ANÁLISE DE UNIDADES BÁSICAS DE PAISAGEM NO MUNICÍPIO DE...

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ANÁLISE DE UNIDADES BÁSICAS DE PAISAGEM NO MUNICÍPIO DE MIRANTE DO PARANAPANEMA-SP Reginaldo José de Souza 1 . Orientador: Prof. Dr. Messias Modesto dos Passos. Programa de Pós-Graduação em Geografia / FCT-UNESP Bolsista CAPES Resumo Este texto resulta de trabalhos de campo realizados em fase inicial de nossa pesquisa no âmbito do projeto “A Derivação Antropogênica da Paisagem na Raia Divisória São Paulo-Paraná-Mato Grosso do Sul: O Caso de Mirante do Paranapanema-SP”. Para a elaboração deste projeto, partimos da concepção de que a Geografia é uma interpretação social do território e adotamos como objetivo maior da pesquisa o estudo do “meio ambiente territorializado”, ou seja, diagnosticar e prognosticar como as dinâmicas socioambientais se materializam na paisagem-território e se prestam como indicadores dos processos históricos da evolução/construção da paisagem. Neste texto, primeiramente abordaremos a importância da apreensão de unidades de paisagem diretamente discerníveis no terreno para que tenhamos um melhor conhecimento da realidade de nosso objeto de estudo. De modo sucinto, apresentaremos alguns elementos históricos da ocupação do Pontal do Paranapanema como um todo, bem como do município ao qual dedicamos nossa análise. Por fim, trataremos das unidades básicas de paisagem observadas em Mirante do Paranapanema, suas dinâmicas e impactos. Palavras-chave: Paisagem, Impactos Ambientais, Mirante do Paranapanema-SP. Introdução Pode-se afirmar que a natureza direta ou indiretamente antropizada não é mais o que ela era no passado remoto. Os impactos humanos sobre sua estrutura e funcionamento, dia após dia, nos remetem a diversos desafios. Um deles está na busca por teorias e métodos científicos capazes de abarcar a problemática ambiental e fornecer respostas criativas às necessidades de usos mais racionais dos recursos naturais. Por longo tempo a natureza passou apagada pela história dos homens, servindo apenas como fornecedora de matérias-primas para a produção de mercadorias, sobretudo após o estabelecimento do capitalismo industrial. Atualmente ela retorna ao debate entre todos aqueles que se interessam pela atual desordem do mundo e se preocupam com o futuro (imediato ou de longo prazo) do planeta. Para nós geógrafos, a atenção sobre a problemática ambiental já é praticamente uma tradição desde a institucionalização de nossa ciência. Hoje em dia, quando estudamos a história do pensamento geográfico e suas implicações nas produções científicas, entendemos que nem sempre as teorias e métodos utilizados no passado (e até mesmo no presente) foram/são suficientes para uma abordagem 1 Endereço eletrônico: [email protected]

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ANÁLISE DE UNIDADES BÁSICAS DE PAISAGEM NO MUNICÍPIO DE MIRANTE DO PARANAPANEMA-SP

Reginaldo José de Souza 1.

Orientador: Prof. Dr. Messias Modesto dos Passos.

Programa de Pós-Graduação em Geografia / FCT-UNESP

Bolsista CAPES

Resumo

Este texto resulta de trabalhos de campo realizados em fase inicial de nossa pesquisa no âmbito do projeto “A Derivação Antropogênica da Paisagem na Raia Divisória São Paulo-Paraná-Mato Grosso do Sul: O Caso de Mirante do Paranapanema-SP”. Para a elaboração deste projeto, partimos da concepção de que a Geografia é uma interpretação social do território e adotamos como objetivo maior da pesquisa o estudo do “meio ambiente territorializado”, ou seja, diagnosticar e prognosticar como as dinâmicas socioambientais se materializam na paisagem-território e se prestam como indicadores dos processos históricos da evolução/construção da paisagem. Neste texto, primeiramente abordaremos a importância da apreensão de unidades de paisagem diretamente discerníveis no terreno para que tenhamos um melhor conhecimento da realidade de nosso objeto de estudo. De modo sucinto, apresentaremos alguns elementos históricos da ocupação do Pontal do Paranapanema como um todo, bem como do município ao qual dedicamos nossa análise. Por fim, trataremos das unidades básicas de paisagem observadas em Mirante do Paranapanema, suas dinâmicas e impactos.

Palavras-chave: Paisagem, Impactos Ambientais, Mirante do Paranapanema-SP.

Introdução

Pode-se afirmar que a natureza direta ou indiretamente antropizada não é mais o que ela era no

passado remoto. Os impactos humanos sobre sua estrutura e funcionamento, dia após dia, nos remetem

a diversos desafios. Um deles está na busca por teorias e métodos científicos capazes de abarcar a

problemática ambiental e fornecer respostas criativas às necessidades de usos mais racionais dos

recursos naturais. Por longo tempo a natureza passou apagada pela história dos homens, servindo

apenas como fornecedora de matérias-primas para a produção de mercadorias, sobretudo após o

estabelecimento do capitalismo industrial. Atualmente ela retorna ao debate entre todos aqueles que se

interessam pela atual desordem do mundo e se preocupam com o futuro (imediato ou de longo prazo)

do planeta.

Para nós geógrafos, a atenção sobre a problemática ambiental já é praticamente uma tradição

desde a institucionalização de nossa ciência. Hoje em dia, quando estudamos a história do pensamento

geográfico e suas implicações nas produções científicas, entendemos que nem sempre as teorias e

métodos utilizados no passado (e até mesmo no presente) foram/são suficientes para uma abordagem

1 Endereço eletrônico: [email protected]

mais substanciosa da natureza e da questão ambiental. Porém, a nossa tradição em transitar entre as

franjas dos fatos sociais e dos naturais é inegável.

Neste sentido, destacamos a nossa inclinação científica às proposições teórico-metodológicas de

Georges Bertrand que se referem ao tratamento da questão ambiental e da classificação paisagística

por meio de três entradas abrangentes e complementares: o modelo GTP – Geossistema, Território e

Paisagem. (BERTRAND, 2007)

O geossistema é considerado como uma fonte (source), totalmente natural, permitindo a

compreensão da estrutura e funcionamento biofísico de um espaço geográfico inclusive seus níveis de

antropização; o território como uma entrada socioeconômica (ressource) a partir do qual se tem a

possibilidade de compreender as repercussões da sociedade na organização e funcionamento do

espaço considerado; a paisagem, uma entrada sócio-cultural, de tempo longo e identitário

(ressourcement), que se presta para avaliar como as ações das sucessivas sociedades se materializam

no território para construir as sucessivas paisagens. (BERTRAND, 2002)

O texto que apresentaremos trata de algumas reflexões iniciais sobre o nosso recorte geográfico

de pesquisa no âmbito do projeto “A Derivação Antropogênica da Paisagem na Raia Divisória São

Paulo-Paraná-Mato Grosso do Sul: O Caso de Mirante do Paranapanema-SP” 2. Temos como

referencial teórico-metodológico o modelo GTP para elaboração de nossa pesquisa e, neste momento, o

que expomos são primeiras tentativas de análise da realidade partindo destes pressupostos. Ou seja,

uma primeira tentativa de análise integrada, considerando os impactos da sociedade sobre o meio

natural a partir de trabalhos de campo que realizamos no município.

Unidades de paisagem

Para que tenhamos alguma prévia noção da dinâmica socioespacial e, a partir de então,

elementos suficientes para a análise de um dado objeto de estudo (um território e sua paisagem, por

exemplo) é preciso, em um primeiro momento, fragmentar a realidade. No caso de nossa pesquisa, é

necessário decompor o todo espacial no intuito de melhor compreender sua dinâmica por meio da

análise das “descontinuidades objetivas da paisagem”.

Passos (1988, p.191)) nos lembra que é em função do estado global que percebemos as

descontinuidades objetivas da paisagem no Pontal do Paranapanema. Aprioristicamente, este autor

classifica quatro grandes unidades para esta região: o espigão divisor entre as calhas dos rios Paraná e

Paranapanema, a vertente do Rio Paraná, a vertente do Rio Paranapanema e o varjão na confluência

dos rios.

2 Vinculado ao Projeto Temático “Dinâmicas Socioambientais, Desenvolvimento Local e Sustentabilidade na Raia Divisória São Paulo-Paraná-Mato Grosso do Sul”. Coordenado pelo Prof. Dr. Messias Modesto dos Passos, financeiramente apoiado pela FAPESP (Processo: 05/55505-3).

Contudo, dentro de um projeto mais complexo, como o nosso, que ultrapassa a visão unilateral, de definição de unidades do terreno, apoiada tão somente em propósitos geomorfológicos ou fitogeográficos, se torna difícil “plantar” na paisagem essas “unidades”. Sobretudo porque, [...] algumas unidades básicas já se evidenciaram. As diferenças entre as “unidades básicas” situadas na vertente do Rio Paraná e na vertente do Rio Paranapanema, se evidenciaram, por exemplo, a partir do momento em que o processo de ocupação do solo, via desmatamento, pastagens e cultivos, acentuou a ação morfogenética dos agentes climáticos. (PASSOS, 1988, p.192)

Esta afirmação de Passos advém de uma incerteza com relação à aplicabilidade da taxonomia

das sub-unidades (contidas nas unidades maiores) conforme o modelo de hierarquização (um tanto

quanto rígida) proposto por Bertrand (1968): geossistema, geofácies e geótopos. O autor opta por uma

definição de unidades cujos critérios partem do uso atual do solo, em que as descontinuidades se dão

por conta das ações antrópicas predominantes.

O nosso critério também está balizado por suas idéias, notadamente pelo fato de trabalharmos

com um recorte espacial de menor proporção: o município de Mirante do Paranapanema-SP. Avaliamos

que, a partir do uso do solo, a nossa análise será coerente com aquilo que observamos no terreno.

Neste instante, é importante expor, mesmo que de modo sucinto, alguns elementos referentes à

ocupação histórica da região do Pontal do Paranapanema. Com isso, acreditamos fornecer maiores

subsídios para que o leitor melhor compreenda a atual dinâmica entre sociedade e natureza no âmbito

do município ao qual dedicamos nossas reflexões.

O Pontal do Paranapanema

Antes de tudo, julgamos interessante frisar a observação de Milton Santos com relação à

transformação das relações entre a sociedade e a natureza no decorrer do tempo:

A história da humanidade parte de um mundo de coisas em conflito para um mundo de ações em conflito. No início, as ações se instalavam nos interstícios das forças naturais, enquanto hoje é o natural que ocupa tais interstícios. Antes, a sociedade se instalava sobre lugares naturais, pouco modificados pelo homem, hoje, os eventos naturais se dão em lugares cada vez mais artificiais, que alteram o valor, a significação dos acontecimentos naturais. (SANTOS, 1999, P.117)

Especificamente com relação ao Pontal como um todo e o município de Mirante do

Paranapanema-SP, partimos da hipótese de que as ações antrópicas transformaram definitivamente

esta significação dos elementos naturais em sua respectiva área.

Com a chegada dos colonizadores e avanço da fronteira agrícola, a fauna e a flora foram

substancialmente alteradas e tanto o potencial ecológico como a população regional foram prejudicados.

Em linhas gerais, o processo recente de derivação das paisagens no Pontal do Paranapanema ocorre

conforme os acontecimentos que explicitaremos a seguir.

N

R

Pontal do Paranapanema e Localização da Área de Estudo

Entre os anos de 1917 a 1922, a Estrada de Ferro Sorocabana avançou de Presidente Prudente

até Presidente Epitácio, possibilitando a expansão do cultivo de café para o oeste paulista, porém, ainda

não atingindo a área correspondente ao Pontal do Paranapanema.

Somente no início da década de 1940, as matas do atual município de Mirante do Paranapanema

– auto-intitulada de capital do Pontal – começaram a ser eliminadas, abrindo espaço para a cultura do

algodão. Durante a década de 1950 é que a devastação das reservas estaduais do município de

Teodoro Sampaio foi incrementada. Na verdade, foi entre 1955 e 1965 que as reservas estaduais

passaram pela fase mais crítica.

Nessa fase, o Pontal viveu – segundo a mentalidade imediatista dos "progressistas" – os seus

sonhos, sobretudo através da chegada do Ramal de Dourados e da fundação dos patrimônios, e ficou

na triste realidade da agonia e morte da mata, consubstanciando o impacto ambiental negativo – pela

eliminação das reservas – e um quadro de injustiça social muito grave – pela instalação dos latifúndios e

da pecuária, com expulsão daqueles que foram usados como mão-de-obra.

A partir de 1976, num quadro de crise econômica – agravada pelo problema do petróleo –, novos

projetos comparecem, com as antigas propostas de redenção de desenvolvimento do Pontal: a

Destilaria de Álcool Alcídia S/A, as hidroelétricas da CESP e os reassentamentos dos pequenos

proprietários desalojados pelas suas obras, além do "Projeto de Valorização Agrícola do Pontal", através

da reforma agrária implantada na Gleba XV de Novembro.

De uma forma geral, a crise energética e agrária criou um clima de maior tolerância em relação

aos depredadores das áreas de mata do Pontal, que passaram a ser olhadas, por muitos, como áreas

disponíveis para projetos agrícolas e hidroelétricos.

Dentro do conjunto da paisagem originalmente uniforme do Pontal, as ações antrópicas atuaram

diversamente, criando um mosaico de unidades básicas da paisagem, bem definidas, segundo o uso do

solo.

No que diz respeito, especificamente, ao município de Mirante do Paranapanema (ver figura 1),

este foi palco de um tipo de ocupação agrícola – desde a sua fundação em meados da década de 1940 -

que provocou uma morfodinâmica muito agressiva, resultando em um rápido exaurimento do solo, com

erosão e assoreamento dos córregos, ou seja, consubstanciando-se uma série de impactos ambientais

negativos que, de modo direto ou indireto, acabam por se refletir na sociedade local.

Estes impactos podem ser apreendidos notadamente por produzirem unidades de paisagem

diretamente identificáveis no terreno.

Fig. 1 –

Análise das unidades básicas em Mirante do Paranapanema-SP

A proposta deste texto é a realização de uma análise de unidades básicas da paisagem

observadas no terreno por meio de trabalhos de campo, porém, antes é preciso salientar que o Pontal

do Paranapanema como um todo, passou por inúmeras transformações em seu potencial ecológico e

em sua exploração biológica – fazendo uso dos termos de Georges Bertrand (1968, 2002). Preferimos

considerar estas transformações como impactos, notadamente pelo fato de nosso objetivo estar ligado a

um estudo da ação humana sobre a natureza e suas repercussões na área de pesquisa em questão.

Conforme Passos,

O Pontal do Paranapanema constituía-se, originalmente, numa paisagem relativamente uniforme, com uma compartimentação geomorfológica pouco diversificada, em equilíbrio biostásico, podendo ser associado ao domínio dos mares de morros, embora fora de sua área mais típica, situada nas regiões cristalinas do Brasil Sudeste. É evidente que por se tratar de uma área periférica, com relevo tabuliforme suavemente convexizado, apresenta um potencial ecológico e uma exploração biológica um tanto distinta da existente na área “core” desse domínio morfoclimático. Com a chegada tardia do homem, a fauna e a flora foram substancialmente alteradas [...]. (PASSOS, 1988, p. 292)

Em trabalhos de campo que realizamos no município de Mirante do Paranapanema3,

observamos diversos pontos onde se desdobram problemas de erosões, assoreamentos e

empobrecimento do solo.

Neste sentido, salientamos a grande importância dos trabalhos de campo em si para entrarmos

em contato direto com alguns problemas que a realidade nos apresenta. No que tange à nossa pesquisa

no referido município, destacamos a remodelação da paisagem definida por uma intensa ação antrópica

caracterizada por formas de ocupação e uso agropecuários irracionais.

Esta irracionalidade se materializa sobre o meio natural, os geocomplexos, geofácies e geótopos,

podendo ser observada enquanto unidades elementares, possibilitando o entendimento de lógicas que

conferem uma descontinuidade objetiva à paisagem.

Via de regra, as alterações antrópicas em Mirante do Paranapanema-SP estão correlacionadas

ao modelo dominante de ocupação socioeconômica do Pontal como um todo, isto é, por meio do

desmatamento (muitas vezes já com formação de pastagens) e uso do solo de modo a gerar seu

verdadeiro exaurimento e posterior criação de gado.

Geralmente a percepção dos colonizadores esteve ligada à derrubada da mata enquanto uma

espécie de efetivação da posse e garantia do patrimônio. Portanto, a área está historicamente

estigmatizada por práticas agrícolas bastante inadequadas, propulsoras de processos erosivos por conta

de incisivas alterações impostas à cobertura vegetal.

Passos (1988, p.153) em seu estudo de Geografia Física Global sobre o Pontal do

Paranapanema, comparou mapas de uso do solo de 1962 e 1972 constatando que os desmatamentos

no período se efetivaram nos baixos espigões e encostas, ou seja, nas áreas potencialmente propicias à

agricultura. O que o referido autor chama de “área core” do Pontal, durante a década de 1960 ainda

apresentava uma expressiva cobertura vegetal, enquanto que em sua área mais “periférica” há

predominância de culturas anuais e perenes, sobretudo no município de Mirante do Paranapanema-SP

cujo parcelamento intenso dos lotes agrícolas denota uma superexploração econômica, fato este

responsável pela aceleração dos impactos ambientais.

Em visitas realizadas à área rural do município, vislumbramos algumas unidades de paisagem

bastante pertinentes para exemplificar os fatos acima destacados, ou seja, significativos pontos

indicadores de uma dinâmica resistásica resultante das ações antrópicas acumuladas no tempo e

deixando seus rastros negativos sobre o espaço, sobre a natureza.

O ribeirão Santo Antônio, configura-se com uma drenagem fluvial entalhada na área rural do

município de Mirante do Paranapanema (seguindo o sentido de norte a sul), exemplifica os reflexos de

um uso irracional e predatório do solo. (ver foto 1)

3 Nos meses de março e abril de 2008.

Conforme o que anteriormente foi exposto, desde os primeiros anos de sua fundação (meados

da década de 1940), este município foi palco de um tipo de ocupação agrícola que provocou uma

transformação muito agressiva, resultando em um rápido exaurimento do solo com erosão e

assoreamento dos córregos, ou seja, consubstanciando-se uma série de impactos ambientais negativos

que, de modo direto ou indireto, se refletem na sociedade local.

No passado, sobretudo até a década de 1970, não existiam preocupações com a necessidade de

proteção do solo por parte dos proprietários agrícolas. Passos (1988, p.162) salienta que em

questionários aplicados aos ex-lavradores do Pontal, as respostas obtidas sempre foram negativas

quando interrogados a respeito de utilização de curvas de nível em suas terras ou se tinham alguma

orientação técnica de agrônomos. Em conversas que tivemos, em nossos trabalhos de campo, com

alguns pequenos-proprietários oriundos do MST, tomamos nota de que muitos deles continuam sem ter

este aparato técnico que os auxiliem no manejo de suas terras.

Atualmente, Mirante do Paranapanema não tem mais o mesmo destaque, como no passado,

com relação ao uso agrícola intensivo, notadamente no que tange ao plantio de algodão, café,

amendoim etc. A pecuária extensiva também está presente na economia local e deixa seus reflexos na

paisagem. Essa constatação está fundamentada, também, na observação in loco de prédios

abandonados das indústrias beneficiadoras de algodão, amendoim e mamona (Anderson Clayton,

Foto 1 - Médio curso do Córrego Santo Antônio em Mirante do Paranapanema-SP. Fonte: Trabalho de campo (2008). Autor: Messias M. dos Passos.

Total ausência de mata ciliar.

Formação de imensos bancos de areia nas margens do córrego, resultado de um uso do solo pouco sustentável.

Braswey, Sanbra, Macfaden) na área urbana, que evidenciam o fenômeno da desterritorialização de

intensa atividade agrícola pretérita.

Outro problema verificado na área estudo é a permanência das estradas rurais e sua contribuição

para os impactos ambientais. Durante as décadas de 1970/1980, a abertura das estradas dentro das

propriedades não obedecia a nenhuma orientação técnica e a erosão em sulcos nessas estradas era

muito acentuada. (PASSOS, 1988, p.163)

Nos dias de hoje, salientamos a presença do Programa Melhor Caminho, de iniciativa do

Governo Estadual, sob coordenação da Secretaria de Agricultura e Abastecimento e a CODASP

(Companhia de Desenvolvimento Agrícola de São Paulo) como executora das obras. O programa

contemplou o município com cerca de oito quilômetros em melhorias nas vias rurais com o objetivo

maior de sanar os problemas gerados a partir da má conservação das estradas. Entretanto, o problema

da erosão, muitas vezes, ainda é agravado pela presença de estradas má conservadas. Gerando

maiores preocupações quando se desdobra em áreas de nascentes de córregos e ribeirões.

É o caso de uma das nascentes do córrego Santo Antônio onde se identifica processo erosivo

bastante intenso em área de afloramento do arenito do grupo Bauru, com presença de solo

hidromorfizado indicando maior largura do leito do córrego no passado e perda do capeamento de

latossolo, principalmente a partir da margem da estrada nas proximidades.

Outro aspecto importante a ser tratado no que diz respeito a esta área é o próprio parcelamento

das propriedades dos sitiantes. Geralmente lotes de sete, oito ou dez alqueires no máximo, que se

destinam à pecuária leiteira. Fato este que, aliado à acentuada declividade das vertentes, ao baixo grau

de permeabilidade do solo (sobre formações mais resistentes do grupo Bauru) e práticas pouco, ou

quase nada, conservacionistas, geram processos erosivos mais críticos.

Pari passu,

[...] a topografia regional apresenta muitos outros pontos de ocorrência de desníveis pronunciados que trai a idéia geral de um relevo pouco movimentado4. Todas essas áreas foram submetidas a cultivos agrícolas sem nenhuma técnica de conservação do solo; ainda hoje é chocante o desleixo em relação à proteção do solo dessas áreas, nos momentos de “refazer” os pastos. A cobertura vegetal é um elemento considerado essencial na maioria dos trabalhos relativos à avaliação da taxa de erosão do solo. Ela desempenha a função de retardar a erosão do solo, amortecendo o impacto pluvial, favorecendo o armazenamento de água e tornando o seu escoamento menor. (PASSOS, 1988, p.164)

Entende-se, portanto, que os impactos ambientais resultam de ações antrópicas

sistematicamente desorganizadas. Tudo começou com o intenso desmatamento para garantir a posse

da terra no passado, perpassando pelos diferentes usos agrícolas do solo, esgotamento, formação de

4 No que diz respeito a esta declividade das vertentes na área, isso vem ao encontro da caracterização de que morfologia do relevo no Pontal se apresenta de modo homogêneo e monótono, a não ser pelo “afloramento” do Morro do Diabo.

Messias M. dos Passos (mar. 2008)

pastos e pecuária extensiva. E, contribuindo com isso, a presença de algumas estradas que aceleram o

escoamento superficial das águas, gerando assoreamento de córregos e supressão de nascentes.

Outras unidades de paisagem se apresentaram muito interessantes enquanto indicadoras desta

condição de abandono das propriedades rurais em Mirante do Paranapanema-SP. Em uma de nossas

saídas a campo (maio de 2008), conosco esteve presente um morador da área rural do município cujas

respostas às nossas perguntas, de maneira informal, foram reveladoras do processo de degradação

existente às margens dos cursos d’água no local.

Ainda seguindo o curso do ribeirão Santo Antônio, o entrevistado dizia ser “a correnteza do rio

muito mais forte nos tempos em que eu era criança do que hoje em dia”. Enquanto fotografávamos a

área, destacavam-se na paisagem grandes bancos de areia nas margens e até mesmo no interior da

lamina d’água (foto 1 e 2). O leito do córrego realmente não poderia mais ser o mesmo em uma área de

ocupação agrícola mais antiga, sem preocupação com práticas de proteção do solo nas vertentes,

sobretudo nos períodos em que as chuvas não estão presentes como na estação úmida. Todos estes

fatores se combinam para resultar em um quadro resistásico de assoreamento e aguda desperenização.

Bancos de areia em pleno leito do córrego.

Processos erosivos por solapamento.

“Afunilamento” do leito do córrego exemplificando o seu processo de assoreamento.

Foto 2 – Assoreamento no médio curso do Córrego Santo Antônio. Fonte: Trabalho de campo (2008). Autor: Messias Modesto dos Passos.

Em sua Tese de Doutorado, Passos constatou que:

O Córrego Guaiçara e Santo Antonio – no Município de Presidente Bernardes – e o Córrego do Engano5 no Município de Mirante do Paranapanema são os que mais chamam a atenção, visto que o assoreamento dos seus leitos elevou o nível desses “rios” – que há cerca de 15-20 anos atrás passava sob as principais pontes a 8-10 metros abaixo e hoje estão apenas 2-3 metros. A agressividade com que se processou a ocupação do solo, sobretudo nas áreas agrícolas e nas pequenas propriedades, resultou numa fragilidade do geossistema em análise: mesmo pancadas de chuvas não muito excepcionais, são causadoras de estragos, apesar de tratar-se de um espaço geográfico caracterizado por certa homogeneidade geomorfológica, litológica e climatológica. No período seco, os processos morfogenéticos relacionados ao escoamento superficial se mantêm inativos. É nesse período que o processo de assoreamento e de desperenização dos córregos e ribeirões se evidencia. Vários trechos de alguns ribeirões chegam a secar totalmente. (PASSOS, 1988, p.98)

Vinte anos após esta observação, verificamos a intensificação destes processos, fazendo jus às

palavras do entrevistado que conosco percorria trechos do córrego em nossa saída a campo. Outro

aspecto percebido é a freqüente ocorrência de erosão por solapamento em vários pontos do curso do

Santo Antônio, sobretudo da média para a alta bacia, onde a agricultura se dá de modo mais predatório

e o ambiente apresenta topografia bastante movimentada ocasionando um forte lesionamento do

geocomplexo.

Este fato nos remete a uma reflexão sobre a própria ação antropogênica influenciando no

modelado do relevo e definindo, em conjunto com a dinâmica climato-hidrológica, o desdobramento de

eventos negativos que rompem com o equilíbrio ambiental na área. Nos meses mais chuvosos e de

temperaturas mais elevadas, geralmente de dezembro a fevereiro, há significativos impactos sobre os

processos morfo e pedogenéticos na área.

O nível do leito do córrego se eleva de modo significativo, a velocidade das águas acaba por

“tragar” as camadas de solo das margens, definindo também os pontos de hidromorfização e

conseqüente formação de brejos, evidenciada pela presença do “rabo-de-burro” e taboas, espécie

indicadora da umidade do solo.

Ilustrando a seriedade do problema de assoreamento/desperenização dos cursos d’água em

Mirante do Paranapanema-SP, temos o córrego Águas da Saúde, no qual existem pontos em que é

possível observar a presença de cercas – entre propriedades - cravadas no meio do leito.

É válido ressaltar que, a nosso ver, os problemas anteriormente apontados nunca devam ser

encarados em um viés fatalista, no qual a responsabilidade maior pela tríade erosão-assoreamento-

desperenização seja atribuída às chuvas e baixa resistência do solo na área. A sociedade não tem

poder sobre a dinâmica dos processos naturais, porém, pode amenizar seus efeitos até mesmo com o

objetivo de beneficiar-se com isso. Afinal, quando pensamos na relação homem-natureza, fica implícito

5 Córrego do Engano ou Santo Antônio: trata-se do mesmo córrego, porém, assumindo denominações locais diferentes.

que se trata de uma espécie de jogo em que ações negativamente exercidas sobre a natureza geram

respostas na mesma proporção para a sociedade.

O olhar sobre a paisagem de Mirante do Paranapanema-SP nos revela a importância da criação

de gado para a economia local. Em contrapartida, também vemos a incidência de processos erosivos,

assoreamento, desperenização e formação de brejos (impedindo o acesso do gado à água): um quadro

de fatos que são prejudiciais à manutenção da referida atividade.

Os prejuízos com essa forma desleixada de manejar o solo e a propriedade agrícola como um todo, têm causado sérios prejuízos ao balanço hidrológico e à economia regional, bastando lembrar que a compactação do solo pela erosão pluvial limita a infiltração e favorece o escoamento superficial, drenando as águas precipitadas para fora da região6, cuja carência hídrica se manifesta a cada ano que passa com maior gravidade. Os prejuízos econômicos, resultantes desse processo, são bem evidentes para quem avalia os efeitos da erosão e do déficit hídrico sobre a pedogênese e relaciona tal fato com a baixa capacidade de apascentamento das pastagens [...]. (PASSOS, 1988, p.98)

De modo geral, é a eliminação da cobertura vegetal o fator determinante do início da fase

resistásica nos geocomplexos. A incorporação socioeconômica do Pontal do Paranapanema esteve

intrinsecamente ligada à prática latifundiária dos colonizadores pela posse da terra notadamente na via

dos desmatamentos intensivos e ostensivos. Porém, em algumas glebas o desmatamento não foi o

princípio deste processo de ocupação. Sobretudo na “área core” do Pontal, muitas vezes o capim para o

boi conviveu com a mata antes que ela fosse derrubada.

Desta forma, podemos dizer que os impactos negativos nestas áreas foram menos significativos

do que aqueles ocorridos em áreas essencialmente agrícolas, muitas vezes com cultivos permanentes

por quase vinte anos seguidos (algodão, por exemplo): como foi o caso de Mirante do Paranapanema

desde a sua fundação.

Agravando a situação, temos a localização do município sobre o arenito da Formação Bauru.

Este se constitui como nível de base para o lençol de água subterrâneo e gera uma rede hidrográfica

muito densa devido sua impermeabilidade. Assim, os córregos e ribeirões incidem de modo mais

proeminente sobre a configuração do modelado do relevo.

Com esta preocupação em mente, refletimos a respeito da magnitude das manifestações da

natureza com relação às ações que o homem exerce sobre ela. O modo pelo qual as atividades

humanas são implementadas pode gerar impactos, tanto positivos quanto negativos ao meio ambiente.

No caso específico de nossa área de estudos, os reflexos negativos da ação antrópica são

evidentes. Outro exemplo que se destaca é o caso da Fazenda Boa Esperança (de propriedade da

empresa Prefer Agropecuária Ltda), entre os municípios de Presidente Bernardes e Mirante do

Paranapanema. Uma unidade de paisagem definida pela degradação em nome do lucro.

6 Região do Pontal do Paranapanema.

Conforme Parecer Técnico (036-2006) do Ministério Público do Estado de São Paulo, a empresa

foi denunciada devido à aplicação ilegal de agrotóxico e corte de árvores sem a autorização de acordo

com a Resolução SIMA 18/2007.

É importante expor que a propriedade possui área total de 1.230 hectares, ou seja, salientando

que não são apenas os pequenos proprietários que imprimem impactos negativos ao meio ambiente

devido uma imaginada superexploração de suas terras. Devemos estar sempre atentos para estes

casos, evitando-se eventuais interpretações preconceituosas com relação ao pequeno produtor, não

apenas no município, mas em todo o Pontal do Paranapanema.

A descrição da vistoria feita na fazenda (Parecer Técnico nº. 036-2006, Ministério Público de SP)

demonstra que, na propriedade, o solo vem sendo preparado para receber o plantio da cana-de-açúcar.

Em visita à fazenda, constatamos que o interesse pela implantação deste agrossistema se orienta pela

própria extensão da área e por sua topografia suave. Logo, este quadro de possibilidades fez com que

interesses econômicos suprimissem o bom senso em se adotar práticas menos predatórias em benefício

tanto da natureza quanto da sociedade local. (foto 3)

Por outro lado, existem algumas ações que representam mudanças relativamente positivas,

materializadas na paisagem de Mirante do Paranapanema-SP. Não poderíamos deixar de tratá-las

enquanto determinantes de outra dinâmica da relação homem-meio. Este é o caso do bairro rural

Colônia Branca que conta com os benefícios do Programa Microbacias Hidrográficas. Uma das metas

Árvore em processo de secação.

Depósitos de calcário provavelmente para futuro tratamento do solo tendo como finalidade o plantio da cana-de-açúcar.

Foto 3 – Porção da Fazenda Boa Esperança localizada no município de Mirante do Paranapanema. Um exemplo claro de desrespeito à legislação e degradação ambiental. Fonte: Trabalho de campo (2008). Autor: Messias Modesto dos Passos.

do programa é o investimento em infra-estrutura rural, incluindo a conservação das estradas, no sentido

de beneficiar o morador da área rural bem como minimizar a ação das erosões do solo por meio da

implantação de “murundus” e “camaleões” ao longo dos trajetos das vias, contribuindo para a diminuição

da velocidade de escoamento superficial das águas e conseqüente transporte de material por

enxurradas. A produção agrícola no bairro é relativamente diversificada, o que pudemos visualizar foram

plantações de cana-de-açúcar, arroz e tomate, além da criação de gado. Mesmo não se tratando de

uma área plenamente desenvolvida, talvez seja representativa de algumas medidas que possam

minimizar boa parte dos impactos negativos existentes no município.

Nas áreas de assentamento de reforma agrária, notamos lotes sem cultivos diversificados. A

infra-estrutura geralmente é insatisfatória (caso ela, de fato, exista). Os assentados não contam com

assistência técnica especializada, conforme respostas de dois entrevistados. O forte da produção é a

pecuária leiteira, com vistas a um laticínio de Presidente Prudente. Realizamos entrevistas informais

com alguns moradores que mostraram sua insatisfação com os preços baixos pagos pelo laticínio, mas,

sobretudo pela falta de assistência técnica que contribua para melhor manejo das pastagens. A má

qualidade destas, sobretudo na estação seca, potencializa a queda da qualidade do leite e, em

conseqüência, diminui o seu valor no mercado enquanto matéria prima para os laticínios.

Analisando o município de Mirante do Paranapanema-SP como um todo, temos as

descontinuidades objetivas de sua paisagem determinadas por ações antrópicas que atuaram de modo

incisivo, principalmente por meio da ocupação marcada pela derrubada da mata original para se garantir

o estabelecimento do homem na terra, cultivos agrícolas em nada sustentáveis, perpassando por

processo de exaurimento do solo até a implantação da pecuária.

Sendo assim, reafirmamos a importância de se determinar unidades de paisagem a partir do

critério uso do solo para percebermos a dinâmica atual do território e adentrarmos na questão ambiental.

É interessante destacar que o referido critério nos permite captar as unidades, porém, poderíamos entrar

em contradição caso refletíssemos a respeito da relativa (aparente) homogeneidade paisagística

existente no município devido à preponderância das pastagens dentro de seu perímetro. Que

descontinuidades seriam estas? Estas unidades seriam tão diversificadas assim?

Para responder as questões, procuramos definir de modo didático, algumas unidades

diferenciadas no terreno (a partir de observações in loco e do que foi anteriormente exposto), conforme

consta no quadro 1 em sinergia com o croqui que se segue (fig. 2).

Unidade de Paisagem

Nomenclatura Preliminar

Localização Critério de definição

1

Agrossistema canavieiro

Grandes propriedades (por exemplo: acima dos 1000 hectares)

Socioeconômico (forma de produção agrícola essencialmente capitalista)

2

Áreas de pastagens com produção leiteira

Minifúndios entre 16 e 24 hectares

Socioeconômico (áreas de assentamentos rurais de reforma agrária)

3 Áreas de produção

leiteira e agricultura de subsistência

Pequenas e médias propriedades em bairro rural (por exemplo: Colônia Branca)

Socioeconômico (pequenos e médios lotes com produção voltada para o mercado local bem como para o consumo familiar)

4 Áreas de nascentes e

vegetação ciliar em dinâmica regressiva

Nascentes e cursos de córregos (por exemplo: Bacia do Santo Antônio)

Naturalista/Geossistêmico; Geótopos e geofácies degradados.

5

Vertentes em dinâmica resistásica

Comuns em toda área do município

Naturalista/Geossistêmico; Geofácies em resistasia, caracterizados por processos de erosão em sulcos.

6 Anastomosamento de

córregos Vários pontos críticos ao longo dos córregos do município (por exemplo: alto e médio curso do Córrego Santo Antônio e Águas da Saúde)

Naturalista/Geossistêmico; Geótopos marcados por processos erosivos de solapamento e afloramentos de bancos de areia na lâmina d’água.

Quadro 1 – Classificação de unidades de paisagem observadas em Mirante do Paranapanema-SP

Fonte: Trabalho de campo (2008). Org.: Reginaldo J. Souza

É preciso partir de um sistema de referências da paisagem para se chegar a reflexões mais

aprofundadas a respeito do jogo de relações que determina a sua configuração. A paisagem evidencia a

organização ou desorganização do território de Mirante do Paranapanema-SP, ou seja, o modo como

estão dispostos os impactos da ação humana sobre o meio ambiente.

Neste sentido é que elaboramos o quadro e o croqui, sendo este último um modelo gráfico de

representação da disposição espacial das unidades de paisagem que identificamos no terreno por meio

de trabalho de campo. Trata-se de um modo de representação preliminar, mas que tem como objetivo

principal fazer com que os leitores deste texto, mesmo aqueles que não conheçam a realidade de

Mirante do Paranapanema-SP, entrem em contato com alguns dos problemas socioambientais

existentes no município. Além do mais, procuramos enfatizar que é possível identificar especificidades

paisagísticas na interface natureza-sociedade, mesmo em uma área que em princípio se apresenta

como possuidora de relativa homogeneidade fisionômica devido à predominância de uma atividade

econômica especifica (como é o caso da pecuária).

Considerações finais

De modo geral, meio ambiente e paisagem se apresentam como noções muito amplas. Sujeitas

a quaisquer discursos, desde propagandas da mídia em seus diversos aspectos (televisão, imprensa,

Internet e rádio) até abordagens acadêmicas nos vários campos de pesquisa científica. Acreditamos que

para se alcançar uma compreensão geográfica destas noções, isto é, categorizá-las de acordo com os

objetivos da nossa ciência, é preciso contextualizá-las na perspectiva do território.

Fig. 2 – Croqui representativo da disposição espacial das unidades básicas de paisagem em Mirante do Paranapanema-SP. Os números correspondem às unidades de paisagem apresentadas no quadro anterior. Orgs.: Reginaldo J. Souza e Paula V. Lindo / Jun. 2008.

Assim, destacamos a relevância da realização deste trabalho para nosso esforço de

compreensão do jogo de relações existente no território e materializado na paisagem. Tomando as

saídas a campo como procedimento metodológico principal, pudemos entrar em contato direto com a

realidade do município de Mirante do Paranapanema-SP. Tendo em mente que a paisagem é fruto de

uma determinada configuração territorial, foi possível identificar uma série de elementos que

possibilitaram as nossas reflexões e a própria produção deste texto.

O município ao qual dedicamos nossa análise é palco de problemas referentes a processos

erosivos, assoreamentos e empobrecimento do solo. O descaso com relação a esta problemática é

evidente e, acreditamos, fruto de uma cultura estabelecida (uso irracional dos potenciais geo-ecológicos,

baseado em interesses econômicos imediatos) desde a ocupação histórica do Pontal do Paranapanema.

E diante deste quadro, assinalamos a importância da tomada de iniciativas, por parte das

autoridades responsáveis, no sentido de vislumbrar a paisagem enquanto uma chave para entrada na

questão ambiental, abrindo passagens à elaboração de políticas públicas voltadas ao desenvolvimento

do território. Afinal, é preciso reverter os impactos negativos em Mirante do Paranapanema-SP,

buscando o verdadeiro desenvolvimento local com investimentos na recuperação de áreas degradadas,

no incentivo às atividades econômicas sustentáveis e, sobretudo, na área da educação (somente esta

pode conscientizar o cidadão e destruir a postura de descaso frente aos problemas socioambientais).

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