A resposta cristã para a dor
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A resposta cristã para a dorJean Francesco
INTRODUÇÃO
O povo brasileiro é apaixonado por telenovelas. Elas fazem sucesso entre
homens, mulheres, pais, mães, crianças, idosos, sogras, sogros, jovens,
adolescentes e etc. Qual é a razão de seu sucesso em nossa cultura brasileira?
Talvez seja o fato de que toda novela se conecta intimamente com a nossa própria
história – e claro, com a curiosidade, principalmente, de algumas donas de casa.
Novelas, filmes, seriados ganham multidões de espectadores porque lidam com a
doença, com grandes paixões, nos imprimem o desejo pelo sucesso, revelam-nos os
mistérios de outras culturas, dá voz às minorias, tribos, estilos de vida,
comportamentos e etc.
Elas têm o poder de nos fazer sofrer com o destino de seu protagonista, rir
com suas graças, alimentar raiva de seus inimigos e nos emocionar com o seu final
feliz (na maioria dos casos). Histórias nos convidam para o seu mundo, e ainda hoje,
é a melhor forma de comunicar e influenciar mentes e comportamento.
A Bíblia é um dos maiores arsenais de histórias do mundo; não será exagero
afirmar que ela possui a coleção de histórias mais conhecidas da humanidade. Uma
dessas histórias é o drama do personagem Jó. Esse livro é uma novela não porque
seja uma ficção ou algo inventado, mas porque narra a história de um protagonista,
seu estilo de vida, suas aventuras, seus dramas pessoais, seu clímax e o seu
desfecho.
Jó, o homem mais importante de todo o Oriente
Jó foi um rico xeique do deserto de Uz e vivia no lado oriental da Palestina,
provavelmente nos tempos de Abraão, Isaque e Jacó. Os primeiros capítulos do livro
que leva o seu próprio nome como título (1-3) nos apresentam a qualidade sem igual
de sua vida. Jó tinha uma grande família, sete filhos e três filhas, possuía sete mil
ovelhas, muitos camelos, junta de bois e etc., de fato, era o homem mais importante
de todo o Oriente!
Jó se relacionava intensamente com Deus. Ele se levantava cedo e entregava
uma oferta de sacrifício em favor de cada um de seus filhos, no caso de um deles ter
cometido pecado. Ele odiava a maldade, era um homem de palavra e muito honesto.
A resposta cristã para a dorJean Francesco
E o mais interessante do começo do livro é que o próprio Deus tinha muito apreço
por ele, pois fazia lhe fazia elogios perante “o público celeste”, e essa fama foi se
espalhando até que Satanás decidiu questionar se, de fato, ele era tão íntegro e
especial assim como o próprio Deus dizia.
A proposta de Satanás foi um teste. Sua argumentação é a de que Jó tem
sido mimado por Deus como uma criança; ele cuida de tudo para que nada de mal
aconteça a ele, à sua família, ou à sua riqueza e ainda abençoa tudo o que ele faz!
Desse modo quem não seria fiel a Deus? O que aconteceria se fosse tirado tudo o
que ele tem? Com certeza, ele amaldiçoaria a Deus face a face!
Deus, como Soberano inclusive sobre Satanás, decide aceitar o seu desafio,
como se dissesse: “Vá em frente, faça o que quiser com tudo que ele tem. Só não o
machuque”.
Famosos estudiosos das línguas semíticas afirmam que o nome, Jó, tinha o
significado semelhante ao de “um homem perseguido” e isso parece estar
relacionado às calamidades que ele sofreu. Pois abruptamente da família, fortuna e
saúde a história de Jó imerge no sofrimento. Seus sete filhos e três filhas são
assassinados violentamente, seus animais – que representam sua riqueza – são
roubados e seus trabalhadores mortos de maneira inesperada.
Jó passa no primeiro teste de maneira muito satisfatória. Jó se levantou,
rasgou a própria roupa, rapou a cabeça e se jogou no chão. Ali, prostrado ele louvou
a Deus com um poema:
Nu saí do ventre da minha mãe,Nu retornarei ao seio da terra.O Eterno dá, o Eterno tira.O nome de Deus seja louvado para sempre1.
Após Jó ter passado no primeiro teste, Satanás propõe a Deus o segundo:
tirar-lhe a sua saúde. Com certeza ele amaldiçoaria a Deus se sua saúde lhe for
tirada, disse Satanás. Deus aceita o segundo desafio, mas com uma condição, você
pode fazer o que quiser com ele, só não tire a sua vida.
E assim aconteceu. Sua saúde foi tomada, ficou coberto de úlceras e feridas
da cabeça aos pés. Elas doíam e coçavam tanto que ele pegou um caco de vaso
quebrado para raspar suas feridas estando sentado no meio de cinzas.
1 A versão da Bíblia aqui utilizada foi a paráfrase bem conhecida de Eugene Peterson, “A Mensagem”, publicada em português no ano de 2011 pela Editora Vida
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A sua dor foi tão grande que sua própria esposa amaldiçoou o seu Deus. Ela
não conseguiu suportar ter que perder filhos, fortuna e a própria saúde de seu
marido. Jó responde a ela, em outras palavras, "se recebemos coisas boas de Deus,
por que não receberíamos também coisas ruins?” Jó continua vivendo integramente
com Deus, sem pecar, apesar de seu sofrimento.
A partir do capítulo 4 até o seu desfecho no capítulo 37, Jó trava uma longa
discussão com seus amigos Elifaz, Bildade, Zofar e Eliú. Jó não aceitou seu
sofrimento calma ou piamente. Não deu ouvido aos “filósofos” do seu tempo, ainda
que fossem seus amigos, ele apresentou seu caso diante de Deus e ali se queixou
de seus sofrimentos, sem meias palavras. Ele se recusou a aceitar o silêncio como
resposta.
Jó era gente como nós. Ele é mencionado como uma pessoa histórica e não
um ser inventado como alguns tem pensado. É citado em Ezequiel 14.14,20 como
um homem sábio e justo e no Novo Testamento em Tiago 5.11 elogiado por sua
paciência. Sem dúvida, Jó diz corajosamente o que alguns de nós têm medo de
dizer. Ele faz poesia daquilo que, para a maioria de nós, não passaria de uma
mistura de reclames individuais. Ele grita com Deus sobre o seu estado, mas em
momento algum ele amaldiçoa a Deus, como sua esposa lhe ordenou.
Jó nos ensina algo maravilhoso: não se deve fugir da dor. A sua vida é uma
poesia sem igual a nos ensinar que o sofrimento pode levar o ser humano à
presença de Deus num estado de adoração, ainda que em gritos de desespero. Isso
porque na leitura de todo o livro há uma máxima irrefutável: não existe vida sem dor;
ela é algo inevitável e inerente a todo ser humano e deve ser encarada com
sabedoria.
Jó, como um livro inspirado por Deus, é um dos exemplos áureos de que
Deus resolveu ensinar o seu povo a lidar com as dificuldades da vida por intermédio
de histórias. Contar histórias seria um hábito do povo de Deus no decurso de suas
vidas e no desenrolar de seu relacionamento pessoal com Deus. Essa história é
uma das mais impressionantes de toda Escritura, pois nos impressiona do começo
ao fim, mexe com o mais profundo de nossa alma: a dor.
Jó: a novela da dor
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Jó é uma novela de dor, pois possui 3 capítulos de “alegria”, os dois primeiros
e o último, e outros 39 capítulos que falam de intensa dor, crise, desentendimentos,
perguntas sem respostas, ambientes desagradáveis, doença, culpa, mistérios e
muitos diálogos perturbadores.
Jó é como nós: ele sofre, e sofre intensamente. Jó é como a humanidade
depois do evento da Queda em Gn 3: vultos de alegria e intensidade de dor. Este
livro bíblico não apenas remonta a história da Igreja Cristã, mas da condição da
nossa sociedade, como cantam alguns poetas de nosso cancioneiro: “tristeza não
tem fim, felicidade, sim” (Vinícius de Morais); ou como disse Alcides Caminha: “tire o
seu sorriso do caminho que eu quero passar com a minha dor”. A história da
humanidade é marcada por duas cicatrizes notáveis: o riso e o choro.
Se você pudesse contar todos os episódios e histórias que você já vivenciou,
qual das duas cicatrizes você mais encontraria, dor ou festa? Sem sombra de
dúvidas, a resposta é dor. É por isso que o livro de Jó é a mais fantástica novela da
vida real; ela não quer nos prender na intenção de satisfazer nossa curiosidade,
bisbilhotices ou interesses sensuais - como não raro acontece nas novelas atuais –,
ela quer nos ensinar a viver; quer nos ensinar a lidar com o nosso sofrimento.
Capítulo 19: o momento decisivo da história de Jó
Chegamos ao capítulo 19. Estamos em um lugar estratégico desta novela
fascinante. Muitos estudiosos afirmam que aqui é o centro da história do
personagem Jó. O capítulo 19 faz parte de uma das contra argumentações de Jó ao
seu amigo Bildade.
O centro do livro é marcado por estas discussões de seus amigos a respeito
do sofrimento de Jó. É, com grande plausibilidade, o centro, pois é o momento em
que Jó elabora de forma consciente o seu estado de crise profunda; aquelas tensões
que lhe tiram o sono e a respiração. É daí que nasce mais um lamento: quando ele
põe pra fora a sua dor; quando ele vomita a sua angústia infernal.
E não apenas Jó olha para trás e elabora sua condição existencial ele se
torna apto pela graça de Deus a olhar para frente com olhares de esperança. É a
partir deste capítulo que podemos perceber tanto na vida de Jó como na nossa que
a dor e o sofrimento não darão a última palavra. E essa última palavra, ainda que
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seja minoria em tamanho de palavras no longo relato sofrido do livro é a palavra que
prevalece: esperança.
Vamos olhar mais de perto agora o que chamo dos 3 capítulos da dor de Jó,
que nada mais são do que as 3 dimensões de sua dor/sofrimento. Veremos que a
dor é mais nossa aliada do que inimiga e que o principal ensinamento de todo este
livro se resume em uma frase: é possível experimentar Deus na realidade do
sofrimento.
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I.Dor existencial
“Então, respondeu Jó:
Até quando afligireis a minha 2 alma
e me quebrantareis com palavras?
Já dez vezes me vituperastes
e não vos envergonhais de injuriar-me.
Embora haja eu, na verdade, errado,
comigo ficará o meu erro”.
Jó 19.1-4
“Pereça o dia em que nasci
e a noite em que se disse:
Foi concebido um homem!
Converta-se aquele dia em trevas;
e Deus, lá de cima, não tenha cuidado dele,
nem resplandeça sobre ele a luz. [...]
Por que não morri eu na madre?
Por que não expirei ao sair dela?
Por que houve regaço que me acolhesse?
E por que peitos, para que eu mamasse?
Porque já agora repousaria tranqüilo;
dormiria, e, então, haveria para mim descanso”.
Jó 3. 3-4,11-13.
Entramos na primeira parte da argumentação de Jó; seu argumento é que as
pessoas com suas palavras e a própria vida com suas contingências o fizeram em
pedaços. Jó está destruído.
2 Note as partes grifadas na 1°pessoa do singular.
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O argumento de seus amigos é a lógica convencional “causa e efeito” ou
lógica da retribuição. Ela pode ser mais bem compreendida pela pequena tabela que
compreende seus discursos até o cap. 19:
A lógica dos amigos Elifaz, Bildade e Zofar Referência bíblica
Os ímpios sempre se dão mal 4.7-11; 5.2-7; 8.8-19; 15.17-35; 18.5-21
Os justos vivem em felicidade 5.17-21, 25-26; 8.5-7, 20-22; 11.15-19
Quando lemos o livro até o final percebemos que o narrador não quis outra
coisa senão desmascarar a religiosidade convencional dos companheiros de Jó. O
texto quer nos ensinar, pelo contrário, que todo justo passa pelo sofrimento.
É isso o que Paulo diz em 2Tm 3.12 “Ora, todos quantos querem viver
piedosamente em Cristo Jesus serão perseguidos”. É esse o drama do salmista no
salmo 73, que o grande pregador do século vinte, Dr. Martyn Lloyd-Jones tematizou
de: “Por que prosperam os ímpios?” Que naturalmente leva em seu bojo uma
segunda pergunta: “por que os justos sofrem tanto na vida?”
A dor distorce, de maneira brutal, a forma como enxergamos a nós mesmos.
Nos momentos de dor desconhecemos quem somos; saímos totalmente do controle!
Jó está desolado, quebrado, falido, em pânico e, até aqui, sem perspectiva de futuro
a respeito de si mesmo.
A dor intensa chega a tal ponto que Jó descreve a si mesmo como se da sua
existência tivesse apenas “sobrado a pele dos dentes”, v. 20. Jó está indomado e
não esconde os seus sentimentos, ele diz, em outras palavras: “Até quando vocês
vão me colocar pra baixo? Até quando meu coração vai estar fraturado? Até quando
as pessoas vão usar meus problemas contra mim? Até quando as pessoas vão
aniquilar a minha vida?”.
Jó está confuso, faz muitas perguntas, pois ele certamente não tem as
respostas que precisa. No processo de encarar, questionar o sofrimento, Jó se
descobre dentro de outro mistério – maior que o sofrimento – o mistério de Deus.
Jó: o estereótipo da nossa dor existencial
A vida é um verdadeiro zigue-zague; é inesperada e chocante como uma
montanha russa. O famoso escritor Oscar Wilde afirmou em um de seus poemas –
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Loucos e Santos – "normalidade é uma ilusão imbecil e estéril”. Toda normalidade é
mentirosa. Nossa vida é exclusivamente um trailer, um curta-metragem, quem sabe
uma breve sinopse e não somos nós os diretores, não estamos e nem estaremos no
controle de nada.
Quando paramos para compreender esta realidade chegamos a uma
conclusão inegável: a vida é frágil o tempo todo. Jamais poderemos calcular com
certeza se acordaremos melhor na manhã do dia seguinte.
Como é na vida de Jó e na nossa, correr riscos, ter dúvidas, não ter
respostas, a crise e todas as outras coisas amargas da vida fazem parte da nossa
relação com Deus. Ser cristão não significa apenas ter aceitado a Jesus, mas,
significa ter aceitado um caminho, o do discipulado, no qual crises, perdas, alegrias,
inveja, perseguição, paz, choro, gargalhadas, refúgio, algumas respostas, e as
cachoeiras de dúvidas são parte da caminhada.
Quando Jesus nos chama para segui-lo, ele espera que nós estejamos
integralmente comprometidos com ele. Nós, isto é, ele quer que caminhemos com
as nossas dúvidas, com o que não sabemos, com as nossas impossibilidades,
vícios, manias, sofrimento, problemas e tudo o que configura a nossa realidade
presente.
Infelizmente temos nos acostumado com uma mentalidade que não aceita a
possibilidade de uma fé que chora, uma fé que não pode lamentar, uma fé que não
pode duvidar, uma fé sem tragédias, uma fé sem tristeza, uma fé sem conflitos, que
na verdade é uma fé sem o peso maciço da cruz. Viver uma fé que não encara a dor
como uma coisa inevitável é uma grande alucinação, para não dizer enganação.
Jó nos coloca em frente a um dos princípios mais elementares da
humanidade: nós não damos conta da nossa dor. A dor de Jó nos ensina lições
maravilhosas para aqueles momentos nos quais nós nos desconhecemos. A dor tem
a capacidade de nos colocar na parede e nos empurrar para as perguntas
existenciais: “quem sou, por que sou assim, para que?”. As nossas dúvidas,
confusões, dores, crises, fazem parte do caminho.
A dor nos acorda para a vida
A dor, além disso, nos tira de nossa zona de conforto. O sofrimento nos move
para a vida com uma intensidade inacreditável. É como aquela volição sequiosa que
me faz correr atrás de água. Corremos atrás de algo porque esse algo nos falta. A
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ausência de amor me faz correr atrás de um par. A fome por comida me faz
trabalhar ou até mesmo roubar para comer. A ausência de sentido me faz correr
atrás de melhores explicações, respostas e filosofias de vida.
Nós corremos atrás de médicos quando nos falta saúde – ou, na maioria das
vezes quando estamos à beira da morte. Corremos até a poesia quando nos faltam
palavras. Corremos até o banco quando sentimos falta de dinheiro. Corremos à
música quando nos faltam melodias. E da mesma forma nós corremos até Deus
quando a nossa humanidade não mais nos basta.
Não é diferente com a dor: corremos para a cura porque estamos doentes.
Em outras palavras, a dor nos torna mais sensíveis para as realidades simples e
também complicadas do dia a dia, e somada a essa maior sensibilidade, nos torna
pessoais mais preparadas para agir em situações de risco.
Encontramos todo tipo de gente a todo instante cruzando nossos caminhos.
Pessoas que tem medo de viver, que desconhecem suas habilidades, pessoas
desmotivadas, que acreditam na impossibilidade das mudanças: “a vida é assim
mesmo...”. Nós, cristãos, às vezes perdemos boas expectativas na vida, nos
enclausuramos pelo insucesso, somos achatados pelas derrotas. O que sobra para
muitos de nós em alguns momentos da vida é a indiferença e a crise existencial.
Caminhando com a nossa dor
Precisamos aprender como Jó a buscarmos as respostas que precisamos no
caminhar com Deus e não fora dele; caminhando com as nossas dores crentes no
cuidado paterno do nosso Deus.
“Quem foi que te disse que a vida é um mar de rosas? Rosas têm espinhos e
pedras no caminho”, já dizia o músico João Alexandre. A fé cristã é uma fé que abre
espaço para quem tem problemas. A Igreja é a comunidade onde os imperfeitos são
bem-vindos, e quando a nossa dor é vivenciada junto aos irmãos percebemos que a
vida realmente continua apesar da dor.
Somente com essa clareza de pensamento descobriremos que saúde
emocional não significa ausência de problemas, mas, aprender que é possível lidar
com eles sem que sejam o centro das nossas atenções.
Perguntas para reflexão:
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1. Como você tem lidado com as suas dúvidas sobre você mesmo?
2. Qual o lugar de Deus e da comunidade cristã neste processo?
3. O que a dor tem te forçado a aprender?
II. A dor espiritual
“Se quereis engrandecer-vos contra mim
e me argüis pelo meu opróbrio,
sabei agora que Deus é que me oprimiu
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e com a sua rede me cercou.
Eis que clamo: violência! Mas não sou ouvido;
grito: socorro! Porém não há justiça.
O meu caminho ele fechou,
e não posso passar;
e nas minhas veredas pôs trevas.
Da minha honra me despojou
e tirou-me da cabeça a coroa.
Arruinou-me de todos os lados,
e eu me vou;
e arrancou-me a esperança, como a uma árvore.
Inflamou contra mim a sua ira
e me tem na conta de seu adversário.
Juntas vieram as suas tropas,
prepararam contra mim o seu caminho
e se acamparam ao redor da minha tenda”.
Jó 19.5-12.
Uma segunda dimensão da dor é a dor em relação ao Soberano, Todo-
Poderoso, o Criador. Jó, de maneira muito corajosa, transfere a sua dor para Deus.
Em sua reflexão sobre o peso que o sofrimento tem lhe causado ele conclui que
deve haver um culpado: Deus! Ele tem alguma coisa contra mim.
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Há neste texto pelo o menos seis razões pelas quais Jó transfere a culpa a
Deus: 1. Ele é o responsável pelo meu sofrimento; 2. Ninguém ouve o meu clamor
por justiça, Deus se calou; 3. Ele fechou todos os bons caminhos da vida; 4. Ele
acabou com a minha fama, popularidade; 5. Ele tirou a minha esperança na vida; 6.
Ele colocou muitos inimigos em meu caminho.
Onde está Deus em minha dor?
Quando experimentamos a dor, em muitos momentos, salta-nos uma
pergunta muito antiga: onde está Deus em todo esse sofrimento? Não é essa a
pergunta que temos vontade de fazer às vezes?
Por que isso tudo está acontecendo? Até quando a doença? Até quando
vamos imaginar ou pensar que Deus está calado? Deus age? Deus interage
comigo? Por que o caminho de Deus é tão difícil? Por que em alguns casos tudo dá
certo para algumas pessoas e sempre dá errado para mim? Para Jó todas essas
perguntas são perguntas justas.
Toda dor é específica, Deus lida com a dor de cada pessoa à sua maneira.
Não há como padronizar o que Deus faz em cada ser humano em suas diferentes
dores. No entanto, no próprio livro de Jó percebemos que é Deus quem controla
todas as situações e até Satanás como um de seus “subordinados” não pode ir além
do que a palavra sua palavra soberana o delimita.
Muitas pessoas não cristãs nos fazem a seguinte pergunta: se Deus é bom
por que Ele permite o sofrimento, dor, tragédias, tsunamis? Certamente essa
pergunta é justa e sempre atual, mas foi feita com a pressuposição errada. Quem
sabe a pergunta correta deveria ser: se nós somos totalmente corruptos, por que
Deus permite que apenas 1% da humanidade nasça sem o sentido da visão? Ou, se
nós somos totalmente depravados e imundos, por que Deus permite que apenas
14.5% da sociedade brasileira tenha alguma dificuldade de enxergar, ouvir,
locomover-se ou alguma deficiência física ou intelectual?
E ainda mais, se nós somos trapos e injustos em nosso proceder diário, por
que Deus permite que 87% dos bebês que nascem no mundo inteiro venham ao
mundo fisicamente perfeitos? Se somos pecadores, inimigos do bem, por que Deus
permite tão poucas tragédias? Só há uma resposta: Deus se mantém gracioso
mesmo em um mundo caído. Seu caráter de misericórdia e graça sustentam o
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mundo criado com mais favor do que imaginámos. Quando fazemos o teste de nos
colocar no banco dos réus – em vez de sempre tentarmos adequar Deus a ele –
compreendemos melhor que ele, na verdade, é indizivelmente maravilhoso demais
para nós.
Jó: nosso guia para experimentar Deus no sofrimento
Quando passamos pela dor nosso relacionamento com Deus é totalmente
transformado. A dor nos faz correr para a pessoa certa: Deus, mesmo com
perguntas erradas, que, aliás, o narrador dá a entender no livro que são essenciais
para o processo de cura emocional de Jó e de seu relacionamento com Deus.
Perguntas aparentemente “erradas” são comuns na poesia hebraica. Uma
boa lida no livro de Salmos saciaria nossa sede por essas evidências. Perguntas
como: “Até quando?” “O Senhor não me ouve?” “O Senhor não vai fazer nada?”
“Onde estão as tuas promessas?” “O Senhor não vê o nosso sofrimento?” “O Senhor
não percebe que os inimigos estão nos destruindo?” são todas comuns no livro de
oração do povo de Deus.
Nos primeiros capítulos de Jó, vemo-lo feliz, cheio de amigos, mulher, muitos
filhos, mas, daí vem a dor. E já no capítulo 3 Jó amaldiçoa o dia em que nasceu,
reclama com Deus, chama Deus de culpado. E mesmo assim, o próprio Deus afirma
que na acusação de Jó não houve pecado, ele é totalmente inocente (42.7,8).
Questionar a Deus de sua “suposta” ausência, expressar sua dor diante de
seus ouvidos, vomitar suas tristezas não é pecado, pelo contrário, pode ser o início
da cura. Os Salmos de Lamento (a maioria dos salmos) são um ótimo exemplo
disso, neles estão escritas todas as emoções da nossa vida, o derramamento das
dores, e ansiedades, o desabafo do crente com Deus, Alguém disposto a nos ouvir.
A dor nos conduz a uma maior intimidade com Deus, pois nos adverte que
somos passageiros e mortais. A Teologia Bíblica nos ajuda a perceber no sofrimento
uma oportunidade de se aproximar de Deus, pois a dor também é uma amostra da
graça de Deus.
Bill Hybels escreveu um livro intitulado Encontrando Deus nas Dificuldades da
vida e uma das ideias que ele trabalha ali é a de que a prosperidade causa na alma
doenças que a adversidade jamais causará. A tragédia nos ensina, de forma
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totalmente nova, que temos de valorizar e celebrar a vida. Nosso Deus é
especialista em trazer algo de bom a partir do monte de escombros.
Durante o sofrimento, Deus lembra às pessoas que todos precisam de Sua
sabedoria, Seu amor e Sua força. As vitórias não produzem esse feito, as derrotas,
sim. A partir de uma confiança plena na soberania de Deus podemos acertar nossa
perspectiva no meio da calamidade e sair do outro lado melhores do que entramos.
Faça o teste. Olhe ao seu redor, tente enxergar o infinito do horizonte só por
alguns minutos e vislumbrarás o seu Deus mais perto do que nunca.
O fogo que faz o milho virar pipoca
O educador Rubem Alves escreveu “A Pipoca”, uma crônica que nos deixa
claro o fato de que não podemos jogar fora a nossa dor, pois é por intermédio dela
que a nossa maneira de viver a vida é aperfeiçoada. A ideia é que um milho de
pipoca que não passa pelo fogo continua a ser milho para sempre e jamais se
transformará numa real pipoca.
“As grandes transformações acontecem quando passamos pelo fogo”, diz ele.
Quem não passa pelo fogo, fica do mesmo jeito a vida inteira. São pessoas de uma
mesmice e uma dureza assombrosa. Só que elas não percebem e acham que seu
jeito de ser é o melhor jeito de ser.
Mas, de repente, vem o fogo. O fogo é quando a vida nos lança numa
situação que nunca imaginamos: a dor. Pode ser fogo de fora: perder um amor,
perder um filho, o pai, a mãe, perder o emprego ou ficar pobre. Pode ser fogo de
dentro: pânico, medo, ansiedade, depressão ou sofrimento, cujas causas ignoramos.
Há sempre o recurso do remédio: apagar o fogo! Sem fogo o sofrimento diminui.
Com isso, a possibilidade da grande transformação também.
A crônica nos leva a imaginar a pobre pipoca, fechada dentro da panela, cada
vez mais quente; ela pensa que sua hora chegou: vai morrer. Dentro de sua casca
dura, fechada em si mesma, ela não pode imaginar um destino diferente para si.
Não pode imaginar a transformação que esta sendo preparada para ela. Porém, sem
aviso prévio, pelo poder do fogo a grande transformação acontece: BUM! E ela
aparece como outra coisa completamente diferente, algo que ela mesma nunca
havia sonhado.
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Bom, mas ainda temos o piruá, que é o milho de pipoca que se recusa a
estourar. São como aquelas pessoas que, por mais que o fogo esquente, se
recusam a mudar. Elas acham que não pode existir coisa mais maravilhosa do que o
jeito delas serem. A presunção e o medo são a dura casca do milho que não
estoura.
Rubem Alves termina dizendo que aquelas pessoas que negligenciam a dor
tem um final trágico: “o destino delas é triste, já que ficarão duras, a vida inteira. Não
vão se transformar na flor branca, macia e nutritiva. Não vão dar alegria para
ninguém.”
Deus existe?
A dor como vimos pode ser uma ótima aliada em nosso relacionamento com
Deus. Lembro-me das primeiras duras semanas em que entrei no Seminário
Presbiteriano do Sul. Bateu-me uma dúvida cruel, que para alguns pode soar até
como engraçado; minha dúvida era a seguinte: Deus existe? Se ele não existir, qual
é a razão para eu continuar aqui? Será mesmo que Ele me chamou para o ministério
sagrado ou o que me fez chegar até aqui foi alguma tipo estranho de voz ou
alucinação?
Estas eram as minhas inquietações, e que graves inquietações. Contudo, isso
me motivou dia após dia a buscar uma resposta, a qual parecia confusa – confusão
é um atributo típico de seminaristas – em minha mente. Isso me fez abrir os olhos
para a tolice de meus pensamentos e me aprofundar no conhecimento do Deus que
sempre me amparou em todos os momentos da minha vida.
Sim, podemos ter certeza: Ele existe e cuida de nós. Aliás, Ele é o melhor
psicólogo em atividade, Ele nos ouve, Ele nos responde, e ainda não cobra pelo
serviço prestado. Não tenhamos medo de levar nossas inquietações diante de Deus,
mesmo que elas não sejam teologicamente certas – como culpar Deus e etc – como
foram as de Jó e como são as nossas.
Toda dor precisa de um desabafo. Deus quer ouvir a nossa angústia: “invoca-
me no dia da angústia; eu te livrarei, e tu me glorificarás.” Salmo 50.15. A “oração
dos retos é o seu contentamento.” Provérbios 15.8.
Perguntas para reflexão:
A resposta cristã para a dorJean Francesco
1. Qual foi a última vez que você irou-se com Deus devido a sua dor?
2. Quais são as perguntas que você tem para fazer hoje a Deus?
3. Você experimenta mais de Deus na realidade do sofrimento?
III.A dor relacional
“Pôs longe de mim a meus irmãos,
e os que me conhecem,
como estranhos, se apartaram de mim.
A resposta cristã para a dorJean Francesco
Os meus parentes me desampararam,
e os meus conhecidos se esqueceram de mim.
O meu hálito é intolerável à minha mulher,
e pelo mau cheiro sou repugnante aos filhos de minha mãe.
Até as crianças me desprezam,
e, querendo eu levantar-me, zombam de mim.
Todos os meus amigos íntimos me abominam,
e até os que eu amava se tornaram contra mim.
Os meus ossos se apegam à minha pele e à minha carne,
e salvei-me só com a pele dos meus dentes”.
Jó 19.13-20
Jó perdeu sua identidade social; ele vive agora a realidade dos
relacionamentos quebrados. (1) seus irmãos de sangue o abandonaram; (2) os seus
parentes o largaram; (3) os conhecidos não olham mais para ele; (4) sua mulher não
suporta o seu hálito; (5) seus filhos estão mortos; (6) as crianças zombam dele
quando ele passa; (7) seus melhores amigos se tornaram adversários.
A resposta cristã para a dorJean Francesco
Sofrendo, sozinho
Pior que sofrer, é sofrer quando se está sozinho. Este parece ser um retrato
fiel dos nossos dias, principalmente o das pessoas que vivem a vida em grandes
centros urbanos. Não é incomum presenciar lares quebrados, filhos que não veem
os pais, maridos que batem em suas esposas, esposas que subjugam seus maridos,
mães que irritam em demasia seus filhos, filhos que não ouvem seus pais, filhos
educados pela pedagogia das telas, seja a televisão, seja o computador, seja pelos
games.
Os nossos jovens estão crescendo como pessoas virtuais que não saem do
quarto, sofrendo por não possuírem amigos para compartilhar seus problemas,
exibindo, assim, sua vida particular em redes sociais através de fotos obscenas,
pensamentos de raiva, decepção e solidão. Isso evidencia, na verdade, que
carecem de relacionamentos verdadeiros e saudáveis. A dor relacional é, com
certeza, um dos maiores males da sociedade e do próprio ser humano.
Quando mascaramos os nossos vazios relacionais, entramos em conflito total.
Em muitos dos chamados países desenvolvidos o trabalho se tornou o maior alvo da
existência, gerando na opinião de alguns sociólogos “monstros de qualidade”: ótimos
profissionais, péssimos seres humanos.
Até mesmo filósofos não cristãos têm chegado à conclusão de que qualquer
cultura que substitua a prioridade relacional da família pelo trabalho estará fadada a
uma geração do estresse, infelicidade e depressão.
Pessoas: a maior riqueza que possuímos
Mas Deus tem algo a nos dizer por intermédio do livro de Jó. Esta é a história
que insiste nas três grandes perguntas do mundo: Quem sou eu? Quem é Deus?
Quem é o outro? Somos levados a crer, por intermédio de Jó, que essas três coisas
devem ser alvo dos nossos maiores investimentos.
Vale a pena chorar pela falta de sentido da nossa existência; vale a pena
investirmos em nosso relacionamento com Deus mesmo sem termos as respostas
que queremos; vale a pena gritar de angústia pelos nossos relacionamentos
quebrados e com a ajuda de Deus reconstruí-los.
A resposta cristã para a dorJean Francesco
A Escritura como um todo nos revela que a verdadeira pobreza na vida é ter
que perder pessoas. Nosso patrimônio e maior riqueza são os nossos
relacionamentos. Seres humanos carecem de Deus tanto quanto carecem de
pessoas. O outro é necessário onde eu não posso mais.
Em meio à dor o ser humano sempre estende a mão em busca de ajuda e de
alento. E, embora Jó esteja triste com seus amigos, ele pede compaixão, v.21. Jó
não anseia que expliquem o seu sofrimento, mas que apenas participem dele. Da
mesma forma, nós precisamos de gente para participar empaticamente da nossa dor
e por outro lado, Deus espera de nós que sejamos estas pessoas para os outros.
Participando da dor
O livro de Jó pode nos ajudar a lidar com os nossos relacionamentos,
primeiro, priorizando-os. Segundo, em Jó 2.11-13 temos um belo relato da primeira
fase de amizade – bem mais positiva que a segunda – oferecida pelos seus amigos:
“Ouvindo, pois, três amigos de Jó todo este mal que lhe sobreviera, chegaram, [...] e combinaram ir juntamente condoer-se dele e consolá-lo. Levantando eles de longe os olhos e não o reconhecendo, ergueram a voz e choraram; e cada um, rasgando o seu manto, lançava pó ao ar sobre a cabeça. Sentaram-se com ele na terra, sete dias e sete noites; e nenhum lhe dizia palavra alguma, pois viam que a dor era muito grande”.
Talvez não exista outro método melhor de ajuda que nós podemos oferecer a
pessoas vivendo com crises relacionais do que estar junto a elas participando de
seu sofrimento. Nessa descrição do encontro de Jó com seus amigos há um
problema na tradução em português. A versão Almeida traz que os amigos não o
reconheceram. Ora, se não o reconheceram, porque então choraram com ele?
O texto em inglês diz que eles mal puderam reconhecê-lo. Neste caso fica
claro que ele foi reconhecido, mas estava desfigurado e quase irreconhecível. Jó
estava tão maltratado pelo sofrimento que sua aparência gerou espanto em seus
amigos. Foram pelo o menos sete dias de silêncio; sete dias que seus amigos
tiveram para redescobrir o Jó por trás de sua feição deformada.
Os momentos em que nós nos sentimos mais perto de Deus são aqueles em
que a dor é tanta que achamos que não conseguiremos viver nem mais um dia.
A resposta cristã para a dorJean Francesco
Nessas horas sentimos sobrenaturalmente o Espírito Santo nos confortando, e esse
cuidado vai além quando alguém decide investir algumas horas e silêncio conosco.
Gente ao nosso lado nos faz perceber que a dor é apenas um detalhe, que a vida
continua apesar da dor.
Todos nós estamos sujeitos a crises relacionais, desentendimentos, mágoas,
decepção e traição. Todos nós passamos por processos de perda. Nossa missão é
acolher. Alguns verbos no texto supracitado são essenciais para essa missão:
condoer-se (sofrer junto), consolar, chorar, sentar-se com, e uma das mais
importantes, o silêncio.
Para confortar pessoas nem sempre precisamos abrir a boca, pelo contrário,
falemos com os nossos olhos e com a nossa presença. Para confortar precisamos
chegar perto das pessoas. É tentar fazer parte daquilo que está no íntimo da pessoa
ao lado. Isso é possível através de um comprometimento sincero com a pessoa por
trás da sua doença ou sofrimento.
Ser empático não é algo fácil, pois se identificar com alguém em um estado
visivelmente aterrador sem se mostrar assustado com a pessoa ou com o momento
exige muito treino, disciplina e principalmente, amor.
Paulo em Rm 12.15 nos recomenda a nos alegrarmos com os que se alegram
e chorar com os que choram. Quando nos alegramos com a alegria de alguém nos
tornamos pessoas mais importantes para ela, mas quando nos dispomos a chorar a
sua dor nos tornamos pessoas totalmente indispensáveis a ela. Chorar com alguém
que está triste é como tatuar-se no seu coração, pois esse alguém nunca mais será
esquecido.
Não precisamos obrigatoriamente ter a resolução para os problemas dos
outros. O que podemos fazer é compartilhar o fardo das pessoas, ouvi-las
empaticamente; deixar que elas exponham suas emoções mais profundas e recebe-
las; acolhê-las, como gostaria que elas fizessem por nós.
Até agora só ouvimos dor, dor e dor. Porém o discurso de Jó não acaba na
dor. No meio de sua dor pessoal, seus confrontos com o que dizem de si, no meio
de sua conturbada relação com Deus, suas dúvidas e desentendimentos, em meio
as suas crises relacionais, surge um pedaço de esperança: a dor não perde por
esperar!
Perguntas para reflexão:
A resposta cristã para a dorJean Francesco
1. Você concorda que a pior perda na vida é perder pessoas?
2. Quanto você está disposto a pedir ajuda a outras pessoas quando
experimenta a realidade da dor?
3. Como você tem participado da dor dos outros?
IV. Uma resposta de esperança
“Porque eu sei que o meu Redentor vive
e por fim se levantará sobre a terra.
Depois, revestido este meu corpo da minha pele,
em minha carne verei a Deus.
A resposta cristã para a dorJean Francesco
Vê-lo-ei por mim mesmo,
os meus olhos o verão, e não outros;
de saudade me desfalece o coração dentro de mim.”
Jó 19.25-27
O que Jó está dizendo neste texto é que a dor pode ser grande e opressora,
mas vai ter um fim. Há uma segura, firme e certa esperança de que alguém vai tirá-
lo dessa. Por mais que o sofrimento faça germinar dentro de nós raízes de dor, é
nela que podemos nos sentir mais perto de Deus do que em qualquer outro lugar.
O resgate da esperança
A resposta cristã para a dorJean Francesco
Jó espera por seu Redentor. A palavra mais próxima traduzida para este
termo, na verdade, é o Resgatador, utilizada no Antigo Testamento para designar o
homem que reassume a posição de marido da mulher de seu parente mais próximo
que faleceu. O exemplo mais claro das Escrituras é o de Boaz com Rute.
Todavia, Jó faz um uso diferente do termo. O seu redentor ou resgatador aqui
é alguém que pode resgatá-lo não de “um casamento perdido”, mas de uma vida na
qual a dor tem sido a última palavra. Ele tem a esperança que alguém fará este
séquito de desespero retroceder.
É interessante notar que em todos os tempos os seres humanos mantêm
algum tipo de expectativa sobre um futuro melhor. Esta expectativa é presente em
filmes, histórias, mitos e lendas antigas e presentes, a humanidade sempre sonhou
com um final feliz para a sua história.
Heróis devolvem a paz para o mundo nos contos e nas ficções. Aqueles que
em meio ao caos nos colocam em liberdade. Parece que alguém criou um mundo de
harmonia, paz e estabilidade, mas algo de errado foi feito no passado que prejudicou
drasticamente nosso presente. Porém, em alguém é despejada a expectativa de
renovação.
Nos filmes como As Crônicas de Nárnia, esse personagem redentor é o leão
Aslam que interrompe na vida das personagens em meio ao caos aparente. Em O
Senhor dos Anéis temos redentor Frodo. Em Star Wars o salvador é Luke
Skywalker. Em Matrix a esperança do cosmos jaz sob o personagem Neo. Todos
nós temos esperança de um mundo em paz onde não haja mais dor, pecado e
inimizade.
Isso ilustra uma grande verdade: o mundo está em estado de caos e anseia
por um herói. Jó também espera esse herói. Todos nós temos uma expectativa de
um mundo em paz onde não haja mais dor, pecado e inimizade.
Jesus, o nosso Redentor
As Escrituras proclamam que muito mais do que um herói esperado como os
demais, Jesus Cristo é o Rei dos Reis, Senhor do Universo. Nele, nós podemos nos
firmar sem medo de errarmos o alvo. Jesus Cristo é a nossa esperança de
restauração!
A resposta cristã para a dorJean Francesco
A vinda de Jesus Cristo para o planeta Terra é a concretização do plano
eterno de Deus. A Escritura nos apresenta Deus, o Criador do universo, de tudo o
que existe, o Soberano que estabeleceu um plano com suas criaturas. A segunda
página dessa história é marcada pelas pautas negras do pecado da rebeldia,
comumente chamada de Queda.
Ali, a depravação do ser humano chegou a um declive tão íngreme que seu
destino mais justa não poderia ser outro a não ser de merecer a morte e o inferno.
Mas o Criador não foi pego de surpresa, ele promete ao povo manchado pela
negridão da morte uma maravilhosa esperança. Alguém virá não apenas para nos
livrar do inferno, mas para tirar o inferno de nós e nos devolver para os braços do
Criador, vivendo em amor em um novo mundo restaurado.
Esse é Jesus Cristo, a nossa real esperança. Ele cumpriu sua missão
encravando nosso escrito de miséria em seu próprio Corpo, morrendo em uma cruz.
Mas, a cruz não pôde pará-lo, ele ressurgiu!
E com ele também nós para uma nova história com Deus, que começa desde
já com a presença real do Espirito Santo, mas ainda não plenamente. A esperança
de Jó é a mesma dos cristãos: a morte irá morrer para sempre, e nós seremos
totalmente redimidos e carregados para o Reino de Jesus Cristo, de onde nunca
mais sairemos. A vinda de Jesus para a Terra é a prova de que ele quer consertar
as coisas.
Encarando a dor com esperança
Por isso, o livro de Jó é um convite para experimentar Deus na realidade do
sofrimento. Como pode ser possível experimentar a beleza de Deus na realidade do
nosso sofrimento e calamidades? Com uma palavra: esperança. Nós temos a única
palavra de esperança que a humanidade precisa conhecer: Jesus Cristo, o nosso
pronto socorre e resgate definitivo.
Quem crê em Jesus, tem certeza que a morte é só o começo, pois Jesus
venceu a morte, a dor, a lágrima e a tristeza. É isso que nos deixa de pé dia após
dia, como diz o Apóstolo Paulo: “Porque para mim tenho por certo que os
sofrimentos do tempo presente não podem ser comparados com a glória a ser
revelada em nós”. Rm 8.18.
A resposta cristã para a dorJean Francesco
A resposta cristã para o sofrimento não é o bem-estar, nem é a ausência de
doença, mas é saber que um dia a dor vai ter um fim. O que nos deixa em pé diante
da dor é a nossa expectante saudade da eternidade.
A resposta cristã para o mundo em desordem é que o Redentor irá renovar a
sua criação, tratando o mal que a desfigura e a corrompe. Por isso, a morte e a dor
são inimigas vencidas. Diferente do que os pensadores do mundo imaginam, o
mundo em que vivemos não é um projeto que deve ser abandonado, nem um
processo evolutivo (mito do progresso). O que ele precisa é de redenção e de
renovação. É isso que foi prometido e garantido pela ressurreição de Jesus dentre
os mortos. É isso o que o mundo inteiro está aguardando.
É isso o que nós aguardamos enquanto vivemos em meio à dor, o momento
em que a vida e o poder da ressurreição irão invadir-nos, criando novos céus e nova
terra, enchendo-a com a glória de Deus, “como as águas cobrem o mar” (Is 11.9).
É o fim das lágrimas dos poetas, da igreja, dos mártires, das mães que
perdem seus filhos por causa dos assassinos do verso 8. É o fim das viúvas, é o fim
das crianças que morrem de câncer, dos filhos que perdem os pais, não há mais
velórios, luto ou sepultamentos.
É o fim do nominalismo cristão, pois os covardes, aqueles que negam a
Cristo, são condenados. É o fim dos abomináveis, da prostituição, dos lares
destruídos pela traição. É o fim das religiões de feitiçaria, é o fim da idolatria. É o fim
dos seguidores do Diabo, os mentirosos. Acabou o sofrimento, pois os perversos
foram finalmente julgados.
Deus renova todas as coisas!
Diante da alegria eterna o sofrimento se torna um devaneio passageiro, pois
Deus nos ama e já tem marcado na sua agenda o grande Dia em que o seu filho,
Jesus Cristo, com as suas próprias mãos enxugará dos nossos olhos toda e
qualquer lágrima e nos olhará nos olhos dizendo: “o choro acabou, as coisas antigas
passaram, tudo agora é novo e para sempre.”
Em Apocalipse 21.4 celebramos a promessa mais esperada dos seres
humanos: a morte da morte, o falecimento do fim e a eternização do “para sempre”.
Tudo isso é garantido, pois o Algoz da morte está sentado no trono e ele mesmo não
A resposta cristã para a dorJean Francesco
está morto, pois é o alfa e o ômega, o Eterno em pessoa. Jesus Cristo mata a morte
para sempre da história dos seres humanos. Ele é a nossa garantia de vitória!
Um futuro maravilhoso nos aguarda. A sociedade quebrada não dará a última
palavra: Deus vai restaurar o mundo manchado pela queda. O nosso pecado não
terá a última palavra em nós, Deus vai restaurar a nossa intimidade plena com Ele.
E a morte, a temida morte, não tem mais a última palavra sob a aqueles que
ressuscitaram com Cristo, pois Deus matou a morte na cruz para sempre.
Nós podemos esperar ansiosamente pelo o que irá acontecer conosco no
futuro, porque tudo o que Deus faz ele o faz para a sua glória e para a nossa alegria.
Perguntas para reflexão:
1. Como nós temos encarado o sofrimento?
2. Qual tem sido a nossa reação diante da morte?
3. Qual é a esperança que nutre e fortalece os nossos corações?
4. Com qual intensidade temos esperado o nosso Salvador?
Livros que nos ajudam a lidar com a realidade do sofrimento:
AITKEN, Eleny Vassão de Paula. Aconselhamento a pessoas em final de vida.
São Paulo: Cultura Cristã, 2004.
A resposta cristã para a dorJean Francesco
_______, Eleny Vassão de Paula. Mal em bem. São Paulo: Cultura Cristã, 2000.
BRÄUMER, Hansjörg. Sombras no meu caminho: o enfermo diante da
enfermidade e do Deus inescrutável. Curitiba: EEE, 1999.
FERREIRA, J. C. L., LEONEL, João. Perguntas sem respostas? Experimentando
Deus na realidade do sofrimento. São Paulo: Editora Reflexão, 2009.
FRIESEN, Albert. Cuidando na Enfermidade. Curitiba, PR: Editora Evangélica
Esperança, 2007.
HYBELS, Bill. Encontrando Deus nas dificuldades da vida. Rio de Janeiro:
Textus, 2003.
KASTENBAUM, Rua e AISENBERG, R. Psicologia da morte. Editora da USP, São
Paulo, 1983.
KÜBLER-ROSS, Elizabeth. Sobre a morte e o morrer. 8ª edição. Martins Fontes,
São Paulo, 1997.
PETERSON, Eugene. O pastor que Deus usa. São Paulo: Mundo Cristão, 2008,
cap. 3: A tarefa pastoral de compartilhar a dor, p. 111-144.
WOLTERSTORFF, Nicholas. Lamento. Tradução de Joel Tibúrcio de Souza,
Viçosa, MG: Ultimato, 2007.
YANCEY, Philip. Deus sabe que sofremos. Traduzido por Emma Anders de Souza
Lima. São Paulo: Editora Vida, 1992.
YANCEY, Philip; BRAND, Paul. A dádiva da dor: por que sentimos dor e o que
podemos fazer a respeito. Traduzido por Neyd Siqueira. São Paulo: Mundo Cristão,
2005.