ABBADI, Manoel Fernando. Sistema penitenciário brasileiro e ...
Transcript of ABBADI, Manoel Fernando. Sistema penitenciário brasileiro e ...
ESCOLA SUPERIOR DE GUERRA
MANOEL FERNANDO ABBADI
SISTEMA PENITENCIÁRIO BRASILEIRO E SEGURANÇA PÚBLICA
Rio de Janeiro 2012
MANOEL FERNANDO ABBADI
SISTEMA PENITENCIÁRIO BRASILEIRO E SEGURANÇA PÚBLICA
Trabalho de Conclusão de Curso – Monografia apresentada ao Departamento de Estudos da Escola Superior de Guerra como requisito à obtenção do diploma do Curso de Altos Estudos de Política e Estratégia. Orientador: Juíza Dra. HELOÍSA CORRÊA DA
COSTA E PAULA.
Rio de Janeiro 2012
C2012 ESG Este trabalho, nos termos de legislação que resguarda os direitos autorais, é considerado propriedade da ESCOLA SUPERIOR DE GUERRA (ESG). É permitido a transcrição parcial de textos do trabalho, ou mencioná-los, para comentários e citações, desde que sem propósitos comerciais e que seja feita a referência bibliográfica completa. Os conceitos expressos neste trabalho são de responsabilidade do autor e não expressam qualquer orientação institucional da ESG _________________________________
MANOEL FERNANDO ABBADI
Biblioteca General Cordeiro de Farias
Abbadi, Manoel Fernando
Sistema penitenciário brasileiro e segurança pública / Delegado de Polícia Federal Manoel Fernando Abbadi. Rio de Janeiro: ESG, 2012.
45 f.
Orientador: Juíza Dra. Heloísa Corrêa da Costa e Paula Trabalho de Conclusão de Curso – Monografia apresentada ao
Departamento de Estudos da Escola Superior de Guerra como requisito à obtenção do diploma do Curso de Altos Estudos de Política e Estratégia (CAEPE), 2012.
1. ONU. 2. Prisioneiro. 3. Ressocialização. 4. Polícia. 5. Conselho da Comunidade I. Título.
AGRADECIMENTO
Manuel Henriques e Eva, meus pais.
Vilma Regina, minha mulher.
Manius, Misiane, Marlus e Mayad, meus filhos.
RESUMO
O presente trabalho aborda o Sistema Penitenciário Brasileiro, bem como o atual
Sistema de Segurança Pública. Descreve a estrutura sugerida pela ONU –
Organização das Nações Unidas para os sistemas prisionais dos países filiados,
abrangendo a parte física dos prédios destinados ao recolhimento de apenados e
custodiados, a parte relativa ao tratamento das pessoas recolhidas ao sistema. O
trabalho também foca nos Conselhos da Comunidade, essenciais à ressocialização
do egresso. Na segunda parte, analisa o Sistema de Segurança Pública, com ênfase
na instituição Polícia. Por fim, explicita a necessária integração dos dois Sistemas
estudados, com sugestão de alterações na política do atual Sistema Penitenciário,
tendo como meta a desconcentração das casas prisionais e a progressiva
municipalização do Sistema para a efetiva participação dos Conselhos da
Comunidade.
Palavras chave: ONU. Prisioneiro. Ressocialização. Polícia. Conselho da
Comunidade.
ABSTRACT
This paper discusses the Brazilian Penitentiary System, as well as the
current public security system. Describes the structure suggested by the
UN – United Nations Organization for the prison systems of Member States,
covering the physical of de buildings intended for the collection of inmates
and custodians, and the part concerning the treatmente of persons taken
into the system. The work also focuses on Community Councils, essential
to the re-socialization and integration of former inmates. The second part
analyzes the public security system with emphasis on Police institution.
Finally, it explains the necessary integration of the two systems studied,
with suggested policy changes to the current prison system, having as goal
the devolution of correctional homes and the progressive decentralization of
the system for the effective participation of Community Councils.
Key words: UN. Prisoner. Re-socialization. Police. Community Council.
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
CADH CONVENÇÃO AMERICANA DE DIREITOS HUMANOS CONANDA CONSELHO NACIONAL DOS DIREITOS DA CRIANÇA E DO
ADOLESCENTE CREA-RS CONSELHO REGIONAL DE ENGENHARIA E AGRONOMIA DO RIO
GRANDE DO SUL CREMERS CONSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO ESTADO DO RIO
GRANDE DO SUL ECA ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE FIOCRUZ FUNDAÇÃO OSVALDO CRUZ LEP LEI DE EXECUÇÃO FISCAL OAB-RS ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL CONSELHO SECCIONAL
DO RIO GRANDE DO SUL ONU ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES UNIDAS SUS SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE SUSEPE SUPERINTENDÊNCIA DOS SERVIÇOS PENITENCIÁRIOS DO
ESTADO DO RIO GRANDE DO SUL
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO .................................................................................................. 8 2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DAS PENAS ........................................................... 10 3 REGRAS MÍNIMAS DA ONU PARA O TRATAMENTO DE PRISIONEIROS .. 15 4 A LEI DA EXECUÇÃO PENAL NO BRASIL .................................................... 23 5 OS CONSELHOS COM A PARTICIPAÇÃO DE MEMBROS DA
SOCIEDADE ...................................................................................... 26 5.1 SUS - SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE ................................................................ 26 5.2 OS CONSELHOS TUTELARES ....................................................................... 28 5.3 OS CONSELHOS DA COMUNIDADE .............................................................. 30 6 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA POLÍCIA NO BRASIL ....................................... 33 6.1 A POLÍCIA NA HISTÓRIA ................................................................................. 33 6.2 A POLÍCIA NO BRASIL COLÔNIA .................................................................... 33 6.3 A POLÍCIA NO IMPÉRIO .................................................................................. 35 7 A CONSTITUIÇÃO DE 1988 E O SISTEMA DE SEGURANÇA PÚBLICA DO
BRASIL ............................................................................................................ 37 8 CONCLUSÃO ................................................................................................... 42 REFERÊNCIAS ................................................................................................ 45 ANEXO A – RELATÓRIO DO CREA-RS SOBRE INSPEÇÃO NO PRESÍDIO
CENTRAL DE PORTO ................................................................ 46 ANEXO B – RELATÓRIO DE VISITA DE FISCALIZAÇÃO DO CREMERS –
RESUMO – REALIZADA NO PRESÍDIO CENTRAL DE PORTO ALEGRE ...................................................................................... 65
ANEXO C – PARECER DA COMISSÃO DE DIREITOS HUMANOS DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL, SECCIONAL DO RIO GRANDE DO SUL SOBRE A VISTORIA REALIZADA NO PRESÍDIO CENTRAL DE PORTO ALEGRE .............................. 86
8
1 INTRODUÇÃO
“O pior da violência é quando nos habituamos a ela, passamos a considerá-la um fenômeno natural, como a chuva, a noite, a lei da gravidade e da dilatação dos corpos. O mesmo podemos dizer da miséria – não da
pobreza, que tem a sua dignidade e é considerada uma virtude”.1
A ideia deste trabalho foi gestada no ano de 2007, mais precisamente no
mês de outubro, oportunidade em que diversas comunidades do Estado do Rio
Grande do Sul se manifestaram pela não construção de presídios em seus
municípios. Tais manifestações são constantes em todos os cantos do território
nacional e completamente dissonantes com o que prega a nossa Carta Magna no
artigo 144, quando diz que: “A segurança pública, dever do Estado, direito e
responsabilidade de todos, é exercida para a preservação da ordem pública e da
incolumidade das pessoas e do patrimônio, através dos seguintes órgãos;” (gn).
Verifiquei que a Constituição Federal de 1988, a chamada “Constituição
Cidadã” havia regrado praticamente todos os passos da vida nacional, deixando de
fazê-lo com relação ao sistema penitenciário, visto que não há capítulo específico.
Ressalto que, no Título II da Carta Magna, estão estabelecidas as regras
relativas aos Dos Direitos e Garantias Fundamentais, sendo que no artigo 5º, incisos
XLV, XLVI,XLVII,XLVII, XLIX e L temos a parte relativa à pessoa do condenado no
âmbito penal, conforme transcrito abaixo:
(...) “XLV - nenhuma pena passará da pessoa do condenado, podendo a obrigação de reparar o dano e a decretação do perdimento de bens ser, nos termos da lei, estendidas aos sucessores e contra eles executadas, até o limite do valor do patrimônio transferido; XLVI - a lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, as seguintes: a) privação ou restrição da liberdade; b) perda de bens; c) multa; d) prestação social alternativa; e) suspensão ou interdição de direitos; XLVII - não haverá penas: a) de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos do art. 84, XIX; b) de caráter perpétuo; c) de trabalhos forçados; d) de banimento; e) cruéis;
1 CONY, Carlos Heitor, Economia e Violência, artigo publicado no Jornal Folha de São Paulo, Edição
de 24 de julho de 1997, 1º Caderno, página 2.
9
XLVIII - a pena será cumprida em estabelecimentos distintos, de acordo com a natureza do delito, a idade e o sexo do apenado; XLIX - é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral; L - às presidiárias serão asseguradas condições para que possam permanecer com seus filhos durante o período de amamentação;” (...)
Antes disso, a Organização das Nações Unidas editou as regras mínimas
para o tratamento de prisioneiros, adotadas pelo 1º Congresso das Nações Unidas
sobre Prevenção do Crime e Tratamento de Delinquentes, realizado em Genebra,
em 1955, e aprovadas pelo Conselho Econômico e Social da ONU, através da sua
resolução 663 C I (XXIV), de 31 de julho de 1957, aditada pela Resolução 2076
(LXII) de 13 de maio de 1977. Em 25 de maio de 1984, através da Resolução
1984/47, o Conselho Econômico e Social aprovou treze procedimentos para a
aplicação efetiva das Regras Mínimas.
Em consonância com a Resolução da Organização das Nações Unidas o
Estado Brasileiro editou a Lei das Execuções Penais, Lei nº 7.210, de 11 de julho de
1984, que tem por objetivo efetivar as disposições de sentença ou decisão criminal e
proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado e do
internado, ou seja, proporcionar a ressocialização do apenado a fim de integrá-lo ao
convívio social após o cumprimento da pena.
Referida Lei trata da matéria de forma clara e fornece o caminho para que a
sociedade trate do seu “doente social” adequadamente e este volte ao convívio
social recuperado e capacitado a participar do cotidiano e contribuir para a evolução
da comunidade, o que nos faz indagar o que motiva os altos índices de reincidência
no Brasil, fato que causa impacto na segurança pública e na sensação de
insegurança dos cidadãos.
10
2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DAS PENAS
No princípio Deus criou a Terra, a qual nos foi dada como morada. Na Bíblia,
em Gênesis, temos a Origem do Mundo e da Humanidade, onde diz: “No princípio,
Deus criou o céu e a terra. A terra estava sem forma e vazia; as trevas cobriam o
abismo e um vento impetuoso soprava sobre as águas”.
“Deus disse: “Que exista a luz!” E a luz começou a existir. Deus viu que a luz
era boa. E Deus separou a luz das trevas: a luz Deus chamou “dia”, e às trevas
chamou “noite”. Houve uma tarde e uma manhã: foi o primeiro dia. (...)
Nesta parte o Livro Sagrado traz na nota explicativa: “A narrativa da criação
não é um tratado científico, mas um poema que contempla o universo como criatura
de Deus. Foi escrito pelos sacerdotes no tempo do exílio na Babilônia (586 – 538
a.C.) e procura salientar vários pontos. (...) Terceiro, que o ponto mais alto da
criação é a humanidade: homem e mulher, ambos criados à imagem e semelhança
de Deus. A humanidade é chamada a dominar e a transformar o universo,
participando da obra da criação. (...)
Quando Javé Deus fez a terra e o céu, ainda não havia na terra nenhuma
planta do campo, pois no campo ainda não havia brotado nenhuma erva: Javé Deus
não tinha feito chover sobre a terra e não havia homem que cultivasse o solo e
fizesse subir da terra a água para regar a superfície do solo. Então Javé Deus
modelou o homem com a argila do solo, soprou-lhe nas narinas um sopro de vida, e
o homem tornou-se um ser vivente.
Javé Deus tomou o homem e o colocou no jardim de Éden para que
cultivasse e guardasse. E Javé Deus ordenou ao homem: “Você pode comer de
todas as árvores do jardim. Mas não pode comer da árvore do conhecimento do bem
e do mal, porque no dia em que dela comer, com certeza você morrerá.
Javé Deus disse: “Não é bom que o homem esteja sozinho. Vou fazer para
ele uma auxiliar que lhe seja semelhante. Formou do solo todas as feras e todas a
aves do céu e as apresentou ao homem (...).
Então Javé Deus fez cair um torpor sobre o homem, e ele dormiu. Tomou
então uma costela do homem e no lugar fez crescer carne.
Depois, da costela que tinha tirado do homem, Javé Deus modelou a mulher,
e apresentou-a para o homem. Então o homem exclamou: “Esta sim é osso dos
11
meus ossos e carne da minha carne! Ela será chamada mulher, porque foi tirada do
homem!”
Para os povos da cultura ocidental – judaico/cristã, a primeira transgressão
do ser humano ocorreu no jardim do Éden, foi quando Adão e Eva comeram o fruto
da árvore proibida. A Bíblia também nos informa que o primeiro crime foi quando
Caim matou Abel.
Ao passarmos pela mitologia grega temos o furto do fogo dos céus realizado
por Prometeu, o qual foi condenado por Zeus a ser acorrentado em um rochedo e ter
seu fígado arrancado por abutre, infinitamente, pois o fígado se renova
continuamente. Há também na mitologia grega a narrativa acerca de Pandora, sendo
que esta recebeu uma caixa que continham os males do mundo e fora advertida
para não abri-la. Ao desobedecer a ordem abriu a caixa e espalhou por sobre a
humanidade todos os pecados.
No médio Oriente, mais especificamente no Egito antigo, há a narrativa do
assassinato de Osíris, pelo motivo de inveja por parte de irmão.
Na história de Roma, em sua fundação, consta que Rômulo mata Remo.
Em suma, nos mais diversos registros da história da humanidade os ilícitos
fazem parte da natureza humana, embora o conceito de crime dependa da época,
dos usos e costumes de cada lugar.
Se há transgressões, também há as punições para elas: A própria Bíblia
registra que Deus não perdoou Adão e Eva, sendo que eles foram expulsos do
paraíso. Caim foi exilado, saiu da presença de Javé e habitou na terra de Nod, a
leste de Éden.
Na antiguidade o chefe da família era também o chefe religioso e também
era ele que determinava os castigos a ser aplicado a quem quebrasse o tabu. Vale
registrar que a pena de morte era largamente aplicada. Dizia-se que a pena/castigo
era para aplacar a cólera divina.
Num passo adiante nota-se a ocorrência da vingança de sangue, ou seja, se
um membro de um grupo fosse agredido por elemento de outro grupo, os membros
do primeiro grupo se sentiam todos ofendidos e a vingança era coletiva, sendo
atingidos todos os integrantes do grupo opositor. A vingança de sangue ocasionava
conflitos infindáveis entre as famílias, em prejuízo do agrupamento, que ficava
enfraquecido para enfrentar os inimigos externos, por isso, pouco a pouco, o
12
particular foi impedido de exercer a vingança pessoal e, fazer justiça por mãos
próprias, passou a ser crime. A aplicação das penas passou a ser monopólio estatal.
Mas, mesmo com o monopólio estatal, as penas infringidas aos condenados
ultrapassavam a racionalidade, como bem nos ensina Michel Foucault em sua obra
Vigiar e Punir, ao relatar no Capítulo I, acerca do corpo dos condenados: “[Damiens
fora condenado, a 2 de março de 1757], a pedir perdão publicamente diante da porta
principal da Igreja de Paris [aonde devia ser] levado e acompanhado numa carroça,
nu, de camisola, carregando uma tocha de cera acesa de duas libras; [em seguida],
na dita carroça, na praça de Grève, e sobre um patíbulo que aí será erguido,
atenazado nos mamilos, braços, coxas e barriga das pernas, sua mão direita
segurando a faca com que cometeu o dito parricídio, queimada com fogo de enxofre,
e às partes em que será atenazado se aplicarão chumbo derretido, óleo fervente,
piche em fogo, cera e enxofre derretidos conjuntamente, e a seguir seu corpo será
puxado e desmembrado por quatro cavalos e seus membros e corpo consumidos ao
fogo, reduzidos a cinzas, e suas cinzas lançadas ao vento.”
Segue a narrativa do suplício imposto a Damiens, cujo corpo acabou em
cinzas em cumprimento a sentença.
Foucault transcreve alguns artigos do regulamento da Casa dos Jovens
Detentos em Paris redigido por Léon Faucher, os quais disciplinam a permanência
dos detentos na prisão, tais como:
“Art. 17. - O dia dos detentos começará às seis horas da manhã no inverno, às cinco horas no verão. O trabalho há de durar nove horas por dia em qualquer estação. Duas horas por dia serão consagradas ao ensino. O trabalho e o dia terminarão às nove horas no inverno, às oito horas no verão. Art. 18. - Levantar. - Ao primeiro rufar de tambor, os detentos devem levantar-se e vestir-se em silêncio, enquanto o vigia abre as portas das celas. Ao segundo rufar, dever estar de pé e fazer a cama. Ao terceiro, põem-se em fila por ordem para irem à capela fazer a oração da manhã. Há cinco minutos de intervalo entre cada rufar. Art. 19. - A oração é feita pelo capelão e seguida de uma leitura moral ou religiosa. Esse exercício não deve durar mais de meia hora. Art. 20. - Trabalho – Às cinco e quarenta e cinco no verão, às seis e quarenta e cinco no inverno, os detentos descem para o pátio, onde devem lavar as mãos e o rosto, e receber uma primeira distribuição de pão. Logo em seguida, formam-se por oficinas e vão ao trabalho, que deve começar às seis horas no verão e às sete horas no inverno. Art. 21. - Refeições – Às dez horas os detentos deixam o trabalho para se dirigirem ao refeitório; lavam as mãos nos pátios e formam por divisão. Depois do almoço, recreio até às dez e quarenta e cinco. Art. 22. - Escola – Às dez e quarenta, ao rufar do tambor, formam-se as filas, e todos entram na escola por divisões. A aula dura duas horas, empregadas alternativamente na leitura, desenho linear e no cálculo.
13
Art. 23. - Às doze e quarenta, os detentos deixam a escola por divisões e se dirigem aos seus pátios para o recreio. Às doze e cinquenta e cinco, ao rufar do tambor, entram em forma por oficinas. Art. 24. - À uma hora, os detentos devem estar nas oficinas: o trabalho vai até às quatro horas. Art. 25. - Às quatro horas, todos deixam as oficinas e vão aos pátios onde os detentos lavam as mãos e formam divisões para o refeitório. Art. 26. - O jantar e o recreio que segue vão até às cinco horas: neste momento os detentos voltam às oficinas. Art. 27. - Às sete horas no verão, às oito horas no inverno, termina o trabalho; faz-se uma última distribuição de pão nas oficinas. Uma leitura de um quarto de hora, tendo por objeto algumas noções instrutivas ou algum fato comovente, é feita por um detento ou algum vigia, seguida pela oração da noite. Art. 28. - Às sete e meia no verão, às oito e meia no inverno, devem os detentos estar nas celas depois de lavarem as mãos e feita a inspeção das vestes nos pátios; ao primeiro rufar de tambor, despir-se, e ao segundo deitar-se na cama. Fecham-se as portas das celas e os vigias fazem a ronda nos corredores para verificarem a ordem e o silêncio.”
Foucault apresentou inicialmente o suplício, bem como a utilização do tempo
dos detentos e explica que eles não sancionam os mesmos crimes, não punem o
mesmo gênero de delinquentes, mas definem bem, cada um deles, um estilo penal.
O tempo entre os dois modelos não chega a um século. Também explica que
à época em que foi redistribuída, na Europa e nos Estados Unidos, toda a economia
do castigo. Época de grandes “escândalos” para a justiça tradicional, época dos
inúmeros projetos de reformas; nova teoria da lei e do crime, nova justificação mora
ou política do direito de punir; abolição das antigas ordenanças, supressão dos
costumes; projeto ou redação de códigos <<modernos>>: Rússia, 1769; Prússia,
1780; Pensilvânia e Toscana, 1786; Áustria, 1788; França 1791, Ano IV, 1808 e
1810. Para a justiça penal, uma era nova. É o fim dos suplícios.
Em sua obra “Dos Delitos e Das Penas”, Cesare Beccaria registra a origem
das penas e diz: “Leis são condições sob as quais homens independentes e isolados
se uniram em sociedade, cansados de viver em contínuo estado de guerra e de
gozar de uma liberdade inútil pela incerteza de conservá-la.”
Prossegue, “Parte dessa liberdade foi por eles sacrificada para poderem
gozar o restante com segurança e tranquilidade. A soma de todas essas porções de
liberdades, sacrificadas ao bem de cada um, forma a soberania de uma nação e o
Soberano é seu legítimo depositário e administrador. Não bastava, porém, formar
esse repositório. Era mister defendê-lo das usurpações privadas de cada homem,
em particular, o qual sempre tenta não apenas retirar do escrínio a própria porção,
mas também usurpar a porção dos outros.”
14
Prossegue o mestre italiano: “Toda pena, que não derive da absoluta
necessidade, diz o grande Montesquieu, é tirânica, proposição esta que pode ser
assim generalizada: todo ato de autoridade de homem para homem que não derive
da absoluta necessidade é tirânico. Eis, então, sobre o que se funda o direito
soberano de punir os delitos, sobre a necessidade de defender o depósito da
salvação pública das usurpações particulares. Tanto mais justas são as penas
quanto mais sagrada e inviolável é a segurança e maior a liberdade que o soberano
dá aos súditos.”
15
3 AS REGRAS MÍNIMAS DA ONU PARA O TRATAMENTO DE PRISIONEIROS
Como dito acima, a Organização das Nações Unidas – ONU, no 1º
Congresso das Nações Unidas sobre a Prevenção do Crime e Tratamento de
Delinquentes, realizado em Genebra, em 1955, editou as Regras Mínimas para o
Tratamento de Prisioneiros, as quais foram aprovadas pelo Conselho Econômico e
Social da Organização através da sua Resolução 663 C I (XXIV), de 31 de julho de
1957. Tal Resolução foi aditada pela Resolução 2076 (LXII) de 13 de maio de 1977.
Em 25 de maio de 1984, através da Resolução 1984/47, o Conselho
Econômico e Social aprovou treze procedimentos para a aplicação efetiva das
Regras Mínimas.
Convém reproduzir parte das observações preliminares editadas então:
“1. O objetivo das presentes regras não é descrever detalhadamente um sistema penitenciário modelo, mas apenas estabelecer – inspirando-se em conceitos geralmente admitidos em nossos tempos e nos elementos essenciais dos sistemas contemporâneos mais adequados – os princípios e as regras de uma boa organização penitenciária e da prática relativa ao tratamento de prisioneiros. 2. É evidente que devido a grande variedade de condições jurídicas, sociais, econômicas e geográficas existentes no mundo, todas estas regras não podem ser aplicadas indistintamente em todas as partes e a todo tempo. Devem, contudo, servir para estimular o esforço constante com vistas à superação das dificuldades práticas que se opõem a sua aplicação, na certeza de que representam, em seu conjunto, as condições mínimas admitidas pelas Nações Unidas. 3. Por outro lado, os critérios que se aplicam às matérias referidas nestas regras evoluem constantemente e, portanto, não tendem a excluir a possibilidade de experiências e práticas, sempre que as mesmas se ajustem aos princípios e propósitos que emanam do texto das regras. De acordo com esse espírito, a administração penitenciária central sempre poderá autorizar qualquer exceção às regras”.
As três primeiras observações demonstram que o Estados Nações não
estão engessados e podem adotar novas regras, em consonância com o espírito da
Resolução, que visem a melhorar o trato para com os prisioneiros e facilitem a
ressocialização, na medida em que as condições jurídicas, culturais, econômicas,
geográficas, dentre outras, têm influências determinantes na política criminal.
É bom registrar que a primeira parte das regras da citada Resolução trata de
matérias relativas à administração geral dos estabelecimentos penitenciários e é
aplicável a todas as categorias de prisioneiros, criminais ou civis, em regime de
16
prisão preventiva, ou já condenados, incluindo aqueles que tenham sido objeto de
medida de segurança ou de medida de reeducação ordenada por um juiz.
Já a segunda parte contém regras que são aplicáveis somente às categorias
de prisioneiros a que se refere cada seção. Entretanto, as regras da seção A,
aplicáveis aos presos condenados, serão igualmente aplicáveis às categorias de
presos a que se referem as seções B, C e D, sempre que não sejam contraditórias
com as regras específicas dessas seções e sob a condição de que sejam
proveitosas para tais prisioneiros.
Desde já fica esclarecido que as regras não estão destinadas a determinar a
organização dos estabelecimentos para delinquentes juvenis (estabelecimentos
Borstal, instituições de reeducação, etc...). todavia, de modo geral, pode-se
considerar que a primeira parte destas regras mínimas também é aplicável a esses
estabelecimentos.
Salienta-se, também, que na Resolução está definido que: “A categoria de
prisioneiros juvenis deve compreender, em qualquer caso, os menores sujeitos à
jurisdição de menores. Como norma geral, os delinquentes juvenis não deveriam ser
condenados a pena de prisão”.
Na parte I da Resolução das Nações Unidas, das regras de aplicação geral,
há 49 (quarenta e nove) itens, com alguns subitens. Inicia no item 6 que nos dá o
princípio fundamental, qual seja: “As regras que se seguem deverão ser aplicadas
imparcialmente. Não haverá discriminação alguma baseada em raça, cor, sexo,
língua, religião, opinião política ou qualquer outra opinião, origem nacional ou social,
fortuna, nascimento ou em qualquer outra situação”. No subitem seguinte, reafirma:
“Ao contrário, é necessário respeitar as crenças religiosas e os preceitos morais do
grupo a que pertença o preso”.
No decorrer dos demais itens são tratadas as seguintes questões: registro
dos presos, a separação por categorias, dos locais destinados aos presos
(instalações), higiene pessoal, roupas de vestir, camas e roupas de cama,
alimentação, exercícios físicos, serviços médicos e de odontologia, disciplina e
sanções, instrumentos de coação, informação e direito de queixa dos presos,
contatos com o mundo exterior, biblioteca, religião, depósitos de objetos
pertencentes aos presos, notificação de morte, doença e transferências, sobre a
transferência de presos, do pessoal penitenciário e da inspeção.
17
Chamou especial atenção o item 9 desta parte I, que trata dos locais
destinados aos presos, onde está previsto que as celas ou quartos destinados ao
isolamento noturno não deverão ser ocupadas por mais de um preso. Se, por razões
especiais, tais como excesso temporário da população carcerária, for indispensável
que a administração penitenciária central faça exceções a esta regra, deverá evitar-
se que dois reclusos sejam alojados numa mesma cela ou quarto individual.
Quando se recorra à utilização de dormitórios, estes deverão ser ocupados
por presos cuidadosamente escolhidos e reconhecidos como sendo capazes de
serem alojados nessas condições. Durante a noite, deverão estar sujeitos a uma
vigilância regular, adaptada ao tipo de estabelecimento prisional em que se
encontram detidos.
Todos os locais destinados aos presos, especialmente aqueles que se
destinam ao alojamento dos presos durante a noite, deverão satisfazer as
exigências de higiene, levando-se em conta o clima, especialmente no que concerne
ao volume de ar, espaço mínimo, iluminação, aquecimento e ventilação.
Nos locais onde os presos devam viver e trabalhar as janelas deverão ser
suficientemente grandes para que os presos possam ler e trabalhar com luz natural,
e deverão estar dispostas de modo a permitir a entrada de ar fresco, haja ou não
ventilação artificial. A luz artificial deverá ser suficiente para os presos poderem ler e
trabalhar sem prejudicar a visão.
Com relação à higiene as instalações sanitárias deverão ser adequadas para
que os presos possam satisfazer suas necessidades naturais no momento oportuno,
de um modo limpo e decente.
As instalações de banho deverão ser adequadas, para que cada preso
possa tomar banho a uma temperatura adaptada ao clima, tão frequentemente
quanto necessário à higiene geral, de acordo com a estação do ano e a região
geográfica, mas pelo menos uma vez por semana em um clima temperado.
Todos os locais de um estabelecimento penitenciário frequentados
regularmente pelos presos deverão ser mantidos e conservados escrupulosamente
limpos.
Nos anexos A, B e C deste trabalho temos: cópia do Relatório de Inspeção
no Presídio Central de Porto Alegre realizado pelo CREA-RS; da Visita de
Fiscalização – Resumo – pertinente ao Presídio Central de Porto Alegre,
apresentado pelo Conselho Regional de Medicina do Estado do Rio Grande do Sul –
18
CREMERS; e, cópia do Parecer da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos
Advogados do Brasil – Seccional Rio Grande do Sul - sobre a vistoria realizada pela
entidade no Presídio Central de Porto Alegre/RS em 19 de abril de 2012.
Além do relatório, do laudo e do parecer, apresento as fotografias do local,
as quais falam por si só. Se quisermos acrescentar algo, resumimos em três
palavras: “circo dos horrores”
Apresento o presídio de Porto Alegre, mas o fato é idêntico aos dos demais
presídios do País.
Outra faceta peculiar é a parte que trata do Pessoal Penitenciário, algo
desconhecido da maioria da população, visto que a administração deverá escolher
cuidadosamente o pessoal de todas as categorias, posto que, da integridade,
humanidade, aptidão pessoal e capacidade profissional desse pessoal, dependerá a
boa direção dos estabelecimentos penitenciários.
Também está previsto que a administração penitenciária esforçar-se-á
constantemente por despertar e manter no espírito do pessoal e na opinião pública a
convicção de que a função penitenciária constitui um serviço social de grande
importância e, sendo assim, utilizará todos os meios apropriados para ilustrar o
público.
Para lograr tais fins, será necessário que os membros trabalhem com
exclusividade como funcionários penitenciários profissionais, tenham a
condição de funcionários públicos e, portanto, a segurança de que a estabilidade em
seu emprego dependerá unicamente da sua boa conduta, da eficácia do seu
trabalho e de sua aptidão física. A remuneração do pessoal deverá ser adequada, a
fim de se obter e conservar os serviços de homens e mulheres capazes. Determinar-
se-á os benefícios da carreira e as condições do serviço tendo em conta o caráter
penoso de suas funções. (g.n.)
A regra acima, como se vê, determina que membros trabalhem com
exclusividade como funcionários penitenciários profissionais, mas o que vemos são
os desvios de função, na medida em que encontramos policiais civis, militares e até
federais cuidando de presos, algo que não está na função destes, uma vez que a
profissionalização destes funcionários seguiu em direção oposta, na medida em que
foram treinados para investigar, identificar e prender os infratores e não vigiá-los e
prepará-los para o regresso ao meio social.
19
A parte II da Resolução diz respeito a regras aplicáveis a categorias
especiais – presos condenados, com os seguintes princípios mestres.
Os princípios mestres têm por objetivo definir o espírito segundo o qual
devem ser administrados os sistemas penitenciários e os objetivos a serem
buscados, de acordo com a declaração constante no item 1 das Observações
preliminares das regras.
A prisão e outras medidas cujo efeito é separar um delinquente do mundo
exterior são dolorosas pelo próprio fato de retirarem do indivíduo o direito à
autodeterminação, privando-o da sua liberdade. Logo, o sistema prisional não
deverá, exceto por razões justificáveis de segregação ou para a manutenção da
disciplina, agravar o sofrimento inerente a tal situação.
O fim e a justificação de uma pena de prisão ou de qualquer medida
privativa de liberdade é, em última instância, proteger a sociedade contra o crime.
Este fim somente pode ser atingido se o tempo de prisão for aproveitado para
assegurar, tanto quanto possível, que, depois do seu regresso à sociedade, o
delinquente não apenas queira respeitar a lei e se auto-sustentar, mas também que
seja capaz de fazê-lo.
Para alcançar esse propósito, o sistema penitenciário deve empregar,
tratando de aplicá-los conforme as necessidades do tratamento individual dos
delinquentes, todos os meios curativos, educativos, morais, espirituais e de outra
natureza, e todas as formas de assistência de que pode dispor.
O regime do estabelecimento prisional deve tentar reduzir as diferenças
existentes entre a vida na prisão e a vida livre quando tais diferenças contribuírem
para debilitar o sentido de responsabilidade do preso ou o respeito à dignidade da
sua pessoa.
É conveniente que, antes do término do cumprimento de uma pena ou
medida, sejam tomadas as providências necessárias para assegurar ao preso um
retorno progressivo à vida em sociedade. Este propósito pode ser alcançado, de
acordo com o caso, com a adoção de um regime preparatório para a liberação,
organizado dentro do mesmo estabelecimento prisional ou em outra instituição
apropriada, ou mediante libertação condicional sob vigilância não confiada à polícia,
compreendendo uma assistência social eficaz. (g.n.)
No tratamento, não deverá ser enfatizada a exclusão dos presos da
sociedade, mas, ao contrário, o fato de que continuam a fazer parte dela. Com esse
20
objetivo deve-se recorrer, na medida do possível, à cooperação de organismos
comunitários que ajudem o pessoal do estabelecimento prisional na sua tarefa de
reabilitar socialmente os presos. Cada estabelecimento penitenciário deverá contar
com a colaboração de assistentes sociais encarregados de manter e melhorar as
relações dos presos com suas famílias e com os organismos sociais que lhes
possam ser úteis. Também deverão ser feitas gestões visando proteger, desde que
compatíveis com a lei e com a pena imposta, os direitos relativos aos interesses
civis, os benefícios dos direitos da previdência social e outros benefícios sociais do
preso.
Os serviços médicos do estabelecimento prisional se esforçarão para
descobrir e deverão tratar todas as deficiências ou enfermidades físicas ou mentais
que constituam um obstáculo à readaptação do preso. Com vistas a esse fim, deverá
ser realizado todo tratamento médico, cirúrgico e psiquiátrico que for julgado
necessário.
Tais princípios exigem a individualização do tratamento que, por sua vez,
requer um sistema flexível de classificação dos presos em grupos. Portanto, convém
que os grupos sejam distribuídos em estabelecimentos distintos, onde cada um
deles possa receber o tratamento necessário.
Ditos estabelecimentos não devem adotar as mesmas medidas de
segurança com relação a todos os grupos. É conveniente estabelecer diversos graus
de segurança, conforme a que seja necessária para cada um dos diferentes grupos.
Os estabelecimentos abertos – nos quais inexistam meios de segurança física contra
a fuga e se confia na autodisciplina dos presos – proporcionam, a presos
cuidadosamente escolhidos, as condições mais favoráveis para a sua readaptação.
É conveniente evitar que, nos estabelecimentos fechados, o número de
presos seja tão elevado que constitua um obstáculo à individualização do
tratamento. Em alguns países, estima-se que o número de presos em tais
estabelecimentos não deve passar de quinhentos. Nos estabelecimentos abertos, o
número de presos deve ser o mais reduzido possível.
Ao contrário, também não convém manter estabelecimentos
demasiadamente pequenos para que se possa organizar neles um regime
apropriado.
O dever da sociedade não termina com a libertação do preso. Deve-se
dispor, por conseguinte, dos serviços de organismos governamentais ou privados
21
capazes de prestar à pessoa solta uma ajuda pós-penitenciária eficaz, que tenda a
diminuir os preconceitos para com ela e permitam sua readaptação à comunidade.
Nos itens 65 e 66, a Resolução aborda o tratamento a ser dispensado aos
condenados. O tratamento dos condenados a uma punição ou medida privativa de
liberdade deve ter por objetivo, enquanto a duração da pena o permitir, inspirar-lhes
a vontade de viver conforme a lei, manter-se com o produto do seu trabalho e criar
neles a aptidão para fazê-lo. Tal tratamento estará direcionado a lhes fomentar o
respeito próprio e a desenvolver seu senso de responsabilidade.
Para lograr tal fim, deverá se recorrer, em particular, à assistência religiosa,
nos países em que ela seja possível, à instrução, à orientação e à formação
profissionais, aos métodos de assistência social individual, ao assessoramento
relativo ao emprego, ao desenvolvimento físico e à educação do caráter moral, em
conformidade com as necessidades individuais de cada preso. Deverá ser levado
em conta seu passado social e criminal, sua capacidade e aptidão físicas e mentais,
suas disposições pessoais, a duração de sua condenação e as perspectivas depois
da sua libertação.
Em relação a cada preso condenado a uma pena ou medida de certa
duração, que ingresse no estabelecimento prisional, será remetida ao diretor, o
quanto antes, um informe completo relativo aos aspectos mencionados no parágrafo
anterior. Este informe será acompanhado por um médico, se possível especializado
em psiquiatria, sobre o estado físico e mental do preso.
Os informes e demais documentos pertinentes formarão um arquivo
individual. Estes arquivos serão mantidos atualizados e serão classificados de modo
que o pessoal responsável possa consultá-los sempre que seja necessário.
A questão da classificação e individualização do preso também é importante,
visto que os mesmos deverão ser separados por seu passado criminal ou sua má
disposição, a fim de se evitar uma influência nociva sobre os companheiros de
detenção.
A administração penitenciária tem a obrigação de repartir os presos em
grupos, a fim de facilitar o tratamento destinado a sua readaptação social, e haverá,
se possível, estabelecimentos prisionais separados ou seções separadas dentro dos
estabelecimentos para os distintos grupos de presos.
Tão logo uma pessoa condenada a uma pena ou medida de certa duração
ingresse em um estabelecimento prisional, e depois de um estudo da sua
22
personalidade, será criado um programa de tratamento individual, tendo em vista os
dados obtidos sobre suas necessidades individuais, sua capacidade e suas
inclinações.
Nos itens 70 a 95 da Resolução são abordados temas pertinentes ao
tratamento dos presos, qualquer que seja a situação destes, iniciando-se com os
privilégios, o trabalho do preso, a educação e o recreio, as relações sociais e
assistência pós-prisional, presos dementes e mentalmente enfermos, pessoas
detidas ou em prisão preventiva, pessoas condenadas por dividas ou à prisão civil
(nos países em que a legislação prevê a possibilidade) e pessoas presas, detidas ou
encarceradas sem acusação.
A Resolução ainda é contemplada com um anexo que aborda os
procedimentos para a aplicação efetiva das Regras Mínimas para o Tratamento de
Prisionais, composto de treze comandos.
23
4 A LEI DA EXECUÇÃO PENAL NO BRASIL.
No dia 11 de julho de 1984 foi promulgada, no Brasil, a Lei nº 7.210, mais
conhecida como Lei de Execução Penal. Esta Lei seguiu as diretrizes gerais
constantes nas Regras Mínimas da Organização das Nações Unidas para o
tratamento de presos, com alguns pontos adequados a nossa realidade e mais
evoluídos.
No Título I está disciplinada a questão do Objeto e da Aplicação da Lei de
Execução Penal e pela relevância é transcrito o seu artigo 1º, onde diz:
“Art. 1º - A execução penal tem por objetivo efetivar as disposições da
sentença ou decisão criminal e proporcional condições para a harmônica integração
social do condenado e do internado”.
No artigo seguinte determina que a jurisdição dos Juízes ou Tribunais da
Justiça ordinária, em todo o território nacional, será exercida, no processo de
execução, na conformidade da citada Lei e do Código de Processo penal.
O parágrafo único do artigo 2º prevê que a Lei será aplicada igualmente ao
preso provisório ou ao condenado pela Justiça Eleitoral ou Militar, quando recolhido
a estabelecimento sujeito a jurisdição ordinária.
A Lei também estabelece que ao condenado e ao internado serão
assegurados todos os direitos não atingidos pela sentença ou pela Lei, não podendo
ocorrer qualquer distinção de natureza racial, social, religiosa ou política.
No artigo 4º temos um dispositivo de suma importância que prevê que: O
Estado deverá recorrer à cooperação da comunidade nas atividades de execução da
pena e da medida de segurança.
No Título II é tratado da pessoa do condenado e do internado, trazendo no
Capítulo I a classificação, sendo que no artigo 5º temos que:
“Art. 5º – Os condenados serão classificados, segundo seus antecedentes e
personalidade, para orientara individualização da execução penal”.
Ao longo do texto legal estão elencados os diversos pontos que devem ser
observados e cumpridos ao longo da execução penal, tais como: assistência,
compreendidas a material, à saúde, jurídica, educacional, social e religiosa, sendo
cada uma delas minuciosamente abordadas e disciplinadas. Há também a previsão
de assistência ao egresso no sentido de apoiá-lo e orientá-lo objetivando reintegrá-lo
à vida em liberdade.
24
No Capítulo seguinte, a Lei trata da questão do trabalho, tanto o interno,
quanto o externo, do apenado.
No Capítulo IV temos a parte que disciplina os deveres, os direitos e da
disciplina a que está sujeito o condenado, bem como as faltas disciplinares, as
sanções e as recompensas. Neste mesmo Capítulo temos a parte relativa a
aplicação das sanções, a que trata do processo disciplinar.
No Título III temos os Órgãos da Execução Penal, os quais estão
discriminados no artigo 61, quais sejam:
“Art. 61 - São órgãos da execução penal: I – o Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária; II – o Juiz da Execução; III – o Ministério Público; IV – o Conselho Penitenciário; V – os Departamentos Penitenciários; VI – o Patronato; VII – o Conselho da Comunidade; VIII – a Defensoria Pública (incluído pela Lei nº 12.313, de 2010)”.
Nos capítulos seguintes temos as atribuições de cada um dos órgãos
elencados acima, cabendo ressaltar a específica do Conselho da Comunidade,
conforme o previsto nos artigos 80 e 81 da Lei, ora transcritos.
“Art. 80 – Haverá, em cada Comarca, um Conselho da Comunidade,
composto, no mínimo, por 1 (um) representante da associação comercial ou
industrial, 1 (um) advogado indicado pela Seção da Ordem dos Advogados do Brasil,
1 (um) Defensor Público, indicado pelo Defensor Público Geral e 1 (um) assistente
social escolhido pela Delegacia Seccional do Conselho Nacional dos assistentes
sociais. (redação dada pela Lei nº 12.313, de 2010)”.
“Art. 81 – Incumbe ao Conselho da Comunidade: I – visitar, pelo menos mensalmente, os estabelecimentos penais existentes na comarca; II – entrevistar presos; III – apresentar relatórios mensais ao Juiz da execução e ao Conselho Penitenciário; IV – diligenciar a obtenção de recursos materiais e humanos para melhor assistência ao preso ou internado, em harmonia com a direção do estabelecimento.”
No Título IV são enumerados e definidos os estabelecimentos penais, tais
como: as penitenciárias, as colônias agrícolas, industrial ou similar, as casas de
25
albergado, os centros de observação, o hospital de custódia e tratamento
psiquiátrico e a cadeia pública.
A partir do Título V temos da execução das penas em espécie, sendo
abordado: as penas privativas de liberdade, dos regimes, das autorizações de
saídas (permissão de saída e saída temporária), remição da pena, o livramento
condicional, a monotorização eletrônica (incluído pela Lei nº 12.258, de 2010), as
penas restritivas de direitos, a prestação de serviços à comunidade, a limitação de
fim de semana, a interdição temporária de direitos, a suspensão condicional, a pena
de multa, a execução das medidas de segurança e a cessação da periculosidade.
No Título VII são tratados os incidentes de execução, tais como as
conversões de penas, o excesso e o desvio na execução e a anistia e o indulto.
A Lei na sua parte final também prevê o processo judicial para tratar das
questões pertinentes ao seu ordenamento e correrá no Juízo da execução, bem
como as disposições finais e transitórias.
26
5 OS CONSELHOS COM A PARTICIPAÇÃO DE MEMBROS DA SOCIEDADE
5.1 SUS - SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE
O Sistema Único de Saúde, mais conhecido por SUS, foi criado com a
Constituição Federal vigente e a regulamentação adveio com as Leis nº 8080/90 e a
de nº 8142/90, que são as Leis Orgânicas da Saúde, cuja finalidade foi a de alterar o
quadro caótico da saúde, bem como a situação de desigualdade na assistência à
saúde da população. Com referidas leis o atendimento público de qualquer cidadão
é obrigatório, sendo vedada a cobrança sob qualquer pretexto.
Centros e postos de saúde, hospitais, laboratórios, hemocentros, bancos de
sangue, fundações e institutos de pesquisa, como a FIOCRUZ – Fundação Osvaldo
Cruz, o Instituto Vital Brazil, dentre outros, fazem parte do Sistema Único de Saúde.
Assim, todos os cidadãos que estiverem no Brasil (brasileiros ou estrangeiros) têm
direito a consultas, exames, internações e tratamentos nas Unidades de Saúde
vinculadas ao SUS, tanto na esfera municipal, estadual e federal, sejam públicas ou
privadas, contratadas pelo gestor público de saúde.
O SUS é destinado a qualquer cidadão e é financiado com recursos
públicos, arrecadados mediante o pagamento de tributos - impostos e contribuições
sociais, pagos pela população.
Com a criação do Sistema Único de Saúde o Estado brasileiro teve por meta
o oferecimento de um importante mecanismo de promoção da equidade no
atendimento das necessidades de saúde da população, ofertando serviços
adequados às necessidades da população, independente do poder aquisitivo do
cidadão. O objetivo é promover a saúde, priorizando as ações preventivas,
democratizando as informações relevantes para que a população conheça seus
direitos e os riscos à sua saúde.
Também está afeto ao SUS o controle da ocorrência de doenças, o
incremento das mesmas e propagação - Vigilância Epidemiológica, assim como o
controle da qualidade de remédios, de exames, de alimentos, higiene e adequação
de instalações que atendem ao público, onde atua a Vigilância Sanitária.
De forma suplementar o setor privado participa do SUS, mediante contratos
e convênios de prestação de serviços ao Estado, na medida em a demanda nas
27
unidades públicas de assistência a saúde for superior à capacidade, com a
finalidade de garantir o atendimento a toda a população de uma determinada região.
A Lei Nº 8.080, DE 19 DE SETEMBRO DE 1990, que é a Lei Orgânica da
Saúde, dispõe sobre as condições para a promoção, proteção e recuperação da
saúde, a organização e o funcionamento dos serviços correspondentes e dá outras
providências.
No Título I – parte que trata das disposições gerais, temos no parágrafo 2º,
do segundo artigo a seguinte previsão:
“Art. 2º. A saúde é um direito fundamental do ser humano, devendo o Estado prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício. § 1 º. O dever do Estado de garantir a saúde consiste na formulação e execução de políticas econômicas e sociais que visem à redução de riscos de doenças e de outros agravos e no estabelecimento de condições que assegurem acesso universal e igualitário às ações e aos serviços para a sua promoção, proteção e recuperação. § 2 º. O dever do Estado não exclui o das pessoas, da família, das empresas e da sociedade.” (g.n.)
Tal qual a Segurança Pública o provimento da saúde também é dever do
Estado e da sociedade.
A outra Lei referida acima, a de n° 8.142, de 28 de dezembro de 1990,
dispõe sobre a participação da comunidade na gestão do Sistema Único de Saúde
(SUS) e sobre as transferências intergovernamentais de recursos financeiros na
área da saúde e dá outras providências, interessando ao estudo a parte da
participação da comunidade na gestão do Sistema.
O segundo parágrafo do artigo 1º trata do Conselho de Saúde, conforme
transcrito abaixo:
“Art. 1°. O Sistema Único de Saúde (SUS), de que trata a Lei n° 8.080, de 19 de setembro de 1990, contará, em cada esfera de governo, sem prejuízo das funções do Poder Legislativo, com as seguintes instâncias colegiadas: I - a Conferência de Saúde; e II - o Conselho de Saúde. § 1°. A Conferência de Saúde reunir-se-á a cada quatro anos com a representação dos vários segmentos sociais, para avaliar a situação de saúde e propor as diretrizes para a formulação da política de saúde nos níveis correspondentes, convocada pelo Poder Executivo ou, extraordinariamente, por esta ou pelo Conselho de Saúde. § 2°. O Conselho de Saúde, em caráter permanente e deliberativo, órgão colegiado composto por representantes do governo, prestadores de serviço, profissionais de saúde e usuários, atua na formulação de estratégias e no controle da execução da política de saúde na instância correspondente, inclusive nos aspectos econômicos e financeiros, cujas
28
decisões serão homologadas pelo chefe do poder legalmente constituído em cada esfera do governo.” (g.n.)
5.2 OS CONSELHOS TUTELARES
A Lei nº 8.248, de 12 de outubro de 1991, que criou o Conselho Nacional
dos Direitos da Criança e do Adolescente (CONANDA), também inseriu em nosso
ordenamento o Conselho Tutelar, previsto no artigo 131 do referido diploma legal,
popularmente conhecido por Estatuto da Criança e do Adolescente, que é órgão
permanente e autônomo, não jurisdicional, encarregado pela sociedade de zelar
pelo cumprimento dos direitos da criança e do adolescente, definidos da citada Lei.
São atribuições dos Conselhos Tutelares, dentre outras, o atendimento às
crianças e adolescentes em caso de violação dos seus direitos por ação ou omissão
do Estado ou da sociedade, por abuso, omissão ou em razão da conduta dos pais
ou responsáveis. Receber obrigatoriamente as comunicações referentes aos casos
suspeitos ou confirmados de maus tratos, bem como nos casos de faltas
injustificadas, evasão escolar ou repetência em níveis elevados de ocorrência,
esgotadas as vias de recursos escolares.
Atendimento aos pais e responsáveis, sendo possível a aplicação de
algumas medidas, exemplo: tratamento especializado e encaminhamento a
programas de orientação familiar. Encaminhar a notícia de fatos que constituem
infração administrativa ou penal contra os direitos da criança e do adolescente aos
órgãos competentes
O artigo 136 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) nos traz as
atribuições dos Conselhos Tutelares.
Diz o artigo:
“Art.136 - São atribuições do Conselho Tutelar: I - atender as crianças e adolescentes nas hipóteses previstas nos arts. 98 e 105, aplicando as medidas previstas no art. 101, I a VII; II - atender e aconselhar os pais ou responsável, aplicando as medidas previstas no art. 129, I a VII; III - promover a execução de suas decisões, podendo para tanto: a) requisitar serviços públicos nas áreas de saúde, educação, serviço social, previdência, trabalho e segurança;
29
b) representar junto à autoridade judiciária nos casos de descumprimento injustificado de suas deliberações. IV - encaminhar ao Ministério Público notícia de fato que constitua infração administrativa ou penal contra os direitos da criança ou adolescente; V - encaminhar à autoridade judiciária os casos de sua competência; VI - providenciar a medida estabelecida pela autoridade judiciária, dentre as previstas no art. 101, de I a VI, para o adolescente autor de ato infracional; VII - expedir notificações; VIII - requisitar certidões de nascimento e de óbito de criança ou adolescente quando necessário; IX - assessorar o Poder Executivo local na elaboração da proposta orçamentária para planos e programas de atendimento dos direitos da criança e do adolescente; X - representar, em nome da pessoa e da família, contra a violação dos direitos previstos no art. 220, § 3º, inciso II, da Constituição Federal; XI - representar ao Ministério Público, para efeito das ações de perda ou suspensão do pátrio poder.”
A aplicação das medidas protetivas elencadas no artigo 101, itens I a VII do
Estatuto também é da atribuição do Conselho, sempre que ocorrer qualquer das
situações descritas nos artigos 98 e 105 do ECA, ou seja, criança ou adolescente
em situação irregular ou que tenha cometido ato infracional.
O artigo 101 referido determina que verificadas quaisquer das situações
previstas no artigo 98, (situação irregular) a autoridade competente poderá
determinar, dentre outras, as seguintes medidas: (g.n.)
I - encaminhamento aos pais ou responsável, mediante termo de responsabilidade; II - orientação, apoio e acompanhamento temporários; III - matrícula e frequência obrigatórias em estabelecimento oficial de ensino fundamental; IV - inclusão em programa comunitário ou oficial de auxílio à família, à criança e ao adolescente; V - requisição de tratamento médico, psicológico ou psiquiátrico, em regime hospitalar ou ambulatorial; VI - inclusão em programa oficial ou comunitário de auxílio, orientação e tratamento a alcoólatras e toxicômanos; VII - abrigo em entidade.
As hipóteses de situação irregular estão disciplinadas no artigo 98 do ECA.
Diz o referido artigo:
30
“Art.98. As medidas de proteção à criança e ao adolescente são aplicáveis sempre que os direitos reconhecidos nesta Lei forem ameaçados ou violados: I - por ação ou omissão da sociedade ou do Estado; II - por falta, omissão ou abuso dos pais ou responsável; III - em razão de sua conduta.”
Diante do que foi estudado, percebe-se que os Conselhos Tutelares, são
órgãos de grande importância no sentido de democratizar o atendimento às crianças
e adolescentes, e está em total acordo com a diretriz trazida pelo ECA de que são
solidariamente responsáveis pelo cumprimento do quanto disposto no Estatuto, a
família da criança ou adolescente, a sociedade e o Estado.
Muitas críticas são feitas ao instituto, já que este não foi totalmente
disciplinado pelo ECA, que deixou ao legislador municipal a tarefa de definir como
funcionará o órgão em seu município, mas, temos por certo que se nesses 16 anos
de vigência do Estatuto, os Conselhos Tutelares não alcançaram os objetivos para
os quais foram criados(a maioria dos municípios brasileiros sequer criou seus
Conselhos), não foi por barreiras na legislação, e sim, falta de vontade política e pela
ausência de comprometimento dos agentes políticos com a realização dos direitos
fundamentais das crianças e adolescentes previstos na Constituição Federal e no
Estatuto da Criança e do Adolescente.
5.3 OS CONSELHOS DA COMUNIDADE
A mídia brasileira diariamente tem noticiado e mostrado as condições físicas
dos presídios país afora, e o que fica demonstrado é exatamente a omissão e a
indiferença da sociedade no trato da questão penitenciária e principalmente a
pessoa do condenado e do internado.
Linhas acima há os exemplos de conselhos atuantes. Há clara distinção no
próprio ordenamento jurídico que os regula, sendo que os Conselhos de Saúde e
Tutelar estão plenamente regulamentados e seus membros com atribuições
definidas, enquanto que aquele - o Conselho da Comunidade – tem apenas previsão
de cunho geral nos artigos 80 e 81 da Lei de Execução Penal. Não se vislumbra
participação popular tal qual a dos conselhos tutelares com campanhas, eleições,
mandatos, remuneração, etc...
31
Os Estados têm suprido esta deficiência com Provimentos e Portarias dos
Tribunais de Justiça com orientações para a instituição e atuação dos Conselhos da
Comunidade nas comarcas subordinadas.
No Estado do Rio Grande do Sul, onde a situação dos presídios está
caótica, principalmente o Presídio Central de Porto Alegre, conforme se vê nas
fotografias do ANEXO I, a Superintendência dos Serviços Penitenciários – SUSEPE
vem incentivando uma maior participação da sociedade na recuperação de presos. A
instituição quer que todas as cidades do Rio Grande do Sul que possuam
estabelecimentos penais tenham um Conselho da Comunidade. A função deste
órgão é dar assistência ao detento para que ele seja tratado e que a sociedade
receba um indivíduo recuperado, que não volte a cometer crimes novamente.
Os Conselhos da Comunidade estão previstos na Lei de Execução Penal
(LEP). Todos os municípios que têm Juízo de Execução e, principalmente, aqueles
que possuem uma casa prisional, devem ter órgão semelhante a este.
Como já dito, nos últimos anos a SUSEPE está tentando sensibilizar a
população gaúcha para que todos os municípios tenham o conselho, visto que, nos
municípios onde os conselhos estão presentes, muitas melhorias têm ocorrido para
fazer com que o preso não reincida no crime.
Hoje, das 110 casas prisionais do Rio Grande do Sul, em apenas 35 a
comunidade acompanha o período de cumprimento da pena e do processo de
ressocialização do detento.
Na LEP está previsto a composição dos Conselhos, cujos componentes
devem visitar os estabelecimentos penais pelo menos uma vez por mês e entrevistar
os presos para verificar quais necessidades imediatas eles têm. Outra atribuição é
oferecer recursos materiais e humanos para melhorar a assistência ao detento na
educação, saúde e nas atividades de trabalho.
Os conselhos também servem como um órgão regulador cobrando do
Estado que haja condições dignas de sobrevivência e trabalho. Todas as ações
devem ser informadas em relatórios mensais ao Juiz e à SUSEPE.
Os textos dos artigos 80 e 81 da LEP não esgotam o rol de atribuições do
Conselho da Comunidade. Nada impede, por exemplo, que a assistência ao
apenado se amplie e que haja um acompanhamento quando ele sair da prisão,
como encaminhá-lo para uma atividade profissional.
32
Um dos maiores exemplos de como a comunidade pode contribuir para
ressocializar um preso e diminuir a reincidência de crime acontece na Penitenciária
Estadual de Torres. Desde o início de 2001 a casa conta com um Conselho. O órgão
conseguiu que várias obras fossem realizadas no presídio.
Mediante a solicitação de recursos feitos à SUSEPE e de doações da
comunidade de Tores, a sala da administração do presídio foi ampliada, o refeitório e
a cozinha foram reformados e um albergue para detentos do regime aberto e semi-
aberto foi construído.
Por meio de convênio com uma universidade do Litoral Norte do Estado não
há mais analfabetos no estabelecimento e, do total de 86 presos, 35 estão
estudando. Segundo o diretor do presídio, IVAN CARLOS DA SILVA, mais da
metade dos presos também trabalha, fora ou dentro do estabelecimento penal. “O
Conselho fez com que muitas coisas mudassem, e os presos confiam e colaboram
com o trabalho que é feito para eles próprios”, confirma o diretor.
33
6 EVOLUÇÃO HISTÓRICA DA POLÍCIA NO BRASIL
6.1 A POLÍCIA NA HISTÓRIA
A Polícia, como instituição, nasce de uma necessidade social e de forma
paralela ao desenvolvimento da sociedade humana e, como no caso desta, não é
possível designar uma data para seu surgimento.
A evolução da Polícia pode ser observada pelos testemunhos escritos
deixados pelos povos antigos. Os egípcios e os hebreus foram os primeiros povos a
incluírem medidas policiais em suas legislações. O termo polis, de onde deriva a
palavra "polícia", surgiu na antiga Grécia, com o significado de cidade,
administração, governo. No entanto, somente em Roma, ao tempo do Imperador
Augusto (63 a.C. a 14 d.C.), adquiriu organização de fato. Em Roma, havia um chefe
de polícia denominado "Edil", que usava uma indumentária de magistrado, que
possuía ampla soberania para decidir seus atos.
Dessa época em diante, seguiram-se períodos de obscurantismo, com o das
invasões bárbaras, até surgir o sistema anglo-saxão de organização policial, na
Inglaterra.
6.2 A POLÍCIA NO BRASIL COLÔNIA
No site da Secretaria da Segurança Pública do Estado de São Paulo2 é
apresentada a instituição Polícia e está registrado que a instituição policial brasileira,
conforme documentação existente no Museu Nacional do Rio de Janeiro, data de
1530, fato ocorrido com a chegada de D. Martin Afonso de Souza, enviado ao Brasil-
Colônia por D. João III.
A pesquisa histórica revela que, no dia 20 de novembro daquele ano, a
Polícia brasileira iniciava as suas ações, promovendo Justiça e organizando os
serviços de ordem pública, como melhor entendesse nas terras conquistadas do
Brasil.
2 www.ssp.sp.gov/institucional/default.aspx.
34
A partir de então, a Instituição Policial brasileira passou por seguidas
reformulações nos anos de 1534, 1538, 1557, 1565, 1566, 1603, e, assim,
sucessivamente, até a chegada do Príncipe D. João ao Brasil.
Registre-se que a Polícia do Brasil Colônia era executada inicialmente por
militares do exército português e é por este motivo que alguns historiadores só
consideram criada a Instituição Polícia quando da chegada do Príncipe D. João em
nosso País. Logo, no meu entender, a semente da instituição foi lançada e
germinada por Martin Afonso de Souza.
Encontramos, também, no site da Polícia Civil do Estado do Rio Grande do
Sul3 que o surgimento da Polícia Civil no Brasil remonta à época da chegada de D.
João VI, em 1808, quando criou ele o cargo de "Intendente Geral da Polícia da Corte
e Estado do Brasil", que era desempenhado por um desembargador do Paço, com
um delegado em cada Província.
A infração penal e sua autoria sempre foram apuradas pela Instituição
Policial Civil, mesmo antes de no Brasil haver sido criado o Inquérito Policial. A
legislação vigente no Brasil era a mesma de Portugal, baseada na herança romana
e nas Ordenações Afonsinas (1446 a 1521), Manuelinas (1521 a 1603) e Filipinas
(1603 a 1867). O processo criminal brasileiro era, nessa época, tripartido,
compreendendo a "Devassa", a "Querela" e a "Denúncia".
No Brasil houve duas fases, a dos Donatários, de 1534 a 1549, e a dos
Governadores-Gerais, de 1549 a 1767, com o Vice-reinado e a organização
judiciária, a estilo do Livro Primeiro das Ordenações, em que os serviços policiais
eram exercidos por "alcaides" e "almotacés" sob a fiscalização dos "Juízes de Vara
Branca", ou "de Fora". Posteriormente a legislação previa o cargo de "Quadrilheiro"
que "em todas cidades e vilas" prendiam os malfeitores. Cada "quadrilheiro" tinha
vinte homens para manter a ordem”.
A Secretaria da Segurança Pública do Estado de São Paulo registra que:
“No dia 10 de agosto de 1808 foi criado, mediante Alvará Régio, o cargo de
Intendente Geral de Polícia, ocupado pela primeira vez pelo Desembargador Paulo
Fernandes Viana, incumbido imediatamente de criar suas diversas secções”.
3 www.pc.rs.gov.br/deic/htm/hist.htm
35
6.3 A POLÍCIA NO IMPÉRIO
Ainda com a pesquisa realizada na Instituição Policial Civil do Rio Grande do
Sul temos que: “Em 1824, com a Independência do Brasil ocorrida em 1822, foi
promulgada a Constituição do Império do Brasil, que previa que a prisão só poderia
ser em flagrante delito ou por ordem escrita de autoridade competente. Às
Assembleias Legislativas Provinciais era outorgada a competência para legislar
sobre polícia. Nas freguesias e capelas curadas as atribuições policiais eram
conferidas aos Juízes de Paz por lei de 15 de outubro de 1827. Em 1835 era criado,
pela lei nº. 29, o Código de Processo Criminal. Esta Lei outorgava à polícia uma
organização descentralizada, conferindo autoridade policial aos Juízes de Paz e
atribuindo a um juiz de Direito o cargo de Chefe de Polícia”.
Então, em 03 de dezembro de 1841 foi editada a Lei nº 261, regulada pelo
Decreto nº 120, de 31 de janeiro de 1842, modificando o Código de Processo
Criminal. Essa Lei criou no município da Corte e em cada Província um Chefe de
Polícia e respectivos Delegados e Subdelegados, nomeados pelo Imperador ou
pelos Presidentes de Província, sendo o primeiro Chefe de Polícia da Província de
São Paulo o Conselheiro Rodrigo Antônio Monteiro de Barros, figura de alta projeção
no cenário jurídico do País.
Em 20 de setembro de 1871, pela Lei nº 2033, regulamentada pelo Decreto
nº 4824, de 22 de novembro do mesmo ano, foi reformado o sistema adotado com a
Lei nº 261. A instituição Polícia foi separada da Justiça trazendo algumas inovações
que perduraram até os nossos dias, como por exemplo, a criação do Inquérito
Policial”.
Em seu sitio a Polícia Civil gaúcha esclarece que “no Estado do Rio Grande
do Sul, fundado em 19 de fevereiro de 1737, a polícia inicialmente passou pela
época das "comandanças", havendo, nesse período, os chamados "Corpos
Policiais". A legislação obedecida era a do Brasil Colônia, já anteriormente citada.
A organização das policias provinciais, prevista no Código de Processo
Penal de 1832, somente teve efetivação com a Lei n. 261, de 3 de dezembro de
1841. Com essa lei estavam criadas as Polícias Civis das Províncias. Nela estavam
previstos os cargos de Chefe de Polícia, Delegados e Subdelegados e, pelo
Regulamento de 31 de janeiro de 1842, era previsto ainda o cargo de "Inspetor de
Quarteirão".
36
O primeiro Chefe de Polícia do Rio Grande do Sul foi o Dr. Manoel Paranhos
da Silva Vellozo, que tomou posse em 18 de maio de 1842, administrando até 11 de
março de 1844. Era o nascimento da Polícia Civil gaúcha, com estrutura e
organização próprias.
É salutar a transcrição do documento histórico relativo a nomeação do
primeiro Chefe de Polícia do Estado do Rio Grande do Sul:
Carta Imperial do Chefe de Polícia desta Prov. do Dr. Manoel Paranhos da Silva Vellozo. Arquivo Histórico do R.G.S Livro B 9 P g. 75 Dom Pedro por Graça de Deos e Unanime Acclamação dos Povos, Imperador constitucional e Defensor Perpetuo do Brazil faço saber todas as authoridades e mais pessoas a quem conhecimento desta Carta pertencer, que Hey por bem, em conformidade do artigo primeiro do Título primeiro da lei de tres de dezembro do anno próximo passado, nomear o Bacharel Manoel Paranhos da Silva Vellozo para Chefe de Polícia da Província de São Pedro do Rio Grande do Sul. E este lugar exercer depois de lhe ser dada a posse pela Authoridade competente, com toda jurisdição marcada na referida lei, e conforme os Regulamentos respectivos, ficando obrigado a satisfazer os devidos direitos logo que for arbitrada a gratificação, que por este mesmo lugar lhe compettir. E por firmeza de tudo que lhe mandei passar a presente Carta por Mim assignada que, sendo sellada com o sello pendente da Chancellaria do Império, se cumprir como nella se contem. Dada no Palácio do Rio de Janeiro em 12 de Abril de mil oitocentos e quarenta e dous, vigessimo primeiro da Independência do Império. Imperador com rubrica e guarda. Paulino Jose Soares de sousa - Carta pela qual Vosssa Magestade Imperial ha por bem nomear o Bacharel Manoel Paranhos da Silva Velloso, para Chefe de Polícia da Provincia de São Pedro do Rio Grande do Sul na forma acima declarada. Para Vossa Magestade Imperial ver. Por Decreto de 17 de março de 1842, e despacho do Ministro Secretário do Estado dos Negócios da Justiça, Antonio Alvares de Miranda Varejão a fêz. Paulino José Soares de sousa, sellada na Chancellaria do Império em 18 de abril de 1842, João Carneiro de Campos. Registrado. Registrada a fls 50 do livro competente. Secretaria de Estado dos Negócios da Justiça em 18 de abril de 1842 Vicente Ferreira de Castro e Silva. N. 99 Pg quatro mil oitocentos e quarenta e seis de sello. Rio 18 de abril de 1842, Oliveira cumpra-se e registre-se. Palacio do Governo na leal e valorosa cidade de Porto Alegre 20 de maio de 1842. Saturnino de Sousa e Oliveira. Posse dia 18 de maio de 1842 Relatório do presidente da Província - Duque de Caxias ou Secretaria do Interior.
37
7 A CONSTITUIÇÃO DE 1988 E O SISTEMA DE SEGURANÇA PÚBLICA DO BRASIL
ARTIGO 144 DA CARTA MAGNA
A Constituição da República do Brasil promulgada em 05 de outubro de 1988
trata, no capítulo III, da Segurança Pública e podemos ver do texto transcrito abaixo
que não faz qualquer menção à Polícia Comunitária, senão vejamos:
Capítulo III
Da Segurança Pública
Artigo 144
A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é
exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do
patrimônio, através dos seguintes órgãos:
I - polícia federal;
II - polícia rodoviária federal;
III - polícia ferroviária federal;
IV - polícias civis;
V - polícias militares e corpos de bombeiros militares.
§ 1º A polícia federal, instituída por lei como órgão permanente, estruturado
em carreira, destina-se a:
I - apurar infrações penais contra a ordem política e social ou em detrimento
de bens, serviços e interesses da União ou de suas entidades autárquicas e
empresas públicas, assim como outras infrações cuja prática tenha repercussão
interestadual ou internacional e exija repressão uniforme, segundo se dispuser em
lei;
II - prevenir e reprimir o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o
contrabando e o descaminho, sem prejuízo da ação fazendária e de outros órgãos
públicos nas respectivas áreas de competência;
III - exercer as funções de polícia marítima, aérea e de fronteiras;
IV - exercer, com exclusividade, as funções de polícia judiciária da União.
§ 2º A polícia rodoviária federal, órgão permanente, estruturado em carreira,
destina-se, na forma da lei, ao patrulhamento ostensivo das rodovias federais.
§ 3º A polícia ferroviária federal, órgão permanente, estruturado em carreira,
destina-se, na forma da lei, ao patrulhamento ostensivo das ferrovias federais.
38
§ 4º Às polícias civis, dirigidas por delegados de polícia de carreira,
incumbem, ressalvada a competência da União, as funções de polícia judiciária e a
apuração de infrações penais, exceto as militares.
§ 5º Às polícias militares cabem a polícia ostensiva e a preservação da
ordem pública; aos corpos de bombeiros militares, além das atribuições definidas em
lei, incumbe a execução de atividades de defesa civil.
§ 6º As polícias militares e corpos de bombeiros militares, forças auxiliares e
reserva do Exército, subordinam-se, juntamente com as polícias civis, aos
Governadores dos Estados, do Distrito Federal e dos Territórios.
§ 7º A lei disciplinará a organização e o funcionamento dos órgãos
responsáveis pela segurança pública, de maneira a garantir a eficiência de suas
atividades.
§ 8º Os Municípios poderão constituir guardas municipais destinadas à
proteção de seus bens, serviços e instalações, conforme dispuser a lei.
Além das Instituições elencadas na Carta Magna o Governo Federal, com o
Decreto nº 5.289, de 29 de novembro de 2004, em observância ao princípio de
solidariedade federativa que serve de orientação para o desenvolvimento de
atividades conjuntas no Sistema Único de Segurança Pública, regulou o Programa
de Cooperação Federativa denominado Força Nacional de Segurança Pública, o
qual pode ser empregado em qualquer parte do nosso País, mediante solicitação do
Governador de Estado ou do Distrito Federal.
A determinação do emprego da Força Nacional de Segurança Pública
compete ao Ministro de Estado da Justiça.
O efetivo mobilizável da Força Nacional de Segurança Pública será
composto por servidores com treinamento especial para atuação conjunta,
vinculados às polícias federais e aos órgãos de segurança pública dos Estados.
Assim, diante do que contém o Artigo 144 da Constituição Federal podemos
verificar que o mesmo descreve tão somente as atribuições de cada órgão vinculado
à segurança pública.
Sabe-se que a Constituição não pode ser vista isoladamente em seus
capítulos e artigos, mas sim de forma interligada e o artigo 144 conjugado com os
artigos 5º e 37 teremos a forma de proceder das Polícias e seus Agentes junto à
comunidade.
39
É do conhecimento de todos que o Estado deve assegurar ao cidadão
(brasileiro ou estrangeiro) residente ou em trânsito pelo país, o respeito a sua
integridade física e patrimonial. Para cumprir essa função o Estado tem a sua
disposição os órgãos que compõem a Segurança Pública, com maior destaque aos
órgãos policiais, que também podem ser denominados Forças de Segurança.
Os agentes policiais atuam na preservação da ordem pública, garantindo à
coletividade os direitos assegurados pela Constituição Federal, e nos acordos e
tratados internacionais que foram subscritos pelo Brasil, entre eles, a Declaração
Universal dos Direitos Humanos, o Pacto de São José da Costa Rica, a Convenção
de Palermo, a Convenção Americana de Direitos Humanos – CADH, dentre outros.
Para um melhor entendimento da matéria se faz necessário conceituar o que
é ordem pública e segurança pública, que são os campos de atuação dos policiais,
que devem respeitar o cidadão, assim como também deverão ser respeitados pelos
integrantes da coletividade a que servem.
A ordem pública é a situação de tranquilidade e normalidade que o Estado
assegura, ou deve assegurar, às instituições e aos membros da sociedade,
consoante as normas jurídicas legalmente estabelecidas. A Segurança pública é a
garantia relativa da manutenção da ordem pública, mediante a aplicação do poder
de polícia, encargo do Estado.
A missão das Policias, como bem traduz o lema SERVIR E PROTEGER, é
assegurar ao cidadão o exercício dos direitos e garantias fundamentais previstos na
Constituição Federal e nos instrumentos internacionais subscritos pelo Brasil. Essa
atividade exige dedicação, especialização e preparo dos servidores das
Organizações Policiais, que devem se afastar do arbítrio, da prepotência, do abuso
ou excesso de poder, em respeito à lei, que deve ser observada por todos em
respeito ao Estado democrático de Direito.
O ex-Secretário Nacional de Segurança Pública do Ministério da Justiça,
Ricardo Balestreri, assevera que: “O policial, pela natural autoridade moral que
carrega, tem o potencial de ser o mais marcante promotor dos Direitos Humanos,
revertendo o quadro de descrédito social e qualificando-se como um agente central
da democracia. Direitos Humanos também é coisa de policial”.
Os órgãos policiais servem justamente para garantir o efetivo cumprimento
das normas e respeito ao Estado democrático em claro respeito a previsão da nossa
Lei Maior, a Constituição Federal.
40
As atividades desenvolvidas pelas organizações Policiais são da maior
relevância; tanto é verdade que o legislador constituinte as elevou a categoria
constitucional, onde delimitou o campo de atuação de cada órgão policial. A
competência prevista no texto constitucional é funcional, tendo por objetivo
assegurar à coletividade a prestação de serviço qualificado, em atendimento aos
princípios do art. 37, caput, da CF, principalmente o da eficiência e não descuidando
do dever funcional do bom atendimento.
A criminalidade, não só no Brasil como no resto do mundo, vem aumentado,
e diversas espécies de crimes como furto, roubo, roubo seguido de morte
(latrocínio), homicídio, além dos crimes de informática, do tráfico de seres humanos,
do tráfico de drogas, o terrorismo, dentre outros, assustam a população que se sente
como medo e insegura. O Estado brasileiro tem se esforçado para dar uma resposta
eficaz a essas questões, mas, por motivos os mais diversos, a sociedade não se
sente satisfeita com os serviços de segurança pública.
A falta de uma Lei Orgânica Nacional que possa ser aplicada de forma
uniforme aos órgãos policiais tem levado a conflitos de atribuições entre as
instituições responsáveis pela preservação da ordem pública. Essa situação tem
sido agravada pela Guarda Municipal que não possui legitimidade para exercer atos
de polícia judiciária ou mesmo atos de policiamento ostensivo e preventivo, mas
insiste em exercer atos privativos de outros órgãos, o mesmo ocorrendo com as
Polícias Militares que prestam um deficiente serviço de Polícia Administrativa
ostensiva, cuja finalidade é a da maior importância junto a população, qual seja a de
evitar que o crime ocorra, mas da mesma maneira que as Guardas Municipais
querem realizar atos de polícia judiciária. Outra corporação que também exerce atos
privativos de outros órgãos é a Polícia Rodoviária Federal que deixa de fiscalizar as
estradas, o que proporciona verdadeira carnificina no trânsito de nossas estradas,
mas realiza segurança de dignitários, segurança de fiscais do trabalho junto às
ações de combate ao trabalho escravo, como também realiza grampos telefônicos
para o Ministério Público, fato divulgado em nossa imprensa escrita.
Se as Polícias Militares e a própria Polícia Rodoviária Federal exercessem
realmente suas atribuições como Polícias preventivas, agindo para evitar que o
crime ocorra teríamos o incremento da criminalidade constatado nos últimos
tempos? Creio que não.
41
Outro fato que gostaria de ver realizado é a quarentena, a exemplo dos
juízes e promotores, para policiais em empresas cujo ramo de atividade é a venda
da segurança particular. Será que tais profissionais não estariam prestando um
péssimo serviço na segurança pública para obter facilidades com a atividade da
segurança privada? É algo que devemos pensar. Aos nossos legisladores para
discussão.
Será que também não deveremos discutir os vários gabinetes com policiais
militares junto aos governos estaduais, tribunais de conta, assembleias legislativas,
tribunais de justiça, foruns e varas judiciais? No Estado do Pará é voz corrente na
corporação estadual que há um policial militar que está prestes a se aposentar e
nunca entrou em uma viatura policial, visto que só prestou serviços para outras
instituições que deveriam ter sua segurança orgânica. É dessa maneira que serão
prestados serviços de segurança com eficiência?
As corporações sempre apontam o déficit de contingente para justificar as
falhas da prevenção, mas, por razões políticas, deixam de apontar os diversos
desvios a que são submetidos os profissionais da segurança pública.
A adoção de uma política nacional de segurança pública, com investimentos
nos setores operacionais dos órgãos policiais e no sistema prisional, são essenciais
para que os direitos básicos do administrado, direito à vida, à liberdade, à igualdade,
à segurança, à propriedade sejam efetivos e não mera peça decorativa em uma
Constituição.
42
8 CONCLUSÃO
Na legislação pátria não encontramos qualquer vinculação entre Sistema
Penitenciário e Sistema de Segurança Pública, embora exista, na prática, uma
correlação entre ambos, visto que o Sistema de Segurança Pública é o maior
abastecedor de “clientes” ao Sistema Penitenciário e este, na medida em que não
consegue ressocializar seus internos para retorno ao convívio social, também
abastece o Sistema de Segurança Pública com o retorno de “clientes costumeiros”.
A legislação brasileira pertinente ao Sistema Penitenciário Brasileiro deixou
de observar o comando existente nas Regras Mínimas da ONU para o Tratamento
de Prisioneiros em seu artigo 46, e subitens, transcritos acima, o qual diz que a
administração penitenciária escolherá cuidadosamente o pessoal de todas as
categorias, posto que, da integridade, humanidade, aptidão pessoal e capacidade
profissional desse pessoal dependerá a boa direção dos estabelecimentos
penitenciários.
Cabe ressaltar o contido no subitem 3, que diz que para lograr tais fins, será
necessário que os membros trabalhem com exclusividade como funcionários
penitenciários profissionais, tenham a condição de funcionários públicos e, portanto,
a segurança de que a estabilidade em seu emprego dependerá unicamente da sua
boa conduta, da eficácia do seu trabalho e de sua aptidão física. A remuneração do
pessoal deverá ser adequada, a fim de se obter e conservar os serviços de homens
e mulheres capazes. Determinar-se-á os benefícios da careira e as condições do
serviço tendo em conta o caráter penoso de suas funções.
O que vemos em nosso País, em algumas unidades Federadas, é o
descumprimento de tal ordenamento, na medida em que encontramos policiais civis,
federais, militares e até terceirizados cuidando de presos, sem qualquer formação no
quesito tratamento para ressocializar. Temos já neste descumprimento um dos
fatores dos altos índices de reincidência no País.
Da mesma forma os Conselhos da Comunidade não estão estabelecidos em
todos os municípios brasileiros, quer tenham casas prisionais ou não, visto que onde
houver vara criminal referido conselho é obrigatório, uma vez que as penas
alternativas também devem ser acompanhadas por citados Conselhos.
A falta de pessoal realmente qualificado para o exercício da atribuição, bem
como a não atuação dos complementos previstos na Lei de Execução Penal
43
brasileira são pontos que julgamos responsáveis pelos elevados índices de
reincidência e a concordar com o Mestre Cezar Roberto Bitencourt que afirma a
falência da Pena de Prisão.
Quem não atua junto aos Sistemas Penitenciário e de Segurança Pública,
pelo que vê na mídia, pode até presumir que durante o tempo de reclusão os
internos são submetidos a tratamento reabilitador. Ledo engano.
Cezar Bitencourt apresenta índices de reincidência que oscilam entre 40 e
80% nos Estados Unidos. Na Espanha entre os anos 1957 e 1973 o percentual
médio de reincidência foi de 60,3%, sendo que na Costa Rica foi encontrado, mais
recentemente, o percentual de 48% de reincidência. Afirma também que os países
latino-americanos não apresentam índices confiáveis, sendo esse um dos fatores
que dificultam a realização de uma verdadeira política criminal.
Muitas modificações hão de ser feitas ao longo dos próximos anos se
quisermos mudar a atual situação do nosso sistema penitenciário, se realmente
desejamos a paz social e termos plena sensação de segurança, tão clamada pela
população.
Primeiro passo, a profissionalização do pessoal encarregado da questão
penitenciária e do trato para com o prisioneiro, com a retirada total dos profissionais
de outras áreas, tais como policiais civis, federais ou militares das casas prisionais,
visto que suas formações são diametralmente opostas a ressocialização dos
apenados.
Segundo passo, descentralização total das casas prisionais e construção de
pequenas unidades em cada município brasileiro, com atuação direta dos Conselhos
da Comunidade, visto que o “doente social” deve ser tratado junto a sua comunidade
de origem. Neste caso deverão ser adotados os mesmos critérios utilizados para a
constituição dos conselhos de saúde o tutelares. Da mesma maneira os
mecanismos utilizados para indicação e nomeação dos Conselheiros da
Comunidade deverão ser idênticos aos daqueles, ou seja, eleição, mandato e
remuneração.
Efetiva separação dos detentos contemplando o tipo de personalidade de
cada um e pela análise do delito cometido. Num primeiro momento poderíamos ter
três classificações afora a dos condenados a penas alternativas, sendo a dos presos
sem periculosidade e primários, os quais receberiam tratamento junto as suas
comunidades. Os presos reincidentes ou primários, mas com média periculosidade,
44
seriam tratados em presídios regionais, contando com maior aparato, quer seja de
profissionais, quanto de especialistas no trato do ser humano, objetivando a
ressocialização. Por último as penitenciárias de segurança máxima, local destinado
aos presos de alta periculosidade e de difícil recuperação e ressocialização.
45
REFERÊNCIAS
BALESTRERI, Ricardo Brisolla, Direitos Humanos: Coisa de Polícia. 3ª edição. Passo Fundo, Berthier, 2003.
BASTOS, Celso Ribeiro, Curso de Direito Constitucional, 17ª edição. São Paulo. Saraiva, 1996.
BECCARIA, Cesare, Dos Delitos e das Penas. 5ª edição. São Paulo, Revista dos Tribunais, 2011.
BITENCOURT, Cezar Roberto, Falência da Pena de Prisão – Causas e Alternativas. 4ª edição. São Paulo. Saraiva. 2012/2ª tiragem.
BRANCO, P.J.A. Natureza jurídica do conselheiro tutelar. Jus Navigandi, Teresina, ano 11, n. 1239, 22 nov. 2006. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=9192>. Acesso em: 04 dez. 2006.
BRASIL. Constituição (1988) Constituição da República Federativa do Brasil, promulgada em 5 de outubro de 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil03/constituicao/constituicao htm>. Acesso em: 21 mar. 2012.
BRASIL. Lei n. 7210, de 11 de julho de 1984. Institui a lei de execuções penais. Brasília, DF, Diário Oficial da União de 13/07/1984. pag. 10227
CAVALLIERI, A. Falhas do Estatuto da Criança e do Adolescente. Rio de Janeiro: Forense, 1997.
DALLARI, Dalmo de Abreu, Elementos de Teoria Geral do Estado. 11ª edição. São Paulo, Saraiva,1985.
ELIAS, R.J. Comentários ao Estatuto da Criança e do Adolescente. São Paulo: Saraiva, 2004.
FOUCAULT, Michel, Vigiar e Punir – nascimento das Prisões. 13ª edição. Petrópolis, Vozes, 1996.
ISHIDA, V.K. Estatuto da Criança e do Adolescente: Doutrina e Jurisprudência. São Paulo: Atlas, 2005.
ONU. Regras Mínimas para o Tratamento de Prisioneiros. Adotadas pelo 1º Congresso das Nações Unidas sobre prevenção do Crime e Tratamento de Delinquentes, realizado em 1955 e aprovadas pelo Conselho Econômico e Social da ONU, através da sua resolução 663 C I (XXIV), de 31 de julho de 1957, aditada pela resolução 2076 (LXII) de 13 de maio de 1977. Disponível em: <http://www.dhnet.org.br/direitos/sip/onu/fpena/lex52.htm> Acesso em: 03 abr. 2012.
PEREIRA, T.da.S. Direito da Criança e do Adolescente. Rio de Janeiro: Renovar, 1996.
SILVA, José Afonso da, Curso de Direito Constitucional Prático. 5ª Edição, São Paulo. Revista dos Tribunais, 1989.
46
ANEXO A: RELATÓRIO DO CREA-RS SOBRE INSPEÇÃO NO PRESÍDIO CENTRAL DE PORTO ALEGRE
47
48
49
50
51
52
53
54
55
56
57
58
59
60
61
62
63
64
65
ANEXO B: RELATÓRIO DE VISITA DE FISCALIZAÇÃO DO CREMERS – RESUMO – REALIZADA NO PRESÍDIO CENTRAL DE PORTO ALEGRE
66
67
68
69
70
71
72
73
74
75
76
77
78
79
80
81
82
83
84
85
86
ANEXO C: PARECER DA COMISSÃO DE DIREITOS HUMANOS DA ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL, SECCIONAL DO RIO GRANDE DO SUL SOBRE A VISTORIA REALIZADA NO PRESÍDIO CENTRAL DE PORTO ALEGRE
87
88
89
90
91
92
93
94
95
96
97
98
99
100
101
102
103
104
105
106
107
108
109
110
111