A OBSERVÂNCIA DAS NORMAS DO NOVO CÓDIGO DE … · Silva2, Manoel Carlos Toledo Filho3, Mauro...
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DIREITO DO TRABALHO/DIREITO CONSTITUCIONAL
A OBSERVÂNCIA DAS NORMAS DO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO
CIVIL PELA JUSTIÇA DO TRABALHO E SEUS REFLEXOS NAS
PRERROGATIVAS DA FAZENDA PÚBLICA
Lívia Deprá Camargo Sulzbach
Procuradora do Estado do Rio Grande do Sul
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RESUMO
No presente estudo busca-se confrontar a previsão constante do art. 769 da CLT com aquela
trazida pelos arts. 15 e 183 do Novo Código de Processo Civil. Analisam-se as posições
doutrinárias e do Tribunal Superior do Trabalho (IN nº 39/2016) referentes à aplicação
subsidiária e supletiva do processo civil comum ao processo do trabalho, de modo a se
verificar a aplicação das prerrogativas da Fazenda Pública, previstas pelo art. 183 do
CPC/2015, ao processo laboral.
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INTRODUÇÃO
No corrente ano, no exercício da advocacia pública no âmbito dos Tribunais
Superiores, deparamo-nos com o advento do Novo Código de Processo Civil, responsável por
uma série de novas normas aplicáveis ao processo, incluindo a contagem de prazos
processuais e prerrogativas da Fazenda Pública, o que influenciou em demasia o nosso dia-a-
dia.
Dentre nossas preocupações estava a observância, pelos Tribunais Superiores, dessas
novas normas, em especial, a intimação pessoal dos Procuradores do Estado. Dessa forma,
comparecemos, junto à Câmara Técnica do Colégio Nacional dos Procuradores do Estado e
do DF a reuniões com representantes dos três Tribunais Superiores (Supremo Tribunal
Federal, Superior Tribunal de Justiça e Tribunal Superior do Trabalho).
Nessas reuniões, fomos informados quanto aos métodos de implantação da referida
intimação por parte do STF e STJ. Contudo, quanto ao TST, a informação fornecida foi a de
que seria publicada uma Instrução Normativa regulamentando a questão, formulada pelo
Grupo de Trabalho formado por alguns Ministros, responsável pela análise das normas do
novo diploma processual que seriam observadas no âmbito da Justiça do Trabalho.
E assim foi feito: em 15 de março do corrente ano, foi publicada a Resolução nº 203
do Pleno do TST, por meio da qual foi aprovada a Instrução Normativa nº 39, a qual
dispunha sobre as normas do Código de Processo Civil de 2015 aplicáveis e inaplicáveis ao
Processo do Trabalho, de forma não exaustiva.
Dentre as previsões constantes da referida Instrução Normativa, não foram abordadas
aquelas referentes à intimação pessoal dos Procuradores do Estado. Tal fato provocou um
debate entre os advogados públicos sobre quais normas seriam realmente aplicáveis ao
processo do trabalho.
Da mesma forma, a Instrução Normativa gerou inconformidade por parte dos
Magistrados Trabalhistas, tendo a sua associação de classe – ANAMATRA – ajuizado a ADI
nº 5.516 junto ao Supremo Tribunal Federal, objetivando a declaração de
inconstitucionalidade formal e material da norma editada pelo TST. Atualmente, está sob
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análise da Câmara Técnica do CNPGEDF o ingresso dos Estados no feito na qualidade de
amici curiae.
Em assim sendo, constatou-se que há uma grande discussão sobre o tema, qual seja, a
aplicabilidade ou não do Novo Código de Processo Civil ao processo do trabalho, o que
repercute no trabalho desenvolvido pelos Procuradores do Estado e gera insegurança jurídica.
O objetivo do presente estudo é verificar as principais teses que se referem à questão,
bem como a posição adotada atualmente pelos Tribunais Superiores acerca do tema, o qual se
faz presente no dia-a-dia dos advogados públicos que lidam com questões trabalhistas e
constitucionais, sempre buscando a interpretação legal que observe os ditames
constitucionais.
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1 DA APLICAÇÃO DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015 AO PROCESSO
DO TRABALHO: ART. 15 DO NCPC X ART. 769 DA CLT
Para compreender os fatores que norteiam o conflito de argumentos entre a aplicação (e
em que extensão) ou não do Novo Código de Processo Civil ao processo do trabalho, faz-se
necessário, primeiramente, analisar os dispositivos legais que abordam a influência de um
procedimento em outro.
A CLT possui a seguinte previsão, constante de seu art. 769, verbis:
Art. 769. Nos casos omissos, o direito processual comum será fonte subsidiária dodireito processual do trabalho, exceto naquilo em que for incompatível com asnormas deste Título.
Como se verifica, o diploma legal supramencionado previa a aplicação subsidiária do
direito processual comum nos casos de omissão da lei processual trabalhista. E assim
consolidou-se a prática dos aplicadores do Direito do Trabalho: a utilização do direito
processual civil restringia-se às situações em que a CLT restava omissa, desde que tais
normas fossem compatíveis com as normas laborais.
Nesse sentido, cita-se o estudo sobre o tema efetuado por Ben-Hur Claus, verbis:
A especialidade do subsistema jurídico trabalhista sobredetermina essacompatibilidade, conferindo-lhe dúplice dimensão: compatibilidade axiológica ecompatibilidade teleológica. Essa dúplice dimensão da compatibilidade éidentificada por Manoel Carlos Toledo Filho sob a denominação de compatibilidadesistêmica.18 Vale dizer, a compatibilidade é aferida tanto sob o crivo dos valores dodireito processual do trabalho quanto sob o crivo da finalidade do subsistemaprocedimental trabalhista, de modo a que o subsistema esteja capacitado à realizaçãodo direito social para o qual foi concebido. O critério científico da compatibilidadevisa à própria preservação do subsistema processual trabalhista, na acertadaobservação de Paulo Sérgio Jakutis. 19 Com efeito, o diálogo normativo entresubsistemas jurídicos pressupõe “[...] buscar alternativas que não desfigurem omodelo originário, pois isso o desnaturaria enquanto paradigma independente”20,conforme preleciona Carlos Eduardo Oliveira Dias ao abordar o tema do diálogodas fontes formais de direito no âmbito da aplicação subsidiária do processo comumao processo do trabalho.1
1 CLAUS, Ben-Hur Silveira. O incidente de desconsideração da personalidade jurídica previsto no CPC 2015 e oDireito Processual do Trabalho. Disponível na internet: <http://www.enamat.gov.br/wp-content/uploads/2015/11/TD14_Ben_Hur_Silveira_Claus_4_O-incidente-de-desconsidera%C3%A7%C3%A3o-da-personalidade-jur%C3%ADdica-previsto-no-novo-CPC.pdf> Acesso em 05 ago 2016.
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Assim, para a doutrina majoritária, anteriormente ao advento do Código de Processo
Civil de 2015, o art. 769 da CLT admitia a aplicação subsidiária do direito processual comum,
nos casos de omissão daquele diploma legal, desde que a norma processual civil fosse
compatível com o subsistema jurídico trabalhista.
Ocorre que, com o advento do novo Código de Processo Civil, surgiu a previsão
constante de seu art. 15, verbis:
Art. 15. Na ausência de normas que regulem processos eleitorais, trabalhistas ouadministrativos, as disposições deste Código lhes serão aplicadas supletiva esubsidiariamente.
Assim, a primeira premissa a ser elucidada a respeito do tema versa sobre a revogação,
ou não, do art. 769 da CLT pelo art. 15 do NCPC. Nesse sentido, cabe registrar que a maioria
dos doutrinadores que abordou o tema considera que tal não teria ocorrido, porquanto, a
norma trabalhista configuraria espécie de norma especial, a qual, segundo dispõe o § 2º do art.
2º da LINDB, não é revogada por norma geral, bem como pelo disposto pelo § 2º do art.
1.046 do novel diploma processual civil, o qual dispõe que, permanecem em vigor as
disposições especiais dos procedimentos regulados em outras leis, aos quais se aplicará
supletivamente este Código.
Corroborando o acima exposto, cita-se o magistério de José Antônio Ribeiro de Oliveira
Silva2, Manoel Carlos Toledo Filho3, Mauro Schiavi4, Ney Maranhão5, Ricardo Souza
Calcini6, dentre outros.
2OLIVEIRA SILVA, José Antônio Ribeiro de. TEMAS POLÊMICOS DO NOVO CPC E SUA APLICAÇÃO NO PROCESSO DO TRABALHO. Os impactos do novo CPC no processo do Trabalho. Estudos Jurídicos – 2015. Escola Judicial do Tribunal Regional do Trabalho da 15a Região. p. 37-76. Disponível na internet: <http://portal.trt15.jus.br/documents/124965/1502503/Os+impactos+do+Novo+CPC+no+Processo+do+Trabalho/fb4271eb-abf4-477e-bc04-cd86e650b9af;jsessionid=BEFA16C10D04C3825A0160EC441389DE.lr1?version=1.1> Acesso em 05 ago 2016.3 TOLEDO FILHO, Manoel Carlos. OS PODERES DO JUIZ DO TRABALHO FACE AO NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. Os impactos do novo CPC no processo do Trabalho. Estudos Jurídicos – 2015. Escola Judicial do Tribunal Regional do Trabalho da 15a Região. p. 77 – 101.Disponível na internet: <http://portal.trt15.jus.br/documents/124965/1502503/Os+impactos+do+Novo+CPC+no+Processo+do+Trabalho/fb4271eb-abf4-477e-bc04-d86e650b9af;jsessionid=BEFA16C10D04C3825A0160EC441389DE.lr1?version=1.1> Acesso em 05 ago 2016.4SCHIAVI, Mauro. NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL: A aplicação supletiva e subsidiária ao Processo do Trabalho. Disponível na internet: <http://www.trt7.jus.br/escolajudicial/arquivos/files/busca/2015/NOVO_CODIGO_DE_PROCESSO_CIVIL-_APLICACAO_SUPLETIVA_E_SUBSIDIARIA.pdf> Acesso em 05 ago 2016.5 MARANHÃO, Ney; AZEVEDO NETO, Platon Teixeira de. Novo CPC e fundamentação jurisdicional exaustiva. Breves pinceladas críticas. Revista LTr. Vol. 79. nº. 05. Maio de 2015. p. 529-537.6CALCINI, Ricardo Souza. Novo Código de Processo Civil causa impactos no processo do trabalho. Consultor Jurídico. Disponível na internet: <http://www.conjur.com.br/2016-abr-28/ricardo-calcini-cpc-causa-impactos-
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Contudo, cabe registrar que há entendimento minoritário em contrário. Nesse sentido
cita-se artigo da lavra de Edilton Meireles, no qual é adotado o entendimento de que a norma
prevista pelo art. 15 do NCPC, na verdade, não deteria a qualidade de norma geral, referente
ao diploma processual civil, mas sim de norma de direito processual do trabalho, eleitoral ou
administrativo, de modo que se adotaria o critério de que a norma posterior revoga a anterior.7
O que se verifica, entretanto, é que a maioria dos posicionamentos doutrinários é pela
compatibilidade do art. 15 do NCPC com o art. 769 da CLT. Veja-se, inclusive, que essa é a
posição adotada pelo Tribunal Superior do Trabalho, consoante disposto na Resolução nº
203/20168, a qual publicou a Instrução Normativa nº 37/2016, e expressamente prevê a
coexistência entre ambas as normas:
(…) considerando que as normas dos arts. 769 e 889 da CLT não foram revogadaspelo art. 15 do CPC de 2015, em face do que estatui o art. 2º, § 2º da Lei deIntrodução às Normas do Direito Brasileiro, (...)
Ademais, o reconhecimento do Direito do Trabalho como um subsistema jurídico é
irrefutável, considerando o seu caráter tutelar, bem como a especialidade das normas que o
regem. Não se faz possível desconsiderar tal finalidade e especialidade em prol de um
argumento de que o diploma processual civil teria simplesmente revogado o que dispõe o
diploma trabalhista sobre o regramento de seu subsistema (embora as consequências práticas
desse entendimento não sejam tão alarmantes – veja-se que a redação entre ambas as normas é
bastante semelhante, a questão controvertida seria a necessidade de compatibilidade entre as
normas).
Assim, partindo-se do pressuposto de que coexistiriam ambas as normas
supramencionadas, outra discussão pertinente, no que concerne à aplicação do novo Código
de Processo Civil ao processo do trabalho, refere-se ao alcance da expressão “supletiva e
processo-trabalho>. Acesso em 05 ago 2016.7 MEIRELES, Edilton. O novo CPC e as regras supletiva e subsidiária ao processo do trabalho. Revista de Direito do Trabalho. Vol. 157/2014. Mai - Jun de 2014. p. 129 – 137. Disponível na internet: <http://bdjur.stj.jus.br/dspace/handle/2011/78094> Acesso em 05 ago 2016.8 BRASIL. Tribunal Superior do Trabalho. Resolução nº203 de 15 de março de 2016. Disponível na internet: <http://aplicacao.tst.jus.br/dspace/bitstream/handle/1939/81692/2016_res0203_in0039.pdf?sequence=1> Acesso em 10 de ago de 2016
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subsidiariamente”, constante do art. 15 do NCPC, porquanto, consoante se verifica acima, o
art. 769 da CLT previa, apenas, a aplicação “subsidiária” do direito processual comum.9
É importante registrar que grande parte da doutrina diferencia o conteúdo dos
dispositivos, considerando que o fato de o novo código de processo utilizar a expressão
“supletiva”, configuraria uma necessidade de que a norma fosse aplicada ao processo do
trabalho não apenas nos casos em que este restasse omisso, mas também para aqueles casos
em que existisse a previsão, mas fosse incompleta. Nesse sentido, cita-se o magistério de
Mauro Schiavi, verbis:
Trata-se de inovação do Novo Código, pois o atual não disciplina tal hipótese.Doravante, o CPC será aplicado ao processo do trabalho, nas lacunas deste, nasseguintes modalidades:a)supletivamente: significa aplicar a CPC quando, apesar da lei processualtrabalhista disciplinar o instituto processual, não for completa. Nesta situação, oCódigo de Processo Civil será aplicado de forma complementar, aperfeiçoando epropiciando maior efetividade e justiça ao processo do trabalho. Como exemplos:hipóteses de impedimento e suspeição do Juiz que são mais completas no CPC,mesmo estando disciplinada na CLT (artigo 802, da CLT), ônus da prova previsto noCPC, pois o artigo 818, da CLT é muito enxuto e não resolve questões cruciais comoas hipóteses de ausência de prova e prova dividida; o depoimento pessoal previsto noCPC, pois a CLT disciplina apenas o interrogatório (artigo 848, da CLT), sendo osinstitutos são afins e propiciam implementação do contraditório substancial noprocesso trabalhista, etc; b)subsidiariamente: significa aplicar o CPC quando a CLT não disciplinadeterminado instituto processual. Exemplos: tutelas provisórias (urgência eevidência), ação rescisória; ordem preferencial de penhora, hipóteses legais deimpenhorabilidade, etc.10
Cabe registrar que a aplicação “supletiva” já vinha sendo utilizada pela Justiça do
Trabalho nos casos em que se entendia que a legislação específica não atendia de forma
efetiva aos princípios da instrumentalidade, celeridade e efetividade processual. Nesse
9 Primeiramente, cabe referir que alguns doutrinadores trabalhistas consideraram a referência expressa, procedidapelo art. 15 do NCPC aos processos do trabalho como uma “certidão de existência daquele processo”, ou seja,um avanço. Nesse sentido, cita-se o magistério de Manoel Carlos Toledo Filho, op. cit., o qual pondera: “É que,pela primeira vez na história do direito brasileiro, o legislador do processo civil externou uma referênciaexplícita ao processo laboral, vale dizer, lembrou-se de que existe sim um processo trabalhista autônomo nopaís8. Cuida-se aqui de uma indiscutívelnovidade9, sufragada pelo art. 15 do novo CPC, (...)10 SCHIAVI, Mauro. NOVO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL: A aplicação supletiva e subsidiária ao Processodo Trabalho. p. 01-02. Cabe registrar o entendimento em sentido contrário encontrado na obra Primeiroscomentários ao novo código de processo civil: artigo por artigo/coordenação Teresa Arruda Alvim Wambier…[et.al.] - 1 ed. São Paulo, Editora Revista dos Tribunais, 2015, no qual, restou consignado o entendimento de que: “A aplicação subsidiária ocorre também em situações nas quais não há omissão. Trata-se, como sugere aexpressão “subsidiária”, de uma possibilidade de enriquecimento, de leitura de um dispositivo sob outro viés, deextrair-se da norma processual eleitoral, trabalhista ou administrativa um sentido diferente, iluminado pelosprincípios fundamentais do processo civil. A aplicação supletiva é que supõe omissão” - p. 75
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sentido, registra-se o Enunciado nº 66 da 1a Jornada de Direito Material e Processual do
Trabalho, ocorrida em 2007, que determinava, verbis:
APLICAÇÃO SUBSIDIÁRIA DE NORMAS DO PROCESSO COMUM AOPROCESSO TRABALHISTA. OMISSÕES ONTOLÓGICA E AXIOLÓGICA.ADMISSIBILIDADE. Diante do atual estágio de desenvolvimento do processocomum e da necessidade de se conferir aplicabilidade à garantia constitucional daduração razoável do processo, os artigos 769 e 889 da CLT comportam interpretaçãoconforme a Constituição Federal, permitindo a aplicação de normas processuaismais adequadas à efetivação do direito. Aplicação dos princípios dainstrumentalidade, efetividade e não retrocesso social.
Para bem apreender o tema, cabe citar o magistério de Maria Helena Diniz11, a qual
diferencia entre lacunas normativas, ontológicas e axiológicas, verbis:
Normativas: quando a lei não contém previsão para o caso concreto. Vale dizer: nãohá regulamentação da lei sobre determinado instituto processual. Ontológicas: quando a norma não mais está compatível com os fatos sociais, ouseja, está desatualizada. Aqui, a norma regulamenta determinado institutoprocessual, mas ela não encontra mais ressonância na realidade, não há efetividadeda norma processual existente. Axiológicas: quando as normas processuais levam a uma solução injusta ouinsatisfatória. Existe a norma, mas sua aplicação leva a uma solução incompatívelcom os valores de justiça e de equidade exigíveis para a eficácia da normaprocessual.
No caso, conforme a corrente denominada “restritiva”, o que dispunha o art. 769 da
CLT era a utilização do direito processual comum nos casos de lacuna normativa. De outro
lado, a disposição trazida pelo art. 15 do NCPC prevê a aplicação “supletiva”, de modo que
poder-se-ia inferir que estaria tratando das lacunas ontológicas e axiológicas. Nesse sentido,
cabe registrar que a corrente “evolutiva (sistemática ou ampliativa)”, já considerava que o art.
769 da CLT deveria ser aplicado nos casos de lacunas ontológicas e axiológicas.
O que se percebe é que aqueles doutrinadores e/ou operadores do Direito do Trabalho
que já se filiavam à corrente evolutiva quanto à aplicação do art. 769 da CLT, tendem a
entender pela harmonia entre o art. 15 do NCPC e aquele dispositivo da CLT de forma mais
ampla, considerando que houve, apenas, a regulamentação do que já existia de fato.
No entanto, há uma corrente, preconizada por alguns Juízes do Trabalho, que vem se
solidificando e que adota entendimento no sentido de que o Novo Código de Processo Civil
11 As lacunas do direito. 5. ed. São Paulo: Saraiva, 1999. p. 95. Apud SCHIAVI, Mauro. Op Cit., p. 04.
10
seria inaplicável como um todo ao processo do Trabalho, por com ele ser incompatível,
conforme veremos a seguir.
1.1 DO POSICIONAMENTO CONTRÁRIO À APLICAÇÃO DO NOVO CÓDIGO DE
PROCESSO CIVIL AO PROCESSO DO TRABALHO
O grande defensor da ideia de que o Novo Código de Processo Civil seria
incompatível com a legislação trabalhista é o Juiz do Trabalho da 15a Região, Jorge Luis
Souto Maior, o qual constrói um entendimento baseado no caráter protetivo do Direito do
Trabalho e no seu objetivo de alcançar o fim da desigualdade entre capital e trabalho, o que
restaria incompatível com as raízes do Novo Código de Processo Civil, qual seja, a
observância de imposição do Banco Mundial (que teria motivado a Reforma do Poder
Judiciário – da qual o Novo CPC é decorrência).
Corroborando o acima exposto, colaciona-se o seguinte trecho de sua obra referente ao
tema12, verbis:
Do que não há dúvida é o advento do novo CPC, cujos debates se iniciaram em2009, com instalação de comissão coordenada pelo atual Ministro do STF, Luiz Fux,se insere no contexto da Reforma do Judiciário, preconizada e financiada pelo BancoMundial, a partir de 1994 (e concluída do ponto de vista constitucional em 2004).Essa reforma do Judiciário, inserida no contexto do projeto neoliberal, tinha comopropósito impedir que o Direito, os juristas e os juízes constituíssem empecilhos àimposição da lógica de mercado.
Durante longo arrazoado, o doutrinador defende a inexistência de lacunas na
legislação trabalhista, argumentando que eventuais omissões na legislação laboral decorreriam
do princípio da oralidade que norteia o processo do trabalho.
Da mesma forma, defende que a regra constante do art. 769 da CLT seria uma
verdadeira “regra de proteção” da CLT frente às ameaças do CPC.
Registra-se o argumento defendido pelo referido Juiz do Trabalho e doutrinador no
sentido de que, seguindo-se a própria literalidade do art. 15 do NCPC, que dispõe que a
aplicação das normas processuais civis ao processo do trabalho se dará de forma subsidiária e12 MAIOR, Jorge Luiz Souto. Novo CPC no processo do trabalho: como não aplicar, aplicando. Disponível em: <www.migalhas.com.br/dePeso/16,MI231714,31047-Novo+CPC+no+processo+do+trabalho+como+nao+aplicar+aplicando> Acesso em 05 ago 2016.
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supletiva, não haveria a possibilidade de fazê-lo, considerando-se a inexistência de omissões
por parte da legislação trabalhista, verbis:
A falta de técnica, no entanto, trai o legislador e a pretensão cai no vazio na medidaem que vincula esta pretensão expansionista à “ausência de normas” que regulem osrespectivos processos. Ocorre que no caso do processo do trabalho, por exemplo, existem mais de 265artigos na CLT regulando o processo do trabalho, sem falar nas normas extraídas dediversas leis que completam, de forma específica, a obra celetista, além das 278Súmulas e Orientações Jurisprudenciais do TST cuidando o tema. Ou seja, o que nãofalta é norma regulando o processo trabalhista e, portanto, pelo critério adotado pelonovo CPC não se poderá aplicá-lo nas lides trabalhistas.13
Em suma, Jorge Luis Souto Maior rejeita a aplicação do novo CPC ao processo do
trabalho por três razões diferentes: incompatibilidade, desnecessidade e em virtude dos graves
riscos que a aplicação do novo CPC traz aos direitos trabalhistas. 14
Adotando posicionamento semelhante ao de Souto Maior, cita-se a Juíza do Trabalho
da 4ª Região e doutrinadora, Valdete Souto Severo15 , verbis:
Para aqueles que lidam com o processo do trabalho e, portanto, estão diariamentediante de cidadãos que buscam créditos alimentares ou a manutenção de seus postosde trabalho, o NCPC é uma ode ao retrocesso.16
Entretanto, registra-se que o entendimento adotado pela referida doutrinadora é menos
radical, porquanto entende que a aplicação (subsidiária ou supletiva) do NCPC ao processo
do trabalho deve ser amplamente restrita às normas que potencializam as características do
nosso processo porque conferem efetividade e celeridade ao procedimento.17
13 MAIOR, Jorge Luiz Souto. Novo CPC no processo do trabalho: como não aplicar, aplicando. Disponível em:<www.migalhas.com.br/dePeso/16,MI231714,31047-Novo+CPC+no+processo+do+trabalho+como+nao+aplicar+aplicando> Acesso em 05 ago 2016.14 Ibidem.15 SOUTO MAIOR, Jorge Luiz; SEVERO, Valdete Souto. O processo do trabalho como instrumento dodireito do trabalho: e as ideias fora do lugar do novo CPC. São Paulo: Ltr, 2015.16 SEVERO, Valdete Souto. O NCPC e o processo do trabalho: falsas novidades e parâmetros de aplicação.Disponível na Internet: http://www.google.com.br/url?sa=t&rct=j&q=&esrc=s&source=web&cd=6&cad=rja&uact=8&ved=0ahUKEwiwh5Ohg7jOAhXEiZAKHbsoC7QQFgg1MAU&url=http%3A%2F%2Fwww.femargs.com.br%2Fuploads%2Fartigos%2Fo-ncpc-e-o-processo-do-trabalho--falsas-novidades-e-parametros-de-aplicacao%2Fo-ncpc-e-o-processo-do-trabalho--falsas-novidades-e-parametros-de-aplicacao.doc&usg=AFQjCNF7Nhk9fzXcdX1DIr6qpbBMPNkQ0w Acesso em 10ago 2016.17 SEVERO, Valdete Souto. Aspectos relevantes da decisão judicial: o processo do trabalho e o novo CPC.Revista eletrônica: acórdãos, sentenças, ementas, artigos e informações/Tribunal Regional do Trabalho da 4a
Região, Porto Alegre, RS, v.12, n. 10, jun. 2016. Edição especial, p. 81-89.
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Analisando o posicionamento dessa corrente doutrinária, constata-se que se
fundamenta em uma visão restrita do que deveria prevalecer no Estado Democrático de
Direito, esquecendo-se, por exemplo, que a Constituição Federal, que norteia todo o sistema
jurídico brasileiro, prevê o pluralismo político como princípio fundamental, coexistindo com
a dignidade da pessoa humana, com o valor social do trabalho e da livre iniciativa, dentre
outros.
E segundo a doutrina que estuda qual seria o alcance da expressão, constata-se que
visa a proteger, exatamente, a divergência entre opiniões, posicionamentos, orientações, que
existem dentro de uma sociedade. Nesse sentido, cita-se o magistério de Martonio
Mont’Alverne Barreto Lima, verbis:
O sentido, pois, do pluralismo político constitucionalmente positivado no Brasilalcança hoje as diversas esferas da vida política e social do País, exercendosimultaneamente a função de principiológico, articulando-se , integrativa enormativamente, com os demais direitos fundamentais. Assim, o pluralismo é umfundamento em si, porém apoiando-se noutros direitos e garantias fundamentais aconsolidarem a democracia brasileira.Referido mecanismo de funcionamento institucional democrático insere nossaConstituição Federal no moderno rol de Constituições que, libertando-se de noçõespassadas a arrefecerem ânimos pela introdução de uma nova realidade normativa,ousam e apostam na força dos contrários para sua própria sobrevivência elegitimidade entre a sociedade.18
Dessa forma, reconhecendo-se o caráter plural que norteia o Estado Democrático de
Direito, consoante regulado pela própria Constituição Federal, em face da existência de
direitos diversos a serem tutelados, relações a serem normatizadas e harmonizadas, o
posicionamento totalmente contrário à aplicação do Novo CPC ao processo do trabalho
configuraria verdadeiro retrocesso, considerando-se, inclusive, que o diploma processual civil,
enquanto projeto, foi amplamente debatido em ambas as Casas do Congresso Nacional,
contando com representantes dos mais variados segmentos da sociedade.
1.2. DA INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº 39/2016 DO TRIBUNAL SUPERIOR DO
TRABALHO
18 LIMA, Mont’Alverne Barreto. Comentários ao artigo 1º, V. In: CANOTILHO, J.J.Gomes; MENDES, GilmarF.; SARLET, Ingo W.; STRECK, Lenio L. (Coords.). Comentários à Constituição Do Brasil. São Paulo:Saraiva/Almedina, 2013. P. 135-136.
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Conforme exposto no capítulo anterior, no intuito de orientar a aplicação do NCPC
pela Justiça do Trabalho, o TST editou a Resolução nº 203, que aprovou a Instrução
Normativa nº 39/2016, a qual dispõe sobre quais normas do novo diploma processual civil
seriam aplicáveis ao processo do trabalho.
Para bem compreender o intuito do TST ao editar a referida Instrução Normativa,
colaciona-se parte de sua exposição de motivos, verbis:
BREVE EXPOSIÇÃO DE MOTIVOS A preocupação com os profundos impactos do novo Código de Processo Civil (Leinº 13.105, de 17.03.2015) no processo do trabalho, mais que aconselhar, impõe umposicionamento do Tribunal Superior do Trabalho sobre a matéria, medianteInstrução Normativa. A proposta que ora se apresenta toma como premissa básica e viga mestra a nãorevogação dos arts. 769 e 889 da CLT pelo art. 15 do CPC de 2015, seja em face doque estatui o art. 2º, § 2º da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, sejaà luz do art. 1046, § 2º do NCPC. Daí que a tônica central e fio condutor da Instrução Normativa é somente permitir ainvocação subsidiária ou supletiva do NCPC caso haja omissão e tambémcompatibilidade com as normas e princípios do Direito Processual do Trabalho.Entendemos que a norma do art. 15 do NCPC não constitui sinal verde para atransposição de qualquer instituto do processo civil para o processo do trabalho, antea mera constatação de omissão, sob pena de desfigurar-se todo o especial arcabouçoprincipiológico e axiológico que norteia e fundamenta o Direito Processual doTrabalho. [...]
O que se verifica pela análise da exposição de motivos supramencionada é o
reconhecimento da aplicação subsidiária ou supletiva do NCPC somente nos casos de
omissão, bem como a exigência quanto à sua compatibilidade com as normas e princípios do
Direito Processual do Trabalho.
A referida Instrução Normativa foi alvo de críticas por alguns doutrinadores e
aplicadores do Direito do Trabalho, sob o argumento de que tal configuraria verdadeira
violação à separação de poderes, à inércia da jurisdição e ao princípio do juiz natural, bem
como desrespeitaria a competência da União para legislar sobre direito processual, além de
conceder poder não atribuído constitucionalmente ao TST, qual seja, o de editar norma de
caráter abstrato.
Em contrapartida, alguns defensores do ato do TST entendem que tal conferiu maior
segurança jurídica ao jurisdicionado, traçando algumas balizas a respeito da aplicação do
NCPC pela Justiça do Trabalho.
14
Nesse sentido, analisando a controvérsia suscitada pela edição da norma pelo TST,
cita-se o magistério de Ricardo Souza Calcini, verbis:
Todavia, já existem críticas à própria constitucionalidade da IN 39/2016, a exemplodaquelas exaradas pelo professor Carlos Henrique Bezerra Leite. Segundo o eméritojurista, teria ocorrido, dentre outras questões: (i) a violação aos princípios daseparação dos poderes, da inércia da jurisdição e do juiz natural (usurpação dacompetência do juiz natural); (ii) o desrespeito à própria competência da União paralegislar sobre direito processual (CF, artigo 22, I); e (iii) a concessão de poder nãoatribuído constitucionalmente ao TST, que não detém a legitimidade para editarinstrução normativa para aprovar norma abstrata e genérica (CF, artigo 111-A, § 1º).Pensamento em sentido oposto, que parece caminhar melhor, sustenta que a ediçãoda regulamentação pelo TST se mostrou necessária. E isso, em verdade, para setransmitir um mínimo de segurança jurídica aos jurisdicionados, com a adoção deorientação a ser seguida pelos demais órgãos da Justiça do Trabalho.Note-se que, até pelo propósito de tutelar créditos de natureza eminentementealimentar, caso não fossem adotadas urgentes medidas pela mais alta cortetrabalhista, fatalmente os processos incorreriam em futuras nulidades processuais, oque desprestigiaria a desejável celeridade processual afeta a este ramojuslaboralista.19
1.2.1. DA AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE Nº 5.516
Conforme já informado na introdução do presente trabalho, contra a Instrução
Normativa do TST foi ajuizada, em 04/05/2016, pela Associação Nacional dos Magistrados
da Justiça do Trabalho – ANAMATRA - a Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 5516,
objetivando a declaração de inconstitucionalidade formal e material da referida Instrução
Normativa,
Consoante consta na petição inicial da ADI nº 5.516, a ANAMATRA sustenta a
inconstitucionalidade da Instrução Normativa nº 5.516 em face das seguintes violações
constitucionais:
– violação ao art. 22, I, da CF, porquanto o TST teria invadido a competência do legislador
ordinário federal dizendo, desde logo, quais seriam os dispositivos do novo CPC aplicáveis ao
19 CALCINI, Ricardo Souza. Novo Código de Processo Civil causa impactos no processo do trabalho.Revista Consultor Jurídico, 28 de abril de 2016, 6h27. Disponível na Internet: <http://www.conjur.com.br/2016-abr-28/ricardo-calcini-cpc-causa-impactos-processo-trabalho> Acesso em 05ago 2016.
15
processo trabalhista - tal configuraria uma típica norma de “sobredireito”, como é a Lei de
Introdução às Normas de Direito Brasileiro (LINDB);
- violação ao art. 5º, II, da CF (princípio da reserva legal) e ao art. 96, I, “a” da CF
(competências privativas dos Tribunais para editar seus Regimentos Internos apenas sobre as
matérias internas do Tribunal);
– violação ao art. 95, I, II e III, e art. 5º, XXXVII e LIII, que dispõem acerca do princípio da
independência dos magistrados.20
Segundo consta da petição inicial, tanto pela interpretação do art. 15 do NCPC, quanto
pelo art. 769 da CLT, cada magistrado de 1º ou 2º grau deveria poder decidir, em cada
processo, qual a norma do novo CPC que poderia, ou não, ser aplicada, com base em sua
independência funcional e judicante. Posteriormente, com o transcurso do tempo, surgiria a
jurisprudência e, a partir daí, deveriam ser editadas súmulas ou orientações jurisprudenciais a
serem observadas no âmbito da Justiça do Trabalho.
Analisando-se as razões que ensejaram a edição da Instrução Normativa, conforme a
já reproduzida exposição de motivos, constata-se que, dentre elas, constam a necessidade de
se conferir segurança jurídica sobre o tema, bem como em face do papel constitucional
atribuído ao Tribunal Superior do Trabalho como corte uniformizadora de jurisprudência.
Dessa forma, sem adentrar-se na análise de todas as alegações formuladas pela
entidade autora da ADI referida, considera-se que, tanto na qualidade de advogados, como de
partes, a referida norma, materialmente, atende ao princípio constitucional da segurança
jurídica que deve nortear a aplicação do direito.
Com a devida vênia de entendimentos contrários, tanto para o advogado como para a
parte é deveras perigoso ficar à mercê do arbítrio de cada julgador, seja no âmbito do
primeiro, quanto do segundo grau, quanto à aplicação ou não de cada dispositivo do CPC ao
processo do trabalho.
E, ainda com relação ao argumento constante da petição inicial que se deveria
aguardar o avanço da jurisprudência, de modo que as decisões chegassem até o TST, que, aí
20 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 5.516. Disponível na internet: <http://redir.stf.jus.br/estfvisualizadorpub/jsp/consultarprocessoeletronico/ConsultarProcessoEletronico.jsf?seqobjetoincidente=4977107> Acesso em 10 ago 2016.
16
sim, editaria Súmulas e orientações jurisprudenciais para regular a matéria, não se sustenta
porquanto contradiz princípios basilares do processo do trabalho, conforme citado pelos
próprios doutrinadores trabalhistas, muitos reproduzidos no presente estudo, quais sejam, o da
efetividade e da celeridade.
Ora, qual seria a utilidade de cada julgador proferir o seu entendimento sobre a
aplicação do novo CPC ao processo do trabalho, ensejando a interposição de recursos, que
sobrecarregariam, ainda mais, o Poder Judiciário, para que o TST reformasse tais
pronunciamentos, se já é possível verificar junto à Corte competente pela uniformização de
jurisprudência, desde logo, qual será o seu entendimento sobre o tema?
Entende-se, no caso, que a segurança jurídica, a efetividade e a celeridade são
princípios basilares do processo como um todo, incluindo-se o processo do trabalho, sendo
deveras prejudicial, inclusive ao empregado, tutelado por esse já mencionado subsistema
jurídico, a protelação do processo para que cada juiz possa manifestar o seu entendimento
sobre o tema.
De outro lado, quanto à alegada invasão da competência legislativa, ocorrendo a
violação do princípio da separação dos poderes, em uma análise preliminar, constata-se que
tal não se sustenta, porquanto o TST não editou norma geral e abstrata, tampouco retirou a
aplicação dos diplomas legais (NCPC e CLT), mas apenas, exerceu sua função constitucional
de interpretar o alcance da norma, o mesmo procedimento o qual postulam os juízes do
Trabalho por meio da ADI nº 5.516.
Nesse sentido, cita-se a decisão do Supremo Tribunal Federal na ADI nº 2.628/DF,
pela qual a Corte Suprema entendeu que a Instrução nº 55 do TSE apenas interpretava norma
e, analisar se tal interpretação excederia, ou não, os limites da norma que visava integrar
demandaria análise da legalidade do poder regulamentar, o que não seria efetuado pelo STF
em sede de controle concentrado, verbis:
AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. PARÁGRAFO 1º DOARTIGO 4º DA INSTRUÇÃO Nº 55, APROVADA PELA RESOLUÇÃO Nº20.993, DE 26.02.2002, DO TRIBUNAL SUPERIOR ELEITORAL. ART. 6º DALEI Nº 9.504/97. ELEIÇÕES DE 2002. COLIGAÇÃO PARTIDÁRIA.ALEGAÇÃO DE OFENSA AOS ARTIGOS 5º, II E LIV, 16, 17, § 1º, 22, I E 48,CAPUT, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. ATO NORMATIVO SECUNDÁRIO.
17
VIOLAÇÃO INDIRETA. IMPOSSIBILIDADE DO CONTRLE ABSTRATO DECONSTITUCIONALIDADE. Tendo sido o dispositivo impugnado fruto de respostaà consulta regularmente formulada por parlamentares no objetivo de esclarecer odisciplinamento das coligações tal como previsto pela Lei 9.504/97 em seu art. 6º, oobjeto da ação consiste, inegavelmente, em ato de interpretação. Saber se estainterpretação excedeu ou não os limites da norma que visava integrar, exigiria,necessariamente, o seu confronto com esta regra, e a Casa tem rechaçado astentativas de submeter ao controle concentrado o de legalidade do poderregulamentar. Precedentes: ADI nº 2.243, Rel. Min. Marco Aurélio, ADI nº 1.900,Rel. Min. Moreira Alves, ADI nº 147, Rel. Min. Carlos Madeira. Por outro lado,nenhum dispositivo da Constituição Federal se ocupa diretamente de coligaçõespartidárias ou estabelece o âmbito das circunscrições em que se disputam os pleitoseleitorais, exatamente, os dois pontos que levaram à interpretação pelo TSE. Sendoassim, não há como vislumbrar, ofensa direta a qualquer dos dispositivosconstitucionais invocados. Ação direta não conhecida. Decisão por maioria.21
Por fim, cabe ressaltar que, como já exposto na introdução do presente trabalho, a
Câmara Técnica do CNPGEDF está avaliando a pertinência e a viabilidade de ingressar no
feito na qualidade de amicus curiae. Entende-se que se trata de questão relevante, porquanto
atinge o trabalho exercido por todos os advogados públicos que atuam perante a Justiça do
Trabalho, representando os entes públicos reclamados, bem como que será uma possibilidade
de requerer ao Supremo para que dê o real alcance do NCPC no processo do trabalho
determinando, por exemplo, a observância das prerrogativas da Fazenda Pública.22
1.2.2. DA AUSÊNCIA DE PREVISÃO QUANTO À INTIMAÇÃO PESSOAL DA
FAZENDA PÚBLICA PELA INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº 39/2016
Analisando-se o teor a Instrução Normativa nº 39/2016, constata-se que ela nada
refere acerca da aplicação, ou não, ao processo do trabalho, da previsão constante do art. 183
do NCPC, o qual prevê:
Art. 183. A União, os Estados, o Distrito Federal, os Municípios e suasrespectivas autarquias e fundações de direito público gozarão de prazo em
21 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 2.628/DF. Disponível nainternet: < http://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=AC&docID=266864> Acesso em 17 ago2016.22 Salienta-se que, após a elaboração e o envio da tese, foi protocolada petição, pela Associação Nacional dosMagistrados do Trabalho, em 09/09/2016, informando a perda do objeto da ADI referida em face dasinformações prestadas pelo TST no feito, no sentido de que a IN 39/2016 teria caráter, apenas, de orientação. Emassim sendo, concluímos que não existiria mais razão para o peticionamento, considerando-se o que estavasendo discutido na ADI. Pode-se pensar em alguma outra medida, caso se entenda pela provocação do SupremoTribunal Federal para que proceda uma interpretação conforme, posicionando-se quanto `a aplicação do NCPC àJustiça do Trabalho.
18
dobro para todas as suas manifestações processuais, cuja contagem terá inícioa partir da intimação pessoal.§ 1o A intimação pessoal far-se-á por carga, remessa ou meio eletrônico.§ 2o Não se aplica o benefício da contagem em dobro quando a leiestabelecer, de forma expressa, prazo próprio para o ente público.
Com relação à contagem em dobro de todos os prazos processuais, salvo melhor juízo,
tal não seria aplicável ao processo do trabalho, em face da existência do Decreto-Lei nº
779/69, o qual trata de normas procedimentais trabalhistas, prevendo para a União, Estados,
Distrito Federal, Municípios, suas autarquias e fundações de direito público federais,
estaduais e municipais, em seu art. 1º, o prazo em quádruplo para contestar e em dobro para
recorrer.
Tal entendimento justifica-se por se tratar de norma especial que estabelece de forma
expressa prazos processuais para os entes públicos, incidindo, no caso o próprio § 2º do art.
183 do NCPC.
De outro lado, nada consta no referido Decreto-lei, tampouco na CLT, acerca da forma
de intimação dos entes públicos, de modo que inexistiria incompatibilidade com relação ao
disposto pelo § 1ºdo art. 183 do NCPC e o processo do trabalho.
Cabe registrar que consta expressamente do art. 3º da Instrução Normativa nº 39/2016
a previsão de que tal diploma não é exaustivo, ou seja, de que algumas normas sobre as quais
o TST ainda não se manifestou quanto à compatibilidade ou não com o processo do trabalho
não necessariamente seriam incompatíveis, verbis:
Art. 3° Sem prejuízo de outros, aplicam-se ao Processo do Trabalho, em face deomissão e compatibilidade, os preceitos do Código de Processo Civil que regulam osseguintes temas: […]
Salienta-se, ainda, que eventual alegação de que a intimação pessoal iria de encontro
ao princípio da celeridade que norteia o processo do trabalho também não se sustenta.
Veja-se que, recentemente, o Supremo Tribunal Federal manifestou-se acerca da
natureza das prerrogativas da Fazenda Pública, na ADI nº 2.418, de relatoria do Ministro Teori
Zavascki, na qual se considerou constitucional, dentre outros, o art. 4º da MP nº 2.102-
19
27/2001, que acrescentou o art. 1º-B e 1º-C à Lei nº 9.494/97, alterando o prazo para oposição
de embargos à execução para a Fazenda Pública para 30 dias. Entendeu o eminente Relator,
no que foi seguido pela maioria dos Ministros da Corte Suprema que, verbis:
É sabido que o estabelecimento de tratamento processual especial para a FazendaPública, inclusive em relação a prazos diferenciados, quando razoáveis, não constituipropriamente uma restrição a direito ou prerrogativa da parte adversa, mas buscaatender ao princípio da supremacia do interesse público. 23
Por fim, registra-se que, em audiência ocorrida no Tribunal Superior do Trabalho com
o Ministro-Presidente daquela Corte, Ministro Ives Gandra da Silva Martins Filho, em
12/05/2016, na qual compareceram Procuradores integrantes da Câmara Técnica do
CNPGEDF, dentre eles a presente autora, restou afirmado que inexistiria óbice à adoção da
intimação pessoal da Fazenda no âmbito do TST, mas que tal estaria aguardando o aporte de
recursos para a sua efetivação.
Constata-se, portanto, que, com base na interpretação da Instrução Normativa 39/2016
do TST, conjugada com o arts. 769 da CLT e 15 e 183 do NCPC, deve ser adotada na Justiça
do Trabalho a prerrogativa da intimação pessoal dos entes públicos.
Por fim, corroborando o acima exposto, cita-se a recentíssima decisão proferida pelo
Min. João Oreste Dalazen, no RR 190-53-2015.5.03.0090, pela qual o Estado do Rio Grande
do Sul foi admitido no recurso de revista repetititvo como amicus curiae, foi determinada a
intimação pessoal do ente público, em conformidade com o art. 183, caput, § 1º, do CPC de
2015.24
CONCLUSÕES
23 BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Voto na ADI nº 2.418. Relator: ZAVASCKY, Teori. Disponível nainternet: <http://www.stf.jus.br/arquivo/cms/noticiaNoticiaStf/anexo/adi2418.pdf> Acesso em 10 ago 2016.24 BRASIL. Tribunal Superior do Trabalho. Decisão proferida no TST-RR-190-53.2015.5.03.0090. Relator:DALAZEN, João Oreste.. Disponível na internet: <http://aplicacao4.tst.jus.br/consultaProcessual/consultaTstNumUnica.do?consulta=Consultar&conscsjt=&numeroTst=0000190&digitoTst=53&anoTst=2015&orgaoTst=5&tribunalTst=03&varaTst=0090&submit=Consultar> Acesso em 10 ago 2016.
20
Em face da análise efetuada da questão controvertida no âmbito doutrinário, além do
entendimento adotado pelo Tribunal Superior do Trabalho e Supremo Tribunal Federal, tem-
se as seguintes conclusões:
1) Consoante posição majoritária da doutrina e do TST, o art. 15 do CPC/2015 é
compatível com o art. 769 da CLT, de modo que devem ser aplicadas, supletiva e
subsidiariamente ao processo do trabalho as normas do novo código de processo civil;
2) A aplicação subsidiária e supletiva do diploma processual civil ao processo do
trabalho pressupõe a existência de lacuna (seja normativa, ontológica ou axiológica,
segundo a classificação de Maria Helena Diniz), bem como a compatibilidade entre os
procedimentos;
3) Visando a observância de sua função uniformizadora da jurisprudência, bem como a
importância do tema, o TST editou a Instrução Normativa nº 39/2016, que estabelece
quais seriam as normas do processo civil compatíveis com o processo do trabalho;
4) A Instrução Normativa não é exaustiva, consoante exposto em seu teor, bem como
visa a orientar a aplicação do novo diploma processual civil em face do impacto que a
sua edição gerou no ordenamento jurídico;
5) A referida Instrução Normativa é objeto da ADI nº 5.516, ajuizada pela
ANAMATRA, que alega a violação a uma série de normas constitucionais, dentre
elas, a separação de poderes, a independência do juiz e a competência do TST;
6) Pode-se defender, perante o STF, o entendimento que não haveria
inconstitucionalidade na Instrução referida, porquanto visa a assegurar a observância
do princípio da segurança jurídica, constitucionalmente previsto e vital para o Estado
Democrático de Direito;
7) Também é defensável a ideia de que o ato editado pelo Tribunal Superior do Trabalho
enquadra-se nas atribuições constitucionais atribuídas ao referido Tribunal, que,
apenas, regulamentou a interpretação dos dispositivos legais no âmbito da Justiça
Laboral (nesse sentido, ADI nº 2.628/DF);
21
8) Na qualidade de litigantes no âmbito da Justiça do Trabalho, os Estados que compõem
a Câmara Técnica do CNPGEDF devem ingressar na ADI nº 5.516, na qualidade de
amici curiae, em face das consequências que podem advir de eventual procedência do
pleito;25
9) Outra utilidade do ingresso dos Estados na demanda é provocar o Supremo Tribunal
Federal para que confira uma interpretação da IN 39 conforme a Constituição,
elastecendo o seu alcance para incluir, inclusive, como aplicáveis na Justiça do
Trabalho, as prerrogativas processuais da Fazenda Pública;
10) As normas que estabelecem as prerrogativas dos entes públicos (art. 183 do CPC/15)
preveem o prazo em dobro e a intimação pessoal. Com relação ao prazo em dobro, há
norma especial que regulamenta a questão no âmbito do processo do trabalho, art. 1º
do Decreto-Lei 779/69, não sendo aplicáveis;26
11) No tocante à intimação pessoal, inexiste norma específica, de forma que se entende
como plenamente aplicável ao processo do trabalho, inclusive em face da recente
manifestação do STF sobre o tema, no julgamento da ADI nº 2.418 em 04/05/2016.
25 Remete-se o leitor à nota nº 22 (p. 15), onde é informado fato novo ocorrido após a elaboração da tese e que modificou o entendimento até então adotado.26 Quanto à contagem do prazo em dias úteis, registra-se que a ANAPE protocolou pedido de providências junto ao CNJ para que seja observado o teor do disposto no art. 219 do NCPC.
22
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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________________________________Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 5.516. Disponível na internet: <http://redir.stf.jus.br/estfvisualizadorpub/jsp/consultarprocessoeletronico/ConsultarProcessoEletronico.jsf?seqobjetoincidente=4977107> Acesso em 10 ago 2016.
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