ANTÓNIO SANTOS DA LUZ - portaldoconhecimento.gov.cv · Roland Barthes e Greimas em modelo de...
Transcript of ANTÓNIO SANTOS DA LUZ - portaldoconhecimento.gov.cv · Roland Barthes e Greimas em modelo de...
ÍNDICE
I. INTRODUÇÃO .................................................................................................. 1
1.1. OBJECTIVOS DO TRABALHO ..................................................................... 2
1.2. METODOLOGIA ............................................................................................. 2
1.3. ESTRUTURA DO TRABALHO ..................................................................... 3
II. ENQUADRAMENTO TEÓRICO……………………………………………..5
III. DO CONTO ORAL AO CONTO ESCRITO .................................................. 8
3.1. A TRANSMISSÃO ORAL E A LITERATURA TRADICIONAL ................ 8
3.2. O CIRCUITO COMUNICATIVO E A ANONÍMIA .................................... 10
3.3. OS CICLOS TEMÁTICOS E A TIPOLOGIA DE CONTOS ....................... 12
3.3.1. OS CICLOS TEMÁTICOS ........................................................................ 12
3.3.2. TIPOLOGIAS DE CONTOS ...................................................................... 13
IV. A RECRIAÇÃO DO CONTO BLIMUNDO ................................................. 16
4.1. O CONCEITO DE CONTO…………………………………………………16
4.2. ORIGEM TEMÁTICA DO CONTO ............................................................. 19
4.3. A ESTRUTURA DO CONTO ....................................................................... 21
4.4. OS PROCESSOS DE RECRIAÇÃO DA NARRATIVA…………………...25
V. CONSIDERAÇÕES FINAIS ........................................................................... 38
VI. BIBLIOGRAFIA .............................................................................................. 41
ANEXOS
1
I. INTRODUÇÃO
O conto popular BLIMUNDO: do texto oral ao texto escrito, é o tema que
escolhemos para construir o nosso trabalho de fim de curso, uma exigência académica
que coroa uma longa etapa de estudos e de vida académica.
Com esta proposta de tema, que ora se apresenta, não se almeja outra coisa a não
ser desenvolver uma leitura analítico-interpretativa da versão escrita do conto popular
BLIMUNDO, publicado em 1999, pelo artista plástico sãovicentino Leão Lopes,
visando compreender não só o percurso que descreveu até à actualidade, na forma de
texto oral, mas também as transformações de que foi objecto ao se transferir para a
forma escrita. De entre as várias versões deste conto que se conhecem, sobretudo orais
ou oralizantes, fez-se uma clara opção pela versão escrita que se justifica por se investir
de pretensões literárias.
Deste modo, e a fundamentar-se esta hipótese, este trabalho opta por desenvolver
uma análise estrutural da narrativa, destacando as componentes diegéticas sobre as quais
se estrutura e se organiza e os mecanismos e processos de recriação da diegese.
Partindo da concepção genológica de texto, tentar-se-á enquadrar o conto no
quadro da relação do binómio literatura oral e literatura escrita, procurando discutir as
fontes ainda que remotas deste texto, e problematizar as modalidades de transmissão e
difusão que lhe permitiram alcançar a actualidade uma vez que se integra na narrativa
oral cabo-verdiana, um importante campo de interpenetração cultural.
2
1.1. OBJECTIVOS DO TRABALHO
A partir da definição da proposta de tema, desenharam-se alguns objectivos que se
propõem alcançar, ao longo do desenvolvimento deste trabalho de pesquisa que, entre
outros, se centram nos seguintes:
i. tentar o enquadramento do conto popular Blimundo no domínio da literatura
oral e da literatura escrita;
ii. discutir a narrativa oral cabo-verdiana enquanto campo de interpenetração
cultural;
iii. apresentar uma proposta de leitura analítico-interpretativa do conto a partir da
aplicação do modelo de análise estrutural proposta por Propp e reelaborada por
Roland Barthes e Greimas em modelo de análise actancial, destacando as
componentes diegéticas sobre as quais se estrutura e se organiza e os
mecanismos e processos de recriação da história.
1.2. METODOLOGIA
A leitura analítico-interpretativa de um texto impõe ao estudioso o recurso a
métodos específicos de abordagem textual e literária em função da natureza do estudo
que pretende levar a efeito. Neste sentido, uma narrativa de transmissão oral exige uma
abordagem estrutural a partir das formulações teóricas proppianas e post proppianas
enunciadas na fundamentação teórica.
A aplicação do modelo de analise impõe a observação de determinados requisitos
que se traduzem em:
i. escolha do texto objecto de análise - versão escrita do conto popular intitulado
Blimundo, recriado por Leão Lopes;
ii. construção da bibliografia de suporte teórico atinente à fundamentação e ao
enquadramento conceptual da pesquisa;
3
iii. construção do quadro teórico referencial;
iv. aplicação ao texto do modelo de análise estrutural proppiano.
1.3. ESTRUTURA DO TRABALHO
Este trabalho encontra-se estruturado em cinco capítulos, correspondendo
cada um aos diferentes aspectos que este trabalho desenvolve.
Capitulo I: corresponde à Introdução do trabalho onde se podem apreciar a
apresentação e a justificação da escolha do tema, se definem os objectivos, a
metodologia seguida e se apresenta a organização interna do trabalho.
Capítulo II: constrói a Fundamentação Teórica onde se conceptualizam e se
discutem os pressupostos teórico-metodológicos sobre os quais assenta o
desenvolvimento do tema. Sobre o eixo teórico repousam os princípios inerentes
ao modelo proppiano de análise estrutural da narrativa, destacando algumas das
componentes diegéticas sobre as quais se estrutura e se organiza, sobretudo a
categoria personagem, e os mecanismos e processos de recriação da diegese.
Capítulo III – intitulado Do Conto Oral ao Conto Escrito propõe uma definição
do conceito de conto, clarificar as circunstâncias que presidem à sua elaboração e
reflectir sobre o seu circuito específico de transmissão, no quadro do circuito
comunicativo, bem como a noção de autoria anónima e/ou colectiva das narrativas
populares. A partir do conceito de Literatura Tradicional problematizam-se as
origens genéticas do conto, a tipologia de contos e os ciclos temáticos.
Capítulo IV – este momento da pesquisa, de carácter mais prático, centra-se em A
Recriação do Conto Blimundo e desenvolve uma leitura sobre o texto em estudo
pela reconstituição dos processos de recriação da narrativa. Partindo da origem
temática do conto e da reconstituição do protagonista da história, a figura possante
do boi Blimundo, analisa-se a organização funcional da narrativa, restabelecendo
algumas das categorias diegéticas.
4
Capítulo V – apresenta algumas Considerações Finais decorrentes das reflexões
e da leitura textual realizada para além de enunciar alguns caminhos a desbravar
futuramente em outros trabalhos sobre as narrativas orais cabo-verdianas.
Capítulo VI – reúne a Bibliografia que serviu de suporte teórico, literário e
metodológico ao trabalho. Organizada em bibliografia activa – textos referenciais
objecto de uma análise mais aturada – e passiva que engloba os estudos críticos e
literários utilizados.
5
II. ENQUADRAMENTO /FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA
A importância do estudo do conto popular repousa em dois aspectos essenciais.
Se, por um lado, o conto popular partilha das mesmas características que o conto
literário consagrado, por outro, constitui uma modalidade específica de discurso, que
merece a atenção dos estudiosos da literatura, já que encerra em si a alusão explícita à
fonte responsável pela sua produção e às formas especificas de transmissão e difusão.
Deste modo, a leitura e a compreensão deste subconjunto particular de textos
narrativos (não literários) passam necessariamente pela discussão do funcionamento do
circuito comunicativo tendo em consideração que a instância que detém o estatuto de
emissor, o povo, é “ um ser colectivo, preferencialmente situado num espaço rural
periférico, pouco permeável a contaminações urbanas”1. Trata-se de um conceito em
torno do qual se concentram fortes divergências conceptuais e, que no quadro da
comunicação literária, recoloca não só a questão da anonímia (uma espécie de sujeito
colectivo anónimo), como a das divergentes recepções literárias.
Legitimado pela comunidade onde circula, que se encarrega de o (re) emitir, o
conto popular, juntamente com outras formas de manifestação de um povo, faz parte da
literatura tradicional de transmissão oral.2 Neste âmbito, importa delimitar os
contornos do conceito de literatura tradicional e (re) estabelecer as articulações
possíveis com a noção de tradição, segundo a perspectiva adoptada por Roman
1 Reis, Carlos, Dicionário de Narratologia, p.83 2 Literatura tradicional de transmissão oral é uma designação polémica que encerra em si um princípio paradoxal, que
tem feito correr muita tinta no domínio dos estudos literários, construída à luz da dicotomia escrita/oralidade.
6
Jakobson3, ao analisar a relação tradição-interprete, forjando uma analogia com a
conhecida dicotomia saussuriana língua/fala a partir da qual se concebe a existência de
versões ou variantes de um mesmo conto-tipo.
A expressão conto popular recobre um vasto conjunto de narrativas bastante
diversificadas do ponto de vista temático o que tem suscitado várias propostas de
classificação de tipos de conto: contos maravilhosos ou de encantamento, contos de
exemplo, contos de animais, contos religiosos, entre outros. A propósito destes ciclos
temáticos que estão representados em múltiplas áreas geo-culturais, Carlos Reis4 avança
que, embora não exista uma teoria concludente sobre a origem desse tipo particular de
texto, a ocorrência de “ uma espécie de fundo arquetípico universal”, é de se admitir
que:
Do ponto de vista histórico, os contos populares constituem resíduos de
crenças e mitos primitivos que se foram progressivamente adaptando a novos
cenários culturais;
Se assiste, hoje, à procura do perfil matricial do conto popular (o que, desde
logo, dilui a importância do estudo das origens do conto).
Nesta procura da construção de uma matriz estrutural do conto pular, ressalvam-se
os trabalhos de Vladmir Propp5, na sua conhecida obra intitulada Morfologia do Conto,
que teve o mérito de propor uma descrição da estruturação dos contos, segundo as
componentes em que se organizam e das relações que estas partes mantêm entre si e
com o todo, introduzindo nos estudos de narratologia uma modalidade de análise
designada por análise estrutural.6
A análise estrutural é norteada pelos seguintes princípios: a concepção do texto
literário como um todo acabado e a noção de relativização que afecta os seus
componentes, isto é, baseando-se em categorias teóricas específicas, procura descortinar
3 Apud Reis, Carlos, Dicionário de Narratologia, p.83 4 Ibid. p. 85 5 Muito embora o pioneirismo se tenha ficado a dever a Joseph Bédier que, procurou definir a essência orgânica dos contos, a sua forma prototípica. 6 Esta modalidade de análise proposta por Propp foi posteriormente retomada e alargada por vários teóricos como Roland Barthes, em 1966, com o seu modelo de análise funcional, com Philipp Hamon e Greimas, com o modelo actancial, entre outros.
7
as relações que os seus componentes entre si sustentam. O que quer dizer que tudo no
texto literário é relativo, não podendo ser isolado do que o rodeia.
Segundo o estruturalismo proppiano, o texto é uma “estrutura em que as partes
estabelecem relações dinâmicas entre si, dotadas de carácter sistémico e, como tal,
desempenham funções específicas, assim, a ausência ou desvalorização desses
elementos é susceptível de pôr em causa o equilíbrio e a estabilidade de toda a obra”,
por isso não pode ser estudado por parcelas mas como um todo visto que o texto
literário não é uma soma de elementos ligados uns aos outros de uma forma
desorganizada, mas um tecido com uma estrutura linear em que os acontecimentos
narrados parecem ordenados segundo um fio condutor adoptado pelo autor com o
objectivo de atingir um determinado fim.
A proposta da análise estrutural dos contos de transmissão oral edificada por
Propp consiste na constituição e leitura de um corpus textual 7 e na identificação de um
conjunto restrito de elementos invariantes – as funções – que se (re) combinam de
forma idêntica, numa ordem rígida de sucessão cronológica. A estrutura do conto
decorre deste conjunto de elementos solidários e interligados. Tais funções estão
repartidas por sete esferas de acção inerentes a sete personagens-tipo.
A evolução deste modelo de análise conduziu-nos à gramática da narrativa, um
tipo de abordagem que privilegia o plano da história em detrimento do discurso, seja na
perspectiva funcional, proveniente de Propp e reelaborada por Barthes, seja na
perspectiva sequencial.
7 Propp analisou um corpus constituído por cem contos maravilhosos russos.
8
III. DO CONTO ORAL AO CONTO ESCRITO
3.1. A TRANSMISSÃO ORAL E A LITERATURA TRADICIONAL
Os textos orais apresentam um carácter efémero e fugaz. A palavra falada está
sujeita a modificações por não se inscrever num espaço de fixação e a linguagem
realizada oralmente submeter-se à dinâmica temporal, por isso estes textos têm a
particularidade de se alterar com o tempo, adequando-se às necessidades, desejos e
anseios das comunidades que os vão (re) actualizando segundo as conjunturas e as
circunstâncias. Para além de que, os sujeitos individuais têm a natural tendência para
adulterar a sua substância a favor das suas necessidades comunicativas.
Se bem que o estudioso da narratologia Carlos Reis8 é de opinião que os
conteúdos da literatura de expressão oral têm permanecido ao longo dos tempos, dado
que a comunidade tem desempenhado um importante papel na preservação desse
património cultural, transmitindo-o de geração em geração. A sua perenidade deve-se ao
facto de retratarem os grandes problemas não só do homem antigo, como também os
problemas que continuam a acompanhar o homem de hoje e de sempre: a luta pela
autonomia, a rivalidade com as figuras parentais, a rivalidade fraterna, a construção
de uma identidade adulta, a solidão do homem na terra, a realidade trágica e, por
vezes, cruel das relações humanas.
8 Reis, Carlos e Cristina Lopes, Dicionário de Narratologia, Coimbra, Almedina, 1987, p.83
9
Um outro estudioso da tradição oral africana, Lourenço do Rosário9, confirma que
as narrativas de tradição oral são o reservatório de valores culturais de uma comunidade
com raízes e personalidade regionais muitas vezes perdidas na amálgama da
modernidade. A narrativa funciona igualmente como um dos principais veículos de
transmissão do conhecimento, mantendo a ligação entre as gerações de uma mesma
comunidade.
Ao considerar a situação da oralidade nas narrativas africanas, aceita-as como um
dos mais poderosos meios pedagógicos. O seu funcionamento como tal estabelece-se em
torno de dois níveis que impõem duas funções: i) a função de nível explícito – através da
narrativa, a memorização torna-se mais fácil em função da curiosidade e do prazer. Deste
modo, a aprendizagem e a compreensão realizam-se de forma rápida e o acto de ensinar
torna-se fácil; ii) a função de nível implícito – em que a narrativa não é um simples
instrumento metodológico de transmissão de conhecimentos, ela transporta em si própria,
através da exemplaridade, o próprio objecto de ensinamento que se quer transmitir.
De um outro ângulo, discute-se o carácter universal das narrativas de transmissão
oral. A bem de verdade, todo o indivíduo a quem se endereça uma narrativa, está apto a
compreender que os conflitos apresentados na intriga podem perfeitamente ter lugar no
próprio universo do grupo de que faz parte. São ao mesmo tempo, e em qualquer lugar, um
grande ponto de interrogação sobre os problemas com que o indivíduo se defronta no dia-
a-dia na sua sociedade. Ao mesmo tempo, todos os elementos da comunidade percebem
que os conflitos veiculados pelas narrativas representam um universo simbólico, o que lhes
permite criar a distinção necessária para a reflexão.
Como actos de cultura e especificamente de criação as narrativas de expressão oral
são formas literárias transmitidas pelo sistema verbal oral. Embora não se conteste a
invasão do universo das narrativas pelo mundo real (que é inevitável), Rosário considera
que tal facto não permite concluir que se possa estabelecer uma relação imediata entre os
ingredientes do mundo real e a própria realidade. Por outras palavras, as narrativas orais
não serão propriamente fontes documentais de carácter histórico nem sociológico. A
dimensão histórica aparece nelas como um desfasamento entre a narração presente, que se
socorre de alguns elementos do real quotidiano, e um contexto etnológico ausente,
9 Rosário, Lourenço J. da Costa. A Narrativa Africana de Expressão Oral, Lisboa: Instituto de Cultura e Língua Portuguesa, (ICALP) 1ª ed. 1989.
10
longínquo, fabuloso ou, até sobrenatural. Não há uma referenciação de um contexto actual,
nem mesmo uma actualização de situações socialmente conhecidas, daí a passagem para o
mundo simbólico dos ingredientes «realistas». No entanto, é certo que a compreensão do
sentido das narrativas ou a correcta interpretação da simbologia dos seus elementos só é
possível desde que se conheça a geografia a história, os hábitos sociais, económicos,
culturais e morais da comunidade que as produz.
3.2. O CIRCUITO COMUNICATIVO E A ANONÍMIA
Tudo o que os seres humanos fazem no seu dia a dia envolve a comunicação, ou
seja, não convivem com seu semelhante sem se comunicar, pelo que só é possível viver
em grupos sociais, comunicando.
A ideia de que todas as coisas que o homem faz são construídas com o objectivo de
comunicar com os outros, com a intenção de comunicar, de dividir os sus sentimentos
com o semelhante, é realçada por Aguiar e Silva10
para quem todo o comportamento do
homem é um comportamento sígnico e (…) todo o fenómeno artístico constitui um
peculiar fenómeno comunicativo.
O processo comunicativo tem merecido desde há muito tempo a atenção de alguns
estudiosos, apesar de não existir consenso entre eles. Eric Buyssens, citado por Aguiar e
Silva11
, assinalou, desde 1943, que o objectivo da disciplina científica que designa por
Semiologia, é o estudo dos processos de comunicação, dos sinais convencionais,
voluntários, intencionais, de carácter social. Buyssens abre a polémica em torno desta
questão, ao pretender defender uma concepção restritiva da comunicação que remete para
um plano secundário os fenómenos de significação. No pólo oposto surge Roland
Barthes que se distancia desta visão ao defender a semiologia da significação como o
domínio de investigação que estuda os fenómenos que não constituem formas de
comunicação voluntária e intencional, ao sublinhar o facto de que muitos sistemas
semiólogicos se constituem mesmo em objecto de uso cuja razão originária de ser não
reside na significação, mas que sofrem, no âmbito social, um processo de semantização,
o mesmo é dizer, de ressignificação. O teórico italiano Umberto Eco solucionou este
problema de semiótica da significação e da semiótica da comunicação de uma forma
10 Aguiar e Silva, Victor. Teoria da Literatura, 8ª edição, Coimbra, 1978 11 In op cit. p. 186
11
coerente. Segundo ele, é teoricamente possível estabelecer uma semiótica da significação
independentemente de uma semiótica da comunicação, mas não será possível o inverso.
Para Buyssens e Prieto e outros autores, o fenómeno da comunicação só ocorre quando
um emissor produz voluntariamente e intencionalmente sinais, com o objectivo de
influenciar o receptor.
Sabemos já que nem todas as artes têm o mesmo estatuto comunicacional, e esta
diferenciação funda-se na natureza diversa dos signos constituintes do sistema semiótico
de cada arte, na heterogeneidade dos códigos, dos canais, dos mecanismos de recepção e
dos factores pragmáticos actuantes em cada arte.
A literatura ocupa necessariamente uma posição privilegiada entre todas as artes
devido à sua essencial solidariedade semiótica com o sistema da comunicação por
excelência de que dispõem os seres humanos – a linguagem verbal.
Há muito que Roman Jakobson assegurava que, para que houvesse a comunicação
verbal, pressupunha-se necessariamente a interacção de seis «factores inalienáveis» que
esquematizou da seguinte forma:
Contexto
Emissor………………….Mensagem………….……Destinatário
Contacto
Código
Para este teórico, a comunicação oral é uma comunicação próxima e instantânea, e
realiza-se na presença dos interlocutores; é bidireccional, pois o emissor e receptor
podem assumir alternadamente a função um do outro durante o mesmo acto
comunicativo, ambos os interlocutores imitem e recebem informações alternadamente.
Aguiar e Silva reforça esta ideia, ao afirmar que o processo comunicativo entre o emissor
e o receptor realiza-se in presentia de ambos e in presentia de um determinado contexto
de situação.
De entre as várias formas de comunicação, a nossa atenção centra-se na
comunicação literária uma vez que o conto literário, escrito por um autor, se manifesta
através da comunicação literária, pese embora o facto de, na sua primitiva forma, o
conto popular fosse transmitido oralmente, de geração em geração. Assumindo a
12
comunicação literária como unidireccional, nela não é possível a reversibilidade das
funções do emissor e do receptor, o receptor e o emissor não trocam de papéis durante o
acto comunicativo. É uma comunicação do tipo disjuntivo e do tipo diferido, isto é,
realiza-se in absentia de uma das instâncias - o emissor e receptor - e num lapso
temporal de maior ou menor amplitude entre o momento de emissão e os momentos de
recepção. Aguiar e Silva12
teoriza o processo comunicativo e apresenta-o como
funcionalmente defectivo, isto é, como um processo em que a instância emissora e a
instancia receptora não se encontram co-presentes fisicamente e em que, por
conseguinte, não podem ser esclarecidos e solucionados in pesentia de ambas as
dificuldades e os distúrbios porventura ocorridos no acto comunicativo.
Relativamente à propriedade autoral, ela não pode ser atribuída a um único criador, mas a
toda uma comunidade. Neste sentido, a instância emissora difere do conto literário escrito, em
que a entidade responsável pela enunciação se define intratextualmente bem como a instância a
quem endereça a mensagem literária.
É Carlos Reis quem afirma que “( …) é bem mais complexo o estatuto do emissor do conto
popular, na medida em que estas narrativas são discursos anónimos, legitimados pela comunidade em que
circulam.”13
3.3. OS CICLOS TEMÁTICOS E A TIPOLOGIA DE CONTOS
3.3.1. OS CICLOS TEMÁTICOS
Porque não existe uma relação directa entre o conto e a realidade, torna-se difícil
indicar os temas absorvidos pelas narrativas que os contos configuram. Na verdade,
apresentam-se relacionados com épocas históricas e com particulares momentos
vivenciais. Os contos são recriados de acordo com os contextos socio-culturais e com as
exigências de cada época. Daí a diversidade de temas que apresentam. De um lado,
figuras humanas, como heróis ou anti-heróis; do outro, aspectos da vivência social:
religiosidade, aventuras, casos de amor; outras envolvem animais, o que representa, de
certo modo, a maneira como as comunidades convivem com estes seres: ora exaltando-
os, como é o caso do boi «Blimundo» que, além de protagonizar a história narrada no
12 Aguiar e Silva, Teoria da Literatura, (8ª edição), Coimbra: Livraria Almedina, 1993, p.198 13
Reis, Carlos, op cit p 84
13
conto em estudo, confere-lhe o título por que é conhecido, ora envolvendo-os em lendas
que os põem em confronto com os seres humanos ou humanizados, como é caso de
muitas “estórias” de Lobo e Chibinho que fazem parte do imaginário popular cabo-
verdiano e do seu património cultural.
Os contos, ao serem transportados de região para região, sofrem adaptações ou
reformulações que os adequam ao novo ambiente; as personagens passam por
transformações, ganham novas figurações; a própria história altera-se de modo a
condizer com a nova situação criada pela mudança do meio ecológico, social e cultural,
ou em função do processo de construção em curso de novos espaços sociais.
3.3.2. TIPOLOGIAS DE CONTOS
Muito tem sido as classificações a respeito do conto, se bem que não exista
consenso entre os autores no que diz respeito à classificação deste tipo de texto.
A classificação elaborada por Aarne/Thompson divide os contos segundo
unidades temáticas, ou seja, a identificação de cada conto baseia-se no tipo de enredo e
no tipo de personagem que encerra.
A classificação de Antti Aarne e Thompson é a seguinte: i) Histórias de Animais
(Animal Tales); ii) Contos populares comuns (Ordinary Folktales); iii) Pilhérias e
Anedotas (Jokes and Anedotes); iv) Contos de Mentiras (Tales of Lying); v) Contos
Acumulativos ou de Repetição (formula Tales); vi) Contos não-classificados
(Unclassified Tales).
Para Propp, antes de se fazer qualquer estudo sobre o conto (estabelecer teses
sobre a origem dos contos e determinar tipos de contos), é preciso, em primeiro lugar,
descrevê-los, conhecer a sua estrutura. Com base neste princípio, Propp rejeita as
classificações que dividem os contos em: histórias fantásticas, histórias tomadas da
vida quotidiana e histórias de animais (de U. F. Miller). Ou as que tentam dividi-los por
assuntos – contos de animais, contos propriamente ditos, contos jocosos – (de Antti
Aarne), sem especificar, na verdade, o que é assunto e o que é variação de um assunto,
de forma a possibilitar o enquadramento de um conto em mais de um tipo.
14
A uniformidade específica do conto não se explica, pois, segundo Propp, por
temas (Antti Aarne), por motivos (Veselovski), por assuntos (Volkov), ainda que eles se
repitam, mas por unidades estruturais em torno das quais estes elementos se agrupam.
Propp acredita que todas as classificações estariam inconscientemente baseadas
na «estrutura» do conto, quando esta não teria sido sequer definida, não se traduzindo
em sistemas de signos formais como o fazem outras ciências. Assim, a divisão dos
contos maravilhosos por «temas» resultaria absolutamente impossível em virtude
mesmo da lei de permutabilidade vigente, segundo a qual «as partes constitutivas de um
conto podem ser transportados para outro conto sem mudança alguma, o que torna falso
a premissa que considera cada tema como um todo orgânico, independente em si
mesmo.
Propp procede à descrição do conto segundo as partes que o constituem e
segundo as relações destas partes entre si e destas partes com o conjunto do conto.
Partindo da análise da acção das personagens, destacam-se as acções constantes a que
ele chama de funções. Podemos observar que as personagens dos contos fantásticos, ao
mesmo tempo que permanecem muito diferentes na sua aparência, idade, sexo, género
de preocupação, estado civil e outros estados estáticos e atributivos, realizam, ao longo
da acção, os mesmos actos. Isto determina a relação das constantes com as variáveis. As
funções das personagens representam constantes, todo o resto pode variar. Por exemplo,
o envio e a partida ligados às buscas são constantes. Aquele que envia e aquele que
parte, a motivação de enviar, etc., são variáveis. Em seguida, as etapas de busca, os
obstáculos, etc., podem coincidir sempre na sua essência sem coincidir na sua aparência.
Uma vez isoladas as funções, poder-se-ão agrupar os contos que alinham as
mesmas funções. Podem ser considerados como contos do mesmo tipo. O que leva a
afirmar que todos os contos maravilhosos pertencem ao mesmo tipo no que diz respeito
à estrutura.
O conto maravilhoso, do ponto de vista morfológico, é o desenrolar de qualquer
acção que parte de uma malfeitoria ou de uma falta e que passa por funções intermédias
para ir acabar em casamento ou em outras funções utilizadas como desfecho. A função-
limite pode ser a recompensa ao alcançar o objecto da demanda ou, de maneira geral, a
reparação da malfeitoria, etc. chamamos a este desenrolar de acção uma sequência. Cada
15
nova malfeitoria ao prejuízo, cada nova falta, dá lugar a uma nova sequência: um conto
pode ter várias sequências.
Segundo Propp é possível inserir todos os contos maravilhosos na seguinte
esquema ABCDEFGHMINKPrRsOLQExTUW; os contos que apresentam uma
sucessão invertida destas funções são variações e não novos sistemas de composição. Este
esquema confirma a tese geral da uniformidade absoluta da estrutura dos contos
maravilhosos.
16
IV. A RECRIAÇÃO DO CONTO BLIMUNDO
4.1. O CONCEITO DE CONTO: O CONTO ORAL E O CONTO ESCRITO
O conto foi, em sua primitiva forma, uma narrativa oral. Para preencher o tempo
de lazer, depois de um dia árduo de trabalho, as populações rurais reuniam-se à volta de
um contador de estórias, que animava as noites quentes de luar, com narrativas
ingénuas de bichos, lendas populares ou mitos arcaicos. É de salientar que à volta do
contador não se reuniam apenas crianças, também adultos da comunidade.
Carlos Reis reforça esta ideia, ao afirmar que: “tal como o romance, a novela ou a
epopeia, o conto pertence ao género narrativo, que se enraíza em ancestrais tradições
culturais que faziam do ritual do relato um factor de sedução e de aglutinação
comunitária. O conto esteve originalmente ligado a situações narrativas elementares:
nelas, um narrador, na atmosfera quase mágica instaurada pela expressão «era uma
vez… suscitava, num auditório fisicamente presente, o interesse por acções relatadas
num único acto de narração e que não raro tinham, para além dessa função lúdica,
uma função moralizante.»14
14 REIS, Carlos e Cristina Lopes, Dicionário de Narratologia, Coimbra, Almedina, 1987, p.79
17
Tendo em conta estas duas funções presentes nos contos populares, Lopes Filho15
avança que, desempenham um papel pedagógico e asseguram a transmissão das
tradições. Através da interpretação simbólica dos mesmos, é possível detectar-se o nível
de representação dos valores morais e regras sociais presentes no imaginário local e
possível de serem transmitidas as gerações mais novas.
A palavra «conto» foi utilizada para designar uma forma popular folclórica, uma
criação colectiva da linguagem. Apontava para dois tipos de textos muito diferentes: o
conto popular ou tradicional, de origem popular e oral,16
transmitida de geração em
geração, que narrava as aventuras, frequentemente fantásticas, de um herói (ou heroína);
e o conto de autor, com característica e estilo personalizado, escrito por um autor que é
um indivíduo empírico, historicamente situado, que relata um episódio, um caso
humano ou uma situação exemplar.
A expressão popular remete-nos para a ideia de povo, o que não é singular, mas
que engloba um colectivo. Para Carlos Reis, é um conceito relativamente ambíguo que
denota de forma difusas, um certo colectivo preferencialmente situado num espaço
rural periférico, pouco, permeável a contaminações da cultura urbana. Sublinha,
assim, que o conceito popular tem as suas raízes não no mundo letrado da cultura
«consagrada», oficialmente reconhecida, e assegurada pelos livros, mas nas camadas
não hegemónicas da população, onde a cultura é transmitida de geração em geração
oralmente.
O conto popular enraizava-se na tradição oral dos povos, actuando como veículo
de transmissão de ensinamentos morais, valores éticos ou concepções de mundo. O
conto não se prestava apenas para divertir e fazer passar o tempo como também incutia
nos espíritos humanos aspectos filosóficos da vida, aprovados pela comunidade, e que
eram passados de geração em geração, uma espécie de legado passado de pais para os
filhos.
É através desta estratégia de circulação na (s) comunidade (s) que o conto afirma a
sua especificidade, juntamente com outras manifestações populares como as expressões
15 LOPES, João Filho, «As estorias na Cultura Cabo-verdiana, Revista de Estudos Cabo-verdianos»,
Comissão Nacional p/ a Instalação da Universidade de Cabo Verde, nº 1, Julho de 2005, p. 19 a 34.
16 Estas narrativas eram posteriormente recolhidas em antologias e passadas a diferentes leitores ao longo
dos tempos.
18
proverbiais, os adágios, as adivinhas, as canções, os jogos de palavras, entre outras,
integrando-se na chamada literatura.
O conto popular é transmitido oralmente de geração em geração, ou seja, o conto
não registado nos livros mas sim na memória e sem suporte material de fixação o conto
popular é literalmente promovido à existência na e pela oralidade. Como a própria
denominação diz, foram criados e narrados pelo povo, nasceram da oralidade (da boca)
e do espírito inventivo de muitos. Mas embora realizado oralmente, ele não se exaure no
momento da sua realização: persiste no tempo, evidenciando de forma clara que a
pervivência de um determinado cultural não passa inevitavelmente pelo o recurso a um
código grafemático. Como já foi referido acima o património cultural pode ser mantida
através da transmissão oral.
No século XIX o conto conhece a sua época de maior esplendor, e passa a
ser cultivado por muitos autores que recriavam narrativas já existentes dando-lhes
roupagem nova. Segundo Moisés Massaud, além de se tornar forma «nobre», ao lado
das demais até então consideradas, sobretudo as poéticas, passa a ser larga e seriamente
cultivado. Abandona o seu estágio empírico, indeciso e por assim dizer folclórico, para
se ingressar numa fase em que se torna produto tipicamente literário. O conto deixa de
ser uma criação colectiva para se tornar uma criação individual, de um autor com um
estilo literário próprio. Muitos contos populares são recriados por autores que lhes
atribuem marcas individuais, passando assim a fazer parte da literatura escrita, onde já
vamos ter um autor conhecido (mesmo que não se conheça o nome, a autoria é
reconhecível pelo estilo e coerência dos textos); origem mais ou menos recente, mas
geralmente atribuível a datas relativamente precisas.
O conto atinge nos nossos dias o seu apogeu como forma literária, passa a ser
escrito em livros, já com uma formulação artística, afastando-se do domínio colectivo
da linguagem. Passa a ser possível identificar o autor através da sua forma peculiar,
individual de escrever e de recriar a narrativa.
19
4.2. ORIGEM TEMÁTICA DO CONTO
Não existe um consenso entre os estudiosos quanto à questão dos motivos
temáticos dos contos pelo que não tem sido fácil explicar de forma clara esta matéria.
Nem mesmo os estudiosos que adoptaram as perspectivas marxistas têm conseguido
explicar claramente a questão dos motivos temáticos.
O estudo dos contos sob o ponto de vista da teoria marxista, segundo Rosário,
pecam por se agarrar de uma forma linear aos modos de produção clássica
(comunitarismo primitivo, esclavagismo, feudalismo, capitalismo, socialismo) com as
correspondentes formas superestruturais da cultura e da sociedade. Se, por acaso na
narração surgem elementos que nos remetem para esses modos de produção, trata-se
sobretudo de uma questão de assimilação ao nível da actualização da narrativa que
dinamiza o processo de transformação das narrativas, adaptando-as às situações
concretas e actuais, sem que, no entanto, percam os valores e a linguagem que estão
para além das realidades historicamente conhecidas. Por outras palavras, as narrativas
folclóricas são recriadas conforme as exigências socioculturais e politicas de cada
época, o que leva à introdução de elementos que nos remetem para uma época
específica como por exemplo: o colonialismo, o feudalismo, o capitalismo, o
socialismo, etc.
Hoje no mundo contemporâneo, dominado pelas novas tecnologia pode verificar
que não há uma referência directa ao sistema de produção actual, que é praticamente
inexistente como motivo temático. Mesmo nas sociedades modernas industrializadas o
motivo temático continua sendo a caça, a agricultura e outras actividades a elas ligadas.
Os motivos temáticos continuam a retratar as vivências do homem rural e não do
homem citadino.
Segundo Propp, as narrativas conservam, através dos tempos, a memória das
crenças e rituais primitivos, ligados à sociedade clânica de regime de recolecção e da
caça, embora a sua sistematização e difusão se tenha desenvolvido com o surgimento da
fase agrícola da humanidade.
A origem do conto não esta ligada à base económica de produção em curso no
século em que se começou a registá-lo ou a recria-lo. É com a realidade histórica do
20
passado que devemos confrontar o conto e ali procurar as suas raízes, determinar o que
precisamente nesse passado é indispensável para a explicação do conto.
Esta teoria de Propp sobre as origens do conto é retomada por Lopes Filho17
para
explicar as origens da narrativa popular cabo-verdiana. Este antropólogo explica que
para se apurar a génese das narrativas, devem equacionar-se as bases culturais da
respectiva sociedade, sem ignorar as relações culturais, históricas, políticas e
económicas estabelecidas entre povos vizinhos, bem como as influências exercidas por
uns sobre os outros, devido a condicionalismos vários, dinamismo e versatilidade de
cada grupo humano. Com base neste pressuposto, avança que a narrativa oral cabo-
verdiana (e mais concretamente as estórias) são basicamente testemunhos de uma
oratura18
nascida do tipo de povoamento que se processou no arquipélago, pois,
evoluiu em conjunto com a própria sociedade. No entanto, uma leitura mais atenta dos
seus segmentos estruturais poderá, possivelmente, revelar contribuições europeias ou
africanas e, por vezes, uma reapropriação simultânea de elementos de ambas as
culturas. Assevera ainda que, em boa parte, as narrativas orais cabo-verdianas
resultaram da coexistência de elementos da cultura africana e da europeia que, depois
incorporados deram origem às novas versões pelo processo de adaptação e pela técnica
do reconto.
A história do boi Blimundo, consagrado pela escrita em dois textos até então
conhecidos,19
constitui um conto tradicional cabo-verdiano cujas origens se perderam na
noite dos tempos.
Narrativa de transmissão oral chegou à actualidade através do circuito
comunicativo específico da literatura tradicional. Contada em todos os cantos dos país,
onde recebe formulações diversas, Blimundo tem conhecido uma infinidade de versões,
infelizmente não recolhidas, correndo o risco de se perderem para sempre. Não sendo
objectivo deste trabalho nem a recolha destes textos nem o estudo comparativo das
diferentes versões, ainda possíveis de resgatar, regista para futuras investigações este
assunto.
17
LOPES, João Filho, «As estórias na Cultura Cabo-verdiana, Revista de Estudos Cabo-verdianos»,
Comissão Nacional p/ a Instalação da Universidade de Cabo Verde, nº 1, Julho de 2005, p. 19 18
Ibid. p.20 19
São as versões escritas de Leão Lopes, objecto de análise neste trabalho e de Aldónio Gomes
constantes da nossa bibliografia.
21
Leão Lopes, autor do texto publicado não há muitos anos, refere no prefácio do
livro que este conto é ainda contado às crianças, pelas ribeiras do interior de Santo
Antão, onde é conhecido, às vezes, com ligeiras nuances de pormenor, em quase todas
as ilhas com tradição de trapiche.
A literatura tradicional cabo-verdiana regista algumas composições versificadas
em torno da figura do boi. Publicadas nas Cantigas de Trabalho, recolhidas por
Oswaldo Osório, constituem um corpus textual que nos remete para a presença de um
ciclo temático em torno do boi, tendo como espaços referenciais as ilhas agrícolas onde
a prática do fabrico do aguardente e do mel da cana do açúcar era uma actividade com
um peso económico significativo – referimo-nos sobretudo às ilhas agrícolas como
Santiago, Santo Antão, Fogo e São Nicolau.
Nestes textos, o boi é um animal mitificado e constitui o tema central o que
demonstra a importância deste animal no desenvolvimento das actividades agrícolas. A
partir destas narrativas e de outras formas poéticas sobre este tema, pode estudar-se a
representação do ciclo do boi e a persistência dessas manifestações no imaginário
popular cabo-verdiano.
4.3. A ESTRUTURA DO CONTO
Quanto à estrutura, podemos dizer que o conto é uma narrativa curta. Caracteriza-
se por uma forte concentração da intriga – unidade de acção, uma célula dramática,
portanto, gravita em torno de um só conflito, um só drama e uma só acção; do espaço –
unidade de espaço; do tempo – unidade de tempo. Integra um número reduzido de
personagens, confere pouca importância às pausas descritivas, mas cede um amplo
espaço ao diálogo, a modalidade discursiva que predomina neste subgénero narrativo.
A unidade de acção corresponde à unidade de espaço, e esta decorre da
circunstância de apenas determinado ambiente encerrar importância dramática. Da
mesma forma que uma única acção possui relevância dramática, um único espaço serve
de teatro ou palco do conflito que o conto revela. Pode dizer-se, consequentemente, que
no conto se processa a determinação do tempo e do espaço na medida em que os demais
22
momentos e lugares são vazios de dramaticidade. Do contrário, pela criação de vários
pólos dramáticos, haveria desequilíbrio interno, e o conto perderia o seu carácter próprio
para se tornar esboço de novela ou de romance.
Poucas são as personagens que intervêm no conto, como decorrência natural das
características apontadas: as unidades de acção, tempo e lugar obrigam à presença de
uma reduzida população no palco dos acontecimentos.
Propp, em Morfologia do Conto, observou que as personagens dos contos
fantásticos, ao mesmo tempo que permanecem muito diferentes na sua aparência, idade,
sexo, género de preocupação, estado civil e outros estados estáticos e atributivos,
realizam ao longo da acção os mesmos actos. Assim, é possível estudar os contos a
partir das funções das personagens: o que muda são os nomes das personagens; o que
não muda são as suas acções ou as suas funções. O conto empresta muitas vezes as
mesmas acções a personagens diferentes. As personagens dos contos, ainda que
diferentes, cumprem as mesmas acções. O próprio modo de realizar uma função pode
mudar: é um valor variável. Mas a função, enquanto função, é um valor constante.
Propp chegou à conclusão de que, no conto maravilhoso, se observam trinta e uma
funções possíveis, assinalando que a ausência de algumas delas não compromete a
ordem das que permanecem nem o seu reconhecimento enquanto tipo estrutural. A lista
de funções representa a base morfológica dos contos maravilhosos em geral. Os contos
começam habitualmente pela exposição de uma situação inicial – designa-se por .
A abertura é seguida das seguintes funções:
I. Um dos membros da família afasta-se de casa (definição: afastamento, designado por
β).
II. Ao herói impõe-se uma interdição (definição: interdição, designada por γ ).
III. A interdição é transgredida (definição: transgressão designada por δ ).
IV. O agressor tenta obter informações (definição: interrogação, designada por ε ).
V. O agressor recebe informações sobre a sua vítima (definição: informação, designada
por ζ ).
VI. O agressor tenta enganar a sua vítima para se apoderar dela ou dos seus bens
(definição: engano, designada por η).
23
VII. A vítima deixa-se enganar e ajuda assim o seu inimigo sem saber (definição:
cumplicidade, designado por θ ).
VIII. O agressor faz mal a um dos membros da família ou prejudica-o (definição,
malfeitoria, designado pela letra A).
VIIIa. Falta qualquer coisa a um dos membros da família, um dos membros da família
pretende possuir qualquer coisa (definição: falta designada por ).
Alguns elementos próprios ao meio do conto, são transportados para o início em alguns
contos.
IX. A notícia da falta ou da malfeitoria é divulgada, dirige-se ao herói um pedido ou
uma ordem; este é enviado em expedição ou deixa-se que parta de sua livre vontade
(definição: mediação momento de transição, designado por B)
Os heróis dos contos são de dois tipos diferentes: 1º heróis os que-demandam-alguem
ex.: se Ivan parte em busca de uma jovem raptada do horizonte paterno é ele o herói do
conto e não a jovem; 2º herói-vitima não há ninguém que vai demandar alguma coisa.
X. O herói que-de-manda aceite ou decide agir (definição: inicio da acção contraria,
designada por C).
XI. O herói deixa a casa (definição: partida, designada por ↑)
XII. O herói passa por uma prova, questionário, um ataque, etc que o preparam para o
recebimento de um auxiliar mágico (definição: primeira função do doador, designada
por D)
XIII. O herói reage as acções do futuro doador (definição: reacção do herói, designada
por E)
XIV. O objecto mágico é posto a disposição do herói (definição: recepção do objecto
magico, designado por F). os objectos mágicos podem ser 1º animais (cavalo, águia,
etc.), 2º objectos de onde saem auxiliares mágicos (o isqueiro e o cavalo, o anel e os
jovens) 3º objectos que tem propriedades mágicos: espada, violino, esfera e muitos
outros; 4º qualidades recebidas directamente como por exemplo a força, a capacidade de
se transformar em animal.
XV. O herói é transportado, conduzido ou levado perto do local onde se encontram o
objectivo da sua demanda (definição: deslocação no espaço entre dois reinos, viagem
com um guia, designado por G)
XVI. O herói e seu agressor defrontam-se em combate (definição: combate, designado
por H)
XVII. O herói recebe uma marca (definição: vitoria, designado por I)
XVIII. O agressor é vencido (definição: vitória, designado por J)
24
XIX. A malfeitoria inicial ou a falta são reparadas (definição: reparação, designado por
K)
XX. O herói volta (definição: volta, designado por ↓ )
XXI. O herói é perseguido (definição: perseguição, designado por Pr)
XXII. O herói é socorrido (definição: socorro, designado por Rs)
XXIII. O herói chega incógnito a sua casa ou a outro país (definição: chegado incógnita,
designado por O)
XXIV. Um falso herói faz valer pretensões falsas (definição: pretensões falsas,
designadas por L)
XXV. Propõe ao herói uma tarefa difícil (definição, tarefa difícil designado por M).
XXVI. A tarefa é cumprida (definição: tarefa cumprida, designado por N)
XXVII. O herói é reconhecido (definição: reconhecimento, designado por Q)
XXVIII. O falso herói ou o agressor, o mau é desmascarado (definição: descoberta,
designado por Ex.)
XXIX. O herói recebe uma nova aparência (definição: transfiguração, designado por T)
XXX. O falso herói, o agressor é punido (definição: punição designado por U)
XXX. O herói casa-se e sobe ao trono (definição casamento, designado por Wºo)
A acção de numerosos contos originários das mais diversas nações, decorre entre
os limites destas funções.
A malfeitoria, o envio ou o apelo de socorro, a decisão de reparar o mal sofrido e a
partida (ABC↑) constituem o nó da intriga. A prova a que o herói é submetido pelo doador,
a sua reacção e recompensa (DEF) constituem um certo conjunto. Outras funções
aparecem isoladas (partida, punição, casamento, etc.).
As funções estão agrupadas segundo certas esferas de acção que correspondem às
personagens que cumprem as funções: 1) a esfera de acção do agressor (ou do mau)
compreende: a malfeitoria (A), o combate e as outras formas de luta contra o herói (H),
a perseguição (Pr); 2 - esfera de acção do doador (ou provedor) compreende a
preparação da transmissão do objecto magico (D), o pôr o objecto magico à disposição
do herói (F); 3- a esfera de acção do auxiliar, compreende a deslocação do herói no
espaço (G), a reparação da malfeitoria ou da falta (K), o socorro durante a perseguição
(Rs), o comprimento das tarefas difíceis (N), a transfiguração do herói (T); 4 - a esfera
de acção da princesa e do seu pai, compreende: o pedido para cumprimento de tarefas
difíceis (M), a imposição de uma marca (J), a descoberta do herói (Q), a punição do
25
segundo agressor (U), o casamento (W); 5- esfera de acção do mandatário, compreende
só o envio do herói. 6 - a esfera de acção do herói, compreende a partida para a
demanda (C↑), a reacção as exigências do doador (E), o casamento (W); 7 - esfera de
acção do falso herói, compreende: a partida para a demanda (C) a reacção as
exigências do doador, sempre negativa (Eneg), e, enquanto função, especifica as
pretensões mentirosas.
Há portanto sete personagens no conto. Além disso existem personagens especiais
para as ligações (queixosos, denunciadores, caluniadores tal como informadores
particulares para a função informação obtida). Uma esfera de acção corresponde
exactamente a uma personagem; uma única personagem ocupa várias esferas de acção;
o caso inverso: uma só esfera de acção divide-se entre várias personagens.
Quanto à linguagem o conto deve ser objectiva e utilizar metáforas de curto
espectro, de imediato compreensão para o leitor. Despe-se da abstracção e de toda a
preocupação pelo rendilhado ou pelos esoterismos. O conto, por seu estofo
eminentemente dramático, deve ser tanto quanto possível, dialogado. Os conflitos, os
dramas, residem na fala das personagens, nas palavras proferidas (ou mesmo pensadas)
e não nos actos ou gestos (que são reflexos ou sucedâneos da fala); sem dialogo não há
discórdia, desavença ou mal-entendido, e sem isso não há conflitos nem acção.
4.4 OS PROCESSOS DE RECRIAÇÃO DA NARRATIVA.
A recriação da narrativa oral, transmitida de boca em boca, segundo Lopes Filho,
deve-se a não fixação das estórias tradicionais, através da escrita (como é sabido a palavra
escrita esta associada à imutabilidade), o que leva a que o seu primitivo autor passe ao
anonimato e, desta forma, cada contador possa ser visto como o possível autor da narrativa.
Mas mesmo assim, esta liberdade de criação de que dispõe o intérprete não pode
levá-lo a cair no exagero, no extremismo, o que conduziria obviamente a criações
arbitrárias. Lopes Filho avança que a criatividade do narrador não é arbitrária por estar
submetida ao sancionamento da respectiva sociedade, mas tal não impede que a
26
“actualização” das estórias dê lugar à existência de múltiplas variantes, por vezes em
resultado de adaptações à vivência sociocultural de cada comunidade.
Se um indivíduo produz inovações ou variações apreciadas pela comunidade, elas
serão imitadas e assim passarão a fazer parte do repertório colectivo da tradição. Se suas
inovações não são aprovadas, elas serão rejeitadas pela comunidade, não entrando assim
no repertório colectivo da comunidade, morrerão com o criador. Assim, sucessivos
públicos decidem se uma determinada estória vai sobreviver e de que forma
sobreviverá. É nesse sentido que o povo participa da criação e transformação da cultura
popular.
Propp afirma que há domínios em que o narrador popular nunca inventa, e há
aqueles em que cria com maior ou menor liberdade. Segundo as análises feitas por este
estruturalista russo, o narrador não é livre nos seguintes domínios:
- na ordem das funções em que a cadeia se desenrola;
- nos elementos cujas espécies estão ligadas por uma dependência absoluta ou
relativa.
- na escolha de algumas personagens em função dos seus atributos, quando não
tem necessidade de uma função determinada.
- na verificação de dependência entre a situação inicial e as funções seguintes:
por exemplo quando é necessário ou quando se deseja utilizar a função A2
(rapto do auxiliar) este auxiliar deve estar inserido na situação inicial.
Por outro lado segundo o mesmo autor o narrador é livre nos seguintes domínios:
- na escolha das funções que omite ou que, pelo o contrário, utiliza.
- na escolha do meio pelo qual a função se efectua. É precisamente este o
caminho que leva, à criação de novas variantes, de novos assuntos, de novos
contos.
- na escolha da nomenclatura e dos atributos das personagens.
- na escolha dos meios que a língua lhe oferece.
Propp acrescenta que, quanto às noções de tema e de variante, é completamento
impossível “distinguir um tema de uma variante. Há apenas duas maneiras de ver as
27
coisas: ou cada transformação origina um novo tema, ou todos os contos têm apenas
um único tema sob diversas variantes. Na verdade, as duas formulações exprimem a
mesma coisa. Deve considerar-se o conjunto dos contos maravilhosos como uma cadeia
de variante.”
A nível intratextual, os intervenientes na construção da mensagem literária são
entidades imaginárias, que não têm existência real, às quais cabe a responsabilidade da
construção e organização do universo imaginário. A enunciação narrativa está a cargo
de um autor textual com funções narrativas que, em termos teoréticos, não poder ser
confundido com o autor real. Na medida em que toda a mensagem literária tem um
destinatário, a este nível, é endereçada a uma instância fictícia que assume as funções de
destinatário intratextual da mensagem. Esta instância é presente, ausente ou virtual, é
designada por narratário. Assim, o circuito comunicativo intratextual estabelece-se entre
um narrador e um narratário, duas criaturas fictícias com funções imaginariamente
diferenciadas.
Todo o texto narrativo, de índole literária, institui um universo ficcional no qual
movem as personagens diegéticas. Contudo, apenas a ficcionalidade não caracteriza
suficientemente o texto pertencente ao modo narrativo, há que ter em conta outras
propriedades textuais como a intertextualidade – todo o texto pressupõe um espaço
intertextual virtual e amplo -, a coerência técnico-semântica e a estratificação – o texto
narrativo é por excelência articulado em diversos estratos (Roman Ingarden).
Esse universo imaginário ou quase-mundo, que o texto cria, articula-se com o real
a partir de um pretenso enraizamento num mundo empírico, com existência histórica,
por um processo de pseudo-referencialidade ou auto-referencialidade, na medida em
que os objectos, os seres, os espaços presentes no mundo ficcional também se
encontram no mundo real. São representados literariamente sob a aparência de
ingredientes do mundo real.
Leão Lopes, o autor do texto em estudo, afirma no prefácio da obra, que
Blimundo era “ um boi imaginário, de grande estatura, símbolo da liberdade no
contexto rural das ilhas, contexto agrícola e com estruturas sociais ainda bem definidas
…” Trata-se de um universo e uma ambiência ruralizantes, em que as figuras de
destaque conformam pólos opostos – de um lado o boi e do outro o Rei, símbolos do
28
poder e da soberania e da opressão, resistência e luta pela liberdade e a vida. Neste
sentido, constitui pano de fundo da acção o mundo rural, sendo descrito pela
enumeração dos elementos que o compõem tais como ribeiras, campos, montanhas,
ruas, apresentando-se como o macro-espaço. O espaço da acção propriamente dito é
extremamente concentrado, como convém ao conto, e resume-se ao micro-espaço
relativo ao pequeno reino.
O narrador reafirma a apresentação feita do herói da história. Ao construir o
enunciado literário apropria-se da adjectivação já utilizada pelo autor do texto e
descreve a entidade imaginária que protagoniza a história, sob uma figura taurina, mas
investido de profundos sentimentos humanos. Um boi, um boiona, um boi de trapiche
que, cansado da vida de trabalho e de cativeiro, ter-se-á revoltado contra o seu amo e
senhor (o Senhor Rei) e fugido para se esconder nas muitas rochas e ribeiras da ilha
(Santo Antão). O Rei que não perdoa esta traição, move contra ele uma grande
perseguição, trazendo-o à sua presença para ser severamente punido. As ordens do Rei
eram: “ Guarda, reúne os soldados e que me tragam o Blimundo, morto ou vivo!”
Enquanto herói da história, Blimundo é descrito como uma figura contraditória.
Se, de um lado, constitui um personagem “ filho das rochas, possante, calmo e sabedor
do mundo, amante da vida e da liberdade, boi respeitado por todos os seus iguais (…)
amigo da harmonia (…) nada fazia que contrariasse a justiça e a ordem natural da
evolução da vida”, por outro era visto, sobretudo aos olhos daqueles que representavam
a lei, a ordem e a justiça, como “irreverente em relação às leis estabelecidas (…)
vagabundo, revoltoso”.
Para além da personagem principal acima descrita, fazem parte deste mundo
construído neste conto outras personagens com estatutos e papéis diferentes. Destacam-
se entre outras, o Rei que se opõe directamente a Blimundo e o rapazinho que o co-
adjuva na captura de Blimundo.
Do ponto de vista teórico, os papéis distribuídos aos personagens constroem-se
em função da teia de relações que se tece em torno das diferentes personagens que
povoam esse universo ficcional. Assim, definem-se em termos de protagonismo e
secundariedade. Aguiar e Silva estabelece a figura do deuteragonista em relação ao
protagonista, referindo-se à personagem secundária de maior destaque na narrativa. No
29
caso concreto de Blimundo, este papel caberá ao Rei, muito embora acumule também o
papel de antagonista, partilhado com o do rapazinho, que tem exactamente a mesma
função. Contudo, se entendido na sua relação com o Rei, este funciona como adjuvante
opondo-se a Blimundo.
As demais personagens, se bem que com alguma importância na história,
integram uma outra categoria identificada por este mesmo estudioso à qual confere a
designação de figuras esparsas ou episódicas. São identificadas como: filhinha do Rei
(codezinha), a vaquinha da praia, a filha do Rei Vaquinha da praia, os soldados, outros
bois e convivas.
30
3.4. Perspectiva estruturalista sobre a versão do conto Blimundo recriado por Leão Lopes: uma aproximação
1ª Sequência:
Era uma vez um boi. Um boi grande, um boiona que se chamava Blimundo.
Blimundo, filho das rochas, possante, calmo e sabedor do mundo, amante da vida e da liberdade, era boi respeitado
por todos os seus iguais, e não só, pelas ribeiras, campos e vertiginosas montanhas. Amigo da harmonia em todas as
coisas, Blimundo nada fazia que contrariasse a justiça e a ordem natural da evolução da vida. Tinha o seu próprio
entendimento do mundo e da liberdade, que ele defendia no quotidiano pelos picos, bordeiras e assomadas.
Situação inicial
Senhor Rei, ao saber das existência de Blimundo e do seu comportamento, que ele considerava irreverente em relação
às leis estabelecida no seu reino, não admitia que boi algum do seu território fugisse à obediência, às demandas dele
senhor todo poderoso, dono das ribeiras, campos, lombos e vertiginosas montanha, dono das aguas e dos trapiches.
y1
Interdição
Que boi julgava ser Blimundo, que procurava com o seu exemplo, tornar irreverente ao Rei, todos os outros bois do
território real? Que bicho depois fazia os trabalhos do campo, faria andar o trapiche para o mel e para o grogue, daria
carne para o sustento à grande e pomposa mesas real? Ainda por cima ele não queria vagabundos no reinado,
revoltosos e bichos que não acatassem às ordens!
1
Transgressão da
interdição
Um Rei é um Rei!Um boi é um boi!
- E, se mando cortar a cabeça de um boi para o meu jantar, têm que me obedecer! – Pensava alto e irritado o
senhor Rei.
- Guarda, reúne os soldados e que me traga Blimundo, morto ou vivo! Ordenou o Rei.
y2
Ordem
31
Saiu a tropa armada de machados, machadins, coletes de ferro, capacete, arpões e afins, espumando, na sede de
cumprir a tão real missão.
Subiram rochas, desceram ribeiras, rebuscaram campos, em busca de Blimundo. A um dado momento da penosa
busca e dum lombo estratégico este os detectou e aguardou.
2
Execução da ordem
No momento decisivo, pensando os heróis do reino – dentro dos seus fatos de ferro e cravo – apanhar o
possante, calmo e sabedor do mundo, amante da vida e da liberdade que era Blimundo, não tiveram mais tempo para
saber contar a história depois.
Blimundo deu conta deles, num estilhaçar de machados, coletes de ferro, capacetes, arpões e afins, com a
sabedoria das rochas que aprendera!
A
Malfeitoria
Não descansou senhor Rei, quando soube da notícia.
B
A notícia da
malfeitoria é
divulgada
2ª Sequência:
O reino está ameaçado por Blimundo, que arrastando na sua irreverência outros bois – dignos servidores do reino –
poderão levar-nos a miséria e a fome! A conduta deste Blimundo e verdadeiramente perigosa para nossa
sobrevivência nesses lombos e ribeiras! Quem depois poderá reinar quando todos os bois tomarem a liberdade?
- Quem fará andar os trapiches?
- Quem fornecerá carne a minha mesa?
- Quem?
- Respondam!
- Quem?
Falta
1.ª Sequência (cont.)
32
- Morte o Blimundo e viva o Rei! - Berrou senhor Rei.
- Viva senhor Rei, – Secundaram os súbditos
y2
Ordem
Estes, fiéis servidores do Rei, obedientes e tementes ao senhor, armaram-se de facas e facões, paus e forquilhas,
fisgas e enxadas e saíram a cata de Blimundo, o possante, calmo e sabedor do mundo, amante da vida e da
liberdade, e amigo da harmonia em todas as coisas.
Os súbditos, ingénuos e obedientes, galgaram lombos, desceram encostas, palmilharam ribeiras, revolveram
furnas, ate que encontraram o procurado.
2
Execução da ordem
Blimundo já os esperava. Sabia que a liberdade que ele tanto amava teria que passar por tão altos preços e que
o senhor Rei não desistiria do intento de o transformar, morte ou vivo, num boi que tivesse que acatar às demandas e
aos abusos do Rei, sem se revoltar.
Deixou os súbditos aproximar e esperou pelo ataque. Foi um encontro rápido e decisivo. Não ficou inteiro um
só homem valente do reino, nem faca nem facão, nem pau nem forquilha, nem fisga nem enxada, em postura de vir a
contar como foi.
Blimundo respirou fundo e angustiado, afastando-se da cena.
A
Malfeitoria
Quando chegaram as notícias ao palácio, Senhor Rei caiu em desespero.
B
Noticia da
malfeitoria
2ª Sequência (cont.)
33
3ª Sequência:
Não tinha mais estratégia de combate ao Blimundo, e não podia suportar a ideia de tão perigoso desafiador à solta. È
nisto que lhe chega a notícia de um rapazinho criado no «borralho de cinza» que lhe promete ir buscar Blimundo.
C
Inicio da acção
contraria o herói
decida agir.
- Quero vê-lo já! – Ordenou Senhor Rei.Trouxeram o rapaz, e o Rei espantado pergunta:
- Tu menino Trazer Blimundo? Esse maldito que me desfez um exército e os meus melhores homens do
reino? Como podes trazer-me Blimundo?
D
O herói passa por um
questionário
- Senhor Rei: dá-me um cavaquinho, um «bli» d´àgua e uma bolça de «prentém» que eu lhe trago
Blimundo e, como recompensa, quero a metade da riqueza do reino e sua «codezinha» * para com ela casar!
F
Recepção do objecto
magico (objecto que
tem propriedades
magicas)
E assim fez Senhor Rei, comprometendo com a recompensa.
w1
Promessa de
casamento
Com o seu saco de «pretém», «bli» d´àgua a tiracolo e seu cavaquinho ao peito, saiu o rapazinho do
palacio, rumo aos campos e ribeiras, lombos e furnas, picos e atalhos, à cata de Blimundo, com todo o sentimento
e sem parar:
Partida do herói
** Oh Blimundo
Senhor Rei mendé-me bem ´shcóbe
pabo bô bê casá q´Vequinha de Praia
Tim-Tim ne nhê cavequim
Cóp-cóp ne nhê prentém
Glú-Glú ne nhê bli d´àga
Oh Blimundo
34
Senhor Rei mendé-me bem ´shcóbe
pabo bô bê casá q´Vequinha de Praia
Tim-Tim ne nhê cavequim
Cóp-cóp ne nhê prentém
Glú-Glú ne nhê bli d´àga
A dada altura, Blimundo do seu esconderijo, ouve a canção que o encanta. Levanta as grandes orelhas e se põe a
escuta com mais atenção. Quando entende bem a mensagem, deixa o rapazinho aproximar:
Canta, canta outra vez! Toca o teu cavaquinho!
Oh Blimundo
Senhor Rei mendé-me bem ´shcóbe
pabo bô bê casá q´Vequinha de Praia
Tim-Tim ne nhê cavequim
Cóp-cóp ne nhê prentém
Glú-Glú ne nhê bli d´àga
B7
Canto de lamento
- É verdade que eu vou casar com a Vaquinha de Praia?
- Não me estás a enganar?
- Não! Respondeu o rapaz.
1
O agressor interroga
o herói
3ª Sequência: (cont.)
35
- Então vou contigo!
O rapaz pede ao Blimundo que se abaixe todo e que o deixe ir montado porque o caminho é longo e duro.
K7
Captura imediata
utilizando astúcia
Blimundo obedece, mais exige:
- Mas... vais a cantar! É tão bonita esta cançlão...
E assim foram:
Oh Blimundo
Senhor Rei mendé-me bem ´shcóbe
pabo bô bê casá q´Vequinha de Praia
Tim-Tim ne nhê cavequim
Cóp-cóp ne nhê prentém
Glú-Glú ne nhê bli d´àga
B7
Canto de lamento
De vez enquanto Blimundo confirmava:
- Mas... eu vou casar com a Vaquinha de Praia?
Foram andando, andando, em direcção ao palácio do Rei.
1
O agressor interroga
o herói
Não pares de cantar! Canta mais perto do meu ouvido! Pedia Blimundo:
Oh BlimundoSenhor Rei mendé-me bem ´shcóbepabo bô bê casá q´Vequinha de Praia
Tim-Tim ne nhê cavequim
Cóp-cóp ne nhê prentémGlú-Glú ne nhê bli d´àga
B7
Canto de lamento
3ª Sequência: (cont.)
36
Entretanto Senhor Rei, pelo sim, pelo não, e com medo do que viesse a acontecer, mandara a tropa colocar-se em
pontos estratégicos do lugar real e ordenara aos súbditos que ninguém se mostrasse quando o rapaz aparecesse com
Blimundo.
y2
Ordem
Já o sol tinha passado para a outra ribeira, quando à entrada do lugar real surgiu Blimundo, pachorrento e
feliz, e sobre ele o rapazinho com o seu cavaquinho.
Regresso do herói
Senhor Rei que esperava no sobrado, não queria acreditar no que estava vendo. Impressionado pela
grandeza do Blimundo, perguntava para si mesmo, como conseguiu o rapaz trazer-lhe o tão arrostado e temido
personagem que muitas noites de sono lhe roubara e muitos estragos ao reino causara.
N
Realização da tarefa
difícil
Blimundo seguiu pela rua principal crivado de olhares de medo através das frestas as portas e janelas,
devidamente trancadas.
Só um amor só uma velha paixão; só esta grande força arrastaria Blimundo, feliz, calmo e confiante, pela
rua que o levaria a enfrentar o Rei que sempre o perseguira pelos seus ideais de amor e de liberdade.
Só a correspondente paixão da Vaquinha de Praia e da enorme vontade de libertar das garras do Rei, o
levaria a enfrentar com suficiente tranquilidade, esse chamado dono das terras, águas, ribeiras, atalhos, furnas e
campos, rochas e lombos.
K4
Reparação da
malfeitoria
Chegados juntos a entrada do palácio, o rapazinho pediu ao Blimundo que o deixasse descer e que o esperasse, pois
tinha que pedir o barbeiro ao Rei para lhe fazer a barba, antes de o apresentar a Vaquinha da Praia.
O rapaz entra pelo palácio dentro e explica ao Rei o seu plano. Veio com ele um barbeiro e seus
apetrechos. Atrás, Senhor Rei, ansioso pelo o desfecho do plano concebido pelo o rapaz.
Blimundo, paciente, deixa-se envolver pela a toalha e ensaboar, enquanto o rei e o rapaz assiste com ar
triunfante a cerimonia.
Blimundo fecha os olhos imaginando a impaciência da Vaquinha de Praia esperando, enquanto o pincel de
barba envolve deliciosamente, com espuma branca e fresca, a sua barba selvagem.
Blimundo deixa-se embalar quase que num sonho e, num ápice, num terrível e certeiro golpe de navalha de
U
Punição do agressor
3ª Sequência: (cont.)
37
1ª Sequência: y1
1 y
2
2 A B
2ª Sequência: y2
2 A B
3ª Sequência: C D F w1 B
7
1K
7 B
7
1 B
7 y
2 N K
4U neg pos
Forma final do conto: y1
1 y
2
2 A B y
2
2 A B C D F w
1 B
7
1K
7 B
7
1 B
7 y
2 N K
4U neg po
barba do barbeiro-carrasco, fica o plano consumado. É traiçoeiramente assassinado Blimundo. Seu corpo cai por
um lado e, nu estrebuchar de revolta e violência, uma bela patada traseira de toneladas de força, atinge o Senhor
Rei que acaba aí o seu reinado.
O rapazinho e o barbeiro fogem espavoridos, mas jamais iam esquecer o último olhar de revolta de
Blimundo, o ultimo olhar que os havia de perseguir eternamente
Blimundo cantou no seu derradeiro fôlego. Cantou na agonia do momento a sua última canção – uma
canção profunda condenadora, bela e terrivelmente melancólica que já mais deixaria de condenar os seus
assassinos.
neg
Resultado negativa
da função
E, no grande banquete a seguir a tragédia, cada bocado de carne no prato dos convivas, levava o sabor de
revolta e da bela e condenadora canção que imortaliza Blimundo, esse sabedor do mundo e das coisas, amante da
vida e da liberdade, amigo da beleza e da harmonia e que nada fazia que contrariasse a justiça e as leis da própria
natureza.
pos
Resultado positiva
da função
3ª Sequência: (cont.)
38
V. CONSIDERAÇÕES FINAIS
Para finalizar o nosso trabalho, podemos afirmar que o conto foi em sua primitiva
forma, uma narrativa oral, circulando ao longo das gerações, pela voz de um conjunto
indefinido de sujeitos individuais, funcionando como um dos principais veículos de
transmissão do conhecimento, mantendo a ligação entre as gerações de uma mesma
comunidade. Posteriormente, os contos orais passam a ser recolhidos e fixados pela escrita
em acto de (re)criação, adquirindo assim uma formulação artística, literária, afastando-se
do domínio colectivo da linguagem para o universo do estilo individual de um certo
escritor, que é um indivíduo empírico, historicamente situado.
Roman Jakobson foi um dos teóricos da literatura que se debruçou sobre a relação
que o intérprete estabelece com a tradição. Conclui que, tal como a língua, também os
contos constituem um tesouro colectivo armazenado na mente dos membros de uma
comunidade. São esquemas relativamente abstractos que sofrem concretizações
diversificadas ao serem actualizados pelos intérpretes.
A narrativa transmitida oralmente está sujeita a modificações, muitas vezes
voluntárias do intérprete. É impossível evitar que toda a vez que o contador conte, pela
repetição habitual dos mesmos episódios, não os vá dispondo e modificando a seu bel-
prazer, apagando-lhes cada vez mais o cunho pessoal e anónimo, para lhes dar carácter
individual, realizando assim o que o prolóquio português ensina: quem conta um conto
acrescenta-lhe um ponto ou retira-lhe um ponto. Pode introduzir-lhes inovações
pontuais, ditadas pela sua imaginação criadora ou pelo próprio contexto situacional,
39
pode reordenar parcialmente os elementos constitutivos do conto e adicionar novos
elementos figurativos, mas, no essencial, o intérprete tem de se submeter à lógica
profunda dos «esquemas» prescritos pela tradição. Ou seja, pode não alterar
profundamente a fisionomia do conto, o que seria condenado pela comunidade.
É de salientar que estes recursos criativos também podem ser utilizados na
passagem do conto oral ao conto escrito, qualquer mudança feita interfere no conjunto da
narrativa dando assim origem a diferentes versões do conto, tal como acontece com o
conto Blimundo que já foi recriado por alguns autores a partir da versão oral anónima
existente.
Podemos observar que as personagens dos contos maravilhosos segundo Propp, ao
mesmo tempo que permanecem muito diferentes na sua aparência, idade, sexo, género de
preocupação, estado civil e outros estados estáticos e atributivos, realizam, ao longo da
acção, os mesmos actos. Isto determina a relação das constantes com as variáveis. As
funções das personagens representam constantes, enquanto que a forma de realizar esta
função é variável.
Podemos isolar as funções das personagens. Os contos fantásticos conhecem trinta
e uma função. A ausência de alguma delas não compromete a ordem das que
permanecem nem o seu reconhecimento enquanto tipo estrutural, como observamos nas
versões recriadas do conto em estudo as verões não apresentam todas as funções, mas a
ausência de algumas delas não influencia a ordem de sucessão das outras. A ausência de
algumas funções não impede que seja feita um estudo comum.
A literatura tradicional cabo-verdiana regista algumas composições versificadas
em torno da figura do boi. Publicadas nas Cantigas de Trabalho, recolhidas por
Oswaldo Osório, constituem um corpus textual que nos remete para a presença de um
ciclo temático em torno do boi, tendo como espaços referenciais as ilhas agrícolas onde
a prática do fabrico da aguardente e do mel da cana do açúcar era uma actividade com
um peso económico significativo – referimo-nos sobretudo às ilhas agrícolas como
Santiago, Santo Antão, Fogo e São Nicolau.
Nestes textos, o boi é um animal mitificado e constitui o tema central o que
demonstra a importância deste animal no desenvolvimento das actividades agrícolas. A
40
partir destas narrativas e de outras formas poéticas sobre este tema, pode estudar-se a
representação do ciclo do boi e a persistência dessas manifestações no imaginário
popular cabo-verdiano.
Enquanto herói da história, Blimundo é descrito como uma figura contraditória.
Se, de um lado, constitui um personagem “ filho das rochas, possante, calmo e sabedor
do mundo, amante da vida e da liberdade, boi respeitado por todos os seus iguais (…)
amigo da harmonia (…) nada fazia que contrariasse a justiça e a ordem natural da
evolução da vida”, por outro era visto, sobretudo aos olhos daqueles que representavam
a lei, a ordem e a justiça, como “irreverente em relação às leis estabelecidas (…)
vagabundo, revoltoso”.
Recorrendo ao processo de antropomorfização e partindo de uma concepção
antropocêntrica da narrativa, o narrador coloca um boi no centro da história, a
representar a figura central, qualidade que o destaca dos demais personagens humanos
que povoam esse universo. Na verdade trata-se de o único animal com forte presença na
história e em forte contraposição aos humanos.
Do ponto de vista simbólico, as imagens dos animais são muito frequentes e
comuns nas narrativas populares. O boi, neste caso, representa o espírito macho
combativo, força fertilizante que ambiguamente pode referir-se tanto à sexualidade
como à perfeição espiritual. Em outros contos populares, o boi, por vezes, evoca a
sensualidade e a impetuosidade masculinas, o poder fertilizante que, ao mesmo tempo,
atrai e mete medo; a energia animal que precisa ser alquimicamente transmutada em
sentimento, para possibilitar o encontro de amor e o restabelecimento da condição
humana plena do ser metamorfoseado.
41
VI. BIBLIOGRAFIA
1. Activa
LOPES, Leão. A HISTORIA DE BLIMUNDO, 2ª edição, Praia-Mindelo, s/d.
2. Passiva
AGUIAR e Silva, Victor. Teoria da Literatura, 8ª edição, Coimbra: Livraria Almedina, 1993.
AWOUWA, J. M. Contes et Fables. Etude, Comprehension. Yaonde: Editions Cle, 1979
BA, Amadou, Hampate, «A palavra, memoria viva na Africa.» O Correio UNESCO, 10-11* (
Nov-Dez), 1979
BETTELHEIM, Bruno. Psicanálise dos Contos de Fadas, Amadora: Bertrand Editora, 1985
BOURDIEU, Pierre. O Poder Simbólico, Lisboa: Difel, 1989
BRAGA, Teófilo. Literatura dos Contos Portugueses, Lisboa: D. Quixote, 1987, Vol. I e II.
BRAGA, Teófilo. O Povo Português, nos seus Costumes, Crenças e Tradições, Lisboa: D.
Quixote, 1985-86, Vol. I e II
CASCUDO, Luís da Camara. Literatura oral no Brasil, 2ª Ed., Rio, 1978
42
CARDOSO, Pedro. Folclore Cabo-verdiano, Edições fac-similada do Instituto de Solidariedade
Cabo-verdiana, Paris, 1983.
COELHO, Adolfo, Contos Populares Portugueses, Lisboa: D. Quixote, 1985
DIEGUES, Manuel. Literatura popular em verso, Editora Itatiaia Limitada, Belo Horizonte,
1986.
FERREIRA, Manuel. Aventura Crioula, Lisboa: Plátano Editora, 1973
GOMES, Aldónio( org.).Eu Conto, Tu Contas, Ele Conta...Estórias Africanas, Lisboa: Mar
além & Instituto Camões, 1999.
LIMA, Francisco, Assis de Sousa. O Conto Popular e a Comunidade de Narrativa,
FUNARTE, Instituto Nacional do Folclore, 1985.
LIMA, Herman. Variações Sobre o Conto, Rio de Janeiro, 1952.
LIMA, Mesquitela, A Antropologia do Simbólico, Lisboa: Presença, 1983
LAUSBERG, Heinrich. Elementos de Retórica Literária. Lisboa: Fundação Calouste
Gulbenkian, 1972.
LOPES, Ana Cristina Macário, Analyse Semiotique des Contes Traditionnels Portugais,
Coimbra: INIC/C.L. da Universidade de Coimbra, 1987
LOPES, Ana Cristina Macário, «Literatura Culta e Literatura de transmissão Oral», Cadernos
de Literatura, Coimbra, n. 15, 1983
LOPES, João Filho, «As estorias na Cultura Cabo-verdiana, Revista de Estudos Cabo-
verdianos», Comissão Nacional p/ a Instalação da Universidade de Cabo Verde, nº 1, Julho de
2005, p. 19 a 34.
MASSAUD, Moisés. Conceito e Estrutura do Conto, Lisboa: Assis Editora, 1964
MATOS, Maria Vitalina Leal de. Introdução aos Estudos Literários, Lisboa: São Paulo,
Editorial Verbo, 2001.
43
PROPP, Vladimir. Morfologia do Conto, 2ª ed. Lisboa: Vega, 1983.
PROPP, Vladmir. As Raízes Históricas do Conto Maravilhoso, São Paulo, 1997.
REIS, Carlos. O conhecimento da Literatura: Introdução aos Estudos Literários, Coimbra:
Livraria Almedina, 1995.
REIS, Carlos e Cristina Lopes, Dicionário de Narratologia, Coimbra, Almedina, 1987.
RODRIGUES, Adriano Duarte. «Os Símbolos do Encantamento nos Contos Populares
Portugueses», Lisboa: Dep. de Antropologia da FCSH. Ethnologia, n. 1, 1983
ROMANO, Luís. Cabo Verde – Renascença de uma civilização no atlântico médio, 2ª edição da
Revista Ocidente, Lisboa, 1970.
ROSÁRIO, Lourenço J. da Costa. A Narrativa Africana de Expressão Oral, Instituto de Cultura e
Língua Portuguesa, 1ª Ed. 1989.
VEIGA, Manuel (cord). Cabo Verde Insularidade e Literatura, Edições KARTHALA, Paris.