6º Encontro da ABRI: Perspectivas sobre o Poder em um mundo … · 2017. 7. 14. · 6º Encontro...
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6º Encontro da ABRI: Perspectivas sobre o Poder em um mundo em redefinição
25 a 28 de julho de 2017- PUC- MINAS - Belo Horizonte – MG
Área temática: Segurança Internacional, Estudos Estratégicos e Política de Defesa
POLÍTICA DE SEGURANÇA AMBIENTAL INTERNACIONAL: as medidas de adaptação
e mitigação adotadas pelos Pequenos Estados Insulares em Desenvolvimento (SIDS)
frente à securitização das mudanças climáticas
Letícia Britto dos Santos
Instituição: Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais
RESUMO
Este trabalho pretende analisar a política de segurança ambiental internacional
adotada pelos Pequenos Estados Insulares em Desenvolvimento (SIDS) frente aos eventos
climáticos extremos, tais como: enchente, aumento de chuvas, derretimento de geleiras,
elevação do nível do mar, a desertificação e/ou a escassez de água. Esses eventos tornam
mais vulneráveis, sobretudo, as populações mais pobres, sendo cada vez mais vistos como
ameaça à segurança de parcelas significativas da população de algumas regiões do globo.
O fenômeno das mudanças climáticas passa a gerar uma situação de incerteza e
que pode ser entendida como ameaça a segurança humana no ambiente global.
Dessa forma, o foco desse trabalho será analisar as medidas de adaptação adotadas pelos
Pequenos Estados Insulares em Desenvolvimento (SIDS) como forma de se protegerem das
ameaças às mudanças climáticas globais. A escolha dessa temática se deve ao fato desta
ser uma questão relevante para a sociedade internacional, uma vez que a construção de
ameaça gera maiores incertezas e, neste caso, essas incertezas afetam a perspectiva até
mesmo de existência desses Estados (alguns estudiosos acreditam que com o aumento do
nível do mar, estes países poderão desaparecer).
Para o campo das Relações Internacionais, a compreensão dessa temática é de
estrema importância, tendo em vista que os novos fenômenos e desafios que surgem,
envolvem toda a sociedade internacional. Os efeitos das mudanças climáticas são
perceptíveis no nosso dia a dia e suas consequências são inúmeras para a segurança
hídrica, alimentar e energética do planeta.
O modelo analítico será elaborado a partir das contribuições de Buzan (1997),
Waever (2009) & Wild (1998), para compreender a resposta que os Pequenos Estados
Insulares em Desenvolvimento dão à securitização feita pela Painel Intergovernamental de
Mudanças Climáticas (IPCC).
A pergunta de partida, que move esse trabalho é: Como os Pequenos Estados
Insulares em Desenvolvimento (SIDS) recebem e respondem ao discurso do IPCC em
relação às mudanças climáticas? As respostas dadas por estes países reforçam ou não a
tendência de securitização da temática?
Esse projeto seguirá a lógica do Modelo Compreensivo. Para que sejam alcançados
os objetivos aqui propostos, o elemento ontológico a ser trabalhado é compreender como
dentro da estrutura internacional são construídas as lógicas entre os agentes, dessa forma,
será realizada a técnica de análise de conteúdo dos documentos oficiais do IPCC, das
SIDS, da AOSIS e das conferências regionais e internacionais que os mesmos participam.
Em função da teoria de securitização escolhida, serão trabalhadas as linguagens, o ato da
fala e as identidades presentes nos discursos, para que a realidade possa ser
compreendida. Já que nesse modelo, a percepção dos atores constrói o objeto, que se torna
um problema de segurança. Como ferramenta técnica de pesquisa, inicialmente a ideia
dessa pesquisa é a realização de uma análise de discurso AD2 – Construtivista – para
compreender a maneira como os atores interpretam a realidade, a questão que está sendo
securitizada.
Palavras-chave: Securitização, Mudanças Climáticas
1 INTRODUÇÃO
Este projeto pretende analisar a política de segurança ambiental internacional
adotada pelos Pequenos Estados Insulares (SIDS) frente aos eventos climáticos extremos,
tais como: enchente, aumento de chuvas, derretimento de geleiras, elevação do nível do
mar, a desertificação e/ou a escassez de água. Esses eventos tornam mais vulneráveis,
sobretudo, as populações mais pobres, sendo cada vez mais vistos como ameaça à
segurança de parcelas significativas da população de algumas regiões do globo. O
fenômeno das mudanças climáticas passa a gerar uma situação de incerteza e que pode ser
entendida como ameaça a segurança humana no ambiente global.
Dessa forma, o foco desse trabalho será analisar as medidas de adaptação e
mitigação adotadas pelos Pequenos Estados Insulares em Desenvolvimento (SIDS) como
forma de se protegerem das ameaças às mudanças climáticas globais. A escolha dessa
temática é por essa ser uma questão relevante para a sociedade internacional, uma vez
que a construção de ameaças geram maiores incertezas e, neste caso, essas incertezas
afetam a perspectiva até mesmo de existência desses Estados (alguns estudiosos
acreditam que com o aumento do nível do mar, estes países poderão desaparecer).
Para o campo das Relações Internacionais, a compreensão dessa temática é de
estrema importância, tendo em vista que os novos fenômenos e desafios que surgem,
envolvem toda a sociedade internacional. Os efeitos das mudanças climáticas são
perceptíveis no nosso dia a dia e suas consequências são inúmeras para a segurança
hídrica, alimentar e energética do planeta. Dessa forma, contextualiza-se o histórico da
temática, a fim de compreender como a questão passa a ser tratada como um problema de
segurança, significando uma possível ameaça que poderia comprometer a vida humana.
O modelo analítico será elaborado a partir das contribuições de Buzan (1997),
Waever (2009) & Wild (1998), para compreender a resposta que os Pequenos Estados
Insulares em Desenvolvimento dão à securitização feita pela Painel Intergovernamental de
Mudanças Climáticas (IPCC). Além disso, será trabalhada a discussão de Giddens (2009)
sobre o paradoxo quanto as respostas aos desafios das mudanças climáticas. Por fim, será
trabalhado os pontos teóricos do Construtivismo sobre difusão de normas e socialização
dos Estados.
A pergunta de partida, que move esse trabalho é: como os Pequenos Estados
Insulares em Desenvolvimento (SIDS) recebem e respondem ao discurso do IPCC em
relação às mudanças climáticas? A pergunta que surge em seguida é: as respostas dadas
por estes países reforçam a tendência de securitização da temática?
1.2 Justificativa
A temática ambiental é de grande relevância para a política internacional, uma vez
que um desastre natural pode afetar diversas regiões do globo e suas causas e
consequências nem sempre são originadas no mesmo lugar. A relevância de se estudar
questões relativas às políticas ambientais sob a ótica das Relações Internacionais é a
contribuição que esse campo pode dar para uma maior discussão de temas que afetam a
vida humana, sobretudo visando discutir as ações dos Estados tendo em vista a adoção de
políticas de adaptação e de mitigação quanto a consequências de alterações ambientais
significativas. Além disso, e considerando a perspectiva da segurança humana, o campo
das Relações Internacionais permite discutir o fenômeno das mudanças climáticas a partir
da perspectiva do que tem sido considerado ameaças globais ao futuro da vida no planeta e
as demandas por políticas que tais ameaças colocam.
Muitos cientistas consideram que a intensificação de alguns fenômenos naturais, tais
como a elevação dos oceanos, o derretimento das geleiras, mudanças nos regimes de
chuvas - maiores inundações em diversas regiões do planeta - aumento de furacões,
ciclones e tufões, são consequências do aquecimento global1. (OBSERVATÓRIO DO
CLIMA, 2008).
Entende-se que as mudanças climáticas têm provocado eventos climáticos extremos,
o que tem gerado e alimentado o debate da questão como um problema de segurança
nacional e internacional. Vista sob a ótica da segurança, a temática suscita não somente a
possibilidade da tomada de decisões em situações emergenciais, mas também abre
condições para a proposição de mecanismos de adaptação aos riscos de forma articulada e
integrada com os instrumentos de gestão já previstos na política normal. (WORL WATER
ASSESSMENT PROGRAMME, 2009).
Lembrando que, todo governo tentará prevenir através de mitigação e adaptação,
evitar que ocorra um desastre, para não ter que passar pela emergencial. Haverá momentos
1 Definido pelo IPCC- Painel Intergovernamental para Mudanças Climáticas- como um aumento da temperatura
global que se vem observando nos últimos 150 anos em função do aumento dos gases de efeito estufa na
atmosfera.
de securitização, mas outros serão medidas normais. O Paradoxo de Giddens (2009)
apresenta a dificuldade de fazer prevenção de algo que você não sabe se existe que não
tem certeza. Um dos questionamentos, apresentados pelo autor é de que: “Por que vou me
prevenir agora?” Já que há uma projeção cientifica, alguns acreditam (a audiência é
convencida através de um discurso que aquilo faz sentido). Através da corrente teórica do
Construtivismo, há uma ameaça real e construída, os Estados são convencidos de que é
preciso securitizar uma temática.
Dessa forma, o Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC),
composto por cientistas de diversos campos do conhecimento e de diversas partes do
mundo, apresenta uma série de relatórios e evidências que são tomados como referências
para as negociações internacionais. Em seu 4º relatório, o IPCC afirma que as populações
que vivem em áreas costeiras de baixa altitude (cerca de 634 milhões de pessoas) estão
entre as mais vulneráveis aos efeitos das mudanças climáticas e aos eventos climáticos
extremos. Sendo que uma elevação de 1 metro no nível do mar poderia colocar mais de 145
milhões de pessoas em risco. Alguns Estados insulares, como Ilhas Marshall, Maldivas,
Kiribati e Tuvalu, já estão com suas existências ameaçadas (MATTAR, 2011).
O IPCC possui grupos de trabalho que lidam com a “mitigação das mudanças
climáticas”. Essas são um conjunto de medidas que visam impedir as emissões de gases de
efeito estufa e que sugerem alternativas para aumentar as atividades que possam removê-
los da atmosfera. Os principais setores econômicos são levados em conta, tanto no curto
como no longo prazo, dentre os quais se incluem: energia, transporte, construção civil,
indústrias, agricultura, silvicultura e gestão de resíduos.
Os grupos de trabalho analisam custos e benefícios de diferentes abordagens de
mitigação, considerando também os instrumentos e medidas políticas de cada país. Dessa
forma ele trata de temas emergenciais, assinala os riscos associados a processos relativos
às mudanças climáticas a partir de evidências empíricas identificadas por metodologia
amplamente discutida entre os seus membros. Tendo em vista os riscos, o IPCC alerta os
Estados quanto a possíveis ameaças para informá-los quanto a decisões nesta área. Neste
trabalho, o IPPC é visto como um ator securitizador, que busca convencer a audiência para
que reconheça tais temas como relacionados às questões de Segurança, para que se
adotem ações prioritárias (IPCC, 2007).
Medidas que poderiam ser implementadas a curto prazo incluem: enfatizar o desenvolvimento e adaptação de tecnologias que aumentem a produtividade/eficiência baseadas nos princípios de crescimento e desenvolvimento sustentável, [...] acelerar esforços de desenvolvimento econômico nos países em desenvolvimento, dado que sua economia se baseia, em grande parte no uso de recursos naturais. Tais esforços ajudariam a formação de capital, necessário
para se adaptar às mudanças climáticas, e geralmente fazem o desenvolvimento sustentável mais viável. (INTERGOVERNMENTAL PANEL ON CLIMATE CHANGE, 1990, p. 169, versão livre)2.
O IPCC sugere que no planejamento e estratégias para lidar com os riscos e
ameaças das mudanças climáticas em curto prazo sejam adotadas medidas de mitigação;
em longo prazo, as medidas de prevenção e adaptação são mais recomendadas, na
tentativa de reduzir o grau de intervenção do homem sobre as mudanças naturais do clima,
com o enfoque para sua proteção e segurança. As medidas de adaptação das mudanças
climáticas são específicas para cada região do planeta, pois os efeitos dessas mudanças
são diferentes de uma região para outra: em algumas regiões inundações serão mais
prováveis; em outras, poderá haver desertificação. O IPCC enfatiza e alerta a sociedade
internacional sobre a necessidade de se tomar medidas urgentes para a prevenção desses
fenômenos.
O foco desse estudo será as medidas de adaptação e mitigação adotadas pelos
Pequenos Estados Insulares em Desenvolvimento (SIDS) como forma de se protegerem das
ameaças às mudanças climáticas globais (SIDS). Esse agrupamento é formado por 52
países reconhecidos pelo Departamento das Nações Unidas de Assuntos Econômicos e
Sociais, situados nas seguintes regiões geográficas: África, Caribe, Oceano Índico,
Mediterrâneo, Oceano Pacífico e Mar da China Meridional, como pode ser verificado na
Figura 1.
Há uma grande concentração desses países no Oceano Pacífico, o que corresponde
a 42,85% dos membros totais, enquanto 19,05% são da região do Oceano Atlântico, Índico
e Mediterrâneo e 38,10% da região do Caribe. Esses países constituíram um órgão
administrativo para cada região: a Comunidade do Caribe, o Fórum das Ilhas do Pacífico e
da Comissão do Oceano Índico. Além disso, a maioria dos SIDS são membros da Aliança
dos Pequenos Estados Insulares (AOSIS), um grupo de países que atua em conjunto no
âmbito do Regime Internacional de Mudanças Climáticas. Quando se analisa a quantidade
de países e o número elevado de votos que os mesmos representam, esse grupo possui um
significado relevante no Sistema Internacional e nas conferências ambientais internacionais.
2 Measures that could be implemented in the short term include: Increased emphasis on the development and
adaptation of technologies which may increase the productivity or efficiency, consistent with the principles
of sustainable growth and development, acceleration of economic development efforts in developing
countries. Because these countries have largely resources based economics efforts improving natural. Such
efforts would help formation of such capital as may be necessary to adapt to climate change, and generally
make sustainable and development more feasible.
MAPA 1: Localização Geográfica dos Pequenos Estados Insulares em Desenvolvimento (SIDS)
Fonte: UNITED NATIONS ENVIRONMENT PROGRAMME (2014) UNEP/GRID-G
Devido a sua localização geográfica, os Pequenos Estados Insulares em
Desenvolvimento (SIDS), estão mais expostos a desastres naturais causados pelos
prováveis efeitos das mudanças climáticas. Vulnerabilidades e variabilidades como o
aumento do nível do mar são algumas das consequências e dos desafios que esses países
em desenvolvimento enfrentam, além da escassez dos recursos hídricos em função das
secas e também dos problemas de inundações. Esses impactos geram outras
consequências, como por exemplo, uma situação de instabilidade para a agricultura, o que
ameaça a segurança alimentar, econômica e a saúde das populações destes países.
Ainda não há um consenso quanto às previsões dos cientistas sobre as mudanças
no regime de chuvas desses países, mas o que é observado é que e estas mudanças
afetam também a disponibilidade dos recursos hídricos, embora o aumento do nível do mar
possa favorecer o aumento de chuvas nas ilhas do pacífico, por exemplo. No meio de tantas
variações extremas, cenários atuais, segundo cientistas, indicam que o nível do mar
aumentará algo em torno de 0,2 a 0,4 metros nas próximas décadas, apesar das
controvérsias de se estes dados podem ou não ser comprovados, este revela mais um
aspecto securitizador do tema. (BANCO MUNDIAL, 2000 apud WORLD WATER
ASSESSMENT PROGRAMME, 2009).
Como um exemplo de mitigação em Pequenos Estados Insulares em
Desenvolvimento (SIDS) que enfrentam muitas tempestades, a população armazena as
águas das chuvas em bacias nos telhados de suas casas e este é o recurso primário para
ter acesso à água potável. Por isso, em período de secas, o acesso à água para as
necessidades básicas fica comprometido e, devido à escassez, o governo providencia o
armazenamento de água em tanques, cobrando uma taxa para o seu fornecimento ou
importando água potável de outros países, mas que normalmente são de alto custo. Em
alguns casos, realizam também sistema de coleta pluvial em locais como superfícies de vias
pavimentadas ou até mesmo em barris de plásticos sob a coroa de coqueiros, que
armazenam grande quantidade de água da chuva ou então, substituem a água potável por
água de coco. Além desses mecanismos, são realizadas dessalinização da água e
reciclagem de águas para reuso.
Em períodos de seca extrema, as populações migram para outras regiões/países;
são os chamados deslocados ambientais. Com os possíveis efeitos das mudanças
climáticas, esse fenômeno tende a se agravar nos Pequenos Estados Insulares em
Desenvolvimento. Sendo assim, os governantes dos países que recebem esses imigrantes,
como Austrália e Nova Zelândia, necessitam se preparar e se adaptar para tal situação.
Partindo do pressuposto de que estes Estados não possuem grandes capacidades
de influenciar o Sistema Internacional e que agindo individualmente não teriam forças
efetivas nas negociações, o agrupamento é um mecanismo para que os mesmos possam
aumentar seu poder de barganha e conseguir atingir seus objetivos no cenário internacional
(BETZOLD; CASTRO e WEILER, 2011). Outro ponto a ser considerado é que, através da
securitização dessa temática e da atuação diplomática destes Estados, os SIDS possam ter
uma maior capacidade de agência e de inserção no ambiente internacional, já que acabam
se tornando atores relevantes em várias negociações internacionais relacionadas à questão
ambiental.
Um argumento que enfatiza essa ideia é o afirmado por Braveboy (2008) de que os
pequenos Estados lidam com pressões de corporações e sociedade civil , com as
limitações de recursos, com a expansão da agenda da política exterior, com os custos e
com os orçamentos reduzidos. Para atuar nesse ambiente de negociação, os pequenos
Estados precisam ser particularmente inteligentes, eficientes economicamente e elaborar
estratégias apropriadas para atender a seus objetivos de política externa.
É importante ressaltar que estes Estados compartilham desafios e preocupações
quanto ao desenvolvimento ambiental, devido às fragilidades a desastres naturais,
especialmente em função da vulnerabilidade aos efeitos das mudanças climáticas, que
acabam desencadeando outros impactos, relacionados à: biodiversidade, ecossistema,
energia, segurança alimentar, recursos hídricos, dentre outros.
Dessa forma, os SIDS participam como um corpo diplomático único nas conferências
internacionais ambientais e buscam negociar nas reuniões das Nações Unidas (ONU), como
as da Assembleia Geral e as do Conselho de Segurança, uma maior cooperação
internacional por parte dos Estados mais poderosos, de forma que exista uma proteção mais
efetiva dos seus territórios e das suas populações.
2 MODELO ANALÍTICO
O campo de estudos de segurança tem se tornado um dos mais dinâmicos e
contestados das Relações Internacionais nas últimas décadas. Dentre os formuladores da
abordagem dos novos temas de “securitização” encontra-se a Escola de Copenhague, um
corpo de pesquisa associado principalmente aos trabalhos de Barry Buzan e Ole Waever,
que tem desenvolvido um instrumento relevante, chamado de Teoria da Securitização. Essa
teoria destaca a natureza política do “fazer” segurança, desafiando a abordagem tradicional
de segurança e introduz uma perspectiva social construtivista, que considera o modo como
os problemas são transformados em questões de segurança (BARBOSA, 2008).
Segundo Buzan, Waever & Wild (1998), o conceito de Segurança Internacional para
as Relações Internacionais foi alargado, a partir da intensificação da globalização e
integração dos países, advento de uma nova configuração internacional após a Guerra Fria.
Os estudos de segurança deixaram de se basear somente na visão clássica realista, que
entende a segurança como afeta exclusivamente à questão militar – segurança do Estado,
considerando sua soberania e integridade territorial como aspectos fundantes - e deu
espaço para novas perspectivas do estudo de Segurança.
Além da variável militar, novos fenômenos passaram a ser considerados como
ameaças aos Estados e aos indivíduos, tais como: redes terroristas, crises econômicas,
epidemias mundiais e variações ambientais, que são consideradas riscos globais. A agenda
ampliou-se em relação à agenda tradicional. Com isso, o estabelecimento de uma agenda
não depende somente dos esforços dos agentes; é necessário que a questão apresentada
seja reconhecida como uma ameaça à segurança, pois para a Escola de Copenhague as
ameaças à segurança são socialmente construídas (BUZAN, 1997).
O conceito de securitização proposto pela Escola de Copenhague é baseado na
perspectiva construtivista, de que o mundo social, assim como as identidades e os
interesses dos agentes, é construído por estruturas e processos intersubjetivos e coletivos.
Pois, a realidade internacional é construída através de uma relação dialética entre os atores,
através do discurso. A audiência (público) identifica-se naquilo que está sendo construído
como um problema de segurança. Há maior dificuldade em se convencer a audiência
quando o objeto de referência não é de natureza militar. Dessa forma, o discurso depende
muito do agente que o produz, de onde fala e de sua capacidade de convencimento. Essa
questão remete ao problema da legitimidade e do reconhecimento do agente securitizador,
considerada a audiência para a qual o discurso é emitido.
Enquanto os tradicionalistas vinculam o estudo da segurança à existência de
ameaças objetivas, os autores da Escola de Copenhague consideram que a securitização e
os critérios para securitização são práticas intersubjetivas, por meio das quais um agente
securitizador procura estabelecer socialmente a existência de uma ameaça à sobrevivência
de uma unidade, alertando a prioridade de ação para conter uma ameaça, com o intuito de
que sejam tomadas medidas para que a mesma unidade seja preservada. (BUZAN et al.,
1998, p. 29-31)
A Escola de Copenhague trabalha com a análise de discurso compreender o
processo pelo qual determinada questão passa a ser considerada como um problema de
segurança. Para BUZAN et al (1998) a securitização é um "ato de fala"3. A segurança não é,
necessariamente, um objeto que se refere a algo objetivo; mas a fala, o discurso em si é o
ato fundamental que constitui um determinado objeto, material ou não, como uma ameaça.
Significa dizer que algo não se constitui uma ameaça por si mesmo. Esse processo depende
da percepção de um agente quanto à ameaça e de sua capacidade de convencer uma
audiência de que tal percepção faz sentido. Ao dizer "segurança", um representante estatal
3 Versão livre de speech-act
faz referência a um acontecimento em uma área específica, e demanda um direito especial
para utilizar quaisquer meios que se fizerem necessários para evitá-lo (BUZAN et al., 1998).
Isto é, demanda condição para agir de forma emergencial, a partir de medidas
emergenciais.
A ideia é que a segurança é construída por um ator securitizador (securitizing actor),
que identifica e difunde que há uma ameaça existencial, a depender de sua capacidade para
convencer discursivamente a audiência quanto ao risco do objeto em questão, e que tal
risco sugere uma condição de ameaça (referente object). A teoria identifica a presença de
atores periféricos (functional actors), que influenciam no processo de securitização. Portanto
para se estudar a securitização, é necessário estudar os discursos de securitização que o
agente securitizador profere não só à sobrevivência de uma unidade, como também à
prioridade de ação para conter uma ameaça à existência dessa unidade, sem
necessariamente utilizar a palavra "segurança". Pois se o tema é legitimado como afeto à
segurança e necessita de uma ação emergencial, deve-se preocupar primeiro com a
questão em risco, para depois se preocupar com as demais (BUZAN et al., 1998).
O discurso de securitização não acarreta a securitização de um tema de forma
automática; ele é apenas uma iniciativa de securitização que pode ser aceita ou não. A
securitização só é efetivada quando o público considera legítima a demanda do agente
securitizador (há uma negociação ao nível discursivo entre governo e população para tratar
do tema como uma questão de segurança).
Ao considerar a questão como um problema de segurança, a ameaça estabelecida
justifica a quebra das regras normais da política (caso seja necessário) com vistas a
contrabalançar essa ameaça. Dessa forma, segundo a Teoria da Securitização, os
tomadores de decisão irão fazer o que for possível e necessário (mesmo que isso não esteja
expresso no discurso) para proteger sua população. Quando um tema é securitizado, ele sai
da esfera da política normal e passa para a esfera da política emergencial, pois a
emergência justifica as ações não balizadas pelo que está institucionalizado (BUZAN et al.,
1998).
O processo que torna uma questão como afeta à segurança implica, como visto,
legitimidade do agente securitizador. Ao tomar medidas emergenciais em relação a tal
questão, pressupõe-se que o governo tem legitimidade e canaliza mais recursos
econômicos para proteger o que está em risco e evitar catástrofes. Dessa forma, busca-se
compreender a “securitização” de novos temas na agenda internacional, como a temática
ambiental e especificamente a questão das mudanças climáticas. Assim, cientistas,
principalmente aqueles ligado ao IPCC, têm construído uma conexão causal entre as
mudanças climáticas e as consequências que geram na intensificação de fenômenos
naturais. A essas consequências tem sido conferido um sentido de ameaça seja às
condições econômicas atuais seja à vida dos indivíduos.
A tragédia no desenvolvimento dessas irreversíveis perdas de todas as formas de
vida em que os recursos para a população humana e o crescimento sem controle do
consumismo geram uma crise ambiental global. As poluições causam consequências como
qualidade da saúde humana, segundo estudiosos do IPCC os gases de efeito e3stufa e as
mudanças climáticas já excederam os piores cenários. E as manifestações dessa crise
alcançam e ultrapassaram a fronteira da segurança ambiental incluindo acidificação dos
oceanos, má gestão da terra, poluição química, incluindo ameaças ao ciclo do nitrogênio,
biodiversidade, camada de ozônio, dentre outros. Sendo que, em algumas regiões do globo,
as ameaças são mais severas do que em outras (LAUTENSACH & LAUTENSACH, 2014)
Por se tratar de um fenômeno novo, que segundo estudiosos, gera riscos e incerteza
para as relações entre os atores no Sistema Internacional, podendo significar ainda
ameaças aos indivíduos, questões como a garantia de acesso à água, necessidade de
proteção contra eventos extremos – inundações ou secas – e também incertezas quanto à
futura existência dos Países - Ilhas têm sido entendidos como temas de segurança e
tratados nas conferências internacionais como emergenciais para a proteção da vida e para
a garantia das condições da sobrevivência humana.
O conceito de segurança segundo o UNITED NATIONS DEVELOPMENT
PROGRAMME (1994) era visto há muito tempo como a segurança do território contra
agressões externas, a proteção dos interesses nacionais na política externa ou como uma
segurança internacional que fosse ameaçada igualmente para todos os países. Este
conceito estava mais relacionado aos Estados- Nação do que as pessoas.
Mas o conceito de Segurança Humana apresentado no Relatório de 1994 do PNUD
afirma que o sistema internacional deve proteger a soberania nacional e os direitos
individuais e que, portanto, o conceito de segurança deveria ser reformulado. Pois, a
segurança humana é uma preocupação universal e relevante para as pessoas de todas as
partes do planeta, sejam nos países ricos como nos países pobres e muitas ameaças são
comuns a todos, como as drogas, a criminalidade, a poluição e a violação dos direitos
humanos. Segundo ainda o PNUD, a intensidade pode diferir de uma parte do mundo para a
outra, mas as ameaças à segurança humana são reais e crescentes.
O conceito de segurança humana segundo o UNITED NATIONS DEVELOPMENT
PROGRAMME (1994) é centrado nas pessoas, preocupa com a forma como as pessoas
vivem em uma sociedade, se vivem em conflito ou em paz. É um termo interdependente,
pois quando a segurança de pessoas está em perigo em qualquer lugar no mundo, seja por
eventos naturais, terrorismo, tráfico de drogas, todas as nações podem se envolver, já que
os eventos não são mais isolados nas fronteiras nacionais.
O relatório afirma ainda que, a segurança humana é mais fácil de assegurar pela
prevenção precoce do que pela intervenção mais tarde, é menos custoso. A lista de
ameaças à segurança humana segundo PNUD (1994) é longa, mas podem ser
consideradas sete categorias principais: segurança econômica, segurança alimentar,
segurança da saúde, segurança ambiental, segurança pessoal, comunidade de segurança e
Política de segurança.
A segurança humana é centrada na proteção do núcleo vital de todas as vidas
humanas de forma que melhore as liberdades humanas e o seu atendimento em situações
de ameaças. Deve existir à vontade e a capacidade para manter a segurança e a
estabilidade da integração dos sistemas políticos, sociais, ambientais, econômicos, militares
e culturais (LIOTTA and OWEN, 2006).
A Segurança Humana é a perspectiva profunda dos estudos de segurança, com
ameaça à sobrevivência de sociedades, grupos e indivíduos. Dessa forma, as mudanças
climáticas podem ser consideradas como uma ameaça construída de um problema de
segurança humana, tendo em vista que é uma crença causal, de ameaça ambiental, que
afeta o valor de risco de sobrevivência e a qualidade de vida dos indivíduos e da
humanidade. E pode ser considerado também, através da ameaça construída, como um
problema de segurança ambiental, já que o discurso securitizador do tema afirma que tal
fato pode afetar ecossistemas e espécies, que envolve valores de risco como a
sustentabilidade e que trata da forma de ameaça que envolve a poluição, o aquecimento
global e a destruição de habitat naturais.
No que respeito à discussão do conceito de segurança, estudiosos das questões
ambientais admitem a ideia de segurança ambiental, entendida como segurança em relação
a efeitos críticos adversos causados direta ou indiretamente pelas mudanças ambientais. A
definição de segurança ambiental, também perpassa pelas à segurança das pessoas ou
entidade políticas associadas a esse ambiente. Sendo que, as mudanças climáticas podem
ser um exemplo dessas ameaças. (LAUTENSACH & LAUTENSACH, 2014)
O conceito de Segurança Ambiental é ainda mais amplo que o de Segurança
Humana, uma vez que ameaças como desastres naturais e o aquecimento global colocam
em risco a vida de outras espécies e ameaça o ecossistema da terra, indispensável à
manutenção de qualquer forma de vida. Segundo Mcdonald (2005) é possível pensar as
mudanças climáticas globais como uma questão de segurança internacional socialmente
construída, devido ao caráter de ameaça à vida humana, ao ecossistema e ao sistema
internacional que a mesma apresenta.
Como a questão de segurança deveria ser focada na sobrevivência da humanidade e
as questões ambientais passaram a ameaçar, justamente, a sobrevivência da humanidade,
essas passaram então, a ser incluídas na agenda de segurança. Tendo em vista que,
quando há ameaça a vida, uma questão passa para o topo da agenda de discussão dos
tomadores de decisões. O impacto catastrófico que as mudanças ambientais poderiam ter
sobre a sociedade internacional, tornaram essas questões parte dos estudos de segurança
(MCDONALD, 2005).
Outro ponto importante é que, as questões de segurança de uma maneira geral têm,
mesmo que implicitamente, um posicionamento de valor e de ideologia. O raciocínio por trás
desse argumento é o de reconhecer e elevar o Meio Ambiente como uma questão de ‘high
politics’ na área de segurança, para que a mesma tenha maior atenção política,
financiamento das agências internacionais e seja tratada como prioridade, por ser uma
questão de ameaça e de urgência, que demanda uma solução eficaz.
Segundo as projeções, os países em desenvolvimento sejam eles do continente
americano, africano, asiático ou no Oriente Médio, serão as regiões mais atingidas por
essas mudanças climáticas. Contudo, existe um entendimento de que esses países ou
regiões não são os principais causadores desse problema, uma vez que eles foram gerados
pelos países desenvolvidos, que tiveram, desde a Revolução Industrial, uma grande
emissão de gases de efeito estufa pela modernização de suas máquinas e indústrias
(OBSERVATÓRIO DO CLIMA, 2008).
BUZAN & WEAVER (2009) consideram a aliança AOSIS dos pequenos Estados
insulares ameaçados pela elevação dos mares, como uma ordem existente e um
universalismo de ameaça física que pode operar no nível sub global, criando uma
possibilidade semelhante de unir um subconjunto de atores contra alguma ameaça
comumente realizada. O planejamento e estratégia para lidar com os riscos e ameaças das
mudanças climáticas ao longo prazo, adotando medidas de prevenção e adaptação, podem
ser vistas como um aceite desse discurso de segurança.
Assim, este possível trabalho não pretenderá discutir se os efeitos das mudanças
climáticas são ou não “reais”, nem se esses efeitos geram uma ameaça “real”. O que se
pretende é discutir como a tal questão tem sido imputado um sentido de ameaça.
Lembrando que a securitização é um processo, dessa forma, o presente trabalho busca-se
compreender esse fenômeno.
Giddens (2009) apresenta o paradoxo da questão das mudanças climáticas,
afirmando que a ameaça não é desconhecida pela população, que as incertezas
apresentadas pelos cientistas, apontam desde as mais radicais até as mais brandas
consequências e que há um risco para a população do planeta. Diante dessa situação, os
tomadores de decisão enfrentam o dilema de que podem ser adotadas medidas agora, para
evitar um maior dano no futuro ou aguardar que esses danos sejam mais críticos e terem
que ser tomadas medidas mais dramáticas. Neste ponto, o autor chama a atenção para o
fato de que lidar com o aquecimento global demanda uma perspectiva de longo prazo que
deve ser efetivada tanto na política doméstica como na política global e que a adoção de
tais políticas demanda planejamento.
Segundo as reflexões de Giddens (2009) sobre a inclusão desse tema na agenda
dos países, o autor alerta que a temática não se trata de algo novo, mas já alertado e
discutido há muito tempo pelos cientistas e tomadores de decisão de todas as partes do
globo. Afirma que o debate da temática deve ser promovido no âmbito doméstico,
garantindo a formulação de política que não sofra com as alternações de governo,
pensando em medidas de adaptação e de mitigação que demanda um alto grau de
investimento financeiro, que muitos países vulneráveis, como os Pequenos Estados
Insulares em Desenvolvimento não possuem. Além disso, há outros desafios propostos que
incluem a participação de organismos da sociedade civil, de empresas e agentes
empresariais, o desenvolvimento de tecnologias, dentre outros.
No que diz respeito à questão das mudanças climáticas Giddens (2009) reforça que
a questão não pode ser adiada e que mesmo os países em desenvolvimento, apesar de
terem suas economias ainda emergentes e não terem sido os principais responsáveis pela
mudança do clima, estes já não possuem as mesmas emissões de gases de efeito estufa
do que antigamente e que por crescerem significativamente, o que pode comprometer o
futuro do planeta.
Neste trabalho, será adotada a visão do Construtivismo como teoria social das
Relações Internacionais, os pontos teóricos sobre difusão de normas e socialização dos
Estados, ligado ao que moldam o comportamento dos Estados e dos atores no sistema
internacional. A ontologia é baseada principalmente sobre a constituição mútua de estrutura
e de agência. Mesmo que as estruturas permitam o comportamento dos atores, estas são
reproduzidas e transformadas pelos próprios comportamentos dos atores. As estruturas são
conceituadas por normas, culturas e identidades. (STEVENSON, 2014) A intersubjetividade
apresenta o conhecimento compartilhado ao invés de crenças individuais, como pode ser
observado no caso deste trabalho, do conhecimento compartilhado relacionado às
mudanças climáticas.
A agência é uma propriedade de atores que indicam a sua capacidade de atuar de
acordo com as situações, para formular e implementar decisões de indivíduos que atuam
como um ator único. Conforme verificado neste trabalho, através do agrupamento dos
Pequenos Estados Insulares em Desenvolvimento (SIDS) estes países atuam em conjunto
como um ator único no âmbito da estrutura (sejam como um corpo diplomático único no
caso da AOSIS nas Conferências das Partes – COP´s- sobre mudanças climáticas).
Significados intersubjetivos constituem estruturas, que por sua vez constituem agentes.
Além disso, os interesses e as identidades dos atores não existem antes da sua própria
interação com a estrutura (STEVENSON, 2014).
Dessa forma, compreender interesses e identidades requer, portanto verificar o
contexto social em que estes atores estão formados e estão sendo transformados. Tendo
em vista que, a depender do contexto social em que os mesmos estão inseridos, estes não
são estáticos, mas estão em uma transformação durante um certo período de tempo,
incluindo mudanças dentro da estrutura normativa da governança global e da resposta dada
pelos países às essas normas. (STEVENSON, 2014). Conforme será estudada neste
trabalho, procura-se verificar como os Pequenos Estados Insulares em Desenvolvimento
respondem as normas relativas a maneira como esperam que esses atores hajam no
âmbito internacional, através do que é indicado e sugerido nos relatórios do IPCC.
Uma das principais preocupações dos estudiosos construtivistas é compreender e
explicar os processos de mudança em Relações Internacionais e as respostas dadas pelos
Estados em relação às essas normas. Segundo Katzenstein (1996) normas podem ser
entendidas como expectativas coletivas para o comportamento adequado de atores que
compartilham de uma mesma identidade”. No caso deste trabalho, ao estarem ameaçados
pelas mudanças climáticas, os Pequenos Estados Insulares em Desenvolvimento
compartilham a mesma identidade e portanto, espera-se um certo tipo de comportamento
desse grupo de países para lidar com a questão.
As normas e lógicas definidas ao longo da trajetória ambiental, como o conceito de
“responsabilidades comuns, porém diferenciadas” principalmente no que diz respeito às
mudanças climáticas, de que os países desenvolvidos teriam mais peso sobre as
consequências do aquecimento global, tendo em vista que ao longo da história, estes foram
os que mais poluíram ao se desenvolverem economicamente desde a Revolução Industrial,
enquanto os países em desenvolvimento por ainda estarem nesse processo deveriam ter o
“direito” de ainda serem isentos de responsabilidades quanto à redução de emissões de
gases de efeito estufa. Apesar de a norma ser difundida e adotada como comportamento
esperado pelos atores, conforme foi apresentado, o Construtivismo alerta para a questão da
mudança no processo em que os agentes interiorizam as normas que constituem a
estrutura social existente (STEVENSON, 2014).
Dessa forma essa norma de “responsabilidades comuns, porém diferenciadas” está
sendo revista e transformada. Esse é um dos principais entraves nas negociações sobre o
clima e que os Estados estão buscando definir um novo tratado que substitua o Protocolo
de Kyoto e coloque metas para países em desenvolvimento que já possuem o maior nível
demissões de gases de efeito estufa, como a China.
Os pontos teóricos sobre difusão de normas e socialização dos Estados aqui
apresentado, buscam oferecer as bases para a compreensão teórica do objeto em questão
neste trabalho. Observar como os Pequenos Estados Insulares em Desenvolvimento
respondem a securitização das mudanças climáticas, afirmadas pelos relatórios do IPCC
nas suas interações entre atores estatais com interesses socialmente construídos.
3 OBJETIVOS
Objetivo Geral:
Compreender como os Pequenos Estados Insulares em Desenvolvimento (SIDS) recebem o
discurso do IPCC sobre as mudanças climáticas e analisar se as respostas dadas por estes
países reforçam a tendência de securitização da temática.
Objetivos Específicos:
- Verificar o discurso securitizador nos relatórios do IPCC ao alertar, informar e orientar os
Pequenos Estados Insulares em Desenvolvimento (SIDS) para lidar com as ameaças e os
riscos das mudanças climáticas;
- Identificar como os SIDS respondem à securitização das mudanças climáticas seja através
da reprodução do discurso que recebem do IPCC, do posicionamento enquanto grupo na
Assembleia Geral, no Conselho de Segurança e nas conferências ambientais regionais
(como a UN Conference on Small Island Developing States, dentre outras no âmbito do
Pacífico, Caribe e Oceano Indico) e internacionais (no caso do Regime Internacional de
Mudanças Climáticas, o posicionamento da AOSIS nas COP´s);
- Compreender se as respostas dos SIDS reforçam ou não a perspectiva da securitização
das mudanças climáticas através das medidas adotadas no âmbito doméstico propostas
através das declarações/documentos apresentadas em encontros nos Fóruns Regionais dos
Pequenos Estados Insulares em Desenvolvimento;
- Comparar através de estudos de casos4, como os SIDS lidam com a necessidade de
adoção às medidas emergenciais, de adaptação e de mitigação frente às mudanças
climáticas a depender do tipo de ameaça enfrentada (vulnerabilidade alta ou baixa, baseada
no índice de vulnerabilidade5); da economia do país (índices como PIB, IDH) das
prioridades, dos investimentos financeiros e da capacidade de atração de recursos externos;
- Identificar a existência ou não de medidas preventivas e/ou políticas de segurança dos
países escolhidos como estudos de caso, analisando se há prioridade na agenda
governamental destes países e também dos países desenvolvidos vizinhos (como Austrália,
4 Ainda não foram escolhidos os países para o Estudo de Caso, mas provavelmente Tuvalu será um deles, dentre
outros, como Cingapura (maior poder socioeconômico). 5 http://index.gain.org/ranking/vulnerability e http://www.vulnerabilityindex.net/
por exemplo) para receberem parte da população ao considerarem o possível
desaparecimento de seus territórios.
4 METODOLOGIA
Esse projeto seguirá a lógica do Modelo Compreensivo, no campo das Relações
Internacionais, seguindo a lógica de algumas obras, como: Explaning and Understanding
International Relations, de HOLLIS, M. & SMITH, S. 1991; Introducción a las Ciencias del
Espíritu de DILTHEY, W., 1956; essa tese procurará relacionar os fatos, para assim
compreender os sentidos dos mesmos.
Conforme apresentado, a proposta de tese irá lidar com a perspectiva Construtivista.
Para que sejam alcançados os objetivos aqui propostos, o elemento ontológico a ser
trabalhado é compreender como, dentro da estrutura internacional, são construídas as
lógicas entre os agentes, dessa forma, será realizada a técnica de análise de conteúdo dos
documentos oficiais do IPCC, das SIDS, da AOSIS, além de uma busca por documentos
nos sites dos órgãos administrativos de cada uma das regiões. Como forma de
sistematização dos documentos e dados, será realizada, a análise de conteúdo de atas de
reuniões seja da Assembleia Geral ou do Conselho de Segurança da ONU, onde há
representações desses Pequenos Estados Insulares em Desenvolvimento e discussões
acerca da temática de segurança climática.
A análise de conteúdo, segundo Bardin (1977) é um método empírico, que depende
do tipo de fala a que se dedica e do tipo de interpretação que se pretende como objetivo.
Analise de conteúdo é um conjunto de técnicas de análise das comunicações e que se
aplicam a discursos diversificados. É um tratamento da informação contida nas mensagens
principalmente na área das ciências sociais, com objetivos bem definidos e que servem para
desvelar o que está oculto no texto, mediante decodificação da mensagem.
Em função da teoria de securitização escolhida, serão trabalhadas as linguagens, o
ato da fala e as identidades presentes nos discursos, para que a realidade possa ser
compreendida. Já que nesse modelo, a percepção dos atores constrói o objeto, que se torna
um problema de segurança. Como ferramenta técnica de pesquisa, inicialmente a ideia
dessa pesquisa é a realização de uma análise de discurso AD2 – Construtivista – para
compreender a maneira como os atores interpretam a realidade, a questão que está sendo
securitizada.
Será realizada a análise de discurso dos atores que serão identificados como
responsáveis pela internalização das políticas internacionais nos Pequenos Estados
Insulares quanto às ameaças dos eventos extremos de mudanças climáticas. Essa etapa do
trabalho será muito importante, pois a análise do discurso envolve algo mais do que saber o
que se fala, envolve saber quem fala, para quem fala, como falam e para que falam, pois o
discurso, segundo a Teoria da Securitização e a abordagem Construtivista nas Relações
Internacionais, pode ter inúmeras funções e significados.
A análise de discurso é uma técnica considerada por Bardin (1977) como uma
análise de conteúdo, onde é possível estabelecer uma relação entre a produção do saber e
o discurso tido como dado e verdadeiro. O objetivo da análise de discurso é, portanto,
alcançar uma significação profunda da realidade que foi conferida pelo locutor no próprio ato
de produção do texto discursivo (ROCHA & DEUSDARÁ, 2005).
Serão analisados documentos e discursos em conferências internacionais que tratam
o tema de Adaptação as Mudanças Climáticas e redução de risco de desastres nos
Pequenos Estados Insulares em Desenvolvimento (SIDS). Além disso, será analisado no
âmbito do Regime Internacional de Mudanças Climáticas, os discursos da Aliança dos
Pequenos Estados Insulares (AOSIS) que representam alguns dos SIDS.
Como o foco dessa pesquisa será compreender como os Pequenos Estados
Insulares respondem à questão da securitização, serão também analisados os discursos
oficiais desse grupo nas principais Conferências Internacionais ambientais das Nações
Unidas, como a Rio+20; além de observar os discursos da AOSIS nas Conferências das
Partes (COP´s) das principais negociações dentro do Regime Internacional de Mudanças
Climáticas. Serão observados também os discursos desses países nas conferências
regionais locais (Caribe, Pacífico, Indico) sobre a questão climática.
Como exemplo, um discurso de país Nauru, em nome da OASIS, proferido no dia 8
de Dezembro de 2012, na Conferência das Partes (COP 18) do Regime Internacional sobre
Mudanças Climáticas, ocorrida em Doha:
[…] Nós, da OASIS viemos a Doha para proteger nossos interesses com base na ciência e no direito internacional. A vida do nosso povo e o futuro dos nossos países estão em jogo. Nós vemos o projeto de rascunho anterior, profundamente deficiente em ambições de mitigação e de financiamento. O pacote atual não fechou a lacuna da ambição e é provável que trave em uma trajetória de mais de 3, 4 ou 5 graus Celsius de aumento na temperatura global. [...] devemos empenhar os nossos Governos [...] e garantir que assentados ao redor da mesa estejam olhando para as soluções que beneficiariam a todos nós. [..]. Precisamos de resultados deste processo que protejam os mais vulneráveis entre nós. É também muito necessário que estejamos realmente indo enfrentar as mudanças climáticas e reduzir as emissões. Precisamos tomar o caminho correto como nós caminhamos neste caminho, ou este processo entrará em colapso e as nossas nações irão desaparecer (ALLIANCE OF SMALL ISLAND STATES, 2012ª versão livre).
Outro ponto importante é que, como esse trabalho terá três níveis de análise:
internacional, regional e doméstico. No âmbito regional e doméstico, será feita um recorte e
uma escolha de Estudos de Casos para que haja um maior aprofundamento da pesquisa no
âmbito interno desses países. Dessa forma, como o foco desse estudo será a resposta
dada por esses países como forma de aceite da ameaça dada pela securitização das
mudanças climáticas, será necessário analisar as práticas desses Estados, manifestadas
através de documentos oficias, como leis, acordos, tratados ou até mesmo políticas
públicas e projetos realizados no âmbito doméstico de alguns desses países.
Assim, outro método a ser utilizado neste trabalho é o Estudo de Caso. Pois, tendo
em vista que são 52 Pequenos Estados Insulares em Desenvolvimento, por uma questão de
recorte, não será possível trabalhar com todos estes países. Dessa forma, será utilizado o
termo SIDS e AOSIS para se referir à representatividade do grupo nas conferências
internacionais, onde estes países respondem em conjunto à questão da securitização das
mudanças climáticas.
Para compreender o comportamento em questão (resposta dos Pequenos Estados
Insulares em Desenvolvimento à securitização das mudanças climáticas) haverá uma série
de variáveis que influenciarão neste comportamento, tais como o nível de vulnerabilidade às
consequências das mudanças climáticas, tipo de economia, etc. Há um trabalho de
MATTAR, 2012, que apresenta os dados de todos estes países, mas que precisam ser
atualizados (essa também será uma das ações deste trabalho):
FIGURA 1: Tabela dos dados/características Geográficas e Socioeconômicas dos
Estados/Territórios os dos Pequenos Estados Insulares em Desenvolvimento:
FONTE: MATTAR, 2012.
A partir desses dados, será feito um estudo para a escolha de alguns países em
meio a grande adversidade dos SIDS, para que seja realizada uma pesquisa mais
aprofundada de alguns casos para ser trabalhado o tema em questão. Como critério de
escolha dos países para os Estudos de Casos, portanto, será levado em consideração: o
pertencimento a outros grupos de coalização dentro do RIMC, os níveis de vulnerabilidade,
a economia e a localização geográfica desses países.
Segundo Miller e Brewer (2003) apesar das críticas, os estudos de caso continuam a
fornecer algumas das pesquisas mais interessantes e inspiradoras nas Ciências Sociais.
Pois, segundo estes autores, a abordagem de estudo de caso surgiu a partir do desejo de
compreender os fenômenos sociais na sua complexidade e este método, oferece uma
compreensão profunda a cerca do objeto em estudo.
Por fim, é importante ressaltar que, o parâmetro de pesquisa adotado seguirá uma
lógica compreensiva, de que a partir da pergunta geral, serão definidos pressupostos
através de perguntas menores, tendo em vista que não há hipóteses para serem testadas, já
que não se trata de um trabalho explicativo. Para o cumprimento dos objetivos propostos, a
metodologia adotada neste trabalho consiste em analisar dados quantitativos e qualitativos,
buscando compreender através das técnicas apresentadas, a compreensão efetiva do
problema.
REFERÊNCIAS
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