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  • O Projeto Poltico Pedaggico: Concepes e Prticas1

    Political-Pedagogical Project: conception and practice

    Ademar de Lima Carvalho2

    1 Este artigo refere-se a parte de uma pesquisa realizada com dez diretores e dez coordenadores pedaggicos da rede pblica estadual e municipal de ensino de Rondonpolis/MT em 2007.

    2 Professor do Departamento de Educao do campus Universitrio de Rondonpolis/MT e do Programa de Ps-Graduao em Educao da UFMT; Doutor em Educao pela UNESP/Marlia e Mestre em Educao Pblica pela UFMT. Endereo: Av. Fernando Corra da Costa, s/n. Coxip, Cuiab-MT, Brasil. E-Mail: .

    Resumo

    Este artigo trata da questo da gesto na escola. Tem por objetivo compreender que importncia que o diretor e o coordenador atri-buem ao projeto poltico pedaggico no proces-so de organizao da estrutura administrativa e pedaggica da escola. O ponto de partida da reflexo recai sobre a problemtica da organi-zao do trabalho pedaggico consubstanciado na experincia de gesto e coordenao no coti-diano da escola. Parte da compreenso de que a prtica que constri a educao, o modo de ser da gesto, da coordenao pedaggica, bem como de toda manifestao da existncia humana. Neste sentido, entende que o projeto poltico-pedaggico se configura como eixo norteador para a ao educativa, tendo em vis-ta que nele que as finalidades polticas mais amplas da escola so traadas.

    Palavras-Chave: Gesto democrtica. Autonomia. Prtica pedaggica. Processo de formao.

    Abstract

    This paper deals with school management. Its purpose is to understand the importance a director and a coordinator attribute to the political-pedagogical project during the process of organizing the administrative and pedago-gical structure of a school. The starting point of this reflection lies on the problem regarding the organization of the pedagogical work con-substantiated with management experience and coordination in the school everyday life. I start from the comprehension that practice builds up education, the way management and pedago-gical coordination should be, as well as every and each manifestation of the human existence. Thus, it shows that the political-pedagogical project is a starting point to the educational action which takes into account that through it the broadest political aims are mapped out.

    Keywords: Democratic management. Autonomy. Ppedagogical practice. Formation process.

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    Introduo

    O objetivo deste texto apresentar uma reflexo acerca do que pensam o diretor e o coordenador sobre o projeto poltico-pedaggico da escola. Tomamos como eixo norteador das anlises um situar entre o imaginrio e a experincia de gesto e coordenao no cotidiano da escola, por pensarmos em oferecer uma contribuio significativa para uma melhor compreenso do processo de ordenao da gesto, sobretudo do projeto poltico pedaggico enquanto edificador de pontes e exerccio constitutivo da educao como prtica da liberdade.

    O contedo das anlises e reflexes realizadas resultado de uma investigao desenvolvida junto a vinte professores que atuam na funo de diretor e coordenador pedaggico na escola pblica.

    Na investigao, objetivamos compreender que importncia que o diretor e o coordenador atribuem ao projeto poltico-pedaggico no processo de organizao da estrutura administrativa e pedaggica da escola, na dimenso da gesto, autonomia, currculo e formao continuada do professor. Considerando a natureza qualitativa do estudo, para o levantamento dos dados realizamos entrevistas com diretor e coordenador que desempenham sua funo na escola pblica, obedecendo se o critrio de cinco de cada rede.

    Para proceder investigao junto aos diretores e coordenadores pedaggicos na unidade escolar, especificamente na coleta dos dados que subsidiaram nossa anlise nesta investigao, foram colocadas as seguintes questes: como voc define o seu papel de gestor (a) escolar? O que significa o projeto poltico pedaggico da escola para voc? Relatar como se d o processo de construo do projeto poltico-pedaggico da escola. Como pensada a questo da gesto, da autonomia, do currculo, da formao de professores e do pedaggico no projeto da escola? Na sua viso, o plano de trabalho do professor tem uma articulao com o projeto da escola? Em que momento se d esta articulao? De que formas so concretizadas na escola as deliberaes do projeto poltico pedaggico? Que outras contribuies podem-se acrescentar para enriquecer a investigao?

    1 Razo de ser da reflexo

    No espao da organizao escolar, indispensvel que o educador desenvolva, de maneira simultnea, uma prtica pedaggica crtica e construtiva que permita ao estudante aprender a aprender a desvendar o tecido social que o cerca. Nesse sentido, entende-se que o projeto poltico pedaggico [...] justamente a ferramenta, o

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    instrumento, a mediao que propiciar a mudana. (VASCONCELLOS, 2002, p. 27) no processo de pensar, organizar e construir a prtica pedaggica significativa no espao da sala de aula.

    Hoje, o controle da sociedade civil sobre a educao e a escola pblica constitui-se numa realidade necessria, visto que a gesto democrtica - o trabalho coletivo na escola - configura-se como espao significativo que abre para a comunidade escolar o compromisso de reeducar a todos para o exerccio pleno da democracia participativa. Nessa dimenso, compreende-se que a educao acontece no espao da cultura. Como a escola parte integrante do universo cultural, tendo como misso de ampliar a experincia e formao humana na relao de seu espao cotidiano, fundamental a presena e o dilogo problematizador com as diferentes culturas, pois no encontro com as diferentes vertentes da realidade que o sujeito se forma, constituindo-se enquanto sujeito autnomo no modo de ser, pensar e agir.

    Contudo, vale lembrar que a escola o espao de democratizao e incluso social atravs da apropriao da cultura sistematizada. Porm, para que de fato a escola se transforme em instncia social que sirva de base mediadora e articuladora de um projeto que tenha a ver com o agir humano, fundamental desenvolver uma percepo de sujeito em construo, vido e desejoso da aproximao com a realidade social ao seu entorno. Nesse movimento, o encontro da comunidade com uma escola viva possibilita abrir caminhos para a construo da democracia direta e um engajamento no processo de construo da escola cidad, sonhada e gerida, visando a promoo de todos. Nesse sentido que se entende que o projeto constitui [...] a carta de definio da poltica educativa da escola. (ALARCO, 2003).

    Na dimenso da gesto educativa, preciso compreender que o gestor da escola um professor que est a servio do servio que os professores prestam aos seus alunos. Dessa forma, na escola o administrativo se desenha como suporte para o pedaggico. O gestor um professor comprometido com o trabalho pedaggico de sua escola. Enfim, a educao, referenciada pelo pedaggico, que se apresenta como o ponto de partida e o de chegada da ao administrativa.

    O trabalho do gestor escolar ocorre num marco institucional inserido, por sua vez, em contextos polticos e socioculturais. Por isso, fundamental que se compreenda que a escola sofre as determinaes sociais, porque no h como delas fugir, pois toda prtica humana est urdida na esfera poltica. As prprias prticas de ensino, gesto e convivncia tambm so tecidas na mesma dimenso. Melhor dizendo, so polticas. Ento, nada de estranho que todos os educadores passem a compreender que a educao, a organizao escolar, a prtica de ensino e a avaliao constituam uma prtica social, um ato poltico. Logo, o fato real que se quisermos uma escola democrtica, preciso um gestor democrtico. Se quisermos um professor crtico, preciso uma coordenao reflexiva e isso um processo de

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    construo individual e coletiva. A democracia na escola um processo que se constri vivenciando, praticando no contexto nas relaes cotidianas.

    A problemtica do Projeto Poltico Pedaggico - sua construo, execuo, avaliao e autonomia transformou-se numa necessidade emergente do processo organizativo da escola. A partir da LDB/9394/96, no artigo 12, que determina que cada unidade escolar tenha o dever de buscar novos caminhos organizativos para gerir o processo educativo, o projeto pedaggico passa a ter outro sentido para o processo de organizao do trabalho da escola, visto que o artigo 13 da referida lei indica como uma das incumbncias dos docentes participar da elaborao da proposta pedaggica da escola. Tambm prev a lei que a elaborao e cumprimento do plano de trabalho do professor devem ter como referncia fundamental a proposta pedaggica da escola.

    Portanto, mediante a determinao desta legislao, a construo do projeto poltico-pedaggico na escola tarefa de todos os sujeitos que esto inseridos na comunidade escolar. E por isso que:

    A discusso, a elaborao, a execuo e a avaliao dos projetos poltico-pedaggicos das escolas, as reunies de conselhos, os grupos de estudo, as aulas so algumas prticas a serem priorizadas na formao dos professores, criando um novo estilo de gesto e uma nova cultura de construo coletiva do cotidiano na escola e da instituio formadora. (VEIGA, 2004, p. 90).

    O projeto poltico-pedaggico da escola se constitui num instrumento nuclear de mobilizao da comunidade escolar, no sentido de definir sua poltica educativa. Isso significa afirmar que pensar o Projeto Poltico-Pedaggico de uma escola pensar a escola no seu conjunto e a sua funo social. (idem. p. 69). Desse modo, considero oportuno construir uma reflexo a respeito do que pensam o diretor e o coordenador sobre o Projeto Poltico-Pedaggico no contexto da escola pblica, porque o ato de se engajar no movimento de busca de novos caminhos para a formao docente e a organizao do trabalho pedaggico, investigando e pensando a prpria prtica da escola, representa um desafio.

    A razo da reflexo funda-se, assim, na premissa de que a governana da escola de qualidade social para todos toma como eixo de exigncia que a tessitura de um projeto coletivo, institucional e participativo tem muito mais possibilidades de produzir inovaes do que as aes individuais. (idem, p.86). Nesse sentido, entende-se que o projeto poltico-pedaggico tem importncia significativa como eixo norteador do processo de organizao curricular e da formao continuada dos professores.

    Concluindo, compreendo, como Alarco (2003, p. 91), que [...] o projeto deve buscar-se numa viso prospectiva e estratgica do que se pretende para a

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    escola, uma viso interpretativa da sua misso e alicerada nos valores assumidos pelo coletivo dos atores sociais presentes na vida da escola..

    O modelo de gesto desenvolvido numa escola reflete o modelo cultural apropriado pelo diretor que administra a unidade escolar. Porm, entendendo que o papel do gestor escolar reside na capacidade de mobilizar os agentes educativos, alunos e comunidade para a concretizao do projeto institucional, sem nunca perder a capacidade de decidir o que melhor para a realidade em que esto inseridos e sem prejuzo qualidade do ensino (ALARCO, 2003, p. 93). justamente nessa relao entre a dinamizao do projeto institucional e a prtica pedaggica na escola que residiu a problematizao do estudo. nesse movimento de contradio que a reflexo tomou como sendo sua a finalidade compreender e analisar a gesto escolar por intermdio do dilogo com o diretor e com o coordenador pedaggico, ambos subsidiados por uma leitura do projeto poltico-pedaggico da escola.

    2 Pontos significativos extrados da fala dos diretores

    Os diretores concebem o papel do gestor como mediador, articulador das aes da escola, intermediador de todo o processo de ensino e aprendizagem; articulador do pedaggico e do administrativo dentro da escola; o gestor aquele que tem que estar a par de tudo.

    O Projeto poltico-pedaggico da escola significa o documento que norteia todas as suas aes, a espinha dorsal da escola, o eixo que define a eficcia do trabalho da unidade; o foco e a meta da escola.

    Em relao ao processo de construo do projeto poltico pedaggico, enfatizam que h participao de todos os segmentos atravs de reunies. H tambm relato sobre a construo do projeto a partir da busca do esqueleto do projeto de outra escola.

    Na percepo dos diretores, a gesto aberta, pensada no global e dentro da parceria. O ponto importante a ser destacado que a gesto algo que precisa ainda ser muito bem trabalhada, apesar da presente idia de que existe a gesto democrtica.

    No tocante autonomia, entende-se que vem crescendo gradativamente o trabalho em conjunto, caracterstica reveladora da condio do Projeto poltico-pedaggico da escola. Porm, uma autonomia ainda reduzida ao desenvolvimento de projetos pontuais e a mudanas de algumas normas na escola. O maior problema reside na questo da autonomia financeira para gerir a escola pblica.

    Na dimenso do currculo, destaca-se o domnio da prescrio adaptada realidade da escola. Na rede municipal, o tema gerador surge como forma de trabalho pedaggico anunciado por algumas escolas, no fugindo, porm, do caminho traado pelos rgos que definem a questo. A preocupao

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    verificada relaciona-se com conhecer mais a legislao e a necessidade de adequao do currculo da escola, como tambm de uma ampliao da prpria concepo de currculo. Na dimenso da construo do currculo por ciclo de formao humana, observou-se que os professores ainda esto presos lgica da seriao.

    Quanto formao, de maneira geral, as escolas anunciam que trabalham a formao continuada, de carter semanal a maioria - dentro da hora atividade, na semana pedaggica, com um grupo de estudo. A formao desenvolvida na escola conduzida pelos coordenadores.

    No tocante ao pedaggico, afirmou-se o desenvolvimento de atividades em conjunto com o professor, pensando na aprendizagem do aluno. A preocupao recai na questo da organizao do ensino em Ciclos de Formao, traduzida na preocupao com dificuldades metodolgicas, compreendendo-se que o pedaggico tem um papel fundamental dentro da escola.

    Em relao articulao entre o plano de trabalho do professor e o projeto da escola, apesar de afirmarem que, teoricamente, o fazem na prtica isso se apresenta ainda de forma frgil. Os diretores da rede municipal deram maior nfase relao do trabalho do professor articulado com o projeto da escola. O momento da articulao se d nas reunies pedaggicas, no conselho, na hora-atividade e nos encontros de estudos.

    Na forma de concretizar as deliberaes do projeto poltico pedaggico, o ponto convergente entre os diretores entrevistados perfaz a reunio pedaggica, a hora atividade e a hora do planejamento.

    Por fim, apresento outros pontos extrados da entrevista com os diretores, que destaco como significativos: difcil de administrar hoje, devido questo da autonomia, viabilizao de projeto por questo econmica; Os alunos faltam muito e isso traz preocupao; O entrave do projeto poltico pedaggico est na falta de trabalho coletivo; Dificuldade de trabalho por rea porque tem professor que trabalha em diferentes escolas. So dados relevantes e reveladores, pois a questo das condies de trabalho e viabilidade do projeto da escola perpassa tanto a necessidade de rompimento com uma cultura predominante de escola, enraizada no individualismo, como pelas condies imediatas de se estruturar novas possibilidades de trabalho, como a permanncia do professor na escola em dedicao exclusiva ao projeto educativo.

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    2.1 - Breve dilogo com os diretores.

    Embora uma parcela significativa dos diretos tenha uma compreenso do seu papel de gestor escolar, os dados da investigao revelaram que h diretores que tm pouco conhecimento da real funo da gesto, da organizao do trabalho pedaggico da escola. Isso pode ser atribudo, dentre outros fatores, ausncia de formao especfica para exercer o comando da gesto escolar. Por outro lado, vale ressaltar que os dados da formao mostram que, embora a maioria dos diretores seja licenciada em Pedagogia, no h qualificao especifica para ocupar a funo de gestor escolar. Apenas um (01) diretor tem especializao na rea, mas com pouca experincia acumulada no exerccio da funo. Isso significa que no demandou ainda uma aprendizagem significativa da funo que lhe peculiar.

    Assim expressou uma diretora:

    Vou dizer a verdade para voc. Neste ano, enquanto professora, no tinha muito conhecimento sobre o Projeto Poltico Pedaggico. Eu via falar, s vezes chamar para discutir. Para mim, eu no via muita importncia. Agora, na direo, ns tivemos aquela reunio com a professora da Universidade, ela passou na reunio passada sobre o Projeto Poltico Pedaggico e sua importncia. Eu ainda no estou muito por dentro no, mas estou buscando, aos pouquinhos estou me inteirando, porque enquanto professora eu no tinha conhecimento.

    A fala da diretora revela um despreparo terico sobre o papel e funo da gesto escolar, bem como dos elementos essenciais que compem a natureza da organizao escolar. Revela, tambm, a ausncia de prticas anteriores na escola que buscassem discutir e construir o significado do Projeto poltico-pedaggico da escola, pois como professora, numa nova gesto, a diretora traz, de sua experincia anterior, o estranhamento sobre a gesto de um projeto do qual, agora, ela se percebe na responsabilidade de conhecer e de compreender.

    Na concepo de outro diretor, o modelo de gesto desejada, passa inicialmente pelos recursos, pelo investimento:

    Porque voc como gestor tem suas propostas, voc fica amarrado, voc v que necessita, tem muitos entraves. preciso avanar muito na questo da gesto democrtica at a questo de direito da escola, os investimentos no chegam, voc precisa ficar fazendo lobby, voc acaba ficando amarrado. Por ser uma gesto democrtica, se voc no mostrar trabalho, de certa forma voc no consegue uma reeleio.

    Penso que a gesto, para adquirir um carter significativo enquanto articulao da organizao do trabalho escolar, deve ser compreendida como concepo e

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    prtica da ao educativa no cotidiano. Restringir a gesto ao aspecto financeiro significa compreender a organizao da escola apenas na dimenso da administrao burocrtica. Balizar a gesto da escola neste ngulo empobrecer o verdadeiro sentido da organizao do trabalho escolar, como suporte necessrio para o desenvolvimento do trabalho pedaggico no cotidiano da sala de aula

    No tocante autonomia, os dados da investigao revelam que a escola tem certa liberdade para propor e desenvolver as atividades pedaggicas, desde que no se contraponha ao currculo estabelecido, ou que no gere despesas excedentes frente ao recurso pblico j disponibilizado, alm do limite daquele direcionado para o funcionamento da unidade escolar. Assim diz o diretor: a escola tem a autonomia que ela vai trabalhar a metodologia, que ela vai utilizar a forma que vai conduzir o seu trabalho no negando ao aluno alcanar o caminho central que ele necessita para ir para o mundo do trabalho. Percebe-se que a questo da autonomia parece ser o ponto crtico da organizao do trabalho escolar.

    A idia que transparece na fala dos diretores quanto concepo de currculo est associada prescrio determinada pela secretaria. As diretrizes curriculares na prtica se transformam na essncia do currculo desenvolvido na ao educativa da escola, dissociando-se da realidade e das reais necessidades educativas dos educandos, embora se perceba que h um esforo para desenvolver o tema gerador e projetos transversais amarrados ao que est estabelecido pela norma vigente.

    Outro ponto importante destacado pelos diretores que h dificuldade de reunir o conjunto de professores no mesmo horrio na escola para desenvolver a formao continuada. Assim expressou um diretor: [...] os professores no tm como reunir num perodo nico para formao, porque uma boa parte trabalha em outras unidades.. Outro diretor afirma que [...] o excesso de trabalho do professor dificulta a formao, visto que tem professor que lotado em duas redes..

    Uma reclamao que destaco como significativa e que veio de uma diretora quanto ao descumprimento e a descontinuidade dos projetos e repasse dos recursos do Estado para a escola, fazendo com que se inviabilize uma ao contnua dos projetos idealizados pelo conjunto de professores. A diretora reclama por autonomia financeira para que a escola possa viabilizar os projetos necessrios para melhorar a qualidade educativa da escola, ou que pelo menos O parco recurso destinado escola deveria chegar sem longo atraso..

    Quanto articulao do plano de trabalho do professor com o projeto da escola, a maioria dos entrevistados afirmou que o plano de trabalho do professor est de certo modo articulado com o projeto da escola devido ao fato de que, no inicio do ano, durante a semana pedaggica, o conjunto de educadores da escola discute e produz o seu plano de trabalho partindo da avaliao do que foi desenvolvido no ano anterior. O trabalho do professor se articula com o da escola em dois aspectos:

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    no momento de elaborao do projeto busca-se aproximar da realidade do aluno e, mensalmente, no encontro coletivo para avaliar o trabalho. Assim expressou um diretor: [...] mensalmente temos encontro coletivo para verificar o que est sendo trabalhado, verificando o fracasso e sucesso..

    3 Pontos significativos extrados da fala dos coordenadores

    Os coordenadores enfatizam que o seu papel complexo porque acabam se envolvendo em tudo. O ponto de convergncia que na prtica complicado definir o papel da coordenao porque realizam outras funes que no a sua especificamente. Contudo, define-se como a alma da escola, como a mediao entre os professores e alunos. Compreendem que a funo do coordenador auxiliar, assessorar e orientar o professor, articular e coordenar a proposta pedaggica da escola..

    O projeto poltico pedaggico da escola significa, para os coordenadores, a vida, a alma, o esteio, a espinha dorsal, o centro, o cerne, a essncia, o carro chefe, o caminho, todo direcionamento da escola.

    Em relao construo do projeto poltico pedaggico a tnica evidenciada que este construdo pelo conjunto de pessoas que trabalham na escola, com a participao de todos os segmentos. As dinmicas de construo que so diferentes, pois h escola que primeiro trabalha com o professor e o servidor, para depois convidar a comunidade. Outra colhe os dados de modo mais participativo e depois a equipe diretiva que faz a ordenao final. Aqui destaco o fato de a maioria dos coordenadores dizerem que o projeto poltico pedaggico est parado, precisando de reviso.

    Na concepo dos coordenadores a gesto no projeto da escola est pensada em ateno ao pressuposto da democracia, sendo aberta e participativa. Na escola as decises so tomadas em conjunto. Contudo, h coordenador que diz saber que a gesto precisa ser democrtica.

    Na questo da autonomia, entende-se que ela tem um carter relativo, porque apenas se pode falar, agir e decidir sobre algumas coisas: A autonomia a parte mais difcil porque envolve a concepo humana. A que nos dada, meio regrada porque a gente tem dependncia da secretaria da educao. Alm dos projetos verticais desarticulados da escola, a gente esbarra na questo financeira que foge realidade da escola..

    O currculo est articulado com a matriz que vem da secretaria, sendo que a nfase recai sobre o tema gerador. Fora do prescrito, h os projetos desenvolvidos pelas escolas. Destaco essa afirmao: [...] alm do contedo, tudo o que ns temos..

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    A formao est pensada no espao da hora atividade com periodicidade semanal. H grupo de estudo, organizao por ciclo e fase. Um ponto convergente na fala dos coordenadores que no h integrao total dos trs perodos para discutir todos os problemas da escola. Outro aspecto que no h disponibilidade integral do professor para participao no processo de formao, o que compromete o processo pedaggico enquanto contedo da formao dos professores.

    No aspecto da articulao do plano do professor ao projeto da escola, uma grande parte dos coordenadores entende que os professores tentam, mas a maioria no tem articulao direta. H uma articulao mais determinista: Quando a gente faz o plano, eu sei a importncia que ele tem, quando vem para a prtica, aqui na realidade, de repente parece que ele no existe, porque ele precisa ser cobrado sempre. Na realidade, acho que esta articulao no est to presente assim.. Contudo, vale ressaltar que h coordenador, na escola organizada em Ciclos, que percebe certa coeso entre os projetos.

    O momento da articulao do trabalho do professor ao projeto da escola tem sido viabilizado de forma mais direta durante o planejamento na semana pedaggica, nos encontros, nas reunies pedaggicas e na hora atividade dos professores. Mas este trabalho encontra limites nos desencontros de professores que atuam em outras atividades profissionais (em duas redes de ensino, s vezes) e mesmo na resistncia ao encontro de formao coletiva. Por outro lado, para os professores que atuam nas mesmas fases e perodos de trabalho possvel dizer que tem surgido um movimento em direo a um trabalho mais prximo, mais partilhado em sua elaborao e reflexo.

    As deliberaes sobre o projeto da escola esto sendo concretizadas atravs de reunio mensal que algumas escolas fazem com os professores. Por um lado, a equipe diretiva sempre se reuniu para tomar as decises necessrias. Por outro lado, ressalta-se que dentro do Plano de Desenvolvimento da Escola/PDE esto traadas vrias aes, onde cada um recebe uma tarefa para ser executada.

    Finalizando, apresento outros pontos extrados da entrevista com os coordenadores que destaco como significativos para a investigao: [...] para melhorar preciso estar inserida no projeto poltico pedaggico a questo financeira.. E um problema: [...] a ausncia da famlia se responsabilizando pelos filhos na escola. O projeto poltico pedaggico foi sufocado pelo Plano de Desenvolvimento da Escola.. A qualidade da educao e do ensino uma discusso que se faz pouco. Outro aspecto importante foi o destaque dado participao ativa do conselho na escola. H um sentimento, uma necessidade e uma abertura para pessoas ligadas universidade docncia ou pesquisa - para desenvolver trabalho de formao com os profissionais da escola. As experincias neste campo so ressaltadas como boas.

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    3.1 Breve dilogo com os coordenadores

    De certa forma os coordenadores tm uma compreenso da importncia do Projeto Poltico Pedaggico como instrumento fundamental de ordenao do trabalho da escola, na dimenso do coletivo, do pedaggico, do processo de ensino, da aprendizagem e da relao com a comunidade. O Projeto Poltico Pedaggico compreendido como a espinha dorsal, o centro, o cerne que d o direcionamento da vida da escola.

    Portanto, conceber o Projeto Poltico Pedaggico como a espinha dorsal, como o centro que constitui a unidade entre as diversas dimenses do universo da escola, significa compreender que o substrato que urde sua conduo se expressa na concepo da finalidade social da educao e concepo do processo ensino aprendizagem. Significa compreender que o currculo que est no centro do projeto da escola, como nos diz Alarco ( 2003). Neste mesmo movimento, pode-se afirmar que [...] central ao currculo e a escola est noo de educao e de aprendizagem, correlacionados com o de ensino e de avaliao de onde decorrem as de organizao de espaos, tempos e recursos. (p. 86-87). A fala dos coordenadores no expressa de forma mais evidente este entendimento.

    No aspecto de como pensando o currculo no projeto da escola, as respostas indicam um entendimento mais na dimenso do que prescrito e projeto de carter transversal. Na questo da autonomia da escola, a investigao evidenciou que h pouca compreenso e que ela reside na sua capacidade de auto-governar-se e auto-produzir-se na dimenso do pedaggico. Na concepo de Silva Jr (1999, p. 231) [...] pode-se argumentar que a autonomia da escola pressupe a elaborao de seu projeto pedaggico e que este, para ser autntico e se tornar vivel, pressupe o trabalho coletivo como seu modo de organizao. Isto significar entender que o trabalho coletivo, no Projeto Poltico Pedaggico condio fundamental para a conquista da autonomia da escola.

    Por outro lado, vale lembrar que uma coordenadora foi enftica ao dizer que na escola a gente faz de tudo um pouco: cuida da indisciplina que no seria o papel da coordenadora; alm de mediar essa relao entre professor e aluno, processo de ensino e aprendizagem, como orientao, formao dos professores, curso de formao continuada, elaborao de projeto. Frente realidade apresentada pela coordenadora, nos compete refletir que o trabalho polivalente do coordenador pedaggico na escola, descaracteriza o seu real papel, se na prtica assume tarefa que no a sua, ou que muitas vezes da competncia especifica do diretor, de outros profissionais da educao e da famlia. A conseqncia desta descaracterizao do trabalho do coordenador pedaggico na escola o esvaziamento do pedaggico.

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    Contrariamente ao que ocorre, a prtica educativa no cotidiano da escola deve estar sempre articulada ao pensamento educativo do educador e ao projeto poltico pedaggico (Carvalho, 2005, p. 68).

    A investigao constatou que uma parte significativa dos coordenadores tem conscincia de qual o seu real papel. Contudo o cotidiano da escola tenciona outra lgica. Frente a essa questo assim se expressou uma coordenadora: [...] o meu papel aqui, na real, seria trabalhar o pedaggico com os professores na escola. S que hoje a gente ajuda na administrao, cuida da indisciplina de aluno; acompanhar os professores que seria uma parte maior. A gente est acompanhando uma parte menor, devido a esses transtornos que se do na sala de aula.

    O fato real que a coordenadora tem clareza de que o seu trabalho no est sendo desenvolvido de acordo com o que de sua competncia. Porm, durante o processo da investigao no pudemos perceber nenhuma manifestao, desejo e vontade expressa por parte de coordenadores para superar essa realidade.

    Dialogando ainda com os coordenadores, a idia que transparece a de que o Projeto Poltico Pedaggico de fato define vrias questes ordenadoras do trabalho a ser desenvolvido na escola, mas, de acordo com uma coordenadora, [...] na realidade nossa ele fica um pouco distorcido, porque no papel voc pode colocar ele muito bonito como voc quer trabalhar, o que voc pensa, como voc vai trabalhar, e voc registra, mas no real, de acordo com os acontecimentos que vem acontecendo na escola, voc sai um pouco da linha. A fala da coordenadora deixa evidente que o seu trabalho ordenado para no ser desenvolvido, visto que registra tudo, mas no cotidiano faz justamente o contrrio. Aqui, se confirma a tese de que a coordenadora pensa que faz, mas justamente no faz o que pensa que faz. H uma distncia enorme entre o que pensado, projetado e registrado no projeto poltico pedaggico e a ao desenvolvida no cotidiano da escola. A realidade dos fatos acaba atropelando o idealizado.

    Neste momento de anlise, tambm questionamos se esta limitao no construda pelas prprias condies de trabalho da coordenao, somada natureza da construo desta funo no espao escolar. Outrossim, cumpre ressaltar o sempre limitado carter do texto do projeto poltico pedaggico e sua necessria flexibilizao e reconstruo.

    Enfim, o projeto poltico pedaggico da escola constitui um documento que tem pouco ou quase nenhuma referncia para balizar o trabalho cotidiano da coordenadora. O projeto poltico pedaggico constitui uma pea abstrata desvinculada do movimento cotidiano da escola, sobretudo da orientao do trabalho pedaggico.

    Penso que a construo do projeto poltico pedaggico, enquanto carta que define a poltica educativa da escola com a finalidade de educar para emancipao humana, necessita de profissionais que tenham uma viso local e global da realidade educativa, que

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    a compreendam e que se comprometam com as necessidades da comunidade. O Projeto Poltico Pedaggico necessita ser respaldado por educadores conscientes que so sujeitos envolvidos no processo de buscar respostas tericas e prticas s necessidades cotidianas, principalmente no que se refere ao ensino e aprendizagem das novas geraes.

    Da reflexo sobre o significado que o coordenador atribui ao projeto poltico pedaggico no processo de organizao da estrutura administrativa e pedaggica da escola, pode-se concluir que a formao desenvolvida na escola no tem servido, ainda, como instrumento edificador do projeto educativo da escola. A formao no espao da escola tem assumido um carter complexo devido natureza da prpria organizao da escola e da situao contratual dos professores que no disponibilizam a sua participao integral no processo de formao oferecido na escola. No entanto, vale ressaltar que este estudo aponta para a necessidade futura de investigao acerca do que se tem chamado de formao continuada na escola em nosso contexto local, ou melhor, do que de fato tem se desenvolvido na escola sob esta perspectiva de formao, visto que este estudo no d conta de apontar os elementos da formao realizada nas escolas e nem mesmo tem esta proposio.

    Por outro lado, a escola que est organizada por ciclo de formao, na percepo de alguns coordenadores, principalmente os da rede municipal, permite uma melhor articulao do trabalho dos professores. Conclui-se que o projeto da escola tem mais solidez na organizao em ciclos de formao e nas reas desenvolvidas no mesmo.

    4 Concluindo o inconcluso: consideraes finais

    Para compreender, mudar e renovar a escola preciso perceb-la sempre em movimento, porque o seu cotidiano urdido por diferentes percepes e significados que formatam a prpria prtica educativa. No espao da escola o Projeto Poltico Pedaggico deve ser compreendido como o substrato necessrio que ordena a estrutura do trabalho pedaggico que produz o movimento dialtico do processo de ensinar e aprender no cotidiano da sala de aula.

    Penso que o processo de formao estabelecido no Projeto Poltico Pedaggico e dinamizado na escola constitui a mola propulsora de oxigenao e articulao do administrativo em funo do pedaggico. O ato de desenvolver o hbito do trabalho coletivo sustentado pela reflexo do que se faz na escola possibilita compreender melhor as determinaes da prtica, bem como descobrir alternativas tericas e metodolgicas para uma gesto e docncia de melhor qualidade.

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    O fato real que quem no tem prazer para estudar no tem possibilidade de contribuir com a melhoria da qualidade da educao, tampouco com a qualidade da aprendizagem do aluno. Portanto, concordo que [...] se cada escola puder ter uma equipe fixa por mais tempo, com um coordenador pedaggico que pudesse concentrar algumas linhas de trabalho e levar os professores a querer trabalhar junto, a eu acredito que poderemos melhorar a educao. (GARCIA, 2007:14).

    Aqui me parece importante, a guisa da concluso, situar o dilogo no mbito daquilo que foi investigado no tocante a concepo dos diretores e coordenadores sobre o projeto da escola. O Projeto Poltico Pedaggico como ponte edificadora que norteia a articulao educativa, o princpio da organizao do trabalho pedaggico, a formao contnua dos professores e o fazer pedaggico no cotidiano da sala de aula constitui-se no eixo basilar da ordenao da democracia na escola.

    Por fim, ponho em relevo alguns aspectos da mentalidade dos diretores e coordenadores pedaggicos no tocante gesto, autonomia da escola, currculo e formao continuada do professor. Interessa compreender o sentido e importncia atribuda a esses elementos, no projeto poltico pedaggico, nos processos de organizao das estruturas administrativa e pedaggica da escola.

    Se nesta pesquisa conclumos que se faz muita coisa no mbito da direo e coordenao pedaggica nas escolas, contudo, para uma parcela significativa dos sujeitos da investigao aquilo que pensado e estabelecido no projeto poltico pedaggico acaba no sendo concretizado, tampouco servindo de referncia para a definio politizada e refletida da ao pedaggica na direo de uma melhoria educativa.

    Isto porque o Projeto Poltico Pedaggico da escola elaborado com base nas informaes colhidas no cotidiano pela coordenadora e que so supostamente caracterizadas ou interpretadas como participao; depois de constitudo, o Projeto referendado pelo Conselho que representa todos os segmentos da instituio, mesmo sabendo que em algumas escolas o seu projeto tem sido construdo de cima para baixo.

    Ainda de acordo com os dados da investigao h escola em que o Projeto Poltico Pedaggico foi ordenado baseado no de outra e, a partir da, vai-se apenas revisando a cada ano.

    Por outro lado, vale ressaltar que a dificuldade de construo e de concretizao do projeto pedaggico no cotidiano da escola persiste porque ainda no est sendo desenvolvido de modo significativo o trabalho coletivo no espao escolar; carecem, ainda, os atores do cotidiano escolar neste processo de melhor compreenso sobre o sentido e significado da formao humana, bem como da natureza do dilogo, como princpio educativo e do trabalho interdisciplinar, enquanto eixo constitutivo da recomposio da unidade do saber, da democracia enquanto referncia para a construo da autonomia da

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    gesto e da escola como espao nuclear de formao.Portanto, faz-se necessrio que o diretor e coordenador pedaggico

    compreendam que na arena escolar haver sempre dificuldade para envolver a todos no processo de construo da escola que precisamos, porm, papel da gesto democrtica construir as condies necessrias para que cada segmento seja seduzido a participar do processo de constituio que vai definir o trabalho pedaggico da escola. Vale ressaltar que a democracia se constitui e se consolida ao ser praticada no exerccio da relao cotidiana do espao social. Isto implica pensar que a qualidade social na educao s ser construda se houver um envolvimento de todos na construo e implementao da proposta educativa da escola.

    Embora a maioria dos coordenadores relatasse que a construo do projeto poltico pedaggico da escola se d mediante a participao de todos os segmentos, sob diferentes formas metodolgicas, a realidade nos diz que isso fica mais no plano do ideal. Por outro lado, torna-se evidente que o fato de os segmentos participarem do processo de construo do projeto da escola no anula a existncia e importncia de ter uma equipe sistematizadora. Pelo contrrio, fundamental que haja uma equipe liderada pelo coordenador que produza o documento final do projeto da escola.

    Outro aspecto a ser destacado que embora seja funo do coordenador articular o processo de construo do projeto da escola, a investigao evidenciou que h uma fragilidade no que se refere a definio de princpios e estratgias concretas para envidar o processo de ordenao do projeto. Parece-me que a lgica presente na dissociao entre o pensar e o agir na prtica pedaggica fruto do modelo determinista de educao que historicamente delineou o processo de formao docente e a organizao escolar e que, ainda no foi superada no cotidiano do fazer pedaggico, permanecendo a lgica do disfarce, onde o ato do planejar est desvinculado do executar e avaliar. Penso que preciso e urgente formar melhor os gestores (diretor e coordenador) quanto concepo de educao, de gesto democrtica, de formao e desenvolvimento da pesquisa no espao escolar.

    Apesar das contradies existentes no universo da escola h uma conscincia da importncia da constituio do Projeto Poltico Pedaggico, enquanto eixo nuclear que institui o processo de ordenao do trabalho pedaggico. De acordo com a investigao, percebe-se que h um envolvimento mais determinado da comunidade educativa em torno da construo do projeto ainda que de forma pontual. O fato que se no h uma prtica mais significativa, ao menos de certa forma, na fala dos diretores e coordenadores est presente o desejo da construo coletiva do projeto. Contudo, ainda h necessidade de aprofundar a compreenso

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    de conceitos como trabalho coletivo, participao, estar juntos. Enfim, aprofundar o sentido e o significado da democracia.

    Apesar de o projeto poltico pedaggico ser uma realidade no processo de ordenao do trabalho da escola, a pesquisa, atravs da fala de coordenador, revelou que ele continua distante da prtica educativa da escola porque os agentes da educao ainda no conseguiram entender o seu significado enquanto eixo condutor da organizao do trabalho pedaggico.

    O problema que na prtica, a poltica desencadeada refora a idia de que todos so tarefeiros do Plano de Desenvolvimento da Escola. Pensa-se o plano de desenvolvimento da escola, claro que consulta as pessoas, faz um diagnosticozinho, e prope algumas aes e determina que executem as aes. O plano de desenvolvimento da escola funciona mais nesta perspectiva, tem uma sondagem, um diagnstico, mas no aquela participao assim como sujeito, como algum constri o projeto que guarda uma concepo de educao continuada pelo conjunto das pessoas que executam (sic). (coordenadora entrevistada). No obstante, compreendo que o projeto poltico pedaggico da escola s tem sentido se for o resultado de uma concepo de educao continuada construda pelo conjunto de professores da escola que tem a misso de execut-la no cotidiano da prtica pedaggica.

    A questo singular que no atuar na escola pblica h muitas possibilidades na dimenso do pedaggico, da inovao e re-significao da prtica. Porm, na dimenso administrativa h limites impostos pela burocracia, aspecto financeiro e concepo de gesto democrtica. Pode-se dizer que at mesmo no campo da legalidade de gesto h dificuldades quando se trata de tomar certas decises no aspecto de reordenao da estrutura escolar. Percebe-se que na dimenso do currculo determinante a concepo do currculo prescrito, porm, associado ao processo de organizao em torno de projeto vinculado aos temas transversais, com o carter de tema gerador.

    O entrave para o desenvolvimento da gesto escolar recai sobre a questo da autonomia para decidir e deliberar sobre o mbito do recurso financeiro. Nesta matria a escola pblica gerida pelo Estado e, portanto, precisa de uma deliberao da vontade governamental para que os recursos sejam aplicados na unidade escolar. Diante da realidade objetiva da gesto da escola, preciso comear a questionar a real possibilidade de desenvolver os projetos, a tomar deciso sem ter autonomia financeira para realizar as propostas da escola (ANTUNES, 2002).

    De modo geral os diretores e coordenadores entendem que no tocante a autonomia da escola, est posto o exerccio de uma funo relativa. Os limites so de ordem burocrtica e financeira para viabilizar os seus projetos, pois os recursos so determinados pelo Estado.

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    Penso que o processo de constituio da organizao do trabalho pedaggico da escola tem um vcio de origem que de natureza de concepo do que consiste o projeto educativo. Pensa-se primeiro na questo salarial e valorizao profissional, porm dissociada da determinao social que descapitaliza a natureza do trabalho docente, da qualidade de educao desejada e da organizao pedaggica necessria para transformar a escola num organismo vivo.

    A concluso que chego a partir do dilogo com os dados da investigao que a filosofia da escola que delineia a concepo de educao, sociedade, de ensino e aprendizagem e de homem que se quer formar no est clara, bem expressa no projeto da escola. Pensa-se nas atividades a serem desenvolvidas antes de constituir o pressuposto terico que norteia a ao educativa da escola. Predomina uma poltica eficientista, ou nas palavras de uma coordenadora:

    Falando do projeto pedaggico na prtica para mim ele e est sufocado pelo Plano de Desenvolvimento da Escola. O plano de desenvolvimento da escola que deveria ser um adendo, um componente, uma parte do projeto pedaggico da escola e da ele seria aquela parte que contempla mais a parte administrativa, as aes administrativas, ele veio na verdade sufocar o projeto poltico pedaggico. O projeto da escola hoje o Plano de Desenvolvimento da Escola. Ento, toda aquela autonomia da escola, para a escola discutir o seu projeto pedaggico e que o pedaggico seria a alma do projeto est sufocada por uma coisa mais empresarial, mais tcnica que o Plano de Desenvolvimento da Escola.

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    Data de recebimento: 12/03/2008Data de aceite: 12/05/2008