4 Tematico Maria Angela Dias
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usjt arq.urb nmero 10 | segundo semestre de 2013
Mara ngela Dias | A lgica da favela pela gramtica da forma.
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Resumo
A importncia do olhar no desenvolvimento da com-preenso do espao tridimensional para a prtica arquitetnica e o ensino de projeto justifica a pes-quisa A Educao do Olhar: apreenso dos atribu-tos geomtricos da forma dos lugares, realizada no mbito do PROARQ/FAU-UFRJ. Para compreender as formas arquitetnicas e pensando-as de maneira lgica e matemtica, aplicamos como metodologia de anlise a Gramtica da Forma (Shape Grammar). Esta metodologia tem grande afinidade com a pes-quisa em desenvolvimento, no sentido de combinar aplicaes analticas e sintticas no conhecimento da forma construda e consequentemente, ampliar a capacidade de visualizao e a habilidade em criar novas formas. Este artigo relata o trabalho re-alizado durante o workshop Estudando a Rocinha: uma abordagem em Gramtica da Forma, sob a orientao das professoras Terry Knight MIT e Gabriela Celani Unicamp,num estudo de anlise da implantao das edificaes e das volumetrias da Favela da Rocinha.
Palavras-chave: gramtica da forma; anlise da forma; arquitetura informal.
A lgica da favela pela gramtica da formaThe logic of the favela by shape grammarMara ngela Dias*, Danusa Chini Gani** e Margaret Lica Chokyu***
Abstract
The importance of seeing in the development of comprehension of three-dimensional space for architectural design and teaching pur-poses justifies the research The Education of seeing: apprehension of geometric attributes of the shapes of places, which takes place in PROARQ/FAU-UFRJ. In order to understand the architectural shapes and thinking of them in logical and mathematical way, we applied Shape Grammaras methodology of analysis.It has big affinity with the ongoing research, due to the analytical and synthetical applications in the knowledge of built form and, consequent-ly, opens up the capacity of visualization and the ability to design new forms. This paper de-scribes the Project produced during the work-shop StudyingRocinha, a Shape Grammar ap-proach, under the guidance of the professors Terry Knight MIT and Gabriela Celani UNI-CAMP, in a study of analysis of the settlement of Rocinhas buildings and its volumes.
Keywords: shape analysis, shape grammar, analysis of architecture.
*Arquiteta e Urbanista, D.Sc pela Coppe/UFRJ. Profes-sora da Graduao e do PROARQ da FAU-UFRJ, onde atua nas linhas de pes-quisa Cultura, Paisagem e Ambiente Construdo e En-sino de Arquitetura, nesta l-tima coordena a pesquisa A Educao do Olhar: apreen-so dos atributos geomtri-cos da forma dos lugares. **Arquiteta e Urbanista, M.Sc. pela COPPE, Doutoranda do PROARQ/FAU-UFRJ. Inte-grante do grupo A Educao do Olhar: apreenso dos atri-butos geomtricos da forma
dos lugares. Professora da Graduao da EBA UFRJ, onde atua na linha de pesqui-sa A Representao da for-ma tridimensional em progra-mas grficos computacionais pelo mtodo sinttico.***Arquiteta e Urbanista, M.Sc. pelo PROARQ/FAU, Doutoranda do PROARQ/FAU-UFRJ. Integrante do grupo A Educao do Ol-har: apreenso dos atributos geomtricos da forma dos lugares. Professora da Gra-duao da FAU- UFRJ. Coor-denadora do Atelier de Patri-mnio na FAU/UFRJ.
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Introduo
O presente artigo visa a apresentar a aplicao da Gramtica da Forma num estudo de anlise
morfolgica da Favela da Rocinha. Para isto,
apresenta um breve histrico da metodologia,
ainda pouco conhecida no Brasil e faz um relato
da atividades do workshop. Por fim, so apresen-
tados os resultados dos trabalhos desenvolvidos
durante o evento.
O objetivo do workshopfoi estudar a aplicao
da metodologia conhecida como Gramtica
da Forma na anlise de um conjunto arquitet-
nico, buscando reconhecer peculiaridades na
ocupao do solo e na volumetria das edifi-
caes. Estas caractersticas foram expressas
num conjunto de regras de organizao espa-
cial segundo o mtodo citado, cujos funda-
mentos tericos e formas de aplicao foram
apresentados pela professora Terry Knightdu-
rante o workshop.
A forma fsica como parmetro de anlise da ar-
quitetura est dentro do escopo da pesquisa A
Educao do Olhar, que visa promover, nos alu-
nos de graduao em arquitetura, o desenvolvi-
mento da compreenso da forma tridimensional
para fins de projeto. A pesquisa prope exerc-
cios de visualizao com base na observao e
representao das edificaes existentes.
O objeto de estudo escolhido para este workshop
foi a favela da Rocinha, comunidade da zona sul
da cidade do Rio de Janeiro. A maneira da ocu-
pao da encosta dos morros bastante carac-
terstica, e apresenta-se como um modelo infor-
mal de urbanizao. Em leituras de pesquisas a
respeito de favelas no Rio de Janeiro1, foi poss-
vel concluir que conjuntos informais em condi-
es topogrficas semelhantes seguem mais ou
menos o mesmo modelo. Modelo estede lgica
diferente da que estrutura a cidade oficial. Ain-
1.Como a Tese de Douto-ramento de Monica Bahia Schlee.
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terpretao do conjunto a partir de uma anlise
formalistano significa ignorar que a morfologia
da favela surge como produto das dinmicas so-
cioeconmicas das cidades. Buscou-se, neste
trabalho, justamente dar uma nova abordagem a
este conjunto, empregando o ponto de vista da
anlise morfolgica.
Com relao Rocinha observou-se que as for-
mas das edificaes e arruamentos so resulta-
do do processo de ocupao do territrio e da
adaptao topografia. Assim, o que se tem
um agrupamento de morfologia complexa, onde
as casas esto implantadas de forma aglome-
rada, com pouca ou nenhuma possibilidade de
expanso horizontal. Este fatoacaba por torn-
-las bastante verticalizadas. O que se observa,
por fim, um conjunto urbano denso, de con-
figurao quase monoltica, penetrado por uma
trama labirnticade becos e escadas. Foi a partir
desta observao que foram realizados os estu-
dos morfolgicos e do qual extramos regras de
implantao e composio.
O objetivo principal deste trabalho foi de fazer um
exerccio de descoberta de regras de composio
e gerar possibilidades de novas formas hipotti-
cas, a partir de aplicao de uma metodologia de
anlise morfolgica. Alm disso, este estudo pos-
sibilita fundamentar aes de ordenamento e qua-
lificao dos espaos e das contruesdentro das
favelas que observem as configuraes prprias
deste tipo de conjunto arquitetnico informal.
Breve histrico da Gramtica da Forma
A Gramtica da Forma (Shape Grammar) foi cria-
da no incio da dcada de 1970 por George Stiny
e James Gips. Foi apresentada pela primeira vez
no artigo Shape Grammars and the Generati-
ve Specification of Painting and Sculpture, de
19722. Trata-se de uma metodologia formalista
que utiliza algoritmos para anlise e gerao de
formas, e foi idealizada inicialmente para empre-
go na rea de Artes Plsticas. Na definio de
Stiny e Gips (1978, 205): An algorithm is a finite
list of instructions that can be followed mechani-
cally. An algorithm is applied to an input to pro-
duce an output3.
Gabriela Celani (2006) explica que as origens do
mtodo vm dos estudos do matemtico mil
Post e do linguista Noam Chomsky. Os trabalhos
destes pesquisadores, publicados respectivamen-
te em 1943 e 1957 tiveram grandes aplicaes na
rea de computao durante as dcadas seguin-
tes e influenciaram Stiny e Gips para a produo da
Gramtica da Forma. O sistema de Post consistia
na substituio de caracteres em uma sequncia
de letras com o objetivo de gerao de novas se-
quncias (op.cit, p.182). Celani explica que entre
as aplicaes deste sistema esto as gramticas
formais, que podem ser ainda analticas ou gene-
rativas. Segundo Celani (op.cit, p.182):
Uma gramtica formal uma estrutura com-
putacional capaz de descreveruma linguagem
2. . in C. V. Freiman, ed., In-formation Processing 71.3. Um algoritmo uma lista finita de instrues que pode ser seguida mecanicamente. Um algoritmo aplicado em uma entrada para produzir uma sada (traduo livre).
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formal por meio de regras e de um alfabeto.
[]. A gramtica generativa, desenvolvida por-
Chomsky (1957) nos anos 50, consiste em um
conjunto de regras por meio das quaispodem-
-se gerar todas as seqncias de palavras (fra-
ses) vlidas em umalinguagem, por meio de
substituies a partir de um smbolo inicial. Em
umagramtica analtica, por outro lado, o pro-
cesso se reverte, e, a partir de umaseqncia
dada de palavras, so feitas redues sucessi-
vas. O resultado umavarivel boleana do tipo
sim ou no, que indica se a seqncia ori-
ginalpertence ou no linguagem descrita pela
gramtica.
No livro Algorithmic Aesthetics, de 1978, Stiny
e Gips detalham a maneira como as questes
sobre anlise, crtica e gerao de uma obra
de arte so transpostas para uma linguagem
que possa ser convertida em algoritmos. Nesta
obra, demonstram a estrutura destes algoritmos
e expem alguns exemplos ainda restritos rea
de msica e das artes visuais.Embora tenham
apresentado no primeiro trabalho uma gramti-
ca generativa, incluindo a apresentao de uma
pintura executada a partir destas regras, durante
as duas primeiras dcadas aps o surgimento do
mtodo, os trabalhos que se seguiram foram ba-
sicamente analticos.
Em 1977, Stiny publica o artigo Ice-ray: notes on
the generation of Chinese lattice designs4, em
que analisa os desenhos de trelias de janelas
tradicionais chinesas. Este o primeiro trabalho
com uso de uma gramtica analtica. Na Erro:
Origem da referncia no encontrada apresenta
as regras que podem ser aplicadas nas diferen-
tes formas, na Figura 2 demonstra a aplicao
das regras a partir de uma forma inicial e a Figura
3expes os resultados diferentes que podem ser
obtidos a partir das mesmas regras.Este trabalho
o primeiro em que se emprega a Gramtica da
Forma paramtrica. Os parmetros so empre-
gados para se regular a proporo dos desenhos.
4. In Environment and Plan-ning B, 1977, vol.4, p.89-98.
Figura 1: Ice-ray grammar regras. Fonte: imagem apresenta-da durante o Workshop por Terry Knight.
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Figura 2: Ice-ray grammar - aplicao das regras. Fonte: ima-gem apresentada durante o Workshop por Terry Knight.
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A Gramtica foi usada para analisar arquitetu-
ra pela primeira vez por Stiny e William Mitchell
(1978), num estudo paramtrico das vilas de
Palladio. A partir deste trabalho, tem sido muito
utilizada para estudar arquitetura, e vem sendo
empregada em instituies, como o Massachu-
setts Institute of Technology MIT, para ensino
de composio em cursos de arquitetura.
Em 1980, Stiny apresenta uma gramtica gene-
rativa empregando elementos tridimensionais
no artigo Kindergarten grammars: designing with
Froebels building gifts. Friederich Froebel (1782
1852) foi um educador alemo que criou um con-
junto de blocos educativos a serem utilizados em
classes de jardim de infncia. A partir de uma
nica relao entre formas, Stiny elaborou dife-
rentes regras empregando marcadores, que do
resultados muito variados. Neste artigo, Stiny
transcreve uma fala do arquiteto Frank Lloyd
Wright: In the Frederick Froebel Kindergarten
exhibit there, mother found the Gifts. And gifts
they were. Along with the gifts was the system,
Figura 3: Ice-ray grammar - resultados possveis. Fonte: imagem apresentada du-rante o Workshop por Terry Knight.
as basis for design and the elementary geometry
behind all natural birth of Form. (p.409). Trata-
-se da apresentao de uma gramtica com ele-
mentos tridimensionais e que emprega tambm
marcadores, que possibilita diferentes resultados
com uma mesma relao entre as formas.
O estudo sobre as vilas de Palladio mostrou as
possibilidades de aplicao do mtodo em ar-
quitetura. Neste trabalho, Stiny e Mitchell con-
seguem inferir regras de composio de plantas
e fachadas da maior parte das vilas projetadas
pelo arquiteto italiano. Depois deste, diversos
trabalhos se seguiram, a respeito da obras to
variadas como as casas de prairie de Frank Lloyd
Wright5, casas de ch japonesas6 e os jardins em
estilo Mughul7.
Embora o trabalho a respeito das vilas de Palladio
fizesse anlise de plantas e fachadas, no havia
ainda um estudo sobre composio arquitetnica
tridimensional. Segundo Knight (2000), o primeiro
trabalho da Gramtica com aplicao em arqui-
5. H. Koning and J. Eizen-berg, The language of the prairie: Frank Lloyd Wrights prairie houses, in Envi-ronment and Planning B 8 (1981): 295-323.6. T. W. Knight, The forty--one steps, in Environment and Planning B 8.7. In G. Stiny and W. J. Mi-tchell, The grammar of pa-radise: on the generation of Mughul gardens, Environ-ment and Planning B 7.
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tetura em trs dimenses foi feito por Koning e
Eizenberg, em 1981, influenciados pelo trabalho
de Stiny a respeito dos Blocos de Froebel.
O professor de arquitetura da Universidade
Tcnica de Lisboa (UTL) Jos Duarte desenvol-
veu pesquisas a respeito de conjuntos urbanos
com o uso da Gramtica da Forma. Apresen-
tou em 2001 sua tese de doutoramento com o
ttulo: Customizing Mass Housing: a discursive
grammar for Sizas Malagueira houses, no MIT
e depois em 2005, Towards the mass customi-
zation of housing: the grammar of Sizas houses
at Malagueira8.Depois desenvolveu um grande
trabalho a respeito das medinas de Marrake-
ch (Marrocos),com anlise tanto da arquitetura
quanto do traado urbano. A equipe de Jos Du-
arte escolheu um quarteiro especfico, o Zaouiat
Lakhdar, e verificou a forma como se do os ar-
ruamentos. Foram inferidas regras distintas para
a forma como as construes so compostas e
para como as ruas so definidas. Na gerao das
regras, empregou critrios paramtricos. A an-
lise desenvolvida por ns sobre a Rocinha toma
como referncia estes trabalhos.
O Workshop
O workshop se desenvolveu em duas semanas e
foi orientado pela professora Terry Knight (Mas-
sachussets Institute of Technology MIT), com a
colaborao do doutorando Rizal Muslimin9 (MIT)
e da professora Gabriela Celani (FEC/UNICAMP).
8. InEnvironment and Planning B, Planning and Design 2005, volume 32:3, pp. 347-380.9. Orientando da professora Terry Knight.
Durante este evento, foi apresentada a aplicao
do formalismo computacional, chamadoGram-
tica da Forma, para analisar e compreender os
padres de vias de circulao e desenvolvimento
dasedificaes da comunidade da Rocinha, no
Rio de Janeiro.
Participaram do exerccio os membros da equi-
pe de pesquisa e colaboradores, entre arquite-
tos e alunos de iniciao cientfica, graduao
e ps graduao.
Neste curto espao de tempo a primeira sema-
na foi dedicada ao conhecimento do mtodo. Foi
explicado o que a Gramtica da Forma, como
pode ser aplicada, a histria do seu desenvolvi-
mento e uma ampla amostragem da aplicao da
gramtica ao longo da ltimas dcadas.
Os primeiros fundamentos tcnicos foram
apresentados em gramticas simples,de figu-
ras geomtricas e em duas dimenses.Assim,
foram realizados exerccios de aplicaes de
regras de identificao de regras de composi-
o em desenhos com formas geomtricas, e
em seguida, apresentadas Gramticas previa-
mente criadas, para que os participantes apli-
cassem as regras. Nesta ltima modalidade, os
participantes desenvolveram desenhos empre-
gando a Ice-ray Grammar, das trelias de jane-
las chinesas, j comentadoanteriormente,neste
artigo. Para simplificar, no foi empregada a
parametrizao do desenho.
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Tambm foi exercitada uma gramtica com se-
mi-hexgonos, com o emprego de marcadores.
Na figura 5, as regras com marcadores mostram
diferentes formas de se conjugar as peas, de
acordo com a posio do marcador. As regras
do a posio exigida e a posio do marcador
da pea adicionada, para dar prosseguimento
implementao de regras. A R4 elimina o marca-
dor da pea e determina o trmino do algoritmo.
Na sequncia, foram realizadosexerccios com
gramticas emtrs dimenses, utilizando os blo-
cos de Frobel. Na Figura 4: exerccios com Blo-
cos de Froebel, os conjuntos de blocos monta-
dos em atelier.
As aplicaes da metodologia em arquitetura e
urbanismo foram exemplificadas atravs da apre-
sentao de trabalhos j realizados por diversos
pesquisadores, na anlise tanto edificaes iso-
ladas existentes quanto de conjuntos urbanos.
Considerando o objetivo de se analisar a Roci-
nha, foram mostrados exemplos de trabalhos
que aplicaram a gramtica da forma na anlise
de assentamentos habitacionais, em especial os
estudos portugueses j citados sobre o conjunto
de Malagueira e as Medinas de Marrakech.
Ainda na primeira semana foram estudadas as
caractersticas da Rocinha e escolhidos quais
os aspectos seriam considerados para a anlise.
Em atelier, houve uma primeira diviso em trs
grupos, onde o primeiro deveria se ocupar de
observar os arruamentos, o segundo, as volume-
trias das edificaes e o ltimo deveria analisar
as fachadas.
Com estes objetivos, o grupo de participantes do
workshop fez uma nica visita area, previamen-
te escolhida para anlise, e da qual j havia al-
guns dados estatsticos. Esta escolha foi feita em
conversas anteriores com o arquiteto Lus Carlos
Toledo, responsvel por diversos projetos para a
Rocinha, cuja equipe realizou um amplo levan-
tamento desta.A visita foi feita atravs de vias
diversas que fossem representativas do todo:
vias carroveis ou no, em escadarias, rampas
ou planas, cobertas ou abertas(Figura 5). A visita
iniciou-se pela Estrada da Gvea, importante via
estruturante do bairro, e terminou na Autoestrada
Lagoa-Barra, limite sul da Rocinha. Foram visita-Figura 4: exerccios com Blocos de Froe-bel. Fonte: acervo da pesquisa
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das algumas residncias, com o fim de se enten-
der a dinmica de crescimento das edificaes.
Figura 5: em laranja, o per-curso da visita tcnica. Fon-te: arte de Pedro Valcarce sobre imagem do Google Maps (maro/2013)
Para segunda semana foi estabelecido um cro-
nograma de trabalho ajustado aos cinco dias res-
tantes do workshop. O foco do trabalho estava
na tarefa de desenvolver regras para a gramtica
da forma, escrev-las e justific-las.
A primeira tarefa desta etapa foi listar as carac-
tersticas consideradas importantes, ainda sem
o compromisso de se definir quaisquer regras ou
algoritmos. Cada equipe apresentou suas obser-
vaes em forma de tpicos ou desenho. A par-
tir dos debates, decidiu-se por redividir os grupo
em duas equipes, uma para estudar a circulao
e padres de layout das construo e outra para
estudar a composio de construo individu-
ais. Este rearranjo se deu aps se perceber que
a composio das fachadas estava fortemente
atrelada prpria volumetria das edificaes, em
especial o fato da topografia priviliegiar o vislum-
bre das coberturas das edificaes, que podem
ser percebidas como uma quinta fachada (Figura
6). Cada equipe recebeu a tarefa de desenvolver
uma gramtica de forma que explicasse os aspec-
tos observados, com base nos exemplos dados
pela professora Terry Knight de como transformar
as observaes nas regras de uma gramtica.
Um aspecto importante do mtodo que as re-
gras feitas a partir das observaes devem sem-
pre ser expressas atravs de desenhos, no
permitida a utilizao de textos para qualquer
tipo explicao (Figura 7). Os textos que forem
Figura 6: vista da Rocinha a partir da laje de uma casa. Fonte: acervo da pesquisa
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inseridos so para colocao de eventuais par-
metros ou para complementar algum dado. Nas
Gramticas criadas no workshop, usamos os
textos para indicar ruas principais, secundrias
ou becos e parmetros de quantidades.
Uma vez estabelecidas as regras, o passo se-
guinte a testagem destas pela prpria equipe
Esta etapa, chamada de computao das re-
gras consistem em aplic-las em diversas pos-
sibilidades, com o fim de se detectar problemas,
como redundncias, ambiguidades e faltas.
importante ressaltar que o termo computao
empregado aqui no tem relao com execuo
em computadores, mas com calcular. Tam-
bm foram executados diagramas em rvore,
que um esquema grfico que demonstra diver-
sas alternativas de aplicao das regras, com os
produtos possveis.
Figura 7: regras expressa em desenhos. Fonte: acervo da pesquisa
Na ltima etapa, antes de fechar o trabalho, as
equipes trocaram suas gramticas para fazer
uma segunda computao das regras. Knight ex-
plicou que as pessoas que criam as regras esto
sugeridas pela prpria linha de racioncio. Assim,
ao executar as regras, tendem a faz-lo sem per-
ceber os percalosna computao.
Durante a elaborao da Gramtica (Figura 8),
surgiram vrias dvidas sobre a composio das
regras e tambm alguns problemas de falta de
dados devido ao pouco tempo de pesquisa lo-
cal. Entretanto, a Professora Terry Knight e o seu
aluno de doutorado Rizal Muslimin, fizeram as
correes possveis com relao definio das
regras.Para finalizar, os trabalhos foram apresen-
tados em pblico e a Professora fez seus comen-
trios numa avaliao do workshop como um
todo, destacando o sucessso do trabalho realiza-
do, no curto perodo de tempo, e levantando os
detalhes tcnicos que deveriam ser corrigidos.
Destacou a complexidade da Rocinha e portanto
a necessidade de mais pesquisas locais, sobre
esta e outras favelas, antes de se dar prossegui-
mento elaborao das gramticas e do seu re-
finamento.
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O grupo gostou dos resultados e principalmente
de ter conhecido a metodologia de anlise Gra-
mtica da Forma, pouco difundida no Brasil. Al-
gumas pessoas que participaram do workshop
decidiram dar continuidade ao projeto de anlise
e esto formando um novo grupo para prosseguir
comas pesquisas, seja com relao s favelas
seja com relao cidade formal,e aprofundar o
conhecimento sobre a metodologia.
A GRAMTICA DA ROCINHA
O Desenho Urbano
Por intermdio da anlise de aerofotos, levan-
tamentos de campo e da visita feita ao local, a
equipe encarregada de estudar a circulao e os
padres de layout de construo, encontrou uma
diversidade de padres de configurao que se
justifica em funo das inmeras variveis envol-
vidas na ocupao do espao analisado. Entre
estas podemos citar as questes economicas,
sociolgicas, antropolgicas e polticas, assim
como, as caractersticas naturais do stio. Des-
ta forma, entendemos que seria necessrio um
levantamento criterioso desde a primeira ocupa-
o do espao pela Fazenda Quebra-Cangalha,
em 1838, at os dias de hoje.
Cientes da impossibilidade de levantar os referi-
dos dados no curto espaco de tempo disponvel,
o grupo optou por concentrar-se nos aspectos
Figura 8: elaborao das regras. Fonte: acervo da pesquisa
fsicos do terreno, levando em considerao a
pr-existencia de uma rua principal, a estrada
da Gvea, e de outras (secundrias) que foram
traadas pelos loteamentos das propriedades de
Companhias como a Castro Guido (1930) e a
Cristo Redentor, na dcada de 1940.
Assim, as regras de assentamento (Figura 9) fo-
ram divididas em dois tipos de ocupao: uma
para as ruas principais e secundrias e outra para
os becos, que se proliferam nas reas delimita-
das por aquelas. Demos incio definio das
regras considerando o terreno com algumas ruas
pr-existentes. A regra R1 indica a construo
de uma casa onde houver uma rua (principal ou
secundria) e a regra R2 limita em 10 as casas
consecutivas, fato observado em fotos areas e
levantamentos de campo.
O beco surge a partir da dcima edificao con-
secutiva (regra R3) ou como caminho natural
entre dois pontos de interesse (regra R5). Neste
caso, a topografia do terreno deve ser levada em
conta na deciso quanto a direo deste caminho
assim como, na ocorrncia ou no de degraus.
Consideramos, tambm, a existncia de casas
construdas nos fundos daquelas localizadas nas
ruas principais, que foi contemplada com a regra
R4. A partir da demarcao do beco, definimos
a implantao de casas ao longo destes (R6) ou
mesmo, interrompendo-os (R6a) assim como o
surgimento de novos becos (R7).
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As regras R8 e R9 determinam a unio de duas
casas em uma e a diviso de uma casa em duas,
respectivamente, sendo que esta ltima ocorre
com mais frequencia, para abrigar novos mem-
bros da famlia. Observamos, igualmente, que
havia casas de formas bastante irregulares, nas
reas intenas do espao estudado, que se loca-
lizavam nos fundos das casas de ruas principais,
secundrias e becos. Definimos regras para o
preenchimento destes espaos com diferentes
possibilidades de circulaes (R 10, R11 e R12) .
Aps o estabelecimento das regras, foram feitos
dois exerccios de aplicao, em terrenos fictcios
(Figura 10), e comparamos com um trecho da co-
munidade da Rocinha (Figura 11). Os resultados,
morfologicamente, nos pareceram satisfatrios.
Figura 9: regras para ruas e becos Figura 10: exerccios em terrenos ficitcios
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As Edificaes
Para inferir as regras que definem as edifica-
es, assim como para aquelas dos arruamen-
tos, foram observados padres do que ocorre
nas edificaes. Entre eles, os elementos exter-
nos que se repetem na maior parte das casas
e a frequncia desta ocorrncia. Assim, foram
inseridos como vocabulrio lajes, paredes, va-
randas, coberturas, caixas dgua (Figura 12).
As relaes espaciais so a forma cada um des-
tes vocbulos podem ser conjugados com outro
e as regras determinam quando e como estas
relaes espaciais se do.
Para a elaborao da Gramtica da Forma das
edificaes, seria interessante fazer uma gram-
tica a partir dos interiores, principalmente dado
que o volume fruto de diversas alteraes e
acrscimos realizados durante vrios anos. Mas,
para isso, seria necessrio conhecer os interiores
de residncias numa quantidade bem maior que
as duas nicas que foram visitadas, para haver
uma amostragem minimamente relevante. Por
isso, elementos como acesso aos terraos, in-
cluindo escadarias internas ou externas s cons-
trues e aberturas na laje no foram considera-
dos, em razo da dificuldade em se estabelecer
regras para estas sem relao com os interiores.
Ainda que as escadas, principalmente as exter-
nas s edificaes, sejam visualmente muito im-
portantes no conjunto.
Figura 11: recorte da comunidade da Rocinha. Fonte: arte da equipe sobre planta de MT Arquitetura.
Figura 12: elementos do vocabulrio. Fonte: acervo da pesquisa
A topografia acidentada da Rocinha torna muito
visvel, para quem est nas partes mais altas da
comunidade, todos os elementos colocados so-
bre as construes. Por isso, elementos normal-
mente invisveis ou discretos como caixas dgua
e pequenas construes, tm destaque visual
maior do que o esperado e foram considerados
na formao da Gramtica.
As regras comeam a ser aplicadas a partir de
uma forma inicial, que corresponde projeo
em planta da edificao, que em muitos casos,
corresponde ao prprio terreno. A regra 1 faz
a construo das paredes. As regras 2 a 4 tra-
tam da colocao da laje, que pode tanto ser
nas dimenses estabelecidas pelas paredes
quanto extravasar. A colocao da laje inclui
a colocao de uma caixa dgua. Decidiu-se
por inserir as caixas dgua por ter sido verifi-
cado que so elementos muito presentes nos
topos das construes.
A regra 5 contempla o uso da laje pelos habitantes,
que fica caracterizada pela construo do parapeito,
geralmente em alvenaria. As regras 6 a 10 tratam de
construes sobre a laje, que pode ser parcial (regra
6), construo de uma cobertura leve (regras 7 e 8) ou
construo do andar como um todo (regras 9 e 10).
As regras para colocao da cobertura foi fracionada
pois percebeu-se que nem sempre a colocao da
telha era imediata colocao da estrutura.
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Depois da regra 10, as regras podem ser apli-
cadas novamente de maneira recursiva, at o
limite de 7 lajes, indicado no parmetro das re-
gras 2 a 4.
interessante observar que as regras no pre-
cisam ser realizadas necessariamente em se-
quncia, e que elas podem ser combinadas de
maneiras variadas, conforme demonstrado no
diagrama em rvore na Figura 14. Seguindo
orientao de Knight e Muslimin, buscou-se ela-
borar uma gramtica com a menor quantidade
possvel de regras, e foram eliminadas algumas
redundncias e regras com princpios repetidos
em outras, chegando-se ao nmero final de 10
regras. Inicialmente eram 15.
Figura 13: regras de composio das edificaes
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Para facilitar esta reduo de regras, recorreu-
-se Gramtica de Cores, desenvolvida por Terry
Knight em 1993. Esta metodologia consiste em
definir cores para os elementos utilizados, de ma-
neira que se possa atribuir caractersticas s figu-
ras. Essas caractersticas podem ser to diversas
como finalidade ou materialidade do elemento.
Para a forma inicial, que o terreno, empregou-se
a cor verde, para diferenciar esta da representao
das lajes, que teriam podem ter a mesma forma.
Essa distino importante no momento da apli-
cao das regras, j que a forma pode ser idntica,
mas no se deseja que as regras possam ser aplica-
das para um ou outro elemento indiferenciadamente.
Da mesma maneira, foi usada uma cor dife-
rente para a parte da laje que extravaza o ali-
nhamento das paredes, para que no haver a
aplicao de paredes desalinhadas daquelas
do andar inferior. A aplicao da cor evita que
seja necessria a criao de regras iguais para
duas situaes distintas, a laje que extravaza e
a que se mantm alinhada.
Alm disso, as cores so usadas tambm nas
fachadas, de maneira a diferenciar a fachada
frontal das laterais, o que influencia tambm
na hora de se aplicar as regras de composio
de fachadas.
No diagrama em rvore (Figura 14), observa-se
uma boa quantidade de possibilidades que as
regras proporcionam, muito embora no estejam
contempladas todas as opes possveis. Nota-
-se que as regras podem ser aplicadas mais de
uma vez, desde que ocorra a condio necess-
ria para a aplicao de alguma das regras. Por
isso, necessrio tambm estabelecer parme-
tros que definam um limite de repeties. Figura 14: diagrama em rvore das regras para edificaes
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Na Figura 15, o incio do estudo das regras de
fachadas. As cores empregadas nas volumetrias
aqui ajudam a aplicar as regras nas fachadas
corretas. A letra M (de main em ingls) indica
a rua principal, enquanto que A (de alley), indi-
ca os becos. As regras distinguem fenestrao
para casas de apenas um pavimento para aque-
las com mais. No houve tempo para elaborar
as demais regras necessrias ou fazer a devida
computao e diagrama em rvore.
Figura 15: regras para fachadas Como dito anteriormente, uma das etapas impor-
tantes no processo de trabalho a computao
das regras. quando se faz a aplicao das re-
gras e a verificao de problemas no processo,
procurando eventuais falhas que possam ocor-
rer, como regras que levem a erros e redundn-
cias. Nessa fase, a Gramtica no s corrigida
como pode tambm ser refinada. Neste sentido,
na primeira computao realizada foi sugerido o
emprego da Gramtica das Cores, para resolver
problemas de ambiguidade. Em uma segunda
etapa, foram retiradas regras redundantes e apri-
moradas outras com insero de elementos.
importante ressaltar que a ordem de aplica-
o das regras no tem necessariamente relao
com a ordem cronolgica com que se do os
acontecimentos reais, partem da observao da
relao entre os elementos e da melhor manei-
ra de otimizar as regras. Outra fato importante,
que a observao dos elementos segue a maioria
do conjunto e as regras criadas a partir desta ob-
servao tem como objetivo explicar a composi-
o formal da grande maioria das situaes. Mas
num universo to grande como a Rocinha, de de-
zenas de milhares de construes, h sempre as
excees e que no se encaixaro em nenhuma
das regras estabelecidas em nossa Gramtica, e
esta situao j era esperada.
Consideraes Finais
Encontramos na metodologia uma grande afi-
nidade com a pesquisa que estamos desenvol-
vendo cujo foco o conhecimento da forma tri-
dimensional. Este trabalho possibilitou equipe
ter um olhar analtico sobre a Favela da Rocinha,
do ponto de vista formal. Perceber a maneira
como as construes se aglomeram e como os
diversos elementos arquitetnicos se conjugam
cofigurando uma outra via de dilogo com a es-
pacialidade da favela.
A inteno no foi gerar regras que contem a
Histria formal da construo da Rocinha mas
de se inferir regras que reflitam a articulao
entre os diversos elementos de composio da
arquitetura popular informal num modelo pr-
prio de urbanizao, em constante adaptao e
transformao.
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Analisando a foto area da Rocinha, verificamos
a existncia de alguns conjuntos diferentes de
assentamento, resultado da grande diversida-
de de ocupao da rea da favela. Estas diver-
sidades devem-se, provavelmente, a condies
topogrficas e histricas. Comparando visual-
mente os conjuntos, com o objetivo de aplicar a
grmtica da forma, observamos que a rea de
estudo escolhida era um dos conjuntos de as-
sentamento mais densos e com linguagem mista:
alguns acompanham as curvas de nivel, outros
preenchem espaos vazios; outros ainda, acom-
panham vestgios de parcelamento da terra.
Por fim, estamos certos de que a espacialidade
da Rocinha apresenta elementos da arquitetura
popular brasileira que podem ser incorporados
aos projetos habitacionais de baixa renda e que
a anlise pela gramtica da forma pode realar a
peculiaridade da sua estruturao espacial, dife-
rente da lgica que estrutura a cidade oficial.Pre-
tendemos prosseguir o nosso trabalho de anlise
da Rocinha aplicando a gramtica da forma.
Agradecimentos
Este workshop faz parte das atividades do proje-
to de pesquisa A Educao do Olhar: aprenso
dos atributos geomtricos da forma dos lugares
e contou com a participao de: Gustavo Pimen-
ta, Lilian Soares e Raphael Marconi, doutoran-
dos; Alberto Fernandes, Claudia Elias; Luciano
Monteiro, mestrandos; Veronica Natividade e
Marat Menezes, arquitetos; e Pedro Valcarce bol-
sista de Iniciao Cientfica.
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