Arcaísmos e Neologimos

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Arcaísmos e Neologimos Aires da Mata Machado Arcaísmo é a palavra ou expressa pertencente a data anterior àquela em que as vemos empregadas. Assim, o antiquado, na língua contemporânea, era correntio no século XVIII. De outra parte, construções e termos censurados como antigos, há dois séculos passados, empregam-se hoje correntemente. Francisco José Freire tachava de arcaísmos andrajo, passamento, longínquo e outros vocábulos indisipensáveis na língua de hoje. À semelhança de hábitod e trajes, as palavras se desgastam ou rejuvenescem, obedecendo às oscilações da moda. Apena smorre para sempre o termo designativo de coisas, instituições ou fatos que ou já não existem ou se transformam. Essa é uma das causas da arcaização que se pode exemplificar, como o fez João Ribeiro com montipilher, vestes doutorais. Este mesmo autorenumera outras, entre as causas principais, no seu Dicioário Gramatical: “Existência de formas sinonímicas eruditas ou não: segre desapareceu diante de século; leixar, atne deixar etc.; existências de homônimos ou palavras de igual soído, e que podem confundir-se: chantar (plantar) e cantar; ca (porque) e ca (aqui); a tendência que muitas palavras sofrem de se tornarem de sentido obsceno ou pejorativo; a inevitável necessidade dos neologismos combinada com a limitação necessária da memória. O homem do povo, segundo TURSH, não tem à sua disposição mais de dois mil vocábulos; o progresso humano, em geral, é uma causa de arcaísmo sintático”. Os arcaísmos podem ser ortográficos (He, hum, athe), morfológicos (português e senhor, “ invariáveis”, fim, “feminino”, amades por amais) e sintáticos (começar fazer por começar a fazer ou começar de fazer), notando-se que mesmo a regência com de” tende a desaparecer de uso. Salientam-se os arcaísmos semânticos, os mais numerosos, consistentes apenas no obsoletismo de significação dos nomes; ex.: arreio no sentido de “enfeite”. Frquentemente, vocábulos e fatos gramaticais, fora de uso na língua contemporânea, mantêm-se vivos na língua popular. A

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Arcasmos e Neologimos

Aires da Mata Machado

Arcasmo a palavra ou expressa pertencente a data anterior quela em que as vemos empregadas. Assim, o antiquado, na lngua contempornea, era correntio no sculo XVIII. De outra parte, construes e termos censurados como antigos, h dois sculos passados, empregam-se hoje correntemente. Francisco Jos Freire tachava de arcasmos andrajo, passamento, longnquo e outros vocbulos indisipensveis na lngua de hoje. semelhana de hbitod e trajes, as palavras se desgastam ou rejuvenescem, obedecendo s oscilaes da moda. Apena smorre para sempre o termo designativo de coisas, instituies ou fatos que ou j no existem ou se transformam. Essa uma das causas da arcaizao que se pode exemplificar, como o fez Joo Ribeiro com montipilher, vestes doutorais. Este mesmo autorenumera outras, entre as causas principais, no seu Diciorio Gramatical: Existncia de formas sinonmicas eruditas ou no: segre desapareceu diante de sculo; leixar, atne deixar etc.; existncias de homnimos ou palavras de igual sodo, e que podem confundir-se: chantar (plantar) e cantar; ca (porque) e ca (aqui); a tendncia que muitas palavras sofrem de se tornarem de sentido obsceno ou pejorativo; a inevitvel necessidade dos neologismos combinada com a limitao necessria da memria. O homem do povo, segundo TURSH, no tem sua disposio mais de dois mil vocbulos; o progresso humano, em geral, uma causa de arcasmo sinttico.

Os arcasmos podem ser ortogrficos (He, hum, athe), morfolgicos (portugus e senhor, invariveis, fim, feminino, amades por amais) e sintticos (comear fazer por comear a fazer ou comear de fazer), notando-se que mesmo a regncia com de tende a desaparecer de uso. Salientam-se os arcasmos semnticos, os mais numerosos, consistentes apenas no obsoletismo de significao dos nomes; ex.: arreio no sentido de enfeite.

Frquentemente, vocbulos e fatos gramaticais, fora de uso na lngua contempornea, mantm-se vivos na lngua popular. A preservao de arcasmos constitui at uma das caractersticas dessa modalidade da lngua. Com isso, h coincidncias emtre a prtica dos antigos escritores e o uso lingstico nas camadas menos cultas da comunidade idiomtica. Piadoso, simpres e pubrico, vocbulos perfilhados por Cames encontram-se, por igual, na fala do matuto brasileiro e no linguajar do labrego lusitano. Joo Leda em Quimera da Lngua Brasileira faz questo de mostrar que essas formas antiquadas, hoje francamente incorretas, ocorrem nos dois pases de lngua portuguesa, como se pode ver das provas que apresenta. No menos acertadamente explica essa persistncia, considerando a situao de populaes descultivadas. Quem oferece esclarecimento cabal a respeito Amrico Castro, que v, na manuteno de arcasmos, na Hispano-Amrica (e poderia acrescentar, no Brasil) fruto do isolamento territorial e do cultural. (La Peculiaridad Lingustica Rioplatense, pag. 143).

H escritores que se comprazem no revigoramento de arcasmos. No raro, trazem vida vocbulos que no deveriam ficar no esquecimento. Outros manifestam acentuados pendores para usarem e abusarem de palavras novas. A ambos deve gui-los o bom gosto, dentro dos limites j traados por Quintiliano: Est no uso a mais segura norma de falar, e temos de nos servir dos termos como das moedas, que s corrente quando traz o cunho do dia. As palavras antigas, alm de ostentarem ilustres padrinhos, comunicam certa majestade e gosto orao; por uma parte tm a autoridade de antigas, e por outra, deixando de usar-se por algum tempo, aparecem como novas. preciso, porm moderao, de modo que o seu emprego no seja freqente nem manifesto, porque no h coisa mais odiosa que a afetao. Sendo a clareza a principal virtude da orao, a elocuo ser viciosa se necessita de quem a interprete. Das palavras novas escolham-se as mais antigas e das antigas, as mais novas. (Instituies Oratrias).