Post on 24-Jan-2019
UNIVERSIDADE ESTADUAL DO CEARÁ
CENTRO DE CIÊNCIA E TECNOLOGIA – CCT
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM GEOGRAFIA – PROPGEO
MESTRADO ACADÊMICO EM GEOGRAFIA
JEAN FILIPPE GOMES RIBEIRO
A ESTRATÉGIA DE CRIAÇÃO E GESTÃO DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO E
A INTERFACE SOCIEDADE-NATUREZA: UMA ABORDAGEM GEOGRÁFICA
INTEGRADA SOBRE A APA DA SERRA DE MARANGUAPE
FORTALEZA – CEARÁ
2014
JEAN FILIPPE GOMES RIBEIRO
A ESTRATÉGIA DE CRIAÇÃO E GESTÃO DE UNIDADES DE CONSERVAÇÃO E A
INTERFACE SOCIEDADE-NATUREZA: UMA ABORDAGEM GEOGRÁFICA
INTEGRADA SOBRE A APA DA SERRA DE MARANGUAPE
Dissertação apresentada ao Programa de Pós-
Graduação em Geografia do Centro de Ciências
e Tecnologia da Universidade Estadual do
Ceará como requisito parcial para a obtenção do
grau de mestre em Geografia. Área de
Concentração: Análise Geoambiental e
Ordenação do Território nas Regiões
Semiáridas e Litorâneas.
Orientadora: Profa. Dra. Isorlanda Caracristi
FORTALEZA – CEARÁ
2014
Para Maria e Antônio, por terem me concebido
a maior dom de todos, origem de todas as
paixões, fonte de todos os desejos, significado
para cada luta e motivo para a busca de todas as
aventuras.
“A prática geográfica não é suficientemente
sustentada sem uma reflexão organizada e
continua sobre a teoria, o método e a
epistemologia. ”
(George Bertrand)
AGRADECIMENTOS
A execução deste trabalho foi uma tarefa dura e de descoberta, não apenas em meu
amadurecimento acadêmico, mas também no conhecimento dos meus limites e minhas
possibilidades. A sua finalização só se tornou possível graças ao apoio que recebi de todos que
de alguma forma colaboraram para que eu tivesse chegado até aqui e me deram força para seguir
em diante.
Primeiramente, gostaria de agradecer aos meus pais pelo apoio que me deram durante minha
formação e pela confiança que me conceberam em minhas escolhas profissionais, este trabalho
é fruto da trajetória que trilhei e não poderia ter sido realizado sem tudo que vocês fizeram por
minha educação.
À Profa. Isorlanda Caracristi, minha orientadora, pela compreensão que teve por mim, pela
dedicação que me concedeu e os ricos debates que me proporcionou. Devo muito a você em
minha formação, para mim, você é a referência do que é ser geógrafo(a), pois sua postura
acadêmica, profissional, política e ética é uma inspiração num mundo que nos cobra sempre ser
individualistas e pragmáticos.
À Profa. Claudia Grangeiro, eterna tutora. Minha trajetória na universidade não teria se dado da
mesma forma se não tivesse sido enriquecida por sua genialidade, dedicação e carinho. Contar
com suas contribuições é um privilégio, porque nos inspira não só a se esforçar em produzir um
bom trabalho acadêmico, mas nos leva a discutir o papel transformador que a Geografia tem.
Aos professores do PROPGEO, em especial aqueles que tive a oportunidade de ser aluno, Prof.
Edilson; Prof. Otavio; Prof. Marcos; Profa. Lucia Brito, Prof. Manoel, por compartilharem de
seus conhecimentos e esforços na formação de pesquisa em Geografia.
Ao João Vitor, amigo de grandes e ousados projetos, sempre disposto a um bom debate.
Aos colegas de turma de mestrado Jorge, Ianone, Rejane, Erica, Naiana pelas trocas de
experiências e os momentos de descontração.
À Lizabeth, grande geógrafa, agradeço as atenciosas e pacientes conversas que em muito me
ajudaram.
Ao Alex pela amizade incondicional.
Ao Diego pela ajuda com os mapas.
Ao Roberto pelos momentos de descontração e pela companhia nas horas mais difíceis.
A todos os colegas do PET GEO UECE, aqueles que foram meus contemporâneos e os que tive
o prazer de conhecer já no mestrado, vocês são parte fundamental do meu crescimento na
Geografia.
À Fundação Mata Atlântica Cearense, na pessoa do Ednaldo Vieira e ao seu esforço diário na
luta pela defesa do meio ambiente.
À Fundação Cearense de Apoio ao Desenvolvimento Científico e Tecnológico pelo subsídio a
pesquisa.
RESUMO
A criação de Unidades de Conservação representa uma das estratégias de proteção da natureza
presente na política ambiental brasileira, tendo-se por base a Lei Federal 9.985 de 18/7/2000
que dispõe sobre o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC). Trata-se de uma
tipologia de área protegida, delimitada para controlar a ocupação através da regulação sobre as
formas de uso dos recursos e na proteção dos processos ecológicos. Depois de criadas, essas
áreas enfrentam problemas relacionados à sua gestão, frequentemente causados por embates
relacionados a conflitos fundiários sobre o manejo dos recursos naturais ou pela relação entre
comunidades tradicionais e sua gerência, o que requer relacionar elementos sociais e naturais
na compreensão do processo de efetivação dessa estratégia. As abordagens de análise integrada
da Geografia constituem importante arsenal na compressão desses processos ao considerarem
a interface sociedade-natureza dos objetos, dentre elas destaca-se o Sistema Geossistema-
Território-Paisagem (GTP), proposto pelo geógrafo francês Georges Bertrand. Partindo dessa
problemática, a presente pesquisa objetivou avaliar a estratégia de criação e gestão de unidades
de conservação de uso sustentável a partir dos pressupostos da análise geográfica integrada do
Sistema GTP. Ao se ater a tal temática, a presente pesquisa pretende ampliar as discussões sobre
a criação de áreas protegidas, orientando reformulações e/ou críticas às formas de gestão e
planejamento ambiental existentes. Dessa forma, tomou-se como área de estudo a Área de
proteção Ambiental (APA) da Serra de Maranguape no município de Maranguape, Ceará. Essa
área abrange um refúgio de Mata Atlântica no semiárido nordestino que abriga condições
naturais e de ocupação diferenciadas do seu entorno. Através da análise integrada dos
componentes da paisagem, pôde-se identificar a relação entre os elementos físico-naturais,
econômicos e culturais na APA, permitindo entender como os instrumentos que ela dispõe em
sua criação e gestão repercutem neles. Assim, foi possível realizar diagnósticos e prognósticos
sobre a APA e sua gestão com o suporte do Sistema GTP, levantando aspectos que podem
contribuir para a eficácia da unidade.
Palavras-Chave: Análise Geográfica Integrada. Sistema GTP. Unidades de Conservação. APA
da Serra de Maranguape.
ABSTRACT
The establishment of Conservation Units is one of the nature protection strategies in Brazilian
environmental policy; it is based on the Federal Law 9985 of 18.7.2000, which provides for the
National System of Conservation Units (SNUC). It is a typology of protected area bounded to
control the occupation through regulation on the form of resource use and protection of
ecological processes. Once created, these areas face problems with their management often
clashes related to land conflicts and the management of natural resources, the relationship
between traditional communities and their management, which requires to relate social and
natural elements in understanding the process of effecting this strategy. Approaches to
integrated analysis of geography is an important arsenal in the compression of these processes
by considering the nature-society interface objects, among which stands out the Geosystem-
Territory-Landscape System (GTP) proposed by the French geographer Georges Bertrand. On
this issue, the present study aimed to evaluate the strategy of establishing and managing of
sustainable use conservation units from the assumptions of integrated geographic analysis of
the GTP system. By sticking to this theme, the present research aims to expand the discussions
on the creation of protected areas targeting reformulations and/or criticism of forms of
environmental management and planning existing. Thus, it was taken as study area the
Environmental Protection Area (APA) of Serra de Maranguape in the municipality of
Maranguape, Ceará. This area covers a haven of Atlantic Forest in northeastern semiarid
harboring natural and differentiated occupation of their surroundings conditions. Through
integrated analysis of landscape components, we could identify the relationship between the
physical-natural, economic and cultural elements in the APA, being possible to understand how
the instruments it has in its creation and management impacting them. Therefore, it was possible
to perform diagnostics and prognostics on the APA and its management with the support of the
GTP system raising aspects that can contribute to the efficiency of the unit.
Keywords: Integrated Geographic Analysis. GTP System. Conservation Units. APA of Serra
de Maranguape.
LISTA DE GRÁFICOS
Gráfico 01 – Atividades da Pesquisa .................................................................................... 24
Gráfico 02 – Construção do Objeto de Estudo ................................................................... 40
Gráfico 03 – Porcentagem do Bioma Protegido por Unidades de Conservação .............. 56
Gráfico 04 – Representatividade dos Compartimentos Geoambientais Cearenses no
Montante de Áreas Protegidas do Estado do Ceará .................................... 61
Gráfico 05 – Média Mensal Pluviométrica no Município de Maranguape (1978-2013)
........................................................................................................................... 85
Gráfico 06 – Evolução do Produto Interno Bruto Municipal de Maranguape (1999-
2011) ................................................................................................................. 99
Gráfico 07 – Quantidade de Banana Comercializada na Ceasa Proveniente de Maran-
guape (2002-2013) ......................................................................................... 100
Gráfico 08 – Movimentação Financeira da Comercialização de Banana Proveniente
de Maranguape na CEASA (2002-2013) ..................................................... 100
LISTA DE QUADROS
Quadro 01 – Guia Metodológico na Análise da Paisagem a Partir da Criação de Uni-
dades de Conservação ..................................................................................... 26
Quadro 02 – Materiais Utilizados ........................................................................................ 27
Quadro 03 – Tipologia das Unidades de Conservação ....................................................... 47
Quadro 04 – Unidades de Conservação do Estado do Ceará ............................................ 58
Quadro 05 – Compartimentação dos Maciços Residuais no Estado do Ceará ................ 78
Quadro 06 – Quadro de Tempo: Fatos Marcantes e Suas Implicações na Paisagem ... 106
Quadro 07 – Classificação das Paisagens por Bertrand .................................................. 108
Quadro 08 – Estimativa da Abrangência Absoluta e Percentual das Classes de Uso e
Cobertura na APA da Serra de Maranguape ............................................ 123
Quadro 09 – Principais Enfoques das Fases de Planejamento de APA .......................... 129
Quadro 10 – Avaliação da Efetividade da Apa da Serra de Maranguape ..................... 142
LISTA DE FIGURAS
Figura 01 – O Sistema GTP .................................................................................................. 37
Figura 02 – Domínios Morfoestruturais e Morfoclimáticos do Brasil .............................. 63
Figura 04 – Áreas Prioritárias para a Preservação da Mata Atlântica no Brasil ........... 71
Figura 05 – Expressão Litológica e Uso no Maciço de Maranguape ................................ 79
Figura 06 – Aproveitamento Mineral na Serra de Maranguape ...................................... 80
Figura 07 – Visualização 3D do Maciço Residual de Maranguape com Visada NE-SW
............................................................................................................................. 81
Figura 08 – Fluxos de Umidade e Brejos de Altitude no Nordeste ................................... 84
Figura 09 – Aproveitamento Hídrico na APA .................................................................... 86
Figura 10 – Perfis Representativos das Classes de Solos da APA da Serra de Maran-
guape ................................................................................................................... 88
Figura 11 – Mangue de Altitude. .......................................................................................... 90
Figura 12 – Exemplares da Fauna na APA. ........................................................................ 91
Figura 13 – Cultivo de Café, Traços da Modificação na Paisagem. ................................. 95
Figura 14 – Diferentes Padrões de Ocupação na APA ....................................................... 97
Figura 15 – Mapa da Compartimentação Ambiental da APA da Serra de Marangua-
pe ....................................................................................................................... 116
Figura 16 – Uso Agrícola na Paisagem .............................................................................. 118
Figura 17 – Repercussões na Paisagem da Moradia e Veraneio ..................................... 120
Figura 18 – Criação de Animais na APA .......................................................................... 121
Figura 19 – Perfil Esquemático em 3D do Uso e Cobertura na Vertente Oriental da
Serra ................................................................................................................. 123
Figura 20 – Ocupação em Área de APP ............................................................................ 127
LISTA DE MAPAS
Mapa 01 – Mapa de Localização da APA da Serra de Maranguape ................................ 21
Mapa 02 – Mapa Básico da APA da Serra de Maranguape .............................................. 76
Mapa 03 – Mapa Hipsométrico da APA da Serra de Maranguape .................................. 82
Mapa 04 – Uso e Cobertura na APA da Serra de Maranguape ...................................... 124
Mapa 05 – Áreas de Preservação Permanente da APA da Serra de Maranguape ....... 128
LISTA DE TABELAS
Tabela 01 – Número e Extensão das Unidades de Conservação Federais Pré e Pós Snuc
............................................................................................................................. 55
Tabela 02 – Setorização da Serra de Maranguape-CE ...................................................... 81
Tabela 02 – População Residente em Maranguape – 1991/2000/2010 .............................. 99
Tabela 03 – Renda Nominal Mensal em Salários Mínimos das Pessoas de 10 Anos ou
mais de Idade Moradoras em Domicílios Particulares Permanentes na
APA da Serra de Maranguape ....................................................................... 102
Tabela 04 – Energia Elétrica nos Domicílios Particulares Permanentes na APA da
Serra de Maranguape ..................................................................................... 102
Tabela 05 – Abastecimento de Água nos Domicílios Particulares Permanentes na APA
da Serra de Maranguape ................................................................................ 103
Tabela 06 – Domicílios Particulares Permanentes com Banheiro ou Sanitário na APA
da Serra de Maranguape ................................................................................ 104
Tabela 07 – Destino do Lixo nos Domicílios Particulares Permanentes na APA da Ser-
ra de Maranguape ........................................................................................... 105
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ........................................................................................................ 17
1.2 QUESTÕES NORTEADORAS ................................................................................. 22
1.3 OBJETIVOS ............................................................................................................... 23
2. MATERIAIS E PROCEDIMENTOS ..................................................................... 23
3. REFERENCIAL TEÓRICO-METODOLÓGICO ............................................... 30
3.1 A ANÁLISE INTEGRADA EM GEOGRAFIA E A PROBLEMÁTICA EM TOR-
NO DA CRIAÇÃO E GESTÃO DE ÁREAS PROTEGIDAS ................................... 30
3.1.1 Das Abordagens Integradas à Proposição do Sistema GTP ................................. 32
3.1.2 O Reencontro com a Paisagem e uma Proposição Metodológica para o Estudo
Geográfico Integrado Sobre as Áreas Protegidas. ................................................ 37
3.1 A POLÍTICA AMBIENTAL BRASILEIRA E AS ÁREAS PROTEGIDAS: O
SISTEMA NACIONAL DE UNIDADES CONSERVAÇÃO – SNUC ..................... 41
3.1.1 Instrumentos do SNUC ............................................................................................ 51
3.2.1.1 Criação de unidades de conservação .......................................................................... 51
3.2.1.2 Obrigação do empreendedor de apoiar unidades de conservação .............................. 51
3.2.1.3 Corredores Ecológicos e Zonas de Amortecimento ................................................... 51
3.2.1.4 Mosaico de unidades de conservação ......................................................................... 52
3.2.1.5 Conselho Gestor ......................................................................................................... 53
3.2.1.6 Plano de manejo ......................................................................................................... 54
3.2.1.7 Zoneamento ................................................................................................................ 55
3.2.1 Conflitos em unidades de conservação e o contexto cearense .............................. 55
4. RESULTADOS E DISCUSSÕES ........................................................................... 62
4.1 A APA DA SERRA DE MARANGUAPE NO CONTEXTO DA ANÁLISE IN-
TEGRADA DA PAISAGEM ..................................................................................... 62
4.1.1 Paisagens de Exceção: Os Brejos de Altitude no Cenário dos Domínios das
Caatingas. .................................................................................................................. 62
4.1.2 A Área de Proteção Ambiental da Serra de Maranguape .................................... 72
4.1.3 Análise Integrada dos Componentes na Configuração da Paisagem da APA da
Serra de Maranguape .............................................................................................. 77
4.1.4 Configuração territorial: atividades socioeconômicas e aspectos demográficos
da APA....................................................................................................................... 93
4.1.5 Compartimentação da Paisagem ........................................................................... 108
4.2 A INTERFACE SOCIEDADE-NATUREZA E A CRIAÇÃO E GESTÃO DA APA
DA SERRA DE MARANGUAPE ........................................................................... 117
4.2.1 Tipos de uso e implicações na paisagem ............................................................... 117
4.2.1.1 Uso Agrícola ............................................................................................................. 117
4.2.1.2 Moradia e veraneio ................................................................................................... 119
4.2.1.3 Extrativismo e criação de animais ............................................................................ 120
4.2.2 Instrumentos de regulamentação e gestão sobre a APA ..................................... 125
4.2.2.1 Áreas de Preservação Permanente ............................................................................ 125
4.2.2.2 Planejamento e gestão .............................................................................................. 129
4.2.3 A APA na percepção dos grupos sociais ............................................................... 137
4.2.4 Análise geográfica integrada na avaliação de indicadores de efetividade. ........ 139
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................. 144
REFERÊNCIAS ..................................................................................................... 147
ANEXOS ................................................................................................................. 155
ANEXO A – ROTEIRO PARA ENTREVISTA SEMIDIRIGIDA ....................... 1556
ANEXO B – PLANO DE GESTÃO DA APA DA SERRA DE MARANGUAPE 157
17
1 INTRODUÇÃO
A segunda metade do século XX é marcada pela emergência das questões
ambientais oriundas do agravamento da problemática da fome, dos acidentes relacionados à
energia nuclear, das elevadas taxas de extinção de espécies, da dilapidação dos recursos naturais
etc. São temas que ganham destaque no seio da sociedade, mobilizando, assim, a produção
técnico-científica, bem como a sua institucionalização através da criação de políticas,
instrumentos jurídicos e organismos estatais de controle e fiscalização.
Surge a preocupação com a potencialidade destrutiva da racionalidade técnico-
científica para com a natureza. A revolução industrial é um marco histórico desse processo em
que uma nova forma de produção se impõe sobre o trato e a obtenção de recursos naturais. O
desenvolvimento da sociedade urbano-industrial e suas práticas produtivas exercem cada vez
mais pressões sobre o meio ambiente, causando a fragmentação, a perda e alteração de habitats.
O desenvolvimento das cidades e a alteração de rios para a produção de energia, a
superexploração de populações de espécies selvagens, a poluição e a introdução de espécies
exóticas são debates que entram nas pautas de movimentos sociais e da comunidade acadêmica.
Com o desenvolvimento da Ecologia surgem as primeiras interpretações científicas
sobre as implicações desses processos, tais como: a fragmentação dos ambientes, o impacto dos
poluentes químicos nos ecossistemas e as interferências nos ciclos de nutrientes. Dentre elas,
destaca-se a preocupação com a perda da diversidade biológica e o desaparecimento de
ecossistemas.
O relatório bianual do Fundo Mundial para a Natureza (WWF), Planeta Vivo 2012,
com base em 9.014 populações de 2.688 mamíferos, aves, peixes, répteis, anfíbios e peixes de
diferentes biomas e regiões, indica uma queda do Índice Planeta Vivo Global de 30% de 1970
a 2008 (WWF, 2012). Ainda para a região biogeográfica Neotropical, onde se incluem os
biomas brasileiros, o Índice Planeta Vivo apresentou uma queda de 55% com a estimativa de
perca de floresta tropical de 0,5% ao ano entre 2000 e 2005.
A variabilidade genética de populações diversas no interior dos ecossistemas
assegura a persistência de uma espécie diante das mudanças ambientais que ocorrem
naturalmente. Assim, a perda de biodiversidade pode provocar o estresse ou degradação de
ecossistemas, diminuindo sua estabilidade e capacidade de resiliência (EHRLICH, 2007) e
comprometendo uma série de processos naturais, tais como a ciclagem de nutrientes, a
formação do solo, os fluxos hidrológicos e a regulação do clima (DAILY, 1997 apud ARAUJO,
2007).
18
Além da importância da biodiversidade como elemento da exploração biológica
atuando na troca de matéria e energia na paisagem, grande parte das atividades econômicas,
como a indústria e a agricultura, são impactadas diretamente pelos serviços ambientais
prestados pela biodiversidade. Segundo o Ministério do Meio Ambiente do Brasil, cerca de
40% do Produto Interno Bruto do país é gerado pelo setor primário que depende diretamente
do patrimônio genético provido da diversidade biológica (ARAUJO, 2007).
Ainda sobre a biodiversidade, é traço comum no pensamento de vários autores a
existência de uma estreita relação entre a diversidade cultural e a diversidade biológica. Diegues
(2001) coloca que certas comunidades tradicionais desenvolveram modos de vida particulares
que envolvem grande dependência dos ciclos naturais, conhecimento profundo dos ciclos
biológicos e dos recursos naturais, e que as formas de manejo por elas criadas contribuíram
para a diversidade biológica e ecológica em regiões específicas.
Paulatinamente, foram incorporadas medidas e estratégias no intuito de oferecer
respostas às problemáticas da crise ambiental, entre elas a demarcação de áreas protegidas como
medidas de proteção da biodiversidade. Tal interesse se dá, principalmente, após os avanços
científicos e tecnológicos que conferiram novos usos e aplicações para a diversidade biológica.
Dessa maneira, surge o interesse pelo controle e exploração da biodiversidade. Paralelamente,
são desenvolvidas em âmbito institucional estratégias e programas para a conservação da
biodiversidade para a criação de áreas protegidas com base nas experiências da criação do
Parque Nacional de Yellowstone nos Estados Unidos em 1872 e na política de proteção à
natureza desenvolvida na Europa pela legislação de uso e ocupação do solo.
A institucionalização dessas áreas no Brasil, que acompanha o debate internacional
em torno da questão, acontece, inicialmente, com a criação dos Códigos Florestal e de Água,
em 1934, mas é com a criação do Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza
(SNUC), em 2000, que uma política de gestão territorial é criada no intuito de preservar a
biodiversidade através da proteção dos biomas brasileiros, instituindo o conceito de unidade de
conservação (UC):
[...] espaço territorial e seus recursos ambientais, incluindo as águas jurisdicionais,
com características naturais relevantes, legalmente instituído pelo Poder Público, com
objetivos de conservação e limites definidos, sob regime especial de administração,
ao qual se aplicam garantias adequadas de proteção (BRASIL, 2000).
A política de criação de áreas protegidas através da institucionalização de Unidades
de Conservação ainda gera grandes embates técnico-científicos e políticos. Depois de criadas,
19
as UC ainda enfrentam problemas relacionados à sua gestão, quase sempre embates
relacionados a conflitos fundiários e sobre o manejo dos recursos naturais, a relação entre
comunidades tradicionais e a gerência das unidades demonstram os limites dos processos
participativos na gestão dessas unidades.
A ciência geográfica não é negligente a essas questões. Várias são as pesquisas
realizadas abordando os diferenciados aspectos da criação de UC, tais como: as territorialidades
envolvidas na delimitação de UC; as questões geopolíticas das estratégias de proteção da
diversidade genética e dos conhecimentos tradicionais e as contribuições parcelares nos estudos
de processos naturais e das metodologias de estudos integrados da paisagem, notadamente
influenciadas pelos trabalhos de G. Bertrand e J. Tricart, dão grandes contribuições aos
instrumentos de planejamento e gestão, somente para citar alguns exemplos.
No entanto, a complexidade da questão ambiental vem colocando uma série de
desafios para a ciência e, em particular, para a Geografia. A abordagem dessa problemática no
âmbito das relações sociedade-natureza por vezes reduz o debate a uma perspectiva naturalista
a partir de uma visão compartimentada e setorizada de natureza ou excluem das dinâmicas
sociais processos naturais enquanto condicionantes e parte de sua (re)produção. Tal
reducionismo implica em conceitos e metodologias que não conseguem avaliar a complexidade
do debate ambiental, oferecendo, assim, uma análise limitada e de proposições pouco efetivas
no trato da questão ambiental.
A crise ambiental é, neste sentindo, uma crise da racionalidade econômica imposta
ao conhecimento, os problemas ambientais são fundamentalmente problemas de conhecimento
(LEFF, 2002). Para Leff (2002), a crise ambiental é a primeira crise do mundo real produzida
pelo desconhecimento do conhecimento, da concepção do mundo e do domínio da natureza.
Podem-se destacar três pontos de fratura que representam as renovações imposta por essa crise:
1) Os limites do crescimento e a construção de um paradigma de produção sustentável; 2) A
fragmentação do conhecimento, o surgimento da teoria dos sistemas e do pensamento da
complexidade e 3) O questionamento da concentração de poder pelo Estado e do mercado
(LEFF, 2008).
Nesse viés contra o projeto epistemológico positivista, sua visão mecanicista,
especializada e objetivista, emergem novas formas de compreensão sobre os fundamentos do
saber e do sentido da vida que orientam um desenvolvimento sustentável da humanidade. Novos
paradigmas que inovam nas formas de compreensão e trato da questão ambiental dentro daquilo
que Leff (2008) chama de saber ambiental e do pensamento complexo de Morin (2002).
20
É dentro desse cenário de renovações epistemológicas, de construção de leituras
interdisciplinares e complexas que o geógrafo francês George Bertrand propõe, no final da
década de 1990, o sistema Geossistema-Território-Paisagem (GTP) como ferramenta teórico-
metodológica. Na década de 1960, George Bertrand é um dos primeiros geógrafos a introduzir
o enfoque integral nos estudos do meio ambiente, centralizando suas reflexões sobre o conceito
geográfico de paisagem. Bertrand introduz à análise da Geografia Física o antropismo, que
passa a compor uma tríade dialética no estudo do meio, elaborando, assim, um procedimento
metodológico que dá operacionalidade às análises geossistêmicas.
A proposta inovadora da década de 60 de Bertrand possui bastante aceitação na
comunidade geográfica, notadamente no Brasil onde são variadas suas aplicações. Apesar do
avanço da proposta de Bertrand para a Geografia Física, a abordagem reduz a atividade humana
a um elemento consumidor de matéria e catalisador de ciclos energéticos, explorando a
elasticidade do meio, na medida em que desencadeava retroalimentações locais. Revendo o
papel dos agentes na paisagem, o geógrafo francês busca, em trabalhos posteriores, resituar o
elemento humano em um polo especial dentro do modelo sistêmico onde as representações
simbólicas passam a ser expressão da relação sociedade-natureza na paisagem (REIS JUNIOR,
2012).
Surge, assim, o Sistema GTP, avançando em seus pressupostos ao apontar
caminhos para uma leitura integrada de conceitos, possibilitando, dessa forma, elencar
múltiplos aspectos a análise geográfica da realidade socioambiental emergindo como uma
ferramenta importante para o entendimento da problemática da conservação dos recursos
naturais através das UC.
Nessa perspectiva, como base de estudo elegeu-se as unidades de conservação do
estado do Ceará, tendo como recorte empírico a Área de Proteção Ambiental (APA) da Serra
de Maranguape (Mapa 01), localizada na Região Metropolitana de Fortaleza e compreendida
entre os Municípios de Maranguape e Caucaia, com uma área de 5.521,52 ha. A APA abriga
um maciço residual cristalino em meio à depressão sertaneja, tratando-se de superfícies
topograficamente elevadas submetidas à influência de mesoclimas de altitude que contrasta
com a paisagem semiárida do interior cearense pelo desenvolvimento de uma mata úmida com
presença de espécies endêmicas (SOUZA, 2000).
21
Mapa 01 – Mapa de Localização da APA da Serra de Maranguape
22
Segundo Aguiar-Silva et al. (2011), as unidades de conservação do estado do Ceará,
em sua maioria (81%), não tiveram na sua criação a adoção de critérios técnico-científicos e,
em muitas, o plano de manejo, instrumento básico de gestão, não havia sido elaborado. Ainda
segundo a autora, no entorno das unidades havia grandes conflitos fundiários e a fiscalização
ineficiente favorecia a especulação imobiliária e o tráfico de animais.
Ao apontar o sistema GTP como ferramenta importante em promover uma análise
integrada no debate da gestão territorial associada à preservação dos recursos naturais e suas
formas de apropriação, a presente pesquisa pretende ampliar as discussões sobre a criação de
áreas protegidas, orientando, dessa maneira, reformulações e/ou críticas às formas de gestão e
planejamento ambiental existentes quanto a sua capacidade de efetivação prática na proteção
dos recursos naturais.
Pretende-se, assim, contribuir para uma leitura da realidade socioambiental do
semiárido cearense através da institucionalização da APA da Serra de Maranguape frente à
singularidade desse ambiente no domínio morfoclimático semiárido e sua apropriação enquanto
recurso nas atividades econômicas da região.
1.2 QUESTÕES NORTEADORAS
Dentro deste cenário a presente pesquisa partiu das seguintes questões norteadoras:
1) Como entender a estratégia de preservação dos recursos naturais por meio da
criação de áreas protegidas utilizando uma análise geográfica integrada?
2) Quais os fundamentos teóricos e técnico-científicos utilizados na criação e
avaliação de unidades de conservação?
3) Qual a efetividade prática da criação de unidades de conservação para
preservação da biodiversidade e demais recursos naturais e como avaliá-la
através de uma leitura geográfica?
4) Como os estudos geográficos integrados podem orientar a criação de políticas e
instrumentos de gestão e planejamentos socioambientais mais adequadas?
23
1.3 OBJETIVOS
Elencou-se como objetivo geral para a pesquisa: avaliar a estratégia de criação e
gestão de unidades de conservação de uso sustentável a partir dos pressupostos da análise
geográfica integrada do Sistema GTP (Geossistema-Território-Paisagem), tendo como
objetivos específicos:
Analisar a proposta metodológica do Sistema GTP buscando fundamentos
teórico-metodológicos voltados à relação entre estudo geográfico integrado,
políticas de preservação ambiental e gestão de recursos naturais como elementos
de interface da relação sociedade-natureza;
Discutir as bases teóricas e técnicas sobre Unidades de Conservação;
Aplicar o sistema GTP como pressuposto metodológico na avaliação da
estratégia de criação/institucionalização da Área de Proteção Ambiental (APA)
da Serra de Maranguape;
Identificar os parâmetros técnico-científicos, jurídicos e ambientais utilizados na
criação e gestão da APA da Serra da Maranguape bem como em seu plano de
gestão e programas de manejo;
Diagnosticar a efetividade prática da implantação e gestão da referida APA na
regulamentação e monitoramento do uso sustentável dos recursos naturais.
2. MATERIAIS E PROCEDIMENTOS
Para sua execução, as atividades da pesquisa (Gráfico 01) foram divididas em
atividades de laboratório, atividades de campo e organização dos dados. As atividades de
laboratório contaram inicialmente com uma revisão de literatura sobre análise integrada da
paisagem, tendo como principais referências Rodriguez et al. (2004), Bertrand (2007) e Tricart
(1978), e sobre áreas protegidas com foco para política ambiental brasileira de conservação
utilizando os trabalhos de Brasil (2000), Diegues (2001), Araújo (2007), Medeiros (2005) e
Bensusan (2006). Para construir uma abordagem integrada da paisagem da APA da Serra de
Maranguape foram essenciais as referências de Souza (2000), Arruda (2001) e Ceará (2002).
Os trabalhos de Maia (2001), Cordeiro (2013), Lima (2005) e Mendes (2006) são estudos já
realizados na área que auxiliaram na construção de um cenário de modificações na paisagem e
a compreender as transformações socioespaciais quem implicam na efetividade da UC,
24
somando aos dados de IBGE (2000) e do Instituto de Pesquisa e Estratégia Econômica do Ceará
(IPECE) sobre o meio socioeconômico.
Gráfico 01 – Atividades da pesquisa
Fonte: Elaborado pelo autor
A construção do referencial teórico teve como principal base a trajetória de Bertrand
(2007) no estudo da paisagem. Conjuntamente com as reflexões feitas por Passos (2006) e a
revisão sobre as Unidades de Conservação foi proposto um roteiro metodológico na análise da
paisagem (Quadro 01). Primeiramente, definiram-se três etapas que buscaram concentrar e
sistematizar procedimentos específicos capazes de agrupar o levantamento de dados e análises
parciais em torno de temas chaves, favorecendo a organização dos dados obtidos e a geração
de produtos essências à análise da paisagem. Cada procedimento, por sua vez, exigiu fontes de
consulta variadas e instrumentos diversos para obtenção e coleta dos dados. O agrupamento por
etapas facilitou a construção de um cronograma de atividades que foram organizadas de forma
hierárquica, facilitando sua execução e a consulta das fontes de obtenção para cada dado. Por
fim, ao final de cada etapa, foram gerados produtos que serviram de objetos de reflexão e análise
para a realização do objetivo geral da pesquisa.
A primeira etapa, a Análise Pré-paisagística, tem por função reunir e classificar as
informações sobre a paisagem e foi organizada sobre duas coordenadas que são interativas.
Uma coordenada material que objetiva reunir a configuração de conjuntos dos corpos materiais
que entram na composição do espaço geográfico, trata-se da análise geossistêmica que nos
permite obter de forma global, interativa e integrativa a relação entre os elementos constituintes
da paisagem. A outra se trata de uma coordenada ideal que busca investigar os atores da
•Levantamento Bibliográfico;
•Construção do Referencial Teórico;
•Levantamento cartográfico e aeroespacial;
Atividades de laboratório
•Reconhecimento de campo;
•Visita a instituições;
•Aplicação de entrevista semidirigidas;
•Registros fotográficos e coleta de coordenadas;
Atividades de campo
•Produção cartográfica;
•Confecção de gráficos e tabelas;
• Integração e interpretação de dados;
•Redação final;
Organização dos dados
25
paisagem em função dos projetos e atividades que realizam. Os atores foram delimitados em
quatro grupos sociais buscando uma representatividade daqueles que estão mais diretamente
ligados a criação e gestão de UC, são eles: moradores, administradores (ligados ao Estado) e
participativos (sociedade civil organizada) e empreendedores. Integrando as duas coordenadas
à elaboração de um quadro de tempo, buscou-se situar a paisagem em um tempo mais logo da
história, seja em seu ritmo bioecológico, seja aos ritmos socioculturais relacionando os
elementos do espaço geográfico aos sistemas de representação dos atores sociais, delimitando
a investigação ao período de criação da UC.
A segunda etapa buscou levantar e caracterizar as implicações da política de criação
e gestão de Unidades de Conservação sobre a paisagem a fim de apreender as modificações
sobre a materialidade da paisagem bem como em seu sistema de representação. Para tanto, se
caracterizou a política do SNUC e os seus instrumentos buscando visualizá-los através da
criação e gestão da APA da Serra de Maranguape e tendo como fonte de consulta a literatura
sobre Unidades de Conservação e sobre avaliação de sua efetividade, a legislação ambiental
pertinente e os documentos de órgãos de apoio à gestão.
A terceira e última etapa constituiu na utilização do sistema GTP na análise entre a
interface sociedade-natureza a partir da interação e hibridação dos elementos sociais e naturais
com base nos produtos obtidos nas etapas anteriores. Procurou-se entender o papel que a UC
(com sua criação e gestão) possuiu na constituição da paisagem e levantou-se elementos que
pudessem subsidiar a avaliação de sua efetividade enquanto política voltada para a utilização
sustentável dos recursos naturais.
26
Quadro 01 – Guia Metodológico na Análise da Paisagem a Partir da Criação de Unidades de Conservação
ETAPA PROCEDIMENTO FONTES DE DADOS E INFORMAÇÕES PRODUTOS
Análise Pré-
Paisagística
Coordenada
Material
▪ Análise geossistêmica;
▪ Imagens de Satélite e produtos geoprocessa-
dos;
▪ Acervo cartográfico temático;
▪ Relatórios Técnicos e Acervo bibliográfico de
pesquisas ambientais sobre a área;
▪ Registros de observações e medições de
campo.
▪ Banco de dados de órgãos/instituições
governamentais;
▪ Delimitação dos geocomplexos e seus
estados;
▪ Mapas temáticos;
▪ Mapas de uso e ocupação;
Coordenada
Ideal
▪ Identificação e delimitação dos atores da
paisagem e suas formas de intervenção;
▪ Elaboração de um quadro de tempo.
▪ Entrevistas junto aos atores;
▪ Planos de gestão e manejo;
▪ Documentos históricos;
▪ Indicadores demográficos, sociais e econômi-
cos.
▪ Composição de um sistema de represen-
tação paisagística;
▪ Recomposição do processo de ocupação e
das formas de intervenção na paisagem ao
logo do tempo.
▪ Diagnóstico socioeconômico;
Implicações a paisagem
das políticas de criação de
Unidades de Conservação
▪ Revisão bibliográfica sobre a construção
do conceito de unidade de conservação e sua
inserção na política ambiental brasileira bem
como sobre métodos e técnicas de avaliação
de unidades de conservação;
▪ Levantamento das medidas e instrumentos
utilizados na criação e gestão da UC;
▪ Literatura científica sobre unidades de conser-
vação e sobre avaliação de sua efetividade;
▪ Legislação ambiental pertinente;
▪ Planos de gestão e manejo;
▪ Conselho Gestor;
▪ Procedimentos técnicos e metodológicos usa-
dos na criação e gestão da UC;
▪ Entrevistas junto aos atores.
▪ Diagnostico sobre a UC e os instrumentos
de gestão na regulamentação do uso dos
recursos naturais;
▪ Mapas de regulamentações sobre o
território;
▪ Relação entre as implicações da política e o
sistema de representação da paisagem.
Análise GTP
▪ Analisar a interface sociedade-natureza a
partir da interação e hibridação dos
elementos sociais e naturais.
▪ Produtos das etapas anteriores
▪ Evidências sobre conflitos entre as pro-
postas de regulamentação de uso dos recursos
naturais e as práticas desenvolvidas pelos
atores sociais;
▪ Análise sobre a efetividade e manejo da UC;
Fonte: Elaborado pelo autor
27
Quadro 02 – Materiais utilizados
MATERIAIS UTILIZADOS DESCRIÇÃO FONTE
Material cartográfico
Imagens
Landsat 5 TM ano de 1990 orbita/ponto
217:63 Resolução 30m INPE
Resouscesat LIS3 de 2012 orbita/ponto
334:78 Resolução 30m INPE
Google Earth™ ano de 2009 e 2012 Google
SRTM resolução 30m TOPODATA/INPE
Dados
vetoriais
Base cartográfica no formato .shp com a
delimitação da rede de drenagem hidro-
gráficas na escala 1:100.000
CPRM
Base cartográfica no formato .shp dos li-
mites municipais, distritos e localidades
na escala de 1:100.000
IPECE
Base cartográfica no formato .shp das
Unidades de Conservação do estado do
Ceará
IPECE
Dados socioeconômicos
Censo Demográfico 2010 IBGE
Perfil Básico Municipal 2012-2013 IPECE
Programas computacionais
Microsoft Office 2007 -
Spring 5.2 -
gvSIG 1.12 -
Registros de áudio, imagem e vídeo Câmera Sony cyber-shot dsc-w320 14mp -
Coleta de coordenadas geográfica GPS Garmin modelo eTrex H -
Fonte: Elaborado pelo autor
As atividades em campo aconteceram nos períodos de 29 a 31 de abril de 2013 e de
03 a 08 de fevereiro de 2014, em ambas houve coleta de coordenadas geográficas e o registro
da paisagem através do uso da fotografia. A primeira atividade teve como objetivo reconhecer
os principais tipos de uso e ocupação na configuração da paisagem, percorrendo a extensão da
Serra dentro do município de Maranguape. No segundo trabalho de campo foram realizadas
visitas técnicas a órgãos públicos e empreendimentos privados para a aplicação de entrevistas
semidirigidas (Anexo A) junto aos atores da paisagem delimitados. A utilização da entrevista
buscou coletar elementos que servissem para análise da paisagem a partir das percepções dos
atores sobre a mesma e sobre as estratégias de conservação e de gestão. Foram realizadas ao
todo 20 entrevistas junto a funcionários do núcleo de meio ambiente da Secretaria de Meio
Ambiente, Desenvolvimento Agrário e Meio Ambiente (SEMADE) de Maranguape,
integrantes do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Maranguape, donos de empreendimentos
privados, participantes da ONG Fundação Mata Atlântica Cearense, além de moradores
serranos.
Durante a fase da organização dos dados, as coordenadas coletadas foram utilizadas
como pontos de controle e na identificação de área de interesse da pesquisa, auxiliando, assim,
28
na produção cartográfica que tinha como principal foco construir uma análise espaço-temporal
do uso e cobertura da APA e a produzir mapas temáticos sobre a mesma. Na tentativa de
produzir um mapa sobre a evolução do uso e cobertura da APA, foram utilizadas imagens
LANDSAT e RESOUCESAT no recorte de tempo que levou em consideração a criação da
APA, através do recurso de classificação de imagens em softwares de geoprocessamento. Pela
baixa resolução das imagens e em função da escala adotada (1:50.0000), não foram obtidos
resultados satisfatórios sendo assim descartadas. Desse ponto, decidiu-se usar as imagens
disponíveis pelo Google Earth™ que apresentavam boas resoluções e permitiram, através da
fotointerpretação com o auxílio de dados vetoriais produzidos por instituições governamentais
e das observações nos trabalhos de campo, produzir um mapa e um perfil em 3D sobre o uso e
cobertura da APA.
Para a produção de mapas temáticos foram utilizadas as bases vetoriais do IPECE,
pela qual foi possível obter a delimitação oficial da APA. A produção de gráficos e tabelas são
produtos de fichamentos realizados durante a revisão de literatura e ilustram o texto no sentido
de orientar a compreensão, as análises e expor os resultados obtidos.
A proposta de roteiro metodológico orientou também a redação e organização dos
capítulos. O terceiro capítulo - Referencial teórico-metodológico - apresenta o percurso
teórico construído na execução da pesquisa, encontrando-se dividido em duas partes: a primeira
discute as análises integradas em geografia e apresenta o GTP como instrumento teórico-
metodológico na análise do objeto de estudo, qual seja a apreensão da estratégia de criação e
gestão de UC a partir da análise da paisagem. A segunda apresenta o debate sobre áreas
protegidas e a elaboração da política brasileira do SNUC, centralizando a análise sobre seus
instrumentos e descrevendo o seu contexto na realidade cearense.
O quarto capítulo - Resultados e discussões - divide-se em dois. Em A APA da
Serra de Maranguape no Contexto da Análise Integrada da Paisagem, busca-se apresentar
uma investigação sobre a leitura integrada dos elementos na paisagem da APA. Primeiramente,
contextualizam-se os enclaves úmidos como paisagens de exceção em seu cenário regional e o
despertar de suas iniciativas de proteção. A partir de então, apresenta-se a APA da Serra de
Maranguape com base na exposição integrativa de seus elementos físico-naturais,
socioeconômicos e culturais como suporte para a análise da paisagem. Em A Interface
Sociedade-Natureza e a Criação e Gestão de Unidades de Conservação estão concentrados
os resultados da pesquisa, a qual a partir dos instrumentos de proteção e gestão da APA e da
leitura dos pressupostos do sistema GTP levantam-se elementos que demonstram adequação ou
conflito nas estratégias adotadas pela APA, discutindo-se, assim, a sua efetividade.
29
Por fim, no capítulo Considerações Finais procura-se avaliar a trajetória da
pesquisa, demonstrando a viabilidade da leitura geográfica integrada, através do sistema GTP,
na avaliação da gestão e criação de unidades de conservação, fornecendo subsídios que
enriqueçam as referências e debates sobre o tema.
30
3. REFERENCIAL TEÓRICO-METODOLÓGICO
3.1 A ANÁLISE INTEGRADA EM GEOGRAFIA E A PROBLEMÁTICA EM TORNO DA
CRIAÇÃO E GESTÃO DE ÁREAS PROTEGIDAS
A preocupação crescente com a preservação ambiental tem colocado como desafio,
por parte da pesquisa científica, o desenvolvimento de tecnologias e estratégias que promovam
a utilização racional dos recursos naturais, bem como sua capacidade em contribuir para a
compreensão da questão ambiental enquanto desafio para a sociedade. Nesse sentido, diversos
esforços são travados visando dar conta de tais questões, incluindo a revisão dos próprios
paradigmas vigentes, que são colocados em xeque, surgindo, assim, novas epistemes e novas
proposições metodológicas.
A especialização positivista pela qual a Geografia Física passou desde o século XX
culminou no aparecimento de diversas subcompartimentações cada vez mais autônomas. Tal
especialização exacerbada entrou em choque com os novos paradigmas que adentravam as
ciências naturais, que buscavam dar respostas às problemáticas que surgiam em torno da
questão ambiental e à necessidade pragmática de organização do território. O reconhecimento
da realidade ambiental que esses setores especializados promovem se dá de maneira
fragmentada e incompleta, não permitindo apreender o ambiente e avaliar os recursos naturais
de um território em sua integralidade (SOUZA, 2002).
Surgem, assim, proposições de estudo integrado dentro da Geografia Física com a
possibilidade de oferecer novas abordagens sobre a natureza. Para Tricart (1978), a noção de
estudos integrados percorre a evolução do pensamento da Geografia moderna, estando presente
nos estudos de Humboldt, Ritter, La Blache e dos grandes naturalistas e viajantes do século
XIX, como Darwin, Richthoffen, Dokoutchaev e Passarge. Ele define três componentes que
norteiam a perspectiva dos estudos integrados: a dimensão escalar do fenômeno, seu papel
relativo dentro do todo e sua posição na inserção espacial.
Para a realização desses estudos, ocorre por parte da Geografia a incorporação do
paradigma sistêmico associado ao conjunto de seu arcabouço conceitual. “O princípio filosófico
sistêmico constitui um importante aspecto da metodologia filosófica que organicamente
pertence à dialética materialista” (RODRIGUEZ et al., 2004, p.41). Um sistema consiste num
conjunto de elementos, qualificados através de atributos, que se relacionam entre si por cadeias
de relações com um certo grau de organização e com uma finalidade (CLAUDINO-SALES,
2004; CHRISTOFOLETTI, 1979):
31
O conjunto dos elementos que compõem os sistemas implica conhecer suas
qualidades, observando sua dinâmica, que podem gerar auto-organizações caóticas ou
não a partir da dissipação interna de suas estruturas provocadas por pequenas ou
grandes flutuações. (CAMARGO, 2008, p.55)
A incorporação da abordagem sistêmica à Geografia ocorre inicialmente de 1935 a
1971, sendo adotada sucessivamente pela Biogeografia, Geografia dos Solos, Climatologia e
Geomorfologia. O lançamento, em 1971, do livro Physical Geography: A Sytems Approach, de
R. Choley e B. Kennedy, vem mostrar como as ideias da teoria dos sistemas1 são compatíveis
com o conhecimento do mundo físico e seus processos. Um dos principais avanços
incorporados pelo advento da visão sistêmica foi à aproximação dos diversos ramos da
Geografia Física retardando ou mesmo revertendo a sua especialização e de certa forma o seu
distanciamento da Geografia Humana (GREGORY, 1992).
O conceito de paisagem acompanha o desenvolvimento do pensamento geográfico,
assumindo significados e graus de relevância distintos em variados contextos históricos e
teórico-metodológicos, tornando-o bastante complexo:
A paisagem emerge na análise geográfica carregada de simbolismo, sendo
responsável pela constituição do imaginário social que atua na condução da ação dos
atores sociais, ao mesmo tempo em que mediatiza a representação do território por
estes mesmos atores. Neste sentido, a paisagem como categoria social é construída
pelo imaginário coletivo, historicamente determinado, que lhe atribui uma
determinada função social. (VITTE, 2007, p.71)
Segundo Rodriguez et al. (2004), a Geografia, ao estudar as paisagens naturais,
evolui sobre duas perspectivas: uma predominantemente biofísica (com influência estudos de
Humboldt e Dokoutchaev) fundamentada nas escolas alemã e russo-soviética e que concebe a
paisagem como um complexo natural integral e outra, essencialmente sociocultural, que analisa
a paisagem como um espaço social ou uma entidade perceptiva.
Em ambos os casos, a visão de paisagem enfatiza a análise do todo, em uma
dimensão basicamente espacial. Na verdade, já existia no século XIX a busca de uma
perspectiva metodológica que possibilitasse uma visão sistêmica e de conjunto da natureza em
sua interação com a sociedade a exemplo da utilização do termo alemão Landschaft e do francês
1A Teoria Geral dos Sistemas proposta pelo biólogo Ludwig Von Bertalanffy em 1968 é um importante campo
metodológico que se propõe, entre outras coisas, suplantar a fragmentação e perceber os fenômenos a partir de sua
interconectividade holística’ (CAMARGO, 2008 p.51).
32
Paysage. Porém, é no século XX, sobre a necessidade de demonstrar o caráter único de
determinadas parcelas da superfície terrestre, que o conceito de paisagem ganha uma nova
essência. Sobre uma ampla integração de variáveis seria possível individualizar unidades de
área com base na identificação da interação entre a apropriação de um território pelo homem e
sua base física (FERREIRA, 2010). Assim,
A geração da paisagem é o resultado imediato da intencionalidade humana na
superfície terrestre. Seja ontem ou hoje, por meio dos mais variados meios técnicos e
científicos, a sociedade imprime sua marca no espaço que fica registrada na paisagem.
Assim, a paisagem é uma representação do espaço. Na Ciência Geográfica e
particularmente na geografia física, a paisagem passa a ser o sinônimo de natureza.
(VITTE, 2007, p. 77)
Nesse direcionamento, a abordagem sistêmica passa a ser o arcabouço teórico mais significativo
para tratar a complexidade da funcionalidade das paisagens em diferentes graus de humanização
pela Geografia. É sobre a Teoria Geral dos Sistemas que fecundas técnicas e metodologias se
desenvolvem no âmbito do estudo geográfico da paisagem, afinal “estudar uma paisagem é
antes de tudo apresentar um problema de método” (BERTRAND, 1971, p.2).
Surgem, portanto, as abordagens integradas dentro dos estudos da Geografia, cada
uma a sua especificidade, mas sempre na tentativa de integrar as questões naturais e sociais,
como serão exemplificadas a seguir.
3.1.1 Das Abordagens Integradas à Proposição do Sistema GTP
A escola russo-soviética, em sua aplicação da Geografia na organização do Estado
soviético, dará importante contribuição aos estudos integrados, colocando a Geografia Física
como um campo particular das ciências naturais a partir do estudo não dos componentes da
natureza, mas da conexão entre esses, abandonando a análise morfológica da paisagem e
dedicando-se ao estudo da sua dinâmica, estrutura funcional, conexões etc. (SOTCHAVA,
1978).
O objetivo de sua análise seria o estudo do geossistema, um tipo de sistema físico
aberto e hierarquicamente organizado, uma expressão da troca de matéria e energia na paisagem
delimitados através de unidades a partir da funcionalidade sistêmica de seus atributos. O
principal nome associado a essa escola é o de V. Sotchava, em que, para ele, a abordagem
geossistêmica é um modelo teórico e conceitual destinado a identificar, interpretar e classificar
33
a paisagem terrestre levando em conta sua homogeneidade e dinâmica interna, possíveis de
zoneamento e espacializada no território.
A construção teórica do geossistema avança metodologicamente com G. Bertand.
Sua abordagem propõe uma conceituação para a paisagem conferindo igual peso aos aspectos
bióticos e abióticos na organização dos sistemas naturais, a escala passa ser uma noção central,
o que exige a adoção de um sistema taxonômico de classificação numa perspectiva espaço-
temporal, e a influência das dinâmicas sociais passa a ser considerada na dinâmica dos sistemas
naturais a partir da noção de ação antrópica.
Outra abordagem integrada da Geografia Física é a Ecodinâmica de J. Tricart.
Considerando a importância da metodologia sistêmica, o autor vê nesta abordagem a
possibilidade de superar as leituras unilaterais da Geografia Física e o excessivo enfoque
biocêntrico da Ecologia. Desta maneira, passa a analisar o fluxo de matéria e energia entre
atmosfera, biosfera e litosfera, concluindo que a morfodinâmica é o elemento central na
estabilidade das unidades ecodinâmicas, sua unidade espacial de referência, classificando-as
em estáveis, intergrades e instáveis de acordo com as repercussões da dinâmica do meio
ambiente sobre a biocenose. Identificadas as unidades é possível determinar como determinado
tipo de uso poderia intervir na dinâmica natural e assim corrigir aspectos desfavoráveis e
facilitar a utilização dos recursos ecológicos.
Fica evidente, pela sua abordagem espacial e classificação tipológica, a vocação de
tais enfoques para a gestão e ordenamento do território, a análise integrada surge como
ferramenta para uma leitura da relação homem-natureza, constituindo relevante meio para a
preservação e conservação ambiental.
Bertand (2007) vê, a partir do contexto francês, no desenvolvimento dos estudos
integrados uma ruptura metodológica e epistemológica na Geografia Física e que a tentativa de
contato entre as ciências da natureza em recomposição com as problemáticas do meio ambiente,
a partir de uma reflexão generalizada para a ciência geográfica em sua globalidade, o futuro
para o desenvolvimento desta ciência. É sobre as reflexões advindas da trajetória acadêmica
desse autor que se construirá o referencial teórico-metodológico para a presente pesquisa.
Para George Bertand, a complexidade da questão ambiental revela os limites dos
esforços científicos até então empregados nos estudos da natureza e em sua relação com a
sociedade, desde as incoerências praticadas até a necessidade de novos avanços. Logo, sua
posição recai sobre a realização de importantes reflexões epistemológicas que se desdobram
em abordagens teórico-metodológicas de bases práticas. A relação sociedade-natureza se
modificara ao logo do tempo, e a geografia não conseguiu acompanhar está evolução, ficando
34
a margem de outras abordagens, tal como a da ecologia. Na verdade, é pela ecologia que toda
uma nova forma de entender e se relacionar com a natureza ganha relevância dentro da questão
ambiental2.
Este caráter excessivamente ecológico tomou para si a capacidade de globalizar,
conceituar, sistematizar e modelar as diversas pesquisas naturalistas. Aqui, o conceito de
ecossistema tornou-se ferramenta fundamental. Ele surgiu sem a pretensão de substituir as
abordagens setoriais clássicas, trata-se de uma evolução no âmbito das ciências naturais em que
a análise das partes é levada em consideração na medida em que é posicionada em uma estrutura
de inter-relações.
O ecossistema resolveu a análise integrada da biosfera ao mesmo tempo nos planos
teórico e prático. Na entrada do sistema, estão as plantas verdes e a fotossíntese que,
pela assimilação clorofiliana, determinam o funcionamento complexo e hierarquizado
do encadeamento trófico. O circuito da matéria é estabelecido e cientificamente
dominado. (BERTRAND, 2007, p.72)
Apesar dos avanços incorporados pela abordagem ecossistêmica, a ecologia é, na
visão de Bertrand, uma “ciência unívoca”, uma visão de finalidade biológica que marginaliza
os aspectos abióticos e possui escala espaço-tempo bastante variável, além do que, no campo
social, por certo empobrecimento conceitual, favorece o desenvolvimento de visões
mecanicistas e deterministas na análise social.
Ao tentar realocar o papel da Geografia Física nas análises naturalistas, Bertand
quer situar às sociedades em sua prática no espaço geográfico em novas bases. O
desenvolvimento de uma ciência fragmentada e dicotomizada levou ao aparecimento de uma
Geografia Física desnaturalizada, sustentada por uma reflexão insuficientemente sistemática e
contínua sobre a teoria, o método e a epistemologia. Para tal, Bertrand visualiza no postulado
materialista de que a sociedade está na natureza e não separada dela, uma visão renovada sobre
o papel dessa disciplina. É precisamente sobre a perspectiva da análise integrada que a
Geografia Física “reencontraria” a natureza, a partir da conceituação do geossistema, não se
tratando, porém, de uma conceituação da natureza, mas de um conceito naturalista do espaço
geográfico.
2Sobre este ponto de vista Bertrand afirma ‘a ecologia acaba de reinventar a natureza e de redesenhar uma
economia política do planeta’ (BERTRAND, 2007 p. 83) e corroborando com ela Koppes (1988 apud Diegues,
2001) afirma que a ecologia foi a base científica para uma sociedade pragmática que buscava objetividade e
utilidade.
35
No entanto, o conceito de geossistema, assim como o de ecossistema, não pode ser
transportado para a análise social, pois esse representa uma leitura não hierarquizada do
“complexo geográfico natural”, além do que a pretensão de abarcar a totalidade da interface
entre natureza e sociedade por um conceito único trata-se de uma abordagem reducionista para
a problemática ambiental. Aqui, o postulado ganha um desdobramento epistemológico,
precisando-se adotar uma estratégia de interface entre as ciências sociais e da natureza a fim de
dar conta da complexidade e diversidade dos objetos analisados, reconhecer as sociedades em
seus meios e ressignificar os meios nas sociedades. Ao mesmo tempo, é necessário, dentro dos
novos paradigmas da ciência, levar em consideração o ressurgimento do sensível e das
sensibilidades, ou seja, abrir espaço nos estudos ambientais para a dialética sujeito e objeto.
Nesse cenário, os geógrafos, intercessores de um conhecimento naturalista e, de
certas formas de análise social, estão, sem dúvida, em situação privilegiada no tratamento dos
problemas do meio ambiente. Todavia, trata-se mais de uma contribuição frente às novas
formas de interdisciplinaridade e de disciplinaridade impostas pela generalização da questão
ambiental do que da reafirmação dessa ciência. A problemática da natureza é ao mesmo tempo
social e espacial e é reafirmando essa questão que os geógrafos poderão dar sua contribuição
efetiva.
A natureza na Geografia é primeiramente espaço, um espaço cada vez menos
natural e cada vez mais antropizado. O antrópico3, aqui, qualifica a ação direta ou indireta das
sociedades sobre seus territórios, os objetos e os processos, não são nem sociais nem naturais
se não híbridos. Sobre essa teoria é que Bertrand (2007) entende ser necessário territorializar o
meio ambiente na busca de uma compreensão geográfica do mesmo, uma vez que é a finalidade
social que serve de base para o sistema de interpretação geográfica da natureza.
Contudo, para a exploração geográfica da interface natureza-sociedade torna-se
necessário uma abordagem metodológica que consiga aprendê-la em sua complexidade e
diversidade, evitando uma conceituação unívoca frente ao cruzamento das dinâmicas sociais e
naturais. Nesse sentido, G. Bertrand propõe o sistema GTP (Geossistema-Território-Paisagem),
na qual “sua função essencial é de relançar a pesquisa ambiental sobre bases multidimensionais,
no tempo e no espaço, quer seja no quadro de disciplinas ou mesmo em formas de construção
da interdisciplinaridade” (BERTRAND, 2007, p. 272).
3Enfim, para levantar qualquer equívoco, é preciso insistir sobre o fato de que este conceito antrópico não é em
nada um conceito social. Ele não tem por função explicar a sociedade na sua relação com o território, mas de
entender a fisionomia e o funcionamento do território sob o impacto da sociedade (PASSOS, 2011 p.14).
36
Tal proposição teórico-metodológica se utiliza de um sistema conceitual
tridimensional no intuito de definir três campos semânticos (Figura 01), cada um à sua própria
finalidade, sobre uma perspectiva totalizante da relação entre o natural e o social na constituição
da paisagem. Eles promovem a consideração das diversas dimensões espaço-temporais de
maneira que possam ser complementares e correlacionáveis na leitura do objeto de estudo
(VIEIRA, 2011).
O geossistema é considerado como uma fonte (source), permitindo a compreensão
da estrutura e funcionamento biofísico de um espaço geográfico, inclusive seus níveis de
antropização. Trata-se de uma dimensão geográfica dos estudos da natureza levando em
consideração uma perspectiva temporal e histórica considerando a sua evolução e fenologia
(estados do geossistema) e uma perspectiva espacial definida a partir de uma leitura escalar com
duas entradas uma horizontal (geótopo, geofácies, geocomplexo4 etc.) e outra vertical
(geohorizontes).
O território funciona como uma entrada socioeconômica (ressource) a partir do qual
se tem a possibilidade de compreender as repercussões da sociedade na organização e
funcionamento do espaço considerado, tratando-se de uma interpretação socioeconômica do
geossistema. A dialética fonte-recurso fundamenta esta análise do território. Nas análises
ambientais, o conceito de território revela as diferentes maneiras pelas quais a sociedade se
apropria e modifica a natureza por meio das relações de poder, o tempo do território e aquele
no qual a fonte se torna recurso.
A paisagem, uma entrada sociocultural, de tempo longo e identitário
(ressurcement), que se presta para avaliar como as ações das sucessivas sociedades se
materializam no território para construir as sucessivas paisagens. É, ao mesmo tempo, uma
ponte entre a análise natural e social, assumindo assim um caráter polissêmico, ou seja, é
natural, social, econômica e cultural.
4O geocomplexo engloba as geofácies e geótopos bem como as relações estabelecidas entre elementos bióticos,
abióticos e antrópicos. O geocomplexo é a escala de análise geográfica; o geossistema se trata de uma construção
a nível teórico que baliza esta abordagem escalar.
37
3.1.2 O Reencontro com a Paisagem e uma Proposição Metodológica para o Estudo
Geográfico Integrado Sobre as Áreas Protegidas.
Quando da publicação de Paisagem e Geografia Física Global: Esboço
Metodológico, em 1967, um dos seus artigos de maior repercussão, e sem dúvida de grande
difusão na Geografia brasileira, George Bertrand relata a imprecisão do uso comum do conceito
de paisagem, colocando o problema dentro de uma perspectiva epistemológica para a Geografia
Física. Este trabalho é influenciado pelos avanços nos estudos integrado do meio à época, são
eles: o desenvolvimento da ecologia americana a partir do conceito de ecossistema, a
Ecogeografia de Carl Troll (1966), a ciência da paisagem e o conceito de geossistema da escola
russa de Geografia, a teoria da biorresistasia de Erhart (1956) e as tentativas de Jean Tricart
(1978) em unir os estudos de relevo-solo-clima-vegetação.
Nesse texto, o estudo da paisagem não se realiza senão dentro de uma geografia
física global, afinal:
A paisagem não é a simples adição de elementos geográficos disparatados. É numa
determinada porção do espaço, o resultado da combinação dinâmica, portanto
instável, de elementos físicos, biológicos e antrópicos que reagindo dialeticamente,
uns sobre os outros fazem da paisagem um conjunto único e indissociável, em
perpetua evolução. (BERTRAND, 1971, p.2)
A abordagem da paisagem pela Geografia Tradicional fugia a essa visão global e
mais ainda de uma análise metodológica consequente. O desenvolvimento das grandes
monografias regionais e uma ausência de reflexão conceitual são os principais fatores dessa
Fonte: BERTRAND, 2007
Figura 01 - O Sistema GTP
38
abordagem, “o meio natural é então tratado em uma descrição compartimentada que se
desenvolve de forma deficitária em relação à problemática social” (BERTRAND, 2007, p. 216).
É o conceito de geossistema, que confere ao método sugerido por Bertrand, um
suporte operacional. Tal construção se coloca numa tentativa de ir contra a uma perspectiva de
ciência fragmentaria, uma adequação a um objeto de combinação natural e social e, ao mesmo
tempo, quer integrar os elementos na apreensão de suas inter-relações e não em busca de uma
síntese.
Não obstante, ao se situar a análise da paisagem entre a natureza e sociedade, a
utilização de abordagens naturalistas torna-se deficitária porque peca ao impor a realidade
social uma interpretação global sob um ponto de vista reducionista, tal como acontece na análise
ecossistêmica. Dentre outras complicações advindas desse tipo de análise, os problemas
relativos à questão ambiental incorrem em abordagens imprecisas e ineficientes quanto a sua
mitigação:
A pesquisa sobre meio ambiente5 não progredirá significativamente enquanto a gente
continuar a argumentar em termos de separação, mesmo de contradição e de conflito
entre fatos naturais e fatos sociais. Se o meio ambiente é, por definição, o domínio da
interação e da mescla, este deve ser traduzido por conceitos e noções híbridas:
paisagem, território, recurso etc. (BERTRAND, 2007, p. X).
Para avançar nessa direção é necessário levantar os problemas nos procedimentos
clássicos e setoriais da análise paisagística6 e, aqui, a abordagem sistêmica consiste no ponto
de partida. As concepções de paisagem maniqueístas que se opõem por fenômeno natural e
fenômeno cultural são um demonstrativo desse problema que é bem exemplificado pela noção
da paisagem enquanto espaço percebido, que ao identificar a paisagem enquanto mera
representação negligencia sua existência material e objetiva.
Bertrand (2007) pretende então, sobre uma inter-relação entre objeto-sujeito,
recolocar a paisagem enquanto sistema, que seja ao mesmo tempo social e natural, subjetiva e
objetiva, espacial e temporal, produção material e cultural, real e simbólica. Esse sistema
paisagístico circunscrito a um espaço real e associado a uma dinâmica ecológica específica é
antes de tudo uma interpretação social da natureza, só se qualifica em termos sociais, a partir
5O meio ambiente consiste num conjunto dos elementos externos que rodeiam a sociedade e interagem com ela
(BERTRAND, 2007 p. 232). 6Quanto à análise paisagística, ao custo de certo peso, deve ser um aprofundamento sem fim dos conhecimentos,
e especialmente desta interação entre elementos considerados diferentes, até disparates e contraditórios: biofísicos
e sociais, econômicos e culturais, patrimoniais e prospectivos, que combinados sobre um mesmo território, fazem
nascer a paisagem na sua aparente banalidade quotidiana (BERTRAND, 2007 p.291).
39
de um grupo social7 definido, de identificação e de utilização. Ao englobar uma série complexa
de relações, a paisagem pode ser considerada um “polissistema” que reagrupa outros sistemas
de forma quase autônoma (sistema natural, sistema social, sistema de produção econômica e
sistema de representação cultural etc.) e que não obedecem a uma continuidade no tempo e no
espaço em seus processos.
Combinando a diversidade biofísica dos meios e a pluralidade sociocultural do
vivido:
A paisagem se individualiza ao mesmo tempo em relação com o espaço propriamente
dito e com o mecanismo da percepção. Ela aparece cada vez mais como um produto
social historizado que permite interpretar o espaço geográfico nos limites de um
sistema de produção econômico e cultural. (BERTRAND, 2007, p. 232)
Ressignificada entre a natureza e sociedade, a paisagem pode ser analisada como
indicador dos processos de antropização, na medida em que ela representa o resultado material
do jogo de interações entre processos físicos, processos ecológicos, processos sociais e
processos culturais (PASSOS, 2006):
Consideramos aqui que a paisagem é parte de um todo; este todo sendo o território em
amplo sentido. Assim concebida, a paisagem não é apenas a aparência das coisas,
cenário ou vitrine. É também um espelho que as sociedades erguem para si mesmas e
que as reflete. Construção cultural e construção econômica misturada. E sob a
paisagem, há o território, sua organização espacial e funcionamento. (Bertrand, 2007,
p. 290)
Assim, toma-se a análise paisagística como ferramenta operacional na compreensão
dos processos de criação e gestão de áreas protegidas, uma vez que se parte do princípio de que
as políticas de desenvolvimento (sustentável) implicam modificações na materialidade
paisagística (PASSOS, 2011) tornando-a uma ferramenta de análise pertinente quanto às
dinâmicas espaciais na interface natureza-sociedade.
A principal política ambiental que rege a de institucionalização dessas áreas no
Brasil é o Sistema Nacional de Unidades de Conservação da Natureza (SNUC), criado no ano
de 2000 no intuito de preservar a biodiversidade através da proteção dos biomas brasileiros.
As políticas ambientais, tais como a da criação de áreas protegidas, colocam, cada
vez mais, a paisagem no centro de seus projetos e a análise paisagística no ponto de partida de
7Por grupo social entendemos um conjunto de indivíduos organizados dentro de um mesmo sistema de produção,
unidos entre eles por uma mesma prática da natureza e que produzem em conjunto coerente de bens materiais e
culturais (BERTRAND, 2007 p. 224-225).
40
sua metodologia (BERTRAND, 2007). Dessa forma, desenha-se como objeto de estudo para a
presente pesquisa (Gráfico 02) a apreensão da estratégia de criação e gestão de unidades de
conservação a partir da análise da paisagem. Uma vez que as políticas de ordenamento
territorial da criação e gestão dessas áreas impõem a adoção de medidas de proteção e de manejo
sobre os meios, os recursos e biodiversidade impõem sobre a paisagem uma mudança em seu
sistema de referência socioecológico, cultural e econômico, e por sua vez possível de apreensão
e de análise pelo estudo da paisagem.
Gráfico 02 – Construção do objeto de estudo
A paisagem, entendida enquanto resultado material dos processos físico-naturais, processos sociais e processos
culturais, serve como ferramenta para análise das políticas de desenvolvimento sustentável, tais como a criação de
unidades de conservação da política ambiental brasileira. Uma vez que estas políticas impõem modificações sobre
seu sistema de referência socioecológica (como também são influenciadas por ele) e, por conseguinte, em sua
materialidade, a análise da paisagem se coloca como instrumento válido na apreensão e avaliação de tais políticas.
Fonte: Elaborado pelo Autor
Unidades de
Conservação
Criação e gestão PAISAGEM
Processos
físico-naturais
Processos
Socioeconômicos
Processos Culturais
41
3.1 A POLÍTICA AMBIENTAL BRASILEIRA E AS ÁREAS PROTEGIDAS: O SISTEMA
NACIONAL DE UNIDADES CONSERVAÇÃO – SNUC
A delimitação de espaços sobre regimes diferenciados de uso que visam o controle
sobre os recursos é uma prática de longa data na história da humanidade. O controle sobre a
extração de madeira e sobre a caça através de normas de controle sobre bosques, florestas e
áreas úmidas já era utilizado por culturas pré-agrárias na Ásia e Oriente Próximo a mais de 400
anos antes de Cristo (CASTRO JR. et al., 2009).
Modernamente, é a experiência da criação do Parque Nacional de Yellowstone, em
1872, nos Estados Unidos, que será a base e marco conceitual para a criação de áreas protegidas
em todo o mundo. A expansão para o oeste americano e a devastação produzida na criação de
novas colônias aliada a recente urbanização acabam por criar nos habitantes americanos o
sentimento de que parte da “riqueza natural” deveria ser preservada.
Dessa forma, com base em grande apelo estético e religioso sobre as áreas sem
ocupação humana, nasce nos Estados Unidos uma concepção de proteção da natureza baseada
na criação de espaços reservados, cujo uso seria controlado pelo poder público (DIEGUES,
1994; ARAÚJO, 2007). Inspirados nesse modelo diversos países aderem à criação de Parques
Nacionais: Canadá (1885), Nova Zelândia (1894), Austrália e a África do Sul (1898), México
(1894), Argentina (1903), Chile (1926) e Brasil (1937) (BENSUSAN, 2006).
Estão presentes nesse período os embates entre “preservacionismo” e
“concervacionismo”, os quais também influenciarão o debate em torno da criação de áreas
protegidas. A experiência americana está calcada numa ideia de que a natureza selvagem,
aquela intocada, era o verdadeiro refúgio do natural (wilderness), assim era as grandes áreas
não habitadas, principalmente após o extermínio dos índios, que seriam reservadas a recreação
da população urbana em crescimento (DIEGUES, 1994). Em contraponto a essa ideia, está a
percepção de que o uso racional e o manejo correto dos recursos, evitando o desperdício, são
práticas que legitimam a conservação da natureza para seus atuais e futuros usuários. Nesse
embate é que surgem as mais diferentes tipologias de áreas protegidas ao redor do mundo.
Para Castro Jr. et al. (2009), os modelos de proteção desenvolvidos são
condicionados pelos diferentes significados que as sociedades atribuem a natureza. Na Europa,
por exemplo, as áreas protegidas têm características de utilização sustentável devido a uma
cultura ligada a terra, enquanto os colonizadores europeus nas Américas desenvolveram uma
ideia de incompatibilidade entre homem e natureza.
42
Apesar da proliferação de Parques Nacionais pelo globo, uma definição mundial
sobre seus objetivos só aconteceria em 1933 durante a realização da Convenção para a
Preservação da Fauna e Flora em Londres. Nesse evento, foram elencadas três características
para os Parques Nacionais: “áreas controladas pelo poder público; áreas para a preservação da
fauna e flora, objetos de interesse estético, geológico e arqueológico, onde a caça é proibida; e
áreas de visitação pública” (BENSUSAN, 2006, p. 15). Na esteira de debates internacionais
acerca do tema, em 1948, foi criada a União Internacional para a Conservação da Natureza
(IUCN) que define áreas protegidas como:
Uma área terrestre e/ou marinha especialmente dedicada à proteção e manutenção da
diversidade biológica e dos recursos naturais e culturais associados, manejados
através de instrumentos legais ou outros instrumentos efetivos (UICN, 1994, p.12).
Outro destaque no debate mundial sobre as áreas protegidas trata-se da Convenção
da Diversidade Biológica (CDB) estabelecida durante a ECO-92 na cidade do Rio de Janeiro.
Esse tratado visa assegurar entre os Estados signatários a conservação da biodiversidade, o seu
uso sustentável e a justa repartição dos benefícios provenientes do uso econômico dos recursos
genéticos, para isso ele define em seu artigo oitavo a:
Art. 8º Conservação in situ8
Cada parte contratante deve, na medida do possível e conforme o caso:
a) Estabelecer um sistema de áreas protegidas ou áreas onde medidas especiais
precisem ser tomadas para conservar a diversidade biológica;
b) Desenvolver, se necessário, diretrizes para a seleção, estabelecimento e
administração de áreas protegidas ou áreas onde medidas especiais precisem ser
tomadas para conservar a diversidade biológica;
c) Regulamentar ou administrar recursos biológicos importantes para a conservação
da diversidade biológica, dentro ou fora de áreas protegidas, a fim de assegurar sua
conservação e utilização sustentável;
d) Promover a proteção de ecossistemas, habitats naturais e manutenção de
populações viáveis de espécies em seu meio natural;
e) Promover o desenvolvimento sustentável e ambientalmente sadio em áreas
adjacentes às áreas protegidas a fim de reforçar a proteção dessas áreas. (BRASIL,
2000, p.02)
Todo esse contexto influencia na criação de áreas protegidas no Brasil e será
responsável pela formulação de políticas de proteção ambiental, fato que exerce profunda
8Significa a conservação de ecossistemas e hábitats naturais e a manutenção e recuperação de populações viáveis
de espécies em seus meios naturais e, no caso de espécies domesticadas ou cultivadas, nos meios onde tenham
desenvolvido suas propriedades características.
43
consequência sobre os ritmos de transformação da paisagem e que se passará a analisar mais
detalhadamente.
Apesar de durante o período colonial e imperial alguns esforços terem sido
tomados no intuito de resguardar os recursos naturais brasileiros, é somente no período da
república que instrumentos mais concisos ganham corpo. Na constituição republicana, a
proteção da natureza passava a ser agenda governamental, constituindo tarefa a ser cumprida e
fiscalizada pelo poder público. É nesse momento histórico que são criados: o Código Florestal
(Decreto 23793/1934), o Código de Águas (Decreto 24643/1934), o Código de Caça e Pesca
(Decreto 23672/1934) e o decreto de proteção aos animais (Decreto 24645/1934) (MEDEIROS,
2006).
Dentre eles, o Código Florestal merece maior destaque no tocante as áreas
protegidas, pois em seu escopo é definido as bases para a proteção territorial dos principais
ecossistemas florestais e demais formas de vegetação naturais do país, além de ser o primeiro
instrumento a definir tipologias de áreas a serem protegidas. Nesse período, a preservação da
natureza estava intimamente relacionada com um sentimento de identidade nacional, no qual
grande parte dos intelectuais ajudava a construir e que seria responsável por influenciar as
políticas e instituições da época (DRUMOND e FRANCO, 2009). É nesse contexto que será
criado o primeiro Parque Nacional brasileiro, o Parque Nacional de Itatiaia em 1934.
Até meados da década de 1970, a política ambiental brasileira de proteção à
natureza vai sendo incrementada com a criação de novas tipologias de áreas protegidas
(reservas biológicas, estações e reservas ecológicas e áreas de proteção ambiental) com o
aperfeiçoamento de normas jurídicas na proteção da fauna e flora (Código Florestal de 1965,
Lei de Proteção à Fauna, 1967). No entanto, o destaque para esse período é a criação de um
aparato de gestão na elaboração e execução de uma política ambiental. Em 1967 é criado o
Instituto Brasileiro de Desenvolvimento Florestal (IBDF) e em 1973 a Secretaria Especial de
Meio Ambiente (SEMA).
Dessa forma, na esteira da evolução dos instrumentos brasileiros de criação de áreas
protegidas, um importante passo é dado na nova constituição do país em 1988. Na mais recente
carta magna, o meio ambiente ganha um capítulo específico no qual se garante que:
Art. 255 todos têm direito ao meio ambiente ecologicamente equilibrado, bem de uso
comum do povo e essencial à qualidade de vida impondo-se ao poder público e à
coletividade o dever de defendê-lo e preservá-lo para as presentes e futuras gerações.
(BRASIL, 1988)
44
Definidos os deveres do poder público, o texto estabelece que:
§ 1º Para assegurar a efetividade desse direito, incube ao poder público:
[...]
III – definir, em todas as unidades da Federação, espaços territoriais e seus
componentes a serem especialmente protegidos, sendo a alteração e a supressão
permitidas somente através de lei, vedada qualquer utilização que comprometa a
integridade dos atributos que justifiquem sua proteção; (BRASIL, 1988)
Ratificando o compromisso constitucional, a Política Nacional do Meio
Ambiente (Lei nº 6939 de 31 de agosto de 1991), que visa estabelecer padrões que tornem
possível o desenvolvimento sustentável através de mecanismos e instrumentos capazes de
conferir ao meio ambiente uma maior proteção, enumera como um de seus instrumentos:
VI – a criação de espaços territoriais especialmente protegidos pelo Poder Público
federal, estadual e municipal tais como áreas de proteção ambiental, de relevante
interesse ecológico e reservas extrativistas. (BRASIL, 1981)
Apesar de criadas, algumas dessas áreas protegidas encontravam dificuldades em
sua gestão uma vez que inexistia um sistema9 que as interligasse a uma política de Estado.
Ainda, segundo Araújo (2005), até a década de 1970 a criação de áreas protegidas obedecia a
critérios estéticos ou ao favorecimento de grupos políticos, o que evidenciava a falta de um
planejamento e adoção de critérios técnico-científicos. A ausência de tal sistema impedia, por
exemplo, que fossem estabelecidas metas para a preservação de parcelas representativas dos
biomas brasileiros.
Uma proposta de lei para a criação de um sistema seria feita em 1988 e tramitaria
pelo congresso por oito anos devido aos embates entre ambientalistas, setores produtivos e
proprietário de terras (MERCADANTE, 2001). Até que seria criado um sistema nacional de
proteção à natureza a partir de determinadas práticas de gestão territorial, com a Lei n°9.605 de
2000, o Sistema Nacional de Unidades de Conservação (SNUC).
O SNUC define Unidade de Conservação (UC) como:
espaço territorial e seus recursos ambientais, incluindo as águas jurisdicionais, com
características naturais relevantes, legalmente instituído pelo Poder Público, com
objetivos de conservação e limites definidos, sob regime especial de administração,
ao qual se aplicam garantias adequadas de proteção (BRASIL, 2000).
9 Conjunto organizado de áreas naturais protegidas que planejado, manejado e gerenciado como um todo é capaz
de viabilizar os objetivos nacionais de conservação (Milano,1988 apud Araújo,2005).
45
e tem como objetivos:
I - contribuir para a manutenção da diversidade biológica e dos recursos genéticos no
território nacional e nas águas jurisdicionais;
II - proteger as espécies ameaçadas de extinção no âmbito regional e nacional;
III - contribuir para a preservação e a restauração da diversidade de ecossistemas
naturais;
IV - promover o desenvolvimento sustentável a partir dos recursos naturais;
V - promover a utilização dos princípios e práticas de conservação da natureza no
processo de desenvolvimento;
VI - proteger paisagens naturais e pouco alteradas de notável beleza cênica;
VII- proteger as características relevantes de natureza geológica, geomorfológica,
espeleológica, arqueológica, paleontológica e cultural;
VIII - proteger e recuperar recursos hídricos e edáficos;
IX - recuperar ou restaurar ecossistemas degradados;
X - proporcionar meios e incentivos para atividades de pesquisa científica, estudos e
monitoramento ambiental;
XI - valorizar econômica e socialmente a diversidade biológica;
XII - favorecer condições e promover a educação e interpretação ambiental, a
recreação em contato com a natureza e o turismo ecológico;
XIII - proteger os recursos naturais necessários à subsistência de populações
tradicionais, respeitando e valorizando seu conhecimento e sua cultura e promovendo-
as social e economicamente. (BRASIL, 2000)
Como aparato administrativo, a Lei n°9.605/00 define o Ministério do Meio
Ambiente (MMA) como coordenador do sistema. O órgão consultivo e deliberativo responsável
por acompanhar a implantação do sistema é o Conselho Nacional do Meio Ambiente
(CONAMA), com o objetivo de criar e administrar as UC o Instituto Chico Mendes (ICMbio)
e o IBAMA.
As unidades de conservação são divididas em duas categorias: 1) Áreas de proteção
integral, na qual são limitadas as atividades e os usos, bem como a retirada da população e a
regularização fundiária. 2) Unidades de Desenvolvimento Sustentável que visam compatibilizar
a conservação dos recursos naturais através da ordenação e da limitação de atividades
econômicas e sociais de caráter não sustentável que modificam os sistemas ambientais. O
SNUC passa a incorporar grande parte das áreas protegidas existentes e abre espaço para que
46
novas tipologias sejam incorporadas. A seguir, um quadro-resumo apresenta as tipologias do
SNUC e suas principais características:
47
Quadro 03 – Tipologia das Unidades de Conservação
(continua)
GRUPO CATEGORIA ORIGEM OBJETIVOS/DEFINIÇÃO QUEM PODE RESIDIR TIPO DE
CONSELHO
ATIVIDADES PERMITIDAS
CRIAÇÃO
DE
ANIMAIS
AGRICULTURA EXTRATIVISMO VISITAÇÃO PESQUISA
Pro
teçã
o I
nte
gra
l
Estação
Ecológica
SEMA
(1981)
Preservação da natureza e a realização
de pesquisas científicas
Proibida a permanência
de população tradicional
e proprietários, os quais
devem ser reassentados
e desapropriados
Consultivo Não Não Não Sim Sim
Reserva
Biológica
Lei de
Proteção
à Fauna
(1967)
Preservação integral da biota e demais
atributos naturais existentes em seus
limites, sem interferência humana di-
reta ou modificações ambientais, exce-
tuando-se as medidas de recuperação
de seus ecossistemas alterados e as
ações de manejo necessárias para
recuperar e preservar o equilíbrio
natural, a diversidade biológica e os
processos ecológicos naturais.
Proibida a permanência
de população tradicional
e proprietários, os quais
devem ser reassentados
e desapropriados
Consultivo Não Não Não Sim Sim
Parque
Nacional
Código
Florestal
(1934)
Preservação de ecossistemas naturais
de grande relevância ecológica e beleza
cênica, possibilitando a realização de
pesquisas científicas e o
desenvolvimento de atividades de
educação e interpretação ambiental, de
recreação em contato com a natureza e
de turismo ecológico.
Proibida a permanência
de população tradicional
e proprietários, os quais
devem ser reassentados
e desapropriados
Consultivo Não Não Não Sim Sim
Monumento
Natural
SNUC
(2000)
Preservar sítios naturais raros, singu-
lares ou de grande beleza cênica. Proprietário de Terra Consultivo Sim* Sim* Não Sim Sim
Refúgio de
Vida
Silvestre
SNUC
(2000)
Proteger ambientes naturais onde se
asseguram condições para a existência
ou reprodução de espécies ou comuni-
dades da flora local e da fauna residente
ou migratória
Proprietário de Terra Consultivo Sim* Sim*
Não Sim Sim
48
Quadro 03 – Tipologia das Unidades de Conservação
(continua)
GRUPO CATEGORIA ORIGEM OBJETIVOS/DEFINIÇÃO QUEM PODE RESIDIR TIPO DE
CONSELHO
ATIVIDADES PERMITIDAS
CRIAÇÃO
DE
ANIMAIS
AGRICULTURA EXTRATIVISMO VISITAÇÃO PESQUISA
Uso
Su
sten
táv
el
Área de
Proteção
Ambiental
(APA)
SEMA
(1981)
Área em geral extensa, com um
certo grau de ocupação humana, dotada
de atributos abióticos, bióticos,
estéticos ou culturais especialmente
importantes para a qualidade de vida e
o bem-estar das populações humanas, e
tem como objetivos básicos proteger a
diversidade biológica, disciplinar o
processo de ocupação e assegurar a
sustentabilidade do uso dos recursos
naturais.
Proprietário de Terra
População Tradicional Consultivo Sim Sim Sim Sim Sim
Área de
Relevante
Interesse
Ecológico
(AIRE)
SEMA
(1984)
Área em geral de pequena extensão,
com pouca ou nenhuma ocupação
humana, com características naturais
extraordinárias ou que abriga
exemplares raros da biota regional, e
tem como objetivo manter os
ecossistemas naturais de importância
regional ou local e regular o uso
admissível dessas áreas, de modo a
compatibilizá-lo com os objetivos de
conservação da natureza.
Proprietário de Terra
População Tradicional Consultivo
Animais
nativos
Plantas
nativas Sim Sim Sim
Floresta
Nacional
(FLONA)
Código
Florestal
(1934)
Área com cobertura florestal de
espécies predominantemente nativas e
tem como objetivo básico o uso
múltiplo sustentável dos recursos
florestais e a pesquisa científica, com
ênfase em métodos para exploração
sustentável de florestas nativas.
População Tradicional Consultivo Sim** Sim** Sim Sim Sim
49
Quadro 03 – Tipologia das Unidades de Conservação
(conclusão)
GRUPO CATEGORIA ORIGEM OBJETIVOS/DEFINIÇÃO QUEM PODE RESIDIR TIPO DE
CONSELHO
ATIVIDADES PERMITIDAS
CRIAÇÃO
DE
ANIMAIS
AGRICULTURA EXTRATIVISMO VISITAÇÃO PESQUISA
Uso
Su
sten
táv
el
Reserva
Extrativista
(RESEX)
SNUC
(2000)
Área utilizada por populações
extrativistas tradicionais, cuja subsis-
tência baseia-se no extrativismo e,
complementarmente, na agricultura de
subsistência e na criação de animais de
pequeno porte e tem como objetivos
básicos proteger os meios de vida e a
cultura dessas populações e assegurar o
uso sustentável dos recursos naturais
da unidade.
População
Tradicional Deliberativo Sim Sim Sim*** Sim Sim
Reserva de
Fauna
Lei de
Proteção
à Fauna
(1967)
Área natural com populações animais
de espécies nativas, terrestres ou
aquáticas, residentes ou migratórias,
adequadas para estudos técnico-cien-
tíficos sobre o manejo econômico
sustentável de recursos faunísticos.
Proibida a perma-
nência de população
tradicional e pro-
prietários, os quais
devem ser reassen-
tados e desapropria-
dos
Consultivo Não Não Não Sim Sim
Reserva de
Desenvolvi
mento
Sustentável
(RDS)
SNUC
(2000)
Área natural que abriga populações
tradicionais, cuja existência baseia-se
em sistemas sustentáveis de exploração
dos recursos naturais, desenvolvidos ao
longo de gerações e adaptados às
condições ecológicas locais e que
desempenham um papel fundamental
na proteção da natureza e na
manutenção da diversidade biológica.
População
Tradicional Deliberativo Sim Sim Sim Sim Sim
Reserva
Particular do
Patrimônio
Natural
(RPPN)
MMA
(1996)
Área privada, gravada com perpetui-
dade, com o objetivo de conservar a
diversidade biológica.
Proprietário de Terra Não
possui Não Não Não Sim Sim
50
*Desde que compatível com as finalidades da unidade.
** Apenas para as populações tradicionais que são residentes.
*** Admitido somente em casos especiais e complementares as demais atividades da RESEX.
Fonte: Elaborado pelo autor a partir de BRASIL (2000) e MEDEIROS (2005).
51
Fica evidente que a criação e gestão de unidades de conservação têm influência na
composição da paisagem. Portanto, a fim de entender como o SNUC modifica o seu sistema de
referência socioecológica, serão listados os principais instrumentos e conceitos por ele
definidos.
3.1.1 Instrumentos do SNUC
3.2.1.1 Criação de unidades de conservação
As unidades de conservação são instituídas pelo poder público e sua criação deve
ser precedida por estudos técnicos que devem especificar sua localização, dimensão e limites.
Em sua criação, as UC devem passar por consulta pública (exceto as Reservas Biológicas e as
Estações Ecológicas), o que, para Bensusan (2006), consiste num dos grandes avanços do
SNUC, na medida em que permite a inclusão das comunidades locais gerando a democratização
das áreas protegidas, evitando muitos conflitos.
Em seu Art.5, inciso VIII, a lei do SNUC determina ainda que a criação e gestão
das unidades de conservação ocorram de forma integrada com as políticas de terras e águas
circundantes, considerando as necessidades sociais e econômicas. Nesse sentido, a legislação
busca minimizar os conflitos compatibilizando os objetivos de diferentes instrumentos na
conservação dos recursos naturais.
3.2.1.2 Obrigação do empreendedor de apoiar unidades de conservação
O art. 36 do SNUC define que empreendimentos de significativo impacto ambiental
devam apoiar a implantação e manutenção de unidades de conservação do Grupo de Proteção
Integral. O Estudo de Impacto Ambiental e seu respectivo relatório devem servir de base para
que o órgão ambiental competente defina o grau do dano causado pelo empreendimento. As
unidades a serem criadas e/ou beneficiadas devem estar na área de influência do
empreendimento.
3.2.1.3 Corredores Ecológicos e Zonas de Amortecimento
52
Visando restringir os usos no entorno das UC, o SNUC estabelece normas que
garantam, por exemplo, a transferência genética e diminuam os impactos em suas
circunvizinhanças. Uma delas, a zona de amortecimento, é definida como:
O entorno de uma unidade de conservação, onde as atividades humanas estão sujeitas
a normas e restrições específicas, com o propósito de minimizar os impactos negativos
sobre a unidade (BRASIL, 2000)
A delimitação dessas zonas deve ser definida caso a caso (exceto para as RPPN e
APA em que não há instituição dessa área) e os limites devem ser estabelecidos pelo órgão
responsável pela administração da unidade. Na Estação Ecológica, Reserva Biológica e Refúgio
da Vida Silvestre uma vez definida formalmente, a zona de amortecimento, não pode ser
transformada em zona urbana. Os usos agrícolas ou pecuários já anteriormente existentes na
área de entorno da unidade de conservação, que se tornará zona de amortecimento não podem
ser impedidos por constituir uma desapropriação indireta (MACHADO, 2001).
Outro instrumento previsto é o corredor ecológico que se caracteriza por:
Porções de ecossistemas naturais ou seminaturais, ligando unidades de conservação,
que possibilitam entre elas o fluxo de genes e o movimento da biota, facilitando a
dispersão de espécies e a recolonização de áreas degradadas, bem como a manutenção
de populações que demandam para sua sobrevivência áreas com extensão maior do
que aquela das unidades individuais (BRASIL, 2000)
Tanto a zona de amortecimento quanto o corredor ecológico, geralmente, fazem
parte do domínio privado e dependem de regulamentação do plano de manejo ou mesmo do seu
ato de criação da unidade.
3.2.1.4 Mosaico de unidades de conservação
Unidades de conservação que estejam próximas ou sobrepostas, mesmo que de
categorias distintas, devem ser geridas de forma integrada e participativa. Os mosaicos devem
ser reconhecidos através de ato pelo MMA e passam a compatibilizar os diferentes objetivos de
conservação da biodiversidade, a valorização da sociodiversidade e o desenvolvimento
sustentável no contexto regional. Para sua gestão, são criados conselhos de caráter consultivo
compostos por membros dos conselhos das respectivas unidades que os compõem.
53
3.2.1.5 Conselho Gestor
Apesar da criação e manejo de UC serem papéis do Estado, a sua gestão deve ser
compartilhada, devendo haver a participação da sociedade civil. Dessa forma, para cada
unidade deve ser definido um conselho gestor com a participação de diversas esferas do poder
público, além de representantes da sociedade civil. Os conselhos possuem as seguintes
atribuições:
I - elaborar o seu regimento interno, no prazo de noventa dias, contados da sua
instalação;
II - acompanhar a elaboração, implementação e revisão do Plano de Manejo da
unidade de conservação, quando couber, garantindo o seu caráter participativo;
III - buscar a integração da unidade de conservação com as demais unidades e espaços
territoriais especialmente protegidos e com o seu entorno;
IV - esforçar-se para compatibilizar os interesses dos diversos segmentos sociais
relacionados com a unidade;
V - avaliar o orçamento da unidade e o relatório financeiro anual elaborado pelo órgão
executor em relação aos objetivos da unidade de conservação;
VI - opinar, no caso de conselho consultivo, ou ratificar, no caso de conselho
deliberativo, a contratação e os dispositivos do termo de parceria com OSCIP10, na
hipótese de gestão compartilhada da unidade;
VII - acompanhar a gestão por OSCIP e recomendar a rescisão do termo de parceria,
quando constatada irregularidade;
VIII - manifestar-se sobre obra ou atividade potencialmente causadora de impacto na
unidade de conservação, em sua zona de amortecimento, mosaicos ou corredores
ecológicos; e
IX - propor diretrizes e ações para compatibilizar, integrar e otimizar a relação com a
população do entorno ou do interior da unidade, conforme o caso. (BRASIL, 2000)
Os conselheiros têm mandato de dois anos, podendo ser renovado por igual período,
as reuniões devem ser públicas, com pauta preestabelecida no ato da convocação e realizada de
local de fácil acesso.
A gestão descentralizada da UC é uma das formas de garantir que conflitos em torno
das propostas de conservação/preservação ambiental sejam negociados pelos próprios atores
envolvidos, além de garantir espaço para que os próprios possam tomar decisões sobre os rumos
da unidade. Para Shenini et al. (2004 apud Castro Jr. et al., 2009), o papel do Estado não se
fragiliza, mas, ao contrário, se fortalece uma vez que permite a participação do controle social
da administração estatal sem enfraquecer sua função na formulação e implantação das diretrizes
políticas para a conservação.
10 Organização da Sociedade Civil de Interesse Público
54
3.2.1.6 Plano de manejo
A simples delimitação da UC não é o suficiente na garantia da proteção dos seus
recursos. Para tal, é necessário que sejam estabelecidas medidas de manejos11 capazes de
assegurar a efetividade da unidade. Para tanto, os conhecimentos científicos provindos de
diagnósticos sobre a UC devem ser complementados com um planejamento que defina um
conjunto de ações que devam ser tomadas no controle da unidade. Para essa finalidade, o SNUC
designa o plano de manejo12 que possui como objetivos:
• Levar a unidade de conservação (UC) a cumprir com os objetivos estabelecidos na
sua criação.
• Definir objetivos específicos de manejo, orientando a gestão da UC.
• Dotar a UC de diretrizes para seu desenvolvimento.
• Definir ações específicas para o manejo da UC.
• Promover o manejo da Unidade, orientado pelo conhecimento disponível e/ ou
gerado.
• Estabelecer a diferenciação e intensidade de uso mediante zoneamento, visando a
proteção de seus recursos naturais e culturais.
• Destacar a representatividade da UC no SNUC frente aos atributos de valorização
dos seus recursos como: biomas, convenções e certificações internacionais.
• Estabelecer, quando couber, normas e ações específicas visando compatibilizar a
presença das populações residentes com os objetivos da Unidade, até que seja possível
sua indenização ou compensação e sua realocação.
• Estabelecer normas específicas regulamentando a ocupação e o uso dos recursos da
zona de amortecimento (ZA) e dos corredores ecológicos (CE), visando a proteção da
UC.
• Promover a integração socioeconômica das comunidades do entorno com a UC.
• Orientar a aplicação dos recursos financeiros destinados à UC. (IBAMA, 2002 p.16)
O Plano de Manejo deve ser elaborado em até cinco anos após a criação da unidade
de conservação e sua construção deve realizar-se sob um enfoque multidisciplinar, refletindo
um processo de diagnóstico e planejamento. Em seu escopo devem ser analisadas informações
de diferentes naturezas, tais como dados bióticos e abióticos, socioeconômicos, históricos e
culturais sobre a Unidade de Conservação. Nas RESEX, RDS e APA, a participação pública é
obrigatória na elaboração de tal documento.
11Conjunto de ações e atividades necessárias ao alcance dos objetivos de conservação de áreas, incluindo as
atividades fins, tais como proteção, recreação, educação, pesquisa e manejo dos recursos, bem como as atividades
de administração e planejamento. (IBAMA & GTZ, 1996 apud ARAUJO, 2005 p. 117) 12Documento técnico mediante o qual, com fundamento nos objetivos gerais de uma unidade de conservação, se
estabelece o seu zoneamento e as normas que devem presidir o uso da área e o manejo dos recursos naturais,
inclusive a implantação das estruturas físicas necessárias à gestão da unidade. (BRASIL, 2000)
55
3.2.1.7 Zoneamento
O SNUC apresenta o zoneamento como a: “definição de setores ou zonas em uma
unidade de conservação com objetivos de manejo e normas específicos, com o propósito de
proporcionar os meios e as condições para que todos os objetivos da unidade possam ser
alcançados de forma harmônica e eficaz” (BRASIL, 2000).
O zoneamento constitui, portanto, um instrumento de ordenamento territorial usado
para se atingir melhores resultados no manejo da unidade. Para cada zona são estabelecidos
usos diferenciados, segundo objetivos pré-estabelecidos, dessa forma, cada zona será manejada
seguindo normas distintas baseadas em suas características ambientais. A adoção de critérios
no zoneamento está intimamente ligada à categoria da unidade em questão
3.2.1 Conflitos em unidades de conservação e o contexto cearense
Apesar de relativamente recente, o SNUC promoveu recente modificações no
cenário das áreas protegidas, tornando-se o mais importante instrumento em sua implantação.
Atualmente, cerca de 1.528.781km² (CNUC/MMA, 2013) encontram-se protegidos, conforme
podemos perceber no quadro a seguir a área total das unidades de conservação estadual e federal
duplicou após a criação do SNUC.
Tabela 01 - Número e extensão das unidades de conservação federais pré e pós SNUC
Fonte: Medeiros & Young (2011)
56
Em relação à proteção dos biomas, a CDB possui como meta estabelecer áreas
protegidas sob 10% de sua área total. Na realidade dos biomas brasileiros, as unidades de
conservação são responsáveis por contribuir por parcelas significativas na sua conservação
conforme se pode visualizar:
Gráfico 03 – Porcentagem do bioma protegido por unidades de conservação
Fonte: CNUC/MMA, 2013.
Elaborado pelo autor
Embora os dados revelem o aumento de áreas delimitas em regime especial de
proteção, é preciso ter ciência que em muitos casos a implantação e gestão dessas áreas
enfrentam inúmeras dificuldades, o que compromete o cumprimento dos objetivos previstos em
sua criação. Muitas áreas, apesar de constarem em registros oficiais, nunca tiveram, de fato, a
implementação das prerrogativas de regulamentação sobre seus recursos, os quais são
chamados de “parques de papel”.
Machlis & Tichnell (1985 apud Morsello, 2001) relatam a existência de diferenças
entre as ameaças que atingem parques em países desenvolvidos e em menos desenvolvidos.
Nos primeiros, as mais comuns são as ameaças externas como poluição química, mineração e
invasão de espécies exóticas, já nos segundos estão associadas ameaças de invasão, queimadas,
remoção de vegetação e animais e conflitos com população residente.
Em pesquisa realizada nas unidades de conservação de uso direto com mais de seis
anos de criação (totalizando 86 unidades a época) no Brasil, realizada pela ONG WWF, foi
constatado que 55% dessas unidades estão em situação precária, não oferecendo condições de
cumprir com o papel para as quais foram criadas; 37% foram consideradas minimamente
implementadas e somente 8,4% foram consideradas razoavelmente implementadas (WWF,
2000). O estudo aponta ainda que entre os principais problemas constatados em termos de
implementação estão a ausência de plano de manejo e o número inadequado de funcionários.
26,10%
8,90% 8,20% 7,40%4,60%
2,70%1,50%
Amazônia Mata Atlântica Cerrado Caatinga Pantanal Pampa Área Marinha
57
Para Medeiros & Young (2011), as dificuldades na implementação e manutenção
das UC estão relacionadas à quantidade insuficiente de recursos que não acompanharam as suas
expansões. Aliado a isso, a pesquisa científica limitada, a deficiente formação de pessoal, a falta
de programas de monitoramento e o déficit no conhecimento do comportamento dos
ecossistemas prejudicam na efetividade das unidades.
Em alguns casos, o SNUC é fragilizado em virtude dos vários interesses
econômicos. Pádua (2012) denuncia as intenções do Decreto Federal 7.154 de 9 de abril de
2010 que autoriza estudos de aproveitamento de potenciais de energia hidráulica e sistemas de
transmissão e distribuição de energia elétrica no interior de qualquer unidade de conservação
federal. Para a autora, a possibilidade de que estudos dessa natureza possam ser realizados
evidencia o descaso do governo com a preservação da biodiversidade na medida em que abre
precedente inconstitucional para tal aproveitamento no interior das UC.
Diegues (2001) acrescenta que a criação de áreas protegidas levanta inúmeros
problemas de caráter político, social e econômico, o que demonstra a complexidade da questão
para além de um enfoque naturalista. Primeiramente, a priorização de categorias de unidades
de conservação que excluem a presença de populações humanas, segundo a delimitação dessas
áreas gera significativo impacto fundiário e político-territorial. Por fim, a expulsão de
populações tradicionais de seus locais habituais de moradia gera conflitos sociais e étnicos.
Grande parte dos conflitos em UC ocorre na escala local, uma vez que é nessa escala
que se materializam as relações socioespaciais e o exercício do poder, a partir do fluxo de
material e informação e das ações de coerção do ordenamento territorial (CASTRO JR, 2009).
Assim, em algumas situações, os governos municipais, muitas vezes pressionados por
interesses locais, acabam por negligenciar e ferir a legislação ambiental federal em suas
propostas de ordenamento territorial gerando longas batalhas judiciais.
No contexto cearense da criação e gestão de UC, cerca de 3.254.775 ha do estado
encontram-se inseridos em áreas protegidas (Quadro 04). A nível jurídico foi instituído o
Sistema Estadual de Unidades de Conservação (SEUC) através da Lei nº14.390, de 07 de julho
de 2009, que visa agregar as unidades de conservação a nível estadual, federal e municipal na
proteção à diversidade de ecossistemas existentes no território estadual (Gráfico 04) dando
prioridade àqueles que se encontrarem mais ameaçados de degradação ou eliminação.
58
Quadro 04 – Unidades de Conservação do estado do Ceará
(continua)
Unidade de conservação Área (ha) Região Ecossistema
Total (1) 3.254.775
- -
Federal
APA da Chapada do
Araripe 1063000,0
Municípios do Ceará, Pernambuco e
Piauí Caatinga
APA da Serra da Ibiapaba 1625019,0 Municípios do Ceará e Piauí Cerrado
APA Delta do Parnaíba 313800,0 Municípios do Ceará, Piauí e Maranhão Cerrado
APA da Serra da Meruoca 608,0 Meruoca, Massapê, Alcântaras e Sobral Caatinga
Estação Ecológia de Aiuaba 11525,0 Aiuaba Caatinga
Estação Ecológica do
Castanhão 12579,0 Jaguaribe, Jaguaribara e Alto Santo Caatinga
Floresta Nacional de Sobral 598,0 Sobral Caatinga
Floresta Nacional do
Araripe-Apodi 38331,0
Barbalha, Crato, Jardim, Missão Velha,
Nova Olinda e Santana do Cariri Caatinga
Parque Nacional de Ubajara 6299,0 Ubajara, Tianguá e Frecheirinha Caatinga
Parque Nacional de
Jericoacoara 8416,0 Cruz e Jijoca de Jericoacoara Marinho
Reserva Extrativista do
Batoque 601,1 Aquiraz Marinho
Reserva Extrativista
Prainha do Canto Verde 29794,0 Beberibe Marinho
Estadual
Parque Ecológico do Rio
Cocó 1155,2 Fortaleza Manguezal
APA da Serra de Baturité 32690,0
Aratuba, Baturité, Capistrano, Caridade,
Guaramiranga, Mulungu, Pacoti e
Redenção
Serra Úmida
Parque Botânico do Ceará 190,0 Caucaia Vegetacional
Litorâneo
Parque Estadual Marinho
da Pedra da Risca do Meio 3320,0 Fortaleza Marinho
APA do Lagamar do
Cauípe 1884,5 Caucaia
Lacustre
Vegetacional
Litorâneo
APA da Serra da Aratanha 6448,3 Guaiúba/Maranguape/Pacatuba Serra Úmida
Estação Ecológica do
Pecém 973,09 São Gonçalo do Amarante/Caucaia Dunas
APA da Bica do Ipu 3485,7 Ipu Serra Úmida
APA da Lagoa do Uruaú 2672,6 Beberibe
Lacustre/Complexo
Vegetacional
Litorâneo
APA do Estuário de Rio
Ceará 2744,9 Fortaleza/Caucaia Manguezal/urbano
APA do Estuário do Rio
Mundaú 1596,4 Itapipoca/Trairi Manguezal
APA do Estuário do Rio
Curu 881,9 Paracuru/Paraipaba Manguezal
APA das Dunas da
Lagoinha 3909,6 Paraipaba Dunas
59
Quadro 04 – Unidades de Conservação do estado do Ceará (continua)
Unidade de conservação Área (ha) Região Ecossistema
APA das Dunas do
Paracuru 3909,6 Paracuru Dunas
APA do Pecém 122,8 São Gonçalo do Amarante
Lacustre
Vegetacional
Litorâneo
APA do Rio Pacoti 2914,9 Fortaleza/Euzébio/Aquiraz Costeiro
Corredor Ecológico do Rio
Pacoti 19405,0
Aquiraz/Itaitinga/Pacatuba/Horizonte/
Pacajus/ Acarape/Redenção
Costeiro/
Vegetacional
Litorâneo/
Caatinga
APA da Lagoa de Jijoca 3995,6 Jijoca de Jericoacoara/Cruz Lacustre
Mon. Natural Monólitos de
Quixadá 16635,6 Quixadá Caatinga
Mon. Natural das Falésias
de Beberibe 31,3 Beberibe Dunas /Falésias
Parque Estadual das
Carnaúbas 10005,0 Granja/Viçosa do Ceará Cerrado/Caatinga
ARIE do Sítio Curió 57,4 Fortaleza Enclave da Mata
Atlântica
Parque Estadual Sítio
Fundão 93,5 Crato Cerrado/Caatinga
Municipal
APA da Lagoa da Bastiana - Iguatu Lacustre
APA da Praia de Maceió 1374,1 Camocim
Costeiro/Complexo
Vegetacional
Litorâneo
APA de Balbino 250,0 Cascavel Costeiro
APA da Praia de Ponta
Grossa 558,7 Icapuí Costeiro
APA de Canoa Quebrada 4000,0 Aracati Costeiro
APA de Maranguape 5521,5 Maranguape Serra Úmida
APA de Tatajuba 3775,0 Camocim Costeiro
APA do Manguezal de
Barra Grande 1260,3 Icapuí Manguezal
APA de Sabiaguaba 1009,7 Fortaleza -
Parque Ecológico das
Timbaúbas 634,5 Juazeiro do Norte -
Parque Ecológico de
Acaraú - Acaraú
Complexo vegetal
litorâneo / Costeiro
Parque Natural das Dunas
de Sabiaguaba 467,6 Fortaleza -
Reserva Particular
RPPN Serra das Almas 4750,0 Crateús Caatinga
RPPN Fazenda Olho
D'Água do Urucu 2610,0 Parambu Caatinga
RPPN Serra das Almas II 495,0 Crateús Caatinga
RPPN Sítio Ameixas –
Poço Velho 464,0 Amontada Caatinga
RPPN Rio Bonito 441,0 Quixeramobim Caatinga
RPPN Fazenda Não Me
Deixes 300,0 Quixadá Caatinga
RPPN Monte Alegre 260,0 Pacatuba Mata Atlântica
60
Quadro 04 – Unidades de Conservação do estado do Ceará (conclusão)
Unidade de conservação Área
(ha) Região Ecossistema Unidade de conservação
RPPN Francy Nunes 200,0 General
Sampaio Caatinga
RPPN Sabiaguaba e
Nazário 50,0 Amontada Caatinga
RPPN Arajara Park 28,0 Barbalha Caatinga
RPPN Chanceler Edson
Queiroz 130,0 Guaiúba Mata Atlântica
RPPN Elias Andrade 208,0 General
Sampaio Caatinga
RPPN Mãe da Lua 764,0 Itapagé Caatinga
RPPN Serra da Pacavira 34,0 Pacoti Mata Atlântica
RPPN Paulino Veloso
Camelo 120,0 Tianguá Mata Atlântica
RPPN Sítio Palmeiras 75,0 Baturité Mata Atlântica
RPPN Reserva Cultura
Permanente 7,6 Aratuba Mata Atlântica
RPPN Belo Monte 15,7 Mulungu Mata Atlântica
RPPN Almirante Renato de
Miranda Monteiro 219,9
Novo
Oriente Caatinga
RPPN Passaredo 3,6 Pacoti Mata Atlântica
RPPN Neném Barros 63,2 Crateús Caatinga
Reserva Ecológica
Particular da Fazenda
Cacimba Nova
670,0 Santa
Quitéria Caatinga
Reserva Ecológica
Particular da Fazenda Santa
Rosa
280,0 Santa
Quitéria Caatinga
Reserva Ecológica
Particular de Sapiranga 58,8 Fortaleza
Complexo veg.
Litorâneo e
costeiro
Reserva Ecológica
Particular do Sítio do Olho
D'água
383,3 Baturité Serra úmida
Reserva Ecológica
Particular Jandaíra 54,5 Trairí
Complexo
vegetal
litorâneo
Reserva Ecológica
Particular Lagoa Encantada 40,0 Aquiraz -
Administradas pela Universidade Regional do Cariri (URCA) / Geopark Araripe
Monumento Natural
Ponta da Santa Cruz - Santana do Cariri -
Monumento Natural
Sítio Cana Brava - Santana do Cariri -
Monumento Natural
Riacho do Meio - Barbalha -
Monumento Natural
Cachoeira do Rio Batateira - Missão Velha -
(1) Exclusive a área da APA da Serra de Maranguape
Elaborado com base nos dados do Conselho de Políticas e Gestão do Meio Ambiente - CONPAM, Associação
Caatinga, Superintendência Estadual do Meio Ambiente - SEMACE.
Fonte: IPECE (2013)
61
De forma geral o SEUC mantém as tipologias e instrumentos previstos pelo SNUC
e adota como órgão consultivo e deliberativo o Conselho Estadual do Meio Ambiente
(COEMA). A Superintendência Estadual do Meio Ambiente (SEMACE) torna-se o órgão
executor e, portanto, como Órgão Central, responsável de coordenar e avaliar a implantação do
SEUC e propor a criação de UC estaduais, o Conselho de Políticas e Gestão do Meio Ambiente
(CONPAM).
Sobre a situação da implementação dos sistemas de unidade de conservação no
estado, Menezes et al. (2010) constataram que a média do tamanho das UC cearenses é de
13.974, 60 ha, considerando-a pequena. A criação de muitas unidades com tamanhos reduzidos
acaba por encarecer a manutenção do sistema, uma vez que serão demandados mais recursos
para estrutura e pessoal, o que pode comprometer sua viabilidade.
A SEMACE, em estudo sobre a avaliação das unidades de conservação, constatou
que havia baixa representatividade de unidades de proteção integral no estado e que das
unidades existentes poucas recobriam o bioma Caatinga. Em relação à gestão foi constatado
que havia perda da capacidade operativa dos conselhos gestores criados e/ou formados e
informações técnicas dispersas (SEMACE, 2010).
Ainda que em minoria, as unidades de uso direto foram avaliadas por Aguiar-Silva
et al. (2011) que averiguaram a inexistência de critérios técnico-científicos em 81% das
unidades criadas e que em muitas o plano de manejo não havia sido elaborado devido à
Gráfico 04 – Representatividade dos compartimentos geoambientais cearenses no
montante de áreas protegidas do Estado do Ceará
Fonte: Menezes et al. (2010)
62
dificuldade em efetuar a regularização fundiária das áreas. Ainda segundo os autores, no
entorno das UC havia grandes conflitos fundiários e a fiscalização ineficiente favorecia a
especulação imobiliária e o tráfico de animais.
O presente cenário demonstra a necessidade de aprofundar os conhecimentos sobre
as formas de criação e avaliação das unidades de conservação criadas a fim de enriquecer
teórico-metodologicamente e empiricamente os conhecimentos sobre áreas protegidas,
contribuindo para a melhoria em sua efetividade.
4. RESULTADOS E DISCUSSÕES
4.1 A APA DA SERRA DE MARANGUAPE NO CONTEXTO DA ANÁLISE INTEGRADA
DA PAISAGEM
4.1.1 Paisagens de Exceção: Os Brejos de Altitude no Cenário dos Domínios das
Caatingas.
No desenvolvimento dos estudos integrados do meio, merecem destaque os
trabalhos de Jean Trincat e André Cailleux a partir de suas pesquisas em geomorfologia. Na
década de 1950, os geógrafos franceses redigiram vários fascículos preliminares, que
constituem os volumes do Traité de Géomorphologie, que apresenta 12 volumes, 9 deles
relacionados à Geomorfologia Climática, além de Introduction à la Géomorphologie
Climatique (1965). Esses pesquisadores passaram a perceber a existência de vários sistemas
morfoclimáticos. Tais sistemas representam um complexo formado pela associação e interação
entre os elementos da paisagem, dessa maneira, as formas de relevo passam a ser entendidas a
partir da relação entre suas litologias, estruturas e com os meios orgânicos, como os vegetais,
animais e grupos humanos (GUERRA, 1975).
Influenciado pelos trabalhos de Jean Tricart e de Andre Cholley com a sua noção
de sistemas de erosão, acrescidas das reflexões de Kullmann, Monbeig e Aroldo de Azevedo,
o geógrafo brasileiro Aziz Ab’Sáber desenvolve a noção de domínios morfoclimáticos (VITTE,
2009). Seus estudos geomorfológicos tinham como elementos fundamentais, os quais eram
considerados chaves explicativas: a compartimentação topográfica, a estrutura superficial da
paisagem e a fisiologia da paisagem. Elaborando um painel descritivo e analítico dos domínios
da paisagem, com base nos ciclos de tempo e de espaço, Aziz Ab’Saber identificou seis
domínios paisagísticos e macroecológicos no Brasil (AURELIO NETO e SOARES, 2013). A
63
delimitação e caracterização da área de estudo da presente pesquisa tem como base a proposta
de Ab’Saber dos domínios morfoclimáticos (Figura 02), partindo do Domínio das Depressões
Interplanálticas Semiáridas do Nordeste e seus enclaves.
Figura 02 – Domínios morfoestruturais e morfoclimáticos do Brasil
Fonte: IBGE (2013)
O Domínio das Depressões Interplanálticas Semiáridas do Nordeste abrange cerca
de 800 mil km², o que corresponde a 11% do território nacional. Compreende os sertões que se
estendem do noroeste do estado de Minas Gerais, o vale médio inferior do São Francisco até o
Ceará e o Rio Grande do Norte. As temperaturas nessa região são quase sempre altas e
constantes variando entre 25 e 29º C durante o ano que é marcado por duas estações bem
definidas, uma seca e outra chuvosa. A estação seca dura de seis a sete meses, o que contribui
para que o balanço hídrico da região seja negativo e a evaporação de 2.000 mm ano-1 com a
64
umidade relativa do ar média em torno de 50%. As precipitações nos altos sertões ficam em
torno de 268 a 800 mm e são mal distribuídas espacialmente.
A variabilidade interanual das chuvas nessa região está associada à variações nos
padrões de Temperatura da Superfície do Mar (TSM) sobre os oceanos tropicais, os quais
afetam a posição e a intensidade da Zona de Convergência Intertropical (ZCIT) sobre o Oceano
Atlântico, que se caracteriza como o principal sistema climático na região. A baixa capacidade
de penetração dos alísios de sudeste também contribui para a variação de chuvas que acabam
por se concentrar no litoral e zona da mata onde as precipitações ultrapassam os 1000 mm.
Em relação aos aspectos litológicos, destaca-se a presença de feições
predominantemente erosivas (depressões sertanejas), deposicionais (terraços fluviais e glacis)
ou residuais (inselbergs e maciços). Nos terrenos cristalinos, a baixa porosidade limita o
potencial hidrogeológico e condiciona um padrão dendrítico de drenagem. Já nas áreas
sedimentares, como depósitos cenozóicos ou bacias sedimentares, a facilidade de infiltração
favorece uma pequena rede hídrica de rios e riachos, com padrões paralelos de drenagem e uma
fraca dissecação do relevo. Em sua grande parte, os terrenos da região são compostos por rochas
resistentes, tais como: os quartzitos, os granitóides e os arenitos. A presença de rochas
carbonáticas ao longo do semiárido nordestino ocorre nas bacias sedimentares fanerozóicas ou
em rochas do embasamento Pré-Cambriano, tais como o mármore ou a dolomita. (BASTOS &
CORDEIRO, 2012).
A combinação da escassez de umidade e a pouca permanência, ao longo do ano,
das águas no subsolo, produzem um baixo nível de decomposição química das rochas, o que
contribui para gerar solos descontínuos, afloramentos rochosos e eventuais manchas de terrenos
pedregosos (solos litólicos). A irregularidade nas chuvas também tornam sazonal o regime dos
rios que caracterizam-se como intermitentes e possuem como caracateristica própria a
drenagem aberta para o mar (AB’SÁBER, 2003).
A predominância dos processos de intemperismo físico, em relação aos processos
morfogênicos, é o principal fator na evolução geomorfológica do semiárido brasileiro. As
formas de relevo existentes são oriundas de um processo de pediplanação, o que forma extensas
superfícies de erosão. Essas são trabalhadas pelos rios do semiárido que em sua fraca
competência em entalhar vales faz com que as superfícies cristalinas apresentem suaves
ondulações com pequenas diferenciações altimétricas entre os fundos de vales e os interflúvios
(AB’SÁBER, 2003). Dessa maneira, há o predomínio das depressões sertanejas enquanto
unidade geomorfológica, porém ainda podem ser observadas feições residuais, como campos
de inselbergs e maciços cristalinos, relevos formados em bacias sedimentares, como cuestas,
65
planaltos, morros testemunhos e depressões periféricas, além de planícies de deposição
sedimentar cenozóica como os terraços fluviais e os tabuleiros pré-litorâneos (glacis) (BASTOS
& CORDEIRO, 2012).
A vegetação que se desenvolve nesse cenário é profundamente adaptada as
condições de clima e solo. A caatinga, nome que no tupi-guarani significa “mata branca”,
corresponde a um diversificado padrão florístico e fisionômico que possue como principal
característica o xeromorfismo e a caducifolia. Onde as condições climáticas são mais
moderadas, a caatinga assumem padrão arbóreo, enquanto que nas áreas core, ela se apresenta
com padrão arbustivo desno ou aberto (SOUZA, 2000). São representantes desse quadro
fitogeográfico espécies arbóreas como o angico (Piptadenia macrocarpa), o pereiro
(Aspidosperma pirifolium Mart.), a aroreira (Astronium urundeuva Engl.), o marmeleiro
(Croton sonderianus M. Arg.) e a Maria Preta (Cordia salzmanni DC), entre eles, também, as
cactáceas como o xique-xique (Cereus gounelli) e o mandacaru (Cerus jamacaru) e as espécies
arbustivas, jurema (Mimosa hostile), catingueira (Caesalpina bracteosa) e sabiá (Mimosa
caesalpinifolia).
Quadro 05 - Principais aspectos do Domínio Morfoclimático das Caatingas
▪ Influências diretas e indiretas exercidas pelas condições climáticas atuais e pretéritas; conjugação da
vegetação, termo-pluviometria, relevo e formações superficiais;
▪ Clima semiárido do tipo megatérmico e uma vegetação predominantemente xerófila (caatinga);
▪ As depressões semiáridas dão o tom desse domínio, enquanto baixadas de clima seco, extensas e onduladas,
com inselbergs e cristas residuais, sendo que, de quando em quando, se pronunciam vales e canais fluviais.
▪ A unidade de paisagem que se destaca, em termos de região natural, é a depressão sertaneja, enquanto área
interplanáltica semiárida no bojo da sub-compartimentação geomorfológica, com precipitações médias mensais
em 30 anos de 1029,5 mm. Trata-se de área deprimida e arrasada por erosão diferencial, correspondendo a
superfícies de erosão que se desenvolveu principalmente sobre rochas cristalinas, cristalofilianas e,
eventualmente,sedimentares;
▪ Evidências de pediplanos neogênicos, como também de intemperismo mecânico pronunciado desde os
períodos de afeiçoamento dos pediplanos. Há resquícios de pavimentos detríticos;
▪ A presença de inselbergs e a drenagem é intermitente sazonal.
Síntese dos processos morfogênéticos ou Sistema de Erosão
Processos areolares/trabalhamento
dos interflúvios Processos lineares/Esculturação de vales
Intemperismo físico predominante sobre o químico,
consequente das severidades climáticas e derivações
termo-pluviométricas, sendo comprovado pelas for-
mas erosivas, como nos afloramentos consequentes da
erosão diferencial (efeitos exógenos) que atuou sobre
rochas quartzíticas.
Exiguidade dos recursos hídricos, com efemeridade
dos rios e riachos, logo, pouca competência para
incisão; drenagem com padrão dentrítico preferen-
cialmente nas áreas do embasamento cristalino.
Pedogênese semiárida com formação de solos rasos ou
esqueléticos
Sedimentos fluviais mal trabalhados, por isso
grosseiros, que mantém os níveis de terraços fluviais.
Apresenta afloramentos rochosos e chãos pedregosos Vales usualmente bem encaixados em forma de “V”,
embora, geralmente, rasos.
66
Agressividade no escoamento superficial, quer seja
difuso, quer seja em lençol, provocando o surgimento
de caneluras, sulcos de erosão, ravinamentos,
voçoroca e torrentes.
Espraiamento de extensas planícies fluviais nos baixos
cursos d’água, sobretudo, nas regiões potamares.
Predominância de morfogênese mecânica na
elaboração de superfícies de erosão, provocando
pedimentos que coalescem para formarem pediplanos.
Os efeitos morfodinâmicos por meio de ações
hidráulicas propiciam a corrosão, atrição, transporte e
Acumulação em setores agradacionais.
Resultantes morfoclimáticos com destaque a geomorfologia
Superfícies aplainadas, apresentando feições de cristas e lombadas, relevo dissecado e suavemente ondulado.
A colonização dessa área seca começa no século XVII com a expansão da pecuária,
que visava abastecer as colônias no litoral e na defesa do território pelos portugueses contra as
invasões francesas. Segundo Andrade (2005), é a pecuária que dá origem as primeiras vilas e
aldeamentos no nordeste seco, seja nos locais de criação de gado, seja naqueles que serviam
como passagem para o transporte desses animais. Associada a essa atividade desenvolve-se
uma agricultura de subsistência em pequenas áreas cujos principais produtos eram mandioca,
milho, feijão e algodão e às vezes melancia e melão. Em algumas áreas próximas ao agreste
desenvolve-se o plantio da cana-de-açúcar e a associada a ela uma pequena indústria de
alimentos (ANDRADE, 1981).
Já no século XVIII, a demanda internacional por algodão vai transformar as formas
de ocupação na área. O algodão passa a ser produzido em larga escala e a ser exportado pelas
cidades litorâneas, como Recife e Fortaleza, e boa parte da produção é consumida
regionalmente, a qual após ser beneficiada em uma incipiente indústria local servia ao vestuário.
As feiras que se desenvolvem na comercialização de produtos regionais conferem importante
papel na formação e crescimento de algumas cidades, como Caruaru, Mossoró, Juazeiro do
Norte, Patos etc. (AB’SABER, 2009).
O clima de temperaturas predominantemente quentes constitui, desde sempre, fator
importante na ocupação e dinamização econômica da área. Os eventos de seca extrema
associados a uma estrutura fundiária rígida são responsáveis por fazer do nordeste seco um
centro de emigração para as restantes áreas do país. Tal fato explica uma série de medidas
tomadas para propiciar uma melhor convivência com o semiárido, dentre elas a açudagem.
Uma política de desenvolvimento regional proveu significativas mudanças a partir
da década de 1950, quando há a nível institucional a criação de organismos, como a
Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste (SUDENE), o Banco de Desenvolvimento
do Nordeste (BNB) e Companhia de Desenvolvimento do Vale do São Francisco
Fonte: Nascimento (2006)
67
(CODEVASF), há ainda a ampliação de infraestruturas como portos e o aumento da geração de
energia elétrica que subsidiaram o desenvolvimento de importantes polos industriais. Com um
aparato institucional presente, algumas atividades tomam corpo renovando o quadro de atuação
na paisagem. Assim, alguns polos de irrigação são desenvolvidos, como o de Petrolina-Juazeiro
e o de Jaguaribe-Apodi, possibilitando a plantação e o mercado da fruticultura.
Para Nascimento (2006):
[...] o ambiente no Nordeste foi constituído ao longo da história, conforme a
quantidade e qualidade dos recursos naturais nos sistemas ecológicos; nos sistemas
socioeconômicos, pela estrutura de relação homem-homem ao lume da produção; e
nos meios tecnológicos, pelo grau de desenvolvimento das forças produtivas usadas e
suas modalidades, de sorte que a interação destes elementos complexos marca várias
fases de desenvolvimento, desde os modos de uso dos recursos naturais, passando
pelos modos de uso do espaço (rural e urbano), respectivamente, ligados à
racionalidade econômica e a política no uso dos recursos e, como reflexo das relações
produtivas, que, inter-relacionados, no tempo e no espaço, forjaram as diversas formas
de modificações ambientais e condições de qualidade de vida nos diversos
geoambientes nordestinos, conforme sua complexidade ambiental. (NASCIMENTO,
2006, p.118)
Nesse sentido, o papel e os interesses das elites locais são estruturantes na relação
sociedade-natureza no semiárido, de forma que as origens dos principais problemas
socioambientais nas diferentes fases de desenvolvimento da região não podem ser deles
desvinculados. Destarte, a rígida estrutura fundiária, a política de favorecimentos e trocas, o
papel que determinadas áreas assumem na divisão internacional do trabalho possuem correlação
direta, por exemplo, com a miséria dos campesinos, os problemas socioespaciais dos centros
urbanos, o mau uso e poluição dos recursos hídricos e as formas de conservação dos recursos
naturais.
Dentro desse cenário ambiental é que se pretende destacar uma paisagem de
exceção do interior dos domínios das caatingas. Ab’Sáber (2003) chama de enclave
“fitogeográficos” as manchas de ecossistemas típicos de outras províncias, porém, presentes no
interior de um domínio de natureza totalmente diferente. O autor destaca a ocorrência desses
enclaves a partir de sua experiência científica no território brasileiro e relata a presença de
manchas de caatinga rodeadas por mata atlântica em Macaé - Cabo Frio e a ocorrência de áreas
de cerrado encravadas no interior da Floresta Amazônica.
No interior do domínio morfoclimático das caatingas aparecem redutos de áreas
úmidas e subúmidas chamadas popularmente por “brejos”. Essas áreas constituem superfícies
topograficamente elevadas de relevos serranos com dimensões variadas e que são submetidas
às influências de mesoclimas de altitude (AB’SÁBER, 1970 apud SOUZA E OLIVEIRA,
68
2006). Também chamados de Brejos de Altitude são definidos por Sobrinho (1970 apud
Tabarelli & Santos, 2004) como um acidente orográfico que por sua elevação acentuada,
incidência de correntes atmosféricas úmidas e natureza do solo, condicionam uma vegetação
predominantemente mais higrófila que as áreas circunvizinhas. Em comparação com a
totalidade da região semiárida, os brejos possuem aspectos distintos quanto à umidade do solo
e do ar, temperatura e cobertura vegetal e dessa forma reguardam condições ambientais
exepccionais em relação o restante das drepressões sertanejas.
Souza e Oliveira (2006) destacam como enclaves úmidos e subúmidos do semiárido
conforme o estado da federeção em que se localizam (Figura 03) :
Figura 03 – Brejos de altitude do Nordeste
1. CEARÁ - Enclave da Serra de Uruburetama, Enclaves das Serras Baturité, Maranguape e
Pacatuba, Enclave da Serra da Meruoca, Enclave do Planalto da Ibiapaba, Enclave da Chapada
do Araripe/Cariri;
Fonte: Souza e Oliveira (2006)
69
2. PARAÍBA - Enclave do Brejo da Borborema;
3. PERNAMBUCO - Enclave do Brejo da Borborema;
4. ALAGOAS - Enclave do Brejo da Borborema;
5. BAHIA - Enclaves da Chapada Diamantina e das Serras da Cadeia do Espinhaço;
6. MINAS GERAIS – Enclave da Serra do Espinhaço.
Para Ab’Sáber (1999), a ocorrência dessas áreas se dá em função de razões
climática e hidrológicas diferenciadas, que com base em modelos geohidrogeológicos são
tipificadas em: brejos de serra, cimeiras ou cumiadas (Baturité, Triunfo, Garanhuns, Serra
Negra); brejos de encostas ou vertentes úmidas (borda oriental da Borborema, borda leste da
Serra do Baturité), brejos de piemonte ou pé de serra, com múltiplos olhos d'água (base do
Araripe, na região de Grato e Missão Velha; Pedro II no Piauí), brejos de sopés de bancadas
calcárias (vale do Apodi — Mossoró), brejos de piemonte dotados de velhos leques aluviais
(noroeste do Ceará) e "baixios" abrejados em planícies alveolares de pé de serra (sudeste do
Ceará).
Os brejos são enclaves na forma de microrregiões úmidas e florestadas, com solos
férteis e de certa instabilidade em relação à disposição topográfica. Ocorrem sobre superfícies
elevadas de litologia sedimentar como no Planalto da Ibiapaba e do Araripe (Ceará) e na
Chapada Diamantina (Bahia) ou, mais comumente, em feições cristalinas (Ex. Maciço de
Baturité). Embora sejam climatologicamente semelhantes em função da altitude, a litologia
condiciona diferentes padrões pedológicos e hirogeológicos. Nas áreas cristalinas, as feições
são mais declivosas (em alguns setores as classes variam de 30 a 45%) chegando a formar
superfícies escarpadas com afloramento de rochas e solos poucos desenvolvidos, cuja reduzida
capacidade de absorção favorece o escoamento de água e a dissecação do relevo. Nos substratos
sedimentares, as camadas estratificadas tendem a condicionar um relevo menos acidentado,
com declives suaves e abertos, enquanto os interflúvios têm aspecto tabuliforme ou ondulado.
(SOUZA e OLIVEIRA, 2006).
Suas altitudes variam entre 600 e 1.200 m, o que influencia no regime térmico, uma
vez que a cada 100 m as temperaturas caem em 0,6ºC (AYOADE, 1986). As altitudes
diferenciadas favorecem a formação de chuvas orográficas que em média ficam entre 900 e
1.300 mm, o que contribui para que o balanço hídrico seja positivo, pois além do aumento das
precipitações, a altitude contribui no aumento da nebulosidade e na diminuição na
evapotranspiração, uma vez que há redução das temperaturas médias.
70
Esse quadro climático favorece o desenvolvimento de uma floresta úmida com
características da mata atlântica brasileira, no entanto a floresta atlântica ao norte do rio São
Francisco, ou floresta atlântica nordestina, recebe influência da biota Amazônica e dos trechos
de floresta atlântica do Sul e Sudeste do Brasil o que a torna bastante distinta do restante da
floresta Atlântica brasileira (TABARELLI & SANTOS, 2004).
Sobre a origem dessa formação vegetal nos brejos de altitude, a hipótese mais aceita
está associada às variações climáticas ocorridas durante o Pleistoceno (últimos 2 milhões -
10.000 anos), as quais permitiram que a Floresta Atlântica penetrasse nos domínios da caatinga.
Ao retornar a sua distribuição original, após períodos interglaciais, ilhas de floresta atlântica
permaneceram em locais de microclima favorável (ANDRADE-LIMA 1982).
Ao longo do processo de ocupação do Nordeste, os brejos receberam importante
destaque, uma vez que as suas condições diferenciadas favoreciam além dos cultivos comuns
ao agreste e sertões a produção de frutas. A produção servia basicamente à subsistência de seus
habitantes e o pequeno excedente abastecia as feiras nordestinas. Acompanhando os ciclos
econômicos da região, as áreas úmidas foram também utilizadas na produção de cana-de-
açúcar, e a partir de 1840 a produção de café é introduzida nessas áreas que passa a ser cultivada
sob sombra da vegetação de maior porte, o maciço de Baturité, a serra da Meruoca, da Baixa
Verde e o próprio Cariri cearense são áreas que se tornam rapidamente grandes produtoras até
que entrasse em declínio em meados do século XX (ANDRADE, 2005).
Hoje, os brejos recebem impactos principalmente com o avanço da bananicultura,
que chega a ser praticada, em alguns casos, em toda extensão dessas áreas úmidas
comprometendo o potencial hídrico e a estabilidade dos solos (AB’SÁBER, 1999). O turismo
também vem despontando como uma atividade que se consolida nessas áreas, além dos
impactos sociais que causa, influencia diretamente na especulação imobiliária e modifica os
padrões de ocupação.
Dada à singularidade dessa paisagem no domínio das caatingas e a forte pressão
que sofre esse ambiente desde o processo de ocupação, diversas têm sido as estratégias para
preservar e garantir o uso racional dos recursos, principalmente a biodiversidade. Por esse
motico, é que o relatório Avaliação e Ações Prioritárias para a Conservação da Biodiversidade
da Mata Atlântica e Campos Sulinos do MMA inclui os brejos dentre as áreas de extrema
importância biológica na preservação da Mata Atlântica (Figura 04).
71
Figura 04 – Áreas prioritárias para a preservação da Mata Atlântica no Brasil
Fonte: MMA (2000)
No estado do Ceará, a Política Florestal Estadual, Decreto nº 24.221, de 12 de
Setembro de 1996, define como Florestas Produtivas com Restrição de Uso, as Serra Úmidas e
Chapadas (encraves da Mata Atlântica) considerando-as como:
Áreas das serras cristalinas que suportam a Floresta Tropical Subperenifólia Plúvio-
Nebular ou Matas Serranas13 ocorrentes nas serras de Uruburetama, Maranguape,
Aratanha, Baturité, Meruoca e nas Chapadas do Araripe e Ibiapaba do Norte, em
disjunção das Florestas Atlânticas do Brasil leste (CEARÁ, 1996).
13 Classificação de Andrade-Lima (1966) para designar disjunções da floresta tropical perenifólia dentro da zona
da caatinga localizadas, via de regra, nos níveis superiores das serras, quer graníticas, quer cretáceas, acima de
cotas nunca inferiores aos 500 m e progressivamente maiores, num sentido geral SE–NW, até os 1.100 m.
72
O decreto assegura que essas áreas somente poderão ser utilizadas através da
exploração seletiva, segundo um Plano de Manejo Florestal ou Agroflorestal, sendo proibido o
corte raso da área total das propriedades ou da área florestal susceptível de exploração. Para
estabelecer a relação entre o estudo integrado da paisagem e os instrumentos de preservação
ambiental, através da criação de áreas protegidas, nessas áreas elegeu-se como base de estudo
a Serra de Maranguape e sua Área de Proteção Ambiental que será trabalhada no tópico
seguinte.
4.1.2 A Área de Proteção Ambiental da Serra de Maranguape
A Área de Proteção Ambiental constitui uma tipologia de área protegida criada
anteriormente ao SNUC pela Lei Federal nº 6.902 de 27 de abril 1981 por iniciativa do
ambientalista Paulo Nogueira-Neto tendo como referência as ações conservacionistas existentes
em Portugal (NOGUEIRA-NETO, 2001). De acordo com a classificação atual de categorias de
áreas protegidas, adotada pela IUCN, as APA estariam incluídas no grupo da categoria: V -
Conservação de Paisagens Terrestres e Marinhas, de Lazer e Recreação, guardadas as suas
especificidades.
Com a Lei Federal nº 9.985/00, a APA passa a integrar o SNUC na categoria de
unidades de conservação de uso sustentável sendo definida como:
É uma área em geral extensa, com um certo grau de ocupação humana, dotada de
atributos abióticos, bióticos, estéticos ou culturais especialmente importantes para a
qualidade de vida e o bem-estar das populações humanas. As condições para a
realização de pesquisa científica e visitação pública nas áreas sob domínio público serão
estabelecidas pelo órgão gestor da unidade (BRASIL, 2000).
As APA podem ser estabelecidas em áreas de domínio público e/ou privado, pela
União, estados ou municípios, sem que haja desapropriação de terras. No entanto, as atividades
e usos desenvolvidos estão sujeitos a um ordenamento por parte do poder executivo, cabendo-
lhe estabelecer normas, limitar ou proibir:
a) a implantação e o funcionamento de indústrias potencialmente poluidoras, capazes
de afetar mananciais de água;
b) a realização de obras de terraplenagem e a abertura de canais, quando essas iniciativas
importarem em sensível alteração das condições ecológicas locais;
c) o exercício de atividades capazes de provocar uma acelerada erosão das terras e/ou
um acentuado assoreamento das coleções hídricas;
73
d) o exercício de atividades que ameacem extinguir na área protegida as espécies raras
da biota regional. (BRASIL, 1981).
Cada APA é regida por seu decreto de criação e, posteriormente, pelo decreto de
regulamentação no qual é criado o Conselho Gestor da unidade, em que são estabelecidas
normas administrativas importantes para a sua gestão ambiental. Como instrumento de gestão,
a APA não possui zona de amortecimento, somente conta com um plano de manejo que objetiva
disciplinar as atividades que acontecem em seu interior, sem que isso possa implicar violações
ao direito de propriedade. As APA são, na verdade, e legalmente, um instrumento de
ordenamento territorial na conservação de atributos ou fatores ambientais em uma dada
localidade (PADUA, 2001).
Atualmente, 442.771 km² do território brasileiro fazem parte de áreas delimitadas
por APA, representando 29% do total de áreas protegidas pelo SNUC (CNUC/MMA, 2014). A
facilidade institucional na criação de uma APA e a não garantia plena de que as medidas
propostas pelo Conselho Gestor sejam implementadas pelos proprietários presentes na área
torna esse instrumento desacreditado por alguns ambientalistas e acadêmicos. Em alguns
contextos, as áreas são bastante extensas e chegam a ultrapassar as fronteiras municipais, o que
pode tornar o processo de gestão mais complexo pela diversidade dos atores envolvidos.
Sobre outro ponto de vista, alguns autores consideram as APA instrumentos
importantes que podem ser usados na consolidação de Corredores Ecológicos e Zonas de
Amortecimento (PADUA, 2001), aumentando a eficiência da gestão em mosaico de áreas
protegidas. A existência de um Conselho Gestor também pode ser apontada como uma
importante ferramenta de gestão, uma vez que sua composição pode contribuir na negociação
entre os atores na resolução de conflitos na construção de práticas sustentáveis (CABRAL &
SOUZA, 2005).
Segundo o IPECE (2012), existem 26 APA no estado do Ceará, em sua grande
maioria, presentes em ambientes da zona costeira, como campos de dunas, lagoas interdunares
e estuários, outra parte contempla todas as serras úmidas do estado. A área a qual o presente
estudo se debruça localiza-se na RMF entre os municípios de Caucaia e Maranguape, tratando-
se de um maciço residual situado a 25 km de distância da capital cearense. Denominada
popularmente de Serra de Maranguape, o maciço de embasamento cristalino apresenta feições
dissecadas com altitudes que chegam a alcançar 920 m (Pedra da Rajada). Por sua proximidade
ao litoral e pela altitude, a Serra de Maranguape reúne condições que dão abrigo a um
74
remanescente de mata atlântica, tornando-o um ambiente peculiar em relação ao seu entorno
semiárido.
Atento as transformações pelas quais a Serra passou nas últimas décadas, o poder
público municipal instituiu a APA da Serra de Maranguape através da Lei Municipal nº 1.168
de 08 de julho de 1993, tendo com abrangência as áreas superiores à cota de 100 m até a linha
da serra e o limite com o município de Caucaia. Seus objetivos são:
I – Proteger as comunidades bióticas nativas, as nascentes fluviais, as vertentes e os
solos;
II – Propiciar à população da área métodos e técnicas apropriadas ao uso do solo de
maneira a não interferir no funcionamento dos refúgios ecológicos;
III – Desenvolver na população uma consciência ecológica e preservacionista (CEARÁ,
2002, p. 05).
Na intenção de promover o disciplinamento no uso e ocupação da Serra, a APA
possui como atribuição restringir ou proibir as seguintes atividades:
a) Implantação ou ampliação de atividades potencialmente poluidoras, capazes de afetar
mananciais de água, as formas de relevo, o solo e o ar;
b) A realização de obras de terraplanagem e abertura de estradas, quando essas
iniciativas importarem em sensíveis alterações das condições ecológicas regionais;
c) A derrubada de florestas e a captura ou extermínio de animal silvestre de qualquer
espécie;
d) Os projetos urbanísticos, inclusive loteamentos, sem a prévia autorização as
SEMACE e da Prefeitura Municipal de Maranguape;
e) O uso de agrotóxicos, em desacordo com as normas ou recomendações técnicas
oficiais. (CEARÁ, 2002, p.05).
Pode-se inferir dessa leitura que a Lei de criação da APA, enquanto instrumento de
conservação ambiental, está calcada em duas propostas de ação para a conservação na Serra de
Maranguape: 1) Proteger os atributos ecológicos da Serra e 2) Controlar a intensidade e os
níveis de ocupação. Alinham-se nessa perspectiva a preocupação com a preservação dos
processos ecológicos essenciais à vida que se manifesta na intenção de proteger as comunidades
bióticas, os recursos hídricos e os solos de um lado. Por outro lado, há a intenção de regular as
formas de uso que se desenvolvem na Serra como foco principal no alcance dessa medida.
Destaca-se a ainda a preocupação em difundir técnicas de manejo compatíveis com o ambiente
serrano, medida mais que essencial na promoção de uma relação sustentável entre os processos
ecológicos e as formas de uso e ocupação.
Por se tratar de uma iniciativa da Prefeitura Municipal de Maranguape, os limites
da APA da Serra de Maranguape estão restritos ao dito Município (questão que será retomada
adiante). Dessa forma, somente parte de uma das vertentes da Serra encontra-se inscrita dentro
75
da unidade. Apesar de apresentar uma discussão geral sobre a Serra, a presente pesquisa teve
como foco de análise, principalmente, a área pertencente a APA, referida como vertente
oriental, uma vez que somente ela é alvo de medidas de proteção, não se poderia estabelecer
uma relação entre o estudo da paisagem e a criação de áreas protegidas ao restante do maciço,
o que não implicou na abstenção de tecer considerações sobre o maciço como um todo evitando
construir uma visão fragmentaria do processo.
Enumerado os instrumentos de criação da APA da Serra de Maranguape, será
apresentada a seguir a caracterização integrada dos componentes da paisagem.
76
Mapa 02 – Mapa Básico da APA da Serra de Maranguape
77
4.1.3 Análise Integrada dos Componentes na Configuração da Paisagem da APA da Serra
de Maranguape
A APA da Serra de Maranguape está situada na Região Metropolitana de Fortaleza
compreendendo um maciço residual nos limites dos municípios de Maranguape, Maracanaú e
Caucaia, que se diferencia do contexto regional por uma ruptura topográfica em relação às
depressões sertanejas. Esse maciço pode ser entendido como uma forma de relevo residual por
ser oriundo de resquícios de uma superfície de maior resistência que se originou em função de
um processo de erosão diferencial, resultando na formação de superfícies mais elevadas que,
sobre um processo de pediplanação, sofreram um recuo de vertentes dando origem a blocos
rochosos isolados e de tamanhos variados.
Segundo Souza (2000), os maciços residuais do Ceará são constituídos de rochas
cristalinas, com primazias de litologias metamórficas que se apresentam dissecadas em feições
convexo-aguçadas onde se desenvolvem solos das classes dos argissolos vermelhos-amarelos
e litólicos. Tais formas possuem drenagem com padrão dendrítico e subdendrítico e com certa
instabilidade nas encostas de declividade acentuada.
Os maciços encontram-se distribuídas pela depressão sertaneja, com disposição em
geral de NE-SW, predominando na porção central do estado e no centro-norte. As serras de
maior altitude e mais próximas aos oceanos são recobertas por mata úmida em seu topo,
formando o brejo de cimeira, enquanto as serras de menor altitude e mais ao interior do
continente apresentam uma mata seca (semi-caducifólia) nos topos e em suas vertentes. Os
maciços são compartimentados por Souza (2000) conforme o Quadro 05:
78
A Serra de Maranguape, similar aos demais maciços do estado, é formada por três
grupos litológicos: rochas graníticas e migmatíticas pré-cambrianas, encaixadas em xistos e
gnaisse; rochas mesozoico-terciárias e depósitos detríticos cenozoicos. O conjunto dessas
rochas encontra-se estruturalmente definido como um sinclinório, onde o complexo granitóide-
migmatítico pré-cambriano encontra-se nas partes inferiores formando a base que é recoberta
por rochas mesozoico-terciárias e pelos depósitos detríticos-cenozoicos. (CEARÁ, 2002).
Segundo relatório realizado pelo IPT (1975), as rochas pré-cambrianas são
formadas por gnaisses (biotita-gnaisses e quartzo-biotita-gnaisses) e granitos (granito-gnaisses
Quadro 05 - Compartimentação dos maciços residuais no estado do Ceará
COMPARTIMENTAÇÃO SUBDIVISÕES LOCALIZAÇÃO CARACTERÍSTICAS
DOMINANTES
Ser
ra
s Ú
mid
as
e S
ub
um
ida
s
Serra de Baturité
Platô, Vertentes
(ocidental; orien-
tal, meridional, se-
tentrional) e ser-
tões de entorno.
Centro norte do Estado.
É ocupada pelos muni-
cípios de Baturité, Gua-
ramiranga, Mulungú,
Pacoti, Aratuba e Re-
denção.
Distribui-se no sentido NNE-SSW;
com altitudes de 700 a 850 m;
dissecada em forma de topos
convexos, lombadas e cristas.
Maciços Pré-litorâneos
Serras de
Uruburetama,
Maranguape,
Aratanha e Juá-
Conceição.
Compartimentos de re-
levos elevados próxi-
mos ao Litoral. São
grandes blocos rochosos
dispersos entre os muni-
cípios de Pacatuba e
Irauçuba.
Distribuem-se no sentido NE-SW
com exceção de Uruburetama (NW
-SE). Formados de rochas do
Complexo Migmatitico apresentan-
do seqüência de cristas com platôs
úmidos e sub-úmidos, com solos
podzólicos revestidos pela mata
plúvio-nebular.
Serra da Meruoca-
Rosário Platô e vertentes
Noroeste, entre os um-
nicípios de Sobral, Me-
ruoca, Alcântara e Mas-
sapé.
"Stock" granítico de forma
retangular dispondo-se na direção
NE-SW. Atinge o nível médio de
750m, com um pequeno brejo de
cimeira, recoberto originalmente
por floresta, com solos argissolos e
litólicos.
Ser
ra
Sec
as
Maciços Centrais e
Ocidentais
Serras do
Machado,
Bastiões, Aimoré.
Maia, São Vicente
e São José.
Área central e ocidental,
entre os municípios de
Canindé e Itatira.
Distribuem-se principalmente no
sentido NNE-SSW; níveis em torno
de 600 m; dissecados em cristas,
"hog-backs" e colinas rasas.
Serra das Matas Platô e vertentes Área central. Entre os
municípios de Monse-
nhor Tabosa e Tamboril
Bloco elevado com altitudes médias
de 650-700 m, pertencente ao
Complexo Migmatítico-granítico
dispondo-se no sentido L-O. Os
solos são litólicos com grande
sequência de afloramentos
rochosos.
Pequenos maciços
sertanejos
Serras do
Carnutim,
Quincocá da
Baixa,
Branca etc.
Encontram-se dispersas
por toda a depressão
sertaneja.
Pequenos maciços rochosos infe-
riores a 600 m dispostos em sentidos
variados, com solos litólicos e
algumas manchas de argissolos
revestidos por caatingas.
Fonte: Adaptado de Arruda (2001)
79
porfiroblásicos, granito-gnaisses com orientação incipientes e granitos equigranulares
grosseiros) (Figura 05). Essas rochas se dispõem em faixas paralelas, cuja homogeneidade
evidencia-se a partir das bordas em direção ao centro dos maciços.
Arruda (2001) setoriza a composição litológica da Serra de Maranguape:
Na porção Maranguape/Gereraú/Pelada predominam rochas granitoídes-
migmatíticas de cor, variando entre cinza e rosa e texturas das mais variadas, foliadas
nas bordas dos corpos. Estão presentes tipos petrográficos como granitos, migmatitos
e gnaisses diversos.
A porção do Serrote do Japarara é formado por fonólitos, possui uma seção horizontal
elipsoidal com eixo maior de 2 km alongado segundo a direção NNE-SSW e com
feição topográfica cônica, alcançando 470 m de altitude. A rocha é bastante dura,
localmente fraturada e de cor cinza-claro a escuro. Tem granulometria
predominantemente fina e localmente grosseira, com presença de fenocristais de
feldspato.
O aproveitamento mineral na Serra de Maranguape (Figura 06) ocorre
principalmente na porção da Serra da Taquara/Mucunã, onde se encontram três locais de
extração de rochas utilizadas na produção de britas para uso na construção civil. Nessa porção
do maciço, o desenvolvimento de tal atividade promove descaraterização na paisagem e
significativo impacto de vizinha na comunidade local.
Figura 05 – Expressão litológica e uso no Maciço de Maranguape
80
Pedra do Urubu - Afloramento de rocha na vertente oriental da
Serra de Maranguape próximo a localidade de São Benedito.
Rocha granítica pertencente ao complexo granítico-
migmatitico que compõem os setores morfologicamente mais
elevados resultantes ao processo de erosão diferencial. Fonte: Próprio autor (2013)
Figura 06 – Aproveitamento mineral na Serra de Maranguape
Extração de rochas na Serra da Taquara, jan/2014
Fonte: Próprio autor (2014)
Segundo Souza (2000), a interação do quadro litológicos com os demais
componentes da paisagem condiciona a diversidade de solos, a disponibilidade de recursos
hídricos de superfície e subsuperfície, o quadro fitoecológico local, as potencialidades dos
recursos naturais disponíveis e a partir da interação com o clima as formas de relevo.
A origem geomorfológica do maciço de Maranguape (Figura 07) está associada ao
soerguimento no período Necomiano que daria origem ao maciço de Baturité que seria
dissociado em relevos isolados (Baturité, Maranguape, Pacatuba, Aratanha, Juá/Conceição)
através de erosão (CLAUDINO-SALES & PEULVAST, 2007). Souza (1988), em sua proposta
de compartimentação morfoestrutural do Ceará, inclui essa área no domínio dos escudos e
maciços antigos, classificando-a como maciço pré-litorâneo, dado a sua proximidade com o
mar. Para o autor, a Serra possui disposição SW-NE e tem morfologia exibindo marcas de
oscilações climáticas entre climas úmidos e secos. Na primeira ocasião as dissecações são
responsáveis pela acidentação do relevo em feições variadas como colinas, cristas e lombas
alongadas. Durante as fases secas, predominaram processos de morfogênese mecânica e o
desenvolvimento de superfícies pedimentadas que estão presentes na cimeira e nos flancos da
serra sendo posteriormente trabalhadas nas fases úmidas.
81
A disposição do relevo encontra-se divido em porções (Tabela 02) de altitudes
diferenciadas onde a porção central alcança altitudes maiores que 600 m, constituindo a parte
mais representativa e área de 207,35 km², correspondente a 65,06% do total.
Figura 07 – Visualização 3D do Maciço Residual de Maranguape com visada NE-SW
Tabela 02 – Setorização da Serra de Maranguape-CE
PORÇÃO LOCALIZAÇÃO ALTITUDE
(m)
ÁREA
(km²)
REPRESENTATIVIDADE
(%)
Serra da Taquara Nordeste 511 43,98 13,8
Serra de Maranguape Porção Central 920 207,35 65,06
Serra da Pelada/Gereraú Sudoeste 410 47,81 15,06
Serrote do Japarara Extremo Sudoeste 400 19,54 6,1
TOTAL 318,69 100
Fonte: Arruda (2011)
Fonte: Elaborado pelo autor com auxílio do software Spring 5.2
82
Mapa 03 – Mapa Hipsométrico da APA da Serra de Maranguape
83
As altitudes elevadas interferem no clima, condicionando suas características
termopluviométricas, o que favorece uma maior disponibilidade hídrica, impondo, dessa
maneira, uma maior permanência ao escoamento fluvial intensificando a capacidade de
escavamento do relevo pelos rios que originam feições morfológicas aguçadas (cristas),
convexas (colinas) e de topos planos (interflúvios tabulares). Essas feições são intercaladas por
vales estreitos (em forma de V) ou ligeiramente alargados nos setores de topografia mais
suaves.
Na APA, os declives estão concentrados nas classes superiores a 10-15%, em
alguns setores eles se tornam mais acentuados, variando de 30-40% ou superior, exibindo
feições escarpadas por vezes expondo as rochas nas vertentes (CEARÁ, 2002). Nos setores de
maior altitude acima da cota de 500 m e onde a declividade é mais acentuada, a ocupação acaba
por ser mais restrita exibindo uma vegetação mais conservada.
Para todos os grupos sociais, a paisagem serrana se apresenta como a imagem de
identificação com o local, a ruptura topográfica em relação às depressões circunvizinhas
destaca-se no cenário local e a sua imagem os grupos lhe atribuem um sentimento de identidade
com o lugar, tornando-se referência ao município. A imagem da serra está associada a um
sentimento bucólico que se diferencia da atribulada vida urbana e juntamente com o rico
patrimônio histórico da cidade são considerados pelos grupos como um elemento de sua
identidade e um sentimento de pertencimento que representam uma forma singular de viver que
ultimamente vem se modificando.
As altitudes diferenciadas associadas às correntes perturbadas e a situação
geográficas vão interferir nas precipitações, ventos, umidade relativa, insolação e radiação
solar, evaporação e temperatura na APA.
As temperaturas ao longo do ano variam em torno de 23ºC a 26ºC, não relevando
significativas amplitudes térmicas tanto anuais quanto diárias. No entanto, nas altitudes maiores
que 600 m as variações alcançam temperaturas entre 18ºC e 25ºC para a noite e para o dia
respectivamente (CEARÁ, 2002).
A posição geográfica do maciço contribui para a influência dominante dos ventos
alísios durante quase todo o ano e para os sistemas de brisas, esses últimos atuando diariamente
e influenciando nas temperaturas locais. Os primeiros predominam na área até a entrada da
ZCIT, ocasionando uma mudança em direção, passando a fluir para o sudoeste. Originada da
convergência de ventos alísios de nordeste e sudeste ao longo do ano, a ZCIT se mantém acima
da faixa equatorial por grande parte do ano até que a partir de fevereiro esse sistema desloca-se
84
para o sul, criando condições adequadas para a quadra chuvosa, constituindo-se como o
principal sistema formador de chuvas no Ceará (Figura 08).
Figura 08 – Fluxos de umidade e brejos de altitude no Nordeste
Essa sazonalidade na área de atuação da ZCIT interfere na distribuição anual das
chuvas na APA. O trimestre mais chuvoso é o de março-abril-maio, enquanto o trimestre de
setembro-outubro-novembro corresponde ao menos chuvoso, apresentando assim uma estação
seca e outra chuvosa no qual as precipitações se concentram no primeiro semestre do ano,
enquanto em média 06 meses são de seca (julho-dezembro) (Gráfico 05). A média anual chega
a ultrapassar os 1300 mm.
Fonte: Adaptado de Bétard et al. (2007)
85
Gráfico 05 – Média mensal pluviométrica no município de Maranguape (1978-2013)
Fonte: FUNCEME
Elaborado pelo autor
Na vertente ocidental, área a sotavento, as precipitações tendem a ser menores e de
maior irregularidade, ficando abaixo dos 900 mm, se diferenciando da vertente oriental e das
áreas de platô, uma vez que são nessas áreas que a altitude, a disposição do maciço (NE-SW) e
seu comprimento (22,5 km) favorecem a formação de chuvas orográficas. (ARRUDA, 2001)
Para Ceará (2002), o balanço hídrico na APA é influenciado pela combinação dos
parâmetros termopluviométricos com os demais. Dessa maneira, o estudo aponta que na área
as médias térmicas mensais são relativamente baixas sendo beneficiadas por uma maior duração
do tempo chuvoso, o que lhe garante consideráveis teores de umidade durante maior parte do
ano. O excedente hídrico anual é superior a 390 mm enquanto a deficiência hídrica anual atinge
650 mm. As diferenças entre os totais de precipitações (P) e a evapotranspiração potencial (EP)
são negativas de junho a janeiro, nos demais meses os resultados são sempre positivos.
Por essas características, o clima na APA pode ser classificado, segundo sistema de
Köppen-Geiger, como AW’- tropical chuvoso quente-úmido com chuvas de verão-outono,
assemelhando-se a todo o litoral cearense, em contraste com os restantes 80% do território do
estado que se apresenta como BSwh’ – semiárido bastante quente, com estação chuvosa
deverão/outono.
Os recursos hídricos de superfície e de subsuperfície são reflexos das condições
morfoestruturais e climáticas, na APA as características do embasamento cristalino, que se
caracterizam por rochas duras e pouco fraturadas, favorecem a formação de uma rede de
drenagem de elevada densidade. A Serra de Maranguape funciona como um divisor de águas
na bacia hidrográfica do rio Ceará, que se insere no conjunto das Bacias Metropolitanas. A
configuração topográfica da Serra associada à distribuição dos depósitos detríticos de encosta
0
50
100
150
200
250
300
Jan Fev Mar Abr Mai Jun Jul Ago Set Out Nov Dez
PR
EC
IPIT
AÇ
ÃO
ME
NS
AL
(mm
)
86
e de piemonte são fatores determinantes nas características da drenagem. Nas partes mais altas,
a estrutura é determinante no seu controle formando padrões subparalelos, os riachos são muito
entalhados com paredes abrutas. Os vales são bastante entalhados (em forma de “V”), com
pequeno acúmulo de material em seus fundos (IPT, 1975).
Na vertente ocidental, a drenagem se apresenta bastante ramificada, de classificação
dendrítica e de comprimento inferior a oito quilômetros, desaguando no rio Ceará. Já na vertente
oriental, os rios se desenvolvem perpendiculares a Serra formando três principais riachos:
Pirapora, Gavião e Tangueira que ao se encontrarem em altitudes menores dão origem ao rio
Maranguapinho, tributário do rio Ceará.
Embora o regime dessa rede de drenagem seja influenciado pela irregularidade nas
chuvas assumindo caráter intermitente, nas cotas mais altas os rios assumem um regime semi-
perene em função das condições climáticas mais úmidas, são eles: do Meio, Romcy, Gavião e
Pirapora. Esse potencial hídrico é aproveitado com a construção de barramentos e açudes onde
a água acumulada serve a agricultura, ao abastecimento humano e ao lazer (Figura 09).
Figura 09 – Aproveitamento hídrico na APA.
Açude do Sítio Boa Vista - O escoamento superficial de água é
barrado neste fundo de vale para utilização desse recurso nas
plantações de banana que bordejam o açude e para o
abastecimento humano, existe um conflito sobre esse recurso em
relação ao seu represamento por moradores nas partes de maior
altitude que acabam restringindo o acesso à água para aqueles
localizados a jusante em altitudes menores além do impacto
sobre os processos físico-naturais.
Fonte: Próprio autor (2013)
As classes dos solos na APA da Serra de Maranguape podem ser divididas com
base em sua evolução pedogenética, diferenciando os solos em profundos (Argissolos
87
vermelho-amarelos com profundidades entre 1,00 e 2,00 m) e em solos rasos, que não
ultrapassam os 50 cm de espessura, caracterizados aqui pelos solos litólico eutróficos (Figura
10).
Argissolos vermelho-amarelos – São provenientes da translocação de
constituintes coloidais e solúveis dentro do perfil argila-sesquióxidos e originados a partir da
alteração de gnaisses, migmatitos e granitos. As características químicas permitem, em função
do grau de saturação por bases, distinguir duas categorias desses solos: argissolos vermelho-
amarelos distróficos e argissolos vermelho-amarelos eutróficos, esses últimos são resultantes
da adição de material orgânico a montante possuindo acidez moderada e argila de atividade
baixa.
Os Argissolos possuem sequências de horizontes A, B, C, às vezes com horizonte
Oo, são profundos e mais raramente rasos, fortemente a moderadamente drenados, com
horizonte textural B de coloração comumente vermelha amarelada, tornando-se mais amarelada
nos níveis mais altos das serras. Estão geralmente localizados em relevos de formas
convexizadas e, dessa forma, evidenciam a presença de óxido de ferro hidratado. Por
predominarem nos platôs, possuem tendência ao diastrofismo devido à maior possibilidade de
perdas de elementos trocáveis e o favorecimento da acidificação.
A fertilidade natural de média a alta e a profundidade, entre outras boas
propriedades físicas, são indicadores de um bom potencial de uso do solo para os argissolos.
Por tais características, esses tipos solo são bastante utilizados, todavia, na maioria dos casos,
isso ocorre de maneira inadequada, uma vez que o relevo montanhoso (45 a 74% de
declividade) e o alto gradiente textura induzem os processos erosivos que são acionados pelo
desmatamento.
Neossolos litólico eutróficos e afloramento de rochas – São oriundos da remoção
ou transporte de materiais e particulares minerais por efeito da gravidade e agente erosivos ao
longo das encostas. São solos com perfis pouco desenvolvidos possuindo apenas o horizonte
A.
Os Neossolos litólico predominam nas porções mais baixas e desgastadas pela
erosão, ocupando áreas de declive mais acentuado, principalmente a sotavento. Esses tipos de
solo ocorrem bordejando as cotas acima de 300 m, permanecendo principalmente entre 100 e
300 m de altitude. Em algumas situações, associam-se a afloramentos de rochas e ficam mais
vulneráveis aos processos erosivos, enquanto que nas áreas de menor declividade associam-se
aos argissolos eutróficos.
88
Figura 10 – Perfis representativos das classes de solos da APA da Serra de Maranguape.
10.1- Argissolos vermelho-amarelos.
10.2 - Neossolos litólico.
Fonte: Próprio autor (2013)
As condições de solo e clima, influenciadas pelas variações altimétricas, implicam
diretamente na fisionomia e na composição florística da vegetação, como também nas formas
de uso e ocupação. A partir da classificação de Fernandes (1998) são identificadas as seguintes
unidades vegetacionais na APA da Serra de Maranguape:
Arbóreo climático estacional caducifólio (caatinga) - Formação vegetal
predominante no semiárido brasileiro, na APA ela ocupa os sertões de entorno e a base das
vertentes da serra alcançando o nível das cotas de 300 m. Nas proximidades dos riachos, ela dá
lugar a uma pequena mata ciliar. Há predomínio de espécies arbustivas e algumas árvores
esparsas, são exemplos: Angico (Anadenanthera colubrina), Aroeira (Myracrodruon
2
1
89
urundeuva), Marmeleiro-branco (Croton argyrophylloides), Trapiá (Crataeva trapia), Feijão
Bravo (Caparis flexuosa), Jurema-preta (Mimosa hostilis Benth.), mandacaru (Cereus
jamacaru).
Nos períodos chuvosos, essa vegetação se confunde com a mata seca e também
ocupa os espaços desta quando desmatada. Na porção meridional e setentrional da Serra, a
caatinga apresenta níveis intermediários de conservação tendo a sua subtração realizada para a
exploração mineral, a produção de carvão e cultivo de lavouras de subsistência.
Arboreto Climático Estacional Semicaducifólio (mata seca) – Abrange as áreas
entre os 300 e 600 m de altitude, possui caráter perene e verdejante predominante no período
chuvoso e quando chega à época da estiagem, uma parte das espécies assume um caráter
caducifólio. Coloniza setores de declividade média à alta, em solos rasos do tipo litólico, onde
os afloramentos rochosos são frequentes e a temperatura é mais elevada do que no ambiente da
mata úmida. São espécies representativas: Espinheiro-preto (Acacia glomerosa), Gonçalo-alves
(Astronium fraxinifolium), Mulungú (Erythrina velutina), Cajá (Spondias mombim), Pau-darco-
amarelo (Tabebuia serratifolia), Catolé (Syagrus cearenses), Barriguda (Bombax cearense).
Pelo caráter eutrófico dos solos em que se desenvolvem, as áreas de mata seca são
de intensa exploração agrícola, desse modo são intensamente desmatadas e acabam dando lugar
a vegetação de caatinga em alguns setores das vertentes.
Arboreto Climático Perenifólio (mata úmida) – Recobre os platôs da Serra e as
encostas mais altas sempre acima da cota de 600 m. Predominam espécies arbóreas de grande
porte, encorpadas e adensadas, acompanhadas de alguns arbustos e elevado número de epífitas
e herbáceas de caráter ombrófilo (Figura 11).
A mata original é uma floresta composta por vários andares de vegetação, com
diversas espécies frutíferas introduzidas, tais como Cajazeira (Spondias lutea), Jaqueira
(Artocarpus integrifólia), Mangueira (Mangifera indica), que se comportam atualmente como
nativas em meio as espécies características: Murici (Byrsonima crispa Adr. Juss.), Pau Marfim
(Agonandra brasiliensis Miers), Pau d’alho (Gallesia gorazema), Sabiá (Mimosa
caesalpinifolia Benth), Cedro (Cedrela fissilis), Utricularia jamesoniana.
A mata úmida é a unidade de vegetação em melhor estado de conservação. Segundo
Arruda (2001), os fatores físicos no acesso áreas de topo, os solos encharcados desfavoráveis a
agricultura e a forte declividade do terreno contribuem para que esse nível de interferência seja
menor.
90
Figura 11 – Mangue de altitude.
Geótopo que se forma nas áreas alagadas dos platôs, com
características pantanosas e vegetação apresentando-se semelhante
às espécies de mangue (típicas das áreas fluivo-marinhas). Destaque
para a espécie Mangue-de-serra (Clusia sp.)
Fonte: Próprio autor (2013)
A peculiaridade da paisagem da Serra de Maranguape, comparando-a ao seu
entorno, se reflete nas características de sua biodiversidade faunística. O clima diferenciado
possibilita a formação de habitats singulares, os quais abrigam espécies que não ocorrem na
depressão sertaneja. Evidências paleobioclimáticas demostram que o isolamento e a formação
de enclaves da conexão entre a mata atlântica e a floresta amazônica na região, hoje
correspondente ao domínio das caatingas (AB’SABER, 1999), propiciou a ocorrência de
processos evolutivos e o surgimento de novas espécies (FERNADES, 1998), o que explicaria
o quadro biogeográfico da Serra de Maranguape (Figura 12) e demais enclaves úmidos do
Nordeste.
Sobre a herpetonofauna da Serra de Maranguape, Lima (2001) aponta a existência de 41
espécies de lepidosauros, distribuídos em 12 famílias e 17 espécies pertencentes a quatro
famílias. São exemplares as espécies citadas por Borges-Nojosa & Caramaschi (2003):
Amphisbaena vermicularis (cobra-cega), Coleodactylus meridionalis (Lagartinho),
Hemidactylus mabouia (Lagartixa-comum), Iguana iguana (camaleão), Leposternon
polystegum (Cobra-de-duas-cabeças), Polychrus acutirostris (Calango-cego), Tropidurus
hispidus, Colobosauroides cearenses e Leposoma baturitensis (genericamente chamados de
calango). Ambos os autores destacam a semelhança de composição entre as espécies nas Serras
91
de Maranguape e Baturité, o que indicaria uma ligação pretérita entre os dois maciços, o
destaque é para o pequeno anfíbio Adelophryne maranguapensis endêmico a primeira.
Figura 12 – Exemplares da Fauna na APA.
12.1 - Adelophryne maranguapensis – Pequena espécie de
anfíbio, medindo cerca de 2 cm, endêmica a Serra de
Maranguape.
12.2 - Leposoma baturitensis – Lagarto característico dos
brejos de altitude do Ceará. Ambas as espécies são adaptadas
as condições ombrófilas e úmidas, sendo bastante sensíveis a
alterações no ambiente.
Fonte: Próprio autor (2013).
Sobre a avifauna da Serra de Maranguape, Albano & Girão (2008) estimam que
existam por volta de 161 espécies na área que também apresentam correspondência com
espécies das Serras de Aratanha e Baturité, são elas Picumnus limae (Pica-pau-anão-da-
caatinga), Sclerurus scansor cearensis (Cisca-folha), Brotogeris chiriri (Periquito-de-encontro-
2
1
92
amarelo) Tangara cyanocephala cearenses (Saíra-milita) Xiphorhynchus guttatus gracilirostri
(Araçapu-de-garganta-amarela) e Zimmerius gracilipes acer (Poiaeiro-de-pata-fina).
Em relação aos mamíferos presentes na Serra, Ceará (2002) afirma serem comuns
em grande parte das formações vegetais da América do Sul, são elementos representativos:
Didelphis albiventris (cassaco), Dasypus novemcinctus (tatu), Coendou prehensilis (porco-
espinho), Epphractuas sexcinctus (peba), Callithrix jacchus (soim), Procyon cancrivous
(guaxinim) e Cerdocyon thous (raposa). O documento ainda relata que é provável que animais
de maior porte, como a anta (Tapirus terrestres), compusessem a fauna local, no entanto em
função do processo de ocupação esses animais teriam desaparecido.
As condições de umidade características da paisagem propiciaram a formação de
habitats para diversos invertebrados, tais como: os gêneros Austoma, Megabulinus e Tomigerus
(caracóis), Molusca e Pulmonata (lesmas), Playhelminthes e Tubellaria (planárias), Annelida e
Oligocheta (minhocas) e Onchophora (onicóforos). Tais espécies são bastante vulneráveis às
alterações no ambiente, desta forma o desmatamento e as queimadas colocam em risco os
processos ecológicos nos quais essas espécies se inserem.
Em pesquisa paleobiogeográfica, a partir da análise de bioindicadores, Montade et
al. (2014) demonstraram que as modificações climáticas nos últimos 5.000 anos foram
responsáveis por mudanças na composição florestal na Serra de Maranguape. As alterações,
principalmente quanto aos níveis de precipitações, provocaram mudanças na composição das
espécies, mas mantiveram as características do micro refúgio por meio da seleção de espécies
chaves, mantendo estável a biodiversidade. Para os autores, enquanto a biodiversidade
permanecer estável, há uma reorganização das comunidades vegetais que permite a
sobrevivência da maioria das espécies. Esse ponto é muito importante para a preservação dos
ecossistemas dessa floresta, que são reservatórios de biodiversidade e de recursos hídricos
importantes, em uma área de clima semiárido e que têm sido afetados pelas intervenções
antrópicas e merecem atenção por parte de políticas de proteção.
93
4.1.4 Configuração territorial: atividades socioeconômicas e aspectos demográficos da
APA.
Uma das dimensões da proposta metodológica de Bertrand (2007) consiste na
análise da repercussão, da organização e dos funcionamentos sociais e econômicos sobre o
espaço considerado, trata-se da leitura do território. O autor, na pretensão de abordar a
totalidade da interface natureza-sociedade, se utiliza do conceito de antropização. Para ele, esse
processo pode ser “especificado, de uma parte, analisando os mecanismos da artificilização, de
outro, restituindo o artefato aos sistemas de valores correspondentes” (BERTRAND, 2007, p.
207).
Por antrópico se considera o conjunto dos processos materiais e imateriais de
origem social, econômica ou cultural, que transformam o espaço-natureza em um meio
ambiente mais ou menos artificializado, sendo, portanto, a origem da artificilização do
geossistema a partir de sua evolução demográfica e econômica, constituindo um dos processos
de produção territorial, ou seja, do espaço geográfico produzido e vivido pelas sucessivas
sociedades.
No entanto, é preciso evitar tratar os problemas do meio ambiente sem uma
profundidade histórica. Somente se pode socializar e antropizar o meio ambiente se ele for
inscrito na perspectiva do tempo e da duração, que é o tempo da natureza, das estações etc.,
mas também é o tempo das sociedades que fizeram e desfizeram seu meio ambiente, trata-se da
memória do território (BERTAND, 2007).
Apresenta-se um breve retrospecto, e o cenário atual, das transformações sociais,
econômica e políticas na APA e entorno buscando construir um quadro nas modificações da
configuração da paisagem (a partir de seus subsistemas) estabelecendo uma relação entre os
seus componentes, as práticas a eles associadas e os seus sistemas de representações.
A historiografia oficial considera que as origens do município datam do século
XVII, quando a frota de Matias Beck chegou ao Ceará conduzindo cerca de 300 homens, entre
soldados, índios e negros escravos. O capitão holandês construiu o forte Schoenenborch, na foz
do Rio Pajeú, em cujo entorno se desenvolveu o povoado que mais tarde se tornaria a vila de
Fortaleza de Nova Bragança. Os holandeses desconfiavam da existência de minas de prata no
Monte Itarema (Serra da Aratanha), próximo ao lugar onde acampavam e não muito distante da
Serra de Maranguape, conseguiram dos chefes indígenas algumas indicações sobre o local onde
se encontravam as jazidas.
94
A expedição ao Monte Itarema constitui a primeira penetração do homem branco
nas terras do atual município de Maranguape, àquela época habitadas por índios potiguaras que
ocupavam a faixa litorânea, desde o Rio Grande do Norte até a Barra do Ceará e depois ao
Piauí.
As primeiras sesmarias concedidas no início do século XVIII tiveram como
donatários o tenente Pedro da Silva e Amaro Morais, em 12 de julho de 1707; Jorge Silva, em
29 de dezembro de 1711; capitão Soares de Oliveira, em 17 de julho de 1717; José Gonçalves
Ferreira Ramos e Felipe Loureço, em 1790. O povoamento, entretanto, veio a tornar-se efetivo
nos primórdios do século XIX com o surgimento, à margem do Riacho Pirapora, do arruado
com uma pequena capela que servia aos moradores ocupados nas atividades agrícolas,
especialmente na cultura do café.
A Serra de Maranguape na construção simbólica dos colonizadores estava
intimamente ligada às formas de ocupação e uso que se desenvolveram no período colonial e
imperial:
A serra proporcionava uma visão grandiosa e acabou criando uma série de mitos e
anseios entre os colonizadores, tanto os flamengos que passaram por lá rapidamente
como os lusitanos que creiam haver nela fontes de prata [...] foi realmente na serra que
encontrou sua fonte de riquezas: os cafezais e as frutas; e nos vales que a circundavam:
os canaviais. [...] aludimos a esse acontecimento para que tenhamos em vista a
construção simbólica que era vinculada às serras: a idéia de riqueza era quase
automática para o colonizador; fosse ele “aventureiro” ou “ladrilhador” - como diria
Sérgio Buarque de Holanda. (MACIEL, 2011, p. 28)
Sobre esta ideia de produção de riquezas é que entre 1851-1852 a Serra de
Maranguape se tornou a principal área produtora de café da província. Os luxuosos casarões e
palacetes que podem ser vistos hoje na sede do município são a memória e o testemunho das
riquezas que foram geradas nesse período.
As mudanças na paisagem durante o auge a produção cafeeira na Serra de
Maranguape (Figura 13) são apontadas por Duarte (2012) que relaciona as formas de ocupação,
as técnicas empregadas na produção agrícola e as implicações ambientais dela advindas. Para
o autor, os produtores agrícolas exerciam sua atividade de forma bastante rudimentar,
possuindo, em sua grande maioria, como instrumentos técnicos, machados, foices e enxadas
Esses sujeitos aturam na paisagem local, seja com a introdução de novas plantas como o café,
seja na derrubada de árvores para limpeza do terreno e outro plantio:
95
A transformação da paisagem a partir da derrubada de árvores e plantio de outras
espécies fez-se sentir não apenas na lavoura, mas em todo o cotidiano das unidades
produtivas. A madeira que não serviria para transforma-se em utensílios era utilizada
como lenha para uso doméstico. Nesse sentido, trabalho, produção, moradia e
utensílios domésticos estavam intimamente ligados aos recursos naturais disponíveis
aos produtores agrícolas (p. 133).
A produção cearense de café era destinada ao mercado interno e, em pequena
escala, era vendido para outras regiões. A partir de 1860 as exportações começaram a crescer,
ocasionando a necessidade de mais áreas voltadas ao cultivo do produto, o que provocou
maiores alterações na paisagem, em especial, nas zonas de serra. A produção concentrada nas
serras (Maranguape, Aratanha, Meruoca, Serra Grande, Chapada do Araripe, Serra do Machado
e a de Baturité) se justifica pela existência de condições ambientais favoráveis ao cultivo, quais
sejam a temperatura amena, a pluviosidade e os solos férteis. O uso do solo de forma predatória
sem a preocupação com sua estagnação associado às técnicas empregadas é um dos motivos
apontados pela baixa produtividade ocasionada com o passar do tempo do plantio (DUARTE,
2012; LIMA, 2000).
Figura 13 – Cultivo de café, traços da modificação na paisagem.
1
96
13.1 – Ingazeira (Inga ssp.) espécie do bioma caatinga
introduzida na Serra e plantada em consórcio com o café que
se desenvolvia a sua sombra, aumentando assim a qualidade
do produto. Além de servir de proteção contra inimigos
naturais e proteger os cafezais do sol, as folhas dessas
árvores ao se decomporem no solo, produzem humos que
enriquece o solo com nitrogênio.
13.2 – Pequeno canal de escoamento de água. Essa técnica
era bastante comum durante o apogeu da produção de café
na Serra abastecendo o consumo humano e a produção
(informação verbal).
Fonte: Próprio autor (2013)
Além da cultura do café, o algodão e a cana-de-açúcar foram culturas de destaque
nos sertões periféricos à Serra. O primeiro foi amplamente produzido no município e sua
produção era escoada para Fortaleza, que aquela época já centralizava as atividades terciárias
no estado. A produção de algodão foi a impulsora para o surgimento das primeiras unidades
fabris e para a instalação de infraestrutura, principalmente corredores e estradas que
possibilitaram o escoamento e a comercialização da produção no município (MENDES, 2006).
Com o declínio dessas atividades econômicas, duas outras atividades ganham
destaque na Serra: o veraneio e a bananicultura. As infraestruturas criadas no município dão
suporte para que se inicie, na primeira metade do século XX, a instalação de sítios e casas de
veraneio. A Serra se tornava assim, um atrativo para fortalezenses e famílias locais que
associam a essa paisagem um refúgio de tranquilidade e bucolismo. A partir desse tipo de
ocupação, baseado na instalação de segundas residências, implantaram-se equipamentos de
hotelaria e recreação, explorando o ambiente da Serra e seus recursos hídricos.
A bananicultura é introduzida na Serra durante a colonização portuguesa e passa a
ganhar destaque com o declínio do café, ocupando inicialmente as áreas deste. Os solos férteis
2
97
e a disponibilidade hídrica na Serra propiciaram a sua ampla difusão, tornando o município de
Maranguape um grande produtor da fruta. A forma de plantio envolve a separação de glebas de
aproximadamente 1 ha que são desmatadas, por vezes preservando as plantas frutíferas e as de
maior porte e intercaladas por faixas de matas de larguras variáveis que objetivam proteger os
bananais do vendo e da erosão. (IPT, 1975)
Em contraste com as bem equipadas casas de veraneio que ocupam a Serra, estão
pequenas comunidade, sempre localizadas a abaixo do nível de 700 m, elas se concentram na
vertente oriental e nos sertões de entorno. Arruda (2001) contabilizou 28 comunidades que têm
como base econômica, em sua maioria, a agricultura de subsistência e o extrativismo vegetal.
A agricultura é praticada com a plantação de pequenos roçados de milho, feijão e mandioca em
terras próprias ou sob sistema de meia junto aos sítios.
Figura 14 – Diferentes padrões de ocupação na APA.
2
1
98
As pequenas comunidades (14.1) em sua maioria são formadas
por ruas desalinhas e casas sem acabamento, contando com
infraestrutura precária em relação à água tratada, esgoto e coleta
de lixo. Em contraste, as casas de veraneios (14.2) dos sítios que
possuem uma infraestrutura boa, em sua parte construídas
próximas aos riachos, privatizando os recursos hídricos
utilizando-os para produção agrícola e lazer. Fonte: Próprio autor (2013)
Nas últimas duas décadas, o município de Maranguape passou por transformações
socioeconômicas significativas que merecem destaque para uma compreensão da relação
sociedade-natureza no município e, por conseguinte, na APA e suas estratégias de proteção.
O crescimento da população urbana em Maranguape se consolidou e apresentou
taxas de crescimento superiores a população rural (Tabela 02). Juntamente com o perfil
econômico do município, apesar de ter no setor de serviços o principal gerador do PIB
municipal, nos últimos anos a contribuição da indústria deu saltos significativos na produção
de riquezas em Maranguape (Gráfico 06). Isso está atrelado à instalação de várias indústrias
durante a década de 1990 no município a partir de incentivos fiscais. Esse fenômeno se insere
no processo de reestruturação produtiva pelo qual passa a RMF onde:
O estabelecimento de distritos industriais e de conjuntos habitacionais tem propiciado
uma complexa estrutura urbana, com alterações no arranjo socioespacial metropolitano,
novas dinâmicas intra-urbanas e nas relações entre as cidade [...] ocorre uma mudança
não somente na forma (organização espacial) e função dos municípios da RMF, mas
também, mudanças qualitativas que se referem à subjetividade e modo de vida como
conseqüência das novas práticas sociais e aceleração do tempo (MUNIZ et al., 2011, p.
10-11)
Nesse cenário, Maranguape que era conhecida como cidade-dormitório, pois a
maioria de seus residentes eram empregados em Fortaleza, passa a dispor de uma oferta maior
de empregos que não só redesenham a economia do município, mas as práticas sociais e a
percepção dos atores. Os ritmos da vida urbana consolidam a visão da Serra com um local de
lazer, que agora passa a ser atrelada a sensação de refúgio e tranquilidade, conferindo um
sentimento de identidade com o lugar:
Antes todo mundo conhecia todo mundo, aumentou o número de pessoas daí o transito
ficou maior [...] mudou também a estrutura urbana da cidade, mas Maranguape tem uma
coisa diferente, uma identidade, uma referência, diferente de Maracanaú, por exemplo.
Tem um aspecto bucólico que é da cidade mesmo. (Entrevistado IV, Grupo dos
Administradores)
99
Tabela 02 - População residente em Maranguape – 1991/2000/2010
Descrição 1991 2000 2010
Nº % Nº % Nº %
Urbana 51.954 72,46 65.268 74,05 86.309 76,00
Rural 19.751 27,54 22.867 25,95 27.252 24,00
Total 71.705 100 88.135 100 113.561 100
Taxa geométrica de
crescimento anual (%) 1991 2000 2010
Urbana 6,1 2,57 2,83
Rural -2,55 1,64 1,77
Total 2,74 2,32 2,57
Fonte: IBGE (2010)
Elaborado pelo autor
Gráfico 06 – Evolução do Produto Interno Bruto Municipal de Maranguape (1999-2011)
Fonte: IBGE (2010)
Elaborado pelo autor
Essa nova dinâmica é acompanhada por uma mudança nos usos na APA, a atividade
do veraneio e o turismo endógeno entram em estagnação na década de 1990 com a diminuição
do fluxo de visitação e relativo abandono dos sítios. A bananicultura, importante atividade de
impacto na paisagem, é praticada em 90,9% dos sítios da Serra (EMATECE, 1990 apud LIMA,
2005) havendo, portanto, íntima relação nesses dois tipos de uso. A banana prata é o tipo mais
produzido em Maranguape, na última década a produção sofreu significativa instabilidade, a
0
50.000
100.000
150.000
200.000
250.000
300.000
350.000
400.000
450.000
500.000
1999 2001 2003 2005 2007 2009 2011
R$
MIL
Agropecuária Indústria Serviços
100
diferença entre a maior produção e a menor é de 77,84 % e os números caíram: em 2002 se
produzia 1.640,94 toneladas enquanto que 2012 foram produzidos 749,78 (Gráfico 07)
Gráfico 07 – Quantidade de banana comercializada na CEASA proveniente de
Maranguape (2002-2013)
Fonte: CEASA
Elaborado pelo autor
Os preços da comercialização dessa produção foram em média de R$ 847.612,74,
dos 11 anos em análise, 9 ficaram abaixo dessa média (Gráfico 08). A relação entre a produção
e a movimentação financeira passou de 309,00 R$/t para 1.035,29 R$/t, uma variação de
235,05%, ou seja, os rendimentos da comercialização da produção subiram embora a
quantidade produzida tenha sido menor.
Gráfico 08 – Movimentação financeira da comercialização de banana proveniente de
Maranguape na CEASA (2002-2013)
Fonte: CEASA
Elaborado pelo autor
0
500
1.000
1.500
2.000
2.500
3.000
3.500
2002 2004 2006 2008 2010 2012
TO
NE
LA
DA
S
0
200.000
400.000
600.000
800.000
1.000.000
1.200.000
1.400.000
2002 2004 2006 2008 2010 2012
R$
101
Essa diminuição na produção pode ser explicada por dois motivos: o primeiro está
relacionado com a mudança no perfil econômico do município e o outro seria a estiagem dos
últimos três anos pelo qual o estado vem passado:
Tá muito difícil trabalhar com agricultura aqui, porque você ganha muito pouco, tem
que investir pra produzir e muitas vezes não compensa. A seca também atrapalha, o
povo passa é sede. A gente num recebe muito incentivo do governo, ai o agricultor
fica sem assistência [...] Assim o povo vai é trabalhar com outras coisas mesmo, da
menos trabalho e ganha mais, principalmente os mais jovens. (Entrevistado XI, Grupo
dos participativos).
O aumento dos rendimentos comerciais em relação à quantidade produzida pode
indicar que os produtores tenham se sentido menos pressionados em aumentar a área de
produção, buscando compensar uma eventual perda de lucro. Segundo o IBGE, em 2004, a área
de da lavoura de banana em Maranguape era de 1600 ha e passou para 504 ha em 2012, assim
a expressão e a intensidade desse tipo de uso na paisagem vem se modificando. Esse cenário
indica uma mudança no perfil das principais atividades exercidas na APA e dá subsídio ao
planejamento e gestão para a área.
Em relação a indicadores sociais e demográficos, na área da APA residem 8.848
pessoas, 51,4% do sexo masculino. Com base na renda (Tabela 03) e usando a classificação de
classes sociais do IBGE, o perfil socioeconômico se distribui em 53,75% dos moradores
pertencentes à classe E14, 2,16% nas classes C e D e 0,13% nas classes A e B. São ao todo 2.233
domicílios, 14 estabelecimentos agropecuários, 2 estabelecimentos de saúde e 12 de ensino, a
maior parte ocupa áreas de Zona Rural enquanto que as Áreas Urbanizada de Cidade ou Vila15
são menores e de maior densidade.
Em geral, os domicílios que apresentam melhor condição de infraestrutura estão
localizados nas áreas próximas as zonas urbanas que correspondem às áreas da vertente oriental,
em oposição às áreas de platô e os sertões periféricos, um levantamento sobre a situação dos
domicílios nos permite entender a qualidade de habitação na APA.
14 Não foi considerada a população sem renda. 15 Nomenclatura do IBGE.
102
Tabela 03 – Renda nominal mensal em salários mínimos das pessoas de 10 anos ou mais
de idade moradoras em domicílios particulares permanentes na APA da Serra de
Maranguape
Descrição APA Maranguape
Total % Total
Menos de 1 3337 46,10 9021
Mais de 1 a 2 554 7,65 9719
Mais de 2 a 5 130 1,80 7237
Mais de 5 a 10 26 0,36 1083
Mais de 10 a 20 9 0,12 251
Mais de 20 1 0,01 62
Sem renda 3182 43,96 x*
*Dado não localizado no âmbito de município.
Fonte: IBGE (2010)
Elaborado pelo autor
O abastecimento de rede elétrica (Tabela 04) atinge 98,6% dos domicílios, apresentando
uma boa cobertura. Somente 0,3% deles não possuem a companhia distribuidora como fonte
principal. Embora o Atlas de Potencial Eólico do Brasil de 2001 do Ministério de Minas Energia
aponte a área com velocidade média anual de ventos entre 7,0 e 7,5 m/s, o que representa uma
potência instalável de 48,77 GW de energia elétrica e poderia significar uma medida sustentável
de aproveitamento dos recursos naturais compatível com as finalidades da APA.
Tabela 04 – Energia elétrica nos domicílios particulares permanentes na APA da Serra
de Maranguape
Descrição
Com energia
elétrica
Com energia elétrica
de companhia
distribuidora
Com energia
elétrica de outras
fontes
Sem energia elétrica
Total % Total % Total % Total %
APA 2.201 98,6 2.195 98,3 6 0,3 32 1,4
Maranguape 28.709 99,1 28.606 98,7 103 0,4 275 0,9
Fonte: IBGE (2010)
Elaborado pelo autor
A maior parte do abastecimento de água dos domicílios na APA (Tabela 05) é feita pelo
acesso a rede geral, o acesso por poços e nascente apresenta relativa expressão (10,9%) se
comparado ao restante do município (3,3%), assim como outras formas de abastecimento que
103
incluem carros-pipa, fontes públicas, poço e bicas localizados fora das propriedades. Em estudo
sobre as águas subterrâneas nos limites da APA, Cavalcante et al (2001) relatam que a grande
maioria dos poços existentes na área de estudo foram perfurados entre 1960 e 1980 (período
que corresponde ao início e consolidação da área como espaço de lazer e veraneio). A maior
abrangência de domínio desses poços é particular (54,4%) com perfuração nos aluviões ao logo
das drenagens principais, sendo a água destinada ao uso doméstico (58%), agrícola (18%),
dessedentação de animais (2%), doméstico e agrícola (3%), doméstico e industrial (1%),
industrial (10%), múltiplo (1%) e recreação (7%).
Uma vez que na APA o uso dos recursos hídricos superficiais e subterrâneos assume
expressividade no território, as alterações na paisagem merecem ser observadas mais
atentamente em relação à repercussão sanitária-ambiental desse uso. Em 88,7% dos domicílios
existem pelo menos um banheiro (Tabela 06), porcentagem menor se comparada ao município
como um todo (95,3%). A incidência de domicílios sem banheiros encontra-se, principalmente,
nas porções da Serra do Japarara e Gereraú e nos sertões periféricos. O cenário se agrava quando
se constata que, segundo o Sistema de Informação da Atenção Básica (SIAB) do Ministério da
Saúde, no ano de 2011, somente 4,3% dos domicílios em Maranguape possuíam ligação com a
rede de esgoto.
Tabela 05 – Abastecimento de água nos domicílios particulares permanentes na
APA da Serra de Maranguape
Descrição Rede geral Poço ou nascente
na propriedade
Chuva armazenada
em cisterna
Outra forma de
abastecimento
Total % Total % Total % Total %
APA 1.257 56,3 243 10,9 0 0,0 732 32,8
Maranguape 24.027 82,9 969 3,3 63 0,2 3.925 13,5
Fonte: IBGE (2010)
Elaborado pelo autor
104
Tabela 06 – Domicílios particulares permanentes com banheiro ou sanitário na APA da
Serra de Maranguape
Descrição
Com banheiro de uso
exclusivo dos moradores
ou sanitário
Sem banheiro de uso
exclusivo dos moradores
e nem sanitário
Total % Total %
APA 1.981 88,7 252 11,3
Maranguape 27.618 95,3 1.366 4,7
Fonte: IBGE (2010)
Elaborado pelo autor
Em complemento as informações sobre saneamento, acrescentam-se os dados sobre
o destino do lixo na APA (Tabela 07). O maior percentual dos resíduos gerados na área de
proteção é coletado pelo serviço público (67,49%), mas é considerável a quantidade de lixo
com destino inadequado ao ser queimado (28,08%) e jogado em terreno baldio (3,94%). A
prática de queimar o lixo é geralmente realizada em domicílios da área rural e/ou área com
deficiência de coleta. Com a vantagem de reduzir o volume dos resíduos, a queima pode ter
como consequências negativas a liberação de gases tóxicos na atmosfera e a contaminação do
solo e lençol freático por metais pesados. O lixo descartado a céu aberto é potencial poluidor
do solo e água que pelo tempo de decomposição interfere nos processos ecológicos, além de
ser veículo de transmissão de doenças.
105
Tabela 07 – Destino do lixo nos domicílios particulares permanentes na APA da Serra de
Maranguape
Descrição APA Maranguape
Total % Total %
Coletado 1.507 67,49 24.370 84,08
Coletado por serviço de limpeza 1.148 51,41 17.342 59,83
Coleta em caçamba por serviço de
limpeza 359 16,08 7.028 24,25
Queimado (na propriedade) 627 28,08 3.682 12,70
Enterrado (na propriedade) 10 0,45 130 0,45
Jogado em terreno baldio ou logradouro 88 3,94 678 2,34
Jogado em rio, lago ou mar 1 0,04 13 0,04
Outro destino 0 0,00 111 0,38
Fonte: IBGE (2010)
Elaborado pelo autor
A elaboração desse quadro socioeconômico traz elementos da dinâmica social e sua
relação com os aspectos físico-naturais no território, inserindo-os numa perspectiva de tempo e
relacionando-os com as percepções dos atores. Pretende-se, assim, demonstrar essa implicação
na fisionomia e configuração da paisagem e que relações podem ser traçadas com os objetivos
e finalidades da Área de Proteção Ambiental. O Quadro 06 apresenta um quando-resumo desse
esforço, demonstrando os principais acontecimentos na área relacionando-os com as
implicações na configuração da paisagem.
106
Quadro 06 – Quadro de tempo: fatos marcantes e suas implicações na paisagem
(continua)
ANO CRONOLOGIA DE FATOS MARCANTES
IMPLICAÇÕES NA
CONFIGURAÇÃO DA
PAISAGEM
1630
1649/1654
1650
▪ Segunda expedição holandesa chefiada por Matias Beck;
▪ Exploração de minas de prata no Monte Itarema (Aratanha);
▪ Os portugueses expulsam os holandeses do Ceará.
Nenhuma intervenção, mata nativa
ocupa toda a área;
1707
1754
1760
▪ A Coroa portuguesa faz as primeiras concessões de sesmarias para o capitão-mor do Ceará Luís Quaresma e família;
▪ Reiniciam-se as explorações de prata no Monte ltarema;
▪ Acelera-se o povoamento; Maranguape torna-se distrito de Fortaleza;
Instalação das primeiras edificações;
desmatamento e descaracterização da
relação indígena com a paisagem.
1800
1849
1851
1862
1869
1876
▪ Efetiva-se real povoamento através do português Joaquim Lopes de Abreu, originando-se a cidade de Maranguape; Inicia-se cultura
cafeeira (vertentes), canavieira (planície) paralela à criação de gado e agricultura de subsistência;
▪ A freguesia de Messejana é transferida para Maranguape;
▪ Maranguape é elevada a vila e o café toma-se principal economia;
▪ Surto de "Cólera morbus" vitimou mais de 2.000 pessoas; construção da Igreja Matriz e praças;
▪ Inauguração da estrada de ferro Fortaleza-Maranguape- Baturité;
▪ Chegada de imigrantes portugueses que iniciam a cultura da banana;
As vegetações originais são
afetadas pela proliferação de
cafezais; Pequenas residências são
construídas como suporte a
produção cafeeira com
infraestrutura habitacional mínima.
1910 -1917
1915 -1920
1920
1930
1938
1947
1960
1969
1960-1970
1970
1973
1974 29/04
1983
▪ Arborização das ruas, iluminação pública (acetileno), reforma no mercado público, limpeza de ruas e terrenos baldios e iluminação
elétrica contribuem para o desenvolvimento da cidade;
▪ Grande surto migratório contribui para a expansão da zona urbana;
▪ Decadência dos cafezais. Cultura é substituída por algodão, cana-de-açúcar, agricultura de subsistência na planície e fruteiras na serra,
especialmente a banana prata (imigrantes portugueses);
▪ Inserção de equipamentos urbanos e instalação de indústria de transformação em Maranguape atrai famílias à serra. Inicia-se a
construção de segundas residências (para lazer em fins de semana) na vertente oriental;
▪ O município de Caucaia (vertente ocidental) eleva-se à cidade;
▪ Inauguração da rodovia Fortaleza-Maranguape-Canindé. Acelera-se o plantio da banana nas vertentes, vertentes, nos alvéolos e fundos
de vales;
▪ Acentuam-se as roças de banana nas vertentes em direção aos platôs, fazendo desta cultura a principal economia do município;
▪ Maranguape desmembra-se de Pacatuba;
▪ Os atrativos naturais da serra incentivam a construção de clubes tais como: Cascatinha Clube de Serra, Balneário Pirapora Palace,
Guarani e vários restaurantes todos na vertente oriental;
▪ Instalação do distrito Industrial de Fortaleza em Maranguape no distrito de Maracanaú acompanhando de um crescimento populacional
que demandam a construção de conjuntos habitacionais na vertente oriental;
▪ A população de Maracanaú ultrapassa a sede (Maranguape), marcando a decadência na economia primária e o desenvolvimento
industrial de Maracanaú. É criada a RMF e Maranguape passa a ser conhecida como cidade-dormitório por ter grande parte de sua
população trabalhando em Fortaleza ou em Maracanaú. Período crítico no desenvolvimento econômico da sede maranguapense;
▪ Expressivo deslizamento de terras mata 14 pessoas no setor turístico (vertente oriental) desencadeando sucessivos novos deslizamentos
por toda essa vertente;
▪ Maracanaú desmembra-se de Maranguape e este entra numa grave crise econômica, à medida que suas empresas abrem falência ou são
transferidas para o Distrito Industrial. O município perde vários incentivos, inclusive aqueles ligados ao setor agrícola;
Os padrões de ocupação se
diversificam e se intensificam. O
veraneio e a bananicultura
despontam como os principais usos
na Serra que passa a ser associada
ao lazer e a recreação. A
disponibilidade hídrica e o clima
ameno passam a constituir os
principais recursos na organização
do território que implica em
modificações na qualidade da água,
cobertura vegetal e estabilidade dos
solos.
107
Quadro 06 – Quadro de tempo: fatos marcantes e suas implicações na paisagem (conclusão)
ANO CRONOLOGIA DE FATOS MARCANTES
IMPLICAÇÕES NA
CONFIGURAÇÃO DA
PAISAGEM
1990
1993
1998
1999
2012
2013
▪ Maranguape retoma o crescimento, desta vez adotando o processo de globalização da economia com atividades totalmente desligadas
do potencial natural local quando recebe grandes indústrias tais como: DAKOTA, MALLOR Y. BONEBRAZ, ITAJAÍ, MICREL
BENFIO e várias agroindústrias tais como: YPIOCA, GRANJAS JORAGRE, GRANJAS CIALNE, AGUARDENTE DANDIZ e outras;
▪ Atividades de veraneio diminuem e entram em estagnação;
▪ Criação da APA da Serra de Maranguape pelo poder municipal;
▪ Criação do Projeto Serra Viva;
▪ Publicado o Zoneamento Ambiental e o Plano de Gestão da APA da Serra de Maranguape
▪ Execução de projetos ligados ao meio ambiente e à reorientação da produção agrícola sustentável, a preservação do patrimônio cultural
e o incentivo ao ecoturismo;
▪ Início da construção da barragem do rio Maranguapinho;
▪ Reformulação do Conselho Municipal de Meio Ambiente
A atividade industrial redesenha o
perfil socioeconômico do
município. O veraneio entra em
estagnação e são criadas e
implementadas atividades de
proteção ambiental pelo Estado e
por grupos civis organizados que
buscam regulamentar o uso
sustentável dos recursos naturais.
Fonte: Adaptado de Arruda (2001)
108
4.1.5 Compartimentação da Paisagem
Ao propor o estudo da paisagem através da análise geossistêmica, Bertrand (1968)
entende a paisagem enquanto síntese das inter-relações de seus elementos e propõe um sistema
taxonômico em sua delimitação, no qual a escala é o elemento central de análise. Cada unidade
visa estabelecer uma homogeneidade aos aspectos da paisagem através de elementos sintéticos
e, ao mesmo tempo, situá-los em uma perspectiva espaço-temporal (Quadro 07).
Quadro 07 – Classificação das Paisagens por Bertrand
Unidade da
paisagem
Escala
espaço-
temporal (CAILLEUX;
TRICART)
Exemplo tomado
numa mesma série
de paisagens
Relevo (1) Clima (2) Biogeografia
Zona G. I (*) Intertropical - Zonal Bioma
Domínio G.II
das Depressões
Interplanálticas
Semiáridas
Domínio
estrutural Regional Domínio região
Região
natural G.III-IV Depressão sertaneja
Região
estrutural -
Geocomplexo G. IV-V
Maciço Residual
(Serra de
Maranguape)
Unidade
estrutural Local
Zona
equipotencial
Geofácies G. VI Vertente úmida - - -
Geótopo G.VII Mangue
de Altitude - Microclima
Biótopo
biocenose
Nota: (*) G = Grandeza. As grandezas entre as unidades são muito aproximativas e dadas somente a título de exemplo. 1 Conforme - A. Cailleux e J. Tricart; 2 Conforme - M. Sorre;
Fonte: Adaptado de Bertrand (2007)
Na escala de análise do geocomplexo se encontram a maior parte dos fenômenos
entre os elementos da paisagem de interesse ao geógrafo, permitindo uma análise compatível
com a escala humana. Três são os aspectos a serem levados em consideração: morfológico
(expressão física do arranjo dos elementos com sua estrutura espacial e dinâmica), o fluxo de
matéria e energia (alimenta a dinâmica dos elementos) e a papel dos seres vivos, incluindo as
sociedades e suas atividades.
Por se tratar de um modelo dinâmico, o geossistema não possui necessariamente
uma homogeneidade funcional ou fisionômica. Isso explica o fato de haver no interior das
escalas uma diferenciação entre as paisagens, assim o mosaico de unidades fisionomicamente
109
homogêneas dentro de um geocomplexo pode ser individualizado através das geofácies que
traduzem um tipo individualizado de exploração do espaço.
A pesquisa considerou a Serra de Maranguape como uma unidade de paisagem na
escala do geocomplexo, agrupando os dados sobre os elementos discutidos no presente capítulo,
organizando as dinâmicas percebidas na paisagem, especializando-as em suas geofácies,
objetivando construir um referencial para discussão entre os elementos da paisagem e a APA.
Foi levado em consideração o trabalho já elaborado por Ceará (2002) que utiliza a proposta de
Souza (2000) na utilização de critérios geomorfológicos como expressão de síntese na
delimitação dessas unidades.
São delimitadas seis unidades que se encontram descritas no Quadro 08
110
Quadro 08 – Compartimentação da paisagem da APA da Serra de Maranguape
(continua)
GEOFÁCIE
COMPONENTES DA PAISAGEM
CRONO-LITO-
ESTRATIGRAFIA GEOMORFOLOGIA HIDROCLIMATOLOGIA SOLOS
COBERTURA
VEGETAL
USO/OCUPAÇÃO
1) Superfície do
Platô Dissecado:
Área central do
maciço resi-
dual em níveis
de 400 a 760
m.
Complexo granítico-
migmatítico Pré-
Cambriano encaixado
em rochas xistosas e
gnaisses; diabásios
Mesozóicos–terciários
dispostos em diques;
colúvios Tércio-Quar-
tenários de piemonte e
depósitos aluviais
quaternários.
Superfície pediplanada de
cimeira retrabalhada sob
condições úmidas e
dissecada em cristas
colinas e lombas alonga-
das, cujas vertentes pre-
dominantes têm classes
de declives variáveis
entre 15 e 45% a mais,
configurando topografias
fortes onduladas a monta-
nhosas, intercaladas por
vales em forma de V;
problemas ambientais
podem decorrer da peque-
na dimensão dos interflú-
vios e da forte inclinação
das vertentes e com riscos
de erosão variando de
moderado a severo em
dependência do estado de
conservação da vegetação
primária.
Densa rede fluvial
exibindo padrões
dendríticos e subden-
dríticos; pluviometria
média anual de 1.000 a
1.400 mm com período
chuvoso de janeiro a
junho; baixo potencial de
águas subterrâneas.
Topos dos relevos e
altas vertentes
Arboreto climático
perenifólio.
(mata úmida pere-
nifólia e subpereni-
fólia) em estado de
conservação ou de
degradação
moderada; Baixa
taxa de ocupação e
uso agrícola.
Argissolos
vermelho-
Amarelos
solos profundos
bem drenados e
fertilidade natural
média;
Baixas vertentes
Neossolos Litólicos
Solos rasos, are-
nosos, pedrego-
sos e fertilidade
natural média a
alta;
Fundos de vales:
Neossolos Flúvicos
solos profundos
mal drenados e
fertilidade natural
média a alta
111
Quadro 08 – Compartimentação da paisagem da APA da Serra de Maranguape
(continua)
GEOFÁCIE
COMPONENTES DA PAISAGEM
CRONO-LITO-
ESTRATIGRAFIA GEOMORFOLOGIA HIDROCLIMATOLOGIA SOLOS
COBERTURA
VEGETAL
USO/OCUPAÇÃO
2) Superfície de
Platô Conser-
vado ou com
Relevo pouco
Movimentado:
Área centro-
norte do topo
da Serra em
níveis de 420
a 720 m.
Complexo granítico
migmatítico Pré-Cam-
briano encaixado em
rochas xistosas e
gnaisses; colúvios Tér-
cio-Quartenários de pie-
monte e depósitos
aluviais quaternários.
Superfície pediplanada de
cimeira submetida a
entalhes pouco profundos
da drenagem superficial.
Declives das vertentes
variando de 5 a 15%,
configurando feições
topográficas de onduladas
a muito onduladas,
intercaladas por vales
mais abertos; a morfo-
dinâmica atual pode
apresentar riscos de
erosão em função de
desma-tamentos
desordenados.
Rede fluvial modera-
damente densa; pluvio-
metria média anual de
1.l00 a 1.400 mm com
período chuvoso de
janeiro a junho; baixo
potencial de águas
subterrâneas
Topos dos relevos e
médias a baixas
vertentes suaves
Arboreto climático
perenifólio.
(mata úmida pere-
nifólia e subpereni-
fólia) em estado de
conservação ou de
degradação mode-
rada; Área de fruticu-
ltura e baixa ocupação
Argissolos
vermelho-
Amarelos
solos profundos
bem drenados e
fertilidade natural
média;
Fundos de vales:
Neossolos Flúvicos
Solos profundos
mal drenados e
fertilidade natu-
ral média a alta
112
Quadro 08 – Compartimentação da paisagem da APA da Serra de Maranguape
(continua)
GEOFÁCIE
COMPONENTES DA PAISAGEM
CRONO-LITO-
ESTRATIGRAFIA GEOMORFOLOGIA HIDROCLIMATOLOGIA SOLOS
COBERTURA
VEGETAL
USO/OCUPAÇÃO
3)Vertente
Oriental:
Encosta úmida
(barlavento) do
maciço resi-
dual, estenden-
do-se para nor-
deste em níveis
de 200 a 400 m
.
Complexo granítico
migmatítico Pré-cam-
briano encaixado em
rochas xistosas e
gnaisses; depósitos
detríticos cenozóicos
com elásticos grosseiros
(talus).
Vertente íngreme exibin-
do evidências de super-
fície pediplanada de
climas secos retraba-
lhadas sob condições
úmidas; classes de decli-
ves variáveis entre 15 e
45% a mais configurando
topografias fortemente
onduladas a montanhosas
e ocorrências de corre-
deiras que entalham a
superfície da vertente;
riscos de erosão variando
de moderado a severo em
dependência do estado de
conservação da vegetação
primária e do tipo de uso
e ocupação da terra
associados às técnicas
agrícolas empregadas.
Sistema de drenagem
radial e dendrítico e
convergindo para o rio
Maranguapinho: pluvio-
metria média anual de
1.100 a 400 mm com
período chuvoso de
janeiro a junho; baixo
potencial de águas
subterrâneas.
Médias e baixas
vertentes íngremes
Arboreto climático
estacional semi-
caducifólio (mata
Seca)
e
Arboreto climático
estacional caducifólio
(vegetação
caducifólia de
Caatinga);
Área de fruticultura e
lavouras de subsis-
tência. Maior adensa-
mento com destinação
ao lazer e veraneio;
Neossolos
Litólicos
Solos rasos,
arenosos, pedre-
gosos e
fertilidade natural
média a alta;
afloramentos
rochosos; Vertentes suaves
Argissolos
vermelho-
Amarelos
solos profundos
bem drenados e
fertilidade natu-
ral média;
113
Quadro 08 – Compartimentação da paisagem da APA da Serra de Maranguape
(continua)
GEOFÁCIE
COMPONENTES DA PAISAGEM
CRONO-LITO-
ESTRATIGRAFIA GEOMORFOLOGIA HIDROCLIMATOLOGIA SOLOS
COBERTURA
VEGETAL
USO/OCUPAÇÃO
4) Vertente
Ocidental
Encosta seca
(sotavento) do
maciço residual
estendendo-se de
sudeste para
Nor-deste em
níveis de 200 –
520 m
Complexo granítico-
migmatítico Pré-Cam-
briano encaixado em
rochas xistosas e
gnaisses; depósitos
detríticos
Cenozóicos com elásti-
cos grosseiros (talus).
Vertente íngreme exibin-
do evidências de superfí-
cies pediplanadas de
climas secos; classes de
declives variáveis entre
15 e 45% a mais, configu-
rando topografias forte-
mente onduladas a
montanhosas e escarpa-
das; riscos de erosão
severa em dependência do
estado de conservação da
vegetação primária.
Sistema de drenagem
convergindo para o rio
Ceará; pluviometria
média anual abaixo de
900 mm com período
chuvoso entre fevereiro e
maio; baixo potencial de
águas subterrâneas.
Altas vertentes
Arboreto climático
estacional caducifólio
(Vegetação Caducifólia
de Caatinga)
e
Arboreto climático
estacional semi-
caducifólio (Mata Seca);
Lavouras de sub-
sistência, fruticultura,
pastagem e extrati-
vismo vegetal
Afloramentos
rochosos e
neossolos
litólicos
solos rasos, are-
nosos e
fertilidade natural
média; Médias e baixas
vertentes
Solos litólicos e
argissolos
vermelho-
amarelos
rasos, textura
média e fertili-
dade natural mé-
dia a alta
114
Quadro 08 – Compartimentação da paisagem na APA da Serra de Maranguape
(continua)
GEOFÁCIE
COMPONENTES DA PAISAGEM
CRONO-LITO-
ESTRATIGRAFIA GEOMORFOLOGIA HIDROCLIMATOLOGIA SOLOS
COBERTURA
VEGETAL
USO/OCUPAÇÃO
5) Vertente
Meridional e
rebordos
Área sudoeste
do maciço resi-
dual em níveis
de 200 a 420 m.
Complexo granítico-
migmatítico Pré-Cam-
briano encaixado em
rochas xistosas e
gnaisses; depósitos
detríticos Cenozóicos
com elásticos grosseiros
(talus) e colúvios
Tércio-quartenários de
piemontes.
Vertente íngreme e com
patamares suaves com
caimento topográfico
para a depressão sertane-
ja, exibindo evidências de
superfícies pediplanadas
de climas secos; classes
de declives variáveis
entre 5 a 15% (topogra-
fias ondula-das e muito
onduladas) e eventual-
mente entre 15 e 45%
(topografias forte ondula-
das tendendo à montanho-
sa); riscos de erosão
severa em dependência do
estado de conservação da
vegetação primária e do
tipo de ocupação da terra
associados às técnicas
agrícolas empregadas.
Sistema de drenagem
convergindo para o rio
Ceará; pluviometria
média anual abaixo de
900 mm com período
chuvoso entre fevereiro e
maio; baixo potencial de
águas subterrâneas.
Altas vertentes
Arboreto climático
estacional caducifólio
(Vegetação Caducifólia
de Caatinga)
e
Arboreto climático
estacional semi-
caducifólio (Mata Seca);
Lavouras de sub-
sistência, fruticultura,
pastagem e extrati-
vismo mineral e ve-
getal
Neossolos litólicos
solos rasos, are-
nosos e
fertilidade natural
média;
Médias e baixas
vertentes
Solos litólicos e
argissolos
vermelho-
amarelos
rasos, textura
média e fertili-
dade natural mé-
dia a alta
115
Quadro 08 - Compartimentação da paisagem da APA da Serra de Maranguape
(conclusão)
GEOFÁCIE
COMPONENTES DA PAISAGEM
CRONO-LITO-
ESTRATIGRAFIA GEOMORFOLOGIA HIDROCLIMATOLOGIA SOLOS
COBERTURA
VEGETAL
USO/OCUPAÇÃO
6) Sertões
Periféricos
Áreas da de-
pressão serta-
neja circunja-
cente ao ma-
ciço residual
abaixo do nível
altimetríco de
100m.
Complexo granítico-
migmatítico Pré-Cam-
briano com rochas
xistosas e gnaisses; de-
pósitos aluviais qua-
ternários nos fundos de
vales
Superfície de aplaina-
mento sertaneja fraca a
moderadamente disseca-
da em colinas rasas ou em
interflúvios de topos pla-
nos.
Densa rede fluvial dotada
de cursos d'água inter-
mitentes sazonais e com
padrões Sub-dendríticos,
convergindo para o rio
Maranguapinho a leste e
para o rio Ceará a oeste;
pluviometria média anual
de 900 mm com período
chuvoso entre fevereiro e
maio.
Médias e baixas
vertentes:
Arboreto climático
estacional caducifólio
(Vegetação Caducifólia
de Caatinga)
Parcialmente degra-
dada; área de uso
agropecuário e de
extrativismo vegetal e
mineral
Planossolos
solos rasos, mal
drenados, textura
arenosa e fertili-dade
natural mé-dia;
Bordas de vales
Planossolos Háplicos
solos rasos mal
drenados textura are-
nosa com problemas
de sais. Níveis residuais
Neossolos litólicos
e afloramentos
rochosos
Fundos de vales:
Neossolos Flúvicos
espessos modera-
damente drenados,
fertilidade natura
média com proble-
mas de sais
116
Figura 15 - Mapa da Compartimentação Ambiental da APA da Serra de Maranguape
Fonte: Ceará (2002)
117
4.2 A INTERFACE SOCIEDADE-NATUREZA E A CRIAÇÃO E GESTÃO DA APA DA
SERRA DE MARANGUAPE
4.2.1 Tipos de uso e implicações na paisagem
Enquanto Unidade de Conservação de Uso Sustentável, a APA permite a
permanência de atividades sociais em seu interior, buscando compatibilizá-las com a
conservação dos recursos existentes. No capítulo anterior, foram abordados os principais tipos
de uso na Serra de Maranguape em sua relação com os componentes físico-naturais e ao sistema
de representação dos atores, colocando-os numa perspectiva dinâmica de tempo que
apontassem para um cenário atual de sua repercussão na paisagem. Levantados esses usos,
discute-se nesse tópico as suas implicações na paisagem procurando espacializá-los para
construir um referencial de discussão sobre a análise integrada da paisagem e a estratégia da
criação e da gestão da APA da Serra de Maranguape.
4.2.1.1 Uso Agrícola
É sem dúvida o uso mais comum na APA e está diretamente ligado a alta
disponibilidade hídrica, aos solos férteis e ao clima ameno. São dois os principais tipos de
cultivos: temporários, que incluem culturas como milho, feijão, mandioca e cana-de-açúcar e
permanente, que inclui a cultura da banana.
Os cultivos temporários ocorrem com maior expressão nos sertões periféricos, na
vertente ocidental, na vertente meridional e rebordos e na vertente oriental. São cultivos que
geralmente são realizados durante a quadra chuvosa e dependem dela para o seu
desenvolvimento. O preparo do terreno acontece inicialmente com o desmatamento da área,
seguido por queimadas para eliminar as gramíneas e herbáceas, sendo concluído com o destoco
das raízes do solo.
A retirada da vegetação contribui para acelerar processos erosivos que culminam
na perda das qualidades físico-químicas (e consequente empobrecimento) dos solos e no
assoreamento dos mananciais hídricos, reduzindo a disponibilidade hídrica, fato que pode ser
potencializado pela declividade do terreno como os encontrados na APA. As queimadas afetam
os solos e a diversidade biótica quando reduzem o percentual de matéria orgânica disponível
do solo e interferem na fauna edáfica.
118
O cultivo permanente é representado pela cultura da banana, outras árvores
frutíferas também aparecem dispersas, como jaqueiras, mangueiras e laranjeiras. Ele ocupa
mais fortemente a vertente oriental e os platôs, seu plantio acontece na maioria das situações
ocupando áreas de mata úmida, onde melhor se adapta. A substituição da vegetação nativa pela
bananeira reduz a proteção do solo ao escoamento superficial e ao impacto das águas da chuva,
as raízes pouco profundas corroboram para a pouca fixação do solo (LIMA, 2005) podendo
ocasionar movimento de massa como os já registrados pela literatura (IPT (1985) e Cordeiro
(2011)). O plantio acontece muitas vezes de forma indiscriminada pela serra ocupando áreas de
declividade alta, olhos d’água e matas ciliares comprometendo os recursos hídricos.
Figura 16 – Uso agrícola na paisagem
1
2
119
16.1 – Terreno preparado para o plantio de milho e feijão.
16.2 – Nascente de água com mata ciliar substituída pelo plantio
de banana.
16.3 – Bananal ocupando áreas de declives acentuados.
Fonte: Próprio autor (2013)
4.2.1.2 Moradia e veraneio
A área de maior densidade demográfica da APA corresponde a vertente oriental,
enquanto que a mais populosa corresponde aos sertões periféricos. Como discutido no capítulo
anterior, as condições de moradia, principalmente no que diz respeito aos aspectos sanitários,
implicam sobre a qualidade dos recursos hídricos. Associado a esse fato está a
impermeabilização do solo pelas edificações e vias de acesso, que por um lado aumenta o
escoamento superficial, podendo causar a intensificação de processos morfodinâmicos e, por
outro, reduz o aporte de água ao lençol freático.
O veraneio e o lazer são atividades que se desenvolvem no aproveitamento das
condições naturais da Serra ligados a um sistema de representação que os associam a um refúgio
de tranquilidade e descanso. Em muitas situações, há o represamento dos cursos d’água que é
utilizada para o abastecimento e recreação dessas residências, privatizando e interferindo na
dinâmica fluvial e no habitat de espécies da fauna e flora que a ela se associa.
3
120
Figura 17 – Repercussões na paisagem da moradia e veraneio
17.1 – Reservatório de água formado pelo represamento do
riacho Pirapora destinado a residências de veraneio adjacentes.
17.2 – Desmatamento da mata úmida para criar uma via de
acesso à residência localizada no platô conservado.
Fonte: Próprio autor (2013)
4.2.1.3 Extrativismo e criação de animais
A retirada da vegetação para ser utilizada como lenha e na produção de carvão
vegetal acontece em todo o maciço e área da APA, tratando-se de uma prática comum em todo
o Nordeste e de grande impacto na paisagem repercutindo diretamente sobre a biodiversidade
e os processos ecológicos.
O desequilíbrio causado pelo desmatamento repercute na proliferação de doenças,
como a leishmaniose, que afeta os moradores serranos (ARRUDA, 2001). Rufino Amaro
2
1
121
(2001) analisando a relação entre a cobertura vegetal em um reduto de Mata Atlântica e a
incidência de leishmaniose na população, constatou que a retirada da vegetação contribui para
que mamíferos silvestres morram ou migrem, deixando os mosquitos flebotomíneos, vetores da
doença, sem suas fontes alimentares naturais, recorrendo ao ser humano e transmitindo o agente
infeccioso da doença.
A extração mineral no maciço de Maranguape ocorre com a exploração de granitos
na parte setentrional do maciço, fora dos limites da APA, e com a extração de areia nos sertões
de entrono, ambas destinadas à construção civil. Como nem toda a extensão do maciço pertence
a APA, essa atividade altamente impactante não é regulada por ela, o que significa um
mecanismo a menos de fiscalização e controle sobre os seus impactos que afetam os recursos
hídricos, a biodiversidade e as comunidades vizinhas.
A produção de animal é característica da economia de Maranguape onde se
desenvolvem a avicultura, suinocultura e a criação de gado leiteiro. Na APA essas atividades
acontecem nos sertões de entorno, se por um lado dinamizam a economia local, do ponto de
vista ambiental são potencialmente comprometedoras dos sistemas. A produção extensiva cria
a necessidade de desmatamento de áreas para o pasto e em excesso compromete os solos e a
renovação da vegetação. A produção confinada, embora reduza o impacto sobre a vegetação,
gera grande quantidade de resíduos que não podem ser diretamente descartados sob o risco de
poluição dos solos, recursos hídricos e contribuir na proliferação de vetores de doenças (BNB,
2008).
Figura 18 – Criação de animais na APA
1
122
18.1 – Granja de aves nos sertões de entrono.
18.2 – Acúmulo de efluente de suinocultura lançado sem
tratamento em riacho na APA da Serra de Maranguape.
Fonte: Próprio autor (2013)
Para compreender as transformações que esses usos e formas de ocupação implicam
na paisagem, foi produzido o Mapa de Uso e Cobertura na APA da Serra de Maranguape (Mapa
03). A partir dele, foi possível estimar a expressão16, em termos de áreas, das classes de usos
consideradas (Quadro 08). Embora a presença de um ambiente de exceção tenha sido um dos
fatores motivadores da criação da APA, a maior parte dela (59,66%) é coberta pelo tipo de
vegetação predominante em seu contexto regional (fato discutido mais profundamente a
diante). As áreas edificadas apresentam pouca expressividade no interior da APA (1,27 %) e
localizam-se, em geral, próximas a superfícies com água (2,29 %). A presença de áreas urbana
é mais forte fora da unidade, concentrando-se em seu entorno, o que provoca maior pressão
sobre os recursos em seus limites. Dos usos agrícolas, o temporário tem maior destaque (16,95
%), o permanente (2,39 %) é espacialmente mais concentrado e se intensifica nas áreas com
altitude superior a 350 m, ocupando, principalmente, áreas em meio à vegetação perenifólia.
A Figura 20 detalha os tipos de uso e cobertura na APA vistos sobre a área do
maciço a partir de sua vertente oriental permitindo observar sua ocorrência em relação às
diferenças de altitude.
16 Existe certa imprecisão nas coordenadas obtidas para cálculo das áreas, o que torna os valores destoantes do
real, todavia, são aceitáveis para demostrar as diferentes magnitudes em que as classes se apresentam na APA.
2
123
Quadro 08 – Estimativa da abrangência absoluta e percentual das classes de uso e
cobertura na APA da Serra de Maranguape
Fonte: Elaborado pelo autor
Figura 19 – Perfil esquemático em 3D do uso e cobertura na vertente oriental
da Serra de Maranguape
Classes de uso e cobertura Área (ha) Percentual (%)
Superfície com água 161,30 2,29
Área Urbana 89,58 1,27
Vegetação caducifólia 4.201,88 59,66
Vegetação perenifólia 1.228,98 17,45
Uso agrícola temporário 1.193,65 16,95
Uso agrícola permanente 168,18 2,39
Total 7.043,57 100,00
Fonte: Elaborado pelo autor
124
Mapa 04 - Uso e cobertura na APA da Serra de Maranguape
125
4.2.2 Instrumentos de regulamentação e gestão sobre a APA
A estratégia de criação e gestão de Unidades de Conservação de uso sustentável
implica na adoção de uma série de medidas e posturas no cumprimento de objetivos para
alcançar a proteção da biodiversidade e a conservação dos recursos. Na configuração da
paisagem, novos elementos passam a atuar sobre seus subsistemas promovendo modificações
que são passiveis de ser aprendidas pela análise paisagística em dupla perspectiva,
reconhecendo a forma como atuam e a efetividade que promovem.
Para tanto, é preciso determinar quais os instrumentos disponíveis e como estão
sendo utilizados, relacionado sua concepção e materialização na paisagem e em que
circunstâncias podem ser aperfeiçoados, tendo como enfoque a interface sociedade-natureza.
Enumeram-se, então, os instrumentos previstos e existentes para a APA da Serra de
Maranguape buscando diagnosticar sua aplicação e efetividade.
4.2.2.1 Áreas de Preservação Permanente
As Áreas de Preservação Permanentes (APP) são uma categoria de área protegidas
presentes na legislação instituída pelo Código Florestal Brasileiro, Lei nº 12.651/12. As APP
são áreas “cobertas ou não por vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os
recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica, a biodiversidade, o fluxo gênico de
fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas” (BRASIL,
2012). São exemplos: as áreas marginais dos corpos d’água (rios, córregos, lagos, reservatórios)
e nascentes; áreas de topo de morros e montanhas, áreas em encostas acentuadas, restingas e
mangues, entre outras.
As APP cumprem importante papel no desenvolvimento sustentável do meio rural
em duas perspectivas, uma física, sobre os componentes da paisagem, e outra sobre os serviços
ecológicos prestados:
· IMPORTÂNCIA FÍSICA: - Em encostas acentuadas, a vegetação promovendo a estabilidade do solo pelo
emaranhado de raízes das plantas, evitando sua perda por erosão e protegendo as partes
mais baixas do terreno, como as estradas e os cursos d’água;
- Na área agrícola, evitando ou estabilizando os processos erosivos;
- Como quebra-ventos nas áreas de cultivo;
- Nas áreas de nascentes, a vegetação atuando como um amortecedor das chuvas,
evitando o seu impacto direto sobre o solo e a sua paulatina compactação. Permite, pois,
juntamente com toda a massa de raízes das plantas, que o solo permaneça poroso e capaz
de absorver a água das chuvas, alimentando os lençóis freáticos; por sua vez, evita que
126
o escoamento superficial excessivo de água carregue partículas de solo e resíduos
tóxicos provenientes das atividades agrícolas para o leito dos cursos d’água, poluindo-
os e assoreando-os;
- Nas margens de cursos d’água ou reservatórios, garantindo a estabilização de suas
margens evitando que o seu solo seja levado diretamente para o leito dos cursos;
atuando como um filtro ou como um “sistema tampão”. Esta interface entre as áreas
agrícolas e de pastagens com o ambiente aquático possibilita sua participação no
controle da erosão do solo e da qualidade da água, evitando o carreamento direto para
o ambiente aquático de sedimentos, nutrientes e produtos químicos provenientes das
partes mais altas do terreno, os quais afetam a qualidade da água, diminuem a vida útil
dos reservatórios, das instalações hidroelétricas e dos sistemas de irrigação;
- No controle hidrológico de uma bacia hidrográfica, regulando o fluxo de água
superficial e sub-superficial, e assim do lençol freático.
· SERVIÇOS ECOLÓGICOS
- Geração de sítios para os inimigos naturais de pragas para alimentação, reprodução;
- Fornecimento de refúgio e alimento (pólen e néctar) para os insetos polinizadores de
culturas;
- Refúgio e alimento para a fauna terrestre e aquática;
- Corredores de fluxo gênico para os elementos da flora e da fauna pela possível
interconexão de APP adjacentes ou com áreas de Reserva Legal;
- Detoxificação de substâncias tóxicas provenientes das atividades agrícolas por
organismos da meso e microfauna associada às raízes das plantas;
- Controle de pragas do solo;
- Reciclagem de nutrientes;
- Fixação de carbono, entre outros. (SKORUPA, 2003, p.02)
Tendo como base a legislação e as características dos componentes físico-naturais
na APA da Serra de Maranguape, as seguintes áreas foram identificadas como Áreas de
Preservação Permanente:
i) As faixas de 30 m dos cursos d’água natural com menos de 10 m de largura;
ii) Áreas com raio de 50 m no entorno das nascentes e dos olhos d’água;
iii) Terrenos com declividade superior a 45°;
iv) Os terrenos com declividade superior a 25° encontrados acima de 2/3 da altura
do maciço em relação à base (topos de morro);
v) Faixas de 50m no entorno de lagoas naturais e reservatórios menores que 20 ha.
Essas áreas podem ser visualizadas no Mapa 04. Ao comparar o mapa de uso e
cobertura com o mapa das APP, percebe-se a existência de conflitos entre os usos e essa forma
de regulamentação do território na APA. Nos sertões de entorno, o conflito mais evidente é a
prática agrícola no entorno de lagoas, reservatório e cursos d’água. A busca por terrenos com
disponibilidade hídrica e solos férteis é fator impulsionador desta prática que pode comprometer
a qualidade da água e promover o assoreamento dos corpos hídricos e canais fluviais. Na área
de serra, vertente oriental e platôs, a prática agrícola em terrenos de declividade acentuada e a
127
margem de riachos são práticas que favorecem a movimentação de massa, o comprometimento
dos corpos hídricos e da biodiversidade (LIMA, 2005).
Figura 20 - Ocupação em área de APP
Vegetação natural substituída por bananal nas margens do riacho
Pirapora.
Fonte: Próprio autor (2013)
128
Mapa 05 – Áreas de Preservação Permanente da APA da Serra de Maranguape
129
4.2.2.2 Planejamento e gestão
O planejamento é uma etapa do processo administrativo que consiste em examinar
o futuro e traçar um plano de ação de médio e longo prazo (Maximiano, 1995). O Planejamento
ambiental corresponde à atividade de conhecimento, formulação e atualização de um plano de
aproveitamento, com vistas ao desenvolvimento sustentado de uma área (BEZERRA, 1996,
p.25 in CÔRTE, 1997, p. 47). É um processo que consiste em estabelecer e programar um
conjunto de ações necessárias para alcançar uma situação desejada, definida por objetivos, a
partir de uma situação atual e do conhecimento que se tem desta situação no momento da
tomada de decisão.
O planejamento de uma APA, dessa forma, consiste na formulação de um plano de
atividades que visem alcançar os objetivos definidos em sua criação. O Roteiro Metodológico
para a Gestão de Área de Proteção Ambiental do IBAMA define três fases para o planejamento
de uma APA (Quadro 09), as ações tomadas nesse processo levam a obtenção de Planos de
Gestão que contém as diretrizes propostas para a consolidação da APA.
Quadro 09 – Principais Enfoques das Fases de Planejamento de APA
Fonte: IBAMA (2001)
A gestão ambiental envolve o conjunto de decisões tomadas na mediação de
conflitos de uso dos recursos naturais em relação a demandas sociais e ambientais (BEZERRA,
1996, p.27 in CÔRTE, 1997, p. 65). É um processo complementar ao planejamento ambiental
que foca na ação e mediação para concretização dos objetivos estabelecidos.
FASE 1 FASE 2 FASE 3
▪ Sistematizar conhecimento exis-
tente sobre a APA;
▪Definir áreas estratégicas e homo-
genias no território e estabelecer as
normas;
▪ Implementar o Sistema de Gestão:
i) Iniciar as ações prioritárias
de gestão da APA;
ii) Priorizar as ações em
caráter pibto nas áreas
estratégicas;
iii) Estruturar o sistema de
Gestão.
▪ Aumentar o conhecimento sobre a
biodiversidade na APA;
▪ Ampliar as ações prioritárias para
todo a APA;
▪ Definir o Zoneamento da APA e as
normas ambientais;
▪ Estabelecer programas de Ação
para a Gestão;
▪ Aperfeiçoar o Sistema de Gestão;
▪ Promover a capacitação de Agente.
▪ Aprofundar o conhecimento,
pesquisa e as ações de proteção à
biodiversidade;
▪ Promover o aperfeiçoamento do
Zoneamento e das normas am-
bientais;
▪ Plano de Gestão se consolida para
a proteção da biodiversidade e o
desenvolvimento sustentável com
alcance regional;
▪ Ampliar a descentralização e au-
tonomia do processo de gestão;
▪ Promover avanço institucional e
criar mecanismo de geração de
recurso.
130
Nessa concepção, gerir uma APA “significa exercer sobre ela um conjunto de ações
políticas, legislativas e administrativas, para que, partindo de uma realidade atual se atingir um
novo cenário, previamente planejado, segundo objetivos preestabelecidos” (CORTÊ, 1997,
p.66). Os instrumentos, diretrizes, ações e os recursos (humanos, administrativos, financeiros e
legais) utilizados nesse processo são definidos no Plano de Gestão da unidade que segundo
IBAMA (2001) deve conter:
i) Quadro Socioambiental/Diagnóstico – Expõe dados, análises e interpretações da
dinâmica socioambiental. Abrange análises do meio biótico, abiótico,
socioeconômico e dos aspectos políticos e institucionais, no âmbito do território
interno e macrorregional da APA;
ii) Matriz de Planejamento ou Quadro Lógico do Plano - Apresenta os principais
elementos do Plano realçando as ligações lógicas entre os recursos previstos, as
ações planificadas e os resultados propostos;
iii) Zoneamento Ambiental - Instrumento que estabelece a ordenação do território
da APA, e as normas de ocupação e uso do solo e dos recursos naturais.
iv) Programas de Ação - Organizam o conjunto de atividades na realização para
alcançar os objetivos específicos da APA dentro das estratégias estabelecidas.
v) Sistema de Gestão - Apresenta a composição do Comitê Gestor, instância de
direção colegiada e dos instrumentos legais que o estabelecem;
vi) Procedimentos de Monitoria e Avaliação - Avalia a interação entre o
planejamento e a execução, possibilitando corrigir desvios e retroalimentar
permanentemente todo o processo de planejamento.
Um primeiro olhar sobre o planejamento da APA da Serra de Maranguape passa
pela discussão sobre sua criação e limites. Como já tratado anteriormente, a Serra de
Maranguape abriga refúgios florestais de Mata Atlântica dentro do bioma Caatinga, tratando-
se de uma área de relevância ecológica regional, ao mesmo tempo em que suas características
físico-naturais singulares condicionam o desenvolvimento de atividades e formas de uso e
ocupação distintas ao seu entorno.
A demarcação da Serra como uma área de protegida vem nesse sentido proteger
esse refúgio através da regulamentação sobre as formas de uso que nela se dão. Por se tratar de
uma iniciativa do governo municipal, somente a parte do maciço em Maranguape pertence à
APA. Sobre o ponto de vista integrado e sistêmico, essa restrição não é capaz de oferecer
efetividade na conservação dessa área, isso porque, partindo de uma perspectiva biológica, por
131
exemplo, tal recorte promove a fragmentação de habitats e elimina a conectividade entre eles,
comprometendo a flutuações demográficas das espécies, as cadeias alimentares e seus
processos reprodutivos (BENSUSAN, 2001). Da mesma forma, torna pouco eficiente as
medidas administrativas que se encontram limitadas ao município de Maranguape e não alcança
a totalidade dos grupos sociais envolvidos. Na iniciativa de corrigir esse fato, já se encontra
tramitando no CONPAM (órgão responsável pela gestão das Unidades de Conservação no
estado) a proposta de estadualizar a APA da Serra de Maranguape (informação verbal)17, o que
traria novos cenários à unidade e sua gestão.
A delimitação e o desenho de áreas protegidas são temas bastante complexos
abordados na literatura científica. Para Santos & Tabarelli (2003), as proposições nessas
questões, em princípio, podem partir de abordagens biológicas em três níveis básicos: nível de
espécie, nível de comunidade e nível ecossistêmico (ou combinados). Cada uma dessas
abordagens, combinadas com interesses políticos, sociais e econômicos, pode levar à seleção
de diferentes áreas com diferentes desenhos. A União Internacional para a Conservação da
Natureza e dos Recursos Naturais (IUCN), na publicação sobre as Diretrizes para o
Planejamento e Gestão de Áreas Montanhosas Protegidas, salienta que na escolha dessas áreas,
alguns fatores devem ser considerados:
1. Nas áreas de serra, montanha, cordilheira etc. é de responsabilidade dos governos,
em cujo território elas se encontram, assegurar que as áreas protegidas criadas
promovam de forma adequada a valoração biológica, física e cultural em seus limites;
embora os governos não têm necessariamente de controlá-las.
2. As áreas protegidas devem ser delimitadas utilizando os critérios de design oriundos
da ciência da biologia da conservação, como por exemplo:
- Maior é melhor do que menor;
- Uma área não fragmentada de qualquer tamanho é melhor do que muitas
pequenas áreas descontínuas;
- Com área de amortecimento é melhor do que nenhuma;
- Borda mínima ou perímetro (arredondado ou em blocos, em vez de linear);
- Conectada é melhor do que desconectada.
3. Para proteger a biodiversidade das mudanças climáticas, áreas protegidas
montanhosas devem ser estendidas das encostas para as planícies e, em alguns lugares
para o mar.
4. Tendo em vista escassez de água de alta qualidade, cabeceiras de montanha são locais
particularmente desejáveis para a proteção da terra/água.
5. Áreas protegidas devem ser planejadas e delineadas em uma escala biorregional,
vinculado à paisagem circundante.
6. Antecipar a proteção a áreas pouco habitadas que estão se tornando valorizadas em
um mundo cada vez mais urbanizado, comercial e frenético.
7. Possibilitar a proteção para terras, privadas ou comunitárias, que já se encontram em
sistema de manejo sustentável na agricultura, pecuária e silvicultura.
17 Informação obtida junto a SEMADE em fevereiro de 2014.
132
8. Selecionar e delimitar com ênfase na unidade hidrológica da bacia, a montante e a
jusante, tanto quanto possível. (HAMILTON & MCMILLAN, 2004, p. 21-22, tradução
nossa)
A APA da Serra de Maranguape é delimitada a partir da cota de 100 m do maciço18,
esse limite coloca sobre proteção não somente áreas de mata úmida, mas também porções
recobertas por mata seca e caatinga. Esse design acarreta duas implicações na gestão da
unidade, em primeiro lugar garante a integração do refúgio florestal da Mata Atlântica com a
paisagem circundante que acaba por funcionar como uma espécie de zona de amortecimento19
para esta, reduzindo o efeito de borda20 na mesma. Por outro lado, trata-se de uma área de
ocupação mais intensa, com uma diversidade de usos maiores, o que implica em garantir
recursos (humanos, financeiros, administrativos) adequados com as necessidades que se
apresentam à gestão. Além disso, diversificam-se os grupos sociais e suas atividades dentro do
processo de gestão participativa, incluído percepções diferenciadas sobre a paisagem e sobre as
atividades econômicas tornando mais complexa a mediação de conflitos.
4.2.2.2.1 Zoneamento e plano de gestão
Além das análises sobre a criação e desenho da unidade, a discussão sobre o
planejamento de uma APA recai sobre os instrumentos a ela previstos, quais sejam: o
Zoneamento, o Plano de Gestão, o Monitoramento e Avaliação e o Plano Operativo Anual
(CORTÊ, 1997). O Zoneamento e o Plano de Gestão existentes para a APA da Serra de
Maranguape foram produzidos pela SEMACE no ano de 2002. O documento elaborado por
uma equipe multidisciplinar apresenta de forma bastante sucinta o quadro geral dos dispositivos
legais da APA, um relato sobre seu processo de ocupação, uma caracterização ambiental com
uma proposta de zoneamento e por fim um conjunto de ações propostas à gestão da unidade.
O zoneamento, apresentado para a APA, foi elaborado com base na metodologia
proposta por Bertand (1971) na delimitação de unidades espaciais e na avaliação de sua
18 A proposta inicial seria estabelecer o limite a partir da conta de 200 m, no entanto, para que o Serrote do Japarara
também fosse incluído na APA esse limite foi revisto. Informação verbal obtida em entrevista em fevereiro de
2014. 19 Ressalta-se que a Zona de Amortecimento enquanto instrumento de gestão prevista no SNUC não contempla a
categoria das APA. 20 Efeito decorrente do processo de fragmentação florestal que implica em alterações físicas e biológicas sobre as
áreas limítrofes desses fragmentos em relação ao seu interior. Pode desencadear a perturbação física da vegetação
e do solo, mudanças do meio abiótico e nas trocas de energia do ecossistema eventualmente influenciando na
dinâmica ecológica do fragmento como um todo (RODRIGUES & NASCIMENTO, 2006).
133
capacidade de suporte, a partir do balanço entre os processos morfoclimáticos e os processos
pedogenéticos, com base em Tricart (1977). São assim propostas quatro zonas:
(1) Zona de conservação da mata primitiva de cimeira – Compreende as áreas do
platô dissecado e conservado, agrupando ambientes estáveis nas vertentes, quando
em estado de equilíbrio, com instabilidade tendendo a intermediária e instável,
sendo priorizada a conservação da vegetação;
(2) Zona de conservação e recuperação ambiental da mata primitiva de encosta –
Engloba a vertente oriental e vertente ocidental. São ambientes instáveis em função
do uso e ocupação e da excessiva degradação da cobertura vegetal e dos solos, em
condições de dinâmica regressiva. As altas vertentes são tidas como de uso restrito
para a conservação da vegetação, já as baixas vertentes são tolerados usos de forma
controlada;
(3) Zona de conservação e recuperação ambiental da mata seca e da caatinga –
Engloba a vertente meridional e setentrional. Reuni ambientes de transição onde o
uso intenso proporciona uma evolução com dinâmica regressiva;
(4) Zona de uso extensivo dos sertões periféricos da serra – Ambientes de transição
tendendo a instabilidade em face da expansão de desmatamentos e pecuária
extensiva. Em áreas de equilíbrio natural, o ambiente é estável favorecendo a
pedogênese.
A proposição dessas Zonas atende a necessidade de ordenamento da APA no nível
de planejamento, entretanto, no nível de gestão se tornam bastantes genéricas ao oferecer
suporte à tomada de decisões, isso porque, apesar de bem delimitadas, são concebidas
priorizando critérios físico-naturais, homogeneizando os padrões de uso e a intensidade de
como se apresentam em seu interior. Esse impasse decorre para aquilo que Bertrand (2007)
chama atenção sobre impor a uma realidade social uma interpretação global sob um ponto de
vista reducionista, típica da análise ecossistêmica. A importação desatenta do conceito de
capacidade de suporte21 da Ecologia para a Geografia conduz a esse tipo de análise, em que as
21Em ecologia trata-se do “limite que determinado ecossistema é capaz de suportar (ou manter) uma população ou
populações em nível de equilíbrio, isto é, no ponto em que não há modificações significativas no número de
indivíduos dessa população” (ART, 1998, p. 65). Em Geografia, a “capacidade de suporte inclui condições de
potencialidades e limitações. As potencialidades são tratadas como atividades ou condições exeqüíveis de praticar
em cada sistema ambiental, sendo propícias à implantação de atividades ou de infra-estruturas. As limitações ao
uso produtivo [...] são identificadas com base na vulnerabilidade e nas deficiências do potencial produtivo dos
recursos naturais e no estado de conservação da natureza, em função dos impactos produzidos pela ocupação”
(SOUZA, 2009 p.32 grifo nosso).
134
atividades sociais repercutem sobre um sistema ambiental da mesma forma que uma população
de uma determinada espécie, desconsiderando, assim, o aspecto histórico no desenvolvimento
das sociedades e seus sistemas técnicos.
Esse tipo de visão é bastante recorrente na análise de sistemas naturais de ordem
geográfica e ecológica, como exemplifica Caracristi (2006):
Os ecossistemas semi-áridos, de modo geral, são considerados “frágeis”, e por isso
potencialmente “vulneráveis” diante do uso e ocupação atuais. E essa adjetivação
comum aos diagnósticos ambientais faz-nos indagar: qual o ecossistema que e “pouco
vulnerável” a ações continuas de usos e ocupações degradadoras? Ou, qual o
ecossistema que pode ser considerado “forte” ou “não frágil”? Os critérios de
classificação são baseados na dinâmica de organização inerentes aos ecossistemas ou a
partir do viés econômico de sua capacidade produtiva? Será que um ecossistema terá a
mesma “capacidade produtiva” diante de modos de produção e de usos e ocupações
diferentes? Ele poderá deixar de ser “frágil” em outro contexto explicativo? (p. 33-34)
Dessa forma, as noções de potencialidade e vulnerabilidade representam uma visão
reducionista sobre as atividades sociais na paisagem. Concretamente, dentro desse tipo de
processo de ordenamento territorial, as formas de uso e ocupação, em sua complexidade, são
secundarizadas, gerando um produto pouco eficiente à gestão, porque as visualizam de forma
estática. Uma vez que se objetiva não somente inibi-las, mas compatibilizá-las aos processos
físico-naturais, é importante que as proposições de ordenamento reconheçam os usos e
ocupações em sua diversidade de intensidade e o papel e características dos atores como sendo
partes de um elemento dinâmico na organização de uma configuração específica da paisagem22.
Reconhece-se assim, o caráter integrado dos elementos na produção de um arsenal de
informações mais coerente, sob uma visão de interface entre sociedade-natureza, tornando
eficiente o levantamento e recrutamento de alternativas disponíveis (e a serem criadas) no
controle dos usos na busca por sustentabilidade.
Essa leitura trata-se de uma contribuição geográfica, a partir dos pressupostos
teórico-metodológicos do Sistema GTP, ao processo multidisciplinar de planejamento de uma
Unidade de Conservação de uso sustentável, levantando novos enfoques no trato das regulações
sobre o uso e ocupação para uma gestão ambiental efetiva.
22Para Caracristi (2006): “numa análise sistêmica, quando as relações são compreendidas pelas suas
funcionalidades, entramos fatalmente numa perspectiva mecanicista/determinista de dinâmica enquanto
movimento espacial, pois as funções estabelecem relações de causa e efeito entre os componentes e o todo do
sistema” (p.35), assim: “a dinâmica sistêmica [não mecanicista] deve ser recursiva e dialógica, o que implicara a
concepção de uma dinâmica não-linear recursiva (complexa), interativa e auto-organizadora dos sistemas naturais”
(p.34). A paisagem, sob uma análise sistêmica, não apresenta, pois uma funcionalidade na relação entre seus
componentes e os usos, na verdade é necessário entender como eles se inserem em um padrão de organização no
qual ela emerge, o que subsidia avaliar seu papel/sua repercussão no todo.
135
O último instrumento de planejamento em análise trata-se do Plano de Gestão, o
qual foi concebido através de uma oficina que buscou reunir representantes do governo
(municipal, estadual e federal) e da sociedade (sindicatos, ONG, empreendedores e moradores).
Nesse processo, foram levantados os problemas ambientais na APA e definidos objetivos a
serem alcançados para solucioná-los, sendo atribuída a cada um deles um conjunto de ações e
colaboradores para realizá-las (CEARÁ, 2002).
As ações propostas no Plano de Gestão (Anexo B) contemplam os objetivos da APA
e incidem sobre todas problemáticas diagnosticada pela pesquisa na relação entre o uso
sustentável dos recursos e sua conservação. A proposição de ações que passam pela regulação,
inibição, fiscalização e construção de alternativas aos usos na APA torna o Plano um rico
instrumento capaz de conduzir a efetividade da unidade. Em partes, o plano atende o que é
recomendado pelo Roteiro Metodológico para a Gestão de Área de Proteção Ambiental do
IBAMA, mas é falho ao apresentar um diagnóstico socioeconômico com detalhamento somente
sobre o município, sem especificar nada sobre a APA e em não possuir uma Matriz de
Planejamento23 com uma proposta de alocação de recursos, fatores que podem auxiliar na
tomada de decisões pelos gestores na execução de atividades.
A capacidade administrativa de executar todas as atividades elencadas no
planejamento de uma APA depende da estruturação de seu Sistema de Gestão que representa o
componente gerencial da unidade, sendo composto pela instituição de um Comitê Gestor, de
caráter consultivo, e os instrumentos legais que estabelece. O Comitê Gestor se caracteriza
como órgão colegiado superior responsável pela coordenação do Sistema de Gestão e formado
por instituições responsáveis pela APA e entidades co-gestoras. Tal comitê, deve se constituir
de uma Secretaria Executiva, órgão coordenado pelo poder executivo, através do administrador
da APA (IBAMA, 2011).
O caráter participativo que o Comitê assume é de suma importância, pois cria um
espaço para que os atores envolvidos possam dialogar. Como ressalta Limonad (2008), a
decisão quanto à ocupação de uma APA é uma decisão eminentemente política. Qualquer
intervenção nesse processo, portanto, é permeada por interesses privados, por relações de poder
e pelo grau de articulação política dos diversos grupos sociais envolvidos e atingidos.
23 A Matriz de Planejamento é uma forma de estruturar e apresentar os principais elementos do Plano [de gestão].
Realça as ligações lógicas entre os recursos previstos, as ações planificadas e os resultados propostos. Proporciona
uma visualização do plano de forma sintética, a partir da missão da APA e da estratégia adotada para atingi-la.
Apresenta, ainda, os diferentes resultados/atividades que o compõem, os indicadores e meios de verificação dos
mesmos, bem como os pressupostos dentro dos quais foi estabelecido (IBAMA, 2001 p. 57)
136
O Comitê se torna assim uma instância em que os conflitos podem ser mediados no
cumprimento dos objetivos da unidade. O Sistema GTP, ao considerar na configuração da
paisagem, a percepção dos grupos sociais, permite que na análise paisagística se perceba o
comportamento dos atores e os conflitos existentes, produzindo de forma integrada uma leitura
sobre suas atividades, projetos e percepções e a relação que estabelecem com a dinâmica do
meio. Nesse sentido, a leitura oferecida pelo sistema GTP oferece subsídios aos gestores de
Unidades de Conservação de uso sustentável no entendimento das relações de conflito na
conservação dos recursos e é totalmente compatível com o formato do Comitê Gestor, quando
ao oferecer essas leituras para o gestor lhe orienta na mediação de conflitos junto aos atores.
Na APA da Serra de Maranguape, a criação do Comitê Gestor foi regulamentada
pelo poder público de Maranguape através do Decreto Municipal 1.097, de junho de 1999,
sendo formado por representantes da própria Prefeitura, IBAMA, SEMACE, da União das
Entidades Comunitárias de Maranguape (UNECOM) e moradores da Serra. No entanto, ele se
encontra desativado, deixando a APA sem um órgão centralizado em sua gestão. As medidas
de intervenção na APA são executadas pela prefeitura, através da SEMADE, que não conta com
um responsável designado para tanto e se ocupa também de todas as outras atividades de gestão
ambiental no município, dispondo de recursos reduzidos.
Dessa forma, a APA não possui um instrumento ativo na execução de atividades de
planejamento, no controle dos usos e formas de ocupações, de normatização e fiscalização. As
ações acontecem de maneira não sistemática pela intervenção esporádica da secretaria
municipal, ou pela iniciativa individual de moradores e ONG, sem uma coesão ou com objetivos
que se complementem. A ausência de um Comitê Gestor torna a APA um “parque de papel”,
que existe em termos legais, mas não se efetiva concretamente. Por esse motivo, é impossível
avaliar o papel que a APA desempenha enquanto política de desenvolvimento sustentável,
todavia, a análise da paisagem desenvolvida pelo presente trabalho demonstra de que maneira
a ausência de um organismo de gestão contribui para a ocorrência de problemas ambientais na
Serra, ao mesmo tempo, oferece subsídios na operação de um sistema de gestão de UC.
137
4.2.3 A APA na percepção dos grupos sociais
O desenvolvimento das atividades no território, através de suas formas de
apropriação e intervenção, está associado às formas de representação ou representações sociais
que conferem identidade a esse território. As percepções acerca da paisagem e as identidades
dos grupos sociais correspondem a uma dinâmica no espaço geográfico, uma expressão
imaterial da relação entre os sujeitos e a materialidade da paisagem. Essas expressões imateriais
traduzem referências das características dinâmicas que se manifestam na paisagem em sua
complexidade de inter-relações entre as atividades econômicas, os elementos geoecológicos e
as manifestações culturais (BERTRAND, 2007).
Tomando como referência as formas como os grupos sociais se apercebem do local
e da paisagem é que se torna possível estabelecer uma interface sociedade-natureza. Para este
estudo, as percepções dos sujeitos sobre as estratégias de criação e gestão de Unidades de
Conservação de uso sustentável fornecem uma base de análise para uma compreensão integrada
sobre a efetividade dessa política ambiental, tornando possível elaborar diagnósticos e
prognósticos.
Os grupos sociais se caracterizam pela reunião de indivíduos em torno de uma
mesma prática na natureza, e que produzem um conjunto coerente de bens materiais e culturais,
compartilhando percepções e projetos do papel que desempenham na paisagem (BERTRAND,
2007). Levando em consideração os usos que desenvolvem e a forma que se inserem no
processo de criação e gestão da UC, foram delimitados quatro grupos sociais na APA da Serra
de Maranguape: moradores, administradores (ligados ao Estado), participativos (sociedade civil
organizada) e empreendedores.
Todos os grupos reconhecem a singularidade do refúgio de Mata Atlântica no
maciço de Maranguape, por isso avaliam como positivo a criação da unidade, nenhum dos
entrevistados afirmou desconhecer a sua existência. No entanto, eles percebem que houve
intensas transformações ao logo do tempo e que a adoção de medidas conservacionistas é
necessária:
É sim pra ter uma forma de proteger isso aqui, é uma riqueza que tem que ter uma
atenção pra que as pessoas tomem consciência e cuidem da natureza (Entrevistado V,
Grupo dos Moradores).
Proteger a Serra é uma forma de garantir a sustentabilidade, manter o que existe pras
futuras gerações e é um dever de todos contribuir, já pensou como pode ficar se ninguém
não se preocupar e não tomar uma atitude? (Entrevistado XV Grupo dos
Administradores)
138
Essas transformações apontadas comprometem os aspectos singulares do cotidiano
e aqueles que lhes conferem identidade com o local como: bucolismo, vida comunitária,
decadência econômica e perca de referências morais.
Sobre como os grupos percebem a apropriação dos elementos geoecológicos da
Serra em seu cotidiano, as respostas foram variadas. O grupo dos administradores tendia a se
referir de forma bastante técnica e abstrata, tais como: “o clima” ou “os recursos hídricos”. No
grupo dos moradores havia certa dificuldade em estabelecer uma relação direta do cotidiano
com os elementos naturais. No entanto, as repostas elegeram a disponibilidade hídrica e o
aproveitamento dos solos na produção de frutas como as mais relevantes. Os atores ligados a
ONG ressaltaram os processos ecológicos e a biodiversidade no desempenho de serviços
ambientais. Para os empreendedores havia um potencial pouco explorado pela deficiência de
infraestrutura para realização de atividades econômicas.
Em relação ao estado de conservação dos ecossistemas, os administradores
classificaram como regular ou bom o estado atual, todos os outros demonstraram perceber
descaso na conservação e que muitas ações se fazem necessárias. Quando questionados sobre
ter conhecimento de alguma medida adotada nesse sentido, todos citaram o combate às
queimadas. Os moradores disseram ser comuns intervenções do IBAMA no combate às
queimadas, já em relação ao combate à caça houve informações contraditórias sobre a atuação
dessa instituição. A ausência dessas medidas era percebida na paisagem, principalmente pelo
desmatamento e ao histórico de eventos de movimentos de massa na Serra.
Quando perguntados sobre as perspectivas de mudanças que os grupos enxergam
para o futuro, os administradores se demonstram pessimistas porque não sentiam por parte dos
outros atores mudanças em suas posturas. No entanto, eles acreditavam no papel da ciência e
do planejamento em poder rever o atual quadro e possibilitar uma melhor qualidade de vida
para os moradores da Serra. Os participativos vislumbram que a não adoção de medidas
imediatas levaria a uma piora do quadro atual e veem no governo o agente responsável nesse
processo. Os moradores almejavam melhores condições de vida por meio do aumento da
escolaridade e melhores condições de emprego e moradia.
139
4.2.4 Análise geográfica integrada na avaliação de indicadores de efetividade.
Frente às ameaças e dificuldades que permeiam a criação e a gestão de áreas
protegidas, despontou no meio científico a necessidade de se avaliar a efetividade dessas áreas.
Mesmo após o planejamento e a execução de um plano de gestão para uma área protegida, uma
série de questões de ordem técnicas, políticas, econômicas, culturais, financeiras etc. põem em
xeque a viabilidade dessas áreas. Avaliar a efetividade de uma área protegida seria, assim sendo,
considerar como o conjunto de ações que, com base em habilidades, capacidades e
competências especiais, permitem satisfatoriamente cumprir a função para a qual foi criada a
área protegida (CIFUENTES, IZURIETA e FARIA, 2000)
Mackinnon et al. (1986 apud Morsello, 2001) elencam como benefícios que podem
ser alcançados com a avaliação do manejo:
Verificar se os objetivos de manejo e o plano em si são realistas;
Julgar se os recursos financeiros e humanos são suficientes para alcançar esses
objetivos;
Preparação de programas de manejo no futuro;
Ajudar no entendimento do valor que as UC têm para a comunidade nacional e
internacional;
Auxiliar na melhoria das técnicas de manejo.
A avaliação de efetividade é, portanto, uma ferramenta de importância fundamental
na concretização das estratégias de conservação, colocando-se como instrumento que oferece a
possibilidade de conhecer a situação das ações de gestão e dá subsídio à tomada de decisão.
A partir das leituras feitas na análise da paisagem e dos produtos por elas gerados,
buscou-se avaliar a efetividade da criação e gestão da APA da Serra de Maranguape. O processo
de gestão ambiental envolve diferentes variáveis, o que o torna transdisciplinar. A posição aqui
adotada almejou oferecer-lhe contribuições a partir da leitura geográfica integrada por meio da
adoção do sistema GTP.
Como referencial nesse processo de análise, foi construído um quadro de
indicadores com base nos trabalhos de Cifuentes, Izurieta e Faria (2000) e de Faria (2004) que
propuseram em seus trabalhos variáveis chaves na avaliação de manejo de áreas protegidas. Os
indicadores são agrupados em âmbitos que permitem visualizar aspectos globais de gestão,
correspondendo ao nível de maior hierarquia. Esses, por sua vez, englobam variáveis que são
indicadores mais sensíveis para descrever uma ação, atividade ou situação relativa a um
140
determinado âmbito. Conforme Quadro 10, foram considerados os seguintes âmbitos e suas
respectivas variáveis:
Âmbito Administração – Contempla aspectos que permitem medir a capacidade
de manejo institucional, incluindo condições de boa organização interna, gestão
de recursos humanos, financeiros e de infraestrutura; todas voltadas a cumprir as
metas e objetivos propostos pela administração a médio e longo prazo.
Âmbito Planejamento – Entendido como o processo contínuo de elaborar,
revisar e aprovar os objetivos estabelecidos, o planejamento é avaliado através
da análise dos seus instrumentos (plano de manejo/gestão, zoneamento etc.) e
medidas de controle existentes.
Âmbito Político-Legal – A legislação é a ferramenta que fornece diretrizes para
a jurisprudência institucional sobre as áreas protegidas. Contempla-se nesse
âmbito avaliar a existência de leis ou políticas que auxiliem a gestão e garantam
a permanência a longo prazo da área.
Âmbito Qualidade dos Recursos Protegidos – São avaliados fatores que podem
ser determinantes para o cumprimento dos objetivos de manejo. São
considerados aspectos biogeográficos como também a avaliação do estado dos
recursos interiores e as formas predominantes do entorno, além das ameaças
externas e internas, fatores naturais ou antrópicos que comungam para o
descumprimento dos objetivos de manejo. As variáveis destacadas aqui
compreenderam:
Desenho: refere-se à figura da área fragmentação da totalidade da área,
que poderá sofrer maiores ou menores impactos oriundos do efeito de
borda em consonância do uso dado ao entorno.
Forma predominante de uso do entorno: procura verificar a
adequabilidade dos usos efetuados no entorno a seus objetivos de gestão,
cuja matriz pode promover a conservação dos recursos como a sua
gradual degradação.
141
Impactos sobre as bacias hidrográficas: dada a importância desse recurso
na APA e no contexto regional, cabe avaliar as implicações dos usos
sobre as mesmas.
142
Quadro 10 – Avaliação da efetividade da APA da Serra de Maranguape
(continua)
INDICADORES AVALIAÇÃO
Ad
min
istr
açã
o
Comitê Gestor
O Comitê Gestor se encontra desativado deixando a unidade sem um órgão centralizador na gestão e sem um gerente com
responsabilidade exclusiva sobre a unidade. A ausência desse organismo inviabiliza a mediação de conflitos no uso dos recursos, a
articulação dos atores na construção de propostas alternativas, a cooptação de recuso e o estabelecimento de parceiras.
Recursos Humanos 5 pessoas compõem o quando de funcionários responsáveis pela gestão ambiental em todo do município.
Recursos Financeiros
Não existe uma política de captação de recursos, sendo eles disputados dentro do montante destinado pela prefeitura para as ações
na área do meio ambiente, agricultura e defesa civil, tão pouco há alguma estratégia que contribua para geração de recursos próprios
que viabilizem a execução de programas e atividades na unidade.
Infraestrutura Inexiste uma estrutura de apoio à administração ou ao desenvolvimento de atividade e programas na unidade, não se cria assim um
vínculo que possa servir de referências entre os grupos sociais.
Demarcação e limites
Não se encontram marcos físicos que indiquem os limites da APA. Na estrada que leva a pousada Encanto da Serra existem placas
em avançado estado deterioração que informavam a existência de uma APA.
Pla
nej
am
ento
Plano Gestor
Plano gestor foi elaborado há 12 anos. Contudo, ainda apresenta medidas que seriam eficazes no gerenciamento da APA. Pode ser
melhor desenvolvido se promover estratégias que consigam envolver os atores em sua proposição/execução
Zoneamento
Existe um zoneamento proposto para unidade, a eficácia desse instrumento pode ser maximizada se conseguir alinhar a proposta de
regulação de atividade e adequação através da identificação das características dos atores e os níveis de intensidade das formas de
uso e ocupação.
Compatibilidade dos usos com os
objetivos da unidade
Historicamente, os usos desenvolvidos na Serra foram de grande impacto na paisagem, podendo ser apercebidos no impacto sobre
a biodiversidade e nos trágicos episódios de movimento de massas. Os aspectos singulares desse ambiente de exceção favorecem o
desenvolvimento de atividades que comprometem a perpetuidade dos processos ecológicos como a ocupação de áreas de APP.
Percebe-se uma tendência de estagnação de alguns tipos de uso, o que cria um cenário especifico na tentativa de regulá-los
143
Quadro 10 – Avaliação da efetividade da APA da Serra de Maranguape
(conclusão)
Fonte: Elaborado pelo autor
INDICADORES AVALIAÇÃO
Po
líti
co-l
ega
l Instrumentos
Lei Municipal nº 1.168 de 08 de julho de 1993
Decreto Municipal 1.097, de junho de 1999.
Decreto Estadual nº 24.221, de 12 de Setembro de 1996.
Políticas
Os instrumentos previstos para APA podem ter sua capacidade de gestão potencializados se integrados a demais políticas de
Estado tais como Políticas de desenvolvimento regional, gestão de recursos hídricos, extensão rural e desenvolvimento social.
Não foram encontradas referências a essa proposta.
Qu
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do
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rote
gid
os
Desenho
O desenho da unidade favorece na redução do impacto do efeito de borda sobre o fragmento de Mata Atlântica, o
desenvolvimento de estudos que busquem entender esse fenômeno na Serra de Maranguape será de grande valia à gestão da
APA. A restrição da unidade ao município de Maranguape favorece a fragmentação de habitats e na sobrevivência das
populações de espécies protegidas.
Forma predominante
de uso do entorno
Por se tratar de uma APA, não se prevê regulamentações sobre as formas de uso do entorno, todavia, esses devem ser
considerados para um entendimento global dos aspectos que influenciam no manejo da unidade. Na vertente oriental, acelera-
se o processo de urbanização que é um vetor de ocupação para a APA e suas regiões periféricas gerador de especulação
imobiliária. Na vertente ocidental e sertões de entorno é intenso o uso agrícola e, em menor expressão, a produção animal,
ambos potencias comprometedores dos recursos hídricos e da fauna e flora.
Impactos sobre as bacias
hidrográficas
Os usos e formas de ocupação na unidade são de grande impacto sobre os recursos hídricos, principalmente pelo represamento
indevido, ocupação de áreas de APP e poluição sanitária. Por serem áreas de nascente, e Maranguape ser um dos municípios
onde os morados sofrem com os períodos de estiagem, maior atenção deve ser dada sobre estes impactos a fim de um melhor
aproveitamento dos recursos hídrico.
144
A avaliação desses itens teve por base as observações em campo e as entrevistas junto
aos atores e foram sintetizadas de forma qualitativa, produzindo diagnósticos e prognósticos
sobre a situação da APA.
5. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A emergência da problemática ambiental, a partir da segunda metade do século
XIX, impôs a toda a sociedade repensar as relações com a natureza, seus modelos de
desenvolvimento e as desigualdades e injustiças por eles gerados. A preocupação com a
biodiversidade, com a perturbação nos processos ecológicos e a degradação dos recursos foram
impulsionadores na adoção de estudos científicos e na formulação de políticas ambientais. A
criação de área protegidas desponta como uma estratégia válida na busca por resposta a esse
processo.
Repensar a relação Sociedade-Natureza pressupõe também rever os paradigmas
científicos e os referenciais teórico-metodológicos a eles associados. Na Geografia, a
perspectiva dos estudos integrados desponta com uma iniciativa inovadora na leitura da
realidade ambiental convergindo com a necessidade de gerar produtos que subsidiem políticas
ambientais mais eficazes. Contudo, é escasso o campo da discussão epistemológica e teórico-
metodológica na Geografia brasileira, sobretudo na Geografia Física, o que leva ao
engessamento de referenciais, reduzindo sua capacidade de acompanhar as dinâmicas da
sociedade.
Propor o Sistema GTP para a análise da política de criação de Unidades de
Conservação é, portanto, uma iniciativa ousada, mas que se justifica pela necessidade em
atender as demandas urgentes que aparecem no cotidiano. A elaboração de um guia
metodológico para esse intuito representa a proposta desta pesquisa em fornecer um referencial
dos estudos geográficos integrados na compreensão da interface sociedade-natureza sobre a
estratégia de preservação ambiental e gestão dos recursos naturais.
Utilizando tal guia e reconhecendo como se processam as Unidades de
Conservação, seus pressupostos teóricos e instrumentos, foi possível levantar elementos para
avaliar a APA da Serra de Maranguape, diagnosticando a repercussão do papel que ela cumpre
(ou da ausência dele) sobre o monitoramento e regulação do uso sustentável dos recursos
naturais. A utilização do referencial proposto não somente tornou possível realizar o
diagnóstico como possibilitou sugerir formas de gestão e levantar prognósticos sobre os
processos que atuam sobre a unidade.
145
Apesar da relevância em termos de biodiversidade, recursos naturais e de identidade
para os moradores, a Serra de Maranguape não recebe a atenção devida quanto à efetivação de
sua APA. As intensas formas de uso que esse ambiente passou ao logo de seu processo de
ocupação foram responsáveis por grandes modificações na paisagem e as atividades em curso
podem comprometer irreversivelmente danos aos sistemas ambientais. Os instrumentos que
dispõem e que criaram a unidade são concisos e estabelecem objetivos e ações palpáveis. A
restrição da APA ao município de Maranguape é um impeditivo na realização de ações
consequentes na conservação dos ecossistemas que formam o brejo de altitude. É urgente que
medidas de proteção sejam concretizadas, e elas só tomaram corpo caso haja a efetivação de
um núcleo gestor na área o que inclui a reativação do Comitê Gestor que possibilita a existência
de um organismo participativo para planejar, gerir e fiscalizar propostas para a conservação na
Serra.
A utilização dos pressupostos do Sistema GTP levantados por este trabalho, através
da análise da paisagem, possuem elementos que possibilitaram avaliar a criação e gestão de
unidades de conservação de uso sustentável e que o caráter integrado de seus diagnósticos sobre
a relação sociedade-natureza traz elementos que podem tornam mais eficaz o planejamento e
gestão dessas áreas.
É preciso salientar que frente à complexidade da questão ambiental muitos são os
recursos possíveis na busca de respostas. Portanto, tratou-se aqui não de produzir uma resposta
única e acabada, mas de oferecer uma contribuição disciplinar a uma questão transdisciplinar.
É exatamente por isso que se deve reconhecer que utilizar e integrar uma multiplicidade de
dados de forma sistêmica é uma tarefa que exige grande esforço na coleta e análise, por esse
motivo, é preciso reconhecer que uma limitação do presente trabalho tenha sido conseguir
integrar de forma mais eficiente as informações apreendidas nas percepções dos sujeitos aos
demais dados, o “P” ao sistema GTP. A adoção de uma metodologia que facilite o tratamento
desses dados pode contribuir na integração e, consequentemente, em um melhor entendimento
dos processos imateriais na configuração da paisagem.
Outras contribuições, com vista à conservação da Serra de Maranguape, que
podem vir a ser estudadas, suscitadas por esta pesquisa, consistem em diagnosticar possíveis
áreas de risco identificando áreas vulneráveis, como também apreender a relação entre a ação
antrópica e o efeito de borda no maciço, construindo novos conhecimentos que podem
contribuir para a gestão da APA. Sobre a relação entre o sistema GTP e a avaliação da
efetividade de áreas protegidas, a adaptação da metodologia utilizada pode ser ampliada,
produzindo indicadores quantitativos e mais próximos dos estudos geográficos.
146
Acredita-se que o presente trabalho tenha trazido elementos que enriqueçam o
arsenal geográfico dos estudos ambientais e contribua para o debate acerca das áreas protegidas.
147
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155
ANEXOS
156
ANEXO A – Roteiro para Entrevista Semidirigida
QUESTÕES INTENÇÕES
1 - Nome, idade, estado civil, com quem mora. Conhecer o perfil dos entrevistados
2- O Sr.(a) gosta de viver neste lugar? Por quê? Analisar a ligação com o lugar, o sentimento de
identidade, de pertencimento.
3-Sempre morou aqui?
3.1- Sim: já teve oportunidade para viver em outro
lugar? Quais os motivos que lhe fizeram ficar aqui?
3.2- Não: onde é que também já morou? Durante
quanto tempo? Quais os motivos que lhe fizeram sair
daqui? O que fez com que o senhor(a) voltasse para
cá? Quando esteve fora, do que sentia mais falta
(coisas, lugares, pessoas...)?
Objetiva-se perceber que elementos os entrevistados
consideram como singulares no local onde vivem em
relação à oportunidade de já terem morado em outro
local ou ainda que elementos justifiquem nunca terem
saído de lá.
4- Como era este lugar no passado (10, 20, 30 anos
atrás)? O local mudou muito deste tempo até os dias
de hoje? Em sua opinião quais foram as principais
mudanças?
Pretende-se comparar como era a paisagem em
questão no passado e como é na atualidade, se os
entrevistados perceberam as mudanças, o que eles
acharam dessas mudanças, se melhorou, se foram
significativas.
5- Quando o senhor(a) pensa neste lugar em que vive,
qual é a primeira imagem que lhe vem na cabeça?
A intenção é que os entrevistados digam qual a
paisagem que mais os marcou, a de maior importância
na vida deles.
6- Qual é a importância do(s) recursos naturais aqui
presente(s) na sua vida, no seu dia-a-dia, como o
senhor percebe esses elementos no seu cotidiano?
Verificar como os entrevistados percebem a
incorporação dos elementos geoecológicos nas
atividades que realizam e se estabelecem e que
vínculos estabelecem com elas.
7- Como o senhor(a) avalia a preservação do
ecossistema aqui presente, visto que mora em uma
Área de Proteção Ambiental?
Apreender como os entrevistados avaliam o estado de
conservação dos recursos naturais e que relações
estabelecem com a existência da UC
8- Para o senhor, qual o significado (importância) da
Serra de Maranguape ser uma Unidade de
Conservação?
Constatar como o entrevistado atenta para o fato de
viver numa área de proteção ambiental e como se da
conta da Unidade de Conservação. O quanto de fato se
sente responsável também pela conservação dessa área
protegida.
9-Você conhece alguma medida tomada na
conservação da Serra de Maranguape? Consegue
observar na paisagem algo que comprove a sua
efetividade ou a falta dela?
Verificar se os entrevistados têm conhecimentos das
medidas tomadas na conservação dos recursos naturais
e com as percebem (ou sua falta) na paisagem.
10- De que forma o senhor(a) pensa o futuro deste
lugar?
Verificar se os moradores possuem visões diferen-
ciadas e opiniões quanto ao futuro e preservação da
APA.
11- Quais paisagens você pensa que deveriam ser
fotografadas porque são de extrema beleza cênica e
patrimônio natural e afetivo? Em sua opinião, por
quais motivos esta(s) paisagem(ens) deixará(ão) de
existir em outros locais que não são áreas protegidas e
por quê?
Verificar se os entrevistados percebem mudanças
drásticas na paisagem e o que poderia vir a desaparecer
caso a Serra de Maranguape não tivesse se tornado
UC.
12- A sua vida neste local está melhor agora do que no
passado? Por quê?
A intenção é perceber se os moradores preferiam a
vida do passado ou a atual. A ideia é apreender como
as transformações e dinâmicas socioambientais ocor-
reram lá antes e depois da transformação da Serra em
APA.
Fonte: Adaptado de Silva (2013)
157
ANEXO B – Plano de Gestão da APA da Serra de Maranguape
(continua)
OBJETIVOS ESTRATÉGIAS
Combater o desmatamento;
▪ Reflorestar as áreas desmatadas com espécies nativas;
▪ Criar programa para formação de agentes ambientais;
▪ Apoiar o projeto Serra Viva
▪ Capacitar o produtor rural;
▪ Fiscalizar e controlar o desmatamento
Resgatar a ética preser-
vacionista da população. ▪ Implementar programas de educação ambiental.
Divulgar o significado e a
existência da APA para a
população local e
flutuante.
▪ Melhorar a sinalização da APA;
▪ Implantar cancelas de acesso à APA;
▪ Promover seminários e palestras;
▪ Elaborar material didático e promocional;
▪ Propagar a APA nos meios de comunicação.
Monitorar e controlar o
uso e ocupação do solo na
região da APA
▪ Capacitar agentes fiscalizadores e multiplicadores;
▪ Instituir a Guarda Florestal;
▪ Implementar a exigência de licença para a intervenção na APA.
Eliminar práticas agrícolas
inadequadas
.
▪ Capacitar os produtores rurais;
▪ Implantar áreas experimentais;
▪ Criar uma associação para desenvolver produtos orgânicos;
Combater a poluição dos
recursos hídricos.
▪ Construir estações de tratamento de esgotos;
▪ Implementar programa da educação ambiental;
▪ Fazer a coleta e a correta disposição do lixo;
▪ Fazer mutirão para a limpeza dos recursos hídricos;
▪ Implantar pontos de apoio para a população de baixa renda.
Ter segurança pública
eficaz na região da APA
.
▪ Criar um fundo de segurança;
▪ Proibir o uso de armas de fogo no perímetro da APA;
▪ Construir guaritas nas entradas da serra;
▪ Melhorar a iluminação pública.
Erradicar as pragas de
mosquitos e cupins cau-
sadas pelo desequilíbrio
ecológico.
▪ Reintroduzir as espécies nativas;
▪ Fomentar pesquisa visando o controle biológico das pragas.
Coletar e dispor do lixo de
forma adequada.
▪ Fazer a coleta com a utilização de contentores;
▪ Ampliar a área da coleta sistemática do lixo.
Ter uma fiscalização
ambiental eficaz na região
da APA.
▪ Criar a Guarda Florestal Municipal;
▪ Definir a legislação municipal.
Coibir os represamentos e
desvios inadequados dos
cursos d’água.
▪ Criar o comitê de bacias;
▪ Estabelecer uma política de utilização dos recursos hídricos;
▪ Identificar os pontos críticos em caráter emergencial.
Estimular o comprome-
timento dos proprietários
com a proteção ambiental.
▪ Cadastrar os proprietários;
▪ Mobilizar os proprietários para o envolvimento na gestão da APA;
▪ Estimular a implantação de pousadas e equipamentos turísticos nos sítios;
▪ Envolver os proprietários na criação de espaços educativos.
158
ANEXO B – Plano de Gestão da APA da Serra de Maranguape
(continuação)
OBJETIVOS ESTRATÉGIAS
Desestimular a prática da
monocultura da banana na
região da APA.
▪ Incentivar a diversificação das culturas agrícolas, substituindo gradativamente a
da banana;
▪ Introduzir técnicas de manejo sustentável;
▪ Criar uma central para comercialização de produtos agrícolas;
▪ Obter incentivos fiscais para a produção agrícola sustentável.
Proteger o patrimônio
histórico, cultural, natural e
arquitetônico na região da
APA.
▪ Levantar e divulgar o patrimônio histórico, cultural, natural e arquitetônico;
▪ Selecionar imóveis para fins culturais e turísticos;
▪ Ampliar os projetos de educação patrimonial.
Incentivar as atividades
agrícolas alternativas.
▪ Incentivar a criação da associação e cooperativas para agricultura
▪ Obter incentivos financeiros para o desenvolvimento de culturas alternativas.
Combater a violência e o uso
de álcool e drogas na região
da APA
▪ Realizar campanhas educativas contra o uso de álcool e drogas;
▪ Estimular atividades esportivas, culturais e de lazer;
▪ Intensificar o policiamento nas áreas frequentadas pelos turistas;
▪ Capacitar guias ecológicos para orientar os visitantes.
Aumentar o volume das
águas superficiais.
▪ Fazer o reflorestamento da APA com mudas nativas, segundo o calendário
ecológico;
▪ Recuperar as matas ciliares;
▪ Recuperar as áreas das nascentes dos cursos d'água;
▪ Implantar um banco de sementes.
Gerar trabalho e renda na
região da APA.
▪ Estimular a criação de cooperativas para produtos artesanais, plantas ornamentais
e agricultura orgânica;
▪ Estimular a criação de apiários;
▪ Estimular a criação de pousadas e equipamentos de apoio ao ecoturismo; -
Estimular a criação de agronegócios em pequenas propriedades;
▪ Formar guias ecológicos;
Coibir o turismo predatório
na região da APA.
▪ Implantar programas para desenvolver o ecoturismo;
▪ Estabelecer normas para disciplinar o ecoturismo;
▪ Sinalizar as trilhas ecológicas e os pontos turísticos;
▪ Implantar o sistema de telefone na serra.
Coibir queimadas ▪ Intensificar a fiscalização na Arca da APA;
▪ Implantar programas de orientação e conscientização.
Coibir a caça predatória.
▪ Intensificar a fiscalização na área da APA;
▪ Realizar campanhas educativas;
▪ Proibir o uso de armas de fogo na área da APA;
▪ Reintroduzir espécies da fauna na área da APA;
▪ Criar símbolo ecológico, valorizando a fauna local;
Divulgar a legislação
ambiental ▪ Realizar campanhas de divulgação.
Implantar o saneamento
básico.
▪ Construir estações de tratamento de esgotos;
▪ Construir sanitários em residências de baixa renda.
Erradicar as doenças
endêmicas tropicais ▪ Identificar e controlar as causas das doenças.
Melhorar as atuais vias de
acesso e as trilhas na serra.
▪ Recapear ou calçamentar as vias de acesso, assim como drenar, sinalizar e
implantar o paisagismo nas suas laterais;
▪ Controlar e sinalizar as trilhas ecológicas.
159
ANEXO B – Plano de Gestão da APA da Serra de Maranguape
(conclusão)
Fonte: Ceará (2002)
OBJETIVOS ESTRATÉGIAS
Coibir a construção de
moradias nas áreas de risco.
▪ Fazer o levantamento das áreas de risco;
▪ Fazer contenção onde é possível;
▪ Implantar programa habitacional para remoção da população das áreas de risco;
▪ Controlar e fiscalizar as construções.
Combater a erosão e
assoreamento.
▪ Recuperar as áreas através de reflorestamento;
▪ Fazer a contenção nas áreas erodidas.
Aumentar a flora e a fauna.
▪ Fazer o levantamento das espécies e do estágio de diminuição;
▪ Fazer o reflorestamento com espécies nativas;
▪ Fazer a reintrodução de espécies da fauna.
Coibir o cultivo em
vertentes íngremes
▪ Selecionar áreas adequadas para as culturas permitidas;
▪ Aplicar Código Florestal
Combater a poluição
sonora.
▪ Equipar os locais públicos com decibelimetros e cumprir a Lei Orgânica do
Município.
Combater a poluição do ar. ▪ Fazer o controle das emissões das indústrias e dos ônibus nas áreas da serra;
▪ Proibir e controlar as queimadas.
Implantar o transporte
coletivo na serra. ▪Estimular a criação de linhas alternativas para diversas localidades na serra.
Coibir a construção
indiscriminada de muros na
serra.
▪ Criar legislação adequada;
▪ Estimular o uso de cercas vivas.
Complementar a legislação
ambiental municipal. ▪ Implementar o Sistema Municipal de Meio Ambiente.