repetio sem que haja um sentido ldico (prazer funcional), como vemos hoje na escola, tambm no tem valor algum. de suma importncia que a criana pense e trate o conhecimento como um jogo, produzindo conhecimento pelo simples fato de querer conhecer mais e no somente considerando-o de forma aplicada ou instrumental. De acordo com os autores, esquecer isso significa ter uma vida sem prazer, caracterizada s um fazer imposto externamente ao sujeito e, por isso, sem sentido para ele (p.131). Jogos simblicos

No processo do desenvolvimento da criana este tipo de jogo vem depois dos jogos de repetio. Eles caracterizam-se por seu valor analgico, isto , a criana repete em aes diversas aquilo que ela j conhece. Os significados que a criana atribui s suas aes so deformaes dos significados correspondentes da vida social ou fsica. Por isso vemos uma menina brincando de me com uma boneca, ou mesmo um menino brincando de motorista com um carrinho. Isso favorece a integrao da criana ao mundo social. Tambm nesse estgio que predominam os processos de assimilao das regras s atividades do sujeito, ou seja, atravs do jogo as crianas manifestam comportamentos que tomam parte de seu repertrio, acomodando ou modificando a realidade conforme seus interesses (assimilao deformante). Assim, a criana pode utilizar um pedao de madeira como se fosse um barco sem parar para pensar sobre a forma do objeto e suas possibilidades reais.

E a pergunta ento : qual a importncia da assimilao deformante na construo do conhecimento na escola?.

De um ponto de vista funcional, atravs destes jogos a criana cria e faz invenes que a ajudam a assimilar o mundo ao seu redor, fazendo com que entenda e se submeta mais facilmente s regras de funcionamento da escola e de sua casa. De um ponto de vista estrutural, estes jogos so um preldio para futuras teorizaes das crianas nas sries iniciais da escola fundamental. A base das operaes pelas quais as crianas aprendem as matrias na escola a unio das experincias vividas com a possibilidade de explicao pelo professor.

Em sntese, os jogos de exerccio so a base para o como e os jogos simblicos so a base para o por que. Mas, a coordenao entre o como e o porqu s se d quando temos a estrutura dos jogos de regra, como veremos no prximo item.

Jogos de regras

Estes jogos constituem um conjunto de regras e normas que cada participante deve conhecer, assumir e respeitar se quer realizar a atividade sem demasiadas interferncias e obstculos.

Tambm possuem as duas caractersticas bsicas dos jogos anteriores. A repetio aparece como uma regularidade, que o como fazer do jogo, mesmo que as regras sejam modificadas. Esta regularidade deve ser levada em conta por todos os participantes, portanto a transgresso de alguma regra uma falta que perturba o sentido do jogo.

A partir dos sete anos, a criana inicia formas de jogar eminentemente sociais; isso acontece porque ela comea a ter conhecimento de normas e regras. Nestes jogos, a moral corresponde s regras do jogo, jogar certo. No entanto, jogar certo nem sempre significa jogar bem, pois isso, no jogo, corresponde tica.

A coletividade tambm uma caracterstica particular deste tipo de jogo. Ou seja, cada jogador depende da jogada do outro. Da podemos ver a assimilao recproca. Esta reciprocidade se d exatamente por causa do carter coletivo, da busca da regularidade e tambm pelas convenes que os jogadores podem fazer ou no do contexto do jogo. Quando a criana comea a desenvolver atividades com regras, tem como desafio controlar seus desejos e motivaes pessoais, os quais, s vezes, poderiam at mesmo interromper o processo, respeitando mais os outros jogadores.

Importante destacar que o valor ldico permanece nos jogos com regra. A escolha de querer jogar ou no que traz o prazer funcional para seus participantes durante a partida. As convenes continuam, igualmente, sendo fundamentais. O lugar, o tempo, os critrios de derrota e vitria regulam as condutas dos participantes.

Perguntamos ento: qual a importncia dos jogos com regra na construo do conhecimento na escola?.

Este tipo de jogo atualiza o jogo de significados que a criana aprendeu no primeiro ano de vida. Por princpio, ela compete com algum que tenha as mesmas condies de ganhar. Para isso, deve ser habilidosa, estar atenta, ter boa memria, abstrair, relacionar regras todo o tempo etc. por essa razo que o jogo de regras um jogo de significados, pois o desafio superar a si mesmo e o outro. Seu carter competitivo valoriza este tipo de jogo na aprendizagem.

Pode ser que este carter competitivo seja questionado e criticado por muitos. A competio, por si mesma, no boa ou m, pois a vida caracterizada por ela. Ela apenas deixa claro que somente um jogador ser o vencedor. No entanto, o que a modifica a reao que temos ao nos confrontarmos com ela. Com certeza este um tema para uma discusso dirigida pelo prprio professor com os seus alunos. Esta discusso pode ajudar os alunos a entenderem o verdadeiro objetivo do jogo.

Para competir h a necessidade de ter competncia e habilidade pessoal para enfrentar os problemas e resolv-los da melhor forma possvel. E se ambos tiverem a mesma competncia, que vena quem tiver mais sorte.

A competncia o desafio de superar a si mesmo. Assim, o outro apenas uma referncia. Se um jogador sempre ganha, o outro ento no est sendo mais uma referncia para ele, e assim, ele deve procurar outro adversrio mais forte para que possa melhorar-se. Nesta referncia, ganhamos ou perdemos sempre de ns mesmos.

Os jogos de regra tambm so importantes quando pensamos no seu valor operatrio. Neles, o fazer, no sentido de conseguir e compreender, so complementares e implicam assimilao recproca de esquemas. Para ganhar nestes jogos so inevitveis: a coordenao de diferentes pontos de vista, a antecipao, a recorrncia, o raciocnio operatrio. Quanto a estes aspectos, cometemos um equvoco com este tipo de jogo. Muitas vezes conhecemos as convenes do jogo, suas regras e movimentos, mas no conseguimos utiliz-las de forma a alcanar a vitria. Isto , quem conhece as regras (sentido simblico) e nunca vence, no conhece seu sentido operatrio.

Um exemplo que podemos dar o jogo de dama. Conhecer o movimento das pedras, no significa ser vitorioso. necessrio que o jogador raciocine diante das jogadas do outro jogador e ento com o conhecimento das regras busque a melhor jogada. Isto sim a unio do simblico com o operatrio.

Ao propor este tipo de jogo, de fundamental importncia o professor planejar uma seqncia de aes e esse planejamento deve contar com a participao ativa das crianas. Elas devem ser estimuladas a compartilhar suas idias a respeito do jogo proposto, bem como a elaborar as regras em conjunto com o professor. Na contraposio de idias para se chegar a um acordo sobre as regras, as crianas tm de se descentrar e coordenar pontos de vista, o que contribui fortemente para o desenvolvimento do raciocnio lgico.

importante, tambm, que, ao jogar, os alunos possam explicitar as estratgias utilizadas, falar de suas dificuldades, registrar os resultados obtidos, enfim, explorar, propor e resolver problemas interessantes do incio ao fim da brincadeira, pois, como diz Paulo Freire (apud Murcia, 2005), s se desenvolve quem se desenvolve.

No que diz respeito Matemtica na perspectiva escolar, o jogo de regras possibilita criana construir relaes quantitativas ou lgicas: aprender a raciocinar e demonstrar, questionar o como e o porqu dos erros e acertos. (MACEDO, PETTY e PASSOS, 1997, p. 151). 3 - O papel do erro no mbito dos jogos

Tratamos o erro de duas maneiras, tanto na nossa vida pessoal como na escolar. Geralmente a sociedade coloca um rigor excessivo com relao ao erro; e na escola no diferente. O aluno deve fazer sempre direito o que o professor est ensinando. Mas muitas vezes h um excesso de generosidade quando estamos em um contexto informal, e ento somos muito permissivos com um falar e escrever bem.

Piaget (apud MACEDO, PETTY e PASSOS, 1997) mostra que o erro no oposio ao acerto, mas deve ser revisto e interpretado de outro modo. A questo a inveno e a descoberta que a criana pode fazer atravs de seu prprio erro.

O erro pode servir como fonte de informaes, permitindo analisar o que a criana fez e como o fez para realizar a tarefa, ou ainda, o que tentou fazer para solucionar um determinado problema e que caminhos percorreu. (MACEDO, PETTY e PASSOS,1997). A seguir apresentamos o erro sob duas perspectivas, a primeira formal ou do adulto e a segunda, da criana.

O erro na perspectiva formal do adulto

O adulto valoriza o que verdadeiro e bom, descartando muitas vezes, o erro como uma forma de aprendizagem.

O professor, como adulto, tem a mesma perspectiva. Alm disso, como profissional, se preocupa com o que verdadeiro, porque tem compromissos pedaggicos. Ele deve divulgar aquilo que certo, mas sempre se confrontar com o erro da criana.

Para cumprir estes compromissos, com o certo e com a criana, existem trs exigncias. Uma delas que o professor esteja comprometido com as verdades de sua rea de atuao. Ao mesmo tempo, ele deve levar em conta as caractersticas psicolgicas das crianas, seu nvel de desenvolvimento, suas dificuldades emocionais e tambm sua condio social. Mais ainda, ele tambm deve transmitir os conhecimentos de uma forma metodolgica correta (MACEDO, 1994).

Diante disso tudo, o professor deve ver o erro como parte do processo. Mas na perspectiva formal, o erro visto como algo ruim, a ser evitado e punido.

Essa perspectiva tambm v o erro, simplesmente como erro, e no questiona o porqu ou como aconteceu o erro. Esta a viso do adulto, algo acabado, que no est num processo de reviso.

A escola est comprometida com bons resultados e quando ela no eficaz, a razo para o erro buscada em vrias fontes: no professor, na escola, na criana, etc. Mas nem sempre h um culpado (MACEDO, 1994).

Cury (2003) destaca a verdadeira viso que o professor deve ter do erro: Um educador deve valorizar mais a pessoa que erra do que o erro da pessoa (p.85). Esta valorizao leva o professor a olhar o erro como uma forma de aprendizado, e o aluno como um verdadeiro aprendiz.

O erro sob a perspectiva da criana

No construtivismo o erro possvel e s vezes at necessrio. Quando o erro aparece o indivduo busca uma auto-regulao, para ficar em sintonia, percebendo ento que algumas aes devem ser mantidas e outras corrigidas ou melhoradas. Assim, o erro e o acerto so partes intrnsecas do processo de aprendizagem (MACEDO, 1994).

Por isso Macedo (1992) questiona: Como tornar o erro um observvel para o aluno?.

Estudos sobre a aprendizagem operatria tm sido oportunos para responder a essa pergunta. Os jogos, que so uma forma de aprendizagem operatria, criam um contexto em que se pode mostrar criana, a contradio, o conflito e a no-coerncia entre suas respostas (MACEDO, p.71). Esta contradio, por sua vez, s notada pelo aluno quando, de algum modo, ele tem recursos para enfrent-la e super-la.

Macedo (1997) destaca que a anlise das prprias aes traz um grande proveito para os alunos, pois permite que analisem o que fizeram e como fizeram para realizar uma tarefa, ou ainda, o que tentaram fazer para solucionar um determinado problema e que caminhos percorreram.

O autor questiona:

Qual a atitude que o professor deve assumir diante do erro? Que postura conveniente diante do construtivismo? Se o erro faz parte do processo, se pode ser analisado de diferentes ngulos, ento no se trata de neg-lo ou justific-lo de maneira complacente, nem de evit-lo por meio de punies, mas de problematiz-lo, transformando-o em uma situao de aprendizagem. O importante sabermos a servio do que est a correo e qual seu sentido estrutural ou funcional para a criana (MACEDO, 1994, p.75).

De acordo com Macedo (1994), o professor pode fazer da anlise do jogo uma forma de coletar informaes sobre como e por que a criana pensou e fez determinadas jogadas. Para ele, a prpria ao de jogar que cria oportunidades para novas descobertas, principalmente quando o professor est observando as aes de seus alunos.

Assim, o professor tem um papel fundamental no contexto do jogo, tanto grupal, quanto individual. O professor deve estar observando todos os grupos que esto jogando e depois dirigir uma conversa sobre a partida, pedindo para que os alunos justifiquem a colocao de uma pea em determinado lugar, ou que analisem as chances de cada jogador ganhar. Fazendo isso, ele permite que os alunos reflitam sobre suas aes e tornem o erro um observvel para si mesmo.

Cury (2003) tambm deixa alguns conselhos para os educadores:

A pior maneira de preparar os jovens para a vida coloc-los numa estufa e impedi-los de errar e sofrer. (p. 92). (...) Elogie o jovem antes de corrigi-lo ou critic-lo. Diga o quanto ele importante, antes de apontar-lhe o defeito. A conseqncia? Ele acolher melhor suas observaes e o amar para sempre. (p.95).

4. Consideraes finas, apesar de provisriasQuando se trata dos processos de ensinar e aprender os contedos dos diferentes componentes curriculares na escola, no existem regras prontas, nem orientaes definitivas. Em todos os casos, e o ensino-aprendizagem de Matemtica no exceo, preciso que os professores, principais responsveis por esse processo, tomem em considerao o assunto a ser tratado, o nvel de ensino, a classe em que ser desenvolvido, entre tantos outros aspectos que influenciam fortemente o sucesso das prticas educativas escolares.Entretanto, considerando que cada estudante responsvel pela construo de seu prprio conhecimento, mas que no prescinde do apoio, do incentivo e do acompanhamento dos professores, com tambm da troca de saberes e experincias com os pares, o jogo uma alternativa importante para favorecer a aprendizagem, tanto por causa do ldico como por estimular processos reflexivos e estabelecimento de relaes.

Ora, para aprender Matemtica dando significado aos seus contedos, estabelecer relaes essencial. No basta, entretanto. preciso adquirir uma desenvoltura no uso dos diferentes procedimentos que lhes so afetos. Assim sendo, reafirmamos nossa posio: os jogos so oportunidades singulares para que os estudantes aprendam contedos matemticos, exercitem e se tornem hbeis na resoluo de procedimentos e se tornem bons resolvedores de problemas, que o objetivo essencial da aprendizagem desse componente curricular.Referncias bibliogrficas

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BARCO, L. Onde anda a imaginao. Superinteressante. Maio de 1998. (xerox)

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Essa e as outras questes que permeiam a descrio dos diferentes tipos de jogos foram adaptadas de Macedo, Petty e Passos (1997).