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II Diretriz Brasileira de Transplante Cardaco

Coordenador

de

normatizaes autores

e

diretrizes

da

sBC

Jadelson Pinheiro de Andrade

Fernando Bacal*1, Joo David de Souza Neto*2, Alfredo Incio Fiorelli*1, Juan Mejia*2, Fabiana Goulart Marcondes-Braga**1, Sandrigo Mangini**1, Jos de Lima Oliveira Jr**1, Dirceu Rodrigues de Almeida3, Estela Azeka1, Jarbas Jakson Dinkhuysen4, Maria da Consolao Vieira Moreira5, Joo Manoel Rossi Neto4, Reinaldo Bulgarelli Bestetti6, Juliana Rolim Fernandes2, Ftima das Dores Cruz1, Lucinei Paz Ferreira1, Helenice Moreira da Costa1, Ana Augusta Maria Pereira4, Nicolas Panajotopoulos1, Luiz Alberto Benvenuti1, Ldia Zytynski Moura7, Glauber Gean Vasconcelos2, Joo Nelson Rodrigues Branco3, Claudio Leo Gelape5, Ricardo Barreira Uchoa2, Silvia Moreira Ayub-Ferreira1, Luis Fernando Aranha Camargo3-8, Alexandre Siciliano Colafranceschi9, Solange Bordignon10, Reginaldo Cipullo4, Estela Suzana Kleiman Horowitz10, Klbia Castelo Branco2, Marcelo Jatene1, Sergio Lopes Veiga7, Cesar Augusto Guimares Marcelino4, Guaracy Fernandes Teixeira Filho10, Jos Henrique Vila11, Marcelo Westerlund Montera12-13*Coordenadores da II Diretriz Brasileira de Transplante Cardaco **Comisso de Redao e planejamento

instituiesInstituto do Corao do Hospital das Clnicas da Faculdade de Medicina da Universidade de So Paulo; 2Hospital de Messejana Dr. Carlos Alberto Studart Gomes, Cear; 3Escola Paulista de Medicina, Universidade Federal de So Paulo; 4Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia, So Paulo; 5Hospital das Clnicas da Universidade Federal de Minas Gerais; 6Faculdade de Medicina de So Jos do Rio Preto; 7Santa Casa de Misericrdia de Curitiba, Pontifcia Universidade Catlica do Paran; 8Hospital Israelita Albert Einstein; 9Instituto Nacional de Cardiologia, Rio de Janeiro; 10Instituto de Cardiologia, Fundao Universitria do Rio Grande do Sul; 11Real e Benemrita Sociedade de Beneficncia Portuguesa, So Paulo; 12Hospital Pr-Cardaco do Rio de Janeiro; 13Santa Casa do Rio de Janeiro1

Esta diretriz dever ser citada como: Bacal F, Souza-Neto JD, Fiorelli AI, Mejia J, Marcondes-Braga FG, Mangini S, et al. II Diretriz Brasileira de Transplante Cardaco. Arq Bras Cardiol.2009;94(1 supl.1):e16-e73 Correspondncia: Fernando Bacal - Av. Divino Salvador, 395 - apto. 201 - Moema - So Paulo - CEP 04078-011 - E-mail: [email protected]

II Diretriz Brasileira de Transplante Cardaco

DiretrizesDeclarao obrigatria de conflito de interessesNos ltimos trs anos, o autor/colaborador da diretriz: Participou de estudos clnicos e/ou experimentais subvencionados pela indstria farmacutica ou de equipamentos relacionados diretriz em questoNo No No No No No No No No No Novartis No No No No No No No No No No No No No No No No No No Jansen; Pfizer; Altana No No No No No No AMGEN No

Nome do mdico

Foi palestrante em eventos ou atividades patrocinadas pela indstria relacionados diretriz em questoNo No No No No No No No No No No No No No No Merck Serono No No No No No No No No No No No No No Merck; Biolab; Pfizer No No No No No No No No

Foi () membro do conselho consultivo ou diretivo da indstria farmacutica ou de equipamentosNo No No No No Pfizer; Ache; Baldacci Norvartis No No No Novartis No No No No No No No No No No No No No No No No No No Merck No No No No No No No No

Participou de comits normativos de estudos cientficos patrocinados pela indstriaNo No No No No No No No No No No No No No No No No No No No No No No No No No No No No No No No No No No No No No

Recebeu auxlio pessoal ou institucional da indstria

Elaborou textos cientficos em peridicos patrocinados pela indstriaNo No No No No Pfizer; Baldacci No No No No No No No No No No No No No No No No No No No No No No No No No No No No No No No No

Tem aes da indstria

Alexandre Siciliano Colafranceschi Alfredo Inacio Fiorelli Ana Augusta Maria Pereira Cesar Augusto Guimares Marcelino Claudio Gelape Dirceu Rodrigues de Almeida Estela Azeka Estela Suzana Kleiman Horowitz Fabiana Goulart Marcondes Braga Ftima das Dores Cruz Fernando Bacal Glauber Gean de Vasconcelos Guaracy Fernandes Teixeira Filho Helenice Moreira da Costa Jarbas Jakson Dinkhuysen Joo David de Souza Neto Joo Manoel Rossi Joo Nelson Rodrigues Branco Jos de Lima Oliveira Junior Jos Henrique Vila Juan Mejia Juliana Rolim Fernandes Klbia Castello Branco Lidia Zytynski Moura Lucinei Paz Ferreira Luiz Alberto Benvenuti Luis Fernando Aranha Camargo Maria da Consolao V. Moreira Marcelo Jatene Marcelo Montera Nicolas Panajotopoulos Reginaldo Cipullo Reinaldo Bestetti Ricardo Barreira Uchoa Sandrigo Mangini Srgio Lopes Veiga Silvia Moreira Ayub Ferreira Solange Bordignon

No No No No No No no No No No No No No No No No No No No No No No No Novartis No No No No No St Jude No No Saint Jude No No Novartis No Novartis

No No No No No No No No No No No No No No No No No No No No No No No No No No No No No No No No No No No No No No

II Diretriz Brasileira de Transplante Cardaco

Diretrizes SUMRIOI. Introduo .................................................................................................................................................. pgina e16 II. Avaliao do receptorA) Indicaes e contraindicaes para transplante cardaco ............................................................................... pgina e16 B) Preparo do candidato ao transplante cardaco ................................................................................................ pgina e17 i. Exames de avaliao, seleo e acompanhamento dos candidatos ambulatoriais ................................................. pgina e17 ii. Teste de esforo cardiopulmonar .......................................................................................................................... pgina e18 iii. Escore prognstico - Heart Failure Survival Score (HFSS) e Seattle Heart Failure Model (SHFM) .......................... pgina e18 iv. Tratamento e manuteno de pacientes ambulatoriais na lista de espera ............................................................. pgina e19 C) Tratamento e manuteno do receptor internado: farmacolgico e no farmacolgico .................................. pgina e19 i. Medidas de controle da congesto em pacientes com insuficincia cardaca crnica descompensada ................. pgina e20 D) Manejo de drogas vasoativas e dispositivos de assistncia i. Drogas vasoativas ................................................................................................................................................... pgina e20 a) Vasodilatadores ....................................................................................................................................................... pgina e20 b) Inotrpicos e inodilatadores ..................................................................................................................................... pgina e20 ii. Dispositivos de assistncia ventricular .................................................................................................................. pgina e21 E) Receptor em prioridade ................................................................................................................................... pgina e22 F) Receptor limtrofe i. Infeco .................................................................................................................................................................. pgina e22 ii. Insuficincia renal ................................................................................................................................................. pgina e22 iii. Caquexia cardaca ................................................................................................................................................ pgina e23 G) Avaliao hemodinmica pulmonar ................................................................................................................ pgina e23 H) Avaliao multiprofissional do candidato ao transplante cardaco i. Avaliao da equipe de enfermagem ...................................................................................................................... pgina e24 ii. Avaliao social ..................................................................................................................................................... pgina e24 iii. Avaliao nutricional do candidato ao transplante cardaco ................................................................................ pgina e25 iv. Avaliao psicolgica ............................................................................................................................................ pgina e26

III. ImunologiaA) Avaliao imunolgica pr e ps-transplante cardaco .................................................................................... pgina e26 B) Imunossupresso ............................................................................................................................................ pgina e27 i. Corticosteroides ..................................................................................................................................................... pgina e27 ii. Inibidores de calcineurina ..................................................................................................................................... pgina e27 iii. Antiproliferativos ................................................................................................................................................. pgina e28 iv. Inibidores do sinal de proliferao (ISP) ............................................................................................................... pgina e28 C) Diagnstico da rejeio aguda celular, humoral e a bipsia endomiocrdica .................................................. pgina e29 i. Classificao histopatolgica da rejeio aguda ..................................................................................................... pgina e29 a) Rejeio aguda celular ............................................................................................................................................. pgina e29 b) Rejeio aguda humoral .......................................................................................................................................... pgina e30 c) Rejeio hiperaguda ................................................................................................................................................ pgina e31 ii. Outros achados significativos da bipsia endomiocrdica, distintos da rejeio .................................................. pgina e31 a) Leso isqumica ...................................................................................................................................................... pgina e31 b) Efeito Quilty ............................................................................................................................................................ pgina e31 c) Local de bipsia prvia ............................................................................................................................................. pgina e31 d) Infeco do enxerto ................................................................................................................................................. pgina e31 e) Neoplasia linfoide .................................................................................................................................................... pgina e31

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DiretrizesD) Tratamento da rejeio aguda celular e humoral ............................................................................................ pgina e31 i. Rejeio aguda celular ............................................................................................................................................ pgina e32 ii. Rejeio humoral .................................................................................................................................................. pgina e32 E) Terapias de induo e terapias de resgate ....................................................................................................... pgina e33 i. Anticorpos monoclonais ......................................................................................................................................... pgina e33 ii. Anticorpos policlonais ........................................................................................................................................... pgina e34 iii. Ciclofosfamida ..................................................................................................................................................... pgina e34 iv. Plasmafrese ........................................................................................................................................................ pgina e34 v. Metotrexate ........................................................................................................................................................... pgina e34 vi. Imunoglobulina .................................................................................................................................................... pgina e35 vii. Rituximab ............................................................................................................................................................ pgina e35 F) Seguimento ps-transplante cardaco avaliao de rejeio ......................................................................... pgina e35 i. Bipsia endomiocrdica ......................................................................................................................................... pgina e35 ii. Cintilografia miocrdica ........................................................................................................................................ pgina e35 iii. Ressonncia magntica cardaca .......................................................................................................................... pgina e35 G) Doena vascular do enxerto ............................................................................................................................ pgina e35 i. Diagnstico ............................................................................................................................................................ pgina e36 ii. Preveno e tratamento ......................................................................................................................................... pgina e36

IV. Aspectos cirrgicos do transplante cardacoA) Captao e preservao do enxerto ................................................................................................................ pgina e37 i. Tcnica de retirada do enxerto ............................................................................................................................... pgina e37 ii. Preservao do corao ......................................................................................................................................... pgina e38 B) Transplante ortotpico: tcnica clssica x bicaval ............................................................................................ pgina e38 i. Anuloplastia valvar tricspide profiltica ............................................................................................................... pgina e38 C) Transplante heterotpico ................................................................................................................................. pgina e38 D) Aspectos anestsicos e monitorao perioperatria ....................................................................................... pgina e39 i. Tcnicas de ventilao ............................................................................................................................................ pgina e40 ii. Suporte hemodinmico ......................................................................................................................................... pgina e40 E) Disfuno aguda do enxerto ............................................................................................................................ pgina e41 i. Disfuno aguda do ventrculo esquerdo (VE) ........................................................................................................ pgina e41 ii. Disfuno aguda do ventrculo direito (VD) .......................................................................................................... pgina e42 F) Uso de hemoderivados e controle de sangramento no perioperatrio do transplante cardaco i. Risco de sangramento em transplante cardaco ..................................................................................................... pgina e43 ii. Reverso de terapias anticoagulante e antiagregante plaquetria ......................................................................... pgina e43 a) Antagonistas da vitamina K (Varfarina) ....................................................................................................................... pgina e43 b) Heparinas ............................................................................................................................................................... pgina e43 c) Antiagregantes plaquetrios ..................................................................................................................................... pgina e44 iii. Uso de hemoderivados e controle de sangramento ps-operatrio ..................................................................... pgina e44

V. Complicaes ps-transplanteA) Condutas em complicaes infecciosas ps-transplante cardaco ................................................................... pgina e45 i. Introduo .............................................................................................................................................................. pgina e45 ii. Profilaxia ............................................................................................................................................................... pgina e45 a) Profilaxia para infeces de stio cirrgico .................................................................................................................. pgina e45 b) Profilaxia para toxoplasmose .................................................................................................................................... pgina e46 c) Profilaxia para Pneumocystis jirovecii (carinii) ........................................................................................................... pgina e46 d) Profilaxia para citomegalovrus (CMV) ....................................................................................................................... pgina e46

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Diretrizesiii. Diagnstico e tratamento ..................................................................................................................................... pgina e47 a) Infeco pelo citomegalovrus .................................................................................................................................. pgina e47 b) Toxoplasmose ......................................................................................................................................................... pgina e47 c) Pneumocystis jirovecii (carinii) .......................................................................................................................... pgina e47 iv. Imunizao em adultos ......................................................................................................................................... pgina e48 B) Reativao da Doena de Chagas ................................................................................................................... pgina e48 i. Profilaxia ................................................................................................................................................................ pgina e48 ii. Diagnstico ........................................................................................................................................................... pgina e48 iii. Tratamento ........................................................................................................................................................... pgina e49 C) Neoplasias aps transplante cardaco ............................................................................................................. pgina e49 D) Retransplante cardaco ................................................................................................................................... pgina e50 E) Comorbidades - preveno e tratamento ......................................................................................................... pgina e50 i. Diabetes melito ...................................................................................................................................................... pgina e50 ii. Hipertenso arterial sistmica ............................................................................................................................... pgina e51 iii. Dislipidemias ....................................................................................................................................................... pgina e51 iv. Insuficincia renal ................................................................................................................................................ pgina e52 v. Osteoporose .......................................................................................................................................................... pgina e52 vi. Depresso ............................................................................................................................................................ pgina e53 F) Orientaes equipe multiprofissional .............................................................................................................. pgina e53 i. Dieta ....................................................................................................................................................................... pgina e53 ii. Aderncia .............................................................................................................................................................. pgina e53 iii. Reinsero social .................................................................................................................................................. pgina e53 iv. Atividade fsica ..................................................................................................................................................... pgina e53 v. Atividade sexual ..................................................................................................................................................... pgina e53

VI. Transplante cardaco em crianas ............................................................................................... pgina e53A) Indicaes e contraindicaes ........................................................................................................................ pgina e53 B) Acompanhamento ambulatorial pr e ps-transplante cardaco peditrico ..................................................... pgina e55 i. Acompanhamento ambulatorial pr-transplante cardaco ..................................................................................... pgina e55 ii. Acompanhamento ambulatorial ps-transplante cardaco ................................................................................... pgina e56 C) Rejeio .......................................................................................................................................................... pgina e57 i. Diagnstico ............................................................................................................................................................ pgina e57 ii. Tratamento ............................................................................................................................................................ pgina e57 iii. Imunossupresso ................................................................................................................................................. pgina e58 D) Tcnicas cirrgicas particularidades na criana ........................................................................................... pgina e59 i. Tcnica cirrgica .................................................................................................................................................... pgina e59 E) O doador para crianas ................................................................................................................................... pgina e59

VII. O papel das centrais de captao e avaliao do doador ................................................ pgina e60A) Estratgias para confirmao do potencial doador ......................................................................................... pgina e60 i. Critrios de morte enceflica .................................................................................................................................. pgina e60 ii. Exames de avaliao .............................................................................................................................................. pgina e60 a) Angiografia cerebral ................................................................................................................................................. pgina e60 b) Eletroencefalograma ................................................................................................................................................ pgina e60 c) Doppler transcraniano ............................................................................................................................................. pgina e60 d) Cintilografia cerebral (tecncio 99 m Tc hexametazime) ............................................................................................. pgina e60 B) Manuteno do doador ................................................................................................................................... pgina e60 C) Atuao das organizaes de procura de rgos (OPO) e alocao de rgos ................................................. pgina e62

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DiretrizesD) Abordagem multidisciplinar do potencial doador ............................................................................................ pgina e62 i. Identificao de potencial doador .......................................................................................................................... pgina e63 ii. Avaliao do potencial doador .............................................................................................................................. pgina e63 iii. Entrevista familiar ................................................................................................................................................ pgina e63 iv. Retirada de rgos e tecidos ................................................................................................................................. pgina e63 v. Entrega do corpo a famlia ..................................................................................................................................... pgina e63

VIII. Organizao do centro transplantadorA) Critrios para habilitao e estrutura do centro transplantador ....................................................................... pgina e63 B) Aspectos ticos do transplante cardaco ......................................................................................................... pgina e64 C) Papel da secretaria de sade na organizao do sistema de transplante cardaco ......................................... pgina e64

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DiretrizesI. IntroduoO transplante cardaco persiste sendo o tratamento de escolha para a insuficincia cardaca refratria, apesar da grande melhora na expectativa de vida com o tratamento clnico. Vrios avanos nessa rea foram observados na ltima dcada, com a incorporao de novas tcnicas cirrgicas, novos imunossupressores, novos mtodos diagnsticos e abordagens nos ps-operatrios precoce e tardio. O Brasil tem ocupado cada vez mais espao no campo dos transplantes, com destaque na Amrica Latina, e acima de tudo como pas referncia no transplante cardaco na doena de Chagas, guiando condutas que so incorporadas no mundo todo. A elaborao de uma Diretriz uma das principais atribuies de uma sociedade mdica, orientando e fornecendo elementos para que os mdicos possam tomar suas decises e condutas, embasadas em documento atualizado, seguindo o maior rigor cientfico, representando condutas de especialistas com larga experincia na rea, juntamente com as evidncias nacionais e/ou internacionais publicadas at o momento. Esta a II Diretriz Brasileira em Transplante Cardaco, finalizada exatos 10 anos aps a primeira Diretriz, publicada nos Arquivos Brasileiros de Cardiologia. O critrio para elaborao deste documento iniciou-se com a definio de 4 coordenadores, 2 clnicos e 2 cirurgies, representantes dos principais centros transplantadores. Aps essa definio, consultou-se a Associao Brasileira de Transplante de Orgos (ABTO), sobre os centros que se mantinham atuantes, tendo realizado pelo menos 10 transplantes nos ltimos 5 anos. Foram convidados, portanto, os representantes dessas respectivas instituies, compondo um seleto grupo de profissionais com ampla experincia para elaborao deste importante documento. Acreditamos que esta Diretriz servir de consulta para equipes multiprofissionais que atendem pacientes em avaliao ou j em seguimento aps transplante, bem como ajudar como orientao para hospitais e servios que pretendem iniciar seus respectivos programas. Conceitos que vo desde o processo de seleo de potenciais receptores, at os cuidados em todas as fases aps o transplante foram incorporados neste documento, sendo, portanto, um guia prtico, atualizado e completo, elaborado por profissionais experientes do grupo de estudos de insuficincia cardaca (GEIC) da Sociedade Brasileira de Cardiologia. Seguem as classes de recomendao e nveis de evidncia utilizados por esta diretriz. Classes de Recomendao Classe I - Consenso sobre a indicao do procedimento/ tratamento. Classe IIa - Evidncias favorecem a indicao do procedimento/tratamento. Classe IIb - Evidncias no favorecem a indicao do procedimento/tratamento. Classe III - No indicado o procedimento/tratamento. Nveis de Evidncia A - Dados obtidos a partir de estudos randomizados ou metanlises de grandes estudos randomizados; B - Dados obtidos de um nico ensaio clnico randomizado ou vrios estudos no randomizados; C - Dados obtidos de estudos que incluram uma srie de casos e dados obtidos do consenso e de opinies de especialistas.

II. Avaliao do receptorA) Indicaes e contraindicaes para transplante cardaco O transplante cardaco reconhecido como o melhor tratamento para a insuficincia cardaca (IC) refratria, mesmo na ausncia de estudos randomizado-controlados. Quando uma criteriosa seleo utilizada para a escolha do doador e do receptor, h um significante aumento na sobrevida, na capacidade de exerccio, no retorno ao trabalho e na qualidade de vida1. Pacientes portadores de IC avanada, classes funcionais III ou IV, com sintomas graves sem alternativa de tratamento clnico e com pior prognstico tm indicao para transplante cardaco 2-4. O tratamento clnico deve ter otimizao farmacolgica e no farmacolgica mximas5. Tambm na IC aguda, devemos promover a remoo de fatores reversveis, como doena coronria de tratamento cirrgico, insuficincia mitral passvel de correo ou cirurgia de defeitos congnitos 5 . Alguns critrios de indicaes e contraindicaes tm mudado nos ltimos anos, principalmente com relao idade, teste cardiopulmonar (TCP), resistncia vascular pulmonar (RVP), obesidade, cncer, diabetes melito (DM), doena de Chagas, insuficincia renal, doena vascular perifrica (DVP), e abuso de drogas4,6. As indicaes para transplante cardaco esto resumidas na Tabela 1. A avaliao da RVP e o TCP devem ser realizados em candidatos a transplante cardaco4. Na impossibilidade de realizar o TCP o teste de caminhada de 6 minutos uma , alternativa vlida. Quando distncia percorrida menor do que 300 metros, h associao com maior mortalidade7. Nos intolerantes ao betabloqueador (BB), o ponto de corte do pico de VO2 14 ml/Kg/min. Nos tolerantes, o VO2 12 ml/ Kg/min. Nos ltimos anos, novas publicaes confirmaram que o uso equivalente de ventilao do dixido de carbono (VE/VCO2) slope > 35 um parmetro de mau prognstico e por este motivo pode ser usado para indicao de transplante cardaco1,4,8-10. Portadores de neoplasia que tm baixo grau de malignidade podem ser aceitos. Em tumores com resposta quimioterapia e ausncia de metstase, o transplante cardaco deve ser considerado com permisso do oncologista4. A presena de DM pode ser um grande problema no transplante cardaco devido s complicaes decorrentes da imunossupresso. Portadores de DM com leses de rgos-alvo tm contraindicao relativa. Diabticos sem leso de rgos-alvo tm bons resultados, ao passo que

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DiretrizesTabela 1 - Indicaes de transplante cardacoClasse de Recomendao Indicaes IC refratria na dependncia de drogas inotrpicas e/ou de suporte circulatrio e/ou ventilao mecnica; Classe I VO2 pico 10 ml/Kg/min; Doena isqumica com angina refratria sem possibilidade de revascularizao; Arritmia ventricular refratria; Classe funcional III/IV persistente. Teste da caminhada dos 6 minutos < 300 metros; Uso de BB com VO2 pico 12 ml/Kg/ min; Sem uso de BB com VO2 pico 14 ml/ Kg/min; Teste cardiopulmonar com relao VE/ VCO2 > 35 e VO2 pico 14 ml/Kg/min. Presena de disfuno sistlica isolada; Classe III Classe funcional III ou IV sem otimizao teraputica. Nvel de Evidncia C C C C C C C C C C C Relativas

Tabela 2 - Contraindicaes absolutas para transplante cardacoResistncia vascular pulmonar fixa > 5 Wood, mesmo aps provas farmacolgicas; Doenas cerebrovascular e/ou vascular perifrica graves; Absolutas Insuficincia heptica irreversvel, doena pulmonar grave; Incompatibilidade ABO na prova cruzada prospectiva entre receptor e doador; Doena psiquitrica grave, dependncia qumica e no aderncia s recomendaes da equipe.

Tabela 3 - Contraindicaes relativas para transplante cardacoIdade maior do que 70 anos; Diabetes insulino-dependente com leses graves de rgos-alvo; Comorbidades com baixa expectativa de vida; Obesidade mrbida; Infeco sistmica ativa; lcera pptica em atividade; Embolia pulmonar com menos de trs semanas; Neoplasia com liberao do oncologista; Diabetes melito de difcil controle; Insuficincia renal com clearance abaixo de 30 ml/min/1,73 m2; Amloidose/sarcoidose/hemocromatose; Hepatite B ou C; Sndrome de imunodeficincia adquirida; Painel linfocitrio > 10%.

Classe IIa

VO2 - consumo de oxignio; BB - betabloqueador.

DM no controlada (HbAc > 7,5) deve ter contraindicao relativa1,4,11. A insuficincia renal deve ser avaliada de acordo com o clearance de creatinina ou creatinina srica como parmetros de seleo. Clearance da creatinina < 30 ml/min/1,73 m2 contraindicao relativa. Nesse caso, pode-se considerar o transplante combinado rim/corao12. Doena cerebrovascular grave e sintomtica contraindicao. Doena vascular perifrica considerada uma contraindicao relativa quando limita a reabilitao e no h condies de revascularizao12. Pacientes com dependncia qumica e tabagismo devem ter abstinncia superior a 6 meses e acompanhamento da equipe multidisciplinar para indicao de transplante cardaco. A doena de Chagas deixou de ser uma controvrsia devido aos seus bons resultados, com baixa incidncia de reativao e sobrevida superior s outras etiologias13. As avaliaes psicolgica, social, de enfermagem, nutricional, odontolgica e de fisioterapia so obrigatrias, buscandose identificar fatores de risco que possam comprometer a evoluo do tratamento. O transplante cardaco pressupe um tratamento multidisciplinar3,4,14. As contraindicaes esto resumidas nas Tabelas 2 e 3. B) Preparo do candidato ao transplante cardaco i. Exames de avaliao, seleo e acompanhamento dos candidatos ambulatoriais A seleo dos candidatos ao transplante cardaco envolve o uso de variveis prognsticas no sentido de

identificar pacientes com IC avanada, combinadas com as contraindicaes e comorbidades, as quais podem acarretar desfechos desfavorveis, como reduo da sobrevida aps transplante ou alto risco perioperatrio. Esse processo de seleo requer equipe multidisciplinar com profundo conhecimento do prognstico e manejo dos pacientes com IC avanada4. A avaliao, estratificao de risco e incluso dos pacientes ambulatoriais na fila de espera um procedimento crtico e requer conhecimento dos marcadores prognsticos de sobrevida. At o momento, no existe um critrio clnico perfeito para identificar os pacientes de maior risco de morte, que deveriam ser colocados na fila de espera do transplante. Mais de 100 fatores prognsticos de sobrevida foram identificados, na tentativa de se otimizar a seleo dos candidatos, tais como: etiologia da IC, reduzida frao ejeo do ventrculo esquerdo (FEVE), classe funcional da IC (NYHA), frequncia cardaca de repouso, presso arterial mdia, persistncia de terceira bulha, distrbio de conduo intraventricular no ECG de repouso, reduzida concentrao de sdio srico, nveis elevados de catecolaminas sricas, peptdeos natriurticos (BNP e NT-pr BNP), troponina, elevada presso capilar pulmonar, reduzido ndice cardaco, presso arterial pulmonar, resistncia vascular pulmonar, baixo

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Diretrizespico de consumo de oxignio (VO2) durante o exerccio, dentre outros. A Tabela 4 resume a rotina de avaliao basal e peridica de pacientes ambulatoriais inscritos na fila de transplante cardaco4. Embora a seleo dos doadores no se baseie nos antgenos leucocitrios humanos (HLA), o exame deve ser feito para anlise retrospectiva. A reatividade contra painel (PRA) feita para rastrear anticorpos pr-formados antiHLA e avaliar necessidade de prova cruzada prospectiva e possibilidade de rejeio humoral aps o transplante. Um estudo de PRA considerado positivo quando maior do que 10% utilizando as tcnicas clssicas de CDC e ELISA, ou qualquer valor quando utilizada a tcnica de Luminex, devendo-se, nestas situaes, recomendar prova cruzada antes do transplante. O PRA deve ser repetido em pacientes aps a utilizao de hemoderivados. Em nossa realidade, todos os pacientes devem receber tratamento profiltico antiparasitrio antes da realizao de transplante cardaco. Isso ocorre devido ao risco de superinfeco aps o uso de agentes imunossupressores. ii. Teste de esforo cardiopulmonar Aps tratamento mximo da IC, a medida do VO2 pico durante o exerccio fornece uma avaliao objetiva da capacidade funcional, e constitui uma medida indireta da reserva cardiovascular. O valor do VO2 pico na indicao de transplante cardaco foi estudado em 114 pacientes, os quais foram prospectivamente classificados em trs grupos: grupo um: VO2 pico < 14 ml/kg/min, estes foram aceitos como candidatos a transplantes; grupo dois: VO2 pico > 14 ml/kg/min, cujo transplante foi adiado; grupo trs: VO2 pico < 14 ml/kg/min, recusados para transplantes por causas no cardacas. A melhor sobrevida em um ano foi observada entre os pacientes com VO2 pico > 14 ml/ Kg/min e a pior entre os pacientes com VO2 pico < 10 ml/ kg/min (47% em um ano) e, portanto, consensual que este ltimo grupo seja aceito para transplante cardaco, a menos que haja contraindicao15. Entretanto, a utilizao do VO2 pico como valor absoluto tem limitaes, visto que a capacidade ao esforo sofre influncia da idade, do sexo e da superfcie corporal. Outra forma de se analisar esse fator prognstico tem sido a anlise do percentual do valor predito para peso, idade e sexo. VO2 pico inferior a 50% do predito tem alta sensibilidade como fator de risco de morte sbita ou de descompensaes recorrentes da IC. Recentes estudos demonstraram superioridade da eficcia ventilatria (VE/VCO2 slope) em relao ao VO2 pico no prognstico de pacientes com IC8,10. iii. Escore prognstico - Heart Failure Survival Score (HFSS) e Seattle Heart Failure Model (SHFM) Esses modelos tm sido utilizados frequentemente para clculo de previso de sobrevida em pacientes com IC crnica. O Heart Failure Survival Score (HFSS) pode tambm orientar a necessidade de transplante em pacientes ambulatoriais com longos perodos de espera. Esse modelo estatstico continuaTabela 4 - Recomendaes para avaliao e seleo do receptor de transplante cardacoTeste Anamnese e exame fsico completos; Acompanhamento. Imunocompatibilidade ABO; PRA (ver texto); Tipagem HLA tecidual; Avaliao da gravidade da IC Teste cardiopulmonar; Ecodopplercardiograma; Avaliao hemodinmica pulmonar; ECG de repouso. Avaliao funcional de mltiplos rgos Bioqumica de sangue, PFH, PFR, PFT, lipidograma; Urinlise; TFG; Proteinria de 24 horas; PFP e gasometria; Radiografia de trax (PA e perfil); Ultrassom abdominal total; Doppler carotdeo (se indicado ou em > 50 anos); Exame odontolgico; Exame oftalmolgico (se diabtico). Sorologia para infeces e vacinao HbsAg, Anti-Hbc,Anti-Hbs, Anti-HCV; HIV, HTLV; CMV, Toxoplasmose, EBV, Varicela; Vacina antigripal (anual); Vacina antipneumoccica; Vacina anti-hepatite B (trs doses); Anti-Hbs (imunidade); Profilaxia de verminose. Rastreamento de neoplasia Pesquisa de sangue oculto nas fezes (trs amostras); Colonoscopia (se indicada e acima de 50 anos); Mamografia (se indicada ou idade > 40 anos) Citologia crvico-vaginal (se indicado, idade 18 anos, sexualmente ativa); PSA (se indicado e homens > 45 anos). Consultas especializadas Avaliao nutricional, social e enfermagem; Psicologia e Psiquiatria/Nutrologia (se indicadas); Outras especialidades (se indicadas). PRA - reatividade contra painel de anticorpos; HLA - antgeno leucocitrio humano; PFH - provas de funo heptica; PFR - provas de funo renal; PFTprovas de funo tireoidiana; TFG - taxa de filtrao glomerular; PFP - prova de funo pulmonar. X X X X X X X X X X X X X X X X X X X X X X X X X X X X X Anual X X X Basal X X Repetir Quinzenal

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Diretrizessendo muito til para discriminar mortalidade nesse grupo de pacientes. Qualquer paciente includo na lista com escore inicial classificado como de alto risco, e que aps o tratamento clnico otimizado tenha seu status alterado para intermedirio ou baixo risco, mesmo assim, mantm alta mortalidade. Sendo assim, esses pacientes s podem ser retirados da lista se ocorrer melhora clnica considervel. O nico grupo que mantm sobrevida igual ou melhor do que o transplante o que includo na lista com escore inicial baixo e se mantm nesse status16-18. Escore HFSS ((1(se DAC) ou 0 (no DAC)) x 0,6931 + (1(atraso de conduo intraventricular) e 0 (sem atraso)) x 0,6083 + (FEVE (%)) x -0,0464 + (FC) x 0,0216 + (concentrao de sdio) x - 0,0470 + (PA mdia) -0,0255 + (VO2 pico) x - 0,05456 O estudo COCPIT19 definiu os pacientes em trs perfis de risco utilizando o HFSS: - Baixo risco (HFSS maior ou igual a 8,10) - Sobrevida em um ano - 93% - Mdio risco (HFSS entre 7,2-8,09) - Sobrevida em um ano - 72% - Alto risco (HFSS menor ou igual a 7,19) - Sobrevida em um ano - 43% O Seattle Heart Failure Model avalia o risco de mortalidade considerando o benefcio das medicaes e dos procedimentos teraputicos. Inclui no seu clculo caractersticas clnicas (idade, sexo, classe funcional, peso, frao de ejeo de ventrculo esquerdo, presso sistlica sistmica), de medicaes (inibidores da enzima de converso da angiotensina - IECA, betabloqueadores - BB, bloqueadores dos receptores de angiotensina - BRA, estatina, alopurinol, antagonista da aldosterona, diurticos com detalhamento dos tipos), laboratriais (hemoglobina, linfcitos, cido rico, colesterol total, sdio srico), de ressincronizao e/ ou de cardiodesfibrilador. Dentre suas limitaes, deve ser destacado que o Seattle Heart Failure Model foi desenvolvido e validado em pacientes de estudos clnicos, observacionais e em registros, no podendo ser generalizado para pacientes hospitalizados e com mltiplas comorbidades. Como a classe funcional da NYHA, sua utilizao deve ser pontual, devendo ser recalculado periodicamente estimando o impacto das intervenes acrescidas20. iv. Tratamento e manuteno de pacientes ambulatoriais na lista de espera O fato de um paciente ser selecionado, inscrito e ativado na lista de transplante cardaco no significa que o transplante ser realizado. A seleo de um candidato dinmica e requer reavaliao contnua. Melhora clnica bem como aparecimento de comorbidades importantes podem adiar ou contraindicar o procedimento. O tratamento clnico deve estar adequado e otimizado . As Tabelas 5 e 6 resumem as recomendaes do tratamento farmacolgico e no farmacolgico.5

C) Tratamento e manuteno do receptor internado farmacolgico e no farmacolgico Para pacientes em lista de transplante de corao, o tempo de espera pode ser longo e a condio clnica pode deteriorar, necessitando internao hospitalar e mudanas naTabela 5 - Recomendaes para tratamento farmacolgico de pacientes ambulatoriais com IC compensada candidatos ao transplante cardacoClasse de Recomendao Indicaes Antagonistas neuro-hormonais (IECA, BRA e BB) que se mostraram efetivos nos estudos clnicos de IC e FEVE < 45%, nas doses mximas toleradas; Espironolactona em pacientes com IC em CF III / IV e FEVE baixa; Combinao de hidralazina e nitrato em pacientes com IC e FEVE baixa, com contraindicaes ao uso de IECA ou BRA; Classe I Diurticos de ala em pacientes com IC grave e reteno hdrica. Nos casos de resistncia aos diurticos, investigar e excluir fatores precipitantes e iniciar tratamento especfico; Anticoagulao com varfarina para os pacientes com IC, FEVE baixa e histria de tromboembolismo, FA ou trombo intracavitrio; Digoxina em pacientes com FE < 45%, ritmo sinusal ou FA, sintomticos com terapia otimizada. Acrescentar BRA s doses mximas toleradas de IECA e BB, em pacientes que persistam sintomticos apesar da terapia padro; Acrescentar hidralazina e nitrato em pacientes afrodescendentes com sintomas persistentes em uso da teraputica padro. Nvel de Evidncia A

B B

C

A

B

B

Classe IIa

B

IECA - Inibidores da enzima de converso da angiotensina; BRA - bloqueadores dos receptores de angiotensina; BB - betabloqueador; CF - classe funcional; FEVE - frao de ejeo do ventrculo esquerdo; FA - fibrilao atrial.

Tabela 6 - Recomendaes para o tratamento de pacientes candidatos ao transplante cardacoClasse de Recomendao Indicaes Restrio hidrossalina; Classe I Acompanhamento por uma equipe multidisciplinar; CPAP na sndrome de apneia obstrutiva do sono. Classe IIa Exerccios fsicos sob superviso em pacientes estveis. Nvel de Evidncia C C C C

CPAP - presso area pulmonar contnua.

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Diretrizesterapia farmacolgica, com a introduo de medicamentos endovenosos, ou de suporte mecnico circulatrio com dispositivos de assistncia ventricular, elevando sua condio para prioridade. Os pacientes internados devem ser mantidos no melhor estado de volemia possvel, com estabilidade hemodinmica para preservao de rgos-alvo (crebro, rim, fgado) e com exames laboratoriais o mais prximo possvel do valor normal. i. Medidas de controle da congesto em pacientes com insuficincia cardaca crnica descompensada Todas as medidas necessrias para alcanar o melhor estado volmico devem ser tomadas, incluindo diurticos intravenosos, ultrafiltrao ou dilise. A dificuldade de controlar ou evitar a reteno de lquidos pode ser considerada critrio de falha teraputica, ou resistncia aos diurticos (falha em induzir diurese clinicamente suficiente, mesmo em uso de altas doses de diurticos de ala), exigindo alternativas para o tratamento da congesto. importante lembrar que a desidratao excessiva pode levar hipotenso, nova ativao do sistema neuro-hormonal e piora da funo renal. A resistncia ao diurtico deve ser tratada com aumento da dose ou da frequncia dos diurticos de ala, mudana para diurtico de ala com melhor biodisponibilidade, adio de um tiazdico ou administrao endovenosa (in bolus ou infuso contnua) de diurtico de ala e/ou uso de drogas inodilatadoras como dopamina, dobutamina, levosimendana ou milrinona. Ultrafiltrao uma tcnica promissora que pode ser de muita ajuda nos pacientes resistentes (Tabela 7) 2,5,21-23. D) Manejo de drogas vasoativas e dispositivos de assistncia i. Drogas vasoativas a) Vasodilatadores As drogas vasodilatadoras para uso intravenoso na insuficincia cardaca disponveis no Brasil so nitroprussiato de sdio, nitroglicerina e nesiritide. Essas drogas tm utilizao preferencial nas situaes de presses de enchimento ventricular elevadas, aumentos significativos na RVP e na resistncia vascular sistmica (RVS), alm das situaes de sobrecarga aguda de volume secundria a leses valvares regurgitantes (insuficincia mitral e artica)24. Para serem usadas isoladamente, necessrio que a presso arterial sistlica sistmica esteja adequada (ideal 85 mmHg) para evitar que haja reduo da presso de perfuso orgnica (Tabela 8). b) Inotrpicos e inodilatadores Em pacientes com baixo dbito cardaco, com ou sem congesto, o emprego de terapia inotrpica pode ser necessrio para melhorar a perfuso tecidual e preservao de funo de rgos vitais25. Esses agentes so mais apropriados para terapia em pacientes com rpida deteriorao hemodinmica, bem como em pacientes com IC crnica e nveis basais elevados de escrias nitrogenadas e que no alcanaram diurese satisfatria, apesar do uso de diurticos de ala e vasodilatadores. So tambm eficazes em suporte hemodinmico temporrio em pacientes espera de transplante cardaco. Tais agentes so divididos em trs grupos: agonistas betaadrenrgicos (noradrenalina, dopamina e dobutamina), inibidores da fosfodiesterase III (milrinona) e sensibilizadores de clcio (levosimendana). As recomendaes para seu uso encontram-se na Tabela 9. O choque cardiognico representa uma situao especial acompanhada de alta mortalidade e caracterizado por persistente (> 30 minutos) e marcada hipotenso (PA sistlica < 90 mmHg ou queda na PA mdia > 30 mmHg), levando hipoperfuso tecidual induzida por falncia miocrdica, aps correo da pr-carga. Quando monitorizado invasivamente, a presso de ocluso pulmonar > 18 mmHg e o ndice cardaco < 2,2 l/min/m (classe IV de Forrester). O tratamento medicamentoso inicial do choque cardiognico se baseia no uso de inotrpicos e diurticos venosos, o primeiro para melhorar o desempenho cardaco e o segundo para reduzir a congesto pulmonar. Entretanto, quando esses

Tabela 7 - Recomendaes do uso de diurticos e/ou hemodilise ou ultrafiltrao na IC em paciente internado em lista de transplante cardacoClasse de recomendao Indicaes Diurticos intravenosos para controle de sintomas de congesto em pacientes com IC aguda; Classe I Associao de diurtico tiazdico ao diurtico de ala em pacientes com tratamento clnico otimizado que mantm sinais de congesto. Ultrafiltrao ou dilise para reduo da sobrecarga de volume e da hiponatremia. Diurticos em pacientes sem sinais de hipervolemia. Nvel de Evidncia C

Tabela 8 - Indicao de vasodilatadores por via intravenosa na IC em paciente internado em lista de transplante cardacoClasse de recomendao Indicaes Nitroglicerina em pacientes sem hipotenso; Nvel de Evidncia B

C

Classe I

Classe IIa Classe III

B C Classe IIb

Nitroprussiato em pacientes em uso de monitorao hemodinmica invasiva e resistncia vascular sistmica aumentada, associado ou no a inotrpicos. Nesiritide para tratamento da IC descompensada em pacientes sem hipotenso.

B

B

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DiretrizesTabela 9 - Recomendaes do uso de inotrpicos na IC em paciente internado candidato ao transplante cardacoClasse de recomendao Indicaes Dobutamina para pacientes em choque cardiognico, para suporte hemodinmico, independentemente da etiologia da cardiomiopatia; Classe I Milrinone para pacientes com sinais de baixo dbito, sem choque cardiognico, etiologia no isqumica, em uso de betabloqueador; Dobutamina e/ou milrinone para suporte hemodinmico para pacientes em baixo dbito e em situao de prioridade. Classe IIa Levosimendana para pacientes com sinais de baixo dbito, sem choque cardiognico, e em uso de betabloqueador. Dobutamina, milrinone ou levosimendana para melhora dos sintomas de pacientes em baixo dbito sem hipotenso arterial; Associao de Levosimendana na tentativa de retirada de Dobutamina. Dobutamina, milrinone ou levosimendana para pacientes sem sinais de baixo dbito; Classe III Dobutamina, milrinone ou levosimendana em infuso intermitente ambulatorial para pacientes com frequentes descompensaes. Nvel de Evidncia B

Tabela 10 - Reposio volmica em pacientes internados em lista de transplanteClasse de recomendao Indicaes Reposio volmica nos pacientes comprovadamente hipovolmicos; Classe I Valores baixos de PVC e/ou POAP associados a hipofluxo tecidual, indicam infuso hdrica imediata. Medidas dinmicas para avaliao da responsividade cardiovascular a volume; Classe IIa Prova de volume com infuso rpida de 250 ml de cristaloide na suspeita de hipovolemia. Avaliao do DC para orientao da reposio volmica quando h suspeita de sobrecarga volmica e/ou manuteno da hipoperfuso aps a ressuscitao inicial. Nvel de Evidncia C C C C

B

C

B

Classe IIb

C

B C B

Classe IIb

PVC - presso venosa central; POAP - presso de ocluso da arteira pulmonar; DC - dbito cardaco.

B

falham, o uso, em associao ou em substituio, de reposio volmica e de vasopressores faz-se necessrio (Tabela 10). ii. Dispositivos de assistncia ventricular (DAV) O nmero de transplantes de corao realizados no mundo permanece esttico e a terapia medicamentosa sozinha para a IC terminal continua a ter resultados desanimadores26. O suporte mecnico circulatrio (SMC) vem expandindo o tratamento da IC avanada. Os DAV so propulsores sanguneos que substituem o trabalho mecnico ventricular (esquerdo e/ou direito), garantindo o dbito cardaco necessrio para propiciar condies favorveis recuperao miocrdica ou substituio do corao27-29. Os DAV podem ser classificados de vrias maneiras: bombas centrfugas, deslocamento do volume (pneumtico ou pulstil) ou de fluxo axial. Podem ser implantveis ou extracorpreos, usados como ponte para transplante (para manuteno da estabilidade clnica enquanto se aguarda o transplante), como ponte para recuperao (naqueles em que se espera a recuperao da funo ventricular), como ponte para uma prxima deciso (quando colocado na descompensao aguda para estabilizao, mas ainda no se tem a prxima estratgia planejada) ou como terapia final (para pacientes que no tm indicao de transplante ou que no exista recuperao da funo ventricular).

Devido pequena experincia brasileira e aos muitos DAV disponveis, esta diretriz no pode cobrir todos os pontos especficos encontrados na seleo e manejo dos pacientes. Porm, baseando-se na literatura atual, os dispositivos pulsteis implantveis devem ser usados com rea de superfcie corporal > 1,5 m2 e, nos menores, o uso de dispositivos extracorpreos ou bombas pulsteis devem ser considerados. Pacientes com creatinina srica > 3,0 mg/dl so de alto risco e o uso de DAV deve ser considerado apenas se a insuficincia renal for aguda e com probabilidade de recuperao. Ventilao mecnica sem insuficincia pulmonar prvia ou infiltrado inflamatrio fator de risco, mas no deve ser considerada contraindicao absoluta. Todos os pacientes avaliados para DAV devem ter funo heptica e testes de coagulao mensurados. Nveis de TGO/ TGP > 3x o valor normal so de risco, e na presena de insuficincia ventricular direita, suporte biventricular deve ser a primeira opo. Pacientes com INR espontneo > 3,5 tm risco aumentado de complicaes hemorrgicas. As complicaes existem assim como nas cirurgias cardacas. As principais so hemorragias, infeces, mau funcionamento do dispositivo (principalmente os de primeira gerao) e sensibilizao ao HLA (anticorpos aos antgenos leucocitrios). As recomendaes para o uso de DAV esto resumidas na Tabela 11. O balo intra-artico de contrapulsao (BIA), embora no descomprima o ventrculo esquerdo, notadamente o tipo de suporte circulatrio mais utilizado e atua como adjuvante no tratamento do infarto agudo do miocrdio (IAM) complicado por choque cardiognico (auxiliando a recanalizao mecnica ou qumica, ou o tratamento da IC, muitas vezes secundria complicaes mecnicas)30. O SMC atualmente um tratamento frequente e aceitvel para a IC tanto em curto quanto em longo prazo. A recuperao miocrdica vem sendo estudada e o mecanismo exato desta recuperao em longo prazo permanece por ser

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DiretrizesTabela 11 - Recomendaes para uso de dispositivos de assistncia ventricularClasse de Recomendao Indicaes Deteriorao progressiva do quadro clnico com necessidade de doses incrementais de inotrpicos e diurticos; BIA em pacientes com choque cardiognico no responsivo teraputica farmacolgica otimizada. Choque cardiognico refratrio ao tratamento clnico e/ou BIA em pacientes com possibilidade de recuperao; Classe IIa Como terapia final eletiva em no candidatos a transplante cardaco que esto dependentes de inotrpicos; Dificuldade de desmame da circulao extracorprea (ps-cardiotomia) em pacientes com possibilidade de recuperao. Classe III BIA - balo intra-artico. Disfuno multiorgnica irreversvel. Coagulopatia refratria. Nvel de Evidncia C

apresentam insuficincia respiratria secundria ao edema pulmonar subjacente ou presena de leses do sistema nervoso central. , portanto, imperiosa, a excluso de doena pulmonar concomitante, preferencialmente pela utilizao de mtodos de imagem5. O aumento do nmero de pacientes graves tem levado ao aumento dos chamados receptores limtrofes e em prioridade14. Os critrios para esses receptores esto resumidos na Tabela 12. Alguns casos no contemplados pelos critrios clssicos podem ser discutidos e aprovados pela cmara tcnica como angina ou arritmia ventricular refratrias. F) Receptor limtrofe i. Infeco Infeces bacterianas no tratadas com antibiticos contraindicam a realizao de transplante cardaco. Contudo, pacientes com infeces sistmicas, porm tratadas nas ltimas 48 horas com antibiticos, e evidncias laboratoriais indicativas de controle do processo infeccioso, podem ser submetidos ao transplante cardaco. Especial ateno deve ser dada embolia pulmonar recente, pelo risco de infeco secundria aps a realizao de transplante cardaco 35. Receptores portadores de hepatite C devem ser submetidos mensurao da carga viral, podendo ser submetidos ao transplante cardaco na ausncia de tal agente infeccioso. ii. Insuficincia renal

Classe I

B

B

B

B C C

elucidado, assim como o remodelamento do corao dilatado. Parte da avaliao para SMC deve incluir o potencial para a recuperao miocrdica31. E) Receptor em prioridade Os pacientes com maior probabilidade de morte na fila de espera para transplante cardaco tm prioridade para serem submetidos ao procedimento operatrio. Nessa condio clnica, esto os pacientes que necessitam de assistncia circulatria mecnica, de suporte inotrpico ou sob ventilao mecnica. A assistncia circulatria mecnica com ventrculo artificial est indicada naqueles que tm expectativa de vida menor do que uma semana. Prioridade para transplante cardaco deve ser dada aos pacientes que esto em uso de ventrculo artificial por um tempo menor do que um ms, ou aos pacientes que esto usando esse aparelho por mais de 30 dias, porm com complicaes relacionadas ao dispositivo32. O uso de BIA prov assistncia circulatria mecnica por alguns dias. Esse dispositivo pode ser usado em pacientes que permanecem em choque cardiognico, com evidncias de falncia de mltiplos rgos, a despeito do uso de agentes inotrpicos33. O uso de aminas vasoativas, principalmente dobutamina, est indicado nos pacientes com dificuldade para a manuteno da perfuso tecidual, apresentando hipotenso arterial sistmica euvolmica (na ausncia de uso concomitante de betabloqueador), oligria e sinais de hipoperfuso cerebral34. So tambm considerados prioritrios os pacientes que esto recebendo mltiplos agentes inotrpicos para a manuteno da estabilidade hemodinmica32. A ventilao mecnica deve ser usada em pacientes que

Insuficincia renal, definida como nveis de creatinina plasmtica > 2 mg/dl, frequentemente encontrada em pacientes com IC candidatos a transplante cardaco. Na grande maioria das vezes, ocorre recuperao da funo renal aps o procedimento operatrio, pois a disfuno renal secundria isquemia renal crnica consequente baixa perfuso renal. Contudo, como a maioria dos pacientes submetidos ao transplante cardaco far uso de inibidores da calcineurina no perodo ps-operatrio imediato, a funo renal poder ser comprometida pelo uso destas drogas. Embora no exista um valor de corte claramente definido, a maioria dos servios de transplante cardaco exclui do programa os pacientes que apresentam valores de creatinina > 3 mg/dl. Os pacientes que apresentam valores de creatinina elevados, porm abaixo desse nvel, devem ser submetidos ao rastreamento de doena renal glomerular (proteinria de 24 horas), doena renal arterial (ultrassom de artria renal) ou doena parenquimatosa (ultrassom renal para avaliao de cronicidade e tamanho renal). Na presena de doena renal

Tabela 12 - Critrios de prioridade para o transplante cardacoDependncia de inotrpicos / vasopressores; Balo intra-artico; Dispositivos de assistncia ventricular; Ventilao mecnica; Determinao da cmara tcnica.

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Diretrizesestrutural, a conduta dever ser estabelecida individualmente, levando-se em considerao a experincia do servio e os recursos institucionais disponveis4. iii. Caquexia cardaca A caquexia cardaca, definida como ndice de massa corporal < 21 kg/m2 em homens e < 19 kg/m2 em mulheres, frequentemente encontrada em pacientes com IC avanada e varivel de predio de prognstico adverso. Pacientes com essa condio clnica, portanto, devem ser diligentemente tratados para a reverso da caquexia antes do transplante cardaco. Caso o paciente no tenha condies de se alimentar de forma adequada em virtude da doena cardaca, deve-se prontamente instituir terapia nutricional, incluindo nutrio enteral ou parenteral a fim de facilitar a cicatrizao aps o transplante cardaco e, no perodo perioperatrio35, reduzir a probabilidade de eventos desfavorveis. , portanto, extremamente necessrio que o candidato seja submetido ao transplante cardaco em condies nutricionais adequadas. G) Avaliao hemodinmica pulmonar Hipertenso pulmonar (HP) frequentemente observada em pacientes com IC e est associada a aumento da mortalidade aps transplante cardaco. Entretanto, a HP uma das variveis que provoca controvrsia na avaliao de candidatos a transplante cardaco36. Fatores que agravam a HP deveriam ser considerados e excludos, tais como apneia do sono obstrutiva, insuficincia mitral grave, estenose de veias pulmonares, doena pulmonar intrnseca ou tromboembolismo pulmonar. O cateter de artria pulmonar tem sido usado para avaliao hemodinmica pulmonar de candidatos a transplante cardaco com o objetivo de: avaliar o grau de HP; determinar presses de enchimento; medir dbito cardaco e avaliar potencial de reversibilidade da HP pelo uso de agentes vasodilatadores, tais como nitroprussiato, xido ntrico, milrinona, sildenafil, dentre outros (Tabela 13). Os parmetros mais usados para avaliar a HP esto mostrados na Tabela 14 37. O aumento reversvel da RVP tem um componente reativo e um fixo. O transplante reduz o componente reativo, mas no o fixo e, com isso, a RVP no se normaliza totalmente logo aps o transplante cardaco. A RVP pode se normalizar em 30 dias, porm uma grave dilatao ventricular direita pode permanecer por at um ano38,39. A resistncia vascular pulmonar > 3 uW tem sido considerada como um fator de risco independente de morte aps transplante cardaco, mas no h um consenso quanto ao ponto de corte abaixo do qual a disfuno de ventrculo direito no ocorra36. Presso sistlica da artria pulmonar (PSAP) > 50 mmHg e gradiente transpulmonar (GTP) > 15 mmHg so tambm preditores de eventos adversos aps transplante cardaco, independentemente da RVP 40. H consenso de que a combinao dessas variveis aumenta ainda mais esse risco39. A avaliao hemodinmica pulmonar em candidatos a transplante cardaco deveria ser realizada conforme as recomendaes descritas na Tabela 15. Se RVP basal > 5 uW, iniciar vasodilatador at que PAS < 85 mmHg. A meta reduzir a RVP para < 3uW (resposta total). Em alguns casos, a associao de inotrpicos necessria. Em pacientes internados, se uma resposta parcial ocorre, mas a RVP permanece > 3uW, o paciente deve permanecer com monitorao hemodinmica contnua e com infuso de vasodilatadores (associados ou no a inotrpicos) para que novas medidas sejam realizadas nas prximas 48 horas. O menor valor medido de RVP deve ser considerado.

Tabela 13 - Frmacos vasodilatadores usados no teste de reversibilidade da RVPAgente Oxignio 100% Nitratos Nitroprussiato de sdio Sildenafil Prostaciclina xido ntrico inalatrio Prostaglandina E1 Adenosina Milrinona Neseritide Hidralazina RVP - resistncia vascular pulmonar. Via de Administrao Mscara facial Sublingual Oral Intravenoso Intravenoso Oral ou sublingual Intravenoso Mscara facial Intravenoso Intravenoso Intravenoso Intravenoso Oral Dose 0,8 mg. 0,5 mg. 10-20 ug/kg/min. 1 ug/kg/min. 20 - 100 mg. 2,0-10 ug/kg/min. 20-80 ppm. 0,01-0,3 ug/kg/min. 100 ug/kg/min. 0,375-0,75 ug/kg/min. 2,0 ug/kg/min em bolus seguida por infuso de 0,01 ug/kg/min. 10-100 mg dividido em 2 doses. Efeitos Colaterais Hipotenso, cefaleia. Hipotenso, cefaleia. Hipotenso, cefaleia. Hipotenso, cefaleia. Hipotenso, flushing, cefaleia. Tremores, flushing, tontura e hipotenso. Metahemoglobinemia. Tremores, flushing, nuseas, vmitos, tontura e hipotenso. Inotropismo negativo. Hipotenso. Hipotenso. Cefaleia, edema perifrico, lupus-like sndrome.

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DiretrizesTabela 14 - Valores hemodinmicos pulmonares normais e na hipertenso pulmonarGTP (mmHg) Normal Hipertenso pulmonar leve a moderada Hipertenso pulmonar reversvel Hipertenso pulmonar grave 5-7 7 - 15 16 RVP (uW) 5. PSAP (mmHg) < 30 31- 49 > 50-60

e seus familiares, com acompanhamento individualizado, sistematizado, e orientaes para o autocuidado no processo de educao42-44, englobando histrico de enfermagem, exame fsico, aspectos gerais (condies de autocuidado e administrao da imunossupresso e medicamentos, adeso ao tratamento - histria pregressa, cuidador, infraestrutura bsica e higiene domiciliar - visita domiciliar, hbitos de higiene/sade do paciente/famlia, dependncia qumica e tabagismo - abstinncia total por 6 meses4, doenas prvias e associadas). Cabem ainda ao grupo de enfermagem, as orientaes quanto fila de transplante e acesso lista de espera; seleo de doadores e critrios de compatibilidade; pr-transplante, ps-operatrio e riscos cirrgicos; imunossupressores e seus efeitos colaterais; riscos de rejeio, infeco, hipertenso arterial e nefrotoxicidade; vacinao (contraindicada vacina de vrus vivo em paciente em fila como prioridade); planejamento familiar e uso de contraceptivos; reativao da doena de Chagas e orientaes quanto a leses de pele, infeco dentria ou alteraes clnicas. O enfermeiro deve possibilitar ao paciente e famlia o esclarecimento de dvidas, avaliando fatores que podero contraindicar ou comprometer o protocolo de transplante (Tabela 16)42,43,45. ii. Avaliao social

GTP - gradiente transpulmonar; RVP - resistncia vascular pulmonar; PSAP presso sistlica da artria pulmonar.

Tabela 15 - Recomendaes para avaliao hemodinmica pulmonar com cateter de artria pulmonarClasse de Recomendao Indicaes Para todos os candidatos em preparo para transplante cardaco e anualmente at o transplante; Administrao de vasodilatador quando PSAP 50 e GTP 15 ou RVP > 3 at PAS < 85 mmHg. Monitorao hemodinmica contnua e realizao de medidas de RVP com terapia otimizada de diurticos, inotrpicos e agentes vasoativos pulmonares. Nvel de Evidncia C

Classe I

C

Classe IIa

C

PSAP - presso sistlica da artria pulmonar; GTP - gradiente transpulmonar; RVP - resistncia vascular pulmonar.

Alguns pacientes podem requerer terapia mdica prolongada at que uma aceitvel reduo da RVP seja obtida. O uso de BIA e/ou DAV deve ser considerado para a reversibilidade da RVP quando o ventrculo esquerdo no pode ser efetivamente descomprimido por terapia mdica. A hipertenso pulmonar com elevada RVP contraindicao relativa ao transplante cardaco ortotpico quando a RVP > 5uW ou ndice de RVP > 6 ou GTP > 16-20 mmHg. Se existe PSAP > 60 mmHg em conjunto com qualquer uma dessas trs variveis, o risco de disfuno de ventrculo direito e morte precoce aumenta. Se a RVP reduzida para < 3uW com vasodilatador, mas a PAS cai para < 85 mmHg, o paciente permanece com alto risco de disfuno de ventrculo direito e de morte aps o transplante cardaco4,41. H) Avaliao multiprofissional do candidato ao transplante cardaco i. Avaliao da equipe de Enfermagem A complexidade e especificidade do transplante cardaco exigem do enfermeiro assistncia especfica com qualidade e domnio tcnico cientfico, avaliando de forma objetiva e direcionada as necessidades do paciente

a ferramenta de conhecimento e interveno estrutural das questes sociais presentes no cotidiano do paciente. Esse instrumento realizado por meio de entrevista e, tem por objetivo configurar o quadro social em que o paciente se encontra inserido, identificando fatores de ordem socioeconmica e cultural, que possam ser considerados de risco mdico para o paciente aps a realizao do transplante cardaco. Alm disso, apresenta a capacidade de facilitar, interferir ou obstruir o acompanhamento integral proposto pelo programa. A avaliao social fundamentada em 04 categorias46: a) Aceitabilidade - Capacidade de aceitao/adeso pelo paciente/cuidador; b) Dinmica familiar - Identificao de cuidador familiar informal/formal que participe da assuno dos cuidados;

Tabela 16 - Recomendaes da equipe de enfermagem ao paciente em fila de transplante cardacoClasse de Recomendao Indicaes Implementao de atividades de educao e ensino ao paciente e famlia em todas as fases do processo de transplante; Classe I Identificao ou risco de complicaes no processo de transplante; Condies para o autocuidado, e autoadministrao de imunossupressores e medicamentos. Nvel de Evidncia C

C C

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Diretrizesc) Acesso - Deslocamento ao hospital no prazo de tempo de at duas horas e acesso aos meios de comunicao; d) Condio socioeconmica - Anlise das variveis: renda, escolaridade, habitao e profisso do paciente/provedor. A avaliao social se constitui em um parecer social, resultado de um estudo fundamentado, conclusivo e indicativo47 e apresenta proposta de interveno s variveis dificultadoras ao adequado acompanhamento do programa de transplante equipe mdica (Tabela 17)4. Os parmetros bioqumicos, tais como albumina, transferrina e pr-albumina devem ser analisados com cautela, pois podem estar diminudos em processos de inflamao, infeco e aumento de catabolismo. O consumo alimentar pode ser avaliado por mtodos prospectivos e retrospectivos, importantes para verificao da alimentao habitual. Dentre os mtodos subjetivos, deve-se utilizar a avaliao nutricional subjetiva global e exame fsico com anlise dos sinais fsicos indicadores de desnutrio energtico-protica e carncias especficas de nutrientes. Alm da avaliao nutricional, recomenda-se realizar o acompanhamento dos pacientes com IC que apresentam comorbidades (Tabela 18), tais como diabetes, hiperlipidemia, doena renal, alcoolismo, caquexia cardaca e obesidade, que necessitam orientaes dietticas especficas2,48,56. a) Recomendaes nutricionais A terapia nutricional em pacientes com IC tem como objetivos49,57-59: preservar a composio corporal e/ou limitar os efeitos do catabolismo; manter o estado funcional e a qualidade de vida; atingir as necessidades nutricionais; identificar o quadro de caquexia cardaca para cessar ou reverter perda de peso; contribuir para a diminuio de medicao e a reduo da progresso da doena; contribuir para minimizar as descompensaes e internaes; evitar a sobrecarga de fludos e controlar edemas. As caractersticas da terapia nutricional encontram-se apresentadas nas Tabelas 19 e 2060. Merece destaque a importncia da restrio de lquidos (gua, chs, sucos, refrigerantes, leites, iogurtes, caldos, sopas, gelatinas, sorvetes) que deve ser individualizada, considerando-se o estado volmico e a gravidade da doena. A restrio pode variar desde 1,5 - 2 litros para pacientes estveis sem sinais de descompensao recente at 700 ml-1 litro para pacientes mais graves que necessitam de internaes frequentes. A recuperao do estado nutricional em pacientes com IC grave tarefa difcil. Na maioria das vezes, a recuperao completa s ocorre aps a realizao do transplante cardaco.Tabela 18 - Comorbidades e suas implicaes em pacientes com IC graveClasse de Recomendao Parmetros Terapia nutricional especializada; Orientao para perda de peso para pacientes com IMC > 30 kg/m2 ou percentual de peso corpreo >140%, devido ao pior prognstico associado no ps-transplante; Evitar orientao de perda de peso de forma generalizada na IC grave ou moderada, devido perda de peso no intencional frequente. IMC - ndice de massa corporal. Nvel de Evidncia C

Tabela 17 - Recomendaes de indicadores sociais para avaliao social em programa de transplanteClasse de Recomendao Classe I Classe IIa Indicaes Aceitabilidade; Dinmica familiar; Condio socioeconmica. Acesso Nvel de Evidncia C C C C

iii. Avaliao nutricional do candidato ao transplante cardaco A IC pode ser vista como um estado catablico complexo que resulta em um prognstico no favorvel. Um dos principais sinais e sintomas da IC a perda de peso gradual, afetando os msculos, tecidos gordurosos, ossos e o prprio corao, chegando, em estgios finais, a um quadro conhecido como caquexia cardaca, definida pela perda involuntria de peso, sem edema, de mais de 6% do peso corpreo total no perodo de 6 meses, que a causa do aumento da mortalidade48. A desnutrio resulta em alteraes na composio corprea e na homeostase de diversos sistemas, como ativao dos sistemas inflamatrios e endcrinos, que ocasionam a liplise, enfraquecimento muscular, falta de apetite e alteraes na perfuso intestinal49. Est frequentemente presente em pacientes com IC grave aguardando transplante cardaco e pode aumentar as complicaes e a mortalidade no perodo ps-operatrio50. A avaliao do estado nutricional tem como objetivo identificar os distrbios nutricionais presentes e planejar a interveno teraputica nutricional adequada, de forma a auxiliar na recuperao e/ou manuteno do estado de sade do indivduo. No existe uma tcnica ideal que, exclusivamente, indique o diagnstico nutricional com preciso. A avaliao deve ser feita de forma subjetiva e objetiva por meio de indicadores antropomtricos, bioqumicos e de consumo alimentar utilizados de forma integrada51-55. Dentre os indicadores antropomtricos, a aferio das pregas cutneas tricipital, bicipital, subescapular, suprailaca, a circunferncia do brao e a circunferncia muscular do brao so os melhores ndices a serem utilizados em pacientes com IC grave, uma vez que so melhores ndices na presena de edemas.

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Classe I

C

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DiretrizesTabela 19 - Caractersticas da terapia nutricionalCaractersticas 20-25 kcal/kg peso/dia calorias para pacientes crticos; Energia 25-30 kcal/kg peso/dia/kg para pacientes estveis e de ambulatrio; Acima de 30 kcal/kg peso para pacientes com caquexia: evitar a sndrome da superalimentao (importncia da monitorao da glicemia e de eletrlitos). 1,0-,5 g de protenas/kg/dia: para pacientes crticos; Protenas 1,5-2,0 g de protenas/kg de peso/dia: pacientes com caquexia (atentar em pacientes com insuficincia renal). A ingesto de sal entre 2,0-2,4 g/dia (dieta restrita) e 3,0-4,0 g/dia (dieta moderada). Deve ser feita de forma individualizada. Preconiza-se a ingesto de 3500 mg/dia (90 mEq). Em casos de baixa ingesto, deve-se suplementar por via medicamentosa. Avaliar consistncia da dieta, oferecer dieta fracionada e de fcil mastigao e digesto. Devem ser considerados na incapacidade do paciente atingir suas necessidades calricas e proticas. Contraindicaes absolutas Contraindicaes relativas

Tabela 21 - Recomendaes para avaliao psicolgica do candidato ao transplante cardacoClasse de Recomendao Classe I Indicaes Avaliao psicolgica especializada. Nvel de Evidncia C

Tabela 22 - Critrios de avaliao psicolgica do candidato ao transplante cardacoA condio psicolgica do paciente compatvel com a situao clnica. Observam-se recursos psicolgicos defensivos adaptativos que mantm a esperana e permitem suportar o sofrimento fsico e subjetivo. Boa estrutura familiar e rede de apoio social; A condio psicolgica do paciente reativa presena e gravidade da doena. No h evidncias, no histrico do paciente, de reaes inadaptadas frente a estressores psicossociais. Boa estrutura familiar e rede de apoio social. Falhas na adeso ao tratamento associadas a condies previstas no Eixo II do DSM IV (distrbios de desenvolvimento e de personalidade) incluindo-se a categoria - personalidade tipo D (distresse), acrescidas de falta de suporte familiar e social. Dependncia qumica (abstinncia inferior a seis meses e fatores de risco para comportamento de recidiva); ideao suicida corrente; tentativas de suicdio pregressas associadas a distrbios mentais do Eixo I e/ou II do DSM IV. Retardo mental impeditivo para compreenso mnima do tratamento vinculado falta e/ ou negligncia de cuidadores.

Sdio Restrio de lquidos Potssio Caractersticas gerais Suplementos orais, dietas enterais e parenterais

Indicaes

Tabela 20 - Recomendaes para restrio hidrossalina em pacientes com ICClasse de Recomendao Indicaes Restrio de sdio em pacientes com IC sintomtica para prevenir a reteno hdrica; Classe IIa Orientao quanto ao contedo de sdio nos alimentos; Restrio de lquidos em pacientes com IC grave, especialmente na presena de hiponatremia. Classe IIb Restrio de lquidos em todos os pacientes com sintomas leves ou moderados parece no conferir benefcios clnicos. Nvel de Evidncia C C C

DSM IV - Diagnostic and Statistical Manual.

C

O abuso alcolico situa-se entre um dos motivos mais frequentes para contraindicao de candidatos. Considerase como fator de risco em tais casos, mesmo na vigncia de abstinncia, a negao de qualquer vnculo de dependncia (incluindo de pessoas) por parte do paciente64. Depresso e ansiedade merecem diagnstico diferencial, em virtude da debilidade que caracteriza a fase de insuficincia cardaca terminal e as fantasias pelo fato de vir a possuir o corao de outra pessoa64,65. Desesperana um fator de risco associado mortalidade na fase de espera pelo enxerto64. A personalidade tipo D outro fator associado mortalidade no ps-operatrio tardio. Define-se por trao de afetividade negativa, na qual a hostilidade mantm alto nvel de estresse e conduz a condies negativas de adaptao63,66. Recomenda-se o uso de instrumentos de avaliao consagrados no campo da psicologia clnica para determinao de recursos psicolgicos defensivos adaptativos situao64.

iv. Avaliao psicolgica H considervel divergncia nos critrios de seleo psicossocial em candidatos a transplante cardaco. A utilizao isolada do DSM IV - Diagnostic and Statistical Manual possibilita o diagnstico de um nmero limitado de casos, nos quais h clara evidncia de distrbios mentais do Eixo I e II que repercutem de forma negativa e direta sobre a adeso, as modificaes necessrias de estilo de vida e a disciplina imposta pelo protocolo de tratamento, especialmente, quando as dificuldades apresentadas no podem ser atenuadas pelo suporte familiar e pela rede de apoio social, e que, portanto, determinam a excluso do paciente do procedimento (Tabelas 21 e 22)61-63.

III. ImunologiaA) Avaliao imunolgica pr e ps-transplante cardaco A presena de anticorpos circulantes contra os antgenos HLA (human leukocyte antigen) um fator de risco para rejeio e perda do enxerto aps o transplante cardaco.

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DiretrizesPara a deteco dos anticorpos pr-formados, o soro de um potencial receptor testado contra um painel de antgenos HLA representativos. O percentual de reatividade determina o PRA e define o grau de sensibilizao do paciente. Vrios estudos mostraram uma forte correlao entre os nveis de PRA e a frequncia de rejeio humoral e a perda do enxerto67,68. Assim, h muitos anos, a avaliao do PRA para os pacientes em lista de espera tornou-se praticamente imperativa (Tabela 23). Para os pacientes sensibilizados, a maioria dos centros adotou a estratgia de transplantar somente aps prova cruzada (crossmatch) prospectiva negativa. Na realizao do crossmatch, o soro do receptor testado contra os linfcitos do doador utilizando a tcnica da linfocitotoxidade dependente do complemento (CDC), podendo assim detectar a presena de anticorpos especficos contra os antgenos do doador (DSA - donor specific antibodies). Considerando que a realizao do crossmatch requer entre 5-6 horas, somente raros pacientes, em local prximo ao doador, podem usufruir deste procedimento. Alm disso, o crossmatch por CDC pode no detectar DSA de baixo ttulo devido a sua limitada sensibilidade69. Recentemente, foi desenvolvida uma nova tcnica (Luminex), baseada na citometria de fluxo (altamente sensvel), a qual, atravs do uso de antgenos HLA purificados, permite a deteco e caracterizao dos anticorpos presentes no soro do receptor. Uma vez definida a especificidade dos anticorpos, sabe-se contra quais antgenos HLA estes so dirigidos. Assim, quando um doador disponvel, e aps sua tipificao HLA, pode-se predizer o xito do crossmatch prospectivo: na ausncia de anticorpos especficos para os antgenos incompatveis do doador, o crossmatch ser negativo. Tal processo constitui o crossmatch virtual. A literatura internacional sobre a aplicao clnica do crossmatch virtual incipiente, mas os resultados so altamente encorajadores, mostrando um novo caminho para solucionar os graves problemas inerentes sensibilizao para os pacientes candidatos a transplante de corao70-72. Classicamente, as tcnicas por CDC e ELISA definem paciente sensibilizado quando PRA acima de 10%, sendo desejado nesta situao o crossmatch prospectivo (Tabela 23). A produo de DSA no ps-transplante associada com o desenvolvimento de rejeio mediada por anticorpo (AMR - antibody mediated rejection), tanto aguda quanto crnica (doena vascular do enxerto)73.Tabela 23 - Recomendaes para avaliao imunolgica no transplante cardacoClasse de Recomendao Classe I Indicao PRA para pacientes em lista de espera. Crossmatch virtual para pacientes sensibilizados; PRA para monitoramento imunolgico ps-transplante. Nvel de evidncia B C C

O mais comum mecanismo de AMR aguda a resposta anamnstica que tem origem na exposio antignica prvia (gravidez, transfuso, transplante prvio, dispositivo de assistnca circulatria) e aparece durante a primeira semana ou, no mximo, em at 30 dias aps o transplante. A produo de altos ttulos de anticorpos rpida e associada disfuno do enxerto exigindo diagnstico imediato e tratamento agressivo. A produo de anticorpos de novo mais lenta (geralmente 100 dias aps o transplante) e a rejeio menos grave. A demonstrao de DSA circulantes, juntamente com os achados clnicos, histolgicos e imunopatolgicos, recomendada para um diagnstico rpido e preciso da AMR74. O uso da tcnica Luminex com sua alta sensibilidade ideal para esse propsito, considerando que a maioria dos DSA est fixada no enxerto75. Em concluso, a deteco e caracterizao dos anticorpos no pr e ps-transplante cardaco so extremamente teis na preveno, no diagnstico, monitoramento e tratamento da AMR. B) Imunossupresso O sucesso dos transplantes foi possvel graas utilizao dos imunossupressores e melhores resultados, no longo prazo, sero atingidos com o desenvolvimento de novas estratgias e novos agentes. Segundo registro mais recente de transplante cardaco76, o esquema trplice incluindo corticosteroide, inibidor de calcineurina e antiproliferativo continua sendo utilizado de maneira rotineira na grande maioria dos servios. Mais recentemente, estratgias incluindo inibidores do sinal de proliferao (ISP) tm sido propostas. i. Corticosteroides Exercem potente efeito imunossupressor e anti-inflamatrio, atuando na regulao de genes que afetam a funo de leuccitos, citocinas, molculas de adeso e fatores de crescimento. So utilizados em altas doses nas fases iniciais e nos episdios de rejeio aguda. Devido aos seus inmeros efeitos colaterais, em especial, metablicos e cardiovasculares, sua retirada tem sido preconizada a partir do 6 ms pstransplante77, principalmente nos pacientes com histrico favorvel de rejeies. ii. Inibidores de calcineurina Ciclosporina e tacrolimus. Associados a protenas especficas do citosol formam complexos chamados imunofilinas que se ligam enzima calcineurina, bloqueando sua atuao, consequentemente inibindo a sntese de IL-2 pela clula T78. So utilizados como imunossupressores de manuteno devendo ser administrados em jejum ou duas horas aps ingesta alimentar. Apresentam metabolismo heptico via citocromo P450 (CYP-3A), por isso, inmeras drogas podem alterar seus nveis sricos, mediante inibio ou induo enzimtica (Tabela 24). Os nveis sricos de ambas as drogas devem ser monitorados e ajustados conforme perfil de rejeio e fase do transplante. A coleta no vale a mais utilizada e largamente difundida

Classe IIa

PRA - reatividade contra painel de anticorpos.

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DiretrizesTabela 24 - Interaes medicamentosas com inibidores de calcineurinaIndutores enzimticos Drogas que diminuem o nvel srico dos inibidores de calcineurina Rifampicina Isoniazida Fenobarbital Fenitona Carbamazepina Inibidores enzimticos Drogas que aumentam o nvel srico dos inibidores de calcineurina Diltiazem Verapamil Eritromicina Cetoconazol Itraconazol Nifedipina Metilprednisolona

para ambas as drogas; mais recentemente, foi sugerida a utilizao da coleta de ciclosporina duas horas aps a ingesta (C2), entretanto, meta-anlise de estudos comparando as estratgias no demonstrou diferena79. Os efeitos colaterais esto na Tabela 25. O tacrolimus parece apresentar menor incidncia de hipertenso, efeitos trficos, dislipidemia e maior incidncia de diabetes80,81. Estudos comparando as duas drogas demonstraram resultados semelhantes de sobrevida80,81, incluindo incidncia de rejeio e doena vascular do enxerto. Em trabalhos mais recentes, foi demonstrada menor incidncia de rejeio com tacrolimus em comparao ciclosporina82,83. Nas situaes de rejeio moderada a grave frequentes ou persistentes (resistentes a corticosteroide), preconizada a converso da ciclosporina por tacrolimus84. Em mulheres e crianas, devido aos efeitos trficos da ciclosporina, h uma tendncia utilizao de tacrolimus como primeira opo. iii. Antiproliferativos Azatioprina e micofenolato. A azatioprina uma prdroga que se converte em 6-mercaptopurina, e atua atravs da incorporao aos ribonucleotdeos das clulas, inibindo a sntese de DNA e RNA. Dentre os efeitos colaterais, destacam-se a mielossupresso, a hepatotoxicidade, a alergia, a pancreatite e as neoplasias. O micofenolato mofetil convertido em cido micofenlico e atua inibindo no competitivamente a enzima inosina monofosfato desidrogenase na via de novo da sntese de purinas, promovendo reduo da proliferao de linfcitos de maneira mais seletiva. Seus efeitos colaterais incluem sintomas gastrointestinais e mielossupresso85. O micofenolato sdico

(apresentao entrica do micofenolato mofetil) minimiza os sintomas gastrointestinais e apresenta perfil de segurana e eficcia semelhante ao micofenolato