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O dos Castelos
"O dos Castelos" o primeiro poema de Mensagem, estando por isso inserido na primeira parte da
obra, intitulada "Braso" e, dentro desta, numa subparte designada "Os Campos". O campo a parte
inferior do escudo nacional e tem duas partes: a dos Castelos e a das Quinas. Daqui surge o nome do
poema: O (Campo) dos Castelos. Recordar que o outro poema que integra este primeiro andamento
de Mensagem se intitula O (Campo) das Quinas.
Neste poema, Fernando Pessoa descreve a Europa e descreve-a como um ser feminino deitado
sobre os cotovelos, fitando (ter presente a diferena semntica entre olhar e fitar) De Oriente a
Ocidente, com romnticos cabelos (que representam a herana cultural do Norte da Europa) e
olhos gregos (que simbolizam a herana cultural do Sul europeu, a herana cultural grega). Por esta
descrio, fcil detetar a personificao da Europa, que se estende por toda a composio potica. Por
outro lado, convm atentar na expressividade do verbo jazer, que significa estar deitado, mas
tambm estar morto ou como morto. Ora tal pode significar uma aluso necessidade de despertar
de uma certa letargia o continente europeu e conduzi-lo na senda da construo de um novo imprio.
Seria interessante refletir sobre o chamado projeto europeu (Comunidade Europeia) e num certo
adormecimento da sua construo, bem como sobre as esperanas depositadas no Tratado de Lisboa.
A segunda estrofe comea por refletir a disposio dos cotovelos: o esquerdo representado pela
Itlia, enquanto o direito pela Inglaterra. Tal disposio reitera o que foi dito acerca dos cabelos e dos
olhos, isto , remete para as razes culturais europeias: o Norte e o Sol, a cultura romntica e a cultura
greco-latina.
Os versos 9 e 10 retomam a forma verbal fita e caracterizam o olhar da Europa: esfngico e
fatal. Esta dupla adjetivao associa, atitude expectante e contemplativa, as noes de enigma e de
mistrio (convm rememorar a lenda associada Esfinge egpcia) com que a figura feminina fita o
Ocidente, que representa a sua vocao (da Europa, leia-se) histrica, isto , o futuro que j
desvendou no passado e que promete voltar a repetir-se futuramente. Ora, no ltimo verso, Portugal
apresentado como o rosto da Europa, onde se situa o tal olhar que fita o Ocidente. Associando
os dois ltimos versos do texto, podemos concluir, neste contexto, que o Ocidente constitui,
efetivamente o futuro do passado (paradoxo), isto , o trajeto que conduzir Portugal a dar
cumprimento misso histrica que repete o passado (dos Descobrimentos). Em suma, o pas de
Cames e do prprio Pessoa ser, metaforicamente, a locomotiva que guiar a Europa na senda desse
futuro esperanoso.
Simbolicamente, este primeiro poema da Mensagem apresenta a imagem de uma Europa
decadente (A Europa jaz, isto , est prostrada, est morta), que vive das glrias do passado (as
origens gregas, a expanso romana e o imprio colonial ingls). Neste contexto, Portugal surge como o
nico pas, com o papel messinico que Pessoa lhe atribui, capaz de fazer ressurgir e renascer o
continente europeu. Portugal dever recuperar o seu estatuto de potncia civilizadora de que j
usufruiu no passado e fazer retornar a Europa glria do passado. curioso observar como, no atual
(2011) contexto de crise e de impasse da Unio Europeia, Fernando Pessoa est cheio de razo quando
apresenta esta imagem de um continente morto espera de algum com valor suficiente para a
ressuscitar.
Anlise do poema O dos Castelos de Fernando Pessoa e a sua intertextualidade com Lus de Cames
1) A Europa aparece personificada neste primeiro poema a Mensagem.
1.1) Procede sua caracterizao, recolhendo os elementos que o poema fornece.
R: A Europa aparece como uma figura feminina Romnticos Cabelos e Olhos Gregos - nessas
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respetivamente do norte (Romnticos) e de sul (Gregos) - deitada sobre os cotovelos, apoiando o rosto
que Portugal na sua mo direita. A Europa olha para o ocidente
1.2) Salienta a importncia dos olhos, referindo o valor da repetio do verbo fitar e dos adjetivos que
caracterizam o olhar no verso 10.
R:O (Olhar esfngico e fatal) da conta da atitude expectante e contemplativa, enigmtica e misteriosa,
com o velho continente Fita (O ocidente) que representa a sua vocao histrica, o futuro que a
Europa j desvendou do passado e que se apresenta agora como comea de novo tudo.
1.3) Explica por que razo pode afirmar que a posio dos cotovelos evoca as razes culturais da
identidade europeia.
R: A posio dos cotovelos estrategicamente colocados em Itlia e em Inglaterra reitera a referencia as
razes culturais da identidade europeia.
1.4) Esclarece o uso do verbo jazer que caracteriza a postura desta figura feminina - a Europa.
R: Jazer significa estar deitado, mas to bem estar morto. O uso deste verbo poder estar relacionado
com a necessidade de despertar um continente adormecido. Portugal (Rosto da Europa) poder
despertar o velho continente na procura de um novo imprio espiritual (5Imperio).
2) Explica, por palavras tuas, os dois ltimos versos do poema.
R: A Europa olha para o ocidente e o ocidente que Portugal (Futuro do Passado) isto o caminho que
levara Portugal a cumprir a sua misso histrica que continua no passado.
O ltimo verso do poema evidencia o papel do sujeito potico preconiza (destinou) Portugal: guiar a
Europa.
Comentrios:
O poema uma descrio do mapa da Europa que Pessoa assemelha a uma mulher reclinada. Compare-se com um trecho d' Os Lusiadas de que a parte referente a Portugal pode ser lida (com comentrios meus) seguindo este "link", ou a totalidade (a partir da Estncia 6) este outro. O campo dos castelos representa a materialidade (ver "O das Quinas").
"olhos gregos, lembrando"- lembrando a herana cultural da Europa que Pessoa remontava Grcia Antiga.
"olhar esfngico e fatal"- olhar enigmtico (imperscutvel) e (mas) pr-destinado. Note-se que, por fidelidade, foi mantida a ortografia original o que permite, tambm, conservar a mtrica que seria alterada pela grafia "esfngico" em vez de "sphyngico". Ao que parece, Fernando Pessoa favorecia a ortografia clssica por razes de estilo mas tambm de elitismo.
"o Ocidente, futuro do passado"- o Mar, onde a Europa se lanou, atravs de Portugal, na grande Idade das Descobertas com a qual traou o seu prprio futuro (o actual e, pensa Pessoa, tambm o futuro a haver).
O das Quinas
Comentrios:
"Os Deuses vendem quando do" uma frase que remonta pelo menos Grcia Clssica e que corresponde a uma viso mesquinha da divindade: os favores dos deuses pagam-se!
"Ai dos felizes porque so s o que passa"- a felicidade transitria e os que se contentam em ser apenas felizes no tm consequncia na Histria; "Baste a quem baste...etc"- a mesma
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noo referida: a quem basta o que tem, por esses limites se fica! "ter tardar"- a posse do bastante adia os cometimentos.
"Foi com desgraa e...etc"- mas Deus tem outro ideal: concebeu o Cristo para ser infeliz e baixo (e, contra a natureza humana, para no desejar felicidade material ou posses) e, tendo-o assim determinado, sagrou-o como Filho, mostrando o Seu caminho (no material, mas espiritual). O campo das quinas simboliza, em geral, a espiritualidade em Portugal, o sonho. Em particular um elogio ao sacrifcio da felicidade material a altos ideais (que o poeta cria ser o seu prprio caso).
Ulisses
Este poema pertence primeira parte da "Mensagem", em que se aborda a problemtica da origem, do
princpio ou da fundao de Portugal. Na origem estaria Ulisses, o navegador errante, que, segundo a
lenda, teria sido o fundador de Lisboa. A origem estaria no mito. Mas o que o mito? E porque situar a
origem no mito?
"Efabulaes mais ou menos complexas, de feio popular, que constituem um verdadeiro tesouro de
sabedoria, transitam de gerao em gerao, sob forma simblica. Apontam para os caminhos que
conduzem a Deus, indicam estdios de iniciao e encerram verdades profundas, inefveis, os mais
profundos e misteriosos tesouros da verdade espiritual, prolas de beleza to rara e to etrea que no
suportam ser submetidas ao exame da anlise intelectual; so dados Humanidade pelos grandes
Instrutores para a protegerem e encaminharem no seu desenvolvimento espiritual".
Para Fernando Pessoa, Portugal encontrar na sua prpria alma "a tradio dos romances de cavalaria,
onde passa, prxima ou remota, a Tradio Secreta do Cristianismo (...), a Demanda do Santo Graal.
Todas essas coisas, necessariamente dadas em mistrio, representam a verdade ntima da alma, a
conversao com os smbolos."
" luz desta concepo de mito que se pode compreender o oxmoro "O mito o nada que tudo":
nada, porque, oculto, nada significa; tudo, porque, desvendado, revela a Verdade.
A anttese repete-se em expresses diferentes, de contedo semelhante: "sol (...) brilhante e mudo"; "O
corpo morto de Deus / vivo e desnudo".
"E Ulisses , como o sol, um mito brilhante e mudo - um mito da criao. Transformou-se em lenda,
empalideceu, deixou de significar, mas "escorre", "fecunda" e "decorre" ocultamente. Em baixo,
Portugal, a vida, perdida a transparncia do mito, esquecida a verdade que ele transporta, degrada-se,
"morre".
A origem da nacionalidade est no Alm, ao seu domnio pertencem os gestos arquetpicos dos
antepassados que criaram a ptria. Todos os heris, enquanto vivos, cumprem uma misso de procura e
revelao de uma realidade que os transcende. Os actores perdem-se na poeira do tempo, a lenda
deturpa-os, a tradio (re)conhece-os, o mesmo povo que os adultera identifica-se com eles.
O desenvolvimento do poema faz-se em trs momentos:
A primeira estrofe em que se apresenta uma definio de mito. Logo no primeiro verso
deparamos com uma das caractersticas frases lapidares da "Mensagem", para, nos restantes
quatro, ser concretizada a sua generalidade e justificado o seu carcter antittico. O mito um
sol brilhante que "abre", isto , revela os cus, mas mudo. "o corpo morto de Deus"
tornado vivo e revelado. O mito luz que abre caminho para o Todo, mas ao homem que
compete a caminhada.
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A segunda estrofe refere-se propriamente a Ulisses ("Este que aqui aportou") e tem, portanto
uma feio particularizante. O poeta enquadra a lenda da fundao de Lisboa pelo heri grego
dentro dos parmetros definidos no primeiro verso. A lenda da sua passagem pela costa
portuguesa foi/ suficiente para justificar o nome da cidade e, mais do que isso, emprestar
solidez e dignidade sua origem: "Este, que aqui aportou, (...) Sem existir nos bastou. (...) E nos
criou".
A terceira estrofe uma concluso. Iniciada pela palavra "assim", define as relaes da
lenda/mito com a realidade. A lenda o fermento da realidade, o seu elemento fecundante: "A
lenda se escorre / A entrar na realidade, / E a fecund-la decorre". A lenda a origem, vem de
cima, do alto dos tempos, e, sem ela, "em baixo", a vida, que "metade de nada, morre".
Necessrio se torna, aqui, atentar na dicotomia ideal - lenda (mito) / real (vida) - de sabor platnico e
to explorada por Fernando Pessoa. De grande expressividade so, entre outros recursos estilsticos, o
uso do oxmoro, logo no primeiro verso e ao longo de todo o poema, a explorao do paradoxo
("metade de nada"), a metfora ("o sol que abre os cus"; "a lenda se escorre") e a personificao ("E a
fecund-la decorre"; "Em baixo, a vida (...) morre").
Significativa tambm a alternncia dos tempos verbais:
1. na primeira estrofe predomina o presente, porque estamos perante uma definio do mito,
algo permanente;
2. na segunda estrofe destaca-se o pretrito, porque se evoca a origem, o acto mtico da
fundao;
3. e na terceira h uma recuperao do relevo do presente, porque se conclui que a lenda
essencial realidade, o cerne da continuidade.
Resumindo:
Trata-se de um heri fundador, de base mtica. Da que o poema, em trs quintilhas, com versos
rimados, oscilando entre as 7 e as 4 slabas, se inicie com a assero: "O mito o nada que tudo".
Trata-se de uma das muitas afirmaes da ordem do oxmoro ou paradoxo, presentes sobretudo na
segunda estrofe. O mito, diz Pessoa, no existe - o nada - , mas tem a fora de ser tudo, porque
fecundante (terceira estrofe).
A primeira estrofe uma espcie de definio, seguindo o esquema normal de qualquer definio:
(Sujeito) -> (Predicado: verbo ser) -> verbo predicativo)
O mito -> -> o nada que tudo
Como tentativa de definio, as formas verbais encontram-se no presente do indicativo. O mito, o nada,
uma vez revelado, passa a ser tudo (tal como o sol, "mito brilhante e mudo" que, revelado, "passa a
corpo morto de Deus / Vivo ou desnudo").
A segunda estrofe inicia-se por um dectico - Este - que se refere a Ulisses, presente no ttulo; ao iniciar-
se por um dectico, a estrofe passa a ser uma tentativa de concretizao da definio da primeira
estrofe. Ulisses, figura do passado (verbos no pretrito - aportou - foi - nos bastou - foi vindo - criou),
no existiu, de facto - mas bastou-nos como lenda ("Sem existir nos bastou - e nos criou".), lenda
portadora de fora vivificante.
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Na terceira e ltima estrofe, a passagem do nada ao tudo: a lenda vem (escorre) de cima; ao entrar na
realidade, fecunda-a - fazendo o "milagre" de tornar irrelevante a vida c de baixo, dita do mundo real,
objectivo: "Em baixo, a vida, metade / De nada, morre". S readquire vida aquilo que o mito / nada tudo
fecunda - e o processo no do passado, mas intemporal - de onde os tempos verbais de presente.
irrelevante, parece dizer Pessoa desde este poema, que as figuras de que vai ocupar-se, os heris
fundadores, tenham tido ou no existncia histrica - o que importa que todos eles tenham
funcionado com a fora do mito, que, no existindo, tudo. Por isso, todos os heris que se seguem so
heris mitificados, ainda que com existncia histrica, feita de sucessos ou fracassos, no importa. Um
deles sem dvida, "D. Dinis".
Comentrios:
"O mito o nada que tudo"- esta frase exprime a ideia que Fernando Pessoa tinha dos mitos como potenciais motores sociolgicos. Mesmo se falso (isto , mesmo que no seja nada) um mito tem o potencial de provocar comportamentos sociais e, portanto, facilitar a evoluo de uma nao segundo determinados vectores.
"O mesmo sol que abre os cus...etc"- provvel referncia aos deuses solares (ou mitos afins) que todos os dias eram supostos renascer alvorada, depois de terem "morrido" no poente anterior.
"Este que aqui aportou"- referncia a Ulisses, heri lendrio da Odisseia e fundador mtico de Lisboa, onde teria aportado numa das suas navegaes ("Lisboa" deriva de Olisippo e Ulixbona- em cuja raiz alguns creem ver o nome de Ulisses ou Odisseus).
"Foi por no ser existindo"- porque no era, foi existindo; foi-se insinuando na nossa realidade.
"a fecund-la decorre"- a lenda tem uma interaco positiva com a realidade; "A vida, metade de nada, morre"- a vida por si s nada vale porque logo desaparece (mas o mito persiste!).
Viriato
Comentrios:
"Se a alma... etc"- a nao portuguesa representa, segundo Pessoa, a memria colectiva do instinto de identidade e independncia personificado por Viriato.
"povo porque ressuscitou (...) o de que eras a haste"- somos um povo porque renasceu (aps a presena romana, nrdica e islmica) o esprito nacional de que Viriato foi a origem.
Fernando Pessoa tem uma predileco pelo uso, literal ou simblico, do termo "antemanh", isto , o periodo antes do alvorecer quando comea a despontar uma luz muito tnue. Aqui o poeta compara Viriato antemanh da nacionalidade portuguesa.
Na Mensagem de Fernando Pessoa, o guerreiro e chefe lusitano visto como o fundador da terra
lusitana, aquele que cujos atos fez de Portugal um pas genuno tendo em conta que no caiu em
esquecimento por parte da nao. por esse reconhecimento por parte do povo e feitos heroicos que
este pas se fundou.
Passando agora para a ltima estrofe:
Teu ser como aquela fria / Luz que precede a madrugada,/ E j o ir haver o dia/ Na antemanh,
confuso nada.
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Pode ser interpretada de dois modos:
Ou Pessoa tenta encarar a figura como uma luz ao fundo do tnel, isto uma imagem positiva
do renascer, ou seja, como se Viriato viesse de repente salvar aquilo que de antes era o escuro,
o vazio, o nada, onde nada de bom acontecia.
Ou ento a estrofe pode resumir-se em apenas Teu ser, confuso nada que deixou de existir,
a dita fria luz que precede a madrugada um tipo luz que existe apenas naquele momento
do dia e depois desaparece, do nada veio do nada vai, e o mesmo pode ter acontecido com
Viriato, foi apenas uma figura que existiu, deixou a sua marca e quando desapareceu voltou a
situao ao que era antes ficando apenas a sua memria.
Intertextualidade:
Nos Lusadas canto III estrofe 22 a figura de Viriato entendida como um homem de grandes feitos.
O Conde D. Henrique
Para uma anlise completa, convm localizar o poema que me proponho a tratar: O Conde D. Henrique
o 3 texto do conjunto II Os Castelos, da 1 parte da Mensagem denominada Braso.
Convm tambm lembrar as diversas simbologias associadas ao n 3:
Representao da totalidade atravs da unio DEUS/UNIVERSO/HOMEM;
Ligao figura de Cristo e espiritualidade (PAI/FILHO/ESPRITO SANTO);
Fases da existncia NASCIMENTO/CRESCIMENTO/MORTE, que alis esto cada uma respetivamente
associada simbologia das trs partes da Mensagem BRASO/MAR PORTUGUS/ENCOBERTO
(estrutura tripartida).
Passo ento anlise concreta do poema. Conde D. Henrique, contribuiu para a fundao de Portugal,
para a criao da nossa nacionalidade, foi o fundador do Condado Portucalense.
Apesar de o poema possuir este ttulo, pouco est ele relacionado diretamente com a personagem. O
texto ultrapassa mesmo a figura de Conde D. Henrique atravs de afirmaes altamente simblicas.
Na 1 estrofe, o heri (Conde D. Henrique) atua como agente de Deus, comandado por uma fora que o
transcende, uma fora que o faz agir inconscientemente.
D-se portanto incio a um percurso espiritual. O que este percurso pretende atingir, a ideia de que
mais importante do que a terra (matria), o esprito, os valores sobre os quais ele (heri) vai criar as
suas razes.
Podemos de certa forma, atravs deste conceito de heri inconsciente, fazer a seguinte questo de teor
filosfico: at que ponto que o Homem autnomo?
Resumidamente, nesta 1 estrofe o heri imvel assiste ao desenrolar involuntrio de alguma aco.
A espada, smbolo de guerra, de morte. Ser esta a mensagem que Pessoa querer fazer passar? No,
aqui a espada funciona paradoxalmente. No de guerra verdadeira que fala o poeta, de guerra
ignorncia. Poder ainda ser interpretada como smbolo flico, pela sua forma longa e comprida,
simbolizando a fecundao dos campos, a criao de vida.
Ora, nesta 2 estrofe o heri desce o olhar na espada e faz aquela interrogao retrica Que farei eu
com esta espada?:
Pessoa conclui ento o poema com a finalizao do ato, a concretizao de algo por parte do heri, o
nascimento de Portugal.
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Comentrios:
D.Henrique: "Todo o comeo involuntrio. Deus o agente"- exprime a ideia de Fernando
Pessoa segundo a qual o Destino rege inexoravelmente a Histria e foi traado por Deus desde a origem dos tempos. Assim, aqueles que, na Terra, determinam a Histria no so mais do que agentes da vontade primeva de Deus e assistem aos seus prprios actos confusos ("vrios") e inconscientes de estar a cumprir um plano.
" espada em tuas mos achada... etc"- A ideia anterior particularizada para o pai de D.Afonso Henriques, que talhou espada os alicerces da futura independncia de Portugal. Confuso, pegou em armas e inconscientemente cumpriu a sua misso na Terra... O trabalho que lhe estava destinado "fez-se" (isto , cumpriu-se, no por sua vontade, mas pela de Deus).
D.Tareja
O poema D. Tareja enquadra-se na primeira parte da Mensagem. a parte onde Pessoa
apresenta em termos herldico-histricos e simblicos, a proposta portuguesa ao mundo,
usando as palavras do eminente Pessoano, Antnio Quadros. D. Tareja mais no que a fonia
medieva de D. Teresa, me de Afonso Henriques e por isso comeo e origem de Portugal, pelo
menos simbolicamente.
A primeira quadra do poema diz-nos que cada nao um mundo a ss, que todas so
mistrios. O mistrio, para o ocultista, apenas o destino ainda por ser, o destino que espera
ser cumprido no futuro e que por isso se vai necessariamente revelar. A me de reis e av de
imprios o comeo do revelar desse mistrio, desse destino por ser. Cumpre-se nela o
mistrio no nascimento do nosso primeiro rei, efectivo instrumento e agente do destino nas
suas obras. D. Teresa de facto me de reis D. Afonso Henriques e av de imprios se
entendermos que a partir de Afonso, a ideia de Imprio se comearia a formar.
Na segunda quadra indica-se que D. Teresa amamentou com seio augusto D. Teresa era
filha do rei de Leo e Castela D. Afonso VI e com bruta e natural certeza, o que, imprevisto,
Deus fadou. A bruta e natural certeza, decerto uma directa referncia maneira como,
depois de criar o futuro rei, este entrou em conflito com a sua me, batalhando-a para o
controlo do Condado Portucalense, em 1128. Imprevisto era tambm o novo rei, porque vizinho
de grandes potncias, que iriam for-lo a lutar sobremaneira para se afirmar no futuro, contra
as maiores probabilidades do seu fracasso do que do seu sucesso. Mas D. Afonso Henriques,
fadado por Deus, no iria vacilar.
A terceira quadra parece ser a mais simblica e por isso de mais difcil interpretao. Parece-
nos no entanto claro que Pessoa, nas duas primeiras linhas, se refere aos actuais governantes
(actuais, claro dos anos de 1930 em Portugal). D a tua prece outro destino, a quem fadou o
instinto teu!: Tem de se ler esta passagem como: que a tua prece nos guie em melhor
direco, do que aquela que seguimos por ordem de quem deu seguimento hodierno ao que tu
iniciaste. Critica social implcita, parece esta ser a melhor interpretao para esta passagem.
Tal como o teu menino envelheceu poder nada mais significar que a memria do rei
primeiro, do impulso e da vontade de independncia e de orgulho se iam diluindo, sobretudo
desde o triste episdio do mapa cor-de-rosa com Inglaterra e o crescente diminuir do poder de
Portugal no mundo, ainda ultramarino, mas cada vez mais pobre e isolado, deitado a uma
ditadura soturna, sem indstria, sem riqueza e sem originalidade.
Veja-se que a ltima quadra confirma o que dissemos da terceira: todo o vivo eterno infante,
ou seja, e mais coloquialmente: a esperana nunca deve ser perdida. H dentro do homem o
poder regenerativo de alterar as coisas, fazer revolues, voltar origem para melhorar, para
ser maior do que pode ser. Infante ou menino, infante ou original. Pede Pessoa, a D. Teresa
ou mesmo ao infinito, que de novo se crie esse portugus ambicioso e original, movido pela
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vontade e pelo destino de ser maior do que pode ser. O antigo seio l est, vigilante, D.
Teresa que deu luz ao primeiro rei, para servir de modelo, de arqutipo sem vida, mas com
mais do que apenas vida, j feito smbolo, origem, nascente de toda a nobreza e coragem de
superar as adversidades.~
Comentrios:
D.Tareja (verso arcaica do nome de D.Teresa, me de Afonso Henriques): "cada nao todo o mundo a ss"- cada nao constitui um todo que, enquanto tal, diferente de todas as outras;
"me de reis e av de imprios"- refere-se linhagem real portuguesa que dela originou e ao futuro Imprio.
"...com bruta e natural certeza"- "bruta" significa aqui "de acordo com a natureza" e portanto "bruta e natural" constitui um pleonasmo (isto , uma repetio).
"o que, imprevisto, Deus fadou."- Aquele que Deus determinou (que fundasse Portugal- isto , Afonso Henriques). "imprevisto" porque improvvel- o primeiro rei de Portugal enfrentou guerras contra o poderoso reino de Castela e Leo, e contra os potentados islmicos. As probabilidades de sucesso pareciam, partida, muito remotas, de onde a improbabilidade.
"d tua prece outro destino"- faz com que Afonso Henriques seja visto pela Histria a uma luz mais favorvel (ver a NOTA final).
"Mas todo vivo eterno infante/ Onde ests e no h o dia"- no reino dos mortos Afonso Henriques sempre menino para a sua me (?).
"No antigo seio vigilante de novo o cria"- d-nos outro lder do mesmo calibre (?)
D.Afonso Henriques
Breve comentrio:
O sujeito potico dirige-se ao rei D. Afonso Henriques, "Pai" (da nacionalidade) - apstrofe -
dizendo-lhe que foi cavaleiro, que lutou pela nacionalidade portuguesa e que "hoje a viglia
nossa", a nossa vez de prosseguirmos a luta para um destino maior, por isso, o sujeito lrico
pede ao rei que nos d a sua "inteira fora", o seu "exemplo inteiro".
D. Afonso Henriques equiparado a Deus, tendo como misso combater os infiis.
Atente-se no vocabulrio de dimeno sagrada: viglia, infiis, bno.
Note.se a referncia ao aparecimento de Deus a D. Afonso Henriques na Batalha de Ourique.
Fernando Pessoa confiava que o destino de Portugal ia ser esplendoroso e ao dizer no poema
"hora errada" teme que a caminhada de Portugal para o seu destino sofra retrocessos.
Os "novos infiis" so as pessoas que, na opinio de Fernando Pessoa, criavam obstculos, ou
poderiam vir a cri-los, ao destino glorioso que ele sonhava para Portugal.
Repeties de palavras "inteiro"/ "inteira", "espada", bno".
Apstrofe, repetio, adjectivao, comparao...
Comentrios:
"Pai" (da nacionalidade).
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"hora errada"- pocas em que a caminhada de Portugal para o seu destino- que Pessoa
confiava ir ser esplendoroso- sofra retrocessos.
"novos infiis"- pessoas que, na opinio de Fernando Pessoa, criavam obstculos (ou viriam a
cri-los...) ao destino glorioso que ele sonhava para Portugal.
D.Dinis
Trata-se de um poema da primeira parte o Braso da Mensagem- colectnea de poemas
de Fernando Pessoa, escrita entre 1913 e 1934, data da sua publicao. Dentro desta integra-
se nos Castelos semelhana do poema Ulisses. Esta obra contm poesia de ndole pico-
lrica participando assim das caractersticas deste dois gneros. Relativamente sua matriz
pica devemos destacar o tom de exaltao herica que percorre esta obra; a evocao dos
perigos e dos desastres bem como a matria histrica ali apresentada. No atinente sua
dimenso lrica, podemos destacar a forma fragmentria da obra, o tom menor, a interiorizao
da matria pica, atravs da qual sujeito potico se exprime.
Nesta primeira parte da obra que nos propomos analisar aborda-se a origem, a fundao o
princpio de Portugal. O ttulo D. Dinis remete-nos para os primrdios da nossa nacionalidade,
assumindo assim o poeta a perspectiva longnqua de D. Dinis, observando no sculo XX
posteriori a empresa dos Descobrimentos.
Em termos formais, constatamos que o poema constitudo por duas estrofes, de cinco versos
(quintilhas). Quanto ao metro e ao ritmo os versos so irregulares. O segundo verso de cada
estrofe tem oito slabas mtricas, enquanto os restantes so decassilbicos. Predomina o ritmo
binrio, aparecendo tambm o ternrio, no verso primeiro da segunda estrofe. A rima sempre
consoante, variando entre rica e pobre, e obedece ao seguinte esquema rimtico: abaab, com
rimas cruzadas, emparelhadas e interpoladas, portanto. O verso decassilbico, de ritmo largo,
adequa-se expresso de uma mensagem que traduz o meditar repousado de um poeta que
rei e vai ao leme de um povo que quer ser grande.
Ainda ao nvel das sonoridades merecem destaque as assonncias (alterao entre vogal
aberta e fechada) e as aliteraes em sibilantes. Esta repetio de sons produz um conjunto
harmnico de versos que combinam as potencialidades do significado com o significante. D.
Dinis poeta e o criador de condies necessrias s navegaes. Surge assim num
contexto verbal que enquadra esses sentidos: consubstanciando matria pica e lrica, jogando
com o tempo histrico de futuro adivinhado.
Na primeira estrofe o sujeito lrico imagina D. Dinis a compor um cantar de amigo. Eis-nos
diante do rei poeta. J no segundo verso o lavrador que emerge. Seria dos pinhais plantados
por D. Dinis que viria a madeira com a qual se construiriam as naus para os descobrimentos. D.
Dinis representa a certeza adivinhada do futuro. A expresso ouve um silncio mrmuro
consigo, contendo um oxmoro reala a atitude meditativa do rei que, como um rei-mago, ao
escrever o seu cantar de amigo profetiza j a epopeia martima dos portugueses. O sujeito
lrico recua no tempo e escuta com o rei o rumor dos pinhais que ondulam ( metfora de
inspirao marinha).. Esta metfora e a personificao contidas na expresso o rumor dos
pinhais como um Trigo de Imprio sugere que esse sussurrar pressentido por D. Dinis era a
fala misteriosa dos pinhais que j ondulavam na imaginao do poeta como um trigo de
imprio. Esta metfora extremamente expressiva. Os pinhais contribuiriam para permitir a
expanso portuguesa e esta criaria a riqueza do nosso imprio. O po smbolo de alimentos
de poder econmico, sendo o trigo , as searas promessa de riqueza para um pas. Este ondular
invisvel deixa j antever a aventura martima e o Imprio que lhe est associado. Assinale-se
ainda o animismo o rumor dos pinhais. Os pinhais parecem ter linguagem e inspiram o
prprio cantar do rei-poeta, porque anunciam qualquer coisa de grande, ainda envolvida em
mistrio. Os verbos encontram-se no presente com aspecto durativo, traduzindo aces que se
prolongam no tempo, tornando a descrio mais impressionista e visualista.
Na segunda parte, mantm-se a preocupao por parte do eu potico de nos fazer chegar o
cantar do jovem rei e o marulho obscuro dos seus pinhais. Tudo isto era, na perspectiva do
-
rei, o pressentimento embora obscuro de qualquer coisa grande que estava para vir, era o
som presente desse mar futuro. Esta ideia pe em destaque o carcter mtico deste heri,
como uma espcie de intrprete de uma vontade superior. A mensagem deste poema centra-
se sobretudo no futuro e a razo disto poder encontrar-se a partir do que atrs ficou dito: se a
perspectiva temporal a de D. Dinis, e este rei prepara as glrias futuras da sua grei,
evidente que a mensagem do poema se centra sobretudo no futuro. Isso mesmo se confirma
no texto O plantador de naus a haver, Arroio, esse cantar ... e a fala dos pinhais... som
presente desse mar futuro.... O cantar de quem, dos pinhais ? Do poeta? Ou dos dois? Esse
cantar era apenas um regatozinho que procurava o mar por achar. Esta metfora exprime
como os portugueses comeando quase do nada foram engrossando caudal das suas foras
at chegarem ndia. O poema refere duas fases da nossa histria: o ciclo terra (plantador de
naus, pinhais, trigo) e o ciclo do mar (arroio, naus e mar). A terra e o mar dois plos entre os
quais se balouou o povo portugus, sem nunca ter encontrado uma distncia equilibrada entre
os dois.
Aps termos perspectivado a mensagem do tempo mais fcil perspectivar a do espao. H
expresses que apontam para o estreito espao lusada antes dos Descobrimentos o
plantador de naus ... o rumor dos pinhais... o som presente ... e a voz da terra.... o espao
limitado dos primeiros tempos da ptria.
Mas surgem por anttese a estas, outras expresses que projectam a nao atravs do mundo:
como um trigo de imprio ... busca o Oceano por achar ... desse mar futuro, ... ansiando pelo
mar...
Relacionando o espao e o tempo, verificamos que ao tempo futuro corresponde o
alargamento do territrio portugus, a projeco da nao atravs dos mares.
Ao longo do poema devemos destacar as expresses que se congregam para dar a sugesto
de um mistrio premonitrio do domnio dos mares na noite ... silncio mrmuro... rumor dos
pinhais, marulho obscuro. voz presente desse mar futuro.
De notar que o rumor dos pinhais de tal forma se insinua no cantar proftico do poeta que se
atribui a esse cantar o mesmo efeito que fala dos pinhais esse cantar busca o oceano por
achar; e a fala dos pinhais som presente desse mar futuro.
Concluindo, este poema est imbudo de sensibilidade pica. A grandeza dos feitos de uma
nao inseparvel da sua grandeza literria. Pelo que se compreende que Fernando Pessoa
tenha concebido na Mensagem um super Portugal em que ele seria o super Poeta. A cultura
parece desempenhar aqui um papel de importncia acrescentada. Tambm o Quinto imprio
ser cultural.
Comentrios:
No sculo XIII a Europa estava deflorestada aps sculos de explorao selvagem das florestas primevas. D.Dinis levou a cabo um vasto plano de reflorestao atravs do plantio de matas reais de pinheiros bravos. A madeira foi depois utilizada na construo das caravelas das Descobertas, o que o tema deste belo oitavo poema da Mensagem.
"Cantar de Amigo"- poema medieval, cantado pelos trovadores. D.Dinis escreveu vrios destes cantares.
"silncio murmuro"- silncio murmurante.
"arroio"- riacho; "marulho"- som do mar.
D. Joo I
D.Joo foi mestre sem saber, defensor do templo sagrado da ptria e a eterna chama de
Portugal, Pessoa retrata o rei como algum eleito por Deus, e tambm como um grande
homem e guerreiro que fez de tudo para salvar o pas.
-
Existem trs momentos neste poema 1 momento h uma interligao entre Deus e o sujeito
pois o destino traado por Deus, no 2 momento Fernando pessoa elogia o seu patriotismo,
onde refere que ele foi um grande homem e guerreiro que fez de tudo para salvar o pas, e o 3
momento h uma imortalizao do Rei, a anttese eterna chama/sombra eterna pretende dar
a ideia que D.Joo I nunca ser esquecido e estar sempre vivo em todos os portugueses
(eterna chama). No entanto, fisicamente, ele j no est entre ns, est morto (sombra eterna)
Comentrios:
D.Joo o Primeiro: "O homem e a hora so um s, quando Deus faz e a Histria feita"-
Fernando Pessoa exprime de novo a ideia de que o destino traado por Deus e rege inexoravelmente a Histria. Quando uma nao atinge uma encruzilhada (como Portugal em 1383) a hora e os escolhidos executam os actos determinados. O homem o papel que desempenhou, este o requerido pela ocasio (pela hora), a ocasio determinada pelo Destino, o Destino foi traado por Deus... (simples, no?). Conhecemos D.Joo I porque teve a sua hora; sem ela teria sido um obscuro mestre de uma ordem militar obscura. Sem a hora no teria havido o homem...
"na ara da nossa alma interna"- no altar do nosso esprito nacional.
"repele a sombra eterna"- repele o olvido, que seria o destino de Portugal se perdesse a sua identidade como nao.
D.Filipa de Lencastre D. Filipa de Lencastre alm do papel que desempenhou ao estreitar relaes com a Inglaterra
exerceu alguma influncia a D.Joo I na conquista de Ceuta . Verificamos assim o quanto foi
importante para a Histria de Portugal e sobretudo como Me , que criou uma gerao de
grande talentos, foi graas educao que deu que levou aquela gerao levar o nosso pas a um
perodo ureo ( os descobrimentos martimos), tanto a nvel econmico como a nvel cientifico e
histrico. Portugal ser sempre lembrado por estes grandes feitos.
Neste poema h uma referencia a arcanjo ( brao direito de Deus) por parte do poeta, veio
afirmar a vontade de Deus, para os futuros efeitos gloriosos dos portugueses nas descobertas
martimas.
A referncia princesa do Santo Graal deve ser interpretada como princesa mstica porque esta foi predestinada por Deus para ser me dos prncipes da gerao. Graal refere-se taa
onde Cristo bebera na ltima ceia.
O nome dado por Fernando Pessoa a D.Filipa de Lencastre Madrinha de Portugal devido educao que esta deu aos seus filhos e que os permitiu ser to distintos e gloriosos.
Comentrios: D.Filipa de Lencastre: "Que enigma havia em teu seio que s gnios concebia"- referncia chamada "nclita gerao" dos filhos de D.Filipa e D.Joo I.
"Volve a ns teu rosto srio"- vira o teu rosto (sisudo...) e olha para ns; lembra-te de Portugal; reza por ns!
"Princesa do Santo Gral"- referncia ao Graal procurado pelos cavaleiros medievais das lendas da Tvola Redonda. Existem vrias verses sobre o que seria, mas a mais comum refere-o como a taa de onde Cristo bebera na ltima Ceia e/ou que teria recolhido o seu sangue na Cruz. A referncia deve ser interpretada como "Princesa mstica" porque fadada por Deus para ser me dos principes da nclita gerao e muito particularmente do Infante D.Henrique; ou "Princesa da grandeza (futura) de Portugal" (o Graal era suposto trazer felicidade Terra).
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D.Duarte Rei de Portugal
Comentrios: D.Duarte Rei de Portugal: "A regra de ser Rei almou meu ser"- A disciplina de ser rei encheu
a minha vida (isto , como D.Duarte viveu o fim do seu curto reinado no remorso das consequncias da falhada expedio a Tnger e da priso do irmo Fernando no tinha prazer na vida, dedicando-se inteiramente ao dever da governao). Esse remorso a razo da frase do poema: "firme em minha tristeza".
D.Fernando Infante de Portugal
Comentrios:
Este poema, sem dvida um dos mais belos de Mensagem, foi o primeiro a ser escrito (em 1913) e destinava-se a servir de mote a um livro que Fernando Pessoa pensou chamar "Portugal". O contedo incluiria, pelo menos, o equivalente s duas primeiras Partes de Mensagem, mas a ndole talvez no tivesse sido integralmente afim. Este poema, inicialmente chamado "Gldio", foi rebaptizado mas no est totalmente sintonizado com o seu novo nome. provvel que tenha sido originalmente escrito com D.Sebastio em mente.
O D.Fernando referido no poema o Infante Santo, que morreu refm em Marrocos.
O gldio era uma espada curta como as utilizadas pelos gregos e pelos romanos. A sonoridade da palavra era muito apreciada pelos autores italianos, espanhis e portugueses que a usavam amide designando uma espada de qualquer tipo ou, simplesmente, o seu equivalente simblico.
Este poema um auto-retrato de D. Fernando. As marcas de discurso de 1 pessoa so
os pronomes pessoais me (vv. 1, 3, 6, 8), eu (vv. 1, 11) e mim (v. 10); determinante
possessivo minha (vv. 12, 15); formas verbais na 1 pessoa do singular: vou (v. 11) e
temo (v. 13).
Os versos 1-3 e 6-7, entre outros confirmam que D. Fernando retratado como
instrumento da vontade de Deus.
O gldio simboliza o poder com que Deus investe o heri para que ele possa fazer
cumprir o destino de Portugal.
Em consequncia da aco divina, o "eu" consumido por uma "febre de Alm" (v.8).
Essa febre participa, como o gesto a que conduz, da predestinao divina do heri.
algo que lhe dado, que faz parte da sua prpria condio, como ser depositrio de um
destino que se cumpre atravs dele, como acontece com D. Fernando.
Mesmo nos casos onde o grande empreendimento a que se propuseram falhou, os heris
na Mensagem mantm viva a chama do desejo e do sonho, impulsionados por essa febre
dev fazer, de descobrir, de criar, a que se juntam o seu destemor confiante por se
sentirem cheios de Deus.
Dir-se-ia, em suma, que nessa "febre de Alm", nessa nsia de Absoluto, reside um dos
aspectos mais importantes da exemplaridade do heri na Mensagem
Essa "febre de Alm" impele o heri aco - o que se concretiza na 3 estrofe.
-
Os trs ltimos versos do poema exprimem o destemor e a confiana com que o heri
se lana na aco por se encontrar imbudo do esprito de Deus. No importa se essa
aco se concretizar ou no em obra feita, o que interessa a prpria aco.
D.Pedro Regente de Portugal
Comentrios: D.Pedro Regente de Portugal: "indiferente ao que h em conseguir que seja s obter"- no fui movido pelo desejo de posse; no fui ambicioso de bens materiais.
"Dplice dono, sem me dividir, de dever e de ser"- eu e o meu dever fomos um s.
D. Pedro era o filho preferido do rei, pelo que teve a oportunidade de receber uma educao
excepcional para a poca em que vivia. Isto transformou-o num amante da cultura, e levou-o a
querer trazer mudanas para a ptria atravs das letras, formando uma ideia de Imprio
Espiritual (o tal Quinto Imprio).
Nos dois primeiros versos do poema, Fernando Pessoa, que fala atravs de D. Pedro, d-nos a
conhecer as caractersticas que mais destacavam esta figura: a sua paixo pela cultura, a sua
grande honestidade, e o facto de ser uma pessoa extremamente ambiciosa e decidida, que sabe o
que quer e vai obt-lo, independentemente do que possa ter a ganhar. Isto porque D. Pedro, ao
planear o futuro da ptria, no pensava no que era melhor para si, mas sim o que era melhor
para aqueles que estavam sob as suas ordens.
Mas, apesar de no ser ganancioso, a sorte escolhia no o proteger, pois no o considerava um
dos seus. No entanto, ele no se importava com isso. Assim sabia que tudo o que conseguiu
alcanar foi fruto do seu trabalho rduo e da sua vontade, e no mera sorte.
Era um homem honrado, de convices fortes, sabia o rumo a tomar, e lutou pelas suas crenas
at morte, mantendo-se sempre fiel a si mesmo. Por isso mesmo morreu em paz, sabendo que
nunca se desviou do destino que Deus lhe ofereceu, e tudo o que lhe aconteceu de mal foi por
Sua vontade, podendo ento ser lembrado para sempre como uma lenda ou mito.
D.Joo Infante de Portugal
Comentrios: D.Joo Infante de Portugal- "Minha alma estava estreita entre to grandes almas...etc"- os meus irmos (o Infante D.Henrique, o Rei D.Duarte, o Infante D.Pedro, e o Infante D.Fernando) tiveram tal grandeza que me ofuscaram completamente.
"virginalmente parada"- sem actividade; virgem de aco (esta afirmao inexacta em relao ao Infante D.Joo que foi um homem de mrito e de prstimo para o Pas. Alis, qualquer comparao com um homem de estatura mundial como o Infante D.Henrique s pode resultar injusta para o comparado!).
" do portugus querer s isto: o inteiro mar ou a orla v desfeita"- para um portugus no h meios termos: ou tudo ou nada (por isso, como no fui tudo, ento eu no fui nada!).
"a orla v desfeita"- a cercadura do mar; a espuma das ondas que se desfazem futilmente na costa.
D. Joo, para alm do seu ttulo de Infante, era tambm Condestvel - 2 figura militar mais
importante no reino a seguir ao rei. Contudo, nunca chegou a ser rei, nem mesmo regente como
o seu irmo D. Pedro, ou seja, no foi algum a quem pudessem ser confiadas certas
responsabilidades, pois estava rodeado de pessoas (a sua famlia) que podiam det-las com
melhores resultados. Apesar de saber ter em si as capacidades necessrias para trazer mudanas
-
positivas ptria, no conseguia aplicar esta potencialidade, outros mais capazes j o faziam por
ele, pelo que se sentia intil e inferior.
Assim, o seu destino parecia toldar-se perante o caminho destas grandes figuras histricas.
Enquanto estas conquistaram "o inteiro mar", "o todo", a ele sobrou apenas "a orla v desfeita",
"o seu nada". D. Joo sofria, ento, devido ao facto de pensar que o seu destino de grandezas
nunca seria cumprido. Porm, ele apenas olhava para os dois extremos, sem colocar a hiptese
de talvez o seu destino ser algo que, apesar de no ser tudo o que ele ambicionava, tambm no
ser insignificante. Talvez o seu destino fosse to importante como o dos seus irmos, pois
enquanto o destes era a conquista e a glria imortal, o dele era deixar transparecer o rumo
grandioso dos seus pares.
Um povo construdo por homens que se destacam e por homens que se anulam para que outros
possam brilhar - e todos tm o seu lugar no mundo.
* nclita gerao = filhos de D. Joo I e D. Filipa de Lencastre. Foram pessoas fundamentais no
estabelecimento de uma dada ordem para a ptria.
D. Sebastio Rei de Portugal
Trata-se de um poema da primeira parte o Braso da Mensagem- colectnea de poemas de Fernando Pessoa, escrita entre 1913 e 1934, data da sua publicao. Dentro
desta integra-se As Quinas. Esta obra contm poesia de ndole pico-lrica participando
assim das caractersticas deste dois gneros. Relativamente sua matriz pica devemos
destacar o tom de exaltao herica que percorre esta obra; a evocao dos perigos e
dos desastres bem como a matria histrica ali apresentada. No atinente sua dimenso
lrica, podemos destacar a forma fragmentria da obra, o tom menor, a interiorizao da
matria pica, atravs da qual sujeito potico se exprime.
Nesta primeira parte da obra que nos propomos analisar aborda-se a origem, a fundao
o princpio de Portugal. O ttulo D. Sebastio remete-nos para um momento importante
da nao, assumindo D. Sebastio um papel importante na deciso tomada de avanar
para a conquista de frica.
Em termos formais, constatamos que o poema constitudo por duas estrofes, de cinco
versos (quintilhas). Quanto ao metro e ao ritmo os versos so irregulares. Os versos
variam entre as seis slabas mtricas, as oito e as dez. Predomina o ritmo binrio,
aparecendo tambm o ternrio. A rima varia tambm entre consoante, que predomina e
toante, variando ainda entre rica e pobre, predominando no obstante a pobre e obedece
ao seguinte esquema rimtico: ababb, com rimas cruzadas e emparelhadas, portanto. A
alternncia de ritmo possibilita a emisso de uma reflexo do prprio rei e o incitamento
que dirige aos destinatrios.
O poema poder dividir-se em duas partes: a primeira correspondendo primeira estrofe
e a segunda parte segunda estrofe. Na primeira o sujeito potico faz uma
autocaracterizao como louco; na segunda faz uma apologia da loucura, um elogio, exortando a que outros dem continuidade ao seu sonho.
Na primeira estrofe o sujeito lrico encontra a base da loucura na grandeza (a febre do
alm, o sonho, o ideal) que o sujeito lrico assume com orgulho. Em consequncia dessa
loucura, o heri encontrou a morte em Alccer Quibir (perfrase). Apesar disto a loucura
tem neste poema uma conotao positiva, j que se liga ao desejo de grandeza,
capacidade realizadora, sem a qual o homem no passa de um animal. Veja-se ainda na
primeira estrofe a referncia ao ser histrico ser que houve que ficou na batalha de Alccer Quibir, onde encontrou a destruio fsica, e a distino deste com o ser mtico
no o que h, que sobreviveu pois imortal, a ideia-smbolo, o sonho que fecunda a
-
realidade. Este perdura na memria colectiva como exemplo.
Na segunda parte, o sujeito potico lana um repto aos destinatrios, fazendo um apelo
loucura e valorizao do sonho. Deve portanto dar-se asas loucura como fora
motora da aco. Trata-se de um apelo de alcance nacional e universal. Este mesmo
elogio ser repetido vrias vezes ao longo da obra. a referncia ao mito sebastianista,
fora criadora, capaz de impelir a nao para a sua ltima fase que est aqui em questo.
O repto permite aos destinatrios considerarem a grandeza do rei suficiente para todos.
A utopia foi e ser sempre a fora criadora de novos mundos quer a nvel individual
quer a nvel colectivo. Sem ideal cai-se no viver materialista. A interrogao retrica
com que termina o poema aponta precisamente para a loucura como fora criativa que
poder ser canalizada para a reconstruo nacional. Sem o sonho a loucura o homem no se distingue do animal. a travs do sonho que o homem capaz de seguir em
frente sem temer a prpria morte. Assim o homem deixar de ser um animal sadio ou
reprodutor com a morte adivinhada.
Comentrios:
"areal"- o campo de Alccer Quibir. "ficou meu ser que houve, no o que h"- ficou o meu corpo, no a minha alma que vive eterna. "sem a loucura que o homem mais do que a besta sadia"- sem o sonho (impossvel, neste caso) o homem apenas um animal vivente. "cadver adiado que procria"- vivo e a reproduzir-se (sem outra finalidade do que, como nos animais, a propagao da espcie) mas inexorvelmente destinado morte.
NUN'LVARES PEREIRA
Comentrios: Segundo lendas pags de origem irlandesa a espada Excalibur foi dada ao Rei Artur pela Dama do Lago. Era mgica e tornava-o quase invencvel. De acordo com uma tradio guerreira muito antiga, era costume ser dado nome a uma arma notvel pela sua beleza ou qualidade. Excalibur no podia ser quebrada e o seu nome tem origem cltica e quer dizer "relmpago duro". "S.Portugal em ser"- personificao do que h de mstico em Portugal (ou do melhor e mais puro em Portugal). "Ergue a luz da tua espada para a estrada se ver!"- inspira-nos para que encontremos o caminho (da grandeza de Portugal).
Anlise contextual da primeira estrofe: Normalmente a aurola tradicionalmente cerca os santos e os iluminados, e o seu tom dourado tem o significado hermtico deconhecimento. J no poema, a aurola que cerca Nuno lvares Pereira , ao mesmo tempo, uma
aurola de santidade (do guerreiro tornado monge) e uma
aurola de combate ( a espada () volteando). O poeta quer dizer que a santidade que ele alcanou, foi a custo tambm dos seus actos de
guerreiro, pois a sua espada que desenha o crculo difano por cima da sua cabea,
destacando-o santo, do comum dos homens.
A imagem potica muito bem conseguida. Vejamos como Pessoa nos faz imaginar o
raio da espada que, levantada em crculo to alto, rompe
o negro do cu em altitude (o ar alto), deixando este de ser to negro e brando.
Anlise contextual da segunda estrofe:
Explicada a origem da aurola que cerca Nuno lvares Pereira (a espada), Pessoa fala-
nos sobre essa mesma espada. Diz-nos que a espada
-
que, erguida / Faz esse halo no cu no uma espada qualquer, no a espada de um comum cavaleiro, mas Excalibur, a ungida, a espada do Rei Artur. No texto pico ingls, Le Morte d'Arthur, a espada Excalibur (palavra que significa
Corta Ao) a espada que legitima Artur como rei por direito da Gr-Bretanha, quando ele a retira da pedra onde estava enterrada. Note-se que Pessoa
d a coroa ao Condestvel, e depois d-lhe a Excalibur,
como dizendo que ele era cavaleiro por dedicao mas rei por direito. Para a Mensagem
tambm importante que a espada tenha sido usada pelo
cavaleiro cuja a irmandade. O cavaleiro protegia o Santo Graal, um objecto desde
sempre ligado aos Templrios e que simboliza o derradeiro
conhecimento e unio com Deus.
Anlise contextual da terceira estrofe: O poema dedicado ao Condestvel termina com uma invocao da sua memria.
Fernando Pessoa resume novamente as qualidades mais relevantes do seu mito, ser
esperana consumada e S. Portugal em ser para depois lhe pedir que erga a luz da sua espada para a estrada se ver. Esperana consumada porque o Condestvel foi um homem de feitos corajosos, ou seja, consumou, concretizou a sua coragem em actos.
S. Portugal em ser, porque aliou, na sua pessoa, coragem, a santidade. Pede-lhe Pessoa erga a luz da sua espada para a estrada se ver. claro que este pedido vem na mesma linha de outros, parecendo que Pessoa rene um
exrcito
imaterial, para servir de inspirao a uma revolta futura. Mas como um exrcito
imaterial, de memrias, mitos, a revolta ter de ser de conscincias,
Mentalidades humanas.
Nuno lvares Pereira o portador de uma espada que, sendo simultaneamente aurola, credencia-o como smbolo da plena heroicidade, por
incorporar a dupla condio de guerreiro e de santo.
A cabea do Grifo: O Infante D.Henrique
Em relao ao poema o Grifo um enigma. Ser talvez, na inteno do Poeta, o enigma
que Portugal se prope desvendar e que ainda no desvendou. O Infante D. Henrique
est frente dessa misso. Senhor do inteiro mar e acabar por ter todo, o globo mundo em sua mo. Contudo esta s, Com seu manto de noite e solido. muito significativo o facto de o Poeta apresentar o Infante como um homem solitrio,
mas que, ao mesmo tempo, ligou o mundo inteiro. Est s e simultaneamente, possui,
todo o globo mundo. O Infante outro importante smbolo, todas as grandes obras foram realizadas na solido, todas as grandes misses foram cumpridas por homens
solitrios. Contudo, trata-se de um tipo especial de solido. No uma solido que os
isole. Pelo contrrio, uma solido que os torna universais. O Infante D. Henrique o
smbolo de uma universalidade que alcanada atravs da mais profunda realizao
individual.
O Infante D. Henrique era o terceiro filho dos reis D. Joo e D. Filipa, nasceu no Porto a
4 de Maro de 1394.
Em 1414, incentivou o pai a montar a campanha de conquista a Ceuta. Como era
organizador e empreendedor, seu pai, nomeio-o administrador e governador da Ordem
-
de Cristo. Foram os seus navegadores que descobriram as primeiras ilhas dos Aores
em 1427. Foi com o Infante D. Henrique que o Cabo Bojador foi passado pela primeira
vez ao comando de Gil Eanes.
O Infante D. Henrique pode-se dizer que foi o impulsionador dos Descobrimentos, e foi
uma personagem muito intrigante, com um certo mistrio e muitos segredos. Tambm
os seus motivos e os objectivos das suas navegaes tm sido amplamente discutidos e
diferenciados, mas, sem dvida, foi o grande condutor da expanso ultramarina
portuguesa e europeia.
Anlise do poema O Infante D. Henrique
O Infante foi o grande impulsionador da expanso ultramarina portuguesa, isso
referido no poema, no ltimo verso. O nico imperador que tem, deveras / O globo mundo na sua mo. Os adjectivos utilizados no poema caracterizam o Infante D. Henrique, e o seu percurso
histrico e os seus feitos. Alguns adjectivos so utilizados para caracterizar o Infante.
Em seu trono entre o brilho das esferas, Com seu manto de noite e solido e Tem aos seus ps o mar novo e as mortas eras. O tempo presente utilizado para eternizar o Infante D. Henrique e os seus feitos,
demonstrar que ainda no foram esquecidos, ou seja, continuam presentes. O presente
indica a permanncia, hbito e geralmente utilizado para cantar feitos histricos, trata-
se do presente histrico, da resultando uma maior realidade do narrador.
Os recursos estilsticos, utilizados no poema so: a adjectivao simples, a anttese, com
o confronto de ideias opostas, Com seu manto de noite e solido, e O globo mundo em sua mo. Nos poemas de Cames relatado a histria de Portugal e os Descobrimentos no sc.
XVI, e os poemas de Pessoa, a histria passada de Portugal para falar no futuro de
Portugal e no Quinto Imprio que Fernando Pessoa acreditava que vai ser construdo
por Portugal.
Comentrios:
"entre o brilho das esferas"- refere-se ao modelo ptolomaico do Universo, que era o geralmente aceite na poca do Infante, e que se baseava num conjunto de esferas concntricas. Pode, eventualmente, tratar-se alternativamente de uma referncia s esferas metlicas que representavam o firmamento.. "o mar novo e as mortas eras"- o mar desvendado e o passado de ignorncia e temor do desconhecido. "o nico que tem deveras o globo mundo em sua mo"- os imperadores e alguns reis tomavam como simbolo do poder uma esfera que sustentavam na mo, representando a universalidade do seu estatuto. S no caso do Infante, diz Pessoa, tal se justificaria!
UMA ASA DO GRIFO: D. JOO O SEGUNDO Se a viso (cabea do grifo) pertencia ao Infante D. Henrique, faltava quem lhe desse o poder de realizar essa viso, literalmente de a fazer voar. Por isso Pessoa usa a
expresso asa do grifo so as asas que vo fazer levantar do cho a viso/sonho magnfico do Infante.
Uma das asas do grifo, D.Joo II. Este uma das asas, pelo simples facto de ter sido
D.Joo II que elaborou o plano de dobrar o Cabo da Boa Esperana, com vista a obter
uma rota martima para a ndia.
Numa anlise formal do poema, vemos que este constitudo por duas estrofes, sendos
-
estas quadras com versos decassilbicos [tendo a inteno de comparar a sua obra com
uma epopeia, especificamente com a de Cames, Os Lusadas, e apresenta uma rima cruzada.
Na 1 estrofe ,em geral, Pessoa destaca nesta asa o poder da vontade.
De braos cruzados no usando a fora, s a vontade, ele fita por isso alm do mar para a ndia. Como um promontrio, que alto desafia o mar, que terra e ao mesmo tempo quase mar. O promontrio um limite, mas D. Joo II encarna esse
mesmo limite, ele define-o e expande-o, com a sua vontade. ele o limite da terra a dominar / O mar que possa haver alm da terra.
Na 2 estrofe, tal como todos os heris na Mensagem, o formidvel vulto solitrio algo que Pessoa elogia e valoriza por serem heris solitrios, sombrios, quase apagados
da sua individualidade, em favor de Portugal.
Existe aqui um paradoxo, porque apesar da sua vontade ser solitria, D.Joo II enche de estar presente o mar e o cu ao navegar por mares nunca antes navegados e descobrir terras para alm do que nos era conhecido. Estas aces fazem temer o mundo vrio. O Mundo inconstante, poderoso, teme que D. Joo II abra os braos e lhe rasgue o vu, ou seja, que D.Joo II com a sua vontade consiga desvendar os mistrios do Mundo desconhecidos ainda aos homens.
Comentrios:
"parece temer o mundo vrio que ele abra os braos e lhe rasgue o vu"- parece temer o mundo perplexo que ele revele os seus mistrios.
A Outra Asa do Grifo:Afonso de Albuquerque
Mal com os homens por amor del-rei, e mal com el-rei por amor dos homens uma famosa frase dita por Afonso de Albuquerque pouco tempo antes de morrer e que traduz
o ideal que norteou toda a sua.
Este poema foi primeiramente editado na revista Mundo Portugus no dia 26 de Setembro de 1928.
Na estrutura interna de Mensagem o poema o terceiro (a outra asa do grifo) do quinto
grupo O Timbre da primeira parte O Braso. Simboliza o poder da fora, a concretizao do sonho.
Se tivermos em conta o simbolismo dos trs poemas do Timbre teremos algo como
viso (D. Henrique), o poder da vontade (D. Joo, o segundo) e o poder da fora, que se
j conhecemos do primeiro verso do poema O Infante, Deus quer, o Homem sonha, a obra nasce. O autor comea por captar um momento da vida do heri, dando uma imagem deste de
p sobre as suas conquistas no primeiro verso.
Do segundo verso ao oitavo so dados os seus sentimentos que tm como causa os
feitos hericos e as suas consequenciais.
Pessoa vai para alem da imagem do heri forte e determinado, e mostra-o como um ser
cansado de ver a injustia que h no mundo e o que o destino (sorte) lhe reserva. A injustia que o autor se refere ingratido dos outros pelos seus feitos. O seu sucesso
no desperta admirao nos outros, mas sim inveja.
H um desprezo pela vida material por parte do heri. Este j est to cansado do poder
e das conquistas que j no pensa em nada, j foram realizados todos os seus desejos
-
materiais. O seu poder j to grande que ultrapassa o seu desejo.
O seu desejo de glria trouxera mais do que vitrias e poder, trouxera tambm as
invejas dos outros e da corte Que o querer tanto/ calcara mais do que o submisso mundo. Nos ltimos dois versos Pessoa fala sobre as conquistas, referindo-se a trs imprios.
O nmero trs representa simbolicamente a perfeio, pelo que a conquista destes trs
imprios a utopia do heri. Estes trs imprios podem ser o Material, o Espiritual, e o
Cultural, podem tambm ser o imprio Portugus, o rabe e o Hindu, e ainda, mais
especificamente se nos tivermos a referir a Afonso de Albuquerque, podem ser Goa,
Malaca e Ormuz, as trs cidades fortes que conquistou.
Pessoa mais uma vez chama sorte ao destino ao contrrio dos poemas dos das quinas em
que o azar uma constante.
Foi o destino que deu, que permitiu a realizao dos feitos de Afonso de Albuquerque, mas como nada de graa, ele presenciou um futuro negro, e uma vida
repleta de azar.
Quanto anlise formal do poema, constitudo por uma dcima composta por cinco
versos decasslabos e cinco hexasslabos alternados.
A rima emparelhada, sendo o esquema rimtico aabbccddee.
Comentrios:
O poema centra-se no desempenho de Afonso de Albuquerque na sia, por contrapartida com o seu descrdito na corte de Lisboa motivado por invejas.
"to poderoso que no quer o quanto pode, que o querer tanto calcara mais do que o mundo sob o seu passo"- Albuquerque podia at ter-se proclamado imperador, mas sempre foi sbdito fiel do Rei D.Manuel. No queria o quanto podia porque o seu sucesso lhe pesava mais sobre os ombros (por ter perdido o favor real) do que a conquista pesara aos povos submetidos.
"trs imprios lhe a Sorte apanha"- refere-se s conquistas de Goa (na ndia), Malaca (na Malsia) e Ormuz, no Golfo Prsico.
"apanha-os como quem desdenha"- submete-os como se isso fosse coisa de pouca monta.
2PARTE
O Infante
Este o primeiro poema da segunda parte de Mensagem, o que faz todo o sentido se
tivermos em conta que o Infante D. Henrique foi o impulsionador dos Descobrimentos, por
exemplo ao fundar a Escola de Sagres. Da o ttulo do texto: embora nele se refira a aventura
martima levada a cabo pelos portugueses, foi o Infante quem desempenhou um papel crucial
nessa aventura, o de protagonista, de impulsionador, o de smbolo do incio da construo do
imprio. Da que lhe caiba o papel de protagonista da Possessio Maris (Posse do Mar),
dedicada gesta dos Descobrimentos. Segundo Antnio Quadros, o Infante foi o descobridor
da ideia de descoberta.
O Infante D. Henrique (1394 - 1460) foi o quinto filho de D. Joo I e de D. Filipa de
Lencastre e geralmente considerado o homem que mais decisivamente contribuiu para o
impulso que levou expanso ultramarina portuguesa. Por outro lado, ele tambm,
-
frequentemente, apresentado como smbolo das vontades e dos esforos annimos de
navegadores, cosmgrafos, mercadores e aventureiros que ajudaram o homem moderno a
construir novas dimenses para a perspetiva do mundo.
Estrutura interna
. 1. parte (1. verso) - As trs etapas que presidem construo da obra humana, traduzidas
pelo mote / aforismo Deus quer, o homem sonha, a obra nasce.
. Duas aes --- a vontade divina;
--- o sonho do homem;
efeito: o nascimento / a concretizao da obra.
. Os trs sujeitos dependem mutuamente, numa relao de causa efeito: sem a vontade do
primeiro, o segundo no sonharia e a obra no poderia nascer.
. O verso, constitudo por trs oraes assindticas justapostas (assndeto e gradao),
organiza-se em torno de formas verbais no presente do indicativo, de aspeto durativo,
exprimindo realidade, atualidade, valor de lei, uma verdade universal.
. 2. parte (versos 2 a 8) - Desenvolvimento do primeiro verso:
1) . Desejo de Deus (agente da vontade):
. a unidade da terra, atravs do mar, de forma a servir de elemento de unio entre os
continentes e os povos, da a existncia de um conjunto de palavras e expresses que
sugerem a ideia de unidade: uma, unisse, no separasse, inteira;
. o carter navegvel do mar, para que o ser humano tivesse acesso ao conhecimento da Terra.
. A colocao das formas verbais predominantemente no pretrito perfeito do indicativo sugere
que o princpio em causa foi respeitado e se concretizou.
2) . A sagrao do Infante: para o cumprimento dessa misso, Deus sagrou o Infante (a deciso de
se aventurar no mar tem origem divina e no num qualquer capricho humano)), isto ,
predestinou-o para os grandes feitos das descobertas ( em ti nos deu sinal. - v. 10). Foi,
portanto, Deus (cuja vontade impretervel) quem quis que o Infante (= os portugueses)
sonhasse dominar os mares, desvendar o desconhecido e estabelecer a comunicao entre os
povos e os continentes, a nvel matria e espiritual / cultural, isto , que desse sonho
nascesse a obra dos Descobrimentos.
Assim, o Infante o smbolo do heri, o agente por vontade divina, destinado a criar uma
obra superior.
. A forma verbal Sagrou encerra grande expressividade:
-contm conotaes religiosas;
- evoca o nome prprio Sagres, a escola de navegao fundada pelo Infante, smbolo do incio
da construo do imprio portugus;
-
- remete para o carter mtico e predestinado do Infante, o escolhido por Deus para a execuo
da obra, da que possamos tambm falar na sua divinizao;
- traduz o carter providencial e inicitico das Descobertas.
. O complexo verbal foste desvendando (v. 4) apresenta a ao como uma continuidade,
como algo que se concretizou de modo progressivo; a forma verbal desvendando (desvendar
= revelar, descobrir, mostrar), por outro lado, remete para a ideia de revelao de algo
desconhecido.
. O sujeito potico dirige-se ao Infante na segunda pessoa do singular (Sagrou-te, e foste -
v. 4); Quem te sagrou criou-te - v. 9; Do mar e ns em ti - v. 10), o que traduz uma
relao de proximidade e de cumplicidade.
3) . A realizao da obra, a sagrao:
o incio da navegao: foste desvendando;
a descoberta das ilhas da Madeira e dos Aores at costa africana: E a orla branca foi de ilha
em continente;
a passagem do Cabo das Tormentas: at ao fim do mundo;
o mar desconhecido a partir da zona do Cabo das Tormentas: do azul profundo;
a concretizao:
. a unio da terra: E viu-se a terra inteira;
. o seu carter sbito: de repente;
. o aparecimento: Surgir;
. a ideia de origem, de profundidade; azul profundo;
. a presena do sinal (j na 3. estrofe).
. O percurso da obra:
a unificao do mundo alicerou-se no mar (na orla branca);
por mar, atingiu-se uma ilha e depois um continente;
da escurido se fez luz (clareou), ou seja, da ignorncia se passou ao conhecimento, a
civilizao ocidental encontrou-se com a oriental;
e assim se atingiu, correndo, o fim do mundo, assim se eliminaram as barreiras e os
limites;
deste modo, do mar (do azul profundo), de repente, irrompeu a unificao do mundo.
. A realizao da obra sugerida por Pessoa atravs do recurso a diversos recursos potico
estilsticos:
. a gradao: comeou por desvendar ilha(s) e continente(s), chegando ao fim do mundo
e dando assim a conhecer a terra inteira;
. as metforas e as sindoques: desvendando a espuma, orla branca, clareou, correndo;
. a perifrstica foste desvendando;
. o gerndio correndo;
. a locuo adverbial de repente;
. as sugestes cromticas e luminosas;
-
. a aliterao do /r/;
. o verbo desvendar, que remete para a ideia de revelao;
. os adjetivos inteira e redonda aponta para a unificao da terra, concretizando-se assim o
desejo expresso no verso 2. Por outro lado, redonda aponta para a esfera, o smbolo da
unidade e da perfeio csmica.
3. parte (3. estrofe) Concluso:
. a transposio da glria do Infante para o povo portugus:
- Deus sagrou o Infante e criou-o portugus;
- enquanto tal, simboliza o povo a que pertence, o que significa que tambm ele foi assinalado,
predestinado, escolhido por Deus para desvendar o mar desconhecido;
. o sonho cumpriu-se: o desvendar e a unificao dos mares e a criao do imprio (sonho
simultaneamente nacionalista e universal);
. o sonho desfez-se: o imprio (do Oriente) desfez-se, pertence a outro tempo;
. a ptria, presentemente, no tem desgnio;
. o apelo ao cumprimento do destino mtico de Portugal: uma nova e espiritual misso
(Senhor, falta cumprir-se Portugal! - v. 12). Trata-se do apelo a um novo sonho, de cariz
espiritual, visto que a dimenso material do imprio j foi conseguida, ou seja, falta que
Portugal se cumpra como ptria e entidade nacional (notar o uso do presente do indicativo
para exprimir urgncia). De notar que o sujeito potico se dirige agora diretamente a Deus,
apontando para o desencadear de um novo ciclo que, no fundo, constitui o regresso ao incio
do poema: uma nova vontade divina, um novo sonho do homem e uma nova ao / obra.
Mas, afinal, o que falhou em todo o processo? Porque se desfez o imprio? Deus quis, o
homem sonhou e a obra nasceu, mas uma obra efmera, perecvel, como tudo o que
material e humano. A culpa no de Deus, j que ele sagrou e destinou o Infante e o povo
portugus ao cometimento de feitos muito acima da sua condio de mortais. Mas como ser
humano limitado, no houve continuidade para o imprio, que se desfez, da que Pessoa
aponte para a necessidade de Portugal se cumprir integralmente, de complementar com a
dimenso espiritual a materialidade do imprio passado, novamente sob a predestinao
divina.
A ao do Infante:
- representa o povo portugus ( e ns em ti nos deu sinal. - v. 10) e foi desvendando
[descobrindo, revelando] o mar, ultrapassando dificuldades;
- os seus esforos foram coroados de xito (Cumpriu-se o Mar - v. 11); fisicamente, o mundo
tornou-se um, a terra tornou-se una, os povos e continentes unificaram-se;
- o Infante o heri que obtm a imortalidade atravs do cumprimento de um dever individual
e ptrio;
-
- tambm o heri que busca a universalidade, da a utilizao do artigo definido no ttulo (O
Infante) e em o homem (verso 1) com um valor universalizante;
- possui um carter divino, dado que foi o eleito, o predestinado por Deus para o cumprimento
desta misso; por extenso, como portugus e representa o seu povo, a sua sagrao
significa a divinizao do homem portugus;
- a sua sagrao, a sua obra, tem como consequncia o acesso ao conhecimento: dos limites
geogrficos do planeta, do mar, de outros povos, de outras culturas.
. Tom dramtico do poema:
- a tenso emocional resultante da viso da terra redonda surgindo magicamente das
profundezas do mar;
- as trs personagens:
. o sujeito potico, que se dirige ao Infante e interpela Deus, significando este facto a
existncia de um dilogo (implcito), o que est de acordo com o carter misterioso e
messinico do poema;
. Deus;
. o Infante.
Recursos potico-estilsticos
1. Nvel fnico
. Estrofes: trs quadras.
. Mtrica: versos decassilbicos hericos, acentuados nas 6. e 10. slabas.
. Ritmo predominantemente ternrio, alternando com o ritmo binrio.
. Rima:
. esquema rimtico: abab / cdcd / efef;
. cruzada;
. consoante;
. grave e aguda;
. pobre e rica.
A rima permite que certas palavras-chave se encontrem em posies de destaque:
nasce, uma, mundo, portugus, sinal, Portugal.
. Transporte: vv. 7-8.
2. Nvel morfossinttico
. Verbos:
- presente: discurso aforstico do primeiro verso;
- pretrito perfeito: narrao de acontecimentos passados;
- regresso ao presente (Falta cumprir-se Portugal) a sugerir urgncia, necessidade.
Esta sucesso presente / passado / presente sugere a dialtica hegeliana tese, anttese,
sntese e seu retorno.
-
. Adjetivos: redonda, inteira - designam um mundo circular, fechado, uno, todo.
. Frases curtas, correspondendo seis a um verso.
. Assndeto: Deus quer, o homem sonha, a obra nasce.
3. Nvel semntico
. Vocabulrio de conotaes simblicas:
- sagrou-te: talvez ligada palavra Sagres, sugere a escolha do Infante para uma misso
divina (Deus quer);
- o uso de maisculas (Mar, Imprio);
- mar: simboliza o desconhecido, o mistrio, da as expresses desvendar a espuma, isto ,
desfazer o mistrio, descobrir, ultrapassando as dificuldades que se lhe deparam; , pois, o
trao de unio de ilhas e continentes (vv. 2-3); nos deu sinal, ou seja, dar a chave para
decifrar o mistrio;
- espuma (branca), orla branca ( o sulco de espuma deixado pelos navios portugueses;
simboliza o longo percurso que tiveram de percorrer para que a empresa dos Descobrimentos
se concretizasse), clareou, surgir (sair das sombras, revelar-se, conhecer), do azul
profundo (do mar imenso e profundo, o smbolo do desconhecido, em oposio ao
clarear, que o revelado): estas expresses sugerem a passagem do mistrio para a
descoberta, para o conhecimento, passagem caracterizada como repentina, espetacular,
miraculosa; assim o sugere a expresso E viu-se a terra inteira, de repente, / Surgir
redonda;
- a viso da terra redonda, surgida repentinamente, sugere a ideia de que a obra dos
portugueses a realizao de um plano divino. O redondo, a esfera. o smbolo da perfeio
csmica, da unidade (do mundo), da obra completa e perfeita que Deus quis: Deus quer /
Deus quis que a terra fosse toda uma;
- as cores:
. azul: ligada ao mistrio, ao desconhecido (o mar);
. branco da espuma vem clarear e revelar a terra inteira, de repente;
- o Infante: representa o povo portugus, mas tambm surge como o smbolo do homem
universal, o heri que realizou um sonho que era vontade de Deus.
. Imagem e personificao: E a orla branca () correndo, at ao fim do mundo, a sugerir a
rapidez imparvel das Descobertas.
. Gradao: Deus quer, o homem sonha, a obra nasce, para explicar a lgica da relao Deus
/ Homem / obra. De acordo com as segunda e terceira estrofes, a obra nasceu, o mar passou
a unir em vez de separar, o imprio cumpriu-se e desfez-se.
. Apstrofe: Senhor.
Comentrios:
Este poema um dos mais conhecidos de Mensagem.
-
"Foste desvendando a espuma e a orla branca foi de ilha em continente..."- a espuma das ondas que acabam nas praias ou rebentam contra os rochedos marca as costas com uma orla branca. A frase anterior uma forma potica de dizer que as costas foram sendo descobertas, primeiro as ilhas e depois os continentes, "at ao fim do mundo".
"Quem te sagrou criou-te portugus"- porque, segundo Fernando Pessoa, Deus fadou Portugal para um magno destino e o Infante foi, por assim dizer, parte do "puzzle".
"Do mar e ns, em ti nos deu sinal"- atravs de ti revelou-nos que o nosso destino era o Mar.
"Cumpriu-se o Mar e o Imprio se desfez...falta cumprir-se Portugal"- cumpriu-se o destinado: o Mar foi desvendado; o Imprio Portugus (isto , o controle das rotas ocenicas e a hegemonia no ndico) desfez-se. Pessoa pensa que Portugal est destinado grandeza futura, e isso ainda no se cumpriu!
Horizonte
Comentrios:
"teus medos tinham coral, e praias e arvoredos"- o medo do desconhecido o temor infundado
do que se imagina como real. Fernando Pessoa exemplifica dizendo que o medo ancestral do
mar era sem fundamento: no havia monstros ou turbilhes que afundassem os navios-
quando ultrapassmos o medo s encontrmos praias e arvoredos, flores e aves...
"mistrio"- termo muito utilizado por Pessoa na acepo de desconhecido, indescoberto.
"Sul sidreo"- Sul sideral, isto , sul celeste- aqui refere-se constelao Cruzeiro do Sul que indica a direco do polo austral
"iniciao"- cerimnia pela qual se comea a explicar a algum os mistrios de alguma religio ou doutrina. O termo est frequentemente associado aos ritos das sociedades ditas secretas. Aqui a iniciao refere-se ao esclarecimento geogrfico.
"resplendia sobre as naus da iniciao"- brilhava (resplandecia) sobre as naus que demandavam o desconhecido para o desvendar.
_
O horizonte smbolo do indefinido, do longe, do mistrio, do desconhecido, do mundo a
descobrir, do objectivo a atingir.
Atravs da apstrofe inicial, " mar anterior a ns", o sujeito potico dirige-se ao mar
desconhecido, ainda no descoberto/navegado.
Na 1 estrofe encontramos uma oposio implcita. A oposio refere o mar anterior aos
Descobrimentos portugueses ("medos", "noite", "cerrao", "tormentas", "mistrio" -
substantivos que contm a ideia de desconhecido, que remetem para a face oculta da realidade)
e o mar posterior a esse feito ("coral e praias e arvoredos", "Desvendadas", "Abria", "Splendia"
- palavras que contm a ideia de descoberta).
A expresso "naus da iniciao" (v. 6) uma referncia s naus portuguesas que, impulsionadas
pelos ventos do "sonho", da "esp'rana" e da "vontade", abriram novos caminhos e deram incio
a um novo tempo.
-
A segunda estrofe essencialmente descritiva. Essa descrio feita por aproximaes
sucessivas, de um plano mais afastado para planos mais prximos: - [Ao longe] a "Linha severa
da longnqua costa" (= o horizonte); [Ao perto] "Quando a nau se aproxima, ergue-se a encosta /
Em rvores"; "Mais perto", ouvem-se os "sons" e percebem-se as "cores"; "no desembarcar"
vem-se "aves, flores".
O sujeito potico, na ltima estrofe, apresenta uma definio potica de sonho: O sonho ver o
invisvel, isto , ver para l do que os nossos olhos alcanam (ver longe); o sonho procurar
alcanar o que est mais alm ( esforar-se por chegar mais longe); o sonho alcanar/aceder
Verdade, sendo que esta conquista constitui o prmio de quem por ela se esfora. De salientar,
aqui, o uso do presente do indicativo - "" - que confere, a estes versos, um carcter intemporal
e programtico.
No verso 1 da terceira estrofe temos o uso da anttese - ver/invisveis.
Nos vesos 16-17 reforada a passagem do abstracto ao concreto. Essa passagem reforada
pela acumulao, no verso 17, de nomes concretos, precedidos de artigos definidos: "A rvore, a
praia, a flor, a ave, a fonte".
Este poema apresenta-nos o sonho como motor da aco dos Descobrimentos. o sonho que,
movido pela esperana e pela vontade, desperta no homem o desejo de conhecer, de procurar a
verdade.
O ttulo "Horizonte" evoca um espao longnquo que se procura alcanar funcionando, assim,
como uma espcie de metfora da procura, como um apelo da distncia, do "Longe", eterna
procura dos mundos por descobrir.
Padro Comentrios: Este outro dos poemas mais conhecidos de Mensagem e tal como os seus pares (Infante, Mar Portugus, e Mostrengo) a linguagem clara e quase no requer explicaes.
"o mar com fim..."- o Mediterrneo; "o mar sem fim..."- o Oceano.
"o que me h na alma (...) s encontrar, de Deus na eterna calma, o porto sempre por achar"- irei sempre mais longe porque, por mais longe que v, haver sempre um porto por descobrir; s descansarei (s encontrarei esse porto) depois de morrer.
palavras mantidas em ortografia antiga: deante= diante; signala= sinala (assinala); immenso= imenso; portuguez= portugus.
A tcnica escolhida pelo "eu" para falar do padro partir do geral para o particular: deixa o
padro no area (1 quadra); apresenta a simbologia geral do padro (2 quadra); refere o valor
das Quinas (3 quadra) e da Cruz (4 quadra).
Subjaz ao ltimo verso de cada quadra a ideia da eterna procura ("para diante"; "o por-fazer";
"o mar sem fim"; "sempre por achar") que se liga "febre de navegar", nsia, insatisfao.
Mais importante do que a imperfeita obra realizada o "por-fazer", a necessidade de navegar
"para diante" , no "mar sem fim", na demanda do "porto sempre por achar".
"Navegar no pode ser entendido apenas no sentido literal. No poema, surge, tambm, como
metfora de toda a procura.
-
Embora "ousada", a "obra [sempre] imperfeita", por isso a exemplaridade do heri reside,
sobretudo, na sua atitude de permanente insatisfao diante do j feito. isto que o eleva acima
da medida humana comum.
O "eu" do poema um heri predestinado: "A alma divina", "O por-fazer s com Deus",
"S encontrar de Deus [...] / O porto sempre por achar".
O padro no assinala a viagem conseguida, pois o importante no chegar partir. O padro
o marco sempre penltimo da viagem comeada.
O Mostrengo
. Assunto: Chegados ao Cabo das Tormentas, os portugueses encontram um monstro voador, o
mostrengo, que pretende atemoriz-los para que no prossigam a viagem. Porm, o marinheiro
portugus (o homem do leme), embora de incio o receie e hesite, enfrenta-o, neutralizando-o, pois
est imbudo da vontade de um rei e de um povo que no abdica da sua misso.
2. Ttulo
1.) A palavra mostrengo derivada por sufixao (monstro + engo). O sufixo -engo, de origem
germnica, tem um valor pejorativo. Mostrengo significa, assim, ente fantstico, geralmente
considerado perigoso e assustador, dotado de uma configurao fora do normal e desagradvel (in
manual Entre Margens 12).
2.) Por outro lado, mostrengo est relacionado com o verbo mostrar. Neste sentido, mostrengo
aquele que mostra o que no ainda conhecido.
3. Retrato do mostrengo:
. situa-se no desconhecido, na lonjura, no local que se julgava ser o fim (est no fim do mar / Na noite
de breu) vv. 1-2), ligado a um tom de mistrio, de enigma;
. o senhor dos mares e dos seus segredos: Nas minhas cavernas que no desvendo, / Meus tetos
negros do fim do mundo (vv. 6-7) - o mar apresentado fechado no sentido de espao e sem fim no
sentido da profundidade, indiciando mistrio; por outro lado, representa o desconhecido (Nas minhas
cavernas que no desvendo; fim do mundo);
. tem um aspeto semelhante ao de um morcego:
- voa (v. 2) notar a inteno de exprimir a voz do morcego e o seu nervosismo, por ver os seus
domnios ameaados, atravs da musicalidade de sons como /u/, //, //, /i/, /a/;
- chia;
- habita cavernas e tetos negros;
- roa nas velas da nau;
- v as quilhas de alto (v. 11);
- imundo e grosso - tem um aspeto medonho, horrvel (v. 13);
. ameaador e arrogante (as suas falas);
. defende os seus domnios perante a ousadia dos portugueses, que ousam invadir e desvendar esses
domnios;
. tem atitudes intimidatrias, ameaadoras, aterrorizadoras, de fora e poder:
- os movimentos circulares que tece em roda da nau (vv. 3, 4, 12, 13, 25) parecem querer asfixiar os
portugueses;
-
- roa nas velas;
- chia;
. tem poder sobre o mar: o que s eu posso (v. 14);
. identifica-se com o mar tenebroso e desconhecido: moro onde nunca ningum me visse / E escorro os
medos do mar sem fundo (vv. 15-16) - notar a expressividade do verbo escorrer, sugerindo que o
mostrengo simboliza o mar, bem como a aliterao em /m/ e o pretrito imperfeito do conjuntivo
visse, sugerindo o desejo do mostrengo em continuar desconhecido;
. sente-se desafiado;
. infunde medo e terror;
. manifesta revolta, indignao e desejo de vingana perante a ousadia dos portugueses (Quem que
ousou entrar, Escorro os medos do mar sem fundo);
. os argumentos de autoridade que evoca tm como objetivo infundir nos marinheiros o medo e lev-los
a retroceder, a desistir da sua viagem;
. na 3. estrofe, apaga-se e j no fala, facto que denota o triunfo dos marinheiros. De facto, medida
que o poema vai avanando, o mostrengo perde fora, acabando por se anular.
. Retrato do marinheiro:
. 1. resposta: - pelo tom aterrador das suas palavras;
- medroso / receoso - pelas atitudes intimidatrias;
- intimidado - pelo ambiente sinistro que o rodeia;
- treme e fala em simultneo;
- invoca a autoridade de que foi investido: El-Rei D. Joo segundo! (v. 9);
- o agente, o representante do rei e, na pessoa do soberano, todo o povo portugus.
. 2. resposta:
- mostra um crescendo de coragem e valentia, pois se, na 1. estrofe, fala a tremer, nesta fala depois
de tremer.
. 3. fala do marinheiro - clmax da tenso dramtica:
- as suas atitudes contraditrias [desprender (desistncia) e prender as mos ao leme, tremer e deixar
de tremer] revelam ainda certa dvida, insegurana, hesitao e receio;
- de facto, o marinheiro est dividido interiormente entre o terror e a coragem, acabando por vencer
esta ltima;
- consciencializa-se de que ali no se representa a si mesmo (Aqui ao leme sou mais do que eu - v.
22), mas a vontade do rei e do seu povo, e enfrenta o mostrengo, vencendo e prosseguindo a sua
misso, uma atitude que revela coragem, convico, fora e determinao.
Estas reaes do marinheiro ao discurso do mostrengo mostram que h uma espcie de gradao
ascendente nas suas atitudes que contrasta com as do monstro. De facto, se, da primeira vez que lhe
respondeu, se mostrou medroso e timorato (disse, tremendo, isto , falou e tremeu ao mesmo tempo,
e apenas respondeu El-rei D. Joo Segundo - vv. 8-9), da segunda vez, embora tenha dado a mesma
resposta, j se nota uma evoluo, pois os dois atos esto dissociados (tremeu, depois deixou de tremer
e falou, o que revela um ganho de coragem); da terceira vez, o marinheiro ainda se sentiu tentado a
erguer as mos do leme, a desistir da sua misso, mas logo tomou conscincia do que estava em causa -
o seu rei e o seu povo: E disse ao fim de tremer trs vezes (v. 21). o recuperar definitivo da
-
coragem, o assumir das responsabilidades de que se encontra investido: o tremer deixou de interferir
com a sua fala.
. Atmosfera tenebrosa e medonha:
. Ambiente:
- Sensaes visuais, que carregam o ambiente de tons tenebrosos:
- noite de breu;
- tetos negros;
- trevas do fim do mundo;
- as quilhas que vejo;
- Sensaes auditivas, que acentuam a horribilidade do quadro:
- voou trs vezes a chiar;
- as quilhas que ouo;
. Personagem: mostrengo e no monstro;
. Atitudes e os movimentos circulares, sitiantes e ameaadores do mostrengo:
- roda da nau voou trs vezes;
- Voou trs vezes a chiar;
- onde me roo;
- Trs vezes rodou imundo e grosso.
. Relao eu (o mostrengo) / tu (o marinheiro), criadora de um clima de sem cerimnia e
agressividade entre os interlocutores;
. Abundncia de formas verbais que sugerem movimento: ergue, voou, tremer, rodou, ata;
. Localizao espcio-temporal:
- roda da nau;
- no fim do mar;
- nas minhas cavernas que no desvendo, / Meus tetos negros do fim do mundo!;
- onde nunca ningum me visse;
- mar sem fundo.
. Simbolismo das personagens:
. O mostrengo simboliza - o mar desconhecido
- os segredos o