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UNIVERSIDADE FEDERAL DO PAMPA
PRÓ-REITORIA DE EXTENSÃO
CURSO DE CIÊNCIAS HUMANAS – LICENCIATURA
ANAIS DO II CONGRESSO INTERNACIONAL INTERDISCIPLINAR
DE CIÊNCIAS HUMANAS - COINTER
397
ORGANIZAÇÃO
APOIADORES
398
C
COORDENADORA GERAL DO EVENTO
Prof.ª Dra. Andrea Becker Narvaes
COMISSÃO ORGANIZADORA
PROFESSORES
Dr. Ronaldo Bernadino Colvero
Me. Anderson Romário Perreira Côrrea
Me. Camila Almeida
ACADÊMICOS
Ewerton da Silva Ferreira
Danilo Pedro Jovino
Hermogenes Cerqueira Filho
Letícia Olveira Chaves de Oliveira
Tiara Cristiana Pimentel dos Santos
Valeska Avila
Vitória Silveira
399
COMITÊ CIENTÍFICO
Me. Alisson Machado
Dra. Adriana Hartemink Cantani
Dra. Andrea Bekcer Narvaes
Me. Anderson Romário Pereira Côrrea
Dra. Carmen Regina Dorneles
Nogueira
Dr. Edson Romário Monteiro Paniágua
Dr. Gerson Oliveira
Me. Gilvane Belém Correia
Danilo Pedro Jovino
Dra. Jaqueline Carvalho Quadrado
Dra. Monique Soares Vieira
Dra. Lauren de Lacerda Nunes
Lucas Giovan Gomes Acosta
Dra. Lisianne Sabreda Ceolin
Me. Rodrigo Maurer
Sandro da Silva
Dr. Sergio Ricardo Gacki
Dra. Susana Cesco
Dra. Nola Patrícia Gamalho
Dr. Muriel Pinto
Dr. Victor Oliveira
DIAGRAMAÇÃO
Ewerton da Silva Ferreira
Secretário Geral do II COINTER
400
A CORREÇÃO E ADEQUAÇÃO AS NORMAS DA
ABNT DOS RESUMOS AQUI APRESENTADOS SÃO
DE RESPONSABILIDADE EXCLUSIVA DOS
AUTORES E AUTORAS.
TRABALHOS APRESENTADOS NO GRUPO DE
TRABALHOS EDUCAÇÃO, COMUNICAÇÃO E
MÍDIA, SOB COORDENAÇÃO DA PROFª. Me.
CAMILA ALMEIDA E DO PROFª DR. DOMINGOS
SÁVIO CAMPOS DE AZEVEDO.
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SUMÁRIO TRABALHOS APRESENTADOS NO GRUPO DE TRABALHO
EDUCAÇÃO, COMUNICAÇÃO E MÍDIA
COMUNICAÇÃO NÃO VIOLENTA UMA ABORDAGEM ORGANICA, NA INTERVENÇÃO PROFISSIONAL 402
COMUNICAÇÃO NÃO-VIOLENTA: FERRAMENTA EFICAZ NA MATERIALIZAÇÃO DA CULTURA DE PAZ.
.............................................................................................................................................................. 418
EDUCAÇÃO AMBIENTAL: CRIANDO ANIMAÇÕES DO POWTOON NOS ANOS INICIAIS DO ENSINO
FUNDAMENTAL .................................................................................................................................... 432
DEMOCRATIZANDO A INFORMAÇÃO: EXPRESSÕES DA QUESTÃO SOCIAL NA PAUTA DA RÁDIO
UNIVERSIDADE 800 AM ........................................................................................................................ 445
DESAFIOS E POSSIBILIDADES DO USO DE JORNAIS E REVISTAS PARA A PESQUISA EM HISTÓRIA:
IMPRENSA ENQUANTO PARTIDO POLÍTICO ......................................................................................... 453
VIOLÊNCIA NO JORNALISMO LOCAL: UMA ANÁLISE SOBRE O DISCURSO CONTRA AS MULHERES .... 467
PERFIL DOS EGRESSOS DO CURSO DE JORNALISMO DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO PAMPA. ......... 497
402
COMUNICAÇÃO NÃO VIOLENTA UMA ABORDAGEM ORGANICA, NA
INTERVENÇÃO PROFISSIONAL 1
Simone Barros de Oliveira2
Renan Mendonça Alves3
RESUMO: A elaboração do artigo deu-se a partir da experiência teórico pratica junto ao Grupo
de Pesquisa: Educação, Direitos Humanos e Fronteira, que está vinculado à Universidade
Federal do Pampa-UNIPAMPA, Campus São Borja-RS. O trabalho tem por objetivo abordar a
Comunicação Não Violenta e sua interface com a realidade social, a fim de analisar a
Comunicação Não Violenta-CNV como meio de trabalho, com a intencionalidade de
sensibilização quanto as potencialidades inovadoras dessa forma de intervenção. O citado
Grupo de Pesquisa proporciona estudos, pesquisas e formação na área da educação, cultura,
direitos humanos e família na tríplice fronteira. Desenvolve interfaces com a educação e
formação profissional no âmbito do Mercosul, bem como identifica, capacita e potencializa
profissionais e comunidade acadêmica para materialização da cultura de paz por meio da
educação na região de fronteira entre Brasil, Uruguai e Argentina. Nesta perspectiva, o artigo
encaminha três pautas importantes: a abordagem das categorias constitutivas e relacionadas a
CNV; A metodologia implementada nessa forma de abordagem viva e orgânica; A dinâmica da
CNV como meio para resolução de conflitos, a partir da experiência vivenciada na Disciplina
Complementar de Graduação: Comunicação, Cultura de Paz e Violência no Curso de Serviço
Social, Campus São Borja/RS. A fundamentação do trabalho é bibliográfica, a partir do método
dialético critico que tem como categorias centrais a totalidade, a historicidade e a contradição.
A relevância do presente estudo é a sistematização da Comunicação Não Violenta-CNV como
meio inovador a serviço da instrumentalidade profissional; bem como subsidiar novas pesquisas
sobre o tema, na perspectiva de ampliação desta forma de abordagem na resolutividade de
conflitos.
Palavras-Chaves: Comunicação Não Violenta; Intervenção e Instrumentalidade; Cultura de
Paz;
1 Trabalho executado pelo Grupo de Pesquisa: Educação Direitos Humanos e Fronteira, vinculado a Universidade
Federal do Pampa, campus São Borja/RS. 2 Professora Adjunta da Universidade Federal do Pampa/UNIPAMPA, Mestre e Doutora em Serviço Social, pela
Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul/PUCRS, líder do Grupo de Pesquisa Educação, Direitos
Humanos e Fronteira. E-mail: simoneoliveira@unipampa.edu.br 3 Acadêmico do 6º semestre do Curso de Serviço Social da Universidade Federal do Pampa, Campus São Borja/RS.
Pesquisador do Grupo de Pesquisa: Educação Direitos Humanos e Fronteira. E-mail renan_nio@hotmail.com
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INTRODUÇÃO
Ao estudar o conceito Comunicação Não Violenta importante é a compreensão das
categorias centrais como: comunicação, violência, cultura, paz e sociedade. Nesse é necessário
resgatar a origem das mesmas, de forma a ter maior precisão quanto ao sentido do que se quer
enfatizar. O artigo em sua primeira seção resgata conceitos e conceituadores das categorias
citadas, promove já no seu início a análise de suas bases e significados para que se introduza a
reflexão do objeto estudado, a Comunicação Não Violenta-CNV Rosenberg (2006).
O presente trabalho elucida as categorias com a intencionalidade exploratória dos
conceitos para delimita-los, a fim de se apreender os elementos constitutivos da Comunicação
Não Violenta-CNV. Assim imprimindo a análise da práxis comunicacional. Como forma de
articular a abordagem viva e orgânica da intervenção Interpessoal as demandas que emergem
do diálogo com a realidade social em suas formas multifacetadas de desigualdades social no
contexto social moderno. O artigo apresenta-se como subsídio técnico tanto para crítica ou para
o endossamento dessa forma de abordagem semântica e hermenêutica da linguagem, isto é, da
Comunicação Não Violenta-CNV. No trabalho estuda-se sobre os sistemas de linguagens que
guardam em si um sentido técnico, ético e político a respeito da visão de homem e de mundo
em que se relaciona pelos códigos de sinais. Nesse sentido servindo tanto para a manutenção
de uma determinada natureza de poder do estatus quo4, ou para seu enfrentamento em forma de
microrevoluções, isto é, em forma de resistência; na passagem do estado em Si para um estado
para Si5.
O artigo apresenta os elementos constitutivos da comunicação tradicional e da
Comunicação Não Violenta – CNV MARSHALL (2006) o que propicia análise do sistema de
linguagem, seja no modelo tradicional ou do modelo empático com a CNV. Serão abordados
os elementos que potencializam a resolutividade de conflitos a partir da metodologia de
abordagem orgânica viva de intervenção na realidade social, com o objetivo de responder as
demandas sociais, cada vez mais metamorfoseadas no contexto social político e ideológico da
sociedade moderna.
A partir dos resultados da revisão bibliográfica problematizam-se os mesmos, na
perspectiva da Comunicação Não Violenta-CNV, a fim de ir ao encontro da instrumentalidade,
4“status quo” quer dizer estado atual de acumulação de capital, manutenção das relações sociais vigentes
burguesas; 5 Para “SI” quer dizer, um momento histórico em que se toma a consciência de classe trabalhadora.
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a partir do conceito de Guerra (2000) como possibilidade de resposta a demanda do conflito
interpessoal. Com a conclusão aponta-se para as potencialidades dessa forma de abordagem
orgânica, que se utiliza de uma práxis comunicacional no caminho da educação permanente,
para uma cultura que vá para além do capital.
METODOLOGIA
O método utilizado é o materialista dialético critico que tem como categorias centrais a
historicidade, a totalidade e a contradição; A fundamentação teórica é a partir de recursos
bibliográficos, com base no acumulo teórico nos mementos de leituras no Grupo de Pesquisa:
Educação Direitos Humanos e Fronteira, vinculado a Universidade Federal do Pampa, campus
São Borja/RS Para a análise da realidade optou-se pelo Método Dialético-Crítico, que busca
mais do que fatos isolados, a sua busca consiste na conexão entre os múltiplos fatores que
condicionam uma realidade. O desvendamento da realidade acontece por meio de suas
contradições, reconhecendo a historicidade e buscando a totalidade, uma vez que leva em conta
o contexto social, cultural, econômico e histórico dos sujeitos envolvidos na investigação.
Segundo o autor, como lê-se:
[...] Pode-se definir método como caminho para se chegar a determinado fim. E
método científico como o conjunto de procedimentos intelectuais e técnicos adotados
para se atingir o conhecimento. (GIL, 2008, p. 27)
O autor afirma que todo o conjunto de ações previamente planejadas com um rigor
metodológico e instrumental a serviço de uma finalidade, que investigar e apreender as
categorias, particularidades, sistemas de mediações do objeto que se propõe a estudar e intervir.
Nesse caminho o que se observa são as categorias utilizadas nesse processo, a historicidade, a
contradição e a totalidade. Segundo Turck (2012, p. 12) apreende-se as categorias do método
como se lê:
[...] Historicidade - como um processo que compreende a processsualidade dos fatos,
sua provisoriedade e seu movimento permanente de superações. Totalidade - como
um todo articulado por conexões que permite a apropriação do cotidiano a partir da
compreensão histórica econômica e política como constituintes da construção da
sociedade capitalista ocidental. Contradição – é a força motriz (C x W) que provoca
o movimento de transformação instigando a partir da luta dos contraditórios, os
processos de mudança, devir na realidade dos sujeitos.
405
Nessa dinâmica do método que se apreende a realidade aparente e com sucessivas
aproximações com o objeto, no movimento dialético nega-se a positividade do objeto e introduz
a negatividade para se aproximar da essência do objeto, no movimento de tese, antítese e
síntese. Outra categoria que se introduz ao método é a categoria mediação, que se encontra no
campo entre o universal e o singular como afirma Pontes (1995) é nas particularidades que se
encontra a medição. A mediação como categoria, serve no campo da pesquisa, pois oportuniza
o articulação das contradições, pela elaboração dos sistemas de mediações que viabilizam
construção na perspectiva da totalidade do objeto.
O presente trabalho utilizou como referência pra pesquisa Gil (2008) a pesquisa é do
tipo qualitativo exploratória com análise bibliográfica em livros, tese, artigos, que abrangem o
processo fundamentação teórica de apreensão e elaboração da sistematização dos achados a
partir de estudos já contemplados no momentos de pesquisa. A delimitação da análise em
documentos e bibliografias deu-se a partir da temática Comunicação Não Violenta-CNV
FUNDAMENTOS HISTÓRICOS: um debate epistemológico necessário.
A humanidade devido a sua necessidade genérica de se comunicar, sempre utilizou um
sistema de signos como instrumento de comunicação. Como afirma Magalhães (2003; p. 22)
onde se lê:
[...] O homem se comunica através de signos, e estes são organizados através de sinais
e linguagens. Pelo processo socializador, ele desenvolve e amplia suas aptidões de
comunicação, utilizando os modos e usos de fala que estão configurados no contexto
sociocultural dos diferentes grupos sociais dos quais faz parte.
Observa-se que a atividade de se comunicar é humano genérica, e tal exercício advêm
da práxis social como resultado de vivencias e processos sócias que se transformam em
processos particulares e se objetivam em uma determinada forma de se comunicar que se traduz
na forma, nos e sinais dos sistemas de comunicação das sociedades.
Ao introduzir a Comunicação Não Violenta – CNV como sendo uma abordagem
orgânica no processo de intervenção interpessoal, propõem-se em primeiro lugar o resgate do
conceito de violência de Hannah Arendt, que é amplo se levado em consideração o conceito de
violência tradicional que se restringe a violência física. Arendt refere que:
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[...] Se nos voltarmos para os debates sobre o fenômeno do poder, descobriremos logo
que existe um consenso entre os teóricos políticos da esquerda e da direita de que a
violência nada mais é do que a mais flagrante manifestação de poder. (ARENDT
2004, p. 22)
Nessa perspectiva a violência deve ser entendida como o exercício do poder sobre
alguém, que pelo poder do outro sobre si é oprimido e dominado. Dessa forma as relações de
poder perpassam as relações interpessoais ou nas relações de poder Estado Nação e sociedade
civil; que sempre se encontram sobre a tensão, isto é, numa relação oprimida pelo poder
jurídico, ideopolitico e econômico, que domina na lógica da reprodução da relação patrocínio
e dominância.
[...] o poder nela exercido não seja concebido como uma propriedade, mas como uma
estratégia, que seus efeitos de dominação não sejam atribuídos a uma “apropriação”,
mas a disposições, a manobras, a táticas, a técnicas, a funcionamentos; (FOUCAULT
1979, p. 30)
Nesse sentido pensar o poder é pensar em algo, para além do tangível mas fruto de
relações de forças opostas que disputam uma sobre a outra, sem mesmo utilizar-se tensão, mas
antes com a manipulação e até mesmo com a concessão por parte de quem se deixa influenciar.
A partir do sentido ampliado da violência, que supera o ato físico, e introduz-se a
discussão da dimensão político ideológica da comunicação frente às desigualdades sociais
vivenciadas no modo societário moderno, a análise da estrutura no qual os discursos de uma
determinada forma de linguagem se colam ou não é prerrogativa básica para se desmistificar as
formas abstratas e classistas do sistema de comunicação modero que estigmatizam
determinados modos e condições de vida. Chauí refere comunicação como:
[...] Um conjunto de mecanismos visíveis e invisíveis que vem do alto para baixo da
sociedade, unificando verticalmente e espalhando-se no interior das relações sociais,
numa existência horizontal que vai da família à escola, dos locais de trabalho às
instituições públicas, retornando ao aparelho do Estado. (CHAUÍ 1998, p. 16)
A autora desnuda o sistema linguístico tradicional, enseja a análise da violência
presente no código comunicacional da cultura moderna. Em Bourdieu (2004) entende-se esse
sistema linguístico como um aparelho ideológico na reprodução da ordem do modo de produção
capitalista, que se faz hegemônico, e que atinge seu modo mais agressivo no Estado Neoliberal.
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Logo desvelar a contradição do sistema linguístico burguês é necessário para que possamos
avançar na construção de um sistema de linguagem que analise criticamente a realidade.
Ao indicar análise sistema linguístico, isto é, dos signos vigentes em nossa sociedade,
provoca-se o olhar para a realidade social. Nesse sentido os signos como: liberdade, direito,
consciência, trabalho escondem em si a subsunção da alienação burguesa em detrimento da
meritocracia e da moral. Pois trazem em si toda a carga subjetiva dos processos particulares e
dos processos sociais que produzem e se reproduzem no modo de falar e escrever. Dá-se
exemplo do termo “vagabundo”; que muitas vezes é empregado por trabalhadores no juízo de
valor na relação interpessoal com outros que estão em situação de desemprego.
Com isso se entende como a cultura perpassa valores, princípios e modo de vida dos
sujeitos e das relações interpessoais, onde se estabelece comunicação seja violenta ou não.
Segundo a Organização das Nações Unidas:
[...]a cultura deve ser considerada como o conjunto dos traços distintivos espirituais e
materiais, intelectuais e afetivos que caracterizam uma sociedade ou um grupo social
e que abrange, além das artes e das letras, os modos de vida, as maneiras de viver
juntos, os sistemas de valores, as tradições e as crenças. (UNESCO 2002, p. 2)
Cultura é um produto social, construído por um modo de vida coletivizado que prima
por um sistema de comunicação onde os símbolos dialogam com todos os membros da
comunidade. Nesse momento é fundante se pensar o modelo de sociedade que se deseja ter para
se decodificar e se codificar a linguagem com signos que traduzam a vontade social, e não
apenas de parte desta.
Outra categoria que emerge dentro desse sistema de linguagem é a categoria que se
refere paz, mas não a paz liberal burguesa; mas a paz que não permite-se lesar pelo silencio,
inércia, passividade mas que rompe com toda a lógica de opressão e dominação e exclusão
promovida nesse sistema de injustiça social, e que é personificado no capital; esse estado paz é
referido por Galtung, como paz negativa. Silva (2002, p.1) afirma que:
[...] A paz negativa, segundo esse ilustre professor, é a mera ausência da guerra, o que
não elimina a predisposição para ela ou a violência estrutural da sociedade. A paz
positiva, por outro lado, implica ajuda mútua, educação e interdependência dos povos.
A paz positiva vem a ser não somente uma forma de prevenção contra a guerra, mas
a construção de uma sociedade melhor, na qual mais pessoas comungam do espaço
social.
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Para Kant o estado de grerra é inerente ao ser humano, que apenas deixaria de viver o
conflito, se seus conflitos fossem mediados. Esse estado de não gerra seria o estado de paz
negativa como Galtung (2005) define em sua análise. Kant entende que:
[...] Kant a pre-ocupação em mostrar a conexão entre a eclosão de uma luta armada e
as atitudes comuns e cotidianas dos cidadãos e de seus governantes. Serve também
para pensar em como, talvez, gerenciar conflitos na ou através dela, a Educação.
(GERHARDT 2005, p. 153)
Já o signo “paz positiva” emerge como um elemento da comunicação a partir de uma
dimensão ética-política, na práxis da fala como conceito que está cheio de significado e
compromisso com a justiça social. A partir dessa análise que surge como uma forma de
enfretamento a violência estrutural e institucional que se personifica na figura do Estado
Moderno, paz positiva é o resultado da superação das injustiças sociais e de um processo
educativo como meio para se chegar a um estado de paz positiva Galtung (2005).
Nesse cenário de disputa e tentativa de se avançar em proposições que proporcione a
resolutividade das demandas sociais, surge a CNV-Comunicação Não Violenta, em uma
abordagem viva e orgânica no intuir de oportunizar como afirma Freire ao se referir a Cultura
de Paz:
[...] A paz é fundamental, indispensável, mas paz implica lutar por ela. A paz se cria,
se constrói na e pela superação das realidades sociais perversas. A paz se cria, se
constrói na construção incessante da justiça social. por isso, não creio em nenhum
esforço chamado de educação para a paz que, em lugar de desvelar o mundo das
injustiças, o torna opaco e tenta miopisar suas vítimas. (FREIRE, apud,
GUIMARÃES, 2005, p. 74).
O grande mestre da educação deixa claro que a paz que nasce da justiça social é perene
e nos provoca, para que se pense em uma educação que transborde o conceito de paz tradicional
ou paz negativa. Coadunando nessa direção dialoga-se com Constantino apud Mészáros (2008,
p.57) que afirma:
[...] Em outras palavras, a abordagem educacional defendida por ele tinha de adotar a
totalidade das práticas políticas – educacionais -culturais na mais ampla concepção
do que seja uma transformadora emancipação. É desse modo que uma
contraconciencia, estrategicamente concebida como alternativa necessária a
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internalização dominada colonialmente, poderia realizar uma grandiosa missão
educativa.
Em um movimento contracorrente, que visa resistir e superar a lógica tradicional da
comunicação, se abre a perspectiva para uma nova educação, uma educação que vá para além
do capital que promova o Ser Social para além dos limites de uma educação continuada e
introduza a educação permanente. Nesse sentido o autor apresenta um ideia que desafia todo a
ordem vigente, no que tange a escola tradicional, segundo Marx apud Mészáros (2008, p. 59)
“os seres humanos devem mudar completamente a condição industrial e política, e,
consequentemente, toda sua maneira de ser”.
A Educação para Paz como plano de fundo para a CNV- Comunicação Não Violenta
Rosenberg (2006) que oportuniza pensar como no Capitalismo inserir a forma de abordagem
viva e orgânica na tentativa de se avançar na discussão; avançar em uma educação que premie
o Ser Social o Ser Humano.
COMUNICAÇÃO NÃO VIOLENTA: Uma abordagem viva e orgânica
A partir do grande educador brasileiro Paulo Freire enfatiza-se a comunicação e sua
relevância para as relações interpessoais seja em família, comunidade ou sociedade. Nesse
sentido toma-se o conceito de Freire para dialogarmos com a comunicação:
[...] Comunicar é comunicar-se em torno do significado significante. Desta forma, na
comunicação, não há sujeitos passivos. Os sujeitos co-intencionados ao objeto de seu
pensar se comunicam seu conteúdo. O que caracteriza a comunicação enquanto este
comunicar comunicando-se, é que ela é diálogo, assim como o diálogo é
comunicativo. Em relação dialógica-comunicativa, os sujeitos interlocutores se
expressam, como já vimos, através de um mesmo sistema de signos linguísticos. É
então indispensável ao ato comunicativo, para que este seja eficiente, o acordo entre
os sujeitos, reciprocamente comunicantes. Isto é, a expressão verbal de um dos
sujeitos tem que ser percebida dentro de um quadro significativo comum ao outro
sujeito. (FREIRE 1983, p.45)
Pensar a comunicação é necessário para apreender o sentido semântico e hermenêutico
da palavra comunicação, isto é, de seu sentido na origem: comum + ação = comunicação. Essa
ação comum tem um reforço quando, parte-se da origem no latin, isto é, “communicatio” que
tem significa encarregado de. Dessa maneira podemos aferir que a comunicação pode ser imersa
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na logica alienante da subjetividade tecnicista - mecanicista que está alienada de sua dimensão
social, restringindo-se em sua condição em Si, alienada de uma proposição para Si. Para Souza
(2008, p.125) lê-se que:
[...] Indo mais além, a autora afirma que as linguagens construídas são produtos do
processo de socialização dos seres humanos, o que remete a uma concepção social das
diferentes linguagens existentes em uma mesma sociedade: elas (as linguagens)
indicam modos de ser e de viver de classes e grupos sociais diferentes entre si. Em
outras palavras, a linguagem possibilita a construção da identidade de um determinado
grupo social.
Tomada a comunicação como trabalho humano genérico, introduz a essa discussão a
práxis na comunicação, como expressão de processo dialético e dialógico com o meio em que
se desenvolve. Como forma de interação do ser social com seus pares, de forma politizada
comprometida com a proposição de um status que sai do estado em Si, para um estado para SI.
O homem genérico, isto é, o Ser social entendendo comunicação como práxis social, rompe
com a alienação simbólica, semântica e hermenêutica e ressignifica sua relação com seu signos
para enfrentamento político, ético e técnico em favor da configuração semântica e hermenêutica
emancipatória.
Pensar em Comunicação Não Violenta-(CNV) é se reportar a figura que cunhou esse
instrumento como meio para a resolução de conflitos Marchall Rosberg (2006) que ao longo
mais de 40 anos atuou em mais de 50 países, com facilitador na resolução de conflitos nas mais
diversas áreas Marchall Rosenberg ao apresentar a CNV resgata o que já temos, como podemos
ver em sua afirmação:
[...] A CNV se baseia em habilidades de linguagem e comunicação que fortalecem a
capacidade de continuarmos humanos, mesmo em condições adversas. Ela não tem
nada de novo: tudo que foi integrado à CNV já era conhecido havia séculos. O objetivo
é nos lembrar do que já sabemos - de como nós, humanos, deveríamos nos relacionar
uns com os outros - e nos ajudar a viver de modo que se manifeste concretamente esse
conhecimento. (ROSENBERG 2006 p.21)
Como podemos verificar ao utilizar a CNV, que ela não se limita a um instrumento mas
antes tem alinhamento com a totalidade do ser social, que é um todo social, emocional,
biológico, psicológico e espiritual. Ao buscar o instrumento dentro de Si, encontra-se logo o
coração como lócus para a Comunicação Não Violenta e no movimento de ouvir e falar é que
411
se estabelece um canal da empatia, do acesso e atendimento das necessidades coletivas na
resolução de conflitos. Conforme citação, o autor apresenta uma abordagem nova das relações
interpessoais pela comunicação, como se vê:
[...] Desde então, identifiquei uma abordagem específica da comunicação – falar e
ouvir - que nos leva a nos entregarmos de coração, ligando-nos a nós mesmos e aos
outros de maneira tal que permite que nossa compaixão natural floresça. Denomino
essa abordagem Comunicação Não-Violenta, usando o termo "não-violência" na
mesma acepção que lhe atribuía Gandhi -referindo-se a nosso estado compassivo
natural quando a violência houver se afastado do coração. (ROSENBERG, 2006, p.
21)
Para além de uma forma de se comunicar a CNV se apresenta de maneira a oportunizar
um diálogo franco aberto na resolução de conflitos, o que gera uma expectativa, devido um
contexto cheio de contradições e desafios em uma sociedade de classes. O quadro nº 1
explicitará a dinâmica na logica dialógica e dialética que se imprime a CNV.
Quadro nº 1
Fonte: Autor
412
Nesse caminho se destacam duas posições a do que fala e a do ouve em um movimento
de troca, sempre tendo como fim a resolutividade coletiva dos conflitos interpessoais. A partir
da abordagem segue- se quatro etapas: 1) Observação; 2) Sentimentos; 3) Necessidades; 4)
Pedido; sendo essas etapas um conjunto que compõe o todo das sucessivas aproximações para
a construção orgânica e viva de uma resposta a necessidade comum.
A partir da Obra de Marchall Rosenberg (2006) e seus seguidores de sua abordagem,
apresenta-nos os elementos constitutivos, para que apreendamos a CNV e seus elementos que
tem na “Empatia” o fundamento para as outras etapas.
[...] Nossas palavras, em vez de serem reações repetitivas e automáticas, tornam-se
respostas conscientes, firmemente baseadas na consciência do que estamos
percebendo, sentindo e desejando. Somos levados a nos expressar com honestidade e
clareza, ao mesmo tempo que damos aos outros uma atenção respeitosa e empática.
(ROSENBERG, 2006, p. 21-22)
Nesse momento em que se decide por uma postura empática para se estabelecer a
comunicação como meio para a resolutividade de conflitos, explora-se cada etapa em uma via
dialógica e dialética. A dialógica rompe com toda pré-disposição para o conflito, pois se desloca
ao diálogo do campo minado do conflito e da culpa, para a resolução e para as necessidades
humanas que devem em primeiro lugar serem atendidas. E para que esse objetivo comum se
realize é compromisso das partes envolvidas investir energia nesse movimento humano
genérico.
Quanto a dialética, esta não é subalterna à dialógica e nem imperiosa, antes é
componente orgânico da análise e intervenção na realidade social, atravessada pela luta de
classes. Fundamentalmente conecta em um movimento de ir do singular para o universal e vice
versa, na apreensão das particularidades da investigação e intervenção na realidade. Modo
garante o processo de reflexão a partir das categorias teóricas do método como a totalidade, a
contradição, a historicidade e a mediação, identificando como os processos sociais se
apresentam no cotidiano das vivencias das relações interpessoais. De acordo com Turck 2012,
p.13, entende-se:
[...] Historicidade – como um processo que compreende a processualiade dos fatos,
sua provisoriedade e seu movimento permanente de superações. [...] Totalidade –
como um articulado por conexões que permite a apropriação do cotidiano a partir da
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compreensão histórica, econômica e política como constituintes da construção da
sociedade capitalista ocidental.
A partir dessa pontuação quanto a dialógica e a dialética, entra-se no primeiro elemento
constitutivo da CNV, o da “Observação” que exige do observador intensidade, dedicação para
que a consciência seja capaz de apreender, capitar, abstrair da comunicação verbal, e não verbal
os componentes da mensagem que expressão a necessidade humana genérica. Nesse sentido é
necessário que se rompa com qualquer tipo de pré-conceito e que os envolvidos não se deixem
afetar por instintos, emoções, sentimentos no processo da observação do outro.
[...] O primeiro componente da CNV acarreta necessariamente separar observação de
avaliação. Precisamos observar claramente, sem acrescentar nenhuma avaliação, o
que vemos, ouvimos ou tocamos que afeta nossa sensação de bem-estar.
(ROSENBERG 2006, p. 50)
Segundo o autor, é importante o compromisso das partes envolvidas na CNV com a
“Observação” pois dela é que se desenvolvem os demais como forma de oportunizar a relações
orgânicas interpessoal. Ao evitar avaliação preconceituosa se premia a realização empática da
comunicação não violenta. Nesse momento priorizasse a criação das condições necessárias,
para que se estabeleça a comunicação sem ruídos, isto é, limpa onde as partes envolvidas
dialoguem.
Já no segundo elemento o do “Sentimento” trabalhasse com o conjunto real de
possibilidades humanas quanto a dimensão emocional que são sentir, entender o que se sente e
se responsabilizar pelo seu sentimento ao ponto da autogestão, rompendo com a alienação de
Si mesmo. O autor apresenta-nos um exemplo que premia a análise desse importante elemento
da CNV, Rosenberg (2006, p. 55) refere-se:
[...] Ouço regularmente afirmações como: "Não me interprete mal, sou casada com
um homem maravilhoso, mas nunca sei o que ele está sentindo". Uma dessas mulheres
insatisfeitas trouxe o marido a um seminário, durante o qual ela lhe disse: "Sinto como
se estivesse casada com uma parede". O marido então fez uma excelente imitação de
parede: ficou sentado, calado e imóvel. Exasperada, ela se virou para mim e exclamou:
"Veja! É isso que acontece o tempo todo. Ele fica sentado e não diz nada. É
exatamente como se eu estivesse vivendo com uma parede".
Nesse exemplo podemos verificar que a comunicação dos sentimentos não ocorre, o que
impossibilita a dialogia do casal. Desvelando a esterilidade da comunicação sem vida, sem
414
sentimento, sem significado. O silencio também comunica a fragilidade da comunicação e de
processos objetivos e subjetivos da relação. Feita a exemplificação, o autor traz uma afirmação:
[...] Os benefícios de enriquecer o vocabulário de nossos sentimentos são evidentes
não apenas em relacionamentos íntimos, mas também no mundo profissional. (ROSENBERG 2006, p. 66)
O que fica evidente todo o esforço de se demostrar que a dimensão emocional, é o que
nos revela humanos é com ela que sentimos amor, ódio, raiva, carinho, é com ela que nossa
existência se mostra intensa cheia de vida. E nesse momento de expressão dos nosso sentimento
é o momento de realização existencial que possibilita sermos verdadeiros, únicos e humanos.
Segundo Rosenberg (2006, p.79) “Quando alguém nos dá uma mensagem negativa, seja verbal,
seja não verbal, temos quatro opções de como recebê-la.” Entre elas: a) Como algo pessoal com
foco na crítica e na acusação; b) Culpando o interlocutor; c) abrimo-nos para nossos sentimentos
e necessidades; d) invertendo o foco, abrirmo-nos a necessidades e sentimentos do outro;
Nesse momento observa-se que nas três primeiras posições frente a uma mensagem
negativa nos isentamos de qualquer espécie de compromisso com o outro, antes o enxergamos
como algoz, culpado quando não nos fechamos em nossas necessidades. O que nos é
apresentado na quarta possibilidade é outro como humano digno como eu e cheio de
necessidades como as minhas. É por isso que se reconhecem as responsabilidades pelo
sentimento do outro, como fonte de reconhecimento das próprias necessidades humano
genéricas e não de uma pessoa em especifico.
Outra importante abordagem quanto aos sentimentos é o da escravidão emocional à
libertação emocional, que se realiza quando se leva em consideração a sério na CNV, fator
segundo Rosenberg (2006, p. 94):
[...] envolve afirmar claramente o que necessitamos de uma maneira que deixe óbvio
que estamos igualmente empenhados em que as necessidades dos outros sejam
satisfeitas.
O compromisso com o outro é o motivo de ser da CNV, por esse motivo é que se faz
necessário abordar ao elemento “Sentimento”, pois nele na gestão dos sentimentos que se abre
a capacidade de acolher as necessidades do outro em relação com as minhas. Mesmo em
415
discordância ou em consonância o que importa e o atendimento da necessidade humana. Com
relação ao terceiro elemento se dialoga com a “Necessidade”, não com a minha ou com a do
outro em especifico, mas a partir das necessidades do outro reconhecer a minha para
dialogicamente verificar nossas necessidades humanas e construirmos estratégias para supri-
las.
Por fim chega-se ao elemento do “Pedido”, que após os da Observação, Sentimento e
Necessidade se apresenta como caminho para respostas mais empáticas aos pedidos. Como
afirmado por Rosenberg (2006, p.103), quando afirma:
[...] quarto e último componente desse processo aborda a questão do que gostaríamos
de pedir aos outros para enriquecer nossa vida. Quando nossas necessidades não estão
sendo atendidas, depois de expressarmos o que estamos observando, sentindo e
precisando, fazemos então um pedido específico: pedimos que sejam feitas ações que
possam satisfazer nossas necessidades.
O pedido só é expresso após a vivencia de todo o processo coletivo e dialógico entre
ambas as partes; Com o amadurecimento humano é que se criam as condições necessárias ao
pedido comum, assim, esperando uma resposta mais natural a necessidade humana. Nesse
caminho da resolução não há intervenção perfeita definida, acabada, por isso a negativa de
entender a CNV como formula, instrumento, que normaliza, configura, formata. O que se tenta
subsidiar é a intervenção interpessoal com uma abordagem orgânica e viva privilegiando as
necessidades humanas no caminho de viver com dignidade social.
CONCLUSÕES
O artigo a partir dos os elementos da Comunicação Não Violenta-CNV aponta para os
profissionais das mais diversas áreas de atuação a potencialidade dessa abordagem orgânica, o
que sensibiliza e estabelece uma nova perspectiva objetiva na resolução de conflitos. Como
afirma Rosenberg (2006, p.21) “a CNV nos ajuda a reformular a maneira pela qual nos
expressamos e ouvimos os outros”. Nessa reformulação abre-se a possibilidade inovadora em
que se valoriza a escuta e olhar sensível, como humanos que somos, rompendo a subjetividade
atribuída pelo modo de produção capitalista.
A decisão pela empatia é antes de tudo uma posição que visa a primazia pela condição
humano genéricas e suas necessidades que advém de qualquer contexto social econômico ou
416
ideopolitico. Para além da modernidade o trabalho demarca a posição da humanidade na
resolução de dilemas de qualquer ordem para garantia o desenvolvimento da vida.
E por fim a contribuição do presente trabalho de pesquisa, está fundamentado na iniciação
a pratica de pesquisa cientifica, que se configura como espaço privilegiado para o aprendizado
e aprimoramentos das técnicas de pesquisa, bem como de sistematização e a posteriores de
apresentação dos resultados e discussão sobre os mesmo. A partir desse trabalho pode-se
constatar a relevância do instrumento CNV como meio de mediação para conflitos, se
constituindo como elemento importante para o trabalho na resolução de problemáticas quanto
as relações interpessoais.
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418
COMUNICAÇÃO NÃO-VIOLENTA: FERRAMENTA EFICAZ NA
MATERIALIZAÇÃO DA CULTURA DE PAZ.
Leticia Souza Brum6
Simone Barros de Oliveira7
RESUMO: O trabalho tem sua gênese a partir do projeto de trabalho de conclusão de curso e
expõe uma perspectiva de possibilidade prática e não ideológica para o intuito de aproximar-se
de uma Cultura de paz. Essa possibilidade prática se materializa através da metodologia dos
Círculos de Construção de Paz, que juntamente com o os fundamentos teóricos da Comunicação
Não-Violenta e do Peace Research (estudos de paz), alicerçam e tornam palpáveis a
transformação de uma cultura tradicional para uma Cultura de Paz. Os Círculos de Construção
de paz utilizam- se da dimensão dialógica das relações humanas e dos conflitos, ambos vistos
como positivamente saudáveis. A comunicação não violenta é a forma pela qual os
componentes do círculo se expressam entre si e a qual requer uma alfabetização em sentimentos
em que objetiva não mudar as pessoas a fim de que supram as necessidades alheias, e sim, gerar
relações honestas e empáticas que consequentemente poderão atender às necessidades dos
envolvidos. Os círculos de construção de paz são uma ferramenta para passar de uma sociedade
de exclusão para uma de pertença e auxiliam no que tange a encontrar os aspectos da vida que
mais importam. No Círculo as diferenças emergem como conflitos e a Cultura de paz é
concomitantemente utilizada enquanto prática e construída como uma necessidade e uma
possibilidade para equilibrar essas diferenças manifestadas.
Palavras-Chaves: Cultura de paz, Círculos de construção de paz, comunicação não-violenta.
INTRODUÇÃO
Os crescentes índices de violência trazidos pelas estatísticas a cada ano são
estarrecedores. Esses fatos evidenciam que o modo de vida atual do humano em sociedade,
inserido em um contexto em que o capital perpassa as relações sociais, é de certa maneira tóxico
6Estudante do curso de Serviço Social da Universidade Federal do Pampa (UNIPAMPA) campus São Borja- RS;
e-mail: leticiabrumleticia@gmail.com 7Professora Adjunta da Universidade Federal do Pampa/UNIPAMPA, Mestre e Doutora em Serviço Social, pela
Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul/PUCRS, líder do Grupo de Pesquisa Educação, Direitos
Humanos e Fronteira. Email: simoneoliveira@unipampa.edu.br
419
e danoso na medida em que a violência torna- se algo banal. A partir disso, o contato com os
Círculos de Construção de Paz realizado pela docente do curso de Serviço Social em uma
disciplina (coautora deste trabalho e orientadora do trabalho de conclusão de curso), fez com
que despertasse a curiosidade sobre o tema, assim como culminasse na redação de monografia
da graduação, tamanho o encantamento que a temática trouxe a partir desse contato.
Diante desse contexto de violência banalizada, é importante que se busquem valores e
formas alternativas não destrutivas de relacionamento em sociedade e uma resolução de
conflitos não violenta, assim como propõem os círculos de construção de paz, herança dos
antepassados indígenas.
Focaliza uma proposta de comunicação e abordagem não violenta no que diz respeito não
só à resolução de conflitos, mas também de uma forma de se relacionar em sociedade não
destrutiva, com maior qualidade e humanização na convivência cotidiana dos sujeitos através
dos círculos de construção de paz e da comunicação não- violenta.
Os objetivos do presente artigo buscam identificar se os círculos de construção de paz são
uma estratégia eficaz para a modificação de uma cultura tradicional para uma cultura de paz e
também como a comunicação não violenta pode impactar a cultura.
METODOLOGIA
O trabalho desenvolvido é bibliográfico e documental. Bibliográfico, uma vez que é
desenvolvido a partir de material já elaborado, sobretudo embasado em fontes científicas como
livros e artigos acadêmicos (GIL,1987). E é documental na medida em que utiliza-se de
documento como material de apoio como Declaração e Programa de Ação sobre uma Cultura
de Paz como o Relatório mundial de cultura de paz. É qualitativo, uma vez que abrange a área
da ciências sociais aplicadas.
A análise e interpretação dos dados são tratados conforme MINAYO (2012) nas etapas
de pré-análise, exploração do material ou e tratamento dos resultados obtidos/ interpretação.
RESULTADO E DISCUSSÃO
A origem dos círculos de construção de paz tem sua descendência ligada de forma
bastante direta aos ancestrais indígenas norte-americanos. Esses realizavam e ainda realizam os
Círculos de Diálogo, os quais consistem na realização da reunião dos membros tribais na
420
formatação de uma roda, com o intuito de discutir questões relevantes para a comunidade. Tal
ação faz parte das raízes tribais de grande parte dos povos. (PRANIS,2010).
Os círculos de construção de paz iniciam nos Estados Unidos dentro da esfera da justiça
restaurativa, em que fazia-se a inclusão tanto da vítima de um crime quanto o causador e a
comunidade. Essas partes estando em parceria com o poder judiciário, determinavam
conjuntamente a melhor reação em relação ao crime a fim de se gerar bem-estar e segurança de
todos. A prática dos Círculos de construção de paz vêm sendo utilizada por mais de trinta anos
e é uma forma de reunir as pessoas de maneira que todos sejam respeitados; todos tenham igual
oportunidade de falar sem interrupções ao explicar- se contando a sua história dentro de um
preceito de igualdade e que acolhe aspectos emocionais das experiências individuais. (PRANIS,
2010)
A metodologia do círculo de construção de paz consiste em um encontro em que as
pessoas dispõem-se em roda sentadas em cadeiras, onde ao centro, coloca-se apenas algum
objeto que tenha um significado comum ao grupo. O formato circular remete à “liderança
partilhada, igualdade, conexão, inclusão e também promove foco, responsabilidade e
participação de todos” (PRANIS, p.25, 2010)
Nos círculos, utilizam-se elementos estruturais intencionais a fim de se gerar um espaço
em que os participantes sintam-se seguros para serem autênticos mesmo em situações de
conflito, dano ou dificuldade. São eles: A cerimonia, o bastão de fala, o facilitador ou guardião,
as orientações e o processo decisório consensual. (PRANIS,2010). A cerimonia marca o início
e o fechamento de um Círculo como um espaço sagrado, buscando estabelecer um centramento
por parte dos participantes no sentido de que haja uma qualidade nas suas presenças dentro do
círculo, diferenciando-se da presença dos encontros corriqueiros das atividades do cotidiano.
O bastão da fala ou também objeto da palavra, demarca a cada participante no momento que o
detêm em mãos, a oportunidade de fala sem ser interrompido, viabilizando a expressão plena
das emoções que causa uma escuta qualificada e um espaço seguro para falar verdades difíceis,
e também ficar em silêncio se assim optar.
O facilitador ou guardião do círculo de construção de paz ajuda a criar um espaço
coletivo em que os participantes sintam-se seguros para expressarem-se. Ele supervisiona a
qualidade do processo e estimula as reflexões através de perguntas ou pautas. O guardião não
controla ou direciona as conclusões, mas pode intervir para garantia de uma interação grupal
de qualidade.
421
As orientações consistem em compromissos que os participantes assumem entre si a fim de
estabelecer condutas claras e mútuas que serão esperadas durante o processo e que ocasionará
um ambiente respeitoso e seguro para todos. As orientações são adotadas por consenso do
grupo.
Já o processo decisório consensual traz o compromisso de compreender as necessidades
e interesses de todos. “Nem sempre o consenso é possível, mas é uma raridade não chegar a um
consenso quando tenha sido alocado ao processo Circular tempo suficiente para a escuta
integral de todos os pontos de vista.” (PRANIS, p.54, 2010)
Os cinco elementos estruturais supracitados facilitam a criação de um ambiente em que
seja possível aos participantes darem o melhor de si na relação com os outros e estabelecerem
vínculos profundos a partir da partilha de histórias pessoais, fortalecendo assim, a conexão entre
si próprios e com os demais membros do círculo.
Existe, nos círculos de construção de paz, a junção da antiga sabedoria comunitária e o
valor contemporâneo do respeito pelos dons, necessidades e diferenças individuais na medida
em que (PRANIS,2010): “respeita a presença e dignidade de cada participante, valoriza as
contribuições de todos os participantes, salienta a conexão entre todas as coisas, oferece apoio
para a expressão emocional e espiritual e dá voz igual para todos” (PRANIS,2010, p. 18)
Segundo (FURTADO, p. 11, 2012):
Esta metodologia pode ser associada ao Círculo de Cultura de Freire, em que o diálogo
em círculo, em colaboração, permite a reelaboração do mundo, emergindo uma
consciência crítica, onde os participantes extrojetam, pela força catártica da
metodologia, seus sentimentos, suas opiniões: de si, dos outros e do mundo.
De acordo com WATSON E PRANIS (2011), “o uso de círculos de construção de paz
desenvolvem a inteligência emocional, promovem a cura e constroem relacionamentos
saudáveis”.
Os Círculos de Construção de Paz podem ser utilizados em situações em que duas ou mais
pessoas:
Precisam tomar decisões conjuntas; discordam; precisam tratar de uma experiência
que resultou em danos para alguém; querem trabalhar em conjunto como uma equipe,
desejam celebrar; querem partilhar dificuldades; desejam aprender uns com os outros.
(PRANIS, 2010, p. 21)
422
A criadora dos Círculos de construção de paz afirma que para que haja uma cultura de
paz, existe a exigência de mudanças profundas das compreensões, e para isso, os círculos são
uma ferramenta prática para proporcionarem essas mudanças e sustenta-las. A autora aponta
que na sociedade atual há um buraco no que se refere ao sentimento de pertença e o significado,
o que segundo ela, são necessidades humanas profundas. Em uma cultura de paz todos devem
ter o sentimento de pertença e serem valorizados como são. O significado, seria uma
necessidade em relação a vida, o qual o ser humano está cada vez mais desconectado, uma vez
que contemporaneamente, o ritmo é acelerado e automático, existem muitas distrações no
materialismo que regem a existência humana e que nas quais não emerge a significação de que
se necessita. A consequência dessa carência de significado é a de que as inquietudes internas
vêm a tona por meio de conflitos com os outros. Logo, os círculos de construção de paz são
uma ferramenta para passar de uma sociedade de exclusão para uma de pertença e auxiliam no
que tange a encontrar os aspectos da vida que mais importam. Uma cultura de paz também
demanda da habilidade de acomodar a diferença no sentido em haja o encontro de valores
comuns, e diante disso, perceber as diferenças como algo enriquecedor e não ameaçador,
gerando interesse ao invés de temor. No Círculo as diferenças emergem como conflitos e a
Cultura de paz é necessária para equilibrar essas diferenças manifestadas. (PRANIS,2017)
DIÁLOGO
CHRISPINO E CHRISPINO (2002) atentam para o fato da ausência de diálogo e uma
comunicação eficaz estar intimamente ligada aos obstáculos que originam os conflitos, os quais
muitas vezes suscitam a violência, evidenciando o papel primordial da comunicação para a
construção de uma atmosfera preventiva perante as diversidades culturais e sociais.
A humanidade está acostumada a um modo básico de pensamento que acabou sendo
enraizado intrinsecamente como algo natural à condição do ser social. Esse modo vem a ser um
padrão mental da separação e da exclusão ao qual estamos condicionados em que impera o
modelo ou/ou: “ou isso ou aquilo; ou amigo ou inimigo; ou bem ou mal; ou eu ou o outro; ou
você está comigo ou está contra mim. As demais possibilidades – a reflexão, o diálogo, a
negociação, a criatividade, a descoberta de outros modos de convivência- ficam desde logo
excluídas.” (THOT, 2001, p.1)
Na cultura do senso comum o diálogo nada mais é que uma interação verbal que
ocasionalmente gera acordos ou conclusões. Para Humberto MARIOTTI (2001), o diálogo é
423
uma metodologia de conversação que almeja os efeitos da melhoria da comunicação entre os
interlocutores, a observação compartilhada da experiência e a produção de novas ideias e
percepções. O diálogo expande a percepção cooperativa da experiência assim como reflexão
conjunta, sendo sua principal característica a fertilização mútua. Diferentemente da intenção da
discussão e do debate, que têm por objetivo as sínteses e tomadas de decisões a interação
dialógica propõe o novos modos de ver e a criação de significados em conjunto sem ter que
analisa-los e julgá-los instantaneamente a fim de não fragmentar, imediatizar e simplificar,
opondo-se ao que preconiza o atual modelo mental de percepção de mundo, inclusive na
ciência, tecnologia e consequentemente na cultura. No organograma seguinte, o autor faz uma
sinopse que clarifica as principais diferenças entre o diálogo e a discussão/debate.
424
Diálogo
Visa abrir questões
Visa mostrar
Visa estabelecer
relações
Visa compartilhar
ideias
Visa questionar e
aprender
Visa compreender
Vê a interação
partes/todo
Faz emergir ideias
Busca a pluralidade de ideias
Discussão/Debate
Visa fechar questões
Visa convencer
Visa demarcar posições
Visa defender
ideias
Visa persuadir e
ensinar
Visa explicar
Visa as partes em separado
Descarta as idéias
"vencidas"
Busca acordos
425
Diante de tal diferenciação, cabem algumas observações do autor que pontua que o
diálogo não é melhor ou pior que o debate ou a discussão, pois são maneiras diferentes, porém
complementares de conversar. A separação das colunas não é estanque, já que em muitos casos
de conversação há alternação de discussão e debate para o diálogo e vice-versa. Não existe
normas de postura rígidas para o diálogo, uma vez que isso quebraria a naturalidade do
processo. O que existe são algumas regras operacionais.
É bastante comum que durante um diálogo haja a tendência do automatismo concordo-
discordo, dada a dificuldade que o ser humano tem de ouvir o outro na ânsia de emitir juízos
instantâneos, concordando ou discordando de quem fala e recaindo então no condicionamento
na lógica binária do “ou/ou, sim/não”. MARIOTTI (2001) propõe que para um diálogo
eficiente, seja feito algo equivalente a Epoché husserliana que preconiza a suspensão
momentânea das certezas humanas a fim de se modificar as perspectivas de percepção para um
mesmo problema dando vasão a quebra de convicções e pré-julgamentos internalizados que
anulam a possibilidade de agir-se defensivamente, compreender e aprender com o outro.
Comunicação Não-Violenta-CNV
A Comunicação Não- Violenta foi desenvolvida pelo psicólogo americano Marshall
Rosemberg que vivenciou a segregação racial dos anos 60, inclusive sendo agredido por ser
judeu. Desde pequeno, Marshall perguntava-se o porquê de algumas pessoas serem mais
violentas e outras, diante de circunstancias praticamente insuportáveis, manterem-se em estados
compassivos. A Comunicação não Violenta ou CNV é uma ferramenta que estimula que a
compaixão natural humana aflore.
O objetivo da Comunicação não-violenta é o das pessoas reaprenderem a se doar em
cada interação com o outro, e isso foi esquecido por fatores como a educação, por
exemplo, pois a conexão com o outro passa a ser secundária em razão do ser humano ser
treinado ao que Marshall chama de “jogo de quem tem razão”. Esse jogo envolve punição, uma
vez que se estiverem errados, são castigados, tornando a educação e consequentemente a cultura
violenta e se estiverem certos, são recompensados e isso induz as pessoas a sentirem culpa e
vergonha. Essa cultura violenta expressa-se também na linguagem, o que Marshall refere-se
como “linguagem chacal” a qual nos desconecta do estado natural compassivo facilitando a
violência. O autor ressalta que em culturas de dominação existe o condicionamento para as
426
pessoas acharem a violência agradável como quando duas horas por noite entre 19 e 21h no
horário em que as crianças mais assistem televisão, em 75% dos programas que elas assistem,
o herói mata alguém ou lhe dá uma surra, e isso acontece no clímax do programa. Somos
educados há algum tempo a sentir prazer com a violência.
A linguagem chacal é constituída de julgamentos moralistas em termos de quem está
certo/errado, bom/mau, normal/anormal. A linguagem chacal também é constituída do
“Amtssprache,” uma linguagem que nega a escolha e que nega a responsabilidade sobre as
próprias ações. Ao ler a obra de Hannah Arendt sobre um prisioneiro de guerra nazista
(Eichmann em Jerusalém), Rosemberg identifica essa linguagem quando no julgamento de
Adolph Eichmann foi lhe perguntado se foi difícil conduzir dezenas de milhares de pessoas à
morte (ele organizava as deportações para encaminhar as pessoas para as campos de
extermínio), quando ele responde que foi fácil porque a linguagem facilitou. Relatou que ele e
seus colegas tinham uma linguagem própria a “Amtssprache”, que seria equivalente a
linguagem burocrática ou de escritório. Essa linguagem nega a própria responsabilidade, uma
vez que a resposta para a motivação do ato, encontra-se no outro: “não tinha alternativa, fui
obrigado, são ordens superiores”. Marshall enfatiza que a “Amtssprache”, é uma linguagem
muito perigosa.
Para a Comunicação não violenta, Rosemberg traz a “linguagem girafa” que a
linguagem do coração. Ele utiliza a girafa como símbolo da não violência porque o animal
possui o maior coração de todos os animai terrestres e portanto, a girafa requer estar sempre
consciente das próprias escolhas.
A Comunicação não violenta é um guia que contribui para a reformulação de como ser
humano expressa-se e ouve o outro, focalizando quatro componentes essenciais da CNV:
observação, sentimento, necessidade e pedido.
O primeiro elemento da CNV consiste em observar sem julgar. Deve apenas observar
sem realizar algum tipo de avaliação ou inferência. Quando há julgamento e avaliação a
tendência é que soe ao interlocutor como crítica e isso gera reação, podendo ser resistência,
atitudes defensivas e /ou agressivas ou ainda o afastamento, justamente o contrário do que a
CNV almeja, que é a aproximação.
As palavras :sempre, nunca e jamais geralmente estão associadas a exageros de
linguagem e trazem um caráter avaliativo às observações, fator que provoca reações defensivas.
427
(ROSEMBERG, 2006) Segue abaixo alguns exemplos de observações com avaliações e
aquelas livres de julgamentos.
Comunicação Exemplo de observação
com avaliação associada
Exemplo de observação
isenta de avaliação
1. Usar o verbo ser sem
indicar que a pessoa
que avalia aceita a
responsabilidade pela
avaliação.
Você é generoso demais Quando vejo você dar
para os outros todo o
dinheiro do almoço, acho
que está sendo generoso
demais.
2. Usar verbos de
conotação avaliatória
João vive deixando as
coisas para depois.
João só estuda na véspera
das provas
3. Implicar que as
inferências de uma
pessoa sobre os
pensamentos,
sentimentos, intenções
ou desejos de outra são
as únicas possíveis.
O trabalho dela não será
aceito.
Acho que o trabalho dela
não será aceito. Ou: Ela
disse que o trabalho dela
não seria aceito.
Confundir previsão com
Certeza
Se você não fizer refeições
balanceadas, sua saúde
ficará
prejudicada
Se você não fizer refeições
balanceadas, temo que
sua saúde fique
prejudicada.
Não ser específico a
respeito das pessoas a
quem se refere
Os estrangeiros não
cuidam da própria casa.
Não vi aquela família
estrangeira
da outra rua
limpar a calçada
Usar palavras que
denotam habilidade
sem indicar que se está
Fazendo uma avaliação.
Zequinha é péssimo
jogador de futebol.
Em vinte partidas,
Zequinha não marcou
nenhum gol.
Usar advérbios e Carlos é feio. A aparência de Carlos não
428
adjetivos de maneiras
que não indicam que
se está fazendo uma
avaliação.
me atrai.
Palavras generalistas Você raramente faz o que
eu quero.
Nas últimas três vezes em
que comecei
alguma atividade, você
disse que não
queria fazê-la.
Palavras generalistas Ele aparece aqui com
frequência.
Ele aparece aqui pelo
menos três vezes
por semana.
O autor evidencia que as comparações bloqueiam a compaixão, podendo ser tanto em
relação aos outro quanto a nós mesmos e também são uma forma de julgamento. Outro fator
que deve ser observado é o da negação de responsabilidade. A negação de responsabilidade
pessoal por nossos sentimentos e pensamentos fica evidente quando alguém diz “Você me faz
sentir culpado”, pois é atribuído ao outro a responsabilidade pelo estado de alguém.
ROSEMBERG aponta que “O que os outros fazem pode ser o estímulo para nossos sentimentos,
mas não a causa.” (2006, p.79) Quando a observação é feita sem a avaliação as generalizações
são desestimuladas, sendo feita de forma específica para um tempo e contexto bem
determinado.
O segundo componente fundamental da CNV é a expressão dos sentimentos e por detrás
de todo o sentimento há uma necessidade. Expressar-se de acordo com o que se sente de forma
fidedigna não é comum, pelo fato do ser humano não sentir-se a vontade expondo- se como
vulnerável quando exterioriza seus sentimentos. De acordo com a CNV, saber identificar e
nomear os sentimentos de forma clara e diferenciá-los de pensamentos, avaliações e
interpretações, facilita a conexão entre as pessoas, auxiliando na resolução de conflitos.
O terceiro item básico da CNV é reconhecer as necessidades que estão por trás dos
sentimentos, tantos os próprios como o dos outros. Quando alguém comunica-se de maneira
negativa, existem as opções para acolher essa mensagem: “1.culpar a nós mesmos; 2. Culpar os
outros; 3.perceber nossos próprios sentimentos e necessidades; 4. Perceber os sentimentos e
429
necessidades escondidos por trás da mensagem negativa da outra pessoa.”
(ROSEMBERG,2006, p.95) Quanto mais diretamente conectarem-se os sentimentos às
necessidades humanas, haverá mais facilidade para o outro reagir compassivamente. O autor
frisa que para as mulheres torna-se ainda mais complicado a prática de percepção das
necessidades e os sentimentos ligados a elas, uma vez que são ensinadas socialmente a ignorar
as próprias necessidades a fim de dedicar cuidado aos demais. Através do desenvolvimento da
responsabilidade emocional, Marshall apresenta os três estágios comuns ao decorrer desse
processo:1. a "escravidão emocional" - acreditar que somos responsáveis pelos sentimentos
alheios; 2. o "estágio ranzinza" - no qual nos recusamos a admitir que nos importamos com os
sentimentos e necessidades de qualquer outra pessoa; 3. a "libertação emocional". A libertação
emocional consiste na total aceitação da responsabilidade pelos próprios sentimentos, sem
atribuí-los aos outros, na medida em que a responsabilização pelos sentimentos alheios é
eliminada. Não é necessário que o interlocutor conheça os conceitos da CNV, pois ao modificar
a maneira de comunicar implicará em uma reação também diferente.
O quarto componente da CNV é o pedido. O pedido é utilizado para atender as
necessidades próprias humanas e “enriquecer a vida” (p.103). O pedido constitui em “solicitar
ações e comportamentos que possam satisfazer as suas necessidades” (p.104), e para isso é
necessário que o pedido seja claro, especifico e afirmativo, visto que é bastante comum começar
um pedido com uma palavra ou frase negativa como “Não quero que você vá” e o “não”,
segundo o autor, bloqueia a dinâmica da escuta e outro não compreenderá a proposição do
pedido. Além de que se há dúvidas de que o interlocutor entendeu o pedido, existe a
possibilidade de perguntar a sua compreensão em relação ao que foi demandado.
A comunicação não violenta requer uma alfabetização em sentimentos em que objetiva
não mudar as pessoas a fim de que supram as necessidades alheias, e sim, gerar relações
honestas e empáticas que consequentemente poderão atender às necessidades dos envolvidos.
CONCLUSÕES
Ao final da presente reflexão aponta-se que os Círculo de Construção de paz e a
Comunicação não violenta são ferramentas estratégicas para a modificação de uma cultura
tradicional para uma cultura de paz, uma vez que promovem uma transformação do senso-
comum estabelecido pela cultura atual na medida em que fomentam e reconhecem o
430
protagonismo humano, preconizando o senso de cooperação ao invés da competição, em que
desenvolve-se a horizontalidade do diálogo e desenvolvimento da auto-gestão de conflitos
A comunicação não violenta é uma alternativa pacífica de linguagem, além de ser um
processo que inspira conexões e ações compassivas, pois disponibiliza uma estrutura básica
para a abordar os problemas humanos, desde os relacionamentos mais íntimos até conflitos
políticos globais, evitando e também solucionando-os de maneira pacífica.
A comunicação não violenta concentra- se nos sentimentos e necessidades humanas ao
invés de padrões rotuladores que desumanizam e contribuem para o espraiamento da violência
contra si e contra os outros. Com a comunicação não violenta há uma capacitação das pessoas
para o diálogo criativo e consequentemente impacta nas relações sociais e que proporciona um
efeito de transformação da cultura tradicional para uma cultura de paz.
REFERÊNCIAS
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círculos de construção da paz para desenvolver a inteligência emocional, promover a cura
e construir relacionamentos saudáveis / Carolyn Boyes-Watson, Kay Pranis; tradução:
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ROSENBERG, Marshall B. Comunicação Não- Violenta violenta: técnicas para aprimorar
relacionamentos pessoais e profissionais I Marshall B. Rosenberg; [tradução Mário Vilela]. -
São Paulo: Ágora, 2006.
432
EDUCAÇÃO AMBIENTAL: CRIANDO ANIMAÇÕES DO POWTOON NOS ANOS
INICIAIS DO ENSINO FUNDAMENTAL
Ricardo Goulart Caporal Filho8
Maicon Quevedo Fontela9
Ariane Ferreira Caporal10
RESUMO: O presente trabalho constitui uma proposta didática de criação e utilização de
vídeos animados como ferramenta auxiliar educacional. As criações das animações foram feitas
através do software PowToon, realizada na oficina de Educação Ambiental, pelos alunos dos
quintos anos na Escola Municipal de Ensino Fundamental Sagrado Coração de Jesus em São
Borja/RS. Essa prática elaborada possui o objetivo de inserir uma metodologia de ensino
significativa do ponto de vista do aluno. Inicialmente os alunos conheceram o programa
PowToon como ferramenta de criação on-line de animações de curta duração, a seguir, os
alunos pesquisaram e produziram as animações dos fenômenos estudados, compreendendo
sobre o ciclo da água, por fim elencaram dicas de redução e consumo consciente desse recurso
natural. Portanto, o trabalho pedagógico se mostra significativo quando o educador se apropria
das ferramentas digitais existentes para criar algo que traga benefícios para a sociedade. Nesse
caso, o PowToon é uma ferramenta para expor o conteúdo de uma forma mais atraente para o
aluno. Pois, além de ser algo incomum nas salas de aula, o uso de vídeos como organizador
prévio dos conteúdos é uma forma de tornar a aula mais dinâmica e interativa. Segundo a Teoria
da Aprendizagem Significativa proposta por Ausubel (1978) em sua obra Educational
psychology: a cognitive view, quando apresentamos um organizador prévio, esse serve de ponte
entre o que o aluno já sabe e o que ele deve saber, a fim de que o material que o professor
pretende ensinar possa ser aprendido de forma significativa, ou seja, os organizadores prévios
são uteis para facilitar a aprendizagem na medida em que funcionam como “pontes cognitivas”.
Enfim, após essa aplicação, observamos que a metodologia se apresenta como uma alternativa
viável de estudo e produção de mídias pelos alunos, o qual possibilita aporte significativo ao
processo de ensino-aprendizagem nas séries iniciais.
Palavras-Chaves: Mídia Educacional, PowToon, Aprendizagem Significativa, Educação
Ambiental, Anos Iniciais.
8Professor Municipal de Ciências; São Borja, RS; ricprofessor@gmail.com; 9Estudante do 6o semestre de licenciatura em Matemática; Bolsista do PIBID; Instituto Federal Farroupilha; São
Borja, RS; fontelamaicon@gmail.com; 10Mestranda do Programa de Pós-Graduação em Letras; Universidade de Passo Fundo; Passo Fundo. RS;
arianeferre@hotmail.com.
433
INTRODUÇÃO
O presente trabalho constitui o desenvolvimento e a aplicação de proposta didática com
a criação e a utilização de vídeos animados como ferramenta auxiliar educacional nos Anos
Finais do Ensino Fundamental. A criação das animações foi feita através do programa
PowToon, realizada pelos alunos dos quintos anos da Escola Municipal de Ensino Fundamental
Sagrado Coração de Jesus em São Borja/RS em uma oficina de Educação Ambiental.
O PowToon é uma ferramenta de criação de vídeos animados on-line que possui a opção
de conta gratuita desde 2012, podendo ser salvos e exportados para o YouTube. Porém, devido
ao fato de ser um programa recente, existe apenas a versão em inglês disponível, sendo
necessária uma noção básica de língua inglesa para manipular as funções das ferramentas do
software.
A essência do processo de Aprendizagem Significativa proposto por Ausubel (1978) são
as ideias, simbolicamente expressas, ainda que sejam relacionadas de maneira substantiva (não-
literal) e não arbitrária com o que o aluno já sabe, ou seja, a algum aspecto de sua estrutura
cognitiva especificamente relevante para a aprendizagem dessas ideias. Para facilitar a
aprendizagem significativa, recomenda-se o uso de organizadores prévios, que são materiais a
serem propostos antes da utilização do material de aprendizagem propriamente dito, servindo
de ponte entre o conhecimento prévio e os assuntos que se pretende ensinar.
Segundo Ausubel (1978, p.41), ao apresentarmos um organizador prévio, esse serve de
ponte entre o que o aluno já sabe e o que ele deve saber, a fim de que o material que o professor
pretende ensinar possa ser aprendido de forma significativa, ou seja, os organizadores prévios
são uteis para facilitar a aprendizagem na medida em que funcionam como “pontes cognitivas”.
Nessa abordagem, o PowToon é uma ferramenta que pode ser utilizada para fins didáticos por
exibir o conteúdo de uma forma mais atraente para os alunos dos Anos Finais do Ensino
Fundamental. Pois, além de ser algo viável nas salas de aula, o uso de vídeos animados
(desenhos) como organizador prévio dos conteúdos é uma maneira de tornar a aula mais
dinâmica e atrativa para as crianças.
Para Ausubel (1978, p.41) o material deve ser potencialmente significativo, do ponto de
vista do aluno, e o aprendiz deve manifestar disposição para que ocorra a aprendizagem. Pois,
uma nova informação precisa ser relacionada com algo que o indivíduo já sabe, sendo assim, o
organizador prévio utiliza certos materiais que são introdutórios, antes de se aplicar o conteúdo
434
a ser aprendido. Do mesmo modo o vídeo se encaixa como um dispositivo de aprendizagem,
pois prepara no aluno uma noção do que vai ser apresentado em aula e resulta facilitando o seu
estudo. Desse modo, esperamos contribuir com essa metodologia diretamente relacionada ao
cognitivismo do aluno, organizada como alternativa de estudo e produção de material de
divulgação, a fim de possibilitar aporte significativo ao processo de ensino-aprendizagem.
De acordo com Gouveia (2003, p. 257) as novas tecnologias digitais instaladas na
sociedade provocaram profundas mudanças no campo social e individual, visto que
influenciaram drasticamente a vida humana, o tempo e o espaço. Desse modo, observamos que
provocaram uma urgente mudança metodológica e conceitual do espaço de aquisição do
conhecimento pela sociedade, inclusive no papel desempenhado pelo professor. Resultando em
uma pressão que acomete aos professores para a utilização do computador como recurso
educacional na sala de aula face as diversas contribuições que impacta no processo de ensino
aprendizagem significativamente (MORAES, 1998, p.13).
O advento das tecnologias digitais surgiu como uma ferramenta, uma opção de
facilidade na realização de tarefas. Mas o que iniciou como uma possibilidade de aplicação
didática logo se transformou em uma necessidade de inserção na sala de aula, visto que já existe
na sociedade, sendo assim, a escola precisa acompanhar e estar inserida na sociedade.
De acordo com Alonso (1998, p. 88) a escola ainda se encontra despreparada para suprir
essa necessidade de adotar tecnologias digitais no processo de ensino aprendizagem. O autor
constata que há uma “defasagem do sistema escolar em relação aos demais setores da vida
social” e risco de tamanha defasagem provoca no estudante a nítida disfunção entre o conteúdo
escolar e o que vivenciam como cidadão nos diferentes cenários da sociedade. Tal cenário,
dificulta o progresso na aprendizagem dos alunos, pois torna a escola menos atraente.
Desse modo, dentro da sala de aula o aluno não encontra total acesso à informação, a
qual já possui em casa por meio de celulares, tablets e computadores. Tal condição demanda
que a escola concentre mais atenção nesse aspecto, relacionando as práticas pedagógicas ao
interesse dos estudantes.
Por sua vez, a tradicional aprendizagem mecânica de memorização contrasta com a
aprendizagem significativa, pois envolve novas informações com pouca, ou nenhuma, interação
com conceitos relevantes existentes na estrutura cognitiva. Nela não há interação entre a nova
informação e aquela já armazenada. Enquanto que o uso de organizadores prévios, faz a
435
conexão entre os conhecimentos anteriores do aluno com o assunto o qual o professor se propõe
ensinar.
Entendemos a necessidade de transformar as práticas pedagógicas tradicionais nas
escolas, evidenciamos que o papel do professor é imprescindível e insubstituível no processo
de mudança social (DELICOIZOV, ANGOTTI, & PERNANBUCO, 2009, p.12), pois são os
profissionais essenciais no processo de mudança do ensino, contribuem com seus saberes, seus
valores, suas experiências nessa complexa tarefa de melhorar a qualidade do ensino.
Assim, a presente proposta de ensino possui o objetivo de introduzir uma prática
pedagógica de ensino significativa, do ponto de vista do aluno, através do uso de tecnologias
digitais (com produção de vídeos) e contribuir com a melhoria do processo de aquisição de
conhecimentos pelos estudantes.
METODOLOGIA
Inicialmente os alunos conheceram o programa PowToon como ferramenta de criação on-
line de animações de curta duração, a seguir, os alunos pesquisaram e produziram as animações
dos fenômenos estudados, compreendendo sobre o ciclo da água, por fim elencaram dicas de
redução e consumo consciente desse recurso natural.
As tecnologias de livre acesso (denominados softwares de código aberto) e sua
possibilidade de contribuição pedagógica no processo de ensino-aprendizagem constituem essa
proposta didática. Sendo realizado em três etapas, com duração de uma hora cada aula, em
quatro turmas do quinto ano dos anos iniciais do Ensino Fundamental na Escola Municipal de
Ensino Fundamental Sagrado Coração de Jesus no município de São Borja/RS:
Etapa A: Inicialmente foi exibida a proposta da oficina aos alunos participantes. Em
seguida aplicamos um questionário Google de forma individual sobre o perfil dos participantes
(Turma, idade, conhecimento ambiental e interesse tecnológico). Por fim foi apresentado
software PowToon (https://www.powtoon.com/home/), que possibilita a criação on-line de
vídeos animados de curta duração. Assim, permite aos usuários criarem apresentações animadas
com a manipulação de objetos pré-criados (imagens importadas, música e até narrações do
usuário). Após a criação do vídeo o PowToon gera um arquivo XML que pode ser reproduzido
no visualizador online PowToon ou exportado para o canal YouTube (na modalidade gratuita
do programa), funcionando nas plataformas Windows e Linux, com a necessidade de conexão
com a internet e não necessita de instalação no computador.
436
FIGURA 1: Tela do computador mostrando o programa on line Powtoon.
Fonte: Disponível em <https://www.powtoon.com/home/>.
Segundo Lévy (1996, p. 41) não devemos tratar as Tecnologias Digitais apenas como
recursos, artefatos, ferramentas, entre outros, mas como incorporadas ao mundo humano. Visto
que, estamos conectados o tempo todo, por computadores, notebooks, celulares, tablets, etc. As
Tecnologias da Informação e da Comunicação fazem parte de nossa vida, como itens essenciais
para a manutenção de uma sociedade civilizada e globalizada. O computador é, portanto, antes
de tudo um potencializador da informação de contribuições significativas ao processo de
ensino-aprendizagem.
437
Etapa B: Na segunda aula os alunos participantes realizaram uma pesquisa sobre o ciclo da
água, listando dez dicas de redução e consumo consciente desse recurso natural. Ainda
pesquisaram imagens e sons na internet utilizados na organização de um roteiro (Storyboard),
o qual permite visualizar o planejamento do projeto a ser executado.
Etapa C: Na terceira aula os alunos realizaram a criação das animações de acordo com a feita
anteriormente pesquisa e seguindo o roteiro organizado. Após a conclusão do vídeo animado
cada uma das quatro turmas publicou o mesmo no canal Youtube. Por fim, aplicamos um
questionário Google de forma individual sobre a oficina aos participantes (Interesse por
Animações, Criação da Storyboard e conhecimento tecnológico).
RESULTADO E DISCUSSÃO
A análise dos resultados obtidos nessa pesquisa realizada em quatro turmas do quinto
ano dos anos iniciais do Ensino Fundamental observou as respostas dos questionários Google
e os vídeos animados criados pelos alunos.
Na análise do questionário individual (Figura 2) sobre o perfil dos participantes,
observamos as respostas da pergunta número três sobre a idade dos alunos participantes, a qual
evidenciou uma proporção de 79,4% com dez anos de idade, 17,6% com onze anos de idade e
3% com 12 anos de idade.
FIGURA 2: Questionário inicial do perfil dos participantes. Gráfico da resposta número três
sobre a idade dos alunos participantes da oficina de educação Ambiental.
Fonte: a pesquisa, 2016.
3%
438
Na análise da pergunta número um do questionário individual sobre o uso de novas
tecnologias (Figura 3), ao serem questionados do seu Interesse por Animações, observamos
uma porcentagem de 100% afirmativo nas respostas dos alunos participantes.
FIGURA 3: Questionário final sobre o uso de novas tecnologias na educação Ambiental.
Gráfico da resposta número um dos alunos sobre o seu interesse em vídeos animados.
Fonte: a pesquisa, 2016.
Na análise da pergunta número dois do questionário individual a cerca do uso de novas
tecnologias (Figura 4), questionamos sobre o seu êxito na criação da Storyboard, onde
encontramos uma porcentagem de 66,7% afirmativo e 33,3% negativo nas respostas dos alunos
participantes.
FIGURA 4: Questionário final sobre o uso de novas tecnologias na Educação Ambiental.
Gráfico da resposta número dois dos alunos sobre o êxito na criação da Storyboard.
Fonte: a pesquisa, 2016.
Os vídeos animados foram criados pelos alunos na oficina de Educação Ambiental nas
quatro turmas do quinto ano dos anos iniciais do Ensino Fundamental (Figuras 5 a 8) e
caracterizam-se como Mídia educacional. Encontram-se disponíveis no canal Youtube e podem
ser acessados por outros estudantes interessados no assunto.
439
FIGURA 5: Imagem inicial do vídeo animado criado pela turma do quinto ano A na oficina.
Fonte: Disponível em <https://goo.gl/yzxvz3>.
FIGURA 6: Imagem inicial do vídeo animado criado pela turma do quinto ano B na oficina.
Fonte: Disponível em <https://goo.gl/ccrmft>.
FIGURA 7: Imagem inicial do vídeo animado criado pela turma do quinto ano C na oficina.
440
Fonte: Disponível em <https://goo.gl/Wu2rqb>.
FIGURA 8: Imagem inicial do vídeo animado criado pela turma do quinto ano D na oficina.
Fonte: Disponível em <https://goo.gl/lrbPyJ>.
Por sua vez, a aprendizagem significativa envolvendo novas tecnologias permite uma
nova forma de interação com as informações, com aquisição de conceitos relevantes e o
desenvolvimento de novas habilidade e competências na estrutura cognitiva dos alunos.
Desse modo, percebemos que a internet possibilita um leque de informações que podem
contribuir no planejamento das aulas pelo professor.
Assim sendo, as ferramentas digitais disponíveis na Internet necessitam serem
conhecidas pelos professores, para Tajra (2000, p. 114), tais ferramentas tecnológicas fornecem
aos alunos oportunidades animadoras para acessar e interpretar o mundo ao redor deles. De
acordo com Borges (2000, p. 28) o conhecimento recorrente na rede on-line possibilita o ensino
de forma dinâmica, interativa e multimídia, pois amplia as potencialidades humanas, criando
novas relações, novos conhecimentos, novas maneiras de aprender e de pensar.
441
No desafio de educar na sociedade contemporânea com seus avanços tecnológicos, de
rápidas transformações, tal configuração moderna do mundo virtual incide fortemente sobre a
escola. Porém, o professor não precisa competir por atenção com os computadores, tablets,
celulares, notebooks, ou demais dispositivos eletrônicos, mas se apropriar desses recursos
disponíveis e, desta maneira, estimular o interesse e a participação da turma nas tarefas
propostas. Segundo Tajra (2000, P.114) os estudantes gostam de novidades, de tecnologia e da
iniciação à pesquisa científica, sendo estas atividades aceitas pelos participantes facilmente.
Segundo Srivastava (2005) o telefone celular se apresenta, atualmente, como uma
ferramenta difundida, de modo que se tornou um aspecto tão importante na vida diária do
usuário que passou de ser um mero "objeto tecnológico" para um "objeto social" chave. Para
Caporal Filho (2017, p. 67) a proximidade e interesse dos alunos nessa geração de jovens no
aparelho celular se destacaram, superando o aparelho de televisão, o computador pessoal (PC)
e os games, na comparação com o aparelho celular. O qual possibilita ao estudante na tela do
computador criar, visualizar e interagir por meio de animações virtuais sobre diferentes temas,
nessa proposta serão relativos a preservação ambiental.
Para Lima et al (2012, p.4), é possível utilizar ferramentas de vídeo para que o conteúdo
seja assimilado pelos alunos nas instituições de ensino, sendo uma estratégia integra da
exposição de conteúdo e de fácil assimilação do mesmo, associando estes elementos com
estímulos visual e auditivo exigindo uma maior concentração dos alunos. A fim de transmitir o
conteúdo, e evitar o desinteresse do aluno ao método tradicional de ensino (leitura e escrita).
CONCLUSÕES
Na intencionalidade de contribuir com o processo educacional essa pesquisa respondeu
ao questionamento e indicou a viabilidade da criação e utilização de vídeos animados no
processo de ensino-aprendizagem.
Os dados obtidos permitiram avaliar a possibilidade de aplicação e desenvolvimento
dessa técnica com alunos a partir dos dez anos de idade (Conforme Figura 2). Destacamos o
interesse em vídeos animados de 100% dos participantes (Figura 3), ainda registramos o êxito
na criação das Storyboards (Figura 4), na finalização das animações e exportação para o canal
YouTube, na qual as quatro turmas participantes concluíram satisfatoriamente (Quintos Anos
A, B, C e D).
442
O poder do professor foi consumido pela internet, perdeu o seu monopólio intelectual e
não fascina mais com seus discursos expositivos. Além disso, acessando via rede mundial de
computadores, por meio de tablets, smartphones, notebooks, ou demais dispositivos eletrônicos
que surgem diariamente, o aluno pode pesquisar e sanar parte de suas dúvidas sem a necessidade
do professor.
Desse modo, para que ocorra uma Aprendizagem Significativa deve acontecer uma
inserção de tecnologias relacionadas a internet e canais de vídeos no youtube. Visto que, aulas
meramente expositivas não fascinam mais, no entanto, o professor não precisa competir por
atenção com os computadores, tablets, smartphones, notebooks, ou demais dispositivos
eletrônicos, mas utilizar desses recursos disponíveis para o aluno pesquisar e estimular o
interesse da turma.
Espera-se que a combinação das formações continuadas aliadas a capacitação no uso de
tecnologias computacionais venham colaborar com a melhoria do ensino. Permitindo a
reciclagem dos professores ao repensar a educação por meios alternativos à aprendizagem
mecânica tradicional, incentivando a capacidade de aprender de maneira ativa e tecnológica,
desligando-se do modelo de ensino voltado à memorização, à exposição verbal e ao quadro-
negro e ao giz. Permitindo a reciclagem dos professores ao repensar a educação por meios
alternativos à aprendizagem mecânica tradicional, incentivando a capacidade de aprender de
maneira ativa e tecnológica, desligando-se do modelo de ensino voltado à memorização, à
exposição verbal e ao quadro-negro e ao giz (ROSA & ROSA, 2014, p.12). Nas práticas
construtivistas devemos deixar espaço extra e possibilitar a descoberta na construção de seus
conhecimentos pelo estudante. Nessa proposta o uso de recursos digitais de acesso livre, assume
uma metodologia dialógica de aquisição de conhecimentos.
Nessa oficina investigamos a habilidade dos alunos ao criarem vídeos animados sobre
o ciclo da água com dicas de redução e consumo consciente desse recurso natural. Essa pesquisa
buscou responder ao questionamento da viabilidade de criação e utilização de vídeos animados
no processo de ensino-aprendizagem com os alunos do quinto ano dos anos iniciais do Ensino
Fundamental. Desenvolvemos na Escola Municipal de Ensino Fundamental Sagrado Coração
de Jesus no município de São Borja/RS, na busca de uma alternativa de estudo e produção de
material informativo.
Para Ausubel (1978, p.41) o material deve ser potencialmente significativo, do ponto de
vista do aluno, e o aprendiz deve manifestar disposição para que ocorra a aprendizagem. Como
443
estratégia de investigação foi utilizado o programa PowToon, a fim de possibilitar aos alunos
criarem no computador novas animações dos conteúdos estudados. Visto que a dificuldade de
aprendizagem dos alunos sofre as perturbações de práticas docentes do tipo tradicional, nas
quais constatamos o professor protagonista do processo, enquanto o aluno adquire
posicionamento passivo.
Além disso, a aprendizagem mecânica (tradicional) envolve novas informações com
pouca, ou nenhuma, interação com conceitos relevantes existentes na estrutura cognitiva do
aluno e contrasta com a Aprendizagem Significativa de Ausubel (1978), que propõe
organizadores prévios na interação entre a nova informação e aquela já armazenada. Esse uso
de organizadores prévios procura fazer a conexão entre os conhecimentos anteriores do aluno
com o assunto o qual o professor se propõe ensinar.
A virtualização do conhecimento como consequência da internet se configura como
abstração da realidade, sendo observada de forma dinâmica interativa e multimídia. Pois,
segundo Borges (2000, p. 28), quando são utilizados permitem um processo de interpretação,
de interligação, de complementaridade, promovendo um ato de criação e invenção. Nesse uso
da virtualização, cada vez mais presente no nosso cotidiano, são ampliadas as potencialidades
humanas, pois criamos novas relações, adquirimos novos conhecimentos e desenvolvemos
novas maneiras de aprender e pensar.
Enfim, após essa aplicação, observamos que a metodologia se apresenta como uma
alternativa viável de estudo e produção de mídias pelos alunos, o qual possibilita aporte
significativo ao processo de ensino-aprendizagem nas séries iniciais.
Ao repensar a própria prática pedagógica, almejando uma real efetivação, se fazem
necessárias novas habilidades nos professores. As quais podem ser procuradas nas formações
continuadas, oferecendo os requisitos básicos para a inserção de novas tecnologias na sala de
aula. Consideramos que a ampliação dos conhecimentos de informática seja necessária para o
professor se apoderar das tecnologias como suporte pedagógico, adquirindo os conhecimentos
básicos, para posterior desenvolvimento das ferramentas tecnológicas na sua prática com os
alunos.
Portanto, no ensino das disciplinas com os conteúdos de difícil compreensão,
recomendamos o uso do software PowToon a fim de facilitar a sua compreensão e estimular o
interesse dos alunos sobre o conteúdo. Com o desenvolvimento dessa pesquisa pretendemos
444
que o produto educacional possa contribuir de forma expressiva no processo de ensino-
aprendizagem. Neste contexto, ainda buscamos incentivar o uso de tecnologias computacionais
na melhoria do ensino, e dessa forma, permitir aos professores repensarem a educação por
meios alternativos.
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2ª ed. São Paulo: Érica, 2000.
445
DEMOCRATIZANDO A INFORMAÇÃO: EXPRESSÕES DA QUESTÃO SOCIAL
NA PAUTA DA RÁDIO UNIVERSIDADE 800 AM 11
Zaida Castro de Siqueira12,
Eliana Mourgues Cogoy13,
Jean Corrêa dos Santos14
RESUMO: O Núcleo de Estudo, Pesquisa e Extensão em Serviço Social, Mídia, Cultura e
Questão Social (NEPMQS) do Departamento de Serviço Social - UFSM possui como uma das
suas atividades principais, a coordenação do programa radiofônico ‘Social em Questão’,
desenvolvido junto à Radio Universidade 800AM. Trata-se de um projeto de extensão originado
para a valorização das atividades de graduação em Serviço Social, fomentando a
interdisciplinaridade e também democratizando os núcleos de estudo, pesquisa e extensão deste
curso na Universidade Federal de Santa Maria (UFSM). Diante da diversidade de assuntos e da
compreensão da transversalidade dos temas, o Social em Questão se consolidou por um
universo de possibilidades que prezam pela cidadania, a garantia de direitos e o acesso à
informação voltada para a sociedade como um todo. O projeto desenvolve-se por meio de
entrevistas com um público diversificado, que busca ir além do ambiente acadêmico e
utilizando-se, também, das redes sociais para promover informações. As pautas abordam as
diferentes expressões da questão social e temas cotidianos. Compreendendo a importância da
democratização das mídias e o seu papel na sociedade, considera-se extremamente favorável os
ganhos que o projeto tem apresentado até o momento, tanto no âmbito acadêmico, como no
papel de cumprir uma função social da universidade, ultrapassando esses limites. Trabalhar a
interdisciplinaridade, impulsionando a democratização da comunicação e o seu acesso de forma
ampla, são objetivos desse projeto de extensão enquanto programa radiofônico. Dentre os
desafios e possibilidades do uso das mídias, o rádio é um dos meios de comunicação de grande
acesso, de mobilização de massas, o mais antigo e o que pode ser “levado” consigo. Através
dele é possível aproximar-se do projeto de democratização da comunicação, de forma a sair do
grande nicho de mídias dominado por uma pequena parcela da sociedade que detém o poder da
informação.
11 Trabalho executado com recursos do Edital Fundo de Incentivo à Extensão (FIEX) da Pró Reitoria de Extensão
(PRE) da Universidade Federal de Santa Maria - UFSM. 12 Pesquisadora e acadêmica do Curso de Serviço Social da Universidade Federal de Santa Maria, Bolsista FIEX
no Núcleo de Estudos, Pesquisa e Extensão em Serviço Social, Mídia, Cultura e Questão Social (NEPMQS), Santa
Maria - RS, e-mail: zaida.castro@live.com.ar 13 Pesquisadora, mestre e docente do Curso de Serviço Social da Universidade Federal de Santa Maria, Santa Maria
– RS, e-mail: elianacogoy@gmail.com 14 Pesquisador e acadêmico do Curso de Serviço Social da Universidade Federal de Santa Maria, Bolsista PRAE
no Núcleo de Estudos, Pesquisa e Extensão em Serviço Social, Mídia, Cultura e Questão Social (NEPMQS), Santa
Maria - RS, e-mail: contatojeanc@gmail.com
446
Palavras-Chaves: Serviço Social, Mídia, Rádio, Interdisciplinaridade, Comunicação.
INTRODUÇÃO
O presente artigo consiste em um projeto de extensão integrante do Núcleo de Estudos,
Pesquisa e Extensão em Serviço Social, Mídia, Cultura e Questão Social (NEPMQS) vinculado
ao Departamento de Serviço Social da Universidade Federal de Santa Maria (UFSM).
Denominado “Serviço Social e mídia: novas possibilidades através da interlocução na rádio
universidade”, trata-se de um programa radiofônico em parceria com a rádio Universidade
800AM da UFSM, e já está consolidado estando no ar pelo seu terceiro ano consecutivo, sendo
transmitido semanalmente, as segundas feiras, as 13h10, horário de Brasília. Ultrapassando
limites e nos desafiando cotidianamente na busca por uma participação mais popular, confiamos
na importância do Social em Questão como ferramenta de informação e extensão dos saberes
[...] a mídia é o espelho que reflete o real, o imaginário e o simbólico social, estes
padrões de comportamento logo passam a ser considerados pela massa como uma via
alternativa para a conquista de voz e vez no discurso social. (ATAÍDE, 2000, p. 12).
O Social em Questão tem o objetivo de transmitir informação de qualidade e priorizar
assuntos de cunho valorativo ao dia a dia e que fomentem as relações e emancipação dos
sujeitos de direito. Visa ir ao encontro da valorização da extensão universitária, não deixando
de fortalecer essa via de duas mãos, onde a Universidade transmite conhecimento à comunidade
e também aprende com o saber dessa comunidade, materializando essa troca na gravação dos
programas.
Entendendo o poder do rádio, como difusor de comunicação e informação a longo
alcance, buscou-se a construção do programa inicialmente para abarcar questões referentes a
demanda de visibilidade do curso de Serviço Social da UFSM e dos seus núcleos de estudos,
pesquisa e extensão. Com o passar do tempo compreendeu-se a importância de discutir e
fomentar a informação acerca das expressões da questão social, objeto de trabalho do/a
profissional Assistente Social. Nisso, justifica-se que, pela contínua construção e luta, deve-se
caminhar rumo a democratizando da informação em diversos meios. Através do rádio e da
extensão, faz-se essa trajetória que busca a aproximação da comunidade externa da academia
447
e, assim, contribui-se para a o papel social da Universidade nessa comunidade. A leitura de
democratização da informação vai além de transmitir, ela está transversalmente relacionada
com informação de qualidade e com conteúdo que vá ao encontro das demandas da sociedade
e do público ouvinte.
METODOLOGIA
A metodologia do programa consiste na produção, edição e divulgação das entrevistas
na mídia, sendo elas rádio e internet. O Social em Questão é gravado em dois blocos de
aproximadamente vinte minutos cada, a construção da pauta é desenvolvida em conjunto com
as/os convidadas/os. A pauta de cada programa é oriunda de temas próximos ao Serviço Social
e a classe trabalhadora, tais como assistência social, saúde, comunicação, educação,
movimentos sociais, cultura, acessibilidade, controle social, violência, gênero, políticas sociais,
gerontologia, eventos acadêmicos e eventos da comunidade, temas que envolvam a população
em situação de rua, divulgação de pesquisas e trabalhos para a sociedade, dentre outras.
O projeto dispõe-se a fomentar e promover um espaço de informações que serão úteis a
sociedade, como uma estratégia democrática, que permita debater os direitos, como a defesa
central da liberdade, para alcançar a cidadania plena. O Serviço Social nesse espaço
interdisciplinar com a comunicação, vem ao encontro de desenvolver habilidades e atuar num
mercado que está em constante transformação. O projeto de extensão radiofônico programa
Social em Questão, cumpre o papel social de levar o conhecimento para além da universidade,
fazendo uma conexão com a sociedade não acadêmica e transpondo barreiras e estigmas
relativos a produção de conhecimento apenas para o ambiente acadêmico.
O programa está no terceiro ano de atividades consecutivas, consolidando-se como
projeto de extensão tanto com o público, como com a proposta de transmitir informação de
qualidade e valor para o cotidiano. Com temas atuais, perpassando a totalidade do Serviço
Social e demais demandas diárias, o programa aproxima-se do seu público pedindo sugestões
de pautas e fazendo a troca de ideias nas mídias de divulgação. Na página do facebook são
divulgados os programas que irão ao ar e os que já foram transmitidos. Na radiotube15, uma
plataforma online que abriga audições de programas radiofônicos de todo o Brasil, ficam
hospedados para acesso ilimitado, e possibilidade de download em formato mp3, os programas
15 A radiotube consiste numa plataforma online que abriga audições de programas radiofônicos de todo o Brasil,
as gravações ficam hospedadas para acesso ilimitado e download dos programas já veiculados.
448
já veiculados. Esse é um meio de produzir conteúdo e de fato proporcionar acesso amplo,
inclusive para aqueles e aquelas que não tiveram a oportunidade de acompanhar a transmissão
na Rádio Universidade e interessam-se pelas pautas. Considerando a importância da
comunicação popular, o programa se desenvolve através de entrevistas com a comunidade não
acadêmica, fomentando o pertencimento no espaço e com pessoas que venham a agregar
conhecimento valorativo para a vida dos e das ouvintes. Vale ressaltar que essa emissora
caracteriza-se como pública e vem destacando-se com sua finalidade educativa e cultural e que
tem alcance em mais de 150 municípios, correspondendo a quase toda a região central e
fronteira oeste do Rio Grande do Sul. Dessa forma, o Social em Questão não só ultrapassa os
limites geográficos da Universidade Federal de Santa Maria, como também ultrapassa os limites
municipais, levando cultura, informação e conhecimento para um público de diversas idades e
recortes socioeconômicos, alicerçando seu papel de projeto de extensão.
RESULTADO E DISCUSSÃO
Através da interdisciplinaridade, o Serviço Social, enquanto formação e trabalho é
chamado para incluir-se no debate da mídia, trazendo o viés de uma profissão crítica, reflexiva,
realizando um contraponto com a realidade posta pela mídia hegemônica, entendida aqui como
mídia dominante. E é nesse processo que o Social em Questão desenvolve seus programas, se
colocando como ferramenta na defesa da democratização da informação e da comunicação
social.
Refletir sobre o processo de comunicação no exercício profissional do assistente
social deve, portanto, se construir num ponto importante de análise e de intervenção
junto às diversas expressões da questão social [...] (ESPÍNDOLA; 2011, p. 228)
Para além de colocar a profissão diante dos meios de comunicação, é importante chamar
a população para construir estes espaços de maneira democrática, compreendendo seu papel na
sociedade, no âmbito do controle social, na construção de políticas públicas e sociais e se
colocando como atores e atrizes fundamentais no processo de construção de uma sociedade
mais justa e igualitária.
A comunicação deve ser compreendida não como um território e um único setor em
uma instituição. Ela deve ser realizada por todos que integram a área pública, de
maneira autônoma e descentralizada e de acordo com suas características e
necessidades. (FIGUEIREDO, 2009, p. 328)
449
Nas palavras de Figueiredo (2009), a comunicação transcende os espaços e deve ser
explorada por todas as áreas do conhecimento. Sendo ela utilizada pelo Serviço Social, serve
como ferramenta de trabalho do fazer profissional direto com os/as usuários/as ou, como no
Programa Social em Questão, de maneira indireta levando informação de qualidade.
Gráfico 01: Perfil das/os convidadas/os no 1º semestre de 2017.
Fonte: sistematização dos/as autores/as (2017).
No Gráfico 01 temos o levantamento de dados referente ao perfil dos/as convidados/as
para as gravações no primeiro semestre de 2017. Dentre as 52 pessoas convidadas desse
período, temos 06 professores/as, 12 estudantes, 13 profissionais da área de Serviço Social e 21
pessoas classificadas como sociedade civil. Por sociedade civil somou-se todas as pessoas
convidadas e que não estão ligadas ao meio acadêmico, tais como: vinculadas a movimentos
sociais, grupos ativistas, profissionais de outras áreas do conhecimento, pessoas em situação de
população de rua e demais ações que estejam relacionadas às temáticas do NEPMQS, que são
Serviço Social, Mídia, Cultura e Questão Social.
450
Gráfico 02: Curtidas na página do facebook no 1º semestre de 2017
Fonte: sistematização dos/as autores/as (2017).
Em relação às mídias de divulgação e replicação de conteúdo, temos dados da página
no facebook intitulada Programa Social em Questão que mostra um crescimento nas suas
curtidas, como exposto no Gráfico 02 que faz um levantamento do primeiro semestre do ano
corrente, de 510 em janeiro de 2017 para 641 curtidas em julho de 2017. Nenhuma das
publicações da página foram patrocinadas, todas as curtidas e seguidores são resultados de
post’s orgânicos, ou seja, sem patrocínio e com conteúdo de criação oriundo dos e das
integrantes do NEPMQS. Outra forma de avaliação do alcance do projeto é a plataforma
radiotube, desenvolvida em 2007 através da Criar Brasil.
Dessa plataforma extraímos dados representados na Tabela 01 que traz informações de
que foram disponibilizados 29 programas, de janeiro de 2017 até 30 de julho de 2017, tendo
um total de 1.248 acessos, com uma média de 43 acessos por programa, proporcionando assim,
alcance às pessoas de várias partes do país e levando informação para os/as ouvintes da Rádio
e também àqueles/as que acompanham o programa através da internet. Outra vantagem de
utilizar a plataforma Radiotube, é a possibilidade de disponibilizar o Social em Questão para as
pessoas que não conseguem acompanhar a transmissão nas segundas feiras pela Rádio
Universidade 800AM.
451
Tabela 01 – Dados do Social em Questão na Radiotube no 1º semestre de 2017
Dados Social em Questão na Radiotube no 1º semestre de 2017
Número de Programas disponibilizados 29 programas
Número de acesso aos programas 1.248 acessos
Média de acessos por programa 43 acessos por programa
Fonte: sistematização dos/as autores/as (2017).
Para Iamamoto (2008) o acesso à informação engloba uma relação democrática aberta
a reflexões e críticas entre o os/as assistentes sociais e aos sujeitos que demandam seus direitos
e serviços a eles correspondentes. Nesse sentido o Social em Questão vem como uma
ferramenta que articula suas bases teórico-metodológicas e suas competências técnico-
operativas, viabilizando conteúdo de qualidade e informações que agregam ao cotidiano. Prova
disso são os números em constante ascendente que demonstram o crescimento ininterrupto do
acompanhamento do Social em Questão. E esses resultados caminham ao encontro da
democratização da mídia e da comunicação como direito humano, resguardadas suas devidas
proporções de veiculação, acesso e território.
CONCLUSÕES
Atualmente, a interface com a mídia abre possibilidades para os espaços sócio
ocupacionais dos/as assistentes sociais, e a experiência junto a Rádio Universidade aponta para
o Serviço Social uma ferramenta que agrega para o trabalho de empoderamento dos/as
usuários/as, no acesso à informação e, consequentemente, na qualificação da cidadania.
Considerando princípios éticos defendidos pela categoria de assistentes sociais, explícitos
dentre os princípios fundamentais do Código de Ética profissional, compreende-se que só é
possível concretizar esses princípios na medida em que há a liberdade e o fortalecimento dos
usuários e usuárias, quando bem informados/as e caminhando para sua autonomia e
emancipação.
Logo, conclui-se que, em se tratando de um projeto de extensão, o Social em Questão
se reafirma como um processo acadêmico que aproxima a comunidade ouvinte da Rádio
Universidade 800AM e vice versa. O Programa leva o conhecimento sobre as manifestações
452
das expressões questão social, da categoria profissional do Serviço Social e também pensa a
comunicação como um direito humano e democrático.
REFERÊNCIAS
ATAÍDE, Y. D.B. A educação e a cultura de paz. Revista da FAEEBA. Salvador: UNEB. Ano
9, no. 14(Jul/dez), 2000.
CHAUÍ, Marilena. Simulacro e poder: uma análise da mídia. São Paulo: Fundação Perseu
Abramo, 2006.
ESPÍNDOLA, Nelma R. S. Em defesa do diálogo entre a mídia rádio e o Serviço Social. In:
Sales, M. A.; Ruiz, J. S. R..(Org.). Mídia, questão social e Serviço Social. São Paulo: Cortez
Editora, 2009, v. 1, p. 214-234.
FIGUEIREDO, Kênia A. O assistente social na era das comunicações. In: Sales, M. A.; Ruiz,
J. S. R..(Org.). Mídia, questão social e Serviço Social. São Paulo: Cortez Editora, 2009, v. 1.
GUARESCHI, Pedrinho A.; BIZ, Osvaldo. Mídia, educação e cidadania: para uma leitura
crítica da mídia. Porto Alegre. Evangraf, 2017.
IAMAMOTO, Marilda Villela. Serviço Social em tempo de capital fetiche: capital financeiro,
trabalho e questão social. 2. ed. São Paulo: Cortez, 2008.
RADIOTUBE. Disponível em https://www.radiotube.org.br/sobre.php. Acessado em outubro
de 2017.
453
DESAFIOS E POSSIBILIDADES DO USO DE JORNAIS E REVISTAS PARA A
PESQUISA EM HISTÓRIA: IMPRENSA ENQUANTO PARTIDO POLÍTICO
Camila de Almeida Silva16
RESUMO: Este trabalho busca refletir sobre as possibilidades e os desafios para o uso de
jornais e revistas como fontes para a pesquisa em História. Destacando para isso que há
inúmeras formas de utilização dessas fontes, e essa variedade está relacionada ao referencial
teórico e metodológico adotado pelos pesquisadores. O referencial adotado nessa pesquisa recaí
sobre o entendimento de Gramsci sobre a sociedade, segundo ele, uma sociedade não se mantém
coesa apenas pela coerção, é necessário também o consentimento, ou seja, que parte da
sociedade esteja em concordância com a ideologia, instituições, etc. O jornalismo atua como
um meio na busca desse consentimento e sua atuação ao longo da História permite aos
pesquisadores compreender de forma mais holística os interesses envolvidos nas relações
políticas, econômicas e sociais que estabelecem. Após 1950, as empresas jornalísticas sofrem
grandes transformações, todas elas relacionadas com a entrada de capital multinacional e
internacional, o anterior ideal partidário se esvaí dos jornais e a noção de neutralidade começa
a integrar o fazer da grande imprensa, ocultando assim seu caráter de classe e consecutivamente
seus interesses. Nesse sentido, esse trabalho coloca-se frente à uma demanda necessária ao
historiador, problematizar a imprensa enquanto um sujeito político, com interesses, e que para
tanto, veicula notícias de acordo com as formas de ver o mundo de seus proprietários são meios
de organizar e difundir cultura. E podem ser também entendidos e analisados como um partido
político, que pretendendo ser hegemônico, precisam criar uma nova ideologia que represente
os interesses de classe que defendem.
Palavras-Chaves: Imprensa; Gramsci; História; Estado ampliado.
INTRODUÇÃO
Em todas as áreas do conhecimento é preciso atentar-se para os procedimentos
metodológico e teóricos adotados para o desenvolvimento da pesquisa. Mas é oportuno
elucidar, o que o que são esses procedimentos? No que consistem? São “uma postura frente à
16 Professora substituta na Universidade Federal do Pampa – UNIPAMPA, Campus São Borja, Rio Grande do Sul,
e-mail: casilva2015@gmail.com
454
realidade e à prática social”, ou seja, é como entendemos a realidade empírica e o mundo de
forma geral. A partir das indagações e das ponderações o sujeito pesquisador se torna uma
problematizador do real (LEME, 1988, p. 97).
Partindo dessas diferentes concepções da realidade é que se formam as diferentes
pesquisas sobre o mesmo objeto, a distinção está no entendimento da realidade. No entanto,
junto aos procedimentos metodológicos adotados estão as teorias para compreensão do objeto
de pesquisa. Há uma relação intrínseca entre as duas, teoria e metodologia. As teorias são as
bases para o entendimento da realidade e a metodologia são as técnicas e instrumentos
utilizados para realizar uma investigação.
Nem todas as abordagens metodológicas dão ênfase à historicidade das fontes e do
próprio método, mas para os objetivos aqui propostos e sob o entendimento aqui exposto, as
fontes jornalísticas serão sempre analisadas a partir de sua história e de sua relação com o
entorno. Destacando que tais relações são importantes para explicar o próprio objeto de
conhecimento, neste caso, a imprensa.
É comum nos diversos campos das Ciências Humanas e Sociais observar pesquisas cada
vez mais compartimentalizadas e sem o estabelecimento de relação entre teoria e prática. Por
isso que para o sentido aqui proposto, entendemos a imprensa enquanto uma entidade de classe,
representante dos interesses de uma minoria, por isso esses interesses e sua condição de classe
devem ser evidenciadas de modo que essas relações juntamente com o jornal em si forneçam
as explicações para os problemas de pesquisa.
Um debate conceitual: classe social
O conceito de classe social, fruto das considerações acerca do materialismo histórico,
encontradas, principalmente nas obras de Marx e Engels, tem enfrentado dificuldades frente ao
debate acadêmico. A fim de contrariar a perspectiva que sustenta a inadequação da
teoria/método marxista, este ensaio se sustentará nas contribuições de Marcelo Badaró Matos,
no que tange o aporte explicativo do materialismo histórico, no intento de demonstrar a
pertinência do conceito em questão. Tomando o cuidado — como salienta Matos (2007) —, em
buscar sempre adequá-lo as novas demandas da historiografia, porém, sem negar a importância
do conceito para entender a vida social do passado e do presente.
455
O aporte utilizado tanto para a compreensão de classe, mas também sobre a ação
política da sociedade civil, é o militante e intelectual sardo Antonio Gramsci, teórico
pertencente à tradição crítica do materialismo histórico, que fez avançar o debate conceitual
sobre o tema a partir da inserção de novos elementos para sua compreensão, elementos estes
ainda não evidentes nas análises de Karl Marx.
O autor acrescenta na análise uma “complexificação”, o conceito de hegemonia, que
rompe como uma perspectiva que percebe o materialismo histórico dialético apenas como
economicismo, passando a valorizar a política, a cultura e a ideologia como elementos
essenciais para o entendimento da realidade social. E como nasce a hegemonia?
Em A ideologia alemã (1845), Marx dizia que as idéias [sic] dominantes numa
sociedade são as da classe dominante, isto é, a classe no poder difunde suas idéias
[sic], sua cultura, sua ideologia em toda a sociedade. No prefácio de 1859 à
Contribuição para a crítica da Economia Política, Marx concluiu que são as relações
de produção (isto é, a forma de propriedade dominante) são as que determinam não
só as instituições políticas e estatais, mas a própria maneira de pensar, a consciência.
Porém o modo de produção (as relações de produção e sua ligação com as forças
produtivas) é contraditório. Portanto essa contradição – por exemplo, no modo de
produção capitalista, a contradição entre classe operária e capitalista – coloca em
discussão não só a política econômica, as questões sindicais imediatas, mas também
as políticas e a cultura das idéias [sic] da classe dominante. (GRUPPI, 1980, p. 81)
Tal contradição exposta acima é para Gramsci o momento que define uma revolução,
quando uma sociedade não consegue se manter coesa em sua hegemonia, cabe então a
exploração de um terreno cultural e ideológico, no sentido de,
Antes de se tomar o aparelho de Estado, uma cidadela vazia para ele, fundamental era
se construir a hegemonia na sociedade, ocupando postos de luta importantes e
produzindo novo conjunto de valores que rivalizem e disputem a direção da sociedade
com os valores dominantes. (SANTANA, 2007, p. 224)
Com Gramsci, temos a partir da valorização da cultura e da ideologia, uma ampliação
da noção de dominação, abre-se espaço para entender a dominação afastada das relações
econômicas com único definidor de tal condição. A ideologia é o que mantem unida uma
sociedade, ela que mantem coesa classes sociais distintas e com interesses opostos e até mesmos
antagônicos.
Abre-se espaço para pensar a noção de dominação enquanto, força mais consenso. E
como argumenta Santana, “não há consenso imposto. Só a força é impositiva. O consenso
precisa ser construído, portanto com aceitação das partes” (SANTANA, 2007, p. 223). A partir
desta concepção Gramsci percebe que é imprescindível para analisar uma sociedade de classe
456
a ideia de negociação, de perdas e de ganhos nas relações entre os detentores dos meios de
produção e aqueles que possuem a força de trabalho como meio de subsistência.
Se para Marx e Engels o ponto de partida para o conceito de classe social foi perceber
que o proletariado era uma nova força política em oposição a classe burguesa moderna, e que
seria imprescindível na luta pela emancipação e pelo fim da exploração. Nesse sentido, na obra
“Ideologia Alemã”, nota-se:
Os indivíduos isolados só formam uma classe na medida em que têm que manter uma
luta comum contra outra classe; no restante, eles mesmos defrontam-se uns com
outros na concorrência. Por outro lado, a classe autonomiza-se em face dos indivíduos,
de sorte que esses últimos encontram suas condições de vida preestabelecida e têm,
assim, sua posição na vida e seu desenvolvimento pessoal determinados pela classe,
tornam-se subsumidos a ela. Trata-se do mesmo fenômeno que o da subordinação dos
indivíduos isolados à divisão do trabalho, e tal fenômeno não pode ser suprimido se
não se superarem a propriedade privada e o próprio trabalho. (MATTOS, 2007, p. 35)
Gramsci não nega essa subsunção do indivíduo à classe, porém, determina que para
superar as contradições do sistema é necessário que antes se conquiste a hegemonia. Sendo a
sua conquista essencial para a conquista do poder. Novamente cultura e ideologia são
evidenciadas no processo de superação e de construção de uma cultura nova.
Inverte-se o caminho originalmente proposto, “antes de tomar o aparelho de estado,
uma cidadela vazia para ele [Gramsci], fundamental era se construir a hegemonia na sociedade,
ocupando postos de luta importantes e produzindo um novo conjunto de valores” (SANTANA,
2007, p. 224). As classes trabalhadoras possuem uma filosofia real, que é a sua ação, tem
também uma filosofia declarada, sua consciência, que está em contradição com sua ação.
Partindo de um processo de transformação, é preciso juntar esses dois elementos para
que sua política se torne uma filosofia consciente, a fim de chegar à uma nova cultura e a partir
disso “tomar” o aparelho de estado (GRUPPI, 1980, p. 81).
Como campos em disputa, as classes sociais com seus distintos projetos de sociedade
rivalizam-se com intuito de “impor” para a sociedade seu modo de ver o mundo e atuam em
diversos campos, mas o que se destaca nesta proposta é a atuação da imprensa e modo como é
possível perceber nela tais projetos e como uma possibilidade de entender as “revistas e jornais
como meios para organizar e difundir determinados tipos de cultura” (GRAMSCI, 2014A, p.
33).
457
A imprensa enquanto partido: desafios e possibilidades
Gramsci aponta os meios de comunicação como um dos principais construtores de
hegemonia. Essa hegemonia, é a capacidade de uma classe dominante ou pretensa ao domínio,
de construir o consenso e/ou consentimento, tornando-se classe dirigente e capaz de se
encarregar da direção moral e intelectual de uma grande maioria.
É oportuno destacar a possibilidade de compreender a imprensa no seu sentido
extraclasse, como um “organizador de uma nova cultura [...] tendo em vista a necessidade de
criar as condições mais favoráveis à expansão da própria classe” (GRASMCI, 2014A, p. 15).
Articulada sob a perspectiva de jornalismo integral, que pretende além de suprir as necessidades
do leitor, também criar novas demandas.
O desafio para esta forma de entender a fonte jornalística está em romper com a visão
de uma imprensa liberal, que ainda está presente em nossa sociedade, que sendo liberal a
tornaria livre para julgar e opinar sobre os fatos, pois à mercê dos interesses de classe existentes
poderia sob os pressupostos da neutralidade julgar os eventos e narrar os fatos.
A ideia de jornalismo integral, também está presente na obra “Los imaginários sociales”
de Bronislaw Baczko (1999), de modo que, nos meios de comunicação se misturam imaginação
e informação numa junção que torna difícil em determinados momentos separar um do outro.
Dos meios de comunicação de massa que se fabricam as necessidades que abrem
inéditas possibilidade para a propaganda, e que se ocupam eles mesmos de satisfazê-
las. Em efeito, o que os meios de comunicação fabricam e emitem, está mais além das
informações centradas na atualidade, posta como espetáculo, são os imaginários
sociais as representações globais da vida social, de seus agentes, instancias e
autoridade, os mitos políticos, os modelos formadores de mentalidade e de
comportamentos, as imagens dos líderes, etc. (BACZKO, 1999, p. 32)
Nesse sentido, as possibilidades de pesquisa estão no poder de observar a imprensa
como um partido político no sentido gramsciano, a fim de perceber os interesses de classes
defendidos pelos periódicos e revistas. Bem como pela possibilidade de observar suas
aspirações, como abordam os eventos.
A partir do entendimento da imprensa enquanto um partido político e enquanto
construtora de hegemonia, pode-se realizar inúmeras perguntas para esta fonte: como o jornal
constrói o seu discurso? Quais mecanismos utiliza para conquistar a opinião pública? A quem
pertence a empresa? Que relações estabelece com o capital? Que frações de classe representes?
É portador de um projeto social ou reproduz um projeto alheio?
458
O exercício ‘normal’ da hegemonia, no terreno clássico do regime parlamentar,
caracteriza-se pela combinação da força e do consenso, que se equilibram de modo
variado, sem que a força suplante em muito o consenso, mas, ao contrário, tentando
fazer com que a força pareça apoiada no consenso da maioria, expresso pelos
chamados órgãos da opinião pública – jornais e associações –, os quais, por isso, em
certas situações, são artificialmente multiplicados. (GRAMSCI, 2014B. p. 95)
Com este autor, surgem discussões no campo político que nos auxiliam a perceber, que
“tanto nos regimes democráticos, onde existe uma relação equilibrada entre coerção e consenso,
até as mais rudimentares ditaduras, nenhum regime político foi capaz de sobreviver sem o
estabelecimento de bases sociais e elementos de hegemonia” (MELLO, 2012, p. 33). Nesse
sentido, hegemonia é “construção de mundo” (BRANDÃO, 2007. p. 5.), ou seja, são os meios
para a elaboração e/ou manutenção de determinada ideologia que historicamente encontram-se
em disputa.
Com o intuito aqui apresentado, se entende os meios de comunicação como meios e
“instrumentos de manipulação de interesses e de intervenção na vida social” (CAPELATTO,
1980, p. XIX). Embora o termo manipulação pareça maniqueísta refere-se à necessidade do
bloco hegemônico manter-se dominante frente as outras classes, e esta dominação não ocorre
apenas a partir do controle do aparelho repressivo do Estado. Desse modo, tanto para Marx
quanto para Gramsci, um tipo qualquer de associação que tomasse parte de alguma ação política
consciente, de organização de “vontades coletivas”, dotada de um princípio político invocador
de um projeto de sociedade, pode ser encarado como partido político (SANTOS, 2007, p. 30).
O que Gramsci propõe é algo como uma baliza metodológica, um meio para que o
pesquisador perceba a capacidade do sistema privado de hegemonia (meios de comunicação,
sistema educacional, religião) de realizar seu programa, de transpor um planejamento em ação
política. Nesse sentido, a questão primordial para esta compreensão é afastar-se das disputas
internas de um partido para buscar compreender sua “eficiência real” (SANTOS, 2007), para
aproximar-se daquilo que o partido conseguiu construir. Ou seja, uma ideologia política que se
apresenta não fria como utopia, nem como raciocínio doutrinário, mas como uma criação da
fantasia concreta que atua sobre um povo disperso e pulverizado para despertar e organizar a
vontade coletiva” (GRAMSCI, 2014B, p. 13).
Desta forma, o partido é “um mecanismo que realiza na sociedade civil a mesma função
desempenhada pelo Estado”, é também “o modo próprio de elaborar sua categoria de
intelectuais orgânicos” (GRAMSCI, 2014A, p. 24). Os intelectuais “são os “prepostos” do
grupo dominante para o exercício das funções subalternas da hegemonia social e do governo
459
político” (GRAMSCI, 2014A p. 21). Eles se formam segundo processos históricos e em relação
com o mundo produtivo, mediados pelo conjunto das superestruturas (ideologia instituições,
sistema de ideias), dos quais “os intelectuais são precisamente os funcionários” (GRAMSCI,
2014A p. 20).
Como qualquer organização, seu objetivo é “elaborar os próprios componentes,
elementos de um grupo social nascido e desenvolvido como ‘econômico’ até transformá-lo em
intelectuais políticos qualificados, dirigentes, organizadores de todas as atividades e funções
inerentes ao desenvolvimento orgânico de uma sociedade integra, civil e política” (GRAMSCI,
2014A p. 24).
Jornalismo no Rio Grande do Sul: O Correio do Povo
Para elucidar os desafios da pesquisa historiográfica usando a imprensa como fonte, é
importante ao pesquisador buscar as principais discussões sobre a temática. A partir dos anos
1980 ocorreram transformações no que tange ao uso de fontes jornalísticas, e elas
proporcionaram um aumento nas produções que utilizam como fonte de pesquisa os jornais. A
antiga tendência em percebê-los como uma fonte secundária tem se tornado menos recorrente,
colaborando assim para desmistificar os paradigmas da historiografia tradicional que os
considera como fontes não confiáveis, pois, estariam envolvidos em subjetividades, tanto
daqueles que a produziram, como do leitor/pesquisar.
Segundo Luca, os jornais enquanto “‘enciclopédias do cotidiano’ contêm registros
fragmentários do presente”, por esse motivo foram considerados fontes de pesquisa
inadequadas, seus registros se compõem de fragmentos do presente, “realizados sob o influxo
de interesses, compromissos e paixões” (LUCA, 2005, p. 112). Porém, para a proposição deste
ensaio, tais paixões e interesses não são vistas como meras distorções subjetivas e sim a partir
das reflexões de Gramsci sobre jornais e revistas, como mecanismos difusores de ideias e de
cultura.
No entanto, não significa negar cuidados metodológicos intrínsecos à profissão de
historiador. É necessário sempre contextualizar a fonte de análise, na tentativa de compreender
as condições vigentes durante a sua produção, a fim de realizar uma leitura detalhada e
meticulosa.
460
Para isso se tornar elucidativo destaca-se a história e a trajetória de uma nas empresas
jornalísticas mais consolidas no Rio Grande do Sul, o jornal Correio do Povo, fundada em 1895
por Francisco Antônio Vieira Caldas Júnior, dois meses após o fim da Revolução Federalista,
que opôs Republicanos e Federalistas no Rio Grande do Sul. O jornal, procurando se manter
distante das disputas partidárias, declarava em sua primeira publicação ser independente e livre
de disputas, foi precursor em distanciar as orientações políticas do fazer jornalístico, que
anteriormente, conduzia e determinava o conteúdo dos folhetins. Segundo Galvani,
quando o Estado [do Rio Grande do Sul] radicalizou-se entre maragatos e pica-paus,
era possível sentir com muita clareza de que lado estavam os jornais e os jornalistas.
Todos eles tinham suas posições políticas e todos os veículos demonstravam na
linguagem e na política sua ideologia. (GALVANI, 1995, p. 45)
Embora a adoção de uma postura distante dos acontecimentos político, o objetivo de
Caldas Júnior era “representar os interesses das chamadas classes conservadoras”, mantendo
fortes relações com as “elites agrárias”, o Correio do Povo “era o jornal lido pelos estancieiros
– e seria interpretado posteriormente pelo jornalista João Antônio Mesplé como uma prova do
interesse exclusivo do jornal pelas questões pertinentes às classes produtoras” (DILLENBURG,
p. 4).
A vinculação da vida política dos partidos à imprensa é chamada de jornalismo de cunho
político-partidário, e está vinculado ao processo em que dirigentes fazem da imprensa um
“agente orgânico da vida partidária” (RÜDIGER, 1993, p. 28). A criação pelos partidos de seus
próprios periódicos acabou estabelecendo nesse período uma concepção de que a natureza do
jornalismo é fundamentalmente opinativa, que caberia a ele dirigir a opinião pública.
O afastamento efetivo entre política e jornalismo ocorreu paulatinamente. Caldas Júnior
percebe o campo fértil para a sua atuação. Mantendo seu jornal sempre vinculado a laços
políticos, porém, essa conexão se dá de forma bastante sutil em comparação com a antiga
proposta de jornalismo. O Correio do Povo, surge em um contexto conflituoso, no entanto,
diferencia-se do modelo existente, enquanto o jornalismo político-partidário sempre nutriu
“sonho de formar e também dirigir a opinião pública” (RÜDIGER, 1993, p. 50), o novo
jornalismo informativo moderno buscava afastar-se desse papel.
A emergência do jornalismo informativo ocorreu juntamente a entrada de capitais
estrangeiros, e se “desenvolveu com o apoio e a serviço [de uma] estrutura transnacional de
poder” (SILVA, 2006, p. 45). No entanto não se pode afirmar que anteriormente os jornais não
possuíam vínculos com a capital, mas o que os caracterizava em grande parte era seu forte
461
vínculo com os partidos políticos em si, ou seja, “esse jornalismo político partidário, está ligado
ao processo pelo qual a classe política transformou a imprensa em agente orgânico da vida
partidária (RÜDIGER, 1993, p. 28).
Esse novo jornalismo que é característico dos jornais que são fonte e objeto dessa
pesquisa, surgem ligados a dois elementos, o primeiro deles é o padrão tecnológico e
consecutiva dependência externa com financiamentos e patrocínios e o segundo é a “relação
com órgãos estatais dadas por interesses mútuos, pois os jornais e revistas colocam-se como
neutros, possibilitando a sua atuação partidária na defesa dos interesses de ambos” (SILVA,
2006, p. 45).
O jornalismo informativo moderno supera progressivamente o antigo, em grande
medida devido ao processo de transformação da estrutura econômica da sociedade. A partir da
Revolução de 1930, há uma diversificação das camadas sociais, que se encontram cada vez
mais inseridas na lógica da industrialização. Esse fenômeno gerou uma ascensão das camadas
médias, possibilitando não apenas uma mudança na estrutura social e econômica, mas, também
novas necessidades culturais que o jornalismo de cunho político-partidário não dava conta de
suprir (RÜDIGER, 1993, p. 43-44).
Paulatinamente, o modelo de jornalismo em que o jornal Correio do Povo se enquadrava
demonstrou que soube aproveitar do crescimento econômico e da expansão do público leitor.
Associando-se a comerciantes, que progressivamente somariam forças para formar um
jornalismo independente como alternativa às novas necessidades da sociedade.
O sucesso do jornal Correio do Povo encontrava-se também na postura empresarial
assumida, que permitiu que o jornalismo informativo moderno se afastasse das disputas
políticas que anteriormente eram o grande financiador dos periódicos para apresentar-se ao
público, como “órgão de nenhuma facção, que não se escraviza a cogitações de ordem
subalterna” (RÜDIGER, 1993, p. 64).
No início do século XX, Caldas Júnior estabeleceu com o Correio do Povo um
predomínio frente ao mercado de periódicos. O segredo para isto, foi a afinada percepção das
mudanças culturais, sociais e econômicas da época e o refinamento no processo de produção
dos jornais, que proporcionou a redução dos custos, permitindo maiores espaços para anúncios
e investidores. O jornalismo ligava-se cada vez mais às condições determinadas pelo avanço do
capitalismo. Conforme Rüdiger,
462
A transição para um novo regime jornalístico não foi progressista; o mercado não
comportava, como não comporta até hoje, grande concorrência: o público leitor era
limitado por fatores econômicos e educacionais, e o número de anunciantes não era
suficiente para sustentar várias empresas. Por isso, as tendências jornalísticas que vêm
se consolidando desde essa época têm se caracterizado pela concorrência monopolista
entre poucos jornais. (RÜDIGER, 1993, p. 61).
Gradativamente, essa concorrência parou de ser exercida entre os jornais espalhados
pelo Rio Grande do Sul. Ainda segundo Francisco Rüdiger, o Correio do Povo e O Diário de
Notícias — ambos localizados em Porto Alegre —, representaram a vanguarda do nosso
jornalismo. Tanto por sua organização nos moldes capitalistas, como por sua “imparcialidade”.
Nesse sentido, a ação monopolista de alguns jornais garantiu a predominância no mercado,
fazendo com que o Correio de Povo e em segundo lugar o Diário de Notícias17 tornassem-se
os maiores jornais do Estado no início do século XX.
A partir de 18 de dezembro de 1935, o jornal passa a ser dirigido por Breno Caldas, filho
de Caldas Júnior. O novo diretor sempre procurou manter a linha inaugurada por seu pai,
mantendo-se a proposta, que buscava um “afastamento” dos conflitos intrínsecos à sociedade.
Contudo, o desenvolvimento desse jornalismo informativo “livre” das disputas políticas
sofreu para a sua manutenção, isso porque, a política era essencialmente uma forma de sustento
do jornalismo e também uma prática muito presente. Embora o jornal sempre tenha cultivado
uma “imagem de distanciamento das discussões políticas, não abria mão de sua influência,
expressa ao longo do século XX” (SPERANZA, 2007, p. 57-58). Podemos citar o episódio em
que Breno Caldas, se envolve em um conflito com o governo Flores da Cunha quando decide
apoiar o “projeto Varguista de desenvolvimento capitalista para o País, cujos termos
centralizadores haviam gerado uma dissidência com Flores [da Cunha]” (RÜDIGER, 1993, p.
70).
As transformações ocorridas no jornalismo não retiraram de cena a natureza política do
seu fazer. Mas garantiram uma mudança na forma de fazê-lo, “o caráter político do jornalismo
foi se dissimulando ainda mais, traduzindo-se em “políticas noticiosas” extremamente sutis,
mas eficazes no processo de modelagem da opinião pública” (RÜDIGER, 1993, p. 71).
Diante alguns empasses na política, o Correio do Povo seguiu exercendo sua influência
e publicando suas anuências. Durante o governo de Eurico Gaspar Dutra, “apoiou a cassação
do Partido Comunista Brasileiro em 1947”. E também em 1950 quando “deu seu apoio a Getúlio
17 O jornal Diário de Notícias foi fundado apenas em 1º de março de 1925. Mas graças a sua adaptação ao novo
modelo de jornalismo obteve grande sucesso.
463
Vargas, embora olhasse com desconfiança algumas das teses de seu programa, caracterizado
por um extremo nacionalismo e por restrições à entrada do capital estrangeiro no Brasil”
(DILLENBURG, p. 5).
Ao início dos debates em torno da sucessão presidencial, após a renúncia de Jânio
Quadros em 1961 “o jornal não aprovou a posse do vice-presidente João Goulart” e com a
implantação da ditadura civil-militar, sempre fez questão de evidenciar sua percepção sobre a
política de João Goulart, Breno Caldas, afirma que “a Revolução de 64 foi para nós benvinda”
(DILLENBURG, p. 5).
Com isso, salientamos o envolvimento do diretor Breno Caldas nas disputas políticas
durante a ditadura civil-militar. Em entrevista cedida à José Antonio Pinheiro Machado, Breno
Caldas afirma que,
A Revolução de 1964, de um certo modo, contou com a nossa participação, ou pelo
menos com a nossa simpatia. O pessoal que foi ao poder em 1964... né é que fosse
ligado a nós – nós não tínhamos ligações políticas com ninguém -, mas eram pessoas
afinadas conosco, estávamos no mesmo caminho. Quando houve a tal conspiração do
Castelo Branco, eu não sabia de nada oficialmente. Até que o general Adalberto
Pereira dos Santos, que comandou o movimento por aqui, fez um contato comigo, me
disse que a situação era crítica, que iria acontecer alguma coisa: “Fique atento a uma
manifestação do general Castelo Branco. (MACHADO, 1987, p. 54)
Não se trata de afirmar que a direção do jornal estivesse a serviço da ditadura, mas, de
observar a influência política que o diretor do Correio do Povo exercia no Rio Grande do Sul.
Pinheiro Machado, ao perguntar à Breno Caldas como era sua relação com os presidentes
militares. Breno responde: “Em geral, boas. O Costa e Silva, que sucedeu o Castelo Branco, era
um terrível jogador, adorava corridas de cavalo” (MACHADO, 1987, p. 77). Conta também
que seu filho, ao servir nas Forças Armadas foi convidado por Costa e Silva para ser seu
motorista. Segundo ele, “um soldado que almoçava na mesa do general, Breno acreditava que
a ideia de Costa e Silva “não era se aproximar do Correio do Povo, que era um jornal muito
influente, mas sim ter por perto alguém ligado ao turfe!”” (MACHADO, 1987, p. 79).
Exercer uma posição de importância perante a sociedade sempre foi a realidade de
Breno. A Pinheiro Machado, conta que deveria ter ido à Brasília a fim de receber uma medalha,
mas não gostava dessas coisas e mandou seu filho Francisco Antônio, gerando um incidente. A
medalha devia ser entregue em mãos, no entanto, Francisco Antônio se encontra com Médici
em uma cerimônia não oficial, em um ato de quebra de protocolo, e recebe a medalha de seu
pai” (MACHADO, 1987, p. 79-80).
464
Esses fatos descritos aqui, no auxiliam a perceber que mesmo seguindo a linha de
“neutralidade” assumida nos primórdios da fundação do jornal Correio do Povo, a família
Caldas, sempre exerceu grande influência nos espaços que conviveu. Tornando difícil afastar
seus interesses enquanto produtor rural e proprietário de terras juntamente com a função de
direção dos rumos do periódico.
Conclusão
Em vista das questões acima apontadas, as novas técnicas jornalísticas proporcionadas
pelo refinamento dos meios de produção a partir dos anos 1950, mas também pelo ingresso de
capitais internacionais nos meios de comunicação colaboraram para a compreensão da imprensa
como um órgão capaz de objetivamente julgar a realidade, no entanto, para os fins dessa
pesquisa a imprensa é entendida como um agente partidário, e faz necessário observar as
“relações de poder das quais a mídia faz parte, não podemos tomá-la como um sujeito à parte,
mas como integrante da própria engrenagem de reprodução do sistema do capital” (SILVA,
2005, p. 30).
Outro ponto bastante relevante para essa proposta, é pensar que os jornais podem ser
entendidos como fonte e objeto de pesquisa, os jornais “não são inertes folhas de papel, mas
folhas de papel que representam, são voz e calam a sujeitos sociais concretos. Tudo isso,
problematizado permite propor um jornal ou revista como um objeto de estudo” (SILVA, 2014.
p. 121).
Sob essa perspectiva a obra de Beatriz Kushnir nos aponta algo bastante oportuno, “as
práxis jornalísticas contemporâneas podem ser observadas, grosso modo, como uma mise-em-
scène – encenação – das regras sociais, uma suposta vigia ao poder e a utopia da liberdade de
expressão absoluta” (2012, p. 55). Nesse sentido, observar a imprensa afastada das relações
burguesas que estabelece é negligenciar seu próprio surgimento.
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RÜDIGER, Francisco. Tendências do jornalismo. Porto Alegre: Ed. da UFRGS, 1993
467
VIOLÊNCIA NO JORNALISMO LOCAL: UMA ANÁLISE SOBRE O DISCURSO
CONTRA AS MULHERES
Sandra Barbosa Parzianello18,
Adriana Hartemink Cantini19,
Simone Barros de Oliveira20,
Waleska Belloc Barbosa21.
RESUMO: O artigo busca analisar de forma interdisciplinar as marcas discursivas existentes
sobre a violência contra as mulheres nos textos do jornal impresso “Folha de São Borja”.
Partimos do pressuposto de que o jornal de maior circulação no município de São Borja/RS
publica uma visão depreciativa em torno do gênero feminino e de que suas marcas discursivas
revelam, inclusive, a banalização da violência contra a mulher. A pesquisa busca mostrar, a
partir de alguns elementos textuais e contextuais, a representação discursiva do valor da mulher
e em que medida esta prática de narrativa na mídia ameaça seus direitos e conquistas. A
proposta é de uma análise qualitativa das matérias impressas buscando evidenciar essa
construção violenta contra a mulher. Neste sentido, a pergunta de pesquisa: como a violência
de gênero está representada na mídia impressa “Folha de São Borja”? nos conduzirá ao
desenvolvimento da pesquisa documental, via levantamento de textos jornalísticos que, por
amostragem, ao longo do ano de 2017, representem a forma como a temática é apresentada no
jornal. À luz dos teóricos que nos fundamentam na análise, veremos se os enunciados
jornalísticos se mostram de forma conotativa, pejorativa e depreciativa em relação à mulher. A
abordagem teórica contará com a contribuição de autores como Heleieth Saffioti nas questões
de gênero e machismo, com o pensamento do psicólogo americano Marshall Rosenberg e sua
compreensão sobre a relação não-violenta, além dos pressupostos da filósofa alemã Hannah
Arendt e dos cânones do campo do conhecimento do Jornalismo. A partir dos textos
jornalísticos e à luz da teoria do discurso desenvolvida por Ernesto Laclau e Chantal Mouffe
(2015), fundadores da Escola de Essex de Análise do Discurso, pretendemos inferir sobre as
18 Jornalista e Cientista Política. Líder do Grupo de Pesquisa Diálogos do Pampa, Unipampa/ CNPq. Mestra em
Ciência Política – UFPel – Universidade Federal de Pelotas.parzianellos@yahoo.com.br 19 Advogada. Professora Adjunta da Unipampa. Vice-líder do Grupo de Pesquisa Educação, Direitos Humanos e
Fronteira, Unipampa/CNPq. Pesquisadora do Grupo Diálogos do Pampa/ Unipampa/CNPq Doutora em Direito.
adrianacantini@unipampa.edu.br 20 Assistente Social.e Professora Adjunta da Unipampa, Líder do Grupo de Pesquisa Educação, Direitos Humanos
e Fronteira, Unipampa/CNPq. Pesquisadora do Grupo Diálogos do Pampa/ Unipampa/CNPq .Doutora em Serviço
Social. simoneoliveira@unipampa.edu.br 21 Advogada, doutoranda em Ciências Sociais, pesquisadora do Grupo Diálogos do Pampa/ Unipampa/CNPq e do
Grupo de Pesquisa Educação Direitos Humanos e Fronteira/UnipampaqCNPq. waleskabelloc@yahoo.com.br
468
práticas jornalísticas novos elementos para a compreensão das semânticas que se fazem sentir
quando os jornais dizem o que dizem.
Palavras Chaves: Violência, Mulher, Mídia, Discurso.
INTRODUÇÃO
Este artigo tem como objetivo analisar de forma interdisciplinar as marcas discursivas
existentes sobre a violência contra as mulheres a partir dos textos do jornal impresso “Folha de
São Borja”. A violência contra as mulheres é um tema que tem ocupado um espaço diferenciado
e mais expressivo ao longo do tempo. As pesquisas nas áreas das ciências humanas e sociais
marcam posicionamentos teóricos que resultam em complexas análises e fundamentações
nascidas de modo que precisam ser enfrentados em torno de seus objetos.
O século XX foi marcado por desafios e conquistas a partir dos movimentos sociais, como
no caso o feminismo. Esta forma de articulação social e política foi, principalmente, um
momento de lucidez em meio à precariedade e a banalização da violência contra a mulher que
se instalou ao longo de séculos na nossa história. A luta foi gradativa, as limitações foram
numerosas, mas os recursos e o avanço tecnológico na contemporaneidade forma
determinantes. Atualmente, há uma multiplicação de posicionamentos em diversas frentes que
invocam, em proporções significativas, discursos pulverizados e fortalecem a identidade
feminina e a gama de direitos que às envolvem.
Levando em consideração esse cenário é que questionamos: como a violência de gênero
está representada na mídia impressa “Folha de São Borja”? Partimos do pressuposto de que o
jornal de maior circulação no município de São Borja/RS publica uma visão depreciativa em
torno do gênero feminino. As marcas discursivas revelam, inclusive, a banalização da violência
contra a mulher. Neste sentido, este meio de comunicação pode estar contribuindo para que,
antigas concepções de valor e socioculturais, possam naturalizar uma forma banal de subjugar
as mulheres.
A pesquisa aponta o que o referido jornal destaca ao abordar temas ligados às mulheres e
os direitos humanos em suas narrativas, a partir das matérias impressas que evidenciam uma
construção violenta e depreciativa contra a mulher conforme a proposta de análise teórico-
qualitativa. Vimos que ao narrar cria-se um acontecimento, que dá vida e sentido tanto aos
469
objetos envolvidos, como aos sujeitos a quem os textos se referem, segundo a pesquisa
documental e de conteúdo que envolveu o levantamento de textos jornalísticos que, por
amostragem, ao longo de 2017, espelhou a forma como a temática é apresentada no jornal.
A pesquisa revelou, a partir de alguns elementos textuais e contextuais, a representação
discursiva do valor da mulher e em que medida esta prática de narrativa na mídia ameaça seus
direitos e conquistas. Portanto, se justifica pela observação dos casos impressos e
compartilhados com o público que se fundamenta na análise da percepção pessoal sobre a
realidade do tema em que o jornalismo constrói uma narrativa hegemônica sobre outras
construções da verdade imediata e, por consequência, do senso comum.
O artigo estabeleceu premissas teóricas sobre violência de gênero e dos direitos humanos,
a (re) leitura do trabalho e da cobertura jornalística, além da análise das matérias conforme
elementos que fundamentaram esta proposta e os enunciados jornalísticos que se revelaram
como discursos conotativos, pejorativos e mesmo depreciativos em relação à mulher.
A análise nos levou a inferir sobre as práticas jornalísticas e um tipo de discurso que pode
levar o leitor a normalizar a ideia de que a forma depreciativa e pejorativa sobre as mulheres
não passa de um simples uso retórico, mas que na realidade se configuram enquanto fenômeno
de violência contra a mulher. Nossas considerações, agregam valor a abertura de um debate
sempre atual, e trazem um caráter contingente que destaca, ainda na contemporaneidade, o
sentido baseado na cultura do machismo, demonstrando que a mulher continua sendo dominada
e submissa.
A Violência e suas manifestações diversas
A violência está na agenda do dia, atualmente é uma expressão que virou moda pelo terror
cotidiano que causa à vida das pessoas. A violência tem sido o tema de muitos estudos e
pesquisas, é uma temática que causa polêmica, se expressa de diferentes formas e vem se
tornando fenômeno complexo, que tem preocupado a sociedade de um modo geral. No contexto
contemporâneo, raramente alguém ousaria afirmar que não se sente ameaçado pelo risco de ser
atingido pelos efeitos devastadores de algum tipo de ato violento. Exatamente, por isso, abordar
470
violência exige desvelar seu caráter dúbio, polêmico, complexo e multifacetado. A violência
nasce, enquanto vocábulo, do latim vis que significa força. Essa significação pode lançar bases
para uma definição do fenômeno, pois o mesmo, em suas diferentes gamas e categorizações,
sempre tem, em seu eixo, algum sobreuso da coerção, seja física, emocional ou psicológica.
Dessa forma, a violência, em geral se opõe a ética e aos valores de uma sociedade.
A abordagem da violência é de propriedade da alçada comum, uma vez que os repetidos
atos violentos são democráticos, não escolhem gênero, faixa etária, estrato social, etnia ou grau
de escolaridade. Assim,
A violência possui uma fecundidade própria, ela se engendra a si mesma. É preciso
então sempre analisá-la em rede, em entrelaçamento. Suas formas e aparências mais
atrozes e às vezes mais condenáveis, frequentemente ocultam, entre outras situações
de violência menos escandalosas, por encontrarem-se prolongadas no tempo e
protegidas, pelas ideologias ou pelas instituições de aparência respeitável. (COSTA e
GOMES,1999, p. 159).
No contexto urbano a violência está presente em todos os espaços sociais. Ela se veicula
nos meios de comunicação e entre a própria população, sob diferentes aspectos e expressões.
Ouve-se falar da violência referente ao crime, à marginalidade, à miséria, à corrupção do
Estado, de lideranças políticas que usam do poder público para negligenciar o povo, entre
outras, de forma que ganha variadas faces e olhares de pessoas, grupos e sociedades
diferenciadas. A violência no Brasil está enraizada na cultura e na sociedade, no entanto, deve
ser percebida com estranhamento, mas o sensacionalismo com que a imprensa trata a violência,
reforça os atos. Ouve-se e enxerga-se a violência retratada nas diferentes formas de se referir à
mulher na sociedade que podem ser identificadas nos processos de comunicação social. Mas,
se por um lado, a noção de violência tem amplo acesso popular, por outro a sua definição não
é considerada pelos estudiosos como tarefa fácil, e muito menos unívoca, entretanto também
não significa que a “[...] violência seja indefinível porque implica divergências de pontos de
vista radicais.” (MICHAUD, 2001, p. 14). De qualquer forma, a violência passou a ser um
problema social que afeta a sociedade como um todo. Estudar e pensar a violência, implica
estudar e pensar a sociedade.
Nesta perspectiva, Boulding (1981), vem fundamentar que a violência estrutural marca a
violência do comportamento. Sendo assim, pode-se pensar a violência perpetuada em diversas
ramificações da sociedade, como uma rede, na qual é possível reconhecer que a violência
471
estrutural. Berguer e Luckmann (2011) no que se refere à “construção da realidade”, refletem a
forma como o conhecimento é apreendido e a relevância do “social” nas suas construções
individuais. Em tal abordagem, os autores reforçam que a sociabilidade é atingida através da
interação dos grupos de indivíduos. Essa interação permite que o homem tenha a percepção do
mundo à sua volta, visto que é somente a partir dela que lhe é permitido atribuir sentidos e
significações às coisas. Ou seja, a “construção social da realidade” se dá na medida em que o
processo de socialização ocorre, quando os indivíduos passam a representar e atribuir
significados ao mundo que os cerca. Neste sentido, de acordo com os autores, o mundo é o
resultado das representações geradas durante a socialização. Esse processo trata-se de um
conjunto complexificado de interações e mediações socioculturais que delineia o modo do ser
social perceber o mundo e representá-lo.
O desafio da contemporaneidade é a de uma comunicação compromissada, que desvie os
seus rumos da conveniência discursiva Citelli, (2001), e que seja realmente consciente do seu
papel formador de opinião e conhecimento. Lippman (2008) defendia que as mídias são a
principal ligação entre os acontecimentos no mundo e as imagens que as pessoas têm na cabeça
acerca desses acontecimentos. Nesse sentido, os contornos dados pela mídia à violência são
necessários para a compreensão do fenômeno em relação a sua realidade local. Os meios de
comunicação operaram, à grosso modo, uma transformação no mundo simbólico, isto é, nas
maneiras de se transmitir e absorver uma produção de sentido. Isto implicou uma dupla
funcionalidade aos meios: eles, enquanto condutores de informação, não somente
representavam a sociedade, mas, também, intervinham para a construção da realidade social a
partir dessa própria representação. Para além disso, os meios de comunicação asseguram um
outro processo que é prioritário para a formação de sentido e significado dos seres humanos: a
interpretação. Toda e qualquer notícia veiculada gera individualmente uma interpretação. Nesta
perspectiva, pode-se inferir que os meios de comunicação contribuem para a construção da
realidade social, pois “[...] a vida cotidiana apresenta-se como uma realidade interpretada pelos
homens e subjetivamente dotada de sentido para eles na medida em que forma um mundo
coerente” (BERGUER E LUCKMANN, 2011, p. 35). Estando presentes nesse processo ativo
de contribuintes para a geração de interpretação na humanidade, as mídias são importantes
construtoras da realidade social na atualidade.
472
A violência contra a mulher no discurso impresso: uma análise do Jornal A Folha de São
Borja
Tendo em vista o caráter prioritário que os meios de comunicação desempenham na
sociedade, é necessário realizar um recorte dessa importância do ponto de vista da mídia
jornalística, já que o objeto desse estudo são as representações da violência contra a mulher no
Jornal. Tendo em vista a problematização do tema frente aos meios de comunicação, o problema
da banalização da violência faz-se importante a realização de um estudo sobre a realidade da
Fronteira Oeste do Estado do Rio Grande do Sul e suas características histórico-culturais no
que se refere ao fenômeno da violência simbólica. Na análise a seguir, serão apresentados os
resultados pesquisa realizada no Jornal a Folha de São Borja, onde analisamos 07 edições
escolhidas aleatoriamente dos meses de janeiro a julho e todas as edições dos meses de agosto
e setembro, considerando que o jornal circula duas vezes na semana: nos sábados e nas quartas-
feiras. As inferências sobre mulheres, foram, encontradas de maneira mais frequente na coluna
policial e na coluna social. Nas sessões destinadas as notícias, encontramos apenas três
inferências durante o período analisado.
A opção pelo jornal impresso se dá justamente pela sua popularização, sendo que esse
está presente em todos os segmentos e classes sociais. Considerando que o direito à informação
é previsto em lei e o acesso a essa informação é típico das democracias, analisar tais
informações à título de pesquisa e esclarecimento, também se constitui no direito das
pesquisadoras e pode, em última instância contribuir para a construção e uma comunicação
menos violenta e mais prospectiva em relação mulher sãoborjense. Citamos a mulher
sãoborjense, porque ignoramos todas as notícias que se referiam as mulheres que, mesmo
sãoborjenses residiam em outros municípios. Dines (2009, p. 88) argumenta que “[...] o cidadão
que tem acesso às informações e condições de escolhê-las, sem perigo, está apto a sobreviver
intelectualmente como homem”. Nesse ponto, as escolhas do veículo impresso justificam-se
por ser o jornal de maior acesso pela população de São Borja e, assim, buscamos descortinar
aspectos arraigados na sociedade local em relação à temática da violência contra a mulher e da
sua representação nessa mídia impressa.
473
A mídia jornalística interage entre si própria, de acordo com suas visões de mundo e
percepções culturais e acaba contribuindo para o processo de (re) produção de valores e
representações. Nesse sentido, Alsina (2009) refere que,
Dentro da perspectiva da construção social da realidade, posso conceber a construção
da notícia como algo especial e pertencente a realidade: é uma realidade simbólica,
pública e quotidiana. Desse ponto de vista, deveríamos falar sobre a construção da
realidade social. Os jornalistas são, como todo mundo, construtores da realidade ao
seu redor. Mas também conferem estilo narrativo a essa realidade divulgando-a, a
tornam uma realidade pública sobre o dia-a-dia. (ALSINA, 2009, p. 11).
Para além disso, por meio dos produtos gerados pelo meio de comunicação do jornal
pesquisado, pode-se conhecer certos hábitos instituídos na sociedade local, nas suas diversas
manifestações. Dado o grau de relevância desse meio jornalístico como partícipe na construção
da realidade da sociedade sãoborjense, é necessário salientar o papel que este veículo de
informação tem em contribuir para o enfrentamento das problemáticas sociais com a difusão de
matérias que possam promover mudanças nas representações estigmatizadas, ou até mesmo na
promoção de discussões sobre temas pertinentes junto a sociedade. No entanto, é possível
observar que esse veículo se nivela, de acordo com interesses internos ou externos, geralmente
girando em torno da lógica de mercado vigente. Essa conveniência discursiva é necessária para
pensar todas as representações que os meios de comunicação e notícias, em geral, podem
oferecer. (CITELLI, 2001, p. 37). Faz-se pertinente compreender que as lógicas dos jornais da
atualidade são influenciadas pelo contexto ao qual se inserem, bem como à concorrência a qual
fazem parte, o que pode gerar discursos ambíguos e descompromissados com a ética e com o
bom senso, mascarando determinados fatos em detrimento de outros.
As representações sobre a mulher na coluna policial
Em todas as edições analisadas do jornal A Folha e São Borja, encontramos notícias na
página policial sobre violência contra a mulher. Dentre elas a maioria é de violência física
praticada por companheiro, ex-companheiro, filho, vizinho ou namorado. Apenas um caso de
violência registrado foi praticado por outra mulher, designada de vizinha.
Nesses registros o que mais chama atenção são as ações que revelam “domínio e posse”
sobre a mulher, como no caso: “[...] foi ameaçada pelo ex-companheiro. A vítima informou que
possui medida protetiva da Lei Maria da Penha, que o homem não obedece. Ele usa o celular
de sua mãe e liga para ex-companheira ameaçando colocar fogo na casa.” (FOLHA POLÍCIA,
474
30 de setembro de 2017, p. 14). Nesse mesmo sentido e na mesma coluna, porém no dia 14 de
outubro, p. 15, outra manifestação de domínio e posse, desta vez entre um homem e uma mulher
que vivem juntos e de forma violenta e criminosa,
Homem tenta estuprar sua companheira. Na segunda-feira, dia 9, por volta das
21h20min, um homem tentou estuprar a sua companheira, que sofreu lesões no rosto,
braço direito e nádegas. Como não conseguiu, ele saiu da casa do casal antes da
chegada da Brigada Militar que havia sido acionada. (Folha de São Borja, Polícia, 14
de outubro de 2017, p. 15).
Ainda foi possível identificar um outro tipo de violência criminosa, não menos prejudicial
a mulher que é o uso de imagens de fotos íntimas suas repassadas via WhatsApp que estavam
armazenadas em um telefone que era de sua propriedade. (Folha de São Borja, Polícia, 30 de
setembro de 2017, p.14).
O crime de ameaça às mulheres por homens também aparece com frequência nas páginas
policiais do jornal, ora com o uso de faca, ora com palavras e ofensas. Outro informe analisado
revela que uma jovem mulher de 25 anos foi agredida pelo namorado com tapas e pontapés
(Folha de São Borja, Polícia, 18 de fevereiro de 2017, p.18).
Também se percebe a violência praticada por mulheres contra mulheres. É o caso da
“mulher agredida com golpe de faca no rosto pela vizinha, que, segundo informa é usuária de
drogas e decorreu de um desentendimento em virtude de negócios”. (Folha de São Borja,
Polícia, 16 de agosto de 2017, p. 15). Aqui é possível perceber a perpetuação da violência,
muitas vezes já sofrida, sobre outras mulheres.
Tantas manifestações de poder sobre o outro, em especial sobre a mulher que se noticiam,
podem ser decorrência do comportamento social e da educação que, culturalmente repetimos
sem questionar, sejamos pais, mães, professores ou profissionais outros que acompanham essas
crianças no processo de desenvolvimento. Ao nascer uma criança, o que se pode identificar
inicialmente é seu sexo, ou seja, se é masculino ou feminino. A partir disso, elas vão sendo
educadas conforme regras específicas que uma determinada sociedade entende correta para o
comportamento de meninas e meninos, variando segundo a época e padrões culturais,
demonstrando o conceito de gênero. É fato que as relações de gênero no Brasil, tal como em
outros países da América Latina, se estabelecem predominantemente através da dominação do
considerado “sexo forte” (masculino) sobre o “sexo frágil” (feminino), o que decorre de todo
475
um processo social e de uma construção histórica. A partir de então, construiu-se uma sociedade
em que os lugares estão previamente definidos: o da mulher: um lugar de submissão, devendo
obediência, primeiramente, ao pai e, depois do casamento, ao marido, não sendo reconhecida
na prática como um sujeito de direitos, sem a intervenção de um homem que por ela seja
responsável.
Diante dessa sociedade assim organizada, a mulher é considerada um inferior, sem
vontade própria que deve submeter-se aos caprichos e desmandos de algum homem
(pai/marido/irmão) que por ela seja responsável. No entanto, mesmo que muito se discuta e se
proponham políticas públicas e normativas capazes de tentar frear essa violência, fruto de uma
concepção machista de sociedade, essa realidade ainda se mostra diferente do ideal, segundo
CORIA,
Quiero señalar algo que me parece de fundamental importancia: en este contexto,
decir que la mujer ocupaba el lugar de objeto significa claramente ser objeto del deseo
de otro. Esto supone, entre otras muchas cosas, que ellas quedaban instaladas en el
lugar de espectadoras dependientes de las necesidades de otros, convencidas de que
el deseo es matrimonio ajeno. En mi criterio, esta convicción, reforzada culturalmente
por siglos de marginación, es el eslabón clave que uniendo la cadena de los siglos
respecto de los comportamientos femeninos en los vínculos amorosos (CORIA, 2005,
p. 18).
Estruturalmente, nessas sociedades, a mulher é percebida como um ser frágil, dependente,
e que durante muitos séculos essa forma de organização foi a única possível, tanto para
mulheres quanto para homens. Tal forma de organização social possibilitou ao homem tanto
poder perante a mulher que alguns passaram a considerá-las criaturas inferiores que vieram ao
mundo para servi-los. Percebemos que os meios de comunicação (cada um deles) promovem
diferentes tipos de representação ativando signos múltiplos na sua linguagem e forma de
comunicar. É importante advertir sobre a potencialidade dos meios de comunicação no seu
discurso e na sua linguagem, para que interpretações menos contextualizadas não sejam feitas,
afastando-se do sentido ético, compromissado e em consonância com a verdade. De maneira
geral, pode-se observar que os meios de comunicação, enquanto socializadores de sentidos e
significações nas mais largas escalas por meio da notícia, do texto e de suas linguagens
específicas são objetos inclusos na construção da realidade social dos indivíduos. Dizer isto é
validar que um veículo jornal pode oferecer contornos, através do mapeamento de suas notícias
e seu discurso, das mais variadas formas de problemáticas sociais na atualidade, neste caso, da
violência simbólica contra a mulher.
476
As representações sobre a mulher na coluna social
Nas páginas destinadas à coluna social os adjetivos utilizados para informar o que as
mulheres sãoborjenses estão fazendo de suas vidas, ficam, em sua maioria no campo da
meiguice e da aparência. Em alguns casos, a própria mulher, ao se definir utiliza termos
depreciativos em relação a ela mesma, talvez repetindo, sem pensar a cultura machista imposta
e o preconceito a que sempre esteve submetida. Esse é o caso de uma notícia inserida na coluna
intitulada Crônicas da Cidade de 16 de setembro de 2017, p. 8, onde a protagonista assim se
define, “Tô amassada, judiadinha, mas velhice não conheço! [...] 92 anos de idade. E segue
reforçando com orgulho que não abre mão de atender as rotinas domésticas [...]. Tô sempre
fazendo a lida, salienta.
Em outro sentido aparecem fotos de mulheres em eventos sociais e com a família com
adjetivos que procuram defini-las, tais como: “chique e elegante; iluminada e belíssima como
sempre; figura descontraída e de bons papos quando o assunto é sociedade; bem simpática e
querida; com belo sorriso; em grande estilo; não disfarça sua faceirice, charmosa como sempre;
a beleza exótica de Fulana de tal”, etc.”. Mesmo quando há notícia de mulheres que estão
atuando profissionalmente, os adjetivos aparecem de forma desmedida, como no caso de, “A
estrela sobe. A sãoborjense [...] apresentou seus trabalhos sobre sua pesquisa de doutorado [...]
durante a Reunião Anual da Sociedade para Estudos Sociais da Ciência no Shereaton Boston,
reunindo mais de 1,5 mil pesquisadores de todos continentes”. (Folha de São Borja, Social, 16
de setembro de 2017, p.4).
Observamos, dessa vez na coluna social, o destaque dado ao trabalho de duas
profissionais, porém não se comentou nada a respeito do trabalho propriamente dito que
desenvolvem, voltando a destacar adjetivos para conceitua-las, “Olha só de linda e simpática a
pediatra [...]. Foi clicada no seu bem orquestrado consultório [...], agenda concorrida de
atendimentos”. (Folha de São Borja, Fim de Semana, Social, 24 de junho de 2017, p.5).
Igualmente, ao noticiar o trabalho de uma defensora pública o título “descolada” aparece em
destaque, utilizando também os adjetivos “ bonita, descolada e sarada, extremamente
agradável”. (Folha de São Borja, Caderno IN, Social, 04 de maio de 2017, p.5.
Uma notícia interessante encontramos na Coluna Social do dia 5 de abril no Caderno IN,
p. 4 que traz como título “Evidência Feminina”. É sobre um evento que ocorreu em um clube
477
recreativo da cidade, onde algumas mulheres receberam troféus. Há várias fotos, uma lista de
nomes das homenageadas, mas nada se sabe sobre elas. O que ficou em “evidência” mesmo foi
a imagem, para utilizar as palavras do próprio jornal “chique e elegante” das mulheres sendo
“clicadas”.
As dúvidas que surgem após essa breve análise são muitas e dariam espaço para outra
pesquisa a ser construída, onde poderíamos questionar alguns leitores do jornal sobre como as
mulheres sãoborjenses são percebidas e, de modo mais incisivo, se a maneira como as mulheres
da cidade são descritas nessas notícias revelam que elas (poderiam não ter) uma atuação
relevante na vida política, econômica e nos demais setores importantes do município.
Entendemos que,
Al igual que los hombres, las mujeres son y han sido siempre, actoras y agentes em la
historia. Ya que las mujeres son la mitad o más de la mitad de la humanidade, siempre
han compartido el mundo y sus trabajos em iguales partes com los hombres. Las
mujeres on y han sido parte central, no marginal, de la formación de la sociedade y de
la construcción de la civilización. (FACIO y FRIES, 1999, p.55).
Porém, apesar da afirmação acima, percebemos que a mulher continua sendo dominada
mas, hoje quem as dominam não são mais os homens, personificados em maridos,
companheiros, ex-companheiros, filhos, irmãos ou namorados, mas a própria sociedade
revelando que ela deve assumir vários papéis e enaltecendo isso, como trabalhadora, dona de
casa e mãe. Não obstante deve ainda, seguir os padrões da moda imposto pela mídia, ser
“querida, simpática, chique” e obedecer a uma série de adjetivos necessários para ser notícia,
ou, pior ainda, sofrer algum tipo de violência sexista. Assim, ou ela é retratada nas colunas
sociais como dona de uma “beleza exótica” e com outros atributos relacionados a sua aparência
ou comportamento social, ou na pior das hipóteses, como vítima da violência sexista, ainda
muito presente em nosso cotidiano.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
É necessário, como uma alternativa à problemática da conveniência discursiva das
notícias, educar para o acesso aos conteúdos informativos presentes nos meios de comunicação.
O jornal tem papel fundamental na construção da realidade social e precisa ter ciência do seu
papel contributivo na formação de cidadãos. Por isso, não atender a lógica do mercado e da
concorrência no que tange aos contornos da violência é de extrema importância. É preciso
478
desvelar com cautela e não esconder, a partir de um criticismo ético, as práticas de violência
contra a mulher nos discursos do jornal, incentivando a tolerância com o diferente, o espírito
de justiça e a solidariedade.
É preciso ter em vista que, enquanto partícipe na construção da realidade, a mídia, em
particular o jornal, pode também ser considerada uma instância pedagógica que forma
conhecimento sobre os mais variados assuntos. As abordagens jornalísticas, muitas vezes de
forte conteúdo denunciativo, acabam por se tornarem simplificadoras, o que tende por prolongar
práticas de incentivo à violência e autenticar processos de opressão que deveria, no seu objetivo
original, combater. A mulher precisa ser retratada como sujeito de direito que participa
ativamente da vida social, política e econômica da cidade, e não apenas como alguém que
merece adjetivos capazes de defini-la fisicamente. Faz-se necessário que o próprio discurso dos
meios de comunicação não seja de violência e que, à longo prazo, as representações desse tema
no jornal pesquisado promovam sentidos e interpretações que influam para a construção de uma
cultura não sexista ou machista, onde as mulheres são retratadas como objetos, mas onde
possam ser reconhecidas como sujeitos e protagonistas da sua própria história.
REFERÊNCIAS
ALSINA, Miguel Rodrigo. A construção da notícia. Tradução de Jacob A. Pierce. Petrópolis,
RJ: Vozes, 2009.
BERGER, Peter. & LUCKMANN, Thomas. A construção social da realidade. 33 Ed.
Tradução de Floriano de Souza Fernandes. Petrópolis: Vozes, 2011.
BOULDING, Elise. La Violencia y suas causas. Paris França: Editorial UNESCO,1981
CITELLI, Adilson. Linguagem Verbal e Meios de Comunicação. Sobre palavras e (inter) ditos.
REVISTA USP. São Paulo, n.48, dezembro/janeiro 2000-2001.
CORIA, Clara. El Amor, nos es como nos contaron ni como lo inventamos. Buenos Aires:
Paidós, 2005.
COSTA, Eloísa de Campos, GOMES, Carlos Minayo. Superar a cultura da violência: Um
desafio para a escola. São Paulo: Papirus Editora, 1999.
DINES, Alberto. O papel do jornal e a profissão de jornalista. 9.ed. São Paulo: Summus,
2009.
479
FACIO, Alda; FRIES, Lorena. Género y Derecho. Santiago de chile: LOM Ediciones/La
Morada, 1999.
LIPPMAN, Walter. Opinião pública. Petrópolis: Vozes, 2008.
MICHAUD, Yves. A violência. Tradução de L. Garcia. São Paulo: Ática, 2001.
NICOLAU, Marcos. MetaCiência na prática: como lidar com a pesquisa científica. João
Pessoa, PB: Ideia, 2016.
480
COMUNICAÇÃO DIGITAL: PANORAMA DAS EMPRESAS FRONTEIRIÇAS22
Henrique Esper23
Cristóvão Domingos de Almeida24
RESUMO: O objetivo deste trabalho é apresentar os resultados obtidos a partir da pesquisa
realizada no projeto de extensão Comunicação Digital nas Organizações de São Borja. O estudo
realizado no desenvolvimento do projeto, visa compreender o cenário atual das empresas
localizadas em São Borja, na fronteira oeste do estado do Rio Grande do Sul. Com foco nos
usos e apropriações das fanpages do site Facebook. O estudo está fundamentado em mídias
sociais, estratégias de comunicação e organização como espaço de fortalecimento das
atividades comerciais no município. Com base em pesquisa documental e mapeamento das
páginas de 310 empresas entre os anos de 2015 e 2016, destacando pontos positivos e negativos
das respectivas instituições e as formas de aproximação com seus públicos. Evidencia-se que
as redes sociais podem servir como potencialidade ao desenvolver o empreendimento e nas
aproximações com os diferentes públicos.
Palavras-Chaves: Comunicação Digital, Mídias Sociais, Cultura Organizacional, Estratégias
Comunicacionais.
INTRODUÇÃO
O objetivo deste artigo é apresentar pesquisas realizadas em 2015 e 2016, identificando
como as empresas de São Borja usam e se relacionam com seus públicos através de estratégias
de comunicação digital, tendo em vista o município localizado na fronteira Oeste do estado do
Rio Grande do Sul, interiorano, com 335 anos de história e possui cerca de 60 mil habitantes.
O artigo se apoia no argumento que nos dias atuais as empresas precisam usar e se apropriar
das redes sociais, pois a partir desses espaços digitais as organizações conseguem manter
22 Trabalho desenvolvido no projeto de extensão: Comunicação Digital nas empresas de São Borja 23 Graduando do curso de Relações Públicas da Universidade Federal do Pampa - UNIPAMPA; São Borja, Rio
Grande do Sul; henrique.esper@gmail.com. 24 Pós-doutor em Comunicação e Práticas de Consumo e professor na Universidade Federal do Pampa; São Borja,
Rio grande do sul; cristovaoalmeida@gmail.com.
481
diálogo com seus públicos, aproximação e estabelecer processos de fidelização.
Nos últimos anos 20 anos os indivíduos estão adquirindo novos hábitos e formas de
raciocínio, com a presença da internet, intensificaram-se esses processos e de modo dinâmico
auxiliam a era informatizada para que cada indivíduo tenha de forma democrática acesso às
informações disponíveis. Os dispositivos utilizados para acessar a rede mundial de
computadores avançaram, e muito, dentre estas variáveis, estão os incentivos por partes dos
governos e o valor que era pago para adquirir os equipamentos e custear o manuseio. Esta
facilidade no acesso, trouxe consigo novas formas de se comunicar. As organizações se
atentaram a esta disponibilidade de acesso e buscam as oportunidades para garantir resultados
positivos.
Este estudo traz as questões da comunicação organizacional digital no município de São
Borja, com intuito de dar visibilidade às estratégias de comunicação digital das empresas no
Facebook e se estão sendo feitas, auxiliando administradores locais, apresentando dados
consistentes para reflexão.
A abordagem metodológica deste estudo é de cunho qualitativo. Para coletar as
informações utilizamos os seguintes instrumentos: levantamento documental dos
empreendimentos empresariais da cidade. Identificamos 310 empreendimentos comerciais no
município (ACISB, 201525). Realizamos também mapeamento da presença das empresas no
Facebook; entrevistas em profundidade com os administradores, para saber se as empresas de
São Borja estão inseridas na rede social Facebook. Para realizar o tratamento desses dados,
trabalharemos com a análise focada no “grau da conexão de uma rede ego” (RECUERO, 2011,
p. 71) que se traduz em: analisar a popularidade de uma página através de suas conexões com
seus seguidores, por curtidas, comentários dentre outras interações entre os usuários.
Evidencia-se que as redes sociais podem servir como potencialidade de desenvolver o
empreendimento e aproximar os diferentes públicos, quando usadas a partir de estratégias
tomadas para melhor desempenho, e, com isso, o surgimento de novas identidades, nova cultura
organizacional e resultados satisfatórios às organizações.
Transformações da comunicação digital no ambiente empresarial
A inserção das redes sociais na internet causa transformações. Essas mudanças estão sendo
objetos de estudos de diversos autores ao redor do mundo. Castells (2008) diz que a formação
25 Associação Comercial Industrial de Prestação de Serviços e Agropecuária de São Borja.
482
de redes e à flexibilidade: tornam praticamente indistintas as fronteiras de participação e de
envolvimento, individualizam as relações sociais de produção e provocam instabilidade
estrutural do trabalho, do tempo e do espaço. Essas dimensões também recebem atenção de
Santaella (2010) e Terra (2011), como ruptura das variáveis clássicas da comunicação e das
bases materiais da vida (CASTELLS, 2008), possibilitando as mensagens serem registradas por
longos períodos e a presença em lugares onde não se está fisicamente, para além das fronteiras
geográficas.
Ao tratar de estratégia e, conectando com a comunicação digital, é importante ressaltar
que essas informações, com auxílio da tecnologia e profissionais capacitados, compreendendo
e adaptando-se às novas tecnologias vêm para somar a resultados positivos à organização.
Castells (2001, p. 8) observou que:
Essas tecnologias permitem a coordenação de tarefas e a administração da
complexidade. Isso resulta numa combinação sem precedentes de flexibilidade e
desempenho de tarefas, de tomada de decisão coordenada e execução descentralizada,
de expressão individualizada e comunicação global, horizontal, que fornece uma
forma organizacional superior para ação humana.
As tecnologias atualizam-se a cada dia. Dentro das empresas não é diferente, elas
precisam estar sempre se reciclando, renovando, necessitam de tecnologias avançadas para
conseguirem melhor desempenho e produtividade. Com profissionais qualificados,
identificando qual tecnologia é a melhor para exercer a atividade, desta forma, articula com os
preceitos elencados por Castells (2001) principalmente no que diz respeito a flexibilização e os
trabalhos descentralizados.
A comunicação digital se insere nessas dimensões porque traz diversas opções para as
corporações trabalharem diretamente com seus públicos. Dentre elas estão as redes sociais da
internet, web sites, televisão, programas radiofônicos, entre outras. Uma das opções mais
usadas pelos empreendedores são as redes sociais da internet, vêm sendo usadas por empresas
e indivíduos, para auxiliar na divulgação das ações e os empreendimentos, criando uma nova
cultura organizacional. Para Schuler criar uma nova cultura organizacional significa:
Todo processo de mudança organizacional desejado, trazendo novas formas de
organização e de administração, implica, essencialmente, um processo de mudança
cultural. A intervenção cultural é, basicamente, um processo de comunicação, em que
as novas informações e as novas vivências funcionam como força transformadora, que
necessita, contudo, de tempo, de sustentação e de perseverança para se manifestar como
transformação efetiva. (SCHULER, 2009, p. 269)
483
Conectando com o pensamento de Kunsch (2009), as redes sociais estão em constante
evolução e as organizações devem aproveitar as ferramentas para ampliar seu campo de atuação
e obter feedback26, divulgação de seus produtos. Desse modo, cada empresa deve utilizar as
informações para redimensionar ações ou fortalecer as melhores práticas.
Recuero (2011, p. 102) conceitua redes sociais como “espaços utilizados para a
expressão das redes sociais na internet”, ou seja, a autora faz a diferenciação entre redes sociais
mobilizadas pela sociedade civil e aquelas utilizadas pelas pessoas no mundo digital. Nesse
sentido, as redes sociais passaram a ser centrais no relacionamento virtual, usando de sites e
outras plataformas.
Desde os primeiros sites de redes sociais, os brasileiros se destacam pela quantidade de
usuários inseridos. Com tamanha relevância, as ferramentas geram o seguinte questionamento:
como as empresas podem utilizar a comunicação digital e obter resultados satisfatórios?
Esta questão vem sendo desmistificada no dia a dia, pois em um país em que 96% das
empresas têm acesso à internet e 36% das empresas instaladas no país já utilizam as redes
sociais digitais (CETIC, 2013)27, demonstra que muitos administradores não conseguiriam
visualizá-las como uma ferramenta eficaz para seus negócios.
Se, em 2013, mais de 36% dos administradores brasileiros estão nas redes sociais
digitais, entendemos que elas são fundamentais para ampliar seus negócios e promover a
interação com os públicos. Essas informações revelam a importância de estarem inseridas nas
tecnologias atuais. As empresas ao compreenderem esse fator como relevante na promoção da
nova cultura organizacional também podem agir e conquistar resultados, pois, podem passar a
ampliar o uso e apropriar com mais intensidade dessas plataformas.
O contexto das empresas de São Borja
A cidade de São Borja, com mais de 330 anos de história, fundada em 1682, é uma das
cidades mais antigas do Brasil. Está a cerca de 600 quilômetros de distância da Capital do estado
e faz fronteira com a Argentina, cidade de Santo Tomé. É reconhecida como a Terra dos
Presidentes. Pois foi o local de nascimento dos ex-presidentes Getúlio Vargas e João Goulart.
26 Retorno/resposta de determinada ação praticada pela empresa. 27 Centro Regional de Estudos para o Desenvolvimento da Sociedade da Informação (Cetic.br).
484
Além disso, a cidade é conhecida também pelo seu tradicionalismo regional ainda presente em
CTGs (Centro de Tradições Gaúchas), com intensa organização durante a semana farroupilha
e, as marcas da tradição são visto no cotidiano, uma vez que as pessoas usam as vestimentas
gauchescas.
De acordo com a Associação Comercial Industrial de Prestação de Serviços e
Agropecuária de São Borja (ACISB), no município existem 310 empreendimentos em plena
atividade. Interpretaremos a partir das metodologias utilizadas para análise do cenário,
compreendendo como estão sendo utilizadas as tecnologias para comunicação digital das
empresas para os públicos e os impasses que os administradores locais estão desenvolvendo
com a vasta possibilidade de tecnologias comunicacionais disponíveis no mercado.
Tomamos como foco para nosso levantamento os sites de redes sociais. Justificamos a
escolha por se tratar de uma plataforma mais acessada pelo público brasileiro, segundo a
pesquisa brasileira mídia 2015. O estudo realizado, buscou as redes sociais, Facebook,
Whatsapp, Youtube, Instagram, Google+, Twitter, Skype e Linkedin entre outras para
evidenciar qual os brasileiros utilizam mais. As três mais usadas foram Facebook (83%),
Whatsapp (58%) e Youtube (17%). Com este resultado focamos no Facebook para começar as
indagações sobre o uso da comunicação digital pelas empresas de São Borja.
A partir deste levantamento, selecionamos cinco empresas para realizarmos entrevistas
buscando compreender a realidade sobre a inserção delas na rede social digital. Essas
informações são relevantes para entendermos como são elaboradas as estratégias de
comunicação digital a partir do Facebook, ou, no caso das organizações que não fazem o uso,
quais são os motivos para ainda não estarem inseridas.
Após o mapeamento das 310 empresas existentes no município, realizamos buscas nas
redes sociais para verificar a existência das empresas no mundo digital, ao mesmo tempo,
analisamos cada pesquisa para determinar onde cada empresa se encaixaria: usam ou não. A
partir do levantamento foram feitas separações para que pudéssemos identificar três tipos de
“uso” feito pelas empresas, o “Perfil”, destinado a pessoas físicas que procuram
relacionamentos no site, como amizade, namoro, ou seja, qualquer tipo de relacionamento que
o site ofereça. Funciona como uma conta principal da página para em seguida criar uma
“Página”, destinada a agrupar em uma única página todos os usuários que são cadastrados neste
site e que buscam informações sobre ela. Isto é, “Página”, é o lugar ideal para fazer com que a
comunicação digital flua, usando estratégias para trazer resultados positivos para o
485
administrador da página em questão e o último filtro são as empresas que não fizeram um perfil
e também não fizeram uma “página”.
O uso da comunicação digital: informações coletadas a partir das empresas
Ao mapear as organizações obtidas a partir do levantamento documental realizado em
2015, pode-se notar que 49% das empresas não utilizam esta plataforma, 10% utilizam, mas
não tem conhecimento para se inserir a esta plataforma de forma estratégica e 41% estão
inseridas.
Figura 1: Mapeamento 2015
Fonte: Os autores.
Estes dados revelam que grande parte das empresas estão inseridas nas redes sociais,
mas esta inserção está ocorrendo de forma lenta, pois as empresas devem usar as novas
tecnologias de modo a buscar resultados positivos. Sabe-se que os benefícios das redes sociais
para a comunicação digital estão além de criar uma página, mesmo as empresas que estão
inseridas no contexto das redes sociais muitas delas não possuem habilidade para o manuseio,
menos ainda para o monitoramento dessa mídia, podendo ocorrer distorções nas estratégias e
na obtenção de resultados.
Verificamos nas vozes das pessoas que trabalham nos estabelecimentos as necessidades
e também os desafios no uso dessas ferramentas. Conforme a resposta do administrador do
empreendimento, indica que o propósito é estar inserido, muito embora encontra algumas
486
limitações. Ele diz: “Nós fizemos uma página mas não percebemos nenhum resultado vindo
desta página, a partir de um tempo paramos de usar pois, estávamos “perdendo” tempo em
cima de uma coisa que não estava nos trazendo resultados para o tempo investido”.
O administrador percebe que a empresa precisa estar inserida nas redes sociais, a partir
deste momento cria sua conta, mas a deixa em inércia, apenas com os dados da empresa, sem
interagir com o público, sem atualizações diárias, isso cria desinteresse tanto dos públicos
quanto do gestor.
Este exemplo foi abordado, pois, uma quantia considerável de empresas analisadas se
preocupam apenas em entrar na rede, mas não atualizam, não criaram ações, estratégias de
comunicação digital, de forma a trazer benefícios para si. Considerando mais frequente o uso
destas para elaborar técnicas eficazes para atrair resultados, as empresas estão cada vez mais
distantes do cenário que está em ascensão quando se trata de redes sociais na internet para
aprimorar a comunicação digital na empresa.
Outro administrador, percebe a dificuldade que tem em deixar com que um
funcionário monitore a página. Esclarece quando é questionado se a empresa está inserida:
“Ainda não, porque nós estamos com um projeto que está sendo posto em prática por uma
empresa terceirizada, que cuidará de nossa empresa nas redes sociais, pois nos dias de hoje
não podemos mais ficar de fora delas.”
Neste outro exemplo, o gestor sabe das dificuldades que para ele seria ao se inserir nas
redes fazendo com que um de seus funcionários fique responsável no gerenciamento dessa
mídia, mas procura a terceirização para não estar de fora desse contexto.
As práticas exitosas das empresas nas redes sociais
Os sites de redes sociais são apropriações de usuários através de mediações pelo
computador criando “atores” por meio de ações, afim de criar conexões com público alvo,
Recuero (2011, p. 30) define o foco do estudo das redes sociais como:
As conexões em uma rede social são constituídas dos laços sociais, que, por sua vez,
são formados através da interação social entre os atores. De um certo modo, são as
conexões o principal foco do estudo das redes sociais, pois é sua variação que altera as
estruturas desse grupo.
Ou seja, são através das conexões que as redes sociais se alteram e se adaptam as
487
mudanças, podendo ser analisada para compreender a dinâmica sem perder o foco das novas
tecnologias.
As empresas destacadas como exitosas ou não exitosas, serão analisadas a partir do grau
de conexões de suas redes. Para Recuero (2011, p. 71) “quanto maior o grau de conexão, mais
popular e mais central é o nó na rede.” Ou seja, quanto mais seguidores, curtidas, comentários,
compartilhamentos, mais popular é a página. No caso das empresas analisadas, quanto mais
popular a página mais visibilidade para a empresa, tratando com êxito a apropriação das redes
digitais para a comunicação digital da organização.
Figura 2: Exitosas
Fonte: facebook.com
Estas empresas foram classificadas como exitosas pois o número de pessoas que
curtiram a página criada por elas foi relativamente alta para o contexto da cidade, criando um
elevado grau de conexão, se tornando popular na rede, fazendo com que flua a comunicação
digital apropriada pela rede social, dando visibilidade a organização.
Figura 3: Quantidade de curtidas e comentários
488
Fonte: facebook.com
É importante salientar a interatividade para o sucesso nas redes sociais, Recuero (2011,
p. 34) afirma que “a interação no ciberespaço também pode ser compreendida como forma de
conectar pares de atores e de demonstrar que tipo de relação esses atores possuem.” Ou seja,
também determinam o êxito das empresas no sites de redes sociais, pois sabendo utilizar a seu
favor, permite estabelecer aproximação com público, fazendo com que haja confiança,
fidelizando ainda mais o vínculo entre organização e público.
Figura 4: Baixo número de curtidas
Fonte: facebook.com
Nota-se o número relativamente baixo de curtidas para o contexto da cidade, não
demonstram apenas dígitos, este número baixo, demonstra que a apropriação da rede digital
social para aprimorar a comunicação digital não está surtindo efeito. Caso esteja sendo feito
algum tipo de investimento, seja ele de tempo ou dinheiro, ainda não obteve retorno.
A mudança de estratégias é necessária para que o administrador não tenha a
489
compreensão de que as redes sociais não se aplicam a sua empresa, pois não conseguem atingir
o público, também se faz necessária para trazer resultados positivos e não ser mais um
investimento que não obteve retorno, muito pelo contrário, essas novas tecnologias estão
disponíveis para auxiliarem a comunicação digital e permitir uma nova cultura organizacional
nas empresas.
Figura 5: Perfil
Fonte: facebook.com
Este empreendimento é um dos que fazem parte dos 10% das empresas que não possuem
conhecimento para utilizar o site a seu favor, ao invés de criar uma “página”, onde pode ser
visto estatísticas de seu uso para obter resultados favoráveis, verificar qual post teve mais
curtida, quem curtiu a página na semana, ou até mesmo para impulsionar a visibilidade da
empresa. Mas, ao contrário disso, foi criado um perfil para a divulgação, expondo a falta de
conhecimento no uso dessa plataforma, pois esse modelo dificulta o gerenciamento da mídia.
Diante disso, podemos observar o baixo número de empresas que conseguem atingir o
sucesso no uso dos sites de redes sociais na cidade. A falta de conhecimento para a apropriação
das redes sociais na comunicação digital, aumenta o número de empresas utilizando de maneira
inadequada, desfavorecendo a obtenção de resultados positivos.
Olhando por outro lado, verificamos que as ações diárias das empresas que obtém êxito
em suas páginas, fazem o uso com estratégias que favoreçam o posicionamento do
empreendimento frente ao seu público. Isto é, conectando interatividade com visibilidade e, cria
uma nova cultura organizacional, mudando os hábitos e procurando estar atualizado com as
novas tecnologias para oferecer o melhor para seus clientes, buscando estar atento ao mercado.
Com o propósito de identificar as transformações na conjuntura das organizações do
município no intervalo de um ano, foi realizado novamente em 2016 o levantamento
documental com a ACISB e executado o mapeamento das informações coletadas, os resultados
revelam que houve mudanças no contexto das empresas de São Borja no ano de 2016:
490
Figura 6: Mapeamento 2016
Fonte: Os autores.
Dentre o intervalo de tempo entre 2015 e 2016, podemos observar mudanças. No gráfico
de 2015 foi concluído que: 10% das empresas que estavam inseridas na plataforma Facebook
para se apropriar dela como uma ferramenta da comunicação digital não estavam obtendo êxito,
pois não se inseriram como “página”, se inseriram como “perfil”, não utilizando as ferramentas
oferecidas pela plataforma. No ano de 2016 duas mudanças foram notórias: A primeira, queda
no número de organizações que utilizam o modo “perfil” de 10% para 7%. Segunda, se dá pelo
491
aumento de 41% para 44% nas empresas inseridas como “página”, utilizando as ferramentas
oferecidas pela plataforma.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Neste trabalho, procuramos mapear, identificar e analisar as empresas do município de
São Borja com suas apropriações de novas tecnologias para o uso na comunicação digital. A
partir de abordagem qualitativa para notar a eficiência deste novo meio de comunicação frente
ao público externo, com mais interatividade e, com o público interno, a partir de uma nova
cultura organizacional.
Com os resultados dos mapeamentos em 2015 e 2016 e das análises, podemos observar
que muitos administradores dos empreendimentos sabem das dimensões dessas plataformas,
mas não possuem conhecimento para se inserir e usar estrategicamente. Algumas empresas
ainda permanecem com pensamentos conservadores sobre mudar os hábitos comunicacionais e
acabam estagnados ao decidirem não procurar auxílios de novas tecnologias para o seu
crescimento.
Portanto, compreende-se que o cenário da comunicação digital nas empresas do
município é promissor. Essa condição faz com que os empreendimentos se atentem para as
oportunidades que podem surgir através do uso dessas plataformas, especialmente a partir,
interatividade e visibilidade dos empreendimentos, isso, por si só justifica o uso dessa mídia
como geradora de desenvolvimento e também de uma nova cultura organizacional.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Presidência da República. Secretaria de Comunicação Social. Pesquisa brasileira de
mídia 2015: hábitos de consumo de mídia pela população brasileira. Brasília: Secom, 2014.
CASTELLS, Manuel. O poder da identidade. São Paulo: Paz e Terra S/A, 2008.
Pesquisa sobre o uso das tecnologias da informação e comunicação no Brasil [livro eletrônico]
: TIC domicílios e empresas 2013 = Survey on the use of information and communication
technologies in Brazil : ICT households and enterprises 2013/[coordenação executiva e
492
editorial/executive and editorial coordination, Alexandre F. Barbosa ; tradução/translation DB
Comunicação]. -- São Paulo : Comitê Gestor da Internet no Brasil, 2014. Acesso em 5 out.
2015.
RECUERO, Raquel. Redes Sociais na Internet. 2. Ed., Porto Alegre: Sulina, 2011.
SANTAELLA, Lucia e LEMOS, Renata. Redes digitais: a cognição conectiva do Twitter. São
Paulo: Paulus, 2010.
SCHULER, Maria. A cultura organizacional como manifestação da multidimensionalidade
humana. In. KUNSH, Margarida M. Krohling (Org). Comunicação Organizacional:
linguagem, gestão e perspectivas. 2. Ed., São Paulo: Saraiva, 2009.
TERRA, Carolina Frazon. Mídias Sociais... e agora? São Caetano do Sul: Difusão Editora,
2011.
493
PERFIL DOS EGRESSOS DO CURSO DE JORNALISMO DA UNIVERSIDADE FEDERAL DO PAMPA.
André Luiz da Silva Rodrigues28 Leandro R. Comassetto29
RESUMO: Este trabalho consiste em um levantamento feito com os egressos do Curso de
Jornalismo da Universidade Federal do Pampa, Campus São Borja. Realizamos uma pesquisa
do período de maio de 2016, até o presente momento. A partir da pesquisa observamos a
demanda por fomentar práticas empreendedoras ainda na Universidade. Devido à escassez de
trabalho nos grandes meios de comunicação, observasse a necessidade de explorar o jornalista
gestor de seu próprio negócio. “Algumas funções são extintas e há um fortalecimento da figura
do jornalista gestor” (MARTINS, 2017, pg 2). Partindo desta premissa constata-se que o
profissional jornalista precisa está cada vez mais preparado para ter muitas funcionalidades,
dentre ela a gestão de seu próprio negócio.
Palavras-Chaves: Egressos Jornalismo, Empreendorismo em comunicação, Jornalismo
Empreendedor.
METODOLOGIA
A partir das discussões do grupo de pesquisa “Empreenderismo em Comunicação”,
traçamos mapear e levantar dados sobre os egressos do curso de Jornalismo da Universidade
Federal do Pampa(Unipampa), após dez anos de criação do mesmo. A partir desta inquietação
elaboramos um questionário com dez questões para observar dados relevantes sobre o perfil
destes profissionais formados pela Unipampa. Para realizar esta pesquisa utilizamos o “Google
Forms” 1 , para entrar em contato com os mesmo utilizamos os seguintes recursos. Telefone
institucional, rede sociais e e-mail’s. Do total de 173 formandos até o ano de 2016, obtivemos
a resposta de 96. A metodologia que utilizamos foi a qualitativa, para ter uma ampla análise do
perfil destes profissionais formados pela instituição pesquisada. Observando o cenário
empreendedor vigente na atualidade da comunicação observamos que “A profissão de jornalista
tem apresentado significativas mudanças nas últimas duas décadas devido à introdução de
novas tecnologias e ao redesenho da organização produtiva ocorrida no mundo do trabalho,
mudanças que estão associadas, em nível mais amplo, ao processo de
reestruturação”(OLIVEIRA, 2015). A partir desta ótica empreendedora queremos observar
28Acadêmico do curso de jornalismo da Universidade Federal do Pampa. Bolsista do grupo de pesquisa
“Empreendedorismo em Comunicação”, E-mail: andrerodrigues.jor@gmail.com 29 Líder do Grupo de Pesquisa: Empreendedorismo em Comunicação.
494
quantos egressos tenderam para o empreendedorismo na comunicação, e no jornalismo. Quais
têm a prospecção de empreender e qual a função do curso de jornalismo neste processo.
RESULTADOS e DISCUSSÃO
A partir da realização desta pesquisa observamos a importância de incentivar ainda na
Universidade os graduandos a buscarem práticas empreendedoras. Observando a atualidade do
mercado de trabalho, o jornalismo também passa por adaptações. O jornalista para garantir seu
lugar no mercado atual, precisa ter o perfil empreendedor, pois só “O empreendedor sabe fixar
metas e alcançá-las. Luta contra padrões impostos. Diferencia-se. Tem a capacidade de ocupar
um espaço não ocupado por outros no mercado, descobrir nichos”. (DOLABELA, 2004, p. 37).
A primeira questão levantada foi apontar o que os acadêmicos estão fazendo profissionalmente
na atualidade. Dos 96 alunos que completaram nosso questionário apenas 41,7% está atuando
na área.
Pesquisa realizada com egressos do curso de Jornalismo da Universidade Federal do Pampa do período de
maio de 2017, até 10 de setembro de 2017.
Observando este quadro, percebe-se que está cada vez mais difícil o profissional jornalista
ter empregabilidade. Conforme o artigo do “Observatório de Imprensa”, feito com base no
levantamento do “Portal Comunique-se” no ano de 2015, 1400 jornalista foram demitidos dos
grandes veículos nacionais. Tal cenário de reproduz aos egressos da Unipampa. Pois mesmo
com a qualificação acadêmica ainda não conseguem uma boa inserção no mercado de trabalho.
Os egressos que consideram a média salarial da categoria, baixa, como aponta o resultado das
respostas levantadas com os ex-alunos.
495
60,2% dos egressos do curso de jornalismo destaca como “ruim” a média salarial dos jornalistas.
A partir desta perspectiva constata-se a relevância de ter mais envolvimento com as
iniciativas empreendedoras dentro da graduação. Tendo este contato ainda na Universidade,
possibilita que a inovação seja uma premissa que a academia incentive seus graduandos a
desenvolver.
“O jornalista profissional terá que ser também um empreendedor, ou seja, ter a
capacidade de gerenciar seu trabalho de forma independente sempre de olho no
equilíbrio entre receitas e despesas. Parece simples, mas não é, pois tanto os mais
velhos como os recém graduados foram formados para trabalhar em empresas, como
assalariados (Castilho, 2011).”
Este cenário de baixos salários, e a falta de empregos em grandes veículos, gera nos
profissionais pesquisados o interesse em criar seu próprio negócio e empreender na área da
comunicação. Conforme as 93 respostas levantadas entre os 96 ex-alunos do curso de
Jornalismo, 65,6% tem interesse em empreender.
93 respostas com os egressos. 65,6% esclarece que quer empreender.
496
Conforme estes dados levantados observamos a importância de incentivar e valorizar o
empreendedorismo, dando um viés inovador para o curso de jornalismo da Universidade
Federal do Pampa.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Partindo do que foi apresentado, nossa pesquisa mostra que ainda precisa haver mais
incentivo aos alunos de comunicação a buscar empreender. Observando o que acontece no
mercado atual, se faz necessário buscar outras maneiras de conseguir se manter como jornalista.
REFERÊNCIAS
CASTILHO, Carlos. Empreendedorismo jornalístico através de blogs. 24 mai. 2011.
Observatório da Imprensa. [acesso em 27 set 2017] Disponível em:
http://observatoriodaimprensa.com.br/codigo-aberto/empreendedorismo-jornalisticoatraves-
de-blogs/
DOLABELA, Fernando. O Segredo de Luísa. 1.ed. São Paulo: Cultura, 2004. BORGES,
Zulcy, 1.400 jornalistas demitidos em 2015 in Observatório de Imprensa, 09/01/2016 na edição
884. [acesso em 27 set 2017] Disponível em: http://observatoriodaimprensa.com.br/imprensa-
em-questao/1-400-jornalistasdemitidos-em-2015/
MARTINS, Cássia. Atitude empreendedora e novos paradigmas de trabalho no
jornalismo: uma análise a partir do LinkedIn Pulse. XL CONGRESSO BRASILEIRO DE
CIÊNCIAS DA COMUNICAÇÃO - INTERCOM, 40, 2017, Curitiba. São Paulo: Intercom,
2017. [acesso em 27 set 2017] Disponível em:
http://portalintercom.org.br/anais/nacional2017/resumos/R12-2742-1.pdf
OLIVEIRA, M. R; GROHMANN, R. O jornalista empreendedor: uma reflexão inicial sobre
jornalismo, flexibilização do trabalho e os sentidos do empreendedorismo no campo
profissional. Líbero – São Paulo – v. 18, n. 35, p. 123- 132, jan./jun. de 2015. [acesso em 27
set 2017]. Disponível em: http://seer.casperlibero.edu.br/index.php/libero/article/view/79/57
497
PERFIL DOS EGRESSOS DO CURSO DE JORNALISMO DA UNIVERSIDADE
FEDERAL DO PAMPA.
André Luiz da Silva Rodrigues30 Leandro R. Comassetto31
RESUMO: Este trabalho consiste em um levantamento feito com os egressos do Curso de
Jornalismo da Universidade Federal do Pampa, Campus São Borja. Realizamos uma pesquisa
do período de maio de 2016, até o presente momento. A partir da pesquisa observamos a
demanda por fomentar práticas empreendedoras ainda na Universidade. Devido à escassez de
trabalho nos grandes meios de comunicação, observasse a necessidade de explorar o jornalista
gestor de seu próprio negócio. “Algumas funções são extintas e há um fortalecimento da figura
do jornalista gestor” (MARTINS, 2017, pg 2). Partindo desta premissa constata-se que o
profissional jornalista precisa está cada vez mais preparado para ter muitas funcionalidades,
dentre ela a gestão de seu próprio negócio.
Palavras-Chaves: Egressos Jornalismo, Empreendorismo em comunicação, Jornalismo
Empreendedor.
METODOLOGIA
A partir das discussões do grupo de pesquisa “Empreenderismo em Comunicação”,
traçamos mapear e levantar dados sobre os egressos do curso de Jornalismo da Universidade
Federal do Pampa(Unipampa), após dez anos de criação do mesmo. A partir desta inquietação
elaboramos um questionário com dez questões para observar dados relevantes sobre o perfil
destes profissionais formados pela Unipampa. Para realizar esta pesquisa utilizamos o “Google
Forms” 1 , para entrar em contato com os mesmo utilizamos os seguintes recursos. Telefone
institucional, rede sociais e e-mail’s. Do total de 173 formandos até o ano de 2016, obtivemos
a resposta de 96. A metodologia que utilizamos foi a qualitativa, para ter uma ampla análise do
30Acadêmico do curso de jornalismo da Universidade Federal do Pampa. Bolsista do grupo de pesquisa
“Empreendedorismo em Comunicação”, E-mail: andrerodrigues.jor@gmail.com 31 Líder do Grupo de Pesquisa: Empreendedorismo em Comunicação.
498
perfil destes profissionais formados pela instituição pesquisada. Observando o cenário
empreendedor vigente na atualidade da comunicação observamos que “A profissão de jornalista
tem apresentado significativas mudanças nas últimas duas décadas devido à introdução de
novas tecnologias e ao redesenho da organização produtiva ocorrida no mundo do trabalho,
mudanças que estão associadas, em nível mais amplo, ao processo de reestruturação”
(OLIVEIRA, 2015). A partir desta ótica empreendedora queremos observar quantos egressos
tenderam para o empreendedorismo na comunicação, e no jornalismo. Quais têm a prospecção
de empreender e qual a função do curso de jornalismo neste processo.
RESULTADOS E DISCUSSÃO
A partir da realização desta pesquisa observamos a importância de incentivar ainda na
Universidade os graduandos a buscarem práticas empreendedoras. Observando a atualidade do
mercado de trabalho, o jornalismo também passa por adaptações. O jornalista para garantir seu
lugar no mercado atual, precisa ter o perfil empreendedor, pois só “O empreendedor sabe fixar
metas e alcançá-las. Luta contra padrões impostos. Diferencia-se. Tem a capacidade de ocupar
um espaço não ocupado por outros no mercado, descobrir nichos”. (DOLABELA, 2004, p. 37).
A primeira questão levantada foi apontar o que os acadêmicos estão fazendo profissionalmente
na atualidade. Dos 96 alunos que completaram nosso questionário apenas 41,7% está atuando
na área.
Pesquisa realizada com egressos do curso de Jornalismo da Universidade Federal do Pampa do período de
maio de 2017, até 10 de setembro de 2017.
Observando este quadro, percebe-se que está cada vez mais difícil o profissional jornalista
ter empregabilidade. Conforme o artigo do “Observatório de Imprensa”, feito com base no
levantamento do “Portal Comunique-se” no ano de 2015, 1400 jornalista foram demitidos dos
grandes veículos nacionais. Tal cenário de reproduz aos egressos da Unipampa. Pois mesmo
499
com a qualificação acadêmica ainda não conseguem uma boa inserção no mercado de trabalho.
Os egressos que consideram a média salarial da categoria, baixa, como aponta o resultado das
respostas levantadas com os ex-alunos.
60,2% dos egressos do curso de jornalismo destaca como “ruim” a média salarial dos jornalistas.
A partir desta perspectiva constata-se a relevância de ter mais envolvimento com as
iniciativas empreendedoras dentro da graduação. Tendo este contato ainda na Universidade,
possibilita que a inovação seja uma premissa que a academia incentive seus graduandos a
desenvolver.
“O jornalista profissional terá que ser também um empreendedor, ou seja, ter a
capacidade de gerenciar seu trabalho de forma independente sempre de olho no
equilíbrio entre receitas e despesas. Parece simples, mas não é, pois tanto os mais
velhos como os recém graduados foram formados para trabalhar em empresas, como
assalariados (Castilho, 2011).”
Este cenário de baixos salários, e a falta de empregos em grandes veículos, gera nos
profissionais pesquisados o interesse em criar seu próprio negócio e empreender na área da
comunicação. Conforme as 93 respostas levantadas entre os 96 ex-alunos do curso de
Jornalismo, 65,6% tem interesse em empreender.
500
93 respostas com os egressos. 65,6% esclarece que quer empreender.
Conforme estes dados levantados observamos a importância de incentivar e valorizar o
empreendedorismo, dando um viés inovador para o curso de jornalismo da Universidade
Federal do Pampa.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Partindo do que foi apresentado, nossa pesquisa mostra que ainda precisa haver mais
incentivo aos alunos de comunicação a buscar empreender. Observando o que acontece no
mercado atual, se faz necessário buscar outras maneiras de conseguir se manter como jornalista.
REFERÊNCIAS
CASTILHO, Carlos. Empreendedorismo jornalístico através de blogs. 24 mai. 2011.
Observatório da Imprensa. [acesso em 27 set 2017] Disponível em:
http://observatoriodaimprensa.com.br/codigo-aberto/empreendedorismo-jornalisticoatraves-
de-blogs/
DOLABELA, Fernando. O Segredo de Luísa. 1.ed. São Paulo: Cultura, 2004. BORGES,
Zulcy, 1.400 jornalistas demitidos em 2015 in Observatório de Imprensa, 09/01/2016 na edição
884. [acesso em 27 set 2017] Disponível em: http://observatoriodaimprensa.com.br/imprensa-
em-questao/1-400-jornalistasdemitidos-em-2015/
MARTINS, Cássia. Atitude empreendedora e novos paradigmas de trabalho no
jornalismo: uma análise a partir do LinkedIn Pulse. XL CONGRESSO BRASILEIRO DE
CIÊNCIAS DA COMUNICAÇÃO - INTERCOM, 40, 2017, Curitiba. São Paulo: Intercom,
2017. [acesso em 27 set 2017] Disponível em:
http://portalintercom.org.br/anais/nacional2017/resumos/R12-2742-1.pdf
501
OLIVEIRA, M. R; GROHMANN, R. O jornalista empreendedor: uma reflexão inicial sobre
jornalismo, flexibilização do trabalho e os sentidos do empreendedorismo no campo
profissional. Líbero – São Paulo – v. 18, n. 35, p. 123- 132, jan./jun. de 2015. [acesso em 27
set 2017]. Disponível em: http://seer.casperlibero.edu.br/index.php/libero/article/view/79/57
502
AS RÁDIOS COMUNITÁRIAS COMO UM MECANISMO PARA PROMOÇÃO DE
INFORMAÇÃO NA ÁREA DOS DIREITOS SOCIAIS
Jéssica Degrandi Soares32,
Rosa Maria Castilhos Fernandes33,
RESUMO: Este artigo apresenta parte da revisão bibliográfica realizada no processo de
pesquisa qualitativa intitulada “O Papel das Rádios Comunitárias na Promoção de Informações
sobre Direitos Sociais”, que tem como objetivo geral compreender de que maneira as rádios
comunitárias promovem programas radiofônicos sobre as políticas sociais, visando o acesso à
informação sobre os direitos sociais aos/as ouvintes de municípios do Rio Grande do Sul.
Propõe-se discutir o lugar das rádios comunitárias dentro do sistema de radiodifusão no Brasil,
entendendo que estas se dispõem a oferecer às comunidades conteúdos de cunho cultural e
educativo, pois a comunicação mesmo sendo um bem público no cenário brasileiro se constitui
a partir da condição da lógica privada que vem reforçando a produção e reprodução do capital.
No cenário de luta pela garantia de direitos sociais em meio à conjuntura política e econômica
de cortes de gastos que incidem diretamente na vida dos/as trabalhadores/as, apresentam um
processo contínuo de disputa pela efetivação dos direitos sociais, as reivindicações da classe
trabalhadora e a necessidade da democratização da comunicação no país. Neste texto
evidenciamos as principais categorias analíticas que é resultado da revisão bibliográfica
realizada neste estudo, quais sejam: Poder midiático, rádios comunitárias, política social e
direitos sociais. Sendo assim as categorias revisadas se constituem em importantes subsídios
teóricos que iluminarão o estudo sobre as rádios comunitárias, em parte socializado neste
trabalho.
Palavras-Chaves: Poder midiático, rádio comunitária, direitos sociais, direito à informação,
políticas sociais.
INTRODUÇÃO
O presente artigo emerge da pesquisa bibliográfica realizada no processo de construção
do projeto de pesquisa de mestrado intitulado “O Papel das Rádios Comunitárias na Promoção
de Informação sobre Direitos Sociais” no Programa de Pós-graduação em Política Social e
32 Mestranda do Programa de Pós-graduação em Política Social e Serviço Social; Universidade Federal do Rio
Grande do Sul; Porto Alegre; Rio Grande do Sul; jessicadegrandi.soares@gmail.com; 33 Orientadora; Professora Doutora, do Programa de Pós-graduação em Política Social e Serviço Social;
Universidade Federal do Rio Grande do Sul; Porto Alegre; Rio Grande do Sul; rmariacf@uol.com.br
503
Serviço Social da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Esta abordagem surge da
necessidade de compreender de que maneira as rádios comunitárias promovem programas
radiofônicos sobre as políticas sociais, visando o acesso à informação sobre os direitos sociais
aos/as ouvintes de municípios do Rio Grande do Sul, e nesta problematização dos meios de
comunicação presentes na sociedade capitalista contemporânea e que vem reforçando a
produção e reprodução do capital que definem os modos de vida da classe trabalhadora
brasileira.
O cenário brasileiro atual, requer a luta pela garantia de direitos sociais em meio à
conjuntura política e econômica de cortes de gastos que incidem diretamente na vida dos
trabalhadores, como é o caso Emenda Constitucional 95, que limita por 20 anos os gastos
públicos, as reformas trabalhistas em andamento, além de outras situações que corroboram com
os ideários neoliberais. Tal contexto evidencia as práticas conservadoras, colocando a
sociabilidade burguesa na ordem vigente. Por outro lado, evidenciam-se as reivindicações da
classe trabalhadora em movimentos sociais que reivindicam direitos trabalhistas, de saúde,
assistência social, educação, previdência social, habitação, entre outros, estão presentes neste
contexto de lutas sociais, mas que não encontram eco nos espaços dominantes da mídia
brasileira, negligenciando os processos pela democratização da comunicação no país.
Pensar a comunicação nos meios midiáticos é uma tarefa que ganha espaços diferenciados
ao longo do tempo, a exemplo disso é o Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação
(FNDC), um movimento social nascido na década de 1980, e que foi um dos principais coletivos
que impulsionaram o artigo V da Constituição Federal de 1988, que trata sobre a comunicação
social no Brasil, enquanto um direito de todos os/as cidadãos/ãs, e que desenvolveu o projeto
de lei que regulamenta a concessão dos meios de comunicação no Brasil, até hoje não aprovada.
Ao considerarmos a mídia na sociedade contemporânea compreendemos os interesses
hegemônicos do capital, pois “os meios de comunicação integram conglomerados econômicos
nacionais e multinacionais” Salles (2011, p. 46), ou seja, oligopólios. Marinoni (2015) retrata
de maneira clara a realidade das emissoras privadas com concessão pública no Brasil, onde ele
já inicia com a defesa de que a comunicação social no Brasil é um bem público, mas que está
subordinada e diretamente ligada “à hipertrofia da lógica privada no setor de radiodifusão”
(2015, p. 01).
O que podemos concluir da condição histórica do oligopólio no Brasil e dos altos
investimentos no setor das emissoras privadas, é que o próprio Estado se apresenta muito
504
pacífico e até mesmo condizente com essa trajetória, e “assim, o Estado alimenta, não só
política, mas também economicamente a concentração” (MARINONI, 2015, p.12).
Sabemos que a existência dos meios de comunicação, são fundamentais para a
democracia de qualquer Nação, mas no Brasil a reforma do sistema de comunicação é
emergente. Recentemente uma reportagem no Le Monde Diplomatique aborda os 4 problemas
graves na condição das mídias e suas concessões, tais como: 1. O quase monopólio da televisão
aberta; 2. A concentração de poder dos políticos que detém concessões de televisão e rádio; 3.
A desigualdade no acesso à internet; 4. As ameaças à liberdade e à garantia de direitos na rede
(BRANT, 2013). Também, Brant (2013) considera a estruturação da comunicação no Brasil
que historicamente objetivou o fortalecimento das redes nacionais, e resultando assim no grande
poder adquirido pelas emissoras tradicionais na ditatura militar até a atualidade.
A realidade da mídia no Brasil se relaciona diretamente com os interesses do capital,
como refere Figueiredo (2011), pois, “a comunicação é, sem dúvida, uma das importantes
características da modernidade e vem evoluindo em estreita relação dialética, e não mecânica,
com as relações sociais”. (FIGUEIREDO, 2011 p.324). Isto pode ser visto como uma espécie
de “revolução multimídia” que acaba valorizando o capital, “impulsionado pelas privatizações
e desregulamentações” (FIGUEIREDO, 2011 p.324).
Ao apresentar a condição dos meios de comunicação no Brasil, nos desafiamos a entender
e conhecer um dos meios que se apresentam dentro das mídias alternativas, que em tese devem
fazer o movimento contrário das mídias hegemônicas acima citadas, e é dentro dessa relação
que nos desafiamos a pesquisar as rádios comunitárias. Ao acessarmos os Dados do Setor de
Comunicações34 do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações,
identificamos que entre janeiro de 2016 e junho de 2017 existem 4.775 rádios comunitárias
outorgadas no Brasil, onde 414 pertencem à região do Rio Grande do Sul, totalizando 8,7% das
rádios comunitárias do Brasil.
As rádios comunitárias vivem uma realidade de criminalização no Brasil onde: “[...] há
uma luta ferrenha contra as rádios comunitárias. São reprimidas de todas as maneiras e é
extremamente difícil conseguir sua aprovação” (GUARESCHI, 2017, p.174). Para o autor as
rádios comunitárias são uma ferramenta de crítica ao que está posto pelos meios de
comunicação tradicionais, é um mecanismo que pode ser utilizado para avaliar e criticar as
informações passadas pela televisão e o rádio comercial.
34 Acessado através do link: http://sistema.mc.gov.br/DSCOM/view/Informacoes.php
505
Assim sendo, é importante frisar que a rádio comunitária desempenha “um papel essencial
na construção da informação e do debate nas comunidades em que atuam. Comunidades rurais,
indígenas e periféricas, muitas vezes marginalizadas” (trecho de entrevista com o locutor da
rádio Coité FM35 à Carta Capital, 2016).
Nessa perspectiva começamos a construir o cenário da comunicação pública no Brasil,
que dentre as relações sociais se expressa a condição de poder aliado ao capital, onde as grandes
redes de emissoras ditarão a trajetória dos meios de comunicação e o não acesso à informação
através de meios alternativos, acarretando na criminalização da comunicação comunitária como
é o exemplo apresentado acima, e no livre espaço para as indústrias da comunicação.
A proposta do presente trabalho tem sua relevância para o Serviço Social assim como
para as políticas sociais, uma vez que direciona a análise sobre as rádios comunitárias, no
sentido de identificar se as mesmas cumprem com seu papel social como mecanismos de
comunicação importantes para a efetivação da cidadania em suas comunidades. Cabe a essa
pesquisa analisar de forma crítica a maneira como as rádios comunitárias no estado do Rio
Grande do Sul promovem programas radiofônicos informativos sobre políticas sociais para a
potencialização dos direitos de cidadania.
Para tanto, além desta introdução que justifica a relevância do estudo sobre a temática,
organizamos este texto trazendo a metodologia de pesquisa e na sequência as principias
reflexões teóricas que emergiram da revisão realizada sobre as categorias analíticas já
anunciadas neste texto. Por fim, tecemos uma breve consideração final diante o processo
vivenciado até aqui.
METODOLOGIA
Este texto é parte do projeto de pesquisa de mestrado que viemos desenvolvendo
intitulado “O Papel das Rádios Comunitárias na Promoção de Informações sobre Direitos
Sociais”. Trata-se de uma pesquisa de natureza qualitativa que tem como caminho
metodológico a realização de : uma pesquisa documental para identificação das rádios com o
objetivo de conhecer as existentes no Rio Grande do Sul; A aplicação de um questionário online
para as rádios mapeadas, com perguntas abertas e fechadas para verificação das que possuem
35 “Píter Júnior, ex-radialista da Rádio Coité FM, foi condenado à pena de dois anos de detenção, convertidos em
serviços sociais” Disponível em: https://www.cartacapital.com.br/sociedade/radios-comunitarias-eterna-luta-
contra-a-burocracia-e-a-justica
506
programas que abordem temas como direitos sociais e políticas sociais; E por último
selecionaremos intencionalmente 4 rádios que participaram do questionário, onde estas
afirmaram possuir programas que tratem sobre os temas citados acima. O tratamento e análise
das informações ocorrerá por meio da análise de discurso com base em Pêcheux (2014).
Entretanto o que nos interessa salientar sobre o processo metodológico é que uma vez definido
o objeto de estudo parte-se para a revisão bibliográfica que nos dá subsídios para percorrer esta
caminhada.
Assim sendo a revisão realizada com base em diferentes autores tratou das respectivas
categorias, quais sejam: Poder midiático (MARINONI, 2015; SALLES, 2011; FIGUEIREDO,
2011), rádios comunitárias (PERUZZO, 2001; GUARESCHI, 2017), política social
(BEHRING, E & BOSCHETTI, 2007; PEREIRA, 2016), direitos sociais e direito à informação
(CFESS, 2012; RUIZ, 2011), entre outros autores. O processo de pesquisa não se estanca nesta
primeira produção, pois a partir da perspectiva defendida, da realidade dialética se buscará
fortalecer cada vez mais o debate e o elo que liga as rádios comunitárias, os direitos sociais e
as políticas sociais.
RESULTADO E DISCUSSÃO
Iniciamos a discussão sobre o conceito de política social pontuando que essa dinâmica na
qual este tema está inserido é cambial, contraditório e regado por correlações que forças no
âmbito político, econômico e social dos Estados. A política social historicamente se situa em
um campo diverso, onde múltiplos aspectos nos apresentaram um campo hostil e de construções
frágeis, que se configura em um tema de constante luta e disputa, fortemente atrelada às
condições e posicionamentos dos projetos societários, de um lado de quem defende a política
social como um direito universal e de outro de quem a coloca como um privilégio, benefício
mínimo que estará diretamente atrelada às movimentações do mercado.
Para a discussão sobre as políticas sociais, utilizaremos autores que trabalham na
perspectiva do materialismo histórico, como Behring e Boschetti (2007) que entendem que:
Na perspectiva, o estudo das políticas sociais deve considerar sua múltipla
causalidade, as conexões internas, as relações entre suas diversas manifestações e
dimensões. Do ponto de vista histórico, é preciso relacionar o surgimento da política
social às expressões da questão social que possuem papel determinante em sua origem
(e que, dialeticamente, também sofrem efeitos da política social). Do ponto de vista
econômico, faz-se necessário estabelecer relações da política social com as questões
507
estruturais da economia e seus efeitos para as condições de produção e reprodução da
vida da classe trabalhadora. (2007, p. 43)
Ou seja, entendemos que a política social é um resultado das expressões da questão social,
que a partir de uma demanda surge a necessidade de se pensar ações como o caso da política
social, porém como Behring e Bosquetti (2007) referem, a maneira como esta será construída
a partir de um “caráter histórico-estrutural” (2007, p.43) e que seu direcionamento está
diretamente ligado às relações sociais e a organização das classes sociais.
A discussão sobre o conceito de política social apresenta que a dinâmica na qual este tema
está inserido é cambial, contraditório e regado por correlações que forças no âmbito político,
econômico e social dos Estados. Ao trazer o processo histórico da política social para o Brasil,
essa discussão se insere em um campo diverso, onde múltiplos aspectos apresentam um campo
hostil e de construções frágeis, que se configura em um tema de constante luta e disputa,
fortemente atrelada às condições e posicionamentos dos projetos societários vigentes. Na arena
de disputas pelos direitos sociais visualiza-se de um lado, a defesa da política social como um
direito universal e de outro de quem a coloca como um privilégio, benefício mínimo que estará
diretamente atrelada às movimentações do mercado.
Pereira (2016) defende que a política social é um tema polissêmico e interdisciplinar que
está diretamente ligada ao Estado, que “diferencia-se da política econômica por visar à coesão
social e à melhoria das condições de vida de indivíduos e grupos” (PEREIRA, 2016, p.204).
Ao mesmo tempo a autora (2016) defende que esta é uma política de todos, da sociedade e do
Estado, ela é uma política pública que necessita de vigia, questionamento, sendo forjada na
tensão entre os interesses que a permeiam, no contexto contraditório e histórico, as políticas
sociais e o que cada uma defende é resultado da totalidade dessa relação.
Behring (2008) ao falar sobre política social traz primeiramente a conjuntura do Estado
nesse processo, ao apresentar aspectos adotados tanto pelo Estado liberal quanto pelo Estado
Social. Em ambos existe o reconhecimento da necessidade de se pensar no social através de
políticas sociais e que, no contexto liberal, os fundamentos do capitalismo irão permanecer e
prevalecer.
A partir desta construção entende-se que o direito à informação se constitui enquanto um
direito social, primordial e referido nas diversas leis que regulamentam as políticas sociais,
como é o caso da seguridade social. Nesta perspectiva entende-se que democratizar informações
é crucial para se pensar a democratização da comunicação, além de ser parte estratégica dos
508
processos de trabalho e da construção de uma consciência crítica, onde através do debate com
a população usuária trabalhadores podem articular questões importantes na garantia de direitos
dentro das políticas sociais.
Para exemplificar no âmbito da Seguridade Social, como é apresentado o direito à
informação, trouxemos alguns trechos das legislações que tratam sobre esses aspectos, onde: A
previdência social que foi a primeira a ser regulamentada refere em seu texto: “Elaborar e
manter, devidamente atualizados, os estudos, informações técnicas e outros elementos relativos
à administração da previdência social, divulgando-os para conhecimento geral” (BRASIL,
1960). A política de saúde do Brasil, a qual é a única política universal defende: “Divulgação
de informações quanto ao potencial dos serviços de saúde e a sua utilização pelo usuário” e
“Art. 47. O Ministério da Saúde, em articulação com os níveis estaduais e municipais do
Sistema Único de Saúde (SUS), organizará, no prazo de dois anos, um sistema nacional de
informações em saúde, integrado em todo o território nacional, abrangendo questões
epidemiológicas e de prestação de serviços” (BRASIL, 1990). E a assistência social preconiza:
“Direito à informação, enquanto direito primário do cidadão, sobretudo àqueles com vivência
de barreiras culturais, de leitura, de limitações físicas” (BRASIL, 2005).
Ao mesmo tempo que as políticas sociais pontuam sobre o direito à informação,
categorias profissionais também preconizam sobre este, onde a partir do código de ética do/a
assistente social, categoria profissional que trabalha diretamente com as políticas sociais e a
garantia de direitos sociais aos/às usuários/as, se defende que:
Art. 5º São deveres do/a assistente social nas suas relações com os/as usuários/as: [...]
c- democratizar as informações e o acesso aos programas disponíveis no espaço
institucional, como um dos mecanismos indispensáveis à participação dos/as
usuários/as; (CFESS, 2012).
Para referir sobre as potencialidades que se pretende alcançar diante da garantia de um
direito como à informação e também a comunicação, pensamos que uma das questões está em
construirmos estratégias para rompermos com os discursos neoliberais tão presentes na mídia
nacional e internacional. Para Ruiz o grande desafio está em abrir:
[...] perspectivas para que os movimentos sociais, os partidos políticos e demais
organizações da sociedade possam divulgar suas teses, ideias e proposições para a
concretização de todos os direitos humanos historicamente demandados pelas lutas
dos trabalhadores, inclusive a comunicação, em uma sociedade justa e democrática.
(RUIZ, 2011, p. 99)
509
Além disto, o autor refere o quanto cabe ao Serviço Social se debruçar sobre a
compreensão “do direito à comunicação com suas estratégias [...]. [...] buscando ainda que neste
espaço contraditório e adverso conjunturalmente –, fortalecer a visão do assistente social como
profissional que atua para viabilizar acesso aos direitos, aprimorando as políticas e ações
desenvolvidas neste sentido.” (RUIZ, 2011, p.99)
O que Ruiz (2011) propõe é um compromisso de uma categoria de trabalhadores que
lutam por sua classe, vislumbrando a defesa pela democratização da comunicação para além de
uma postura profissional, entendendo o papel fundamental dos meios de comunicação na
realidade social, por isto consideramos fundamental o trato teórico sobre o poder midiático e a
relevância das rádios comunitárias como instrumento contra hegemônico.
O Poder midiático, enquanto uma das categorias abordadas nesta produção, pode ser
compreendida a partir de alguns exemplos, como é o caso da Pesquisa Brasileira de Mídia
(2016), onde é demonstrado que todas as pessoas que responderam à pesquisa utilizam um ou
mais dos seguintes meios de comunicação: Televisão (89%), internet (49%), rádio (30%), jornal
(12%), revista (1%) e outros (2%).
Ao pensar que as empresas que produzem as matérias fazem parte do oligopólio da
comunicação brasileira e são em grande parte financiadas pelo capital internacional, devemos
pensar que estas ao passarem uma mensagem têm intencionalidades de manutenção, produção
e reprodução do capital, sustentando e retroalimentando o sistema capitalista.
Cabe destacar que a trajetória da mídia no mundo e no Brasil é dividida em muitas
questões, desde o processo de pensar uma comunicação com viés educacional, cultural e
político, até um viés vinculado ao comercial, funcionalista e manipulador. Pensar os meios de
comunicação é também compreender quem são os donos destes, que no caso do Brasil são
principalmente grandes empresas que constituem o oligopólio dos meios de comunicação. O
lugar que as grandes redes de emissoras de radiodifusão ocupam é extremamente favorável ao
acumulo de capital e também a manipulação do pensamento daqueles que consomem desse
conteúdo.
Neste sentido, buscamos analisar os fenômenos que envolvem o tema de pesquisa
proposto, a partir da teoria marxista, onde nos desafiamos a compreender o movimento dialético
que envolve as categorias, e nesse processo alcançar a centralidade da luta de classes na
realidade social, nos apresentando assim, que o direito à comunicação está em constante
510
disputa, e que cabe à classe trabalhadora enfrentar a classe dominante que se apropria dos meios
de comunicação.
Na condição de abordarmos as mídias alternativas, daremos ênfase às rádios
comunitárias, estas enquanto instrumentos contra hegemônicos, ou seja, que cursam uma
trajetória na contramão do ideário capitalista. A hegemonia neste contexto, “pressupõe a
conquista do consenso e da liderança cultural e político-ideológica de uma classe ou bloco de
classes sobre as outras. [...]tem a ver com entrechoques de percepções, juízos de valor e
princípios entre sujeitos da ação política” (MORAES, 2010, p. 01).
O que se compreende a partir da mídia hegemônica é que esta reforça seus princípios
através de sua programação, direcionando e pautando os temas que a sociedade em geral
discute. No momento em que pensamos a rádio comunitária como uma mídia alternativa, como
um instrumento de resistência nesse processo, defende-se que as temáticas abarcadas por esse
meio contra hegemônico trataram de narrativas na realidade das comunidades, dos movimentos
sociais e das características dos territórios onde as rádios se encontram, fortalecendo a condição
da regionalização e trabalhando com a identidade daqueles que se expressam através do rádio,
e também daqueles que se identificam com a programação.
Um dos objetivos desta pesquisa onde se busca “desvendar os aspectos que potencializam
os direitos sociais nos territórios em que as rádios comunitárias operam contribuindo com esta
reflexão no âmbito das políticas sociais”. Na relação entre a rádio comunitária e o debate sobre
as políticas sociais buscamos afinar a teoria entre estas duas categorias, na perspectiva de pensar
o quanto a rádio comunitária pode fortalecer e elucidar sobre essa temática, dando ênfase aos
direitos sociais e de cidadania, trazendo informações e discussões que muito envolvem a vida
cotidiana da classe trabalhadora.
É possível observar que a legislação sobre essas políticas do campo da seguridade social
brasileira preconizam o direito à informação como primordial para o funcionamento das
políticas sociais, porém o nossa intensão é ainda maior, é mostrar que para além da informação
tanto para usuários/as e trabalhadores/as, é importante que se discuta esse processo, que os
sujeitos participem da construção da política social, e é por isso que pensamos que as rádios
comunitárias em sua teoria e defesa são instrumentos estratégicos em suas comunidades para
essa efetivação.
CONCLUSÕES
511
Na trajetória da pesquisa bibliográfica se evidenciou a estreita relação da mídia
hegemônica com o modo de produção e reprodução do capitalismo, ao mesmo tempo em que
esse domínio do capital conduz a caminhada das emissoras de rádio e televisão e suas
programações. Nessa perspectiva entendemos que movimentos sociais como o FNDC,
categorias profissionais como o conjunto CFESS/CRESS e outros segmentos da sociedade
lutam pela democratização da comunicação enquanto um direito humano e social, sendo assim
um movimento de resistência às mídias hegemônicas.
Na relação entre estas categorias e a discussão sobre as rádios comunitárias enquanto um
instrumento que tem potencialidades para viabilizar a discussão e promoção de informações
sobre políticas sociais compreende-se o quanto esta análise tem suas relações e pode ser
debatida tanto no âmbito da comunicação social, como também na área das políticas sociais.
Ao mesmo tempo se percebe que existe uma grande influência das classes dominantes no
conteúdo apresentado pelas ferramentas midiáticas, fazendo com que estas incidam no
pensamento dos/as que a consomem. É necessário que o objetivo dos meios de comunicação
esteja claro para a classe trabalhadora, a qual vivencia diariamente através das telas e rádios
informações que criminalizam, julgam e favorecem os interesses do capital.
As expressões da questão social apresentadas nesse contexto demonstram que em grande
parte os meios de comunicação são aliados da elite política e do pensamento burguês, e que é
necessário compreender os mecanismos e articulações desses âmbitos, afinal a classe
trabalhadora sofre diretamente a condição do grande capital.
O processo de conscientização sobre os direitos sociais e as políticas sociais que
viabilizam este deve ser construído por todos os espaços democráticos da sociedade, e
reiteramos nesta produção que o referencial que permeia as rádios comunitárias, pode ser de
grande valor para o direito à informação como ponto de partida para a busca por uma sociedade
mais justa e igualitária.
Ao trabalhar as categorias analíticas, rádio comunitária, políticas sociais e direito à
informação e direitos sociais, se compreende que estas categorias se envolvem e podem ser
potencializadas pela realidade concreta as quais representam, onde a partir dos sujeitos que
buscam e lutam pela democratização da comunicação e direito à informação trabalham na
proposta de um novo caminho para a comunicação social no Brasil.
512
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